OBTENÇÃO DE PLANTAS TETRAPLÓIDES DE CITROS VISANDO A PRODUÇÃO DE 1 TRIPLÓIDES SEM SEMENTES 2 3

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OBTENÇÃO DE PLANTAS TETRAPLÓIDES DE CITROS VISANDO A PRODUÇÃO DE 1 TRIPLÓIDES SEM SEMENTES 2 3 Autores: Lilian Povedano 1 , Francisco Humberto Henrique 1 , Augusto Tulmann Neto 2 , Rodrigo 4 Rocha Latado 1 5 6 Resumo: Uma das estratégias para a produção em citros com frutos sem sementes é a utilização 7 de variedades triplóides, resultantes do cruzamento de plantas tetraplóides com plantas diplóides. 8 Um dos problemas para uso mais intenso desta metodologia está no baixo número de variedades 9 tetraplóides disponíveis. O objetivo do presente estudo foi induzir plantas autotetraplóides das 10 laranjeiras Lima e Buckeye navel, tangerineira Clementina e Fortunella, com uso do método do 11 cultivo temporário na presença de colchicina, visando o seu uso posterior como parental em 12 cruzamentos com variedades diplóides, para obter híbridos triplóides sem sementes. Os 13 tratamentos utilizados eram compostos pelo cultivo de segmentos de epicótilo de cada variedade, 14 durante 1, 2 ou 3 dias, no meio de cultivo contendo as concentrações de colchicina de 0,025 e 15 0,05% p/v, seguido de transferência para placas contendo o mesmo meio de cultura, mas sem a 16 presença do alcalóide, até a regeneração de brotações. Aos 60 dias de cultivo foi realizada a 17 avaliação do número de brotações regeneradas por explante. As brotações adventícias 18 regeneradas foram microenxertadas in vitro e, em seguida, aclimatizadas as condições 19 ambientais. Para a seleção de plantas tetraplóides usou-se a metodologia de citometria de fluxo, 20 seguido da avaliação de densidade estomática na epiderme abaxial das folhas. A colchicina 21 ocasionou um efeito fitotóxico nos explantes, resultando na redução do número de brotações 22 regeneradas por explante, com exceção para a tangerineira Clementina. Esta toxidez, causada 23 pelo uso da colchicina, variou em função da variedade, do tempo de tratamento e da concentração 24 de colchicina. As etapas de microenxertia in vitro e aclimatização, utilizados, foram eficientes com 25 a obtenção de mais de 40 plantas de cada variedade, sendo a frequência observada de plantas 26 autotetraplóides variou entre 9,3 e 21,9%, nas quatro variedades. A avaliação da densidade 27 estomática de folhas de plantas de diversas ploidias demonstrou haver uma alta e negativa 28 correlação entre a densidade estomática e a ploidia, chegando a se observar reduções de até 29 50% nas densidades estomáticas de folhas de plantas autotetraplóides, em relação às plantas- 30 controle diplóides. 31 Termos de indexação: citros, tetraplóide, sem semente, colchicina 32 33 34 1 Centro de Citricultura Sylvio Moreira/IAC, Rod. Anhanguera, Km 158, Cx. Postal 04, 13.490- 970, Cordeirópolis, SP. Autor correspondente R.R.L. e-mail: [email protected] 2 Centro de Energia Nuclear na Agricultura/USP, Av. Centenário, 303, São Dimas, 13.416-000, Piracicaba, SP.

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OBTENÇÃO DE PLANTAS TETRAPLÓIDES DE CITROS VISANDO A PRODUÇÃO DE 1

TRIPLÓIDES SEM SEMENTES 2

3

Autores: Lilian Povedano1, Francisco Humberto Henrique1, Augusto Tulmann Neto2, Rodrigo 4

Rocha Latado1 5

6

Resumo: Uma das estratégias para a produção em citros com frutos sem sementes é a utilização 7

de variedades triplóides, resultantes do cruzamento de plantas tetraplóides com plantas diplóides. 8

Um dos problemas para uso mais intenso desta metodologia está no baixo número de variedades 9

tetraplóides disponíveis. O objetivo do presente estudo foi induzir plantas autotetraplóides das 10

laranjeiras Lima e Buckeye navel, tangerineira Clementina e Fortunella, com uso do método do 11

cultivo temporário na presença de colchicina, visando o seu uso posterior como parental em 12

cruzamentos com variedades diplóides, para obter híbridos triplóides sem sementes. Os 13

tratamentos utilizados eram compostos pelo cultivo de segmentos de epicótilo de cada variedade, 14

durante 1, 2 ou 3 dias, no meio de cultivo contendo as concentrações de colchicina de 0,025 e 15

0,05% p/v, seguido de transferência para placas contendo o mesmo meio de cultura, mas sem a 16

presença do alcalóide, até a regeneração de brotações. Aos 60 dias de cultivo foi realizada a 17

avaliação do número de brotações regeneradas por explante. As brotações adventícias 18

regeneradas foram microenxertadas in vitro e, em seguida, aclimatizadas as condições 19

ambientais. Para a seleção de plantas tetraplóides usou-se a metodologia de citometria de fluxo, 20

seguido da avaliação de densidade estomática na epiderme abaxial das folhas. A colchicina 21

ocasionou um efeito fitotóxico nos explantes, resultando na redução do número de brotações 22

regeneradas por explante, com exceção para a tangerineira Clementina. Esta toxidez, causada 23

pelo uso da colchicina, variou em função da variedade, do tempo de tratamento e da concentração 24

de colchicina. As etapas de microenxertia in vitro e aclimatização, utilizados, foram eficientes com 25

a obtenção de mais de 40 plantas de cada variedade, sendo a frequência observada de plantas 26

autotetraplóides variou entre 9,3 e 21,9%, nas quatro variedades. A avaliação da densidade 27

estomática de folhas de plantas de diversas ploidias demonstrou haver uma alta e negativa 28

correlação entre a densidade estomática e a ploidia, chegando a se observar reduções de até 29

50% nas densidades estomáticas de folhas de plantas autotetraplóides, em relação às plantas-30

controle diplóides. 31

Termos de indexação: citros, tetraplóide, sem semente, colchicina 32

33

34

1 Centro de Citricultura Sylvio Moreira/IAC, Rod. Anhanguera, Km 158, Cx. Postal 04, 13.490-

970, Cordeirópolis, SP. Autor correspondente R.R.L. e-mail: [email protected] 2 Centro de Energia Nuclear na Agricultura/USP, Av. Centenário, 303, São Dimas, 13.416-000,

Piracicaba, SP.

Title: Induction of Citrus autotetraploid plants aiming the production of triploid seedless 1

plants 2

Abstract: One of the strategies for the production of citrus seedless fruits is the use of triploid 3

varieties resulting from crossing between tetraploid and diploid plants. One of the problems for 4

more intense use of this methodology is the low number of tetraploid cultivars available. The aim of 5

this study was to induce autotetraploid plants of Lima and Buckeye navel sweet oranges, 6

Clementina mandarin and Fortunella, using the method of temporary cultivation in media 7

containing colchicine, aiming its subsequent use as a parental in crosses with diploid plants, in 8

order to obtain seedless triploid hybrids. The treatments consisted of the cultivation of epicotyl 9

segments of each variety 1, 2 or 3 days in media containing colchicine at concentrations of 0.025 10

to 0.05% w/v, followed by the transfer of explants to Petri dishes containing the same medium 11

without the presence of alkaloid. At 60 days, the number of regenerated shoots per explant of all 12

treatments was assessed. The adventitious shoots were in vitro micrografted and then, 13

acclimatized to environmental conditions. Flow citometry method was used for selection of 14

tetraploid plants followed by evaluation of stomata in the abaxial epidermis of the leaves. 15

Colchicine caused a phytotoxic effect in the explants, resulting in reducing the number of 16

regenerated shoots per explant, except for Clementine mandarin. This toxicity caused by use of 17

colchicine varied depending on the variety, period of the treatment (1, 2 or 3 days) and 18

concentration of colchicine. The stages of in vitro micrografting and acclimatization were efficient 19

with getting more than 40 acclimatized plants of each variety, and the observed frequency of 20

autotetraploid plants ranged between 9.3 and 21.9% in the four varieties. The evaluation of 21

stomata density of the autotetraploid plants showed a high and negative correlation between 22

stomata density and ploidy, because it was observed reductions up to 50% in stomata density of 23

autotetraploid plants compared to control plants (diploid). 24

Index terms: citrus, tetraploid, seedless, colchicine 25

26

Introdução 27

28

A cadeia citrícola pode ser considerada como um dos segmentos mais globalizados do 29

agronegócio brasileiro com grande parte de sua produção voltada ao mercado externo, trazendo 30

anualmente aproximadamente US$ 1,5 - 2,0 bilhões, em divisas para o país (Neves et al., 2010). 31

O Brasil detém a liderança mundial na produção e exportação de suco de laranja com 32

aproximadamente 85% das exportações mundiais em 2009, mas participa pouco do mercado 33

mundial de frutas frescas, com volume aproximado de 0,2% do total de produção de frutos na 34

safra 2008/09 (Neves et al., 2010). 35

Além de questões de ordem fitossanitária e clima não ideal, outra importante razão para a 36

baixa participação brasileira neste mercado de frutas frescas é a inexistência de variedades que 37

atendam aos requisitos de qualidade exigidos pelo mercado externo, principalmente, a 1

comercialização de frutos sem sementes (apirenos). 2

Uma estratégia para a produção de frutos cítricos sem sementes é a utilização de 3

variedades triplóides (3x=27), como é o caso a lima ácida Tahiti (Citrus latifolia), provavelmente 4

originada de hibridação natural (Luchetti et al., 2003). 5

Variedades híbridas triplóides também podem ser obtidas a partir de cruzamentos de 6

parentais diplóides (2x) com tetraplóides (4x) (Esen & Soost, 1973) e diplóides (2x) X diplóides 7

(2x) (Esen & Soost, 1971), sendo que neste último, a frequência natural de obtenção de triplóides 8

geralmente foi muito baixa (próxima de 5%), variando em função do genótipo materno. 9

Um dos problemas para uso mais intenso de cruzamentos entre variedades diplóides e 10

tetraplóides de citros está no baixo número de genótipos tetraplóides disponíveis. Segundo Soost 11

& Cameron (1975), a maioria dos tetraplóides foi obtida espontaneamente após seleção em 12

populações de seedlings, mas com freqüência também muito baixa, variando entre 1 e 11%, 13

dependendo do porta-enxerto analisado (Barrett & Hutchinson, 1978; Saleh et al., 2008) e do 14

efeito ambiental (Barrett & Hutchinson, 1982). 15

Plantas híbridas alotetraplóides podem ser obtidas com o uso da técnica de hibridação 16

somática via fusão de protoplastos (Grosser al., 2000; Grosser & Gmitter, 2005). Já plantas 17

autotetraplóides podem ser obtidas a partir do tratamento in vivo ou in vitro de propágulos com 18

substâncias antimitóticas, tais como a colchicina e a orizalina (Dhooghe et al., 2011), incluindo 19

gemas axilares (Barret, 1974; Wakana et al., 2005), óvulos (Gmitter Jr. & Ling, 1991), calos 20

embriogênicos (Gmitter Jr. et al., 1991; Wu & Mooney, 2002), protoplastos (Zeng et al., 2006), 21

suspensões celulares (Dutt et al., 2010) e segmentos de epicótilo (Latado et al., 2007). 22

Nos trabalhos de obtenção in vitro de plantas cítricas autotetraplóides, o aumento da 23

eficiência e a redução no tempo de obtenção das plantas autotetraplóides podem ser obtidos com 24

a utilização de protocolos de alta eficiência de regeneração de plantas, por meio da indução de 25

brotações adventícias in vitro, utilizando-se segmentos de epicótilo (Almeida et al., 2002), ou pela 26

indução de embriões a partir de calos (Gmitter et al., 1991). 27

Para superar problemas de enraizamento de plântulas tetraplóides regeneradas, a 28

microenxertia in vitro das brotações regeneradas sobre plantas estioladas de variedades de porta-29

enxerto foi utilizada com sucesso por Latado et al. (2007). 30

Vários autores relataram o uso da técnica de citometria de fluxo para a identificação das 31

plantas auto ou alotetraplóides, já que a técnica apresenta como vantagens a precisão, rapidez e 32

facilidade de uso (Wu & Mooney, 2002). No entanto, técnicas citogenéticas tais como a contagem 33

do número de cromossomos de células de ponta de raiz, também podem utilizadas. 34

O objetivo do presente estudo foi induzir plantas autotetraplóides de variedades de copa de 35

citros com uso do método do cultivo temporário na presença de colchicina, visando o seu uso 36

posterior como parental em cruzamentos com variedades diplóides, para obter híbridos triplóides 37

sem sementes. 38

1

Material e Métodos 2

3

Foram utilizadas neste estudo sementes de laranjeiras Lima (clone novo 9 = CV 9) e 4

Buckeye navel (CN 20), tangerineira Clementina (Clone velho = CV 175) e Fortunella cv. Meiwa 5

(CV 424), extraídas de frutos resultantes de polinização aberta, colhidos de plantas mantidas no 6

Banco Ativo de Germoplasma do Centro APTA Citros Sylvio Moreira / IAC. 7

Segmentos de epicótilo, com tamanho de 1,0 cm, foram extraídos de plântulas cultivadas in 8

vitro. Estas foram obtidas partir de sementes germinadas in vitro e cultivadas durante 30 dias em 9

meio semi-sólido composto por somente sais de MS e 7,0 g L-1 de ágar, em condições de escuro. 10

O meio de cultivo utilizado para o tratamento temporário com colchicina e para a 11

regeneração de brotações era composto por sais de MS, acrescido de 0,5 g L-1 de extrato de 12

malte, 0,1 g L-1 de mio-inositol, 50 g L-1 de sacarose, 1,0 mg L-1 de benzilaminopurina (BAP), 7,0 g 13

L-1 de ágar e pH, ajustado para 6,0. 14

Quando usada, a solução aquosa contendo colchicina (Sigma Corp.) foi filtro-esterilizada 15

com uso de membrana filtrante de 0,22 µm e, a seguir, foi adicionada ao meio de cultivo já 16

autoclavado. 17

Os tratamentos testados eram compostos por cultivo temporário de 100 segmentos de 18

epicótilo de cada variedade, durante 1, 2 ou 3 dias, no meio de cultivo contendo as concentrações 19

de colchicina de 0,025 e 0,05% p/v, em condições de escuro e a temperatura de 25 ± 1o C. 20

Após este período, os explantes foram transferidos para placas contendo o mesmo meio de 21

cultura, mas sem a presença do alcalóide, sob fotoperíodo de 16 horas de luz (50 mol m-2 s-1) e 22

mesma temperatura, até a regeneração de brotações. 23

O controle experimental foi formado por placas de Petri contendo 50 explantes de cada 24

variedade, cultivados em meio sem colchicina. 25

Aos 60 dias de cultivo foi realizada a avaliação do número de brotações regeneradas por 26

explante. Os dados de número de brotações por explante foram transformados pela equação raiz 27

de (X + 0,5) para uso em análises de variância de cada variedade separadamente, considerando 28

o experimento como em delineamento inteiramente casualizado e apenas um fator: tratamento. 29

Foram realizados os testes F e de Tukey a 5% de probabilidade. 30

As brotações adventícias regeneradas foram microenxertadas in vitro em plântulas de 31

citrumelo Swingle, com cultivo em condições de fotoperíodo de 16 horas de luz (50 mol m-2 s-1), 32

25 ± 1oC, durante 30 a 60 dias. Para a aclimatização, as brotações desenvolvidas foram 33

sobreenxertadas em limão Cravo (C. limonia Osbeck) e mantidas em câmara úmida durante 30 34

dias, sendo a seguir, transferidas para estufas, sob condições de temperatura e umidade relativa 35

não-controladas, mantendo-se sempre a identificação do tratamento utilizado (tempo de cultivo e 36

concentração da colchicina). 37

Todas as plantas aclimatizadas de cada variedade tiveram a sua ploidia avaliada utilizando o 1

método de citometria de fluxo citado por Latado et al. (2007), utilizando-o equipamento Partec 2

CyFlow Ploidy Analyzer DAPI (Partec GmbH., Alemanha), que é equipado com lâmpada UV-LED 3

(com emissão de luz no comprimento de 365 nm) e um parâmetro ótico, para detecção de 4

fluorescência. 5

A densidade estomática de folhas de plantas autotetraplóides e das plantas-controle foi 6

avaliada em folhas novas mas completamente expandidas, coletadas de plantas com idade de um 7

ano. As folhas foram lavadas e, em seguida, segmentos de folhas (0,5 x 0,5 cm) foram excisados 8

e imersos em solução de KOH (5N) fervente, durante 1 minuto, seguido de imersão em água 9

corrente. A epiderme abaxial de cada amostra foi destacada com auxílio de pinça e transferida 10

para uma lâmina e coberto em seguida por uma lamínula. A avaliação da densidade estomática foi 11

realizada com uso da objetiva de 40X, observando-se cinco campos de visão por amostra e 12

calculando-se, em seguida, a média de cada amostra. 13

14

Resultados e Discussão 15

16

A avaliação do número de brotações adventícias regeneradas por explante, realizada aos 60 17

dias após a inoculação dos segmentos de epicótilo (Figura 1), demonstrou que, as variedades 18

utilizadas no presente estudo sempre apresentaram baixa taxa de regeneração de brotações por 19

explante, mesmo no tratamento do controle, variando entre 0,18 e 0,55 brotação por segmento de 20

epicótilo (Figura 2). 21

Almeida et al. (2002) testaram diversas concentrações de BAP no meio de indução de 22

organogênese usando segmentos de epicótilo de laranjeiras Natal, Valência e Hamlin e 23

determinaram que a concentração 1,0 mg L-1 de BAP foi a melhor para as três variedades, com 24

taxas de regeneração de 1,6, 1,8 e 2,4 brotações por explante, respectivamente. Moura et al. 25

(2001) também observaram resultado semelhante com laranjeira Pêra, com a obtenção de 2,5 26

brotações por explante quando adicionaram 1,0 mg L-1 de BAP no meio de cultura. 27

Outra constatação do presente estudo foi a de que a colchicina ocasionou um efeito 28

fitotóxico nos explantes, resultando na redução do número de brotações regeneradas por 29

explante, com exceção para a tangerineira Clementina, em que não se observou diferenças 30

estatísticas significativas (Figura 2). Alguns tratamentos foram tão fortes que os explantes não 31

conseguiram regenerar nenhuma brotação. 32

Os efeitos nocivos do tratamento de células e tecidos vegetais com colchicina já foram 33

relatados por vários autores. Gmitter et al. (1991), Gmitter & Ling (1991) e Wu & Mooney (2002) 34

observaram reduções na capacidade de regeneração e até a mortalidade de calos e de óvulos 35

imaturos de várias espécies de citros quando cultivados em meio contendo colchicina. 36

No presente estudo observou-se que a toxidez causada pelo uso da colchicina variou em 37

função da variedade, assim como do tempo de tratamento e da concentração de colchicina 38

utilizada. A laranjeira Buckeye navel demonstrou ser a mais sensível a colchicina, pois apresentou 1

grande redução (estatisticamente significativa) no numero de brotações em qualquer tratamento 2

(concentração e tempo de tratamento). Em seguida, vieram a laranjeira Lima e a Fortunella, e por 3

último, a tangerineira Clementina, em que não se observou toxidez (Figura 2). 4

Wu & Mooney (2002) também observaram diferenças entre variedades cítricas quanto à 5

sensibilidade de explantes à colchicina. Segundo estes, os calos de tangerineira Clementina 6

Caffin apresentavam menor sensibilidade ao tratamento comparando-se com os calos de 7

tangoreira Umatilla, enquanto que os calos de tangoreira Dweet e pomeleira Wheeny foram os 8

que apresentaram os sintomas menos pronunciados de toxidez. 9

Os dados indicam que, para a laranjeira Lima e para a Fortunella, o tempo de tratamento foi 10

mais importante para a expressão da toxidez do que a concentração de colchicina, pois pôde-se 11

observar que a exposição dos explantes durante dois dias foi excessivamente tóxica, ocasionando 12

uma redução acentuada no número médio de brotações regeneradas (Figura 1). Resultados bem 13

semelhantes foram obtidos por Latado et al. (2007), com trabalho de indução de tetraplóides em 14

laranjeira Pêra-de-abril, tangoreira Murcote e tangerineira Ponkan. 15

O total de microenxertias in vitro realizadas em cada variedade foi de 52 e 63, para 16

laranjeiras Lima e Buckeye Navel, respectivamente; 55 microenxertias, para tangerineira 17

Clementina, e 46, para Fortunella cv. Meiwa, com taxa média de sobrevivência das brotações 18

microenxertadas próxima de 95,25%, isto é, com perda de menos de 5% de microenxertos. 19

A fase de microenxertia das brotações in vitro foi considerada como essencial (Figura 3), 20

pois seu objetivo é desenvolver as brotações de forma mais eficiente e num menor espaço de 21

tempo. Isto ocorre devido ao suporte dado pela planta in vitro, usada como porta-enxerto, que tem 22

a capacidade de nutrir mais eficientemente a brotação enxertada, não necessitando de gastos de 23

energia com enraizamento. Assim, torna-se possível evitar a fase de enraizamento direto das 24

brotações, etapa considerada como uma das mais problemáticas nos trabalhos que envolvem 25

organogênese de citros (Figura 3). 26

O método de aclimatização utilizado foi também considerado como eficiente, pois resultou 27

na aclimatização de 100% das plântulas microenxertadas e num curto espaço de tempo, 28

aproximadamente 45 dias. 29

O número total de plantas avaliadas por citometria de fluxo, a frequência de obtenção de 30

plantas autotetraplóides, assim como a lista de tratamentos que as induziram nas quatro 31

variedades, estão citados na Tabela 1. Estes dados demonstram que foram obtidas várias plantas 32

autotetraplóides de cada variedade, o que é excelente para as etapas futuras em que serão 33

realizados os cruzamentos com as plantas diplóides, pois possibilitará selecionar as melhores 34

plantas tetraploides e eliminar as plantas que porventura apresentarem algum problema genético 35

tais como: o não desenvolvimento correto da planta e/ou a não produção de flores viáveis. 36

Dentre as variedades utilizadas, a laranjeira Lima e Fortunella foram as que apresentaram 37

as maiores frequências de plantas autotetraplóides, 17,4 e 21,9%, respectivamente, seguido da 38

tangerineira Clementina, com 14,0% e da laranjeira Buckeye navel (Tabela 1). As duas 1

concentrações de colchicina utilizadas foram eficientes na indução de plantas autotetraplóides, 2

porém a concentração de 0,025% de colchicina foi melhor para a indução de plantas 4n na 3

laranjeira Lima e na Fortunella. Em relação ao tempo de tratamento com colchicina, os melhores 4

resultados foram observados quando se manteve os explantes durante dois dias no meio 5

contendo o alcaloide (Tabela 1). 6

A avaliação da densidade estomática de folhas de plantas de diversas ploidias demonstrou 7

haver alta correlação, negativa, entre a densidade estomática e a ploidia, chegando a se observar 8

reduções de 50% nas densidades estomáticas de folhas de plantas autotetraplóides, em relação 9

às plantas-controle diplóides (Tabela 2, Figuras 4c e 4d). Assim, as plantas do controle (diplóides) 10

apresentaram densidade estomática variando entre 362,7 e 538,8 estômatos/mm2, enquanto que 11

as plantas autotetraplóides apresentam folhas com densidade variando entre 137,8 e 312,4 12

estômatos por mm2 (Tabela 2). 13

Em citros, Allario et al. (2011), comparando plantas diplóides e autotetraplóides de limão 14

Cravo, verificaram que o tamanho (área) dos estômatos das plantas tetraplóides eram 15

significativamente maiores, com valores de 490 µm2, enquanto que as plantas diplóides 16

apresentavam com estômatos com 290 µm2. Já em relação a densidade estomática, foi possível 17

observar uma redução deste parâmetro nas plantas tetraplóides (400 estômatos/mm2) em relação 18

as plantas diplóides (270 estômatos /mm2). 19

As plantas autotetraplóides foram multiplicadas vegetativamente por meio de enxertia, com 20

plantio de cópias no campo e em casa de vegetação. Enquanto aguarda-se o início da fase 21

reprodutiva destas plantas, observou-se que as plantas tetraplóides apresentam algumas 22

características morfológicas comuns mas diferenciais em relação às suas respectivas plantas 23

originais: folhas mais espessas, com coloração verde mais intensa e com a presença de glândulas 24

de óleo mais protuberantes. 25

26

Tabela 1. Número de plantas com ploidia avaliada pelo método de citometria de fluxo, número e 1

frequência de plantas autotetraplóides e os respectivos tratamentos em que foram 2

obtidas. 3

Variedade Número de

plantas

avaliadas

Número e

frequência de

plantas 4n (%)

Tratamentos que induziram plantas

4n

laranjeira Lima 46 8 (17,4) (0,025%-1d, 1d, 2d, 2d, 2d, e 3d)

(0,05%-2d e 3d)

laranjeira

Buckeye navel

54 5 (9,3) (0,025%-1d, 2d e 2d)

(0,05%-1d e 3d)

tangerineira

Clementina

50 7 (14,0) (0,025%-1d, 2d e 3d)

(0,05%-2d, 2d, 2d e 3d)

Fortunella cv.

Meiwa

41 9 (21,9) (0,025%-1d, 1d, 2d, 2d, 2d e 3d)

(0,05%-1d, 2d e 3d)

1d = 1 dia de tratamento em meio contendo colchicina, 2d = 2 dias e 3d = 3 dias 4

0,025% e 0,05% = concentração de colchicina adicionada ao meio de cultivo 5

6

Tabela 2. Ploidia estimada e densidade estomática de folhas de três plantas autotetraplóides (4n) 1

de diversas variedades de copa e das respectivas plantas-controle. 2

Amostra Ploidia estimada Densidade estomática

(estômatos/mm2)

laranjeira Lima 2n 362,7

planta 1 4n 185,5

planta 2 4n 198,7

planta 4 4n 214,0

laranjeira Buckeye navel 2n 421,2

planta 12 4n 204,7

planta 14 4n 226,6

planta 18 4n 200,5

tangerineira Clementina 2n 538,8

planta 2 4n 280,7

planta 3 4n 270,5

planta 4 4n 312,4

Fortunella cv. Meiwa 2n 366,5

planta 7 4n 189,4

planta 9 4n 137,8

planta 10 4n 165,9

3

1

2

Figura 1.Cultivo in vitro de segmentos de epicótilo. A) explantes em meio contendo colchicina; B) 3

explantes após duas semanas de cultivo em meio de regeneração e C) explantes 4

formando brotações adventícias após 60 dias em meio de regeneração. 5

6

1

2

Figura 2. Número médio de brotações adventícias obtidas por segmento de epicótilo de 3

variedades de copa de citros, em função dos diversos tempos de tratamento e das 4

diversas concentrações de colchicina adicionadas ao meio de cultivo. 5

6

1

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Figura 3. Gemas adventícias microenxertadas in vitro. A) um dia após a microenxertia; B) 19

brotação se desenvolvendo uma semana após a microenxertia; C) brotação se 20

desenvolvendo três semanas após a microenxertia. 21

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Figura 4. Histogramas obtidos por análises de citometria de fluxo de suspensões nucleares de: A) 3

laranjeira Lima controle (2n); B) laranjeira Lima autotetraplóide (4n). Face abaxial da folha 4

de: C) laranjeira Lima controle (2n) e D) laranjeira Lima autotetraplóide (4n), contendo os 5

estômatos. 6

7

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