Vieira C, Hespanhol H & Marques J. (2008). "Biodiversidade e Recursos Biológicos: Flora briológica...

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3“A diversidade biológica constitui um dos elementos funda-

mentais dos ecossistemas, sendo largamente responsável pela

sua estrutura e funcionamento.”

Biodiversidade e recursos biológicos

As Condições Naturais e o Território de Ponte de Lima147 |

Doutor em Biologia.Universidade do Porto.

3. Biodiversidade e Recursos BiológicosJoão Honrado*

A diversidade biológica constitui um dos elementos fundamentais dos ecossistemas, sendo largamente responsável pela sua estrutura e funcionamento. Os padrões de distribuição es-pacial dos diversos elementos da biodiversidade, resultado da acção conjunta de processos ecológicos, demográ!cos, histórico-evolutivos e antrópicos, determinam a sustentabilidade ecológica das paisagens, bem como a sua capacidade de providenciar níveis relevantes de serviços ambientais de produção e regulação. De facto, pode a!rmar-se que a biodiversidade constitui a salvaguarda das funções ecológicas de cada território, contribuindo decisivamente para a sua viabilidade sócio-económica a médio e longo prazo.O Alto Minho, no extremo NW de Portugal, constitui um território diversi!cado em que as condições ambientais e a acção do Homem construiram, ao longo do tempo, paisagens de elevado valor ecológico, albergando uma "ora e uma fauna exuberantes que encontram nas áreas de média altitude o balanço adequado entre riqueza (número total de espécies) e origi-nalidade (presença de espécies endémicas). No coração do Alto Minho, o concelho de Ponte de Lima, ao incluir serras, vales e veigas, grandes e pequenos rios, e um mosaico litológico de granitos e xistos, possui uma das mais representativas colectâneas biológicas da região, em que apenas estão ausentes os elementos endémicos das áreas serranas mais elevadas (Peneda, Soajo) e as espécies características dos ecossistemas litorais. De igual modo, o território é ex-tremamente rico em usos tradicionais da biodiversidade endógena, desde sempre um recurso fundamental à subsistência das populações, que foram introduzindo, ao longo da história da ocupação da região, um elevado número de espécies exóticas de interesse agronómico, de que subsistem ainda uma apreciável diversidade de variedades regionais com características muito peculiares.O presente capítulo pretende descrever, numa aproximação ecológica, os aspectos mais sig-ni!cativos da biodiversidade do concelho de Ponte de Lima, sendo dada particular ênfase à sua distribuição pelas paisagens limianas, fortemente determinada pelas actividades huma-nas. Entendeu-se adequado o reconhecimento de dois sub-capítulos, um primeiro devotado à diversidade biológica enquanto património, com particular destaque para a diversidade endógena ou nativa do território e para a problemática da sua conservação, e um segundo em que são descritos os principais usos humanos da biodiversidade, quer a endógena, quer a introduzida com !ns agronómicos ou outros.Foram diversas as fontes de informação utilizadas neste capitulo. No sub-capítulo dedicado à biodiversidade como património, foram maioritariamente usados resultados de estudos an-teriores desenvolvidos no território por investigadores da Universidade do Porto, bem como trabalhos de especialidade com outra abrangência geográ!ca (referidos na bibliogra!a). Para cada espécie são, em geral, referidos o seu nome vulgar (quando conhecido) e o seu nome cientí!co; para cada tipo de vegetação indica-se, quando pertinente, o nome da aliança !tos-sociológica em que se enquadra.

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3.1. Biodiversidade

Vegetação e !ora vascular: João Honrado*, F. B. Caldas*, Paulo Alves*Flora briológica e liquénica: Cristiana Vieira*, Helena Hespanhol*, Joana Marques*Vertebrados terrestres: Tiago Múrias*, Claudia Soares*Ictiofauna: Alexandre Valente*Invertebrados: José Manuel Grosso-Silva*, Sónia Ferreira*, Nuno Formigo*

3.1.1. A biodiversidade do concelho de Ponte de Lima

Os padrões de distribuição espacial da diversidade biológica do concelho de Ponte de Lima encontram-se fortemente associados aos padrões de ocupação e uso do solo, tendo sido reco-nhecidas, para efeito da presente descrição, sete grandes classes, correspondentes a conjuntos coerentes dos pontos de vista ecológico e !sionómico e com uma forte ligação à gestão do território pelas populações humanas:i) Florestas naturais;ii) Povoamentos "orestais;iii) Mosaicos agro-"orestais;iv) Matagais, matos e ambientes rochosos;v) Rios e lagoas;vi) Áreas rurais (mosaicos agrícolas pratenses); evii) Áreas urbanas e outros ambientes arti!cializados.A Figura 3.1 evidencia a distribuição aproximada dos diversos “tipos de ambientes” no con-celho. Para cada tipo de ambiente, serão descritos os principais factores (naturais e antrópi-cos) condicionantes da !sionomia, da estrutura e do funcionamento dos ecossistemas e os aspectos mais signi!cativos da diversidade biológica que albergam. As "orestas naturais e os povoamentos "orestais serão descritos em conjunto, para efeitos comparativos, o mesmo acontecendo com as áreas urbanas e os espaços agrícolas.

Florestas e povoamentos !orestaisO Alto Minho constitui um território particularmente rico em "orestas naturais, incluindo carvalhais, aveleirais e "orestas ribeirinhas. Também os matagais pré-"orestais apresentam uma considerável diversidade, incluindo desde louriçais e matagais espinhosos de orlas "o-restais a salgueirais arbustivos de margens e leitos "uviais. Os diversos tipos de formações arbóreas e arbustivas dispõem-se naturalmente na paisagem em função das suas preferências ecológicas, em particular no que se refere à humidade e nível de tro!a dos solos, que por sua vez dependem maioritariamente da topogra!a local.As "orestas naturais de quercíneas (carvalhos, sobreiros e azinheiras) constituem a vegetação potencial natural de grande parte do nosso País e dominariam no passado a generalidade das paisagens. No entanto, a crescente pressão humana sobre o território conduziu à substitui-ção paulatina dos ecossistemas "orestais naturais por tipos de ocupação do solo relacionados

* Universidade do Porto

à esquerdaFigura 3.1 Distribuição apro-ximada dos grandes tipos de mosaicos de habitats (“ambientes”) reconhecidos no concelho de Ponte de Lima e descritos no texto.

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Quercus robur

Ilex aquifolium

Quercus suber

Ruscus aculeatus

Digitalis purpurea

Aquilegia dichroa

com as actividades produtivas, nomeadamente a agricultura e a produção "orestal. Assim, em grande parte do território nacional, as "orestas naturais possuem uma representação escassa na paisagem, ocupando maioritariamente locais topogra!camente acidentados, menos idóne-os às actividades humanas ou submetidos a processos recentes de abandono. Neste contexto, o concelho de Ponte de Lima possui, em certa medida, um carácter excepcional no contexto do nosso País, uma vez que ainda apresenta representações signi!cativas de alguns tipos de ecossistemas "orestais naturais, nomeadamente nos vales dos principais rios e nas áreas serra-nas da parte oriental do concelho (Serras de Corno de Bico e da Boalhosa) (Figura 3.1).A maior parte do concelho teria estado, no passado, ocupada por extensas áreas de carva-lhal, a vegetação "orestal natural mais representativa do território. Os carvalhais de encosta (A#$%&#&-Q'$()*&# (&+&(*,), actualmente raros nas paisagens limianas (Figura 3.2), são absolutamente dominados pelo carvalho-alvarinho (Quercus robur), com ocorrência pontual do carvalho-negral (Quercus pyrenaica). Nos carvalhais mais sombrios, é relativamente co-mum a presença simultânea do azevinho (Ilex aquifolium), protegido pela legislação nacional, sendo o sobreiro (Quercus suber) um acompanhante frequente dos carvalhos nas encostas mais declivosas e soalheiras. No estrato arbustivo, são comuns a gilbardeira (Ruscus acule-atus), a silva-macha (Rubus ulmifolius) e algumas lianas como a hera (Hedera hibernica) e a madressilva (Lonicera periclymenum). O estrato herbáceo é particularmente rico em gramí-neas (Brachypodium rupestre, Agrostis x fouilladei, Holcus mollis), sendo também comuns a anémona-dos-bosques (Anemone albida), as páscoas (Primula acaulis) e a seixebra (Teucrium scorodonia). Nas orlas destes carvalhais, a dedaleira (Digitalis purpurea), as esporas-bravas (Linaria triornithophora) e a "or-das-viúvas (Aquilegia dichroa) encontram-se entre as "ores mais vistosas da "ora espontânea dos ambientes "orestais. Por vezes, as orlas dos carvalhais são colonizadas por arbustos espinhosos como o escalheiro (Pyrus cordata), conferindo estas formações arbustivas (F(-#.'/&-P0(*&# )&(1-2-$) uma importante protecção ao interior dos bosques.

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Figura 3.2 Aspecto de paisa-gem rural rica em carvalhais

de encosta (Labrujó).Fotogra"a: Joana Vicente.

Figura 3.3 Comunidades brio-liquénicas exuberantes

em bosque de carvalho-alvarinho, dominadas por

Hypnum cupressiforme e Usnea !orida.

Fotogra"a: Cristiana Vieira

A presença de espécies de brió!tas (musgos, hepáticas e antóceros) nos variadíssimos substra-tos de um carvalhal, tais como rochas, troncos, taludes e solo, é um indicador do bom estado de conservação deste habitat. As comunidades de brió!tas desempenham um papel funda-mental na retenção de água e na manutenção e recuperação do solo, sendo nos troncos e nas rochas que se observa a maior diversidade briofítica. Os líquenes mais interessantes crescem sobretudo nos troncos, onde podem ser igualmente abundantes e competir activamente com as brió!tas na captação de recursos. Muitos deles são também bons indicadores da presença de bosques maduros e não contaminados (Figura 3.3).

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Figura 3.4 Comunidades de epífetas em bosque de carvalho-alvarinho, dominadas por Polypodium interjectum.Fotogra"a: Cristiana Vieira.

Entre as espécies de brió!tas mais comuns que colonizam os troncos destacam-se Orthotri-chum lyellii, Ulota crispa, Frullania tamarisci, Metzgeria furcata e Zygodon viridissimus, em etapas de colonização primária. Em carvalhais mais antigos, as árvores de maior porte supor-tam interessantes comunidades de epí!tas (B-(2(-%*&-P&/03&1*&# ,$((-2*), dominadas por brió!tas como Antitrichia curtipendula, Neckera complanata, Hypnum cupressiforme, Ra-dula lindenbergiana e Pterogonium gracile e por líquenes como Lobaria pulmonaria, Lobaria scrobiculata e Nephroma laevigatum, típicos da etapa de sucessão secundária, sendo os fetos (Polypodium interjectum, Davallia canariensis) as únicas plantas vasculares com presença re-gular (Figura 3.4).Os ramos das árvores de maior porte são abundantemente revestidos por líquenes fruticu-losos como Ramalina farinacea, Usnea sub!oridana e Evernia prunastri, entre outros. Por outro lado, as brió!tas que colonizam as rochas e o solo sob um coberto arbóreo fechado bene!ciam de um grau de humidade superior ao de ambientes expostos, o que permite o desenvolvimento de formas de vida de maiores dimensões, tais como as de Dicranum scopa-rium, Eurhynchium striatum, Polytrichum commune e "uidium tamariscinum que podem revestir grandes extensões dentro do carvalhal. Nestas zonas, os líquenes estão praticamente restritos aos ramos mais expostos, onde resistem à competição com as brió!tas. A base dos troncos pode ser colonizada por algumas espécies de Cladonia, designadamente Cladonia coniocraea, Cladonia glauca e Cladonia macilenta, a maioria das vezes associadas ao musgo Hypnum cupressiforme.

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Fraxinus angustifolia

Alnus glutinosa

Salix atrocinerea

Mellitis melissophyllum

Figura 3.5 Woodwardia radicans em ambiente sombrio e húmido no vale do rio Trovela.Fotogra"a: Joana Vicente.

Figura 3.6 Mosaico de bri-ó"tas e líquenes em talude, dominado por Peltigera canina.Fotogra"a: Cristiana Vieira.

Os carvalhais mistos dos solos frescos e férteis da base das encostas declivosas (Pulmonario--Quercion roboris) são "orestas de elevada diversidade vegetal, em que o estrato arbóreo é co--dominado por diversas espécies de árvores, como o carvalho-alvarinho, a aveleira (Coryllus avellana), o padreiro (Acer pseudoplatanus), o freixo (Fraxinus angustifolia) e o castanheiro (Castanea sativa), ocorrendo o amieiro (Alnus glutinosa), o salgueiro-negro (Salix atrocine-rea), o ulmeiro (Ulmus glabra) e o loureiro (Laurus nobilis) nos solos mais frescos. Nas orlas e clareiras destes carvalhais, os aveleirais (Betulion fontqueri-celtibericae) contribuem para a manutenção de um ambiente sombrio e fresco, responsável pela elevada diversidade de plantas herbáceas típica destas matrizes "orestais. Os indicadores herbáceos mais !éis destes bosques mistos são a fentanha (Polystichum setiferum), o feto-de-botão (Woodwardia radi-cans, espécie reliquial com estatuto de conservação; Figura 3.5), a verónica (Veronica monta-na), a urtiga-brava (Mercurialis perennis), o heléboro (Helleborus foetidus), o selo-de-salomão (Polygonatum odoratum), a lisimáquia-dos-bosques (Lysimachia nemorum) e o hipericão--do-gerês (Hypericum androsaemum). Nas suas orlas são comuns plantas arbustivas e her-báceas de ambientes frescos, como o pilriteiro (Crataegus monogyna), a betónica-bastarda (Melittis melissophyllum), o olho-de-gato (Pentaglottis sempervirens), o morangueiro-bravo (Fragaria vesca) e o miosótis-do-bosque (Omphalodes nitida).Nas bases de encostas declivosas, a diversidade de brió!tas que se pode encontrar a colo-nizar o solo e pequenos blocos rochosos em ambientes de bosque é bastante mais elevada do que a diversidade liquénica. A vegetação herbácea dos taludes encobre frequentemente líquenes como Cladonia humilis, Cladonia clorophaea e Lepraria sp. pelo que conferem ao solo uma tonalidade acizentada; dominam espécies de brió!tas como Pseudoscleropodium purum,

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Figura 3.7 Ilustração de cor-ço (Capreolus capreolus).

Mellitis melissophyllum

Parus major

Pyrrhula pyrrhula

Garrulus glandarius

Upupa epops

Picus viridis

Erithacus rubecula

Troglodytes troglodytes

Turdus merula

Turdus philomelos

Accipiter nisus

Buteo buteo

Strix aluco

Martes foina

Lacerta lepida

Bufo bufo

Rana iberica

Rhytidiadelphus loreus, Reboulia hemisphaerica, Lunularia cruciata, Plagiothecium nemora-le, Plagiomnium a#ne, Isothecium myosuroides e Hypnum cupressiforme, enquanto que nas zonas de talude sem vegetação vascular enraízada as brió!tas Pogonatum aloides, Dicranella heteromalla, Diphyscium foliosum, Bartramia pomiformis ou Scapania compacta e os líquenes foliáceos de grandes dimensões, como Peltigera canina e Peltigera polydactila, contribuem para a estabilização do solo dos taludes (Figura 3.6).A diversidade de espécies vegetais e a complexidade estrutural dos carvalhais potenciam a ocorrência, neste tipo de "oresta, de comunidades faunísticas bastante ricas. Assim, a avi-fauna dos carvalhais é bastante mais diversi!cada do que as suas congéneres de outros meios "orestais menos complexos (por exemplo, os povoamentos "orestais). No interior dos carva-lhais, encontram-se espécies arborícolas como a estrelinha-de-poupa (Regulus ignicapillus), o chapim-azul (Parus ater), o chapim-real (Parus major), o papa-!gos (Oriolus oriolus), o dom-fafe (Pyrrhula pyrrhula), a escrevedeira (Emberiza cirlus), o gaio (Garrulus glandarius) e a poupa (Upupa epops), que se movimentam junto às copas, sendo os troncos explorados pela trepadeira-azul (Sitta europea) e pelo pêto-verde (Picus viridis). No sub-bosque bem desenvolvido que se encontra por baixo das copas, são comuns o pisco-de-peito-ruivo (Eri-thacus rubecula), o rouxinol (Luscinia megarhynchos), várias espécies de silvídeos, como a felosa-de-Bonelli (Phylloscopus bonelli), a felosa-ibérica (Phylloscopus brehmii) e a toutinegra-de-barrete-preto (Sylvia atricapilla), bem como a pequena carriça (Troglodytes troglodytes). Nas zonas de clareira, onde o estrato arbustivo é menos denso e o estrato arbóreo mais baixo, predominam os turdídeos como o melro (Turdus merula) ou o tordo-ruivo (Turdus philome-los), e o picanço-real (Lanius meridionalis). Os predadores estão representados pelo gavião (Accipiter nisus), pelo búteo (Buteo buteo) e pela coruja-do-mato (Strix aluco), entre outros.No que diz respeito aos mamíferos de gran-de e médio porte da fauna portuguesa, a maioria das espécies que pode ser encon-trada nas "orestas não é estrita destes ha-bitats. Assim, os animais vão-se des-locando entre um conjunto de vários biótopos na procura de alimento e de abrigo. Entre estas espécies contam-se o lobo (Canis lupus signatus), que re-presenta o maior carnívoro em Portugal e que se encontra em perigo de extinção, e o corço (Capreo-lus capreolus), uma das principais presas naturais do lobo (Figura 3.7). Mamíferos de pequeno porte que ocorrem nestes habitats são, por exemplo, a fuinha (Martes foina), o texugo (Meles meles), o rato-do-campo (Apodemus sylvaticus) e o leirão (Eliomys quercinus).

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A lagartixa-de-Bocage (Podarcis bocagei) é um réptil endémico da Península Ibérica que en-contra nos bosques caducifólios o seu habitat característico. Para além desta espécie, a cobra-rateira (Malpolon monspessulanus), o sardão (Lacerta lepida), a lagartixa-ibérica (Podarcis hispanica) e o licranço (Anguis fragilis) ocorrem nas zonas mais abertas destes habitats. Nos carvalhais habitam também diversas espécies de anfíbios, como a salamandra-de-pintas-ama-relas (Salamandra salamandra), o sapo-comum (Bufo bufo) e o sapo-parteiro (Alytes obste-tricans). Podem ainda ocorrer outros anfíbios, como os endemismos salamandra-lusitânica (Chioglossa lusitanica) e rã-ibérica (Rana iberica), mas a sua presença estará condicionada pela presença de habitats aquáticos adequados. No que se refere aos invertebrados, deve destacar-se a fauna de insectos devido à sua elevada riqueza especí!ca e às complexas interacções ecológicas em que participam. Uma das espécies que merecem destaque é a cabraloura (Lucanus cervus; Figura 3.8), que se encontra protegida por lei. A larva desta espécie alimenta-se de madeira morta, um regime alimentar comum a centenas de outras espécies e que as torna particularmente vulneráveis a alterações do meio. A título de exemplo da grande diversidade de insectos presentes nos carvalhais podem referir-se o grilo (Nemobius sylvestris), abundante na manta morta, o escaravelho (Carabus lineatus lateralis), predador de caracóis e lesmas, e o vespão (Vespa crabro), cujas colónias ocupam normalmente cavidades de árvores). Uma das espécies mais facilmente observáveis nas orlas "orestais é Graphosoma lineatum (Figura 3.9), um percevejo que se alimenta da seiva de di-versas espécies de umbelíferas.A maior parte da área "orestal do concelho de Ponte de Lima é constituída por povoamen-tos intensivos de eucalipto (Eucalyptus globulus) e/ou pinheiro-bravo (Pinus pinaster). Estas matas de produção, particularmente comuns nos solos derivados de xistos mas presentes nas áreas de encosta um pouco por todo o concelho, ocupam, em conjunto, cerca de um terço da área total do concelho, sendo o pinheiro-bravo a espécie mais comum.Quando comparados com as "orestas naturais de caducifólias, os povoamentos "orestais intensivos possuem níveis de diversidade biológica consideravelmente mais baixos. No que se refere às plantas vasculares, o carvalho-alvarinho e o sobreiro são as únicas árvores com presença regular, nomeadamente nos povoamentos de pinheiro-bravo submetidos a gestão menos intensiva. Mais comuns são os arbustos, principalmente os tojos (Ulex latebractea-tus, Ulex minor), as urzes (Erica umbellata, Calluna vulgaris), as giestas (Cytisus striatus) e o feto-comum (Pteridium aquilinum). Como os povoamentos "orestais são constituídos por árvores espaçadas e são submetidos a gestão regular, estão ausentes os elementos "orís-ticos mais característicos dos carvalhais, nomeadamente as plantas nemorais dos estratos herbáceo e arbustivo.Do mesmo modo, a diversidade e a cobertura de espécies de brió!tas são muito reduzidas ou, por vezes, quase nulas, devido ao ambiente acentuadamente seco e exposto e às carac-terísticas edá!cas. Nos solos ácidos típicos destas formações, particularmente nas clareiras onde não existe uma deposição avolumada de folhagem, encontram-se as brió!tas Hypnum cupressiforme, Campylopus pilifer, Dicranella heteromalla, Pseudotaxiphyllum elegans e Di-

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Figura 3.8 Cabra-loura (Lucanus cervus).Fotogra"a: Sónia Ferreira

Figura 3.9 O percevejo (Graphosoma lineatum).Fotogra"a: Sónia Ferreira.

plophyllum albicans. A diminuição de diversidade no substrato cortícola é devida à desagre-gação do ritidoma dos pinheiros e eucaliptos, e assim apenas a base dos troncos é colonizada por brió!tas, nomeadamente por Lophocolea heterophylla, Sematophyllum substrumulosum e por espécies que colonizam o solo. Dos dois tipos de povoamentos "orestais arti!ciais, os pinhais são os mais favoráveis à colonização liquénica, quer ao nível do solo, quer ao nível dos troncos, que podem suportar exemplares notáveis de Usnea, Ramalina e algumas espé-cies a!ns do género Parmelia, como Flavoparmelia caperata (de cor verde) e Parmotrema chinense (de cor azul-acizentada).Apesar do carácter monoespecí!co dos povoamentos de pinho destinados à produção "o-restal, a fauna que neles existe pode ser surpreendentemente diversi!cada. A avifauna dos pinhais, se bem que menos rica do que a das "orestas naturais, apresenta, ainda assim, uma diversidade considerável de espécies. As comunidades de aves presentes num pinhal podem ser mais ou menos ricas, dependendo, entre outras coisas, da existência, ou não, de um sub-bosque, do tipo de povoamento e da intensidade de maneio. Algumas espécies emblemáticas dos pinhais são o chapim-preto (Parus ater), o chapim-de-crista (Parus cristatus), a trepadei-ra-comum (Certhia brachidactyla), várias espécies de corvídeos como a gralha-preta (Corvus corone) e o gaio (Garrulus glandarius), o pica-pau-malhado-grande (Dendrocopus major) e o estorninho-preto (Sturnus unicolor). Entre as aves de rapina, o gavião (Acipiter nisus) e o açor (Acipiter gentilis) são das espécies que mais dependem deste tipo de povoamentos "orestais. Em comparação com os povoamentos de pinhal, os eucaliptais apresentam uma avifauna muito mais pobre. As espécies mais frequentes destes povoamentos, independentemente da

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sua idade, parecem ser a carriça (Troglodytes troglodytes) e o chapim-real (Parus major), en-quanto um conjunto de outras espécies como o chapim-preto (Parus ater), a touninegra-de-cabeça-preta (Sylvia melanocephala) e alguns fringilídeos, como o tentilhão (Fringilla coelebs), o pintassilgo (Carduelis carduelis) e o serino (Serinus serinus) ocorrem com alguma regula-ridade. Se existir um sub-bosque bem desenvolvido pode-se encontrar também o pisco-de-peito-ruivo (Erithacus rubecula), a toutinegra-de-barrete-preto (Sylvia atricapilla) ou o melro (Turdus merula).Os pinhais oferecem uma menor diversidade de alimento e de refúgio aos mamíferos quan-do comparados com os carvalhais, o que in"uencia o número de espécies presentes. O es-quilo (Sciurus vulgaris) é uma presença quase constante neste tipo de habitat. Esta espécie, de hábitos estritamente "orestais, esteve extinta durante muitos anos em Portugal tendo sofrido uma forte expansão recente em todo o N do País a partir das populações espanholas. O javali (Sus scrofa), que constitui outra das presas naturais do lobo e que é uma importante espécie cinegética, a fuinha (Martes foina), o texugo (Meles meles), entre outros, podem tam-bém ocorrer nestes habitats. Nos répteis, pode destacar-se a presença da lagartixa-do-mato (Psammodromus algirus) e da cobra-de-escada (Elaphe scalaris) sobretudo nas zonas mais abertas. Nos eucaliptais, a fauna de mamíferos, de répteis e de anfíbios é escassa, ou nula em alguns casos, uma vez que este tipo de habitat não oferece abrigo e alimento à maioria das espécies destes grupos.Tal como ocorre no caso da "ora, as comunidades de invertebrados presentes nos povoamen-tos "orestais intensivos são consideravelmente menos diversas quando comparadas com as das "orestas naturais, sendo compostas, de uma forma geral, por espécies de ampla distri-buição e baixa especi!cidade ecológica. Assim, em pinhais é possível observar, entre outras espécies, o escaravelho (Carabus rugosus celtibericus), podendo referir-se, relativamente aos eucaliptais, várias espécies que procuram abrigo sob a casca das árvores, como é o caso dos percevejos Melanocoryphus albomaculatus e Rhaphigaster nebulosa. Entre as borboletas, es-pécies como Maniola jurtina e Pontia daplidice podem ser encontradas em pinhais, princi-palmente em zonas de clareira.

Mosaicos agro-!orestaisOs mosaicos agro-"orestais ricos em prados vivazes e "orestas naturais constituem a expres-são de um sistema de exploração e gestão do território de elevado valor ecológico, em que a biodiversidade é favorecida pela intervenção humana. De facto, estes mosaicos de vegetação arbórea, arbustiva e herbácea albergam grande parte da "ora e da fauna típicas dos carvalhais e das suas orlas, ao mesmo tempo que criam condições para a ocorrência da biodiversidade pratense e ainda de espécies adaptadas a estas paisagens complexas.Estes mosaicos agro-"orestais são particularmente característicos das áreas montanhosas do Norte do País, onde prados vivazes (“lameiros”), bidoais e carvalhais de montanha compõem agroecossistemas de elevado valor ecológico e paisagístico. No território de Ponte de Lima, particularmente nas freguesias de Labrujó, Rendufe e Boalhosa, estes sistemas estão repre-

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sentados por uma versão de média altitude, pouco comum em virtude da maior aptidão agrícola do territó-rio e que conhece no Alto Minho a sua expressão mais característica no território nacional.Os prados vivazes (A((4$#-24$-(*&# $ C0#&,'(*&#), explorados para erva, feno ou pasto, são for-mações herbáceas que resultaram do abate dos ecossistemas "orestais naturais (principalmente carvalhais) e são mantidas pelo corte ou pasci-go regulares. As plantas dominantes são tipicamente as gramíneas, em particular a erva-nozelha (Arrhena-therum bulbosum), o feno-de-cheiro (Anthoxanthum odoratum) e a erva-!na (Agrostis x fouilladei). Quando a pressão de corte e/ou pastoreio não é

demasiado grande, estes prados são também ricos em plantas com "oração vistosa, como a centáurea-dos-prados (Centaurea rivularis), o milefólio (Achillea millefolium), a camomila (Chamaemelum nobile) e espécies pouco comuns como Centaurium scilloides e a orquídea Serapias lingua.Neste tipo de ambientes, a abundância de espécies de brió!tas é relativamente reduzida, mas podem surgir espécies com ciclos de vida fugazes como Pleuridium acuminatum e espécies dos géneros Pohlia e Bryum, adaptadas a colonizar solos que sazonalmente sofrem perturbações devido às práticas agrícolas. Podem também ocorrer espécies que dependem da estabilidade de alguns substratos pedregosos (como os muros), tais como Brachythecium albicans ou Scle-ropodium touretii, ou dos solos de canais de rega e dos lameiros, tais como Lunularia cruciata, Fissidens viridulus, Fossombronia angulosa, Kindbergia praelonga ou Philonotis caespitosa.A fauna dos mosaicos agro-"orestais é uma fauna de ecótono, englobando espécies com re-quisitos ecológicos bastante diversi!cados. No que diz respeito à avifauna, espécies associa-das a bosques pouco densos, como os fringilídeos: pintassilgo (Cardeulis carduelis), tentilhão (Fringilla coelebs), serino (Serinus serinus) e verdilhão (Chloris chloris); chapins como o cha-pim-real (Parus major) e o chapim-azul (Parus caeruleus), a rola comum (Streptopelia turtur) e rola-turca (Streptopelia decaocto), convivem com espécies mais típicas de meios abertos, como a laverca (Alauda arvensis), a cotovia-de-poupa (Galerida cristata), a perdiz (Alectoris rufa), a petinha-dos-campos (Anthus campestris), a petinha-das-árvores (Anthus trivialis) e a alvéola-cinzenta (Motacilla cinerea).

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Figura 3.10 Rã-de-focinho-ponteagudo (Discoglossus

galganoi).

Figura 3.11 Aranha Pisaura mirabilis. (Fotogria: Sónia

Ferreira).

Em áreas ocupadas por mosaicos agro-"orestais ocorre uma grande diversidade de espécies de mamíferos. Assim, é possível observar o coelho-bravo (Oryctolagus cuniculus), importante es-pécie cinegética cujas populações têm regredido devido às várias doenças de que têm sido alvo, o ouriço-cacheiro (Erinaceus europaeus), a toupeira (Talpa occidentalis), a doninha (Mustela nivalis), a geneta (Genetta genetta), bem como o javali (Sus scrofa) que, muitas vezes, se des-loca às zonas agrícolas para se alimentar. No caso dos répteis, ocorrem neste tipo de habitat a cobra-lisa-europeia (Coronella austriaca), a cobra-de-pernas-tridáctila (Chalcides striatus) e o sardão, entre outros. A rã-de-focinho-ponteagudo (Discoglossus galganoi) é um anfíbio que aparece inúmeras vezes associado aos lameiros (Figura 3.10). Se estes meios apresentarem lo-cais com água acumulada podem também observar-se alguns tritões como o endémico tritão-de-ventre-laranja (Triturus boscai) ou o tritão-marmorado (Triturus marmoratus).À rica fauna de invertebrados típica dos bosques presentes nos mosaicos agro"orestais soma-se uma diversidade considerável de espécies associadas à vegetação dos prados vivazes. Entre estas encontramse escaravelhos herbívoros como Exosoma lusitanicum, Chrysolina bankii, Apteropeda orbiculata e Sphaeroderma rubidum, sendo também muito conspícua a presen-ça, nas "ores, de outros escaravelhos como Cribroleptura stragulata, Stenurella melanura e Oedemera nobilis. São igualmente frequentes borboletas como Iphiclides podalirius, Colias croceus, Pieris rapae e Celastrina argiolus, e moscas como Episyrphus balteatus, sendo ainda incontornável a presença das abelhas produtoras de mel (Apis mellifera). Menos conspícua é a presença da borboleta Macroglossum stellatarum, cuja forma se assemelha à de um colibri, podendo ocasionalmente ser avistada pairando junto a "ores de cujo néctar se alimenta. Um outro grupo de invertebrados que evidencia neste tipo de habitats uma elevada diversidade é o das aranhas, de que é exemplo Pisaura mirabilis (Figura 3.11).

As Condições Naturais e o Território de Ponte de Lima163 |

Figura 3.12 Aspecto de gies-tal na oprla de um pequeno bosque de carvalhos.Fotogra!a: Joana Vicente.

Matagais, matos e ambientes rochososA vegetação arbustiva de porte baixo (“ma-tos”) a médio (“matagais”) resulta da degra-dação das "orestas naturais e constitui um dos elementos predominantes das áreas de aptidão "orestal deste território. Particu-larmente comuns nas áreas mais elevadas do concelho (Serras de Arga, de Antelas, de Corno de Bico, da Boalhosa, etc.), os matos e matagais são, em geral, frequentes em todas as áreas do concelho situadas acima dos 200 m de alitude, onde alternam, espacial e tem-poralmente, com os povoamentos "orestais de eucalipto e pinheiro-bravo.Os matagais de giestas ou maias, em que a espécie dominante é a giesta-das-vassouras (Cytisus striatus), constituem as formações arbustivas que tipicamente substituem os bosques de carvalhos nos locais onde o solo manteve grande parte das suas propriedades.

Os giestais (Ulici-Cytision striati) são particularmente comuns em solos profundos e com textura ligeira derivados de granitos, como é o caso das Serras de Corno de Bico e da Boa-lhosa (Figura 3.12). Trata-se, em geral, de comunidades pobres em espécies, mas de grande importância ecológica, uma vez que protegem os solos face à erosão e criam condições para a recuperação espontânea dos carvalhais. Além da giesta-das-vassouras, ocorrem com alguma regularidade o tojo-arnal (Ulex latebracteatus), a giesta-negral (Cytisus scoparius) e a giesta-branca (Cytisus multi!orus), sendo esta particularmente comum em áreas expostas aos ventos e regularmente afectadas por incêndios, como é o caso do Monte de S. Lourenço (Armada). Em solos grosseiros derivados de granitos, o codeço (Adenocarpus lainzii) é tipicamente o arbusto dominante. O estrato herbáceo destes matagais é habitualmente pobre, sendo apenas frequentes o feto-comum (Pteridium aquilinum) e a erva-!na (Agrostis x fouilladei).As brió!tas que colonizam rapidamente os solos grosseiros deste tipo de matos têm um papel fundamental na prevenção da erosão dos solos queimados, des"orestados ou simplesmente desprovidos de qualquer tipo de vegetação. Nos giestais, o grau de humidade condiciona a abundância e composição das comunidades briofíticas, daí que a cobertura de brió!tas em con-dições xéricas se resuma muitas vezes a musgos pioneiros como Campylopus pilifer, Dicranella heteromalla e Polytricum piliferum, enquanto que no solo grosseiro sob o coberto de giestais de porte elevado seja favorecida a ocorrência de espécies de brió!tas com crescimento prostrado que se desenvolvem melhor em situações de maior grau de ensombramento, tais como Hyp-num cupressiforme, Hypnum jutlandicum ou Pseudoscleropodium purum (Figura 3.13).

As Condições Naturais e o Território de Ponte de Lima | 164

Figura 3.13 O musgo Pseu-soscleropodium purum forma tapetes densos sob coberto

de giestais.Fotogra"a: Cristiana Vieira.

à direitaFigura 3.14 Aspecto de

mato entre árvores dispersas de pinheiro-bravo (Pinus

pinaster).Fotogra"a: Joana Vicente.

Os matos rasteiros de tojos e urzes são particularmente comuns nas áreas mais elevadas das principais serras e, em geral, nos solos submetidos a perturbação regular e a processos erosi-vos. Os solos derivados de granitos albergam tipicamente tojais altos (Daboecion cantabricae) dominados pelo tojo-arnal (Ulex latebracteatus), em que são também comuns o tojo-molar (Ulex minor), a urze-irlandesa (Daboecia cantabrica) e o feto-comum (Pteridium aquilinum). Estes tojais antecedem, na recuperação natural da vegetação, os matagais de giestas, com os quais estabelecem mosaicos na paisagem (Figura 3.14). Nos solos esqueléticos e pedregosos derivados de xistos, os matos de tojo-arnal são substituídos por urzais-tojais com uma com-

posiçção "orística distinta (Ericion umbellatae), em que predominam o tojo endémico Ulex mi-cranthus (Figura 3.15), o tojo-gatinho (Genista triacanthos), a queiró (Erica cinerea), a torga (Erica umbellata), o sargaço (Halimium alyssoi-des), a carqueja (Pterospartum cantabricum) e a gramínea Agrostis curtisii. Estes urzais-tojais possuem uma expressão signi!cativa no extre-mo setentrional do concelho, onde ocupam ex-tensas áreas na dependência dos ciclos de explo-ração "orestal e dos incêndios.

As Condições Naturais e o Território de Ponte de Lima | 166

Figura 3.15 O tojo endémico (Ulex micranthus).

Fotogra"a: Joana Vicente.

Figura 3.16 Funaria hygro-metrica, musgo pioneiro

de solos recentemente queimados.

Forogra"a: Cristiana Vieira.

Neste tipo de matos, entre a vegetação pioneira, há uma maior predominância de brió!tas com formas de crescimento erectas e densas, adaptadas ao menor grau de ensombramento proporcionado por estas formações vegetais, tais como Polytrichum juniperinum, Campylo-pus pilifer, Polytrichum piliferum, Polytrichum juniperinum ou Racomitrium elongatum. São também pioneiros dos solos ácidos destes matos e de pequenos ramos em decomposição os líquenes fruticulosos do género Cladonia, sobretudo Cladonia rangiformis e Cladonia uncia-lis. Estas espécies podem formar grandes tapetes que se distinguem facilmente da vegetação circundante pela tonalidade mais clara que conferem às áreas mais abertas. Quando se trata de solos submetidos a perturbações que disponibilizam um aporte rápido de nutrientes edá-!cos, tais como fogos ou a presença de gado, o solo pode ser rapidamente colonizado por duas espécies de brió!tas, Ceratodon purpureus e Funaria hygrometrica, habitualmente usadas como indicadoras de perturbação recente (Figura 3.16).Nas clareiras dos matos rasteiros menos densos, ocorre uma grande diversidade de vegetação pioneira que coloniza os solos mais incipientes.A vegetação pioneira mais comum é dominada por plantas anuais (T4$(&-A*(*&#). Os ar-relvados anuais mediterrânicos são caracterizados por apresentarem uma elevada diversidade de espécies pertencentes a um número também elevado de famílias botânicas. São predomi-nantes as espécies de gramíneas (Aira praecox, Anthoxanthum aristatum), cario!láceas (Silene scabri!ora, Spergula arvensis), cistáceas (Xolantha guttata), crassuláceas (Sedum arenarium) e compostas (Arnoseris minima, Hypochoeris glabra). As plantas que dominam estes prados

As Condições Naturais e o Território de Ponte de Lima167 |

Figura 3.17 Tapete de tor-mentelo (Thymus caespitius).Fotogra"a: Joana Vicente.

pioneiros possuem ciclos de vida muito curtos e uma elevada capacidade de dispersão, pro-duzindo um grande número de sementes extremamente pequenas e leves. Não é estranho, portanto, que colonizem com muita facilidade todos os espaços abertos entre a vegetação lenhosa, colorindo a paisagem com "ores de múltiplas cores no início de cada Primavera.Os arrelvados anuais apresentam um carácter efémero nos locais em que o solo permite uma recuperação rápida da vegetação arbustiva após a perturbação. No entanto, nos locais mais afectados por processos erosivos, o solo encontra-se bastante degradado e não possibilita uma colmatação rápida dos espaços pelos matos. Nestas condições, os espaços perturbados per-manecem abertos durante vários anos, o que permite a colonização recorrente por arrelvados anuais e a entrada progressiva de plantas vivazes e perenes. A vegetação pioneira perene (S$-1&-T40%*&# )-$,3*2*2*) está representada pelos tomilhais de tormentelo ("ymus caespiti-tius; Figura 3.17), comunidades características do NW da Península Ibérica. Além do tormen-telo, estas formações albergam tipicamente a gramínea Agrostis commista, diversas espécies de arroz-dos-telhados (Sedum brevifolium, Sedum anglicum), diversas pequenas bolbosas (Romu-lea bulbocodium, Ornithogalum broteroi) e numerosas espécies típicas dos arrelvados anuais, que partilham estes espaços com os tomilhais. Em situações de rocha desagregada e solos grosseiros, os musgos Racomitrium lanuginosum, Polytrichum piliferum, Campylopus pilifer e Campylopus intro!exus surgem como as espécies de brió!tas dominantes (Figura 3.18).Os meios abertos proporcionados pelos diversos tipos de matos e matagais acima descritos apresentam uma fauna característica, embora relativamente mais pobre do que os meios "o-

As Condições Naturais e o Território de Ponte de Lima | 168

Figura 3.18 Comunidades densas dominadas pelo

musgo Racomitrium heteros-tichum, pioneiras na colo-

nização de solos grosseiros resultantes da desagregação

de rochas graníticas.Fotogra"a: Cristiana Vieira.

restais e de ecótono. A avifauna destes biótopos inclui espécies como o picanço-real (Lanius meridionalis), o picanço-de-dorso-ruivo (Lanius senator), a ferreirinha (Prunella modularis), o cartaxo-comum (Saxicola torquata), a toutinegra-tomilheira (Sylvia undata), a toutine-gra-de-cabeça-preta (Sylvia melanocephala), o papa-amoras (Sylvia communis) e o chasco-comum (Oenanthe oenanthe). A águia-cobreira (Circaetus gallicus) é também um visitante comum. Os matos altos são igualmente locais de refúgio para várias espécies de mamíferos, sendo a raposa (Vulpes vulpes) e o coelho (Oryctolagus cuniculus) duas espécies que utili-zam estes habitats. Também os répteis encontram nos meios abertos habitats favoráveis à sua ocorrência, destacando-se a cobra-lisa-meridional (Coronella girondica), a cobra-rateira (Malpolon monspessulanus), a lagartixa-de-Bocage (Podarcis bocagei), entre outros. No que diz respeito aos anfíbios, pode ser encontrado o sapo-corredor (Bufo calamita) e também o sapo-comum (Bufo bufo).Em áreas com matagais e matos, a fauna de invertebrados apresenta-se moderadamente di-versa. Estão habitualmente representadas várias espécies de percevejos, como Coreus margi-natus, Dolycoris baccarum e Eurydema oleracea, e de diversos outros grupos, nomeadamente de louva-a-Deus, de que é exemplo Mantis religiosa, de escaravelhos como Dicladispa testacea e Gonioctena olivacea, de borboletas como Leptotes pirithous e Melanargia lachesis, e também de gafanhotos como Oedipoda caerulescens e Calliptamus barbarus.Os ambientes rochosos de Ponte de Lima, têm alguma expressão nas áreas cuminais das prin-cipais serras (Arga, Antelas e Boalhosa). A vegetação típica das fendas dos a"oramentos ro-chosos (S-5*6(-.*&#) é bastante pobre em plantas vasculares, já que se trata de ambientes pouco idóneos para a sua sobrevivência devido à baixa disponibilidade de água e nutrientes.

As Condições Naturais e o Território de Ponte de Lima169 |

Figura 3.19 Fenda de a!oramento rochoso coloni-zada por musgos e plantas vasculares suculentas, destacando-se a espécie Sedum hirsutum.Fotogra"a: Cristiana Vieira.

Figura 3.20 - Comunidades de musgos e líquenes sobre bloco granítico, dominadas por Lasallia pustulata e Hedwigia ciliata.Fotogra"a: Cristiana Vieira.

Por outro lado, as brió!tas e líquenes constituem elementos importantes e dominantes da com-posição "orística típica das !tocenoses de ambientes rochosos expostos, sendo responsáveis pela acumulação de solo e humidade que facilitam a colonização posterior por pequenas plan-tas vasculares, tipicamente suculentas, como é o caso das espécies do género Sedum (Sedum brevifolium, Sedum hirsutum) (Figura 3.19) e do umbigo-de-vénus (Umbilicus rupestris).

As Condições Naturais e o Território de Ponte de Lima | 170

Figura 2.21 Lagartixa-ibérica (Podarcis hispanica).

A maior diversidade e cobertura de espécies de brió!tas encontra-se em superfícies rochosas com exposição a N, onde podem ser observadas espécies como Andreaea rothii, Frullania tamarisci e Hypnum cupressiforme, em superfícies rochosas ressumantes, onde surgem es-pécies como Bryum alpinum, Racomitrium obtusum e Marsupella sphacelata, e em pequenas cavidades que apresentam espécies mais dependentes da disponibilidade de solo como Cy-nodontium bruntonii, Rhabdoweisia fugax e Pseudotaxiphyllum elegans. Em exposições mais soalheiras e em situações em que há menor disponibilidade de água, a diversidade e a cober-tura de brió!tas diminui, encontrando-se espécies como Grimmia montana, Racomitrium heterostichum e Hedwigia stellata (Figura 3.20).Os líquenes colonizam praticamente toda a superfície das rochas de tal forma que, à distância, a cor de um a"oramento rochoso não é, por vezes, a da rocha propriamente dita mas a dos líquenes que a revestem. O mais apelativo é, sem dúvida, Rhizocarpon geographicum, de cor amarela esverdeada, que coloniza, associado a espécies mais discretas dos géneros Lecanora, Aspicilia e Rinodina, rochas recentemente expostas. À semelhança do que ocorre com as bri-ó!tas, é comum veri!car que a cobertura de líquenes aumenta nas superfícies expostas a N, sobretudo no caso de líquenes foliáceos como Lasallia pustulata e de indivíduos saxícolas de Ramalina. Entre as espécies que colonizam as fendas ou pequenas cavidades da rocha, uma das mais frequentes é Cladonia subcervicornis, tipicamente de cor cinza-escura.A fauna das escarpas e a"oramentos rochosos é, em geral, menos rica (porque mais especia-lista) do que a de outros biótopos, mas inclui várias espécies com particular interesse para conservação. No que diz respeito à avifauna, estes biótopos apresentam especial interesse para as aves de rapina. Espécies como a águia-cobreira (Circaetus gallicus) ou o peneireiro-de-dorso-malhado (Falco tinnunculus) podem ser aqui frequentemente observados. O corvo (Corvus corax) é também uma espécie típica destes meios, tal como o picanço-real (Lanius meridionalis), o chasco-cinzento (Oenanthe oenanthe) e o melro-azul (Monticola solitarius), que utilizam os a"oramentos rochosos para aí construirem o ninho. Também é frequente en-contrar nestes biótopos várias espécies de andorinhas, como a andorinha-das-rochas (Ptyo-noprogne rupestris) ou a andorinha-de-urupígeo-ruivo (Hirundo daurica), assim como o an-

dorinhão-preto (Apus apus). No que se refere aos mamíferos, o gato-bravo (Felis silvestris) ocupa este tipo de ha-bitats, embora possa também ocorrer em zonas "orestais. Algumas espécies de morcegos são !ssurícolas e estarão provavelmente representadas nestes habitats. Quanto aos répteis, a lagarti-xa-ibérica (Podarcis hispanica) é uma presença constante, uma vez que está muito bem adaptada a estes ambien-tes expostos (Figura 3.21).

As Condições Naturais e o Território de Ponte de Lima171 |

Figura 2.22 Pormenor de regato com vegetação herbácea.Fotogra"a: Joana Vicente.

Rios e lagoasPonte de Lima possui uma densa rede hidrográ!ca, centrada no rio Lima e alimentada por precipitações abundantes, ainda que concentradas entre o Outono e a Primavera.Os regatos e pequenos ribeiros dos troços superiores desta rede hidrográ!ca, percorrendo topogra!as acidentadas e possuindo caudal mais ou menos sazonal, apresentam margens pedregosas e naturalmente desprovidas de vegetação "orestal. As plantas vasculares que ti-picamente colonizam as margens destes cursos de água têm porte herbáceo e formam tufos densos, como é o caso da junça-dos-rios (Carex reuteriana) e das gramíneas Deschampsia gallaecica e Molinia coerulea. Nos remansos, os ranúnculos (Ranunculus omiophyllus) e outras plantas de ecologia anfíbia (Juncus bulbosus, Scirpus !uitans) formam tapetes mais ou menos densos e coloridos (Figura 3.22).As condições húmidas expostas destes troços "uviais constituem a ecologia de algumas es-pécies de brió!tas adaptadas à sazonalidade da corrente e à secura estival, como é o caso das espécies que colonizam os blocos rochosos dos leitos, tais como Racomitrium aciculare, Racomitrium aquaticum, Bryum alpinum, Nardia compressa, Platyhypnidium lusitanicum e Marsupella emarginata, ou que habitam no solo encharcado das margens dos regatos, como Polytrichum commune ou Polytrichastrum formosum.Nos solos húmidos e frequentemente encharcados das margens dos principais rios, os car-valhais e aveleirais típicos das áreas de encosta são substituídos por "orestas e matagais de árvores e arbustos adaptados a estes ambientes, como o amieiro e os salgueiros. Na maior par-

te dos casos, as "orestas ripárias (O,%'#-1&-A/#*&# ./'2*#&,-$) ocorrem sob a forma de estruturas lineares que acom-panham as margens dos cursos de água (Figura 3.22), principalmente nos troços mais encaixados dos vales dos principais a"uentes do rio Lima no concelho (rios Estorãos, Labruja, Trovela e Covo). Nestes locais, as "orestas ripícolas são ricas em espécies vegetais, sendo as mais comuns a junça-dos-rios (Carex reuteriana), a sa-xífraga (Saxifraga spathularis), o feto-real (Osmunda regalis) e o junco-dos-bosques (Luzula henriquesii). Nas margens mais rochosas e declivosas, as clareiras das "orestas ripárias são ocupadas por for-mações de loureiro (Laurus nobilis), os louriçais (Arbuto-Laurion nobilis), com carácter reliquial no território e portanto com grande valor para conservação.

As Condições Naturais e o Território de Ponte de Lima | 172

Figura 3.23 Pormenor do rio Estorãos, em local com

galeria r´pícola bem desen-volvida.

Fotogra"a: Joana Vicente.

à direitaFigura 3.24 Comunidades

de leitos rochosos de ribeiros torrenciais, dominadas por Carex reuteriana e Platypni-

dium lusitanicum.Fotogra"a: Cristiana Vieira.

A riqueza da brio"ora ripária é igualmente elevada nos vales ensombrados pelas "orestas ripárias, onde o grau de humidade permite o crescimento exuberante de brió!tas higró!las e aquáticas. A colonização dos leitos e margens rochosas é feita por espécies adaptadas ao impacto das correntes rápidas, como Platyhypnidium lusitanicum, Fontinalis squamosa var. dixonii e Scapania undulata. Outras espécies, como Plagiomnium undulatum, Plagiothecium nemorale, Riccardia multi$da e Marchantia polymorpha, refugiam-se do arrastamento das águas nas rochas emersas. Nas margens dos cursos de água e das levadas, entre as espécies primocolonizadoras que estabilizam os solos dos taludes dos cursos de água sazonalmente emersos, destacam-se Hyocomium armoricum, Fissidens polyphyllus, Atrichum undulatum e Pellia epiphylla (Figura 3.24).Nas topogra!as mais suaves, associadas aos vales dos rios Lima e Neiva e aos troços termi-nais dos seus principais a"uentes, as "orestas ripárias de amieiro, freixo e salgueiro-negro ocupariam no passado uma parte signi!cativa dos terraços aluviais, no entanto a exploração agrícola destes solos férteis limitou a sua presença às margens dos cursos de água. O sub-bos-que destas "orestas-galeria é particularmente rico em fetos, como é o caso do feto-real (Os-munda regalis), do feto-pente (Blechnum spicant), do feto-fêmea (Athyrium $lix-femina) e do feto-macho (Dryopteris borreri). Nas suas orlas, são frequentes arbustos como a silva-macha (Rubus ulmifolius) e o sabugueiro (Sambucus nigra). Nos troços mais largos do rio Lima, acu-mulam-se línguas de areia nas margens e mesmo em pleno leito, formando meandros e ilhas de dimensão variável. Estas línguas de areia, regularmente submetidas a águas torrenciais, são

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Figura 3.25 Tronco de amiei-ro colonizado por líquenes crustáceos e pela hepática

folhosa Frullania dilatata.Fotogra"a: Cristiana Vieira.

colonizadas por formações densas (Salicion salviifoliae) de salguei-ro-branco (Salix salviifolia), que contribuem para a !xação dos sedimentos e contrastam com as "orestas ripárias pelo seu porte ar-bustivo e pela tonalidade cinzenta da sua folhagem.A base dos troncos e as raízes ex-postas das árvores que constituem as galerias ripícolas é frequen-temente colonizada por comu-nidades de brió!tas adaptadas à "utuação de caudal sazonal e cuja composição "orística re"ecte a qualidade físico-química da água. Espécies como Brachythecium ri-vulare, Dendrocryphaea lamyana, Porella pinnata encontram-se em rios com águas pouco poluídas, enquanto poucas são as espécies, como Fontinalis antipyretica ou Leptodictyum riparium, que re-sistem a níveis de poluição acen-tuados. Os troncos mais jovens dos amieiros e salgueiros são inteiramente revestidos por líquenes crustáceos de tonalidades brancas e esverdeadas como Pertusaria amara e Graphis scripta, que colonizam preferencial-mente os ritidomas lisos e macios em ambientes sombrios. Pontualmente, surgem peque-nos talos cinzentos de Parmelia tiliacea e Hypogymnia physodes, associados a musgos como Frullania dilatata e Metzgeria furcata (Figura 3.25).A presença de água é um factor potenciador da ocorrência de uma fauna diversi!cada, inde-pendentemente da altitude ou do tipo de coberto vegetal das margens. Desde logo, a fauna “oculta” destes meios: os invertebrados aquáticos de muitos tipos que os habitam e que neles desempenham funções fundamentais do ponto de vista ecológico. Protozoários, rotíferos e crustáceos, microscópicos, que constituem a maior parte do zooplâncton e que não só con-trolam o crescimento das populações de algas que lhes servem de alimento, como são eles próprios fonte de alimento para outros invertebrados e vertebrados aquáticos. Ocorre tam-bém uma miríade de anelídeos, crustáceos de maiores dimensões, larvas de insectos, etc., ge-nericamente designados por “macroinvertebrados”. O seu contributo é essencial para garantir o bom funcionamento do ecossistema aquático, uma vez que actuam na decomposição da

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Figura 3.26 Toupeira-de-água (Galemys pyrenaicus).Fotogra"a: Henrique Carvalho.

matéria orgânica, limpam a água de materiais em suspensão e são alimento para muitas outras espécies de animais aquáticos. Existem numa enorme quantidade de locais e situações no meio aquático, estando presentes qualquer que seja o grau de pureza ou degradação do curso de água. Pela sua abundância e diversidade de formas de vida são hoje em dia o!cialmente utiliza-dos em muitos países (incluindo Portugal) na avaliação da qualidade das massas de água.A avifauna dos meios ripários inclui espécies com requisitos ecológicos muito variados. Nos troços mais rápidos e sinuosos dos rios pode encontrar-se o melro-de-água (Cinclus cinclus), especialista na caça de insectos aquáticos. Na galeria ripícola associada aos troços mais lar-gos e calmos dos rios encontra-se uma variedade de pequenos passeriformes e espécies a!ns como o rouxinol, o rouxinol-do-mato (Cettia cetti), o chapim-azul (Parus caeruleus), a felosa-poliglota (Hippolais polyglotta), o bico-de-lacre (Estrilda astrild) e o guarda-rios (Alcedo at-this), ao passo que nos terraços "uviais e nas línguas de areia que bordejam as margens, é pos-sível encontrar uma grande diversidade de espécies como as alvéolas branca (Motacilla alba) e amarela (Motacilla !ava), a carriça-dos-caniços (Cisticola juncidis), o borrelho-pequeno-de-coleira (Charadrius dubius), o maçarico-das-rochas (Actitis hypoleucos), a gaivota-prateada (Larus cachinans) e o guincho (Larus ridibundus) e a garça-cinzenta (Ardea cinerea).Em alguns dos a"uentes do rio Lima ocorre a toupeira-de-água (Galemys pyrenaicus; Figura 3.26), mamífero aquático estritamente ligado aos cursos de água, cujos requisitos ecológicos incluem uma boa qualidade da água e um elevado grau de naturalidade das margens. Esta espécie é frequentemente referida como um bioindicador da qualidade do habitat. A lontra (Lutra lutra) ocorre em cursos de água de vários tipos. O toirão (Mustela putorius) ocorre nos corredores ripícolas, e o musaranho-de-água (Neomys anomalus) e o rato-de-água (Arvicola sapidus) habitam nas margens e cursos de água. Entre os répteis, o lagarto-de-água (Lacerta

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Figura 3.27 Lagarto-de-água (Lacerta schreiberi).Fotogra"a: Joana Vicente.

Figura 3.28 Truta-de-rio (Salmo trutta), capturada no rio Lima.Fotogra"a: Alexandre Valente.

schreiberi) é um endemismo ibérico característico das margens das linhas de água nesta região (Figura 3.27). As cobras-de-água (Natrix natrix e Natrix maura) são espécies que também se encontram frequentemente nestes habitats. Nos anfíbios pode destacar-se a presença de duas espécies fortemente ligadas aos cursos de água: a salamandra-lusitânica e a rã-ibérica.A ictiofauna da bacia hidrográ!ca do rio Lima revela algumas diferenças nas comunidades que podemos encontrar no curso principal do rio Lima e nos seus a"uentes. Nas zonas de cabeceira dos principais a"uentes, como o Labuja, o Estorãos e o Trovela, onde o leito do rio é mais grosseiro e diversi!cado, o declive mais acentuado, a velocidade da corrente mais viva e as águas mais oxigenadas, encontramos a truta-de-rio (Salmo trutta; Figura 3.28), o escalo (Squalius carolitertii), e por vezes, em algumas levadas, o ruivaco (Achondrostoma oligolepis). Como são estas as zonas onde se localizam muitas das áreas de desova da truta-de-rio, predo-

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Figura 3.29 Lampreia-ma-rinha (Petromyzon marinus),

capturada na bacia do Lima.Fotogra"a: Alexandre Valente.

Figura 3.30 0 Salmão-do-Atlântico (Salmo salar), capturado no rio Lima.

Fotogra"a: Alexandre Valente.

minam aqui as fracções mais jovens da população; estas trutas jovens, à medida que crescem, procuram zonas mais amplas e vão-se deslocando e colonizando as zonas situadas mais para jusante. Apenas no Inverno, aproveitando as cheias que ocorrem durante a época da reprodu-ção, podemos encontrar perto da cabeceira dos rios as trutas de maiores dimensões.Apesar dos inúmeros açudes que podem ser encontrados ao longo dos cursos de água, a enguia-europeia (Anguilla anguilla) consegue ainda chegar à parte mais alta de alguns rios graças à sua grande capacidade para ultrapassar esses obstáculos. À medida que se desce o rio, a comunida-de vai sendo enriquecida, começando por aparecer a boga (Pseudochondrostoma duriensis); nas zonas mais baixas e calmas do rio aparece ainda o barbo (Barbus bocagei). Em alguns a"uentes, podemos ainda encontrar pequenas populações de esgana-gatas (Gasterosteus gymnurus). Pelo menos num a"uente, o rio Estorãos, o trecho !nal é ainda frequentado pela lampreia-marinha (Petromyzon marinus; Figura 3.29), que aí encontra alguns locais de reprodução e onde se de-senvolve uma população de larvas – as amocetes. Junto à con"uência com o rio Lima, encon-tram-se frequentemente algumas espécies mais comuns no curso principal do Lima, como a solha-das-pedras (Platichthys !esus) e ainda, ocasionalmente, tainhas (Liza aurata).A distribuição natural das espécies piscícolas no rio Lima está, em muitos locais, alterada em resultado das modi!cações a que o rio foi sujeito. As mais evidentes são as barragens do aproveitamento hidroeléctrico de Alto Lindoso (Alto Lindoso e Touvedo); a continui-dade "uvial foi alterada e surgiram lagos arti!ciais em que as condições naturais se viram drasticamente alteradas. Outras modi!cações, de menor dimensão mas igualmente con-dicionadoras para a ictiofauna, são por exemplo o açude criado em Ponte de Lima para garantir o espelho de água junto à vila. Estes obstáculos não só afectam toda a fauna pis-cícola, mas muito especialmente interferem com as deslocações das espécies migradoras que ainda procuram a bacia do rio Lima para se reproduzirem, como a lampreia-marinha (Petromyzon marinus), o sável (Alosa alosa), a savelha (Alosa fallax), o salmão-do-Atlântico (Salmo salar; Figura 3.30) e a truta; interferem igualmente com a migração da enguia-euro-peia em direcção às zonas situadas a montante, onde se estabelece no início do seu período de crescimento nos rios.

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Figura 3.31 A libélula Erythromma lindenii.Fotogra"a: Sónia Ferreira.

Podem portanto ser encontradas espécies sedentárias (ou holobióticas), que são aquelas que completam o seu ciclo de vida na bacia hidrográ!ca, muito embora possam efectuar movi-mentos de maior ou menor amplitude entre diferentes zonas ao longo do curso dos rios, ou entre o Lima e os seus a"uentes. Um segundo conjunto inclui as espécies migradoras, ou an!bióticas, e que podem procurar estas zonas de água doce para se reproduzirem (espécies an!bióticas e anádromas) ou apenas para se alimentarem e crescerem (espécies an!bióticas e catádromas). Algumas espécies, de que a truta é um excelente exemplo, são extremamente plásticas e podem exibir ciclos de vida complexos; alguns exemplares nunca saindo dos rios e outros que se comportam como grandes migradores.Os habitats dulçaquícolas albergam diversos grupos de invertebrados com modos de vida muito distintos. Um dos grupos mais conspícuos, cujas larvas são aquáticas e os adultos de vida aérea, é o das libélulas, representadas nos regatos e pequenos ribeiros por espécies como Calopteryx virgo e Pyrrhosoma nymphula. Em zonas de açudes a primeira é substituída por Calopteryx xanthostoma, que é acompanhada, entre outras, por Erythromma lindenii (Figura 3.31), Platycnemis latipes, Lestes viridis e Sympetrum sanguineum. Entre os invertebrados pre-sentes à superfície, tanto em cursos de água como em lagos, destaca-se o alfaiate (Aquarius najas), por ser a espécie mais frequente do seu grupo. No caso dos escaravelhos aquáticos, merece realce a presença de Rhithrodytes agnus, espécie endémica da Serra de Arga.Nas áreas mais deprimidas, de natureza palustre, os bosques de amieiro e salgueiro (Al-nion glutinosae) que tipicamente dominariam a paisagem albergam um conjunto de espécies particularmente adaptadas a estes ambientes aquáticos estagnados, como é o caso da tabúa (Typha latifolia), do embude (Oenanthe crocata) e do feto-real (Osmunda regalis). Os bos-ques jovens, de crescimento rápido, são tipicamente dominados pelo salgueiro, que é mais tarde superado pelo amieiro, predominante nos bosques maduros. Um pouco por todo o

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3.32 Sapo-de-unha-negra (Pelobates cultripes).

Fotogra"a: Cláudia Soares.

território nacional, os bosques de ambientes palustres foram sendo cortados e os solos dre-nados para exploração agrícola. Assim, os bosques de ambientes palustres do concelho de Ponte de Lima, maioritariamente resultantes de um processo de recuperação após abandono das actividades agrícolas, constituem uma das mais importantes representações destes ecos-sistemas no contexto nacional, reconhecido, por exemplo, através da sua inclusão parcial na Paisagem Protegida das Lagoas de Bertiandos e S. Pedro de Arcos. Também nas freguesias de Correlhã e Vitorino das Donas é possível encontrar interessantes representações destas "orestas palustres.Estes ambientes palustres albergam uma grande diversidade de interessantes tipos de vegeta-ção. Os solos húmidos são colonizados por urzais higró!los (S$((-2'/&-U/*)*&# %*#&(*,) de lameirinha (Erica ciliaris) e tojo-molar (Ulex minor), prados de Molinia coerulea (M&/*-#*&# )&$('/$-$), juncais de Juncus e%usus (J'#)*&# -)'2*6/&(*) e comunidades turfó!-las (R40#)4&,3&(*&# e A#-.-//*1&-J'#)*&#) dominadas por ciperáceas e por musgos como Sphagnum auriculatum, Aulacomnium palustre ou Calliergonella cuspidata. Nas lagoas, organiza-se uma interessante sequência de comunidades, em que se incluem as formações de ervas altas (B(&%&-E'3-2&(*&#) dominadas pelo trevo-cervino (Eupatorium cannabinum), as comunidades anfíbias de Potamogeton polygonifolius (H03$(*)&-S3-(.-#*&#) e as forma-ções de nenúfares (N0%34-$*&#) dominadas pelo golfão-branco (Nymphaea alba).Os ecossistemas palustres, pela sua natureza de transição entre a terra e a água, apresentam uma fauna bastante diversi!cada. A avifauna é constituída por espécies bem adaptadas a am-bientes aquáticos e estruturalmente pouco complexos, como a galinha-de-água (Gallinula chloropus), o mergulhão-pequeno (Tachybaptus ru$collis), a garça-vermelha (Ardea purpu-

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Figura 3.33 Aspecto da paisagem da veiga do Lima, nas imediações de Ponte de Lima.Fotogra"a: Joana Vicente.

rea), o pato-real (Anas platyrhynchos) e o rouxinol-pequeno-dos-caniços (Acrocephalus scir-paceus), entre outros. As Lagoas de Bertiandos e S. Pedro de Arcos constituem um tipo de habitat aquático raro nesta região do País e que proporciona a ocorrência de uma elevada diversidade de espécies de répteis e anfíbios. Assim, estão presentes o cágado-de-carapaça-estriada (Emys orbicularis), o tritão-palmeado (Triturus helveticus), a rela-comum (Hyla ar-borea) e o sapo-de-unha-negra (Pelobates cultripes; Figura 3.32), entre outras.De entre as valas associadas às Lagoas de Bertiandos e S. Pedro de Arcos, algumas revestem-se de carácter temporário, podendo estar completamente secas, no Verão, ou congeladas, nos períodos mais frios. Nas valas em que se encontra água em permanência a taxa de circulação é fraca e a sua qualidade do ponto de vista piscícola (concentração de substâncias, oxigénio dissolvido, temperatura, etc.), degrada-se rapidamente. Poucas são as espécies e poucos são os indivíduos que sobrevivem durante muito tempo, e os raros peixes que se encontram re-sultam da colonização feita a partir do rio Estorãos nos períodos de grandes cheias em que o rio transborda do seu leito. No que se refere aos invertebrados, em áreas palustres é possível observar várias libélulas, como é o caso de Ischnura graellsii e Anax imperator, sendo esta a mais conspícua pela sua grande dimensão e comportamento territorial. Entre os crustáceos destaca-se Lepidurus apus, que ocorre em charcos temporários e, em Portugal, é unicamente conhecido no concelho de Ponte de Lima.

Áreas rurais e urbanasAs áreas rurais e urbanas possuem uma diversidade biológica muito particular e em geral bastante rica, excepto nas áreas urbanas mais impermeabilizadas e em ambientes rurais par-ticularmente intensi!cados.

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Figura 3.34 Paisagem com mosaico policultural

(Rendufe).Fotogra"a: Joana Vicente.

As áreas agrícolas mais conspícuas em Ponte de Lima, onde é praticada uma agricultura especializada e intensiva centrada na produção de milho, encontram-se localizadas nas áreas planas e de menor altitude (“veiga do Lima”; Figura 3.33) associadas ao vale do rio Lima e às partes terminais dos vales dos seus principais a"uentes. Nestes espaços intensamente cultivados há pouco espaço para a vegetação natura; no entanto é considerável a diversidade "orística, principalmente de plantas anuais com ciclo de vida adaptado à sazonalidade das práticas agrícolas. Na Primavera, as comunidades de ervas daninhas (S)/$(-#24*&# -#-#'*) são, em geral, dominadas pela "oração intensa de espécies como o pampilho-de-micão (Coleostephus myconis) e a soagem (Echium plantagineum); no Verão, a junça (Cyperus escu-lentus) invade os campos de milho e domina a vegetação arvense (P&/0.&#&-C4$#&3&1*&# 3&/0,3$(%*). Nas orlas dos campos são frequentes diversos tipos de prados (P&2$#2*//*&# -#,$(*#-$) e juncais (M$#24&-J'#)*&# *#6/$5*) adaptados aos solos férteis e frescos da veiga. Nas depressões mais húmidas e nas valas de rega e drenagem, são conspícuas as co-munidades helofíticas dominadas pela salgueirinha (Lythrum salicaria) e pelo embude (Oe-nanthe crocata) e as comunidades anuais de persicária (Polygonum persicaria) e pimenta-de-água (Polygonum hydropiper).Nos mosaicos policulturais típicos das áreas de baixa altitude, os campos de milho convivem com diversos tipos de parcelas agrícolas (vinhas, pomares, hortas), constituindo paisagens de elevada diversidade e complexidade em que as comunidades de ervas daninhas assumem por vezes grande exuberância (Figura 3.34). Nestas paisagens ocorrem também regularmente prados vivazes de erva e pascigo (Cynosurion cristati) dominados pela erva-lanar (Holcus

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Figura 3.35 A borboleta Vanessa atalanta.Fotogra"a: Sónia Ferreira.

lanatus), pelo panasco (Dactylis lusitanica), pelos trevos (Trifolium repens, Trifolium pratense) e pela tanchagem (Plantago lanceolata).O cultivo da oliveira (Olea europaea) no vale do rio Lima é bastante favorável à instalação de diversas espécies de brió!tas e líquenes, albergando comunidades que só encontram con-dições idênticas nos troncos de algumas árvores dos carvalhais de encosta. É de assinalar a presença de brió!tas como Orthotrichum lyelii, Leucodon sciuroides e Antitrichia curtipen-dula e a elevada cobertura de líquenes foliáceos de grandes dimensões, incluindo Lobaria scrobiculata, Nephroma laevigatum e Degelia plumbea, para além de Pannaria mediterranea, sobretudo nas árvores mais antigas, cujos troncos podem atingir diâmetros consideráveis. Os ramos das oliveiras são tipicamente colonizados por líquenes crustáceos, e os líquenes fruticulosos estão praticamente ausentes, provavelmente devido à frequência das podas a que estão sujeitas as árvores.Entre as espécies da fauna ligadas aos habitats agrícolas, incluem-se, como aves mais comuns, o pardal-montês (Passer montanus), o rabirruivo-preto (Phoenicuros ochruros), a escrevedei-ra-de-garganta-preta (Emberiza cirlus), a codorniz (Coturnix coturnix) e o mocho-de-orelhas (Otus scops), entre outros. As aves de rapina estão representadas pelo tartaranhão-caçador (Circus pygargus). Outros vertebrados frequentes são a ratazana-preta (Rattus rattus), o ou-riço-cacheiro (Erinaceus europaeus), a lagartixa-de-Bocage (Podarcis bocagei), o sardão (La-certa lepida), a rã-verde (Rana perezi) e o sapo-comum (Bufo bufo). Os mosaicos policulturais apresentam, geralmente, uma diversidade de invertebrados bastante superior à das áreas de cultivo intensivo. De facto, além de serem ocupados por espécies da maioria dos grupos, estes mosaicos albergam, muitas vezes, espécies raras ou de distribuição restrita, que são fa-vorecidas pela heterogeneidade da paisagem. Entre as espécies frequentemente observadas encontram-se as borboletas Vanessa atalanta (Figura 3.35), Papilio machaon e Pieris brassicae,

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Figura 3.36 Homalothecium sericeum, musgo que coloniza a su-

perfície de muros em locais pouco perturbados.

Fotogra"a: Cristiana Vieira.

os percevejos Syromastes rhombeus e Nezara viridula e as joaninhas Coccinella septempuncta-ta e Oenopia conglobata.Os ambientes urbanos e viários constituem espaços arti!ciais e em geral impermeabilizados, em que é diminuto o espaço disponível para a vegetação. Com excepção da vila de Ponte de Lima, as áreas urbanas e viárias do concelho constituem habitualmente mosaicos paisagísti-cos com as áreas agrícolas e, em menor grau, com os povoamentos "orestais.Nas entulheiras, bermas de estradas e outros espaços ruderalizados, ocorre uma conside-rável diversidade de vegetação nitró!la anual (H&(1$*&#) e vivaz (D-')&-M$/*/&2*&#, E)4*&-G-/-)2*2*&#), em que são particularmente importantes espécies como o funcho (Foeniculum piperitum), os cardos (Galactites tomentosa, Carduus tenui!orus), o belouro-branco (Verbascum crassifolium), a raspa-saias (Picris echioides), a soagem-maior (Echium rosulatum) e diversas gramíneas anuais dos géneros Bromus, Avena e Lolium. Nos ambien-tes viários, em particular nos caminhos empedrados, ocorrem comunidades de pequenas plantas anuais adaptadas ao pisoteio (P&/0)-(3*&#). As fendas de muros e paredes de ca-sas velhas (P-(*$2-(*&-G-/*&#, C0%+-/-(*&-A,3/$#*&#) são colonizadas por plantas especializadas e bastante conspícuas como a parietária (Parietaria judaica) e a cimbalária (Cymbalaria muralis).Em territórios de baixa altitude onde predominam as terras planas e férteis e os ambien-tes urbanos e viários, a mobilização e poluição dos substratos colonizáveis pelas brió!tas conduziu frequentemente a uma diminuição acentuada da cobertura e diversidade das comunidades e à redução dos elencos briofíticos a espécies primocolonizadoras pouco

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especí!cas. Os habitats terrícolas mais frequentes em mosaicos humanizados, os talu-des, são locais onde as brió!tas se tornam mais conspícuas e assumem um papel de pri-mocolonização, promovendo a estabilização dos planos inclinados. Nestes habitats, em condições higró!las, podemos encontrar espécies como Fissidens bryoides, Atrichum un-dulatum, Calypogeia $ssa, Cephalozia bicuspidata, Lophocolea bidentata, Minum hornum ou Plagiomnium a#ne, mas em taludes ácidos mais expostos a cobertura e diversidade em espécies de brió!tas reduz-se signi!cativamente e as comunidades assemelham-se às ambientes expostos, com espécies como Campylopus pilifer, Dicranella heteromalla ou Pogonatum aloides.Os muros das orlas de campos e outras construções em xisto ou granito constituem ambientes rochosos arti!ciais colonizados por comunidades de brió!tas e líquenes que espelham as con-dições de humidade, e exposição das áreas envolventes (Figura 3.36). Em zonas com menor grau de perturbação e poluição as comunidades brioliquénicas são constituídas por espécies de brió!tas como Porella obtusata, Schistidium apocarpum e Homalothecium sericeum, po-dendo também ser extraordinariamente ricas em líquenes, a maioria de tendência nitró!la e alguns bastante coloridos, como Xanthoria parietina, Neofuscelia pulla e Xanthoparmelia conspersa. Os substratos mais perturbados e frequentemente associados a cimentos são co-lonizados por espécies como Bryum capillare, Bryum argenteum, Tortula muralis, Trichosto-mum crispulum ou Didymodon insulanus. Nestes substratos básicos que resultam da aplicação de cimentos surgem algumas espécies normalmente associadas a rochas carbonatadas como Physcia adscendens e Placynthium nigrum.Os ambientes urbanizados foram colonizados por espécies de fauna com uma larga plasti-cidade ecológica e que, nalguns casos, acabaram por !car dependentes deste tipo de meios. Entre as aves das zonas urbanizadas e arti!ciais, as espécies que mais se evidenciam são o pardal-comum (Passer domesticus), o pombo-das-rochas (Columba livia), a andorinha-das-chaminés (Hirundo rustica), a andorinha-dos-beirais (Delichon urbica) e a coruja-das-torres (Tyto alba). Outras espécies que ocorrem nestas zonas, mas que precisam de substratos ar-bustivos e arbóreos com uma certa dimensão (parques e jardins, por exemplo), são as diversas espécies de fringilídeos (serino, tentilhão, pintassilgo), a rola-turca (Streptopelia decaoto) e o mocho-galego (Athene noctua). Entre os mamíferos, a raposa (Vulpes vulpes) é uma espécie oportunista que ocorre na periferia de zonas urbanas. No caso dos répteis, a lagartixa-ibérica (Podarcis hispanica) habita os muros de pedra que dividem as propriedades. A fragmentação do habitat e a perseguição humana que se veri!ca nestas áreas di!culta, no entanto, a ocor-rência de muitas espécies animais.Apesar da arti!cialidade dos ambientes urbanos e viários, a fauna de invertebrados presente é razoavelmente diversa, em grande medida devido à existência de quintais e áreas ajardinadas e/ou incultas, que possibilitam a presença de espécies típicas quer de matos, quer de áreas agrícolas. É o caso da bichacadela (For$cula auricularia) e de alguns escaravelhos (Oxythyrea funesta e Lagria hirta), sendo igualmente possível observar diversas espécies de borboletas, incluindo Vanessa cardui, Pieris napi e Phragmatobia fuliginosa.

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3.1.2. Conservação da biodiversidade no concelho de Ponte de Lima

Os habitats como suporte da biodiversidade e da sua conservaçãoOs diversos tipos de ecossistemas presentes no concelho suportam importantes funções eco-lógicas e ambientais, entre as quais se destacam a sustentabilidade produtiva da paisagem e a conservação de uma interessante diversidade biológica.As "orestas naturais de carvalhos, salgueiros, amieiros, aveleiras e outras espécies de árvores constituem a vegetação natural de máxima complexidade e equilíbrio com as condições do meio. São, em conformidade, ecossistemas produtores de elevada biomassa, capazes de prestar serviços de grande relevância ambiental e de albergar uma grande diversidade de "ora e fauna, incluindo espécies de elevado valor para conservação. O corte de pequenas parcelas "orestais e a sua substituição por prados cortados regularmente para erva e feno contribuiu para a cons-trução de mosaicos agro-"orestais de elevado valor cénico e ecológico, potenciando a riqueza especí!ca que neles atinge níveis insuperáveis no território. Um pouco por todas as áreas de montanha do N de Portugal, estes mosaicos paisagísticos encontram-se submetidos a proces-sos mais ou menos acelerados de abandono, com consequências ainda incompletamente esti-madas sobre a biodiversidade. No extremo oposto, a intensi!cação agrícola ou "orestal destes mosaicos (com cultivos exóticos de elevada produtividade) pode induzir impactos profundos no seu equilíbrio ecológico, incluindo a perda dos habitats de numerosas espécies.Os espaços abertos, com cobertura vegetal menos densa e de menor porte, constituem áreas de menor importância ecológica global mas fornecem abrigo a um interessante conjunto de espécies que aqui encontram as condições ideais para a sua sobrevivência. Os a"oramentos rochosos albergam comunidades brio-liquénicas de grande originalidade e espécies vegetais com interessantes adaptações às condições de vida extremas fornecidas por estes biótopos. Os matos rasteiros, assim mantidos pelo uso regular do fogo e pelo pastoreio de passagem, pos-suem baixo valor ecológico mas revelam-se importantes para a conservação da fauna, além de constituirem paisagens exclusivamente europeias no contexto global. Os matagais de giestas assumem uma maior relevância ecológica, pela sua capacidade !xadora e enriquecedora do solo em azoto, criando condições para a recuperação natural das "orestas de carvalhos. Em síntese, a complementaridade da biodiversidade destes espaços face à que pode ser observada nos espaços "orestais atribui-lhes elevada importância e justi!ca a de!nição de estratégias de gestão que façam o compromisso entre a conservação da biodiversidade e a sustentabilidade global do território.Os sistemas húmidos do concelho albergam também uma riquíssima diversidade biológica, facto reconhecido através da sua classi!cação ao abrigo de diversos estatutos. As "orestas ripícolas e palustres, habitats prioritários à escala comunitária, constituem ecossistemas de elevada produtividade vegetal e suportam importantes comunidades de plantas e animais, dominando mosaicos paisagísticos de elevado valor ecológico e fundamentais na regulação dos "uxos hídricos e de outros ciclos biogeoquímicos. As margens do rio Lima, importante corredor ecológico incluído na Rede Natura 2000, suportam imponentes "orestas-galeria e

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densos salgueirais arbustivos que fornecem abrigo a muitas espécies animais. A paisagem dominada pelas Lagoas de Bertiandos e S. Pedro de Arcos, alberga mais de uma dezena de habitats naturais (Anexo I da Directiva “Habitats”), incluindo dois considerados prioritários. A protecção destes sistemas revela-se, portanto, da maior importância para a conservação da biodiversidade e do equilíbrio ecológico do território.As áreas rurais e urbanas caracterizam-se pela maior intensidade da presença humana, pelo que estão em geral ausentes destes espaços representações signi!cativas de habitats naturais. Quando intensamente ocupadas e exploradas, estas áreas possuem baixos níveis de biodiver-sidade, como é o caso de grande parte da veiga do Lima. Pelo contrário, os espaços policultu-rais de baixa intensidade, comuns nas áreas de encosta, caracterizam-se pela elevada diversi-dade de espécies vegetais e animais, em particular no que se refere às plantas vasculares, aos insectos e às aves, incluindo algumas espécies com valor para conservação.Em Anexo listam-se os habitats naturais classi!cados ao abrigo do Anexo I da Directiva “Habitats”, que constitui o principal instrumento legislativo de salvaguarda da diversidade biológica europeia.

A !ora e a fauna: valores assinaláveis no concelho de Ponte de LimaNo que se refere à "ora vascular com maior valor para conservação, Ponte de Lima possui alguns elementos de grande originalidade dentro do contexto nacional. Entre as espécies lis-tadas no Anexo II da Directiva “Habitats” podem citar-se Veronica micrantha e o feto-do-botão (Woodwardia radicans). Veronica micrantha é uma espécie que ocorre pontualmen-te em alguns locais do Noroeste da Península Ibérica. No Alto Minho, aparece associada a zonas agrícolas policulturais, sendo conhecida em poucos locais e tendo populações muito pequenas. O feto-do-botão ocorre em Portugal na Serra do Gerês, no vale do rio Trovela e na serra de Freita e Arada. Tendo possuído outrora uma distribuição mais alargada, esta espécie refugiou-se nos vales mais abrigados quando o clima se tornou desfavorável.No concelho ocorrem também outras espécies que, apesar de não terem qualquer estatuto de protecção, podem ser consideradas importantes em termos de conservação. Algumas dessas espécies ocorrem em habitats raros no território mas que ainda se encontram relativamente bem representados. As turfeiras e os matos higró!los de baixa altitude são, em conjunto com as zonas dunares e as zonas de solos esqueléticos de montanha, os habitats mais ricos em en-demismos no NW da Península Ibérica. O pequeno arbusto espinhoso Genista ancistrocarpa ocorre na zona do Baixo Lima, concretamente nas imediações das Lagoas de Bertiandos e S. Pedro de Arcos, tipicamente em matos higró!los de baixa altitude. Devido ao desapareci-mento do habitat típico desta espécie, motivada pela expansão das áreas agrícolas em zonas de baixa altitude, esta espécie desapareceu em vários locais da nossa costa. Outra espécie com uma presença semelhante no concelho é a ciperácea Rhynchospora modesti-lucennoi, consti-tuindo esta a população mais setentrional da Península Ibérica dada a recente extinção das populações galegas. Estas duas espécies encontram-se citadas no Livro Vermelho da Flora Vascular Espanhola como em perigo de extinção.

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à direita:Feto-do-botão (Woodwardia radicans)

No que diz respeito às brió!tas, a riqueza da região resulta da heterogeneidade e estado de conservação de habitats que proporcionam redutos de colonização para as espécies que sur-gem um pouco por toda a região do Minho, mas também para algumas espécies mais raras listadas na Lista Vermelha Ibérica. As espécies de brió!tas mais ameaçadas relacionam-se principalmente com ambientes aquáticos, onde a destruição das galerias ripícolas e a dete-rioração da qualidade da água e do leito diminuem a qualidade de habitats para espécies que colonizam blocos rochosos de cursos de pequena dimensão e classi!cadas como “Vulnerá-veis” (Radula holtii, Racomitrium lusitanicum) ou espécies que surgem nas raízes expostas das margens consideradas “Quase Ameaçadas” (Porella pinnata), com dados muito escassos ("amnobryumn maderense) ou já alvo de alguma atenção (Cryphaea lamyana). Em solos húmidos do concelho podem também encontrar-se duas espécies “Vulneráveis” (Ditrichum cylindricum e Bruchia vogesiaca).Em rochedos graníticos e a"oramentos rochosos, a desagregação da rocha e a exploração comercial de granitos podem constituir perigos adicionais a espécies cujos dados de distri-buição evidenciam alguma necessidade de atenção para a conservação das suas populações (Campylostelium strictum e Andreaea heinemannii subsp. crassifolia) ou que são reconhecidas como novas e com poucos dados acerca da sua distribuição (Hedwigia stellata). Outras espé-cies de brió!tas são também alvo de protecção através da legislação comunitária por serem exemplo de espécies cuja colheita na natureza e exploração devem ser objecto de medidas de gestão (anexo V da Directiva 92/43/CEE). Exemplo disto são as espécies colhidas de forma mais intensiva para !ns decorativos e para "oricultura (Leucobryum glaucum e espécies do género Sphagnum) cujas populações podem sofrer declínios acentuados pelas perturbações causadas na capacidade reprodutiva da espécie.As comunidades clímax de líquenes epí!tos dos bosques caducifólios europeus (L&+-(*&#) têm sofrido uma franca regressão nas últimas décadas. A fragmentação destes bosques, os incêndios e a contaminação atmosférica são as principais causas apontadas como causadoras do declínio destas comunidades. Das espécies de líquenes presentes no concelho, as mais ameaçadas são Lobaria scrobiculata e Degelia plumbea, consideradas “Ameaçadas”, tratando-se de espécies epí!tas que surgem de forma pontual associadas a formações arbóreas pouco perturbadas, bem conservadas e estáveis. Embora localmente abundantes, as espécies Flavo-parmelia caperata e Parmotrema chinense são consideradas “Vulneráveis”, já que requerem uma certa estabilidade ambiental. Apesar destes estatutos de protecção atribuídos às espécies de líquenes pela comunidade cientí!ca, nenhuma das espécies referidas se encontra protegida por legislação nacional, sendo apenas consideradas como espécies de interesse comunitário as pertencentes ao subgénero Cladina (aqui referidas como Cladonia), designadamente Clado-nia rangiformis e Cladonia uncialis, listadas no anexo V da Directiva “Habitats”.As aves do concelho contam com dezasseis espécies ameaçadas, ou quase ameaçadas, a nível nacional (Livro Vermelho dos Vertebrados) e/ou internacional (Directiva Europeia das Aves). A garça-vermelha e o tartaranhão-caçador encontram-se “Em Perigo”, enquanto que o açor, o maçarico-das-rochas, o noitibó-da-europa (Caprimulgus europaeus), a ógea (Falco subbuteo)

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e o falcão-abelheiro (Pernis apivorus) têm o estatuto “Vulnerável”. Seis outras espécies apresen-tam o estatuto de “Quase Ameaçadas”: rouxinol-pequeno-dos-caniços, petinha-dos-campos (Anthus trivialis), águia-cobreira, corvo, picanço-de-dorso-ruivo e o tordo-ruivo (Turdus phi-lomelos), no que se refere às populações nidi!cantes. Com excepção do açor e da ógea, todas as espécies com o estatuto “Em Perigo” e “Vulnerável” integram também a lista da Directiva Europeia das Aves (Anexo A-I), tal como o guarda-rios, a petinha-dos-campos, a laverca e a toutinegra-tomilheira, que não se encontram presentemente sob ameaça no nosso País. Ocorrem, ainda, várias espécies de vertebrados terrestres com elevado valor para a conserva-ção, que apresentam estatuto de ameaça ou que são endémicas da Península Ibérica. Entre os mamíferos, encontra-se o lobo, espécie “Em Perigo de Extinção” sobretudo devido à persegui-ção humana, que ainda hoje se veri!ca ilegalmente. A toupeira-de-água e o gato-bravo são es-pécies que apresentam o estatuto de “Vulnerável”, sendo a primeira, também, um endemismo ibérico. Os morcegos encontram-se insu!cientemente estudados e portanto não se conhece a sua diversidade no concelho. No entanto, é um grupo que estará com certeza representado na área e cuja maioria das espécies apresenta estatuto de ameaça. Nos répteis e nos anfíbios, o cágado-de-carapaça-estriada encontra-se “Em Perigo”, e a cobra-lisa-europeia, a salamandra-lusitânica, e o tritão-palmeado são espécies “Vulneráveis”, sendo o maior factor de ameaça para as populações das espécies destes grupos a destruição do seu habitat. A lagartixa-de-Bocage e o lagarto-de-água, bem como a salamandra-lusitânica, o tritão-de-ventre-laranja, a rã-ibérica, e a rã-de-focinho-ponteagudo são espécies endémicas da Península Ibérica muito bem representadas neste território..No que se refere à ictiofauna, embora as espécies sedentárias também possam ver a sua sobrevi-vência ameaçada, são as espécies migradoras que por diversas razões, mais facilmente se podem deparar com factores que podem afectar negativamente as suas populações. Apenas uma das espécies sedentárias se considera ameaçada, o esgana-gatas, considerado “Em Perigo”. Infeliz-mente todas as espécies migradoras são consideradas ameaçadas em Portugal, embora o nível de preocupação seja diferente entre elas. De entre as espécies da bacia hidrográ!ca do rio Lima é o salmão do Atlântico que é considerado a espécie mais ameaçada, tendo-lhe sido incluído na categoria “Criticamente em Perigo”; a enguia-europeia e o sável foram incluídos na categoria “Em Perigo”, e a lampreia-marinha e a savelha na categoria “Vulnerável”. Quer isto dizer que metade das espécies piscícolas da bacia do Lima se encontram de alguma forma ameaçadas.As importantes lacunas de conhecimento que ainda se veri!cam no concelho di!cultam signi-!cativamente a valoração da fauna de invertebrados do ponto de vista patrimonial. Esta análise torna-se ainda mais complexa devido à inexistência de um Livro Vermelho de Invertebrados de Portugal, sendo que o único documento legal com aplicação a espécies de invertebrados é a Directiva 92/43/CEE, entretanto transposta para o direito interno. Desta forma, para além das duas espécies legalmente protegidas conhecidas do concelho (Lucanus cervus e a borboleta Eu-phydryas aurinia), salienta-se a ocorrência de Rhithrodytes agnus, Lepidurus apus e Cychramus luteus. Lucanus cervus, a cabra-loura, é uma espécie associada a "orestas de folhosas autóctones que depende da existência de madeira morta para a alimentação na fase larvar. Por essa razão, a

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Figura 3.37 Erva-da-fortuna (Tradescantia !uminensis). Fotogra"a: Joana Vicente.

principal ameaça que se veri!ca é a perda de habitat, através da redução da área ocupada pelas folhosas autóctones e da diminuição da disponibilidade de madeira morta (árvores mortas e partes mortas de árvores vivas). Euphydryas aurinia é uma borboleta de ampla distribuição em Portugal continental, sobre a qual não são actualmente reconhecidos factores de ameaça signi!cativos. No que se refere a Rhithrodytes agnus, escaravelho aquático endémico da Serra de Arga, a alteração da qualidade da água constitui o factor de ameaça mais importante; no en-tanto os conhecimentos a este respeito são ainda muito reduzidos. Lepidurus apus é um crus-táceo registado de uma única localidade a nível nacional (Correlhã), desconhecendo-se a sua situação em termos de conservação. Situação idêntica pode ser referida no caso do escaravelho Cychramus luteus, que em Portugal é apenas conhecido de dois locais relativamente próximos entre si, um dos quais situado no concelho de Ponte de Lima (Queijada).

Novas e velhas ameaças: espécies exóticas invasorasDevido às excepcionais condições climáticas do concelho de Ponte de Lima, é longa a lista de "ora vascular exótica invasora neste território. As perturbações antropogénicas ao nível da composição da paisagem favorecem o aparecimento e expansão destas espécies. O género Acacia é o mais problemático no que diz respeito à "ora exótica infestante, encontrando-se representado no concelho por três espécies: a mimosa (Acacia dealbata), a austrália (Acacia melanoxylon) e a acacia-de-espigas (Acacia longifolia), que se encontram distribuídas por uma grande diversidade de habitats, desde as margens de linhas de água até às zonas to-pogra!camente mais elevadas. Em solos esqueléticos derivados de xisto, ocorre uma outra espécie de hábito espinhoso que forma moitas impenetráveis. Trata-se da háquea-espinhosa

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Figura 3.38 Campylopus intro!exus, musgo invasor

em solos secos de locais perturbados.

Fotogra"a: Cristiana Vieira.

(Hakea sericea), espécie que tal como as Acacias é de origem australiana e possui o mesmo comportamento piró!to. Durante um incêndio, os frutos da háquea resistem às elevadas tem-peraturas, abrindo de seguida e libertando as sementes na área ardida, assegurando assim a colonização integral do terreno. Para além das infestantes arbóreas e arbustivas, existem algumas herbáceas que são problemáticas porque colonizam ambientes "orestais. A erva-da-fortuna (Tradescantia !uminensis; Figura 3.37) consegue viver em ambientes com um nível de luminosidade muito baixo, em áreas sujeitas a perturbação moderada. Ocorre muitas vezes associada a zonas "orestais invadidas por acácias em ambientes mais húmidos, ocorrendo por vezes em habitats prioritários como os louriçais e os bosques ripícolas.Em Ponte de Lima, a única brió!ta invasora conhecida é Campylopus intro!exus, uma espécie que constitui um dos exemplos mais típicos de introdução recente no continente europeu. Sendo um musgo quase sempre fértil, tem-se tornado muito frequente e, sem qualquer dúvi-da, trata-se de uma espécie extremamente prejudicial para a manutenção das comunidades terrícolas autóctones. A sua presença está ligada a ambientes com uma certa perturbação antrópica e surge em solos abertos, húmidos, fazendo parte de comunidades "orestais, geral-mente degradadas ou com in"uência de fogos ou em caminhos (Figura 3.38).Também na região ocorrem algumas espécies exóticas invasoras de vertebrados, como é o caso da tartaruga-da-Flórida (Trachemys scripta). No entanto, não existem ainda estudos que forneçam uma indicação positiva ou negativa sobre o grau de preocupação que a presença local destas espécies implica.A bacia do rio Lima tem escapado, em certa medida, à grande praga de introdução de espé-cies piscícolas exóticas que se têm visto aparecer sucessivamente nos rios portugueses. Não

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Truta arco-íris (Oncorhyn-chus mykiss)

se conseguiu, contudo, manter totalmente imune a esse processo. Assim, e de acordo com o anexo I do Decreto-Lei n.º 565/99, foram já introduzidas na bacia do Lima o pimpão (Caras-sius auratus) e a carpa (Cyprinus carpio). Um caso mais recente é o da introdução da truta arco-íris (Oncorhynchus mykiss). A justi!cação para a introdução da carpa e da truta arco-iris é, provavelmente, o seu interesse para a pesca desportiva.Embora não se possa considerar uma espécie exótica, a truta-de-rio (Salmo trutta) criada em viveiros tem sido largamente utilizada para efeitos de repovoamentos dos rios considera-dos truteiros da bacia hidrográ!ca do Lima. A análise genética das populações autóctones e dos animais utilizados nos repovoamentos mostrou que o papel dos repovoamentos é muito restrito, se não mesmo nulo; contudo, esta estratégia para aumentar o efectivo das trutas nos rios onde a pesca desportiva é mais intensa deve ser repensada face aos riscos de degradação genética das populações selvagens de truta-de-rio. Outro animal aquático que se pode encon-trar na bacia do rio Lima, pelo menos no trecho !nal do rio Estorãos, é o lagostim-vermelho-da-Louisiana (Procambarus clarkii), considerada uma espécie com risco ecológico conhecido (Anexo III do Decreto Lei n.º 565/99).Os conhecimentos sobre a ocorrência e distribuição de invertebrados exóticos no concelho são muito limitados, podendo referir-se unicamente a presença do escaravelho da batata (Leptinotarsa decemlineata) e do longicórnio dos eucaliptos (Phoracantha semipunctata). No que se refere à primeira destas espécies, cujo impacto económico é muito signi!cativo pelos prejuízos que origina no cultivo da batateira, não são conhecidos efeitos ecológicos adversos, dado que a sua acção parece limitar-se à batateira, não competindo dessa forma com espécies autóctones. Relativamente a Phoracantha semipunctata, trata-se igualmente de uma espécie causadora de prejuízos económicos, mas desprovida de impactos ecológicos negativos.