Percursos da Analogia: da Fotografia à Síntese
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Percursos da Analogia: da Fotografia à Síntese
Eduardo DiasResumo: Este artigo busca identificar as relações que as técnicas deprodução da imagem mantêm com a impressão de analogia contida nasrepresentações imagéticas. Esta investigação partirá de uma delimitaçãodo conceito de analogia para em seguida questionar como as diversasartes das imagens – fotografia, cinema, televisão e vídeo – surgidas a partirdo final do séc. XIX operam a analogia em suas representações. Essepercurso será trilhado a fim de interrogar as imagens de síntese, cujanatureza se destoa das técnicas de representação do fotográfico.
Palavras-Chave: Analogia. Imagens Técnicas. Imagem de Síntese.
1. Analogia da imagemAs imagens contêm em si uma carga de informações acerca
dos mundos que representa por manter, muitas vezes, uma grande
fidelidade com o referente que está registrado. Essa aderência
ao real traz em si o testemunho de um lugar e de um momento no
qual ocorreu a produção daquela imagem. A respeito da
representação na pintura, Couchot (2003, p. 29) destaca um
conceito de historia de Leon Alberti que representa o acabamento
final da pintura e que causa emoção no espectador. Dessa
forma, as pinturas não são retratos fiéis da realidade, pois
passaram por uma intermediação do pintor.
Fato semelhante de agenciamento também ocorre nas imagens
técnicas – fotografia, cinema e vídeo. A produção de imagens
1
através de dispositivos técnicos requer uma sucessão de
escolhas na produção imagética, que envolve desde a revelação
do filme até montagem e edição. Porém, essas imagens desfrutam
de credibilidade junto às imagens que retratam por não
passarem por nenhum agenciamento no instante de seu registro.
As informações do mundo contidas nas imagens possuem um
aspecto comum: a impressão de analogia. Segundo Bellour (1993,
p. 217), a analogia é a maneira de “colocar em forma o
visível” e prolongar a natureza através da representação
imagética estando ligada à informação daquilo que ela
representa, porém sem se reduzir a essa representação. É o
elemento que situa aquela imagem no tempo e no espaço,
revelando, através do visível e do invisível, uma
interpretação, um olhar sobre o mundo naquele instante. É
através de sua potencialidade de semelhança e de representação
que o espectador pode explorar uma imagem, vendo além daquilo
que está sendo mostrado.
A analogia produz um afastamento entre a apreensão da
realidade e as imagens, pois o análogo da imagem não é o
verdadeiro, podendo ser uma referência para a construção de
2
uma compreensão do mundo através de imagens, mas não pode ser
encarado como o real em si. Dessa forma, o observador
desempenha um papel de interpretação no qual executa uma
operação de ligação entre as imagens e o mundo, fazendo
distinções, percebendo suas semelhanças, construindo suas
definições e reconhecendo ambas as naturezas.
Bellour (1993, p. 217) afirma que a multiplicidade de
imagens é o que nos permite definir a realidade, pois tomamos
como referência um mundo visto através dos registros
imagéticos e acreditamos ser possível conhecer o mundo dessa
forma de contato. Assim, ele acredita que a profusão de “modos
de ser” das imagens permeia a vida social a ponto de
definirmos o mundo ao nosso redor e a nós mesmos a partir
delas. Baudrillard (1991) acredita que pertencemos a uma
lógica da simulação, onde os modelos precedem o fato,
aprisionando-nos a uma realidade na qual não há separação
entre os pólos da simulação e verdade do mundo. A partir
destas colocações, podemos identificar a força que as imagens
possuem na construção do cotidiano da sociedade, pois ainda
que não conheçamos os elementos representados nas imagens,
3
deduziremos uma autenticidade e veracidade aos fatos
retratados.
A respeito das técnicas de produção de imagens, Bellour
utiliza a visão de Peter Galassi, que insere a fotografia para
o campo da história da arte. Segundo Bellour (1993, p.218),
Galassi afirma que “o olho se tornou móvel, face a uma
natureza doravante fragmentária e contingente, em relação à
qual a fotografia parece convocada a preencher uma função
justificada”. Assim, ele desfaz o pensamento que associa a
fotografia ao campo das invenções científicas, aproximando-a
de mudanças ocorridas com o observador.
Crary (1990), por sua vez, acredita que as mudanças
significativas no campo das imagens ocorreram no início do
século XIX, entre as décadas de 1820 e 1830. Essas mudanças
foram provocadas pela invenção de alguns aparatos técnicos que
romperam com as convenções seculares renascentistas, como por
exemplo, o traumatoscópio, o zootrópio e o estereoscópio,
sendo este último considerado pelo autor o paradigma do séc.
XIX. Ele acredita, então, que antes da invenção da fotografia,
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as artes da imagem passaram por mudanças que produziram novos
tipos de imagens, redefinindo também a posição do observador.
As técnicas mecânicas da imagem – fotografia, cinema e
vídeo – operariam uma mudança na impressão de analogia por
transfigurarem-na através dos avanços técnicos que a registram
em seus suportes.
2. A Analogia Fotográfica
Durante o século XX, tivemos que aprender a lidar com a
variedade de modos de ser das imagens a partir do surgimento
de diferentes técnicas de mecanização da produção imagética.
Ainda no séc. XIX, a fotografia se estabeleceu como referência
por ter sido a primeira técnica a romper com o paradigma
secular do modo de produção da pintura renascentista. Sua
importância se deve também à introdução de um aparato técnico
na produção imagética, retirando o caráter artesanal da
criação de imagens, ainda conservando sua ligação com o real.
A técnica possui um papel importante na expressão
estética ao oferecer recursos, configurar e reconfigurar os
modos de produção, influenciar a percepção, entre outros. A
respeito das tecnologias de produção da imagem, Crary (1990,
5
p. 8) afirma que a “tecnologia é sempre uma parte concomitante
ou subordinada de outras forças”1. Vemos que a técnica possui
papel importante na expressão artística, porém ela não é o
elemento fundamental para a construção de um discurso
imagético.
A fotografia representa plasticamente o visível no
instante da captura da imagem e comprova a existência daquilo
que ela reproduz. Barthes (1998) afirma que esta é a essência
da fotografia. Ele ainda afirma que a fotografia é a forma
“co-natural” do referente real posto em frente à câmera. Esse
“certificado de presença” transforma a foto em uma “informação
descontínua da vida passada” (KOSSOY, 2001, p. 115),
representando o fragmento de um mundo que excede os limites
daquela imagem. Benjamin, em Pequena História da Fotografia (1971),
atribui o conceito de aura ao registro único de um referente
distante, no qual o acaso esteja presente, revelando uma
unicidade daquela imagem decorrente da fugacidade daquele
momento. Mesmo representando um mundo recortado, a fotografia
tem a capacidade de devolver a vida àquele instante
1 Tradução livre do trecho, em inglês, “[On the contrary,] technology isalways a concomitant or subordinate part of other forces.”
6
registrado, que, efêmero, tornou-se através do suporte
material o único remanescente daquele instante.
A imagem fotográfica também possui a capacidade de
recuperar pequenas histórias implícitas nas imagens. Ao
eternizar determinada ocasião, ela conserva memórias para as
pessoas que mantém uma ligação emocional com o assunto
retratado e também fornece elementos para uma interpretação
livre de memórias afetivas com a imagem. Essas memórias podem
remeter ao momento do encontro das pessoas retratadas ou à
maneira como elas se relacionavam ou ainda podem guardar na
imagem simbologias maiores, como a memória de um lugar, um
monumento específico que não existe mais, bem como representar
as modas de vestuário e de penteados, para citar também
exemplos comuns ao grande grupo da sociedade.
A analogia fotográfica corresponde ao valor de índice que
a imagem carrega em si do momento passageiro de seu registro e
também ao remeter à realidade em sua representação. Na
fotografia, a analogia se estabelece por definir o mundo
através dessa constante referência ao momento passado que foi
reproduzido, pois sempre implica a semelhança e o
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reconhecimento em suas imagens. Por eternizar o instante em
seus detalhes, a fotografia foi vista como uma estrutura
portadora e exemplificadora da analogia da imagem. Essa
característica de analogia tornou-se constitutiva de sua
natureza.
3. Extensões-distensões da analogia: o movimento e a
transmissão.
O surgimento do cinema no final do séc. XIX deu
prosseguimento ao processo de maquinização das imagens
iniciado pela fotografia. Ele permite o registro e a exibição
da imagem através de seu dispositivo, fazendo com que a
fruição da imagem se torne dependente de uma máquina (técnica)
específica. Além disso, as imagens cinematográficas inseriram
no campo imagético o movimento, que é criado a partir da
projeção de uma seqüência de fotogramas a uma velocidade
constante para que a persistência retiniana dessas imagens
produza a sensação de movimento. A respeito do poder de
atratividade das imagens do cinema, Edgar Morin afirma que
“o cinematógrafo aumenta duplamente a impressão derealidade da fotografia, na medida em que, por um ladorestitui aos seres e às coisas seu movimento natural, e,por outro lado, os liberta tanto da película quanto da
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caixa do quinetoscópio, projectando-os sobre umasuperfície em que parecem autônomos” (MORIN, 1997, p.31).
O autor diferencia o estado da imagem cinematográfica em
relação à fotográfica. Com isso ele atinge a questão da
analogia da imagem do cinema ao falar de sua autonomia em
relação ao registro – concretização da imagem em movimento
acontece na tela – e ao suporte – elas não são mais palpáveis
nem contemplativas e sua fruição é de uma nova ordem. Por
essas distinções, o filme requer uma nova constituição da
representação e da semelhança em suas imagens, especificando a
sua expressão estética através da sua técnica.
Algumas décadas depois surgiu a televisão, que veio a se
popularizar após a II Guerra Mundial. As tecnologias de
transmissão e recepção desenvolvidas para a guerra
contribuíram para o aprimoramento do novo aparato ao serem
utilizadas comercialmente no período pós-guerra. A tecnologia
da TV eliminou o tempo diferido entre a captação/registro da
imagem e sua exibição, características presentes na fotografia
e no cinema. Suas imagens são transmitidas – sobreapresentadas2
2 Segundo o autor, a sobreapresentação de imagens consiste na eliminação dadistância entre a produção e a exibição de uma imagem, proporcionadaatravés das tecnologias de transmissão ao vivo da TV.
9
(COUCHOT, 2003) – ao vivo, já que o videotape surgiria décadas
depois.
As técnicas de produção introduzidas pelo vídeo
permitiram ao artista uma maior liberdade e flexibilidade das
imagens. Tornou-se possível, então, a manipulação do tempo e
do espaço através de fundamentos básicos como a transmissão ao
vivo ou a edição de vídeo. Ainda que a presença dos referentes
se fizesse necessária frente às lentes das câmeras, era
possível encadear no momento da transmissão seqüência de
lugares e tempos distintos em uma mesma obra. A tecnologia do
vídeo ainda permitiu que os corpos e os objetos fossem
virtualmente modificados pelas ferramentas de edição das
imagens – característica bastante comum na videoarte
desenvolvida a partir da década de 60. O filme, por sua vez,
não possuía a mesma liberdade, pois ficava restrito às
trucagens entre cenas e planos.
Segundo Bellour (1993, p. 221), o cinema expandiu a
analogia das imagens ao introduzir o movimento nas imagens,
reproduzindo assim a realidade em sua forma aparentemente
completa. Ao abrir mão da condensação do mundo em uma imagem
10
estática, o filme explora as questões da representação e
semelhança. Ele ainda constrói a metáfora da “dupla hélice”
(1993, p. 221) baseando suas observações no cinema, por este
manter contato direto com o movimento e o tempo.
A dupla hélice consiste nas ligações que as analogias do
fotográfico (recuperação indicial do momento efêmero) se unem
às do cinema (reconstituição do movimento natural). Para ele,
esses dois modos de imagens mantiveram vínculos entre si, que
resultou em uma produção baseada na exploração mútua da
característica principal da outra modalidade. Em outras
palavras, nesses vínculos, o cinema explora a analogia por
referência do fotográfico e a fotografia explora o movimento
cinematográfico em suas imagens. O autor coloca a sua posição
a esse respeito afirmando que o encontro dessas duas
modalidades, que acontece no filme, desvirtua as
especificidades das imagens em uma mescla que se aproxima da
desfiguração e da falta de reconhecimento das imagens.
Em cima das suas proposições sobre a fotografia e o
cinema, Bellour (1993, p. 222-3) faz considerações a respeito
das imagens do vídeo. Em relação ao fotográfico, ele considera
11
que o vídeo é uma “mancha disforme” que potencializa a
representação, mas ao mesmo tempo o arruína. Em relação ao
cinema, ele considera que o vídeo dissolve a analogia do
movimento ao tratá-lo em tempo real, no tempo da transmissão.
Após a introdução do movimento nas imagens e de sua
transmissão e manipulação em tempo real, as questões da
analogia passaram por uma reformulação diante da diversidade
de modalidades e de suas possíveis contaminações. A analogia
teve então que aprender a lidar com o dinamismo do movimento e
da atualidade da transmissão.
4. A analogia ao limite: síntese numérica e a simulação
imagética
O desenvolvimento da interface gráfica nos computadores
ocorrida no final dos anos 70 e início da década de 80
permitiu que estes se transformassem em um espaço para a
convergência das mídias, pois ele permitia, em potência, a
manipulação de qualquer tipo de imagens – e também de sons –
por meio dos seus softwares. O desenvolvimento da computação
gráfica atingiu a produção de imagens por meio de dispositivos
tecnológicos, atingindo a fotografia, o cinema, a televisão e
12
o vídeo ao possibilitar a manipulação de todos esses tipos de
imagens em softwares específicos, que não se limitaram apenas
ao tratamento das imagens e também passaram a permitir a
criação de imagens em seu ambiente técnico. Também foram
desenvolvidas técnicas de modelização em três dimensões, que
reproduzem gráfica e detalhadamente o mundo real. Esse novo
tipo de imagem totalmente numérica e sem o vestígio de um
referente durante seu processo de produção é chamado de imagem
de síntese.
A criação digital de imagens se baseia em modelos de
memória – armazenados no software ou por outra fonte de
informação como livros, desenhos, fotografias, etc. –,
ocorrendo em um tempo diferido entre produção imagética e o
espaço-tempo da realidade. O processo criativo baseado na
simulação desfaz a lógica referente e representação
prescindindo deste último e suas imagens a invertem ao
preceder o mundo que representam (BAUDRILLARD, 1991).
Simular o real também faz desaparecer os espaços de
diferença entre o mundo e a sua representação, pois se procura
eliminar a existência de referenciais e símbolos da realidade
13
a serem representados. Baudrillard (1991, p. 9-10) aponta que
simular é pôr em questão a “diferença do verdadeiro e do
falso, do real e do imaginário”. A esse respeito Couchot
(2003) afirma:
tudo se passa então como se a simulação numéricaengendrasse a aparição de uma outra dimensão do real,bem diferente de uma cópia, de uma representação ou deuma duplicação: um análogo purificado e transmutado pelocálculo (COUCHOT, p.173).
É através do “análogo numérico do mundo” que o autor vê
como as imagens de síntese se relacionam com os indivíduos e
com aquilo que elas representam, ao participarem de um
processo de desreferencialidade ao oferecer imagens ao mundo,
alterando e questionando nossos processos de semelhança e
representação.
O olho desempenha uma função de ligação entre a
representação e o mundo, operando nos processos de
reconhecimento das imagens e associação com a realidade. É ele
que irá reconhecer a impressão de analogia contida nessa
modalidade de imagem. Bellour (1993, p. 225) afirma que a
síntese potencializa a analogia ao circunscrever as imagens a
um território informacional, no qual todas as bordas da imagem
podem ser moduladas a partir da manipulação do criador e
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também se tornando objetos cujas referências são eles
próprios.
A imagem originada a partir da síntese numérica e baseada
na representação por simulação do mundo aparenta ter
dissolvido a questão da analogia em um afastamento entre o
sentido e a semelhança. Porém a imagem não perde sua impressão
de analogia, ela a reconfigura através de um afastamento entre
o que ela representa e aquilo que ela se torna. Esse
afastamento se refere à aderência ao real que as imagens
produzidas por projeção ótica nos dispositivos possuem,
testemunhando a presença dos referentes em um espaço-tempo
determinado e registrado nos suportes.
5. O caso “Eye for an eye”
O videoclipe Eye for an eye foi lançado oficialmente em 2002
pelo coletivo britânico U.N.K.L.E. sendo o primeiro single do
álbum Never, Never Land, lançado em 2003. A direção do clipe ficou
a cargo do coletivo de design e animação Shynola e com o apoio
da animadora Ruth Lingford. Este vídeo foi desenvolvido como
um curta tendo a intenção de ser lançado como um filme ao
mesmo tempo em que fosse lançado como um vídeo promocional. O
15
vídeo incorpora a canção homônima e possui também um trecho de
uma música do filme Fantasia, de Walt Disney, e de pinturas em
3D da banda britânica Massive Attack.
Segundo o empresário do grupo, este videoclipe procura
ser visto primeiramente como um manifesto anti-guerra em vez
de ser um sucesso comercial. Durante a produção deste vídeo,
ocorreram os atentados de 11 de setembro de 2001 em Nova York,
tornando o trabalho relevante e, segundo os componentes do
Shynola, ganhando uma nova dimensão. O vídeo foi exibido em
festivais de animação nos anos seguintes ao seu lançamento,
chegando a conquistar alguns prêmios.
FIGURA 1 – Still de Eye for an eye, U.N.K.L.E.
O vídeo foi produzido em animação tridimensional e
apresenta pequenos seres pacíficos constituídos de massa
rígida (FIG. 1) vivendo em uma espécie de paraíso constituído
por flores e árvores frutíferas. Após prólogo – música do
filme Fantasia –, aparecem no céu aviões que carregam uma
16
espécie da mesma raça em uma altura gigantesca, aparentando
fisicamente ser uma figura materna de todos aqueles seres. A
criatura é jogada ao chão (FIG. 2) e possui pequenos encaixes
para a única expressão facial existente nos pequenos seres,
que atraídos pela novidade encaixam sua “boca” nos diversos
encaixes vermelhos espalhados pelo corpo do enorme ser. A
criatura revela sua natureza perversa e suas intenções bélicas
ao liberar estranhos insetos pretos (FIG. 3) que lutam contra
os pequenos seres. Após esse fato, a guerra se instala no
lugar que anteriormente se mostrava pacífico. No final do
vídeo, quando a população nativa aparenta ter sido derrotada
os seres invasores se retiram e os aviões retornam, levando a
estranha e enorme criatura embora, provavelmente para atacar
outro lugar. O videoclipe termina com a frase an eye for an eye
makes the whole world blind3, reiterando a intenção de manifesto
pacifista do clipe. A letra da música também faz parte deste
pequeno manifesto citando a conhecida Lei de talião “olho por
olho, dente por dente” e finaliza avisando que não adianta
correr por que não é possível se esconder4.
3 Em tradução livre do inglês, olho por olho faz o mundo inteiro cegar.4 Letra no original em inglês, “an eye for an eye/ a tooth for a tooth/ runrun run/ but you sure can’t hide”.
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FIGURA 2 – Still de Eye for an eye, U.N.K.L.E.
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19
FIGURA 3 – Still de Eye for an eye, U.N.K.L.E.
Em um primeiro momento, os aviões que carregam a enorme
criatura podem nos remeter a imagens daqueles aviões que jogam
comidas e medicamentos nos territórios de países pobres que
atravessam um momento de guerra ou de epidemia. Porém, o
prosseguimento do videoclipe nos remete à história do Cavalo
de Tróia – artefato de guerra mascarado de presente e
utilizado pelos espartanos para derrotar os troianos – no
momento em que os estranhos insetos começam a sair da grande
criatura e em seguida atacam os nativos daquele lugar. A
operação se completa quando as pacíficas criaturas se
transformam nos estranhos insetos escuros, tornando-se parte
daquele exército destruidor/conquistador. O final do vídeo
ainda nos traz símbolos de uma verdadeira guerra: o líder que
coopta os novos guerreiros que se movem enfileirados em marcha
como um exército, a bandeira fincada no território
conquistado, o abandono do lugar para dar prosseguimento aos
objetivos de conquista.
1993. pp. 201-213
SONTAG, Susan. Sobre a Fotografia. São Paulo: Companhia das Letras,
2004.
20
Por escolha dos realizadores, este videoclipe opta por um
formato mais tradicional de constituição dos elementos,
inserindo uma narrativa canônica, que possui começo, meio e
fim, contando com um prólogo – a música de Fantasia – e um
epílogo – a frase ao final do vídeo, porém sua narrativa é
simplificada devido a curta duração do formato. É comum alguns
videoclipes procurarem explorar formatos de narrativa que se
aproximam dos curtas-metragens, baseando-se em poucos
elementos narrativos e utilizando uma estrutura simples para
desenvolver a história, a fim de se diferenciar sua produção
das outras, dando um caráter mais elaborado àquele produto que
compõe a sua obra artística.
Em todo o clipe, as imagens nos apresentam seres que
podemos fazer correspondência deles à realidade – podemos
comparar os nativos com pequenos seres como crianças e
pigmeus, comparamos os insetos a moscas – e também fazemos
comparação entre a enorme criatura a uma figura materna que
amamenta os filhos, as frutas nos remetem a cerejas, entre
outras referências contidas nas imagens. As imagens nos levam
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a fazer comparações com as ações de guerra e suas estratégias
e também nos remetendo à mitologia grega.
Dessa forma, o clipe constrói uma rede de semelhanças com
signos comuns da nossa sociedade, mostrando-nos imagens
realistas construídas por síntese numérica. A impressão de
analogia aqui se dá através do nosso conhecimento do mundo e
das ligações que fazemos entre as representações operadas com
o que o individuo considera que seja verdadeiro e/ou
verossímil, implicando associações entre aquelas
representações e as imagens que temos como repertório
cultural.
Notas
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