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Anais do I Congresso
Acadêmico de Direito
Constitucional
Porto
Velho/RO
23 de
junho de
2017
P. 444 a 459
MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS APLICÁVEIS AO ADOLESCENTE INFRATOR EM
TERMOS DE EFICÁCIA E RESSOCIALIZAÇÃO NA CIDADE DE PORTO
VELHO/RO
Josimeire de Oliveira Dourado1
Stênio Castiel Gualberto2
RESUMO
As medidas socioeducativas encontram-se previstas no artigo 112 da Lei Federal nº 8.069, de treze de julho de 1990, denominada de Estatuto da Criança e do Adolescente, sendo aplicáveis aos adolescentes (com idades entre 12 e 18 anos) que cometem algum ato infracional, expressão criada e utilizada pela referida Lei, tendo em vista que a Constituição Federal de 1988 não vislumbra o cometimento de crimes ou contravenções penais por adolescentes, e sim, ato infracional. O presente artigo foi motivado pela preocupação com o crescente índice de envolvimento de adolescentes com a prática de atos infracionais na cidade de Porto Velho. A pesquisa realizada é descritiva e bibliográfica/documental. Para efeitos de fundamentação da pesquisa, foi realizada coleta de dados junto ao Juizado da Infância e da Juventude de Porto Velho, a fim de averiguar a reincidência de adolescentes infratores e a partir do método dedutivo constatar a eficácia das medidas socioeducativas quanto a sua capacidade em promover a ressocialização, observando-se que essas medidas possuem potencial para atingir o fim o qual se destinam, contudo, os órgãos e entidades responsáveis pela sua efetivação apresentam deficiências em sua execução.
Palavras-chave: Medidas socioeducativas. Adolescente infrator. Estatuto da Criança
e do Adolescente.
ABSTRACT
The socio-educational measures are provided for in article 112 of Federal Law 8,069, dated July 13, 1990, denominated Statute of the Child and the Adolescent, being applicable to the adolescents (aged between 12 and 18 years) that commit some 1 Graduanda em Direito na Faculdade Católica de Rondônia – FCR, Porto Velho/RO, E-mail:
[email protected]. 2 Advogado, Especialista em Direito Penal e Direito Processual Penal pela Universidade Luterana do
Brasil – Ulbra, Professor de Direito Penal e Processo Penal na Faculdade Católica de Rondônia e na Faculdade de Rondônia, E-mail: [email protected].
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infraction act, expression created and used by said Law, in view of the fact that the Federal Constitution of 1988 does not envisage the commission of crimes or criminal offenses by adolescents, and yes, an infraction act. The present article was motivated by the concern with the increasing index of involvement of adolescents with the practice of infractions acts in the city of Porto Velho. The research carried out is descriptive and bibliographical/documentary. For the purposes of the research, was collected data from the Court of Childhood and Youth of Porto Velho, in order to investigate the recidivism of juvenile offenders and from the deductive method to verify the effectiveness of socio-educational measures regarding their capacity to promote resocialization, observing that these measures have the potential to achieve the purpose for which they are intended, however, the bodies and entities responsible for their implementation have deficiencies in their execution.
Keywords: Socio-educational measures. Adolescent offender. Child and Adolescent
Statute.
INTRODUÇÃO
A Constituição Federal de 1988 atribui a condição de inimputável ao
adolescente, ou seja, o considera como pessoa isenta de pena por enxergar que ao
tempo da ação ou omissão, esse não era capaz de entender o caráter ilícito do fato
praticado ou mesmo de determinar-se de acordo com esse entendimento, conforme
previsão de seu artigo 288, sendo tal matéria disciplinada também nos artigos 26 e
27 do Código Penal.
Em razão disso, se fez necessária a criação da Lei Federal 8.069 de 1990,
denominada Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que estabeleceu a
possibilidade do adolescente cometer os chamados atos infracionais e serem
responsabilizados com medidas diversas das previstas no Código Penal, passando
a ser submetidos as medidas socioeducativas.
As medidas socioeducativas possuem um caráter punitivo e ressocializador,
isto é, ao mesmo tempo em que visam demonstrar a reprovabilidade social frente ao
ato infracional cometido, buscam também promover a reeducação do adolescente, o
que consiste em prepara-lo para retornar ao convívio em sociedade de maneira
saudável e positiva para si e para as pessoas a sua volta.
Ocorre que nos dias atuais tem se tornado cada vez mais comum visualizar o
cometimento de atos infracionais por adolescentes. Em todo o Brasil tem se
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verificado o aumento dos índices de envolvimento de menores de 18 anos com as
práticas delituosas, em especial na cidade de Porto Velho, que possui um dos mais
altos índices de reincidência da delinquência juvenil.
Sendo assim, a discussão a respeito da eficácia das medidas socioeducativas
e seu potencial em promover a ressocialização dos adolescentes infratores, da
cidade de Porto Velho, se mostra pertinente e necessária, por se tratar de um
problema social e atual, que atinge não apenas os jovens que praticam ou já
praticaram algum ato infracional, como também atinge a toda a sociedade de modo
geral.
Isto posto, surge a motivação para o presente trabalho, demonstrada a
relevância do tema para o universo jurídico e acadêmico, com o intuito de promover
o debate, tendo em vista ser de grande importância para a sociedade.
1 – DAS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS
As medidas socioeducativas aplicadas ao menor infrator estão previstas no
artigo 112 do Estatuto da Criança e do Adolescente, sendo um rol taxativo, ou seja,
não se admite aplicação de medidas diversas daquelas apresentadas no
mencionado artigo, que destaca-se, in verbis:
Art. 112. Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas:
I - advertência; II - obrigação de reparar o dano; III - prestação de serviços à comunidade; IV - liberdade assistida; V - inserção em regime de semiliberdade; VI - internação em estabelecimento educacional; VII - qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI. § 1º A medida aplicada ao adolescente levará em conta a sua
capacidade de cumpri-la, as circunstâncias e a gravidade da infração.
§ 2º Em hipótese alguma e sob pretexto algum, será admitida a prestação de trabalho forçado.
§ 3º Os adolescentes portadores de doença ou deficiência mental receberão tratamento individual e especializado, em local adequado às suas condições.
Contudo o legislador ao elaborar tais medidas, possibilitou ainda no inciso VII,
do artigo acima, a faculdade de aplicação cumulativa ou não das medidas expostas
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acima com qualquer uma das medidas protetivas definidas no artigo 101, incisos I a
VI, quais sejam:
Art. 101. Verificada qualquer das hipóteses previstas no art. 98, a autoridade competente poderá determinar, dentre outras, as seguintes medidas:
I - encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de responsabilidade;
II - orientação, apoio e acompanhamento temporários; III - matrícula e frequência obrigatórias em estabelecimento
oficial de ensino fundamental; IV - inclusão em programa comunitário ou oficial de auxílio à
família, à criança e ao adolescente; V - requisição de tratamento médico, psicológico ou
psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial; VI - inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio,
orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos;
E ainda, é importante ressaltar, que as medidas socioeducativas serão
sempre aplicadas depois de verificadas as condições do ato infracional, no caso a
suas circunstâncias e sua gravidade, bem como deverão ser observadas ainda, a
capacidade de compreensão do adolescente quanto ao ato infracional por ele
cometido e as medidas que poderá sofrer em razão de tal prática.
Nesse sentido, as medidas socioeducativas, visam tanto garantir uma
“penalização” do adolescente infrator, demonstrando a reprovabilidade social
perante o ato cometido, ao passo em que protege a sociedade de tais atos, como
também procura reeducar o adolescente para o convívio em sociedade de maneira
saudável e positiva, sem que este torne a praticar tais atos. Desse modo é o
entendimento apresentado pelo Promotor de Justiça Márcio Monthé Fernandes
(1988, p. 73) sobre as medidas socioeducativas:
Trata-se de uma sanção-educação, em substituição à sanção castigo. Deseja-se que o adolescente cumpra a medida satisfatoriamente, inserindo-se na sociedade com novos ideais, de modo a se tornar um adulto habilitado a conviver conscientemente consigo mesmo e de maneira produtiva em seu meio sócio familiar.
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2.1 – DA ADVERTÊNCIA
Essa medida socioeducativa está prevista no artigo 115 do Estatuto da
Criança e do Adolescente e dispõe que: “a advertência consistirá em admoestação
verbal, que será reduzida a termo e assinada”, ou seja, essa medida detém um
caráter pedagógico, pois se preocupa apenas em demonstrar a censura quanto ao
ato ilegal praticado, sendo proferida pelo juiz na presença do adolescente
juntamente com os pais, tutores ou curadores visando cobrar a não realização de
novos delitos por parte do adolescente.
2.2 – DA OBRIGAÇÃO DE REPARAR O DANO
A obrigação de recompor o dano é aplicável apenas no que se refere aos atos
infracionais cujo bem jurídico tutelado é o patrimônio, dessa forma o juiz ao decretar
essa medida, busca responsabilizar o adolescente para que devolva a coisa, efetue
o ressarcimento sobre o prejuízo causado, ou mesmo que promova de qualquer
outra maneira uma compensação ao desfalque causado à vítima, conforme leciona o
artigo 116 do ECA:
Art. 116. Em se tratando de ato infracional com reflexos patrimoniais, a autoridade poderá determinar, se for o caso, que o adolescente restitua a coisa, promova o ressarcimento do dano, ou, por outra forma, compense o prejuízo da vítima.
Parágrafo único. Havendo manifesta impossibilidade, a medida poderá ser substituída por outra adequada.
Assim, depreende-se que tal medida também comporta um caráter
pedagógico, tendo em vista que impõe ao adolescente assumir a responsabilidade
pelo ato ilícito cometido e refletir sobre os seus atos, formando-se a ideia de que
toda ação gera uma reação.
Outro aspecto importante dessa medida a ser considerado é que caso o
adolescente não tenha patrimônio próprio não caberá aos pais ou responsáveis a
incumbência de recompor o sinistro, visto que é fundamental que o próprio
adolescente a cumpra, devendo ser verificada a sua capacidade de cumprimento da
medida e que diante de sua impossibilidade a autoridade judiciária poderá decretar a
substituição dessa medida por outra.
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2.3 – DA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE
Tal medida encontra-se disciplinada no artigo 117 da Lei nº 8.069/90 e possui
a seguinte redação:
Art. 117. A prestação de serviços comunitários consiste na realização de tarefas gratuitas de interesse geral, por período não excedente a seis meses, junto a entidades assistenciais, hospitais, escolas e outros estabelecimentos congêneres, bem como em programas comunitários ou governamentais.
Parágrafo único. As tarefas serão atribuídas conforme as aptidões do adolescente, devendo ser cumpridas durante jornada máxima de oito horas semanais, aos sábados, domingos e feriados ou em dias úteis, de modo a não prejudicar a frequência à escola ou à jornada normal de trabalho.
Essa medida vislumbra a possibilidade do adolescente ser penalizado pelo
ato infracional cometido de forma que seja benéfica e proveitosa a toda a sociedade,
pois estabelece que o adolescente passará a realizar gratuitamente e por período
não superior a seis meses um serviço que atenda algum interesse geral da
comunidade, considerando as suas aptidões, desde que não prejudique os seus
estudos.
Dessa maneira, nota-se que o principal objetivo dessa medida é gerar um
senso de responsabilidade por parte do infrator juvenil, partindo da premissa de que
enquanto o referido estiver inserido no sistema de cumprimento dessa medida,
desempenhando funções que geralmente possuem o condão de fornecer o bem
comum, possam também repensar suas atitudes.
Ocorre, que além de esperar uma conscientização por parte do adolescente
obrigado a prestar serviços comunitários, se faz essencial para fins de eficácia da
aplicação dessa medida, que o Ministério Público e a sociedade de modo geral
fiscalize a execução da medida.
2.4 – DA LIBERDADE ASSISTIDA
Versam os artigos 118 e 119 do Estatuto da Criança e do Adolescente que:
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Art. 118. A liberdade assistida será adotada sempre que se afigurar a medida mais adequada para o fim de acompanhar, auxiliar e orientar o adolescente.
§ 1º A autoridade designará pessoa capacitada para acompanhar o caso, a qual poderá ser recomendada por entidade ou programa de atendimento.
§ 2º A liberdade assistida será fixada pelo prazo mínimo de seis meses, podendo a qualquer tempo ser prorrogada, revogada ou substituída por outra medida, ouvido o orientador, o Ministério Público e o defensor.
Art. 119. Incumbe ao orientador, com o apoio e a supervisão
da autoridade competente, a realização dos seguintes encargos, entre outros:
I - promover socialmente o adolescente e sua família, fornecendo-lhes orientação e inserindo-os, se necessário, em programa oficial ou comunitário de auxílio e assistência social;
II - supervisionar a frequência e o aproveitamento escolar do adolescente, promovendo, inclusive, sua matrícula;
III - diligenciar no sentido da profissionalização do adolescente e de sua inserção no mercado de trabalho;
IV - apresentar relatório do caso.
O juiz ao decretar a aplicação dessa medida, designará um orientador
responsável por realizar um acompanhamento do adolescente, ou seja, será
escolhida uma pessoa capacitada que passará a observar as atividades diárias do
adolescente, verificando a sua frequência e desempenho escolar, bem como o seu
convívio social e com a sua família.
Esse orientador deverá apresentar relatório do caso expondo cada aspecto da
vida do adolescente durante a execução da medida, bem como, promoverá
orientações no sentido de propiciar a reeducação do jovem infrator, procurando
viabilizar a inserção do adolescente no mercado de trabalho, tudo em prol de evitar
sua reincidência nas práticas delituosas, o orientador será alguém da sociedade que
possui convívio com o adolescente e apto para acompanhar suas atividades diárias.
Entretanto, apesar de ser aplicada aos delitos considerados de média
gravidade, supramencionada medida sofre duras críticas quanto a eficácia de sua
efetivação, haja vista, que faltam profissionais qualificados para desempenharem o
acompanhamento necessário nos termos descritos em lei.
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2.5 – DO REGIME DE SEMILIBERDADE
Sua previsão legal se encontra no artigo 120 do ECA, conforme exposição a
seguir:
Art. 120. O regime de semiliberdade pode ser determinado desde o início, ou como forma de transição para o meio aberto, possibilitada a realização de atividades externas, independentemente de autorização judicial.
§ 1º São obrigatórias a escolarização e a profissionalização, devendo, sempre que possível, ser utilizados os recursos existentes na comunidade.
§ 2º A medida não comporta prazo determinado aplicando-se, no que couber, as disposições relativas à internação.
Nessa modalidade de medida socioeducativa, o adolescente ficará recolhido
em estabelecimento próprio para a aplicação dessa medida, durante o período
noturno, ficando livre para exercer suas funções normalmente durante o dia,
contando que cumpra a ressalva descrita no §1º, ou seja, a escolarização e
profissionalização do adolescente deverá ser observada obrigatoriamente.
Destaca-se que conforme preceitua o §2º do supracitado artigo, não existe um
prazo determinado para o cumprimento da medida, dessa forma se adotará as
regras disciplinadas para a medida de internação, quais sejam, que a medida seja
reavaliada dentro de um prazo máximo de seis meses e que a duração total da
aplicação da medida não extrapole o período de três anos.
Desse modo, é considerada um meio termo entre as medidas de meio aberto
e a medida de internação, posto que restringe apenas parcialmente a liberdade do
infrator juvenil, possibilitando a efetivação de sua ressocialização durante o dia,
dada a imposição de escolarização e profissionalização do adolescente, ao passo
em que se utiliza de seu caráter punitivo durante a noite.
2.6 – DA INTERNAÇÃO
Por fim a medida de internação foi definida no artigo 121 da Lei 8.069/90 da
seguinte forma:
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Art. 121. A internação constitui medida privativa da liberdade, sujeita aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento.
§ 1º Será permitida a realização de atividades externas, a critério da equipe técnica da entidade, salvo expressa determinação judicial em contrário.
§ 2º A medida não comporta prazo determinado, devendo sua manutenção ser reavaliada, mediante decisão fundamentada, no máximo a cada seis meses.
§ 3º Em nenhuma hipótese o período máximo de internação excederá a três anos.
§ 4º Atingido o limite estabelecido no parágrafo anterior, o adolescente deverá ser liberado, colocado em regime de semiliberdade ou de liberdade assistida.
§ 5º A liberação será compulsória aos vinte e um anos de idade.
§ 6º Em qualquer hipótese a desinternação será precedida de autorização judicial, ouvido o Ministério Público.
§ 7o A determinação judicial mencionada no § 1o poderá ser revista a qualquer tempo pela autoridade judiciária.
A medida de internação é a medida mais rigorosa aplicada ao adolescente,
somente sendo cabível nos casos em que o ato infracional cometido possui maior
gravidade, no caso, aqueles cometidos mediante grave ameaça ou violência, pois
restringirá totalmente a liberdade do jovem infrator. Por ser tão drástica e
impactante, tal medida deve se ater totalmente aos limites da lei, atuando apenas
dentro do necessário em prover a reeducação e apenas em último caso, quando for
constatado que as outras medidas não surtiram o efeito esperado.
É válido salientar, que para a eficácia dessa medida será de responsabilidade
do Estado garantir a integridade dos adolescentes, em estabelecimento
especializado, dispondo de profissionais capacitados, para que o fim máximo da
medida seja alcançado, o qual seja, a reinserção do adolescente na sociedade de
maneira positiva e benéfica, sem que este volte a praticar atos infracionais.
3 – DA APLICAÇÃO DAS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS NA CIDADE DE
PORTO VELHO/RO
Para efeitos de fundamentação do presente artigo no que se refere a
aplicação das medidas socioeducativas na cidade Porto Velho, fez-se necessário a
realização de pesquisas junto ao Juizado da Infância e da Juventude de Porto Velho,
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a fim de coletar dados, a qual constatou-se diversas deficiências para efetiva
aplicação dessas medidas em conformidade com o que estatui a Lei 8.069/90.
Dentre as deficiências observadas, destaca-se que das seis medidas
socioeducativas descritas no artigo 112 da Lei 8.069/90, apenas cinco dessas
medidas possuem aplicabilidade prática na cidade de Porto Velho/RO, as quais são:
a medida de advertência, a de obrigação de reparar o dano, a de prestação de
serviços à comunidade, a de liberdade assistida e a de internação. A medida de
inserção em regime de semiliberdade não é aplicada em Porto Velho, pois não
existe estabelecimento e sistema adequado para a sua execução.
Outra dificuldade encontrada é o fato de que o Centro de Referência
Especializado da Assistência Social – CREAS e os Centros de Referência da
Assistência Social – CRAS que são as unidades públicas responsáveis por executar
as medidas socioeducativas de meio aberto: liberdade assistida e prestação de
serviços à comunidade apresentam diversas dificuldades no que diz respeito ao
acompanhamento do socioeducando.
Denota-se que as principais dificuldades percebidas no CREAS e nos CRAS,
quanto a implementação dessas medidas, residem no fato de que muitos
adolescentes apesar de encaminhados ao programa de execução das medidas
socioeducativas, quando condenados a prestação de serviços comunitários, o
efetivo início do serviço ocorre apenas após decorridos vários dias e por vezes após
mais de dois meses.
No ano de 2015 o índice de adolescentes que foram encaminhados ao
programa e apenas puderam iniciar o serviço lhe atribuído após mais de dois meses
foi de 80%, enquanto que em 2016 esse percentual não diminuiu muito, ficando em
73% para aqueles que iniciaram o serviço depois de dois meses e 27% para os que
iniciaram o cumprimento da medida em até dois meses, certo de que tal demora na
resposta socioeducativa compromete sobremaneira o caráter pedagógico da
medida, além de ir contra a recomendação legal que sugere que decorra o menor
tempo possível entre a prática do ato infracional e o início da medida socioeducativa.
No que tange a essa demora na inserção do adolescente na medida
socioeducativa, a principal justificativa apresentada pelos profissionais responsável
por essa área é a de que existe pouca oferta de instituições para a prestação do
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serviço comunitário, quanto a essa questão é válido apontar a definição sobre o
tema constante no caput do artigo 14 da Lei 12.594/2012:
Art. 14. Incumbe ainda à direção do programa de medida de prestação de serviços à comunidade selecionar e credenciar entidades assistenciais, hospitais, escolas ou outros estabelecimentos congêneres, bem como os programas comunitários ou governamentais, de acordo com o perfil do socioeducando e o ambiente no qual a medida será cumprida.
Um aspecto notável concernente as unidades públicas responsáveis pela
concretização das medidas socioeducativas de meio aberto, no caso o Centro de
Referência Especializado da Assistência Social e os Centros de Referência da
Assistência Social, cuida-se da falta de profissionais qualificados para atuarem
devidamente na promoção da ressocialização, devendo ser pessoas que entendam
o efetivo objetivo dessas medidas.
Ocorre no entanto, por vezes de o adolescente não ser bem recebido nos
locais onde foram designados para desempenharem os serviços comunitários, ou
mesmo de serem colocados para empreender funções inadequadas para o fim
reeducador descrito em lei. O que se verifica é que a sociedade tende a
menosprezar o infrator juvenil, mas o que deveria ser feito é o acolhimento e
acompanhamento desses jovens com o intuito de reinseri-lo na sociedade como
alguém que pode mudar suas atitudes e passar a agir de maneira saudável, com
boas práticas, dentro do que rege a Lei.
Outro entrave constatado e que por sua vez dificulta a execução da medida
socioeducativa de liberdade assistida trata-se da falta de orientadores sociais,
fazendo com que a maioria dos adolescentes recebam apenas o acompanhamento
do profissional de referência.
Existe ainda, a dificuldade enfrentada pelos programas de implementação das
medidas socioeducativas em meio aberto, em realizar o acompanhamento de jovens
infratores que residem nos distritos, tendo em vista a pouca disponibilidade de
transportes e diárias.
Outro ponto que deve ser evidenciado, diz respeito a falta de conhecimento
pelos profissionais sobre o orçamento do Município e do Governo Federal destinado
para a socioeducação, impedindo-os de planejar atividades coletivas com os
adolescentes e suas famílias.
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Por fim, sobre as medidas socioeducativas em meio aberto é importante
noticiar os índices de reincidência dos jovens submetidos a essas medidas, no ano
de 2015 apenas 14% dos adolescentes eram reincidentes nas práticas delituosas, já
em 2016 esse número passou a ser de 54% de jovens reincidentes, configurando
um aumento de 40% em relação ao ano anterior.
No tocante a medida de internação empregada na cidade de Porto Velho,
existem diversos fatores a se considerar, um deles é que a faixa etária que visualiza
a predominância de adolescentes cumprindo tal medida concentra-se entre 17 e 18
anos, chegando a um total de 57% do total de infratores juvenis no ano anterior,
sendo que a grande maioria desses jovens possuem um histórico de reincidência em
atos infracionais.
Esse dado revela certa fragilidade do programa em conferir suporte ao
adolescente no sentido de romperem com as práticas infracionais e seguirem novos
caminhos que sejam benéficos para si e para a sociedade de um modo geral.
Assinala-se também, que durante a internação apenas 35% dos jovens
receberam visitas de pai e mãe concomitantemente, 28% somente receberam visitas
de suas mães, 13% receberam visitas de outros parentes e 11% receberam visitas
apenas de seus pais (dados levantados no ano de 2016).
Em tais dados, enxerga-se a necessidade de pôr em prática táticas que
priorizem uma maior e melhor convivência entre os adolescentes internados com
suas famílias, amigos e pessoas de seu convívio, com o escopo de constituir uma
base de apoio fundamental para promover a reeducação.
O principal problema constatado nessa medida é a falta de política
socioeducativa capaz de garantir um ambiente adequado em termos de salubridade,
segurança e oferta de atividades diversificadas que possam atender as
necessidades de cada adolescente.
O sistema de internação desses jovens infratores consiste em um local
bastante desfavorável em seu caráter socioeducador, pois o ambiente físico
apresenta condições inadequadas de habitabilidade e higiene, carece de servidores
qualificados e com o perfil esperado para o trabalho, o que acaba potencializando os
conflitos, motins e levantes ocorridos por parte dos adolescente entre si e parte dos
servidores desse regime.
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Tal ambiente se revela um local violento e caótico cuja finalidade aparente é
unicamente privar a liberdade dos infratores juvenis, isolando-os do mundo exterior,
sem se atentar para as diversas ações que deveriam ser adotadas e trabalhadas na
vida desses jovens, durante o período em que ficam internados.
É o que se conclui ao observar as seguintes porcentagens obtidas no ano
passado: ocorrência de brigas entre pequenos grupos somavam 2%, motins,
levantes e quebradeiras eram de 2%, queima de colchões correspondia a 26%,
tentativas de fugas era igual a 19%, 16% de fugas, 3% de intervenções policiais na
unidade, 5% de agressões físicas cometidas contra funcionários, 12% de apreensão
de substâncias entorpecentes em poder dos adolescentes e 15% de apreensão de
objetos perfuro cortantes em posse dos mencionados.
Finalmente, após a elaboração de um levantamento quanto ao dever das
entidades de atendimento dos socioeducandos de oferecer cursos
profissionalizantes e escolarização atribuídos a destinação de prepará-los para o
mercado de trabalho, evidenciou-se a falta de investimentos em cursos
correspondentes ao perfil do adolescente e a necessidade do mercado, sendo que
em 2016 houve um total de 92% dos jovens que não tiveram acessos a esses
cursos.
Cumpre salientar que todos os dados e informações contidos nesse capítulo
foram obtidos junto ao Juizado da Infância e da Juventude de Porto Velho/RO,
localizado na Avenida Rogério Weber, nº 2396, Bairro Caiari, CEP: 78900-450,
mediante Autorização do Excelentíssimo Senhor Juiz de Direito Marcelo Tramontini.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ante todo o exposto, o que se conclui sobre a eficácia das medidas
socioeducativas aplicadas na cidade de Porto Velho é que o grande problema
enfrentado na obtenção da ressocialização dos adolescentes infratores reside na
ausência de um sistema socioeducativo compatível com o que dispõe a Lei
8.069/90.
Há uma grande necessidade de investimento nos recursos humanos, seja na
contratação de profissionais mais qualificados, competentes e que saibam atuar da
melhor forma possível nesse trabalho que requer atenção e cuidado, deve-se
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também instituir uma política de capacitação dos profissionais que laboram nessa
área.
Destaca-se também, a carência de ambiente adequado para o cumprimento
da medida de internação e que sequer existe sistema para a execução da medida de
regime de semiliberdade, ou seja, muitas coisas previstas em lei não possuem
qualquer aplicabilidade prática em Porto Velho/RO.
A prefeitura, o Governo do Estado e demais órgãos e entidades responsáveis
pela promoção das medidas socioeducativas pecam com o pouco investimento que
são efetuados nos sistemas de socioeducação, e, que se reflete em mais
adolescentes cometendo atos infracionais e aumento nos índices de reincidência
delitiva, ao passo em que a população se omite ao não cobrar esses investimentos
em sistema adequado e realização de atividades de reintegração social desses
jovens.
Observa-se também que em todas as famílias deveriam existir mais diálogo,
compreensão, aceitação, transmissão de valores e amor entre os seus membros,
pois tais atitudes são determinantes para a formação do caráter do adolescente,
certo de que nas famílias que possuem tal organização há chances menores de que
o jovem venha a cometer ato infracional, ou que venha a reincidir em tais práticas.
Por fim, destaca-se que apesar do longo caminho que deve ser percorrido até
que se possa finalmente vislumbrar um sistema satisfatório de reeducação, observa-
se que não são as medidas socioeducativas que são ineficazes em atingir o
propósito para o qual foram designadas, mas sim que a sua execução não vem
ocorrendo da maneira que deveriam, de acordo com o que preceitua a lei.
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Josimeire de Oliveira Dourado e Stênio Castiel Gualberto
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