TRÁFICO DE MULHERES NO LESTE EUROPEU E A QUESTÃO DE SEGURANÇA NO PÓS-GUERRA FRIA

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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE INSTITUTO DE ESTUDOS ESTRATÉGICOS GRADUAÇÃO EM RELAÇÕES INTERNACIONAIS Marília Daniela Silveira da Silva TRÁFICO DE MULHERES NO LESTE EUROPEU E A QUESTÃO DE SEGURANÇA NO PÓS-GUERRA FRIA Niterói 2013

Transcript of TRÁFICO DE MULHERES NO LESTE EUROPEU E A QUESTÃO DE SEGURANÇA NO PÓS-GUERRA FRIA

UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE INSTITUTO DE ESTUDOS ESTRATÉGICOS GRADUAÇÃO EM RELAÇÕES INTERNACIONAIS

Marília Daniela Silveira da Silva

TRÁFICO DE MULHERES NO LESTE EUROPEU E A QUESTÃO DE SEGURANÇA NO PÓS-GUERRA FRIA

Niterói 2013

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Marília Daniela Silveira da Silva

TRÁFICO DE MULHERES NO LESTE EUROPEU E A QUESTÃO DE SEGURANÇA NO PÓS-GUERRA FRIA

Monografia apresentada ao curso de Relações Internacionais da Universidade Federal Fluminense como requisito parcial para a obtenção do Grau de Bacharel em Relações Internacionais com ênfase em Estudos Estratégicos

Orientador: Prof. Dr. Thiago Rodrigues

Niterói 2013

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Marília Daniela Silveira da Silva

TRÁFICO DE MULHERES NO LESTE EUROPEU E A QUESTÃO DE SEGURANÇA NO PÓS-GUERRA FRIA

Monografia apresentada ao curso de Relações Internacionais da Universidade Federal Fluminense como requisito parcial para a obtenção do Grau de Bacharel em Relações Internacionais com ênfase em Estudos Estratégicos

BANCA EXAMINADORA

_______________________________________________________ Prof. Dr. Thiago Rodrigues – Orientador

_______________________________________________________ Prof. Dr. Fernando Roberto de Freitas Almeida – Leitor

Niterói 2013

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Agradecimentos

Agradeço primeiramente aos que me deram a vida e me acompanharam nessa jornada:

meu pai, Eduardo Moreira da Silva, que acredita incondicionalmente na capacidade de seus

filhos e fez da educação destes seu objetivo maior, e minha mãe, Eliane Machado Silveira da

Silva, pelo seu amor, atenção, paciência e por me fazer crer na ambição e na independência

feminina.

Aos meus irmãos, sem os quais eu nada seria, Carlos Eduardo Silveira da Silva e Luís

Fernando Silveira da Silva, pelas dicas e proteção típicas de irmãos mais velhos. À minha

irmã, Elisa Maria Costa e Silva de Paiva, pelo carinho e atenção, e aos meus sobrinhos,

Antônio e Alice, que me lembram constantemente pelo que vale a pena lutar.

Agradeço aos meus amigos mais antigos, Thayara, Thaís e Lorena, pelos quase vinte

anos de apoio constante, mesmo quando a vida nos lança pelos seus caminhos diversos, e aos

amigos mais próximos, confidentes de preocupações e alegrias durante esses quase cinco anos

Matheus Paludetto, Melissa Guterres e Deborah Amaral, que fizeram este caminho mais

simples e doce.

Por fim, agradeço aos inúmeros colegas do curso de Relações Internacionais por sua

companhia e aos professores, responsáveis pelo crescimento acadêmico que possibilitou a

existência deste trabalho.

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Resumo

O fim da Guerra Fria possibilitou o crescimento dos grupos criminosos e a

globalização ampliou sua ação a níveis mundiais. Os Estados se viram diante da incapacidade

de lidar com as novas ameaças através dos meios e conceitos teóricos tradicionais. A ameaça

à sobrevivência estatal demanda dos atores internacionais respostas urgentes e definitivas.

Inseridos nessa lógica, a exploração e o tráfico de mulheres nos países fragilizados do

Leste Europeu se fez notar com especial atenção nos últimos anos e suas amplas

consequências, sendo a principal a perda de poder estatal, são sentidas pelos países membros

da União Europeia como ameaças a sua existência, apoiando-se assim o discurso securitizador

e impelindo a reação imediata quanto à região e ao problema destacados.

Palavras-chave: Securitização; Tráfico de mulheres; Leste Europeu; Novas ameaças.

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO.....................................................................................................................7

2. SEGURANÇA INTERNACIONAL E AS NOVAS AMEAÇAS...... ..............................10

2.1 O pós-Guerra Fria e as novas questões na agenda internacional............................10

2.2 Definindo segurança: visão tradicional e a teoria de securitização.........................12

3. HISTÓRICO DO TRÁFICO DE PESSOAS E DA EXPLORAÇÃO FEMININA......17

3.1 O produto humano: diferenças no decorrer do tempo e “white slavery”................17

3.2 O tráfico de mulheres nos dias atuais......................................................................19

4. A SITUAÇÃO NO LESTE EUROPEU: DESAFIOS Á SEFURANÇA REGIONAL E

A ATUAÇÃO DA UNIÃO EUROPEIA...............................................................................22

4.1 Definindo o Leste Europeu.....................................................................................22

4.2 A infiltração do crime organizado no Estado.....................................................24

4.3 União Europeia e a questão de segurança...........................................................27

5. CONCLUSÃO...........................................................................................................33

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS........................................................................35

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1. INTRODUÇÃO

Quando adentra o curso universitário de Relações Internacionais (RI), em qualquer

instituição que o ministre, a grande maioria dos infantes aprendizes será instruída dentro dos

conceitos explicativos de uma teoria que se debruça sobre o funcionamento do Estado, sua

posição perante o sistema internacional, a importância do interesse de Estado-nação e do

aparato militar para sua garantia.

A partir de exemplos que datam da antiguidade aos tempos atuais, o aluno de RI é

convidado, então, a aceitar a naturalidade desses conceitos para explicar toda a história

conhecida, assim como o caminho que leva a elucidação dos fenômenos de guerra e paz entre

os atores protagonistas do sistema. Sob esse panorama de invariância da natureza o aprendiz,

em especial o realista, encontrará sua cartilha, útil para explicar qualquer fato futuro ante a

circularidade temporal, buscando apenas a adequação de qualquer novo acontecimento à

explicação sistemática.

As teorias hegemônicas distinguem as políticas interna e externa de um país e pouco

consideram a importância da sociedade para a formulação da política, o que leva a

visualização de um sistema de “bolas de bilhar”, ou seja, blocos internamente consensuais em

sua ação externa previsível em torno de seus dois interesses primordiais: sobrevivência e

expansão no sistema anárquico. Quando aprendemos a pensar com essa imagem de mundo é

fácil perder a consideração inicial da ação individual e de grupos internos na determinação do

papel do Estado no cenário mundial. O Estado, ele próprio, se torna uma entidade, um

individuo agindo de acordo com as leis que a estrutura determinou.

Ainda, existe no campo o que podemos chamar de uma confusão entre o sentido

técnico e o corriqueiro das palavras, conforme quando nos referimos à própria denominação

“Relações Internacionais”. Afinal, o que realmente está se estudando são os Estados

nacionais, mas as diversas nacionalidades que podem existir dentro dela são por vezes

ignoradas. Comumente, por razões de simplificação, utilizamos o nome do Estado como se

ele representasse o interesse total das partes internas. Ao falarmos que a União Soviética

exercia tal política ou respondeu a uma ação dos Estados Unidos dessa ou daquela maneira

durante a Guerra Fria ignoramos que essa decisão pertence a um círculo de indivíduos, menos

ou mais abrangente, e não a outros diversos grupos nacionais numerosos internamente. As

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“relações internacionais” não se consagram pelo estudo das relações entre nações e sim das

“relações interestatais”.

O estranhamento dessa situação, especialmente ante os novos atores de importância na

arena internacional, já motivou diversos outros trabalhos de alunos de RI. Para a monografia

presente se destaca a motivação relativa a um mesmo questionamento, compartilhado por

outros aprendizes: “onde estão as pessoas nas Relações Internacionais?” (TIMO, 2010, p. 9).

A seguinte análise busca a resposta a essa pergunta em dois grupos intrinsecamente

ocultos de grande parte da consciência pública geral e da lógica de ação estatal: os grupos

organizados de crime transnacional e sua atuação no que se refere ao tráfico de mulheres.

Busca-se atingir por meio desta monografia uma maior compreensão do alcance de tal

fenômeno a nível global, considerando sua influência no processo de tomada de decisões

internas e externas dos Estados no que visa sua segurança. A impossibilidade de conseguir de

modo satisfatório explicitar os elementos desse tipo de iniciativa em uma perspectiva global,

somada ao reconhecimento de sua abrangência, suas implicações na política europeia e a clara

influência do crime organizado nos aparelhos estatais no Leste Europeu encaminharam a

escolha para a ocorrência do fenômeno nessa região.

A questão maior a ser examinada na monografia concerne em como a ação dos

grupos responsáveis pelo comércio ilegal de bens e pessoas influencia as ações e escolhas dos

Estados. O problema perpassa as questões surgidas após o fim da Guerra Fria e a hipótese

aqui relacionada é a consideração de como a atuação das redes de crime organizado é

percebida como uma ameaça à sobrevivência e atuação do Estado soberano e a consequente

securitização do tema. Através da análise de documentos oficiais da União Europeia se busca

inferir a validação ou não desta hipótese. Casos conhecidos em que o poder e a soberania

estatais se encontram alterados devido à atuação das redes de crime também serão analisados

para tal propósito. Sob essa ótica, a sociedade e as chamadas novas ameaças assumem aspecto

essencial para a compreensão da política internacional atual. Essas ameaças se tornam um

desafio para os Estados pela falta de meios efetivos e teorias satisfatórias que abranjam seu

combate.

O mote da pesquisa, por ser alvo de maiores atenções apenas recentemente, configura-

se o maior desafio para a investigação do tema. Tal qual o narcotráfico, o terrorismo e o

tráfico de armas o tema tem recebido contribuições esparsas e apenas atualmente tornou-se

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tema focal das preocupações de segurança internacional, apesar de sua existência datar de

bem antes do fim da Guerra Fria e do aumento do alcance da globalização. Assim sendo, os

pesquisadores desses temas acabam por contar com um limitado material com o qual trabalhar

no que se refere às ciências políticas e análises de relações internacionais. As fontes

existentes, entretanto, têm por pontos positivos a contemporaneidade de seus dados e a

relevância na análise da ordem atual.

A monografia está organizada em quatro partes, sendo estas: (ii) Segurança

internacional e as novas ameaças, (iii) Histórico do tráfico de pessoas e da exploração

feminina, (iv) A Situação no Leste Europeu: Desafios à segurança regional e a atuação da

União Europeia e, (v) Considerações Finais.

O primeiro capítulo tem por objetivo assinalar o desenvolvimento das questões

referentes às chamadas “novas ameaças”, assim como o conceito de securitização nas RI e sua

aplicação quanto ao tema. No segundo capítulo busca-se analisar o contexto histórico do

problema do tráfico de mulheres. O desenvolvimento dessa questão no Leste Europeu, tal qual

a caracterização do problema no que se refere a uma ameaça à segurança da região podem ser

encontrados no terceiro capítulo, onde são realizados os estudos referentes à documentação

oficial acerca do problema. Por fim, o último capítulo apresenta uma revisão sobre o tema e

os resultados da pesquisa.

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2. SEGURANÇA INTERNACIONAL E AS NOVAS AMEAÇAS

2.1. O pós-Guerra Fria e as novas questões na agenda internacional

Em 1945, o fim da Segunda Guerra Mundial e a derrota alemã alteraram a ordem

mundial até então conhecida ao apresentar ao mundo dois polos conflitantes no cenário

mundial. Munidos de um poder destrutivo impensável até algumas décadas e de aparatos

ideológicos opostos, os Estados Unidos e a União Soviética representavam o choque entre

capitalismo e socialismo em meio a um cenário que encontrava a Europa em situação delicada

após os conflitos seguidos que a atingiram e países periféricos sem força de contestação aos

poderes hegemônicos.

As tensões latentes entre os Estados e a percepção de perigo iminente influenciavam

nas decisões de governos, instituições e indivíduos. A ameaça de uma guerra “quente”, em

que o conflito entre os dois países escalaria ao ponto da utilização do armamento nuclear e da

consequente destruição sem precedentes exigia o interesse e esforços de ambas as partes na

solução das questões mundiais, em meio à mediação e esperanças dos espectadores da

resolução das questões pela racionalidade dos Estados.

Mais de quarenta anos passaram-se até a desvantagem econômica e política soviética

culminar no processo que resultou em seu desmembramento e adoção de um modelo

ocidentalizado e capitalista. A falta de aliados resultante das subdivisões do próprio

socialismo, a necessidade de suporte constante dos Estados menores pertencentes à União, o

abismo cada vez maior que se interpunha entre suas capacidades tecnológicas e armamentistas

em comparação aos Estados Unidos e a recuperação dos Estados europeus e ascensão dos

Estados periféricos, trazendo para o sistema novas questões e forças, causou o

enfraquecimento e consequente fim do conflito, mais pela implosão soviética do que pela

demonstração de poder americana (HOBSBAWM, 1996).

Eclipsados pela importância desse conflito outras questões se desenvolviam no cenário

mundial. As chamadas “novas ameaças” não são resultado da globalização ou da realidade

apresentada no pós-guerra, como erroneamente pode-se pensar devido a atenção relativamente

recente dada pelas teorias e noticiários. A maioria das questões hoje abordadas vêm

desenrolando-se desde antes do começo da Guerra Fria, ocorrendo uma conjunção de fatores

que leva a sua centralidade no que refere-se às preocupações acerca de segurança

internacional atuais.

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O mundo que viu a ascensão da União Soviética não era o mesmo que viu sua

derrocada. A tecnologia havia se desenvolvido de maneira surpreendente, levando o aumento

das trocas de informação em um nível de rapidez surpreendente. As sociedades estavam mais

interconectadas e dependentes umas das outras, em uma tendência que nos anos seguintes

apenas se ampliou. Outros países obtiveram acesso à produção de armas nucleares e a paz

mundial já não era mais dependente apenas das decisões dos polos reconhecidos, mas de um

acordo mais inclusivo a esses novos poderes. A economia financeira representava outra face

desta interligação e revelava a importância de atores não estatais e seu poder de influência no

capitalismo moderno. No descortinar deste novo ato a derrota do inimigo principal permitiu

que as preocupações dormentes referentes a questões mais ligadas à sociedade civil

ganhassem atenção.

As novas ameaças podem ser entendidas como o grupo de questões a que os analistas

internacionais creditam estar ligado o futuro das preocupações mundiais em um contexto de

segurança mais amplo e globalizado (BOBBITT, 2003; MATHIAS e SOARES, 2003). Essas

ameaças não partem de um Estado específico, o que dificulta sua resolução tendo em vista a

incapacidade e teórica e legal da ação governamental. Podemos citar como algumas dessas

ameaças questões referentes a danos ao meio-ambiente, terrorismo, tráfico de pessoas, tráfico

de armas, narcotráfico, crimes cibernéticos, pirataria etc. Essas questões, mesmo não tendo

sua origem com a globalização, são extremamente interligadas ao aumento e facilitação das

trocas mundiais. Além disso, mesmo consideradas em suas particularidades, apresentam a

semelhança de influírem diretamente em aspectos econômicos, políticos e sociais,

ultrapassando mesmo sua área reconhecida de ação e, por isso mesmo, tornaram-se desafios

em nível mundial.

A ligação das novas ameaças com as sociedades civis, sejam essas ameaças formadas

por indivíduos, grupos com certa organização de ação ou toda a humanidade (como é o caso

da ambiental), pode ser apontado como um dos principais causadores da ineficiência no

combate a esses problemas. Estados estão acostumados a lidar com outros Estados e as teorias

principais que pautam suas relações encontram dificuldades em antever o tipo de ação a ser

tomada uma vez que o inimigo escape da definição construída historicamente. A guerra como

continuidade das relações diplomáticas, como definida por Karl von Clausewitz, um dos

autores mais evocados pelos teóricos do realismo, não pode ser aplicado a tal realidade já que,

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primeiramente, a solução na maioria das vezes não parece ser possível através da diplomacia

ou mesmo da ação militar convencional (KALDOR, 2007).

Uma dessas “novas ameaças” e tema a ser tratado por esta monografia, o comércio

ilegal não difere muito do comércio legal em seus objetivos e dinâmica geral. A regra

primordial é a oferta e procura de bens e serviços, sob o objetivo de ganhos materiais por

parte do ofertante e satisfação das necessidades e expectativas do consumidor. A disposição

de produtos no mercado negro não se limita aos aspectos morais e legais, havendo em seu

“catálogo” cigarros, obras de arte, drogas, armas, pessoas (e suas partes), dados virtuais,

informações etc. Variar os produtos ofertados e combiná-los quando possível é a regra e não a

exceção do comércio ilegal. Igualmente, foi-se o tempo em que uma máfia podia ser apontada

com certezas e seu negócio coibido ao se fechar o cerco sobre o produto ofertado. Hoje em

dia, “é competitivamente menos vantajoso controlar, do começo ao fim, a cadeia de

fornecimento de um determinado produto” (NAÍM, 2005, p. 35), o que explica a preferencia

pela ação conjunta, em redes globais, de grupos diversos, espalhados por vários territórios.

De acordo com Moisés Naím, existem três ilusões que permeiam o assunto “comércio

ilegal”: a de que o fato não há novidades em sua ação (e, consequentemente ignora as

transformações ocorridas desde a antiguidade aos dias atuais); a percepção do problema

através apenas de seu teor criminal e não pelo viés sistemático e a visão do processo

criminoso como separado da vida normal dos Estados e sociedades. Os ataques terroristas de

11 de setembro de 2001 nos Estados Unidos serviram para alterar a concepção dada a este

tipo de ameaça para os Estados, exigindo respostas imediatas e globais. O comércio ilegal tem

ação sutil perto do terrorismo, se infiltrando no governo e agindo nas estruturas pelo lado

interno. Não há intenção de destruição das estruturas que constituem o Estado e de anarquia,

pois os grupos criminosos se apropriam e aproveitam de sua existência e as fronteiras

aumentam seu lucro e limitam a ação estatal.

2.2 Definindo segurança: visão tradicional e a teoria de securitização

O caos na ordem internacional ocasionado pelo turbulento começo do século XX

causou enormes mudanças nas percepções sistêmicas até então desenvolvidas. A Primeira

Guerra e a Segunda Guerra sepultaram a inocência acerca da violência entre Estados, da

efetividade diplomática e do tamanho da destruição ocasionados pelos conflitos

internacionais. Mesmo durante a Guerra Fria é difícil definir o que era “segurança nacional”

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para os Estados então, uma vez que o termo poderia ser empregado de diferentes formas e

sem um escopo teórico delimitado de forma clara Mesmo com alguns teóricos tentando criar

definições satisfatórias, o uso mais frequente do termo se dava através dos tradicionalistas

como um sinônimo de defesa e das práticas relacionadas ao poder, o verdadeiro meio e fim da

época (BUZAN, 1983).

Com o esfriamento das tensões entre os dois protagonistas da Guerra Fria durante os

anos 1970 e 1980 abriram-se espaços para que novas questões recebessem atenção mundial e

se desenvolvessem nos anos seguintes. No campo das RI podemos perceber o surgimento de

teóricos de caráter crítico ao status quo, que viam o pensamento tradicional deste campo

ligado à perspectiva hegemônica e sua tentativa de manutenção de poder. A questão da

segurança voltou a receber atenção sob o pensamento construtivista, do qual deriva a

percepção de que as bases da disciplina estão submetidos às concepções formuladas pelos

atores internacionais, ou seja, são “what actors make of it” (WENDT, 1992). Nesse contexto,

o conceito de segurança aparece ligado a outros fenômenos e se estende para abarcar o papel

de atores marginais em sua definição.

De acordo com a teoria tradicional como percebida por Barry Buzan, Ole Waever e

Jaap Wilde (1998), segurança internacional é um conceito ligado à própria sobrevivência do

Estado. O conceito se encontra assim relacionado aos interesses vitais de auto-preservação no

sistema anárquico e seus temas são abordados através da visão tradicional de poder e a

legitimidade das ações à emergência em sua abordagem. A partir desta percepção, a primazia

das atenções estatais volta-se para o aspecto militar, havendo, entretanto, lugar para

preocupações nos campos político, econômico, sociais e ambientais. Permeando esses campos

o conceito de segurança representa o temor do Estado acerca de ameaças a sua existência, seja

por via da força, por questionamentos à sua legitimidade e soberania, pela quebra de suas

normas e instituições, da incapacidade de manutenção das identidades nele contidos e do

colapso dos níveis atuais de civilização.

Segundo a teoria desenvolvida pela Escola de Copenhagen, segurança é “the move

that take politics beyond the established rules of the game and frames the issue either as a

special kind of politics or as above politics” (BUZAN et al, 1998, p.23). O que se infere é que

não há um ou vários temas que estejam ligados intrinsicamente com o conceito aqui

explorado, sendo este passível à consideração dos Estados acerca de sua importância para a

existência/sobrevivência estatal. Buzan, Waever e Wilde dividem o interesse do Estado por

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esses assuntos em três categorias: nonpolicized, em que o assunto está aquém dos interesses

estatais e debates públicos; policized, no qual o tema já demanda certa atenção governamental

e é parte das preocupações publicas e securitized, quando o assunto é tido como uma ameaça

existencial ao Estado e demanda ação emergencial. Assim, percebemos que o conceito de

segurança não pode ser compreendido como sinônimo de defesa e poder, correspondendo, de

modo mais preciso, à percepção de cada Estado acerca das ameaças, tradicionais ou não, que

podem atingir sua população ou instituições e demandam um plano de ação que enfraqueça ou

extermine tal perigo à sua existência. A compreensão dessas ameaças se modifica tanto no

tempo quanto no espaço e uma questão considerada de determinada importância por

determinado Estado, pode não significar o mesmo em outro ou pode até alterar sua posição

nesta classificação para esse mesmo Estado no decorrer do tempo.

Mesmo os outros Estados permanecendo como protagonistas das preocupações e

medos no sistema, não tendo perdido seu posto de atores mais importantes nele contidos, é

certo que outras questões causarão temor e insegurança, chamando os Estados à ação. A

interdependência global determina a rede de segurança sistêmica, mas cabe ainda a cada um

desses atores protagonistas a consideração de quais destas questões, sejam as novas ameaças

ou as tradicionais, interferem na definição do interesse nacional. Às ameaças que um Estado

poderá enfrentar, muitas delas não apresentarão soluções por vias tradicionais, assim

limitando a capacidade unilateral e criando as bases da segurança internacional. Nas palavras

de Buzan:

“These objects of security multiply not only as the membership of the society of states increases, but also as we move down through the state to the levels of individuals, and up beyond it to the level of the international system as a whole. Since the security of any other referent object of level cannot be achieved in isolation from the others, the security of each becomes, in part, a condition for the security of all.” (1983, p.13)

A teoria de securitização de Buzan, Waever e Wilde lança novas luzes sobre como

diferentes assuntos se tornam parte do escopo do bloco que constitui a segurança de um

Estado. Como o trecho acima salienta, há no mundo atual inúmeras questões sujeitas a essa

classificação, entretanto algumas delas ganham lugar sob o holofote das atenções e vinculação

aos interesses fundamentais de um Estado. Segundo tal teoria podemos identificar a escolha

dessas questões por um ator securitizador. Uma vez definida a prioridade do Estado quanto à

segurança, os grandes desafios deste ator passam a ser a formulação de um discurso

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legitimador da ação e a ação propriamente dita, ou, como lidar de forma prática com a ameaça

(BARBOSA e SOUSA, 2010).

Um objeto secutitizado existe “not necessarily because a real existential threat exists

but because the issue is presented as such a threat” (BUZAN et al, 1998, p. 24) e a sociedade

reconhece e aceita a realidade da ameaça, futura e hipotética. Segundo os autores, a

securitização tem sucesso quando apresenta 3 componentes: “existential threats, emergency

action, and effects on interunit relations by breaking free of rules” (1998, p. 26). Em um

mundo globalizado se impõe a resolução multilateral de problemas, o que só é atingido na

concordância dos Estados acerca de determinado tema, o que leva muitas vezes à necessidade

de convencimento da audiência internacional, sendo alguns desses atores mais privilegiados

na articulação da securitização, assim como na prática existem alguns limites no que tange os

assuntos a serem tratados.

A aplicação da securitização em uma ordem repleta de ameaças não tradicionais

encontra problemas já que tanto a teoria quanto a prática por parte dos Estados não estão

preparadas para lidar com o tipo de objeto que devem enfrentar. O uso da força militar

tradicional não consegue lidar com os desafios impostos pelo terrorismo ou o crime

internacional, como fatos recentes deixaram comprovados. A definição de segurança nacional

ligada à defesa e ao poder limitou a ação a lógica dualista e comparativa ao conflito entre

Estados, o que dificulta o combate de grupos descentralizados, sem território especifico e/ou

internos ao Estado ameaçado.

A multiplicação dos assuntos ligados à segurança dificulta a definição das prioridades

e pode gerar um estado de atenção e medo constantes para a população e a mobilização

permanente das forças e instituições estatais ligadas às ameaças mais imediatas ou próximas.

Isso causaria um problema de paralisação das engrenagens e burocracias ligadas ao Estado

para a resolução de perigos não imediatos e de difícil combate. A segurança total não deve ser

vista como o objetivo final (e que move todos os interesses para este caminho), mas como “a

kind of stabilization of conflictual or threatening relations, often through emergency

mobilization of the state” (WAEVER, 1995 apud BUZAN et al, 1998, p. 4).

Outra falha da construção e representação da ameaça é o aspecto ideário nela contido.

Seguindo ainda a caracterização da ameaça com a comparação à guerra, a imagem passada a

população e o medo associada a ela podem ser exagerados, de modo que a ação obtenha

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aprovação da sociedade, e usada para fins diferentes dos expressados pelos grupos que detém

a legitimidade do uso da voz do Estado, ou seja, têm a autorização de falar por todos nele

contidos. A força, politica ou econômica, pode ser usada em adversários políticos e

econômicos sob pretextos outros que a ação visando interesses escusos. A construção do

inimigo é permitida através da securitização das ameaças utilizando-se dos mais diversos

argumentos. Assim, cabe o questionamento de até quão longe a busca por segurança pode ser

utilizada como justificativa de ação.

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3. HISTÓRICO DO TRÁFICO DE PESSOAS E DA EXPLORAÇÃO FEMININA

Em se tratando da questão de gêneros no contexto geral da história, a mulher sempre

sofreu perante a associação de inferioridade e submissão as vontades do homem, o que levou

a condições de constante medo e conformação à superioridade masculina. Mulheres são

frequentemente o elo mais fraco de uma cadeia de abuso e miséria, sendo encontrado em

realidades diversas as inúmeras questões políticas e sociais derivadas desta inferioridade. Este

trabalho contempla uma das faces desse problema através da observação do tráfico de

mulheres, crime que apresenta consequências nos campos diplomático, social, político e

econômico. Neste capítulo a questão é tratada através de seus viés histórico para melhor

compreensão do problema a nível internacional e dos esforços multilaterais movidos. Com

especial atenção vislumbramos as resoluções europeias, próprias ao interesse central desta

monografia.

3.1 O produto humano: diferenças no decorrer do tempo e “white slavery”

A exploração do ser humano como produto, passível de compra, venda e troca, não é

fato novo na história conhecida. Guerreiros, mulheres jovens e crianças foram, por muito

tempo, considerados espólios de guerra e deviam aceitar seu destino de constante troca e

submissão á força do outro (SALES et al., 2005). Nesse primeiro período não há uma clara

distinção dentre o produto explorado e explorador, senão a de sua situação de inferioridade

frente a outro poder, exemplo que pode ser observado nos casos da Grécia antiga e do império

romano. Nesse contexto, dentro de um mesmo grupo étnico e em uma sociedade, haveria

donos e escravos. A possibilidade da “troca de papéis”, em que um escravo se torna líder e

passa a ter seus próprios servos era submisso às limitações da força e da riqueza, com poucas

chances de reversão de sua posição (MELLO, 2000).

Na Europa do período feudal o camponês trocava a liberdade pela proteção ofertada

por seu senhor. Entretanto, a privação de diversos de seus direitos não o tornava um escravo.

Ao longo do século XVIII as ideia iluministas de valorização do homem e da razão, assim

como um novo posicionamento da sociedade e seus efeitos na Igreja Católica, foram

responsáveis por uma nova visão quanto ao ser humano, abrindo caminho para o

questionamento da servidão e do escravagismo, ideias que se concretizariam posteriormente.

Vale ressaltar que a sociedade europeia de então permanecia paternalista e as mulheres ainda

estariam privadas por muito tempo de relações mais igualitárias.

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O perfil do ser humano traficado alterou-se com as grandes navegações. A descoberta

de novas terras e povos trouxe a possibilidade de escravidão de outros grupos étnicos,

culminando na submissão de negros e índios. Considerados pela igreja como algo à parte de

humano e não atingidos pelas leis que já valiam na Europa, esses povos foram explorados à

exaustão como mão-de-obra nas colônias e passiveis de trocas comerciais. No caso brasileiro,

seguido ao tráfico negro podemos perceber o tráfico de mulheres brancas, as chamadas

“polacas”, diante da tentativa de “europeização” da população e de seus costumes (SALES et

al., 2005). Na maioria das colônias europeias a prática era fator comum e concomitante ao

tráfico negro.

É dito que os esforços para o fim da escravidão negra e branca começam a acontecer

simultaneamente, em fins do século XIX. No caso da escravidão branca o conceito

primeiramente proposto de análise foi o caso de mulheres traficadas para fins sexuais e esse

acabou por ser a definição de “escravidão branca” como um todo. Apesar das discussões entre

historiadores acerca dos reais números de mulheres traficadas à época, é possível perceber

que a cooptação forçada já era um problema de escala considerável ao analisarmos os

números policiais de diversos países e as inúmeras conferências existentes no fim do século

XIX a fim de debater a questão.

Às discussões seguiram-se seis acordos durante todo o começo do século XX e

anteriores à Liga das Nações, sendo que os primeiros tratam especificamente de determinar

sua especificidade racial, limitando-se às mulheres brancas. Nos anos seguintes os acordos

propostos tornaram-se mais expansivos, tanto ao número de adeptos que se propunham a

combater a prática quanto as vítimas a que referiam-se.

Em 1904, foi assinado o Acordo Internacional para a Supressão do Tráfico de

Escravas Brancas, voltada ao apoio às vítimas e à reunião de dados acerca do tema pelos

países envolvidos. Já em 1910, a Convenção Internacional para a Supressão do Tráfico de

Escravas Brancas começa a delimitar as punições aos aliciadores e proteção a menores. A

Convenção Internacional para a Supressão do Tráfico de Mulheres e Crianças de 1921

começa a expandir seu foco de atenção além da questão racial. A partir de então foram

formulados outros protocolos, inseridos na dinâmica nascente da Liga das Nações. Em 1948,

a Declaração Universal dos Direitos Humanos estabelece a proibição a qualquer tipo de

escravidão, independente de fatores de gênero, etários, de identidade nacional e étnicos,

universalizando o direito à liberdade (RAINICHESKI, 2012). Nos anos seguintes vários

outros acordos são redigidos de forma a fortalecer os princípios expressos nesse documento.

19

As mudanças na percepção do papel feminino e das desigualdades de gênero, especialmente

nas décadas de 1970 e 1980, inspiraram a Convenção sobre a Eliminação de todas as formas

de Discriminação contra a Mulher, de 1979. Em 1988, o Estatuto de Roma classifica o tráfico

de seres humanos como crime contra a humanidade e, em 2000, o Protocolo para Prevenir,

Suprimir e Punir o Tráfico de Pessoas contém a primeira e, até hoje principal, conceituação do

tráfico de pessoas (RAINICHESKI, 2012), conceituação essa aqui aplicada quando nas

seguintes referências ao termo:

“’Trafficking in persons’ shall mean the recruitment, transportation, transfer, harbouring or receipt of persons, by means of the threat or use of force or other forms of coercion, of abduction, of fraud, of deception, of the abuse of power or of a position of vulnerability or of the giving or receiving of payments or benefits to achieve the consent of a person having control over another person, for the purpose of exploitation. Exploitation shall include, at a minimum, the exploitation of the prostitution of others forms of sexual exploitation, forced labour or services, slavery or practices similar to slavery, servitude or the removal of organs;” (UNODC, 2002).

3.2 O tráfico de mulheres nos dias atuais

O tráfico de seres humanos permanece um assunto pouco explorado nas Ciências

Humanas e nas Relações Internacionais, apesar do aumento constante da prática após o fim da

Guerra Fria. A Europa Oriental é um dos maiores mercados fornecedores de mulheres para

fins sexuais, especialmente para a Europa. A facilidade de locomoção advinda da

globalização e dos acordos da União Europeia tornou o combate à ação desses grupos mais

complexa e irregular. Como os traficantes de escravos do século XIX, os negociantes de seres

humanos trabalham onde houver demanda de seus produtos.

Atualmente o tráfico de pessoas é considerado o terceiro maior comércio ilegal do

mundo, perdendo apenas para o narcotráfico e o tráfico de armas e apresentando

relativamente poucos riscos na comparação a estes (HUGHES, 2000). Essas pessoas seguem

sendo exploradas para os mais diversos propósitos: trabalho doméstico, industrial e rural,

extração de órgãos, venda de bebês para adoção e coerção sexual. O tráfico feminino para fins

sexuais configura o maior espectro do tráfico humano. Apesar de grande parte de suas rotas e

potenciais vítimas serem conhecidas, este tipo de comércio ainda age com relativa liberdade.

Com importância indiscutível é natural perguntar o motivo desse tipo de comércio ser

praticamente ignorado pelos meios de comunicação e a resposta dada por Moisés Naím é

simples: os casos “tornaram-se lugar comum” (2008, p.83).

20

Seus propósitos e vítimas permanecem inalterados: crianças e mulheres de regiões

menos favorecidas do mundo, sendo mandados constantemente para países com melhores

condições de vida por grupos de certo poder econômico e político dentro de seu próprio país.

As áreas em que trabalham também não sofreram significantes mudanças: trabalho forçado e

exploração sexual. Essa é uma questão que atinge grande parte dos países subdesenvolvidos

ou em desenvolvimento ao longo de sua história, inclusive o Brasil, considerado o segundo

pior país em termos de tráfico sexual infantil, ficando atrás apenas da Tailândia1.

Provindas de áreas pobres e com inúmeras necessidades latentes, essas meninas e

mulheres são facilmente seduzidas por grupos criminosos com promessas de trabalho no

exterior e dinheiro fácil. Uma vez em seu destino essas mulheres sofrem os mais diversos

tipos de abuso, sendo o primeiro deles a privação de seu direito a liberdade. Mesmo as

mulheres que viajam sabendo de seu propósito para a prostituição não tem real noção do

tratamento que receberão quando distantes de seus países. É prática comum a privação de

passaportes daquelas que entraram por meio legal, abusos sexuais e mentais por parte dos

captores, privação de contato com familiares e com o país de origem e o rodizio de moças

através da venda ou troca entre diversas casas de prostituição, tanto para a garantia de manter

a clientela atraída com as constantes novidades quanto para evitar vínculos das mulheres com

a sociedade local.

A globalização e a tecnologia atual auxiliaram o comércio e as trocas legais e ainda

mais o comércio ilegal em sua ação. A facilidade de locomoção entre países e a falta de

fiscalização adequada ao imenso fluxo cotidiano acabam por ter como consequência a entrada

e saída constantes de mulheres através das perenes fronteiras globais.

No campo das telecomunicações configura-se ainda mais uma dificuldade: a de

detectar e impedir a troca entre aqueles que ofertam e demandam produtos e serviços ilegais.

A Internet permite um novo tipo de “atendimento ao consumidor”, com a especificação de

seus desejos em detalhes e pronto envio por parte do fornecedor, onde quer que ele esteja. A

“deep web”, fenômeno ainda pouco estudado e debatido, apresenta um problema para as

autoridades internacionais. Segundo Michael Bergman (2000), a “deep web” 2 é ainda maior

1 Dado retirado do site da ONG Libertad Latina – The Crisis of Child Exploitation in Brazil, disponível em

<http://www.libertadlatina.org/LA_Brazils_Child_Prostitution_Crisis.htm>, acesso em 13 dez. 2012. 2 De acordo com o autor, a “deep web” ou “internet invisível” constitui a parte da rede mundial que escapa do

sistema de buscas tradicional. Os sites e informações nela contidos não estão ligados a uma rede imóvel e

reconhecida (a World Wide Web de protocolo HTTP), só sendo possível a busca através de termos únicos e a

21

do que o compreendido pelas pessoas como a “internet normal” e dentro dela podem ser

encontradas ofertas de inúmeros serviços ilegais como assassinos de aluguel, transação de

órgãos humanos e a venda de armas, drogas, crianças e mulheres.

Ainda, existem problemas particulares da própria especificidade do “produto” desse

tipo de crime. O tráfico de pessoas lida com algo mais complexo do que o narcotráfico ou

tráfico de armas, cujos próprios produtos são a prova do crime. É um tipo de comércio em que

o produto necessita ser coagido a participar por meios diversos e pode testemunhar contra si

mesmo. Essa especificidade cria problemas quanto às políticas para suprimir o comércio e o

que fazer com suas vítimas.

No caso de pessoas há a possibilidade de, mesmo descoberto o esquema que o rodeia,

as vítimas se negarem a testemunhar contra seus raptores, sendo por medo de represálias

contra elas mesmas e suas famílias, da atuação legal dos governos contra imigrantes ilegais ou

vergonha de sua condição, o que dificulta a criminalização das pessoas envolvidas na

caracterização de prostituição simples. Outra questão a ser abordada é a relativa

glamorização da prostituição pelo cinema e a cultura pop. Algumas das mulheres encontram-

se conformadas com sua posição devido à falsa imagem de salvação por um de seus clientes,

em uma imitação na vida real de um roteiro hollywoodiano (HUGHES, 2002; SALAS, 2007).

utilização de um sistema específico, diverso do comum, e pelo uso de programas característicos. Além disso,

parte do conteúdo é protegido por identificação e senha e os sites não estão ligados ao conteúdo passível de

buscas, impedindo a entrada por meio da “internet normal”. A discrição em torno da “deep web” assegura

liberdade de ação para grupos criminosos e o tamanho e dificuldade de identificação dos envolvidos impedem

que medidas efetivas sejam tomadas quanto às negociações criminosas ocorridas dentro dela.

22

4. A SITUAÇÃO NO LESTE EUROPEU: DESAFIOS Á SEFURANÇA REGIONAL E

A ATUAÇÃO DA UNIÃO EUROPEIA

A destruição da cortina de ferro e o desmembramento, na passagem dos anos 1980

para os 1990, da União Soviética deixaram marcas profundas na vida politica, econômica e

social dos países antes protegidos pela estabilidade comunista. À deriva em um mundo

capitalista sem as ferramentas adequadas à sua sobrevivência, os antigos membros da aliança

comunista demoraram a estabilizar-se e enfrentaram as graves crises resultantes de seu atraso

tecnológico e econômico frente aos demais.

Os negros anos seguintes à glasnost e a perestroika permitiram que o “ovo de

serpente” fecundado na sociedade pobre desses países durante a Guerra Fria eclodisse e

tomasse de assalto a situação econômica e politica local. Buscando a sobrevivência e a

riqueza, os grupos formados não encontraram limites a sua ação criminosa, aproveitando-se

da demanda local (e posteriormente internacional) para alcançarem seus interesses e alçarem

posições de poder durante tão turbulento período (GLENNY, 2008; NAÍM, 2006).

Neste capítulo analisamos a ação de tais grupos no Leste Europeu e sua ligação com a

questão previamente abordada do tráfico de mulheres e as consequências para a segurança

local e internacional, resultantes da interligação entre a sociedade civil e as instituições

estatais.

4.1 Definindo o Leste Europeu

A região denominada “Leste Europeu” tem uma composição de países que variam de

acordo com o ponto de vista e percepção de identidades do pesquisador. Neste trabalho,

usamos a definição das Nações Unidas, segundo a qual, o Leste europeu compreende os

seguintes países: Bielorrússia, Bulgária, República Tcheca, Hungria, Polônia, República da

Moldávia, Romênia, Federação Russa, Eslováquia e Ucrânia. Apesar disso, é importante

ressaltar que o termo Leste europeu e oeste europeu não representam mais do que

agrupamentos cunhados e referidos durante a Guerra Fria e, desde que este conflito não mais

existe, tais termos deixaram de ser precisos (UNSTATS, 2013).

Durante a Guerra Fria a dicotomia político-econômica encontrada na Eurásia culminou

na utilização do termo “leste europeu” e “oeste europeu” para a diferenciação dos modelos ali

contidos. Em sua essência uma separação puramente geográfica, o termo evoluiu então para

23

abarcar todo um conjunto de ações desenvolvidas pelo comunismo, em oposição ao

capitalismo. Os países do Leste Europeu terminaram por ser incluídos em uma representação

de estrutura da qual se espera certa coesão e unicidade. O perigo contido nesta perspectiva é a

excessiva simplificação da situação na região, ignorando a interferência dos movimentos

internos dos Estados ali contidos.

A formação da União Soviética ainda pode ser relacionada com os resquícios do

pensamento imperial do século XIX. Idealizado como temporário, o Estado comunista tinha

ganas de supressão das questões nacionalistas em favor da revolução mundial. Como afirma

Suny:

“O ‘Estado’ que, em certo sentido, era para ser a negação dos Estados como até então haviam existido, era ao mesmo tempo a carapaça do primeiro governo socialista, o veiculo para que o partido bolchevique levasse adiante seu programa de suprimir o poder da “burguesia” e das antigas classes dirigentes, acabar com uma guerra imperialista, e disseminar a guerra civil internacional para além das fronteiras da Rússia.” (2008, p.86).

A grande ironia do poder soviético se encontra no fato de ao tentar desenvolver um

plano revolucionário, voltado para a mudança do sistema, Moscou congelou seus satélites em

uma situação desfavorável e dependente de seu poder e, ao promover uma ideologia em que

as nacionalidades e etnicidades seriam suplantadas pela identificação proletária supranacional,

este poder incentivou o fortalecimento de identidades nacionais contidas em seu território. O

enfraquecimento do centro imperial sob as pressões da época permitiu a seus satélites a

possibilidade de exercerem essas nacionalidades de forma livre, levando ao desmembramento

da União Soviética e ao reconhecimento pela comunidade internacional da legitimidade

desses novos Estados.

A situação encontrada pelos países satélites da região após o desmembramento da

União Soviética não foi das melhores. Abandonados a própria sorte pela potência regional

russa, ela mesma sofrendo os efeitos da derrota política recente, os Estados da região não

contavam com instituições fortes e centralizadas para guiar suas populações, não tinham

meios econômicos e tecnologia para batalhar na competição da Terceira Revolução Industrial

e em suas populações já se encontravam grupos criminosos oportunistas, que se beneficiaram

ainda mais do momento de fragilidade estrutural (GLENNY, 2008).

24

Os ajustes da ordem mundial ao período pós-Guerra Fria e os movimentos de transição

política no Leste Europeu deram inicio a um período de instabilidade e insegurança politica.

No referente à economia, a privatização sofreu com a falta de planos precisos, tanto

em sua execução quanto com o uso dos recursos adquiridos. Os lucros do processo foram

enviados para o exterior, em uma “fuga de capital” (HUGHES, 2002). No caso russo foi

estimado que cerca de 140 bilhões de dólares tiveram este destino. A reinserção dos países da

região na lógica capitalista já desenvolvida se deu de maneira caótica. Países afiliados a

economia planejada por mais de 40 anos encontravam dificuldades para entrar no novo

cenário das multinacionais, alto desenvolvimento no campo tecnológico e acirramento

competitivo. A abertura à venda de recursos naturais e bens nacionais enriqueceu apenas uma

elite que sabia manejar as leis do comércio em proveito próprio. Mais que isso, suas

economias se encontravam filiadas a ação dos grupos organizados paralelos que haviam de

proliferado em meio as fragilidades estatais durante a Guerra Fria e encontravam

oportunidades inigualáveis de crescimento na reabertura (GLENNY, 2008; NAÍM, 2006).

4.2. A infiltração do crime organizado no Estado

Essas organizações agiam com maior compreensão do receituário capitalista do que as

débeis instituições nacionais e se aproveitaram do seu poder econômico e social para

infiltrarem-se nos aparelhos governamentais, a ponto de em 1996 ser precisado que

controlavam, na Rússia, cerca de 40% dos bancos privados, 60% das empresas estatais, mais

de metade dos bancos estatais, além de lucrarem através das empresas privadas (HUGHES,

2002, p.3). O fenômeno não arrefeceu nos anos seguintes e hoje a maioria dos Estados antes

pertencentes à União Soviética ou seus satélites encontram suas vidas política, econômica e

social fortemente ligados ao crime organizado.

A sociedade civil não assistiu a tais mudanças passivamente. Segundo Misha Glenny

esses grupos organizados surgidos das fragilidades nacionais de controlarem seus fluxos

internos de crime:

“instintivamente perceberam que a elevação dos padrões de vida ocidentais, o crescimento do comércio e dos fluxos migratórios e a capacidade de policiamento bastante reduzida em muitos países combinavam-se para formar uma mina de ouro” (2008, p.12).

Podemos formar paralelos da economia ilegal com a legal, ponto focal do trabalho de

Glenny, para explicar o rápido crescimento e sucesso dessas organizações. As lições

25

capitalistas foram aprendidas por alunos exemplares, que logo aprenderam a ofertar o produto

adequado as demandas encontradas e, posteriormente, estabeleceram uma rede de contatos

internacionais que se aproveitava da infraestrutura legal já existente em suas transações. Desta

maneira chegaram à atualidade com ação capitalista global e interligadas às transações físicas

e virtuais do mercado internacional.

A interação entre sociedade civil e Estado é fundamental para a construção da imagem

e dos objetivos contidos em determinado território e população. Não é raro haver certa

tolerância por parte da maioria dos Estados acerca das trocas ilícitas ocorridas dentro deles,

mas quando os grupos de maior poder na sociedade têm por interesse principal a maximização

dos ganhos de atividades criminosas, nos deparamos com a possibilidade da tomada das

instituições estatais e, consequentemente, dos interesses ali existentes (SERRANO, 2005).

Ainda durante a lógica bipolar os agentes do Comitê de Segurança do Estado da

Bulgária (DS) tinham como atividade paralela o contrabando de todo tipo de mercadoria,

incluindo o tráfico de pessoas, e se aproveitavam do poder do Estado totalitário para sua

realização, inclusive na garantia de seu monopólio:

“Mas [a DS] estava determinada a impedir que outros entrassem no ramo. A polícia de fronteira da Bulgária era implacável, e havia punições severas para quem fosse apanhado tentando contrabandear drogas ou armas sem autorização. Tamanha determinação nada tinha a ver com um suposto empenho em fazer valer o império da lei (um conceito que era anátema para os serviços de segurança): o objetivo era fortalecer o monopólio econômico do DS.”(GLENNY, 2008, p. 22-23)

A DS se aproveitou da possibilidade de criação de empresas privadas pelo Decreto 56,

em 1986, para iniciarem seus empreendimentos capitalistas. O fim da Guerra Fria encontrou o

crime organizado búlgaro pronto para controlar os aspectos civis e econômicos do Estado.

Na Rússia, a entrada das empresas capitalistas foi fator de extrema importância para o

crescimento do poder paralelo. A máfia russa nasceu da impossibilidade governamental de

lidar com a questão de segurança a seus empresários, ameaçados pela ação das gangues a

serviço de forças concorrentes. Sem a união de suas forças, sob uma liderança e com uma

rede confiável de proteção esses empresários não teriam como suportar a crise econômica e

política nacional. Sua ação cresceu devido à falta de definição entre os limites do legal e ilegal

no país, que permitiram sua ação no controle desta questão, propiciando a anomalia legal do

país, em que “todas as ações eram legais e ilegais ao mesmo tempo” (GLENNY, 2008, p. 82).

O poder das organizações criminosas no país se expandiu ao próprio Estado, na atenção dos

26

seus agentes da possibilidade de influência e riqueza da máfia local e na corrupção dos frágeis

órgãos estatais e logo alcançaram as regiões próximas devido a esta mesma fragilidade.

Talvez o caso mais singular na exemplificação da subversão do poder institucional

pelos grupos de crime organizado, a Transnítria nasceu da incapacidade de controle moldávio

dos conflitos de identidade nacional existentes no território. A região recebeu largos

investimentos por parte da potência comunista e com o desmembramento soviético foi

incorporada pela Moldávia, apesar de não haver uma própria identificação com o país por

parte de seus habitantes. As tensões escalaram para a guerra, sendo necessário a intervenção

do exército russo, em 1992, para sua resolução (ISATCHENCKO e SCHLICHTE, 2007). O

território perseverou em seus esforços para a construção de um Estado independente do ponto

de vista formal, apresentando “constitution, government institutions, its own currency and

budget, as well as its own flag” (2007, p. 21).

O processo acima apresentado não diferiria muito do apresentado de outros exemplos

de sociedades que pleiteiam seu espaço e reconhecimento na arena internacional, contudo um

segundo processo se interpõe na Transnítria, com a centralização do poder na figura

autoritária de Igor Smirnov e a Sheriff Company, que controla todos os setores estratégicos do

país e é o grande responsável pela sobrevivência econômica do grupo que controla o governo.

A autossuficiência propagandeada, em verdade, é fruto das negociações com a Rússia e a

Ucrânia na venda de recursos naturais, o processo de privatização e o comércio, em que não

há separação entre o legal e o ilegal. A região é reconhecida por ser um refúgio de criminosos,

zona de aliciamento de vitimas para o tráfico de pessoas e um território de passagem para

mercadorias ilegais, e por consequência, “afeta e debilita países em vastas regiões do planeta”

(GLENNY, 2008, p. 123).

A corrupção do governo pelos grupos responsáveis pelo crime organizado se

multiplicava em outros países do Leste Europeu. Em grande parte o crime evoluiu para ocupar

o posto mais alto da classificação desenvolvida por Naylor e Lupsha, a “dependência mútua”

político-econômica e criminal (SERRANO, 2005, p. 42)3. No que se refere ao tráfico de

3 “En la etapa predatória, la relación del crimen com el sistema político y económico más amplio se caracteriza

por la vulnerabilidad del primero frente al aparato de aplicación forzosa de la ley. Aquí la violencia criminal es

en su mayor parte defensiva. En la segunda fase, las actividades criminales se difunden, infiltran y manipulan el

sistema político y económico formal. El suministro de bienes y servicios ilícitos o escasos es típico de esta

etapa. Es la fase simbiótica la que puede actuar como incubadora de “mafias” capaces de extenderse hasta la

esfera internacional. Una dependencia mutua entre la organización criminal y el sistema político y económico

formal caracteriza a esta última fase”

27

mulheres, a demanda dos países ricos, especialmente os europeus, foi percebida e aproveitada

para que fosse montada a rede que até os dias atuais atua nessa região. É estimado que as

mulheres do Leste Europeu representem até 80% do comércio humano para a Europa

Ocidental (KÖPPEL e SZÉKELY, 2005, p. 208). Conforme Misha Glenny bem define:

“ Mulheres são mercadorias atraentes para quem quer entrar no mundo do crime.

Podem cruzar fronteiras legalmente e não atraem a atenção de cães farejadores. O

investimento inicial representa apenas uma fração da soma exigida para entrar no

ramo de carros, os custos operacionais são mínimos, e, como prestadora de serviço,

a mercadoria (uma mulher escravizada) gera lucros repetidamente. Uma única

mulher pode render entre 5 mil e 10 mil dólares por mês para seu traficante.”

(2008, p. 37)

A maioria dos países da região apresenta algum grau de reconhecimento internacional

da prática, uma fama que parece distante de ser anulada. Rússia, Moldávia e Ucrânia são

frequentemente citadas como os núcleos da distribuição de mulheres, tanto para a Europa

quanto para o continente americano e a Ásia. Essas organizações criminais se importam com

os laços nacionais apenas no que afete diretamente seus negócios, o que levou ao aprendizado

da ação transnacional e da cooperação com seus semelhantes, formando uma cadeia com

especialistas em tarefas diversas que suportem suas negociações (WILLIANS, 2005). O

tráfico humano necessita de investidores, recrutadores, transportadores, funcionários

corruptos ou protetores, guias, seguranças da movimentação e do negócio, coletores do

débito, especialistas em lavagem de dinheiro e uma rede de suporte, uma configuração que se

mostra quase impossível de ser descoberta e combatida em sua totalidade (ARONOWITZ,

2009).

4.3. União Europeia e a questão de segurança

Do outro lado da mesma moeda podemos perceber os efeitos da ação do crime

organizado nos países europeus para o qual seus produtos são destinados. Os “mercados

negros”, onde são vendidos os produtos não autorizados no comércio legal, existem

independentemente da facilitação trazida pelo fortalecimento do comércio ilegal no Leste

Europeu. Entretanto, esta facilitação permitiu que elas chegassem em volume maior, por

várias rotas e fornecedores diferentes, e fossem seus preços fossem barateados.

A cooperação no combate ao crime transnacional pela União Europeia remonta ainda

aos anos 1970. A Europol nasceu com a responsabilidade de “coordinar la investigación de

28

formas graves del crimen internacional ‘allí donde hay indicios reales de la participación de

una estructura criminal organizada’” (DEN BOER, 2005, p. 162), agindo de acordo com os

interesses dos países membros e buscando a cooperação entre as instituições políticas destes.

Junto a essas preocupações se encontra as migrações ilegais e o comércio de seres humanos.

De acordo com Serrano (2005), os esforços para definir o crime organizado

transnacional nos anos 1990 e 2000 estão intimamente ligados à sua associação com a questão

de segurança. O crime transnacional se apropria da diversidade legislativa e das implicações

da ação soberana para atingir seus objetivos:

“Además, las fronteras estatales han creado invariablemente oportunidades para delinquir: generando variaciones em los niveles de gravación de impuestos, de ‘subsidización’ y proibición; dando lugar a problemas de jurisdicción legal, y elevando los costos de la investigación.” (2005, p.33)

Há clareza na percepção de que o crime transnacional (e no caso aqui tratado o tráfico

de mulheres) oferece perigos aos indivíduos, sendo então classificado como uma “ameaça

social” 4. Quando a percepção dessa ameaça atinge o Estado e suas bases, exige a resposta

imediata, em um processo de securitização do problema. Como vimos anteriormente, não são

raros os casos em que o crime organizado internacional subverte a lógica de segurança do

sistema ao corromper o Estado, tornando imperativo para outros atores a tomada de decisões

que impeçam essa ameaça.

A União Europeia expõe a percepção multilateral de que “nenhum país é capaz de

enfrentar totalmente sozinho os complexos problemas que se colocam hoje em dia”, expresso

na Estratégia Europeia em Matéria de Segurança (Conselho Europeu, 2003). Alguns países se

encontram mais ameaçados pelo crime transnacional e seus efeitos e apresentam maiores

preocupações quanto à prática (DEN BOER, 2005, p. 168). O discurso desenvolvido impele a

ação do bloco em favor do combate aos “desafios globais” que afetam a segurança regional.

Segurança é um conceito subjetivo, relacionado à sobrevivência do Estado, e necessita

de certa construção ao redor dos temas definidos como vitais à sobrevivência estatal (BUZAN

et al, 1998). Os perigos ao Estado nos dias atuais são percebidos pela União Europeus

diretamente ligados às novas ameaças, mas nem sempre foi assim.

O temor da guerra entre Estados dominou o pensamento europeu até o fim da Guerra

Fria. A possibilidade da guerra nuclear fez com que países da região investissem ou

4 Naylor apud Serrano, 2005, p. 55

29

obtivessem acesso aos armamentos nucleares. A lógica acerca do tema “segurança” se alterou,

principalmente após os ataques terroristas aos Estados Unidos em 11 de setembro de 2001 e

da ampliação das trocas entre os atores com a globalização, demonstrando a necessidade de

uma nova concepção acerca da defesa dos interesses estatais.

A percepção acerca das novas ameaças, expandindo-se além do policized nas

preocupações, se tornando ameaça existencial ao Estado, o que implica a exigência de ações

imediatas, ocorrendo assim à securitização do tema.

Os blocos regionais exigem que haja acordo entre os Estados acerca dessas ameaças e

a conduta a ser tomada. No caso do crime transnacional a cooperação entre Estados é

fundamental para o combate efetivo, tanto no que tange seus aspectos de atuação internos

quanto externos. A interdependência dos países em direcionar sua ação exige que todos os

membros estejam de acordo em sua influência no que se refere à desestabilização e destruição

estatal, o que exige o convencimento das sociedades e instituições do perigo dessas ameaças.

Vamos analisar agora alguns dos conceitos referidos nesse documento acerca das

maiores ameaças notadas pelo bloco europeu e como estes se relacionam à teoria de

securitização.

A Estratégia Europeia em Matéria de Segurança (EEMS) possui um claro discurso

legitimador a favor da securitização dos temas expostos, invocando a ação emergencial contra

inimigos próximos e que ameaçam de forma imediata e direta a sobrevivência dos Estados da

região. O ator securitizador – aquele que define a “ameaça existencial” - tem necessidade do

uso de termos que invoquem a compreensão de sua audiência das ameaças percebidas. No

documento supracitado (Conselho Europeu, 2003): o terrorismo “torna indispensável uma

atuação concertada a nível europeu” (p. 3, grifo nosso), a proliferação de armas de destruição

maciça é “potencialmente a maior ameaça a nossa segurança” (p. 3, grifo nosso), conflitos

regionais em todo o mundo “têm impacto direto nos interesses europeus” (p. 4) e os

fronteiriços são uma “ameaça à estabilidade regional” (p. 4), a criminalidade internacional

tem a região como “um alvo de primeiro plano” (p. 4, grifo nosso) e o conjunto de ameaças

“poderão colocar-nos perante uma ameaça verdadeiramente radical” (p. 5, grifo nosso).

Além do alarmismo, outro ponto principal do documento é o imediatismo proclamado,

em que “nunca é demasiado cedo para começar” o combate às crises e ameaças, sendo este

outro ponto apontado por Buzan, Waever e Wilde (1998). Além disso, é possível visualizar os

30

contornos de uma visão dualista, da separação entre “eles” e “nós” e das novas ameaças se

opondo diretamente à União Europeia.

Como combater a ameaça é o passo seguinte a ser explicitado. No caso presente, o

receituário para lidar com os conflitos regionais e o crime internacional é o mais interessante

para nossa análise:

“A União Europeia e os Estados-Membros intervieram no sentido de contribuir para a resolução de conflito regionais e para o estabelecimento de Estados em colapso, nomeadamente nos Balcãs, no Afeganistão e na RDC. Uma das formas mais eficazes de lidar com o problema da criminalidade organizada na EU consiste em restabelece a boa governação nos Balcãs, promover a democracia e dotar as autoridades locais de capacidade para fazer frente à criminalidade.” (Conselho Europeu, 2003, p. 6)

Reestabelecer um sistema conhecido de Estados fortes, com o qual seja possível

dialogar pelos meios diplomáticos parece ser a intenção principal daqueles que redigem o

documento. Até que ponto a resolução dos problemas passa pela violação dos acordos

internacionais estabelecidos, especialmente a soberania dos Estados alvo? A “guerra ao

terror” demonstrou que a ação tradicional não adianta para coibir esse tipo de ameaça. Apesar

da percepção da ineficiência da resolução militar apenas, quando se diz que “nos Estados em

colapso, podem ser necessários instrumentos militares para reestabelecer a ordem e

instrumentos humanitários para fazer frente à crise imediata”, essa afirmação suscita

expectativas de rompimento às regras do sistema internacional quanto à soberania dos Estados

caso outras iniciativas falhem, mesmo sendo intenção primordial do acordo a atuação em

torno dos instrumentos econômicos e disseminação dos princípios do sistema para fortalecer

as instituições estatais e os reincluir no sistema internacional. Em outra parte a solução das

questões políticas na região é descrita da seguinte forma:

“A melhor proteção para a nossa segurança é um mundo constituído por Estados democráticos bem governados. As melhores formas de reforçar a ordem internacional são a disseminação dos princípios da boa governação, o apoio às reformas sociais e politicas, a luta contra a corrupção e os abusos de poder, o estabelecimento do primado do direito e a proteção dos direitos humanos.” (Conselho Europeu, 2003, p.

A intervenção e estabelecimento de uma ordem governamental conhecida mais uma

vez figuram no documento como a solução esperada aos problemas apresentados, com a

democracia figurando sob os holofotes dessa empreitada. Esses fragmentos revelam que o

pensamento referente à defesa e segurança ainda está intrinsecamente ligado à lógica militar

tradicional.

31

No que tange o Leste Europeu abre a possibilidade de inclusão da região ao afirmar

que:

“Não é do nosso interesse que o alargamento crie novas linhas de fratura na Europa. É necessário tornarmos extensivos aos nossos vizinhos a Leste os benefícios da cooperação econômica e política, enfrentando ao mesmo tempo os problemas políticos que os afetam.” (Conselho Europeu, 2003, p. 8)

Quanto ao tráfico de mulheres, este se encontra incluso às medidas preventivas

estabelecidas no referente ao crime organizado, na afirmação de que “com efeito, grande parte

das atividades dos bandos criminosos consiste no tráfico transfronteiriço de drogas, mulheres,

migrantes clandestinos e armas” (Conselho Europeu, 2003, p. 4). A justificativa principal para

o combate multilateral dessas práticas consiste na percepção do enfraquecimento das

estruturas do Estado, do primado do Direito e da própria ordem social da região. O temor da

tomada dos Estados próximos pelos grupos criminosos resulta nas tentativas de coibir sua

ação e na legitimação da intervenção na política do Leste Europeu, de modo a afastar os

perigos de sua ação dos territórios dos países europeus.

Como vimos, o tráfico de mulheres aparece, ainda, ligado a outras práticas ilegais e os

lucros obtidos são reinvestidos nos outros aspectos da rede criminosa. Desse modo, figura a

sensação de insegurança regional promovida pela facilidade da entrada e saída das vítimas

desse tipo de crime, exemplificando a fragilidade da União Europeia em lidar com as novas

ameaças e das complicações legais, politicas, econômicas e sociais trazidas pelo tráfico

humano na Europa. A maior ameaça percebida é a ligação das redes de tráfico humano com a

debilidade dos Estados próximos e como esta pode vir a representar real perigo à

sobrevivência dos países membros.

A efetividade das propostas da EEMS foi analisada em um relatório, cinco anos depois

de seu lançamento. As conclusões então apontadas referem-se à inclusão de outros fatores de

ameaça, como a pirataria, a migração ilegal, a ampliação das questões climáticas e do controle

do comércio ilegal de armas, além da necessidade de ação conjunto não apenas dentro do

bloco, mas incluindo a ONU e os Estados Unidos.

O documento de 2008 aponta ainda o crescimento do crime internacional, que

“continua a ameaçar as nossas sociedades pela prática do tráfico de droga, de seres humanos e

de armas, para além da fraude internacional e do branqueamento de capitais” (Conselho

Europeu, 2008, p. 4). No que se refere ao crime no Leste Europeu, aponta-se a ampliação das

relações entre a União Europeia e os países da região, com exceção da Bielorrússia, na

32

tentativa que o apoio econômico e político fortaleçam as instituições estatais e diminuam as

desigualdades sociais e as práticas criminosas na região.

O convencimento da população acerca das questões tratadas mais uma vez figura em

papel de destaque, uma vez considerado que “cabe aos governos, aos parlamentos e às

instituições da UE explicar de que modo isso contribui para a segurança interna” (Conselho

Europeu, 2008, p. 12). A atuação da União Europeia necessita do apoio das sociedades nela

contidas acerca dos objetos reconhecidos como ameaças futuras para que possa realizar as

ações preventivas nesses documentos descritos.

33

5. CONCLUSÃO

A monografia presente tinha como intenção primordial o delineamento da questão do

tráfico de mulheres inclusa no contexto das novas ameaças pós-Guerra Fria e sua influência

no que tange a percepção de segurança e sobrevivência dos Estados, buscando-se através

desta análise específica a compreensão do processo de formação dos interesses estatais sob

esta nova lógica.

A pesquisa apresentada situa-se no campo das interações entre sociedade civil e

Estado, tanto no que se refere aos grupos não-estatais nele inseridos quanto nas relações

intrínsecas dos mecanismos de tomada de decisões e do suporte necessário a efetivação das

práticas acordadas.

À hipótese de securitização das novas ameaças, nelas inclusa o tráfico de mulheres,

buscou-se agregar a atuação multilateral, própria à região alvo do estudo e ao contexto de

interdependência e integração atuais.

Quanto à teoria apresentada, a construção do conceito “segurança” pelos Estados para

legitimar a ação em torno de uma ameaça futura relaciona-se à mudança de paradigma

observada com as mudanças na ordem mundial e a observação dos efeitos nocivos das novas

ameaças à soberania e sobrevivência dos Estados. Nesse sentido, a análise do discurso

redigido pelos Estados-membros da União Europeia vincula-se diretamente à conceituação

aqui apresentada, à necessidade iminente de proteção regional e atuação além dos limites

fronteiriços para cumprimento deste propósito.

Nota-se em todos os estudos aqui apresentados a falta de um receituário adequado para

lidar com as questões apresentadas. Cada tipo de ameaça é vista através de um escopo

individual e regional, o que dificulta a visualização do combate além destas limitações e

implica na falta de consenso entre os atores no sistema internacional. No caso do crime

transnacional organizado, essa união em torno do consenso acerca das definições conceituais,

vinculadas as causas de seu surgimento e crescimento nos últimos trinta anos tem importância

primordial para a solução a ser apresentada à audiência do discurso legitimador.

Cabe aqui salientar que apesar da alteração da visão acerca dos temas que se

apresentam como ameaça nos dias atuais, a percepção de como atuar em seu combate não se

alterou consideravelmente, preservando-se uma ótica voltada aos aspectos militar e

econômico e a crença na racionalidade do Estado democrático como fatores decisivos.

A esfera governamental dos Estados e a ordem mundial não devem ausentar

seus objetivos dos anseios e problemas de suas sociedades e, efetivamente se os fizer, estará

34

condenando-se ao fracasso da falta de apoio à suas resoluções. Metade da população mundial

está constantemente sujeita às deliberações da outra metade, em uma lógica distorcida e

injusta, em que pouco é feito para combater as desigualdades criadas.

O tráfico de mulheres permanece assunto pouco explorado, especialmente quando o

comparamos com outras novas ameaças, como o narcotráfico e o terrorismo. A percepção

internacional acerca do tema ainda é circundada por uma cortina de descrença e ignorância

acerca da abrangência desse negócio e das implicações legais, econômicas, políticas e sociais

dessa prática. Implícito à exploração feminina, que representa a maioria absoluta do tráfico

com propósitos sexuais, se encontra uma sociedade paternalista, que não se sente diretamente

ofendida pela objetificação do corpo e do sexo e aproveita-se da fragilidade de suas vítimas

resultante da posição de gênero construída. Pouco ou nada poderá ser feito acerca da sujeição

da mulher em um contexto internacional enquanto a consciência acerca da figura feminina

não se alterar.

35

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