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VILA GUAÍRA: CARACTERIZAÇÃO DA REALIDADE SOCIAL, EDUCACIONAL E

AS CONTRADIÇÕES SOCIOECONÔMICAS

Francisca Francisneide Alves Avancini1 Prof. Victor da Assunção Borsato2

RESUMO

Na contextualização histórica e econômica brasileira, um longo período de modernização produtiva da agricultura foi trazendo à luz, através das mais diversas manifestações, a crítica a esse modelo e o debate sobre a modernização social que não se realizou no âmbito desse processo de transformações. As profundas transformações por que passaram a agricultura e o espaço rural no Brasil, no período compreendido entre fins do ano de 1970 e início dos anos 1980, traduziram-se em uma intensa, mas parcial e setorizada modernização produtiva, no esvaziamento populacional relativo deste espaço e em novas dinâmicas sociais, econômicas e ambientais. A Geografia, enquanto ciência, ao longo de sua história sempre se reocupou com as relações entre o homem e o ambiente e, enquanto disciplina também se preocupa em formar alunos críticos, conscientes e éticos, que efetivem a reflexão e o questionamento para que a aprendizagem se materialize significativamente. Nesse sentido, o presente estudo se propôs a estudar os aspectos socioeconômicos da Vila Guaíra, localizada no município de Goioerê-PR, a partir da comunidade e por meio da análise das contradições sócio espacial e realidade atual dos moradores do bairro. Procurou-se envolver os alunos na proposta e produzir um material pedagógico, utilizando-se de acervo histórico e pesquisas com os moradores da Vila Guaíra, através de entrevistas orais e escritas sobre suas trajetórias e atividades econômicas. Concomitantemente, buscou-se compreender as transformações no espaço geográfico a partir da década de 1970 tendo a Vila Guaíra como um referencial, foi para esse bairro que muitos trabalhadores expulsos do campo se fixaram. Palavras-chave: Modernização da agricultura; Êxodo Rural; Superação.

1 INTRODUÇÃO

A sociedade brasileira assiste, a partir da década de 1960, um processo de

modernização da agricultura do país. Emergem novos objetivos e formas de exploração

agrícola originando transformações tanto na pecuária, quanto na agricultura. Como

consequências do processo são apontados, além da acirrada concorrência no que diz respeito à

produção, os efeitos sociais e econômicos sofridos pela população envolvida com atividades

rurais. 1 Professora PDE 2012.� 2 Orientador PDE 2012.�

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Segundo Graziano Neto (1985), essa modernização altera a composição e a utilização

do trabalho, aumentando o uso do trabalhador bóia-fria3,assim como o pagamento pela força

de trabalho (que é o assalariamento); os pequenos produtores são expropriados , dando lugar

aos moldes empresariais de organização da produção. O autor complementa também outras

consequências, em que a propriedade tornou-se mais concentrada, as disparidades de renda

aumentaram, o êxodo rural acentuou-se, aumentou a taxa de exploração da força de trabalho

nas atividades agrícolas, cresceu a taxa de auto-exploração nas propriedades menores, piorou

a qualidade de vida da população trabalhadora do campo.

Assim, a modernização da agricultura brasileira, vai além do processo técnico na

agricultura, modifica também a organização, e consequentemente, as relações sociais de

produção. Se por um lado, esse processo gerou o aumento da produtividade, por outro

provocou a exclusão social de milhares de trabalhadores que não se beneficiaram do processo

de modernização agrícola, gerando grande êxodo do campo para a cidade.

No município de Goioerê vivenciou-se também esse panorama, em que trabalhadores

permanentes, os meeiros, arrendatários, que antes de 1970 desenvolviam suas atividades na

grande propriedade rural, sob a forma de colono ou morador, foram então sendo substituídos

por uma mão-de-obra especializada em certas tarefas empresarias e por uma mão-de-obra

temporária. Assim, muitos tiveram suas vidas direcionadas para a cidade, em busca de

condições para sua sobrevivência.

Diante da realidade vivenciada, o presente estudo objetiva estudar os aspectos

socioeconômicos da Vila Guaíra a partir da comunidade e por meio da análise das

contradições sócio espacial e realidade atual dos moradores do bairro. Em termos específicos,

objetiva-se envolver os alunos na proposta e produzir um material pedagógico, utilizando-se

de acervo histórico e pesquisas com os moradores da Vila Guaíra, através de entrevistas orais

e escritas sobre suas trajetórias e atividades econômicas; e compreender as transformações no

espaço geográfico a partir da década de 1970 tendo a Vila Guaíra como um referencial, pois

foi nesse bairro que muitos trabalhadores expulsos do campo se fixaram.

Em relação a justificativa para a realização do estudo, as Diretrizes Curriculares do

ensino de Geografia (2008) estabelecem que seja utilizada metodologia para que os alunos

entendam o seu espaço econômico e geográfico partindo da comunidade em que vivem. Para

que isso ocorra, é necessário fazer inter-relações entre seu local de vivência e no seu

3 O boia-friaou asslariado rural é o trabalhador que, expulso do campo, vai constituir uma massa de trabalhadores temporários (volantes) residindo nas periferias urbanas. São agricultores em diversas lavouras mas não possuem suas próprias terras.�

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município. Partindo da história local e do Brasil, relacionando e comparando com a história

geral, por meio desse processo pedagógico se desenvolve a consciência histórica do aluno.

Nas Diretrizes Curriculares, o objeto de estudo da geografia é o espaço geográfico,

entendido como o espaço produzido e apropriado pela sociedade, composto pela inter-relação

entre sistemas de objetos-naturais, culturais e técnicos – e sistemas de ações – relações

sociais, culturais, políticas e econômicas.

Os estudos geográficos de um determinado lugar ou espaço observado a partir de um

olhar social e econômico tem contribuído significativamente para a produção do

conhecimento histórico da comunidade que ali vivem. Para se entender o processo de relação

de trabalho e relação de poder que marcam a comunidade do bairro Vila Guaíra, localizada no

município de Goioerê, escolhem-se realizar um recorte a partir das décadas de 1970 a 2010,

para evidenciar as transformações que a modernização da agricultura ocasionou na cidade de

Goioerê (Vila Guaíra) e no campo.

Schmidt e Cainelli (2004) destacam as possibilidades do trabalho com a história local

para que o aluno seja inserido na comunidade na qual ele faz parte, criar a sua história e a sua

identidade. O estudo com a história local ajuda a gerar atitudes investigativas, criadas com

base no cotidiano do aluno, além de ajudá-lo a cerca do sentido da realidade social.

2 REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 A MODERNIZAÇÃO AGRÁRIA E AS SUAS CONSEQUÊNCIAS

A realidade das atividades do campo reflete atualmente a transição do modelo

econômico do país agro-exportador para o subdesenvolvido industrializado. Conforme a

indústria se tornava o eixo principal da economia brasileira – processo consolidado a partir da

década de 1950, quando a economia do país era cada vez mais controlada pelas

transnacionais, a agricultura ficava mais dependente e subordinada a indústria e aos interesses

econômicos de grupos brasileiros e internacionais.

Wanderleiy (1995) explicita que no Brasil, a história agrícola está ligada à história do

processo de colonização no qual a dominação social, a política e a econômica da grande

propriedade foram privilegiadas. Assim, a grande propriedade impôs-se como modelo

socialmente reconhecido e recebeu estímulos expressos na política agrícola que procurou

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modernizar e assegurar sua reprodução, podendo-se concluir que a agricultura familiar sempre

ocupou um lugar secundário e subalterno na sociedade brasileira.

Assim, a estrutura fundiária no Brasil foi marcada pela concentração de terras, os

conflitos pela posse da terra e as relações desiguais de trabalho, cuja característica principal é

o predomínio de grandes propriedades. Almeida e Rigolin (2011) evidenciam que as

transformações no campo decorrentes da evolução do sistema capitalista não aconteceram de

forma homogênea no tempo e espaço, mas atenderam as especificidades de cada região ou

período.

Em meados da década de 1960, como salienta Martine e Garcia (1987), foram

lançadas as bases de um projeto para a agricultura brasileira, onde deveria alterar-se a

estrutura de produção agrícola, equiparando-se à agricultura dos países desenvolvidos, em

matéria de produtividade e rentabilidade. Estimulados pelos preços internacionais favoráveis,

pelo pacote tecnológico denominado de Revolução Verde, associado às forças que reprimiam

qualquer oposição às mudanças, empreendia-se uma profunda transformação na estrutura da

produção agrícola tradicional.

A partir da década de 1970, a agricultura brasileira moldava-se ao capitalismo. Muller

(1989) afirma que as agroindústrias cresceram como consumidoras dos produtos da

agropecuária, ao tempo que se remodelavam, surgiam novas agroindústrias, de grande porte,

ligadas ao exigente mercado internacional. Complementando, Martine e Garcia (1987)

expressam que na década de 1970 assistiu-se a um aumento no uso da força mecânica, e em

contrapartida, a uma relativa estagnação no uso da força animal. Esse processo que ora visava

o aumento da produção teve como principal consequência a substituição do homem do campo

pela máquina.

As mudanças não atingiram, somente, a base técnica, mas também, econômica e social

da agricultura, provocando profundas transformações no meio rural brasileiro. Nesse

contexto, se por um lado, esse processo gerou o aumento da produtividade, por outro

provocou a exclusão social de milhares de trabalhadores que não se beneficiaram do processo

de modernização agrícola.

Silva (1981) afirma que, a transformação capitalista da agricultura brasileira foi

referenciada a política do estado, que sem sombra de dúvidas, criou mecanismos que

favoreceram a capitalização da grande propriedade. Constata-se que os grandes proprietários

tinham mais facilidade em obter créditos agrícolas, uma vez que tem a terra como garantia

dos financiamentos. Entretanto, as avaliações realizadas sobre a política de credito rural,

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indicam que grande parte desses recursos foram investidos pelas grandes propriedades em

reserva de valor, principalmente na compra de mais terras.

A análise da modernização agrícola brasileira evidencia que a mesma apresentou

objetivos que não levaram, necessariamente, ao desenvolvimento rural, ocasionando impactos

como: êxodo rural, diferenças estruturais, processo de especialização, concentração fundiária,

concentração de renda, exploração da mão-de-obra, problemas ambientais, entre outros.

2.1.1 Consequências Sócio-Ambientais

A modernização da agricultura brasileira que impôs um novo padrão de

desenvolvimento econômico, ocasionou também exclusão do homem do campo, da geração

de emprego, diminuição da renda, entre outros, ocasionando consequentemente, desordem no

espaço rural, decorrente da competitividade do capitalismo. Silva (2000) analisa que, dentro

de uma ótica global, a modernização agrícola revela que a propriedade da terra foi sendo

subordinada ao capital. O progresso técnico não está uniformemente difundido, ocorrendo

concentração espacial e setorial. Nesse enfoque, de acordo com Graziano Neto (1982), a

desigualdade da modernização ocorre entre as regiões do país, entre as atividades

agropecuárias e entre os produtores rurais. O autor acrescenta que em termos regionais, é o

Sudeste e o Sul do país que mais se têm modernizado, particularmente os Estados de São

Paulo, Paraná e Rio Grande do Sul.

Verifica-se que o estilo de desenvolvimento adotado provocou resultados sociais que

ameaçam a capacidade de sobrevivência da sociedade.

O custo social das mudanças ocorridas agudiza o questionamento das suas vantagens econômicas. Sem dúvida a produção e a produtividade aumentaram, mas não no ritmo esperado. A agroindústria se expandiu rapidamente, mas a produção per capita de alimentos básicos é menor do que no início da modernização. O número de postos de trabalho no campo aparentemente aumentou, mas grande parte deles são de natureza instável e mal remunerados. O campo se industrializou, se eletrificou e se urbanizou parcialmente, entretanto o êxodo rural também se multiplicou, levando ao inchamento das cidades. (MARTINE, 1987, p. 10)

As alterações no modo de produzir e organizar a produção agrícola provocaram uma

reorganização do espaço geográfico, adequando-o às novas condições de produção

determinadas, em geral, pelos interesses do Estado e dos grupos econômicos capitalistas.

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Com a especialização de alguns produtos e de algumas áreas, as monoculturas

crescem, principalmente devido às economias externas. Gliessman (2000) enfatiza que esse

processo ocasiona uma fragilidade ambiental, econômica e social. De acordo com Silva

(2000), as condições econômicas, sociais e políticas brasileiras indicam disparidade entre

diferentes classes sociais que marginaliza diretamente as classes menos favorecidas, como os

agricultores com baixo poder aquisitivo, pequenos proprietários e agricultores familiares com

área restrita. A modernização da agricultura brasileira tendeu a favorecer o aumento da

participação relativa das camadas mais ricas na apropriação da renda total.

Silva (2000) analisa que o aumento generalizado da pobreza no campo pode ser visto

como resultado do processo de modernização, pois a expansão da grande propriedade com a

mecanização e utilização de agroquímicos diminui a necessidade de mão-de-obra permanente,

ao mesmo tempo em que os trabalhadores volantes (bóias-frias) vêem sua oferta de trabalho

diminuir cada vez mais e acabam se sujeitando a duros turnos no campo por diárias cada vez

mais irrisórias.

A pobreza se intensificou pela distribuição desigual da terra e de outros bens, com a

manutenção e reforço da estrutura agrária concentrada, sendo isso e o favorecimento às

propriedades patronais que deram origem à expressão “modernização conservadora” para

referir-se a este processo.

2.1.2 Expropriação do Campesinato

Com a modernização da agricultura, e estrutura fundiária evolui em um sentido

concentrador e excludente, dificultando, qualquer tipo de acesso à terra, aos trabalhadores

rurais brasileiros. Silva (2000) pondera que além da propriedade privada da terra estar

concentrada nas mãos de poucos proprietários, o acesso a ela também é restrito, pois, além da

minoria deter a maior porção de terras rurais, detém também a exploração das mesmas.

Assim, o rápido processo de mecanização e o aumento da concentração fundiária da

agricultura brasileira contribuíram para o intenso processo do êxodo rural e,

consequentemente, para a concentração populacional nos centros urbanos.

Diante desse cenário, nas últimas quatro décadas, o perfil da distribuição espacial da

população brasileira sofreu profunda alteração. De acordo com Palmeira (2012), entre 1940 e

1980, inverteram-se os percentuais das populações rural e urbana, a primeira caindo de

aproximadamente 70% da população total para cerca de 30%, enquanto a segunda aumentava

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de 30% para 70%. As migrações internas foram as grandes responsáveis pelo crescimento

urbano e o IBGE estima que, em 1970, de 30 milhões de migrantes, total acumulado de

residentes em municípios distintos daqueles em que nasceram, 21 milhões se dirigiram para as

áreas urbanas.

O forte êxodo rural se iniciou nas regiões de maior desenvolvimento, onde o processo de

capitalização e mecanização ocorreu primeiro e de forma mais intensa. Martine e Garcia (1987)

enfatizam que o descompasso entre o ritmo de reprodução da força de trabalho e a expansão da

oferta de emprego no campo produziu, durante a década de 1970, o maior êxodo rural visto no

Brasil.

2.2 CONTEXTUALIZAÇÃO DO MUNICÍPIO DE GOIOERÊ

Iniciando a explanação, Paz Júnior (2003) relata que, no município de Goioerê, os

trabalhadores permanentes, os meeiros, arrendatários, que antes de 1970 desenvolviam suas

atividades na grande propriedade rural, sob a forma de colono ou morador, foram então sendo

substituídos por uma mão-de-obra especializada em certas tarefas empresarias (o motorista, o

contador, o tratorista e outros) e por uma mão-de-obra temporária.

Percebe-se, assim, que a expulsão nas últimas quatro décadas, dos moradores, dos

colonos, dos parceiros, dos posseiros das propriedades rurais formou-se diferentes relações de

trabalho, sendo que uma delas foi um proletariado rural, a qual recebe varias denominações,

sendo que no Estado do Paraná, especificamente no município de Goioerê, denominados

“bóias-frias ou trabalhadores volantes”, submetidos as duras condições de trabalho. Ainda nas

décadas de 1970 e 1980, período em que a legislação não era tão fiscalizada, esses

trabalhadores, para melhorar a sua renda levava consigo, na maioria das vezes que iam para o

campo de trabalho, a esposas e filhos menores para ajudar na tarefa e consequentemente na

renda, já que o pagamento por dia de trabalho era por tarefa diária ou empreita.

Para Coelho (2011), na década de 1970 o Município de Goioerê se destacou como

grande produtor de café, juntamente com a hortelã e o algodão, esses produtos “era o carro

chefe” da economia municipal e responsável pelo grande fluxo migratório de mineiros,

paulistas, nordestinos e catarinenses para a região.

Em 1975 o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), estimou a população

do município em 100.360 habitantes (IBGE 2011), esse grande número, vindos de outras

regiões para trabalharem nas lavouras de café, da hortelã e do algodão, que empregava um

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grande número de mão de obra. Umas séries de fatores contribuíram para a decadência da

população a partir do final dessa década. A mecanização da agricultura que diminui a

ocupação da mão de obra no campo, o declínio da hortelã (Mentha piperita), com o

surgimento de outros países produtores e a diminuição dos cafezais não só na região como em

todo estado do Paraná foram os principais. O êxodo da população rural para as cidades

maiores ou para outras regiões do país, principalmente para o Centro-Oeste, justifica a brusca

diminuição da população de Goioerê. A queda na população foi intensa, o Censo do IBGE de

1980 apontou uma população total de 48.798 habitantes para o município.

Um grande número de produtores rurais e também de trabalhadores do campo

deixaram a região em busca de novas fronteiras agrícolas que estavam sendo abertas em Mato

Grosso, Mato Grosso do Sul e Rondônia, em um processo registrado em quase todos os

municípios do Noroeste do Paraná. Ainda em 1975, as pequenas e médias propriedades da

região foram gradativamente sendo incorporadas por fazendas de soja, pastagens ou

plantações de algodão.

De acordo com Paz Junior (2003), em 1980 a população rural ainda somava 80% do

total de habitantes do município vinte anos depois, no ano 2000 apenas 20% se encontram na

zona rural. Com o declínio da atividade cafeeira, a principal atividade agrícola foi o cultivo do

algodão, que atingiu seu auge na década de 1990, período em que Goioerê foi considerado o

maior produtor do Brasil, com 44 mil hectares cultivados.

O aparecimento de pragas, principalmente o “bicudo” (Anthonomus grandis), políticas

agrícolas que não subsidiavam a cultura, o aumento da produção de área plantada no cerrado

brasileiro e os preços desestimulantes fizeram que a partir de 1993 o algodão sofresse também

o declínio e praticamente foi erradicado no município.

Assim em 1991 o município contava com um total 45.104 habitantes, esse número foi

reduzido para 31.634 em 1996, em 2000 a população registrada foi de 29.742 habitantes e no

último Censo (IBGE – 2011), a população foi de 29.018 habitantes.

Segundo Neto (2011), a fundação da Vila Guaíra ocorreu no mesmo período da

fundação de Goioerê, no ano de 1955, não havia área demarcada ou planejada para ser um

bairro, todo espaço fazia parte da área central da cidade. O surgimento da comunidade se deu

por meio da oralidade, os próprios moradores demarcaram a área através de uma antiga

avenida chamada Rua Guaíra (hoje denominada Avenida Dário Moreira de Castilho),

próximo a um arroio, o Schimidt, que serve de limite entre a comunidade e a região central da

cidade.

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Sendo o bairro Vila Guairá, o maior fornecedor de mão de obra temporária ou “bóias

frias” no período entre as décadas de 1970 a 2010, houve um empobrecimento e um débil

desenvolvimento nessa comunidade, como também uma área de dispersão da população para

as médias e grandes cidades.

As transformações ocorridas no campo a partir da década de 1970, com o processo

tecnológico na agricultura, ocasionou o impacto sócio-econômico na população rural,

especificamente os pequenos proprietários, arrendatários e meeiros que eram em grande

número na região de Goioerê. Esses trabalhadores tiravam da terra o seu sustento, e

produziam gêneros alimentícios de primeira necessidade. Com a modernização, alavancada

com a mecanização, esses trabalhadores foram “expulso” do campo.

Essas mudanças alteraram profundamente a concentração da população do campo e a

estrutura fundiária do município, diminuindo o número de pequenas propriedades. Os

pequenos produtores e os trabalhadores rurais deixam o campo em busca de novas fronteiras

agrícolas ou outros postos de trabalhos na cidade.

3 METODOLOGIA

A necessidade de sistematização na elaboração de pesquisas científicas torna

necessária a utilização de metodologias para a realização das mesmas. Gil (1999), define

pesquisa como o processo formal e sistemático de desenvolvimento do método científico,

cujo objetivo principal é descobrir respostas para problemas mediante emprego de

procedimentos científicos. Ressalta ainda que, pesquisa social é o processo utilizado na

metodologia científica, que permite a obtenção de novos conhecimentos no campo da

realidade social.

Richardson (1999) afirma que apesar de ser muito comum a realização de pesquisas

para o próprio pesquisador não se deve esquecer de que a pesquisa social deve contribuir para

o desenvolvimento humano, porém seu objetivo imediato é aquisição de conhecimento.

Com relação ao propósito da teoria, a presente pesquisa pode ser caracterizada como

descritiva. Segundo Gil (1999), o objetivo primordial da pesquisa descritiva é descrever

características de determinada população ou fenômeno ou o estabelecimento de relações entre

variáveis. Richardson (1999, p.71) salientam que “os estudos de natureza descritiva propõem-

se investigar o que é, ou seja, a descobrir as características do fenômeno como tal.”

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No presente trabalho, pretende-se estudar os aspectos socioeconômicos da Vila

Guaíra, localizada no município de Goioerê-PR, a partir da comunidade e através da análise

das contradições sócio espacial e realidade atual dos moradores do bairro.

No delineamento da pesquisa, o pesquisador define qual o melhor método a ser

utilizado para a realização do trabalho cientifico. Diante das classificações expostas por Gil

(1999), foi adotado como método para realização deste trabalho o estudo de caso ex-post-

facto. Opta-se pelo estudo de caso por ser mais adequado aos objetivos deste estudo,

considerando que:

Pode-se definir pesquisa ex-post-facto como uma investigação sistemática e empírica na qual o pesquisador não tem controle direto sobre as variáveis independentes, porque já ocorreram suas manifestações ou porque são intrinsecamente não manipuláveis (GIL, 1990, p.69).

A análise qualitativa permite ao pesquisador chegar à descoberta de ideias e intuições

com o objetivo de ampliar o conhecimento. O estudo de caso é uma vertente da abordagem

qualitativa e se enquadra perfeitamente neste trabalho.

A Unidade Didática foi produzida com a participação do aluno que vivencia o

processo de modernização de agricultura, fator que o faz compreender a realidade. A

modernização da agricultura no município de Goioerê e as alterações nas relações de trabalho

foram investigadas e debatidas em sala de aula e através de pesquisa de campo.

Os textos selecionados para que o aluno compreenda o processo de transformação

ocorrido com a modernização no campo foram: A Agricultura, a Pecuária e o Sistemas

Agrários; a Agricultura e a Pecuária no Brasil: estrutura fundiária; As relações de trabalho no

campo: Trabalho familiar, Arrendamento, e Parceria. (ALMEIDA e RIGON, 2011).

A presente Proposta foi desenvolvida com os alunos do 2° ano do período noturno do

Ensino Médio do Colégio Estadual Vila Guaíra, com idade média entre 16 a 20 anos, cujo

número de alunos em sala é de 25, os quais foram divididos em 5 grupos, contendo 5 alunos

cada, e cada grupo foi responsável pelo desenvolvimento de uma Unidade Didática.

4 RELATO DAS ATIVIDADES E ANÁLISE DE RESULTADOS

Seguindo a concepção das Diretrizes Curriculares do ensino de Geografia (2008), que

apregoam a importância dos alunos entenderem o seu espaço econômico e geográfico

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partindo da comunidade em que vivem, através de inter-relações entre seu local de vivência,

relacionando e comparando com a história geral, proporcionando por meio desse processo

pedagógico o desenvolvimento de consciência histórica do aluno, foi desenvolvido o presente

estudo.

Segundo Morin (2001), é consenso que o processo educativo caracteriza-se como um

campo considerável de complexidade, exigindo (re)visão e (re)construção constante de

saberes, através de uma prática reflexiva e investigativa. Para o autor, há complexidade

quando elementos diferentes são inseparáveis constitutivos do todo (como o econômico, o

político, o sociológico, o afetivo e o mitológico), por isso a complexidade é a união entre a

unidade e a multiplicidade.

Buscar a aprendizagem efetiva dos alunos, onde os mesmos apreendam os significados

dos conteúdos, extrapolando o ensino superficial, onde o aluno apenas decora sem conseguir

aplicar a nenhum conhecimento é o desafio desse estudo. Conforme Vygotsky (1991), é

preciso que o desenvolvimento de um conceito espontâneo tenha alcançado um certo nível

para que o aluno possa absorver um conceito científico correlato, em que os seus conceitos

geográficos e sociológicos devem se desenvolver a partir do esquema simples 'aqui e em outro

lugar’. Nesse sentido, o estudo do meio permite que o conteúdo ensinado não seja meramente

teórico e sim, ligado a vida das pessoas. A geografia ensinada então passa a ter sentido e

interesse para o educando.

Diante desse enfoque, no âmbito da Geografia, faz-se necessário haver uma

aproximação entre o que é ensinado e o que é vivido e consequentemente o que é aprendido

pelos alunos. Deve ser enfatizada a compreensão do saber geográfico, facilitando aos alunos o

acesso à visão da Geografia real, vivenciada no seu cotidiano e tão necessária para melhorar

as relações entre o homem, a natureza e o entendimento do espaço geográfico como uma

extensão humana e física.

Callai (2003) ressalta que a geografia como ciência social, necessariamente precisa

considerar o aluno e a sociedade em que vive. Essa disciplina não pode ser uma coisa alheia,

distante, desligada da realidade, nem um amontoado de assuntos, ou lugares (partes do

espaço), onde os temas são soltos, defasados ou de difícil compreensão pelos alunos e não

pode ser feita apenas de descrição de lugares distantes ou de fragmentos do espaço. A autora

argumenta que a geografia deve permitir que o aluno se perceba como participante do espaço

que estuda, onde os fenômenos que ali ocorrem são resultados da vida e do trabalho dos

homens e estão inseridos em um processo de desenvolvimento. Não é uma geografia

descritiva, enciclopédica e artificial, em que o espaço ensinado é fracionado e parcial e, onde

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o aluno é um ser neutro, sem vida, sem cultura e sem história. O aluno deve estar dentro

daquilo que está estudando e não fora, deslocado e ausente daquele espaço.

Nesse contexto, a proposta de implementação buscou estudar os aspectos

socioeconômicos da Vila Guaíra a partir da comunidade e por meio da análise das

contradições sócio espacial e realidade atual dos moradores do bairro. O principal objetivo foi

envolver os alunos na proposta e produzir um material pedagógico, utilizando-se de acervo

histórico e pesquisas com os moradores da Vila Guaíra, através de entrevistas orais e escritas

sobre suas trajetórias e atividades econômicas. Buscou-se também compreender as

transformações no espaço geográfico a partir da década de 1970 tendo a Vila Guaíra como um

referencial, visto que foi para esse bairro que muitos trabalhadores expulsos do campo se

fixaram.

A pesquisa nasceu do desejo e da necessidade de melhor compreender-se a construção

do saber escolar, partindo da análise dos conteúdos geográficos, das formas populares de

saberes locais, do lugar onde o aluno está inserido, das relações sócio-espaciais estabelecidas

com o entorno e a comunidade em geral, produzindo assim um saber geográfico escolar.

Buscou-se propor reflexões para contribuir com a construção de um material

produzido com os professores e alunos do Colégio Estadual Vila Guaíra, para compreenderem

na prática as relações de trabalho existentes na comunidade e no município de Goioerê nas

décadas de 1970 a 2010. Os alunos do Colégio são em grande maioria filhos dos

trabalhadores rurais que viveram as transformações do campo no período. Assim, procurou-se

envolver os alunos na produção de narrativas históricas junto a sua comunidade, bem como a

análise das transformações sócio-econômicas ocorridas no município, e também a montagem

de um portifólio com fotografia de época e atuais que materializam as transformações na Vila

Guaíra, documento que poderá ser utilizado como material didático, sendo mais um acervo

para o estudo das transformações no campo.

Segundo Priori (1994), nos municípios de pequeno porte, há muitas dificuldades em

encontrar registros históricos sistematizados. Com raras exceções, são encontrados arquivos

estruturados, documentos organizados ou catalogados. Assim, para se organizar um arquivo, o

pesquisador precisa optar por fontes orais e material trazidos pela própria comunidade.

Para desenvolver a proposta de trabalho, foi dividido o estudo em cinco unidades

distintas, abordando: o conhecimento da história de Goioerê; a modernização agrária e as suas

consequências; as transformações sociais e econômicas ocorridas na comunidade do Colégio

Estadual Vila Guaíra; o Sindicato do Trabalhador Rural; e a história da comunidade da Vila

Guaíra e o acervo histórico.

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Na primeira etapa da proposta, foram realizadas atividades buscando evidenciar o

conhecimento da história de Goioerê. Para que o aluno compreenda a sua localização dentro

do espaço em que vive, foi trabalhado o mapa do município de Goioerê individualmente,

sendo realizada a localização dos pontos cardeais, colaterais e a posição do Colégio no mapa.

Complementando a atividade, foram realizados os seguintes questionamentos para

verificar o pré-conhecimento dos alunos em relação ao seu espaço e sua história: Conhece ou

já ouviu falar da história da Vila Guaíra? Como ele está organizado: em quadras,

pavimentação asfáltica, rede de esgoto, iluminação pública, lotes vagos...? Quais foram as

principais mudanças nos últimos 20 anos? Quem estabeleceu esta organização: comunidade

ou setores públicos? Há como mudá-lo? Descreva as características físicas e sócio-

econômicas da comunidade em que vive.

As respostas que apresentaram argumentos mais fundamentados e com maior

conhecimento, foram selecionadas e apresentadas em sala de aula. Graziano Neto (1986)

argumenta que pela dificuldade encontrada em localizar fontes de pesquisa, o pesquisador

pode optar por fontes orais. Nesse enfoque, procurou-se organizar um acervo pesquisado e

produzido pelos alunos, que no decorrer das aulas possibilitarão debates em torno das relações

de trabalho local como também partir da realidade vivida na comunidade.

Constatou-se desde o início da atividade proposta o interesse dos alunos, em que os

mesmos demonstraram possuir informações sobre a realidade do município e comunidade

local, as quais passaram a ser sistematizadas e organizadas, ampliando substancialmente o

conhecimento.

A Geografia, enquanto ciência, assume um enfoque conceitual sobre o homem

enquanto sujeito construtor e transformador do espaço, um homem social e cultural, situado

em uma dimensão econômico e política que imprime seus valores ao processo de construção e

reconstrução do lugar em que vive, mas que também é marcado por este mesmo lugar.

O espaço vivido pode ser entendido como uma rede de manifestações da cotidianidade desse sistema em torno das intersubjetividades que são, por sua vez, as redes nas quais se constituem as exigências individuais, no trabalho, na escola, na família, nas outras diversas formas da vida societária (REGO, 2000, p. 7, 8).

Baseado nessa visão é possível analisar a relação entre os saberes produzidos no

cotidiano de uma comunidade e a produção do saber escolar, focalizando o conhecimento

geográfico de seus moradores. Com este objetivo, é válido apreender o conjunto de

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percepções construídas a partir das relações estabelecidas entre os indivíduos e o lugar onde

vivem.

Na segunda atividade, foi abordada a modernização agrária e as suas conseqüências.

A realidade das atividades do campo reflete atualmente a transição do modelo econômico do

país agro-exportador para o subdesenvolvido industrializado. Conforme a indústria se tornava

o eixo principal da economia brasileira, processo consolidado a partir da década de 1950,

quando a economia do país era cada vez mais controlada pelas transnacionais, a agricultura

ficava mais dependente e subordinada a indústria e aos interesses econômicos de grupos

brasileiros e internacionais.

Muller (1989) afirma que a partir da década de 1970, a agricultura brasileira moldou-

se ao capitalismo. As agroindústrias cresceram como consumidoras dos produtos da

agropecuária, ao tempo que se remodelavam, surgiam novas agroindústrias, de grande porte,

ligadas ao exigente mercado internacional. Nesse período, Martine e Garcia (1987) relatam

que ocorreu um aumento no uso da força mecânica, e em contrapartida, a uma relativa

estagnação no uso da força animal. Esse processo que ora visava o aumento da produção teve

como principal conseqüência a substituição do homem do campo pela máquina.

Após ser realizada explanação sobre o tema, buscou-se contextualizar a teoria com a

prática, sendo proposta análise das tabelas do IBGE da população rural e urbana do município

de Goioerê entre as décadas de 1970 e 2010. Os alunos realizaram pesquisas sobre a

população rural e urbana do município de Goioere dos últimos 40 anos, buscando

informações no site do IBGE e no Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, que tem

escritório regional dentro da prefeitura do município. Após o trabalho de pesquisa, eles

apresentaram tabela com a explicação das mudanças da população para os demais alunos da

sala.

Objetivando ampliar a compreensão do processo de transformação ocorrida no

ambiente em que estão inseridos, foi montado um questionário para as entrevistas com

moradores da comunidade. Assim, foi organizado um grupo de cinco alunos, tendo como

objetivo o levantamento das informações junto com os moradores, sendo pesquisados dez

moradores, sendo os resultados dos trabalhos apresentados em sala de aula. As questões da

entrevista apresentam-se expostas no Apêndice 1.

A aplicação das atividades apresentou-se resultados positivos, verificando-se que os

alunos participaram e interagiram com o tema, em que o fato de estarem utilizando material

coletado por eles mesmos, tornou as aulas mais atrativas e proporcionou melhores resultados.

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Segundo Freire (1996), adquire importância a concepção sobre o saber do educando e

o conceito geográfico escolar, vislumbrando-se uma escola capaz de articular elementos do

conhecimento científico, mas que também valorize elementos da cultura e do saber popular.

Verifica-se a importância de uma escola onde seja questionada a sua função como veículo de

reprodução do conhecimento descontextualizado culturalmente, mas que também possa

antever a possibilidade de ser lugar de construção de cidadania, mediada por diversos

contextos. Nessa perspectiva, Freire (1996) aponta caminhos para uma educação dialógica,

problematizadora e em consonância com a própria vida do aluno. Nesse sentido, ao falar

sobre o universo do educando, de sua maneira de ver, de ler o mundo, o autor valoriza o saber

geográfico construído na relação entre as classes sociais.

A atividade oportunizou conhecer um pouco mais sobre a realidade da comunidade da

Vila Guaíra, em que a pesquisa de campo através de análises de gráficos, tabelas e coleta de

informações fez com que o resultado fosse mais interessante, havendo interação dos

educandos e do corpo docente. Albuquerque (2004) ressalta que a ideia do educador é

incorporar o mundo do educando ao processo educativo, uma vez que ele propõe uma

educação que pense o cidadão a partir das condições sócio-econômicas da sua vida, do seu

trabalho e do seu universo familiar e cultural.

O estudo dos alunos constatou que na década de 1970 ocorreu no município de

Goioerê expressivo êxodo rural – migração do campo para a cidade em larga escala. Esse

movimento populacional teve como principal causa a modernização da agricultura e teve

como consequência o crescimento populacional da cidade. Os proprietários dos pequenos

lotes de terras venderam os mesmos para grandes proprietários, migrando para as cidades,

tornando-se na maioria das vezes bóias-frias devido à falta de emprego nos setores

secundários e terciários. Com a aceleração da modernização a mão-de-obra agrícola foi

substituída pelas máquinas, ficando em extinção o trabalho no campo, gerando desemprego

rural e urbano.

O resultado desse processo foi o inchaço das cidades, aumentado também as vilas,

onde se estabelecia a população vinda do campo que não possuía mão-de-obra especializada e

nem nível educacional suficiente para ingressar no mercado de trabalho. Esse cenário foi

percebido também em Goioerê com a Vila Guaíra, sendo comprovado pelos alunos com as

análises dos dados do IBGE e nas entrevistas realizadas com moradores. Um dos

entrevistados relatou: “Lembro dos bons tempos da época do ciclo do algodão, não havia

desemprego”.

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Constatou-se com as atividades da segunda unidade do estudo, o envolvimento dos

alunos/professora e o trabalho interdisciplinar em matemática através da montagem e análise

das tabelas e gráficos, estando os educando motivados na realização do estudo. Os alunos

tornaram-se sujeitos do seu processo de aprendizagem, coletando dados, montando gráficos e

tabelas, obtendo conhecimento e acompanhando as transformações que ocorreram em seu

município.

Complementando o estudo, foi abordada na terceira unidade, as transformações sociais

e econômicas ocorridas na comunidade do Colégio Estadual Vila Guaíra. Para contemplar a

proposta, optou-se por trabalhar com fotografias coletadas pelos alunos na própria família ou

com moradores antigos, e também utilizar fotografias do Acervo Público do município, sendo

também produzidas fotografias do bairro hoje para serem comparadas com as anteriores,

buscando evidenciar a evolução verificada nas análises e da paisagem. Foram observados

aspectos inerentes ao vestuário, as moradias, os instrumentos de trabalho que apareceram

nessas fotografias, sendo observado também de que o espaço era ocupado, ou seja, se haviam

espaços vazios, vegetação, como eram as ruas, se continham asfaltos ou não.

Simultaneamente, foram sendo registradas fotos recentes da comunidade da Vila Guaíra,

realizando-se comparação das mudanças ocorridas com o decorrer do tempo. Esse acervo foi

catalogado e identificado, sendo montado um painel apresentado à comunidade.

Complementando a atividade, os alunos elaboraram um texto descrevendo a paisagem,

seu lugar de vivencia, destacando as marcas do passado e a configuração atual.

Percebeu-se nas atividades da unidade a interação dos alunos com o tema proposto, em

que houve grande empenho para realizar o resgate histórico da comunidade, sendo

conseguidas diversas fotografias que retrataram a vivencia da época. Nesse contexto, as

atividades realizadas estão de acordo com as concepções de Vygotsky (1991), em que em sua

teoria sócio - histórico - cultural, apregoa que a base da aprendizagem está na interação do

educando com o meio social. Para o autor, o ser humano, desde que nasce, está em interação

com o seu grupo social, inserido em uma determinada cultura. Em sua abordagem sócio-

histórica os mecanismos psicológicos não são inatos, originam-se e se desenvolvem na

relação entre os indivíduos e o contexto sócio-histórico.

Na quarta atividade, foi enfocado o Sindicato do Trabalhador Rural: Representação de

Classe. Com a modernização no campo, não somente em nível de Brasil, estado do Paraná e

direcionada ao município de Goioere, já havia uma organização de Sindicato Rural

estabelecida. Silva (1981), os camponeses se reagruparam em pequenos proprietários,

arrendatários, parceiros e camponeses sem terra, pouco a pouco, o termo camponês começou

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a perder espaço para uma expressão mais abrangente: o trabalhador rural. Mas sem conhecer a

legislação trabalhista, embora se organizassem, foram sendo “retirados” das terras que

trabalhavam e moravam. Isso fez com que fossem para as pequenas, médias e grandes

cidades, onde uma parcela conseguiu se colocar no mercado de trabalho e outra tiveram que

retornar ao campo como trabalhador temporário, ou “bóia-fria”, gerando assim uma nova

classe trabalhadora.

Mesmo havendo legislação que assegurasse os seus direitos, como registro em carteira

e indenização por tempo de serviço, ficaram as margens dos grandes produtores rurais: ou

seja, o que restou a essa classe trabalhadora foi vender sua força de trabalho. Antunes (2007)

chama a atenção para o capitalismo contemporâneo que vem assumindo nas últimas décadas a

sua lógica destrutiva. A Agricultura canavieira é um grande exemplo disso. No caso do

município de Goioere houve um aumento das áreas de produção de cana-de-açúcar, onde o

bairro Vila Guaíra tornou-se uma grande fornecedora de mão-de-obra para o corte da cana,

onde o mecanismo da exploração é o pagamento por produção diária per capita.

Diante da explanação, a atividade desta unidade foi organizada com mais um grupo de

cinco alunos, tendo como proposta uma pesquisa no sindicato dos trabalhadores rurais no

município de Goioere, buscando investigar inicialmente como era a legislação trabalhista nas

épocas recortadas na presente proposta. Foram questionados se de fato era cumprida a

legislação vigente e de que forma se fiscalizavam e quais os benefícios ou consequências para

o trabalhador rural, que benefícios eram ofertados aos mesmos através dos sindicatos.

Como a comunidade, em sua grande maioria, trabalhadores agrícolas ofertam mão de

obra ao corte da cana de açúcar, que atualmente configura-se como a atividade econômica

mais importante para o município, os alunos pesquisaram a legislação a respeito da atividade

canavieira, enfocando a como é estabelecida a remuneração dos trabalhadores. Todos os

dados foram registrados e apresentados para o grande grupo.

Os alunos realizaram pesquisas sobre o tema, trazendo para a sala de aula inúmeras

informações, discutindo se as informações teóricas apresentadas são vivenciadas na prática da

comunidade em que estão inseridos.

Vygotsky (1991) construiu sua teoria tendo por base o desenvolvimento do indivíduo

como resultado de um processo sócio-histórico, enfatizando o papel da linguagem e da

aprendizagem nesse desenvolvimento, sendo essa teoria considerada histórico-social. Sua

questão central é a aquisição de conhecimentos pela interação do sujeito com o meio.

Finalizando a abordagem pedagógica, na quinta unidade foi enfatizada a história da

comunidade da Vila Guaíra e o acervo histórico. A atividade teve como objetivo apresentar os

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resultados obtidos com os trabalhos descritos nas unidades anteriores, em forma de seminário,

no formato PowerPoint da Microsoft. Para isso se efetivar, o grupo participou da apresentação

dos demais grupos para se interarem de todas as pesquisas e registros efetuados. Todo o

material produzido foi apresentado em forma de painel no pátio da escola para a comunidade

e ficando exposto por um período.

Através do questionário da pesquisa que foram tabulados em forma de gráficos, foram

separados os moradores que vieram do campo, daqueles que vieram de outras localidades ou

região e também para os que moravam no bairro (Vila Guaíra) antes da década de 1970. Foi

realizado trabalho de análise das fotografias e textos produzidos nas unidades. Fundamentado

nos resultados obtidos nos gráficos e textos, os alunos trabalharam com desenhos que retratam

a realidade da comunidade, sendo montado um portifólio disponibilizado como suporte

educacional e cultural. Esse material foi apresentado para a comunidade.

Evidencia-se a necessidade de uma educação que contemple os anseios e necessidades

da comunidade. Nesse contexto, compartilhando às idéias de Freire (1987), que concebe a

escola como espaço de construção de saberes, advindos tanto nos saberes populares quanto

científicos. Esses saberes devem entrelaçar-se para que o saber escolar seja verdadeiramente

significativo para o educando. Tal concepção só poderá ser efetivada levando-se em

consideração que: o respeito aos saberes do educando se insere no horizonte maior em que

eles se geram – o horizonte do contexto cultural, então o respeito ao saber popular implica,

necessariamente, o respeito ao contexto cultural. Assim, a escola deve ser um espaço de

diálogo entre os saberes.

A referida proposta de trabalho se propôs a investigar como ocorre o entrelaçamento

dos saberes da comunidade e o escolar, reportando-se aos saberes populares, construídos

cotidianamente no espaço vivido e aqueles sistematizados, ministrados nas salas de aula,

visualizando uma junção profícua, a fim de gerar aprendizagens significativas para a vida do

aluno. As percepções apreendidas a partir das representações do aluno sobre o seu entorno

inscrevem-se na singularidade das experiências cotidianas vividas por cada um no seu

contexto. É imprescindível considerar que o aluno é parte do lugar, ele o identifica segundo a

sua subjetividade, sua própria leitura, trazendo essa leitura para embasar a sua aprendizagem.

Albuquerque (2004) analisa que a produção do saber escolar não se constitui fora da escola, o

saber do educando deve compor a elaboração do saber escolar, pois que deve ser o ponto de

partida para o processo que desencadeará o acesso a outras formas de saberes e que,

posteriormente, permite ao educando fazer uma nova leitura do mundo.

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A pesquisa tomou como ponto de reflexão e investigação o ensino de Geografia, sua

importância para a vida do aluno e as possibilidades de existência de um ensino

contextualizado, partindo e retornando ao lugar como base de construção do saber escolar

Geográfico. Nesse contexto, a Unidade Didática foi produzida com a participação do aluno

que vivencia o processo de modernização de agricultura, possibilitando-o compreender a

realidade. Assim, a modernização da agricultura no município de Goioerê e as alterações nas

relações de trabalho foram investigados e debatidos em sala de aula e através de pesquisa de

campo.

Cada indivíduo possui uma relação com o espaço que o cerca, percebe de maneira

diferente, de forma singular. Isto está ligado a sua compreensão em relação à sociedade, ao

trabalho, à natureza e aos próprios homens, fazendo com que o espaço experimentado

apresente diferentes significados e provoque diferentes reflexões. Assim o ser humano deve

tomar consciência de que faz parte de uma sociedade, de um espaço, no qual está inserido e

que deverá gerenciar seu espaço geográfico de maneira satisfatória e tendo consciência de sua

importância neste. Desse modo, muitas questões, no processo da investigação do estudo do

meio, exigem pensamentos e olhares geográficos que contextualizem sua interação e

compreensão espacial total.

Nesse sentido, o estudo permitiu que o conteúdo ensinado não seja meramente teórico

e sim, ligado a vida das pessoas. A geografia ensinada então passa a ter sentido e interesse

para o educando. Nas relações do homem com o meio estão inseridos objetos de significados

variados, e por meio da experiência, da investigação, da pesquisa, da conscientização, o

conhecimento se materializa e auxilia na identificação e na apreensão das complexidades

destas relações. O estudo sobre os entornos da escola contribuem para que a aprendizagem

deixe de ser uma “ilha” dentro da comunidade e do bairro e colaborar para que o educando

faça uma leitura consciente do meio. O saber do aluno é o reflexo dessa comunidade.

Valorizar e aprender como os alunos contextualizam seu meio pode contribuir para que a

escola tenha uma função ativa, enquanto porte da comunidade em que está inserida.

Dentro de um ensino significativo, os estudos sobre o meio possibilitam que os alunos

tenham acesso ao conhecimento escolar e científico da ciência geográfica, ampliando suas

reflexões sobre o espaço em que vivem. A escola é uma instituição imbuída também de

evidenciar o ensino-aprendizagem contextualizando o meio que o cerca e o mundo,

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possibilitando ao aluno compreender as inter-relações existentes entre ela e seu entorno. É

indispensável que a escola permita aos educandos a apropriação das múltiplas linguagens que

irão promover o diálogo dos mesmos com o mundo, pois no processo de estudo do meio das

crianças é imprescindível mais que informações e conceitos, uma compreensão de realidade

que vai desenvolvendo-se ao longo da vida. Deste modo à escola pode e deve contribuir para

que o aluno amplie sua visão de mundo e compreenda com nitidez as relações desenvolvidas

no seu meio.

As atividades propostas na produção didático-pedagógica contribuíram para mudanças

na realidade social da escola pública, pois através das atividades o indivíduo se apropria dos

conhecimentos necessários, interagindo com a comunidade na qual está inserido. O resgate

histórico através das pesquisas e entrevistas com moradores antigos, tornou o trabalho

interessante, fazendo do aluno um agente integrado à comunidade, atuante, capaz de produzir

um acervo, organizar painéis com imagens e fotografias, construir gráficos e tabelas,

possibilitando uma análise e discussão, envolvendo o passado e o presente da comunidade

estudada e assim contribuir para a compreensão da realidade socioeconômica e cultural atual,

para que se torne um cidadão crítico e atuante, capaz de transformar o meio em que vive.

Finalizando o estudo, evidencia-se que quando o aluno participa do processo como

agente do mesmo, aumenta a oportunidade de aprendizagem, pois torna-se possível a analogia

entre os conteúdos estudados e a vivencia, sendo portanto o trabalho de campo o ponto inicial

para o processo de aprendizagem, somado à leitura e pesquisa bibliográfica. Assim, a

proposta pedagógica contribuiu para mudanças relevantes na realidade social da escola e a

produção de material didático é de suma importância para todas as disciplinas como fonte de

pesquisa.

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APÊNDICE 1 – QUESTÕES PARA ENTREVISTA. Identificação do entrevistado: ( ) Aluno ( ) Pai ou Mãe ( ) Professor ( ) Morador da década de ( ) 1970, ( ) 1980, ( ) 1990, ( ) 2000 e ( )2010

1. Vieram de qual estado, região ou município?

2. Foi morar no campo ou na cidade?

3. O que atraiu para esse município?

4. Em que atividade econômica trabalhavam naquela época?

5. As mudanças ocorridas no campo os afetaram? (de que forma?

6. Qual atividade econômica exerce hoje?

7. Conhece ou conheceu a história do bairro Vila Guaíra?

8. Há alguma razão especifica em escolherem o bairro para morarem?

9. Quais as mudanças ocorridas no bairro a partir de 1970?