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Introdução
Quando nos propusemos realizar este trabalho sabíamos que tendo em conta a natureza
do tema – As Comunicações Móveis na Acção Política – a nossa tarefa implicava uma
investigação qualitativa, privilegiando o contexto material como fonte directa dos
dados, incidindo na descrição e análise das acções, interacções e discursos, procurando,
dessa forma, construir uma narrativa descritiva mais assente no processo do que nos
resultados.
Para isso, partiu-se da seguinte hipótese:
A tecnologia móvel é a mais ubíqua, democrática e poderosa tecnologia ao serviço da
globalização (Geser, 2004; Starr 2005). E o seu principal terminal – o telemóvel – é o
instrumento tecnológico de socialização mais difundido e massificado do planeta,
estando hoje nas mãos de mais de metade da população mundiali. Nunca os cidadãos do
mundo estiveram tão conectados, participando e interagindo incessantemente, em tempo
real e em movimento, acedendo a informação instantânea e inteligente. As tecnologias
móveis estão a reconfigurar o homem e a sociedade, a causar um efeito disruptivo, que
pela sua facilidade de propagação, quase viral, está a precipitar o processo de
desconstrução das velhas estruturas formais, assumindo-se, cada vez mais, como um
veículo do emergente paradigma reticular. O telemóvel está a acelerar a difusão da
sociedade em rede, inaugurada pela Internet, pondo fim ao monopólio dos mass-media
unidireccionais e gerando um novo conceito de canal, que amplifica as tendências
sociais e esbate a fronteira entre produtores e consumidores. O establishment e a lógica
de poder centralista dos agentes que tradicionalmente ocupam o espaço público
começam a ser ameaçados pelo surgimento de um novo modelo de participação e auto-
organização bottom-up de governança democrática (Ito, 2003). Um pouco por todo o
lado – do Primeiro Mundo ao Terceiro Mundo – surgem fenómenos que indiciam
profundas transformações relacionais e monitoriais entre os cidadãos e o poder. Nos
EUA, assiste-se hoje a um inusitado processo político em que a “estrela” em ascensão é
um jovem senador democrata, que até há bem pouco tempo estava ausente do
mainstream mediático. Filho de pai queniano e mãe americana, com um singular
percurso de vida, Barack Obama apresenta como principais credenciais políticas, um
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eloquente discurso proferido na Convenção Democrática de 2004 – que calou fundo no
coração da América – e a sua experiência enquanto organizador comunitário nos bairros
pobres dos subúrbios de Chicago. Obama usou a sua campanha para dar voz à rua, ao
cidadão comum, às pequenas comunidades e, a partir das bases, ergueu um dos maiores
fenómenos de mobilização popular de que há memória na América. Curiosamente, as
comunicações móveis têm constituído um forte canal de conexão entre os apoiantes de
Obama, a par com as redes sociais on-lineii, não apenas na mobilização para as suas
acções de campanha, mas também ajudando a angariar fundos. Estima-se que a
campanha de Obama tenha conseguido angariar cerca de 300 milhões de dólares só nos
últimos 5 meses e uma grande parte através de pequenos donativos individuais.
Já em Portugal, um dos países do mundo com maior taxa de penetração móvel, aliás,
bastante superior à dos EUA, o potencial de utilização das tecnologias móveis na acção
política continua por explorar.
A hipótese colocada resume-se, finalmente, ao seguinte: Pode o telemóvel, dadas as
suas características e a sua difusão, constituir um instrumento fundamental de estímulo
à participação dos cidadãos na actividade política e funcionar como um agente de
mudança na transformação das lógicas tradicionais de acção política?
A formulação desta hipótese coloca um conjunto de interrogações a que procuremos dar
resposta ao longo deste trabalho, tais como:
Será que a utilização da tecnologia da informação e da comunicação móvel corresponde
ao preenchimento de uma lacuna tecnológica que, pela forte familiaridade existente
entre o telemóvel e o cidadão, constitui hoje uma condição para a eficácia da acção
política?
Quais as aplicações móveis susceptíveis de serem usadas na acção política?
De que forma podem ser usadas, ou poderão vir a sê-lo?
Quais as implicações sociais e políticas dessa utilização?
O que nos ensinam as experiências móveis até aqui realizadas no campo da política?
As tecnologias móveis têm ou não contribuído para despertar o interesse pela política e
para aumentar os níveis de participação dos cidadãos na política?
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De que forma os políticos têm utilizado as tecnologias móveis no desenvolvimento das
suas estratégias e das suas campanhas?
Será que esta nova forma de diálogo democrático pode ser traduzida em acção,
permitindo a interacção com o sistema político actual?
Poderemos estar de facto a assistir à emergência de uma nova forma de democracia
viabilizada pelas tecnologias móveis?
Dadas as limitações de espaço que temos para a apresentação das respostas a estas
perguntas, não iremos responder da mesma forma a todo o seu conjunto. No entanto,
consideramos que a sua enunciação é necessária para que se possa incorporar as
respostas, ainda que parciais, na verificação da hipótese apresentada. Assim, ao longo
das próximas páginas, iremos apresentar uma análise das comunicações móveis no
campo da acção política, de acordo com as seguintes etapas:
No Capítulo I – desenvolve-se uma abordagem sobre o papel que desempenham os três
agentes que tradicionalmente intervêm no espaço público – políticos, jornalistas e
cidadãos – procurando explicar a forma como se posicionam e se relacionam entre si,
com o objectivo de melhor compreender os impactos e as consequências que as novas
tecnologias de informação e comunicação, nomeadamente móveis, estão a provocar no
quadro dessas relações.
No Capítulo II – desenvolve-se uma abordagem sobre o impacto social das tecnologias
móveis com o objectivo de compreender o papel que estas têm assumido na
reconfiguração dos processos de socialização, no incremento das relações interpessoais
e no surgimento de outras formas de comunicação e intercâmbio de informação, que
estão na origem de um novo conceito espácio-temporal.
No Capítulo III – desenvolve-se uma abordagem sobre a forma como as organizações
políticas têm recorrido às tecnologias móveis enquanto canal de difusão da sua
mensagem com o objectivo de compreender os efeitos que essa acção produz, tanto ao
nível da reacção dos cidadãos, como dos seus efeitos no modelo de organização das
estruturas políticas (uma descrição mais aprofundada dos exemplos pode ser encontrada
nos Anexos I e II).
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No Capítulo IV – termina-se com uma análise conclusiva, baseada na exposição
analítica contida nos capítulos anteriores.
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Capítulo I
Política, media e comunicações móveis
Segundo o conceito clássico de Habbermas o espaço público é definido como a esfera
intermédia que se constituiu historicamente, no período das Luzes, entre a sociedade
civil e o Estado. É o espaço onde o público se manifesta, dando lugar à formulação de
uma opinião pública. É o intercâmbio discursivo de posições racionais sobre problemas
de interesse geral que permite identificar uma opinião pública. O espaço público
assume-se como o espaço da discussão por excelência, enquanto o espaço político é o
da decisão. O espaço público é, nesse sentido, a condição para o nascimento do espaço
político, já que constitui o laço político que liga milhões de cidadãos anónimos, dando-
lhes a sensação de participar efectivamente na política (Wolton, 1997).
Progressivamente, os media foram assumindo a função de configuradores da sociedade.
Eles passaram a dominar cada vez mais o espaço público e foram-se afirmando como os
principais mediadores entre os cidadãos e os políticos (Bougnoux, 1995). Ou dito de
outra forma, os media deslocaram-se para o centro do processo social e passaram a
construir a esfera pública (Blumler, Kavanagh, 1999). A comunicação tornou-se, assim,
parte integrante da actividade política e a comunicação política passou a ser o motor do
espaço público. A comunicação política é, por sua vez, o espaço onde se trocam os
discursos contraditórios dos três agentes que têm legitimidade para se exprimir
publicamente acerca da política: os políticos, os jornalistas e a opinião pública através
das sondagens (Wolton, 1997). Ou dito de outra forma, há no espaço político três níveis
de representação: insiders, semi-insiders e outsiders. Os insiders são os políticos, os
semi-insiders os jornalistas e os outsiders as massas (Louw, 2005). De acordo com esta
teoria, as massas limitam-se a ser espectadores passivos da acção política, sendo o
verdadeiro jogo protagonizado entre políticos e jornalistas. Trata-se de uma tese que
remete para as teorias de Gramsci entre classes dominantes e classes dominadas,
traduzindo um «processo de naturalização» onde se estabelece uma espécie de
cumplicidade entre o dominante e o dominado que acaba por legitimar o dominante de
uma forma consciente ou inconsciente. Os media são, assim, fundamentais para
estabelecer esse «processo de naturalização» e assegurar que o dominado «se esqueça
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de si e se ignore, submetendo-se ao dominante, da mesma maneira que contribui, ao
reconhecê-lo, para fundá-lo» (Bourdieu, 1996). Este processo de legitimação
desenvolve-se por acção dos grandes meios de comunicação social – jornais, estações
de rádio, canais de televisão – que através de dispositivos centrais desencadeiam os
processos de naturalização, forjando, consensos, que ocultam estratégias “hegemónicas”
(Rebelo, 2006). Os “dominados” ficam, assim, subjugados às narrativas mediatizadas
pelos órgãos de comunicação social de massas.
A política passou a ser inseparável da comunicação e os políticos perceberam que sem
comunicação não se podem fazer ouvir nem compreender. Confrontados com esta
evolução, tiveram que adaptar-se à chamada “mediatização da vida política”. A
necessidade de mais visibilidade levou-os a ter de aceitar novas regras para o exercício
do poder no dia-a-dia, num contexto em que os processos são cada vez mais públicos.
Uma boa parte da acção política é indissociável de uma estratégia de comunicação,
concebida para obter a adesão de um maior número de cidadãos, com o objectivo de
ganhar eleições e garantir o acesso ao poder. Os jornalistas transformaram-se em aliados
tácticos dos políticos. Sem a acção dos jornalistas os políticos não poderiam criar os
eventos que lhes trazem poder e notoriedade. Claro, que subjaz sempre ao trabalho dos
media um princípio fundador da actividade jornalística: o direito dos cidadãos à
informação. É em nome do interesse do público, que como se sabe nem sempre coincide
com o chamado «interesse público», que os media pressionam os políticos para que se
expliquem e se justifiquem. Trava-se, assim, um jogo de equilíbrio entre políticos e
jornalistas, um processo de negociação permanente, de gestão da informação, ao qual
não é naturalmente alheio à acção dos spin-doctors, uma categoria de profissionais da
comunicação que estabelece um processo de interacção entre políticos e jornalistas. Esta
dimensão relacional, de gestão das impressões, onde entram mecanismos de sedução e
de persuasão, é parte integrante das negociações internas ao sistema político. A
necessidade cada vez maior de responder às solicitações de exposição pública conduziu
ao surgimento de um conjunto de profissões cuja criação foi estimulada pela crescente
complexidade e sofisticação do processo de construção do espaço mediático,
nomeadamente: relações públicas, assessoria de imprensa, spin-doctoring, publicidade,
marketing, etc. A explosão dos processos de comunicação é fruto da emergência de um
conjunto de actores que neles têm interesse e cuja actividade constitui um fenómeno
chave de ocupação da esfera pública, na medida em que estes promotores de
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acontecimentos procuram converter as suas intenções na defesa do bem comum (Louw,
2005). A mediatização da vida política obriga os políticos a tornar a sua acção tão
espectacular quanto possível. A gestão da informação, e cada vez mais da imagem,
tende a fazer com que haja uma convergência entre as agendas política e mediática. A
acção política é formatada pelo processo mediático, com especial predominância para a
televisão. A política tornou-se, assim, lugar privilegiado de espectáculo. Hoje a
comunicação de Estado tornou-se o essencial da sua acção. O Estado tem de produzir
uma quantidade crescente de imagens e de sons para alimentar, dia-a-dia, a máquina dos
media. Tornou-se quase natural a existência de uma cultura de governo asfixiada e
telecomandada pelos media, pelo seu ritmo, pelos seus formatos e pelas suas exigências.
Os media são hoje os mais poderosos meios para produzir comunicação. Como no
início da década de 70 do século passado, explicou Guy Debord, no seu livro A
Sociedade do Espectáculo: «É a especialização do poder, a mais velha especialização
social, que está na raiz do espectáculo».
Podemos, assim, concluir duas coisas: a mensagem política é pensada, sobretudo, em
função da massa espectadora; e o actual star-system politico-mediático exige políticos
com star-quality.
Assistimos, assim, a um verdadeiro aggiornamento mediático dos políticos, que aceitam
cada vez mais adaptar-se aos novos formatos mediáticos, ao ponto de se transformarem
em vedetas do star-system, partilhando as luzes da ribalta com actores de cinema,
apresentadores de televisão, pop-stars, futebolistas de grande clubes, campeões
olímpicos… O processo democrático é agora executado num palco onde, juntamente
com os recursos tradicionais como a ideologia, os rituais e os valores de culturas cívicas
mais antigas, existem guiões, actores e adereços, que podem ser vistos como
“emprestados” da cultura popular, mas que na realidade se tornaram parte integrante da
estrutura política (Richards, 2004). A influência da cultura de massas na política é
crescente, assistindo-se a um processo de “aculturação” da política por manifestações
tipicamente populares (Richards, 2004). Quanto mais televisivo o processo político se
torna, mais nós lê-mos os nossos políticos através dos seus gestos e caras, da mesma
forma que lê-mos os artistas na televisão (Street, 2001). Ainda assim, as comunicações
políticas permanecem dessincronizadas de algumas das dimensões chave da nova
realidade cultural, apesar de todo o entusiasmo em relação ao spin-doctoring, da
“escravatura” dos políticos face aos media e da energia com que é perseguido o controlo
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da agenda mediática. Persiste um «deficit emocional» nas comunicações políticas
contemporâneas, uma escassez de atenção sustentada e trabalhada para com as
necessidades emocionais da audiência, já que enquanto a experiência dos cidadãos se
transformou, a forma dos políticos se lhes dirigir nem sempre acompanhou essas
transformações (Richards, 2004). A cena política é cada vez mais sobre as emoções e
sobre a sua gestão, o que obriga os políticos e os seus conselheiros a estarem
intensamente envolvidos em certos tipos de trabalho emocional, especialmente naquilo
que já foi chamado “a gestão mediatizada de massas da emoção pública” (Richards,
2004).
A tarefa dos políticos e dos especialistas em comunicação política é, efectivamente,
cada vez mais complexa e exigente. Até porque assistimos actualmente tanto a
transformações relacionais como a profundas alterações monitorais na conexão dos
cidadãos com o espaço público mediático. Os media são a expressão da produção de
narrativas do exterior que nos são impostas (Kerckove, 1997). Mas acontece que este
trajecto “de fora para dentro” está a ser posto em causa pelo poder que cada um de nós
tem de criar objectos de sentido. A função imperialista dos media está nesta altura a ser
objecto de um processo contraditório. A dominância dos grandes media, mormente a
televisão, está a ser ameaçada. Com o advento digital, passou a existir um processo de
individualização da comunicação, que varia em função de cada espectador. Com os
media digitais a mudança é ditada pela procura. Nesse sentido, o imperialismo dos
grandes media, no que respeita à tematização do debate público, está a ser ameaçado
pela evolução tecnológica (Rebelo, 2006). Primeiro, foi o surgimento da televisão por
cabo, que acabou com o monopólio da televisão hertziana e generalista. Depois, o
zapping, que veio permitir que cada espectador pudesse construir uma grelha de
programação personalizada, contribuindo, assim, para a erosão do próprio conceito de
“canal”, cuja génese se situa fora do plano da recepção. E, finalmente, as inúmeras
inovações tecnológicas descobertas e colocadas no mercado a um ritmo alucinante,
originando a massificação de novas funcionalidades e serviços, tais como: blogs, vlogs,
wikis, P2P, podcasting, RSS, Wi-fi… (Rebelo, 2006). A lógica de regulação como
forma de controlo da informação acabou. Vivemos hoje uma «cidadania monitorial».
Estamos a assistir ao desmembramento do sistema produtivo de informação instalado,
que está a ser posto em causa pela multiplicação de novos actores de produção
informativa (Bennett, Manheim, 2006). Assiste-se, assim, a uma “desrealização do
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espaço e do tempo”. A instantaneidade é ponto culminante da “desrealização”,
marcando a passagem dos media tradicionais aos novos media. Ao tempo da cronologia
e da história, sucede um tempo que se expõe instantaneamente (Rebelo, 2006, citando
Stiegler, 2001). Neste sentido, está a desenvolver-se uma nova consciência de tempo e
com ela está a nascer um novo ser humano. Depois de eliminar as distâncias
transformando-nos em “nómadas electrónicos”, os novos media obrigam-nos a
questionar a noção de tempo. Depois de a humanidade ter conquistado o espaço, a
evolução tecnológica dirige-se agora à última fronteira – o tempo – real, virtual, pessoal
e social (Kerckove, 1997).
Como aqui se demonstra, os media estão longe de ser meros veículos de transporte, são
aparelhos sociais institucionalizados, geradores de mediações simbólicas, através das
quais se hierarquiza e se tematiza a realidade social (Franco, 2006). O modelo de órgãos
de comunicação social de massas, que imperou nos últimos 150 anos, e rapidamente se
expandiu porque respondia ao apelo do modelo produtivo dominante, começa agora a
entrar em crise e em declínio. Os grandes media já não “ditam” a vontade dos cidadãos
Rebelo, 2006), como o provam um conjunto de acontecimentos políticos que teremos a
oportunidade de analisar no Capítulo III (e Anexos I e II). A Internet, através de e-mails,
blogs e sites de redes sociais, ou os telemóveis, através de SMS e MMS, dotaram o
cidadão comum de instrumentos que lhes permitem de forma simples, instantânea e
barata, comunicar não só através da escrita, mas também do som e da imagem. O
potencial de utilização de comunicação móvel é muito grande e estamos ainda nos
primórdios da sua utilização. A cada momento surgem formatos novos aos quais é
necessário estar atento. São variadas as possibilidades e começam a surgir modelos
conceptuais que contribuem para desenhar iniciativas políticas como: Smart Mobs,
Flashmob, Moblog, Weblogs... (Rebelo, 2006; Franco 2006). Assistimos ao advento dos
«repórteres de ocasião», cidadãos anónimos que através da utilização de um simples
telemóvel ou de uma câmara amadora, captam imagens e sons inéditos que constituem
instantâneos da realidade (Rebelo, 2006) e que por vezes se transformam em
documentos históricos únicos – como aconteceu em casos tão diversos como o 11 de
Setembro, o tsunami, o Katrina, as torturas no Iraque, o enforcamento de Saddam...
O telefone prepara-se agora para ser o veículo do cinema e da televisão e, nesse sentido,
definir o momento. O que assistimos é que ambos, o telefone e a televisão, se unem e se
libertam do lugar agindo com liberdade de movimento (Franco, 2006). Contrariamente
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ao computador, que foi originalmente construído para fins militares, o telemóvel tem
uma enorme vantagem: nomeadamente, ao ser um telefone ele é uma ferramenta
tecnológica de socialização desde a sua génese (Oberman, 2005). Comunicações sem
fios, telemóveis, iPod, PDA e outras ferramentas do género mantêm-nos em contacto
com o mundo e com todos em tempo real potenciando novas modalidades de
colaboração. Estará o dispositivo móvel a afirmar-se como alternativa aos media
tradicionais como os jornais, a rádio ou a televisão e ao mesmo tempo a apropriar-se do
espaço de novos media como, por exemplo, a Internet? Na realidade, conseguindo o
domínio da tecnologia móvel acede-se a um recurso muito mais imediato, muito mais
potente e muito mais difícil de controlar do que a rádio, a televisão, ou mesmo a
Internet. (Starr, 2005). Hoje, mais do que um telefone, o telemóvel constitui um
terminal de dados, a partir do qual é possível aceder e interagir com o mundo em rede. É
esta mutação na natureza do fenómeno da comunicação, que passa de linear a reticular,
caracteristicamente pós-moderno, que configura uma mudança de paradigma que não
deixará de ter consequências estruturantes no modelo relacional entre os diferentes
actores sociais. Nas Sociedades Informacionais, onde a rede é o elemento fundamental
da organização, um novo modelo comunicacional está a ganhar forma (Cardoso, 2008).
Um modelo caracterizado pela fusão da comunicação interpessoal com a comunicação
de massas, conectando audiências, emissores e editores sob uma rede comum de
dispositivos mediáticos que vai desde os jornais aos videojogos e que oferece novas
funções mediáticas aos seus utilizadores (Cardoso, 2008). As novas tecnologias e a sua
socialização estão hoje ao alcance de grupos de pessoas relativamente pequenos quando
antes só estavam ao alcance de enormes grupos corporativos (Rheingold, 2002). Os
media monolíticos e as suas representações cada vez mais simplistas do mundo não
conseguem originar o confronto de ideias necessário para gerar consensos (Ito, 2003). A
política é baseada na comunicação socializada, na capacidade de influenciar as mentes
das pessoas. Na sociedade contemporânea, política é, basicamente, sinónimo de política
mediática (Castells, 2007). A difusão da Internet, das comunicações móveis, dos media
digitais e de uma variedade de instrumentos de software social conduziram ao
desenvolvimento de redes horizontais de comunicação interactiva que conectam o local
e o global no momento pretendido (Castells, 2007). Hoje, uma grande percentagem da
humanidade tem acesso a comunicações móveis – mais de 3,5 biliões de pessoas em
todo o mundo, cerca de metade da população do planeta – mesmo em locais remotos
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onde não chega a electricidade. Com a convergência entre a Internet e as comunicações
móveis e a grande difusão da banda larga, as pessoas começaram a construir o seu
próprio sistema de comunicação de massas (Castells, 2007). O campo da cidadania
alarga-se e autonomiza-se e a política, que atravessa uma crise de identidade e
legitimação, tenta reinventar-se, aderindo aos novos media e socorrendo-se do mais
democrático e massificado dos canais de comunicação – o telemóvel. O objectivo é
claro, estabelecer o diálogo directo com os eleitores, através de um canal de
comunicação veloz, ubíquo e sem mediação. A utopia da democracia directa, onde
eleitos e eleitores, governo e governados, estão em permanente contacto, pode estar
prestes a chegar, por via do telemóvel.
Chegados aqui, cumpre perguntar: Com é possível que, em poucos anos, o telemóvel se
tenha tornado num instrumento tão poderoso? Que profundas transformações ocorreram
nas sociedades contemporâneas capazes de justificar uma mudança no paradigma da
comunicação? No próximo capítulo procuramos responder a estas questões.
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Capítulo II
As comunicações móveis como meio de socialização: do pessoal para o global
Desde os primórdios da vida na Terra, há biliões de anos atrás, que a evolução tem sido
marcada por dois grandes constrangimentos físicos (Geser, 2004). Primeiro, a
proximidade física – que foi sempre uma pré-condição para os organismos vivos
iniciarem e manterem continuadamente relações interactivas. Segundo, a existência de
locais de vivência estáveis – que foram sempre necessários para o desenvolvimento de
formas cada vez mais complexas de comunicação e cooperação (Geser, 2004). Em
vários momentos da nossa história as inovações tecnológicas produziram efeitos de
mudança fundamentais e permanentes nas estruturas de poder das sociedades humanas.
O arado, a roda e os aquedutos todos contribuíram para aumentar a capacidade do
homem em melhorar o rendimento em determinada área, desenvolvendo a possibilidade
de em áreas cada vez mais pequenas de território viverem cada vez maior número de
pessoas – criando assim as condições para o nascimento da civilização (Starr, 2005).
Nas sociedades modernas os indivíduos estão muito habituados a enfrentar constantes e
penosas discrepâncias em matéria de distâncias geográficas e sociais. Por um lado, têm
de tolerar a extrema proximidade espacial com massas de pessoas que lhe são
totalmente indiferentes – em cidades, centros comerciais, autocarros superlotados, etc. –
e, por outro lado, têm de suportar a distância espacial relativamente àqueles que lhes são
mais próximos – cônjuge, filhos, pais e amigos. (Geser, 2004). Com a invenção do
telégrafo – que foi o primeiro vector de comunicação a separar a velocidade do
movimento da informação da velocidade do movimento dos objectos e da matéria –
deu-se início a uma nova era – a terceira natureza – em que a informação passou a estar
um passo à frente do movimento das pessoas e das coisas, acabando por dominar e
coordenar os seus movimentos (Wark, 2005). O telégrafo, tal como o telefone que
imediatamente lhe sucedeu, conectava pontos fixos. Com a massificação do telefone
fixo este passou a constituir o elemento chave na construção das grandes organizações
(Aaronson, 1977). O telefone fixo eliminou o pré-requisito da proximidade física, mas
por outro lado, preservou, ou até certo ponto reforçou, a necessidade de permanecer em
lugares específicos. A principal função do telefone fixo foi a de reforçar o papel social
integrador de locais de estabilidade sedentária, como é o caso das cidades ou das
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organizações burocráticas, permitindo que elas crescessem muito para além do potencial
de integração de relações sociais primárias (Geser, 2004).
Com o advento das tecnologias móveis o que se assiste agora é à expansão das
capacidades introduzidas pelo telégrafo e pelo telefone, fazendo com que a terceira
natureza exerça ainda maior domínio sobre a segunda natureza, que é a do contexto
humano e do processo produtivo, que por sua vez domina a nossa relação com a
natureza, os recursos e as matérias-primas (Wark, 2005). Visto nesta perspectiva
evolucionista, a importância do telefone móvel reside no facto de ter dado a
possibilidade às pessoas comuns de se envolverem no processo de comunicação,
permitindo ao mesmo tempo libertá-las dos constrangimentos da proximidade física e
da imobilidade espacial (Geser, 2004). Os dispositivos móveis tornaram possível que
uma qualquer coisa se possa encontrar com outra qualquer coisa, em qualquer lugar, a
qualquer momento, dentro das leis da física (Wark, 2005). Na sua essência, o
dispositivo móvel é um equalizador e um amplificador. Muito para além da simples
tecnologia que permite fazer ou receber um telefonema pessoal, este instrumento
possibilita um acesso sem paralelo à informação e permite-nos transcender o espaço e
estender a nossa presença muito além dos limites físicos a que o nosso corpo está
confinado. Dá-nos a possibilidade de procurarmos coisas que queremos encontrar e
determinar o que queremos saber em, virtualmente, qualquer lugar (Starr, 2005). Alguns
autores definem este fenómeno como Appartageist. Trata-se de um neologismo criado
para descrever a base da teoria sociológica das comunicações móveis, especificamente
no contexto das relações entre tecnologia e sociedade. É um termo usado para explicar o
“espírito da máquina” – segundo a definição Hegeliana do espírito como a essência que
anima a vida de todas as culturas humanas nas suas mais diversas formas – e como essa
natureza de “contacto perpétuo” influencia tanto o design como o significado inicial e
subsequente que a tecnologia assume para os utilizadores, os não-utilizadores e os anti-
utilizadores (Katz e Aakhus, 2002; Campbell, 2004). O Papa Bento XVI afirmou
recentemente que os novos media, sobretudo os telemóveis e a Internet, estão a
modificar a fisionomia da comunicação e a tornar mais visíveis os traços essenciais da
verdade sobre a pessoa humanaiii. Na realidade os equipamentos móveis possuem uma
vantagem única relativamente aos equipamentos com fios: o contexto. Porque os
telemóveis estão connosco o tempo todo e, por isso, têm a capacidade de reflectir o
nosso contexto. Esse contexto pode ser a nossa localização geográfica, o nosso humor, a
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nossa presença, o nosso estatuto social ou o nosso estado de espírito. Este contexto
também pode reflectir o contexto de quem nos rodeia. (Wark, 2004). Os instrumentos
de comunicação móvel permitem-nos navegar e procurar, permitindo que encontremos
outros e que outros nos encontrem a nós. Estes instrumentos aumentam a possibilidade
de recebermos informação relacionada com o meio envolvente em que nos
encontramos, mesmo informação deixada por outros que não pode ser detectada pelas
normais capacidades sensoriais do ser humano (Starr, 2005). O dispositivo móvel,
ligado em rede, tanto permite ao seu utilizador comunicar discretamente e de forma
privada como difundir uma mensagem para milhares ou mesmo milhões de pessoas. Os
telemóveis estão a ficar mais inteligentes, mais personalizados e ainda mais ubíquos
(Starr, 2005). O telemóvel pode provar a nossa identidade, salvar a nossa vida numa
situação de emergência ou arruinar a carreira de um político. Todo o telemóvel está
igualmente conectado a todos os outros e a partir do momento em que os dedos
começam a teclar entra-se automaticamente num dos mais democráticos meios de
comunicação do planeta (Starr, 2005).
O sistema de transmissão tecnológica sem fios – wireless – está certamente no topo de
toda a inovação que torna a comunicação compatível com a mobilidade espacial.
Curiosamente, esta portabilidade foi primeiro desenvolvida para aparelhos receptores,
enquanto a transmissão tecnológica – o caso da rádio e da televisão – se manteve
estática e sob o controlo de um pequeno número de actores poderosos – grandes
empresas e governos/Estados (Geser, 2004). As pessoas estão a transitar dos ecrãs da
televisão para os ecrãs dos computadores e destes para os ecrãs dos telemóveis (Harper,
2005). O telemóvel é o mais pequeno dos ecrãs que pode ter o maior dos futuros, como
principal fonte de informação e entretenimentoiv. O rápido desenvolvimento da
tecnologia móvel deve-se ao facto de o número total de telemóveis em todo o mundo ter
ultrapassado, já no ano de 2001, o número de aparelhos de televisão (Geser, 2004). O
telemóvel tornou-se um dos mais ubíquos dispositivos de comunicação e estima-se que
haja hoje em todo o mundo maior número de telemóveis do que computadores ou
aparelhos de televisão. Esta difusão ocorreu à escala mundial, independentemente dos
diferentes hábitos culturais, valores e normas (Geser, 2004). Desde 1981 – quando as
primeiras redes móveis foram ligadas na Arábia Saudita e na Escandinávia – até hoje, o
telemóvel tornou-se numa das maiores histórias de sucesso do mundo (Geser, 2004).
Segundo dados divulgados em Novembro de 2007 pela consultora de telecomunicações
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Informa Telecoms & Media a penetração do telemóvel ultrapassou já 50% da população
mundial – com mais de 3.3 biliões de assinantesv. As redes móveis – espalhadas por
cerca de duas centenas e meia de países – cobrem já mais de 90% da população
mundial. O que significa que cerca de 40% da população mundial coberta pela rede
móvel ainda não está conectada e apenas 10% não está nem coberta nem conectada.
Muitos dos mercados mais maduros têm já uma penetração móvel acima dos 100%,
dado que cerca de 60 países em todo o mundo atingiram uma taxa de penetração móvel
acima dos 100%, enquanto 27 países registam uma taxa de penetração abaixo dos 10%.
A mesma consultora prevê que até ao final de 2008, o número de assinantes de
comunicações móveis ascenda a 4 biliões. No mesmo sentido, pronunciou-se o
Secretário-Geral da União Internacional das Telecomunicações (ITU) Hamadoun Touré,
que num discurso proferido na sede das Nações Unidas, em Nova Iorque, a 26 de
Setembro, afirmou que até ao final do ano de 2008 mais de 60% da população mundial
disporá de telemóvelvi.
Em muitos países do mundo, quando as pessoas procuram informação o telemóvel é o
primeiro dispositivo de informação a que recorrem. As pessoas não usam o telemóvel
apenas para fazer chamadas, elas também o utilizam para enviar e receber informação (Venkatesh, 2005). Para centenas de milhões de pessoas em todo o mundo, o telemóvel
está a tornar-se na primeira forma de acesso à Internet e ao conhecimento que ela
contém, bem como meio privilegiado de acesso e participação às suas redes sociais
(Harper, 2005). Os últimos dados disponíveis indicam que no ano de 2007 cerca de 798
milhões de pessoas em todo o mundo acederam, pelo menos esporadicamente, à Internet
ou a serviços móveis de Internet, tais como WAP ou I-Mode usando um telemóvel em
vez de um PCvii. A tecnologia móvel está a avançar e a ficar todos os dias cada vez mais
acessível. Não se pode pensar mais neste equipamento como um telemóvel, tem de se
pensar nele como um dispositivo portátil, um computador em miniatura, que faz todo o
tipo de coisas, mas que está nos nossos bolsos (Oberman, 2005; Walczak, 2005). A
principal função do telemóvel é comunicar com outras pessoas, ele constitui parte
integrante da vida social das pessoas que o usam. Tudo o que é mobile é mais emocional
e, por isso, as pessoas têm um relacionamento muito mais pessoal e afectivo com os
seus telemóveis do que com praticamente tudo o que esteja no ecrã do seu PC (Shirky,
2005). Há alguns anos atrás as pessoas olhavam para a tecnologia móvel como uma
estratégia, hoje em dia ela é um canal. A tecnologia móvel chega a pessoas que outros
16
canais como a televisão, a rádio, ou a imprensa, não conseguem chegar (Manis, 2005). Num estudo realizado na Irlanda em que era perguntado a jovens que tipo de aparelho
tecnológico preferiam ter consigo se estivessem numa ilha deserta, 52% respondeu o
telemóvel, enquanto apenas 18% optou pela TV. Por outro lado, a maioria afirmou-se
disponível para gastar muito maiores somas de dinheiro em contas mensais de
telemóvel do que em serviços de Internet (Geser, 2004).
As pessoas usam os seus telemóveis e confiam na informação que recebem através deles
mais do que no computador ou na televisão porque o telemóvel está acessível o tempo
todo e está ligado às pessoas de uma forma muito individual (Walczak, 2005). O
telefone cabe no bolso e carrega informação como os nomes e os contactos dos amigos.
Isso é algo muito pessoal. Qualquer pessoa com um telemóvel pode registar-se para
aceder e receber informação. A utilização dos telemóveis para aceder à Internet está a
propagar-se tanto em meios urbanos como rurais. As pessoas em geral – de todas as
condições sociais, étnicas, culturais, económicas e religiosas, idades ou proveniências –
gostam da eficácia e da energia da tecnologia móvel (Walczak, 2005).
Independentemente do lugar onde nos encontremos, o telemóvel pode fornecer
informação de uma tal forma que está já a ultrapassar em eficácia o próprio computador.
A tecnologia móvel é o canal de comunicação que funciona em toda a parte e a qualquer
hora. Está sempre ligado e pronto para aceder e ser acedido. É o meio de comunicação
que ocupa o espaço quando não se tem acesso a um computador ou à televisão
(Walczak, 2005). Nenhum canal é mais personalizado ou mais ajustável do que o
telemóvel. É o dispositivo de comunicação e informação de bolso que cada vez mais
cidadãos transportam consigo e levam para todo o lado. A maioria dos telemóveis tem
apenas um utilizador, o que o transforma num meio altamente personalizado (Guy,
2005). Contrariamente ao que sucede com os PC, os televisores e a larga maioria dos
outros equipamentos electrónicos, os telemóveis permitem a personalização,
possibilitando a escolha de diferentes cores, toques, imagens de ecrã, etc. (Geser, 2004).
Existe hoje um consenso alargado de que os telefones portáteis podem substituir PC
fixos ou portáteis até um nível considerável, já que são, actualmente, dispositivos
multimédia capazes de transportar voz, mensagens de texto, fotografias, música,
programas de software ou qualquer outra funcionalidade codificada em formato digital.
Mais do que isso, estas funcionalidades multimédia são compatíveis com formato, peso,
consumo e preço reduzidos, e ainda dispõem de um interface muito mais simples e fácil
17
de usar, o que torna possível a sua utilização por crianças de tenra idade, pessoas
analfabetas, portadores de deficiência e outros segmentos de população info-excluída,
incapazes de lidar com sistemas operativos como o MS Office ou o W2K (Geser, 2004).
Ao contrário do que sucede com a Internet, onde os EUA sempre dominaram as
tendências tecnológicas tanto no desenvolvimento como na adesão, as comunicações
móveis contemporâneas têm sido alavancadas principalmente por países asiáticos e
europeus, contribuindo, assim, para mudar a geopolítica do desenvolvimento das
tecnologias da informação (Geser, 2004). Este processo disruptivo relativamente ao
status quo, combinado com a diversidade na implementação das infra-estruturas de
comunicação móvel, significa que a tecnologia sem fios tem sido vista desde a sua
génese como estando localizada em contextos sociais, culturais e históricos específicos
em vez de traduzir uma solução universal de cruzamento cultural, como a Internet é
muitas vezes apresentada (Ito, M., 2005). Na perspectiva teórica de Manuel Castells só
à Internet é atribuído o estatuto de mega-inovação. Porém, em comparação com os PC e
as tecnologias da net, os telemóveis são hoje usados pela principal fatia da população
mundial, gerando fortes impactos na vida social (Geser, 2004). Um estudo empírico
realizado pela International Telecommunication Union (ITU), demonstra claramente o
contributo dado pelo telemóvel para superar o tradicional fosso no que concerne ao uso
do telefone entre países mais desenvolvidos e menos desenvolvidos. Este estudo revelou
que, no ano de 2001, em cerca de 100 países, muitos dos quais africanos, havia mais
telemóveis do que telefones fixos em serviço e que a tecnologia móvel é bem mais
eficaz do que a tecnologia dos computadores a conectar as populações mais
desfavorecidas ao mundo da informação digitalviii. África proporciona, a este nível, um
interessante case study. Por um lado, os africanos podem adquirir um telemóvel muito
mais facilmente e por muito menos dinheiro do que um computador (Hare, 2005).
Segundo dados de 2004, havia no continente africano aproximadamente 81 milhões de
utilizadores de telemóveis contra 12 milhões de utilizadores de Internet. Na realidade,
os telemóveis têm hoje um enorme impacto em África, sendo responsáveis por toda
uma nova cultura que está a emergir entre os jovens africanos e que se manifesta na
forma como se organizam, como comunicam e como desenvolvem relacionamentos.
Para muitos jovens africanos o SMS tornou-se uma moda e constitui hoje a principal
forma de comunicação, porque é fácil e rápida. Também os agricultores em África usam
o telemóvel como ferramenta de trabalho para se manterem informados sobre as suas
18
colheitas e tomarem decisões com base na informação trocada sobre os melhores
mercados para vender os seus produtos (Busk, 2005). Para os pobres de países como
Marrocos, que vivem nas cidades e que ganham a vida a fazer biscates, o telemóvel
tornou-se o meio que lhes permitiu organizarem-se em rede e criar uma nova forma de
trabalho, que chega a resultar num rendimento 200 vezes superior ao que obtinham
anteriormente (Ilahiane, 2004). Um dos principais impactos do telemóvel em termos
sociais é a sua capacidade de abranger uma parte significativa da população iletrada dos
países em vias de desenvolvimento do hemisfério sul, que nunca teriam os meios para
comprar um computador e que nem sequer estavam cobertos pela rede tradicional de
telefone fixo (Geser, 2004). Exemplo disso mesmo é o facto de o telemóvel ter sido
introduzido nas aldeias de países pobres como a Suazilândia, a Somália ou o
Bangladesh onde não existia telefone fixo e em muito casos nem sequer rede eléctrica
(Plant, 2002). Outro bom exemplo do forte impacto social das tecnologias móveis está
na importância que estas adquiriram para as populações deslocadas ou para os jovens
que tiveram que abandonar as suas aldeias em busca de trabalho nas cidades,
constituindo o telemóvel o único meio de contacto com os seus familiares que ficaram
nas aldeias ou que se encontram espalhados por outros lugares do mundo. Noutros
casos, o telemóvel desempenhou um papel emancipador, permitindo, por exemplo, aos
jovens manterem relações com amigos que os pais desaprovam, e, mormente, no caso
de países árabes como o Afeganistão e o Paquistão, os jovens muçulmanos, rapazes e
raparigas, que nunca seriam autorizados a estarem juntos sozinhos, poderem participar
em redes virtuais de socialização através dos seus telemóveis (Rheingold, 2002).
Uma coisa é certa, historicamente, a tecnologia sem fios esteve sempre mais avançada
fora do que dentro dos EUA. Isto ficou a dever-se a razões não tecnológicas mas
culturais. Em muitos países o primeiro telefone é o telemóvel. Nos EUA durante muito
tempo não foi assim, as pessoas em primeiro lugar tinham telefones fixos em casa e no
trabalho e depois tinham telemóveis. Os telemóveis foram durante muito tempo
considerados acessórios nos EUA, sendo utilizados como segundo ou mesmo terceiro
dispositivo e não como a primeira opção de comunicação como acontece em muitos
outros países. (Venkatesh, 2005). Nos EUA a tecnologia móvel está tradicionalmente
mais associada às comunicações de voz. Noutros países, como por exemplo o Japão, ela
está mais associada à transferência de informação. Há ainda países onde a tecnologia
móvel é vista como uma combinação de chamadas de voz e de transferência de dados.
19
Nos EUA essa mudança está a ocorrer gradualmente, mas muitos americanos ainda
tendem a usar os seus telemóveis, fundamentalmente, para falar em vez de os utilizarem
como dispositivos de informação. Para recolher informação os americanos continuam a
preferir o acesso à Internet através do PC (Hare, 2005). Há ainda quem atribua a menor
utilização do telemóvel nos EUA ao facto de a maioria dos americanos se deslocar em
carros por si conduzidos, diminuindo assim o potencial da utilização do telemóvel
durante as horas de viagem. Enquanto os europeus e mesmo os japoneses usam mais
frequentemente transportes públicos – autocarros e comboios – para se deslocarem.
Especialmente quando utilizam os comboios, os indivíduos estão desocupados e, por
isso, motivados para usar várias tecnologias de forma a ocupar o tempo. Neste contexto,
a utilização do telemóvel veio permitir encontrar soluções para os tempos mortos e para
os espaços de transição, possibilitando, assim, fugir à monotonia. Fazer texting parece
ser uma das principais actividades dos passageiros frequentes em Londres enquanto
esperam nos terminais de transportes (Geser, 2004). O mesmo sucede no Japão. O facto
de a maioria dos japoneses usar transportes públicos permite-lhes dedicar-se ao texting
durante horas enquanto estão em viagem. Nos comboios, no Japão, as pessoas não
podem falar, por isso, dedicam-se ao texting. Nos EUA as pessoas passam mais tempo
sentadas nos carros, no escritório ou em casa. Como nos carros não se pode escrever
mensagens e no escritório e em casa há computadores, não há, portanto, tempo para
“brincar” com dispositivos móveis. Ou por outras palavras: não há contexto. As pessoas
nos EUA estão habituadas aos computadores – onde podem ter uma vida real e uma
vida virtual. A utilização do computador de forma ubíqua nos EUA está focada, na
maioria das vezes, em fazer portais no ciberespaço em vez de trazer a rede para a vida
real (Ito, 2005).
No Japão, por sua vez, as mensagens de texto são a funcionalidade mais usada pelos
utilizadores de telemóveis, sobretudo entre os jovens. No Japão há mesmo um conceito
– ketai – que traduz as mudanças comportamentais que o uso das tecnologias móveis
introduziu no dia-a-dia da vida dos jovens nipónicos. O ketai é um novo paradigma das
comunicações móveis caldeado pela cultura de rua. Os japoneses olham para o
telemóvel como um dispositivo orientado para os negócios que acabou “sequestrado” no
final da década de 90 por jovens consumidores de cultura pop, que o utilizam numa
lógica de passatempo (nagara), simultaneamente coabitando nos mundos online e
físico, como uma “máquina em território anti-ubíquo” (Fujimoto, 2003). O ketai não
20
corresponde tanto a uma nova capacidade técnica ou à ideia de liberdade de movimento,
mas antes a uma confortável e íntima conexão “tecnosocial”, um dispositivo pessoal que
suporta comunicações que são uma presença leve, constante e mundana. Mais do que
algo intrinsecamente disjuntivo, o ketai sugere uma visão perfeitamente integrada na
conjuntura e nas identidades do dia-a-dia. O uso do ketai Internet e texting, bem como
um certo fetichismo no uso de dispositivos móveis fez o Japão distinguir-se na arena
transnacional (Ito, 2005). O Japão é, aliás, o país do mundo onde os avanços no domínio
das tecnologias móveis chegaram mais longe. O Japão dispõe já de tecnologia 4G, o que
permite entre outras coisas, fazer o download integral de filmes para o telemóvel e uma
vez feito o download desses filmes gravá-los para o cartão de memória do telemóvel e
depois retirá-lo e colocá-lo no PC ou no aparelho de TV e assistir aos filmes em casa.
Como é isto possível? A resposta é simples: interoperabilidade. A interoperabilidade é
assegurada através da utilização de um pequeno cartão de memória ou do Bluetooth
(Busk, 2005).
Acontece que os avanços tecnológicos não se apresentam em todos os países como
determinantes para a disseminação do uso dos telemóveis. Como vimos no caso de
África os telemóveis afirmam-se em ambientes tecnológicos paupérrimos. O mesmo
acontece em contextos tecnofóbicos, como é o caso de Itália, onde computadores e
outras novas tecnologias têm um posicionamento modesto e, especialmente, na
Escandinávia onde as pessoas são tradicionalmente introvertidas e pouco conversadoras
e onde o telemóvel é altamente valorizado (Geser, 2004). Tal como sucede com outras
tecnologias de uso frequente que deixam em aberto mais do que fixam o leque de
opções, o telemóvel também não pode ser visto à priori como um factor de causa/efeito,
mas antes como um instrumento que proporciona um conjunto de capacidades
funcionais específicas que podem ser mais, menos ou nada exploradas em função de
variadíssimas condições socioculturais e psicológicas (Geser, 2004). Uma investigação
desenvolvida com cidadãos de países tão diferentes como a Finlândia, Israel, Itália,
Coreia do Sul, EUA, Holanda e Bulgária permitiu identificar semelhanças nos hábitos
de comunicação associados à utilização do telemóvel (Katz e Aakhus, 2002). Os autores
deste estudo concluíram que apesar das grandes diferenças culturais, a utilização e
aculturação do telemóvel começa a tender para a uniformização, reflectindo-se em
diversos contextos sociais, nomeadamente ao nível da participação em redes sociais,
conduzindo a mudanças nos hábitos tradicionais e à adaptação e integração das
21
comunicações móveis nas práticas da vida quotidiana. Em todos esses países o
telemóvel é usado num conjunto de práticas e comportamentos sociais, que vão desde a
marcação de encontros entre jovens até à distribuição de tarefas domésticas e à gestão
de compromissos no seio das famílias. Independentemente da cultura, quando as
pessoas interagem com os seus dispositivos tecnológicos de comunicação pessoal eles
tendem a estandardizar a infra-estrutura e a gravitar em direcção a gostos e
características universais (Katz e Aakhus, 2002).
Apesar de conhecido por ser um povo reservado e pouco extrovertido, a verdade é que
os finlandeses aderiram em massa ao telemóvel. Efectivamente, a Finlândia teve, desde
sempre, uma das mais altas taxas de penetração per capita de telemóveis do mundo.
Esta taxa elevada da penetração foi influenciada pela presença da Nokia, um líder
mundial na indústria das telecomunicações. Cada criança na Finlândia aprende, desde as
cadeiras da escola primária, que há um nome – Nokia – que é uma espécie de “tesouro”
nacional e que é de tal forma importante que afecta a vida de todos os finlandeses. Os
finlandeses inventaram mesmo uma palavra para descrever este fenómeno: nokialização
(Puro, 2002). Israel está também entre os países do mundo onde os telemóveis têm
maior adesão. Mas aqui, por razões bem diferentes das da Finlândia. Os israelitas são
conhecidos por serem grandes conversadores, muito extrovertidos e terem um
temperamento audacioso (chutzpadic), características consideradas determinantes para
explicar a sua forte propensão para a conexão móvel (Schejter e Cohen, 2002). Um
pouco à semelhança do que sucede na Finlândia, também na Coreia do Sul o ambiente
tecnológico ajuda a explicar a adesão e o entusiasmo motivados pelo telemóvel. Por um
lado, marcas coreanas como a Samsung e a LG testam os seus produtos no seu pequeno
mercado interno antes de os exportarem para o resto do mundo. Na Coreia do Sul 70%
dos telemóveis têm MP3 e quase todos têm câmara e muitos têm mesmo câmara de sete
megapixéis. Por outro lado, os coreanos estão habituados a ligações de Internet muito
mais rápidas nas suas casas e nos seus empregos do que nos EUA ou na Europa. As
suas ligações sem fios são também muito rápidas. (Hare, 2005). Mas há outra razão
tecnológica ad contrarium que ajuda a explicar o facto de, desde muito cedo, ter havido
uma apropriação social da tecnologia móvel na Coreia do Sul. A razão é simples: a
Coreia tem uma deficiente rede analógica e uma escassez de linhas telefónicas. Assim,
as comunicações móveis vieram colmatar uma lacuna tecnológica e, em grande medida,
ultrapassar os efeitos desse problema (Kim, 2002).
22
A Holanda é outro país que regista uma grande difusão e adesão da tecnologia móvel e
de outras tecnologias de comunicação. Segundo alguns autores, a explicação para este
fenómeno pode estar no facto de os cidadãos holandeses estarem progressivamente a
tornar-se “tecnologicamente inteligentes”. Isto é, os holandeses tendem a revelar baixos
níveis de ansiedade na utilização das tecnologias digitais. Este fenómeno pode estar
associado à circunstância de no sistema educativo holandês existir uma proliferação de
tecnologia nas salas de aula e as crianças terem a oportunidade de adquirir uma grande
familiaridade com estas ferramentas desde muito cedo. No caso holandês, as forças
socioeconómicas e políticas influenciaram a adopção e o uso do telemóvel (Beckers,
Mante e Schmidt, 2003). Também na Rússia a adopção e o uso do telemóvel foi
influenciado pelas forças socioeconómicas e políticas. As mudanças sociais e
económicas profundas operadas na sociedade russa resultaram numa revolução nas
tecnologias de comunicação móvel iniciada em meados dos anos 90. Dos anos 60 aos
anos 80, a Rússia esteve excluída da esfera da tecnologia de informação. A Perestroika
e a Glasnost, que conduziram à abertura democrática iniciada por Gorbachev nas
décadas de 80 e início de 90 abriram as portas para a disseminação de tecnologias de
comunicação personalizada, tais como a Internet e o telemóvel (Vershinskaya, 2003).
Não surpreende, por isso, que o colapso da União Soviética tenha também afectado a
paisagem tecnológica de outras nações. Um dos seus ex-satélites, a Bulgária, tem uma
história recente de autonomia económica, cultural e tecnológica. Até há bem pouco
tempo, possuir um telemóvel não era uma prioridade para muitos búlgaros que tinham
de acudir a necessidades básicas, esforçando-se para sobreviver num país relativamente
pobre. Mais recentemente, a adesão ao telemóvel registou uma verdadeira explosão na
Bulgária, sendo hoje um dos países com uma das maiores taxas de penetração móvel do
mundoix. Graças ao seu desenvolvimento cultural e económico, o telemóvel
transformou-se num importante símbolo de prosperidade na Bulgária (Varbanov, 2002).
Tal como a Rússia e a Bulgária, também a China tem vindo a submeter-se a mudanças
políticas e económicas profundas desde finais do Século XX, que estimularam a
adopção e o uso do telemóvel. A privatização crescente do mercado provocou um
incremento da esfera pessoal e da liberdade de escolha. A par disso, os chineses têm
uma tradição do guanxiwang ou de redes pessoais. No passado os chineses confiaram
nestas redes para guardar bens e para se protegerem. Na nova economia de mercado, as
redes pessoais ajudam os chineses a conduzir mudanças sociais e económicas.
23
Impulsionados pelo processo de privatizações e pela tradição do guanxiwang, o
telemóvel transformou-se num artefacto da vida quotidiana ao assumir um conjunto de
implicações e significados que traduzem o enorme e complexo processo de
transformação socioeconómico que a China vive. Num estudo comparativo realizado
entre utilizadores de telemóveis chineses e americanos, conclui-se que os chineses
consideram ser aceitável receber chamadas de telemóvel dos patrões fora do horário de
trabalho. Enquanto, que a maioria dos americanos considera que as chamadas
profissionais fora do horário de trabalho são inaceitáveis e tendem a recusá-las. Por
outro lado, os chineses tendem a desligar os seus telemóveis apenas durante o sono,
enquanto os americanos os desligam em vários períodos do dia, nomeadamente quando
não necessitam de fazer chamadas ou enquanto as baterias estão a carregar. Foram,
ainda assim, identificadas algumas similitudes culturais. Tanto chineses como
americanos silenciam os seus telemóveis em determinados lugares públicos, tais como
teatros, salas de concerto, igrejas e em algumas reuniões (Caporael e Xie, 2003).
Já entre os países europeus, encontram-se diferenças significativas no grau como o
telemóvel é percepcionado pelos diferentes povos como meio de facilitação dos
relacionamentos sociais. Estudos realizados revelam que os italianos registam os níveis
mais elevados, seguidos dos franceses, ingleses, espanhóis e alemães respectivamente.
Em comparação com outros povos europeus, os italianos, a par dos franceses, tendem a
adoptar mais o telemóvel para razões pessoais do que por razões profissionais
(Fortunati, 2002). Num outro estudo, que incidiu sobre cidadãos destes mesmos países,
foram identificadas similitudes no uso do telemóvel. Os utilizadores afirmaram ser
pouco provável que o seu telemóvel esteja ligado enquanto assistem a eventos públicos
tais como uma exposição ou um espectáculo e ser mais provável que isso aconteça
enquanto viajam de carro (Haddon, 1998).
Finalmente, o caso português. Em 2007, um grupo de investigadores do Observatório da
Comunicação – Obercom, publicou um estudo denominado “Portugal Móvel -
Utilização do Telemóvel e Transformação da Vida Social”, que analisa as implicações
sociais decorrentes do uso do telemóvel na sociedade portuguesa (Cardoso, Gomes,
Espanha e Araújo, 2007). Este estudo aponta para conclusões que revelam similitudes
com tendências que já foram aqui anteriormente identificadas em outros países,
particularmente no contexto europeu. Assim, o telemóvel começou por constituir em
Portugal uma prática comum no seio da vida profissional, mas uma rápida massificação
24
levou à sua apropriação pelos demais grupos sociais e à generalização do seu uso no
seio da vida particular e familiar. Segundo os autores deste estudo, a apropriação social
do telemóvel deu lugar a uma nova forma de gestão da vida social e familiar que
designam por “micro-coordenação do quotidiano”. De acordo com os resultados deste
estudo, além de um facilitador de comunicação o telemóvel constitui para mais de 2/3
dos utilizadores (68%) um instrumento que permite uma gestão mais eficaz das tarefas
do dia-a-dia nos contextos pessoal e familiar. O estudo conclui, igualmente, que o
telemóvel é utilizado com frequência para saber como estão os amigos e os familiares
(60,7%), para saber onde estão os filhos, pais ou familiares do agregado doméstico
(59%), perceber onde se encontram outras pessoas da sua família (53,5%), para
combinar encontros (45,4%) ou simplesmente para conversar sem assunto concreto com
amigos, familiares e conhecidos (44,6%). Já no que respeita à utilização do telemóvel
em lugares públicos os resultados acusam enormes variações em função dos diferentes
contextos. Assim, 63,9% dos utilizadores desliga ou coloca o telemóvel em silêncio em
locais fúnebres, 61,7% em celebrações religiosas em igrejas e 48,3% no cinema.
Enquanto noutro tipo de locais mais informais a utilização do telemóvel é encarada pela
esmagadora maioria como uma prática normal e apenas 6,4% sente necessidade de
desligar ou tirar o som ao telefone em restaurantes e 7,6% em transportes públicos. Por
outro lado, o uso do telemóvel como mediador das relações afectivas e amorosas
assume particular expressão, já que 56,1% dos utilizadores confessa usar o telemóvel
para esse fim, com especial incidência para os jovens entre os 18 e os 24 anos, enquanto
apenas 16,8% dos utilizadores afirma nunca o ter usado com esse propósito. O estudo
conclui ainda que os mais jovens apropriaram o telemóvel no seu quotidiano e sentem a
necessidade de se espelharem nele, personalizando-o com fotografias, protectores de
ecrã ou toques. Os jovens são também o grupo mais propenso a experimentar novas
potencialidades, funcionalidades e serviços, especialmente de entretenimento e com
baixo custo. Já no contexto profissional, o estudo conclui que o uso do telemóvel criou
condições para o desenvolvimento de novas dinâmicas de trabalho e de organização da
vida laboral.
Portugal é hoje um país que ocupa uma sólida posição no “pelotão da frente” no
domínio da difusão e massificação da tecnologia móvel em termos mundiais,
contrariando, assim, o proverbial atraso tecnológico que caracterizou o país até finais do
século passado. Até há pouco mais de uma década, Portugal estava praticamente virgem
25
quanto à sociedade da informação. Durante muitos anos, Portugal registou uma das
piores taxas de penetração de telecomunicações da Europa, chegando a prever-se que
seria necessário mais de um século para que pudesse atingir os níveis de
desenvolvimento de alguns dos países europeus mais avançados, tendo em conta que as
telecomunicações exigiam infra-estruturas físicas que implicavam investimentos
pesados e retornos morosos (Coelho, 2007). De repente, com o advento das tecnologias
móveis esta realidade altera-se radicalmente e Portugal passa, em pouco anos, da cauda
para a dianteira dos indicadores mundiais de comunicações móveis. O facto de os
portugueses terem beneficiado de um contexto tecnológico muito favorável pode ajudar
a explicar o sucesso que este meio alcançou. Portugal foi dos primeiros países a lançar o
serviço GSM, foi também dos primeiros a lançar o serviço UMTS, foi o primeiro país a
lançar a assinatura através de cartões pré-pagos, esteve ainda na liderança do
lançamento de opções tecnológicas importantes para uma melhor utilização dos
serviços, como seja o HSPDA. Tendo disponível a tecnologia e os serviços mais
avançados, os portugueses têm sido muito lestos na sua utilização. Segundo dados da
ANACOMx, Portugal registou no final do segundo trimestre de 2008, 14,3 milhões de
assinantes, o que corresponde a uma taxa de penetração superior a 140%. Acresce,
ainda, que os cartões pós-pagos têm vindo a registar um acelerando crescimento desde
2007, sendo que no espaço de 1 ano foram contabilizados mais 936 mil cartões pós-
pagos. A assinatura pós-paga corresponde já a cerca de 25% do total de assinantes. Esta
evolução estará associada, entre outros factores, à adesão dos assinantes de serviços de
dados baseados no UMTS/3G que, geralmente, implicam o pagamento de uma
mensalidade. Também os cartões pré-pagos têm vindo a registar um acrescimento
acentuado no último ano, representando agora 75% do total de assinantes. Esta evolução
deve-se, sobretudo, ao lançamento de uma nova oferta que permite comunicações
gratuitas entre aderentes. Quanto ao número de utilizadores com acesso aos serviços 3G
atingiu os 3,7 milhões de assinantes em Portugal, registando um crescimento
verdadeiramente explosivo, mais de 80% no último ano. O que significa que hoje, 35
em cada 100 portugueses têm acesso a serviços 3G, quase o dobro da média da União
Europeia, figurando Portugal no segundo lugar deste ranking, apenas superado pela
Itália. Também as mensagens escritas têm vindo a registar um crescimento sustentado,
sendo que o número médio de mensagens enviadas por utilizador é hoje de 137 por mês,
o que corresponde a uma média de 4 mensagens por dia. Este crescimento explica-se
26
pela adesão de muitos utilizadores a tarifários específicos que incluem um elevado
número de mensagens grátis. A evolução mais repentina tem vindo a registar-se ao nível
dos MMS. No último ano, o número de mensagens multimédia enviadas cresceu 75%.
No entanto, e apesar deste crescimento em termos absolutos, o número de mensagens
multimédia enviadas mantém-se, em termos relativos, a um nível muito modesto,
situando-se em 1 MMS por trimestre por utilizador. Sublinhe-se, que este serviço está
condicionado quer pelos equipamentos disponíveis quer pelo tarifário, pelo que a sua
utilização ainda não é muito frequente. Quanto às vídeochamadas, no último ano
registaram um crescimento de mais de 50%. Só no segundo trimestre de 2008, tinham
sido feitas em Portugal 1,2 milhões de videochamadas, tendo o tempo de conversação
associado a estas vídeochamadas aumentado mais de 150% relativamente ao trimestre
anterior. Verifica-se, assim, uma “retoma” na utilização desta funcionalidade, apesar de
este serviço só estar disponível para quem dispõe de equipamentos compatíveis e do seu
tarifário continuar pouco atractivo.
Ao finalizar este capítulo, sabemos que o verdadeiro poder do telemóvel decorre da sua
extraordinária capacidade de adaptação aos mais diversos contextos, mesmo os mais
adversos. Como pudemos verificar nem sempre os países mais ricos e tecnologicamente
avançados são aqueles onde as comunicações móveis estão mais massificadas e por
outro lado, mesmo em regiões remotas de países pobres, onde não há luz eléctrica, há
telemóveis. É precisamente o carácter ubíquo da tecnologia móvel que a torna um
instrumento de socialização tão poderoso e, por isso, tão apetecível para aqueles que
querem estar conectados com o mundo real. Esse é o papel dos políticos. Por isso, no
próximo capítulo vamos analisar a forma como as tecnologias móveis podem tornar
mais eficaz a ligação entre cidadãos e políticos.
27
Capítulo III
As comunicações móveis na acção política
I. Instrumentos, serviços e fenómenos móveis globais
Como vimos no Capítulo I, as relações entre os políticos e os media têm vindo a sofrer
profundas transformações em função das mudanças impostas pelo advento dos novos
media, especialmente em consequência da fortíssima apropriação social das
comunicações móveis em todo o mundo, como analisámos no Capítulo II. Não é, assim,
de estranhar, que os políticos integrem cada vez mais nas suas estratégias políticas e nas
suas campanhas, novas tecnologias de comunicação, em particular, instrumentos de
tecnologia móvel, enquanto meio privilegiado de contacto com os cidadãos/eleitores.
Procuraremos de seguida responder a um conjunto de questões relativamente à forma
como as tecnologias móveis se têm vindo a aplicar ou poderão vir a ser aplicadas na
acção política concreta. Nesse sentido, passamos a identificar e a analisar alguns
instrumentos, serviços e fenómenos móveis e as consequências da sua utilização no
campo da política (no Anexos I descrevemos detalhadamente exemplos ocorridos um
pouco por todo o mundo).
O Short Message Service, mais conhecido por SMS, é um protocolo de comunicações
que permite o intercâmbio de mensagens curtas de texto entre utilizadores de
comunicações móveis. A tecnologia SMS foi decisiva para o desenvolvimento e o
crescimento das mensagens de texto, sendo hoje a aplicação de dados mais usada no
mundo, com 2.4 biliões de utilizadores, o que corresponde a 74% do total de assinantes
de telemóvel do planetaxi. O SMS é, ainda, o meio mais personalizado, permitindo fazer
chegar mensagens altamente focadas e alertas de acção rápida em qualquer sítio ou a
qualquer hora. Não obstante ter tido origem nos EUA, o facto interessante é que foi
internacionalmente que o uso do SMS em acções políticas atingiu grande sucesso. A
utilização da tecnologia SMS foi pela primeira vez experimentada no campo da política,
em 1999, pelas organizações anti-globalização para coordenar os manifestantes que
protestavam contra a reunião da Organização Mundial do Comércio (OMC), que
decorria na cidade de Seatlle, nos EUA. Desde então, grupos políticos informais e
organizações políticas formais em todo o mundo nunca mais pararam de usar na acção
28
política esta ferramenta da tecnologia móvel. Apesar de se tratar de uma tecnologia
recente, o SMS transformou-se rapidamente num fenómeno global. Desde há algum
tempo que o SMS tem configurado e reconfigurado o espaço público em todo o mundo,
tendo-se transformado num importante canal de influência e mobilização social. Em
muitos países do mundo – Filipinas, Coreia do Sul, Hungria, Inglaterra, Espanha,
Ucrânia, Canadá, Índia, África do Sul, Kuwait, Indonésia, Itália, Tailândia, Quénia, Sri
Lanka; Rússia, China, Zimbabué, Nepal, Austrália, Etiópia, Iraque, França, entre muitos
outros – o SMS tem vindo a constituir uma importante arma política, muitas vezes
determinante no desfecho de processos eleitorais. Por exemplo, nas Filipinas, em 2001,
o SMS foi o grande veículo de mobilização do chamado People Power II, que levou à
queda do ex-Presidente Joseph Estrada, no que foi considerado como sendo a primeira
revolução não-violenta da tecnologia móvel a conseguir derrubar um alto responsável
político. Mas a força do SMS não se manifesta apenas na acção contestatária, podendo
ser também um mecanismo de grande eficácia usado a favor de quem está no poder. Na
Coreia do Sul, por exemplo, foi o SMS que salvou o Presidente Roh Moo Hyun da
derrota, quando todas as sondagens a vaticinavam, graças à mobilização de muitos
votantes de última hora nas eleições de 2002, convencidos pelo apelo directo que lhes
chegou via SMS. (ver Anexo I – 1xii)
O poder do SMS estende-se a todas as latitudes do planeta e tem impacto sobre a vida
de milhões e milhões de cidadãos. É importante, no entanto, sublinhar que não são as
mensagens de texto que, por si só, geram mobilizações de massas. O SMS é um
instrumento que, em conjugação com outros meios – jornais, rádio, televisão, Internet –
impele à mobilização e à participação das pessoas. A vantagem do telemóvel e em
particular do SMS é que permite pôr as pessoas a contactar umas com as outras de
forma pessoal, directa e imediata (Rafael, 2005). Qualquer software construído para a
tecnologia móvel – incluindo o SMS – é e será social pela sua própria natureza e é isso
que o torna tão poderoso (Oberman, 2005). Mesmo se comparado com as chamadas de
voz, o SMS é o instrumento móvel com maior disponibilidade no mercado nos dias de
hoje. Significa isto que a mensagem de texto é o mínimo denominador comum. É por
isso que as mensagens de texto continuam a ser, amplamente, a tecnologia móvel mais
usada no campo da política. (Manis, 2005). E não é por acaso. Presentemente as
mensagens de texto têm um rácio de leitura na ordem dos 95%. Por isso, qualquer rácio
de resposta é também muito alto (Mehta, 2005). No espaço político é muito importante
29
comunicar de forma responsável. Um aspecto fundamental a ter em conta é que antes de
contactar alguém via SMS é preciso obter a sua permissão. Isso pode ser feito pela
própria pessoa, enviando um SMS para um short code da campanha solicitando
informação, ou pode ser feito com recurso a outros meios, como sejam, a Internet, o
direct-mail, ou o contacto pessoal. (Walczak, 2005). Outro aspecto importante é que a
qualquer momento, as pessoas podem deixar de querer receber mensagens, bastando,
para tanto, que enviem um SMS com a palavra “Stop”, sendo automaticamente retirados
do serviço. Bombardear as pessoas com mensagens tende a aborrecê-las e a tornar o
meio menos eficaz. Ainda assim, quando se pretende enviar mensagens em massa
devem ser utilizadas ferramentas de web, que permitem enviar mensagens para
telemóveis da mesma forma que enviam e-mails. No entanto, é preciso ter em conta que
o SMS não é o e-mail. O SMS dispõe apenas de 160 caracteres. Boas mensagens
transportam informação concisa e útil. Receber uma mensagem de uma fonte fidedigna
com informação útil pode ter um impacto muito positivo (Churchill, 2005). Mensagens
enviadas por amigos são muito mais susceptíveis de serem lidas porque se baseiam em
afectos, isto é, baseiam-se em coisas que as pessoas partilham e que querem ler. A
melhor forma de construir uma comunidade em torno de um candidato é fazer com que
os seus apoiantes se sintam verdadeiramente integrados (Greenville, 2005). Finalmente,
outras das grandes vantagens do SMS reside no facto de quando uma mensagem de
texto não é capaz de chegar a determinado telemóvel, ela fica em espera e continua a
tentar passar até conseguir. O mesmo não se passa com os e-mails ou com as chamadas
de voz. Em alturas de calamidade e de redes de comunicação bloqueadas, a informação
transmitida através de SMS pode ser recebida. Para citar dois exemplos: durante os
ataques bombistas de Londres e durante o 11 de Setembro, as redes de telemóvel
bloquearam e muitas pessoas ficaram sem conseguir fazer chamadas de voz. Só as
mensagens de texto funcionaram. Isto só foi possível porque as mensagens de texto
usam uma parte diferente da rede (Venkatesh, 2005).
Uma das aplicações mais vantajosas para as organizações políticas que usam o SMS de
forma massificada no contacto com os seus públicos-alvo é o Common Short Code,
vulgarmente conhecido apenas por short code. Esta tecnologia permite a um utilizador
de telemóvel enviar uma mensagem de texto previamente definida para um certo
número de 5 dígitos, que regista esse utilizador para receber alertas, participar em
votações, receber mais informação sobre determinado assunto, ou fazer donativos. Por
30
exemplo, a mensagem pode ser o próprio nome do candidato, normalmente o seu
apelido (desde que não ultrapasse as cinco letras, por exemplo: SILVA) e um short code
(5 dígitos, exemplo: 33223) para o qual deve ser enviado um SMS com esse nome, no
sentido de obter mais informação. Quase sempre este tipo de instruções está disponível
na Internet no site do candidato. O que acontece depois desta operação depende muito
do que a organização ou a campanha política pretendam. Geralmente o que sucede é o
utilizador receber de volta um SMS com algum tipo de informação, nomeadamente o
endereço electrónico que lhe permite aceder directamente ao site do candidato ou a
outro site que disponha de informação sobre determinada questão política. O site da
Internet terá de ser um site WAP – Wireless Application Protocol – que possa ser
facilmente visualizado em qualquer telemóvel (Manis, 2005). O Common Short Code é
o equivalente móvel do web site URL (Mehta, 2005). Uma das funções mais exploradas
hoje em dia por esta tecnologia, principalmente nas campanhas políticas americanas, é a
recolha de fundos, já que o sistema legal nos EUA prevê a possibilidade de obtenção de
financiamentos individuais por esta via, o que implica a celebração prévia de acordos
entre as campanhas e os operadores móveis. (ver Anexo I – 2)
Outro tipo mensagem, disponível desde 2005, para terminais 2G e 3G é o Multimedia
Messaging Services, vulgarmente conhecido por MMS. Esta tecnologia permite o envio
de mensagens não apenas de texto, mas também de imagens, vídeo e áudio, através de
uma aplicação de partilha de ficheiros peer-to-peer (P2P) (Manis, 2005). Com o avanço
tecnológico as pessoas vão querer fazer muito mais do que ler. Com a tecnologia e as
capacidades cada vez mais avançadas que os novos equipamentos móveis disponíveis
no mercado estão a adquirir, quer em termos de texto e de áudio, mas também ao nível
visual, com a possibilidade de capturar imagens fotográficas e vídeo e proceder à sua
distribuição, o telemóvel está a transformar-se numa máquina de media móvel (Wark,
2005). Se aliarmos a isto o potencial de comunicação em cascata estamos perante um
instrumento político extremamente poderoso (Franco, 2006). Como está amplamente
demonstrado as imagens têm sobre as pessoas um impacto muito maior do que o texto
ou o áudio. Mesmo os vídeos amadores têm a capacidade de persuadir as pessoas
quando são criados ou enviados por um familiar ou amigo próximo. Por causa da sua
natureza ubíqua, o vídeo móvel introduz um elemento de imediatismo na mensagem
política – uma característica particularmente vantajosa quando se trata de angariar
fundos, convencer os indecisos, e garantir o voto no dia das eleições. Hoje é possível
31
através do recurso a esta tecnologia fazer chegar aos eleitores imagens de eventos em
tempo real ou em deferido – quer seja um comício, o depoimento de um candidato ou
um debate. (ver Anexo I – 3)
Um dos suportes que tem vindo a registar uma difusão crescente são os toques para
telemóveis, tendo-se transformado num instrumento extremamente popular,
particularmente entre os mais jovens, constituindo um dos mais usados elementos de
personalização dos telemóveis, a par dos protectores de ecrã. Nos últimos tempos, a
utilização de toques monofónicos, polifónicos ou reais, com conteúdos políticos tem
vindo a ser feita por grupos de cidadãos – muitas vezes surgindo de forma espontânea e
alastrando de forma viral via SMS, ou até mesmo por estruturas políticas formais,
principalmente em períodos de campanha eleitoral. A verdade é que os toques são hoje
um verdadeiro instrumento de divulgação e acção política (Franco, 2006). Inúmero são
os casos de campanhas políticas que recorrem a este instrumento, nomeadamente para
difundir slogans de campanha com fundos musicais ou mesmo hinos de campanha das
candidaturas, como sucede actualmente na campanha presidencial americana. Mas os
casos que até agora atingiram maiores repercussões sociais e políticas, partiram da
criação e difusão de toques tendo por base frases embaraçosas e polémicas envolvendo
políticos. (ver Anexo I – 4)
Outra das tecnologias a que cada vez mais as organizações políticas recorrem com o
objectivo de manterem os seus apoiantes a par de todas as novidades e actualizações das
suas actividades e campanhas é o Really Simple Syndication, vulgarmente designado por
RSS. Trata-se de uma tecnologia que permite aos utilizadores actualizar a informação
disponível sobre determinado tópico, de forma rápida e cómoda, não só na Internet, mas
também em equipamentos móveis através de agregadores específicos. Actualmente
existem diversos programas que permitem visualizar este formato num PDA,
permitindo não só aceder à informação a todo o momento em que exista ligação à
Internet, como visualizá-la sem estar on-line, o que evita custos (Franco, 2006). O RSS
é amplamente utilizado pela comunidade de blogues para partilhar últimas novidades,
designadamente multimédia. É um modelo de consumo que conduz a respostas mais
rápidas. O RSS tem a capacidade para distribuir conteúdos, comentários e conversações
em tempo real para dispositivos móveis. (Harper, 2005). Esta tecnologia tem grande
potencial de aplicação no campo da política. (Anexo I – 5)
32
Uma das funcionalidades tecnológicas que utiliza um Feed RSS é o Podcast. Trata-se,
em certa medida, de um RSS de segunda geração, que permite receber conteúdos
multimédia on-demand, nomeadamente em tempo real, de acontecimentos que estejam
ainda a decorrer. Bastará para tanto, enviar um SMS para um short code. É, no fundo,
uma forma de publicação de arquivos de media digital de áudio e vídeo, que permite aos
utilizadores acompanharem a sua actualização. Existe ainda a possibilidade de depois de
obter esses ficheiros de áudio ou vídeo eles poderem ser partilhados com outros
utilizadores, usando tecnologias de transmissão de dados de curta distância,
designadamente infra-vermelhos ou bluethooth, sem quaisquer custos adicionais
(Franco, 2006). Com isso, é possível o acompanhamento e/ou o download automático
do conteúdo de um Podcast. O podcasting, tal como o blogging, dá a cada pessoa uma
voz e cria uma nova forma de pessoas antes desconhecidas verem publicitadas as suas
ideias, opiniões e competências. Qualquer pessoa pode começar um blogue ou uma
emissão de podcasting praticamente sem custos. O blogging veio preencher uma lacuna
no discurso político e o podcast começa a desempenhar o mesmo tipo de papel. O
público quer e precisa de saber o que é que os seus representantes políticos fazem e
quais as suas posições sobre determinadas questões. O podcasting permite ao candidato
comunicar as ideias e os objectivos aos eleitores com a sua própria voz e imagem (Hemel, 2005). (ver Anexo I – 6)
Outro dos canais que começa neste momento a ser explorado é o moblog. Trata-se de
um blogue cujas postagens são mantidas ou produzidas por via de um dispositivo móvel
ou portátil, como um telemóvel ou um PDA. O blogue pode ser integralmente um
moblog ou um blogue normal com postagens moblog ocasionais (Franco, 2006). A
actividade política, apesar de ser, por si só, um acontecimento, é uma alavanca para um
conjunto de outros assuntos, eventos e acontecimentos que ocorrem todos os dias e que
o moblogging pode captar e difundir instantaneamente, independentemente do lugar
onde se esteja (Oberman, 2005). Com a aposta feita pelo mercado na massificação de
telemóveis apetrechados de câmaras e com acesso à Internet esta oportunidade está
rapidamente a alastrar ao mainstream. A tecnologia móvel permite o que nenhum outro
meio consegue: uma oportunidade para construir relações mais aprofundadas com uma
audiência e ter o benefício adicional de poder coordenar acções em grupo (Harper,
2005). As pessoas estão a aderir em números recorde a redes sociais e de media a partir
dos seus telemóveis. O incremento desta difusão tem originado a rápida ascensão de
33
blogues bem como a proliferação de telemóveis com acesso à Internet (Harper, 2005). O
moblogging pode, assim, ser uma fonte de inspiração para as campanhas políticas
devido às sugestões e abordagens enviadas pelos cidadãos, que são produto de uma
verdadeira inteligência conectiva (Franco, 2006). (ver Anexo I – 7)
É cada vez maior o número de novos equipamentos móveis disponíveis no mercado
munidos de sistemas de identificação e localização geográfica, como o GPS e o
Bluetooth. Acontece, que o facto de determinada aplicação tecnológica começar a ser
promovida no mercado não significa que ela tenha uma plêiade de utilizações
associadas. A localização geográfica é um bom exemplo disso. Apesar do suporte
tecnológico existir, a evolução das aplicações e serviços, bem como as questões de
privacidade e os modelos de negócio continuam a desencorajar o desenvolvimento de
soluções comerciais. O potencial do Bluetooth é muito prometedor, mas os riscos de
abusos têm desaconselhado o desenvolvimento de serviços a associados a esta
tecnologia. Não há dúvida que a informação relativa à localização específica dos
utilizadores é o Santo Graal dos serviços móveis (Udall, 2005). No entanto, há um
conjunto de fortes condicionantes relacionadas com o seu uso e comercialização e um
sem número de interrogações que se colocam. Quem deve deter a informação relativa à
localização associada a cada utilizador? Quem é que o utilizador deseja que tenha
acesso a essa informação? O utilizador pode querer que a sua localização seja conhecida
por determinada aplicação ou serviço e não por outras? E que papel está reservado em
todo o processo àqueles que efectivamente estão na posse dessa informação: os
operadores? (Udall, 2005). Demasiadas questões que continuam sem resposta e que,
pelo menos para já, afastam a possibilidade de uma exploração massificada das
funcionalidades de localização geográfica. Mas isso não significa que não comecem a
surgir algumas tentativas de intervir num domínio tão tentador quanto arriscado. (ver
Anexo I – 8)
Um dos instrumentos que as organizações políticas poderão vir a explorar num futuro
próximo, com já o indiciam algumas experiências recentes, é o Portal-Móvel. Trata-se
de um site móvel que funciona como um centro aglomerador e distribuidor de
conteúdos, com hiperligações para outros sites ou sub-sites e que é especialmente
concebido para ser acedido a partir de telemóveis (Franco, 2006). O acesso a qualquer
site da Internet é, em princípio, possível através de um telemóvel, mas raramente isso se
revela útil em termos práticos – a não ser que esse site seja especificamente ajustado
34
para ser apresentado em pequenos ecrãs. Daí a vantagem de uma campanha política ter
o seu próprio domínio móvel do tipo – http://movel.nomedodominio.mobi – onde
deverão ser inseridos conteúdos de campanha que possam ser visualizados num
equipamento com um ecrã de reduzidas dimensões, como sejam serviços de notícias
curtas, informação sobre eventos e ligações a outros sites, na Internet, bem como a
possibilidade de fazer o download de podcasts de áudio e vídeo, de toques e de efectuar
o registo para receber RSS móveis, SMS e MMS. Este é um instrumento fundamental
para manter um contacto permanente com os apoiantes, consolidando a ideia de que em
qualquer lugar ou momento se pode aceder e saber o que se passa na campanha (Franco,
2006). A campanha de Barack Obama, por exemplo, dispõe de um site móvel. (ver
Anexo I – 9)
Não nos podemos esquecer que o verdadeiro objectivo da aplicação dos instrumentos e
serviços móveis, designadamente no campo da política, é que eles possam gerar
reacções por parte do seu universo de utilizadores. Um dos mais extraordinários
fenómenos gerados pelo poder dos novos media, concretamente o SMS, os diversos
tipos de blogues e as redes sociais on-line, é o chamado Smart Mobs. Trata-se de uma
expressão celebrizada por Howard Rheingold, autor do livro Smart Mobs – The Next
Social Revolution, que define a capacidade das tecnologias de socialização
desencadearem a mobilização de multidões, que emergem enquanto expressão de uma
inteligência colectiva com o objectivo de conquistar novos espaços, liberdades e
condições de vida. Sempre que as novas ferramentas de comunicação móvel agregam
ferramentas de redes sociais, o conhecimento partilhado gera um potencial de acção
através de uma massa crítica conectada e participante (Freire, 2008)xiii. As pessoas auto-
organizam-se ao nível das bases sem receberem instruções de nenhuma instância
central, propagando a mensagem a sectores independentes da população, tornando-os
activos e dando-lhes a oportunidade de intervirem. O SMS e a tecnologia móvel têm a
capacidade de alcançar e motivar as pessoas que cada partido precisa de convencer e
mobilizá-las de forma a tornar a campanha bem sucedida. (Rheingold, 2005). (ver
Anexo I – 10)
Acontece, que toda esta descrição não ficaria completa se não nos referíssemos a um
dos métodos de contacto com os eleitores mais antigos da política americana e que nos
últimos anos tem vindo a sofrer profundas alterações graças à introdução das
tecnologias móveis. Trata-se do Voter Relationship Management, mais conhecido por
35
VRM. O VRM é um sistema de marketing eleitoral, baseado em métodos de gestão,
concebido para enviar mensagens especialmente dirigidas a segmentos específicos de
eleitores e a estabelecer com eles uma relação directa. Este método é particularmente
útil para organizar campanhas eleitorais, construir activas bases de apoio, angariar
fundos, fomentar a participação democrática e conquistar novos eleitores (Churchill,
2005; Shirky, 2005, Kewley, 2005). Por exemplo, se determinada área geográfica for
considerada critica para uma eleição, um grupo de voluntários dirige-se para o terreno
para desenvolver acções porta-a-porta, com o objectivo de obter informação precisa
sobre o máximo de eleitores, designadamente: a identificação partidária de cada um dos
membros do agregado familiar; a probabilidade de irem votar; o número do telemóvel e
o endereço de e-mail e qual o tipo de contacto que preferem; e no caso estarem
indecisos, quais as questões que consideram mais importantes e que podem determinar
em que candidato vão votar (Churchill, 2005). Assim, é possível através deste sistema
direccionar a mensagem certa a cada segmento desse eleitorado, investindo mais nos
eleitores que se sabe que é necessário fidelizar ou conquistar (Shirky, 2005). Estas bases
de dados revelam-se ainda fundamentais para o processo que nos países anglo-
saxónicos é designado por Get Out the Vote – GOTV. Isto é, combater o
abstencionismo e garantir que os apoiantes de cada candidato ou partido efectivamente
votem no dia da eleição. Na véspera e no próprio dia da votação são enviados alertas e
SMS com informação útil, nomeadamente informação personalizada fazendo referência
às motivações antes identificadas para cada eleitor e dando conta da importância que
aquela eleição tem para a resolução dessas questões (Churchill, 2005). Os processos de
recolha e gestão dessa informação têm evoluído consideravelmente ao longo dos anos.
Particularmente na última década, têm ocorrido tremendas mudanças ao nível do
trabalho de campo. A tecnologia móvel tem desempenhado um papel muito importante,
tendo permitido dar um enorme salto em frente. Com o desenvolvimento dos
computadores, da Internet e das tecnologias móveis, através de dispositivos como o
PDA, foi possível fazer com que o VRM começasse a transitar do formato de papel para
o formato digital. (ver Anexo I – 11)
36
II. De Howard Dean a Barack Obama: as experiências móveis nos EUA
O facto de a penetração móvel nos EUA, como pudemos analisar no Capítulo II, ser
inferior à de muitos países dos continentes europeu e asiático, não impediu a América
de ser dos primeiros países do mundo a aplicar as tecnologias móveis ao campo da
política, tanto em contextos informais como formais, e de ser hoje, seguramente, o país
onde essas experiências estão mais avançadas. Como já vimos no ponto anterior, os
desenvolvimentos proporcionados pelas comunicações móveis constituem hoje um
instrumento que pode fazer toda a diferença no campo de batalha político. Políticos
conectados com os seus eleitores são políticos mais bem informados sobre os problemas
reais das suas comunidades e por isso mais capazes de lhes dar resposta em tempo útil.
Vejamos um caso pioneiro de aplicação das novas tecnologias móveis na acção política
nos EUA. Em 2004, apesar da sua derrota prematura nas primárias para a nomeação do
Partido Democrata, Howard Dean ultrapassou as expectativas de praticamente toda a
gente pelo apoio popular que conseguiu, em grande medida graças à sua estratégia de
mobilização on-line. Dean conseguiu criar um verdadeiro movimento de massas através
da Internet, conquistando os jovens e recolhendo mais de 50 milhões de dólares através
de pequenas doações, sobretudo feitas online. Numa tentativa para atingir o target dos
eleitores jovens e dos estudantes e apelar ao seu activismo, a campanha de Dean enviou
SMS através do domínio upoc.com, que aloja comunidades de utilizadores de texting,
permitindo aos seus apoiantes organizarem-se e contactarem entre si, criando, desta
forma, um importante fórum de discussão. A utilização das novas tecnologias para
recrutar activistas a partir das bases, iniciada por Dean, tem vindo, desde então, a
formatar a actividade política nos EUA (Miller, 2005). (ver Anexo II)
Cabe, assim, perguntar porque razão o candidato que mais inovou acabou por ser
derrotado logo nas primárias do seu partido? Uma das explicações prende-se com a
cultura tecnológica dos americanos à época. Em 2004, o uso do SMS era muito popular
entre os jovens, mas ainda pouco familiar para a maioria dos americanos para que estes
o usassem de forma efectiva, especialmente no campo da política. A Política e as
campanhas eram então percepcionadas por muitos eleitores na América como estruturas
formais e tradicionais. Logo, introduzir o SMS a um nível tão formal como o da
política, quando ainda não estava integrado a outros níveis mais informais da sociedade
americana, tornou-se ineficaz (Miller, 2005). Outra das razões apontadas prende-se com
37
o modelo de organização da campanha de Dean. O impulso dado pela campanha deste
candidato para atingir níveis mais elevados de abertura política, produziu,
paradoxalmente, uma cultura em que os deaniacs (apoiantes fervorosos de Dean) se
esqueceram de que o verdadeiro objectivo era convencer os eleitores a votar no seu
candidato. Por seu turno, o campo do seu principal adversário na disputa pela nomeação
do Partido Democrata nas primárias de 2004, John Kerry, empregou uma estratégia
quase totalmente oposta, baseada na disciplina organizativa. E apesar de no lado de
Kerry não haver tanto activismo como no de Dean, Kerry acabou por receber muito
mais votos e ganhou a nomeação (Shirky, 2005). O facto é, que a experiência iniciada
por Dean inaugurou uma nova forma de fazer política na América, com a qual muito
aprenderam os candidatos que lhe sucederam. Joe Trippi, director de campanha de
Howard Dean em 2004, teve à época uma frase premonitória: Quer consigamos ou não
atingir massa crítica nesta campanha, penso que estamos a ser precursores de um
método que vai ser usado ainda mais intensamente no futuro. Mas esta análise não
ficaria completa se não se colocasse outra questão fundamental e que se prende com o
desfecho final das presidenciais americanas de 2004: Porque razão os republicanos
obtiveram mais sucesso do que os democratas, convencendo maior número de eleitores
a votar? O que alguns defendem é que mesmo com a mobilização de massas iniciada
por Howard Dean, o facto é que os republicanos acabaram por usar de forma muito mais
eficaz do que os democratas os novos instrumentos mediáticos para mobilizar as suas
bases nas eleições gerais de 2004. Isso aconteceu, em grande medida, porque a
campanha de John Kerry praticamente ignorou as lições do fenómeno Dean. A
campanha de Bush, por seu turno, soube incorporar técnicas de auto-organização das
bases na sua estrutura formal de campanha, certificando-se que todos estavam cobertos
pela sua mensagem e, acima de tudo, que iriam votar no dia da eleição (Rheingold,
2005). O sucesso republicano em 2004 foi em larga medida atribuído à capacidade de
criação de uma cadeia de comando, ao mesmo tempo disciplinada e abrangente, que
soube manter-se em ligação permanente com a sua rede de voluntários e com as
estruturas locais do partido e para cujo sucesso as tecnologias móveis foram
determinantes (Weber, 2005). Os republicanos intuitivamente perceberam o potencial
político de fazer a transição para as estruturas da “terceira natureza” (Wark, 2005).
Como a campanha de 2004 amargamente demonstrou aos democratas, a ignorância na
utilização da tecnologia móvel no processo político conduz à auto-marginalização e à
38
derrota. E isto não tem apenas a ver com tecnologia. A tecnologia é o instrumento, mas
a lição importante a aprender é: como deve ser usada e desenvolvida essa tecnologia de
forma a gerar um conjunto de novas práticas. É que as probabilidades de eficácia da
actividade política multiplicam quando as pessoas sabem o que fazer com as
ferramentas que lhes são dadas. É isso que permite aos políticos mobilizar as massas
(Rheingold, 2005). Na verdade, desde há muito que se sonha com o dia em que possa
emergir um novo tipo de candidato, a liderar um novo tipo de campanha, sem receio da
tecnologia. Esse candidato seria o precursor de um novo sistema político, desenvolvido
não a partir do estilo de comunicação de cima para baixo, mas antes de um estilo de
comunicação orientado para o diálogo, verdadeiramente democrático, capaz de gerar
consensos colectivos em que muitos participam (Harper, 2005). Muitos acreditam que
esse dia já pode ter chegado.
A verdade é que as eleições presidenciais de 2008 vieram trazer à campanha muitas
novidades no domínio da aplicação das novas tecnologias, particularmente na área das
comunicações móveis. Ainda é cedo para fazer um balanço, tendo em conta que este
trabalho de dissertação está a ser desenvolvido num momento em que a campanha ainda
decorre e, por isso, as experiências que dela resultam ainda não puderam ser estudadas e
os seus resultados publicados, não existindo, portanto, a possibilidade de recorrer a
bibliografia de apoio. Mas é pelo menos possível, com base na cobertura noticiosa da
campanha e da consulta a diferentes sites na Internet directa ou indirectamente
relacionados com a actividade política e com os novos fenómenos da comunicação,
fazer referência a alguns dados que se nos afiguram relevantes. Assim, importa referir,
que qualquer dos três mais importantes pré-candidatos que disputaram as últimas
eleições primárias do Partido Democrata – Barack Obama, Hillary Clinton e John
Edwards – dispunha de um short code no qual os interessados se podiam inscrever para
receber informações sobre os respectivos candidatos e as suas campanhas. Do lado
republicano, o candidato John Mccain não dispõe de qualquer short code. No entanto, o
RNC – Comité Nacional Republicano – dispõe de um short code, através do qual é
possível fazer o registo e receber via SMS informação sobre Mccain e a campanha
republicana. Apesar dos esforços realizados, não foi possível identificar sinais
consistentes que apontem para a existência de uma estratégia móvel no âmbito da
campanha do candidato republicano John Mccain, contrariamente ao que sucedeu, pelo
39
menos em parte, nas presidenciais de 2004 com George W. Bushxiv, como já analisámos
anteriormente. As razões desta aparente mudança de estratégia por parte da máquina de
campanha republicana ficam, assim, por explicar.
Face a isto, importa centrarmo-nos na análise do campo democrata e particularmente do
seu candidato Barack Obama. Neste campo, há, efectivamente, dados relevantes a reter.
Desde logo, é notória a existência de uma estratégia móvel na campanha de Obamaxv.
Fundamentalmente por quatro razões.
Primeiro, Obama tem, desde Agosto de 2007, um site móvel – Obama Mobilexvi – que
oferece um serviço gratuito de 12 toques diferentes com passagens dos seus mais
importantes discursos, acompanhados de fundo musical, bem como protectores de ecrã
com fotos do candidato em diferentes poses e circunstâncias, sendo ainda possível
fazer-se o download de vídeos do próprio candidato ou de momentos da sua campanha.
Além disso, o site permite fazer o registo para receber informação periódica via SMS
sobre acções e eventos de campanha ou outro tipo de informação útil, por exemplo,
como tornar-se voluntário ou como fazer donativos. Outra das funcionalidades
disponíveis no Obama Mobile são os SMS com informações sobre assuntos específicos,
tais como Economia, Saude, Educação, Guerra do Iraque, etc. Ou ainda a possibilidade
de responder a um inquérito com questões sobre a actualidade política americana.
Segundo, a campanha de Obama disponibiliza um serviço de mensagens focalizadas
geograficamentexvii, o que permite que os seus apoiantes recebam mensagens com
informação relativa aos estados ou regiões onde vivem. Um trunfo que se terá revelado
precioso durante a fase das primárias e que certamente contribuiu para a mobilização
dos seus apoiantes nas suas múltiplas deslocações pelo país. Antes de cada deslocação
do candidato são enviados milhares de SMS aos apoiantes que vivem na respectiva área
encorajando-os a manifestar o seu apoio a Obama e a comparecerem nos eventos. A
campanha de SMS de Obama foi, aliás, distinguida com dois importantes prémios: o
Mobile Messaging Award, atribuído em Março, em Cannes, no âmbito da Global
Messaging Conferencexviii; e o Best Mobile/Text Messaging Campaign, no 2008 Golden
Dot, atribuído em Abril pelo Institute for Politics, Democracy & the Internet, da
Universidade de George Washingtonxix.
Terceiro, a campanha de Obama elegeu o SMS como um dos seus principais veículos de
comunicação, designadamente quando escolheu este meio para fazer o anúncio do
candidato à Vice-Presidência Joe Bidenxx. Nessa operação, realizada a 26 de Agosto,
40
poucas horas de ter início a Convenção Democrata, foram enviados 2,9 milhões de
SMS, comunicando a escolha de Joe Biden, o que foi considerado pela consultora de
comunicações americana Nielsenxxi, como a maior campanha individual de marketing
móvel jamais desenvolvida nos Estados Unidos. Segundo dados revelados pela Nielsen,
116 milhões de americanos utilizam actualmente o serviço de SMS de forma constante
como meio de comunicação. De acordo, ainda, com uma sondagem realizada pela
consultora Limboxxii, durante o período das primárias, tendo com alvo pessoas registadas
em serviços de SMS dos vários candidatos: 6% confessou que o SMS mudou
significativamente o seu voto; 22% respondeu que a sua intenção de voto mudou um
pouco; 14% disse que a imagem que tinha do candidato ficou mais positiva; 56%
afrimou ter gostado de receber o serviço. Um estudo realizado pelas universidades de
Michigan e de Princeton, concluiu que os alertas SMS enviados para recordar os
eleitores para votar são responsáveis por um aumento de 4% na participação eleitoral,
com particular incidência nos mais jovens. Os jovens são o grupo etário nos EUA onde
se registam mais baixos índices de recenseamento e de participação eleitoral. Uma outra
sondagem, realizada pela Virgin Mobile, no inicio do mês de Agosto, por SMS,
concluiu que do universo de 20 mil participantes, 37% declararam-se democratas, 17%
republicanos, 11% com outras preferências partidárias e 9,5% independentes. Mais de
54% dos inquiridos tinham entre 18 e 25 anos, 18% entre 26 e 34 anos e 16% mais de
35 anos. Deste universo, 40% votaram em Barack Obama, 18% em Hillary Clinton e
apenas 8% em John Mccainxxiii. Refira-se, ainda, que um outro estudo realizado pela
empresa de comunicações móveis Crisp Wireless, concluiu que o termo “Obama” é o
mais procurado em toda a rede de sites desta empresa americana, de acordo com os
resultados do seu barómetro do 2º trimestre de 2008, ganhando em número de buscas,
quer ao malogrado actor Heath Ledger quer à estrela pop Britney Spearsxxiv.
Em quarto lugar, a campanha de Obama fez uma forte aposta na dinamização de redes
de socialização, quer através do seu blogue oficialxxv, quer através de comunidades de
utilizadores de texting, com especial destaque para o fórum de discussão alojado no
Twitter.comxxvi, muito popular entre os jovens americanosxxvii e ao qual é possível aceder
via telemóvel.
Com base no atrás exposto podemos concluir:
41
A filosofia da estratégia móvel da campanha de Obama parece ter sido claramente
inspirada e influenciada pela experiência de Dean, mas com a vantagem de ter podido
aprender com os erros do pré-candidato democrata de 2004 e de beneficiar hoje de um
contexto tecnológico mais favorável, em consequência de uma maior taxa de penetração
móvel e de uma maior apropriação das tecnologias móveis por parte da sociedade
americana. Uma análise empírica permite-nos concluir que, embora os jovens tenham
constituído, desde o início, o verdadeiro motor da campanha de Obamaxxviii, este soube
aproveitar essa energia para construir uma base de apoio transversal a várias gerações.
Obama deu voz aos seus apoiantes, através da disseminação de estruturas de base,
abrindo sedes em pequenas comunidades, organizando uma activa e bem apoiada rede
de voluntários e apostando numa forte mobilização não apenas individual mas
comunitária. Este aspecto parece ter-se revelado decisivo na fase das primárias,
especialmente na renhida disputa que travou com a sua principal rival Hillary Clinton.
A favor deste argumento está o facto de Obama ter obtido uma clara vantagem nos
estados onde as votações foram realizadas através do método de caucusxxix, onde é
determinante o nível de motivação dos apoiantes e a sua capacidade de persuasão, numa
lógica de acesso debate, em que os eleitores podem mudar de opinião e de campo
político.
Na nossa perspectiva, o recurso a um instrumento tão ubíquo e personalizado como a
tecnologia móvel terá certamente contribuído para ajudar a conectar a rede de apoiantes
de Obama, assente num forte espírito de voluntariado. A estratégia móvel de Obama só
terá sido bem sucedida, porque o candidato abdicou do controlo centralizado, muito
comum nas organizações políticas formais, habituadas a uma grande rigidez
organizativa, abrindo espaço para a construção de uma rede auto-organizada – bottom-
up – com base num diálogo transversal entre os diferentes níveis da estrutura de
campanhaxxx. As tecnologias móveis permitem não só desenvolver campanhas de
marketing eleitoral particularmente eficazes, como influenciam o modelo de
organização das estruturas políticas, já que a sua utilização estimula e legitima uma
maior intervenção e mesmo interferência por parte dos cidadãos nos processos de
decisão. Como vários exemplos em todo o mundo têm demonstrado, a conexão da
política ao meio móvel está na forma como essas mensagens são usadas e não tanto no
que elas dizem. Para as redes políticas, tal como acontece como as redes criadas a partir
das práticas sociais da comunicação móvel, o meio está no processo de criação de uma
42
comunidade de utilizadores e não na mensagem (Rheingold, 2005). Essa parece ser a
grande transformação em curso.
43
Capítulo IV
Conclusões
Face a tudo o que foi exposto ao longo deste trabalho, entendemos estar em condições
de considerar que a hipótese formulada na Introdução se confirma. Assim, tendo em
conta o trabalho de investigação e de análise que desenvolvemos ao longo dos capítulos
I, II e III, julgamos ter respondido cabalmente às questões que foram sendo enunciadas
e que resultam do conjunto de conclusões que seguidamente detalhamos.
O telemóvel é, efectivamente, o mais massificado canal de comunicação do planeta,
sendo utilizado por mais de metade da população mundial – 3,3 biliões de utilizadores,
sendo que, até ao final do corrente ano, esse número ascenderá a 4 biliões, o que
corresponde a mais de 60% dos 6,7 biliões de pessoas que hoje vivem no nosso planeta.
A tecnologia móvel é, assim, a tecnologia de socialização mais difundida no planeta,
havendo um número de telemóveis em todo o mundo superior ao número de televisores,
de computadores ou de utilizadores de Internet. O carácter ubíquo do telemóvel é de tal
forma grande, que em muito locais remotos do planeta, particularmente em África, há
telemóveis em locais onde nem sequer chega a electricidade, o que só se torna possível
porque a principal característica deste tipo de terminais é serem wireless e as suas
baterias poderem ser carregadas manualmente, sem necessidade de energia eléctrica. As
características únicas dos equipamentos móveis, nomeadamente, o facto de serem
wireless, terem reduzidas dimensões e serem de fácil portabilidade, faz com que a
tecnologia móvel esteja a ficar cada vez mais disseminada. Por outro lado, os
equipamentos móveis estão a adquirir cada vez maior número de funcionalidades e de
capacidades tecnológicas, o que os torna mais inteligentes, mais personalizados e ainda
mais ubíquos (Geser, 2004; Starr, 2005). O telemóvel é, desde a sua génese, uma
ferramenta tecnológica de socialização e por isso a sua apropriação tem sido um
fenómeno socialmente transversal. Tanto em sociedades ricas e tecnologicamente
avançadas como em locais pobres, isolados e remotos o telemóvel constitui um
importante instrumento de socialização e conexão com o mundo real (Rheingold, 2002;
Oberman, 2005; Starr, 2005). Acontece, que o telemóvel não é só um instrumento de
comunicação também é um mecanismo de recolha e intercâmbio de informação. Nesse
sentido, as comunicações móveis têm vindo a substituir-se aos media tradicionais
44
ameaçando o seu monopólio enquanto meios de informação. Os media monolíticos já
não “ditam” sozinhos a vontade dos cidadãos (Rebelo, 2006). As comunicações móveis
vieram acelerar os processos de informação permitindo reportar acontecimentos de
forma quase instantânea, ganhando assim em rapidez e eficácia aos chamados mass-
media. Por outro lado, as tecnologias móveis têm outra vantagem sobre os media
tradicionais, permitem formas de comunicação interactiva, possibilitando aos
consumidores que se tornem produtores de conteúdos, os chamados repórteres de
ocasião. Mas o potencial das tecnologias de informação móveis vai ainda mais longe,
fornecendo aos cidadãos instrumentos para que estes possam participar e interagirem de
forma a facilitar a sua auto-organização. As comunicações móveis permitem um
contacto com o mundo e com todos os seus utilizadores em tempo real e em
movimento, potenciando novas modalidades de relacionamento e colaboração. Não há
dúvida que o telemóvel tem vindo a transformar-se num poderoso instrumento de
mobilização de massas, como se prova pelos inúmeros casos já verificados em todo o
mundo, ocorridos muitas vezes de forma espontânea, como emanação de uma vontade
genuína dos cidadãos. A forte ligação que existe hoje entre o telemóvel e o seu
utilizador constitui um factor que não pode ser negligenciado por aqueles que querem
difundir a sua mensagem, designadamente os políticos. As tecnologias móveis têm
vindo a contribuir para despertar o interesse dos cidadãos pela política e para aumentar
os níveis de participação dos cidadãos na política. Em muitos locais do mundo as
comunicações móveis são encaradas como uma condição para a eficácia da acção
política. Cada vez mais, os políticos estão a integrar instrumentos móveis nas suas
estratégias políticas porque sabem que esse é o canal que lhes permite manter uma
relação mais estreita e directa com os seus eleitores. Os partidos políticos começam a
descobrir o potencial das tecnologias móveis para atrair novos apoiantes, mobilizar a
base de apoio, angariar fundos e difundir a sua mensagem. As tecnologias móveis
permitem a criação de redes de socialização em torno de causas políticas e dos seus
protagonistas, o que está a operar profundas transformações nas formas de
relacionamento entre os cidadãos e os políticos. Graças às tecnologias móveis está a
nascer uma nova forma de comunicação entre políticos e cidadãos, baseada num diálogo
directo e sem mediações, prescindindo da acção daqueles que tradicionalmente têm sido
os principais mediadores entre políticos e cidadãos: os jornalistas. Assim, os políticos
cada vez mais tenderão a recorrer às diversas funcionalidades tecnológicas móveis, não
45
só porque isso permite fortalecer os elos de ligação com o seu eleitorado, mas também
porque os próprios eleitores vão exigir ter uma participação maior nos processos de
decisão política. É indiscutível que em muito locais do mundo, as comunicações móveis
estão a mudar a política e a política está a mudar aos olhos dos cidadãos, que agora
sentem que podem ser parte integrante de um movimento de transformação social, cujo
acesso durante muito tempo lhes foi vedado pelas pesadas estruturas partidárias, cheias
de burocracias e hierarquias. As comunicações móveis estão a permitir desestruturar os
velhos modelos de organização centralista e a substitui-los por processos de
comunicação baseados no diálogo em rede, muitas vezes desenvolvidos em canais que
escapam ao controlo dos dirigentes. Esta é uma nova realidade a que quem quiser ter
lugar na política do futuro vai necessariamente ter de se adaptar.
Os políticos deixaram de ter segredos e os cidadãos serão implacáveis para com os que
forem apanhados a infringir as regras. Mas essa é única forma de regenerar a
democracia e de reconciliar os cidadãos com a política. Não há dúvidas que uma nova
forma de democracia está a germinar e a emergir progressivamente, mais rapidamente
em alguns sítios do que em outros, mas a sua eclosão é inevitável. A sua evolução
dependerá muito mais de razões de ordem cultural e política do que de razões
tecnológicas. O caso de Portugal é, nesse sentido, paradigmático. Portugal é dos países
do mundo com melhores indicadores no domínio das tecnologias móveis. Temos uma
média de 1,4 telemóveis por cada português, o que significa que já estamos numa
situação de saturação em termos de mercado. Por outro lado, não só a taxa de
penetração é excelente, como estão disponíveis em Portugal as mais avançadas soluções
tecnológicas do mundo, algumas, aliás, em que Portugal foi pioneiro, nomeadamente no
sistema de cartões pré-pagos. Outro dado importante é que os portugueses não só têm
muitos telemóveis como têm telemóveis tecnologicamente avançados. Em cada 100
portugueses 35 têm telemóveis com tecnologia 3G, o que lhes permite enviar e receber
não só mensagens multimédia MMS, como também videochamadas. Sendo Portugal um
pais com uma performance tecnológica móvel que o torna num case-study mundial,
porque razão, até agora, este imenso potencial ainda não foi aproveitado pelos políticos
portugueses?
Esta análise, que tenta verificar a hipótese inicial, que recordamos – Pode o telemóvel,
dadas as suas características e a sua difusão, constituir um instrumento fundamental de
46
estímulo à participação dos cidadãos na actividade política e funcionar como um agente
de mudança na transformação das lógicas tradicionais de acção política? – Conduziu-
nos a uma nova interrogação sobre o caso português.
Na nossa perspectiva, faz sentido que o caso português seja objecto de estudo e de uma
análise complementar futura. A esse propósito, o que podemos desde já concluir, com
base no presente trabalho, é que para tornar útil e eficaz o processo de aplicação das
tecnologias móveis ao campo político, é necessário que as organizações políticas
adaptem os seus modelos organizativos a esta nova realidade: tornando as suas
estruturas mais leves e flexíveis, criando, assim, espaço para que as novas formas de
participação e intervenção sejam incorporadas nos processos de decisão política. A
concepção de uma estratégia política móvel passa, em primeiro lugar, por assumir essa
vontade política.
47
i Segundo dados da International Telecommunication Union : http://www.itu.int/newsroom/press_releases/2008/29.html ii A campanha de Obama está presente em diversos sites de redes sociais sendo os mais conhecidos, o Facebook, que junta cerca de 2 milhões de apoiantes de Obamaii; o MySpaceii, com cerca de 650 mil; e o Twitter, com cerca de 100 mil, este último muito popular entre os jovens estudantes americanos e que pode ser acedido também através de telemóvel. iii http://www.vatican.va/holy_father/benedict_xvi/messages/communications/documents/hf_ben-xvi_mes_20080124_42nd-world-communications-day_po.html iv Gregory M. Lamb, The Christian Science Monitor v http://www.redesmoveis.com/showthread.php?t=1943 vi http://www.itu.int/newsroom/press_releases/2008/29.html vii http://www.informatm.com/itmgcontent/icoms/s/reports.html;jsessionid=DE5D597F5882B364A02D008058ED6274 viii World Telecommunication Development Report 2002: http://www.itu.int/ITU-D/ict/publications/wtdr_02/. ix http://www.itu.int/ITU-D/icteye/DisplayCountry.aspx?code=BGR x http://www.anacom.pt/render.jsp?contentId=628738 xi http://pt.wikipedia.org/wiki/SMS xii No Anexo I – 1 procede-se à descrição de mais de duas dezenas de casos da utilização do SMS na acção política ocorridos por todo o mundo. xiii http://stoa.usp.br/claudiapf/weblog/22046.html xiv http://bloomberg.com/apps/news?pid=20670001&refer=home&sid=aEBF5Q7... xv http://www.usnews.com/usnews/news/articles/070815/15textprez.htm; http://www.ireport.com/docs/DOC-53312; http://latimesblogs.latimes.com/technology/2008/08/good-cellphones.html xvi http://obamamobile.mobi/;http://www.barackobama.com/mobile/; http://my.barackobama.com/page/group/GOMOBILE; http://mobileactive.org/US-election-08-how-are-candidates-using-mobile-phones; http://techpresident.personaldemocracy.com/blog/entry/1217/a_first_look_at_obama_on_the_go; http://www.techpresident.com/blog/entry/19082/obama_gets_mobile_right; http://blog.mobileweb.be/2008/07/30/obama-votes-for-mobile-web/; http://domainnamewire.com/2008/07/29/barack-obama-goes-mobi/ xvii http://promointeractive.net/2008/06/10/obama%E2%80%99s-mobile-messaging-spin/; http://www.usnews.com/usnews/news/articles/070815/15textprez.sidebar.htm xviii http://www.appscout.com/2008/05/obama_mobile_takes_08_mobile_m.php xix http://www.wirelesscorp.com/pr_2008_03_12.php~; http://www.reuters.com/article/pressRelease/idUS188337+12-Mar-2008+PRN20080312 xxhttp://www.nielsenmobile.com/html/press%20releases/ObamaSMSVPMessage.html xxi http://www.nielsenmedia.com/nc/portal/site/Public/ xxii http://www.marketingcharts.com/direct/mobile-advertising-changes-voters-attitudes-and-behaviors-3358/limbo-mobile-sms-political-campaign-actions-takenjpg/ xxiii http://cellphones.about.com/od/textmessaging/a/votertexting.htm xxiv http://www.fiercemobilecontent.com/story/obama-dominates-mobile-web-searches/2008-06-09 xxv http://my.barackobama.com/page/content/hqblog xxvi http://twitter.com/barackobama xxvii http://techpresident.personaldemocracy.com/blog/entry/19082/obama_gets_mobile_right xxviii http://bryanscrafford.wordpress.com/2007/06/20/obama-using-cell-phone-outreach/ xxixNos EUA designa-se por caucus o sistema de eleição de delegados em alguns estados, na etapa das eleições primárias, em que cada candidato reúne os seus apoiantes num recinto onde se desenvolve um intenso debate no sentido de convencer os ainda indecisos. Quem conseguir revelar maior capacidade de persuasão e mobilização vence a eleição. xxix http://www.smstextnews.com/2007/08/success_in_obama_mobile_campaign.html
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