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CENTRO UNIVERSITÁRIO AGES JOSÉ MARCELO DOMINGOS DE OLIVEIRA TODAS AS MORTES DE LGBTI+ NO BRASIL SÃO POR HOMOFOBIA? UM ANO DEPOIS DA ADO 26 Paripiranga

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CENTRO UNIVERSITÁRIO AGES

JOSÉ MARCELO DOMINGOS DE OLIVEIRA

TODAS AS MORTES DE LGBTI+ NO BRASIL SÃO POR HOMOFOBIA?

UM ANO DEPOIS DA ADO 26

Paripiranga

JOSÉ MARCELO DOMINGOS DE OLIVEIRA

TODAS AS MORTES DE LGBTI+ NO BRASIL SÃO POR HOMOFOBIA?

UM ANO DEPOIS DA ADO 26

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado

ao Curso de Graduação em Direito, do

Centro Universitário AGES, como requisito

parcial para obtenção do título de Bacharel.

Orientador: Augusto Cesar Santiago Teixeira, Me.

Coorientadora: Christiane Rabelo de Souza, Me.

Paripiranga

2021

Oliveira, José Marcelo Domingos de, 1971

Todas as mortes de LGBTI+ no Brasil são por homofobia? Um ano

depois da ADO 26 / José Marcelo Domingos de Oliveira. - Paripiranga, 2021. 94 f. Orientador: Prof. Me. Augusto Cesar Santiago Teixeira.

Coorientadora: Profa. Me Christiane Rabelo de Souza. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Direito) – UniAGES,

Paripiranga, 2021. 1. Homossexuais. 2. Homofobia. 3. Direito Penal. I. Título. II. UniAGES

JOSÉ MARCELO DOMINGOS DE OLIVEIRA

TODAS AS MORTES DE LGBTI+ NO BRASIL SÃO POR HOMOFOBIA?

UM ANO DEPOIS DA ADO 26

Este Trabalho de Conclusão de Curso foi

julgado adequado à obtenção do título de

Bacharel em Direito e aprovado em sua

forma final pelo Curso de Direito do Centro

Universitário AGES.

Paripiranga, 09 de dezembro de 2021.

_________________________________________________

Orientador Augusto Cesar Santiago Teixeira, Me.

Centro Universitário AGES

_________________________________________________

Coorientadora Christiane Rabelo de Souza, Me.

Centro Universitário AGES

_________________________________________________

Prof. Erlon Leal Martins, Esp.

Centro Universitário AGES

Ao Professor Luiz Mott, pela incansável luta

em prol da cidadania dos LGBTI+ no Brasil.

AGRADECIMENTOS

A existência marca o corpo e a alma. Existir é trilhar caminhos em companhia de

muita gente e, na minha trajetória um sonho antigo, cursar Direito e, no íntimo uma força

maior sempre esteve a me guiar e fortalecer, Deus.

Deus não é parte, é a essência do universo, do sentido das coisas e de todas as minhas

conquistas.

Alcançar um objetivo não é uma ação solitária. É um feito a muitas mãos, presenças,

encontros e desencontros e, não seria justo abandonar tantas memórias, por isso opto em

comemorar a conquista da conclusão do curso de Direito, nestas parcas palavras de

agradecimentos.

O nosso ponto de partida é a AGES. Instituição encravada no interior da Bahia, fruto

da perspicácia e ousadia, de um número considerável de profissionais que por aqui passaram,

munidos com o intuito de oferecer ensino de qualidade, num cenário de vida no campo, mas

somente seus egressos e educadores (professores e demais técnicos) são capazes de dedilhar a

magia de ser parte de sua história. Aqui deixamos nossos mais profundos e sinceros votos de

agradecimento a todos (as) que contribuíram para este empreendimento.

Aos técnicos administrativos, do mais simples ao mais graduado, nosso carinho de

sempre, pelo convívio, abraços, sorrisos, confidências, em especial a Maria de Fátima Rabelo,

Aristhela Mônica Santos Santana Amorim, Edjane Barbosa Trindade, Breno Almeida Santos,

Bruna Santana Batista, Hozana Ferreira Dias, Laiza Santa Rosa Matos Santos, Gilsa Mara

Freire Carvalho, Gleide Selma Ferreira Santana, Mirely Santa Rosa Nascimento, Luciana de

Matos Lima Santos, Richard Eduard dos Santos, Bruna Thaiza Souza Santana, Hortência

Rabelo Santos, Maria Fernanda dos Santos, Ana Lúcia Borges, Isleny Andrade Santana.

O mesmo afeto se eleva em relação ao corpo docente, meus mestres e ao mesmo

tempo companheiros da labuta diária do fazer pedagógico e, aqui não poderia esquecer de

homenagear Luciano Santos Moreira (in memoriam), Paulo Gomes Lima Junior, Sidinei

Antônio Anesi, Maria Lúcia Ribeiro dos Santos, Tanise Zago Tomasi, Fábio Maia, Elton de

Oliveira Assis, Nelson Gonçalves Cardoso, Jailson Souza Santana, Edson Pires da Fonseca,

Franklim da Silva Peixinho, Antônio Dias e Bernardo Cecílio da Fonseca.

O emaranhado de lembranças não nos deixa esquecer o percurso formativo, pois

cursei as disciplinas em meio a tantas atribulações, obrigações, espaços exíguos de tempo,

mas tão rico em tantos outros meios, quer pela presencialidade dos meus colegas, dos projetos

intitulados: Direito e Cinema, Direito e Literatura, ou ainda, na condição de membro do

Núcleo Docente Estruturante (NDE), participação em reuniões pedagógicas, formação em

serviço, pesquisas de casos de mortes violentas de LGBTI+ e, sem esquecer as minhas agruras

com as questões do Grupo Dialogay de Sergipe, a povoar minhas preocupações ao longo de

mais de 20 anos. Vivência rica, inesquecível e singular de uma aproximação com o Direito,

por isso, sou grato a Ítalo de Souza Dantas Moreira, César Tropeiro, Ernesto Andrade Silva,

por estarmos juntos na condição de educandos.

Desfruto até hoje da amizade de muitos aqui não citados, igualmente respeitados. Por

saber dos sacrifícios, especialmente por ter suportado o calor do verão nas subidas para casa,

às 12h30, e nas descidas, antes das 14h, ou do aguaceiro e frio no inverno, mas nada, nem

mesmo outro cenário caberia o meu sonho de uma formação em Direito, sem esquecer das

salas lotadas, do barulho e calor insuportáveis, mas os corredores lotados e o clima europeu,

matizaram o término das aulas às 22h20, na querida e pacata Paripiranga.

Nas saídas dos alunos à noite, as ruas da cidade fervilhavam, especialmente nas

quintas e sextas-feiras, com festas em algumas repúblicas, casas de show improvisadas, as

festividades de São Pedro e da Padroeira, terminam dando o tom da vivência de uma cidade

universitária. Somente o agradecimento aos moradores por pactuar o convívio com tantas

diferenças e, mesmo nas discordâncias, ainda imprimir a civilidade no convívio cotidiano.

É necessário reconhecer o estado de espírito sempre cativado pelo sentimento de

pertencimento e, nunca importou o tempo para concluir o curso. O simples fato de estudar,

adquirir conhecimento era mais importante, a ponto de aprender a cada dia mais com meus

professores e colegas.

Em alguns semestres mantive trancado o curso, mas a Professora Christiane Rabelo

de Souza, à época, coordenadora regional nordeste da área jurídica, compreendeu ser possível

a conclusão do meu curso e, sua percepção e incentivo se materializou com o esforço da

Professora Silvia Manoela de Jesus Santos, atual coordenadora do curso de Direito, as quais

rendo meus agradecimentos e reconhecimento do quanto se desdobram para oferecer

condições de acesso ao curso de Direito na AGES.

O retorno definitivo ao curso se deve a Laiza, por um encontro fortuito na ponte, ao

lado da Torre Eiffel, ao informar que estaria desistindo do meu sonho, pois não sabia como

proceder para reabrir a matrícula. A voz mansa, o carinho de sempre e a escuta atenta, não

permitiram tamanha atitude, ao verificar todas as possibilidades e, em poucos dias estava tudo

resolvido. Meu carinho e reconhecimento pelo seu empenho em contribuir para uma educação

de qualidade e para todos.

Ao meu orientador e amigo, Augusto Cesar Santiago Teixeira pela presencialidade e

apoio em tantos momentos de minha vida acadêmica, profissional e pessoal, os mais sinceros

votos de gratidão.

Estendo também meus agradecimentos e reconhecimento a Professora Karina Sales

Vieira, pelo convívio fraterno na AGES e pelo carinho dispensado na revisão do meu texto

monográfico, ao dispensar prestimosas sinalizações para deixar a leitura mais agradável e

informativa.

E, na imensidão de um cotidiano marcado por reuniões, atividades pedagógicas,

encontrei Admilson Santos Nascimento, a quem divido o meu cotidiano e os sonhos, num

tempo de tantas dificuldades, justamente quando o nosso país mergulhava em tantas

incertezas políticas e econômicas e, vê-lo construindo seu projeto de vida é motivo de alegria,

por isso, esta conquista também é dele, pelo cuidado, pela espera atenta em cada retorno de

um dia cansativo de trabalho ou estudos, numa demonstração de afeto tão intensa.

Por fim, não poderia deixar de agradecer a Deus, pelos meus pais – Maria Craveiro

de Santana e Pedro Domingos de Oliveira (in memoriam), por saber o quanto estariam

orgulhosos e, com certeza algumas lágrimas rolariam, por ter ciência do quanto fomos

capazes de romper a fome e a escassez de recursos tão presentes na nossa infância e

adolescência, mas com trabalho e honradez fomos recompensados com tamanha vitória, por

isso, também estão orgulhosos os meus irmãos e irmãs – Raissa, Marta, Najála, Marisa,

Magna, Marcos, Mateus e Marcones (in memoriam), aos meus cunhados e cunhadas e, de

igual modo relembro com carinho de Madrinha Júlia Gama de Oliveira e Tia Marcília

Barbosa (in memoriam), por reconhecer na minha ancestralidade, minha razão de ser. A

Todos esta conquista e meu agir daqui para frente em honra da Justiça.

“A nossa tentação é quase sempre maniqueísta. A visão simples que separa os ‘bons’

dos ‘maus’ é sempre a mais imediata. Quanto menos entendemos, mais julgamos” (COUTO,

2011, p. 52).

RESUMO

O presente texto constitui um esforço de pesquisa empírica acerca da aplicação do conceito de

homofobia aos casos de mortes violentas contra LGBTI+, ocorridas no Brasil, em 2020. Os

dados fazem parte do Observatório de Mortes LGBTI+ no Brasil, sob a responsabilidade do

Grupo Gay da Bahia e da Acontece Arte Política LGBTI+. A estatística divulgada pelas

organizações de defesa da causa homossexual tem sofrido sérias críticas, justamente em

relação ao fato de se sustentar a ideia de todas as mortes identificadas e catalogadas terem

sido motivadas por homofobia direta ou estrutural. Por ser um estudo empírico, desenvolvido

no âmbito da ciência jurídica, impôs mesclar algumas técnicas de pesquisa próprias das

ciências sociais e, mesmo em relação aos dados quantitativos, deve-se compreender apenas o

uso de percentagem simples, sem uso de cruzamentos, desvio padrão, média, entre outros

recursos próprios da estatística. O resultado alcançado demonstra não haver uma relação

direta entre orientação sexual e identidade de gênero com todos os casos de mortes violentas,

ao contrário, há recorrência de causas diversas afeitas a serem explicadas pelo fenômeno da

violência, criminalidade e segurança pública na sociedade brasileira atual. Isto sinaliza para a

necessidade de aperfeiçoamento ou delineamento do conceito de homofobia, como

possibilidade de uso pelas autoridades policiais, quando do registro de episódios de violência

envolvendo esse segmento social.

Palavras-chave: Homossexuais. Homofobia. Direito Penal.

ABSTRACT

This study is an empirical research effort about the application of homophobia’s concept to

cases of violent deaths against LGBTI+ that occurred in Brazil in 2020. The data are part of

the Observatório de Mortes LGBTI+ in Brazil, under the responsibility of Bahia’s Gay Group

and the LGBTI+ Political Art Events. The statistic released by organizations that protect the

homosexual cause has been seriously criticized, precisely in relation to the fact that the idea is

supported that all identified and cataloged deaths were motivated by direct or structural

homophobia. As an empirical study, developed within the scope of legal science, it is imposed

a mix of research techniques typical of the social sciences and, even regarding the quantitative

data, only the use of simple percentages should be understood, without the use of crossings,

standard deviation, mean, among other statistical resources. The result achieved demonstrates

that there is no direct connection between sexual orientation and gender identity with all

violent deaths’ cases, on the contrary, there is a recurrence of several causes affected to be

explained by the phenomenon of violence, crime and public safety in today's Brazilian

society. This alarms to the need for improvement or delineation of homophobia’s concept, as

a possibility the police authorities to use, when recording episodes of violence involving this

social segment.

Keywords: Homosexuals. Homophobia. Criminal Law.

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Tipificação das mortes violentas de LGBTI+ no Brasil, em 2020 ......................... 58

Tabela 2 - Lista dos casos de mortes violentas de LGBTI+ no Brasil, em 2020 ..................... 86

LISTA DE ABREVIATURAS

ADO Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão

LGBTI+ Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais, Intersexo e mais

LGBTTQIA+ (lésbicas, gays, travestis, transexuais, queers, intersexo, assexuados e outros)

MI Mandato de Injunção

ROGERIA Registro de Ocorrência Geral de Emergência e Risco Iminente À comunidade

LGBTQIA+ Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais, Queer, Intersexo e mais

LISTA SE SIGLAS

BDTD Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações

GGB Grupo Gay da Bahia

IBGE Instituto de Geografia e Estatística

MHB Movimento Homossexual Brasileiro

OMS Organização Mundial da Saúde

SSP/AL Secretaria de Estado da Segurança Pública de Alagoas

STF Supremo Tribunal Federal

TJDFT Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios

UNESP Universidade Estadual Paulista

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 16

2 TESSITURAS TEÓRICAS SOBRE VIOLÊNCIA, GÊNERO E HOMOFOBIA ............... 24

2.1 VIOLÊNCIA, UMA CATEGORIA POLISSÊMICA E MULTIFATORIAL ............... 24

2.2 POR UMA COMPREENSÃO DA DOMINAÇÃO MASCULINA .............................. 27

2.3 DAS IDEIAS FEMINISTAS, AO DISCURSO DE GÊNERO ...................................... 29

3 HOMOFOBIA, USOS E DESUSOS..................................................................................... 36

3.1 DA LUTA PELA “AFIRMAÇÃO HOMOSSEXUAL” E A DENÚNCIA DE

VIOLAÇÃO AOS DIREITOS HUMANOS: A CONSTRUÇÃO DE UM OBJETO DE

PESQUISA ........................................................................................................................... 37

3.2 A CONCEPÇÃO MOTIANA DE CRIME DE ÓDIO, HOMOFÓBICO OU

HOMICÍDIO POR RACISMO LGBTFÓBICO ................................................................... 39

3.3 O CONCEITO DE HOMOFOBIA E A ADO 26 ........................................................... 48

4 MORTES VIOLENTAS DE LGBTI+ NO BRASIL: HOMOFOBIA OU MULTICAUSAS?

.................................................................................................................................................. 51

4.1 MONITORAMENTO DAS MORTES DE LGBTI+ PELO GGB OU A “FARSA” DE

UMA TRAGÉDIA ................................................................................................................ 52

4.2 AS MORTES VIOLENTAS DE LGBTI+ NO BRASIL, EM 2020, MANIFESTAÇÃO

DA HOMOFOBIA? .............................................................................................................. 57

5 CONCLUSÃO ....................................................................................................................... 71

REFERÊNCIAS ....................................................................................................................... 74

16

1 INTRODUÇÃO

Um tema de pesquisa não surge do nada. Em seu trajeto há nuances da percepção do

investigador, dos seus interesses, dos desdobramentos na esfera acadêmica e nas relações

sociais e, isto ocorreu aqui também. Por militar no movimento LGBTI+ 1 e, por ter um

percurso nas pesquisas sobre violência contra esse segmento social seriam suficientes, mas o

estímulo maior adveio de uma conversa com o professor, antropólogo e decano do movimento

homossexual brasileiro, Luiz Mott e, na condição de defensor intransigente dos direitos

humanos, instruiu-me a ler os textos de Sergio Carrara, quanto ao tratamento dispensado pela

Justiça aos LGBTI+ vítimas de violência.

Ideia importante, apesar disso, reconheci ser impossível construir um estudo nesse

sentido, em tão pouco tempo. Diante disso, optei por buscar responder uma inquietação antiga

e, também, necessária para as pesquisas sobre mortes violentas de LGBTI+ no Brasil, quanto

à classificação de crimes de homofobia, justamente o ponto de inflexão do biólogo Eli Vieira

(2021), ao revisitar o conceito de homofobia, ao resgatar os casos de mortes violentas

ocorridas, em 2020.

Em 2020, continuei a ajudar ao Grupo Gay da Bahia, através de Luiz Mott, com

maior inserção no Grupo Acontece, através do professor Alexandre Bogas (Unesp)2, na coleta

e sistematização dos casos de mortes violentas de LGBTI+ no Brasil, apesar de compreender

a necessidade de termos um melhor desenho dos critérios para inclusão das referidas mortes

no rol de crimes de homofobia.

1 É importante compreendermos a existência de um amplo debate travado nas duas últimas décadas em torno da

nomenclatura mais adequada para se referir ao segmento aqui em estudo. Isto se reveste em importância, pois

estamos diante de um tema ligado a questões identitárias e de pertencimento e, falar de homossexuais, em 1869,

quando o médico húngaro Karoly Maria Benkert, a utilizou pela primeira vez (STEAKLEY, 1981), e sua

trajetória ao longo de mais de cem anos, passando pela repressão policial nos Estados Unidos da América, com o

levante de Stonewall In, em 1969, ou mesmo a luta contra as batidas policiais em São Paulo (COLLING, 2011) e

o enfrentamento da epidemia de HIV/aids, implica sabermos o quanto os segmentos no interior da sigla LGBTI+

se reconhecem e buscam visibilidade, então, na Conferência de Gays, Lésbicas, Travestis e Transexuais, ocorrida

em Brasília, em 2008, aprovou a mudança na ordem das letras na sigla GLBT, para LGBT, ou seja, trazia-se

assim as lésbicas para o início da sigla, com o firme propósito de assegurar maior visibilidade às suas pautas,

uma vez que, gays e travestis haviam se projetados mais, quando do enfrentamento da epidemia de HIV/aids,

desta forma, aqui, ao adotarmos a sigla LGBTI+, queremos dizer e sinalizar uma compreensão do alcance dessa

abreviatura, quanto aos diferentes grupos no interior do que seria nas décadas de 1980, 1990 e parte dos anos

2000, como população homossexual, apesar de estarmos ainda em um campo de disputa, quando militantes e/ou

pessoas interessadas diretamente com o tema, especialmente militantes da causa preferem denominar de

movimento LGBTTQIA+ (lésbicas, gays, travestis, transexuais, queers, intersexo, assexuados e outros). 2 ACONTECE – Arte e Política LGBT+ fundada em 22 de junho de 2013, em Florianópolis (SC) objetiva a

defesa da causa LGBT e dos Direitos Humanos e, entre as estratégias de fomento a cidadania da população-alvo

encontra-se a produção e difusão de produções artísticas e culturais de lésbicas, gays, bissexuais, travestis,

transexuais e demais orientações sexuais e identidade de gênero.

17

Revisar e analisar os casos de mortes violentas de LGBTI+, em 2020, constitui uma

ação importante para ampliar o debate sobre tais mortes, com possibilidade de cobrança ao

poder público para operar o registro através dos formulários nas delegacias de polícia,

criminalística e medicina legal3.

Atualmente, convivemos com ausência de dados estatísticos oficiais, por isso,

estudos dessa natureza reveste-se de importância acadêmica, uma vez que inexiste ainda um

debate mais aprofundado quanto aos critérios para definir se um crime é motivado por fatores

homofóbicos e, por outro lado, assegurará também os desdobramentos no campo jurídico,

apesar do Supremo Tribunal Federal (STF) ter julgado procedente a Ação Direta de

Inconstitucionalidade por Omissão – ADO 26, que equiparou a homofobia ao crime de

racismo.

A conversa com Luiz Mott motivou-me a buscar a construção do nosso objeto de

pesquisa e, mesmo com as indicações e ponderações, não foi nada fácil efetuar o recorte. O

primeiro obstáculo era definir um marco temporal, pois já estamos vivendo o momento

posterior ao julgamento da ADO 26 e, homofobia agora é crime no Brasil, e como havia

observado nos estudos em relação às mortes de mesma natureza em Sergipe, quando realizei

as pesquisas para minha tese de doutoramento, no Programa de Pós-Graduação em Ciências

Sociais, na Universidade Federal do Rio Grande do Norte, em 2012 (OLIVEIRA, 2014), o

simples fato de a orientação sexual ser de um LGBTI+ não significa estarmos diante de um

crime homofóbico4.

Evidentemente, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) serviu de

parâmetro para delimitar o nosso marco temporal, então, o cuidado agora seria ponderar sobre

a metodologia a ser empregada, o recorte temporal seria 2020, ou seja, período amparado pelo

referido entendimento da Suprema Corte.

O esforço de pesquisa está inserido nas preocupações acadêmicas de compreensão do

fenômeno da violência e criminalidade, trabalhos sedimentados por diferentes pesquisadores e

3 Em 14/09/2021, o Conselho Nacional de Justiça, sob a presidência do Ministro Luiz Fux debateu sobre modelo

de formulário de combate a violência contra a população LGBTI+, ou seja, “[...] o intuito de subsidiar a

elaboração de um formulário de avaliação de riscos sobre violência contra pessoas que fazem parte da

comunidade LGBTQIA+” (ALEIXO, 2021). A ideia é da cantora Daniela Mercury, e o projeto deverá

homenagear a cantora e atriz ROGERIA (Registro de Ocorrência Geral de Emergência e Risco Iminente À

comunidade LGBTQIA+). 4 Tal argumentação foi utilizada pela Associação Nacional de Juristas Evangélicos (Anajure), em “Nota Pública

sobre o julgamento da ADO 26, referente à criminalização da homofobia e transfobia”, datada de 11 de fevereiro

de 2019, justamente para sustentar o fato de nem todas as mortes violentas de LGBTI+ ser motivada por

homofobia. Entretanto, a leitura e uso do trecho da minha tese de doutorado está enviesada e pouco afeita a

alinhar-se à tese defendida, mas, como não reconhecer os múltiplos usos de um texto? O importante é considerar

o fato de ter estabelecido o debate, afinal este é o propósito primeiro da produção científica.

18

grupos de estudos, a exemplo de Luiz Mott (1988; 1997; 2000; 2002; 2011), Sérgio Carrara

(2003), Beato (1998), Núcleo de Estudos da Violência da USP. Trabalhos não

necessariamente voltados à compreensão da violência sofrida pelos LGBTI+, entretanto,

oferecem pistas importantes para compreendermos a escalada da violência na sociedade

brasileira dos últimos trinta anos.

É natural reconhecer o fato de os LGBTI+ terem ocupado há muito tempo um lugar

de exclusão. Uma invisibilidade social e, ao mesmo tempo uma negativa de direitos, quando

não sofrem duplamente a reprovação social, com a agressão e o tratamento dispensado na

Justiça, quando a vítima assume o lugar de propiciador das condições de agressão e morte

(vitimização), ou ainda, no tratamento dispensado com a inépcia na elucidação dos casos,

levando a figurar entre os crimes insolúveis e a impunidade assume sua face mais

característica, quando não se promove a absolvição em sede do Tribunal do Júri.

Posturas adotadas pela Justiça em casos de violência contra LGBTI+ não difere das

repetidas negativas de direito às mulheres vítimas de violência doméstica. O importante agora

é compreender como a homofobia se encontra presente nas mortes violentas de LGBTI+ no

Brasil, em 2020, assim, quais os fatores presentes na cena do crime que demonstram um ato

de homofobia? Seria a homofobia uma qualificadora para as mortes violentas de LGBTI+?

Quais seriam as causas dos crimes homofóbicos no Brasil?

Responder a tais indagações implica reconhecermos o quanto estudos recentes têm

procurado desvelar a face mais recorrente da homofobia em nossa sociedade e, isso aparece

nos 135 trabalhos sinalizados como dissertações de mestrado e 97 teses de doutoramento

defendidas entre 2016 e 2020 em programa de pós-graduação em universidades brasileiras5.

Por se tratar de um trabalho de análise de dados empíricos, evidentemente

reconhecemos estarmos trabalhando com um segmento, ou parte considerável deste, e não

apenas travestis e transexuais, envoltos em dificuldades de toda ordem para a sua inserção

social, por isso, sofrem ainda mais com a pobreza, ausência de teto para morarem, dificuldade

para obter qualificação adequada para adentrar ao mercado de trabalho, enquanto fatores de

risco, como se observou ainda mais fortemente na primeira fase de enfrentamento da

pandemia da Covid-19.

E, não se pode deixar de mencionar um fato importante, quando se trata da

população LGBTI+, a invisibilidade social promovida pelos órgãos públicos é uma realidade,

especialmente neste momento em que o Instituto de Geografia e Estatística (IBGE),

5 A pesquisa foi realizada na Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD) – Link:

https://bdtd.ibict.br/vufind/.

19

responsável pelo Censo Demográfico 2020, nega-se a incluir um questionário mais atento a

esta população, desprezando uma oportunidade ímpar para ir construindo um perfil desse

segmento social. Apesar da ausência do cuidado do Poder Executivo, o Poder Judiciário tem

procurado redimensionar suas práticas com inclusão de dados em seus relatórios, quanto a

população LGBTI+ privada de liberdade.

Evidentemente, o nosso estudo não parte do zero, ao contrário assenta-se em estudos

anteriormente estruturados em torno do conceito de homofobia, por isso, os estudiosos do

tema adotam como marco conceitual a obra do psicólogo norte-americano George Weinberg,

publicada em 1972, sem tradução para o português, isso não implica em ausência de esforço

na academia brasileira, ao contrário, monografias, dissertações e teses demonstram o interesse

pela temática nos últimos anos, além de livros e artigos científicos, quando não aparecem em

matérias jornalísticas e comentários em blogs e redes sociais, enfim, é uma conceituação já

internalizada, quando se busca reportar ao preconceito e a discriminação contra a orientação

sexual e o gênero, em relação a população LGBTI+.

E, diante da tarefa de compreender o emprego do conceito de homofobia às mortes

violentas de LGBTI+ no Brasil, em 2020, esta investigação insere-se nas pesquisas de estudo

de caso (GIL, 2017), no sentido de se constituir num estudo exaustivo dos episódios

identificados e sinalizados como atinentes a vítimas de ódio na condição de gays, lésbicas,

bissexuais, travestis, transexuais, intersexo e mais, com vistas a termos um detalhamento

maior em relação à caracterização desse tipo de crime e assim, possamos verificar se, de fato

os casos identificados pelo Grupo Gay da Bahia (GGB) e pelo Acontece Arte e Política

LGBTI+ são crimes de homofobia.

Em nossa incursão junto ao tema, justifica-se o emprego do estudo de caso, devido

ao banco de dados organizado pelo GGB ao longo de 40 anos e, selecionamos 2020, por ser

um período sob o entendimento do STF quanto a possibilidade de aplicação da Lei de

Racismo, aos crimes de ódio contra LGBTI+, então, esperávamos com esta escolha obter um

melhor detalhamento, uma vez que buscamos conseguir informações para uma melhor

tipificação deste tipo de crime, mesmo porque não existe no nosso Código Penal, uma

qualificadora, como ocorre, por exemplo, com o feminicídio (art. 121, §2º, inciso VI), ou seja,

matar uma mulher por questões de gênero.

A inexistência do tipo penal, homofobia, não implica ausência de possibilidade de se

verificar o motivo torpe, quando a sociedade reprova o ato da pessoa por ter matado alguém

por um motivo vergonhoso, repudiado moral e socialmente, a exemplo do preconceito (art.

121, §2º, inciso I).

20

A opção pelo estudo de caso, enquanto recurso metodológico, implica reconhecer nas

palavras de Antonio Carlos Gil (2017), o fato desse tipo de estudo sempre ter estado

relacionado a um estudo exploratório e, nessa condição não segue os rigores exigidos num

processo de pesquisa científica, apesar de ter adquirido ao longo do tempo reconhecimento e,

hoje, se traduz num excelente recurso para análise de estudos de fenômenos reais, como

observa Yin (2013 apud GIL, 2017), além do referido estudioso das metodologias de pesquisa

também reconhecer o quanto é problemático, nas ciências sociais, e não o é em relação ao

Direito, nas Ciências Sociais Aplicadas, fazer a distinção entre o fenômeno em estudo e o seu

contexto de produção, por isso, muitos pesquisadores têm lançado mão do estudo de caso para

ajudá-los na aproximação de seus objetos de estudo, mesmo porque, em nosso caso, tínhamos

como tarefa a explorar, ou seja, os casos de mortes violentas de LGBTI+, num contexto de

pouca definição quanto aos elementos caracterizadores da homofobia, ou ainda, estávamos

diante de uma motivação para tais crimes, apesar de haver aqui a possibilidade de discutirmos

a “homofobia estrutural”, enquanto manifestação difusa e de difícil caracterização. Esforço

sem o qual não seria possível propor hipóteses explicativas e as causas do referido fenômeno.

Uma vez optado pelo uso do estudo de caso, não impede de reconhecermos o quanto

há de críticas a esta metodologia, conforme aponta Consoli et al. (2008) e, parte da crítica

assenta na ausência dos estudos desfocados de evidências, com ausência de protocolo de

pesquisa e, por cima deixam transparecer não haver critérios de seleção dos casos estudados

(BARBOSA, 2008; CESAR; ANTUNES, 2008; MARTINS, 2008).

Gil (2017) também tece comentários acerca dos críticos do método, ao afirmar ser

um recurso que oferece pouca possibilidade para generalização, uma vez que ao estudar

poucos casos, termina por dificultar ou impedir a generalização, apesar de reconhecer não ser

objetivo deste tipo de estudo alcançar as características de uma população, mas oferecer uma

visão global do fenômeno e apontar fatores que levam a aquela situação, enquanto causas.

Além disso, ponderam sobre o tempo necessário para o desenvolvimento deste tipo de estudo,

considerando como baliza as pesquisas realizadas quando do surgimento dos primeiros

trabalhos com esta orientação metodológica, a ponto de se constituir enquanto

empreendimento exitoso em matéria de estudo científico.

O fato de termos ajudado na coleta dos dados para a composição do “Observatório de

Mortes LGBTI+ no Brasil – 2020: Relatório” (OLIVEIRA et al., 2021) facilitou no processo

de sistematização dos dados e, por sua vez na formulação do problema e, consequente,

definição das unidades-caso, ou seja, as mortes violentas de LGBTI+ catalogadas pelo GGB,

referente ao exercício de 2020 estavam todas disponíveis, ao menos os dados mais básicos das

21

vítimas e dos agressores identificados pela política, além das notas jornalísticas com descrição

da cena do crime ou episódio.

E, em relação à coleta dos dados, devemos esclarecer que, uma parte do esforço já

havia sido efetuada durante 2020, quando levantamos os dados através de diferentes fontes.

Parte das informações foram obtidas diretamente no Google, com utilização de palavras-

chave (homossexual, gay, travesti, transexual, bissexual, mulher trans, homem trans), ou

ainda, com uso de expressões, como: professor morto, pai de santo morto ou assassinado,

espancado e putrefação, morava sozinho, entre outros. Apesar disso, em alguns momentos, o

simples fato de buscar tais informações na rede mundial de computadores, às vezes

direcionando a notícias e tantas outras vezes através do Youtube, blogs e redes sociais

constituiu uma tentativa de ampliar as possibilidades de acesso a informações sobre o objeto

de pesquisa deste estudo.

Impressiona como a notícia sobre tais mortes aparecem pulverizadas e, nem sempre

coberta pela grande mídia. Em geral, o G1 nos Estados traz notícias dessa natureza, ou ainda,

outras tantas advieram por meio de grupos de WhatsApp, mais especificamente, no Grupo da

Decana (criado por Luiz Mott) e outro mantido por Toni Reis (Aliança Nacional LGBT).

Não raro, amigos dispersos em vários Estados da Federação, ex-alunos e colegas de

trabalho trouxeram indícios de casos de mortes violentas de LGBTI+, demonstrando ser

necessário a formação de uma rede de informantes, atentos e comprometidos com a cidadania.

Pesquisar dados de mortes de LGBTI+ em mídias diversas, implica em reconhecer a

possibilidade de deixar algum caso sem registro, corroborando com um histórico de crimes

não elucidados e esquecidos, então, o número alcançado com tal esforço não traduz

naturalmente o real universo do fenômeno, em outras palavras, é apenas aqueles alcançados

pela metodologia empregada até aqui e os esforços do GGB, Luiz Mott e seus colaboradores

para o monitoramento de tais crimes.

Cientes do passo a passo em relação à coleta de dados, é pertinente ainda considerar

que, tal trabalho de coleta, também, é complementado com informações mais detalhadas ou

comprovação das referidas mortes em órgãos oficiais, a exemplo dos Boletins da Secretaria de

Segurança Pública da Bahia6. Dados também disponíveis junto à Secretaria de Estado da

Segurança Pública de Alagoas7, que disponibiliza a “Relação de vítimas de crimes violentos

letais e intencionais registrados pela SSP/AL”, em formato PDF. O Estado do Paraná oferece

6 Disponível em: http://www.ssp.ba.gov.br/modules/consultas_externas/index.php?cod=5. 7 Disponível em: https://dados.al.gov.br/catalogo/pt_BR/dataset/relacao-de-vitimas-de-crimes-violentos-letais-e-

intencionais-registrados-pela-ssp-al-2016.

22

informações sobre serviço funerário, a exemplo de Curitiba8, com informações importantes

sobre a morte no obituário, desde informações sobre pai, mãe, profissão e local de velório e

sepultamento.

E, não raro, os dados fornecidos pela mídia e serviços públicos, por exemplo, são

insuficientes para alcançar os dados necessários à caracterização do crime e,

consequentemente, relacioná-lo aos casos de homofobia, então, criamos a estratégia de

pesquisar as páginas sociais dos mortos no Facebook e Instagram. Sempre com o cuidado de

verificar comentários sobre a morte e amigos próximos, para assim entrar em contato através

do Messenger, especialmente para as informações obtidas via Facebook.

Munidos das informações preliminares e com um rol de lacunas, a estratégia agora

passa pela aproximação com os funcionários da criminalística, Instituto Médico Legal,

Ministério Público, varas criminais, parentes e amigos. Numa peregrinação interminável, por

depender exclusivamente da boa vontade destes em se disponibilizarem para uma conversa,

nem sempre fácil e amistosa nas primeiras tentativas, mas para superar as desconfianças, o

temor do uso das informações, o sensacionalismo, para alguns o melhor foi o silêncio.

Imbuído do ardor em buscar uma explicação mais plausível para as mortes violentas

de LGBTI+, passamos a pensar na possibilidade de adotar a noção clássica de unidade-caso,

enquanto pessoa morta em um contexto ou por meio de produção do desfecho trágico, a ponto

de traduzir a ideia de homofobia.

E, o fato de nosso objeto de estudo ser mortes violentas de LGBTI+, sabíamos da

existência de ao menos seis diferentes modalidades de estudos de caso, como explica Gil

(2017), ou seja, caso raro, caso decisivo, caso revelador, caso típico, caso extremo e, caso

discrepante. A nossa dúvida seria, justamente, trabalhar com um caso extremo ou discrepante,

então, optamos pelo caso extremo, por termos um nível de demonstração de ódio mais latente,

abandonando a ideia de caso típico, mesmo porque não há como se operar a construção de um

tipo-ideal weberiano (WEBER, 2004).

Então, num universo de 247 mortes violentas de LGBTI+ no Brasil, em 2020, todas

estas mortes foram por homofobia? A pergunta acompanhou o itinerário deste estudo ao longo

da constituição do objeto de estudo, desde o levantamento dos dados, por isso, optamos por

selecionar casos com indícios de manifestação de falas de ódio, múltiplas perfurações, pênis

cortado, reprovação da sexualidade da vítima pelo agressor, enfim, ato manifesto de querer

8 Disponível em: https://obituarios.curitiba.pr.gov.br/.

23

aniquilar com a pessoa LGBTI+ por não concordar com a sua orientação sexual ou identidade

de gênero.

E, na elaboração do protocolo de pesquisa, optamos por utilizar uma tabela no Excel,

com informações básicas sobre a vítima, contendo: data da ocorrência, cidade, Estado, região,

nome, nome social, orientação sexual/gênero, idade, cor, profissão, causa morti, tipo de arma,

local do crime e fonte. Recurso que venho desenvolvendo desde 1994, quando iniciei meus

estudos sobre morte de LGBTI+, em Sergipe. Além disso, elaboramos e trabalhamos com

perguntas ao longo do estudo, como uma espécie de referência e limite para o esforço

interpretativo, mesmo porque há que se considerar a busca aqui pelas características de tais

crimes, visto que o objetivo era verificar se tais mortes se encontravam inseridas no rol dos

crimes homofóbicos ou homicídio por racismo LGBTfóbico.

É pertinente considerar, também, o cuidado com a análise dos dados. O primeiro

passo foi compor um quadro de informações sobre a morte, desde a observação de detalhes da

cena do crime, modus operandi, fala do agressor, depoimento de testemunhas, comentários de

agentes da segurança pública e jornalistas, e, de posse desse material passamos a confrontar

com o conceito de homofobia, para a seleção dos casos, manifestamente indicassem haver

motivação de crime de ódio.

Uma vez identificados tais casos, passamos a analisá-los com o intuito de compor as

características de tal fenômeno e assim proceder a formação de uma ideia acerca do tipo de

crime de homofobia praticado no Brasil, como próprio de manifestação de torpeza.

O trabalho encontra-se organizado em cinco capítulos, sendo o primeiro voltado aos

aspectos introdutórios, com delimitação do tema, objeto de pesquisa, justificativa e

metodologia.

O capítulo 2 traça uma digressão sobre as teorias elaboradas em torno do conceito de

violência, gênero e homofobia, por constituir elementos essenciais do objeto de estudo desta

monografia.

E, no capítulo 3, busca-se verificar os usos e desusos do conceito de homofobia.

Cuidado importante, especialmente quando se compreende existir críticas contundentes

quanto a aplicação dessa definição para alcançar a explicação para as mortes violentas de

LGBTI+ no Brasil.

O capítulo 4 constitui a parte empírica do estudo, ao relacionar os casos de mortes

violentas de LGBTI+ no Brasil, 2020, com o conceito de homofobia, por fim, apresenta-se as

conclusões do estudo.

24

2 TESSITURAS TEÓRICAS SOBRE VIOLÊNCIA, GÊNERO E HOMOFOBIA

2.1 VIOLÊNCIA, UMA CATEGORIA POLISSÊMICA E MULTIFATORIAL

A geração atual tem vivenciado um ambiente social marcado pela violência.

Compreendê-lo enquanto fenômeno social tem se constituído num esforço de estudiosos de

diferentes áreas do conhecimento, a exemplo de Michaud (1989), Corbisier (1991), Wieviorka

(1997) e Arendt (2016), sem mencionarmos aqui os esforços de gestores públicos.

Em 2002, a Organização Mundial da Saúde (OMS) lançou o “Relatório Mundial

sobre Violência e Saúde”, numa espécie de constatação da gravidade do problema e, no

preâmbulo desta obra, Nelson Mandela reconhecia o fato que “o século vinte será lembrado

como um século marcado pela violência. Em uma escala jamais vista e nunca antes possível

na história da humanidade, ele nos oprime com seu legado de destruição em massa, de

violência imposta [...]” (OMS, 2002, p. 9) e, Gro Harlem Brundtland, Diretora Geral da OMS,

observa que: “Em todo o mundo, a violência invade a vida de muitas pessoas e, de alguma

maneira, toca a todos nós. Para muitas pessoas, ficar a salvo é questão de trancar portas e

janelas e evitar lugares perigosos. Para outros, é impossível escapar” (OMS, 2002, p. 11).

Perspectiva plenamente verificável, quando se trata de travestis e transexuais expostas às

agruras da prostituição e, muitas delas terminam sendo executadas ou vítimas de agressões,

para não falar em lesões corporais de natureza grave.

Em 2017, o número de homicídios no Brasil alcançou 65.602 casos (CERQUEIRA,

2021) e, mesmo com a redução para 45 mil, em 2020, os números demonstram a gravidade da

situação vivenciada pela população brasileira e, se consideramos ter havido dois anos de

queda dos referidos números, apesar do isolamento social advindo do combate a Covid-19

(MONITOR DA VIOLÊNCIA, 2021).

A lição imposta pela violência às autoridades e, ao cidadão é o quanto seus

desdobramentos impõe restrições à vida, à saúde, produz doenças e morte (AGUDELO,

1990), então, a compreensão da dimensão violência perpassa pela noção de um fenômeno

mundial, como compreende a OMS, social, histórico e multifatorial, por isso assume um

caráter polissêmico em sua definição, quer seja pela sua natureza complexa, ou pelo fato de se

modificar ao longo do tempo.

A Organização Mundial da Saúde conceitua a violência como: “o uso de força física

ou poder, em ameaça ou na prática, contra si próprio, outra pessoa ou contra um grupo ou

comunidade que resulte ou possa resultar em sofrimento, morte, dano psicológico,

25

desenvolvimento prejudicado ou privação”. (OMS, 2007, p. 1165). Apesar da amplitude da

compreensão da OMS sobre o conceito de violência, o presente estudo foca os casos de

mortes violentas contra LGBTI+ no Brasil, em 2020, catalogados pelo GGB.

O conceito construído pela OMS (2007) atenta para o uso da força, mas suas raízes,

como diria Corbisier (1991), mesmo reconhecendo o início do ser humano, começa com o uso

da razão, entretanto a história é permeada de crimes, massacres e outros eventos violentos.

Nesse sentido, Odalia (1983) considera o viver em sociedade como algo violento, por ser um

evento sempre presente em todas as épocas, a ponto de extrapolar a dimensão de

sobrevivência, para formas sutis, de tal maneira que “[...] ela de alguma forma se enriquece

para ser uma decorrência da maneira pela qual o homem passa a organizar sua vida em

comum com outros homens [...] (ODALIA, 1983, p.14).

E, na concepção de Yves Michaud (1989, p. 8), deve-se considerar que a “violência’

vem do latim violentia, que significa violência, caráter violento ou bravio, força. O verbo

violare significa tratar com violência, profanar, transgredir [...]” e, “são violência o

assassinato, a tortura, as agressões e vias de fato, as guerras, a opressão, a criminalidade, o

terrorismo etc. [...]” (MICHAUD, 1989, p. 7) e, ao tomar tais fatos, busca então definir a

natureza desse fenômeno social, aqui afeito a servir de suporte para o debate jurídico, ou seja,

a agressividade e a brutalidade capaz de provocar em outrem, danos físicos ou ainda

psíquicos. Apesar disso, é necessário entender que a lei permite certos atos violentos nos

esportes, cirurgias ou mesmo para manter a ordem e, no art. 23, do Código Penal, tais atos

podem incidir nas excludentes de ilicitude (estado de necessidade, legítima defesa e estrito

cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito).

Yves Michaud (1989) ao sinalizar para a distinção feita no âmbito penal acerca de

violência e crime, impõe a observação acerca da sua natureza transgressora, pois, a tipificação

do ato violento pressupõe a intencionalidade do agente, enquanto resultado esperado e, o dano

causado pode indicar o grau de agressividade, pois o dano físico é fácil de identificar, mas

terminam desconsiderando outras formas de agressões.

Ao buscar definir violência, é necessário reconhecer se foi deflagrada em nível

interpessoal, coletiva ou autodirigida. A violência interpessoal ocorre quando uma pessoa

agride um membro da família, parceiro (a) ou da comunidade. A violência coletiva ocorre

contra um grupo social e, a autodirigida caracteriza-se pelo ato contra si, a exemplo do

suicídio.

Pode-se também classificar a violência em física, sexual, psicológica, ou ainda, por

privação ou abandono, por isso é importante compreender a violência como violação, para

26

que se possa relacionar a violação aos direitos civis (liberdade, privacidade, proteção

igualitária), sociais (educação, saúde, habitação, segurança), econômicos (emprego e salário),

culturais e políticos (voto, participação política).

Theophilos Rifiotis (1998, p. 26), em “Dilemas éticos no campo da violência”

reconhece haver ambiguidade nos significados da palavra violência, especialmente quanto [...]

a percepção que os sujeitos sociais têm da violência e sua relação com a construção de uma

sociedade democrática”. Em sua visão, a concepção ambígua de violência é acompanhada

também pela mudança de significado, além de carregar diferentes tipos de fenômenos e,

terminam não sendo reduzidos ao crime a violência institucional, assim, “[...] no nosso

cotidiano, referimo-nos violência no esporte, no trânsito, nas ruas, nas prisões, ou ainda com

relação às precárias condições de vida, à fome e, evidentemente, com relação à criminalidade

[...]” (RIFIOTIS, 1998, p. 27), por isso, reconhece como violência invisível.

Uma contribuição importante na argumentação de Rifiotis (1998) é o quanto

devemos aprender com a violência como parte das nossas relações sociais. Essa percepção

pode sem complementada pela noção trabalhada por Minayo e Souza (1999, p. 10), ou seja, a

dificuldade para se conceituar a violência advém do fato de “[...] ser ela, por vezes, uma

forma própria de relação pessoal, política, social e cultural; por vezes uma resultante das

interações sociais; por vezes ainda, um componente cultural naturalizado” e Minayo (1994, p.

7), ao buscar compreender a relação entre violência e saúde pública, reconhece ser a violência

um problema inerente a todas as sociedades em todos os tempos, mas uma certeza é aceita por

todos, ou seja, a violência não decorre de fatores biológicos, “[...] Trata-se de um complexo e

dinâmico fenômeno biopsicossocial, mas seu espaço de criação e desenvolvimento é a vida

em sociedade”.

A filósofa Hannah Arendt (2016), ao abordar a violência no âmbito da política,

oferece pistas importantes para a compreensão desse fenômeno na sociedade contemporânea,

especialmente quando traz a ideia de caráter instrumental, pois o ato para se desenvolver

carece do agente, orientação e justificativa, por não ser algo gratuito. A ideia de instrumental

encontra sua lógica no fato de a violência constituir uma forma de destruir o poder, pois em

sua concepção o poder ocorre de forma coletiva e voltada ao agir em conjunto, enquanto a

violência constitui um ato materializado.

Vladimir Denisov (1986) constrói uma análise singular acerca da violência, em sua

obra “Violência Social: ideologia y política”, quando compreende este fenômeno de forma

multifacetada, com características externas e internas, coletivas e subjetivas. O foco encontra-

se centrado em indivíduos, grupos, classes sociais e instituições, ao agir através de formas

27

variadas para ofender outrem, sempre com o objetivo de obtenção de poder, patrimônio, ou

ainda, reconhecimento social.

Villela (2000) compreende a violência através da violência estrutural, institucional e

intencional. Forma de organização do objeto de estudo também adotado por Minayo (1994),

ao reconhecer também uma violência estrutural, resistente e delinquente e, uma contribuição

trazida pela referida autora é a contribuição de Roberto Da Matta (1982 apud MINAYO,

1994), ao recomendar realizar uma análise histórica, evitar fazer defesa ou acusação, pois a

violência pode sinalizar mudanças na sociedade, por fim, “relacionar o crime à norma; o

desvio à regra; o conflito à solidariedade; a ordem à desordem; o cinismo à consciência e ação

sociais. Porque o crime e o castigo, a ordem e a desordem, violência e a concórdia revelam,

também, as formas de propriedade e de governo, bem como as leis do mercado” (MINAYO,

1994, p. 8).

Uma vez discutido aspectos gerais sobre o conceito de violência, a tarefa agora é

relacionar a um aspecto central do nosso objeto de estudo, o machismo presente na sociedade

brasileira, enquanto herdeira da cultura mediterrânica.

2.2 POR UMA COMPREENSÃO DA DOMINAÇÃO MASCULINA

Ao trazer a ideia de dominação masculina, a primeira imagem a ser resgatada por um

sociólogo é uma obra de Pierre Bourdieu, publicada em 2002.

Resgatar a discussão elaborada pelo mais importante sociólogo francês da segunda

metade do século XX, constitui um desafio para entendermos o machismo e seus

desdobramentos na sociedade ocidental e, mais importante ainda, a sua permanência na

sociedade brasileira e, como se materializa em violência, quer em relação à mulher e às

LGBTI+.

Bourdieu (2002) analisa a dominação masculina numa perspectiva simbólica, para

demonstrar a sua natureza de violência simbólica, especialmente enquanto poder imposto,

como legítimo, a ponto de esconder as forças exercidas contra as mulheres e, para nosso

objeto, a população LGBTI+.

O pior é compreender o quanto as relações sociais escondem a manutenção da

dominação masculina, especialmente em relação a funções próprias para homens e assim

afasta-se as mulheres de funções e postos de comando na sociedade, mas lembre-se, Bourdieu

(2002) não traz a discussão sobre gênero, mesmo porque tal conceito ainda não estava sendo

28

discutido com tal força em sua época, ou mais especificamente quando produziu este escrito e

publicou em 1995, no formato artigo.

É impressionante como a concepção de “invisíveis” é importante para entendermos

que, mesmo acreditando que somos livres para pensar, o nosso esquema mental encontra-se

impregnado por preconceitos, ou mesmo interesses que não são necessariamente nosso, por

isto, Bourdieu (2002) insiste em demonstrar haver entre os grupos dominados a aceitação

consciente, deliberada e de submissão pré-reflexiva, por isso, o corpo é socialmente modelado

e, no âmbito da biologia ocorreria a naturalização da ideia de dominação masculina.

A discussão feita por Pierre Bourdieu (2002), talvez, encontre sua limitação no fato

de não apontar uma saída para a superação da dominação masculina, especialmente pelo fato

de estar tão amalgamada no inconsciente coletivo.

O problema da dominação masculina, tratado por J. G. Peristiany (1988), em relação

a honra e vergonha nas sociedades mediterrânicas, é retomado por Pierre Bourdieu (1995), ao

tangenciar sua argumentação em torno da “ultramasculinidade mediterrânea”, por

compreender também o quanto as etnografias realizadas por antropólogos junto a

comunidades rurais do mediterrâneo possibilitaram, mesmo na década de 1960, observar a

manutenção de um lastro social baseado do patriarcalismo, trazido e implementado em nossa

sociedade. A prova mais cabal desse modelo nefasto é a narrativa construída por Gilberto

Freyre, em Casa Grande e Senzala (1987), lançado no Recife, em 1933, na condição de ensaio

sobre a “formação da família brasileira sob o regime da economia patriarcal”.

A narrativa freiriana é inconteste, ao menos na condição vivencial da mulher. Sujeito

inferiorizado e retido ao ambiente da casa grande, envolta em panos, com casamento, muitas

das vezes no fim da infância, sujeitas aos arroubos masculinos, e assim detidas aos cuidados

do marido, a obrigação de parir, e nos tempos livres devotas a oração e as prendas do lar,

especialmente a costura e o bordado.

Oposta à condição de mulher branca, a mulher negra, escrava, estava exposta aos

caprichos do seu dono, quando não era ama-de-leite, servia nas cozinhas, na limpeza da casa,

nos eitos de cana de açúcar, na procriação da força de trabalho e, pelo seu talento e arte

mantinha as tradições orais, muitas delas preservadas até os nossos dias, nas comidas e

quitutes, nas danças, músicas e manifestações religiosas, de inegável valor para a diversidade

da nossa cultura.

Obviamente, assemelhar-se à mulher era e sempre foi uma tragédia social, no interior

de uma sociedade em que as famílias esperavam ansiosamente pela chegada do primogênito,

herdeiro e continuador de um sobrenome, por isso, não raro os filhos “afeminados” serem

29

conduzidos aos seminários, e assim assegurava-se também poder junto a Igreja Católica.

Nesse sentido, Mott (2021) reconhece a existência de leis proibindo e punindo o denominado

“vicio dos clérigos”, com ampla narrativa dos casos identificados em seus estudos e, Ronaldo

Vainfas (2010) nos ajuda a compreender como o sexo estava disseminado nos trópicos, apesar

das proibições e punições aplicadas.

Escondia-se ou procurava manter inabalável a estrutura patriarcal, alicerçada na

figura masculina, viril e capaz de levar adiante o projeto de império português, no caso do

Brasil.

2.3 DAS IDEIAS FEMINISTAS, AO DISCURSO DE GÊNERO

Na modernidade, a luta das mulheres por igualdade de gênero remonta as

reivindicações por melhores condições de trabalho e salários, ainda no século XIX, e ao longo

do século XX se estende por uma teia de iniciativas, entre as quais destaca-se as ideias

produzidas por Simone de Beauvoir, especialmente em “O segundo sexo”, publicado em

1949, quando traz uma frase que a imortalizou em seus estudos sobre a condição da mulher,

ou seja, “não se nasce mulher: torna-se mulher” (BEAUVOIR, 1970, p. 9).

O texto de Beauvoir (1970) é um clássico para se compreender a condição feminista.

Não é um livro vinculado a este ou aquele grupo político, corrente de pensamento. É uma

obra original naquilo que se propõe, ou seja, enfrentar a condição feminina, a ponto de

desvelar uma realidade de submissão e negativa de direitos, diante de uma sociedade

machista.

A originalidade de Simone de Beauvoir é o fato de ter trazido o corpo para o centro

das discussões feministas, ou seja, a existência da mulher encontra-se centrada nos

significados sociais atribuídos a seu corpo, ou ainda, é inquestionável como a mulher possui

um corpo envolto em tabus e estereótipos, a ponto de ser utilizado tais discursos para impedir

a igualdade de gênero, especialmente, quando diz ser a mulher incapaz de desempenhar certas

funções. Não possuir condições emocionais para alguns cargos, enfim, utiliza-se da condição

de mulher para negar acesso a cidadania plena.

Simone de Beauvoir deve ser considerada feminista, por trazer ao debate público a

discussão sobre a desigualdade entre homens e mulheres, entretanto, sua contribuição maior é

operar a análise e difundir o discurso a partir de um ambiente exclusivamente masculino até

então e, antecipar a pauta feminista dos anos 1960, ao trazer o corpo em sua dimensão

política.

30

A ideia de “o pessoal é político”, resgatada por Luís Felipe Miguel (2021), para falar

sobre o slogan utilizado pelas feministas na década de 1960, dá o tom do quanto Simone de

Beauvoir constitui a precursora do movimento feminista, mesmo que tenha havido

preocupação menor em relação à teoria política, sua grandiosidade se encontra na discussão

em torno do casamento, sexualidade e trabalho desempenhado por mulheres de classe média,

mesmo porque, Simone de Beauvoir (1970, p. 494) diz que: “[...] A mulher não se define nem

por seus hormônios nem por misteriosos instintos e sim pela maneira por que reassume,

através de consciências estranhas, o seu corpo e sua relação com o mundo [...]”, agora em

condição de reivindicar seus direitos de ser mulher.

Ao resgatar a figura e ideias de Simone de Beauvoir, não devemos esquecer a

contribuição de Mary Wollstonecraft (1759-1797). Escritora, filósofa e defensora dos direitos

das mulheres na Inglaterra; seus escritos e seus relacionamentos compõe o enredo de uma das

precursoras do movimento feminista, dentre os quais se destaca “Uma reinvindicação pelos

direitos da mulher”, publicado em 1792, ao defender a igualdade entre mulheres e homens.

É importante também compreender a existência de uma espécie de contrato sexual,

como aparece nos escritos da filósofa Carole Paterman (1993), enquanto ficção, mesmo

porque o contrato social mantém um silêncio em relação ao contrato sexual e, este deve ser

compreendido como um direito político, mesmo porque, reconhece que: “[...] a nova

sociedade civil criada através do contrato original é uma ordem social patriarcal”

(PATERMAN, 1993, p. 14), por isso reconhece ser a liberdade civil um atributo a indivíduo

do sexo masculino e não um direito universal e, de igual modo só podemos compreender o

domínio público, se compreendermos o domínio privado, em outras palavras: “[...] a diferença

sexual é uma diferença política; a diferença sexual é uma diferença entre liberdade e sujeição

[...]” (PATERMAN, 1993, p. 21) e, o pior é reconhecer a mulher como objeto do contrato, a

ponto de admitir ser possível o estupro no interior do casamento, ou ainda, estarem e não

estarem ao mesmo tempo na esfera civil, pois legislação e Estado civil são partes da estrutura

patriarcal e, o mais grave é enxergar o fato de os homens exigirem à venda na esfera pública

dos corpos femininos para a prostituição.

A reivindicação do corpo por Beauvoir (1970) constitui um ato revolucionário. De

sua produção surge um emaranhado de contribuições acerca do feminino e, não por acaso,

devemos compreender o quanto a reivindicação de um corpo gay, lésbico, travestis, transexual

e outros sinaliza para uma nova configuração do contrato social, em busca das velhas amarras

do patriarcado.

31

Impressiona como Simone de Beauvoir (1970) nos conduz a pensarmos o quanto o

imaginário social nos impõe uma forma de pensar e usar o corpo. No fundo, o conceito de

patriarcado, numa perspectiva estrutural, é a forma como as mulheres são vistas em uma

unidade, um contexto e o sentido social, ou seja, filha, esposa, mãe, avó, se quisermos falar de

papéis assumidos ao longo das diferentes faixas etárias e existência.

O dedilhar da luta feminista descambou numa discussão ainda mais tensa nos debates

públicos, quando se propala as ideias de gênero, pulsada especialmente pela distinção entre

sexo e gênero, presente na obra de Carol Gilligan (1982) e, mais adiante impulsionada pelas

contribuições da filósofa Judith Butler.

As ideias de Beauvoir (1970) sobre a mulher como produto da história e da

sociedade, evidentemente influenciaram publicações feministas e a organização política ao

redor do mundo e, parte das organizações de defesa dos direitos das mulheres receberam

impulso com financiamento da Fundação Ford e da holandesa Netherlands Organisation for

International Development Cooperation (Novib), com institucionalização de grupos e

propostas de trabalho, afirma Moraes (2021).

Evidentemente, devemos compreender a gênese do movimento feminista na segunda

metade do século XIX, numa percepção acerca de uma primeira onda (PINTO, 2010), quando

mulheres inglesas se organizaram para lutar por direitos, a exemplo do voto (as sufragistas),

mas as reivindicações enfrentaram retração durante a Primeira Guerra Mundial e se estendeu

até os anos de 1960.

E, se havia um movimento feminista nas décadas de 1970 e 1980, os debates

ganhariam impulso com a teoria de gênero proposta pela filósofa Judith Butler, em especial

em “Problemas de Gênero: feminismo e subversão da identidade”, publicado em 1990,

quando intentou demonstrar a relação entre a identidade e a ação política do feminismo, ou

seja, as estruturas jurídicas contemporâneas cobram uma identidade estrita a “matriz

heterossexual”, enquanto a “[...] grade de inteligibilidade cultural por meio da qual os corpos,

gêneros e desejos são naturalizados” (BUTLER, 2003, p. 216) e, para alcançar tal percepção,

Butler utiliza o conceito de “contrato heterossexual”, desenvolvido por Monique Wittig

(1992; 2021) e de “heterossexualidade compulsória”, de Adrienne Rich (2010; 2019).

A discussão travada por Butler (2003) nos ajuda a resgatar as ideias presentes na

obra “Criminologia e feminismo”, organizado por Carmen Hein de Campos (1999) e, no

capítulo escrito por Alessandro Baratta (et al. Campos, 1999, p. 43), “O paradigma do

gênero”. O autor constata que: “[...] Estudar a situação da mulher no sistema da justiça

criminal, de modo cientificamente correto, significa afrontar, a um só tempo, a questão

32

feminina e a questão criminal, ambas no contexto de uma teoria da sociedade [...]”, ou seja,

em sua concepção não é mais possível estudar contemporaneamente a questão criminal

desconsiderando as “variáveis gênero”. Para o nosso estudo, este é um ponto singular,

especialmente quando se compreende existir em nossa sociedade o tratamento de abjeto

dispensado aos LGBTI+, pelo fato de destoar da heteronormatividade, ou seja, os sexos

compreendidos pela lógica da reprodução assumiram a condição e complementaridade,

conforme se observa na visão e discurso judaico-cristão (Gen. 1:28; Gen. 2:24).

A cobrança por uma reavaliação dos referenciais de análise da criminalidade e, em

consequência o lugar do gênero nesses esforços interpretativos, implica reconhecermos o

quanto a criminologia crítica passou a questionar o sistema penal, a ponto de trazer a lume a

questão do tratamento dispensado a ricos e pobres, com maior chance dos últimos receberem

o etiquetamento de “criminosos”, ou responsáveis pela violência vivenciada no interior de um

sistema altamente seletivo, por outro lado, a “[...] Criminologia Crítica não incorporou a

crítica feminista ao Direito e à Ciência [...]” e, essa atitude tem reflexo negativo sobre os

grupos marginalizados, a ponto de a autor afirmar que: “[...] a impunidade de práticas como a

violência doméstica, o racismo, o homofobismo, por exemplo, tem traçado, de certa forma,

uma convergência entre estes movimento sociais que procuram buscar, através da

criminalização, o fim ou a punição das condutas discriminatórias” (CAMPOS, 1999, p. 15);

por fim, a referida autora questiona sobre as possibilidade de o sistema penal,

reconhecidamente violador de direitos, poder ou não ser mobilizado para defender os direitos

das mulheres e, no nosso caso, dos LGBTI+.

Alessandro Baratta (1999) traz uma assertiva importante para a compreensão da

relação entre criminologia e a questão do feminismo, ao compreender ter havido uma

mudança considerável em relação à percepção da condição da mulher vítima ou autora de

delito pelo Direito Penal e, tal mudança de ótica coincide também com as preocupações da

criminologia, a iminência de, logo em seguida, ter surgido uma literatura adensada sobre a

temática, especialmente em relação à vitimologia, denotando a sua inserção na questão

criminal, a ponto de surgir um metadiscurso, apesar de o referido autor compreender ser este

fruto de contribuições de Sandra Harding9, ao criticar a ciência androcêntrica e instigar a

criação de uma teoria feminista da consciência, ao buscar demonstrar “[...] como a ciência

moderna, o modelo hegemônico ‘normal’ da consciência científica, baseia-se na oposição

9 Sandra G. Harding, nasceu em 29 de março de 1935, nos Estados Unidos, notabilizou-se como pesquisadora da

teoria feminista, pós-colonialidade. Doutora pela Universidade de Nova Iorque e professora emérita da

Universidade da Califórnia. É uma filósofa de notável contribuição para as questões de gênero.

33

entre sujeito e objeto, entre razão e emoção, entre espírito e corpo [...]” (BARATTA, 1999, p.

20), enfim, o primeiro deverá sempre prevalecer sobre o segundo, por ser qualidade do

masculino, enquanto o feminino é ignorado, salienta o autor.

Deve-se compreender o quanto é importante o resgate da dimensão de gênero nos

estudos de criminologia para redimensionar a noção de distinção entre sexo (biológico) para

gênero (masculino e feminino) construídos socialmente e, o objetivo do movimento

reivindicatório é a emancipação da mulher.

Importa também relembrarmos o pensamento de Frances Olsen, quanto à existência,

desde os séculos XVII e XVIII, na cultura ocidental “[...] de um sistema dicotômico de

conceitos, quais sejam: ativo-passivo, reflexivo-emotivo, competente-sensitivo, poder-

simpatia, objetivo-subjetivo, abstrato-contextualizado, orientado para os princípios-

personalizados [...]” (BARATTA, 1999, p. 26), numa perspectiva hierarquizada e, o autor

ainda reconhece o fato de o Direito Penal ainda se encontrar estruturado em torno de

conceitos masculinos.

A disposição de um código penal focado no modelo de hombridade masculina,

impede um olhar humanizado e capaz de ter afeição para as questões de gênero e, ainda mais

excludente quando se trata de travestis, transexuais e gays, especialmente, porque há uma

prioridade na divisão binária entre homens e mulheres, com papéis definidos socialmente e,

qualquer movimento de rompimento desta ordem é motivo para a rotulagem na condição de

marginal, de descrédito quanto ao caráter, a personalidade, então a tarefa dos estudiosos e

militantes da questão de gênero deverá ser pela desconstrução dos pilares da visão petrificada

de macho no interior do Direito Penal.

Evidentemente, os estudos de criminologia e feminismo têm procurado desconstruir

a ideia de desviante, mas não é possível esquecer o fato de que “o sistema da justiça criminal

é integrativo do sistema de controle social informal [...]” (BARATTA, 1999, p. 49), ou seja,

há um controle pelo patriarcado privado e pela esfera pública e, assim, funciona como

estruturas estruturantes de normalização e reprovação, por isso, Gerlinda Smaus (1998)

compreende ser necessário entender o fato de que a violência contra a mulher deve ser

debatida no interior do Direito Penal, então, de igual modo a questão da violência contra os

LGBTI+ não pode ser diferente, além disso, Alessandro Baratta (1999, p. 51) reconhece que

“[...] as infratoras são tratadas mais severamente que os homens [...]”, quando se encontram

em situação de infratoras.

Então, a condição de infratores está alicerçada em um contexto de Direito Penal

voltado a um controle social, eminentemente seletivo e, por isso devemos buscar em Butler

34

(2003) sua percepção de poder, especialmente, quando resgata tais mecanismos de

funcionamento do poder em Michel Foucault (1994; 1996; 1997) e, o faz com o intuito de

desconstruir a percepção de poder como entidade ou ideia, para associar a prática ou exercício

presentes no cotidiano através de instituições, a exemplo da escola, prisão, fábrica etc.

(FOUCAULT, 1996) e distribuído no interior da sociedade através de uma rede de

micropoderes em articulação com o Estado, ou seja, “[...] O poder não pode ser visto como

um processo global e centralizado de dominação que se exerceria em diversos setores da vida

social, mas sim que funciona como uma rede de dispositivos ou mecanismos que atravessam

toda a sociedade e do qual nada nem ninguém escapa” (DANNER; OLIVEIRA, 2009, p.787).

Com isso há um afastamento da ideia de poder focada na punição, repressão, quando na

realidade o que se visa é alcançar os corpos dóceis e necessários ao funcionamento da

economia (FOUCAULT, 1996), por isso, o filósofo francês insiste tanto na ideia da relação

entre poder e saber e, aqui interessa a Judith Butler (2003), a ideia de identidade feminina, por

compreender como um poder-saber, ou seja, a mulher se torna mulher, como diria Simone de

Beauvoir (1970), a ponto de ser necessário refazer o conceito de feminino, como uma

estratégia política.

É necessário também reconhecer o quanto Judith Butler (2003) procura demonstrar

as implicações ao se pensar o gênero como uma construção cultural e, assim, torna-se

problemático tal conceito, uma vez que buscamos desmistificar os mecanismos de formação

do gênero. Assim, opõe-se à ideia de sexo e gênero como entidades naturais, ou seja, “[...] as

pessoas só se tornam inteligíveis ao adquirir seu gênero em conformidade com padrões

reconhecíveis de inteligibilidade de gênero” (BUTLER, 2003, p. 37), assim, o gênero

necessita de atos, então, o gesto masculino irá definir o gênero e não uma essência natural,

enquanto externalização de substâncias internas e, com isso, “o gênero é a estilização repetida

do corpo, um conjunto de atos repetidos no interior de uma estrutura reguladora altamente

rígida, a qual se cristaliza no tempo para produzir a aparência de uma substância, de uma

classe natural de ser” (BUTLER, 2003, p. 59).

O problema de gênero surge com os corpos discordantes e, gênero original seria

aqueles a repetir a narrativa das instituições sociais sobre o uso do corpo. Aqui aparece a

dimensão do não-lugar, enquanto corpos distorcidos das narrativas e discursos oficiais, mas a

literatura e a ciência estão repletas de sujeitos abjetos, por isso, o fluxo e refluxo de novas

identidades de gênero tendem a desconstruir a ideia de feminino e, consequentemente passam

a cobrar do Estado uma nova leitura sobre os sujeitos e seus corpos, amalgamado em novos

referenciais, equidistantes do patriarcado.

35

Discussão importante, mas ainda se faz necessário abordar os usos do conceito de

homofobia, conforme se observa na digressão efetuada no próximo capítulo.

36

3 HOMOFOBIA, USOS E DESUSOS

A discussão sobre violência, orientação sexual e identidade de gênero constituiu uma

parte do interesse deste estudo em compreender a aplicação do conceito de homofobia para as

mortes violentas de LGBTI+ no Brasil, por isso, iremos prosseguir agora com a análise sobre

os usos e contornos conceituais do termo homofobia. O ponto de partida é a luta pela

cidadania LGBTI+, quando se buscou desde o início da década de 1980 trazer ao debate

público os episódios de mortes de gays e travestis, num primeiro momento e, mais tarde a

lista passou a incorporar lésbicas, bissexuais, travestis e transgêneros.

Nota-se inexistência de referências aos demais segmentos presentes na lista LGBTI+,

em especial intersexo, quer pela ausência de referência nas notas jornalísticas, ou mesmo em

processos judiciais, quando realizei a pesquisa em Sergipe (OLIVEIRA, 2014) e o GGB

(2011) também não traz dados com relação a esta orientação sexual.

É pertinente, ainda, reconhecer a tessitura elaborada em torno da concepção de Luiz

Mott sobre os crimes de ódio, homofobia e racismo LGBTfóbico e, em seguida buscar

compreender a relação entre a pauta do GGB, quanto às mortes violentas e o monitoramento e

denúncias, para então adentrar um capítulo espinhoso de tais pesquisas, quando se encontra

com críticos, a imputar a pecha de “falsa”, para os dados apresentados na condição de vítimas

de homofobia, especialmente em relação a um pesquisa, em particular, desenvolvida por

pesquisadoras da Universidade Federal do Rio de Janeiro e, aqui, esmiuçado.

Cabe também ponderar sobre levantamentos efetuados nos últimos anos acerca de

teses polêmicas desenvolvidas e defendidas em universidades públicas, a exemplo de um

levantamento publicado por Gabriel de Arruda Castro, em 13/06/2017, na Gazeta do Povo,

constituindo apenas uma manchete sensacionalista (“Dez monografias incomuns bancadas

com dinheiro público”) e um relato das peças acadêmicas com título, curso, trecho e autor,

demonstrando no recorte selecionado alusão a justificativa da reprovação para a aplicação de

recurso público, como se a pesquisa científica adquirisse grau de importância somente na área

médica ou tecnológica.

Neste capítulo e no próximo, iremos nos deter aos aspectos intrínsecos ao conceito

de homofobia, em especial a “[...] um conjunto de emoções negativas (aversão, desprezo, ódio

ou medo) em relação às homossexualidades [...]”, quando as notas jornalísticas permitem

notar a “[...] alusão a situações de preconceito, discriminação e violência contra pessoas

LGBT. Passou-se da esfera estritamente individual e psicológica para uma dimensão mais

social e potencialmente mais politizadora [...]”, a ponto de termos a materialização da

37

homofobia como “[...] uma atitude de hostilidade contra as/os homossexuais; portanto,

homens e mulheres [...]” (PRADO, 2010, p. 7, 8 e 13).

É importante também reconhecermos a classificação proposta por Daniel Borrillo

(2010), em relação à homofobia, ou seja, existe em sua concepção a homofobia irracional e

cognitiva, a homofobia geral e específica, a homofobia, sexismo e heterossexismo e, o

racismo, xenofobia, classismo e homofobia. Além disso, reconhece também a homofobia

clínica (séc. XIX), homofobia antropológica (darwinismo social), homofobia liberal

(orientação sexual na condição de escolha), homofobia burocrática (stalinismo) e “holocausto

gay” (Estado Nazista) (OLIVEIRA, 2014), ou ainda, a homofobia internalizada, enquanto

medo da própria sexualidade e, nessa condição pode contribuir para a exposição à violência

(PEREIRA; LEAL, 2002).

Então, o primeiro item deste capítulo, trata sobre a luta pela afirmação homossexual

e, no interior dessa luta surgiu a pauta da denúncia de casos de violência. A proposta inicial

seria de levantamento junto a mídia e com a colaboração de militantes, para ir compondo um

quadro, sem traduzir num panorama efetivo do problema, mesmo porque o preconceito e a

discriminação aos LGBTI+ no início da década de 1980, não constituía um fator a favor de tal

visibilidade, mesmo porque se lidava com um segmento excluído da sociedade e, em disputa

por cidadania. Dessa forma, cobrar do movimento um critério objetivo, passos científicos para

coleta e sistematização, parece até certo ponto ilógico, quando o objetivo sempre foi

promover a denúncia de tais atrocidades.

3.1 DA LUTA PELA “AFIRMAÇÃO HOMOSSEXUAL” E A DENÚNCIA DE

VIOLAÇÃO AOS DIREITOS HUMANOS: A CONSTRUÇÃO DE UM OBJETO DE

PESQUISA

O conceito de homofobia foi incorporado ao discurso do movimento LGBTI+ por

Luiz Mott, em um momento em que, falar de mortes de pessoas desse segmento social

indicava uma relação intrínseca com a aversão à sexualidade da vítima, especialmente quando

se tratava de justificar a ofensa não suportada pelo agressor ao ter a sua honra de “macho”

violada, então, os golpes de faca, as agressões, mutilações etc., estariam ali justificadas.

Reconhecer o contexto de introdução do conceito de homofobia e o quanto se

popularizou a ponto de substituir a percepção de preconceito e discriminação, amplamente

utilizados até pouco tempo.

38

É inegável o quanto existe de relação entre a luta por demonstrar e conquistar a

cidadania LGBTI+, especialmente na década de 1980, quando se passou a vincular a denúncia

de mortes recorrentes de gays e travestis, especialmente, como subproduto de uma cultura

patriarcal, em que o machismo é a sua face mais característica e perversa, ao negar à mulher a

condição de pessoa e, assemelhar-se ou igualar ao feminino é chamar para si a desonra e o

escárnio, na condição de objeto.

A divulgação dos casos de mortes violentas de LGBTI+ no território brasileiro

ajudou a dimensionar o problema. Casos esparsos e discutidos isoladamente tendiam a ser

compreendidos como mortes decorrentes de tentativa de inversão da posição sexual no

momento do coito. Ter levado desconhecido para casa, descuidando da proteção e oferecendo

ao agressor condições para matar, para roubar (latrocínio), ou ainda, ter desqualificado e

provocado a ira do agressor. Seriam algumas das possibilidades para explicar as mortes, a

exemplo do caso do figurinista Gil Brandão, no Rio de Janeiro, em 12 de dezembro de 1983.

Divulgar os casos de mortes violentas de LGBTI+, especialmente por uma militância

homossexual, não era uma atitude esperada pela comunidade em particular e, muito menos,

pela sociedade em geral. Soava como uma forma de reforçar o estigma, a aversão aos gays

(vítimas mais recorrentes naquela época), pois tendia a oferecer argumentos aos segmentos

mais conservadores para reforçar sua reprovação e, no meio gay estaria ali dado munição para

as críticas, quando não ao discurso de que a “bicha” procurou.

O fato é, mesmo operando ações em prol da visibilidade das pautas homossexuais, o

Grupo Gay da Bahia assumiu o protagonismo de construir um itinerário de lutas em prol da

cidadania desse segmento social e, levantar, sistematizar e publicizar tais mortes seria

importante para demonstrar a intolerância como prática corriqueira, por isso, a primeira

edição do Boletim Grupo Gay da Bahia inaugurou a sessão “Violência” e nominou

textualmente se tratar de uma pesquisa intitulada de “Homossexuais assassinados no Brasil”,

dimensionando como um fenômeno social e o fez com uma lista nominal de 20 casos e, no

21º colocou uma interrogação, enquanto sinalização da ausência de tantos outros não

catalogados devido à subnotificação e dificuldades para obtenção de informações.

É possível observar o fato de as vítimas nominadas no Boletim do GGB, n.1, de

agosto de 1981, ter resgatado casos ocorridos a partir de 1969, a começar pelo Padre Antônio

Carneiro van der Linder, morto na cidade do Rio de Janeiro, em 21/9/1969, depois de ter o

crânio esmagado (MOTT, 2011).

Na referida lista, um dado poderia passar despercebido ao pesquisador mais

desatento, a vítima listada no item 15 – Roberto Rocha Leal, foi morto em 29/9/1980, no Rio

39

de Janeiro, a causa da morte seria “injeções de tranquilizante numa clínica psiquiátrica”

(MOTT, 2011, p. 11).

A inclusão do caso de Roberto Rocha Leal faz muito sentido, em 1981, quando havia

a preocupação por considerar a homossexualidade normal e existia uma mobilização por

retirar o parágrafo 302.0 do Código de Saúde do INAMPS, enquanto “desvio e transtorno

sexual”, por assegurar à família a possibilidade de submeter um parente homossexual a

tratamento psiquiátrico compulsório, então, a referida morte sinaliza a preocupação da

militância homossexual com os danos causados com esse tipo de recurso utilizado pela

sociedade para livrar a pessoa de tendências ou práticas sexuais consideradas inadequadas,

erradas ou pecaminosas, a ponto de desonrar a família.

A notícia das mortes estaria sendo uma constante nos demais Boletins e, assim

nascia, talvez, a pesquisa mais longeva na história do Brasil e, mesmo que não seja

considerada científica em sua totalidade por alguns críticos, e mais uma produção do

movimento LGBTI+, não se pode duvidar dos cuidados adotados pelo antropólogo Luiz Mott

em prover de fidedignidade tais dados, mesmo porque na nota publicada no Boletim do GGB,

na edição de n. 1, de agosto de 1981, logo após a lista dos casos, há um longo parágrafo em

que convoca a todos a informar sobre casos de violência e, reconhece a importância dessa

atitude para a liberdade, e conclama a união de todos contra a opressão, numa nítida

referência ao pensamento marxista de unidade para a vitória, conforme aparece no “Manifesto

do Partido Comunista” (MARX; ENGELS, 1990).

3.2 A CONCEPÇÃO MOTIANA DE CRIME DE ÓDIO, HOMOFÓBICO OU HOMICÍDIO

POR RACISMO LGBTFÓBICO

Ao dimensionar a relevância de uma concepção adotada por Luiz Mott, em torno dos

crimes de ódio contra LGBTI+, decorre do fato de sua militância e, em certa medida, estudos

sobre a temática sinalizar a existência de especificidade nesse tipo de violência, a ponto de

questionar o tipo penal, ou seja, deixaríamos de ter um homicídio privilegiado (art. 121, CP)

ou, simplesmente qualificado (art. 121, §2º, CP), para observar aqui uma qualificadora, em

particular por motivo torpe e, mais recentemente, com a adoção do tipo penal – feminicídio

(Lei n. 13.104/2015), ao demonstrar existir, então, como causa do crime a razão da vítima ser

LGBTI+.

Nesse ponto, existe discordância entre doutrinadores quanto à qualificadora, ou seja,

se estamos diante de uma natureza objetiva ou subjetiva. Apesar dessa qualificadora ser de

40

natureza objetiva (NUCCI, 2020), ou seja, não se tratar de uma qualificadora subjetiva, uma

vez assim aplicada violaria o princípio da legalidade, entretanto, Alice Bianchini (2016)

sustenta estarmos diante de uma qualificadora subjetiva, embora reconheça a possibilidade de

incidência de circunstâncias privilegiadoras.

Então, para aplicar tal qualificadora em relação à população LGBTI+ precisamos

encontrar as razões da vítima ter sido morta por ser ou assemelhar-se à mulher, além disso,

não é porque a mulher é vítima de homicídio que estará o fato tipificado no rol do

feminicídio, pois esse relaciona aos casos de mortes por razão de gênero e, aos demais

episódios de mortes violentas de mulheres impõe a tipificação do feminicídio.

A noção motiana de crimes de ódio se constituiu ao longo de quatro décadas.

Inicialmente, a síntese dos casos no Boletim do Grupo Gay da Bahia, ao anunciar a

quantidade de perfurações, mutilações, empalamento, corte de genitália, frases dos homicidas,

dão o tom do quanto o pesquisador e militante anunciava a sua compreensão da manifestação

da reprovação a orientação sexual da vítima e, o mais importante aqui, procurava desconstruir

a reprovação social, visivelmente manifesta nas manchetes sensacionalistas e falas de agentes

públicos, especialmente da política, segurança pública e judiciário.

Mott iria manter e, em certa medida, ampliar sua constatação através da seleção de

casos com manifestação de violência extrema e cruel, espelhada em fotos de cadáveres em

estado de putrefação, mutilados, desconfigurados, relatados e dispostos nos releases à

imprensa ou publicações diversas de sua autoria (MOTT, 1997; 1998; 2001; 2002) ou no

âmbito das campanhas do Grupo Gay da Bahia.

A percepção motiana de crimes de ódio sempre enfrentou vozes discordantes e, não

raro ocorreu de haver manifestação nas entrevistas ou nas publicações escritas, como se

observa na edição 33, do Boletim do Grupo Gay da Bahia, publicado em março 1999, quando

procura responder a autoridades nacionais e internacionais acerca do caráter homofóbico de

tais crimes, pois, em sua concepção: “[...] mesmo quando uma lésbica mata sua companheira,

ou um michê mata um gay, ou ainda um cliente assassina um travesti, o que está subjacente a

tais agressões é a ideologia machista e homofóbica, que desqualifica travestis, lésbicas e gays

como subumanos, criaturas que merecem ser agredidas e assassinadas. ‘Viado tem mais é que

morrer!’, diz o ditado popular repetido de norte a sul do país [...]” (MOTT, 2011, p. 334), ou

seja, o argumento busca recompor o ambiente capaz de justificar a origem da referida

violência.

Mott reconhece existir na sociedade brasileira uma ideia perversa de reprovação à

homoafetividade, advinda da tradição judaico-cristã, quando os textos sagrados dão conta de

41

uma complementariedade entre homem e mulher e, as relações entre pessoas do mesmo sexo

estariam afeitas a abominação (Lev, 20:13), por não ser possível a procriação.

A ideia de machismo utilizada por Luiz Mott pode ser encontrada como parte de uma

tradição muito forte entre os povos mediterrânicos, como se observa nos textos organizados

por J. G. Peristiany (1988), justamente os colonizadores das terras brasileiras e, para cá

afluíram com suas crenças e valores, a ponto de colocar a mulher na condição de abjeto e, por

conseguinte todos os “afeminados” atraem a ira da “inversão” a ponto de serem alvo de

violência.

A leitura e interpretação dos casos, apresentados de forma sistêmica, mesmo que

exista uma subnotificação, como alerta sempre Luiz Mott, o fato é que, o referido pesquisador

reconhece existir “[...] a impunidade e homofobia dentro da polícia e da própria justiça

estimulam a ação violenta dos machistas homofóbicos. Perguntamos nós: porque não se

questiona a especificidade e “ódio” nos crimes tendo as demais minorias como vítimas –

mulheres, negros, índios, menores de rua – questionando-se apenas a falta de ódio dos crimes

contra gays, lésbicas e travestis? Resposta: preconceito anti-homossexual!” (MOTT, 2011, p.

334), ou seja, Mott relaciona o ódio como elemento característico da prática de atos

homofóbicos e, aqui, não restaria dúvida quanto à manifestação do intento do agressor em

provocar o dano ao bem jurídico, vida e, sua motivação (antijuridicidade) cristaliza-se pela

materialização da quantidade de perfurações, mutilações, ou mesmo o escárnio como se

manifesta ao ser perguntado em entrevistas a jornalistas.

O discurso motiano não se alterou ao longo do tempo, ao contrário passou a ser

reforçado com a ideia de manifestação latente das marcas de violência como definidora deste

tipo de crime, a ponto de considerar existir no Brasil uma homofobia sistêmica, como indicou

em uma postagem no Grupo Amigos da Decana, no aplicativo do WhatsApp, em 20 de

setembro de 2021, ao tecer comentários sobre a existência de uma política oficial de repressão

levada a efeito pelos militares, entre 1964 e 1985, conforme sustentada pelo advogado Renan

Honório Quinalha, em sua tese de doutoramento, pelo Instituto de Relações Internacionais, da

Universidade de São Paulo, em 2017, sob o título: “Contra a moral e os bons costumes: A

política sexual da ditadura brasileira (1964-1988)” e, publicada pela Companhia das Letras,

com o título: “Contra a moral e os bons costumes”, em 2021.

A obra de Quinalha (2017; 2021) centra o olhar sobre a repressão deferida pelos

militares nos centros urbanos, apesar de desprezar um fato observado por Luiz Mott, ou seja,

a violência contra LGBTI+ já era fato corriqueiro no Brasil, é tanto que, Febrônio Índio do

Brasil, nosso primeiro condenado por inimputabilidade, praticou seus crimes na década de

42

1920 e, talvez aqui esteja uma limitação da interpretação da postura dos militares em relação a

este segmento social, mesmo porque se havia uma luta contra os “afeminados”, travestis e

despudorados de qualquer ordem, existia na realidade, numa visão motiana, uma luta contra

subversivos, ou seja, pessoas com animus para desestabilizar a ordem instituída.

A tese defendida por Quinalha (2017) parece trazer ao primeiro plano a Operação

Sapatão, Operação Bicha e a Operação Limpeza voltadas especialmente ao combate às

pessoas envolvidas com a prostituição na região central da capital paulista, momento que

coincide com a gestão de Antônio Erasmo Dias, à frente da Secretaria de Segurança Pública

de São Paulo, entre 1974 e 197910, justamente o iniciador das “caça” aos comunistas.

O referido tema voltaria a ser discutido por Luiz Mott, no Grupo Amigos da Decana,

em 26/09/2021, quando fez a seguinte ponderação: “Essa tese de James Green e Renan

Quinalha, que a homofobia foi política de estado da ditadura militar é contestada por

históricos militantes, TREVISAN, MOTT, MIRIAM MARTINHO, LUIZ MORANDO, entre

outros. A homofobia sistêmica persiste antes, durante e depois da ditadura [...]” (MOTT,

2021), pois a interpretação dada aqui é de um esforço concentrado do sistema repressivo em

torno da ideia de comunismo, comunista, ao se buscar reprimir os seus adeptos encarnados na

figura do subversivo, por isso, Mott (2021) reconhece que: “Os milicos perseguiram sim os

subversivos, mas se implicou pouco contra moral e costumes, tanto que o divórcio foi

aprovado no governo Geisel [...]”.

Mott (2021), também, identifica como sendo o período de maior efervescência da

cultura gay, com surgimento de grupos, congressos, boates, saunas e havia ainda menos

homicídios de LGBTI+, assim, reconhece ter existido “homofobia” como política de estado

existiu sim, cruel, em Cuba e outras repúblicas socialistas e, talvez aqui possamos relembrar

atmosfera do final da década de 1970, com os embalos das discotecas nas grandes cidades e

os carnavais de rua.

Quinalha (2017) talvez tenha generalizado a orientação adotada no âmbito da

Delegacia Seccional Centro, em São Paulo, em relação aos gays, travestis e lésbicas e,

desconsiderou as práticas policiais no restante do país, especialmente em cidades menores, a

exemplo de Aracaju ou mesmo Lagarto, ambas no Estado de Sergipe, as quais vivenciavam

práticas homoafetivas ainda marcadas pelos ditames do preconceito e discriminação de uma

10 Coronel reformado do Exército, com licenciatura em História pela Universidade de São Paulo (USP) e

bacharelado em Direito pela Universidade da Guanabara. Destacou-se por ser um dos fundadores da Arena

(partido situacionista durante o Regime Militar) e um dos primeiros a organizar a caça aos comunistas, em 1968.

A sua passagem à frente da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo (SSP/SP) ocorreu em três momentos:

02/04/1974 a 06/05/1978, 22/11/1978 a 01/02/1979 e 03/03/1979 a 15/03/1979.

43

sociedade provinciana e patriarcal, então, perseguição, prisões e violência policial não foi

registrada, mesmo porque na minha infância era perceptível a existência de gays e lésbicas em

nosso convívio, as saídas para casas de amigos, o mal estar depois das festas, ou ainda os

comentários dos meus pais acerca do relacionamento de alguns parentes da capital que

apareciam acompanhados de amigos e/ou amigas.

A chacota ocorria, bem como as piadas, especialmente para aqueles com mais

trejeitos ou assumidamente gay ou lésbica, na figura de “das flores” e “Maria Homem”

(OLIVEIRA, 2014). Os relacionamentos existiam e, muitos deles entre pessoas de todas as

classes sociais, apesar de haver o cuidado para evitar comentários ou se posicionar

socialmente, pois não era de interesse de um professor levantar bandeira da causa

homossexual.

Mott (2021) associa a vivência gay nos anos de 1970 à convivência com o Regime

Militar, enquanto perseguição cruel à esquerda, com episódios de extermínio, em

contraposição, não havia uma propaganda oficial contra a sexualidade discordante, mesmo

porque as boates gays estiveram abertas e com fluxo intenso de frequentadores, sem

mencionar os banheiros públicos, além de pegação em praias e praças públicas, então, o

problema aqui não parece ser de subversão, mas de transgressão, conforme discuti na minha

tese de doutorado (OLIVEIRA, 2014).

A perseguição policial toma os espaços de prostituição e pegação LGBTI+ nas

décadas de 1980 e 1990. É o momento de afloramento da luta contra a aids, uma presença

maior de travestis nos passeios públicos e, consequentemente a imprensa começa a relatar

episódios policiais e, na percepção de Mott (2021), a repressão a travestis estaria ligada a

ideia de combate à prostituição no centro das cidades.

Mott (2021) reconhece um fato importante em relação ao modus operandi dos

militares, entre 1964-1985, ou seja, os homens de farda não se importavam com a

sexualidade, o importante para eles seria a obediência à ordem estabelecida, ao regime

imposto e, parece ser esta a análise mais plausível, mesmo porque as operações policiais e

inquéritos em São Paulo assemelha mais a uma tentativa de “limpeza” da região central da

capital paulista, além disso, Lula concedeu entrevista ao Jornal Lampião da Esquina e, chegou

a afirmar a inexistência de homossexuais no movimento operário brasileiro, demonstrando o

quanto a sua visão encontrava-se aliada as ideias socialistas de homossexualidade com

degradação da sociedade burguesa.

A discussão sobre a relação entre LGBT e o Estado, entre 1964 e 1985, passa ainda

pelo fato de compreendermos existir no Brasil um conservadorismo arraigado, a ponto de a

44

campanha de Jânio Quadros ter sido marcada por um discurso moralizante e, o fato de ter

ficado apenas sete meses no cargo de Presidente da República, não o impediu de fincar um ato

marcadamente afeito a demonstrar sua visão tacanha em relação ao corpo feminino e, assim,

11 de agosto de 1961, assinou o Decreto n. 51.182, proibindo o uso de biquíni em concursos

de beleza, por considerá-lo indecente, e a Polícia de Costume estaria encarregada de adotar as

medidas cabíveis.

É imperioso também reconhecer a aplicação do artigo 59, da Lei de Contravenções

Penais (Decreto Lei nº 3.688 de 03 de outubro de 1941), sobre crime de vadiagem. Matéria

discutida e aprovada o fim da referida pena pela Câmara dos Deputados através do Projeto de

Lei n. 4.668/04, de autoria do ex-ministro da Justiça José Eduardo Cardozo. O projeto

aprovado foi remetido ao Senado Federal, agora na condição de Projeto de Lei n. 1212, de

2021, e aguarda votação pelo Plenário.

O importante aqui é entender como a vadiagem serviu de instrumento para a ação da

Polícia de Costume, ou competentes para atuar no combate às contravenções penais e, não

raro reprimiam a prostituição, por considerar uma ofensa a moral e aos bons costumes,

ensejando uma ofensa à honra e à dignidade da família brasileira. Atuava também na

repressão aos vadios, falsos mendigos, embriagados, por infringir o art. 59, do Decreto Lei n.

3.688/41 e, não raro atuava também no combate às religiões de matriz africana, conforme

analisa Vilson Caetano de Sousa Júnior (2018). Em Salvador, a referida unidade policial

recebia o nome de Delegacia de Jogos e Costumes.

Luiz Mott e Aroldo Assunção (1987), ao narrarem as mutilações feitas no próprio

corpo pelas travestis no momento da iminência de serem detidas ou em situação de cárcere, na

Delegacia de Jogos e Costumes de Salvador, oferecem uma oportunidade para

compreendermos e, em certa medida dimensionarmos a relação de marginalização das

travestis e, nunca de subversão. O sistema estava ali preocupado com a degradação da moral,

da honra e dignidade da família soteropolitana. O mais grave é saber da existência do

jornalista José Augusto Berbert, colunista de cinema do jornal A Tarde, o mais importante

jornal baiano, especialmente nas décadas de 1980 e 1990, propalar em sua coluna arroubos

contra os gays e, Mott figuraria como persona non grata, a ponto de ser desqualificado ou

quando não destilava e instigava o ódio.

A crueldade materializada nos corpos das vítimas de ódio aparece nas crônicas

policiais, nos comentários de jornalistas, a exemplo de José Augusto Berbert, ou nas palavras

de políticos e religiosos, formando um imenso caldo, num caldeirão sempre em ebulição, quer

nas prisões noticiadas com ardor pelo repórter, a sentir prazer em realçar o malfeito, com nota

45

ilustrada com a imagem do agressor ou da vítima, para demonstrar estar recebendo no corpo o

pagamento pelo rompimento da norma social.

Enfrentar a sociedade, e conceder entrevista ou mesmo participar de programas de

rádio e televisão não parece ter sido tarefa fácil para Luiz Mott, ao longo de quatro décadas.

Em parte, pela necessidade de encontrar argumentos plausíveis para desconstruir a visão

arraigada de descrédito da pessoa LGBTI+, e por outro lado, aferir credibilidade em uma

cidadania, nem sempre fácil de visualizar para pessoas à margem da sociedade.

E, talvez o argumento mais difícil para desconstruir tenha sido as passagens bíblicas

de reprovação às práticas homoeróticas.

Em 2019, recebi uma ligação de Mott. Era cedo, pela manhã e caminhava em direção

ao Centro Universitário AGES. No outro lado da linha, um pesquisador sagaz e ávido por

explicar-me sobre a sua concepção de crimes de ódio envolvendo LGBTI+ e, em sua

concepção deveríamos observar detalhes que pudessem apontar a uma homofobia estrutural.

A ideia de resgatar o conceito de racismo estrutural parecia servir mais um motivo

para os críticos do trabalho de monitoramento das mortes violentas pelo GGB, com o firme

propósito de desqualificá-lo, apesar disso, com o julgamento da Ação Direta de

Inconstitucionalidade por Omissão – ADO 26, proposta pelo Partido Popular Socialista (PPS),

de relatoria do Ministro Celso de Mello e, julgada pelo Plenário em 13/06/2019, com

publicação de acórdão em 6/10/2019, e assim equiparou-se o crime de homofobia ao racismo,

com previsão na Lei n. 7.716/89.

Ao buscar relacionar os crimes homofóbicos ao racismo estrutural, Mott aproxima

das ideias trazidas por Silvio Luiz de Almeida (2018), especialmente quando procura

desconstruir o racismo como uma patologia social ou pessoal (intelectual, mental, caráter) e, o

mais grave “[...] o racismo constitui as relações no seu padrão de normalidade [...], ou seja, o

racismo é uma forma de normalidade. É uma forma de normalização, de compreensão das

relações. O racismo ele constitui, não só as ações conscientes, mas também aquela posição

que a gente chama de inconsciente [...]” (ALMEIDA, 2021), enfim, o pesquisador alerta para

o fato de o racismo constituir uma forma de estrutura social e, nesse ponto há possibilidade de

se verificar como a discriminação e o preconceito aos LGBTI+ pode nos ajudar a explicar as

mortes violentas.

Então, Luiz Mott estava certo ao propor uma leitura das mortes violentas de LGBTI+

com fulcro no racismo estrutural, apesar disso, recentemente emanou uma análise sobre a

equiparação dos crimes de homofobia ao de feminicídio, numa perspicácia própria dos

operadores do Direito, com adaptação efetuada a partir do “Protocolo para investigar,

46

processar e julgar as mortes violentas de mulheres (feminicídios) com perspectivas de gênero

no Estado do Paraná” (SECRETARIA DA JUSTIÇA, FAMÍLIA E TRABALHO DO

PARANÁ et al., 2021).

A proposta desenhada por Luiz Mott (2021) visa tipificar os casos de mortes por

homofobia, a qualificadora feminicídio (art. 121, §2º, inciso VI, CP), por compreender existir

todos os elementos subjetivos do animus do agente, ao praticar o crime motivado pelo ódio ou

aversão à condição de orientação sexual ou gênero.

É pertinente considerar o fato de em caso de morte de transexual ser perfeitamente

possível o emprego de tal tipificação, para qualificar o crime e assim agravar a pena, como se

verifica desde a promulgação da Lei n. 13.104, de 9 de março de 2015, quando a qualificadora

feminicídio foi incluída no rol dos crimes do §2º, do art. 121, do Código Penal, ao prever uma

pena de 12 a 30 anos de reclusão11, pelo fato de ter cometido o crime “contra a mulher por

razões da condição de sexo feminino”.

Em 2016, o Ministério Público de São Paulo ofereceu a primeira denúncia de

feminicídio envolvendo a morte de uma transexual. A narrativa apontava Luiz Henrique

Marcondes dos Santos, conhecido pelo codinome de “Flaquelou”, como autor da agressão que

vitimou Michele, com quem convivia há dez anos. A morte decorreu de asfixia e facada no

pescoço e, para encobrir o crime, enterrou o corpo próximo à casa, onde residiam, na Rua

Piruba, n. 1.059, Chácara Bandeirantes, na cidade de São Paulo12.

A percepção sobre crimes contra transexuais, tipificados como feminicídio, seria

registrada pela primeira vez em 2019, quando a Delegacia de Praia Grande, no litoral paulista,

registrou o Boletim de Ocorrência referente a morte da cabeleireira Raiane Marques, 36 anos

(ACAYABA; ARCOVERDE, 2021).

11 A Lei 13.964/2019, sancionada em 24 de dezembro de 2019, alterou o tempo de cumprimento das penas

privativas de liberdade que antes não podiam passar de 30 anos, agora podem alcançar 40 anos. 12 No Acórdão do Recurso em Sentido Estrito: SER 0001798-78.2016.8.26.0052 SP 0001798-78.2016.8.26.0052

contas o seguinte trecho do depoimento acostado aos autos: “O réu, na fase administrativa, confirmou a

ocorrência do delito. Salientou que viveu com “Michele” por cerca de 10 anos. No dia do ocorrido, no horário do

almoço, começou a ingerir bebida alcoólica na companhia da vítima. Por volta das 20h00, a vítima discutiu com

o réu em virtude de ciúmes, afirmando que ele a traía. Na sequência, Michele pegou uma faca de cozinha e partiu

para cima do réu, que conseguiu segurar o braço dela e desarmá-la. Michele acabou se desequilibrando, já que

possuía uma deficiência física e foi ao solo. Caiu por cima dela e a faca que estava em sua mão acabou atingindo

o pescoço de Michele. Retirou a faca do pescoço da vítima e desferiu novo golpe no pescoço dela. Após a morte

da ofendida, com medo de ser linchado, resolveu enterrar o corpo de Michele. Por volta das 22h00, quando a rua

já estava deserta, colocou a vítima no ombro e carregou-a até um terreno baldio, próximo ao local dos fatos, e

enterrou o corpo dela. A seguir, retornou para sua casa, lavou o sangue do chão e de suas roupas. No dia

seguinte, jogou no lixo todos os pertences de Michele. Para todos que perguntavam sobre a vítima, informava

que ela havia se mudado para Osasco. Quando encontraram o corpo de Michele, fugiu com medo de ser

linchado. Asseverou que não queria matar Michele, mas apenas visava se defender (fls. 143/146). Em Juízo,

quedou-se silente (mídia).” (JUSBRASIL, 2021).

47

É pertinente, também, reconhecer a aplicação da referida interpretação do tipo penal

feminicídio, para as mortes de transexuais, em outras unidades da Federação, a exemplo da

condenação do réu Francisco das Chagas Rodrigues de Souza13, acusado pela morte de sua

companheira Flávia de Oliveira, 34 anos, em 15 de novembro de 2018, em Fortaleza (CE). O

corpo foi encontrado em avançado estado de putrefação, no mesmo imóvel onde residia e

mantinha um salão de cabeleireiro, com marcas de 17 golpes de faca. A 3ª Vara do Júri de

Fortaleza o considerou culpado pela morte, e a Justiça, em 30/10/2019, o sentenciou a 16 anos

de reclusão, inicialmente em regime fechado (COMPANHEIRO..., 2021).

Em 10 de junho de 2021, o Conselho de Sentença do Tribunal do Júri da Barra

Funda, em São Paulo, por maioria considerou Jonatas Araújo dos Santos, culpado pela morte

da manicure Larissa Rodrigues dos Santos, 21, morta a pauladas em 04 de maio de 2019, por

ter se recusado a fazer um programa sexual. A juíza Fernanda Salvador Veiga sentenciou o

réu a 16 anos, nove meses e 18 dias de reclusão em regime fechado, pelo crime de

feminicídio. A família reclamou da pena aplicada, por considerar injusta diante da crueldade

cometida (MENDONÇA, 2021)

A ideia motiana é de se verificar na cena do crime, no modus operandi o animus do

agressor a ponto de relacionar com a condição de ser mulher, mas aqui estaríamos diante de

um impasse em relação à população LGBTI+, ou seja, aplica-se com relativa pertinência as

transexuais por terem constituído uma identidade no feminino e, também, a mortes

relacionadas às lésbicas, apesar de os gays não receberem o mesmo tratamento, mesmo

porque não seria adequado associarmos a ideia de passivo sexual, por exemplo.

É uma ponderação necessária, especialmente quando se ler a denúncia elaborada pelo

Ministério Público de São Paulo, para justificar a tipificação no crime de Michele, ao

reconhecer a necessidade da norma penal feminicídio ainda requerer complementação, apesar

de associar o crime a violência doméstica baseada na condição de gênero e, o fato de serem

companheiro e coabitarem estaria caracterizada a tipificação e, mesmo que inexista na lei a

expressão gênero, mas “sexo feminino”, o Parquet reconhece existir entre os doutrinadores, a

exemplo de Valéria Diez Scarance (2015) e Maria Berenice Dias (2007), o entendimento

acerca da possibilidade de as transexuais serem vítimas de crimes de feminicídio

(MINISTÉRIO PÚBLICO DE SÃO PAULO, 2021).

Na concepção de Luiz Mott, os crimes homofóbicos devem ser interpretados de

forma analógica com os mesmos critérios que o feminicídio, e, assim, recebam tratamento

13 Ver Processo n. 0179669-41.2018.8.06.0001 – TJCE.

48

isonômico. Apesar de reconhecer que nem todos os crimes dessa natureza são movidos por

fatores homofóbicos, embora tragam em sua compreensão o fato de haver em nossa cultura

uma violência intrínseca à discriminação por razões de orientação sexual e papel de gênero.

A ideia motiana é fundada em alguns marcadores sociais arraigados em nossa

cultura, ao associar aos LGBTI+ a fragilidade, subordinação, delicadeza, feminilidade,

frescura, marginalidade entre outros sinônimos e, ainda se deve pensar que tais percepções

estão alicerçadas em uma cultura machista, de pensamento da superioridade do macho

heterossexual e, assim, este sistema de crença levaria o agressor a pensar que pode eliminar as

pessoas com comportamento e sexualidade destoante da heteronormatividade, e assim

preservaria a ordem social.

É imperioso observar traços diferenciados em relação à explicação do crime, em uma

sociedade como a norte-americana, quando se busca obter do agressor seus pensamentos, ao

praticar determinado ato e, como a política, o Ministério Público e o judiciário brasileiro

reconstroem a cena do crime, e o ato do agressor e vítima, enfim, não é sempre possível

verificar tal perspectiva na seara penal brasileira, quando o intuito é verificar materialidade e

autoria do crime, então, aspectos subjetivos são pouco valorizados. Por isso, talvez a proposta

de Mott, em insistir na necessidade de preservação da cena do crime, trabalho técnico de

investigação (criminalística e médico-legal), pode fornecer pistas importantes sobre a conduta

criminosa, além do cuidado para evitar a perda de indícios essenciais para a elucidação do

crime. E, aqui há uma orientação importante, considerar desde o início das investigações a

orientação da vítima, quando da formulação da hipótese das motivações do crime.

As ponderações de Luiz Mott se revestem de cuidados essenciais para se alcançar a

elucidação do crime, mesmo porque nos 40 anos de pesquisa de mortes violentas de LGBTI+

no Brasil, compreendeu o quanto somos carentes de recursos técnicos para assegurar uma

apuração policial isenta de arroubos e descuidos, a ponto de inviabilizar a elucidação. O

problema foi denunciado em uma série do Jornal da Globo, em 2014, quando buscou

demonstrar as condições que levam à impunidade em nosso país (CONFIRA..., 2021).

3.3 O CONCEITO DE HOMOFOBIA E A ADO 26

O Mandado de Injunção impetrado no Supremo Tribunal Federal pela Associação

Brasileira de Gays, Lésbicas e Transgêneros (ABGLT), e a Ação Direta de

Inconstitucionalidade por Omissão (ADO), pelo Partido Popular Socialista (PPS), apresentava

o seguinte objetivo:

49

[...] obter a criminalização específica de todas as formas de homofobia e transfobia,

especialmente (mas não exclusivamente) das ofensas (individuais e coletivas), dos

homicídios, das agressões e discriminações motivadas pela orientação sexual e/ou

identidade de gênero, real ou suposta, da vítima (BARROSO, 2019, p. 5).

A finalidade para impetrar os dois pedidos junto ao STF era obter a equiparação da

homofobia e da transfobia ao crime de racismo (art. 5º, XLII, CF/88), ou ainda,

subsidiariamente, na condição de discriminações atentatórias aos direitos e liberdades

fundamentais (art. 5, XLI, CF/88), então, esperava a declaração da demora do Congresso

Nacional em criminalizar as condutas de ódio e/ou aversão ao segmento LGBTI+, tanto em

relação a discursos de ódio, quanto a atos homofóbicos.

Ao presente estudo importa compreender a recepção da referida ação pelo STF e,

como os Ministros se posicionaram em relação à percepção acerca do racismo, ao adotar a Lei

n. 7.716/89 como parâmetro para a leitura dos crimes de homofobia.

É pertinente considerar a intencionalidade de punir não apenas a manifestação dos

discursos de ódio, uma vez constatado casos de homicídios, induzimento ao preconceito e à

discriminação em relação à orientação sexual ou identidade de gênero. Dessa forma, busca-se

aqui analisar a tipificação reconhecida pelo STF, apesar das críticas acerca do ativismo

jurídico da referida Corte.

O Plenário do STF, em 13 de junho de 2019, formou maioria para declarar a omissão

do Congresso Nacional em não promover o debate e edição de lei criminalizando a homofobia

e a transfobia. O Ministro Celso de Mello, relator da ADO 26 e MI 4733, em sua tese foi

acompanhado por 8 ministros e três contrários.

Em síntese, a tese do Ministro Celso de Mello assenta-se em três pontos: 1) enquanto

perdurar a omissão do Congresso Nacional na edição de lei tipificando condutas homofóbicas

e transfóbicas, deve-se aplicar os crimes previstos na Lei n. 7.716/89 e, em caso de homicídio,

deve-se observar as circunstâncias qualificadora para motivo torpe (art. 121, §2º, inciso I,

CP); 2) a entendimento neste julgamento não atinge o exercício da liberdade religiosa, desde

que não configure discurso de ódio; e, 3) o conceito de racismo não deve ser visualizado

apenas aos aspectos biológicos ou fenotípicos, ou seja, deve-se compreender como uma

negação da dignidade humana de grupos considerados vulneráveis.

Aceita as teses do Ministro Celso de Mello, resta entendermos como se observa ou

materializa tal proteção legal no combate ao preconceito e à discriminação e, uma vez

cometido um homicídio, visto ser o nosso objeto de estudo, o alcance e efetividade desta

tipificação, pois se a intenção seria agravar a pena, conseguiu-se qualificá-la, em um tipo

50

penal, enquanto desestímulo à prática criminosa. Mas, a Associação Nacional de Juristas

Evangélicos (ANAJURE) emitiu uma Nota Pública, datada de 11 de fevereiro de 2019,

evidentemente com uma série de argumentos para justificar seu entendimento quanto a

improcedência do pedido da ADO 26 e, em certa altura chega a tecer comentário, para

justificar as razões da inaptidão do Direito Penal em dissuadir o agressor com tipificação

penal, especialmente quando se visualiza os altos índices de criminalidade e reincidência

(ANAJURE, 2021).

O art. 1º, da Lei n. 7.716/89 prevê a punição para “os crimes resultantes de

discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional” e, no art.

20 considera, também, crime os indivíduos que: “praticar, induzir ou incitar a discriminação

ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional”.

A decisão também se aplica a lesão corporal e, uma decisão importante foi tomada

pela 3ª Turma Criminal do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, no SER 2018 07 1 001953-

0, ao decidir por unanimidade a aplicação da tentativa de feminicídio para agressões sofridas

por mulheres transexuais, em um caso ocorrido em Taguatinga, quando os agressores

provocaram lesões corporais graves (TJDFT, 2021).

Em síntese, o desenho dado pelo STF em relação aos crimes de homofobia encontra-

se relacionado ao ódio ou ao discurso a pessoa LGBTI+, então, a maior dificuldade será

tipificar tais atos apenas e tão somente pela materialidade de tais aspectos, e desconsiderar o

fato de a vítima pertencer a orientação sexual ou identidade de gênero, por existir aqui um

esforço maior para localizar no ato deferido contra a vítima uma intencionalidade de diminuí-

la, menosprezá-la e a agressão sinalizaria, então, a força empreendida para negá-la, mas como

fazer isto em relação a muitos dos crimes em que há relação com drogas, motivos torpe?

Conforme discuti em minha tese de doutorado (OLIVEIRA, 2014).

É, justamente, tais indagações alvo da análise desenvolvida no próximo capítulo.

51

4 MORTES VIOLENTAS DE LGBTI+ NO BRASIL: HOMOFOBIA OU

MULTICAUSAS?

As críticas dispensadas a compreensão do Grupo Gay da Bahia (GGB), em relação às

mortes violentas de LGBTI+ no Brasil, como demonstração de atos homofóbicos, impõem

aqui uma tentativa de compreensão do referido objeto de disputa política da militância, agora

no campo científico.

O fato de haver crítica não constitui problema, nem mesmo sinaliza se estamos certos

ou errados, assim, talvez, o maior problema das implicâncias jurídicas atrelada ao debate

tenha sido em decorrência da forma como foi conduzido o debate. Por um lado, a pesquisa

científica se desenvolve por tentativas e erros, e a disputa no campo dos movimentos sociais

se dá por embate desenvolvido em torno do processo de mobilização e engajamento14, sempre

permeado por pautas, por isso, ver o movimento defender a ideia de existência de atos

reiterados de homofobia e assim cobrar do Estado e da sociedade uma postura contundente de

respeito às diferenças, pode sinalizar o endurecimento do discurso e a tentativa de comprovar

tal situação através das notas jornalísticas, sistematizadas e divulgadas anualmente em

relatórios.

Conscientes da árdua tarefa de contribuir com o debate, este capítulo busca analisar

os dados coletados pelo GGB e pela Acontece Arte e Política LGBTI+, em 2020. A ideia é

aplicar o conceito de homofobia, conforme trabalhado anteriormente aqui neste estudo, e

provocar a discussão sobre a pertinência ou não de tal categorização, ou ainda, uma vez

verificado tais casos, a possibilidade da tipificação na categoria dos crimes de feminicídio.

Evidentemente, a categoria feminicídio envolve a condição de gênero feminino,

então, os gays estariam de fora dessa tipificação?

A resposta a tal indagação encontra sua raiz no mesmo problema do uso da categoria

homofobia, especialmente quando se inclui todas as mortes de LGBTI+ na condição de

mortes por ódio (crime torpe) e, ao confrontar os relatos trazidos pelas notas jornalísticas e de

outros meios digitais, nem sempre é possível considerar ter havido a demonstração de aversão

a orientação sexual ou a identidade de gênero.

O desafio agora é desvelar as polifonias do ódio, ou demonstrar o quanto a violência

é multicausal. Cuidado necessário para entender as narrativas dos eventos publicados sobre

14 A pesquisadora Maria da Glória Gohn (1997) oferece importantes insights acerca da dinâmica dos

movimentos sociais, especialmente em relação ao processo de mobilização e engajamento.

52

tais mortes e, por outro lado, o alcance da tipificação feminicídio para as mortes violentas de

LGBTI+ no Brasil, em 2020.

4.1 MONITORAMENTO DAS MORTES DE LGBTI+ PELO GGB OU A “FARSA” DE

UMA TRAGÉDIA

Os dados de mortes violentas de LGBTI+ organizados e divulgados pelo Grupo Gay

da Bahia (GGB) têm sido alvo de questionamentos, quer em relação à pesquisa ou a

contabilização dos casos na categoria de homofobia, e, entre os críticos da pesquisa estão o

biólogo Eli Vieira, o jornalista Dinamarco (Dario Pompeu Di Martino Junior), o

administrador do blog “Quem a homofobia não matou hoje”, atual “Quem? Números”

(https://quemnumeros.com/), Daniel Reynaldo e, mais recentemente, o jornalista Reinaldo

Azevedo que também escreveu em seu blog junto a Revista Veja, um texto ensinando aos

leitores como deveria dissecar uma notícia ou como ler uma falsa estatística, e tomou como

objeto o Relatório das Mortes Violentas de LGBTI+ no Brasil, produzido pelo GGB, em 2008

(AZEVEDO, 2021)15.

Reinado Azevedo (2021) reconhece o fato de o GGB ser a instituição que localiza e

sistematiza os dados de violência contra a população LGBTI+ no Brasil, além de conhecer a

inexistência de dados oficiais e que, tal estatística advém de notas jornalísticas.

O jornalista e blogueiro apresenta a seus leitores uma síntese dos dados apontados

pelo Relatório do GGB, com intuito de distinguir os pontos mais frágeis, assim, adotou os

dados disponibilizados em 2008.

A primeira indagação é sobre o quantitativo de casos e, em sua análise, a estatística

apresentada está errada. Primeiro, devido a inexistência de percentual de LGBTI+ no Brasil e,

o número em sua concepção não seria relevante se comparado ao conjunto da população

heterossexual, apesar do GGB (HOMOSSEXUAIS DENUNCIAM..., 2021) sustentar que

10% da população brasileira é homossexual.

E, ao tecer comentário sobre as notas jornalísticas acerca da temática, questiona

quanto são “[...] míopes, coxos, diabéticos, deprimidos? [...]” (AZEVEDO, 2021), e com isso

deixa transparecer a incompreensão da natureza do objeto denunciado pelo GGB, enfim,

busca construir uma crítica apegando-se a pontos irrelevantes do debate, mesmo porque, o

jornalista atenta para causas diretas, quando Mott e o GGB apontam também para a

15 O texto de Reinaldo Azevedo foi publicado em 2009 e atualizado em 2020, demonstrando assim, a atualidade

do tema, a ponto de o jornalista e blogueiro ter retornado ao tema.

53

homofobia estrutural, no sentido consolidado pelo STF no julgamento da ADO 26, ou seja, há

de fato uma forma de manifestar a violência que é própria de uma reprovação social quanto a

pessoa LGBTI+.

O jornalista também se limita a igualar nas conjecturas feitas pelo GGB, ao apontar o

Brasil como o país mais homofóbico do Mundo, quando se trata de crimes violentos contra

LGBTI+ e, Reinaldo Azevedo (2021) procura demonstrar ser uma “fábula” tal narrativa,

apesar de o site Remembering Our Dead (Rememorando nossos mortos -

https://tdor.translivesmatter.info/reports) divulgar cotidianamente mortes de transexuais em

diferentes países e, neste monitoramento as vítimas de solo brasileiro são muito superior aos

demais casos identificados nas outras nações.

Soa também preconceituoso o fato de questionar os riscos agravados de uma travesti

ser vítima de homicídio, mais que um gay e, talvez Reinaldo Azevedo deveria ler os últimos

relatórios da Associação Nacional de Travestis (Antra) e tentado entender as razões de tal

brutal aumento de casos envolvendo a violência letal contra este segmento social, a ponto de,

em 2020, figurar com um número de casos maior em relação aos gays (BENEVIDES;

NOGUEIRA, 2021).

Limita-se a retrucar o fato de Pernambuco ter figurado à época como o Estado mais

violento para a população LBGTI+ e, de igual modo também era para a população em geral e

aqui Reinaldo Azevedo não viu nenhuma importância, a ponto de questionar, no item seguinte

se a polícia deveria fazer a proteção individual daqueles que saem em busca de sexo

ocasional, mas a impressão deixada pelo jornalista ao negar qualquer importância às

estatísticas produzidas pelo GGB, ou mesmo negando-as, a ponto de conclamar a existência

de matemáticos gays no Brasil, que, em sua concepção é bem superior ao número de mortos,

para ajudar a instituição a produzir um relatório de melhor qualidade, pois as 190 vítimas não

parecem significar muito em sua concepção sobre violência, uma vez que o país possui um

número de homicídios superior a 50 mil/ano.

A crítica de Azevedo carece de alguns ajustes. Primeiro, os movimentos sociais

sempre foram carentes de recursos e, manter uma estatística não parece ser algo fácil de

operar e, os dados divulgados de mortes de LGBTI+ não sinalizam para uma informação

definitiva, mas um indício a ser verificado, numa espécie de grito de alerta, ou seja, uma pauta

política.

Na atualidade, uma crítica mais contundente ou de maior relevância no emaranhado

de vozes discordantes em relação à produção de estatísticas de mortes violentas de LGBTI+

no Brasil é de Jair Messias Bolsonaro, por ocupar a Presidência da República e, em uma de

54

suas manifestações acerca do tema, chegou a demonstrar desdém com as referidas estatísticas

ao afirmar que: “Você não tem que ter uma política pra isso. Isso não pode continuar

existindo. Tudo é coitadismo, coitado do negro, coitada da mulher, coitado do gay, coitado do

nordestino, coitado do piauiense” (MARINI, 2021) e, sua postura também é seguida por

Olavo de Carvalho, em um artigo publicado no Blog (https://olavodecarvalho.org/tag/gays/) é

possível localizar textos contrários à afirmação LGBTI+, por considerar que os gays vivem

em um sociedade segura e, a aprovação de lei anti-homofobia seria uma forma de assegurar

aos gays um instrumento de manipulação do poder, ou seja, “[...] a lei dita “anti-homofóbica”

dará à militância gay um poder repressivo e intimidatório praticamente ilimitado,

transformando-a num temível instrumento de chantagem nas mãos de seus mentores e aliados

no governo federal e nos partidos de esquerda” (CARVALHO, 2021).

Demonstrado haver críticas no meio jornalístico, político, não poderíamos deixar de

observar também no meio científico e, aqui, aparece então Eli Vieira et al. (2021) que

disponibiliza uma checagem feita em parceria com outros pesquisadores em um site na

internet (https://lihs.org.br/sociedade/homofobia/), com o intuito de divulgar a ideia sobre a

falsidade das estatísticas de mortes de LGBTI+ no Brasil, produzidas pelo GGB.

A crítica de Eli Vieira e seus colaboradores também reconhece a inexistência de

dados oficiais sobre casos de homofobia no Brasil e, os dados disponibilizados, especialmente

pelo GGB decorre de um esforço de sistematização a partir da clipagem de notícias e,

diferente de Reinaldo Azevedo, o trabalho aqui se deteve aos dados referentes a 2016.

Entre as constatações feitas por Eli Vieira para demonstrar a ausência de rigor

científico e, o mais grave para o seu grupo de pesquisadores é a inclusão de 30 casos de

mortes de LGBTI+ brasileiros ocorridos no exterior, ou ainda casos duplicados e inclusão de

vítimas sem a devida checagem para verificar se, se tratava mesmo de uma pessoa LGBTI+,

além de questionar a inclusão de casos de suicídios e acidentes automobilísticos, enfim,

episódios sem qualquer relação ao fator homofobia.

O argumento utilizado para desprender o motivo do suicídio, não há como relacionar

com a homofobia, tornando insustentável o argumento do ponto de vista científico, por não

oferecer nenhum suporte teórico plausível, apenas indicar não ser correto correlacionar, pois a

maior parte dos casos de suicídio estaria ligada a depressão e, nessa condição faltaria estudos

para comprovar a relação, enfim, parece haver aqui uma crítica assentada na superficialidade

e em ponto de vista, sem definição clara de referenciais plausíveis para contestar a produção a

qual visa desqualificar.

55

Os esforços de Eli Vieira et al. (2021) para desmascarar a argumentação apresentada

pelo GGB, também, deixa transparecer inconsistência e, entre os problemas encontra-se a

ausência de uma definição esclarecedora sobre a percepção acerca da homofobia nos casos

estudados, por isto, sua crítica a ideia de homofobia estrutural, como sendo o lastro que

levaria o GGB a explicar a inclusão de todos os casos, até mesmo de um casal de lésbica

envolvida com o tráfico e morta quando circulava em uma moto, não parece ser suficiente

para esconder a sua preocupação com a visibilidade obtida pela pesquisa do GGB.

A concepção de homofobia para Eli Vieira et al. (2021) encontra-se assentada na

ideia de crime de ódio do FBI, ou seja, “contra uma pessoa ou sua propriedade motivado em

todo ou em parte pelos vieses do infrator contra uma raça, religião, deficiência, orientação

sexual, etnicidade, gênero ou identidade de gênero” e, ao término do texto de análise há frases

dúbias, ao apontar ser necessário as pessoas buscarem a liberdade, haver combate ao

preconceito, apesar de certa melancolia ao falar em “inflar dados”, como se apontasse na

direção de não se publicizar ou tocar neste assunto, enquanto medida mais adequada para lidar

com a situação, enfim, defendem que o Estado apure os crimes e puna os criminosos,

independente da sexualidade da vítima.

O jornalista Dinamarco (Dario Pompeu Di Martino Junior), talvez, teve um esforço

maior ao escrever o livro, intitulado: “A farsa dos crimes homofóbicos no Brasil” (2021), com

o propósito de demonstrar ser irrelevante as mortes de LGBTI+ no Brasil e assim mostrar a

verdade sobre os dados e, afirma não ser contra gays. Em sua concepção, a ideia de Luiz Mott

sobre os crimes, enquanto produto de um contexto cultural, institucional e histórico, devem

ser considerados “fantasiosos e forçados”.

Dinamarco (2021) atribui as mortes de gays a outros gays, apesar de não oferecer

nenhum argumento plausível, além de retrucar a inclusão de casos de suicídio, como aparece

na leitura de Eli Vieira et al. (2021).

É visível uma demonstração de ódio e/ou rancor por parte dos críticos do trabalho

desenvolvido pelo GGB referente às mortes de LGBTI+ no Brasil e, em relação à Dinamarco

(2021) aparece com mais intensidade, apesar de não oferecer argumentos plausíveis para o

leitor deduzir a sua ideia de homofobia e como identificar um caso dessa natureza. Além de

demonstrar incompreensão em relação ao segmento, sem que aqui estejamos a defender o

lugar de fala (RIBEIRO, 2017) e, para não deixar dúvida da sua linha de raciocínio de que os

gays estariam matando gays, há um capítulo intitulado: “MORTES "GAY MATA GAY" e,

por fim, traz o rol dos “CRIMES REALMENTE HOMOFÓBICOS”.

56

Em 2017, o biólogo Daniel Barbosa Reynaldo, funcionário da Prefeitura Municipal

do Rio de Janeiro, criou a página na web intitulada: “Quem a homofobia não matou hoje”, em

contraposição a página “Quem a homofobia matou hoje” (desativada), com o propósito de

desmistificar os dados fornecidos pelo GGB, mas suas críticas provocaram reação das

pesquisadoras da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Maria Clara Dias, Suane

Felipe Soares e Milena Cristina Carneiro Peres, responsáveis por uma pesquisa sobre

lesbocídio (2018) e, em matéria publicado pelo site PONTE, a pesquisadora Maria Clara

denuncia o referido biólogo, ao afirmar que: “[...] o site é “um espaço de ódio, racista e

homofóbico” e não deveria estar no ar” (VASCONCELOS, 2021), entretanto, a animosidade

não se restringiu ao debate no site, ainda tramita na Justiça processo movido pelas

pesquisadora e, o acusado conta a história em cinco episódios, sendo o primeiro disponível no

seguinte endereço: https://quemnumeros.com/2020/02/23/lesbocidio-a-fraude-da-ufrj-parte-1-

2/.

As posições expostas aqui não devem ser desconsideradas. Podem sinalizar

homofobia internalizada, como também podem ajudar ao GGB a aperfeiçoar sua metodologia

e construir coletivamente um protocolo de pesquisa mais ajustado aos propósitos visados, ou

seja, denunciar os casos de mortes violentas de LGBTI+ eivados de ódio e, ter um número

reduzido ou residual, em relação ao total apurado durante um ano, não irá desmerecer a sua

luta e suas reivindicações, mesmo porque não é o quantitativo que deverá ser utilizado como

parâmetro para justificar ações efetivas do Estado em prol de um segmento em situação de

vulnerabilidade social.

O questionamento de Daniel Barbosa Reynaldo quanto a cientificidade dos dados

dispostos no “Dossiê sobre lesbocídio no Brasil: de 2014 até 2017” (PERES et al., 2018) não

deveria ter sido suficiente para um processo judicial, com pedido de retirada de página do

Facebook (Quem a homofobia não matou hoje), mesmo porque o esforço de pesquisa é pelo

debate, e o mais amplo possível, pois o esforço não é para satisfação de ego ou promoção

pessoal, mesmo porque a disputa e o debate em curso parece ter tomado rumos não

científicos, com posições de pessoas de esquerda e direta, quando o foco deve ser uma

percepção o mais próxima da realidade das mortes violentas e, o quanto há de homofobia, ou

não, nesses eventos.

No fundo, o debate propiciado por esses embates imprimiu mais cuidado junto ao

GGB, quando se questiona e procura esclarecer a inclusão de um dado, ou como opera para

alcançar o resultado apresentado ao publicar um novo relatório e, aqui cabe um parêntese, nos

últimos anos não houve nenhum aporte de recurso público ou privado para a pesquisa e

57

publicação dos dados e, se há dados divulgados é fruto do empenho de abnegados voluntários

da causa LGBTI+, ademais Luiz Mott e o GGB, também, deveriam explicar como as

estatísticas foram infladas entre 2010 e 2019, ao incluir casos de suicídio, atropelamento e

mortes no exterior.

Talvez o maior desafio deste estudo esteja por vir agora, quando passaremos a

discutir os casos de mortes violentas registradas pelo GGB, em 2020, e para alcançarmos um

grau de cientificidade, iremos operar a análise dos casos a luz de uma percepção que favoreça

compreender que, a homofobia se manifesta de forma direta através de relatos sobre o modus

operandi do agressor em relação à vítima, quando difere múltiplas perfurações, esquarteja,

corta a genitália, empala, escreve frase em parede com o sangue da vítima e, de igual modo o

simples fato de a vítima ser LGBTI+ não significa ter sido alvo de ataques homofóbicos,

então, tais crimes podem encontrar respostas em causas diversas, apontadas atualmente como

explicações para o fenômeno de violência e criminalidade, ou problema de segurança pública.

Ao trabalhar aqui com o conceito de homofobia direta e, deixar em suspenso os

possíveis casos de homofobia estrutural, é uma sinalização do quanto é difícil, por exemplo,

para um operador da segurança pública apontar inicialmente, em uma cena de crime que, o

simples fato da vítima ser um LGBTI+ estaria ali uma vítima da homofobia, pois não parece

razoável tecermos tal análise aqui sem um aprofundamento maior acerca do conceito de

homofobia estrutural e suas formas de manifestação, assim, no próximo item encontra-se

aplicado o conceito de homofobia, justamente em relação aos casos de mortes violentas de

LGBTI+ no Brasil, em 2020.

4.2 AS MORTES VIOLENTAS DE LGBTI+ NO BRASIL, EM 2020, MANIFESTAÇÃO

DA HOMOFOBIA?

O relatório do Observatório de Mortes LGBTI+ no Brasil - 2020, produzido pelo

Grupo Gay da Bahia e Acontece Arte e Política LGBTI+ (MOTT et al., 2021) dá conta de

247 episódios desta natureza, entretanto, os organizadores reconhecem a existência de

subnotificação16 e, em pesquisa recente encontramos mais dez casos17. Por isso, estamos

considerando aqui o quantitativo de 257 ocorrências (Tabela 2).

16 Mott et al. (2021, p. 10) justifica a subnotificação da seguinte forma: “[...] Apesar da redução quantitativa,

ressalta-se que não existem motivos reais e factíveis para se comemorar, a redução no número de mortes

motivadas pela LGBTIfobia não se deu pelo incentivo do Estado na promoção de políticas públicas de inclusão e

proteção, mas sim, por uma oscilação numérica e pela enorme subnotificação identificada durante as buscas,

pesquisas e registros”.

58

E, o fato de ter participado da coleta e sistematização dos dados, especialmente em

um ano atípico, convivendo com isolamento social, e o quanto isso nos afetou

emocionalmente, a ponto de termos reduzido o nosso empenho diário no monitoramento dos

casos, pode ter impactado na identificação de episódios dessa natureza.

Apesar dos percalços de um itinerário de pesquisa, das atribulações da vida cotidiano

do pesquisador, o fato é o quanto tais crimes compõem uma polifonia do ódio, ou como a

militância LGBTI+ pode ter feito equivocadamente a leitura das mortes, a ponto de encaixá-

las totalmente apenas em uma categoria, ou seja, crimes de homofobia.

A tabela 1 busca categorizar os 257 casos em tipos penais, apesar de nem todos

configurarem crime (nem mesmo culposo – art. 18, inciso II, CP), quando se observa a

informação de casos de afogamento acidental e morte natural (0,39%) e, nesta condição não

deveriam compor a lista de mortes e, atropelamento pode ou não ter relação com episódio de

ódio.

Tabela 1 – Tipificação das mortes violentas de LGBTI+ no Brasil, em 2020

Tipificação Quant. %

Afogamento 1 0,39

Morte Natural 1 0,39

Atropelamento 2 0,78

Silicone Industrial 2 0,78

Suicídio 23 8,94

Latrocínio 15 5,83

Homicídio 213 82,89

Total 257 100

Fonte: Elaboração do autor, 2021.

É plenamente difícil a compreensão acerca da inclusão de um caso de afogamento

(0,39%) no cômputo dos dados de mortes violentas de LGBTI+. A explicação dada para este

imbróglio de pesquisa decorre da ausência de critérios mais rígidos a respeito da inclusão dos

casos. Pois, o fato de Allyson Cardoso Santos, 25, ter se afogado na praia de Bertioga, litoral

paulista, em 10 de outubro de 2020 (ORTIZ, 2021), quando veraneava com o companheiro,

foi incluído como forma de registro por se tratar de uma pessoa gay, mas, ao término da

pesquisa, e considerando a inexistência de prova contrária às informações veiculadas, não

justifica a manutenção das mortes violentas, uma vez comprovada a condição de acidente para

a provocação do óbito.

17 Alfredo Dias de Castro Neto, 48, assassinado no dia 02/09/2020, no município de Sorriso, em Mato Grosso,

vendedor de açaí, morto a facadas em casa depois de uma relação sexual (AGUIAR, 2021.)

59

E, a mesma situação se repete com Isabelle Oliveira, técnica de enfermagem

encontrada morta pelos colegas, em 14 de fevereiro de 2020, com diagnóstico preliminar de

infarto (morte natural) (TÉCNICA..., 2021), então, dada a ausência de informação posterior

sobre indícios de violência, ela deveria ter sido retirada da lista.

Cabe um estudo mais detalhado dos dois atropelamentos de travestis incluídos na

lista de mortes violentas de LGBTI+ no Brasil, em 2020. O primeiro registro é de uma travesti

espancada e atropelada, em Taubaté (SP), em 21/05/2020 (TRAVESTI..., 2021) e, o segundo,

referente a Rayssa, nas margens da BR 101, em Umbaúba (SE), em 29/09/2020 (ATRAES,

2021). Cuidado necessário para se verificar a motivação e, cabe uma observação, ou seja, por

não considerarmos aqui a homofobia estrutural, possivelmente o ódio às travestis e

transexuais possa passar inalterado a nossa análise, quanto aos casos de homofobia.

Outro tipo de violência identificado no levantamento do GGB é a morte decorrente

de aplicação de silicone industrial, com duas ocorrências (0,78%) e, tal prática pode ser

tipificada como homicídio doloso, com dolo eventual (culpa consciente), quando o agente não

tem a intenção de matar, mas sabe dos riscos, como ocorreu no tribunal goiano, ao impor a

um cabeleireiro uma ação penal por dolo eventual (DOLO..., 2021).

Luiz Mott organizou a cartilha: “Silicone: redução de danos para travestis” (2002),

com o intuito de ampliar o debate sobre os riscos à saúde, em relação a aplicação de silicone

industrial e as consequências penais, ao alertar sobre a possibilidade da “bombadeira”

responder por lesão corporal de natureza grave (art. 129, CP) e, em caso de morte, a pena é de

reclusão de quatro a doze anos.

De igual modo, a leitura e compreensão de casos de suicídio podem também ter

relação ou não com situações de homofobias, sem desconsiderar diante de um fato envolto em

tabu e angústia por parte dos familiares e amigos, a ponto de a motivação ser de difícil acesso

ou escassa, mesmo porque muitos destes casos estão relacionados a um adoecimento psíquico,

agravado por quadros de depressão, perdas e isolamentos. Além disso, ao cruzarmos os casos

de suicídios (8,94%) e homofobia (5 %), é compreensível estarmos diante de tipo penal,

motivo de difícil elucidação e evidência dos fatores motivadores, por isso, classificar as

mortes violentas de LGBTI+ no Brasil não é fácil e a generalização tende a criar resistências

em diferentes segmentos da sociedade, não apenas entre indivíduos de tendência conservadora

e contrária a defesa de direitos deste segmento social.

O crime de induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio ou a automutilação, com

redação dada pela Lei n. 13.968, de 2019, é o tipo penal previsto no art. 122, do Código Penal

(Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940), entretanto, nas notas de eventos dessa

60

natureza, não há nenhuma menção a pessoa afeita ao induzimento. A característica mais

premente é a ausência de relatos mais esclarecedores do contexto produtor do ato.

O Observatório Trans ao relatar um caso de suicídio em Pau dos Ferros (RN),

ocorrido em 4 de janeiro de 2020, informou que: “Murilo Gonçalves, homem trans de Pau dos

Ferros interior do Rio Grande do Norte, tirou sua própria vida por conta da crescente onda de

preconceito que vivenciava em ambiente familiar” (SUICÍDIO..., 2021).

O fato do Observatório Trans creditar a morte a “onda de preconceito” vivenciada no

âmbito familiar e, nas 21 notas acerca deste tipo de evento na página da referida pesquisa, não

dá para alcançar a mesma percepção, entretanto Corrêa et al.(2020), ao buscarem

compreender sobre o “Pensamento suicida entre a população transgênero: um estudo

epidemiológico”, oferecem, ao que parece, uma melhor exposição do tema, especialmente

quando compreendem existir uma relação direta entre a transfobia e a saúde mental, enquanto

decorrência da privação de direitos e, os desdobramentos tende a ser a exposição a índices

elevados de discriminação social, a ponto de serem vítimas de uma gama de tipos de

violência, por isso, considera que: “[...] Há uma conexão direta entre suicídio e saúde mental

precária, particularmente doença mental. O suicídio e a automutilação são problemas graves

entre minorias sexuais e tendem a ser determinados por um ambiente homofóbico e

transfóbico, vários antecedentes da má saúde mental e fatores como o desemprego e dívidas,

no contexto de um prolongado declínio econômico” (CORRÊA et al., 2020, p. 14).

O problema aqui é como responsabilizar alguém da família pelo suicídio de pessoa

LGBTI+, em especial em relação ao animus do sujeito criminoso, pois o princípio da

legalidade impõe limite ao poder de punir do Estado, apesar disso, Jorge Figueiredo Dias

(2002) reconhece que, o princípio da legalidade (Nullum crimen, nulla paena sine lege),

mesmo impondo objetividade à lei penal, ainda assim, permite ao julgador alguma

possibilidade para a discricionariedade quando procede a aplicação da norma, menos em

relação a aplicação da analogia. Portanto, veda-se a aplicação da analogia para suprimir

lacunas existentes na lei, ou seja, não se admite preencher as lacunas deixadas pelo legislador

através de processos de equiparação. Pode, ao contrário, utilizar a analogia in bonam partem,

ou seja, dispor da lei para beneficiar o réu. Entretanto, o mesmo Dias diz que: “[...] aceita-se,

pelo contrário, que praticamente todos os conceitos utilizados na lei são suscetíveis e carentes

de interpretação: não apenas os conceitos ‘normativos’, mas mesmo aqueles que à primeira

vista se diria caracterizadamente ‘descritivos’ e por isso apreensíveis através dos sentidos

[...]” (DIAS, 2007, p. 187-188), assim, em relação à interpretação analógica, assume aqui a

possibilidade de beneficiar e prejudicar o réu, desde que a lei permita, mas no caso de suicídio

61

a lei é enfática ao trazer o verbo “induzir”, ou seja, a ação precisa estar materializada nas

ações do sujeito que conduz o outro ao cometimento do suicídio, não nos parece aqui ser fácil

tecer tal associação a reprovação familiar ou mesmo a violência verbal.

Um exemplo possível de aplicação da interpretação analógica é em relação ao

feminicídio (art. 121, §2º, inciso VI), pois a primeira acepção do vocábulo alude a pessoa do

sexo feminino, vítima de morte em decorrência da sua condição de gênero, quer seja pelo

menosprezo ou tentativa de diminuição/aniquilamento, então, tal conceituação pode ser

aplicado analogicamente a pessoa transexual, em especial aos sujeitos com identidade

feminina, a exemplo dos casos citados no capítulo 2.

Cabe ser tratado aqui o episódio da morte de Brenda - mulher indígena trans,

moradora da região do Barra do Garças, no leste de Mato Grosso e, pertencente ao povo Boe

Bororo. Impressiona neste caso, o fato de estarmos diante de um suicídio de uma LBGTI+

indígena (ANTONINI, 2021).

É importante considerar o fato de não termos aqui aprofundado a questão dos

suicídios, especialmente em relação à percepção enquanto problema de saúde pública, as

campanhas de prevenção, a exemplo do “Setembro Amarelo”18, ou ainda, como a militância

LGBTI+ busca demonstrar a relação entre preconceito e discriminação e a pulsão de morte.

Outro aspecto a ser considerado em relação às mortes de LGBTI+ é a recorrência de

casos de latrocínio (roubo com resultado morte). Tipificação amplamente divulgada nas

matérias jornalísticas e, o próprio animus do agente criminoso não deixa dúvidas de sua

intenção, por isso infringe o art. 157, §3º, II, com reclusão de 20 a 30 anos e multa (incluído

pela Lei n. 13.645, de 2018).

O crime de roubo encontra-se previsto no art. 157, do Código Penal, então, deve-se

compreender roubo como “subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave

ameaça ou violência à pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à

impossibilidade de resistência”, caput do referido artigo. Logo, o latrocínio deve ser

compreendido como roubo qualificado, configurado com o emprego de violência ou grave

ameaça para materializar o roubo e o resultado é a morte, então estamos diante de um crime

contra o patrimônio e não contra a vida.

O roubo resultado morte (latrocínio), em relação aos gays, parece existir uma relação

de causalidade com as vulnerabilidades de alguns indivíduos desse segmento da orientação

sexual quanto a necessidade de manter encontros fortuitos com desconhecidos, para relação

18 É uma estratégia de prevenção ao suicídio desenvolvida pela Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), em

parceria com o Conselho Federal de Medicina (CFM), desde 2014.

62

sexual e, uma vez permitida a entrada desses em suas residências terminam por criar as

condições para o desencadeamento da violência, quer pela cobiça, enquanto interesse

despertado ao visualizar bens e objetos de fácil subtração e, esta percepção não é nossa, mas

já se encontra a mais de duas décadas no Manual de Sobrevivência Homossexual19, produzido

e divulgado pelo Grupo Gay da Bahia (STYCER, 2021; DHNET, 2021).

É uma interpretação hipotética, apesar dos relatos das notas jornalísticas darem conta

de a vítima ter levado alguém para o interior de seu domicílio, então, o que impulsiona uma

pessoa a desconsiderar todos os alertas dados pelo Grupo Gay da Bahia (GGB)20?

A resposta mais provável pode ser encontrada na dinâmica da relação entre a

sexualidade da vítima, família e sociedade. Pessoas amedrontadas pelo fantasma da

reprovação da homossexualidade e, a saída mais provável é vivenciar uma sexualidade na

clandestinidade, com exposição ao risco de ser alvo de extorsão, assalto e morte.

Viver à margem da sociedade cobra um preço alto. O maior desafio é manter em

silêncio a sexualidade, por medo da reprovação social, ao mesmo tempo em que se expõe ao

risco para apascentar os desejos sexuais e, na concepção dos gays vítimas de homicídios, tem-

se a impressão de haver um cuidado para esconder de parentes, amigos, vizinhos e colegas de

trabalho seus parceiros sexuais ocasionais, numa pretensa visão de haver uma separação

rígida entre o mundo da auto imagem heterossexual e os subterfúgios para escamotear as

práticas sexuais (raramente afetivas).

A interpretação acima deve ser visualizada como uma hipótese possível à explicação

da recorrência de casos de latrocínio (5,83%), em 2020, em relação às mortes violentas de

LGBTI+, no Brasil, sendo que, destas, 80% são de gays e 20 % de travestis e mulheres trans.

Entretanto, a explicação da relação direta entre medo de expor a sexualidade e assim submeter

a relações fortuitas com estranhos no interior do domicílio não se sustenta diante das

narrativas presentes nas notas jornalísticas, especialmente quando se observa, por exemplo, o

caso da morte do influencer cearense Denis Pires do Nascimento, 25, morto em 04/01/2020,

em Fortaleza, quando o agressor o ameaçou com arma de fogo para subtrair o celular. A

vítima estava em um campo de futebol, reagiu e foi morta (DHPP..., 2021).

O caso de Denis Pires do Nascimento implica em reconhecermos não haver nenhum

indício de ligação entre sexualidade da vítima e a causa da morte. Entretanto, existe aqui uma

19 É justamente a regra n. 1, ou seja, “Evite levar desconhecidos ou garotos de programa para casa. Prefira fazer

programas em hotéis, motéis e saunas” (DHNET, 2021). 20 A mais de quarenta anos, ao afirmar em cartilha que “Gay vivo, não dorme com o inimigo” (GGB, 2000).

63

manifestação da criminalidade, recorrente nos últimos anos nos centros urbanos,

especialmente com roubo de aparelho celular e, em muitos casos com resultado morte.

E, nem sempre a manchete ou nota jornalística coaduna com os fatos tratados em

sede de ação penal. Isto pode ser visto no caso da morte do Professor José Valcimar

Rodrigues de Souza (Lulinha), 47, vitimado com um golpe de pia de banheiro na cabeça, por

Danixon Cristo Nunes, 19, que responde ao Processo n. 0000096-89.2020.8.04.5801, pelo

crime de latrocínio e corrupção de menores (Art. 157, §3º, inc. II do Código Penal e art. 244-

B da Lei 8.069/1990), quando subtraiu uma moto, na cidade de Maués (AM) (MAUÉS,

2021). A nota jornalística narrou o fato de ter se defendido da vítima depois de uma investida

para ter relação sexual, ao mesmo tempo o Delegado afirmou ser prática da vítima pagar por

programa sexual ao suposto agressor (LIMA, 2021), enquanto a defesa buscou desclassificar

o crime para homicídio em concurso material21, com furto subsequente, conforme previsão

nos arts. 69, 70 e 71, do Código Penal e, o Magistrado expediu a seguinte sentença: “Assim,

torno definitiva a pena aplicada ao réu pelo crime de roubo qualificado pela morte (latrocínio)

em vinte anos de reclusão e dez dias-multa, os quais fixo em 1/30 do salário-mínimo vigente à

época do crime, pois não há informações sobre a força econômica do réu.” (MAUÉS, 2021, p.

105).

Outro caso de latrocínio, também, ocorreu em Manaus, no dia 15 de janeiro de 2020,

quando a polícia registrou a morte por asfixia do professor Antônio Genivaldo Lira Lacerda,

47, diretor de uma escola municipal de Manaus. Consta a prisão de Ewerton Rodrigo Pinto

dos Santos, o “Loirinho” (Processo nº 0604691-22.2020.8.04.0001 – TJAM) e Felipe

Mendonça Glória, 25 (Processo nº 0609570-72.2020.8.04.0001 – TJAM). O corpo foi

encontrado em uma cova rasa no quintal da residência e o carro em outro bairro da cidade, nas

proximidades do domicílio de “loirinho” (POLÍCIA..., 2021), assim, não resta dúvida quanto

a tipicidade da morte, ensejando a aplicação do art. 157, §3º, II, CP, enquanto há um silêncio

quanto o motivo do crime, então, tal episódio deveria figurar na condição de limbo22, na

pesquisa divulgada pelo GGB.

21 No relatório do Magistrado há a seguinte referência a tese de defesa, vejamos “[...] A defesa, por sua vez,

pediu a alteração da tipificação, sustentando que teria havido, em tese, homicídio. Apontou que em nenhum

momento o acusado teve a intenção de subtrair bens da vítima, e que, pelo fato de não ter havido desmonte da

motocicleta, conclui-se que não houve nenhuma motivação patrimonial. Ainda, pela eventualidade, se fosse

reconhecido o dolo de subtrair, este teria sido posterior, o que resultaria em um crime de homicídio em concurso

material com um furto subsequente (item 152.1). Vieram os autos conclusos para sentença. É o relatório [...]

(MAUÉS, 2021, p. 103). 22 O GGB passou a incluir na categoria “Limbo”, os casos com indícios de vítimas de crimes de homofóbicos,

mas escassas informações comprobatórias.

64

Francisco Gleison de Sousa, 24, influencer de codinome Pirangay, foi asfixiado em

20/01/2020, na residência de um amigo, após levarem dois adolescentes para comer uma

pizza e, depois de irem aos quartos para manterem relação sexual, ocorreu um

desentendimento, então os adolescentes decidiram matá-los. O amigo ficou desacordado,

enquanto Pirangay evoluiu para o óbito. Os adolescentes evadiram do local levando os

celulares das vítimas e deixaram uma porção de cocaína, além disso, a reportagem traz a

informação de o Delegado ter descartado a homofobia como motivação do crime (DIGITAL,

2021).

As informações sobre a morte de Rogério Correia dos Santos, 37, representante

comercial, encontrado com os pés e mãos amarrados, em sua residência no Conjunto

Tiradentes, Zona Norte da capital sergipana, em 30/01/2020, impactou o imaginário da

comunidade LGBTI+ aracajuana e, mais adiante a Polícia Civil apreendeu um adolescente,

17, e um comparsa, 18, responsáveis por terem adentrado a residência com a permissão da

vítima, com o intuito de manterem relação sexual. Em depoimento, os agressores relataram

terem bebido e usado drogas na casa da vítima e, em seguida, o agrediram e o enforcaram

(asfixia), e mesmo com a violência perpetrada, ainda o amarraram com um fio de ferro de

passar e, somente depois subtraíram uma moto e objeto (ADOLESCENTE..., 2021).

O episódio da morte de Rogério Correia dos Santos ilustra a ausência de maiores

cuidados ao convidar desconhecidos a sua residência, independente do horário de ingresso

deles no domicílio, além de ser acompanhado por um adolescente, ato também reprovável na

sociedade.

No extremo norte do país, em Caracaraí, município de Roraima, em 22/02/2020,

registrou a morte do professor e diretor de escola municipal, Rafael Pinheiro, 29, vítima de

pauladas. A polícia identificou e o Ministério Público ofereceu denúncia em desfavor de

Felipe Sena da Conceição, 21, e de José Diego Martins de Souza, 35 anos. O crime teve início

quando um dos acusados atraiu a vítima para uma proposta de relação sexual e, antes de

consumar o ato, deferiu os golpes com o propósito de obter a moto e o celular (TRIO...,

2021).

Outro episódio, também tipificado na condição de latrocínio ocorreu no dia

17/03/2020, em Manaus (AM), quando a polícia registrou a morte de Carlos César Ferreira,

49, vítima de quatro facadas. O corpo foi encontrado pelo namorado, depois de retornar do

trabalho, por volta das 17h, ao ser surpreendido com a porta aberta e o corpo caído embaixo

da pia. A suspeita seria dele ter sido vítima de uma pessoa em situação de rua. Notou-se a

subtração de um celular e o televisor foi localizado no quintal (HOMOSSEXUAL, 2021).

65

Em matéria publicada no site de A Crítica, em 20/03/2021, a reportagem informava

sobre a prisão de Ozias Reis Aleixo, 33, de codinome “Osga”, como responsável pela morte

de Carlos César Ferreira e, o Delegado, à época, apontava como causa do crime um

desentendimento entre vítima e agressor (NOGUEIRA, 2021), entretanto, o crime foi

qualificado como ato Contra a vida/Homicídio Qualificado, conforme consta no Processo nº

0639375-70.2020.8.04.0001e, em tramitação no Fórum Henoch Reis da Comarca de Manaus

(AM), então, os indícios levaram a autoridade policial e, possivelmente o Ministério Público a

desclassificar o crime de latrocínio por homicídio qualificado.

É inegável ter havido um episódio de latrocínio em relação à morte de Cássio

Rogério Gonçalves, 34, bancário, encontrado despido, com 16 perfurações de faca e degolado

em cima da cama, em sua residência, em Várzea Grande (MT), em 11/04/2020. Os vizinhos

sentiram sua ausência e, ao irem à sua procura o avistaram pela janela do quarto em óbito. A

casa em construção, sem portão, demonstrava ter havido algum encontro anterior regado a

bebidas, devido a quantidade de garrafas arrumadas na lateral do imóvel. A crueldade em

nada indicaria se tratar de ter sido praticado por dois jovens, um de 18 (Jonny Pereira de

Oliveira), outro de 17 anos, ambos afeitos a rotina da casa por estarem se relacionando

sexualmente com a vítima e, depois do crime subtraíram televisores, caixa de som, celulares e

roupas. Os irmãos assumiram a autoria do crime e informaram ter ido cobrar uma dívida e, a

morte teria decorrido de um desentendimento (RAMIRES, 2021; TEIXEIRA, 2021).

Em 27/04/2020, a Polícia de Francisco Morato (SP) registrou a morte de Nathasha

Ferreira Lobato, Mulher Transexual, 30, profissional do Sexo, na condição de vítima de roubo

resultado morte. Constatação pouco vaga se assegurar tal tipificação penal, uma vez que não

foram encontradas informações processuais sobre o caso (SENA et al., 2021). Dificuldade

facilmente sanada se houvesse por parte do movimento LGBTI+ uma proposta de

monitoramento além das notas jornalísticas, como se observa no trabalho desenvolvido por

Sergipe (OLIVEIRA, 2014).

É inegável a inconsistência quanto à classificação do crime perpetrado contra uma

travesti de 56 anos, encontrada em cima da cama, amordaçada, com sangramento no nariz, e

rigidez cadavérica, 10 de maio de 2020, em Juiz de Fora (MG) (ZMATANOTÍCIAS, 2021).

É quase impossível tipificar como latrocínio.

Eliedson Vinícius Marcelino de Menezes, 39, arquiteto, vítima de latrocínio, com

morte provocada por facadas, em 20/05/2020, em Natal (RN). A Polícia identificou um

jovem, 18, e um adolescente, 14, como responsáveis pelo crime. Os jovens alegaram ter sido

convidados pela vítima para irem lanchar, e momentos antes da relação sexual, ocorreu uma

66

discussão sobre o valor a ser pago pelo programa; após consumar a morte, fugiram com o

carro da vítima (BARBOSA, 2021).

Outra profissional do sexo, também vítima de latrocínio foi Marlan Reis Sousa

(Paulinha), travesti, profissional do sexo, em Anápolis (GO), em 13/06/2020. O agressor

utilizou arma de fogo e, uma testemunha informou ter o agressor chegado em um veículo e

anunciado o assalto e, com a negativa da vítima em entregar os bens pretendidos, teria

ocorrido a morte, com nítida manifestação de roubo resultado morte (art. 157, §3º, II, CP)

(IDENTIFICADA..., 2021), mas sem manifestação do motivo torpe – homofobia, por não

haver associação possível.

A ausência de associação direta não implica inexistência de fatores pouco

perceptíveis para correlacionar à orientação sexual e ao gênero, mas isso parece pouco

provável ser sustentável em um debate público entre movimento social e os desqualificadores

da metodologia empregada pelo GGB na tipificação das mortes violentas de LGBTI+ no

Brasil.

A morte violenta de Ari da Silva, 52, vítima de estrangulamento, na cidade de

Atibaia (SP), em 19/09/2020, considerada como um caso de latrocínio pela Polícia, deixou um

sentimento de revolta e ausência na comunidade, diante da agressão cometida. O corpo foi

encontrado nos fundos de um salão de cabeleireiro, estrangulado e amordaçado. A subtração

estaria configurada com o desaparecimento de um celular e aparelho de TV (OLIVEIRA,

2021).

O pedagogo e servidor público, Cláudio Antônio Reimondi, 48, foi vítima de

latrocínio, no município de Boa Vista da Aparecida (PR). O suspeito do roubo do veículo e de

objetos pessoais da vítima foi preso em menos de 24 horas depois da ocorrência e, aqui

aparece uma situação mais delicada, não há informações sobre a orientação sexual da vítima,

especialmente para incluí-la na lista de mortes de LGBTI + e, a situação também se repete em

relação ao último caso, considerado latrocínio, ocorrido em 02/10/2020, em Teotônio Vilela

(AL), quando a Polícia registrou a morte de José Ailton Pereira Róssiter, 45, que saiu com um

jovem de 21 anos para beber. O agressor o asfixiou para subtrair uma motocicleta e um

celular. O corpo foi encontrado em um canavial (BERNARDINO, 2021).

A dúvida em relação à orientação sexual da vítima nem sempre é fácil de preencher,

quer pelas lacunas na matéria jornalística, quer pelo cuidado do repórter em manter o silêncio.

Atitude recorrente em casos envolvendo pessoas com notoriedade social, talvez aqui esteja a

explicação para o caso de José Ailton Pereira Róssiter, ex-candidato a vereador e com amplo

trânsito na sociedade local.

67

Em síntese, nem todos os casos são de latrocínio, tão pouco de vítima de LGBTI+. A

constatação implica em reconhecer a existência de margem de erro em pesquisas dessa

natureza, justamente pela ausência de dados estatísticos oficiais, a ponto de ser necessário

reconhecer a existência de falhas na coleta e sistematização dos dados. A solução para tal

inconsistência deve passar por um maior rigor conceitual acerca da percepção da

materialização de episódios de homofobia, mesmo porque o movimento de defesa da causa

LGBTI+ não sustenta o seu argumento de combate ao preconceito e a discriminação em

função do quantitativo de mortes, mas a sua persistência no tempo, como um fenômeno

perene e, pelo fato de pessoas morrem em pelo século XXI devido a discordância da

sexualidade manifestada pela maioria das pessoas na sociedade brasileira, mesmo que seja

uma única vítima, é digno de reprovação e providências pelo Estado e sociedade.

Efetuado a digressão acerca da tipificação, é pertinente verificar a antijuridicidade e,

uma vez identificada na figura da motivação para as mortes violentas de LGBTI+ no Brasil,

em 2020, objetiva-se uma aproximação ao animus do agressor, apesar de alertarmos estarmos

diante de uma classificação efetuada, muito mais pela sensibilidade do pesquisador e, em

certa medida, vinculada a nota jornalística, quando diz se tratar de assalto, assédio, atentado,

emboscada, agressão por cliente, atropelamento, briga, briga por ponto, desentendimento,

confusão, drogas, cachaça, discussão banal, conheceu por aplicativo, dívida de drogas,

espancamento coletivo, execução, extorsão, fake news, homicídio privilegiado, homofobia,

irmão à matou, morta pelo primo, morta pelo ex-companheiro, crime passional, morte

acidental por policial militar, morte natural, morto por travesti, morto namorado, negou

lanche, latrocínio, ponto de prostituição, rixa, vingança, silicone industrial, suicídio e tortura.

Ao buscar compreender os casos afeitos a serem considerados motivados por atos de

ódio, aversão, enfim, homofóbicos, notamos todos os episódios estarem inseridos na

tipificação homicídio. Isto demarca a intencionalidade ou animus do agente em provocar a

morte, afastando assim argumentos acerca do roubo com resultado morte (art. 157, §3º, II,

CP).

Os crimes de ódio diferem completamente de outros episódios violentos. O agressor

intenta contra o outro uma agressividade maior. Tende a falar sobre a vítima com desprezo,

desdém, raiva, ou ainda, ausência de arrependimento ou compaixão pelo outro.

É pertinente considerar não ser a identificação dos treze (13) casos, aqui demarcados

exclusivamente na condição manifesta de homofobia. Ponderação necessária, pois três casos

aqui incluídos ainda deixam dúvidas, apesar de haver maior probabilidade para estarem nesta

condição para a explicação acerca da ocorrência morte violenta, especialmente em relação a

68

morte de Samatta do Valle, morta por um cliente habitual. Morta por asfixia e encontrada

dentro de porta-malas de um veículo no interior de um motel, em 06/02/2020. O Ministério

Público denunciou a vítima por feminicídio (ACUSADO..., 2021).

Dorete (Valdinar Lopes Leal), 32, assassinada a pauladas e encontrada nua em uma

horta comunitária, no dia 08/02/2020. A imprensa local nominou-a de garoto de programa

(WELLINGTON, 2021), mas posteriormente com a prisão do acusado pelo crime, Geferson

Gonçalves dos Santos, não oferece maiores detalhes para a tipificação em crimes de

homofobia, mesmo que se adote a palavra crueldade adotada por uma das reportagens sobre o

caso (HOMOSSEXUAL É ASSASSINADO..., 2021).

Outro caso que paira dúvida quanto a motivação homofóbica é Richard Henrique de

Maura, 22, morte a golpes de faca, no dia 12 de fevereiro de 2020, em São José do Rio Preto

(SP), depois de ser atraído para uma suposta relação sexual com três adolescentes (15 e dois

de 17 anos). Então, qualquer tentativa de explicação do fato conduziria apenas a hipóteses,

sem um fundamento adequado.

E, diferente dos três casos retratados acima, os episódios envolvendo atos

homofóbicos, é perceptível, a exemplo da violência perpetrada contra Fabiola (Fábio Pereira

de Andrade), 48, transexual, morta no interior do Conjunto Penal de Jequié (BA), em

31/03/2020, pois o relato trazido pela matéria do Blog Junior Mascote (POLÍCIA CIVIL...,

2021) não deixa dúvida acerca da questão de gênero como motivação da morte, vejamos: “[...]

Segundo a Polícia, um dos assassinos de Fabíola disse que o transexual foi morto com chutes,

socos e "chuchadas" desferidas por pelo menos 4 internos. O crime foi motivado por questão

de gênero, ou seja, o simples fato de ser transexual e defender outro interno que estava sendo

torturado pelos autores [...]”.

Em Buenópolis (MG), um jovem de 19 anos acertou um programa com um idoso de

62, entretanto, antes de consumar o ato, arrependeu-se e o agrediu com socos, chutes e

tijolada, numa nítida manifestação ou repulsa à sexualidade da vítima, demonstrando ter

havido, por conseguinte nojo (CRIME..., 2021).

A morte de Alex Junior da Silva Dias Carvalho, 22, em Juazeiro (BA), encontrado

morto na manhã do dia 03 de fevereiro de 2020. A mãe considerou ser um ato de homofobia,

enquanto o movimento LGBTI+ local informou a reportagem do Blog Preto no Branco

(JUAZEIRO..., 2021), ser “o assassinato de um LGBTI+ é um ato de violência contra toda a

população [...]”, mas os dados são insuficientes para apontar se tratar de um crime de

homofobia.

69

Os casos se sucedem e, os episódios de mortes violentas de LGBTI+ tendem a ser

incluídos no rol dos crimes homofóbicos, mas a morte de Isabelle Colstt (Bruno Fonseca), 27,

transexual, em uma rua de Florianópolis (SC), em 4/02/2020, destoa do modus operandi de

crimes de ódio, pois dois indivíduos desceram de um veículo e deferiram sete facadas, em

uma nítida possibilidade de se verificar uma execução, ou ainda, há casos em que existe a

motivação homofóbica, a exemplo do caso de Guilherme de Souza, 21, morto a pedradas, em

Luís Eduardo Magalhães, no oeste baiano. O corpo foi encontrado no dia 12/07/2020, com

marcas de ter sido morto a pedradas e depois teve o corpo parcialmente queimado. Dois

adolescentes, 14 e 16 anos, foram apontados como responsáveis pelas agressões, por se

incomodar com a sexualidade da vítima (PITOMBO, 2021). O agressor também seria morto

de forma violenta, em 07/12/2020 (ADOLESCENTE QUE..., 2021).

A morte do radialista José Antônio Macedo, conhecido por Toti, ocorrida em

1º/08/2020, com crueldade, por uma adolescente. Foram deferidos 17 golpes de faca, na

região do pescoço e uma foiçada na cabeça, ou ainda, “[...] Sem demonstrar nenhum

arrependimento ou piedade, o assassino creditou o crime ao sentimento de aversão à

homossexualidade, ou seja, ele teria praticado o chamado crime de homofobia” (PEREIRA,

2021).

Outro caso, inscrito na lista do GGB, na condição de crime homofóbico é do

cabeleireiro José Roberto Tavarez, 47, encontrado com sinais de tortura em uma mata na

Zona Norte da cidade de São Paulo, mas a hipótese de homofobia foi levantada pela família

(CORPPO..., 2021).

O caso da travesti Ester Vogue, 33, em situação de rua, teve o corpo queimado e veio

a evoluir para óbito, pois do atentado em 08/11/2020, mas a nota jornalística não traz

informações sobre as causas da agressão (TRAVESTI EM..., 2021).

A morte de Sheila (Marcos Paulo de Oliveira da Silva), 27, em uma pousada, no dia

19/11/2020, em João Pessoa (PB), pode estar conexa a um relacionamento abusivo,

especialmente quando se observa relato de sua tia acerca de episódios violentos envolvendo o

companheiro e, minutos depois de ter entrado na pousada, o companheiro saiu sozinho

(TRAVESTI ENCONTRADA...., 2021).

A família também reclamou justiça para Jonas Antônio Gomes, 27, apedrejado em

07/12/2021, no município de Jacaré dos Homens (AL), pois “A família do jovem afirmou que

ele já havia sofrido uma tentativa de homicídio anteriormente pelo fato de ser homossexual”

(HOMOSSEXUAL É APEDREJADO..., 2021).

70

E, todos os casos listados, neste estudo, na condição de crimes com viés homofóbico,

denotam episódios de homicídios. Dado relevante quando se observa o afastamento de outras

motivações, mesmo assim, tal conclusão não se traduz em uma assertiva, apenas uma primeira

constatação, mesmo porque não tínhamos a intenção de promover o cruzamento de variáveis,

e, para estudos desta natureza, o ideal é cruzar dados de, ao menos cinco a dez anos. Logo,

optamos por desconsiderar o Estado e a região com mais recorrência de casos, para evitar

apontarmos, por exemplo, a região mais preconceituosa, se assim fosse verificado, o nordeste

encabeçaria o topo da lista, mas São Paulo seria o Estado com maior recorrência de casos.

O estudo também não buscou trazer uma aproximação com os agressores, familiares

das vítimas e desdobramentos no judiciário, visto que, estávamos munidos da

intencionalidade de verificar se todos os casos de mortes violentas de LGBTI+ no Brasil, em

2020, seriam ou não motivadas pela homofobia.

A resposta obtida é em sentido negativo, uma vez que a análise pormenorizada

oferece a visualização de uma multiplicidade de causas. Apesar de a homofobia ser

plenamente possível de servir de qualificadora de crise envolvendo LGBTI+ na condição de

vítima, então, as causas de tais crimes decorre do ódio, aversão ou negativa da pessoa

LGBTI+ e, para aferirmos a existência da homofobia estrutural no rol das mortes identificadas

pelo GGB e pela Acontece seria necessário antes de tudo reconhecermos primariamente o fato

de morte violenta de LGBTI+ bastaria para incluir no tipo penal morte por motivo torpe

(homofobia), mas a cena do crime nem sempre dá conta de sustentar esta hipótese,

demonstrando assim a necessidade de um maior aprofundamento caso a caso, apesar de o

movimento de defesa da causa LGBTI+ afeita a defesa dos Direitos Humanos não possuírem

recursos suficientes para se ater a minúcias de cada episódio.

71

5 CONCLUSÃO

As críticas aos dados de mortes de LGBTI+ no Brasil divulgados pelo Grupo Gay da

Bahia (GGB) têm sido constantes. Parte da reprovação ao trabalho desenvolvido pela ONG

baiana decorre da inclusão de casos considerados de natureza diversa e não, necessariamente,

incluídos entre aqueles motivados pelo ódio à orientação sexual ou identidade de gênero

discordante da heteronormatividade.

E, para confrontar a posição do GGB e de seus críticos, operamos um esforço em

torno da identificação dos elementos atinentes a homofobia, por ser um conceito guarda-

chuva, numa concepção afeita a englobar também a LGBTfobia, sempre com o cuidado de

entender a interpretação advinda do julgamento da ADO 26, pelo Supremo Tribunal Federal

e, consequentemente a revisão de todos os casos listados no “Observatório de Mortes

LGBTI+ no Brasil – 2020”.

É inegável a existência de casos de homofobia entre as mortes estudadas, então, ter

mais ou menos casos, não deveria ser a regra para a sensibilização das autoridades e

sociedade. O indispensável é saber da importância da existência de uma vida e, a morte por

homofobia, seja quantos casos ocorram devem ser repudiadas pela sociedade, diante de um

crime qualificado na condição de torpeza, como compreendeu o STF, na ADO 26, em 2019.

O STF reconheceu a equiparação da homofobia ao crime de racismo, ao alargar a

compreensão da noção de racismo para além dos aspectos biológico e de fenótipo, ao incluir a

dimensão grupos vulneráveis a discriminação e ao preconceito, então o tipo penal reconhecido

pelo Supremo Tribunal é de natureza torpe (art. 121, §2º, inciso I, CP), ou seja, matar alguém

é o ato mais grave, no entendimento do nosso legislador pátrio e, por fim a uma vida por

motivo de ódio, aversão a sua orientação sexual ou identidade de gênero não deve e não pode

encontrar apoio numa sociedade civilizada.

Os crimes homofóbicos tendem a apresentar crueldade, com múltiplas perfurações,

escoriações, espancamento, apedrejamento e, em geral, o agressor não demonstra

arrependimento. A manifestação mais característica é a reprovação do comportamento da

vítima e, matar parece sinalizar um ato de honra, de respeito a hombridade, a condição de ser

e estar na sociedade em superioridade aos indivíduos discordantes do padrão heteronormativo.

E, em relação aos motivos (causas) das mortes violentas de LGBTI+ no Brasil, em

2020, o estudo aponta para execução, suicídio, briga por ponto de prostituição,

desentendimento, confusão, drogas e cachaça, discussão banal, roubo resultado morte

(latrocínio), morto pelo namorado (a)/esposo (a), homofobia, dívidas, envolvimento com

72

tráfico, rixa/vingança, morta em ponto de prostituição, irmão à matou/morta pelo primo/ex-

companheiro/passional, assalto, atentado/emboscada/agredida por cliente, atropelamento,

morto por travesti, silicone industrial, assédio, conheceu por aplicativo, espancamento

coletivo, extorsão, fake News, homicídio, morte acidental por PM, morte natural, negou

lanche e tortura.

O número elevado de casos em que não foi possível identificar a motivação do crime,

sinaliza a importância de o Estado se sensibilizar para incluir em seus formulários policiais,

médico legal e criminalística a informação sobre orientação sexual e identidade de gênero,

enquanto cuidado necessário para visibilizar o problema e ajudar na elaboração de políticas

públicas efetivas para a população LGBTI+.

A multiplicidade de motivos/causas deve ser visualizada como negligência do Estado

em desenvolver políticas públicas de proteção e fomento à cidadania de pessoas inseridas em

grupos vulneráveis. Cuidado essencial para se vencer a desigualdade potencializada quando a

vítima é travesti e transexual, pois uma vez excluídas das oportunidades sociais, terminam

encontrando na prostituição uma fonte de renda digna, apesar de estarem expostas à violência,

por isso, o número tão elevado de execuções.

Deve-se recepcionar as críticas aos relatórios do GGB como pertinentes para um

desenho mais próximo entre o conceito de homofobia e as mortes violentas de LGBTI+ no

Brasil. Evidentemente, pode reconhecer excessos de ambas as partes em discordância, mas em

nada justifica um debate acadêmico ter extrapolado os muros e alcançado a jurisdição civil e

penal.

As vozes discordantes não se originam apenas no ambiente acadêmico, ao se

identificar também jornalistas, políticos, entre outros. Manifestações necessárias para o debate

público sobre o tema. A ponderação, talvez, seja em relação a afirmativa de se tratar de

“farsa”, mesmo porque radicalização, desqualificação não costuma ser o combustível para o

avanço das pesquisas científicas, como se observa em relação ao debate urbano dos encontros

de associações de pesquisadores, revisões científicas, enfim, os instrumentos costumam ter

outro verniz.

A decisão do Supremo Tribunal Federal, em equiparar a homofobia ao crime de

racismo constitui um alento em relação ao enfrentamento do ódio aos LGBTI+, apesar de não

haver qualquer garantia quanto a tipificação de tais atos em sede de inquérito policial ou ação

penal, uma vez que, as autoridades deverão interpretar o crime e o tipificar na condição de

torpe por razão de aversão a orientação sexual e a identidade de gênero. Em outras palavras,

não basta ser a vítima pertencente ao segmento LGBTI+, pois os motivos de sua morte podem

73

estar entrelaçados a teia das drogas, a razões diversas, não implicando qualquer relação com a

sua sexualidade, apesar de reconhecermos ser o machismo em nosso país manifestamente

estrutural e, para os crimes aos quais se encontram elementos para tipificar como crime torpe

por razão de homofobia, os aplicadores não o fazem por não compreenderem a importância

em sinalizar a reprovação a atos dessa natureza via judiciário.

Nota-se o quanto a ausência de uma atuação prévia através da educação dos

brasileiros para conter e extirpar a violência de gênero, constitui um desafio a ser vencido, por

isso, tentar resolver o problema do feminicídio e da homofobia via Direito Penal, numa

espécie de fetiche normativo, com o surgimento de uma norma, é prova inconteste das nossas

fragilidades para pensar a política criminal e o seu lugar na pacificação da sociedade, num

contexto de controle social eficaz e eficiente.

Em suma, sem a sistematização da violência contra LGBTI+ pelo Estado, a partir de

uma conceituação mais evidente da manifestação de atos homofóbicos, especialmente em

relação a mortes violentas, a sociedade brasileira irá conviver com a denúncia anual do GGB

e demais grupos de defesa da causa LGBTI+ e, por outro lado, vozes discordantes, ao

buscarem desqualificar o discurso do quanto o Brasil assume o topo no ranking dos países

mais homofóbicos do Mundo. Talvez, a decisão do Supremo Tribunal Federal, com

consequente impacto no cotidiano das varas crimes, pode sinalizar, nos próximos anos, o

cenário mais próximo da realidade do drama vivenciado por muitas famílias brasileiras reféns

da angústia de ter perdido um ente querido para o ódio, mas somente o tempo e a prática

forense irão ajudar também a compor uma radiografia em que o Estado, materializado nas

ações da segurança pública se nega, ao resistir na inclusão de itens em seus formulários de

coleta de informações de episódios de violência e crime, a orientação sexual e/ou identidade

de gênero da vítima.

74

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preso.ghtml?fbclid=IwAR3jquuVmGqcFIaS1GjqsTO2cIL_aT3bcuaaDwGW69dQAYK1D_0

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TRAVESTI ENCONTRADA morta em pousada de JP sofria homofobia e vivia

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TRIO é preso por envolvimento na morte de professor em Caracaraí, Sul de RR. G1 –

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2021.

86

APÊNDICE

Tabela 2 - Lista dos casos de mortes violentas de LGBTI+ no Brasil, em 2020

Ordem Data Cidade Estado Registro Civil Nome Social Orientação Sexual Idade Fonte

1 02/01/2020 Dilermando de Aguiar RS Celena Peixoto Transexual 39 Gaúcha Zero Hora

2 04/01/2020 Fortaleza CE Dennis Pires do Nascimento Gay 25 SSPDS - CE

3 04/01/2020 Quixadá CE Laura Adriana Freitas Carneiro Mulher Transexual 43 CN News

4 04/01/2020 Quixadá CE Kathly Anny Freitas da Silva Mulher Transexual 22 CN News

5 04/01/2020 Pau dos Ferro RN Murilo Gonçalves Homem Trans Nossa Pau de Ferros

6 06/01/2020 Fortaleza CE Paola Prado Travesti Diário do NE

7 06/01/2020 Jaboatão dos Guararapes PE José Vitor Santos da Silva Vitória Travesti 19 TV Clube

8 08/01/2020 Santo Antônio do Leverger MT Mary Bastos de Lima Travesti 37 Olhar Direto

9 08/01/2020 Buenópolis MG A. F. Bissexual 62 Rádio Studio FM

10 09/01/2020 Rio de Janeiro RJ Giselle Katrine - Sara Travesti

11 11/01/2020 Curitiba PR Jurandi Pires da Silva Jussara Transexual 55 Banda B

12 11/01/2020 Jaú SP Mulher Transexual Tdor

13 12/01/2020 Deodápolis MS Paulo Espíndola Lopes Paulinha Travesti 24 Bonito Informa

14 13/01/2020 Fortaleza CE Francisco Rodrigues da Silva Júnior Gay 32 Diário do NE

15 14/01/2020 Rio Largo AL Márcio Marcelino dos Santos Gay 40 7 Segundos

16 15/01/2020 Maués AM José Valcimar Rodrigues de Souza Professor Lulinha Gay 47 Metrópoles

17 15/01/2020 Iporá GO Bruna Rosa Transexual 18 Tdor

18 15/01/2020 Manaus AM Antônio Genivaldo Lira Lacerda Gay 47 A Crítica

19 16/01/2020 Salvador BA Fabíola Travesti Informe Baiano

20 17/01/2020 Brasília DF Ana Clara Lima Júlia Mulher Transexual 38 Painel Político

21 17/01/2020 Fortaleza CE Camila Veras da Silva Mulher Transexual 27 Diário do NE

22 19/01/2020 Boa Vista RR Letícia Travesti 17 G1 - RR

23 19/01/2020 Santa Maria RS Morgana Cláudia Ribeiro Mulher Transexual 37 Gaúcha Zero Hora

24 20/01/2020 Fortaleza CE Francisco Gleison de Sousa Pirangay Gay 24 Correio 24 Horas

25 21/01/2020 Moreno PE Henrique Antonio Alves de Deus Gay 24 JC Online

26 21/01/2020 Jucurutu RN Sebastiam Alves da Silva Gay 35 Catole News

27 22/01/2020 Nísia Floresta RN Eliezei Urbano Gay 42 G1

87

28 22/01/2020 Lagarto SE Gilson José Gay

29 23/01/2020 Bauru SP Amauri Arruda dos Santos Gay 47 G1 - Bauru e Marília

30 24/01/2020 Campo Bom RS Fabiano Ulguim Soares Travesti 37 Jornal NH

31 25/01/2020 Independência CE Elinaldo da Silva Januário Naldo Gay 31 Porronca

32 25/01/2020 Petrolândia PE Adenildo Freire de Sá Ninho de Nenéu Gay 51 Petrolândia Notícias

33 26/01/2020 Aquiraz CE Carlos Alberto Silvino Fonseca Beto Gay 59 O Povo

34 26/01/2020 Natal RN Pedro Paulo da Silva Oliveira Bruna / Pepê Travesti 23 G1 - RN

35 27/01/2020 Aracaju SE Givaldo Santos Pereira Gay 20 Agência Jornal de Notícias

36 30/01/2020 Rolim de Moura RO Wedylla Brenner Darack Travesti 25 Portal de RO

37 30/01/2020 Aracaju SE Rogério Correia dos Santos Gay 37 A8SE

38 01/02/2020 Restinga SP Adriana Santana Transexual http://observatoriotrans.org/suic%C3%ADdio

39 01/02/2020 Campina Grande PB Cristiane Soares Cris Nagô Lésbica 43 PB Todo Dia

40 01/02/2020 Juazeiro do Norte CE Leonardo Matias Chagas Monique Travesti 25 F5 Cariri

41 01/02/2020 Ceará Mirim RN Ritchely Silva Transexual 25

42 03/02/2020 Juazeiro BA Alex Junior da Silva Dias Carvalho Gay 22 Preto no Branco

43 04/02/2020 Florianópolis SC Bruno Fonseca Isabelle Colstt Transexual 27 Jornal Conexão

44 05/02/2020 Cajazeiras PB Maisa Andrade Mulher Transexual 34 Portal T5 - Paraíba

45 05/02/2020 São Luís MA Wenyson Fernandes Miranda Xexeu Gay 33 O Imparcial

46 06/02/2020 Florianópolis SC Samantta do Valle Mulher Transexual 20 ND+

47 08/02/2020 Agricolândia PI Valdinar Lopes Leal Dorete Transexual

48 08/02/2020 Limoeiro PE Joyce Berlim Travesti

49 09/02/2020 Rio de Janeiro RJ Karev Homem Trans 19

50 10/02/2020 Conselheiro Lafaiete MG Raphael Filipe Clementino Pereira Sabrina Sampaio Travesti 20 Fato Real

51 10/02/2020 Belo Horizonte MG Thabata Oliveira Blus, Travesti 31 Mirante da Bocaina

52 11/02/2020 Campinas SP Nenem Santos da Silva Travesti 38 Bargas Filho

53 12/02/2020 São Paulo SP Katarina Ariel Transexual 20 R7

54 12/02/2020 São José do Rio Preto SP Richard Henrique de Maura Gay 22 G1 – São José do Rio Preto e Araçatuba – TV TEM

55 14/02/2020 Augustinópolis TO Isabelle Oliveira Transexual Sou Enfermagem

56 15/02/2020 Quilombo SC Bruna Karla Travesti 23 Matagal

57 20/02/2020 Itaperuna RJ Gabrielly Vanderguel Travesti G1 - N Fluminense

58 20/02/2020 Anápolis GO Gaby Transexual 21 Jaguaruana News

59 22/02/2020 Caracaraí RR Rafael Pinheiro Gay 29 G1 - RR

60 22/02/2020 Florianópolis SC Bruna Andrade Transexual 30 ND+

88

61 23/02/2020 Fortaleza CE Dávila Duarte Travesti Diário do NE

62 23/02/2020 Encruzilhada RS Maria Eduarda Aires Dias Transexual 32 O Correio

63 23/02/2020 Encruzilhada RS Paulo Ricardo Cardoso Carvalho 45 O Correio

64 23/02/2020 Araguari MG Travesti Triângulo Notícias

65 29/02/2020 Betim MG Alexia Freires Pereira Travesti 28 Iguatu.net

66 02/03/2020 Itabatã BA Genivaldo Rosa Silva Gay 42 BA Extremo S

67 06/03/2020 Varginha MG Wellington Batista da Silva Gay 36 G1 - S de Minas - EPTV

68 10/03/2020 Belo Horizonte MG Talita Travesti Estado de Minas

69 12/03/2020 Belo Horizonte MG Isadora Travesti 51 Estado de Minas

70 12/03/2020 Alagoinhas BA Emanuel do Nascimento Santos Ludmila Travesti Apito Notícias

71 12/03/2020 Manaus AM Diego Figueiredo Gay 38 D24 AM

72 14/03/2020 Arapiraca AL Rafael Souza Rafhynha Pimenta Travesti 25 Portal Arapiraca

73 15/03/2020 Embu-Guaçu SP Transexual 31 G1 - SP

74 16/03/2020 SP SP Gay 49 G1 - SP

75 17/03/2020 Manaus AM Carlos César Ferreira Gay 49 Correio da Amazônia

76 20/03/2020 Caruaru PE Paloma Travesti 22 Blog do Evaldo Magalhães

77 22/03/2020 Caruaru PE Kelly Travesti 35 Espiaqui

78 24/03/2020 Mirassol SP Viviane Maximiano (Woguel)

79 26/03/2020 Cariacica ES Travesti 30 Folha Vitória

80 29/03/2020 Fortaleza CE Luana Paty Travesti 39 Diário do Nordeste

81 30/03/2020 Vitória ES Rayslla Ferreira

82 31/03/2020 Dourados MS Rodrigo Junior Dias de Alcâncata Jennifer Alcantara Travesti 34 Dourados News

83 31/03/2020 Jequié BA Fábio Pereida de Andrade Fabíola Transexual 48 Júnior Mascote

84 04/04/2020 Querência MT Rayka França Transexual 26 G1 - MT - TV Centro América

85 06/04/2020 Bayeux PB Jefferson Felipe do Nascimento Martins Travesti 27 Portal Correio

86 06/04/2020 Aparecida do Taboado MT Amarildo Rossi Gay 57 Mídia Max

87 08/04/2020 Fortaleza CE Letícia Pérez

88 09/04/2020 Aracaju SE Sasha Santos Transexual 25 Fan

89 09/04/2020 Pirapora MG Tansexual Rádio FM Pirapora

90 11/04/2020 Magé RJ Luana Alves Travesti 25 NDM

91 11/04/2020 Várzea Grande MT Cássio Rogério Gonçalves Gay 34 Gazeta Digital

92 12/04/2020 Patos PB José Wilke Lopes de Medeiros Leca do Beral Travesti 33 Diário do Sertão

93 12/04/2020 Pato Branco PR Valdecir Antonio Missel Tatu 37 Rádio Chopinzinho

89

94 12/04/2020 Macaé RJ Bruno Maia da Silva de Almeida Gay 29 O Debate On

95 13/04/2020 Guarujá SP Josenildo da Silva Nil Gay 50 G1 - Santos e Região

96 14/04/2020 Rio das Ostras RJ Amilton Soares Pio Gay 48 Notícias Macaé

97 18/04/2020 Cumaru do Norte PA Letícia Travesti Correio de Carajás

98 18/04/2020 Barra Mansa RJ Bianca Fernandes Martins Lésbica 39 G1 - S do Rio e Costa Verde - TV Rio S

99 21/04/2020 AL Marcos Moana jasmim / Marquinhos Gay

100 22/04/2020 Manhuaçu MG Eduarda (Dudu) Travesti 33 Portal Caparaó

101 22/04/2020 Ilhéus BA Leto Travesti Reclame Boca

102 27/04/2020 Francisco Morato SP Nathasha Ferreira Lobato Mulher Transexual 30 G1 São Paulo

103 29/04/2020 Ilhéus BA Binho Fábio Roberto Notícias

104 02/05/2020 Camaçari BA Reinaldo de Jesus Santos Rubi Ferriera / Jade Travesti 35 Notícias de Camaçari

105 03/05/2020 Sobradinho BA Fernando de Sousa Paiva Fernandinha Travesti Carlos Britto

106 07/05/2020 São Domingos BA Fabio Filho Oliveira da Silva Fabinho Travesti 22 Varela Notícias

107 07/05/2020 Joao Pessoa PB Diego Vieira Gay PB Hoje

108 09/05/2020 Patrocínio do Muriaé MG Gabrielly Hills Travesti Repórter Kadu Fontana

109 10/05/2020 Itabuna BA Robertino Mariano dos Santos Mulher Transexual 42 O Divergente

110 10/05/2020 Medeiros Neto BA Marlei Pinto Costa Travesti 36 Photo Jornalismo

111 10/05/2020 Juiz de Fora MG Paloma Travesti 56 Instagram

112 15/05/2020 Rio de Janeiro RJ Paula Travesti Observatório Trans

113 15/05/2020 Caucaia CE Francisco Sérgio da Rocha Goes Júnior Gay 42 Diário do Nordeste

114 15/05/2020 Barra do Garças MT Brenda mulher indígena trans Revista Badaró

115 16/05/2020 Fortaleza CE Barbara Travesti 33 CN News

116 16/05/2020 João Pessoa PB Gabriel Taciano de Oliveira Gay 33 Brasil de Fato

117 17/05/2020 São Paulo SP Demétrio Campo Homem Trans Hypeness

118 17/05/2020 Joao Pessoa PB Gabriel Taciano Gay Parlamento Paraíba

119 20/05/2020 Itabuna BA Leonardo Jesus de Souza Travesti Bnews

120 20/05/2020 Natal RN Eliedson Vinícius Marcelino de Menezes Gay 39 G1 - Rio Grande do Norte

121 21/05/2020 Taubaté SP Travesti 30 G1 – Vale do Paraíba e Região – Vanguarda

122 25/05/2020 Porto Nacional TO César Azevedo Gay G1 – Tocantins – TV Anhanguera

123 28/05/2020 Itu SP Vick Santos Transexual 22 G1 - Sorocaba e Jundiaí

124 29/05/2020 São Paulo SP Cryslaibe de Manaus Travesti Observatório Trans

125 01/06/2020 Ijuí RS Gilberto Coracini Beto Cabeleireiro Gay 72 Rádio Progresso

126 05/06/2020 Rosário MA Leandro de Almeida Gay 27 Imirante.com

90

127 06/06/2020 Porto Velho RO Grampoula Travesti 48 Rondônia Notícias

128 06/06/2020 Porto Real do Colégio AL Jade Travesti Alagoas 24 Horas

129 06/06/2020 Barra de Santa Rosa PB Keyla Travesti Nov Cruz

130 06/06/2020 Camocim CE Francisco Antônio Sousa Luanny Sousa Travesti 22 Diário do Nordeste

131 11/06/2020 Salvador BA Kethley Santos Travesti 20 B News

132 13/06/2020 Anápolis GO Marlan Reis Sousa Paulinha Travesti Portal 6

133 14/06/2020 Maricá RJ Marcinha Shokenna Bastos da Silva Travesti 28 LSM

134 22/06/2020 Pacajus CE Babalu Travesti 40 CETV 1ª edição

135 23/06/2020 Teresina PI Travesti Meio Norte

136 24/06/2020 Aparecida de Goiânia GO Renatynha Valadares Travesti 23 DM.com.br

137 25/06/2020 Rio Branco AC Fernanda Machado Travesti 27 AC24Horas

138 25/06/2020 Recife PE Lady Gaga Travesti 30 Diário da Selva

139 25/06/2020 Cruzeiro SP Marceli Silva Mulher Transexual 41 Band

140 26/06/2020 Rio de Janeiro RJ Antonela Chelton Travesti

141 26/06/2020 Erechim RS Wenceslau Bento de Souza Santos Bissexual 41 Diário Online

142 28/06/2020 Londrina PR M. M. F. L. Verônica Travesti 50 CGN

143 28/06/2020 Palmas TO Igor Lima Potêncio Homem Trans 24 Gaeta do Cerrado

144 30/06/2020 São bernardo do Campo SP Beti Santos Travesti Folha de S. Paulo

145 30/06/2020 Pacajá PA Fernanda Coelhinha Travesti

146 30/06/2020 Londrina PR Manoel Messias Ferreira de Lima Veronica Xexel Travesti 50 Goio News

147 02/07/2020 Rio de Janeiro RJ Colombiana Travesti Whatsapp

148 04/07/2020 Santo Amaro da Purificação BA Yandra Karony Santos Travesti Varela Notícias

149 11/07/2020 Sobral CE Antônio Carlos Eleoterio da Silva Carol da Silva Travesti 36 Sobral 24 horas

150 12/07/2020 Luís Eduardo Magalhães BA Guilherme de Souza Gay 21 Folha de S. Paulo

151 12/07/2020 Fortaleza CE Soraya de Oliveira Santiago Mulher Transexual 35 O Povo

152 13/07/2020 Recife PE Helton José Alves Medeiros Tifany Alves Medeiros Travesti 51 TV Jornal

153 19/07/2020 Iguatu CE Rhyanna Mabelly Spanick Travesti 20 Diário do Nordeste

154 23/07/2020 São Borjas RS Rayven Marthiela Travesti Facebook

155 25/07/2020 Jardim Paulistano SP Mateus Gustavo Silva Gay 25 Pop Mundi

156 26/07/2020 Caaporã PB Josué Balbino de Lima Doroty Travesti 40 Portal T5

157 26/07/2020 Alagoa Grande PB Erik Lima Travesti 22 Blog do Rildo

158 28/07/2020 Campo Largo PR Cesar Silveira Gay 35 RIC MAIS

159 28/07/2020 Campo Largo PR Mateus Valeri Antunes Gay 24 RIC MAIS

91

160 01/08/2020 Taquarituba SP José Antônio Macedo Toti Gay 59 G1 - Itapetininga e Região

161 03/08/2020 Americana SP Alice Garrefa Transexual 25 A Cidade ON

162 03/08/2020 Fortaleza CE Travesti Diário do Nordeste

163 04/08/2020 Belo Horizonte MG Samara Travesti Rádio Itatiaia

164 04/08/2020 Santo Antônio de Jesus BA Travesti Infosaj

165 05/08/2020 Feira de Santana BA Paloma Travesti Paulo Publicidades

166 08/08/2020 Caucaia CE Célio Gay CN7

167 08/08/2020 Boa Esperança Fernanda Soares Travesti

168 08/08/2020 Fortaleza CE Ludimila Travesti 15 Cnews

169 08/08/2020 Manaus AM Lésbica Imediato

170 09/08/2020 Salvador BA Gillis Prado Gay 39 Dalvas Blog

171 10/08/2020 Fortaleza CE Letícia Costa Travesti 29 CN7

172 10/08/2020 Mairinque SP Luara Redfield Transexual 23 G1 - Sorocaba e Jundiaí

173 12/08/2020 Taguatinga DF Dimas Pereira Gay 44 Metrópoles

174 12/08/2020 Fortaleza CE Francisco Ediberto dos Santos Brasileiro 39 O Povo

175 13/08/2020 Contagem MG HDB Ellen Travesti 53 R7

176 15/08/2020 Recife PE Roberto Gay 80 Gay.blog.br

177 16/08/2020 Campinas SP 42 Correio

178 17/08/2020 Feira de Santana BA André Luís de Carvalho Holanda Bissexual 36 Se Liga Alagoinhas

179 17/08/2020 Venda Nova MG Lésbica 18 Estado de Minas

180 17/08/2020 Maceió AL Thiago Rogério dos Santos Gay 22 Alagoas 24 Horas

181 18/08/2020 São Paulo SP José Roberto Tavarez Madonna Gay 47 R7 - Cidade Alerta

182 18/08/2020 Fronteira MG Travesti 26 G1 – Triângulo e Alto Paranaiba

183 19/08/2020 Igarapé Grande MA Bernadete Travesti Blog Ricardo Farias

184 19/08/2020 Crateús CE Daniele Rodrigues Mulher Transexual 21 Diário do Nordeste

185 20/08/2020 Canindé de São Francisco SE Claudinha Leite Travesti G1 - Sergipe

186 21/08/2020 Campina Grande PB Luiz Eduardo Leite Brasileiro Gay 44 Paraíba Online

187 21/08/2020 Maceió AL Ludmila Ohana Oliveira Lima Lésbica 34 Gazeta Web

188 23/08/2020 Rondonopolis MT Carina Dias Rezende Lésbica 25 O bom da notícia

189 23/08/2020 Porto Alegre RS Matheus Vinícius Pedroso Kelly - Isabela Pedroso Mulher Transexual 22 Zero Hora

190 26/08/2020 São Bernardo do Campo SP Travesti Viva ABC

191 29/08/2020 Itaitinga CE Branca Travesti 29 O POVO

92

192 31/08/2020 Santa Cruz do Sul RS Melani Aguiar Transexual 20 Independente

193 02/09/2020 São Paulo SP Chiara Duarte Pereira Transexual 27 G1 - São Paulo

194 02/09/2020 Sorriso MT Alfredo Dias de Castro Neto Gay 48 Olhar Direto

195 04/09/2020 Maceió AL Jardiele Santos Travesti 24 Alagoas 24 Horas

196 06/09/2020 Mururú MA Jeová Constino da Silva Giovana Perez Transexual Suelda Santos

197 08/09/2020 Manaus AM William Fonseca da Silva Gay 48 Amazonas 1

198 12/09/2020 Sobral CE Cibele Rodrigues de Sousa Nem Travesti O Sobraelse

199 17/09/2020 Marechal Deodoro AL Maria Camila Coimbra dos Santos Lésbica 32 Cada Minuto

200 19/09/2020 Atibaia SP Ari da Silva Gay 52 Bragança em Pauta

201 20/09/2020 Salvaterra PA Joel Henrique Macedo Barbie Macon Mulher Transexual 34 O Liberal

202 20/09/2020 Laranjal Amapá Ted Beanio Costa Ramos Gay 49 G1 - Amapá

203 22/09/2020 Cuiabá MT Jorge Alexandre Hattene 33 Campo Grande News

204 25/09/2020 Londrina PR Sandra Beatriz Travesti 23 RIC MAIS

205 26/09/2020 Campina Grande PB Gay G1 - Paraíba

206 27/09/2020 Boa Vista da Aparecida PR Claudio Antônio Reimondi Gay 48 CGN

207 28/09/2020 Maceió AL Mychael Douglas Fontes da Silva Souza Martito Travesti 24 Gazeta Web

208 28/09/2020 Campo Grande MT Stelio Constantino Sucia Labasura Constantino Barbosa Mulher Transexual 28 Mídia Max

209 28/09/2020 Fortaleza CE José Evilázio Melo Gonçalves Gay 56 Diário do Nordeste

210 29/09/2020 Umbaúba SE Rayssa Travesti Instagram

211 30/09/2020 São José da Laje AL Fabrício Alves da Silva Michele Travesti BR 104

212 01/10/2020 Cururipe AL Luan Angêlo dos Santos Gay 28 Gazeta Web

213 02/10/2020 Teotônio Vilela AL Jose Ailton Pereira Róssiter Gay 45 Gazeta Web

214 03/10/2020 São Pedro do Ivaí PR Nathalia Leticia Barbosa da Fonseca Travesti 26 G1 - Norte e Nordeste

215 05/10/2020 Ibitinga SP Paolla Bueno Mulher Transexual 17 G1 - Bauru e Marília

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220 17/10/2020 Brejo Grande SE Lésbica FanF1

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224 26/10/2020 São José de Mapibu RN Yuri Alzaniel Batista da Silva Gay 17 G1 - Rio Grande do Norte

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227 10/11/2020 São Bernardo do Campo SP Ester Vogue Travesti 33 Zap Maraba

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253 20/12/2020 São Paulo SP Wanderley Santos Aguiar Vanessa Sampaio Travesti 22 R7

254 22/12/2020 Rio Largo AL Oreinha Transexual 21 Todo Segundo

255 23/12/2020 Salvador BA Ajax Gonçalves Vianna Gay 60 B News

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256 25/12/2020 Cascavel CE Jacó Ângelo da Silva Travesti 26 G1 - Ceará

257 29/12/2020 Salvador BA Wendel Moura dos Santos Gay 35 A Tarde

Fonte: Elaboração do autor, 2021.