TECNOLOGIAS SOCIAIS E PRODUÇÃO ARTESÃ: ESTUDO INTERDISCIPLINAR DE INCLUSÃO NO MERCADO

12
II CONINTER Congresso Internacional Interdisciplinar em Sociais e Humanidades Belo Horizonte, de 8 a 11 de outubro de 2013 TECNOLOGIAS SOCIAIS E PRODUÇÃO ARTESÃ: ESTUDO INTERDISCIPLINAR DE INCLUSÃO NO MERCADO DOMINGOS, BIANCA S. M. (1); MELLO, ADILSON S. (2); RIBEIRO, R. B. (3) 1. Universidade Federal de Itajubá - UNIFEI. Instituto de Engenharia de Produção e Gestão IEPG. Av. BPS, 1003 Bairro Pinheirinho, Itajubá/MG [email protected] 2. Universidade Federal de Itajubá - UNIFEI. Instituto de Engenharia de Produção e Gestão IEPG. Av. BPS, 1003 Bairro Pinheirinho, Itajubá/MG [email protected] 3. Universidade do Estado do Rio de Janeiro Faculdade de Tecnologia - UERJ. Departamento de Engenharia de Produção - DENP Rodovia Presidente Dutra km 298 Pólo Industrial, Resende/RJ [email protected] RESUMO Esta proposta tem seu foco no estudo da aplicação de Tecnologias Sociais em Movimentos Sociais Organizados, incorporando Design de Produto e Engenharia de Materiais enquanto instrumentos otimizadores dos produtos e processos artesanais com finalidade de inserção dos artesãos na lógica produtiva vigente. Têm-se, de um lado, os artesãos e o contexto socioeconômico no qual se encontram, e, de outro a fibra da banana e o papel feito com esta mesma fibra, enquanto matérias-primas dos produtos produzidos pelos mesmos. O projeto interdisciplinar visa à inclusão dos artesãos membros da Associação Casa do Artesão Mariense, situada no município de Maria da Fé, MG, no mercado econômico formal por meio da profissionalização destes e dos seus produtos e processos. Neste contexto, realizar-se-á a análise das fibras de banana utilizadas na produção artesanal, em intersecção com as tecnologias sociais, propondo a otimização do processo de produção e sua matéria-prima e o design de produto como elementos fundamentais para inclusão destes artesãos no mercado competitivo. Tem-se, para tanto, que equilibrar as forças entre as agências dos humanos, no caso proposto os artesãos e o contexto socioprodutivo no qual estão inseridos, e dos não-humanos, híbridos, no caso o artesanato e o processo de produção deste. Palavras-chave: Tecnologias Sociais. Interdisciplinaridade. Design de Produto. Engenharia de Materiais. Produção Artesã.

Transcript of TECNOLOGIAS SOCIAIS E PRODUÇÃO ARTESÃ: ESTUDO INTERDISCIPLINAR DE INCLUSÃO NO MERCADO

II CONINTER – Congresso Internacional Interdisciplinar em Sociais e Humanidades

Belo Horizonte, de 8 a 11 de outubro de 2013

TECNOLOGIAS SOCIAIS E PRODUÇÃO ARTESÃ: ESTUDO INTERDISCIPLINAR DE INCLUSÃO NO MERCADO

DOMINGOS, BIANCA S. M. (1); MELLO, ADILSON S. (2); RIBEIRO, R. B. (3)

1. Universidade Federal de Itajubá - UNIFEI. Instituto de Engenharia de Produção e Gestão – IEPG.

Av. BPS, 1003 – Bairro Pinheirinho, Itajubá/MG [email protected]

2. Universidade Federal de Itajubá - UNIFEI. Instituto de Engenharia de Produção e Gestão – IEPG.

Av. BPS, 1003 – Bairro Pinheirinho, Itajubá/MG [email protected]

3. Universidade do Estado do Rio de Janeiro – Faculdade de Tecnologia - UERJ. Departamento de

Engenharia de Produção - DENP Rodovia Presidente Dutra km 298 – Pólo Industrial, Resende/RJ

[email protected]

RESUMO

Esta proposta tem seu foco no estudo da aplicação de Tecnologias Sociais em Movimentos Sociais Organizados, incorporando Design de Produto e Engenharia de Materiais enquanto instrumentos otimizadores dos produtos e processos artesanais com finalidade de inserção dos artesãos na lógica produtiva vigente. Têm-se, de um lado, os artesãos e o contexto socioeconômico no qual se encontram, e, de outro a fibra da banana e o papel feito com esta mesma fibra, enquanto matérias-primas dos produtos produzidos pelos mesmos. O projeto interdisciplinar visa à inclusão dos artesãos membros da Associação Casa do Artesão Mariense, situada no município de Maria da Fé, MG, no mercado econômico formal por meio da profissionalização destes e dos seus produtos e processos. Neste contexto, realizar-se-á a análise das fibras de banana utilizadas na produção artesanal, em intersecção com as tecnologias sociais, propondo a otimização do processo de produção e sua matéria-prima e o design de produto como elementos fundamentais para inclusão destes artesãos no mercado competitivo. Tem-se, para tanto, que equilibrar as forças entre as agências dos humanos, no caso proposto os artesãos e o contexto socioprodutivo no qual estão inseridos, e dos não-humanos, híbridos, no caso o artesanato e o processo de produção deste.

Palavras-chave: Tecnologias Sociais. Interdisciplinaridade. Design de Produto. Engenharia de Materiais. Produção Artesã.

1. INTRODUÇÃO1

O presente artigo tem seu foco no estudo da aplicação de Tecnologias Sociais em Movimentos

Sociais Organizados, descrevendo processos de integração entre campos disciplinares na

aplicação de Tecnologias Sociais, perpassando por conceitos de Design de Produto no estudo das

peças artesanais e de Engenharia de Materiais no estudo das Fibras de Banana utilizadas na

produção na Associação de Artesãos e na Cooperativa Mariense de Artesanato, no município de

Maria da Fé, Minas Gerais.

No decorrer do projeto, ocorrerá a integração interdisciplinar das diferentes propostas disciplinares,

por meio da relação entre Tecnologias Sociais, Design de Produto e Engenharia de Materiais

enquanto instrumentos otimizadores dos produtos e processos artesanais com finalidade de

inserção dos artesãos no mercado, retirando da precarização a atividade artesã com a qual se

estabelece a relação.

A pesquisa pressupõe a combinação entre as dimensões cultural e ambiental, possibilitada pelas

investigações acerca das formações sócio-técnicas, no âmbito dos agenciamentos identitários que

grupos, comunidades e segmentos sociais produzem. Objetiva-se traçar dois caminhos

complementares que tenham um único objetivo: a inclusão dos artesãos, enquanto representantes

da precarização de produtos e processos, no mercado competitivo. Tem-se, para tanto, que

equilibrar as forças entre as agências dos humanos, no caso proposto os artesãos e o contexto

socioprodutivo no qual estão inseridos, e dos não-humanos, híbridos, no caso o artesanato e o

processo de produção deste.

Neste sentido, o artigo pretende avaliar a cadeia produtiva das fibras e, imbricados neste processo,

as peças produzidas pelos artesãos de Maria da Fé/MG; realizar levantamento da precarização de

processo produtivos e inserção sócio-técnica; analisar as peças produzidas pelos artesãos sob o

enfoque do Design de Produto; determinar a classificação, forma e a distribuição das fibras via

Microscopia Óptica e Eletrônica de Varredura; oferecer capacitação técnica para os artesãos por

meio de workshops; formação de rede interdisciplinar para produção de conhecimentos nas áreas

de Tecnologias Sociais, Engenharia de Materiais, Design e a dimensão Societária implicada.

2. EMBASAMENTO TEÓRICO

O foco deste projeto centra-se em torno da definição de “coletividades sócio-técnicas” apresentada

por Latour (1994), na qual é sustentada uma simetria entre as agências de humanos entre si e

não-humanos. Ou seja, propõe-se a reflexão acerca dos limites da definição da agência

exclusivamente pela ação e relação dos “humanos-entre-eles”, trazendo a necessidade da

incorporação das ações de não humanos, híbridos, considerando que estes se expressam como

coletividades sócio-técnicas que produzem efeitos no curso da ação.

1 Pesquisa apresentada com o apoio da Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado de Minas Gerais - FAPEMIG

Tem-se, para tanto, que equilibrar as forças entre as agências dos humanos, no caso proposto os

artesãos e o contexto socioprodutivo no qual estão inseridos, e dos não-humanos, híbridos, no caso

o artesanato e o processo de produção deste. Ou seja, ambas as agências pertencem a um mesmo

mundo, não sendo composta apenas de natureza objetiva, social ou discursiva, pois é

concomitantemente real, coletiva e discursiva. Nesse sentido, desequilibrar os polos humano e não

humano significaria reduzir os fatos ao social. Para Latour (2005):

Os fatos científicos são construídos, mas não podem ser reduzidos ao social porque

ele está povoado por objetos mobilizados para construí-lo. O agente desta

construção provém de um conjunto de práticas que a noção de desconstrução capta

da pior maneira possível (LATOUR, 2005: p.12).

Nesse sentido, a inclusão dos artesãos no mercado formal só é possível se implicada da

importância que o híbrido possui neste mesmo mercado, ou seja, o produto em si é ou não

competitivo? A fim de buscar um entendimento sobre a questão posta e os argumentos acima,

Johann (2010) discorre sobre o artesanato enquanto gerador de renda, mas ressalta que a sua

eficácia nesse papel é reduzida devido a não capacitação, ou organização, voltada para venda,

produção, linhas e produtos, essenciais para o funcionamento de uma unidade produtiva geradora

de renda.

Nesse sentido, dimensiona-se a questão proposta neste projeto: a relação entre profissionalização

e a qualidade do produto final. A incorporação do Design no processo de produção artesanal é

relevante ao considerarmos hoje a inserção de novos atores na cadeia produtiva em questão. Se

antes o artesanato era vendido diretamente ao consumidor, agora foram agregados à cadeia

agentes intermediários, como lojistas, gestores, exportadores, entre outros, e, consequentemente a

relação oferta/demanda foi acrescida dos fatores como qualidade, valor agregado, marketing etc.

Resumindo, no que concerne à relação entre artesanato e Design, “com a colaboração de designers

experientes que possam preservar as características técnicas, sociais e culturais que os produtos

artesanais possuem através de seus vínculos à cultura local. Inovar sem descaracterizar” (Barroso,

2002, p. 20).

Os artesãos envolvidos por esta pesquisa utilizam a fibra de banana como material principal na

confecção das peças. O município de Maria da Fé/MG, onde será realizada a pesquisa, localiza-se

na região do Sul de Minas, e a bananicultura projeta-se como uma importante atividade agrícola, na

geração de emprego e renda. A área de cultivo da banana na região é de, aproximadamente, 9.600

hectares, e a produção estimada é de 86.859 toneladas/ano, e “movimenta anualmente R$30

milhões e cada hectare gera três postos de trabalho. Entre as cidades produtoras, as principais são

Brasópolis com 2.276 hectares, Pedralva com 1.500 e Cristina com 1.135 hectares”. (EMATER,

2013)

Porém, a bananicultura gera uma grande quantidade de resíduos provenientes do seu cultivo.

Dados fornecidos pela EMBRAPA (2013) mostram que de cada 100 kg de frutas colhidas no ano de

2006, 46 kg não foram aproveitados. Neste sentido, o artesanato com fibras de banana, além de

promover a geração de renda para os artesãos, promove a utilização destes resíduos, evitando o

despejo indiscriminado e a consequente contaminação do meio-ambiente. (PEREIRA, 2010)

As vantagens do uso das fibras naturais são inúmeras, e dentre elas, pode-se considerar que são

renováveis e a sua degradabilidade, aliado ao conceito de sustentabilidade e consciência

ambiental. Em muitos trabalhos tem-se observado o desenvolvimento de produtos a partir das fibras

celulósicas (resíduos vegetais) de juta, sisal, linho, banana, bambu, madeira, palmeira, coco em

reforço em polímeros termorrígidos ou termoplásticos, conforme a característica do produto e da

região (FUNG et al., 2003; MATTOSO, 1999; HERRERA-FRANCO e VALADEZ-GONZÁLEZ,

2004).

A questão da precarização é sustentada por meio da não legitimação pelos órgãos governamentais

do trabalho e das atividades desenvolvidas pelos artesãos, o que tem desdobramentos práticos,

como o não enquadramento nos benefícios previstos na legislação vigente, e subjetivos, ao que

concerne o reconhecimento destes pela sociedade.

As Tecnologias Sociais (TS) aparecem no referido contexto enquanto uma via de ruptura para o

ciclo de exclusão dos artesãos da economia convencional. Essas são definidas enquanto produtos,

técnicas ou metodologias replicáveis, desenvolvidas na interação com a comunidade e que

representem efetivas soluções de transformação social (DAGNINO, 2008). Compreendemos por

Tecnologias Sociais: produtos, técnicas ou metodologias replicáveis, desenvolvidas na interação

com a comunidade e que representem efetivas soluções de transformação social. Considera-se que

geração de conhecimento para a inclusão, base sobre a qual o projeto foi fundado, demanda uma

mudança na configuração das relações entre os diferentes sujeitos implicados, configurando uma

estrutura não mais hierárquica, vertical, mas sim horizontal, de trocas e benefício mútuo, em outras

palavras, interdisciplinar.

Os conceitos e Tecnologia Social, Economia Solidária, inclusão, mediação e desenvolvimento

ganham, através deste projeto, uma dimensão prática originada no movimento exógeno da

Universidade através de suas relações com os diferentes segmentos sociais. Como ponto de

partida temos geração de conhecimento para a inclusão, sob a ótica da educação tecnológica

voltada à integração entre produção de conhecimento e sua adequação à "realidade social".

Analisando as características da trajetória histórica do enfoque CTS (Ciência, Tecnologia e

Sociedade) e o que ele apresenta para transformações significantes no ensino dentro da

Universidade.

Von Linsingen (2004) afirma que a consolidação de uma educação tecnológica que leve em conta a

CTS ao nível do conhecimento tecnocientífico, pode ser favorecida por meio de três ações

sintonizadas: (a) introdução da interdisciplinaridade nos projetos como necessidade para o

tratamento dos assuntos científicos, tecnológicos, sociais e ecológicos; (b) introdução da

transversalidade da CTS na abordagem disciplinar das áreas técnicas; (c) transposição didática que

permita a explicitação das imbricações sociotécnicas do conhecimento tecnocientífico.

Segundo Dagnino (2008) não se trata de aproveitar conhecimento gerado com dinâmica funcional

para desenvolver tecnologias que satisfaçam outras demandas socioeconômicas e políticas. O que

se deseja é gerar uma nova dinâmica, que proporcione a construção social de um conhecimento

voltado às necessidades e aos interesses dos atores pertencentes, no caso, à associação e a

cooperativa. Assim, se por um lado os horizontes universitários serão ampliados no sentido da

abertura da instituição aos movimentos sociais organizados, a estes serão levados os instrumentos

necessários para que adquiram autonomia jurídico -legal, econômica, política e sustentável.

3. METODOLOGIA

A pesquisa abarca pesquisadores e profissionais com formação em distintas áreas do

conhecimento e atuação profissional nos múltiplos campos relacionados ao Desenvolvimento, às

Tecnologias e à Sociedade, bem como no campo de reflexões ou atuação da gestão social (UNIFEI,

2013). Portanto, a equipe, assim como o PPG, é multidisciplinar e multi institucional, integrando

pesquisadores e alunos nas áreas de Administração, Ciências Sociais, Engenharia de Materiais e

Desenho Industrial, membros do PPG DTecS, do Mestrado Profissional em Engenharia de

Materiais e da graduação em Desenho Industrial da Faculdades Integradas Teresa D’Ávila -

FATEA.

A metodologia da pesquisa foi construída de modo a conciliar os instrumentos metodológicos

correspondentes a cada uma das disciplinas abrangidas, ao mesmo tempo em que se procurou dar

espaço ao surgimento de instrumentos trazidos pelas necessidades do campo e que não

pertencessem a nenhuma área em específico.

No primeiro semestre da pesquisa, a coleta de dados do município de Maria da Fé/MG, por meio de

fontes como o IBGE, Fundação João Pinheiro e a Prefeitura Municipal sobre a situação econômica,

a influência do artesanato na economia local, o cadastro dos artesãos e o turismo local. Quanto aos

artesãos inseridos na associação e cooperativa, serão levantados o histórico, a história de vida dos

artesãos e suas relações com os híbridos (Cadeia produtiva, processo produtivo e criativo –

Design). Será averiguada a existência de parcerias público/privada, o reconhecimento social dos

artesãos, as demandas e a coleta de materiais para a produção artesanal. Ainda na etapa de coleta

de dados, será realizado o levantamento estrutural dos Movimentos Sociais Organizados, no caso

deste estudo, da Cooperativa e Associação de Artesãos quanto à estrutura econômica,

organizacional, jurídico e legal.

Todo o processo de coleta de dados é sustentado por instrumentos como a observação

participante, busca documental e entrevistas individuais e em grupo. Esses fazem parte do rol do

que nas ciências sociais é denominada pesquisa qualitativa, considerada um “conjunto de técnicas

para coletar dados sobre valores, hábitos, crenças, linguagem, significados e comportamentos

sociais” (OLIVEIRA, 2010, p. 73). Acrescido a isso, pensa-se essa relação levando em conta o

coletivo (humano/não-humano), leitura da realidade sociotécnica, buscando relações simétricas no

mesmo. Ainda conforme Oliveira (2010), a importância de se realizar pesquisa por meio de

metodologia qualitativa é clara uma vez que esta:

Realiza-se através do contato direto do pesquisador com o fenômeno observado a

fim de obter informações sobre a realidade dos atores sociais em seu próprio

contexto [...] as observações visam buscar os fundamentos na análise no meio onde

vivem os atores sociais. (OLIVEIRA, 2010, p. 80)

Neste sentido, pensando na Teoria Ator-Rede (ANT) de Latour (2012), o contexto não será tomado

como um “justificador” das particularidades observadas em campo, mas sim como mais um dos

fatores de igual peso a ser considerado dentro da Rede formada. Ou seja, conforme prevê o autor,

procuraremos nos manter entre a interação local e o contexto global.

Na etapa de Sistematização dos Dados Coletados serão executadas as análises da dimensão

socioeconômica dos atores, elaboração de um workshop junto aos artesãos, e com o objetivo de

auxiliar na aplicação deste, será desenvolvido um material didático, voltado para as demandas

locais. Posterior à coleta de dados e análise, serão incorporados aos estudos a Engenharia de

Materiais e o Design de Produto nas análises de produto e processos da Cooperativa e Associação

de Artesanato.

Os estudos envolvendo Engenharia de Materiais abordará o acompanhamento do processo de

preparação das fibras de banana, mapeando desde o processo de corte do pseudocaule até a

produção das fibras, a caracterização das fibras por Microscopia Eletrônica e Óptica. Os produtos,

embalagens e estética dos produtos artesanais serão aprimorados sob a égide do Design de

Produto, com estudos e análises executados por profissional-pesquisador da área.

A terceira etapa da pesquisa denominada “devolutiva”, cujo movimento é de retorno ao campo após

os estudos realizados na Universidade. Pretende-se implantar as alterações de produtos e

processos resultantes da etapa 2 em conjunto com os membros da Associação e da Cooperativa

sujeitos da pesquisa. Essa etapa também pressupõe a realização de cursos de capacitação, ou

workshops, destinados a suprir as possíveis carências estruturais constatadas na primeira etapa,

Por exemplo: profissionalização na gestão e administração de recursos; novas técnicas de

produção e escoamento do produto; captação de recursos advindos da parceria público/privada etc.

Observa-se nesse ponto a importância da interdisciplinaridade posto que as múltiplas dimensões do

conhecimento são somadas sob um único objetivo, e cada qual mantém ao mesmo tempo suas

particularidades e o diálogo fundamental à formação de uma rede. Nota-se também que na 3ª etapa

a Administração e o Direito, enquanto áreas disciplinares, são chamados ao projeto a fim de agregar

possibilidades.

A quarta e última etapa sustenta-se em campo acompanhando como as mudanças trazidas pela

terceira influenciarão ou não transformações locais, e se essas serão, caso ocorram, positivas ou

negativas. Para tanto, resgata-se a metodologia qualitativa explicitada na primeira etapa, buscando

assim coletar novos dados que viabilizem a contraposição aos primeiros e, consequentemente, uma

análise do impacto que as Tecnologias Sociais podem causar nas diversas faces do local.

4. RESULTADOS PRELIMINARES

A pesquisa está em fase de desenvolvimento no Programa de Pós-Graduação em

Desenvolvimento, Tecnologias e Sociedade da Universidade Federal de Itajubá – UNIFEI. O projeto

atende uma das premissas do Programa, que seja a produção de conhecimentos, informações,

estratégias e ações sobre desenvolvimento, tecnologias, tecnologias sociais, cultura, trabalho,

educação e identidade em diferentes campos do conhecimento, integrando-os em função de uma

visão multidisciplinar.

Destacada a dimensão interdisciplinar da pesquisa, desenvolvida de modo a conciliar as

particularidades de cada uma das disciplinas abrangidas concomitantemente à procura de dar

espaço ao surgimento de instrumentos trazidos pelas necessidades do campo e que não

pertencessem a nenhuma área em específico, é relevante a tomada do objeto de pesquisa

enquanto um “assunto híbrido”, ou seja, que abrange a realidade como algo que vai além do recorte

instituído pelas disciplinas.

É necessário destacar a característica elástica do conceito de Tecnologias Sociais e que o projeto

em questão implica na formação de uma rede interdisciplinar entre a Administração, Ciências

Sociais, Engenharia de Materiais e Design de Produtos que forneça os instrumentos necessários

para que elas próprias atuem enquanto um meio para que o local possa ser deslocado ao centro,

possibilitando a consolidação de uma cultura democrática pela participação dos atores implicados

na busca de resolução de seus próprios conflitos e demandas. Admite-se que o projeto em questão

ainda não consegue atingir plenamente a proposta de Latour (2012) no que concerne à leitura

simétrica entre os actantes na formação de uma Rede. Entretento, elementos da Teoria Ator-Rede

permearam todas as etapas propostas, na busca de uma nova concepção do híbrido que supere

uma visão antropocêntrica.

As etapas de coleta e sistematização dos dados contam com dois bolsistas do Programa

Institucional de Bolsas de Iniciação Científica – PIBIC – CNPq, sendo que um bolsista executará a

pesquisa na Cooperativa de Artesãos, e o outro na Associação de Artesanato do município de Maria

da Fé - MG. Serão considerados os artesãos e o contexto socioeconômico no qual se encontram,

com a finalidade de compreender a inclusão dos artesãos no mercado local, enquanto

representantes da precarização de produtos e processos. Portanto, pretende-se, por meio da

observação participante e descrição densa (GEERTZ, 2008), apreender esses artesãos e seus

produtos. Procedimento que faz parte da Etapa 1 da pesquisa “Design, Engenharia de Materiais e

Tecnologias Sociais: Produção Artesã e Inclusão no Mercado”. As análises da fibra de banana e

design de produto serão realizadas em paralelo com a etapa inicial do projeto, de coleta e

sistematização dos dados.

Destaca-se a participação das artesãs membros da Cooperativa Gente de Fibra na XIV FENEART –

Feira Nacional de Negócios do Artesanato, realizada de 04 a 14 de julho de 2013 no Centro de

Convenções em Olinda, Pernambuco. O evento é considerado o maior do segmento na América

Latina, com investimento de R$ 4,8 milhões, a estimativa é movimentar acima de R$ 40 milhões em

negócios e receber um público superior a 300 mil pessoas durante os seus onze dias de realização

(FENEART, 2013).

As peças artesanais foram expostas em uma área reservada ao TOP 100 SEBRAE, visto que a

Cooperativa é apoiada pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas – SEBRAE

e integra o ranking das unidades produtivas artesanais mais competitivas do Brasil, Figura 1.

Figura 1 – Peças artesanais da Cooperativa Mariense de Artesanato – Gente de Fibra – expostas na

XIV FENEART, Olinda/PE

Fonte: Os autores

Análise de Produtos e Processos – Fibras de Banana – Engenharia de Materiais

Essa etapa contempla a área disciplinar de Engenharia de Materiais, em que as fibras de banana

utilizadas na produção artesanal serão analisadas em Microscópio Eletrônico de Varredura (MEV),

na Escola de Engenharia de Lorena – EEL – USP, e a microscopia óptica das fibras de banana

serão realizadas no Laboratório de Materiais, Texturas e Modelagem Prof. Wilson Kindlein, nas

Faculdades Integradas Teresa D’Ávila – FATEA, Figura 2.

Figura 2 – Microscópio Eletrônico de Varredura da EEL-USP

Fonte: Os autores

O MEV, segundo Dedavid (2007) é um aparelho que pode fornecer rapidamente informações sobre

a morfologia e identificação de elementos químicos de uma amostra sólida, sendo um dos mais

versáteis instrumentos disponíveis para a observação e análise de características microestruturais

de objetos sólidos. Outra característica importante do MEV consiste na:

Aparência tridimensional da imagem das amostras, resultado direto da grande

profundidade de campo. Permite, também, o exame em pequenos aumentos e com

grande profundidade de foco, o que é extremamente útil, pois a imagem eletrônica

complementa a informação dada pela imagem óptica (DEDAVID, 2007: p.10).

Os parâmetros estatísticos serão avaliados num microscópio óptico. Na aquisição das imagens

serão capturados e digitalizados 40 campos de medida por amostra numa câmera profissional com

resolução 640x480x8bites em campo claro com auxilio da luz de xenônio, visando à determinação

da distribuição, tamanho, classificação das fibras, conforme a norma ASTM 1382-1997, Figura 3.

Figura 3 – Microscópio Óptico do Lab. de Materiais, Texturas e Modelagem da FATEA

Fonte: Os autores

O processo de análise da fibra acompanhará desde a extração do pseudocaule, lavagem das fibras,

separação e obtenção dos fios, até a secagem. Concomitantemente a este acompanhamento,

serão preparadas as amostras para análise. O acompanhamento do processo extrativo será

comparativo, abrangendo a Cooperativa e Associação de Artesãos. Deste modo, será possível

observar as técnicas e instrumentos/utensílios utilizados, espécie de bananeira e outros dados

relevantes.

Análise de Produtos e Processos – Peças Produzidas pelos Artesãos – Design de

Produto

Posterior a análise das fibras por meio da Engenharia de Materiais, será executado o detalhamento

2D e 3D das peças produzidas pelos artesãos por meio dos softwares AutoCAD e SolidWorks,

promovendo um estudo pormenorizado, visando agregar valores tecnológicos, funcionais e

estéticos. Ressalta-se que a incorporação do Design no processo de produção artesanal se dá ao

considerarmos hoje a inserção de novos atores na cadeia produtiva em questão. Se antes o

artesanato era vendido diretamente ao consumidor, agora fazem parte da cadeia agentes

intermediários, como lojistas, gestores, exportadores, entre outros, e, consequentemente a relação

oferta/demanda foi acrescida de fatores como qualidade, valor agregado, marketing etc.

O processo de detalhamento 3D, segundo Hayward e Weare (2002), parte de documentos de

desenhos preliminares. A segunda etapa consiste no modelo 3D detalhado, com a: Análise

estrutural e dimensionamento dos elementos, listas de materiais de todos os acessórios, projeto

estrutural e diagrama de montagem das peças artesanais. O software AutoCAD auxilia na

modelagem geométrica, com desenhos bi e tridimensionais. De acordo com Guarnier (2009), o CAD

permite criar três tipos de modelos: o modelo em estrutura de arame (wireframe), que utiliza linhas

conectadas para representar o objeto; o modelo de superfície (representa a peça pelas superfícies

internas e externas); e o modelo sólido, que é a representação fiel do objeto real (sólido 3D).

REFERÊNCIAS

BARROSO, Eduardo. Curso design, identidade cultural e artesanato. Fortaleza: SEBRAE/FIEC, 2002.

DEDAVID, Berenice Anina. Microscopia eletrônica de varredura: aplicações e preparação de amostras:

materiais poliméricos, metálicos e semicondutores. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2007.

DAGNINO, Renato. Neutralidade da ciência e determinismo tecnológico. Campinas: Editora da Unicamp,

2008.

EMATER-MG. Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Minas Gerais. Municípios

constituem a Associação dos Bananicultores das Serras do Sul de Minas, 2013. Disponível em:

<http://www.emater.mg.gov.br/portal.cgi?flagweb=site_tpl_paginas_internas&id=10418>. Acesso em: 17

maio 2013.

EMBRAPA. Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária. Embrapa fruta, 2006. Disponível em:

<http://www.jornalentreposto.com.br/anteriores/janeiro_2006/transporte.htm>. Acesso em: 17 maio 2013.

FENEART. XIV Feira Nacional de Negócios do Artesanato. A Feira, 2013. Disponível em: <

http://www.fenearte.pe.gov.br/2013/a-feira/>. Acesso em: 28 julho 2013.

FUNG, KL; et al. An investigation on the processing of sisal fibre reinforced polypropylene composites.

Composites Science and Technology, v.63, n.9, p.1255-1258, 2003.

GEERTZ, Clifford. A interpretação das culturas. - l.ed., IS.reimpr. - Rio de Janeiro: LTC, 2008.

GUARNIER, Christiane Roberta Fernandes. Metodologias de detalhamento de estruturas metálicas. 2009.

Dissertação (mestrado) Departamento de Engenharia Civil. Programa de Pós Graduação em Engenharia

Civil, Universidade Federal de Ouro Preto, Escola de Minas Gerais, 2009.

HAYWARD, Alan; WEARE, Frank. Steel Detailers’ Manual. 2ª Edição. Blackwell Publishing, 2002.

JOHANN, Diene Meri Weiller. Design e Artesanato: análise da gestão, materiais e técnicas utilizadas em

grupos de artesãos no Rio Grande do Sul. 2010. Dissertação (mestrado) Escola de Engenharia e Faculdade

de Arquitetura, Programa de Pós Graduação em Design, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Rio

Grande do Sul, 2010.

LATOUR, Bruno. Jamais fomos modernos: ensaio de antropologia simétrica. Rio de Janeiro, 1994.

LATOUR, Bruno. Reagregando o social – (pp. 17-96). Editora EDUFBA/Edusc, 2005.

LATOUR, B. Reagregando o social: uma introdução à teoria ator-rede. Bauru, São Paulo, Edusc, 2012.

OLIVEIRA, Maria Marly de. Como fazer pesquisa qualitativa/Maria Marly de Oliveira. 3ª ed. revista e ampliada

– Petrópolis, RJ: Vozes, 2010.

PEREIRA, A. L. S., CORDEIRO, E. M. S., NASCIMENTO, D. M., MORAIS, J. P. S., SOUSA, M. S. M., ROSA,

M. F. Extração e Caracterização de Nanocelulose de Fibras do Pseudocaule da Bananeira. V Congresso

Norte-Nordeste de Pesquisa e Inovação, 2010.

UNIFEI. Pós-Graduação. Mestrado em Desenvolvimento, Tecnologias e Sociedade, 2013. Disponível em:

<https://www.unifei.edu.br/pg/pos-graduacao-inicial?c=117&m=ME&p=0> Acesso em: 07 junho 2013.

von LINSINGEN, Irlan . O enfoque CTS e a Educação Tecnológica: origens, razões e convergências

curriculares. In: XI Congreso Chileo de Ingeniería Mecânica - COCIM 2004, Antofagasta. Anais do COCIM

2004, 2004. v. 1. p. 1-11.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem à Fundação de Amparo à Pesquisa do estado de Minas Gerais – FAPEMIG

pelo apoio no desenvolvimento da pesquisa.