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1 UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE UFS PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA NÚCLEO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA NPGEO JACSON TAVARES DE OLIVEIRA TERRITÓRIO DO AGRONEGÓCIO: EXPANSÃO DOS MONOCULTIVOS DO EUCALIPTO E DA PRODUÇÃO DE CELULOSE NA BAHIA SÃO CRISTÓVÃO SE 2014

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE – UFS

PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA

NÚCLEO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA – NPGEO

JACSON TAVARES DE OLIVEIRA

TERRITÓRIO DO AGRONEGÓCIO: EXPANSÃO DOS

MONOCULTIVOS DO EUCALIPTO E DA PRODUÇÃO DE

CELULOSE NA BAHIA

SÃO CRISTÓVÃO – SE

2014

i

JACSON TAVARES DE OLIVEIRA

TERRITÓRIO DO AGRONEGÓCIO: EXPANSÃO DOS

MONOCULTIVOS DO EUCALIPTO E DA PRODUÇÃO DE

CELULOSE NA BAHIA

Tese de doutorado apresentada ao Programa de

Pós-Graduação em Geografia da Universidade

Federal de Sergipe, sob a orientação da Profª Drª

Josefa de Lisboa Santos, como requisito para

obtenção do título de Doutor em Geografia.

Área de concentração: Organização e Dinâmica

dos Espaços Agrário e Regional

SÃO CRISTÓVÃO – SE

2014

ii

FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA BIBLIOTECA CENTRAL

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE

O48t

Oliveira, Jacson Tavares de

Território do agronegócio : expansão dos monocultivos do eucalipto e da produção de celulose na Bahia / Jacson Tavares de Oliveira ; orientadora Josefa de Lisboa Santos. – São Cristóvão, 2014.

338 f. : il.

Tese (doutorado em Geografia) – Universidade Federal de Sergipe, 2014.

1. Geografia agrícola. 2. Agroindústria – Bahia. 3. Economia agrícola. 4. Eucalipto. 5. Trabalho. 6. Camponeses. I. Santos, Josefa de Lisboa, orient. II. Título.

CDU 911.3:63(813.8)

iii

iv

v

DEDICATÓRIA

Como resultado de um esforço coletivo em desvelar o véu do desenvolvimento na

Silvicultura Baiana, este trabalho é dedicado aos bravos camponeses que confrontam o

capital e o Estado na luta pela terra, no afã pela transformação social em meio ao

latifúndio secular.

Como reconhecimento do que hoje sou e dos princípios que cultivo, dedico este

trabalho a minha mãe, Dilva e ao meu pai Aloysio, pelo amor incondicional e por tudo

que fizeram por mim a vida toda.

Às minhas queridas irmãs Selma e Kellen; À minha adorada sobrinha Danielle, que

esteve comigo em Aracaju, fazendo seus estudos em Farmácia.

Aos meus filhos Leonardo, Mariana e Thiago, pelos quais tenho um amor incondicional

e pela compreensão que tiveram comigo nas ausências justificadas pelas exigências da

tese.

À minha amada esposa Daniela, pelo apoio pleno e irrestrito e acompanhamento intenso

em todas as etapas do Doutorado, desde o período de estudos em Aracaju até as

caminhadas e percalços no trabalho de campo no Extremo Sul Baiano.

Às minhas queridas e engajadas professoras Josefa e Alexandrina, pela confiança em

mim depositada, pelo esforço em universalizar a teoria crítica e pela convicção em fazer

uma Geografia comprometida com o mundo do trabalho.

Enfim, dedico a todos os tios, primos, professores, amigos e colaboradores que

contribuíram para o sucesso desse trabalho.

vi

AGRADECIMENTOS

Ao término deste trabalho de elaboração da tese, é chegada a hora de agradecer a todos

os que colaboraram, nestes quatro anos de Doutorado, em todas as etapas da pesquisa,

desde o período de cumprimento dos créditos, das visitas de campo, das viagens com

professores e colegas de curso até as jornadas intensas do trabalho de campo junto aos

camponeses dos acampamentos e assentamentos rurais no Extremo Sul da Bahia.

Agradeço, imensamente, aos meus professores da Universidade Federal de Sergipe, do

Núcleo de Pós-Graduação em Geografia, em especial à minha orientadora, Profª Drª

Josefa de Lisboa Santos, que além de ter ministrado a disciplina “Estado, Políticas

Públicas e Desenvolvimento”, esteve ao meu lado todo o tempo e prestou valiosas e

detalhadas orientações nas diversas etapas da pesquisa e da elaboração da tese; Não

poderia deixar de expressar, também, o meu apreço incondicional pela Profª Drª

Alexandrina Luz Conceição, pelas excelentes aulas ministradas nas disciplinas “Teorias

e Técnicas em Geografia Agraria”, “Seminários Temáticos: História do Pensamento

Geográfico” e “Relação Campo-Cidade”, bem como pela orientação preciosa no exame

de qualificação; Também agradeço ao Prof. Dr. Marco Antonio Mitidiero Junior, pelo

excelente trabalho na condução das disciplinas “Tópicos Especiais: Teoria e Método em

Trabalho de Campo na Geografia” e “Tópicos Especiais: Espaço e Território nas

Concepções de Milton Santos, Antonio Carlos Robert Moraes e David Harvey”; Um

agradecimento especial ao Prof. Dr. José Eloízio da Costa, grande incentivador de

minha vinda para Aracaju, pelo apoio incondicional e pela disciplina ministrada

“Legislação Ambiental e Agrária e a sua Efetividade”; Um grande abraço de

agradecimento ao Profº Dr. Eraldo da Silva Ramos Filho, pela contribuição efetiva no

meu exame de qualificação e na banca de defesa da tese; Finalmente, manifesto,

também a minha gratidão aos Professores Doutores Simone Raquel Batista Ferreira e

Edvaldo Oliveira, que, na função de Examinadores Externos, contribuíram para o

aperfeiçoamento desta tese.

Agradeço, muitíssimo, aos meus colegas de curso na UFS, nas diversas disciplinas, pela

convivência agradável, alegre e madura que tivemos durante o ano de 2010, no

acolhimento e durante o período de estudos na linda cidade de Aracaju, em especial a

José Hunaldo, Wodis, Auceia, Rosana, Benizário, João, Luana, Ricardo, Eliany,

Moacir, José Wagner, Eder, Carmem, Wellington, Tânia, Francileide, Joab, Anésia,

Renato e Vanessa.

Ainda na UFS/NPGEO, agradeço a todos os funcionários do Núcleo na pessoa de

Everton, pela atenção qualificada e pelo empenho em atender as demandas do curso.

Aos companheiros do IFBA Paulo Marinho, Manoel Cavalcanti, Moab, Aurina e

Albertino, os meus autênticos agradecimentos pelo grande esforço em autorizar o meu

afastamento para a qualificação profissional.

Um agradecimento muito especial aos mais de cem camponeses do Extremo Sul da

Bahia que me receberam em suas casas nos assentamentos rurais e em seus barracos de

lona nos acampamentos, sempre com alegria e esperança nos olhos, na luta pela terra e

pela construção de uma sociedade diferente. Seria impossível nomear todos aqui, mas

agradeço a todos os camponeses do Pré-Assentamento 25 anos, nas pessoas de Lucas

Carvalho, Gildásio, Abel Soriano, Evanilda Gil e Jorge Francisco Soares; do

Acampamento Dorothy Stang, nas pessoas de Sivanildo Ramos (Chocolate) e Anália;

do Assentamento Lulão, nas pessoas de Antonio Pestana e Láustia; do Asssentamento

Ojefferson, na pessoa de Waltamar Caires; e do Assentamento Milton Santos, nas

pessoas de Neuza Biscoito e Galego.

vii

Agradeço aos companheiros do MST que atuam na coordenação dos trabalhos no

Extremo Sul Baiano e que não mediram esforços para a liberação das informações e

acesso irrestrito aos acampamentos e assentamentos, com destaque para Eliane Oliveira,

Preto, Juliana, Elivone e José Barbosa.

Em Eunápolis, um agradecimento enorme à Ivonete Gonçalves de Souza, coordenadora

do CEPEDES, pela grande presteza e disposição em contribuir com a pesquisa,

inclusive, auxiliando nos trabalhos de campo nos assentamentos e acampamentos; Ao

Vereador Lucas Tavares Leite, pela excelente entrevista sobre o avanço da silvicultura

na região; Ao pessoal da Prefeitura de Eunápolis, em especial a Gisele, Livia Almeida,

Wellington Silva de Barros, Aleciana Gomes de Araújo, Aidenia Campos; Um

agradecimento a Patrícia, pelas informações sobre o viveiro da Veracel em Eunápolis.

Agradeço, também, ao grupo do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Eunápolis:

Damiana Alcântara, Ednei Rodrigues Silva, Eduardo Espavier, Michael Jr Silva,

Robson Reis e Glayson Pdereira Vaz, bem como a Valmir Alves de Oliveira, do

Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Itagimirim; Um agradecimento especial aos

fomentados da Veracel que concederam entrevistas, com destaque para Gutemberg

Pereira Souza, Arnold Prado, Albert Sartori, Paulo Coji, Helder e Ademir.

É importante expressar a minha gratidão a todos os que dispuseram um pouco do seu

tempo para realizar entrevistas e colaborar com a tese, tais como Dinei, da Associação

dos Trabalhadores do Campo de Eunápolis; Domingos, do Conselho Indigenista

Missionário; Antonio Inácio Ribeiro, Diretor de Assalariado da FETAG – BA; e Carlos

Eduardo, Assessor Jurídico da CONTAG.

Aos colegas da Geografia, muito obrigado pela força e apoio, em especial a Edvaldo

Oliveira, grande amigo e sempre à disposição para colaborar com o trabalho

cartográfico; à minha irmã Kellen Tavares de Oliveira e à minha colega Sonia Muñoz

Croveto pela preciosa contribuição na elaboração do abstract e do resumen; à Venozina

Ribeiro, Ione, Nádia, Rosângela Barros, Neurandes, entre tantos companheiros que

colaboraram com este trabalho.

Meus sinceros agradecimentos a um guerreiro na luta pela terra, Diacísio Ribeiro, da

CPT, também grande colaborador no processo de construção desta tese; Aos amigos

Roberto da EBDA, Ricardo Amorim e Idelma, pelo apoio incondicional e incentivo.

Pelo exposto, a elaboração de uma tese requer esforço coletivo e, por esse motivo,

desejo expressar a todos os colaboradores, indistintamente, o MEU MUITO

OBRIGADO!

viii

RESUMO

A expansão do agronegócio do eucalipto na Bahia, fruto do movimento global de

reprodução do capital em direção aos territórios que apresentam condições favoráveis à

elevada produtividade de biomassa, não realizou as promessas de desenvolvimento

regional e de geração de emprego e renda, ao contrário, acirrou ainda mais o conflito

capital x trabalho no campo. A implantação do projeto neoliberal no país e a abertura

econômica foram cruciais para a entrada das grandes empresas multinacionais de papel

e celulose na Bahia, inclusive com a implementação de alianças financeiras e

tecnológicas entre empresas concorrentes no mercado mundial, mas que, em território

nacional, se uniram para fortalecer o poder de concorrência no mercado global. Sob o

apoio incondicional do Estado em seus diferentes extratos de governo, as empresas

concretizaram seus projetos de instalação de fábricas de celulose em Camaçari, Mucuri

e Eunápolis, com a formação de extensos plantios de eucalipto no Nordeste e Sul

Baianos, tornando-se as maiores proprietárias de terras na Bahia. Essa tese pôde ser

comprovada pela redução do número de postos de trabalho no campo e nas fábricas,

pelo aumento da concentração fundiária, pela redução do território disponível para a

reprodução camponesa, assim como a retração do valor percentual da contribuição

social das empresas no período de 2005 a 2012. As empresas são beneficiadas tanto pela

via do financiamento público e mecanismos de isenção fiscal, quanto pela flexibilização

das leis trabalhistas e simplificação do licenciamento ambiental. Tal processo alimenta

os movimentos socioterritoriais, notadamente o Movimento dos Trabalhadores Sem

Terra (MST), e revela a existência de um campo em conflito nos territórios analisados

(Bahia Specialty Cellulose, Suzano Papel e Celulose e Veracel Celulose). Os

acampamentos e assentamentos pesquisados no território da Veracel retratam a

resistência camponesa contra o agronegócio do eucalipto no embate histórico pela

territorialização, como conflito resultante da interação dialética universal entre capital x

trabalho. A presente tese compartilha o materialismo histórico e dialético como método

de interpretação da realidade e reconhece o território como produto de relações de

poder, não apenas no âmbito do Estado e dos grupos dominadores, mas, sobretudo, no

âmbito dos grupos dominados, responsáveis pela produção da riqueza e capazes de agir

como classe e construir novos referenciais de vida e de organização social para além da

lógica do capital e de seus pressupostos.

Palavras-chave: Agronegócio do eucalipto, Território, Precarização do Trabalho,

Campesinato, Luta pela Terra.

ix

ABSTRACT

The expansion of agribusiness eucalyptus in Bahia, result of global movement of

reproduction of the capital towards to territories that are favorable to high biomass

productivity, did not realize the promises of regional development and generation of

employment and income, on the contrary, intensified even more conflict in capital x

working in field. The implementation of the neoliberal project in the country and the

economic opening were crucial for the entry of large multinational pulp and paper in

Bahia, including the implementation of financial and technological alliances between

competitors in the world market, but in national territory, came together to strengthen

the power of competition in the global market. Under the unconditional support of the

State in its different extracts government, companies materialize their projects

installation of pulp mills in Camaçari, Mucuri and Eunapolis with the formation of

extensive eucalyptus plantations in the Northeast and South Baianos, becoming the

largest landowners in Bahia. This thesis could be proved by reducing the number of jobs

in the field and in the factories, by increased land concentration by reducing the

available territory for peasant reproduction, as well as the percentage decrease social

contribution of companies in the period 2005-2012. The companies benefit both through

public funding and tax exemption mechanisms, as the flexible labor laws and

simplification of environmental licensing. This process feeds the socio-territorial

movements, notably the Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), and reveals

the existence of a field in conflict analyzed in territories (Bahia Specialty Cellulose,

Suzano Papel e Celulose e Veracel Celulose). The encampments and settlements

surveyed in the territory Veracel portray the peasant resistance against agribusiness

eucalyptus in the historical struggle for territorial, as conflict resulting from universal

dialectical interaction between capital X working. This thesis shares the historical and

dialectical materialism as a method of interpreting reality and recognize the territory as

a product of power relations, not only within the State and dominant groups, but

especially, within the dominated groups, responsible for the production of wealth and

able to act as a class and build new life references and of social organization beyond the

logic of capital and their presuppositions.

Keywords: Agribusiness eucalyptus, Territory, Precariousness Labor, Peasantry,

Struggle for land.

x

RESUMEN

La expansión del agronegocio de eucalipto en Bahía, fruto del movimiento global de

reproducción de capital orientado a los territorios que presentan condiciones favorables

a la elevada productividad de biomasa, no realizó las promesas de desarrollo regional y

de generación de empleo y renta, al contrario, intensificó aún más el conflicto capital x

trabajo en el campo. La implantación del proyecto neoliberal en el país y la abertura

económica fueron cruciales para la entrada de las grandes empresas multinacionales de

papel y celulosa en Bahía, inclusive con la implementación de alianzas financieras y

tecnológicas entre empresas competidoras en el mercado mundial, más que, en territorio

nacional, se unieron para fortalecer el poder de competencia en el mercado global. Bajo

el apoyo incondicional del Estado en sus diferentes ámbitos de gobierno, las empresas

materializaron sus proyectos de instalación de fábricas de celulosa en Camaçari, Mucuri

y Eunápolis, con la formación de extensas plantaciones de eucalipto en el Nordeste y

Sur de Bahía, convirtiéndose en las mayores propietarias de tierras en Bahía. Esta tesis

puede ser comprobada por la reducción del número de puestos de trabajo en el campo y

en las fábricas, por el aumento de la concentración de tierras, por la reducción de

territorio disponible para el cultivo de los campesinos, así como la disminución del

índice porcentual de la contribución social de las empresas en el período de 2000 a

2010. Las empresas son beneficiadas tanto por la vía del financiamiento público y

mecanismos de exención de impuestos, así como por la flexibilización de las leyes

laborales y simplificación de las licencias ambientales. Dicho proceso alimenta los

movimientos socioterritoriales, particularmente el Movimiento de los Trabajadores Sin

Tierra (MST), y revela la existencia de un campo en conflicto en los territorios

analizados (Bahia Specialty Cellulose, Suzano Papel e Celulose e Veracel Celulose).

Los campamentos y asentamientos investigados en el territorio de Veracel retratan la

resistencia campesina contra el agronegocio de eucalipto en la lucha histórica por la

territorialización, como conflicto resultante de la interacción dialéctica universal entre

capital x trabajo. La presente tesis asume el materialismo histórico y dialéctico como

método de interpretación de la realidad y reconoce el territorio como producto de

relaciones de poder, no apenas en el ámbito del Estado y de los grupos dominadores,

sino, principalmente, en el ámbito de los grupos dominados, responsables por la

producción de riqueza y capaces de actuar como clase y construir nuevos estándares de

vida y de organización social más allá de la lógica del capital y de sus presuposiciones.

Palabras clave: Agronegocio de eucalipto, Territorio, Precarización del Trabajo,

Campesinado, Lucha por la Tierra.

xi

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Território do Agronegócio Silvícola na Bahia................................... 04

Figura 2 – Participação dos dez maiores países produtores mundiais no

conjunto da produção de madeira em tora para papel e celulose - 1975/2011....

30

Figura 3 – Taxa de crescimento dos dez maiores países produtores mundiais

no conjunto da produção de madeira em tora para papel e celulose -

1975/2011...........................................................................................................

31

Figura 4 – Número de países produtores de madeira em tora para papel e

celulose e a participação relativa dos dez maiores no conjunto da produção -

1975/2011...........................................................................................................

33

Figura 5 – Participação dos dez maiores países produtores mundiais no

conjunto da produção de celulose - 1975/2011...............................................

34

Figura 6 – Taxa de crescimento dos dez maiores produtores mundiais no

conjunto da produção de celulose - 1975/2011..................................................

35

Figura 7 – Número de países produtores de celulose e a participação relativa

dos dez maiores no conjunto da produção - 1975/2011......................................

36

Figura 8 – Dez maiores países consumidores mundiais de papéis - 1975/2011 37

Figura 9 – Taxa de crescimento dos dez maiores países produtores mundiais

no conjunto da produção de papel - 1975/2011.................................................

38

Figura 10 – Dez maiores países consumidores de papel- 2011: Consumo per

capita de papel - 1975/2011.................................................................................

39

Figura 11 – International Paper: atuação global em 33 países......................... 42

Figura 12 – Stora Enso: atuação global em 41 países........................................ 44

Figura 13 – Oji Holdings Corporation: atuação global em 14 países............... 46

Figura 14 – Nippon Paper: atuação global em 17 países................................... 48

Figura 15 – Svenska Cellulosa Aktiebolaget (SCA): atuação global em 50

países...................................................................................................................

50

Figura 16 – UPM: atuação global em 66 países................................................ 53

Figura 17 – Smurfit Kappa Group: atuação global em 32 países.................... 54

Figura 18 – Mondi Group: atuação global em 31 países.................................. 56

Figura 19 – Indústria Mundial de Celulose e Papel: Concentração no período

1998/2010............................................................................................................

57

xii

Figura 20 – Brasil: Produção de Celulose no período 1950/1962....................... 62

Figura 21 – Brasil: Produção de Celulose no período 1963/1973....................... 63

Figura 22 – Brasil: Produção e Exportação de Celulose no período 1981/1990. 66

Figura 23 – BNDES: Investimentos no setor de celulose e papel no período

1985/1994............................................................................................................

68

Figura 24 – Brasil: Empresas produtoras de papel – 1997.................................. 70

Figura 25 – Brasil: Empresas produtoras de celulose de mercado – 1997.......... 71

Figura 26 – Brasil: Produção de celulose e papel: 1987/2000............................. 72

Figura 27 – Brasil: Exportações de celulose e papel: Participação relativa no

total da produção no período 1987/2000.............................................................

73

Figura 28 – Brasil: Produção de celulose e papel: 2001/2011............................. 75

Figura 29 – Brasil: Exportações de celulose e papel: Participação relativa no

total da produção no período 2001/2011.............................................................

76

Figura 30 – Destino das exportações brasileiras de celulose e papel - 2011....... 76

Figura 31 – Taxas de crescimento da produção de celulose no período

2001/2010............................................................................................................

78

Figura 32 – Investimentos do DEPACEL/BNDES no setor de papel e celulose

- 2001/2010.........................................................................................................

79

Figura 33 – Investimentos do BNDES na modernização e na ampliação da

capacidade produtiva - 2001/2010.....................................................................

80

Figura 34 – Brasil: As quinze maiores empresas de papel e celulose em

volume de vendas - US$ milhões – 2010............................................................

82

Figura 35 – Brasil: Concentração da produção de papel e celulose:

participação das dez maiores empresas - 1952/2009...........................................

84

Figura 36 – Brasil: Capacidade instalada para produção de celulose - 2009. 85

Figura 37 – Brasil: Capacidade instalada para produção de papel – 2009..... 86

Figura 38 – Capacidade Instalada para produção de celulose e papel – 2009.... 87

Figura 39 – Brasil: Exportações de celulose e papel – 2010............................ 89

Figura 40 – Brasil: Fontes de matérias-primas para a indústria de papel e

celulose - 2010....................................................................................................

90

Figura 41 – Sateri Holdings Limited: Produção de celulose solúvel especial. 102

Figura 42 – Suzano Papel e Celulose: Atuação global em 40 países.......... 108

Figura 43 – Suzano: Produção de celulose e papel - 2012.................................. 110

xiii

Figura 44 – Território da Unidade Mucuri: Produção de madeira em tora em

2011.....................................................................................................................

111

Figura 45 – Unidade Mucuri: consumo de madeira no período 2005/2009........ 113

Figura 46 – Geração de emprego no campo - 2006............................................. 114

Figura 47 – Fibria: Atuação global em 50 países.............................................. 119

Figura 48 – Fibria: Presente em seis Estados...................................................... 122

Figura 49 – Território da Veracel: Produção de madeira em tora em 2011..... 124

Figura 50 – Terminal Marítimo de Belmonte.................................................... 125

Figura 51 – Veracel: Produção de Celulose e Receita Líquida: 2005/2011........ 126

Figura 52 – Terras da Veracel na Bahia - 2012................................................... 127

Figura 53 – Plantios de eucalipto da Veracel..................................................... 128

Figura 54 – Viveiro da Veracel........................................................................... 129

Figura 55 – Programa Produtor Florestal da Veracel: Profissões dos

Proprietários de Terras.........................................................................................

134

Figura 56 – Programa Produtor Florestal da Veracel: Área das Propriedades.... 135

Figura 57 – Veracel: EBITDA 2005/2011.......................................................... 137

Figura 58 – Veracel: Lucro líquido ou prejuízo - 2005/2011.............................. 138

Figura 59 – Construção da Fábrica Veracel: Participação no investimento........ 138

Figura 60 – Veracel: Participação dos impostos na receita líquida no período

2005/2012............................................................................................................

141

Figura 61 – Veracel: Participação dos impostos municipais na receita líquida

no período 2005/2012..........................................................................................

142

Figura 62 – Veracel 2011: Distribuição dos impostos municipais...................... 143

Figura 63 – Eunápolis: PIB industrial e participação no ranking estadual –

2004/2010............................................................................................................

144

Figura 64 – Veracel: Investimentos Sociais no período 2005/2012.................... 146

Figura 65 – Projeto de Expansão da Veracel....................................................... 148

Figura 66 – Território da Bahia Specialty Cellulose: Produção de eucalipto no

período 2000/2011.............................................................................................

164

Figura 67 – Território da Bahia Speciality Cellulose: área de produção de

madeira no período 1985/2011............................................................................

165

Figura 68 – Território da Bahia Speciality Cellulose: área de produção de

lavouras (temporária e permanente) no período 1985/2011................................

166

xiv

Figura 69 – Território da Bahia Speciality Cellulose: área de pecuária de

bovinos no período 1985/2011...........................................................................

167

Figura 70 – Território da Bahia Speciality Cellulose: taxa de crescimento da

Urbanização no período 1980/2010...................................................................

169

Figura 71 – Território da Bahia Speciality Cellulose: Coeficiente de Gini no

período 1985/2006...............................................................................................

171

Figura 72 – Entre Rios: Estrutura Fundiária – 1985/2006................................... 172

Figura 73 – Território da Suzano Papel e Celulose – Unidade Mucuri:

Produção de eucalipto 2000/2011........................................................................

174

Figura 74 – Território da Suzano Papel e Celulose – Unidade Mucuri: área de

produção de madeira no período 1985/2011.......................................................

176

Figura 75 – Território da Suzano Papel e Celulose – Unidade Mucuri: área de

produção de lavouras (temporária e permanente) no período 1985/2011...........

177

Figura 76 – Território da Suzano Papel e Celulose – Unidade Mucuri: área de

pecuária de bovinos no período 1985/2011........................................................

178

Figura 77 – Território da Suzano Papel e Celulose – Unidade Mucuri: taxa de

crescimento da Urbanização no período 1980/2010.................................

179

Figura 78 – Território da Suzano Papel e Celulose – Unidade Mucuri:

Coeficiente de Gini no período 1985/2006..........................................................

180

Figura 79 – Caravelas: Estrutura Fundiária – 1985/2006.................................... 181

Figura 80 – Empresa Plantar utilizando o correntão em um desmatamento

ilegal nas terras da Veracruz Florestal em 1993.................................................

184

Figura 81 - Panfleto distribuído pelo GFP convidando à população de

Eunápolis para protestar a favor da Veracruz Florestal em 16 de junho de

1993....................................................................................................................

187

Figura 82 – Carta de Eunápolis: panfleto desenvolvimentista distribuído pelo

GFP no dia 16 de junho de 1993........................................................................

188

Figura 83 – Desemprego na Europa – Maio de 2013.......................................... 189

Figura 84 – Panfleto distribuído pela empresa Marco Florestal no município

de Eunápolis em Junho de 1993.........................................................................

191

Figura 85– Panfleto distribuído pela Câmara de Vereadores no município de

Eunápolis em Junho de 1993..............................................................................

192

xv

Figura 86 – Panfleto distribuído pela Deputado Federal João Almeida no

município de Eunápolis em Junho de 1993.....................................................

193

Figura 87 – Fábrica Veracel.............................................................................. 196

Figura 88– Território da Veracel Celulose: Produção de eucalipto no período

2000/2011............................................................................................................

197

Figura 89 – Território da Veracel Celulose: Participação percentual dos três

principais municípios produtores no conjunto da produção do território

Veracel no período 2002/2011..........................................................................

198

Figura 90 – Território da Veracel: área de produção de madeira no período

1985/2011............................................................................................................

199

Figura 91 – Território da Veracel: área de produção de lavouras (temporária e

permanente) no período 1985/2011.....................................................................

200

Figura 92 – Território da Veracel: área de pecuária de bovinos no período

1985/2011...........................................................................................................

201

Figura 93 – Território da Veracel: taxa de crescimento da Urbanização no

período 1980/2010...............................................................................................

203

Figura 94 – Território da Veracel: Coeficiente de Gini no período 1985/2006. 204

Figura 95 – Porto Seguro: Estrutura Fundiária – 1995/2006............................... 205

Figura 96 – Suzano: Quadro Funcional 2004/2010............................................. 225

Figura 97 – Fibria: Quadro Funcional 2010/2012............................................... 226

Figura 98 – Veracel: empregos gerados no período 2005/2012........................ 230

Figura 99- Veracel: Empregados Próprios – 2012: Composição salarial por

cargo....................................................................................................................

231

Figura 100 – Viveiro da Veracel: Salários 2013................................................. 233

Figura 101 – Greve dos funcionários da Veracel: março/2013......................... 234

Figura 102 – Veracel: processo produtivo altamente mecanizado................... 236

Figura 103 – Território da BSC: Agricultura Familiar e Não Familiar:

Número, Área e Pessoal Ocupado (em %) – 2006..............................................

241

Figura 104 – Território da BSC: Assalariamento – 2006.................................... 242

Figura 105 – Território da Suzano Unidade Mucuri: Agricultura Familiar e

Não Familiar: Número, Área e Pessoal Ocupado (em %) – 2006.......................

244

Figura 106 – Território da Suzano Unidade Mucuri: Assalariamento – 2006....

244

xvi

Figura 107 – Território da Veracel: Agricultura Familiar e Não Familiar:

Número, Área e Pessoal Ocupado (em %) – 2006..............................................

245

Figura 108 – Território da Veracel: Assalariamento – 2006............................... 246

Figura 109 – Território da Veracel Celulose: Resistência Camponesa em três

municípios - 1985/2012.......................................................................................

248

Figura 110 – Território da Veracel Celulose: Assentamentos Rurais realizados

pelo INCRA........................................................................................................

249

Figura 111 – Território da Veracel Celulose: Resistência Camponesa: Locais

Visitados..............................................................................................................

250

Figura 112 – Fotos do Assentamento Lulão........................................................ 252

Figura 113 – Assentamento Lulão: Distribuição da terra – 2013........................ 253

Figura 114 – Assentamento Lulão: Rendimento das famílias – 2013................. 254

Figura 115 – Fotos do Assentamento Ojefferson................................................ 256

Figura 116 – Assentamento Ojefferson: Procedência das famílias – 2013......... 258

Figura 117: Assentamento Ojefferson: Rendimento das famílias – 2013........... 258

Figura 118 – Fotos do Assentamento Milton Santos........................................... 260

Figura 119 – Assentamento Milton Santos: Procedência das Famílias............... 261

Figura 120 – Assentamento Milton Santos: Distribuição da terra – 2013.......... 262

Figura 121 – Assentamento Milton Santos: Rendimento das famílias – 2013.... 262

Figura 122 – Croqui do Pré-Assentamento 25 anos do MST............................. 266

Figura 123 – Fotos do Pré-Assentamento 25 anos do MST................................ 267

Figura 124 – Pré-Assentamento 25 anos do MST: Procedência das famílias..... 268

Figura 125 – Pré-Assentamento 25 anos do MST: Rendimento das famílias –

2013.....................................................................................................................

269

Figura 126 – Criação do Acampamento Irmã Dorothy Stang............................. 271

Figura 127 – Croqui do Acampamento Irmã Dorothy Stang............................. 273

Figura 128 – Fotos do Acampamento Irmã Dorothy Stang................................. 274

Figura 129 – Acampamento Irmã Dorothy Stang: Procedência das famílias –

2013.....................................................................................................................

275

Figura 130 – Acampamento Irmã Dorothy Stang: Rendimento das famílias –

2013.....................................................................................................................

275

xvii

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Coeficiente de Gini: Graus de Concentração Fundiária.................... 21

Tabela 2 – Cálculo da amostragem para os acampamentos e assentamentos

localizados no território da Veracel.....................................................................

22

Tabela 3 – Celulose de fibra curta: rotação e rendimento globais...................... 29

Tabela 4 – Celulose de fibra longa : rotação e rendimento globais.................... 29

Tabela 5 – Brasil: Capacidade nominal instalada para produção de celulose –

1985.....................................................................................................................

67

Tabela 6 – Maiores empresas mundiais de papel e celulose – 1996................... 74

Tabela 7 – Dez maiores produtores mundiais de celulose – 2001/2010.............. 77

Tabela 8 – Maiores empresas mundiais de papel e celulose – 2010................. 83

Tabela 9 – Projeto de Duplicação da Veracel - Cálculo da Evapotranspiração

Total Anual das árvores de eucalipto...................................................................

150

Tabela 10 – Projeto de Duplicação da Veracel – Relação entre

Evapotranspiração Total Anual das árvores de eucalipto e Pluviometria

Regional...............................................................................................................

151

Tabela 11 – Quantitativo de terras atuais e futuras da Veracel........................... 157

Tabela 12 – Grandes empresas do setor de papel e celulose: taxas de

crescimento do número de empregados e das vendas no período 2000/2010.....

224

xviii

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Fontes consultadas e especificação das informações coletadas para

a tese...................................................................................................................

18

Quadro 2 – Datas prováveis das primeiras fábricas de papel em vários países... 27

Quadro 3 – Investimentos do BNDES no setor de celulose – 2001/2010........... 81

xix

SUMÁRIO

DEDICATÓRIA............................................................................................ iv

AGRADECIMENTOS................................................................................. v

RESUMO...................................................................................................... vii

ABSTRACT................................................................................................... viii

RESUMEN................................................................................................... ix

LISTA DE FIGURAS................................................................................... x

LISTA DE TABELAS................................................................................... xvi

LISTA DE QUADROS................................................................................. xvii

1. INTRODUÇÃO........................................................................................ 01

1.1 Perscrutando a propósito do método................................................ 05

1.2 Território, apropriação e controle......................................................... 09

1.3 Considerações sobre os procedimentos de pesquisa............................ 16

2. EM BUSCA DE TERRITÓRIOS PARA A REPRODUÇÃO

CAPITALISTA .......................................................................................

25

2.1 A territorialização das empresas de papel e celulose no

Mundo......................................................................................................

26

2.1.1 A International Paper........................................................................... 41

2.1.2 A Stora Enso......................................................................................... 43

2.1.3 A Oji Holdins Corporation..................................................................... 45

2.1.4 A Nippon Paper..................................................................................... 47

2.1.5 A Svenska Cellulosa Aktiebolaget (SCA)............................................ 49

2.1.6 A UPM................................................................................................. 52

2.1.7 A Smurfit Kappa................................................................................... 52

2.1.8 A Mondi................................................................................................ 55

2.2 A territorialização das empresas de papel e celulose no Brasil......... 58

xx

3. O PAPEL DO ESTADO E SEUS AGENTES NO

EMPREENDIMENTO DA EUCALIPTOCULTURA NA

BAHIA........................................................................................................

92

3.1 O Estado multitarefas do capital........................................................... 92

3.2 A territorialização das empresas de produção de eucalipto e de

celulose na Bahia........................

99

3.2.1 A Bahia Speciality Cellulose (BSC)...................................................... 101

3.2.2 A Suzano Papel e Celulose................................................................... 105

3.2.3 A Veracel.............................................................................................. 115

3.2.3.1 Os próximos territórios a serem incorporados................................... 147

4. A GEOGRAFIA DESIGUAL DA ACUMULAÇÃO CAPITALISTA

DAS EMPRESAS DE PRODUÇÃO DE EUCALIPTO E DE

CELULOSE NA BAHIA .......................................................................

162

4.1 O território da Bahia Speciality Cellulose............................................ 163

4.2 O território da Suzano Papel e Celulose.............................................. 173

4.3 O território da Veracel........................................................................... 182

5. A PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO NO CONTEXTO DA

CRISE ESTRUTURAL DO CAPITAL E RESISTÊNCIA

CAMPONESA NOS TERRITÓRIOS DA EUCALIPTOCULTURA

NA BAHIA..............................................................................................

210

5.1 A expansão aparentemente ilimitada do capital em escala ampliada 214

5.2 A precarização do trabalho no setor de papel e celulose.................... 224

5.2.1 A Bahia Specialty Cellulose.................................................................. 227

5.2.2 A Unidade Mucuri................................................................................ 229

5.2.3 A Veracel.............................................................................................. 230

5.3. A Resistência Camponesa............................................................... 238

5.3.1 A resistência camponesa no território da BSC................................... 241

5.3.2 A resistência camponesa no território da Suzano Unidade Mucuri... 243

5.3.3 A resistência camponesa no território da Veracel............................... 245

5.3.3.1 Assentamento Lulão............................................................................ 250

xxi

5.3.3.2 Assentamento Ojefferson................................................................... 255

5.3.3.3 Assentamento Milton Santos.............................................................. 259

5.3.3.4 Pré-Assentamento 25 Anos do MST................................................... 264

5.3.3.5 Acampamento Irmã Dorothy Stang.................................................... 270

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................ 279

6.1 O CONFLITO IRRECONCILIÁVEL ENTRE O CAMPESINATO

E O AGRONEGÓCIO...............................................................................

279

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS................................................. 301

1

1. INTRODUÇÃO

[...] O princípio epistemológico segundo o qual o ponto de vista do

proletariado é o que oferece a melhor possibilidade objetiva de um

conhecimento da verdade não significa absolutamente que basta se colocar

nesse ponto de vista para conhecer a verdade. Uma grande montanha permite

uma melhor visão da paisagem do que uma pequena colina, mas um míope

situado no cume da montanha não verá muito... por outro lado, o ponto de

vista das outras classes, mesmo sendo inferior, não produz somente mentiras,

inverdades e erros (LOWY, Método Dialético e Teoria Política, p. 33).

Na Bahia, o avanço do capital no campo facilitado pelo Estado através das

políticas de abertura econômica e mecanismos públicos de financiamento promoveu

transformações espaciais e alterações nas relações de trabalho na busca de sua

reprodução ampliada. Esse processo não se deu nem se dá sem conflitos. O outro lado

do par dialético resiste e luta pela terra: os camponeses despossuídos e despojados da

terra que agora dispõem apenas da sua força de trabalho se organizam para o embate

contra o capital, inclusive tentando impedir a expansão do eucalipto para outros

municípios baianos, com o apoio de organizações como a Comissão Pastoral da Terra

(CPT) e de movimentos sociais como o Movimento dos Sem Terra (MST). Querem a

terra de trabalho e não a terra de negócio Assim, a explicação da expansão da

eucaliptocultura na Bahia não pode ser divorciada do movimento global do capital, mas

como uma singularidade dentro da totalidade, quando o território baiano passa a

despertar mais efetivamente os interesses do capital no seu desenvolvimento desigual e

combinado.

Nesse contexto, a implantação do projeto neoliberal no país e a abertura

econômica foram cruciais para a entrada das grandes empresas multinacionais de papel

e celulose na Bahia, inclusive com a implementação de alianças financeiras e

tecnológicas entre empresas concorrentes no mercado mundial, mas que, em território

nacional, se uniram para fortalecer o poder de concorrência no mercado global. Sob o

apoio incondicional do Estado em seus diferentes estratos de governo, as empresas

concretizaram seus projetos de instalação de fábricas de celulose em Camaçari, Mucuri

e Eunápolis, com a formação de extensos plantios de eucalipto no Nordeste e Sul

Baianos, tornando-se as maiores proprietárias de terras na Bahia.

Para convencer as populações locais e obter o licenciamento para as suas

atividades, as empresas de papel e celulose com o aval do Estado difundiram o discurso

do desenvolvimento e da geração de emprego e renda, fazendo crer que milhares de

2

empregos seriam criados e que a atividade de produção de celulose seria a mola

propulsora para elevar a qualidade de vida da população, bem como atrair outras

empresas para a região.

Nesta tese, parte-se da ideia de que o caráter contraditório do desenvolvimento

leva a um distanciamento entre os discursos e os resultados do agronegócio do

eucalipto. Se o desenvolvimento promete melhorar as condições de vida da

humanidade, os procedimentos adotados para o atingimento dos objetivos aprofundam

ainda mais as condições de pobreza e miséria.

Nesse sentido, defende-se a tese de que a territorialização das empresas de

produção de eucalipto e de celulose na Bahia, apoiada pelo Estado, não realizou as

promessas de desenvolvimento regional e de geração de emprego e renda, acirrando

ainda mais os conflitos capital X trabalho no campo.

Para a defesa desta tese, várias hipóteses foram testadas no trabalho de pesquisa,

que envolveu a análise – muitas vezes exaustiva – de dados estatísticos oficiais e de

dados primários obtidos nas visitas à área de estudo. As principais hipóteses levantadas

para condução da análise científica em direção à abordagem do tema pretendido foram:

1. A territorialização das empresas de produção de eucalipto e de celulose na Bahia

encontrou suporte financeiro, técnico e legal nos diferentes níveis de Estado; 2. A

territorialização das empresas de produção de eucalipto e de celulose na Bahia

aumentou a concentração fundiária e reduziu o território disponível para a reprodução

camponesa; 3. A expansão da eucaliptocultura no território baiano ocorre paralelamente

à redução do número de postos de trabalho no campo e nas fábricas, assim como à

retração do valor percentual da contribuição social das empresas.

A realidade do avanço da eucaliptocultura nas regiões Sul Baiano e Nordeste

Baiano, compreendidas nessa pesquisa como o território da expansão da

eucaliptocultura e as contradições que estão na base dos conflitos capital X trabalho

requerem a compreensão de que o que acontece aí não está desarticulado da totalidade

existente no campo brasileiro, nem do movimento global de reprodução do capital.

Entretanto, antes de tanger acerca do método que escolhemos para interpretar

esse fenômeno, torna-se imperativo apresentar o recorte espacial escolhido.

Com base nos dados divulgados pelo IBGE (1990/2011) sobre os municípios

produtores de madeira em tora para papel e celulose no estado da Bahia, demonstrados

3

na Figura 1, verifica-se que eles se localizam em duas áreas distintas do território

baiano, onde atuam três grandes empresas produtoras de papel e celulose.

Do ponto de vista cartográfico oficial os municípios destacados estão localizados

nas mesorregiões ibegeanas Nordeste Baiano, Centro Norte Baiano, Metropolitana de

Salvador e Sul Baiano. As mesorregiões são unidades geográficas maiores que as

microrregiões e menores que o estado, tendo sido fixadas de acordo com a Divisão

Regional do Brasil para fins estatísticos, com a Resolução PR-51, de 1º de janeiro de

19901, do Departamento de Geografia da Diretoria de Geociências do IBGE (IBGE,

1998).

Para a nossa pesquisa, o principal parâmetro para a definição do recorte espacial

é a penetração do capital no campo baiano e isso se traduz nas áreas produtoras de

madeira em tora para papel e celulose. Assim, as regiões Nordeste Baiano e Sul Baiano

utilizadas nesta pesquisa apresentam somente os municípios produtores de eucalipto e,

portanto, diferem da classificação ibegeana.

Estando o território da eucaliptocultura dotado de condições que atraem as

empresas transnacionais, optamos por investigar a partir dos seguintes objetivos:

Analisar as contradições e os conflitos que se estabelecem a partir da relação capital X

trabalho no processo de expansão capitalista no território baiano através da

eucaliptocultura e seus rebatimentos no campesinato e na precarização do trabalho;

Elucidar a participação do Estado na implantação e desenvolvimento dos projetos do

agronegócio do eucalipto; Desvelar o discurso do desenvolvimento e da modernização

como forma de justificativa ideológica para obter o consentimento das populações

locais; Discutir as transformações verificadas na estrutura fundiária, na composição das

populações urbana e rural e na produção de alimentos no período de implantação e

expansão da eucaliptocultura; Discutir os resultados alcançados após duas décadas de

existência do agronegócio do eucalipto na Bahia; Refletir sobre a ação dos movimentos

sociais presentes na Bahia que resistem ao avanço do capital via monocultura do

eucalipto.

1 A atual Divisão Regional em Mesorregiões e Microrregiões Geográficas para fins estatísticos foi criada

pelo IBGE em 1990 em substituição à Divisão Regional em Microrregiões Homogêneas de 1968, que

apresentava, prioritariamente, critérios naturais para o recorte espacial. Na nova classificação, procurou-

se priorizar o processo social: Entende-se por mesorregião uma área individualizada em uma Unidade da

Federação que apresenta formas de organização do espaço geográfico definidas pelas seguintes

dimensões: o processo social como determinante, o quadro natural como condicionante e a rede de

comunicação e de lugares como elemento da articulação espacial (IBGE, 1990, p. 8).

4

Figura 1 – Território do Agronegócio do Eucalipto na Bahia.

5

Para atendimento dos propósitos destacados, o método que assegura essa forma

de entender a produção geográfica do espaço é o materialismo histórico-dialético, em

que a análise é norteada segundo três aspectos: Primeiro: a realidade é concebida

enquanto movimento e contradição como a forma de ser dos fenômenos (lógica

dialética); Segundo: a existência é entendida como anterior à consciência (postura

materialista); finalmente: o fenômeno só pode ser explicado quando apreendido em sua

gênese e em seu desenvolvimento (análise histórica)2.

Nessa direção, são considerados os processos sociais para entender o movimento

de produção do espaço em suas várias escalas e o papel que cada nível ocupa na divisão

social e territorial do trabalho.

1.1 Perscrutando a propósito do método

A lógica concreta (dialética) concebe o real como um todo estruturado que se

desenvolve e se cria através de conexões recíprocas entre o todo e as partes, num

movimento profundo que procura apreender a essência que se esconde sob a aparência

do fenômeno em todas as suas contradições. Para Lefebvre (1991, p. 238) nenhum

fenômeno pode ser compreendido de forma isolada e na pesquisa dialética cada

fenômeno é entendido no conjunto de suas relações com os demais fenômenos (Lei da

Interação Universal):

Nada é isolado. Isolar um fato, um fenômeno, e depois conservá-lo pelo

entendimento nesse isolamento, é privá-lo de sentido, de explicação, de

conteúdo. É imobilizá-lo artificialmente, matá-lo. É transformar a natureza —

através do entendimento metafísico — num acúmulo de objetos exteriores

uns aos outros, num caos de fenômenos.

Mas isso não quer dizer que Lefebvre considere dispensável a cisão do todo no

processo de conhecimento; o que está sendo ressaltado é que o pensamento não pode

parar nessa etapa. A separação é necessária para o entendimento do real, mas isso reflete

somente um aspecto, uma aparência, que se transforma em erro quando é mantida3. Para

2 LEFEBVRE, Henri. Lógica Formal Lógica Dialética. 5. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,

1991; LOWY, Michael. Método Dialético e Teoria Política. 4.ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1989.

MORAES, Antonio Carlos Robert; COSTA, Wanderley Messias da. Geografia Crítica: a valorização

do espaço. 4.ed. São Paulo: Hucitec, 1999. 3 Para Lefebvre (1991, p. 238) o método dialético busca um movimento profundo, essencial que

aparentemente se esconde sob o movimento superficial dos fenômenos: Deixando de isolar os fatos e os

fenômenos, o método dialético reintegra-se em seu movimento: movimento interno, que provém deles

mesmos, e movimento externo, que os envolve no devir universal. Os dois movimentos são inseparáveis.

Nesse sentido, ao não isolar os fatos e os fenômenos, o método dialético eleva a nível superior as noções

de relação, de identidade e diferença, de oposição e contradição, num movimento universal em que as

relações e as contradições aparecem unidas e atuando umas sobre as outras (Lei do Movimento

Universal).

6

Kosik (1995, p. 57) a teoria materialista considera os fatos em um duplo contexto: o

contexto da realidade, onde os fatos existem originária e primordialmente, e o

contexto da teoria, onde os fatos são arrancados do contexto do real e imediatamente

ordenados:

O homem não pode conhecer o contexto do real a não ser arrancando os fatos

do contexto, isolando-os e tornando-os relativamente independentes. Eis aqui

o fundamento de todo conhecimento: a cisão do todo. Todo conhecimento é

uma oscilação dialética (dizemos dialética porquanto também existe uma

oscilação metafísica, que parte de ambos os pólos considerados como

grandezas constantes e registra as suas relações exteriores e reflexivas),

oscilação entre os fatos e o contexto (totalidade), cujo centro ativamente

mediador é o método de investigação.

O próprio Lefebvre (1991, p. 181), ao considerar o movimento da pesquisa

dialética afirma que o pensamento precisa avançar reunindo aquilo que separou para

reencontrar o conteúdo, o movimento, a unidade concreta:

[...] Tendo de penetrar nos fatos, o pensamento começa assumindo pontos de

vista unilaterais, que aprofunda e supera. Na condição de não parar, de não

estancar teimosamente numa das propriedades descobertas, ele reencontra o

conteúdo, o movimento, a unidade (concreta, completa) dos pontos de vista

unilaterais assumidos pelo entendimento.

Para Kosik (1995, p. 50) o conhecimento humano não depende simplesmente de

uma somatória de fatos com início e fim determinados, mas da compreensão dialética de

que as partes se encontram em interação e conexão entre si e com o todo e que o todo

não está situado acima das partes, uma vez que o todo também é recriado continuamente

no movimento de interação das partes:

Se a realidade é um todo dialético e estruturado, o conhecimento concreto da

realidade não consiste em um acrescentamento sistemático de fatos a outros

fatos, e de noções a outras noções. É um processo de concretização que

procede do todo para as partes e das partes para o todo, dos fenômenos para a

essência e da essência para os fenômenos, da totalidade para as contradições

e das contradições para a totalidade.

Enquanto a lógica formal isola os fatos e entende as contradições de forma a

destruir um termo pelo outro, na contradição dialética o pensamento transpassa essas

contradições e procura compreender as relações entre os termos, a unidade e o

movimento que origina os contraditórios (Lei da Unidade dos Contraditórios). Segundo

Kosik (1995, p. 60) que trabalha com o conceito de Totalidade Concreta é preciso

reconhecer a conexão recíproca entre as contradições e a totalidade:

O problema não consiste em reconhecer a prioridade da totalidade face às

contradições, ou a das contradições face a totalidade, precisamente porque tal

separação elimina tanto a totalidade quanto as contradições de caráter

dialético: a totalidade sem contradições é vazia e inerte, as contradições fora

da totalidade são formais e arbitrárias.

7

Assim, ao se descobrir um termo contraditório de outro é preciso avançar na

análise para não incorrer no erro de estabelecer uma relação tautológica e excludente

entre eles, procurando, através do pensamento dialético captar o movimento que gera as

contradições em sua conexão recíproca com a totalidade.

A contradição na lógica formal permanece na generalidade abstrata e na

tautologia porque não há conexões nem unidade entre os contraditórios, permanecendo

como uma relação de exclusão: a existência de um significa a destruição do outro (ou

um, ou outro). A contradição, nestes termos, é vista como oposição, onde os dois

contraditórios são colocados um à margem do outro, bem diferente do método dialético

que, conforme Lefebvre (1991, p. 238) “busca captar a ligação, a unidade, o movimento

que engendra os contraditórios, que os opõe, que faz com que se choquem, que os

quebra ou os supera”.

Na visão lefebvriana, as condições econômicas do mundo moderno (com o

avanço das forças produtivas industriais) engendram as contradições entre classes

concorrentes, grupos antagonistas, nações imperialistas que devem ser vistas como

totalidade e unidade dos contraditórios. Essas contradições de classe derivam do caráter

privado da apropriação da riqueza socialmente produzida que Marx desvendou no

século XIX ao analisar a sociedade capitalista de seu tempo:

Esse ponto de vista de classe domina em todo O Capital e fundamenta a

unidade dialética da ciência e da crítica (político-moral); por exemplo, o

conceito central da obra, a mais-valia, não tem indicações morais para uma

ética burguesa, pois a venda da força de trabalho se faz segundo todas as

regras do mercado, segundo um contrato “livre” e “justo”. É ao considerar o

problema do ponto de vista do proletariado que Marx encontra na mais-valia

a explicação-denúncia do mecanismo da exploração dos trabalhadores e da

injustiça profunda do capitalismo (LOWY, 1989, p. 71).

Nesse sentido, aplicando o método dialético, Marx pôde explicar o processo de

alienação e reificação da vida social que ocorre no capitalismo, numa análise profunda

de cada categoria deste modo de produção, onde elas são apreendidas, analisadas,

definidas e conceitualizadas dentro de uma visão histórica. Em outras palavras, a

historicidade dos fenômenos indica que toda transformação de um ser, envolvendo seu

nascimento e seu desaparecimento, não se dá apenas por transformações quantitativas.

(Transformação da Quantidade em Qualidade – Lei dos Saltos)4.

4 Para Lefebvre (1991, p. 239): [...] a lei dos saltos é a grande lei da ação. A ação e o conhecimento não

podem criar nada já pronto e acabado. O momento da ação, do fator “subjetivo”, aparece quando —

reunidas já todas as condições objetivas — basta um fraco impulso proveniente do sujeito” para que o

8

Nesse contexto, não há uma descontinuidade absoluta, o processo continua, o

movimento continua; não há uma separação efetiva, a unidade é sempre renovada,

dando a ideia de um movimento em espiral (Lei do Desenvolvimento em Espiral – da

Superação), onde ocorre um retorno acima do superado, elevando seu nível e ampliando

seus limites.

Para que haja a superação da realidade é preciso que haja o contraditório, a luta

entre termos que se negam mutuamente até um nível onde a intensificação das

contradições instala a crise e a necessidade de superação, vista aqui como o resultado da

negação recíproca entre os termos, ou seja, surge a negação da negação. Lefebvre

(1991, p. 231) afirma que:

A superação implica, por conseguinte, um retorno ao passado: um

aprofundamento do passado. Em cada etapa do desenvolvimento da natureza,

da vida, do pensamento, o passado é reencontrado — mas superado e, por

isso mesmo, aprofundado, liberado de suas limitações, mais real que no

início. Esse sentido da superação deve ser longamente meditado, até que se

possa captar toda sua profundidade.

Portanto, para a realização desta pesquisa, procurar-se-á utilizar como suporte

metodológico o materialismo histórico-dialético e a teoria crítica marxista que

possibilitam uma melhor apreensão da realidade objetiva5.

Assim, compreender a realidade a partir das suas contradições é o eixo central da

teoria crítica marxista que, com rigor e profundidade, desvenda o caráter privado de

apropriação da produção social da riqueza, sendo esta a contradição fundamental do

modo de produção capitalista e que, para sua manutenção e reprodução deriva todo o

processo de alienação do trabalhador.

Ao longo do tempo, essa apropriação da mais valia social pelas elites capitalistas

aprofunda o processo de diferenciação social, que amplia o fosso entre capitalistas e

trabalhadores, cujas relações contraditórias se inscrevem no território que também se

desenvolve de forma desigual, uma vez que a produção/destruição/transformação do

território depende do tipo de relações socais de produção que são travadas por cada

sociedade. Sendo assim, o território é a síntese dialética da sociedade e se ela é

salto se opere. [...] O salto dialético implica, simultaneamente, a continuidade (o movimento profundo

que continua) e a descontinuidade (o aparecimento do novo, o fim do antigo). 5 Destacamos as grandes leis do método dialético: Lei da Interação Universal (da conexão, da mediação

recíproca de tudo o que existe); Lei do Movimento Universal; Lei da Unidade dos Contraditórios;

Transformação da Quantidade em Qualidade (Lei dos Saltos); Lei do Desenvolvimento em Espiral (da

Superação). Ler em LEFEBVRE, Henri. Lógica Formal Lógica Dialética. 5. ed. Rio de Janeiro:

Civilização Brasileira, 1991.

9

caracterizada pela luta de classes sociais antagônicas, o território produzido tem a marca

da diferenciação e precisa ser entendido como um espaço transformado pelo trabalho,

imerso em relações de poder, onde a classe capitalista tenta manter a apropriação e o

controle. É nessa direção que o conceito de território adotado nessa pesquisa deve ser

revelado.

1.2 Território, apropriação e controle

O conceito de território variou muito ao longo do tempo e, mesmo atualmente,

há diversas abordagens teóricas que refletem o pensamento dos diversos autores que

utilizam esse conceito, à medida que tentam explicar a produção do espaço como

rebatimento da atuação da sociedade ao organizar-se para produzir os bens necessários à

sua existência.

No âmbito da ciência geográfica, acredita-se que Friedrich Ratzel foi o primeiro

autor a utilizar o conceito de território, entendido como uma “determinada porção da

superfície terrestre apropriada por um grupo humano” (MORAES, 1990, p. 23).

Para Ratzel , bastante influenciado pela teoria evolucionista de Darwin, Spencer

e Lamarck, o território existe na relação de apropriação que um determinado grupo

humano realiza sobre uma porção da superfície terrestre a partir da necessidade da

garantir o espaço vital para a sobrevivência e a riqueza do próprio grupo:

Ratzel considerava que o homem, como uma espécie entre os seres vivos,

procura ampliar seu território à custa dos vizinhos. Partindo da ideia de que

as condições naturais condicionam as formas de vida, chegou à conclusão de

que os agrupamentos humanos, quando se vêem face a um território limitado,

buscam ampliar seu espaço de vida, mesmo em detrimento dos seus vizinhos

(LENCIONI, 1999, p.82).

O conceito de espaço vital está relacionado ao ponto de equilíbrio entre o

quantitativo populacional de uma dada área e os recursos naturais e tecnológicos

existentes nesse território capazes de satisfazer suas necessidades, determinando, dessa

forma, a conquista ou não de novos territórios, mesmo que isso implicasse em conflitos

com outros povos (MORAES, 1987). Para Ratzel (1990, p. 75-76) a missão última do

Estado é e continuará sendo a de proteger o território:

Se o território é desfrutado apenas temporariamente, a propriedade que se

mantém aí é também temporária. Quanto mais sólido se torna o vínculo

através do qual a alimentação e a moradia prendem a sociedade ao solo, tanto

mais se impõe à sociedade a necessidade de manter a propriedade do seu

território. Diante deste último, a tarefa do Estado continua sendo em última

10

análise apenas uma: a da proteção. O Estado protege o território contra as

violações vindas de fora, que poderiam reduzi-lo.

A ideia de progresso está ligada ao maior uso dos recursos do meio e a

necessidade de manter o território é que representa a gênese do Estado: “Quando a

sociedade se organiza para defender o território, transforma-se em Estado” (RATZEL

apud MORAES, 1987, p. 56). Nesse caso, além da função de proteger o território, o

Estado também contribui para um melhor aproveitamento dos recursos e para gerenciar

todos os meios necessários para aumentar a sua própria potência, culminando com o seu

incremento territorial.

A unificação tardia da Alemanha, o avanço do modo de produção capitalista e o

inevitável choque com outros países também em fase de crescimento são as condições

históricas sem as quais não se pode entender o pensamento de Ratzel, mostrando que as

fronteiras são móveis na medida em que as comunidades crescem e, nesse processo,

rompem (movem) as fronteiras, sendo o território fruto das relações de poder que

podem tanto levar ao progresso – quando ocorre a anexação territorial – ou ao fracasso

– quando ocorre a perda de territórios.6 Na visão ratzeliana não é possível considerar

nem mesmo o Estado mais simples (ou a sociedade mais simples) sem considerar

também o seu território correspondente, sendo a união desses organismos ao solo uma

consequência natural da ligação evidente entre a criatura humana e a Terra. Para Ratzel

(1990, p. 74) o território é fundamental mesmo para aqueles povos em via de

incremento, quando essa importância possa parecer menos evidente, mas é na

decadência que se pode verificar o quanto a manutenção do território é essencial para

um povo:

Um povo decai quando sofre perdas territoriais. Ele pode decrescer em

número, mas ainda assim manter o território no qual se concentram seus

recursos; mas se começa a perder uma parte do território, esse é sem dúvida o

princípio da sua decadência futura.

Dessa forma, os conceitos e categorias de análise trazem uma dimensão espaço-

temporal importante e espelham diversas concepções teóricas e metodológicas dentro da

Geografia. Para Raztel os conceitos de território e espaço vital são centrais. Em um

contexto em que a Alemanha se ressente da falta de terras, de recursos de mercado e de

matérias-primas, há o receio por sua vulnerabilidade. Com a vitória de Napoleão na

6 Notas de Sala de Aula da Disciplina História do Pensamento Geográfico ministrada pela Profª Drª

Alexandrina Luz Conceição.UFS-NPGEO. 2010.

11

França, avança um sentimento de necessidade de procurar espaços para se expandir, daí

o desenvolvimento mais forte do conceito de território a partir de Ratzel.

Raffestin, a partir de 1976 escreve a Geografia do Poder, obra circunscrita

historicamente dentro do movimento de renovação da Geografia e que evidenciou a

preocupação do autor em elaborar conceitos que pudessem fortalecer essa disciplina

como corpus científico, a exemplo do esforço teórico em fazer a distinção entre espaço

e território. Nessa obra, publicada pela primeira vez em 1980, Raffestin entende o

território como posterior ao espaço que se forma a partir de uma ação humana em

qualquer nível:

É essencial compreender bem que o espaço é anterior ao território. O

território se forma a partir do espaço, é o resultado de uma ação conduzida

por um ator sintagmático (ator que realiza um programa) em qualquer nível.

Ao se apropriar de um espaço, concreta ou abstratamente (por exemplo, pela

representação), o ator “territorializa” o espaço. Lefebvre mostra muito bem

como é o mecanismo para passar do espaço ao território: “A produção de um

espaço, o território nacional, espaço físico, balizado, modificado,

transformado pelas redes, circuitos e fluxos que aí se instalam: rodovias,

canais, estradas de ferro, circuitos comerciais e bancários, auto-estradas e

rotas aéreas, etc.” O território, nessa perspectiva, é um espaço onde se

projetou um trabalho, seja energia e informação, e que, por consequência,

revela relações marcadas pelo poder. O espaço é a “prisão original”, o

território é a prisão que os homens constroem para si (RAFFESTIN, 1993, p.

143).

Para Raffestin, a apropriação do espaço é a condição básica para a existência do

território, que surge a partir da ação humana conduzida por um ator sintagmático. Para

realizar essa análise, o autor busca em Greimas7 os conceitos sobre os dois tipos de

atores coletivos: os sintagmáticos e os paradigmáticos. Atores sintagmáticos são aqueles

que realizam um determinado programa, manifestando, com precisão, a ideia de

processo e de articulações sucessivas no interior do processo. Atores paradigmáticos são

aqueles que surgem de uma classificação, de uma repartição, sem integração num

processo programado. Assim, “o Estado é um ator sintagmático por excelência quando

empreende uma reforma agrária, organiza o território, constrói uma rede rodoviária etc.

A empresa é um ator sintagmático quando realiza um programa de produção”

(RAFFESTIN, 1993, p. 40).

Nesse sentido, o território é uma produção a partir do espaço, produção

entendida como relações que se inscrevem num campo de poder, sendo a territorialidade

definida como “uma rede de relações nas quais a informação é transmitida e

7 GREIMAS, A.J. Sémiotique et sciences sociales. Paris: Seuil, 1976.

12

reproduzida”, mediada pelas redes, circuitos e fluxos espaciais (BEZZI, 2004, p. 221).

Fica explícito também que para Raffestin, espaço é um substrato material, ele não o

discute enquanto uma produção social, como em Henri Lefebvre ou Milton Santos.

Na análise de Raffestin, o papel da dominação e do poder, dentro da sociedade,

tem grande peso na formação dos diferentes territórios. Resgatando as ideias de

Foucault sobre a multidimensionalidade do poder, o território para Raffestin é

entendido, essencialmente, pelo seu conteúdo político. O Poder – com letra maiúscula –

do Estado é exercido pela sua soberania no território e garante a sujeição dos cidadãos

inserindo-os nos sistemas produtivos, tornando-se, dessa forma, um instrumento

imprescindível para o desenvolvimento do capitalismo. Foucault denominou esse

processo de bio-poder, estabelecendo as disciplinas do corpo e as regulações da

população, em disciplina (leis, polícia, exército), quantidade (natalidade, mortalidade,

saúde, expectativa de vida, etc.) e qualidade (papel das escolas, da qualificação

profissional), para garantia da reprodução do processo produtivo.

Assim, o poder é encarado como um atributo inato das relações que se

estabelecem entre as pessoas no território. O Estado exerce o Poder num nível superior

e atua favorecendo determinados grupos8, orientando a produção capitalista e

amenizando as tensões sociais que surgem das contradições inerentes ao

sociometabolismo do capital.

O apoio do Estado a grandes empreendimentos como a expansão da

eucaliptocultura na Bahia favorecendo a grupos nacionais e transnacionais não se dá de

forma explícita, mas através de discursos que procuram mostrar a sociedade os

benefícios da instalação dessas empresas no território, onde as ideias de

“desenvolvimento” e “progresso” estão presentes. Esse tipo de política de

reordenamento territorial em que os meios de produção, notadamente, a terra, vêm

passando por um processo de concentração ainda maior, mostra que as finalidades

difundidas pelo discurso da modernidade estão dissimuladas da verdadeira realidade.

8 Este tema será retomado no capítulo 3: “O papel do Estado e seus agentes no empreendimento da

eucaliptocultura na Bahia”.

13

Mas há o Poder (com letra maiúscula) e o poder (com letra minúscula). O Estado

não é a única organização que exerce poder no território. Outras organizações também

recortam o território em malhas, manipulando fluxos e estabelecendo redes9.

Se o Estado tem poder e o poder deriva das relações estabelecidas entre as

pessoas em um território, os movimentos sociais e as organizações, que se situam no

outro lado do par dialético, também possuem poder e podem exercê-lo, formando redes,

direcionando fluxos e aumentando a sua influência no território.

Para o desenvolvimento desta tese que analisa o avanço da eucaliptocultura na

Bahia em suas contradições e conflitos, essa percepção de território e de poder é

fundamental, pois atribui à sociedade o papel de sujeito na construção da espacialidade

e reconhece o poder, não apenas do Estado, mas, sobretudo, dos grupos dominados

responsáveis pela produção da riqueza.

Segundo Moraes (2000, p. 28), a sociedade é o sujeito e, portanto, responsável

pela ação. Para ele há uma questão emblemática na corrente teórica que advoga a

relação sociedade/espaço como objeto da Geografia:

[...] deve-se ter cautela ao falar da relação sociedade/espaço como objeto

geográfico, pois tal enunciado sugere uma associação entre duas partes que se

determinam reciprocamente, que entram com o mesmo peso na relação. E

não se trata disso no caso, pois o dinamismo que impulsiona o

relacionamento de um agrupamento social com um dado meio está totalmente

localizado no âmbito do grupo, na verdade são os contatos entabulados entre

seus membros que definem a forma de relacionamento de todos e de cada um

com o espaço em que vivem.

Dessa forma, para Moraes (2000), considerar a relação sociedade/espaço como

objeto da Geografia implica em dar o mesmo peso para as partes, resultando em uma

análise que coloca o espaço como sujeito, como responsável pela ação (dinamismo).

Para ele, a responsabilidade pela qualificação do espaço se encontra nos processos

sociais e, sendo assim, não é possível dar a mesma importância entre sociedade e

natureza, uma vez que a espacialidade é resultado da ação humana e não da ação do

9 Para Raffestin (1993, p. 53-54): Sendo co-extensivo de qualquer relação, torna-se inútil distinguir um

poder político, econômico, cultural etc. Sendo toda relação um lugar de poder, isso significa que o poder

está ligado muito intimamente à manipulação dos fluxos que atravessam e desligam a relação, a saber, a

energia e a informação. [...] O laço entre o poder e o saber é evidente, mas não há nem informação pura

nem energia pura. Trata-se sempre de uma combinação das duas. Para Raffestin, a relação de poder do

fiel com sua igreja emerge da informação, enquanto que na relação de poder do guarda com seu

prisioneiro emerge da energia, mas o próprio autor afirma a existência do poder como “lugar de

transmutação”, onde “a energia pode ser transformada em informação, portanto em saber e a informação

pode permitir a liberação da energia, portanto de força” (RAFFESTIN, 1993, p.55-56).

14

espaço. O mesmo raciocínio pode ser estendido para a categoria território, utilizada

como referência argumentativa nesta tese.

Segundo Porto-Gonçalves (2006, p. 38) o amplo desenvolvimento do

capitalismo pelo mundo está relacionado às sucessivas revoluções que conseguiu

realizar nas relações sociais e de poder por meio da tecnologia e, sendo assim, a

categoria território é mais adequada para a análise da realidade:

O território é uma categoria analítica que nos remete à inscrição da sociedade

da natureza e, assim, nos obriga a considerar as relações sociais e de poder

que estão imbricadas na relação das sociedades com a natureza. A

problemática ambiental ganha maior consistência quando analisada a partir

do território, das territorialidades e dos processos de territorialização.

Para Santos e Silveira (2005), mais importante que o território em si mesmo é o

uso que se faz dele a partir do tripé ciência, tecnologia e informação que caracteriza a

dinâmica do mundo atual. Nessa visão, o território funciona através da horizontalidade e

da verticalidade.

As redes (verticalidades) são formadas por pontos distantes uns dos outros a

partir de uma imposição externa baseada em normas utilitárias, parciais e egoísticas que

beneficiam a alguns grupos privilegiados e que corroem a coesão horizontal

(horizontalidade). Esta situação acelera o processo de alienação dos homens e dos

espaços. Segundo Santos (2002, p. 287) “a tendência atual é no sentido de uma união

vertical dos lugares. Créditos internacionais são postos à disposição dos países e das

regiões mais pobres, para permitir que as redes se estabeleçam ao serviço do grande

capital”. Essa abordagem é bem apropriada para os objetivos desta tese que analisa a

expansão da eucaliptocultura na Bahia, onde capitais internacionais estão associados a

capitais nacionais e estatais para impor a sua lógica de mercado (verticalidade, rede)

reconfigurando o uso da terra em detrimento dos interesses das populações locais (da

sociedade civil local – horizontalidade, como no dizer de Milton Santos).

Não obstante essa situação adversa, as condições atuais do meio técnico-

científico também permitem uma rebeldia do lugar, em direção ao fortalecimento e

ampliação da coesão horizontal. Assim, no conflito espaço local X espaço global torna-

se necessário resgatar a noção de espaço banal, ou seja, o território de todos, conforme

Santos (1996, p. 18):

Há um conflito que se agrava entre um espaço local, espaço vivido por todos

os vizinhos, e um espaço global, habitado por um processo racionalizador e

um conteúdo ideológico de origem distante e que chegam a cada lugar com

os objetos e as normas estabelecidos para servi-los. Daí o interesse de

retomar a noção de espaço banal, o território de todos, frequentemente

15

contido nos limites do trabalho de todos; e de contrapor essa noção à noção

de redes, isto é, o território daquelas formas e normas ao serviço de alguns.

Contrapõem-se, assim, o território todo e algumas de suas partes, ou pontos,

isto é, as redes.

Para Santos (2002, p. 287-288) enquanto no passado remoto era da energia a

responsabilidade pela união entre as várias partes de um território, hoje esse papel

pertence à informação, que tanto pode servir às redes quanto à coesão horizontal,

transformando-se em ação política:

Mas os lugares também se podem refortalecer horizontalmente reconstruindo,

a partir das ações localmente constituídas, uma base de vida que amplie a

coesão da sociedade civil, a serviço do interesse coletivo. [...] A informação

tornada comum não é apenas a das técnicas de produção direta, mas tende

também a ser a das técnicas de mercado. Os mesmos interesses criam uma

solidariedade ativa [...] gerando, desse modo, uma ação política.

Dessa forma, no processo de expansão da atividade de produção do eucalipto no

território baiano o que se verifica é a união vertical dos lugares que apresentam as

vantagens comparativas para a reprodução ampliada do capital, mas conforme o

fragmento textual supracitado é possível que o(s) lugar(es) se rebele(m) e responda(m) a

esse movimento com uma ação política que interesse ao conjunto da sociedade local.

Para Santos (1996, p. 19) a disseminação da informação no espaço banal pode superar,

inclusive, o nível local e atingir outras escalas:

Por enquanto, o lugar — não importa sua dimensão — é a sede dessa

resistência da sociedade civil, mas nada impede que aprendamos as formas de

estender essa resistência às escalas mais altas. Para isso, é indispensável

insistir na necessidade de conhecimento sistemático da realidade, mediante o

tratamento analítico desse seu aspecto fundamental que é o território (o

território usado, o uso do território).

Na análise miltoniana, está presente o poder exercido pelos lugares através do

fortalecimento da coesão horizontal, transformando-se em uma ação política capaz de

contrapor à força do capital, através da solidariedade ativa. A rebeldia dos lugares é a

expressão do poder que emana das relações que se estabelecem entre as pessoas no

território.

No tocante à questão da resistência, Milton Santos (1996) destaca uma questão

escalar e observa que a resistência anti-capital começa no lugar e pode alcançar escalas

espaciais mais altas a depender da circulação da informação, que contribui para o

fortalecimento da coesão horizontal, estabelecendo as bases da ação política. Esse

debate, na obra de Mészáros, encontra uma conotação radical e transformadora. Ele

observa que uma articulação que altere radicalmente o poder controlador do sistema do

capital precisa se dar em escala internacional.

16

Portanto, a categoria território tem importância e pertinência nesta pesquisa

sobre a expansão da eucaliptocultura no território baiano. Imersa no marco teórico

adotado, é possível entender o espaço como anterior ao território, que, por sua vez, se

forma a partir de uma ação humana e exprime as relações de poder (RAFFESTIN,

1993), onde a sociedade tem papel ativo e preponderante sobre a natureza (MORAES,

2000), com plenas condições de fortalecer a horizontalidade rumo a uma ação política

que atenda ao conjunto da sociedade (SANTOS, 2002). Enfim, como parte integrante do

norteamento teórico desta tese, a categoria analítica território é vista a partir das

contradições e conflitos existentes na luta de classes que deriva do caráter privado de

apropriação da produção social da riqueza (MARX, 1984), cuja expressão geográfica é

o desenvolvimento desigual e combinado (SMITH, 1984) capaz de universalizar o

assalariamento e subordinar as relações não-capitalistas dentro do modo de

produção/distribuição/circulação/consumo (OLIVEIRA, A., 2004). A superação existe

como potencialidade e exige a superação das lutas parciais em prol da unificação global

e da homogeneização do trabalho vislumbradas na ótica marxiana (SMITH, 1984:

MÉSZÁROS, 2011; HARVEY, 2011).

Assim, o materialismo histórico-dialético e a teoria crítica marxista possibilitam

entender melhor a realidade em sua materialidade social, que “apresenta qualidades

ímpares, advindas do poder transformador e da capacidade decisória dos homens”,

diferentemente do positivismo que “proclama o uso do mesmo arsenal metodológico

para tratar qualquer fenômeno da realidade” (MORAES; COSTA, 1999, p. 56). Ainda

segundo esses autores é preciso diferenciar o método de interpretação do método de

pesquisa, entendendo o primeiro como a concepção de mundo, a postura filosófica e o

posicionamento político do cientista e o segundo como o conjunto de técnicas utilizadas

em determinado estudo, envolvendo os aspectos quantitativo e qualitativo.

1.3 Considerações sobre os procedimentos de pesquisa

Com relação aos procedimentos de pesquisa, os questionários do tipo pergunta-

resposta10

e a técnica da entrevista livre,11

, que embora dificulte a tabulação traz a

10

Esse tipo de procedimento facilita a tabulação dos dados, mas, também, sendo o único instrumento de

apreensão de informações, pode trazer o inconveniente de limitar as respostas e orientá-las a um caminho

pré-concebido, deixando de apreender informações importantes do objeto cognoscente. 11

OLIVEIRA, Rosiska D. de; OLIVEIRA, Miguel D. de. Pesquisa Social e Ação Educativa: conhecer

a realidade para poder transformá-la. In: Pesquisa Participante, Carlos Rodrigues Brandão (org.),

17

vantagem de permitir a interação com o objeto de pesquisa possibilitando conviver,

perguntar, debater, questionar, problematizar e trocar experiências. Logicamente que ao

utilizar a técnica da entrevista livre o pesquisador tem a função de direcionar o tema ao

núcleo temático a ser pesquisado.

Nesta pesquisa, os instrumentos e a metodologia estão a serviço do

entendimento do avanço do capital no campo baiano através da expansão da

eucaliptocultura com profundas transformações no mundo do trabalho e nas relações de

produção, acirrando o conflito capital X trabalho. Para tanto, é primordial a revisão da

literatura sobre o tema (levantamento e fichamento de livros, teses, dissertações artigos,

etc.) e a utilização de dados secundários e dados primários, sendo estes obtidos através

de visitas à área de estudo, lançando mão dos questionários e das entrevistas livres.

Várias fontes foram consultadas. O propósito foi resgatar os dados estatísticos

sobre a situação das empresas nacionais e transnacionais do ramo de papel e celulose,

bem como sobre a produção de madeira no mundo e no Brasil, para subsidiar a

elaboração de mapas, gráficos e tabelas sobre o tema. O quadro 1 apresenta as diversas

fontes e o tipo de informação coletada para essa tese:

Brasiliense, 1983. Segundo as autoras, a técnica da entrevista livre “é concebida como um diálogo aberto

onde se estimula a livre expressão da pessoa com quem se conversa, amplia o campo do discurso que

passa a incluir não só fatos e opiniões bem delimitadas, mas também devaneios, projetos, impressões,

reticências, etc. [...] E, no interior deste discurso, o que nos interessa, sobretudo é fazer emergir as

contradições e incoerências entre o falar e o agir, entre a percepção da realidade e de si e as pautas de

comportamento quotidiano, entre o sonho e a realidade, entre o real e o possível”.

18

Quadro 1 – Fontes consultadas e especificação das informações coletadas para a tese.

FONTES TIPO DE INFORMAÇÃO

Site do Instituto Brasileiro de

Geografia e Estatística - IBGE

Informações dos Censos Agropecuários de 1996 e 2006 sobre o pessoal ocupado em estabelecimentos

agropecuários segundo o tipo de vínculo com o produtor;

Levantamento da estrutura fundiária brasileira no período 1960/2006 a partir de informações dos Censos

Agropecuários;

Dados das Lavouras Temporária e Permanente e da Produção da Extração Vegetal e da Silvicultura dos

municípios baianos no período 1980/2010;

Informações dos Censos Demográficos entre os anos 1980/2010 sobre a situação do domicílio.

Site da Food and Agriculture

Organization of the United

Nations – FAO

Informações sobre as principais exportações de commodities brasileiras no período compreendido entre

1980/2010;

Busca sobre a produção de madeira em tora para papel e celulose no Brasil e no mundo.

Site da RISI/PPI Informações sobre as vendas globais, o ranking mundial das principais empresas a produção de celulose e

papel e o quadro de funcionários das principais empresas transnacionais no período 1996/2010.

Site das principais empresas

transnacionais12

de papel e

celulose

Informações sobre as maiores empresas transnacionais de papel e celulose no tocante à distribuição

geográfica mundial, produção, produtividade, empregabilidade e total de terras próprias para a produção

de madeira a partir dos relatórios anuais publicados.

Associação Brasileira de Celulose

e Papel – BRACELPA

Dados sobre a produção brasileira de celulose de fibra curta e de fibra longa para o ano de 2013;

Informações sobre produção e exportação de papel e celulose, concentração da produção de papel e

celulose e fontes de matérias primas.

Associação Nacional dos

Fabricantes de Papel e Celulose –

ANFPC

Dados brasileiros da produção e exportação de celulose no período 1950/1990.

Site das empresas de papel e

celulose atuantes na Bahia13

Informações sobre a distribuição geográfica, localização das fábricas, quadro de funcionários, quantidade

de terras próprias, produção, vendas, margem de lucro e destino das vendas.

12

International Paper, Stora Enso, Oji Holdings Corporation, Nippon Paper Group, Svenska Cellulosa Aktiebolaget, UPM, Smurfit Kappa Group e Mondi Group

19

FONTES TIPO DE INFORMAÇÃO

Site da Veracel Informações sobre produção de celulose, receita líquida, margem de lucro, processo de financiamento de

construção da fábrica, pagamento de impostos, contribuição social, total de terras e as áreas de plantios no

período 2005/2012.

Informações do Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) da Veracel para a duplicação da fábrica na

Bahia.

Site do Banco Mundial Informações sobre o Produto Interno Bruto e incidência de pobreza no mundo.

Site do Banco Central do Brasil Informações sobre as lavouras que mais recebem investimento do Governo na forma de crédito rural.

Banco Nacional de

Desenvolvimento Econômico e

Social – BNDES

Informações sobre o investimento do Estado brasileiro nas empresas de celulose e papel no período

1985/2010.

Site da Comissão Pastoral da

Terra – CPT

Informações sobre total de famílias em ocupações de terra, total de acampamentos e total de assassinatos

no campo no período 1985/2012.

Instituto Nacional de Colonização

e Reforma Agrária - INCRA

Informações sobre os assentamentos federais criados no território da Veracel.

13

Sateri Holdings Limited (BSC); Suzano Papel e Celulose (Unidade Mucuri); Fibria/Stora Enso (Veracel).

20

Além dessas fontes, que serviram prioritariamente para atendimento da demanda

estatística da tese, outras fontes foram consultadas, a exemplo do Ministério Público da

Bahia, onde foram adquiridas informações sobre as ações de denúncia contra a Veracel

por uma série de irregularidades na condução do processo de licenciamento ambiental e

na formação da base florestal, bem como sobre as inconsistências do RIMA.

Para avaliar a relação entre evapotranspiração total anual das árvores de

eucalipto e pluviometria regional duas fontes foram consultadas: a Superintendência de

Estudos Econômicos e Sociais da Bahia – SEI, sobre as características de pluviosidade

dos municípios; e Buckup (2006), sobre o consumo de água pelo território das empresas

produtoras de eucalipto.

Para aprofundar o conhecimento sobre a territorialização das empresas de

produção de eucalipto e de celulose na Bahia foi necessária a realização de uma

pesquisa de campo, que serviu de base para a coleta de dados específicos sobre o tema,

tais como: Informações junto aos fomentados sobre as características do programa de

fomento da Veracel, das propriedades rurais, das expectativas e da relação com a

empresa; Informações colhidas junto a autoridades públicas regionais e instituições

locais (Prefeitura, Câmara de Vereadores, Ministério Público, Centro de Estudos e

Pesquisas para o Desenvolvimento do Extremo Sul da Bahia – CEPEDES14

, entre

outras); Dados colhidos nas entrevistas realizadas com os funcionários do viveiro da

Veracel em Eunápolis e nas entrevistas com representantes sindicais e de organizações

de trabalhadores rurais em várias escalas e ex-funcionários da empresa; Dados colhidos

nas visitas aos acampamentos e assentamentos nos municípios de Santa Cruz Cabrália,

Eunápolis e Porto Seguro, envolvendo a coleta de pontos GPS para a elaboração de

mapas temáticos, aplicação de questionários entre os camponeses, acampados e

lideranças do MST, registro fotográfico, elaboração de gráficos e mapas temáticos.

Para a análise da estrutura fundiária foi realizado o cálculo do Coeficiente de

Gini, a partir da fórmula de Brown:

14

O CEPEDES conta com o acervo mais completo sobre a implantação e a expansão das atividades da

fábrica Veracel em Eunápolis, com portfólios anuais contendo informações de jornais da época,

documentos do Greenpeace e do Ministério Público da Bahia.

21

Sendo Y a área dos estabelecimentos e X o número de estabelecimentos. O Coeficiente

de Gini é um indicador que varia de 0 a 1, indicando máxima desconcentração e

concentração absoluta, respectivamente. Com base na distribuição das frequências entre

imóveis e área é possível determinar o grau de concentração, conforme Tabela 1:

Tabela 1 – Coeficiente de Gini: Graus de Concentração Fundiária.

Coeficiente de Gini Concentração Fundiária

0,251 a 0,500 Fraca a Média

0,501 a 0,700 Média a Forte

0,701 a 0,900 Forte a Muito Forte

0,901 a 1,000 Muito Forte a Absoluta

Fonte: Projeto Geografar, 2011.

Os dados primários foram obtidos no campo, a partir de entrevistas fechadas

(questionários) e da entrevista livre (com a utilização de equipamentos de registro de

áudio, de vídeo e audiovisual – quando possível e permitido), junto a sindicatos rurais,

organizações de trabalhadores rurais, movimentos sociais de luta pela terra,

camponeses, trabalhadores assalariados e proprietários de terras.

Para o cálculo do tamanho mínimo da amostra da população dos acampamentos

e assentamentos, foi considerado o erro amostral tolerável de 15%, com base na

seguinte equação (TRIOLA, 1998):

n = N. no / N + no onde,

n = Tamanho Mínimo da Amostra

N = Tamanho da População

no = Aproximação Inicial do tamanho da Amostra (Erro Amostral Tolerável)

Para calcular o erro amostral tolerável foi utilizada a seguinte equação:

no = 1 / E2 onde,

E = Erro Amostral Tolerável

Considerando um erro amostral tolerável de 15%, o cálculo da amostragem para

a população dos acampamentos e assentamentos está registrado na Tabela 2:

22

Tabela 2 – Cálculo da amostragem para os acampamentos e assentamentos localizados

no território da Veracel.

Acampamento/Assentamento Total de Famílias Amostragem

25 anos 360 40

Dorothy 168 35

Lulão 60 26

Ojefferson 75 28

Milton Santos 250 38

Total 913 167

No contexto dos Sistemas de Informação Geográfica (SIG), as informações

sobre a eucaliptocultura e sua expansão pelos diversos territórios foram tratadas nos

softwares GPS TrackMaker, MapSource e MapViewer 6.0, a fim de realizar a

elaboração de cartogramas quantitativos temáticos a partir de dados primários e

secundários. A arte final dos cartogramas foi executada com base na utilização do

software CorelDraw X6.

Portanto, foi a partir desses procedimentos metodológicos e à luz do

materialismo histórico-dialético que se analisou o avanço da eucaliptocultura na Bahia e

a territorialização dos conflitos entre capital X trabalho, entendendo que os processos

sociais que ocorrem neste recorte espacial não se explicam por si mesmos, mas estão

inseridos numa totalidade, ligada umbilicalmente ao modo capitalista de produção, em

seu desenvolvimento desigual e combinado, com todas as suas contradições para a

manutenção, produção e reprodução do capital com base na exploração do trabalho

humano e na consumação desenfreada dos recursos naturais.

É dentro desse contexto teórico-metodológico que se discutiu o processo de

expansão do eucalipto através da territorialização das empresas de produção de

eucalipto e de celulose no estado da Bahia, destacando as estratégias utilizadas pelo

capital para realizar o seu ajuste espacial nas diferentes escalas, as primeiras áreas

incorporadas, a expansão, o papel do Estado, as ideologias do desenvolvimento e da

modernização e os novos territórios a serem incorporados.

Defende-se a tese de que a territorialização das empresas de produção de

eucalipto e de celulose na Bahia encontrou suporte financeiro, técnico e legal nos

diferentes níveis de Estado e acirrou os conflitos capital X trabalho no campo, na

medida em que aumentou a concentração fundiária e reduziu o território disponível para

a reprodução camponesa, com rebatimentos na contração das lavouras temporária e

23

permanente e na urbanização dos municípios mais polarizados, desmascarando, assim, o

discurso do desenvolvimento e da geração de emprego e renda veiculado no momento

da implantação e desvelando a face oculta do capital que se move em direção às maiores

taxas de lucro proporcionadas pelos diferentes territórios e não para trazer o

desenvolvimento, processo que alimenta os movimentos socioterritoriais e revela a

existência de um campo em conflito.

Nesta direção e para responder aos embates travados nos campos político e

econômico optamos por utilizar as categorias: território, Estado, campesinato,

agronegócio, precarização do trabalho e relação capital X trabalho.

A discussão sobre território, abordada nesta proposta de tese contribui para

elucidar as relações de poder e os conflitos presentes na área de pesquisa, onde as

classes sociais antagônicas se confrontam.

As categorias analíticas adotadas estarão presentes nos diferentes capítulos,

sendo que no Capítulo 2, Em busca de territórios para a reprodução capitalista, é

realizada uma abordagem histórica sobre a expansão das empresas de produção de

eucalipto e de celulose pelo mundo, dentro da lógica do capital em tentar solucionar

suas crises através dos mecanismos de ajuste espacial e totalidade intensiva, que

concorrem para a entrada das empresas nacionais e transnacionais no território baiano,

No Capítulo 3, O papel do Estado e seus agentes no empreendimento da

eucaliptocultura na Bahia, destaca-se a abordagem crítica sobre o papel do Estado no

gerenciamento das crises do capital e na ação corretiva que realiza na tentativa de

solucionar o problema que surge da fragmentação entre produção e

consumo/controle/circulação e, no caso específico da eucaliptocultura baiana, o apoio

incondicional do Estado nos aspectos financeiros, técnicos e jurídicos, bem como na

condução das estratégias de convencimento das populações locais para aprovação dos

projetos de introdução, desenvolvimento e expansão dos monocultivos do eucalipto.

No Capítulo 4, A Geografia desigual da acumulação capitalista das empresas

de produção de eucalipto e de celulose na Bahia, o objetivo principal é avaliar o

processo de formação dos territórios da Bahia Speciality Cellulose, da Suzano Unidade

Mucuri e da Veracel Celulose e seus rebatimentos na contração do território camponês,

com ênfase no aumento da concentração fundiária, na diminuição da produção de

alimentos, no aumento da urbanização e nos processos de expulsão rural.

24

No Capítulo 5, Precarização do trabalho no contexto da crise estrutural do

capital e resistência camponesa nos territórios da Eucaliptocultura na Bahia, o foco é a

abordagem crítica sobre o fenecimento do Estado de Bem Estar Social a partir dos

processos de reestruturação da produção efetuados pelo capital, que seguem a taxa de

utilização decrescente e concorrem para a expansão da precarização do trabalho, com

rebatimento nas diversas formas de permanência do território camponês nos territórios

da Bahia Speciality Cellulose, da Suzano Unidade Mucuri e da Veracel Celulose,

destacando os resultados da pesquisa de campo realizada nos acampamentos e

assentamentos existentes no território da Veracel, onde o embate entre movimentos

socioterritoriais e agronegócio do eucalipto ocorre mais intensamente.

Enfim, no Capítulo 6, Considerações finais: o conflito irreconciliável entre o

campesinato e o agronegócio, apresenta-se o esforço teórico postimeiro para defender a

tese segundo a qual a territorialização das empresas de produção de eucalipto e de

celulose na Bahia não trouxe nem o desenvolvimento, nem contribuiu para a geração de

emprego e renda, apesar do arsenal ideológico utilizado pelas empresas e pelo Estado

para conseguir a aprovação das populações locais aos projetos de produção de eucalipto

e de celulose, traduzindo-se, a partir da lógica do capital em realizar seu

desenvolvimento desigual e combinado, na motivação necessária para o

recrudescimento do conflito campesinato X agronegócio, com a participação ativa dos

movimentos socioterritoriais em reafirmar o poder do campesinato como classe social

na luta anti-capital.

25

2. EM BUSCA DE TERRITÓRIOS PARA A REPRODUÇÃO CAPITALISTA

[...] Da mesma maneira que a produção baseada no capital cria, por um lado,

a indústria universal — isto é, trabalho excedente, trabalho criador de valor

—, cria também, por outro lado, um sistema de exploração universal das

qualidades naturais e humanas, um sistema de utilidade universal, do qual a

própria ciência aparece como portadora tão perfeita quanto todas as

qualidades físicas e espirituais, ao passo que nada aparece elevado-em-si-

mesmo fora desse círculo de produção e troca sociais. [...] A natureza torna-

se puro objeto para o homem, pura coisa da utilidade; deixa de ser

reconhecida como poder em si; e o próprio conhecimento teórico das suas

leis autônomas aparece unicamente como ardil para submetê-la às

necessidades humanas, seja como objeto de consumo, seja como meio da

produção. O capital, de acordo com essa sua tendência, move-se para além

tanto das fronteiras e dos preconceitos nacionais quanto da divinização da

natureza, bem como da satisfação tradicional das necessidades correntes,

complacentemente circunscrita a certos limites, e da reprodução do modo de

vida anterior. O capital é destrutivo disso tudo e revoluciona constantemente,

derruba todas as barreiras que impedem o desenvolvimento das forças

produtivas, a ampliação das necessidades, a diversidade da produção e a

exploração das forças naturais e espirituais (MARX, Grundrisse, p. 333-334).

A abertura econômica brasileira ao mercado internacional iniciada pelo Estado

nos anos 1990 facilitou sobremaneira a entrada de grandes empresas internacionais no

Brasil, especialmente no estado da Bahia, reconhecido mundialmente como possuidor

de vantagens comparativas relacionadas às condições edafoclimáticas excepcionais que

permitem uma velocidade de produção de biomassa superior a cinco vezes à encontrada

na Europa ou demais áreas localizadas no clima temperado.

O contexto de abertura econômica promoveu uma revalorização de determinadas

áreas em função destas vantagens comparativas, que possibilitam uma elevada

produtividade e, com isso, uma redução do tempo de giro do capital, intensificando o

processo de acumulação e reprodução ampliada do capital.

Com efeito, a abertura econômica do Brasil iniciada nos anos 1990 permitiu às

gigantes da celulose o acesso a áreas de grande produtividade, onde os maciços

florestais atingem a idade de corte em períodos curtos de cinco a oito anos (PEIXOTO,

1998), contra períodos de vinte a vinte e cinco anos nos países de origem dessas

empresas.

Dessa forma, a redução do tempo de giro do capital proporcionada pela elevada

produtividade dessas áreas aumenta a produção do excedente e intensifica o processo de

acumulação e reprodução ampliada do capital (HARVEY, 2005). A velocidade de

circulação do capital incrementada pela diminuição do tempo necessário para a

produção natural da matéria-prima nas condições edafoclimáticas excepcionais

26

encontradas no litoral da Bahia contribui para o processo de acumulação, assim como o

preço relativamente barato das terras em relação ao praticado nas Regiões Sul e Sudeste

do País.

Nesse contexto, dada a velocidade que o eucalipto vem avançando em território

brasileiro, não demorará muito para o país assumir a liderança mundial na produção de

madeira para celulose, a contar também com outros fatores além das condições naturais:

o emprego da mecanização, a fertilização dos solos e a utilização de biotecnologia

(PEIXOTO, 1998).

Com efeito, a grande expansão da eucaliptocultura no Brasil, saindo de nono

maior produtor mundial de madeira em tora para papel e celulose em 1975 para segundo

lugar em 2011, bem como de 11º lugar na produção mundial de celulose para a quarta

posição no ranking global em 2011, com a observância de taxas de crescimento

superiores a mil por cento no período 1975/2001, tem relação direta com o movimento

global de reprodução do capital, em sua busca incessante por áreas onde se possa

produzir mais, melhor e com menos custos e, dessa forma, é necessário analisar, nas

escalas mundial e nacional, o processo de ajustes espaciais capitalistas que reorientaram

a produção de madeira e celulose, das tradicionais regiões temperadas para terras

tropicais.

2.1 A territorialização das empresas de papel e celulose no mundo

A territorialização das empresas de produção de eucalipto e de celulose no

mundo atende, prioritariamente, aos objetivos de reprodução ampliada do capital em sua

lucratividade máxima possível, mas para que o processo se complete, não basta,

simplesmente, que exista uma grande produção de mercadorias aptas para venda.

Torna-se necessário a existência, conjunta e proporcional, de demanda por essas

mercadorias. E, nesse sentido, a demanda por papel no mundo cresce a uma taxa

superior à taxa de crescimento da oferta, o que impulsiona a incorporação de novas

áreas de produção de madeira em tora. A demanda por um material capaz de registrar

informações não é de hoje e nem sempre foi atendida pelo papel15

.

15

Historicamente, no mundo, dois precursores do papel (do latim papyrus) merecem destaque: o papiro e

o pergaminho. O papiro egípcio, fabricado por volta de 2400 aC, a partir de entrelaçamento transversal de

talos de papiro cortados em tiras, formando camadas que eram batidas com pesadas marretas de madeira,

até produzir um líquido que, ao secar, colava as tiras entre si, originando uma espécie de folha rústica

flexível e leve (o papiro) onde se podia escrever; O pergaminho, desenvolvido na cidade de Pérgamo

27

O Quadro 2 apresenta as datas prováveis das primeiras fábricas de papel em

vários países:

Quadro 2 – Datas prováveis das primeiras fábricas de papel em vários países.

PAÍS CIDADE ANO PROVÁVEL

Espanha Xativa (Valencia) 1150

França Herault 1189

Itália Fabriano 1260

Alemanha Nuremberg 1389

Suíça Marly 1400

Bélgica - 1407

Holanda Gennep 1428

Grã Bretanha Hertfordshire 1488

Suécia Motala 1532

Dinamarca - 1540

Rússia Moscou 1690

Estados Unidos Germanstown 1690

Fonte: CPI, 2013.

Na Europa, novos melhoramentos são adicionados ao sistema de fabricação de

papel: o uso de moinhos de martelos movidos a força hidráulica, o emprego de cola

animal para colagem e o emprego de filigrana (pequenos fios que dão maior qualidade

ao papel). Assim, com a fabricação de papel se espalhando pelo continente, uma

invenção vai contribuir para o aumento da demanda de papel: em 1440, Gutemberg

inventa a imprensa e os livros que, até então, eram escritos à mão, ficam disponíveis à

(atual Bergama, na Turquia) em 200 aC era feito com a pele de animais (ovelhas, carneiros, cabras, vacas

e outros), sendo o material utilizado para registrar a cultura medieval, principalmente a edição de bíblias,

cuja fabricação de um único exemplar exigia a pele de 300 carneiros, resultando em altos custos

(CABRALES, 2005; CPI, 2013). Coube ao chinês T’sai Lun, no ano de 105 dC inventar a fórmula válida

até hoje para a fabricação do papel: preparação da massa a partir da desintegração das fibras vegetais por

fracionamento/cozimento, misturando cascas de árvores a trapos de tecidos; formação da folha a partir da

prensagem da massa; secagem da folha. Esse primeiro sistema de fabricação de papel ficou sob o controle

dos chineses por mais de seis séculos até que, por volta do ano 600 dC chega à Coréia e em 610 dC ao

Japão. No ano de 751 dC, na batalha de Samarcanda, o exército árabe fez prisioneiros os técnicos

chineses de uma fábrica de papel e os forçou a revelar o segredo (CABRALES, 2005; BRACELPA,

2013; CPI, 2013; PORTAL SÃO FRANCISCO, 2013). Os árabes tinham grande interesse neste material

barato para poder divulgar os ensinamentos de Maomé e melhoraram o processo de fabricação de papel a

partir da introdução de amido, derivado da farinha de trigo, para a colagem das fibras de papel e da

utilização do linho, cânhamo e outras fibras para a preparação da pasta. No ano de 1110, os árabes

introduzem o sistema na Espanha, através das caravanas da seda e, a partir daí, espalhou-se pelo

continente europeu (CABRALES, 2005; BRACELPA, 2013; CPI, 2013; PORTAL SÃO FRANCISCO,

2013).

28

população em geral. Após a fabricação da bíblia em papel, o pergaminho deixou de ser

utilizado (CABRALES, 2005; PORTAL SÃO FRANCISCO, 2013).

Na Holanda, em 1670, a ausência de força hidráulica impulsiona o

desenvolvimento de máquinas movidas pelos moinhos de ventos: as máquinas

refinadoras de cilindros (conhecida como holandesa) que, pouco a pouco, se impõem

em relação aos moinhos de martelo (CABRALES, 2005; PORTAL SÃO FRANCISCO,

2013).

Em 1774, o químico alemão Scheele descobriu que as fibras poderiam ser

branqueadas com cloro gasoso e que, com a utilização deste produto químico, poderiam

ser empregados como matérias-primas trapos mais grossos e coloridos. Isto levou, em

1798, à invenção da primeira máquina de fabricação de papel de folha contínua, em que

os irmãos Fourdrinier colocaram em prática as ideias do francês Nicolas Louis Robert,

que não teve condições financeiras para desenvolvê-las (CPI, 2013; PORTAL SÃO

FRANCISCO, 2013).

A partir daí, máquinas mais rápidas e eficientes foram inventadas, movidas a

outros tipos de energia e a fabricação de papel precisava de novas fontes de matérias-

primas para alimentar a crescente demanda. Assim, os estudos do naturalista alemão

Jakob Christian Schaeffer sobre como fazer papel sem utilizar trapos chamaram a

atenção para o emprego de musgos, urtigas, pinho e tábuas de ripa como fontes de

matérias-primas. Em 1884, o alemão Friedrich Gottlob Keller consegue produzir

celulose a partir do desfibramento da madeira. Desde então, vários processos foram

surgindo para separar as fibras da celulose da lignina, tais como: processo de pasta

mecânica, processo com soda, processo sulfito, processo sulfato (Kraft).

A utilização da madeira como matéria-prima pode dar origem a dois tipos de

celulose, com diferentes características físicas e químicas: a de fibra longa, originária de

espécies coníferas como o pinus, tem comprimento entre 2 e 5 milímetros, sendo

adequadas para a fabricação de papéis mais resistentes, como os de embalagens, e nas

camadas internas do papel cartão, além do papel jornal; A celulose de fibra curta, com

0,5 a 2 milímetros de comprimento, deriva principalmente do eucalipto16

, sendo menos

resistentes e mais macias e absorventes, ideais para a produção de papéis como os de

16

De acordo com Lima (2004) o termo eucalipto deriva do grego eu (bem) e kalipto (cobrir), em função

da estrutura globular arredondada de seu fruto e sua ocorrência natural tem um amplo espectro de

variação latitudinal (de 7º N a 43º39’ S), revelando seu grande poder de adaptação em diversos tipos de

solo e de clima.

29

imprimir e escrever e de fins sanitários (papel higiênico, toalhas de papel, guardanapos).

(BRACELPA, 2013; CPI, 2013; PORTAL SÃO FRANCISCO, 2013).

No âmbito mundial, a produção brasileira de celulose, tanto de fibra curta quanto

de fibra longa, é a que apresenta o menor tempo de rotação e a maior produtividade. No

tocante à rotação, o tempo médio é de 7 anos para o eucalipto e de 15 anos para o pinus,

contra 35/40 anos e 45/90 anos, respectivamente, nas áreas mundiais tradicionais. Com

respeito aos índices de produtividade, o Brasil apresenta 44m3/

ha/ano para o eucalipto e

38 m3/

ha/ano para o pinus, contra 6/4 e 7/2 m3/

ha/ano, respectivamente, nos países com

áreas tradicionais de produção de madeira, conforme demonstram os dados das Tabelas

3 e 4:

Tabela 3 – Celulose de fibra curta: rotação e rendimento globais.

Espécies Países Rotação (anos) Rendimento

m3/ha/ano

Eucalipto Brasil 7 44

Eucalipto África do Sul 8-10 20

Eucalipto Chile 10-12 25

Eucalipto Portugal 12-15 12

Eucalipto Espanha 12-15 10

Bétula Suécia 35-40 6

Bétula Finlândia 35-40 4

Fonte: Bracelpa, dados do setor de celulose e papel, abril/2013.

Tabela 4 – Celulose de fibra longa : rotação e rendimento globais.

Espécies Países Rotação (anos) Rendimento

m3/ha/ano

Pinus spp Brasil 15 38

Pinus radiata Chile 25 22

Pinus radiata Nova Zelândia 25 22

Pinus elliottii/taeda Estados Unidos 25 10

Pinus de Oregon Canadá (costa) 45 7

Picea abies Suécia 70-80 4

Picea abies Finlândia 70-80 4

Picea glauca Canadá (interior) 55 3

Picea mariana Canadá (leste) 90 2

Fonte: Bracelpa, dados do setor de celulose e papel, abril/2013.

30

Os dados mostram a superioridade brasileira tanto em relação ao tempo

necessário para que a espécie possa ser cortada (rotação) e transportada até a fábrica,

bem como quanto à quantidade de biomassa produzida por hectare (rendimento). Essas

vantagens comparativas, provenientes das excepcionais condições edafoclimáticas

aliadas aos baixos preços da terra e da mão de obra, impulsionaram a expansão das

produções de madeira em tora para papel e celulose, conforme dados das Figuras 2 e 3.

Figura 2 – Participação dos dez maiores países produtores mundiais no conjunto da

produção de madeira em tora para papel e celulose - 1975/2011.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados da FAOSTAT, 2013.

31

32

Os países com terras situadas entre os trópicos cresceram no período 1975/2011

a taxas superiores a mil por cento, com destaque para a Indonésia, Brasil e Chile. A

Indonésia, em 1975, era o penúltimo produtor mundial (47º) e agora ocupa o quinto

lugar; O Brasil ocupava em 1975 a nona posição e agora é o segundo produtor mundial

e considerando que, no período 2000/2011, cresceu a uma taxa superior à da Indonésia

(65,5% contra 50,5%) e os Estados Unidos caíram 24,8% no mesmo período, as chances

são grandes de o país ocupar o primeiro lugar nos próximos anos; O Chile estava na 23ª

posição em 1975 e, atualmente, é o oitavo produtor mundial de madeira em tora para

papel e celulose, crescendo na última década 92,5%, índice superior ao registrado por

Brasil e Indonésia.

Os tradicionais países produtores (EUA, Rússia, Canadá, Suécia, Finlândia,

Japão e Noruega), com terras situadas na zona temperada, não conseguem concorrer

com os países tropicais em função da alta rotatividade e baixo rendimento de suas áreas

produtoras de madeira, de forma que todos cresceram pouco ou apresentaram taxas

negativas. Do grupo de países supracitado, apenas os Estados Unidos permanecem na

mesma posição que ocupavam em 1975, mas verifica-se que sua participação relativa no

conjunto da produção mundial reduziu na última década, de 33,4% para 23,3%.

Considerando a expansão global da produção de madeira em tora para papel e

celulose, o crescimento no período 1975/2011 foi de 70,7%, saltando de 320,9 milhões

de m3 em 1975 para 547,9 milhões de m

3 em 2011. Tomando como base somente as

duas últimas décadas, observa-se uma diminuição do ritmo de crescimento, uma vez

que, na década de 1990, o incremento da produção foi de 19,2% e, nos últimos onze

anos, o aumento atingiu apenas 8%.

A Figura 4 apresenta o número de países produtores de madeira em tora para

papel e celulose e a participação relativa dos dez maiores no conjunto da produção total

nos últimos 36 anos, de acordo com dados da FAOSTAT, 2013. Em 1975 apenas 48

países produziam madeira em tora para papel e celulose e os dez maiores produtores

eram responsáveis por 82,5% do total produzido no mundo. Quase quatro décadas

depois, o número de países produtores aumentou 58,3% chegando a 76 países

produtores, mas isso não foi suficiente para manter a concentração típica do setor, pois

75,2% do total da produção mundial continuam no controle dos dez maiores produtores,

representando uma desconcentração mínima de 8,8% em relação a 1975.

33

Figura 4 – Número de países produtores de madeira em tora para papel e celulose e a

participação relativa dos dez maiores no conjunto da produção - 1975/2011.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados da FAOSTAT, 2013.

A expansão da produção de celulose no mundo no período 1975/2011 está

demonstrada na Figura 5, evidenciando uma concentração ainda maior do que a

verificada no setor de produção de madeira em tora, de forma que Brasil, Indonésia e

Chile, embora crescendo a taxas bastante altas (Figura 6), não conseguiram repetir a

mesma performance que tiveram na expansão de seus territórios de produção de

madeira.

Os movimentos mais significativos no período 1975/2011são o crescimento de

Indonésia (14.161%), Brasil (1.016%), Chile (983%) e China (557%), responsáveis pela

escalada no ranking mundial e o fraco desempenho dos tradicionais países produtores,

tais com Rússia — que teve crescimento negativo de 11% — e de Japão, Canadá,

Estados Unidos, Suécia e Finlândia, que cresceram pouco nos últimos 36 anos. A China

subiu cinco posições e agora ocupa o segundo lugar, com uma produção de 21,1

milhões de toneladas de celulose em 2011; O Brasil era o 11º produtor mundial em

1975 e agora está na quarta colocação, com uma produção de 13,9 milhões de toneladas

em 2011; O Chile era o 25° maior produtor mundial em 1975 e agora ocupa o décimo

lugar, com 4,9 milhões de toneladas; Finalmente, a Indonésia, que em 1975 ocupava o

34

44º lugar, agora é o nono maior produtor, com 6,6 milhões de toneladas de celulose em

2011, sendo o país que mais avançou posições no ranking mundial.

Figura 5 – Participação dos dez maiores países produtores mundiais no conjunto da

produção de celulose - 1975/2011.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados da FAOSTAT, 2013.

Considerando a última década, os países que mais cresceram foram Brasil

(89,6%), Chile (88,9%), Indonésia (56,6%), China (42%) e Rússia (25,4%). Suécia,

Estados Unidos, Finlândia, Japão e Canadá tiveram crescimento negativo no período,

sendo que as piores quedas foram de Japão (-20,3%) e Canadá (-30%). Isso significa

que, caso as taxas observadas no período 2000/2011 se mantiverem como tendência na

próxima década, Brasil, Indonésia e Chile subirão no ranking e a China permanecerá na

segunda posição, encurtando a distância com os Estados Unidos. Com efeito, essa

tendência de perda da hegemonia estadunidense na produção mundial de celulose já se

verifica nos últimos 36 anos, quando o país saiu de 35% do total da produção mundial

em 1975 e agora detém 26,9%, notadamente na última década, em que houve a maior

declinação na participação global (de 31% para 26,9% em onze anos).

35

36

Com relação ao incremento da produção global de celulose no período

1975/2011, a taxa de crescimento foi de 81,5% — superior a verificada pela produção

de madeira em tora para papel e celulose que observou 70,7% —, mas analisando

apenas as duas últimas décadas, o ritmo do crescimento está bastante reduzido, uma vez

que no período 1990/2000 a taxa foi de 11,2% e no período 2000/2011 ela alcançou

somente 1,4%. Em números absolutos a produção mundial de celulose em 2000 era de

184,2 milhões de toneladas e em 2011 foi de 186,8 milhões, um crescimento de apenas

2,6 milhões de toneladas em onze anos.

O setor de produção de celulose é ainda mais concentrado que o de produção de

madeira em tora para papel e celulose. Em 1975, 68 países produziam celulose e, na

época, os dez maiores produtores concentravam 85,8% do total da produção (Figura 7).

Em 36 anos apenas cinco países entraram para o grupo de produtores de celulose

(crescimento de 7,4%) e a concentração da produção no Top 10 ainda se mantém acima

de 80%, bem maior do que a verificada no setor de produção de madeira, cuja

concentração no Top 10 foi de 75,2% em 2011.

Figura 7 – Número de países produtores de celulose e a participação relativa dos dez

maiores no conjunto da produção - 1975/2011.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados da FAOSTAT, 2013.

Verificou-se que, no período 1975/2011 a produção de madeira e de celulose

cresceram 70,7% e 81,5% respectivamente, sendo que nos últimos onze anos houve

37

uma redução no ritmo de crescimento com a produção de madeira crescendo 8% e a de

celulose apenas 1,4%. Nesse sentido, é interessante averiguar o que ocorreu com o

consumo mundial de papel no período, objetivando identificar os principais países

consumidores e entender as principais movimentações no ranking global 1975/2011,

como forma de avaliar as pressões sobre os setores de produção de madeira em tora e de

celulose.

As Figuras 8 e 9 relacionam, graficamente, as informações sobre o consumo

mundial de papel no período 1975/2011 e um dado específico causa preocupações no

cenário global: o consumo de papel cresce a taxas superiores às observadas na produção

de madeira em tora e de celulose. Em 1975, o mundo consumiu 127,2 milhões de

toneladas de papel e, passados 36 anos, o consumo subiu para 400,3 milhões de

toneladas, perfazendo um crescimento de 215%, bem superior à produção de madeira

em tora (crescimento de 71%) e de celulose (crescimento de 82%). Considerando

apenas a dinâmica do consumo na última década (2000/2011), o descompasso é ainda

maior: o consumo de papel subiu 23% contra 8% da produção de madeira em tora e

contra apenas 1,4% da produção de celulose.

Figura 8 – Dez maiores países consumidores mundiais de papéis - 1975/2011.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados da FAOSTAT, 2013.

38

39

Os países com as maiores taxas de crescimento do consumo de papel no período

1975/2011 foram China, Coréia do Sul, Índia e Brasil, suficientes para que todos eles

galgassem posições no ranking mundial, com destaque para a China que, atualmente, é

o país que mais consome papel. Por outro lado, Brasil e Coréia do Sul, que não

apareciam na lista dos dez maiores consumidores de papel até 1990, registraram um

aumento no consumo de papel capaz de realizar sua inclusão na lista dos maiores em

2000 e, notadamente, o Brasil, que superou Coréia do Sul e França e, atualmente, ocupa

o oitavo lugar.

Considerando apenas os dez maiores consumidores — responsáveis por 71% do

consumo global total —, e o período 2000/2011 — mais representativo das tendências

globais atuais —, nota-se que China (crescimento de 149% no período), Brasil (35%) e

Coréia do Sul (26%) são os países que mais consomem papel. Na outra ponta, a

Alemanha cresceu o consumo em apenas 4,5% e Reino Unido, Japão, França e Estados

Unidos contabilizaram crescimento negativo entre – 2% a – 22% no mesmo período.

No entanto, ainda é muito grande a distância entre o grupo dos países

emergentes e o grupo dos países desenvolvidos, quando se observa o consumo per

capita de papel, conforme dados da Figura 10:

Figura 10 – Dez maiores países consumidores de papel- 2011: Consumo per capita de

papel - 1975/2011.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados da FAOSTAT, 2013.

0

50

100

150

200

250

300

350

1975 1990 2000 2011

kg/h

ab

China

EUA

Japão

Alemanha

Índia

Itália

Reino Unido

Brasil

França

Coréia do Sul

40

Os dados mostram que todos cresceram o consumo per capita de papel até o ano

2000. Nos últimos onze anos, é nítida a formação de dois grupos: o grupo de

crescimento positivo formado por China, Coréia do Sul, Alemanha, Brasil e Índia; e o

grupo de crescimento negativo formado por Itália, Reino Unido, Japão, França e

Estados Unidos. Mas, mesmo registrando taxas de crescimento baixas ou negativas na

última década, Alemanha, EUA e Japão apresentam consumo per capita de papel

superior a 200 kg/hab; Coréia do Sul, Itália, Reino Unido e França apresentam consumo

per capita entre 140 a 190 kg/hab; os demais apresentam baixo consumo per capita,

inferior a 80 kg/hab, sendo China com 76 kg/hab, Brasil com 48 kg/hab e Índia com

apenas 10 kg/hab. Considerando o tamanho da população desses países, notadamente

China e Índia, que têm mais de um bilhão de habitantes cada um, bem como o aumento

das taxas mundiais de urbanização e escolaridade, que induzem a um maior consumo de

papel, é possível afirmar que essa demanda reprimida será responsável pela pressão no

aumento da oferta de papel no mundo e, por extensão, no incremento das áreas

produtoras de madeira em tora para papel e celulose.

Portanto, o descompasso entre a produção de madeira e celulose e a oferta de

papel no contexto mundial significa a formação de um mercado cativo, em franca

expansão, para as empresas do setor, representando a oportunidade para auferir altas

taxas de lucro, em função de três fatores principais, articulados entre si: em primeiro

lugar, devido à enorme concentração empresarial do setor de papel e celulose, onde

poucas empresas conseguem atuar por causa da alta intensidade de capital; em segundo

lugar, a alta produtividade de madeira em tora e de celulose alcançada pelas novas áreas

produtoras localizadas nos países tropicais; e, por último, a atuação dos Estados

Nacionais em aprofundar as políticas neoliberais que permitiram a abertura comercial e

o livre acesso do capital a essas áreas de grande produtividade.

A análise da atuação das principais empresas transnacionais do setor de papel e

celulose demonstra o processo de reestruturação efetuado a partir dos anos 2000, no

sentido de reduzir o número de funcionários sem afetar o volume de vendas, realizado a

partir de fusões de grandes empresas de âmbito global e da incorporação de novas

tecnologias capazes de aumentar a produtividade e a economia de escala, segundo a

tendência da taxa de utilização decrescente do capital, conforme aponta Mészáros

(2011, p. 66):

Seguindo a lógica de suas determinações imanentes, a tendência inexorável à

concentração e à centralização de capital — que surge originalmente tanto do

41

antagonismo capital/trabalho como dos intercâmbios conflitantes de uma

grande multiplicidade de capitais em competição — continua a prevalecer

como antes, mesmo sob as condições arbitrárias de imposição monopolista e

de “curto-circuito” e algumas das determinações internas do sistema,

ativando e intensificando assim a tendência da taxa de utilização decrescente

no próprio plano de utilização do capital. A tão idealizada categoria de

“economia de escala” (que, no fundo, corresponde a pouco mais do que uma

racionalização apologética do insaciável apetite canibalesco do grande capital

em devorar seus irmãos e primos menores) expõe muito bem a crescente

inviabilidade não apenas do pequeno, mas também do médio capital, em face

da taxa de utilização decrescente do capital, que só os maiores complexos

parecem suportar no presente momento crítico da história e, mesmo eles, de

modo longe de satisfatório.

Nesse sentido, é interessante avaliar a trajetória das grandes empresas

transnacionais do ramo de papel e celulose na última década, com destaque para a

estadunidense International Paper, as finlandesas Stora Enso e UPM, as japonesas Ogi

Paper e Nippon Paper, a sueca SCA, a irlandesa Smurfit Kappa e a anglo-sul-africana

Mondi.

2.1.1 A International Paper

A International Paper (Figura 11) foi constituída em 1898 com a incorporação de

18 fábricas de celulose e papel no nordeste dos Estados Unidos e, mediante um processo

de crescimento baseado em aquisições, atualmente é a empresa líder no mercado

mundial de celulose e papel. Entre 1986 e 2000 adquiriu várias empresas, tais como a

Hammermill Paper Company, a Masonite Corporation, a empresa de papel alemã

Zanders Feinpapiere AG, a fabricante de papel francês Aussedat Rey, a Board Paper

Federal e a Union Camp Corporation.

Em 2000, adquire a Champion, 12ª colocada no ranking RISI/PPI 1998. No

mesmo ano, comprou várias empresas brasileiras, sendo a mais conhecida delas a

Chamex, formando a International Paper do Brasil, com fábricas em Mogi Guaçu-SP,

Luiz Antonio-SP e Três Lagoas-MS. Entre 2005 e 2006, a International Paper realizou

uma reestruturação significativa, vendendo mais de 6.000.000 hectares (24.000 km2) de

floresta nos EUA, juntamente com várias fábricas de papel revestido e papel de

embalagem. Quatro fábricas de papel revestido no Maine, Michigan e Minnesota foram

vendidas para a Apollo Management. A fábrica de papel kraft em Roanoke Rapids,

Carolina do Norte foi vendida para a Kapstone Paper and Packaging. O setor de

embalagens de bebidas foi vendido para o grupo Carter Holt Harvey.

42

43

A International Paper vendeu também o setor de produtos de madeira da

empresa para o grupo West Fraser Timber Inc., de Vancouver, British Columbia. Isto

incluiu 13 serrarias, tornando West Fraser o segundo maior produtor de madeira na

América do Norte, ao lado de Weyerhaeuser Company. Além disso, a International

Paper possui atualmente ações da empresa chilena Copec. Em 2011, a IP adquiriu o

controle acionário da Andhra Pradesh Paper Mills, uma das maiores empresas de papel

e celulose da Índia, com duas fábricas em Rajahmundry e Kadiam, com uma capacidade

total de produção de 240 mil toneladas por ano.

Nesse processo de reestruturação, a empresa diminuiu o quadro de funcionários

em 46% na última década, de 110.000 em 2000 para 59.500 em 2010, reduziu a

produção de celulose (-45%) e de papel (-17%), ao mesmo tempo em que conseguiu

alavancar as vendas em 15%, saltando de 21,6 bilhões de dólares em 2000 para 25

bilhões de dólares em 2010, mantendo sua liderança no ranking mundial de papel e

celulose, atuando em 33 países e sendo proprietária de 495 mil hectares de terra na

Rússia e no Brasil.

2.1.2 A Stora Enso

A finlandesa Stora Enso (Figura 12) atua em 41 países e ocupa atualmente o

terceiro lugar no ranking mundial, mas isso só foi possível devido ao processo de fusão

ocorrido em 1998, quando a finlandesa Enso Oy ocupava o oitavo lugar e a sueca Stora

o 12º lugar. Em 2000, a companhia adquiriu a empresa estadunidense Consolidated

Paper, que ocupava o 31º lugar em 1998. Também em 2000, o grupo Stora Enso e

AssiDomän formaram uma companhia comum, a Billerud AB (67º lugar em 2010), para

produzir papel de embalagens.

A Stora Enso tem negócios no Brasil, onde controla 50% das ações da Veracel

Celulose S.A., localizada no sul da Bahia, que é uma das maiores fábricas de celulose

do mundo e, também, é proprietária da Stora Enso Arapoti Indústria de Papel LTDA,

antiga Inpacel Indústria Ltda que pertencia à International Paper, atuando no segmento

de produção de papel para impressão de revistas e catálogos, no município de Arapoti-

PR. A empresa tem projetos de expansão da área cultivada de eucalipto na Bahia e no

Rio Grande do Sul, onde pretende instalar uma fábrica de celulose.

44

45

Nos últimos anos, a empresa passou por um processo de reestruturação. As

operações norte-americanas foram alienadas em 2007 para a New Page Corporation,

que atualmente ocupa o 23º no ranking. A empresa vendeu e fechou algumas de suas

fábricas na Finlândia, Suécia e Alemanha, para abrir outras em locais mais rentáveis,

como por exemplo, no Brasil. Assim, na última década, enquanto o faturamento da

empresa cresceu 11%, saindo de US$ 10,4 bilhões em 2000 para US$ 11,5 bilhões em

2010, o número de funcionários foi reduzido em 38%, de 45.000 para 27.893 no mesmo

período, com queda na produção de papel (-17%) e aumento de 25% na produção de

celulose. Trata-se da empresa que mais possui terras no mundo, num total superior a

quatro milhões de hectares, em países como Suécia, Finlândia, Rússia, Uruguai, Brasil,

República Tcheca, China, Estônia, Romênia, Laos, Tailândia e Lituânia.

2.1.3 A Oji Holdins Corporation

A empresa japonesa Oji Holdins Corporation (antiga Oji Paper) atua em 14

países (Figura 13) e ocupa o quarto lugar no ranking mundial do setor de celulose e

paper (2010). A primeira fábrica da Oji Paper Company foi construída em 1875 na

aldeia de Oji, na época um subúrbio de Tóquio e, em 1933, a Oji Paper fundiu-se com a

Fuji Paper e Karafuto Industries, tornando-se uma empresa oligopolista que respondia

por 80 % da produção japonesa de papel. Após a Segunda Guerra Mundial, a fim de

evitar práticas anticoncorrenciais causadas pela concentração excessiva, o Governo

Japonês impôs um programa de descentralização, que culminou com a divisão da

empresa em três componentes: Tomakomai Paper, Jujo Paper e Honshu Paper.

A tentativa estatal de impedir a concentração do capital não durou muito tempo.

A Tomakomai Paper expandiu suas operações e, em 1952, foi rebatizada para Oji Paper

Industries e, em 1960, para Oji Paper novamente. A Oji Paper adquiriu empresas

concorrentes, incluindo Kita Nippon Paper, Nippon Pulp Industries e Toyo Pulp. Em

1993, a Oji Paper fundiu-se com a Kanzaki Paper, mudando a denominação para New

Oji Paper e, em 1996, a New Oji Paper e a Honshu Paper fundiram-se novamente para

se tornar a Oji Paper. No mesmo ano inaugurou a Oji Paper da Tailândia e, em 2002,

abriu duas fábricas na China: a Oji Specialty Paper, em Shanghai e a Oji Paper Nepia,

em Suzhou. Em 2005, cria um projeto florestal para aumentar a área total para 300.000

hectares em seis países estrangeiros, totalizando10 florestas no exterior.

46

47

Em 2007, estabeleceu uma joint venture17

, a Jiangsu Oji Paper, para a produção

de celulose Kraft e papel de alta qualidade na cidade de Nantong, província de Jiangsu,

China. Em 2010, adquiriu ações na empresa Paperbox Holdings, holding18

da GS Paper

& Packaging Sdn Bhd, a maior fabricante de cartões para embalagens da Malásia. Em

2011, adquiriu ações na empresa HPI Recursos Bhd, a holding da Harta Packging

Group, na Malásia. No mesmo ano, adquiriu a Piracicaba Indústria de Papeis Especiais

e Participações LTDA, da Fibria Celulose AS, e mudou seu nome comercial para "Oji

Papéis Especiais Ltda." Em 2012, Oji Paper se transformou em holding pura e mudou a

denominação para "Oji Holdings Corporation".

De 2000 a 2010 a empresa subiu uma posição no ranking, elevando as vendas de

US$ 10,1 bilhões para US$ 11,5 bilhões, num crescimento de 14%, ao mesmo tempo

em que a produção de celulose e de papel caiu no período, – 20% e – 4%

respectivamente, bem como o número de empregados, que era 23.095 em 2000 e foi

reduzido para 21.987 em 2010 (- 5%).

O projeto de expandir a área de produção de madeira em países estrangeiros está

quase atingindo a meta de 300 mil hectares. Atualmente, a empresa possui 433,1 mil

hectares de terra localizados em oito países, sendo 190 mil no Japão e o restante, em

ordem decrescente, no Brasil, na Indonésia, na Nova Zelândia, no Laos, na Austrália, na

China, no Vietnã e no Canadá.

2.1.4 A Nippon Paper

O grupo japonês Nippon Paper (Figura 14) atua em 17 países e ocupa atualmente

o quinto lugar no ranking mundial do setor de celulose e papel.

17

Joint significa um conjunto, uma associação e venture significa um negócio, um projeto, uma aventura,

sendo que o conceito de joint venture remete a união de esforços para a realização de um projeto comum

que envolve certos riscos. Assim, a joint venture é uma associação de empresas, criando ou não uma nova

empresa, para explorar determinado(s) negócio(s), sem que nenhuma delas perca a sua personalidade

jurídica, de forma que ao final do projeto a associação é dissolvida automaticamente e durante a vigência

da joint venture, nenhuma empresa pode agir em nome das demais (DIREITO BRASIL, 2013; ÂMBITO

JURÍDICO, 2013). 18

A terminologia deriva do inglês to hold, que significa segurar, controlar, manter. A holding é uma

forma de sociedade criada com o objetivo de administrar um grupo de empresas (conglomerado), a partir

da detenção majoritária de quotas ou ações. Pode ser holding pura, quando tem por objeto social apenas a

participação no capital de outras sociedades, funcionando somente como uma controladora. A outra

modalidade é a holding mista, quando além de ter por objeto social a participação em outras empresas,

prevê a exploração de outras atividades empresariais, como produção de bens e serviços (VALOR

JURÍDICO, 2013)

48

49

Surge do processo de desconcentração imposto pelo Governo Japonês no final

da Segunda Guerra Mundial, numa tentativa frustrada de impedir a formação de

oligopólios. Em 1949, a Jujo Paper é criada a partir do desmembramento da Oji Paper

e, em 1968, a Jujo Paper se funde com a Tohoku Pulp e, em 1993, após a fusão da Jujo

Paper com a Sanyo-Kokusaku Pulp, a empresa é renomeada para Nippon Paper

Industries. Em 2001, ela se funde com a empresa Daishowa Paper Manufacturing e

passa a se denominar Nippon Unipac Holding. Em 2004, a Nippon Unipac Holding é

renomeada para Nippon Paper Group.

Assim com as demais empresas transnacionais do ramo, também realizou uma

reestruturação na última década, caracterizada pela redução do número de funcionários

(-15%) e da produção de celulose e papel (– 62% e – 8% respectivamente), sem

prejudicar o faturamento global que subiu 11% no período, saindo de pouco mais de 10

US$ bilhões em 2000 para US$ 11,1 bilhões em 2010.

O Grupo Nippon Paper possui terras em cinco países, totalizando 256,3 mil

hectares, sendo 90 mil no Japão e o resto, em ordem decrescente, na Austrália, no

Brasil, no Chile e na África do Sul.

2.1.5 A Svenska Cellulosa Aktiebolaget (SCA)

A Svenska Cellulosa Aktiebolaget (SCA) tem atuação global em 50 países

(Figura 15) e localiza-se no sexto degrau do ranking mundial do ramo de celulose e

papel. Foi fundada, em 1929, pelo sueco Ivar Kreuger como uma holding para dez

empresas suecas da indústria florestal. Em 1932, após a falênca de Kreuger, a empresa

passou a ser controlada pelo banco Handelsbanken, juntamente com fundos de

investimento e empresas associadas e, em 1975, a SCA adquiriu a Mölnlycke Health

Care, uma das principais produtoras europeias de produtos descartáveis para higiene.

Em 1990, adquiriu a empresa de embalagem Reedpack e, em 1995, comprou a empresa

alemã PWA . Em 2001, comprou da empresa Georgia-Pacific a divisão de tecidos

Wisconsin Tissue e, em 2004, adquiriu os setores de tecidos e produtos de higiene da

empresa Carter Holt Harvey.

50

51

Em 2007, adquiriu o setor europeu de fabricação de tecidos na Procter &

Gamble e abriu mais cinco fábricas na Europa e Hong Kong. Em 2008, diminuiu suas

operações no Reino Unido e fecha a fábrica de New Hythe. No mesmo ano, aumenta

sua participação na empresa chinesa de tecidos Vinda e aumenta seus investimentos no

México. Em 2009, fechou sua fábrica de tecidos em Pratovecchio, na Itália e adquiriu as

marcas argentinas de produtos de higiene Calipso, Plissé, Plissé bebé e Master. Em

2010, iniciou um projeto para fechar sua fábrica de cuidados pessoais em Linselles,

França e, no mesmo ano, comprou as marcas mexicanas Tessy Babies e DryKids da

Copamex. Ainda em 2010, iniciou a produção de absorventes íntimos e fraldas

descartáveis em Veniov, Rússia. No ano seguinte, investiu 290 milhões de euros na

produção de tecido expandido na Rússia e na Alemanha, bem como na serraria Bollsta

na Suécia. Ainda em 2011, adquiriu 50% da empresa turca de produtos de higiene

Komili, passando a controlar as marcas Star Baby (fraldas para bebê) e Rozi (cuidados

femininos), bem como 95% da empresa turca de produtos de higiene San Saglik.

Também adquiriu a empresa brasileira de produtos de higiene Pro Descart e suas marcas

BioCare geriátrica, Biofral, BabyFral, BioCare Bebê Plus e DryBaby.

Na reestruturação realizada entre 2000 e 2010 a SCA foi uma de duas, entre as

dez maiores coprorações (a outra foi a Mondi), a aumentar o quadro de funcionários,

saindo de 42.000 para 45.341, o que perfaz um crescimento de 8%, ao passo que

incrementou o volume de vendas em 58%, de US$ 6,8 bilhões para US$ 10,8 bilhões e

dobrou a produção de papel, fatos que permitiram à empresa a escalada de quatro

posições no ranking, saindo da décima posição em 2000 para a sexta em 2010, com

grandes chances de subir mais posições se o crescimento se mantiver nessas mesmas

taxas nos próximos anos.

A SCA é a única, entre as grandes empresas do ramo, a não dispor de território

de produção de madeira em outros países. Todas as suas terras totalizam 2,6 milhões de

hectares e se localizam na Suécia, perdendo apenas para a Stora Enso, que possui pouco

mais de 4 milhões de hectares em 12 países. Em função da baixa produtividade de suas

terras, a SCA é obrigada a importar 50% da madeira que precisa e 63% da celulose que

precisa para realizar as suas operações de produção de papel.

52

2.1.6 A UPM

A transnacional finlandesa UPM (Figura 16) atua em 66 países e se encontra na

sétima posição no ranking mundial do setor de celulose e papel. Historicamente, a

UPM-Kymmene foi formada pela fusão de Kymmene Corporation e Repola Ltda e sua

subsidiária United Paper Mills Ltda em 1996. A partir de 2006 iniciou um processo de

reestruturação, fechando várias fábricas na Europa e nos Estados Unidos. Os produtos

da UPM são fabricados em 16 países e a empresa tem representações fixas em 66

países, formando uma rede de vendas em todo o mundo. As unidades de produção da

UPM estão localizadas na Austrália, Áustria, Brasil, China, Estônia, Finlândia, França,

Alemanha, Malásia, Polônia, Rússia, Espanha, África do Sul, Reino Unido, Uruguai e

EUA.

Em seu processo de reestruturação no período 2000/2010 reduziu o quadro de

empregados em 33%, saindo de 32.755 para 21.869, sem prejudicar o faturamento

global que, inclusive, aumentou 39%, totalizando vendas superiores a US$ 10 bilhões

em 2010, conseguidas em função do incremento da produção de papel em 20% e da

produção de celulose, que alcançou quase três milhões de toneladas em 2010.

O grupo possui territórios de produção de madeira em quatro países, totalizando

mais de um milhão de hectares, sendo 852 mil hectares na Finlândia, e o restante, em

ordem decrescente, no Uruguai, nos Estados Unidos e no Reino Unido.

2.1.7 A Smurfit Kappa

O grupo Smurfit Kappa (Figura 17) tem sede em Dublin, na Irlanda e atua em 32

países europeus e americanos, ocupando atualmente a nona posição no ranking mundial

do setor de celulose e papel. O processo de fusão começou em 1998 quando as empresas

Jefferson Smurfit Corp (20ª colocada no ranking de1998) e Jefferson Smurfit Group

(14ª lugar em 1998) se uniram para formar a Smurfit-Stone Container Corporation,

passando para o 7º lugar em 2000. Em 2005, se fundiu com a empresa holandesa Kappa

Packaging (24º lugar em 2004), mudando seu nome para Smurfit Kappa. Em 2010, a

empresa ficou em 9º lugar no ranking global.

53

54

55

O quadro de empregados foi reduzido em 4% no período 2000/2010, contanto

agora com 38 mil funcionários em 32 países, sendo 21 na Europa e 11 nas Américas.

Sua sede mundial está em Dublin, com sedes regionais em Paris e Miami. O

faturamento global subiu 8% em relação a 2000, totalizando vendas superiores a 8,8

bilhões em 2010, com a produção de papel atingindo 7,65 milhões de toneladas em

2010.

Com relação aos territórios produtores de madeira e considerando apenas as dez

maiores empresas do setor, é a que possui a menor quantidade de terras, com 104,5 mil

hectares de terras localizados na Colômbia e na Venezuela.

2.1.8 A Mondi

Finalmente, o Grupo Mondi (Figura 18), com atuação global em 31 países e

ocupante do décimo lugar no ranking mundial. A empresa tem suas raízes na África do

Sul, em 1967 e, a partir da década de 1990, estendeu seus negócios para muitos países

da Europa Central e Ocidental, através da aquisição de muitas empresas. Em 2000, a

empresa assumiu o controle acionário das empresas austríacas Neusiedler AG e

Frantschach e adquiriu a empresa polaca Cofinec. Em 2002, aumentou a sua

participação na empresa Syktyvar para 90%. Em 2004, aumentou para 71% o seu

controle acionário sobre a empresa polaca Celuloza Świecie AG. Em 2007, tornou-se

uma empresa de capital aberto, com as listas primárias em Joanesburgo e Londres. Em

2012, adquiriu o controle acionário da Nordenia International AG.

Considerando apenas as dez maiores empresas do ramo de celulose e papel, a

Mondi foi a que mais cresceu em volume de vendas no período 2000/2010, saindo de

três bilhões de dólares em 2000 para mais de oito bilhões de dólares em 2010,

perfazendo um crescimento de 174%. Aumentou em 2% o quadro de funcionários, hoje

com 29.000 empregados e reduziu a produção de papel em 38%, ao passo em que

aumentou a produção de celulose para 544 mil toneladas em 2010 (crescimento de 33%

em relação a 2000). O grupo possui 2,4 milhões de hectares de terras, 87% delas

localizadas na Rússia e o restante na África do Sul.

56

57

Assim, a análise do processo de reestruturação efetuado, na última década, pelas

maiores empresas do ramo de celulose e papel demonstra que os objetivos principais

das fusões e aquisições foram reduzir os custos com a força de trabalho, aumentar a

economia de escala com a concentração das atividades e introdução de novas

tecnologias poupadoras de mão de obra no processo produtivo, bem como investir em

áreas de maior produtividade e lucratividade situadas fora das zonas temperadas do

hemisfério norte. O resultado foi uma alavancagem nas vendas e a escalada rápida de

posições no ranking mundial, mantendo o grau de concentração típico do setor de

celulose e papel, conforme a Figura 19:

Figura 19 – Indústria Mundial de Celulose e Papel: Concentração no período

1998/2010.

Obs.: Os dados se referem à participação percentual do volume de vendas das dez

maiores empresas mundiais de celulose e papel no conjunto do volume de vendas das

cem maiores empresas.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados da RISI/PPI 1998, 2000, 2004 e

2010.

Os dados mostram que até 2004 as fusões e aquisições permitiram a

concentração do volume de vendas nas dez maiores empresas do setor de papel e

celulose, em que a participação percentual do top 10 subiu de 38,7% para 43% em

relação ao total de vendas realizadas pelas cem maiores empresas do ramo. As

informações para o ano de 2010 registram uma queda relativa do grupo top 10,

indicando um maior crescimento das demais empresas no cenário internacional. Isso

ocorreu porque o processo de reestruturação não ficou restrito aos dez grupos mais

38,7

41,6

43,0

39,9

36,0

37,0

38,0

39,0

40,0

41,0

42,0

43,0

44,0

1998 2000 2004 2010

%

58

poderosos, estendendo-se para as demais empresas do ramo, como por exemplo, a

formação da Fibria, resultante da fusão entre Aracruz e Votorantim Celulose e Papel,

em 2009. Com a fusão, a Aracruz, que era a 50ª empresa em 2004 e a Votorantim

Celulose e Papel, que era a 54º no mesmo ano, alavancaram para o 24º em 2010. Nesse

sentido, é salutar avaliar o processo de implantação e desenvolvimento da indústria de

celulose e papel no país. Historicamente, no Brasil, a produção industrial de celulose

teve início nos anos 1940, no âmbito da política de substituição de importações

implantado pelo Governo Federal pós-crise de 1929 e, dessa forma, antes de discutir o

avanço das empresas de produção de eucalipto e de celulose no Estado da Bahia, é

necessário resgatar o processo histórico de atuação das empresas papeleiras no país,

também, em seu início, bastante articulado às políticas públicas de desenvolvimento

econômico.

2.2 A territorialização das empresas de papel e celulose no Brasil

No Brasil, a primeira fábrica de papel surge em 1809, em Andaraí Pequeno, no

Rio de Janeiro, no contexto da vinda da família real e nas três décadas seguintes surgem

três novas fábricas: André Gaillard (1837), Zeferino Ferraz (1841) e Conceição da

Bahia (1841) todas no Rio de Janeiro. Em 1852, Guilherme Schuch, o Barão de

Capanema, instala a fábrica de Orianda, que consegue produzir um papel com

excepcional qualidade técnica, passando a fornecer o produto para vários jornais (Diário

do Rio de Janeiro, Correio da Tarde e Correio Mercantil) e papel selado para o Tesouro

Nacional. Entre as dificuldades enfrentadas pela fábrica Orianda para produzir papel no

período imperial estava a carência de matéria-prima, que obrigava a importação de

trapos da Europa e a peste bubônica que, em 1855, infectou todo o operariado. Mesmo

com o apoio do imperador D. Pedro II, a fábrica faliu em 1874 (CABRALES, 2005).

No período Republicano, entre 1889 e 1925 novas fábricas de papel são

instaladas no país e sobrevivem até hoje, com outros proprietários e novas

denominações em função de processo de aquisições e fusões comuns ao setor. Em 1889,

nasce a fábrica de papel Paulista, em Salto do Itu (hoje sob o comando da empresa

Arjowiggins19

) fundada pelos irmãos Melchert; Em 1890, surge a Companhia

Melhoramentos; Em 1909, os irmãos Klabin juntamente com outros acionistas criam a

19

O grupo Arjowiggins é resultado da fusão, em 1991, entre o grupo francês Arjomari e o grupo inglês

Wiggins Teape, com mais de 500 anos e mais de 240 anos, respectivamente, de existência no mercado de

papéis, convertendo-se numa das mais importantes empresas do setor (ARJOWIGGINS, 2013).

59

Companhia Fabricadora de Papel (atual grupo Klabin); Em 1923, nasce a Indústria de

Papelão Limeira S.A. (que originou o grupo Ripasa, posteriormente adquirido pelos

grupos Suzano e Votorantim Celulose e Papel-VCP, atual Fibria). Em 1925, o imigrante

libanês Karan Simão Racy fundou a Fábrica de Papelão Simão e Cia (que originou o

grupo Simão, posteriormente adquirido pela VCP, atual Fibria). Nesta época, a indústria

de papel dependia da importação de celulose e nenhuma empresa fazia a integração

vertical com a atividade de produção de madeira (MENDONÇA JORGE, 1992;

HILGEMBERG; BACHA, 2001; CABRALES, 2005; ARJOWIGGINS, 2013;

OSÓRIO, 2007).

A primeira fábrica moderna de papel e celulose foi instalada pelo grupo Klabin20

em Telêmaco Borba, no Paraná, no ano de 1946, utilizando o processo Kraft21

e o

pinheiro como matéria-prima. Naquele momento, o país se ressentia dos efeitos da crise

de 1929 e o governo proibiu a importação de equipamentos para a instalação de novas

fábricas de papel, o que acabou beneficiando as empresas existentes e concentrando a

produção, uma vez que estas empresas poderiam importar as máquinas, acessórios e

todos os insumos necessários para produzir celulose no país, inclusive com isenção de

impostos de importação e sem taxas alfandegárias (SUZIGAN, 1986).

Nesse sentido, Mendonça Jorge (1992) destaca a fábrica da Klabin como o

marco divisor da indústria de papel e celulose no Brasil, em função da integração

vertical representada pela exploração florestal, transporte até a fábrica, produção

industrial de celulose e papel e comercialização e da relação com o Estado através da

promoção de uma política pública especialmente desenvolvida para o setor:

Este empreendimento marca, a meu ver, uma linha divisória no

desenvolvimento da indústria de papel e de celulose no Brasil. Em primeiro

lugar, porque trata-se do primeiro projeto significativo de uma fábrica de

papel integrada (produção conjunta de celulose e papel) e. sobretudo,

utilizando recursos florestais nacionais. Em segundo lugar, porque é o

primeiro projeto onde aparece uma relação explícita entre o Estado e a

iniciativa privada, através de uma política pública deliberada de apoio ao

desenvolvimento do setor (MENDONÇA JORGE, 1992, p. 27).

20

De acordo com HILGEMBERG e BACHA (2001), o capital e o empresariado da indústria de papel tem

origem entre 1885 e 1925 nas atividades realizadas por imigrantes em importar e comercializar papéis e,

posteriormente, passando a atuar, também, na fabricação de papel. O grupo Klabin é oriundo da antiga

Companhia Fabricadora de Papel. 21

A palavra Kraft é de origem sueca e alemã e significa força. Trata-se do processo de fabricação de

celulose dominante no Mundo e consiste em cozinhar os cavacos de madeira em um equipamento

chamado digestor, onde o material é misturado com produtos químicos (hidróxido de sódio e

hidrossulfeto de sódio) e submetido a altas pressões e temperaturas para separar, quimicamente, as fibras

de celulose da lignina. A lignina é a substância que une as fibras de celulose e tem a característica de

aumentar a rigidez da parede celular vegetal e o processo Kraft possui a força necessária para romper essa

barreira e conseguir a celulose para a fabricação de papel (BRACELPA, 2013).

60

A produção de celulose e papel é dependente do fator locacional representado

pela matéria-prima, de forma que o alto custo do transporte da madeira em tora até a

fábrica força os empresários, através da taxa de utilização decrescente do capital

(MÉSZÁROS, 2011), a construírem o empreendimento industrial nas proximidades das

plantações florestais, normalmente situadas distantes das grandes cidades. No caso da

fábrica da Klabin, a localização em Telêmaco Borba estava ligada a existência de uma

grande reserva de Araucária na fazenda Monte Alegre, adquirida pelo grupo em 1934,

cuja própria compra foi incentivada pelo interventor do Governo Vargas no Estado do

Paraná, demonstrando que a empresa tinha a intenção de construir uma fábrica naquela

região (MENDONÇA JORGE, 1992).

Em função dessa especificidade da indústria de papel e celulose se localizar

perto das áreas fornecedoras de madeira, alguns autores teorizam sobre a pretensa

capacidade dessa indústria em desenvolver regiões distantes dos grandes centros

urbanos, promovendo, dessa forma, a desconcentração industrial e a geração de

emprego e renda:

A localização das fábricas esta ligada à concentração dos ativos florestais, de

propriedade das empresas e de seus fornecedores de matéria-prima, o que

torna a produção de celulose e papel uma atividade geradora de

desconcentração industrial, induzindo o desenvolvimento de regiões menos

dinâmicas, visto que os projetos são implantados próximos a maciços

florestais plantados, localizados na maioria das vezes distantes dos centros

urbanos (OSÓRIO, 2007, p. 20).

Com efeito, essa linha teórica não compartilha a ideia do desenvolvimento

desigual, combinado e contraditório com que o capital efetua a sua reprodução

ampliada. Para Osório (2007) a vinda de indústrias para uma região é suficiente para

desenvolvê-las, partilhando do modelo de desenvolvimento difundido pela concepção

cepalina, em que as diferenças sócio-territoriais diminuiriam com o avanço da

industrialização.

Nos anos 1950, apesar da auto-suficiência na produção de papel (exceto papel

imprensa), o país precisava importar 70% da celulose necessária para realizar a

atividade industrial de produção de papel em seu território. O contexto de dependência

da matéria-prima importada aliado ao cenário mundial de incerteza quanto à capacidade

da produção global de celulose atender à crescente demanda impulsiona o Brasil a

61

utilizar o eucalipto como fornecedor de fibra curta22

para a produção de celulose e,

nesse processo, consegue diminuir sua dependência externa de 73,7% em 1950 para

28,8% em 1960 (HILGEMBERG; BACHA, 2001).

Nesse período, a implementação do Plano de Metas de Juscelino Kubitschek

inaugurou uma nova fase de estruturação da economia capitaneada pelo Estado,

mediante a articulação de capitais nacionais, estrangeiros e estatais em prol da

industrialização do país, reforçada pela criação de um órgão específico de

financiamento de longo prazo, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico –

BNDE (SUZIGAN, 1986).

O Plano de Metas pretendia reduzir as importações de celulose e alcançar a auto-

suficiência em 1962, atingindo a produção de 300 mil toneladas de celulose e os dados

da Associação Nacional dos Fabricantes de Papel e Celulose – ANFPC (Atual

BRACELPA) mostram a eficiência dessa política governamental, chegando muito perto

da meta uma vez que a produção em 1962 foi de 278 mil toneladas de celulose (Figura

20).

Os dados mostram ainda que a produção de celulose de fibra curta, proveniente

do eucalipto, superou a produção de celulose de fibra curta pela primeira vez na história,

especificamente no ano de 1960 e, a partir daí, o eucalipto foi se tornando a principal

matéria-prima para a indústria brasileira de celulose. No período 1950/1962, enquanto a

produção de celulose de fibra longa cresceu 203% a de fibra curta atingiu um

crescimento superior a dez mil por cento. O aumento da produção industrial de celulose

ocorreu a partir da expansão de empresas nacionais que já atuavam no mercado nos

anos 1930 e 1940, bem como da entrada de empresas estrangeiras na década de 1950,

notadamente pelo processo de aquisição de fábricas já existentes23

.

22

Dois tipos de celulose, com diferentes características físicas e químicas, são utilizados na produção de

papel. A fibra longa, originária de espécies coníferas como o pinus, tem comprimento entre 2 e 5

milímetros, sendo utilizada na fabricação de papéis que demandam mais resistência, como os de

embalagens, e nas camadas internas do papel cartão, além do papel jornal. Já a fibra curta tem

comprimento entre 0,5 a 2 milímetros, derivando principalmente do eucalipto, sendo ideais para a

produção de papéis como os de imprimir e escrever e de fins sanitários (papel higiênico, toalhas de papel,

guardanapos). As fibras do eucalipto também compõem papéis especiais, entre outros itens. Elas têm

menor resistência, com alta maciez e boa absorção (BRACELPA, 2013). 23 Entre as empresas nacionais que expandiram a produção pode-se destacar a Klabin, a Indústria de Papel

Simão S.A. – IPS, a Suzano e a Ripasa. Três empresas estrangeiras se destacaram no período: a Rigesa, a

Manville e a Champion Corp., todas estadunidenses. A primeira surge quando a West Virginia Pulp and

Paper assume o controle da empresa nacional Gerin Focesi & Cia; A segunda é oriunda da compra da Cia.

de Papel Itajaí pela empresa Manville Corporation; A terceira surge a partir da aquisição da Panamericana

Têxtil pela Champion Corp., que se consolidou no mercado a partir da produção de celulose branqueada

62

Figura 20 – Brasil: Produção de Celulose no período 1950/1962.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados da ANFPC, 1990.

Em meados da década de 1960, o Estado estabeleceu incentivos fiscais24

para

garantir o suprimento da madeira para o funcionamento das fábricas, mediante a

promulgação do Decreto Lei 5.106/66, que beneficiava as pessoas físicas e jurídicas

com o abatimento, na renda bruta, das importâncias efetivamente aplicadas no

reflorestamento (para as pessoas físicas) e de até 50% do Imposto de Renda devido

(para as pessoas jurídicas) do total gasto com a atividade de reflorestamento. Outro

instrumento que contribuiu para a viabilização dos maciços florestais foi a Decisão

196/68 do BNDE, direcionando recursos financeiros para projetos que cumprissem as

metas mínimas de produção estabelecidas que, no caso da celulose, deveriam atingir

100 t/dia e as empresas ainda deveriam produzir pelo menos metade da madeira

utilizada no processo de fabricação da celulose. Com relação à medida do BNDE, é

importante ressaltar que em 1967 apenas seis fábricas de celulose reuniam as condições

necessárias para produzir 100 toneladas diárias de celulose, indicando a contribuição do

Estado em concentrar ainda mais o setor (HILGEMBERG; BACHA, 2001).

de fibra curta. É importante destacar que a Panamericana Têxtil surgiu a partir de financiamentos do

BNDE (MENDONÇA JORGE, 1992). 24

Em 1965 foi promulgado o Código Florestal (Lei 4.771) que aventou a possibilidade de serem

deduzidas do imposto de renda as importâncias empregadas em reflorestamento (Art. 38, § 2º) e, nesse

sentido, o Decreto Lei 5.106/66 surgiu para regulamentar os incentivos fiscais previstos no Código

Florestal.

0

20

40

60

80

100

120

140

160

180

Em m

il to

ne

lad

as

Fibra Longa

Fibra Curta

63

Além dos incentivos fiscais ao reflorestamento, o governo também isentou

(Decreto nº 60.943/67) o Imposto de Importação (II) e o Imposto sobre Produtos

Industrializados (IPI) para as indústrias de papel e artes gráficas e, em 1968, estendeu

esses benefícios às fábricas de celulose (MENDONÇA JORGE, 1992, p. 66).

Com todos estes incentivos, a produção brasileira de celulose triplicou no

período 1963/1973, conforme os dados da Figura 21:

Figura 21 – Brasil: Produção de Celulose no período 1963/1973.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados da ANFPC, 1990.

Pelos dados, verifica-se que a celulose de fibra curta proveniente do eucalipto

continua dominando a produção brasileira, representando praticamente o dobro da

produção da celulose de fibra longa. Enquanto a produção de celulose de fibra longa

cresceu 142% no período 1963/1973, a produção industrial de celulose de fibra curta

atingiu 251% de crescimento no mesmo período, indicando uma tendência de

distanciamento ainda maior ao longo do tempo.

Durante a Ditadura Militar, ainda inspirado pelo modelo de desenvolvimento

cepalino, o governo Geisel lança o II Plano Nacional de Desenvolvimento - PND, com

os objetivos de continuar o processo de industrialização do país a partir de novos

investimentos em infraestrutura, reduzir a dependência das importações de petróleo,

desenvolver a capacidade científica e tecnológica, desenvolver as regiões Centro-Oeste,

0

100

200

300

400

500

600

700

1963 1964 1965 1966 1967 1968 1969 1970 1971 1972 1973

Em m

il to

ne

ela

das

Fibra Longa

Fibra Curta

64

Norte e Nordeste, erradicar os problemas urbanos e realizar uma maior integração com a

economia mundial (BRASIL, 2013).

O II PND estabelecia as metas para a produção de celulose e papel até 1979,

quando a produção de celulose deveria atingir 2.860 mil/t/ano e a de papel 2.900

mil/t/ano. Considerando a produção de 1974 que foi de 1.547 mil/t/ano para a celulose e

de 2.267 mil/t/ano para o papel, as taxas de crescimento deveriam ser de 85% e 28%

respectivamente (BRASIL, 2013, p. 82).

Nesse contexto, o Estado lançou o I Plano Nacional de Papel e Celulose – PNPC

para alcançar a auto-suficiência na produção interna de papeis e atingir a meta de 3,68

milhões de toneladas em 1980. Com relação à produção de celulose, a meta proposta era

de 4,2 milhões de toneladas, sendo 2,2 milhões para o mercado interno e dois milhões

para o mercado externo (JUVENAL; MATOS, 2002, p. 9).

Isso significava a multiplicação da produção do ano de 1973 em 4,5 vezes e seria

necessário plantar quatro milhões de hectares para viabilizar a produção. O governo

então criou os “Distritos Florestais”, que seriam a formação de grandes áreas contínuas

a serem adquiridas para a produção de madeira em áreas próximas ao local de

implantação das novas fábricas. Do total de 30 distritos planejados, vinte seriam criados

nos estados de Espírito Santo, Minas Gerais, Bahia e Goiás. Cada distrito teria

aproximadamente 140 mil hectares poderia comportar duas fábricas com capacidade

total de produzir 1.000 toneladas diárias de celulose. Para facilitar a aquisição de terras

o Governo estava disposto a utilizar o recurso da desapropriação a fim de garantir o

êxito do PNPC. Segundo Mendonça Jorge (1992, p. 53):

Há indicações, não comprovadas, de que o Presidente Geisel decretou como

áreas de desapropriação, para fins de reforma agrária terras próximas a

Aracruz, o que permitiu que fossem compradas pela empresa, grandes glebas

de terra a preços aviltados e que, em seguida, este decreto teria sido

revogado.

Além disso, ao estabelecer como critério a instalação de duas unidades fabris em

cada distrito, cada uma com capacidade de produzir, pelo menos, 500 t/celulose/dia o

governo, mais uma vez, privilegiou os grandes grupos econômicos, na medida em que,

naquela época, apenas Aracruz, Cenibra e Jari reuniam as condições necessárias para

atender as metas mínimas de produção.

Conforme Najberg (1989 apud MENDONÇA JORGE, 1992, p. 62) a política de

financiamento executada pelo Estado na década de 1970 serviu de estímulo à

65

capitalização das empresas e considerando os recursos emprestados pelo BNDE(S)25

no

período 1975/87 apenas 26% foram amortizados, representando um grande calote aos

cofres públicos.

Em 1980, a produção de celulose alcançou 2.872,7 mil toneladas superando a

meta estabelecida no II PND, que foi de 2.680 mil toneladas. Com relação às metas

traçadas no I PNPC a produção alcançou 68% dos 4,2 milhões de toneladas previstos e

as exportações atingiram 44% dos 2,0 milhões de toneladas programados (ANFPC,

1990).

Mesmo não alcançando à totalidade das metas traçadas no I PNPC a produção dc

celulose saltou de 1.129,5 mil toneladas em 1974 para 2.872,7 mil toneladas em 1980,

caracterizando um crescimento de 154% e, com relação às exportações o crescimento

foi ainda maior (566%), uma vez que foram exportadas 887,8 mil toneladas de celulose

em 1980 contra 133,3 mil em 1974, indicando a política do Estado em apoiar

empreendimentos capazes de fornecer divisas para o país através do setor de

exportações e equilibrar as contas internacionais.

A crise econômica geral que marcou os anos 1980 afetou a produção de celulose

que passou a crescer menos no período, notadamente no setor de exportações, conforme

os dados da Figura 22.

Os dados mostram uma desaceleração do crescimento da produção e exportação

de celulose no país, uma vez que a produção cresceu apenas 40% no período 1981/1990

contra 154% no período 1974/1980. Já as exportações apresentaram uma queda ainda

maior, crescendo apenas 8,8% contra 566% no período anterior. As dificuldades na

expansão da produção estão ligadas à crise fiscal que se abateu sobre o Estado nos anos

1980, a partir da explosão das dívidas interna e externa que motivaram a adoção de

vários planos para tentar ajustar a economia e o clima de incertezas nos negócios

atrapalhou os investimentos.

25

O Banco Nacional de Desenvolvimento – BNDE foi criado pela Lei nº 1.628, de 20 de junho de 1952 e

atuou com esse nome até 1982, quando passou a se chamar Banco Nacional de Desenvolvimento

Econômico e Social – BNDES, numa tentativa de mostrar que o banco não somente buscava o

desenvolvimento econômico do país, mas também o desenvolvimento social (BNDES, 2013). No entanto,

as ações efetivas da instituição continuaram pautadas pelo apoio aos grandes grupos econômicos,

notadamente, no ramo de papel e celulose.

66

Figura 22 – Brasil: Produção e Exportação de Celulose no período 1981/1990.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados da ANFPC, 1990.

É nesse contexto que o BNDES aumenta a sua participação acionária em

diversas empresas com dificuldades ou capital insuficiente para continuar realizando

suas atividades produtivas, com destaque para a Aracruz (40,25%), a Braskraft (32.71

%), Cia. Celulose da Bahia (35,90%), a Cícero Prado/Cia. de Zorzi (46.96%), a Papelok

(31.15%), a Riocell (50%), a Papelão Ondulado do Nordeste- PONSA (22,68%), a Cia.

Guatapará- CELPAG (39,09%) e a Cia. Papeleira do Sul - CPS (22%). Esse processo de

participação acionária do BNDES em empresas foi apresentando uma redução ao longo

dos anos 1980 e a partir da implantação das políticas neoliberais efetuadas no final dos

anos 1980 e início dos anos 1990 essa participação é reduzida e até eliminada em alguns

casos, abrindo espaço para as privatizações em que grupos nacionais e estrangeiros

passam a comprar as empresas em dificuldades financeiras ou realizar fusões para

aumentar a competitividade no mercado internacional (MENDONÇA JORGE, 1992).

Em 1985, apenas oito empresas apresentavam a capacidade de produção superior

a 500 t/dia de celulose, correspondendo a 69% do total do país (Tabela 5).

Considerando as onze maiores empresas do ramo de celulose a capacidade nominal

instalada para produção de celulose correspondia a 79,7 % do total brasileiro, indicando

a alta concentração dessa atividade econômica, basicamente utilizando o eucalipto como

matéria-prima para a obtenção de celulose de fibra curta, atingindo 2/3 do total da

produção em 1985.

0

500

1.000

1.500

2.000

2.500

3.000

3.500

4.000

4.500

1981 1982 1983 1984 1985 1986 1987 1988 1989 1990

Em m

il to

ne

lad

as

Produção

Exportação

67

O II PNPC foi lançado no final de 1987 e pretendia ampliar até 1995 a oferta de

celulose para 6,6 milhões de toneladas, de papel para 8,4 milhões de toneladas, entre

outros objetivos como incentivos fiscais e estímulo a capitalização das empresas pela

abertura de capital. É no âmbito desse programa que nasce, em 1991, a Bahia Sul

Celulose S/A26

, uma associação entre Cia. Suzano (37,77%), CVRD (30,91%),

Bndespar27

(27,66%) e IFC (3,66%), com o propósito de construir uma fábrica em

Mucuri com capacidade para produzir 420 mil toneladas/ano de celulose de fibra curta

branqueada de eucalipto (JUVENAL; MATOS, 2002).

Tabela 5 – Brasil: Capacidade nominal instalada para produção de celulose – 1985.

EMPRESA Fibra Longa Fibra Curta Total %

toneladas/dia

Klabin 1320 298 1.618 14,9

Aracruz 1.331 1.331 12,2

Cenibra 970 970 8,9

Suzano 950 950 8,7

Jari - Monte Dourado 190 560 750 6,9

Riocell 665 665 6,1

Champion 630 630 5,8

RIPASA 600 600 5,5

Simão 450 450 4,1

Manville 390 390 3,6

Rigesa 320 320 2,9

Outras 1.424 792 2.216 20,3

TOTAL 3.644 7.246 10.890 100,0

Fonte: ANFPC, 1990.

É nesse período do II PNPC que surge outra grande empresa no ramo da

celulose, mais precisamente em 1988, quando o grupo Votorantim adquire a CELPAG

junto ao Bndespar que, até então, detinha 72,56 % das ações ordinárias. O grupo passa a

produzir celulose branqueada de eucalipto pelo processo Kraft integrada à produção de

papel de imprimir e escrever. Logo em seguida, em 1992, o grupo amplia sua escala de

operações com a compra da Indústria de Papel Simão (MENDONÇA JORGE, 1992;

JUVENAL; MATOS, 2002).

Foi também dentro do ciclo de investimentos realizados no âmbito do II PNPC

que a Aracruz pôde duplicar sua capacidade de produção com empréstimos de US$ 510

26

Em 2001 a empresa Suzano compra as ações de seus sócios e unifica a gestão em todas as suas

unidades operacionais (SUZANO, 2013). 27

O Bndespar é uma holding (sociedade gestora de participações sociais) do Banco Nacional de

Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), criada para administrar as participações em empresas

detidas pelo banco (BNDES, 2013).

68

milhões junto ao BNDES em 1988/1989, correspondendo à metade de total investido

pelo banco no setor (MENDONÇA JORGE, 1992; HILGEMBERG; BACHA, 2001).

Lançado num contexto de crise econômica, as metas de investimento do II

PNPC eram ambiciosas: investir quase 9,6 bilhões de dólares no período 1987/1995,

sendo 6,3 bilhões de dólares apenas para a ampliação da produção de celulose. Assim, o

BNDES aumentou os investimentos no setor de papel e celulose no período, atingindo a

marca de 24% do total de investimentos do banco em 1990, conforme a Figura 23:

Figura 23 – BNDES: Investimentos no setor de celulose e papel no período 1985/1994.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados do BNDES, 2013.

Ao final do período do II PNPC, o BNDES havia mudado o foco da sua atuação.

No período anterior, entre 1974 e 1985, o Banco, mediante a ação de suas subsidiárias,

detinha o controle acionário de quatro empresas do setor de celulose e papel e tinha

participação acionária não majoritária em outras 23 empresas. Nessa nova fase

(1986/1992), em consonância com as políticas neoliberais desenvolvidas pelo governo,

o BNDES passou a devolver ao controle privado as empresas que assumira no período

anterior, no âmbito do Programa Nacional de Desestatização – PND28

.

28

O Programa Nacional de Desestatização faz parte da implantação do projeto neoliberal no Brasil e foi

instituído por força da Medida Provisória – MP nº 155, de 15 de março de 1990, na gestão do Presidente

Fernando Collor de Melo. Mais tarde a MP se transformou na Lei nº 8.031/90, que por sua vez, foi

3

5

3

8

16

24

20

12

9

4

0

5

10

15

20

25

30

1985 1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994

%

69

Os anos 1990 marcaram para o BNDES a introdução de novos mecanismos

como forma de responder às crescentes demandas sociais e ambientais motivadas pelas

pressões da sociedade através de movimentos sociais e organismos não governamentais

atuando para tentar diminuir os problemas sociais e conservar os recursos naturais. O

Banco passa a introduzir em suas operações o conceito de responsabilidade social das

empresas, condicionando os financiamentos à realização de investimentos na

infraestrutura das comunidades próximas. Da mesma forma, o BNDES também exigiu

das empresas os documentos comprobatórios do licenciamento ambiental de cada

empreendimento, de acordo com a legislação atual, como requisitos imprescindíveis

para a liberação dos financiamentos (JUVENAL; MATOS, 2002).

Em 1997, algumas mudanças podem ser verificadas no ranking das empresas

brasileiras produtoras de papel e celulose em relação ao período anterior. Em 1985, os

principais fabricantes de papel eram Klabin, Suzano, Champion, Simão, Ripasa, Rigesa

e Manville e as principais empresas produtoras de celulose de mercado eram Aracruz,

Cenibra, Jari-Monte Dourado e Riocell.

No tocante à produção de papel, o volume total foi de 6.518 mil toneladas em

1997 e os dados da BRACELPA (Figura 24) mostram uma nova configuração em

relação ao ranking de 1985:

Klabin e Suzano continuaram liderando o mercado de papel, mas em

1985 a Klabin tinha 22,6 % e a Suzano 13,2 %, demonstrando a entrada

de novos concorrentes e um crescimento maior da Suzano que, em 1997,

passou a ter o mesmo percentual (15%) que a Klabin;

O grupo Votorantim (que adquiriu a Indústria de Papel Simão em 1992)

superou a Champion e ocupou o terceiro lugar;

Em 1992 a Manville comprou a Papelok, formando uma nova empresa

denominada Igaras, ocupando em 1997 o sexto lugar;

Apareceram novas empresas com mais de 2% de participação no

mercado nacional de produção de papel: Trombini, Pisa, Inpacel e

Santher.

revogada em 1997, quando a Lei 9.491/97 passou a regular o PND (VIOLA, 2011). De acordo com o

BNDES (2009, p. 6), durante o período 1990/2009 foram realizadas 71 desestatizaçoes no âmbito federal

e estadual, referentes aos setores siderúrgico, químico e petroquímico, fertilizantes, elétrico, ferroviário,

mineração, portuário, financeiro, de petróleo, de papel e celulose e outros, resultando em 105,8 bilhões de

dólares, incluindo a receita de venda e as dívidas transferidas ao comprador.

70

Figura 24 – Brasil: Empresas produtoras de papel – 1997.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados da BRACELPA, 1997.

Com relação à produção de celulose para mercado, o volume total foi de 2.769

mil toneladas em 1997 e os dados da BRACELPA (Figura 25) atestam a extrema

concentração existente neste setor, onde apenas seis empresas controlam a totalidade da

produção, sendo que Aracruz e Cenibra continuam liderando o ranking. Tomando-se

como referência a configuração produtiva em 1985, as principais mudanças são as

seguintes:

A Bahia Sul, formada, em 1991, pela associação da Cia Suzano, do BNDES e

da CVRD, superou a produção das tradicionais Jari e Riocell, ocupando o

terceiro lugar com 19% do mercado;

A Riocell apresentou um melhor rendimento e superou a produção da Jari que,

em 1985 ocupava o terceiro lugar;

O surgimento de uma nova empresa produtora de celulose de mercado, a

Lwarcel, criada em 1986, ainda com participação pequena no conjunto da

produção nacional.

15%

15%

8%

6%

5% 5% 4%

3%

3%

3%

2%

31%

KLABIN

SUZANO

VOTORANTIM

RIPASA

CHAMPION

IGARAS

RIGESA

TROMBINI

PISA

INPACEL

SANTHER

OUTROS

71

Figura 25 – Brasil: Empresas produtoras de celulose de mercado – 1997.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados da BRACELPA, 1997.

Com os investimentos alocados pelo II PNPC e a implantação das medidas

neoliberais que facilitaram a entrada de capitais estrangeiros no país, a indústria

brasileira de celulose e papel cresceram 50,5% e 24,3% respectivamente no período

1987/1995, mas não o suficiente para o atendimento das metas traçadas pelo II PNPC

que pretendia ampliar a oferta de celulose para 6,6 milhões de toneladas e de papel para

8,4 milhões de toneladas. Os dados da Figura 26 mostram o crescimento da produção de

celulose e papel no período 1987/2000.

38%

26%

19%

9%

5% 3%

ARACRUZ

CENIBRA

BAHIA SUL

RIOCELL

JARI

LWARCEL

72

Figura 26 – Brasil: Produção de celulose e papel: 1987/2000.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados da FAOSTAT, 2013.

Em 1995, a produção industrial de celulose atingiu 5,909 milhões de toneladas e

a de papel 5,856 milhões de toneladas, abaixo das metas do PNPC e caracterizando uma

nova fase em que a produção de celulose passa a liderar os volumes produzidos pelo

segmento no país, com uma taxa de crescimento duas vezes maior que a verificada pela

produção de papel.

Os dados da Figura 27 acrescentam uma informação importante na análise da

expansão da produção de celulose no Brasil: Enquanto a produção de papel cresceu,

basicamente, para o atendimento das demandas do mercado interno, a produção de

celulose se consolidou como um ramo de atividades crescentemente voltado para

abastecimento dos mercados europeu, estadunidense e asiático.

Assim, as exportações de papel que em 1987 foram 0,609 milhão de toneladas

(12,9 % do total produzido) alcançaram um valor de 0,839 milhão de toneladas em 2000

(11,8 % do total produzido), o que representa uma queda na quantidade exportada de

8,8% no período. Já as exportações de celulose saltaram de 0,814 milhão de toneladas

(20,7 % do total produzido) para 4,425 milhões de toneladas (39,7 % do total

produzido), caracterizando um aumento de 91,5 % no mesmo período (1987/2000).

0,0

1,0

2,0

3,0

4,0

5,0

6,0

7,0

8,0

Em m

ilhõ

es

de

to

ne

lad

as

Celulose

Papel

73

Figura 27 – Brasil: Exportações de celulose e papel: Participação relativa no total da

produção no período 1987/2000.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados da FAOSTAT, 2013.

A crescente expansão da produção de celulose no Brasil no período 1987/2000

foi suficiente para colocar quatro empresas na listas das 150 maiores do ramo no

mercado mundial, conforme dados da Tabela 6.

Os dados comprovam a grande concentração do setor de produção industrial de

papel e celulose, restrito a poucas empresas e a poucos países. Isto ocorre porque esta

indústria é a que exige maior intensidade de capital no mundo, em função do longo

período de maturação que envolve grande necessidade de terras, plantio, máquinas,

equipamentos e capital de giro. Em 1996, a produção mundial se restringia aos EUA,

Japão e alguns países europeus e no Brasil, poucas empresas aparecem no ranking 150,

com destaque para o grupo Klabin, ocupando a 52º posição no cenário global.

0,0

5,0

10,0

15,0

20,0

25,0

30,0

35,0

40,0

45,0

% Celulose

Papel

74

Tabela 6 – Maiores empresas mundiais de papel e celulose – 1996.

RAN-

KING EMPRESA

PAÍS

SEDE

VENDAS DE

PAPEL E

CELULOSE

(US$ milhões)

VENDAS

CONSOLI-

DADAS (US$ milhões)

1 International Paper EUA 16.220,0 20.143,0

2 Nippon Paper Industries Japão 9.411,5 11.623,9

3 Oji Paper Japão 8.456,2 12.047,6

4 Kimberly-Clark EUA 8.388,2 13.149,1

5 UPM-Kymmene Finlândia 7.939,2 11.852,7

6 KNP BT Holanda 7.020,0 8.492,9

7 Svenska Cellulosa Suécia 5.991,8 7.767,1

8 Enso Oy Finlândia 5.721,5 5.876,3

9 James River EUA 5.700,0 5.700,0

10 Arjo Wiggins Appleton Inglaterra 5.639,1 5.639,1

11 Georgia-Pacific EUA 5.609,0 13.024,0

12 Stora Suécia 5.249,2 6.331,0

13 Champion International EUA 4.961,7 5.880,4

52 Ind. Klabin de Papel e Cel. Brasil 1.187,2 1.187,2

75 Votorantim Celulose e Papel Brasil 654,3 654,3

90 Aracruz Celulose Brasil 556,3 527,5

97 Cia. Suzano de Papel e Cel. Brasil 512,4 1.684,8

Fonte: RISI, PPI - Top 150 Listing of 1996.

No período de 2001 a 2011 (Figura 28) a produção industrial brasileira de

celulose saltou de 7,390 milhões de toneladas em 2001 para 13,922 milhões de

toneladas em 2011, perfazendo um crescimento de 88,4% no período. Da mesma forma

que o período anterior (1987/2000) a produção de celulose tem crescido a taxas

superiores à da produção de papel29

que, no mesmo período, avançou de 7,354 milhões

de toneladas em 2001 (praticamente o mesmo valor que a produção de celulose) para

10,159 milhões de toneladas em 2011, num crescimento de 38,1%.

29

Exceto no biênio 2010-2011, quando a produção de celulose recuou 1,7% e a de papel cresceu 4,4%,

não sendo suficiente para alterar a configuração de produção geral do período 2001/2011, caracterizada

pelo domínio do setor de celulose.

75

Figura 28 – Brasil: Produção de celulose e papel: 2001/2011.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados da FAOSTAT, 2013.

Com relação à participação das exportações no conjunto da produção de celulose

e papel, verificou-se uma mudança significativa no comportamento da indústria de

papel, que também aumentou as suas exportações no período 2001/2011, conforme os

dados da Figura 29:

7,4 8,0

9,1 9,5

10,4

11,2

12,0 12,7

13,3

14,2 13,9

7,4 7,7 7,8

8,2 8,6 8,7 9,0 9,2 9,4

9,8 10,2

0,0

2,0

4,0

6,0

8,0

10,0

12,0

14,0

16,0

2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011

Em m

ilhõ

es

de

to

ne

lad

as

Celulose

Papel

76

Figura 29 – Brasil: Exportações de celulose e papel: Participação relativa no total da

produção no período 2001/2011.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados da FAOSTAT, 2013.

Enquanto entre os anos 1987/2000 as exportações de papel recuaram 8,8%, no

período 2001/2011 elas cresceram 49,7%, índice superior ao verificado pelas

exportações de celulose, que aumentaram 37,7%. Mas, em termos gerais, é notável o

avanço das exportações brasileiras de celulose, que em 2011 representaram 60,9% do

total da produção, seguindo para Europa, América do Norte, Ásia e Oceania, conforme

dados da Figura 30:

Figura 30 – Destino das exportações brasileiras de celulose e papel - 2011.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados da BRACELPA, 2011.

44,3 41,7

49,1 51,3 52,6

54,8 54,1 55,5

61,8 59,2

60,9

12,8 14,1

20,9 20,7 22,2

20,7 20,4 20,3 20,3 20,0 19,1

0,0

10,0

20,0

30,0

40,0

50,0

60,0

70,0

2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011

% Celulose

Papel

77

A maior parte do comércio internacional de papel realizado pelo Brasil tem

como destino a America Latina, com 56,8% do valor total exportado, em função da

carência que os países da região possuem no tocante ao setor, com produção ausente ou

insuficiente para atender plenamente as demandas internas. Quanto às exportações de

celulose, a Europa é a principal região importadora, respondendo por 45,5% do valor

total. Na última década, enquanto a América do Norte reduziu o volume das

importações de celulose de 28% em 2000 para 18,7% em 2011, a China que importava

apenas 3% em 2000, compra agora 26% do total exportado pelo país, sendo o segundo

maior parceiro comercial do setor.

Entre 2001 e 2010, a produção industrial de celulose no Brasil cresceu 91,7 % e

alavancou o país para a posição de quarto colocado no ranking mundial (Tabela 7),

apresentando um desempenho superior a tradicionais produtores como Suécia, Finlândia

e Japão.

Tabela 7 – Dez maiores produtores mundiais de celulose – 2001/2010.

Ranking 2001 2010

País Produção* País Produção*

1º EUA 53,0 EUA 50,3

2º Canadá 24,9 China 20,4

3º China 13,9 Canadá 18,6

4º Suécia 11,4 Brasil 14,2

5º Finlândia 11,2 Suécia 11,7

6º Japão 10,7 Finlândia 10,5

7º Brasil 7,4 Japão 9,4

8º Rússia 6,0 Rússia 7,3

9º Indonésia 4,4 Indonésia 5,8

10º Chile 2,7 Chile 4,1

* Em milhões de toneladas.

Fonte: Tabela elaborada pelo autor a partir de dados da FAOSTAT, 2013.

Isso ocorreu porque enquanto o Brasil quase dobrou a produção industrial de

celulose no período 2001/2010, a Suécia cresceu apenas 2,9 % e Finlândia e Japão

amargaram queda de 5,9 % e 12,2 % respectivamente, conforme dados da Figura 31:

78

Figura 31 – Taxas de crescimento da produção de celulose no período 2001/2010.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados da FAOSTAT, 2013.

Outra movimentação importante vem sendo o crescimento da produção

industrial de celulose da China, que ocupa agora o segundo lugar no ranking mundial,

anteriormente pertencente ao Canadá que, por sua vez, teve o pior desempenho entre os

grandes produtores, com uma queda de 25,4 % da produção. Em 2011, o ranking dos

dez principais produtores permaneceu inalterado, mas o Brasil vem crescendo a uma

taxa bem superior a da China e dos EUA, condições necessárias para galgar novas

posições no cenário mundial.

O desempenho positivo da produção brasileira de celulose no período teve uma

contribuição importante do Estado, através do seu órgão de fomento ao

desenvolvimento, o BNDES, que investiu 13,8 bilhões de reais no setor de papel e

celulose entre os anos 2001 a 2010, conforme dados da Figura 32:

91,7

53,7

47,3

31,3

22,0

2,9

-5,2 -5,9

-12,2

-25,4

-40,0

-20,0

0,0

20,0

40,0

60,0

80,0

100,0

%

79

Figura 32 – Investimentos do DEPACEL/BNDES no setor de papel e celulose -

2001/2010.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados do BNDES, 2013.

A média de investimentos do DEPACEL30

foi de R$ 1,3 bilhão por ano, mas os

dados mostram grande variação ao longo dos anos, com picos de desembolsos em

alguns anos e quedas acentuadas em outros, caracterizando uma variabilidade explicada

pelo BNDES como normal em função das flutuações naturais nos ciclos de

investimentos dos setores31

32

33

34

.

30

O Departamento de Indústria de Papel e Celulose – DEPACEL é o órgão do BNDES responsável pelas

operações diretas e mistas dos setores de celulose, papéis, florestas plantadas e painéis de madeira. 31

Do total investido nos dez anos (R$ 13,85 bilhões) 18,8% (R$ 2,6 bilhões) foram em renda variável e

81,2% (R$ 11,25 bilhões) em renda fixa. Em 2009, por exemplo, do total de R$ 3,6 bilhões

desembolsados pelo banco, R$ 2,4 bilhões resultaram em uma operação de renda variável que deu origem

à Fibria (Fusão da Aracruz Celulose com a Votorantim Celulose e Papel). 32

Renda variável é um tipo de investimento no qual a remuneração ou retorno de capital não pode ser

determinado na data da realização do investimento, sendo, portanto, pouco previsível, pois está sujeito a

grandes variações de acordo com o mercado. Ações de empresas são exemplos de renda variável

(BANCO DO BRASIL, 2013). 33

Renda Fixa é um tipo de investimento com regras definidas de remuneração em que o rendimento é

conhecido previamente (juro prefixado) ou dependente de indexadores (taxa de câmbio ou de inflação,

taxa de juros, etc.). São exemplos de renda fixa a Caderneta de Poupança, o Certificado de Depósito

Bancário (CDB), os Títulos Públicos, as Letras de Câmbio, as Letras Hipotecárias, as Debêntures e

Fundos de Renda Fixa (BANCO DO BRASIL, 2013). 34

Em 2009 ocorreu a incorporação da Aracruz Celulose pela Votorantim Celulose e Papel (VCP),

resultando na empresa denominada Fibria, com controle acionário exercido pelo Bndespar (33,6%),

Votorantin Industrial (29,3%) e ações no mercado (37,1%), segundo informações do Plano de Manejo da

Unidade Aracruz, regiões do Espírito Santo e Bahia (FIBRIA, 2010).

0,8 0,8

0,4

0,95

1,35

2,3

1,9

0,95

3,6

0,8

0

0,5

1

1,5

2

2,5

3

3,5

4

2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010

R$

bilh

õe

s

80

O principal destino dos investimentos classificados como operações de renda

fixa é a linha voltada para a modernização ou ampliação da capacidade produtiva dos

setores de celulose, papel, florestas plantadas e painéis de madeira, abrigando 79,6%

(R$ 11,027 bilhões) dos investimentos totais no período 2001/2010. As demais linhas

de renda fixa que receberam investimentos do DEPACEL foram a destinada a

investimentos sociais das empresas com 0,6% (R$ 0,08 bilhão ou R$ 80 milhões) e a

linha emergencial de capital de giro criada no contexto da crise financeira internacional

de 2008 com 1% (R$ 0,143 bilhão ou R$ 143 milhões) do total de desembolsos diretos

(BNDES, 2009; VIDAL; DA HORA, 2013). O valor irrisório dos investimentos

voltados para o setor social, que não chega a 1% do valor total, é evidência irrefutável

da postura classista do Estado ao realizar suas ações, contradizendo o discurso da

solidariedade social e da geração de emprego e renda para os mais pobres.

Considerando apenas os investimentos realizados pelo DEPACEL na linha de

modernização ou ampliação da capacidade produtiva dos setores de celulose, papel,

florestas plantadas e painéis de madeira, a distribuição favorece o setor de celulose com

quase a metade dos desembolsos efetuados no período 2001/2010, conforme os dados

da Figura 33:

Figura 33 – Investimentos do BNDES na modernização e na ampliação da capacidade

produtiva - 2001/2010.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados do BNDES, Relatórios Anuais

2001 a 2010.

49%

23%

18%

10%

Celulose

Papéis

Florestas Plantadas

Painéis de Madeira

Valor total dos investimentos: R$ 11,027 bilhões.

81

As grandes empresas produtoras de celulose no Brasil puderam modernizar e

ampliar a sua capacidade de produção no período 2001/2010 com o aporte significativo

de recursos do BNDES, elevando a produção para mais de 14 milhões de toneladas e

passando a ocupar a quarta posição no ranking mundial. Os principais projetos

aprovados pelo BNDES no período receberam investimentos de R$ 4,4 bilhões,

conforme dados do Quadro 3:

Quadro 3 – Investimentos do BNDES no setor de celulose – 2001/2010.

Empresa Projeto Período Investimento

BNDES

VCP (atual

Fibria)

Aumento da capacidade de produção da

unidade de Jacareí (SP), de 422 mil t/ano

para 822 mil t/ano.

2000-

2002

R$ 406

milhões

Ripasa Aumento de capacidade de produção de

celulose na unidade de Limeira (SP) de 310

mil t/ano para 455 mil t/ano.

2000-

2002

R$ 120

milhões

Aracruz

(atual Fibria)

Terceira linha da unidade de Aracruz (ES),

com capacidade de produção de 700 mil

t/ano de celulose.

2000-

2002

R$ 666,3

milhões

Suzano Ampliação da linha de Suzano (SP) de 420

mil t/ano para 505 mil t/ano.

2002-

2004

R$ 116

milhões

Veracel

(joint-

venture da

Stora Enso e

da Aracruz)

Criação da fábrica nos limites dos

municípios de Eunápolis e Belmonte, na

Bahia, com capacidade de 900 mil t/ano

2003-

2005

R$ 1,3 bilhão

Klabin Adequação ambiental, modernização e

aumento de capacidade da unidade de

Telêmaco Borba (PR), de 564 mil t/ano para

664 mil t/ano.

2004-

2005

R$ 100

milhões

Suzano Ampliação da produção em Mucuri-BA,

com capacidade de produção de 1 milhão de

t/ano de celulose .

2005-

2007

R$ 1,5 bilhão

Aracruz

(atual Fibria)

Modernização da unidade de Guaíba (RS),

com aumento de capacidade de 400 mil

t/ano para 430 mil t/ano.

2006-

2007

R$ 21 milhões

VCP (atual

Fibria)

Criação da primeira planta de celulose no

estado do Mato Grosso do Sul, com

capacidade instalada de 1,3 milhão de t/ano

de celulose.

2007-

2009

R$ 600

milhões

Aracruz

(atual Fibria)

Expansão da unidade de Barra do Riacho,

em Aracruz (ES), de 2.130 mil t/ano para

2.330 mil t/ano.

2006-

2008

R$ 250

milhões

Fonte: Quadro elaborado pelo autor a partir de dados de VIDAL e DA HORA, 2013, p.

155-156.

82

A implantação do projeto neoliberal nos anos 1990 e os altos investimentos

realizados no setor de papel e celulose, apoiados financeiramente pelo Estado através do

BNDES, forneceram as condições para que as empresas estrangeiras já existentes

aumentassem a sua produção e novas empresas passassem a produzir em solo nacional,

conforme dados da Figura 34:

Figura 34 – Brasil: As quinze maiores empresas de papel e celulose em volume de

vendas - US$ milhões – 2010.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados da REVISTA EXAME, 2011.

Em 2010, as empresas estrangeiras operando no Brasil no setor de papel e

celulose eram International Paper (estadunidense), Cenibra35

(japonesa), Rigesa

(estadunidense), Veracel (sueca-finlandesa), Bahia Speciality Cellulose (chinesa) e

Stora Enso Arapoti (sueca-finlandesa), controlando ¼ das vendas realizadas no setor.

Dessa forma, o mercado brasileiro de produção de papel e celulose ainda é

dominado por nove empresas de controle acionário nacional, que movimentaram 74,2%

das vendas em 2010 e se concentram no Estado de São Paulo, sede de 2/3 dessas

empresas (Suzano, Klabin, Fibria, Grupo Orsa, Penha e Jandaia).

35

Em 2001, a CVRD desfez a sua participação na Cenibra e vendeu suas ações ao grupo Japan Brazil

Paper and Pulp – JBP, que, a partir de então, detém o controle acionário da empresa (BNDES, 2001).

20,8%

19,4%

17,9%

7,8%

6,2%

5,9%

4,2%

3,3%

2,7%

2,6% 2,3%

2,0% 1,8% 1,6% 1,5%

Suzano

Klabin

Fibria

International Paper

Cenibra

Grupo Orsa

Rigesa

Veracel

Mili

Bahia Speciality Cellulose

Celulose Irani

Penha

Jandaia

Stora Enso Arapoti

AdamiVolume total das vendas em 2010: US$ 14.398,40

83

Os resultados alcançados na última década melhoraram a posição das empresas

brasileiras no ranking mundial, conforme dados da Tabela 8:

Tabela 8 – Maiores empresas mundiais de papel e celulose – 2010.

RAN-

KING EMPRESA PAÍS SEDE

VENDAS DE

PAPEL E

CELULOSE

(US$ milhões)

VENDAS

CONSOLI-

DADAS

(US$ milhões)

1 International Paper EUA 24.959,0 25.179,0

2 Procter & Gamble EUA 14.736,0 78.938,0

3 Stora Enso Finlândia/Suécia 11.532,6 13.640,4

4 Oji Paper Japão 11.503,0 13.448,1

5 Nippon Paper Japão 11.089,8 12.522,1

6 Svenska Cellulosa Aktiebolaget Suécia 10.823,2 15.138,7

7 UPM Finlândia 10.073,1 11.821,7

8 Kimberly Clark EUA 9.607,0 19.746,0

9 Smurfit Kappa Group Irlanda 8.842,5 8.845,1

10 Mondi Reino Unido/África do Sul 8.101,9 8.250,3

11 Sappi África do Sul 6.572,0 6.572,0

12 Marubeni Japão 6.466,6 102.705,1

13 Smurfit-Stone Container EUA 6.284,0 6.284,0

24 Fibria Celulose Brasil 3.555,0 3.555,0

32 Suzano Papel e Celulose Brasil 2.553,9 2.553,9

44 Klabin Brasil 1.885,9 2.072,5

87 Cenibra Brasil 797,8 797,8

Fonte: RISI, PPI - Top 150 Listing of 2010.

Com a incorporação da Aracruz Celulose pela Votorantim Celulose e Papel

(VCP) e criação da Fibria, o grupo passou a ser a maior empresa brasileira em vendas

de papel e celulose, superando a Klabin que era líder em 1996. No geral, as quatro

empresas melhoraram suas posições no ranking: Klabin era 52º em 1996 e agora está

em 44º; Suzano era 97º e agora está em 32º; Cenibra nem aparecia no ranking das 150

maiores empresas em 1996 e agora está em 87º; A Votorantim e a Aracruz ocupavam as

posições 75º e 90º respectivamente e, com a formação da Fibria, localiza-se agora em

24º lugar. Mesmo assim, o total de produção de papel e celulose no Brasil ainda é muito

pequeno quando se analisa o mercado mundial, uma vez que o total de vendas das 15

maiores empresas brasileiras em 2010 foi de US$ 14.398,40, valor abaixo das vendas

verificadas pelas líderes International Paper (US$ 24.959,0) e Procter & Gamble (US$

14.736,0) no mesmo ano.

Da mesma forma que no âmbito mundial os dez maiores produtores concentram

82% da produção total de celulose de mercado, no Brasil a concentração dessa atividade

é ainda maior, conforme dados da Figura 35:

84

Figura 35 – Brasil: Concentração da produção de papel e celulose: participação das dez

maiores empresas - 1952/2009.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados de Juvenal e Matos, 2002, p. 19 e

da BRACELPA, Relatório Estatístico, 2009, p. 19-31.

A produção de celulose é bastante restrita e somente grupos altamente

capitalizados reúnem as condições necessárias para fazer frente aos enormes

investimentos demandados para realizar a integração vertical, caracterizada pela compra

de terras, plantio, máquinas, equipamentos e capital de giro. No mundo e no Brasil,

considerando as duas últimas décadas, os movimentos de fusão de empresas visando ao

aumento da escala de produção e diminuição dos custos resultaram em uma

monopolização ainda maior dessa atividade. No Brasil, por exemplo, em 2009, as dez

maiores empresas de celulose dominavam mais de 93% da produção nacional. Isso

também ocorre no ramo de papel, só que em menor intensidade, uma vez que a

quantidade de investimentos e o período de amortizações são menores em comparação

com a indústria de celulose.

Conforme a Figura 36, a capacidade instalada para produção de celulose no

Brasil em 2009 foi de 15.123.800 toneladas, sendo que o conjunto das dez maiores

empresas concentrou 89,6 % (13.548.000 t) do total nacional.

52,9 51,4 53,2 57,1

64,3 65,1 65,2

55,9

80,1 82,5

87,3 88,9 93,4 94,3 93,2

0

10

20

30

40

50

60

70

80

90

100

1952 1966 1972 1982 1992 1999 2001 2009

% Papel

Celulose

85

Figura 36 – Brasil: Capacidade instalada para produção de celulose - 2009.

Fonte: Mapa produzido pelo autor a partir de dados da BRACELPA, Relatório

Estatístico 2009.

Obs.: Os dados se referem apenas à capacidade instalada das 10 maiores empresas em

2009, correspondente a 89,6% (13.548.000 t) do total nacional (15.123.800 t). Os dados

não incluem a capacidade instalada para a produção de celulose solúvel.

Além da concentração verificada no âmbito da distribuição empresarial,

constatou-se também uma distribuição geográfica bastante irregular, em que a atuação

dessas dez empresas ficou restrita a oito estados: São Paulo, Espírito Santo, Bahia,

Paraná, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Santa Catarina e Pará.

No tocante à capacidade instalada para produção de papel no Brasil (Figura 37)

em 2009 o país reunia as condições industriais necessárias para produzir 11.345.432

toneladas, em que as 14 maiores empresas atuando em nove estados, controlavam

55,7% (6.319.799 t) do total nacional, apresentando uma concentração empresarial e

geográfica menor do que a verificada na indústria de celulose.

86

Figura 37 – Brasil: Capacidade instalada para produção de papel - 2009.

Fonte: Mapa produzido pelo autor a partir de dados da BRACELPA, Relatório

Estatístico 2009.

Obs.: Os dados se referem apenas a capacidade instalada das 14 maiores empresas em

2009, correspondente a 55,7% (6.319.799) do total nacional (11.345.432 t).

Quando se analisa a concentração da atividade industrial de produção de

celulose e papel no âmbito da capacidade instalada total por estado verifica-se que São

Paulo tem o domínio nos dois setores, com a indústria de papel apresentando uma

concentração maior do que a de celulose, conforme dados da Figura 38.

87

Figura 38 – Capacidade Instalada para produção de celulose e papel – 2009.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados da BRACELPA, Relatório

Estatístico 2009.

88

Os dados mostram que o estado de São Paulo concentra 41,6% da capacidade

instalada de produção de papel e 27,5% da produção de celulose e, considerando os três

estados maiores produtores, a indústria de papel apresenta uma concentração de 80,3% e

a de celulose 59,5%. Aparentemente, essas informações podem ser contraditórias, mas

quando se verifica a quantidade de estados produtores, enquanto a indústria de papel

está presente em 17 estados, a de celulose realiza operações em onze apenas. Isso ocorre

porque a indústria de papel produz bens de consumo, com sua venda orientada para o

consumidor final, enquanto que a indústria de celulose produz um bem intermediário,

voltado para o consumo de outras fábricas. Em outras palavras, a indústria de celulose é

mais concentradora no tocante ao número de empresas existentes em função dos altos

custos de implantação e dos longos prazos de amortização; e, geograficamente, mais

dispersa em função da necessidade de proximidade junto aos maciços florestais. Com a

indústria de papel acontece o contrário: os custos menores de implantação e baixos

prazos de amortização induzem a gestação de mais empresas e a menor necessidade de

estar próxima às fontes de matérias-primas promovem a concentração geográfica.

Assim, enquanto a indústria de papel se localiza em regiões mais próximas do

mercado consumidor e com melhor infraestrutura, a indústria de celulose se localiza

próximas às zonas produtoras de madeira, em função dos altos custos em transportar

madeira em tora por grandes distâncias. Por esta razão, seguindo a taxa de utilização

decrescente do capital (MÉSZÁROS, 2011), a atividade de produção de celulose gera

uma pequena desconcentração industrial, orientada pela localização dos territórios de

produção de madeira de propriedade das empresas e/ou de seus fornecedores de

matéria-prima.

Segundo dados da FAOSTAT (2010), 59,3 % de toda celulose produzida no

Brasil foi exportada e conforme a BRACELPA (2010), 86% desse total foram

embarcados nos portos de Vitória/Portocel-ES36

(64%) e de Santos-SP (22%). O

restante foi embarcado nos portos de Salvador-BA, Rio Grande-RS, Almeirim (PA) e

outros portos, conforme a Figura 39.

36

O Terminal Especializado de Barra do Riacho – Portocel está localizado no estado do Espírito Santo,

pertence às empresas Fibria (51%) e Cenibra (49%) e é o único porto do Brasil especializado no

embarque de celulose, com capacidade anual de 7.500.000 toneladas. O porto possui uma infraestrutura

capaz de receber as cargas por diferentes modalidades de transporte (rodoviário, ferroviário e marítimo) e

de registrar todas as operações de embarque através da coleta eletrônica de dados com transmissão em

tempo real para uma rede de microinformática ligada aos sistemas da Alfândega via EDI (do inglês

Electronic Data Interchange que significa troca estruturada de dados), que dinamiza o processo e facilita

o embarque da celulose (PORTOCEL, 2013).

89

Figura 39 – Brasil: Exportações de celulose e papel - 2010.

Fonte: Mapa produzido pelo autor a partir de dados da BRACELPA, Mapa do setor de

celulose e papel, 2010.

As exportações brasileiras de papel representaram 20,1% do total produzido em

2010 (FAOSTAT, 2013), sendo que as principais vias utilizadas para escoar a produção

foram o porto de Santos-SP (45%) e o transporte terrestre (rodoviário e ferroviário),

onde 26% da produção brasileira de papel são escoadas para os países vizinhos

(BRACELPA, 2010).

Verifica-se que o Portocel tem uma localização estratégica para receber a

celulose produzida, não somente das terras capixabas, mas, notadamente, da Bahia que

possui duas grandes fábricas de celulose (Veracel em Eunápolis e Suzano em Mucuri)

relativamente próximas da fronteira com o Espírito Santo e bem próximas dos maciços

florestais. Considerando a soma das áreas de fomento e os plantios próprios realizados

nas terras das empresas (Figura 40) a Bahia possui a maior fonte de matéria-prima tipo

madeira em tora, com 648 mil hectares plantados de eucalipto, o que representa 24,2%

do total plantado no Brasil. Ao todo, treze estados tem territórios produtores de madeira,

mas Bahia, São Paulo, Paraná, Minas Gerais e Rio Grande do Sul apresentam uma área

conjunta superior a 74% do total existente no país.

90

Figura 40 – Brasil: Fontes de matérias-primas para a indústria de papel e celulose -

2010.

Fonte: Mapa produzido pelo autor a partir de dados da BRACELPA, Mapa do setor de

celulose e papel, 2010.

Nesse contexto, a indústria de celulose e papel apresentou um crescimento

constante ao longo da histórica econômica do país. Enquanto o Brasil, nos anos 1950,

precisava importar 70% da celulose necessária para realizar a atividade industrial de

produção de papel em seu território, atualmente o país é o segundo37

maior exportador

de celulose, com quase 8,5 milhões de toneladas (FAOSTAT, 2013), correspondentes a

60,9% do total da produção nacional, seguindo para Europa, América do Norte, Ásia e

Oceania. Para que o país realizasse a metamorfose de importador para grande

exportador foi fundamental a participação do Estado, desde a política

desenvolvimentista do Plano de Metas de Juscelino Kubitschek, que estabeleceu

incentivos fiscais e redução de impostos, passando pelos Planos Nacionais de

Desenvolvimento do Regime Militar e lançamento dos PNPCs até os anos 1990, quando

o Governo Brasileiro decide aprofundar o projeto neoliberal, dando início ao processo

37

O maior exportador mundial de celulose é o Canadá, com 9,1 milhões de toneladas, correspondentes a

49,3% do total da produção canadense (FAOSTAT, 2013).

91

de privatizações, abertura econômica e desregulamentação das leis trabalhistas. O

BNDES foi o órgão governamental que mais participou da grande expansão da indústria

de papel e celulose no Brasil, inclusive com o desembolso de recursos para empresas

estrangeiras, sob o argumento da promoção do desenvolvimento e da geração de

emprego e renda para a população, mas, na realidade, apenas 0,6 % dos investimentos

eram voltados para o setor social.

Para o estado da Bahia, a territorialização das empresas esteve articulada ao

movimento de expansão do capital internacional facilitado pela implementação do

projeto neoliberal no Brasil, a partir dos anos 1990, marcando uma fase de grande

expansão dos territórios produtores de madeira e é fundamental uma análise mais

detalhada de como se deu esse processo, o que será realizado no próximo capítulo .

A ideologia neoliberal traz embutida uma proposta de resignação aos ajustes

estruturais alertando que eles são necessários para que o Estado possa garantir serviços

públicos de qualidade para todas as pessoas e que o futuro poderia ainda ser pior se

essas reformas não fossem implantadas. Entretanto, no Brasil, o ambiente favorável ao

ingresso de capitais externos contribuiu para a entrada de empresas estrangeiras com

atuação agressiva no mercado global e ávidas por territórios onde os custos fossem

baixos e possibilitassem maior competitividade e lucratividade. Para Harvey (2005) a

exportação de capitais excedentes é uma necessidade premente do capitalismo, que

enxerga nessas novas regiões a possibilidade de aumentar a taxa média de lucro no

sistema como um todo.

Como resultado, observa-se o avanço exponencial das forças produtivas no

campo e na cidade em favor de grandes corporações. Essa lógica exige uma

compreensão da natureza desse Estado e essa é a proposta para o próximo capítulo.

92

3. O PAPEL DO ESTADO E SEUS AGENTES NO EMPREENDIMENTO DA

EUCALIPTOCULTURA NA BAHIA

[...] O capital é irreformável [e] não pode compartilhar o poder.

(MÉZSÁROS, Para Além do Capital, p. 836).

Antes de abordar o papel do Estado no empreendimento capitalista via expansão

da eucaliptocultura é necessário analisar, pela ótica da teoria marxista do Estado, como

essa entidade funciona como agente central para a reprodução da sociedade capitalista, a

partir da execução de determinadas tarefas necessárias ao provimento dos serviços

sociais, regulação das atividades econômicas e gerenciamento de crises.

3.1 O Estado multitarefas do capital

Historicamente, o Estado se origina a partir das contradições que surgem quando

uma classe se apropria do excedente produzido socialmente, num estágio em que as

forças produtivas avançam com a implantação e o desenvolvimento da divisão do

trabalho, permitindo assim que cada unidade familiar produza mais do que o necessário

para a reprodução do produtor e de sua família, lançando as bases para a diferenciação

social em função da apropriação do excedente econômico e, posteriormente, numa etapa

histórico-espacial mais avançada, proporcionando as condições necessárias para o

surgimento das cidades:

A maior divisão entre trabalho material e espiritual é a separação entre cidade

e campo. A oposição entre cidade e campo começa com a passagem da

barbárie à civilização, do tribalismo ao Estado, da localidade à nação, e

mantém-se por toda a história da civilização até os dias atuais. [...] Com a

cidade surge, ao mesmo tempo, a necessidade da administração, da polícia,

dos impostos etc., em uma palavra, a necessidade da organização comunitária

e, desse modo, da política em geral (MARX; ENGELS, 2011, p. 52).

Assim, o Estado foi criado em nome da necessidade da organização comunitária

e do provimento dos serviços públicos e precisa se mostrar independente e neutro,

pairando acima das classes sociais, numa tentativa de tornar senso comum que suas

ações são realizadas para o bem de todos, justificando, dessa forma, seus instrumentos

de dominação, notadamente, a lei, os impostos e as armas.

Para Harvey (2005, p. 85), a teoria marxista do Estado permite entender como a

classe dirigente consegue exercer seu poder, garantir seu próprio interesse de classe e

fazer passar para a sociedade que as ações do Estado são para o bem de todos:

A produção e troca capitalista são inerentemente “anárquicas”. Os

indivíduos, todos em busca dos seus interesses privados, não podem levar em

93

consideração “o interesse comum”, mesmo o da classe capitalista, em suas

ações. Portanto, o Estado capitalista também tem de funcionar como veículo

pelo qual os interesses de classe dos capitalistas se expressam em todos os

campos da produção, da circulação e da troca. Ele desempenha um papel

importante na regulação da competição, na regulação da exploração do

trabalho [...], no provimento de “bens públicos” e infraestruturas sociais e

físicas [...], na administração de crises e age contra a tendência de queda da

margem de lucro.

Segundo Marx e Engels (2011), o aparato do Estado serve apenas para manter os

antagonismos de classe sob controle, utilizando os meios necessários para reprimir a

classe oprimida e explorada e garantir um dos pilares da sociedade de classes, a

propriedade privada dos meios de produção:

Por meio da emancipação da propriedade privada em relação à comunidade,

o Estado se tornou uma existência particular ao lado e fora da sociedade civil;

mas esse Estado não é nada mais do que a forma de organização que os

burgueses se dão necessariamente, tanto no exterior como no interior, para a

garantia recíproca de sua propriedade e de seus interesses (MARX;

ENGELS, 2011, p 75)

De acordo com Engels (1980) o Estado não é um poder vindo de fora, que se

impõe sobre a sociedade para garantir os interesses de todos, mas é fruto da contradição

entre os interesses particulares e os da comunidade, sendo, portanto, historicamente

determinado:

O Estado não é pois, de modo algum, um poder que se impôs à sociedade de

fora para dentro; tampouco é “a realidade de ideia moral”, nem a “imagem e

a realidade da razão”, como afirma Hegel. É antes um produto da sociedade,

quando esta chega a um determinado grau de desenvolvimento; é a confissão

de que essa sociedade se enredou numa irremediável contradição com ela

própria e está dividida por antagonismos irreconciliáveis que não consegue

conjurar. Mas para que esses antagonismos, essas classes com interesses

econômicos colidentes não se devorem e não consumam a sociedade numa

luta estéril, faz-se necessário um poder colocado aparentemente por cima da

sociedade, chamado a amortecer o choque e a mantê-lo dentro dos limites da

“ordem”. Este poder, nascido da sociedade, mas posto acima dela se

distanciando cada vez mais, é o Estado (ENGELS, 1980, p. 135-136).

Forjado a partir da contradição entre os interesses da classe dominante e os da

classe trabalhadora, o Estado precisa escamotear a sua postura classista e a estratégia

adotada para resolver esse problema é desenvolver um arcabouço ideológico capaz de

transformar os interesses de classe em interesses comuns. De acordo com Marx e Engels

(2011) cada classe dominante de sua época domina também nas idéias, no pensamento,

universalizando seus valores, princípios e ideais como verdades supremas e eternas:

[...] Toda nova classe que toma o lugar de outra que dominava anteriormente

é obrigada, para atingir seus fins, a apresentar seu interesse como o interesse

comum de todos os membros da sociedade, quer dizer, expresso de forma

ideal: é obrigada a dar às suas idéias a forma da universalidade,a a apresentá-

las como as únicas racionais, universalmente válidas (MARX; ENGELS,

2011, p 48).

94

Sendo assim, para Marx e Engels (1980, p. 23) “O governo moderno não é senão

um comitê para gerir os negócios comuns de toda a classe burguesa” e, nestes termos,

não há espaço para a figura do Estado como árbitro neutro, que paira acima das classes

sociais. O que existe é o Estado subserviente e funcional ao capital, como instrumento

de dominação de classe, que desempenha tarefas básicas para garantir a acumulação

capitalista, ou seja, o Estado capitalista tem a sua razão de ser e toda a sua organização

voltada para sustentar a relação básica entre capital e trabalho.

Em Harvey (2005) há todo um esforço teórico para demonstrar a tese marxiana

de que o Estado capitalista é instrumento de dominação de classe e se organiza para

sustentar a relação básica entre capital e trabalho:

[...] Se a margem de lucro precisa ser equalizada, então tanto o capital quanto

o trabalho devem ter grande mobilidade; o que significa que o Estado deve se

empenhar, quando necessário, em remover as barreiras em favor da

mobilidade. Em geral, o Estado e, em particular, o sistema legal possuem um

papel crucial a desempenhar na sustentação e garantia da estabilidade desses

relacionamentos básicos. A garantia do direito da propriedade privada dos

meios de produção e da força de trabalho, o cumprimento dos contratos, a

proteção dos mecanismos de acumulação, a eliminação das barreiras para a

mobilidade do capital e do trabalho e a estabilização do sistema monetário

[...] estão todos dentro do campo de ação do Estado (HARVEY, 2005, p. 84).

Segundo Marx e Engels (2011) o sistema legal do Estado capitalista precisa

parecer fruto da vontade geral e se constituir no arcabouço jurídico necessário para criar

a ilusão de que todos são livres e que a lei serve para todos:

Como o Estado é a forma na qual os indivíduos de uma classe dominante

fazem valer seus interesses comuns e que sintetiza a sociedade civil inteira de

uma época, segue-se que todas as instituições coletivas são mediadas pelo

Estado, adquirem por meio dele uma forma política. Daí a ilusão, como se a

lei se baseasse na vontade e, mais ainda, na vontade separada de sua base

real, na vontade livre (MARX; ENGELS, 2011, p. 76).

Harvey (2005) considera a democracia social burguesa um sistema bastante

aperfeiçoado para realizar essa tarefa, na medida em que proclama que todos são iguais

perante a lei e detentores do direito de ir, vir e ter, perpetuando o direito do capital em

ter os meios de produção e da classe trabalhadora o direito de ser livre para vender a sua

única propriedade: a força de trabalho:

[...] É fácil perceber que uma forma particular de Estado – que podemos

chamar de democracia social burguesa – está bem aparelhada para satisfazer

as exigências formais do modo capitalista de produção. Esse tipo de Estado

incorpora uma poderosa defesa ideológica e legal da igualdade, da

mobilidade e da liberdade dos indivíduos, ao mesmo tempo em que é

muitíssimo protetor do direito de propriedade e da relação básica entre capital

e trabalho (HARVEY, 2005, p. 86).

Esta relação entre o campo econômico e o político é adequada na democracia

social burguesa, na medida em que a pretensa igualdade política (um eleitor, um voto)

95

escamoteia a desigualdade econômica chancelada pelo Estado na garantia legal da

propriedade privada e torna-se ainda mais alienante através das práticas de medidas

compensatórias (concessões) realizadas pelo governo no oferecimento de serviços

públicos e infraestruturas que nenhum capitalista individual seria capaz de prover com

seu lucro.

Nesse sentido, para Gramsci (1978, p. 193):

[...] O Estado é concebido como organismo próprio de um grupo, destinado a

criar as condições favoráveis para a máxima expansão do próprio grupo; mas

este desenvolvimento e esta expansão são concebidos e apresentados como a

força motora de uma expansão universal, de um desenvolvimento de todas as

energias “nacionais”, isto é, o grupo dominante é coordenado concretamente

com os interesses gerais dos grupos subordinados e a vida estatal é concebida

como uma contínua formação e superação de equilíbrios instáveis (no âmbito

da lei) entre os interesses do grupo fundamental e os dos grupos

subordinados, equilíbrios em que os interesses do grupo dominante

prevalecem mas até um certo ponto, isto é, não até o mesquinho interesse

econômico-corporativo.

Segundo o autor, é por meio do sistema político que a classe dirigente exerce a

sua hegemonia sobre o Estado, embora este controle do sistema político se dê de forma

indireta, e para manter essa hegemonia as concessões são necessárias para obter o

consentimento (obediência) das massas, dos governados. As concessões variam em

quantidade e qualidade e no tempo e no espaço e nunca tocam no essencial (núcleo

duro) do capital. Gramsci (1991) afirma ser impossível a existência da igualdade

política sem a igualdade econômica:

Enquanto existir o Estado-classe não pode existir a sociedade regulada, a não

ser por metáfora, isto é, apenas no sentido de que também o Estado-classe é

uma sociedade regulada. [...] Permanece, porém, exato o conceito [...] de que

não pode existir igualdade política completa e perfeita sem igualdade

econômica (GRAMSCI, 1991, p. 144)

O interesse geral fictício disseminado pela classe dominante através da ideologia

capitalista é catalisado pelas instituições estatais que amplificam o discurso,

estabelecem as normas gerais para o ordenamento sócio-territorial e criam o aparato

necessário para o seu cumprimento, como parte das estratégias imprescindíveis de

mascaramento das contradições oriundas do processo de produção de riquezas,

caracterizado pelo controle privado dos frutos do trabalho, base de toda diferenciação

social que produz abundância em um pólo e escassez em outro.

Nesse sentido, Mészáros (2011) atesta que o sistema do capital padece de

defeitos estruturais oriundos da ausência de unidade entre produção e controle,

produção e consumo e produção e circulação, resultando em uma fragmentação que

96

assume a forma de antagonismos sociais que precisam de uma ação corretiva por parte

do Estado que tenta assegurar e proteger a produtividade do sistema:

Em sua modalidade histórica específica, o Estado moderno passa a existir,

acima de tudo, para poder exercer o controle abrangente sobre as forças

centrífugas insubmissas que emanam de unidades produtivas isoladas do

capital, um sistema reprodutivo social antagonicamente estruturado. [...]

Constitui a única estrutura corretiva compatível com os parâmetros

estruturais do capital como modo de controle sociometabólico. Sua função é

retificar — deve-se enfatizar mais uma vez: apenas até onde a necessária

ação corretiva puder se ajustar aos últimos limites sociometabólicos do

capital — a falta de unidade [entre produção e controle, produção e consumo

e produção e circulação] (MÉSZÁROS, 2011, p. 107).

Para Mészáros, o sistema do capital é formado por forças centrífugas

incorrigíveis resultantes das interações de conflito que existem, tanto no conflito

estrutural entre capital e trabalho, quanto nos conflitos existentes entre a pluralidade de

capitais, desde o microcosmo até as maiores empresas transnacionais. A anulação das

forças centrífugas é impossível dentro da lógica do capital porque implicaria em realizar

a união das funções de produção e de controle, o que inviabilizaria a reprodução desse

sistema sociometabólico. Assim, resta apenas tentar manter essas forças sob controle,

uma vez que elas representam um potencial impacto desintegrador de todo o sistema e é

assim que o Estado ganha sua enorme importância como mediador das interações de

conflito entre capital X trabalho e capital X capital.

Dessa forma, o Estado tenta corrigir as distorções que surgem da fragmentação

da produção e do consumo através do provimento de algumas necessidades da

sociedade (educação, saúde, habitação, infraestrutura, seguridade social, etc.), além das

funções complementares de regulação das atividades econômicas e gerenciamento de

crises, mas sua atuação, embora de suma importância para o capital, não é suficiente

para produzir a unidade, uma vez que a separação no processo de produção (com

relação ao controle, ao consumo e à circulação) faz parte das determinações estruturais

do próprio capital e representa uma condição fundamental para a sua reprodução.

Nesse sentido, existe um limite para a atuação do Estado representado pelo

equilíbrio possível entre o que ele pode fazer para escamotear os antagonismos e os

custos dessa ação para o capital. Essa fronteira estrutural que o Estado moderno não

pode ultrapassar revela o seu caráter classista.

Miliband (1982, p. 20) reafirma o caráter classista do Estado e destaca a sua

importância na regulamentação, controle, coordenação, planejamento como instrumento

coercitivo da classe dominante:

97

Tal intervenção do Estado em todos os aspectos da vida econômica não

constitui nada de novo na história do capitalismo. Ao contrário, a intervenção

estatal presidiu o seu nascimento ou pelo menos guiou e ajudou os seus

primeiros passos [...] e jamais deixou de ser de importância vital nas

atividades do capitalismo, mesmo no país mais apegado ao laissez-faire e a

um rígido individualismo. [...] E o mesmo se aplica para a ampla rede de

serviços sociais, em relação aos quais o Estado assumiu responsabilidade

direta ou indireta naquelas sociedades.

Para Mészáros (2011, p. 108) o Estado moderno surge da necessidade de se

legitimar a apropriação do excedente econômico realizado pelo trabalho através da

consolidação de instituições legais e políticas que apresentam complexidades

diretamente proporcionais à extensão espacial e temporal que o capital atravessa em

determinado momento histórico, quando, dialeticamente, o Estado passa de necessidade

de legitimação da extração de trabalho excedente, para ser, também, uma precondição

fundamental para a sobrevivência do sistema:

[...] O Estado moderno altamente burocratizado, com toda a complexidade

do seu maquinário legal e político, surge da absoluta necessidade material da

ordem sociometabólica do capital e depois, por sua vez — na forma de uma

reciprocidade dialética — torna-se uma precondição essencial para a

subsequente articulação de todo o conjunto. Isso significa que o Estado se

afirma como pré-requisito indispensável para o funcionamento permanente

do sistema do capital [...].

No reconhecimento da postura classista do Estado, verifica-se que em âmbito

regional, a ação dessa estrutura de governo no território da Bahia coaduna para o

cumprimento das tarefas que são delegadas para as instituições legais e políticas dentro

do sistema capitalista. Especificamente, no caso da expansão das empresas papeleiras,

além dos incentivos fiscais, subsídios, infraestrutura, pesquisa tecnológica,

financiamentos a juros baixos, formação de mão de obra qualificada, registra-se,

também, no plano jurídico, a mudança de leis para acelerar o processo de licenciamento

ambiental.

Assim, no que tange a legislação pertinente ao licenciamento ambiental, o

Governo da Bahia, através da Lei Nº 12.212, de 04 de Maio de 2011, extinguiu o

Instituto do Meio Ambiente (IMA), órgão responsável pela concessão de licenças

ambientais. A Lei 11.050, de 06 de junho de 2008, que criou o IMA estabeleceu no

Artigo 6º, item IV a competência para “expedir licenças ambientais, ressalvada a

competência do CEPRAM”. O CEPRAM é o Conselho Estadual de Meio Ambiente.

A Lei atual (12.212/2011) extinguiu o IMA e criou o Instituto do Meio

Ambiente e Recursos Hídricos (INEMA), responsável agora pelo licenciamento

ambiental. No Artigo 106, que trata das competências do INEMA, o item X traz a

seguinte redação:

98

[...] expedir licenças ambientais. Emitir anuência prévia para implantação de

empreendimentos e atividades de conservação estaduais, autorizar a

supressão de vegetação, conceder outorga de direito de uso de recursos

hídricos e praticar outros atos autorizativos, na forma da lei (BAHIA, 2011).

Assim, pela legislação atual, basta apenas a assinatura do Secretário Estadual de

Meio Ambiente para dar legitimidade ao processo de licenciamento, uma vez que foi

suprimida a redação concernente ao papel do Conselho Estadual de Meio Ambiente no

licenciamento ambiental, facilitando sobremaneira a aprovação de empreendimentos

polêmicos como a expansão do monocultivo do eucalipto.

Para Harvey (2005, p. 117-118) a remoção das barreiras para o desenvolvimento

do capitalismo em novas regiões é uma necessidade vital para a sobrevivência desse

modo de produção que produz, frequentemente, excesso de capitais superacumulados

que precisam buscar novas oportunidades para investimentos rentáveis e o Estado de se

coloca para esse fim:

[...] podemos deduzir um impulso dentro do capitalismo para criar o mercado

mundial, para intensificar o volume de troca, para produzir novas

necessidades e novos tipos de produtos, para implantar novos recursos

produtivos em novas regiões, e para colocar toda a mão de obra, em todos os

lugares, sob a dominação do capital.

Harvey denominou o processo de ajuste espacial e defende que os ajustes são

vitais para o capitalismo, que precisa da reorganização geográfica para contornar suas

crises, mesmo que temporariamente, já que o ajuste espacial representa a projeção das

contradições do capitalismo sobre o palco mundial.

No caso da expansão do eucalipto na Bahia, os capitais externos encontraram

condições favoráveis para se territorializar, tanto pelas medidas governamentais quanto

por liberação de recursos com a participação de órgãos do governo e de empresas de

capital privado nacional, com destaque para as empresas Suzano Papel e Celulose e

Veracel. Nesse sentido, Araújo (2000) destaca que o Nordeste dos anos 1990 é bem

diferente do Nordeste do final dos anos 1950, época em que a Superintendência para o

Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE) definia as políticas de desenvolvimento

regional, destacando o papel da abertura comercial dos anos 1990 no favorecimento da

desconcentração espacial através de focos exportadores, como o avanço da indústria de

papel e celulose na Bahia:

O Nordeste também aparece, através da Bahia, sobretudo, mas também do

Maranhão, na indústria de papel e celulose, com 40,6%, segmento que

registra uma distribuição de sua atividade em praticamente todas as regiões, à

exceção do Centro-Oeste (ARAÚJO, 2000, p. 123).

99

Os incentivos fiscais representados pela isenção de impostos como o ICMS

contribuem ainda mais para que essas empresas tenham maior competitividade no

mercado mundial. Elas ainda recebem do Estado subsídios, infraestrutura, proteção

jurídica, pesquisa tecnológica, financiamentos pelo BNDES a juros baixos e recebem

formação de mão de obra qualificada pelo SEBRAE.

Dessa forma, fica evidenciada a postura classista do Estado quando direciona

todos os seus recursos e esforços para a expansão do capital em escala ampliada que

tem no seu desenvolvimento desigual e combinado a capacidade inata de promover

desigualdades sociais contínuas no tempo e no espaço na mesma medida em que cresce

a produção de riquezas.

3.2 A territorialização das empresas de produção de eucalipto e celulose na Bahia

A territorizalização das empresas de produção de eucalipto e de celulose na

Bahia faz parte do processo global de expansão do capital que está sempre ligado à

procura de áreas de menores custos de produção e de maior competitividade e

lucratividade (vantagens comparativas) e, no caso da expansão pelo território baiano,

houve também a participação de recursos financeiros tanto de órgãos governamentais

quanto de empresas privadas nacionais e transnacionais.

O capital não pode ficar circunscrito a um território, precisa romper os limites

para não entrar em colapso. Cada expansão e cada crescimento só pode ser o

pressuposto para uma nova expansão, conforme aponta Mészáros (2011, p. 664):

[...] O capital autoexpansivo deve mostrar um retorno lucrativo na totalidade

de suas unidades adicionais, compondo assim não só o seu próprio poder,

mas também as complicações (e contradições) que acompanham a

necessidade de converter mais-valia em mero pressuposto do novo ciclo de

expansão. E, assim, esse processo tem de continuar indefinidamente,

independentemente da magnitude do capital já acumulado, que precisa ser

considerado em todas as suas formas (inclusive os meios de produção) como

nada mais do que mero ponto de partida do impulso renovado de expansão.

As vantagens comparativas do território são utilizadas ao extremo, onde os

latossolos tropicais e os cursos d’água são convertidos em meros sustentáculos para a

produção de espécies híbridas de eucalipto geradas em laboratório de ponta, com a

subserviência da ciência em utilizar o conhecimento da biotecnologia atual para

combinar os genes mais produtivos de espécies diferentes para criar um híbrido38

que

38

Segundo Silveira et al. (1995) as principais espécies de eucalipto utilizadas pelas empresas no Brasil

são a Eucalyptus grandis, a Eucalyptus urophylla e a Eucalyptus saligna que, através do melhoramento

genético tradicional e da clonagem dão origem a clones híbridos interespecíficos como E. grandis x E.

100

atenda a insaciável sede de lucratividade do capital. Dessa forma, o capital tanto pode

avançar como totalidade extensiva, através da incorporação de novos territórios, quanto

como totalidade intensiva, ao utilizar as inovações técnicas e organizacionais para

alcançar maior produtividade e lucratividade, explorando, assim, ao máximo as

vantagens comparativas dos territórios.

A expansão do capital via territorialização das empresas de papel e celulose na

Bahia segue a lei do desenvolvimento desigual e combinado, em que a alta lucratividade

das atividades econômicas (monocultura do eucalipto e indústria de papel e celulose)

coexiste, contraditoriamente, com a produção de produção de pobreza, evidenciada pela

intensificação da concentração da terra, diminuição da produção de alimentos e

expulsão da população camponesa para as cidades.

A necessidade premente do capital em ampliar, constantemente, a sua escala de

operações traduziu-se na formação de dois processos contraditórios, quais sejam a

territorialização do capital e a monopolização do território. Esses termos foram

utilizados por Oliveira, A. (1991) ao analisar a industrialização da agricultura no campo

brasileiro:

O que esse processo contraditório de desenvolvimento capitalista no campo

revela, é que, no primeiro caso [as usinas de açúcar e álcool que compram

terras para plantar cana-de-açúcar], o capital territorializa-se. Estamos,

portanto, diante do processo de territorialização do capital monopolista na

agricultura. No segundo caso [as multinacionais do cigarro que compram a

produção de fumo dos proprietários de terra], esse processo contraditório

revela que o capital monopoliza o território sem entretanto, territorializar-se.

Estamos, pois, diante do processo de monopolização do território pelo capital

monopolista (OLIVEIRA, A. 1991, p.24-25).

Martins (2008) também destaca a necessidade do capital em se apoderar da

mais-valia, tanto pela via assalariada, quanto daqueles que ainda possuem os meios de

produção:

[...] Apropriar-se dos meios de produção foi o meio histórico que o capital

preexistente descobriu para se apropriar da mais-valia. Mas, uma vez

constituído o sistema capitalista, o capital teve e tem tido condições de se

apropriar da mais-valia, mesmo dos trabalhadores que ainda não foram

separados de seus meios de produção. É o caso dos camponeses que para

comercializar seus produtos tornaram-se dependentes dos setores comerciais

intermediários e dos setores financeiros de que o grande capital se apropriou

(MARTINS, 2008, p. 86-87).

Lisboa (2007), ao analisar o processo de modernização capitalista do campo, que

se realiza mediante a dupla expropriação do camponês (da terra ou da produção

urophylla e E. urophylla x E. grandis. O resultado desse processo são materiais genéticos hibridizados

que conferem maior “plasticidade” quanto à adaptação aos diferentes sítios florestais e, além disso, são

mais produtivos e/ou apresentam melhores características da madeira.

101

camponesa), observa que o domínio do capital sobre o trabalho e seu controle sobre o

território é facilitado pela dependência tecnológica:

O campo passa a ser pensado pela incorporação inevitável aos padrões da

sociedade nacional de tipo urbano-industrial. O camponês é expropriado ora

da sua própria terra, ora da sua produção. Durante esta transformação, o

camponês é metamorfoseado em verdadeiro trabalhador para o capital, uma

vez que este exige o uso dos implementos e insumos introduzidos pela

indústria moderna, o que repercute no privilegiamento das culturas

comerciais sem a garantia dos rendimentos dessa produção para quem

trabalha nela (LISBOA, 2007, p. 54-55).

Na Bahia, a expansão do capital via totalidade extensiva se deu pela utilização

dos dois processos, tanto pela compra direta de milhares de hectares de terra quanto pela

monopolização do território através da subordinação da produção dos proprietários

rurais, neste caso inclusive com a participação do Estado em fomentar a atividade

através dos Programas Pronaf Florestal e Programa Agricultor Florestal39

, onde a

produção de eucalipto é realizada com financiamento público, em que o discurso oficial

aponta para o fortalecimento da agricultura familiar, mas que, na realidade, trata-se de

mais uma modalidade de favorecimento estatal às empresas.

Assim, dadas as condições estruturais para o capital lançar suas bases na Bahia,

três empresas produzem celulose de forma integrada, aliando a propriedade de milhares

de hectares de terras destinados à produção de madeira em tora, principalmente

mediante o cultivo do eucalipto e a instalação de fábricas para a produção de celulose.

Estas empresas, com atuação em âmbito global são a Bahia Speciality Cellulose, a

Suzano Papel e Celulose e a Veracel.

3.2.1 A Bahia Speciality Cellulose (BSC)

A Bahia Speciality Cellulose (BSC) é uma subsidiária do Grupo Sateri Holdings

Limited (Figura 41), com sede em Xangai, na China, que é uma das principais

fabricantes de celulose solúvel especial, com operações de vendas para os mercados

asiático, europeu e estadunidense.

39

O Pronaf Florestal é um programa desenvolvido pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário em

parceria com o Ministério do Meio Ambiente para estimular o reflorestamento com fins comerciais, pelo

qual as empresas de papel e celulose têm a possibilidade de transferir tecnologia de produção de mudas de

espécies de eucalipto para os agricultores que, posteriormente, vendem a produção para essas empresas. O

Programa Agricultor Florestal é uma parceria da Secretaria de Meio Ambiente do Estado da Bahia

(SEMA) com o Pronaf que incentiva a realização do plantio de eucalipto como nova fonte de renda e uso

múltiplo da propriedade.

102

103

A celulose solúvel é matéria prima importante para a fabricação de produtos

têxteis, alimentícios, cosméticos, farmacêuticos, eletrônicos, de papel celofane, de

filamentos para pneus, de lentes de contato, de filmes fotográficos, de telas de LCD

(liquid crustal display), de filtros para cigarros e tintas, entre outros. No Brasil, apenas

três empresas produzem celulose para dissolução. As outras duas são a Buckey

Americana e a Coopercel-Coop Trab, ambas localizadas no estado de São Paulo.

Enquanto a BSC tem capacidade para produzir até 485 mil toneladas por ano, as demais

empresas só conseguem produzir 40 mil toneladas por ano (BRACELPA, 2009; BSC,

2013).

Em 2003, a Sateri Holdings Limited adquiriu as empresas Klabin Bacell S.A. e

Copener Florestal Ltda., dando-lhes o nome de Bahia Pulp S.A., na ocasião com

capacidade instalada de produção de 115 mil toneladas anuais. Em 2008, a empresa

implantou uma segunda linha industrial que elevou a capacidade para 485 mil toneladas

anuais e em 2010, a empresa foi rebatizada para Bahia Specialty Cellulose

A unidade industrial da Bahia Specialty Cellulose localiza-se no Complexo

Industrial de Camaçari, um dos maiores do mundo. A fábrica tem uma localização

privilegiada, a uma distância média de 100 km das áreas de plantio de eucalipto,

situadas em municípios do Nordeste Baiano, com condições edafoclimáticas propícias

ao rápido crescimento das árvores que produzem fibras de alta qualidade. Além disso, a

unidade fabril fica próxima do porto de Salvador, instalado em um local de águas

profundas e capaz de receber cargueiros de grande calado e, assim, exportar a produção

de celulose solúvel para o mercado mundial (SATERI, 2012; BSC, 2013).

A Bahia Specialty Cellulose possui uma planta industrial verticalmente

integrada, da base florestal à produção de celulose solúvel. É proprietária de uma área

total de 150 mil hectares, dos quais 84 mil hectares são utilizados para o plantio de

eucalipto, onde são incorporadas as modernas técnicas de melhoramento genético para a

produção de mudas com alta produtividade e resistência à pragas, aliadas a um eficiente

sistema de preparo do solo, plantio do eucalipto, manutenção, colheita e transporte até a

unidade industrial. Assim, o eucalipto chega à fábrica descascado e cortado em toras de

seis metros de comprimento, onde é lavado e picado em pedaços pequenos, chamados

cavacos e submetidos aos processos de cozimento, lavagem, depuração, extração

alcalina a frio, branqueamento, secagem e embalagem. Depois de embalada em fardos

ou enrolada em bobinas, o produto é acondicionado em containers ou caminhões e

104

levado ao porto de Salvador, onde é embarcado em navios especiais com destino a

vários países (SATERI, 2012; BSC, 2013).

As duas unidades fabris são flexíveis e podem produzir dois tipos básicos de

celulose solúvel: os rayon-grades e os specialty-grades. Os rayon-grades servem para a

fabricação de fibra de viscose (utilizada para fabricação de produtos têxteis, não-tecidos

como lenços umedecidos, máscaras cosméticas, etc.), de filamento de Lyocell e viscose

(utilizados em produtos têxteis e não-tecidos) e para outras aplicações, como esponjas.

A produção dos rayon-grades segue para duas fábricas da Sateri Holdings Limited, em

Jiangxi e Fujian. Os specialty-grades servem para a produção de acetato (filtros de

cigarro, resinas), celulose microcristalina (produtos farmacêuticos), filamento industrial

(pneus) e outras aplicações especiais (tripas artificiais, cosméticos, etc.). A produção

dos specialty-grades é realizada em Camaçari e segue como produto final para o

mercado consumidor mundial a partir do porto de Salvador (SATERI, 2012; BSC,

2013).

As produções de celulose solúvel e de fibra de viscose aumentaram no biênio

2011/2012, mas a SATERI não conseguiu melhorar o desempenho nas vendas em

função da queda no preço das mercadorias no mercado internacional, sendo que a

tonelada de celulose solúvel caiu de US$ 1.728 para US$ 1.278 (- 26%) e a tonelada de

fibra de viscose sofreu uma redução de 20%, uma vez que custava US$ 2.588 em 2011 e

caiu para US$ 2.059 em 2012. A maior retração nas vendas foi verificada na

comercialização da celulose solúvel, com uma queda no faturamento de 17% em relação

a 2011, mesmo exportando mais mercadorias no mercado internacional.

A queda do faturamento poderia precipitar uma crise nas operações da SATERI,

que depende de investimentos na bolsa de valores, mas a alta lucratividade do setor

permitiu a absorção dessa queda momentânea do preço da celulose solúvel e da fibra de

viscose. Conforme dados da Sateri (2012) a margem de lucro EBITDA40

das operações

40

Ebitda é a sigla em inglês para earnings before interest, taxes, depreciation and amortization, que

significa: "Lucros antes de juros, impostos, depreciação e amortização", Lajida. Trata-se de um termo

técnico utilizado por analistas financeiros para realizar análise de balanços de contabilidade de empresas

de capital aberto, permitindo assim a comparação entre empresas de setores ou portes distintos, ou ainda

aquelas que residem em países diferentes, cuja carga tributária possa divergir bastante. Isto é possível

porque o cálculo avalia apenas o lucro do negócio, descontando qualquer rendimento financeiro ou a

carga tributária. O Ebitda surgiu nos EUA na década de 1970 e é, atualmente, o melhor indicador para

avaliar o fluxo de caixa das empresas, mas, ao mesmo tempo, pode resultar em uma falsa perspectiva

sobre a efetiva liquidez da empresa, uma vez que ele não leva em consideração os efeitos financeiros e

tributários. Além disso, algumas empresas podem adulterar o balanço inserindo as despesas operacionais

do negócio na conta dos investimentos de capital, exatamente para manipular os resultados do Ebitda,

105

de produção de celulose solúvel caiu de 46% em 2011 para 40% em 2012 e a de fibra de

viscose caiu de 25% para 16% no mesmo período, evidenciando a importância da Bahia

Specialty Cellulose em manter a lucratividade média da empresa em níveis aceitáveis

dentro da lógica do capital.

A Bahia Specialty Cellulose recebe incentivos fiscais nas operações florestais e

industriais. O setor de plantações da empresa é realizado pela Copener Florestal Ltda,

responsável pelo gerenciamento do cultivo de eucalipto no Nordeste Baiano, tendo

benefício da redução de 12,5% sobre os impostos de renda e da contribuição social. Para

o setor industrial essa redução é de 75%, válida por dez anos, uma vez que a fábrica está

inserida em área de atuação da SUDENE, que concede esse benefício às pessoas

jurídicas titulares de projetos de implantação, modernização, ampliação ou

diversificação de empreendimentos, protocolizados até 31/12/2018, pelo prazo de 10

(dez) anos (SATERI, 2012; SUDENE, 2013).

3.2.2 A Suzano Papel e Celulose

A Suzano Papel e Celulose atua em 13 municípios do Sul Baiano: Mucuri, Nova

Viçosa, Caravelas, Ibirapoã, Alcobaça, Teixeira de Freitas, Lajedão, Medeiros Neto,

Prado, Vereda, Itanhém, Itamaraju e Jucuruçu, tendo no município de Mucuri a sua

unidade operacional que foi inaugurada em 1992.

Historicamente, a Suzano iniciou suas operações em 1924, quando o ucraniano

Leon Feffer criou a empresa Leon Feffer Distribuidora de Papel com atuação na

revenda de papéis nacionais e importados. As dificuldades de importação de papéis na

época da Segunda Guerra Mundial levaram a empresa a começar suas atividades de

fabricação própria de papel, no ano de 1939, a partir de celulose importada, mas a

continuidade dos conflitos limitou também a importação da polpa de celulose,

motivando a contratação de um laboratório estadunidense a pesquisar matérias-primas

alternativas para a produção de celulose, culminando com a utilização do eucalipto

como substituto ideal do pinus. A Suzano foi a primeira empresa no mundo a utilizar o

eucalipto como fornecedor de fibra curta, iniciando os cultivos comerciais em 195541

(SUZANO, 2013).

como ocorreu, em 2000, com a WorldCom, a segunda maior empresa de telecomunicações dos Estados

Unidos, no maior escândalo financeiro desse tipo da história daquele país (IPEA, 2005). 41

Em 1946 o grupo Klabin já produzia celulose em uma fábrica instalada em Telêmaco Borba, no Paraná,

mas a matéria-prima utilizada era o pinheiro (araucária).

106

No ano de 1956, a aquisição da Indústria de Papel Euclides Damiani S/A,

situada na cidade de Suzano, em São Paulo, marca também o rebatismo da empresa que

passa a se denominar Companhia Suzano de Papel e Celulose, produzindo papel a partir

de celulose nacional e importada até que, em 1961, a fibra de eucalipto consegue

atender a 100% das demandas por celulose.

Em 1960, a Suzano adquire o controle acionário da Indústria de Papel Rio Verde

S/A. ampliando suas operações e em 1975 inicia suas operações de exportação de papel

para a Europa. No início da década de 1980, a empresa abre seu capital e passa a ter

ações negociadas na Bolsa de Valores de São Paulo. Em 1991, a Suzano, a CVRD, o

Bndespar e o IFC se unem para formar a Bahia Sul Celulose S/A, com o objetivo de

construir uma fábrica em Mucuri com capacidade para produzir 420 mil toneladas/ano

de celulose de fibra curta branqueada de eucalipto (JUVENAL; MATOS, 2002). Em

2001 a Suzano adquire as ações de seus sócios e unifica a gestão em todas as suas

unidades operacionais (SUZANO, 2013).

Em 2005, adquire 50% da Ripasa, juntamente com a Votorantim Celulose e

Papel (atual Fibria) e inicia as operações da Suzano América, nos Estados Unidos, com

a abertura de escritórios e centrais de distribuição em seis cidades: Beaumont e

Houston, no Texas; Baltimore, em Maryland; Jacksonville, na Flórida; Carson, na

Califórnia; e Mobile, no Alabama.

No ano de 2007, entra em operação a segunda linha de produção de celulose em

Mucuri, elevando a produção total para um milhão de toneladas anuais. Em 2010, a

Suzano adquire a FuturaGene, PLC e assume o controle do Conpacel e da KSR, uma

das maiores distribuidoras de papéis do país. O Conpacel passa a ser unidade Limeira,

no interior de São Paulo.

Em 2013, iniciando um novo ciclo de crescimento, a Suzano pretende dobrar a

sua capacidade instalada de produção de celulose a partir da construção de fábricas no

Maranhão e no Piauí. A unidade Maranhão tem capacidade para produzir 1,5 milhão de

toneladas anuais de celulose de eucalipto de mercado e geração de 100 MW de energia

adicional disponível para venda, com a previsão de iniciar suas atividades no final de

2013. A unidade Piauí está em fase de construção e a compra dos equipamentos está

prevista para 2014. As duas fábricas estão estrategicamente localizadas em áreas mais

próximas da Europa e dos Estados Unidos, diminuindo os custos de exportação para

esses mercados. Já foram investidos 3,94 bilhões de reais na unidade Maranhão no

107

período 2009/2013, sendo R$ 2,7 bilhões financiados pelo BNDES, com prazo de

pagamento de 12 anos e três anos de carência e R$ 1,2 bilhão provenientes de

debêntures mandatoriamente conversíveis em ações. Além dessas fontes de

financiamento, ainda há fontes externas para a aquisição de equipamentos importados

(SUZANO, 2013).

A Suzano possui 392 mil hectares de terra nos Estados do Maranhão, Piauí e

Tocantins, sendo que, atualmente, existem 105 mil hectares plantados com eucalipto,

prontos para o atendimento da demanda de madeira em tora necessária para o

funcionamento da unidade Maranhão. Com a expansão da produção de celulose no

Maranhão e no Piauí, a empresa pretende ampliar a aquisição de terras para produção de

eucalipto na região.

A Suzano Papel e Celulose (Figura 42) é uma empresa de produção de papel e

celulose que atua de forma integrada verticalmente, desde a base florestal até a

produção de papel, exportado, principalmente, para aproximadamente 40 países. No

período 2004/2011 a produção de papel e celulose cresceu 150%, saindo de 1,24

milhões de toneladas para 3,1 milhões de toneladas. O período marcou a produção de

celulose como a principal atividade da empresa. Em 2004 ela era de apenas 456 mil

toneladas (37% do total produzido) e passou para 1,8 milhão de toneladas (58%) em

2011. Em 2013, com o início das operações da unidade Maranhão, a Suzano prevê uma

produção de 3,4 milhões de toneladas de celulose e de 1,3 milhão de toneladas de papel,

ou seja, a celulose representará 73% do total produzido pela empresa (Suzano, 2011).

O redirecionamento da produção para a fabricação de celulose está ligado ao

aumento da demanda no mercado internacional, pois 80% da produção são exportados

para Ásia (notadamente a China) e Europa. Já a produção de papel tem 79% do total

consumido regionalmente (Américas Central e do Sul), sendo 62% para atender as

demandas do mercado brasileiro.

108

109

As vendas aumentaram 6% no biênio 2010/2011 e a margem de lucro EBITDA

caiu de 38% para 27%, em função de fatores como as reduções de preços de celulose e

papel ao longo do ano e da apreciação do real em relação ao dólar, mas ainda dentro da

rentabilidade aceitável para o capital.

A empresa vale hoje no mercado cerca de R$ 8,6 bilhões, vende para

aproximadamente 60 países e mantêm escritórios e centrais de distribuição nos Estados

Unidos, na Argentina, na Europa e na Ásia, com laboratórios no Brasil, em Israel e na

China. O grande crescimento promovido pelas aquisições de empresas concorrentes e a

expansão da produção para áreas de grande produtividade com o apoio do Estado

fizeram com que a Suzano galgasse posições no ranking internacional, saindo da

posição 93ª em 2000 para o 32º lugar em 2010 (RISI/PPI, 2010).

Entre os anos de 2004 e 2010 a receita líquida da empresa cresceu 71%, saindo

de R$ 2,6 bilhões para R$ 4,5 bilhões, ao mesmo tempo em que o crescimento do

número de empregados foi de apenas 27%, de 3.425 para 4.352 no mesmo período.

Considerando a totalidade do quadro funcional para o ano de 2010, o somatório da

remuneração (salários, gratificações, comissões e abonos), 13º salário, férias e encargos

sociais compulsórios (INSS, FGTS e contribuição social) correspondeu a 9,2% da

receita líquida.

As contribuições sociais realizadas pela Suzano nas comunidades em que suas

fábricas estão inseridas atingiram 0,35% da receita líquida (R$ 16 milhões) no ano de

2010, atendendo a projetos de educação, cultura, saúde e saneamento, esporte, combate

à fome e segurança alimentar, entre outros. Já o lucro líquido foi de R$ 769 milhões em

2010 (17% da receita líquida). Esses números mostram a inviabilidade do projeto

desenvolvimentista de inspiração cepalina que prega a industrialização das áreas pobres

como forma de desenvolvimento e geração de emprego e renda para as comunidades

regionais. Na realidade, a vinda das empresas para essas áreas se deve às excepcionais

condições edafoclimáticas que possibilitam a maior produtividade de biomassa do

planeta, reduzindo assim o tempo de giro do capital e aumentando a lucratividade. Além

do pífio investimento nas comunidades locais, que não chega a 1% do faturamento

global, verifica-se ainda o crescimento da precarização do trabalho através da

proliferação da terceirização e da contratação de estagiários, sem mencionar os

desempregos gerados no campo com a expansão dos territórios produtores de madeira

110

poupadores de força de trabalho, reduzindo a oferta de terras para as atividades

camponesas.

Assim, a Suzano apresenta uma grande competitividade estrutural,

proporcionada pelos baixos custos de produção de celulose nas unidades Embu, Rio

Verde, Limeira e Suzano, no Estado de São Paulo; e na unidade Mucuri, no Estado da

Bahia. Atualmente, a unidade Mucuri é a que apresenta a maior capacidade de produção

de celulose e a unidade Suzano a que mais produz papel, conforme informações da

Figura 43:

Figura 43 – Suzano: Produção de celulose e papel - 2012.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados da SUZANO, 2013.

Com a entrada da unidade Maranhão nas operações de fabricação de celulose,

com capacidade similar a da unidade Mucuri, a Suzano passa a concentrar a sua

produção de celulose em áreas com os mais baixos custos operacionais e,

estrategicamente, mais próximas da Europa e dos EUA, uma vez que 80% da produção

total de celulose são exportados. Já a fabricação de papel permanece centralizada nas

quatro unidades paulistas, orientada basicamente para o atendimento do mercado

interno, que consome cerca de 60% do total produzido.

A unidade Mucuri (antiga Bahia Sul Celulose S/A) chegou a envolver 12 mil

homens no processo de construção da fábrica, sendo que, em março de 1992, a fábrica

de celulose iniciou suas atividades e, em fevereiro de 1993, começou a fabricação de

papel. A fábrica polariza 13 municípios no extremo sul baiano, com destaque para os

municípios de Mucuri, Caravelas, Alcobaça e Nova Viçosa, que possuem os maiores

territórios de produção de madeira, conforme pode ser visualizado na Figura 44:

111

Figura 44 – Território da Unidade Mucuri: Produção de madeira em tora em 2011.

Fonte: Mapa produzido pelo autor a partir de dados do IBGE: Produção da Extração

Vegetal e da Silvicultura: madeira em tora para papel e celulose, 2011.

Obs.: Para o cálculo da área em hectares foi utilizada a produtividade média do

eucalipto: 44m3/ha/ano, Conforme BRACELPA, 2013.

A produção conjunta dos 13 municípios atingiu 11,2 milhões de metros cúbicos

de madeira em tora de eucalipto e ocupou, aproximadamente, 254 mil hectares,

considerando a produtividade média de 44 m3/ha/ano (BRACELPA, 2013). O consumo

de madeira da unidade Mucuri para o mesmo ano foi de 2.817.829 toneladas

(SUZANO, 2011) o que corresponde a 72% de toda a madeira em tora produzida pela

região, considerando o peso médio de 350 kg por m3 de eucalipto seco sem casca

(EUCALYPTUS, 2013). Os quatro municípios com produção acima de um milhão de

m3 (Caravelas, Alcobaça, Mucuri e Nova Viçosa) são justamente aqueles que reúnem

dois fatores diretamente relacionados: a proximidade com a fábrica em Mucuri e as

excepcionais condições edafoclimáticas proporcionadas pela excelente localização na

112

área litorânea, favorecidas pelos ventos úmidos que lhe conferem altos índices

pluviométricos.

A produção de celulose e papel da unidade Mucuri é enviada por transporte

terrestre para o Terminal Especializado Barra do Riacho – Portocel. Em 2010, a Suzano

investiu no aprimoramento logístico da unidade Mucuri, onde 25% do papel produzido

para exportação passou a ser acondicionado em contêineres no interior da própria

fábrica e não mais em Portocel, onde os custos operacionais são maiores. Numa etapa

posterior, a empresa pretende estender o sistema para toda a produção da unidade

industrial, bem como criar um sistema de interligação alfandegária, para que as cargas

possam ser encaminhadas diretamente aos navios.

Ainda em termos de aprimoramento logístico, foi criada no mesmo ano, a

empresa LogFácil para realizar o transporte da produção de celulose da unidade Mucuri

até Portocel:

Outra ação, aprovada no final do ano [2010] pelo Conselho de

Administração, foi a criação da LogFácil, uma empresa Suzano de logística

que será responsável pelo transporte da celulose produzida em Mucuri para

Portocel. Até então, apenas 5% da operação era realizada com frota própria.

Além de reduzir custos, a iniciativa nos possibilitará otimizar as atividades

dos transportadores e exercer maior controle sobre a qualidade dos serviços

prestados (SUZANO, 2010, p. 28).

A iniciativa de aprimoramento logístico é mais um passo na consolidação da

proposta de integração vertical da produção perseguida pela empresa, como expressão

da busca pelo controle de todas as etapas do processo produtivo, da base florestal,

passando pela fabricação, transporte e comercialização. A Suzano também desenvolveu

um projeto na unidade Mucuri capaz de sincronizar rotas e calendários, a fim de

estabelecer uma articulação mais eficiente entre os pedidos e a saída das cargas,

permitindo que os caminhões partam com a capacidade máxima de transporte de carga

para Portocel.

Em 1992, quando a então Bahia Sul Celulose S/A começou as suas atividades de

fabricação de celulose de fibra curta branqueada de eucalipto, a capacidade de produção

era de 420 mil toneladas/ano. Quinze anos depois, quando entrou em operação a

segunda linha de produção, já com a nova denominação de unidade Mucuri, a

quantidade total de celulose foi elevada para um milhão de toneladas anuais, ou seja, um

crescimento de 138%. Para realizar a duplicação da produção, a quantidade de madeira

consumida também precisou crescer na mesma proporção, conforme atestam os dados

da Figura 45:

113

Figura 45 – Unidade Mucuri: consumo de madeira no período 2005/2009.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados da Suzano, Relatório de

Sustentabilidade, 2005, 2007, 2009.

Por isso, a empresa investiu nas áreas de fomento para complementar a produção

de madeira em tora, totalizando R$ 250 milhões em 2005 e expandindo a área de

fomento em seis mil hectares. Nesse sistema, a expansão ocorre através da parceria

entre a Suzano e os produtores locais, a quem a empresa garante as mudas de eucalipto,

a assistência técnica, a manutenção e o corte, tarefas que têm seu custo abatido

posteriormente na operação de entrega da produção para a fábrica em Mucuri

(INSTITUTO CARBONO BRASIL, 2005).

Por ocasião da construção da segunda linha de produção da Unidade Mucuri,

foram investidos R$ 3,4 bilhões (US$ 1,28 bilhão), sendo 50% financiados pelo

BNDES, com a geração de 6,7 mil empregos no canteiro de obras (SUZANO, 2006;

INSTITUTO CARBONO BRASIL, 2005). O relatório de sustentabilidade publicado

anualmente pela Suzano não traz as informações do quantitativo de funcionários por

unidade fabril, mas dados da CUT (2009) apontaram para a existência de 800

funcionários diretos trabalhando nas dependências da unidade e pelo menos o dobro

disso de trabalhadores indiretos. Considerando os investimentos totais para construção

das duas linhas de produção (US$ 1,36 bilhão da linha 1 e US$ 1,28 bilhão da linha 2) a

unidade Mucuri custou US$ 2,64 bilhões e gera, atualmente, menos de 2 mil empregos.

1.107.636

2.528.115 2.544.449

0

500.000

1.000.000

1.500.000

2.000.000

2.500.000

3.000.000

2005 2007 2009

ton

ela

das

114

Considerando a base florestal, as atividades de produção de madeira em tora

para alimentar a fabricação de celulose imobilizaram, em 2011, 254 mil hectares de

terra nos treze municípios inseridos na área de atuação da unidade Mucuri. Quantos

empregos foram gerados nessas atividades? Para a Bracelpa (2010), entidade

representativa da indústria de papel e celulose, a atividade de produção de madeira

gerou em 2010 44.033 empregos, sendo 8.940 próprios e 35.093 de terceiros,

correspondendo a 50 hectares de terra por emprego gerado, uma vez que o setor possui

2,196 milhões de hectares de área plantada. Para o IBGE, tomando-se como referência

os dados do Censo Agropecuário de 2006 para as variáveis pessoal ocupado e área das

lavouras permanente e temporária, das pastagens e da produção de madeira, os número

são outros, conforme os dados da Figura 46:

Figura 46 – Geração de emprego no campo - 2006.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados do IBGE, Censo Agropecuário,

2006.

Assim, adotando como parâmetro os dados do IBGE, em 2011, a atividade de

produção de madeira gerou 1.657 empregos nos 13 municípios polarizados pela unidade

Mucuri. Caso essas terras fossem utilizadas pela agricultura camponesa (familiar para o

IBGE) seriam gerados 101.600 empregos na lavoura temporária, 81.935 na lavoura

permanente e 38.485 na pecuária.

Nesse contexto, o projeto desenvolvimentista defensor da industrialização como

alternativa para o desenvolvimento das regiões menos favorecidas que leva o Estado a

2,5 3,1 6,6

21,1 23,9 8,8

94,2

153,3

0

20

40

60

80

100

120

140

160

180

LavouraTemporária

LavouraPermanente

Pastagem Silvicultura

He

ctar

e/e

mp

rego

Agricultura Familiar

Agricultura Patronal

115

financiar, com recursos públicos, a construção das fábricas bilionárias e a renunciar os

impostos devidos contribui, na verdade, para a geração de mais desemprego na região,

porque imobilizam milhares de hectares de terra que seriam mais bem aproveitados pela

agricultura camponesa, gerando 60 vezes mais empregos a um custo infinitamente

menor.

3.2.3 A Veracel

A Veracel é uma joint venture das empresas Fibria e Stora-Enso localizada no

município de Eunápolis e atua em dez municípios do Sul Baiano: Santa Cruz Cabrália,

Eunápolis, Itagimirim, Porto Seguro, Belmonte, Itabela, Itapebi, Guaratinga,

Canavieiras e Mascote.

Em 1991, a Veracel era apenas um embrião da Veracruz Florestal LTDA, uma

subsidiária da Odebrecht que, por sua vez, em 1997, se funde com a empresa sueca

Stora e esta, por sua vez, se funde com a empresa finlandesa Enso em 1998.

Atualmente, a Veracel Celulose está nas mãos da Fibria (resultante da fusão entre

Aracruz e Votorantim Celulose e Papel, em 2009) e da Stora Enso, cada uma com 50%

do controle acionário.

Historicamente, a Aracruz nasceu no período da Ditadura Militar e foi

beneficiada pela política governamental de desenvolvimento através da industrialização,

notadamente voltada para o fomento de fábricas que pudessem gerar divisas para o país

através de exportação de seus produtos no mercado mundial. Nesse sentido, quatro

medidas do Governo se destacam: a promulgação da Lei 4.771/65, o Decreto Lei

5.106/66, a Resolução 276/67 do BNDE e a Decisão 196/68 do BNDE. A Lei 4.771/65

que instituiu o Código Florestal Brasileiro previa a regulamentação de incentivos fiscais

para incentivar a expansão dos territórios produtores de madeira no país; O Decreto Lei

5.106/66 regulamentou esses incentivos fiscais e permitiu que as pessoas físicas

pudessem abater da renda bruta todas as despesas efetivamente realizadas com

reflorestamento e que as pessoas jurídicas pudessem abater até 50% do Imposto de

Renda devido; A Resolução 276/67 do BNDE concedeu prioridade aos projetos de

implantação ou ampliação da capacidade de produção de celulose e papel; A Decisão

196/68 do BNDE estabeleceu escalas mínimas de produção para poder liberar os

recursos financeiros, beneficiando as grandes empresas, sendo que, no caso do setor de

celulose, o mínimo exigido era que a empresa tivesse uma capacidade de produzir 100

116

toneladas diárias e possuir terras que garantissem o suprimento de pelo menos metade

das necessidades de madeira (HILGEMBERG; BACHA, 2001).

Nesse contexto, em 1967 teve início a Aracruz Florestal no Espírito Santo e no

ano seguinte é fundada a Aracruz Celulose, mas a empresa só começa a fabricar

celulose dez anos mais tarde. O projeto original previa a instalação de uma fábrica com

capacidade para produzir 400 mil t/ano de celulose, totalmente voltada para a

exportação, a um custo de US$ 400 milhões e capaz de gerar 600 empregos na fábrica e

mais de mil nos territórios produtores de madeira. As dificuldades de implantação

estavam relacionadas à desconfiança dos investidores quanto à utilização do eucalipto

como matéria-prima, de forma que a construção da fábrica só se concretizou porque o

BNDE assumiu o controle acionário e financiou os investimentos que chegaram a 58%

do valor total da fábrica (US$ 650 milhões). Em 1978, a Aracruz Celulose iniciou suas

operações com capacidade de produção de 1.000 toneladas diárias de celulose de fibra

curta branqueada de eucalipto (MENDONÇA JORGE, 1992; FIBRIA, 2013).

Em 1985 foi inaugurado o Portocel, em Barra do Riacho, município de Aracruz-

ES, o único porto brasileiro especializado no embarque de celulose, de propriedade da

Aracruz (51%) e da CENIBRA (49%), que trouxe vantagens operacionais e econômicas

para essas empresas, reduzindo custos através dos ganhos de escala e especializando as

ações de armazenamento, movimentação e embarque, que favoreceram a redução dos

níveis de contaminação da celulose (MENDONÇA JORGE, 1992; FIBRIA, 2013;

PORTOCEL, 2013).

Em 1988, o Grupo Votorantim adquiriu a Cia. de Celulose Guatapará –

CELPAG junto ao BNDES que detinha 72,45% das ações ordinárias e resolveu instalar

uma fábrica integrada de papel para imprimir e escrever, ficando o BNDES com uma

participação minoritária das ações ordinárias (3,76%) e 32,68% do capital total. Nasce,

então, a Votorantim Celulose e Papel - VCP. O BNDES ainda financiou US$ 157,7

milhões para a construção de uma fábrica integrada de 280 mil t/ano de celulose e de

300 mil/t/ano de papel, orçada em US$ 600 milhões. (MENDONÇA JORGE, 1992).

Em 1992 a VCP adquiriu o Grupo Papel Simão e incorporou as unidades

Piracicaba, Jacareí, Mogi das Cruzes e a distribuidora KSR e oito anos depois as ações

da VCP começam a ser negociadas na Bolsa de Valores de Nova York. Também no ano

de 2000, a Aracruz ingressou no controle acionário da Veracel, juntamente com a

Odebrecht e a Stora Enso (FIBRIA, 2013).

117

Em 2001, a VCP passou a ser proprietária de 28% do capital da Aracruz

Celulose, que também tinha como donos o grupo norueguês Lorentzen (28%), o Grupo

Safra (28%) e o BNDES, com 12,5%. No ano seguinte, aconteceu o início das

operações da terceira linha de produção da Aracruz, denominada “Fábrica C” no

Espírito Santo, com capacidade de produção de 700 mil t/ano de celulose (VIDAL; DA

HORA, 2013; FIBRIA, 2013).

Em 2003, o grupo Odebrecht vendeu toda a sua participação na Veracel, ficando

a Aracruz e a Stora Enso como sócias paritárias do empreendimento que se transformou

em uma joint venture para produção de 900 mil t/ano de celulose de fibra curta de

eucalipto, denominada Veracel Celulose, com a construção de uma fábrica nos limites

dos municípios de Eunápolis e Belmonte, na Bahia, tendo início da produção em 2005 e

contando com investimentos do BNDES de 1,3 bilhão de reais (VIDAL; DA HORA,

2013; VERACEL, 2005; FIBRIA, 2013).

Em 2006, a VCP realizou uma troca de ativos com a International Paper, em que

a VCP transferiu para a IP a sua unidade de produção de celulose e papel de Luiz

Antonio, em São Paulo, juntamente com a base florestal local. Em contrapartida, a IP

repassou para a VCP os ativos referentes a uma fábrica de celulose em construção, com

capacidade para produção de 1,1 milhão de toneladas anuais, no valor de US$ 1,15

bilhão, além de terras localizadas no município de Três Lagoas, em Mato Grosso do Sul

(FIBRIA, 2013). Para a conclusão da obra, a VCP obteve do BNDES um financiamento

de R$ 600 milhões e inicia suas operações em 2009, com capacidade instalada de 1,3

milhão de t/ano de celulose (VIDAL; DA HORA, 2013).

Em 2008, a VCP e a Suzano criaram o Consórcio Paulista de Papel e Celulose –

CONPACEL, definindo assim, o modelo de gerenciamento da antiga RIPASA42

, com

cada um dos controladores detendo 50% dos ativos e comercializando a produção de

forma independente (BRACELPA, 2013; FIBRIA, 2013).

Entre 2006 e 2008, a Aracruz expande a unidade fabril de Barra do Riacho em

Aracruz (ES), de 2.130 mil t/ano para 2.330 mil t/ano, com investimentos do BNDES de

R$ 250 milhões e em 2009 tem início o terceiro berço de atracação de navios no

Portocel (VIDAL; DA HORA, 2013; FIBRIA, 2013).

42

Em 2004 a Ripasa Celulose e Papel foi adquirida pelas empresas VCP e Suzano, por R$ 720 milhões e

faltava definir o modelo de gerenciamento e a nova denominação da empresa, que só ocorreu em 2008. A

Ripasa alcançou, em 2005, uma receita líquida de R$ 1,4 bilhão e 646 mil toneladas de vendas e detinha

quatro unidades industriais em São Paulo, além de 86,4 mil hectares de terras (SUZANO, 2006).

118

O ano de 2009 marca a conclusão das negociações para a incorporação da

Aracruz Celulose pela VCP, dando origem à Fibria, num investimento total de R$ 5,4

bilhões, comprando 28% das ações ordinárias do grupo Lorentzen e 28% das ações

ordinárias do grupo Safra, conforme informações de Vidal e Da Hora (2013, p. 159):

[...] Um dos acionistas da Aracruz, o grupo Lorentzen, aceitou vender sua

participação (28% das ações ordinárias) à VCP por R$ 2,7 bilhões. Um

acordo de acionistas tornava a proposta extensível (tag along) ao grupo Safra

(outro acionista da Aracruz, também detentor de 28% das ações ordinárias),

que, no entanto, não pretendia vender suas ações.

Para a conclusão da operação, o grupo Votorantim procurou o BNDES e

conseguiu que o banco aportasse R$ 2,1 bilhões, argumentando que a criação da maior

empresa de celulose de fibra curta do mundo representaria mais desenvolvimento para o

país, através dos ganhos de escala, redução dos custos operacionais e maior

competitividade no mercado internacional (VIDAL; DA HORA, 2013).

Em 2011 a Fibria vende seus ativos do CONPACEL e da KSR para a Suzano

Papel e Celulose por R$ 1,45 bilhão, envolvendo o controle da fábrica em Limeira-SP e

as terras. No mesmo ano, a Fibria também vendeu a unidade Piracicaba ao grupo Oji

Paper, que por sua vez, mudou o nome da unidade para Oji Papéis Especiais LTDA com

capacidade de produção de 169 mil toneladas anuais de papéis (FIBRIA, 2013; OJI

HOLDINGS CORPORATION, 2013).

Com a formação da Fibria em 2009, a empresa passou a ser a 24ª maior

vendedora mundial de celulose e papel, com atuação em 50 países (Figura 47) e vendas

de US$ 3,6 bilhões em 2010 (R$ 6,3 bilhões). Antes da incorporação a Aracruz era a 45ª

e a VCP a 58ª (RISI/PPI, 2008). Para atuar, em âmbito global, nos principais mercados

de consumo, a Fibria possui escritórios em Miami (EUA), Nyon (Suíça), Csomád

(Hungria) e Hong Kong (China), além de centrais de distribuição em: Baltimore,

Jacksonville, Mobile e Port Arthur (EUA); Flushing (Holanda), Monfalcone (Itália),

Pasir Gudang (Malásia) e Changshu (China).

Entre 2010 e 2012, a Fibria conseguiu aumentar a sua produção de celulose em

4,8% saindo de 5,1 milhões de toneladas para 5,3 milhões de toneladas, mas as vendas

recuaram 1,7% no mesmo período, em função da queda no preço da tonelada de

celulose no mercado internacional, iniciando o ano de 2011 em US$ 849/t e chegando

ao final de 2012 em US$ 776/t, sendo que no final de 2011 a cotação atingiu apenas

US$ 648/t, resultando no pior desempenho dos três anos analisados: vendas de R$ 5,8

bilhões em 2011, apesar do aumento da produção.

119

120

A produção de papel que era de 314 mil toneladas em 2009 caiu para 93 mil

toneladas em 2011 (queda de 70%), demonstrando o interesse da Fibria em atuar apenas

no setor de produção de celulose. Prova disso é a saída dos negócios de papel verificada

em 2011, representada pela venda do Conpacel, da KSR e da Unidade Piracicaba.

A margem de lucro Ebitda que estava em 40% em 2010 caiu para 34% em 2011

e voltou a subir no ano de 2012 chegando a 36%, indicando que mesmo enfrentando

dificuldades com o preço da commoditie celulose de fibra curta no mercado

internacional, as margens de lucro continuaram satisfatórias, beneficiadas, inclusive

pela valorização de 17% no preço do dólar em 2012 que significam um maior preço

líquido da celulose em reais.

Dos 5,3 milhões de toneladas de celulose produzidas pela Fibria, 4,7 milhões

(89%) foram exportados, com destaque para os mercados europeu (43%), norte-

americano (23%) e asiático (23%), nos quais a empresa possui escritórios e centrais de

distribuição como parte da logística responsável pela circulação das mercadorias. Para

reduzir os custos de transporte da celulose até os mercados de destino e otimizar o

sistema operacional, a Fibria encomendou, em 2012, a construção de 20 navios

cargueiros à empresa sul-coreana STX Pan Ocean para serem utilizados exclusivamente

pela empresa no transporte da celulose para o exterior:

O ano de 2012 marcou ainda o início da operação do STX Arborella,

primeiro de uma frota de 20 navios que serão construídos pela empresa sul-

coreana STX Pan Ocean para atender ao contrato de afretamento com a

Fibria, com duração de 25 anos. Com navios especialmente projetados para

atender as especificações técnicas do transporte de celulose, a operação

reforça a vantagem competitiva da Companhia, com o aprimoramento do

desempenho logístico e controle do frete oceânico, a entrega de produtos de

alta qualidade e rigorosamente nos volumes e prazos contratados (FIBRIA,

2012a, p. 3).

A Fibria atingiu um valor de mercado de R$ 12,5 bilhões em 2012 e vem

estabelecendo a produção de celulose como foco para seus negócios, vendendo as

unidades de produção e comercialização de papéis e reestruturando a produção através

das inovações tecnológicas que permitem obter maior produtividade e, ao mesmo

tempo, reduzir os custos com a força de trabalho. No período 2010/2012 o total de

funcionários próprios caiu de 5.037 para 3.827, uma redução de 24% no período,

enquanto que o número de funcionários terceirizados subiu de 11.919 para 13.343,

configurando uma situação de que apenas 22,3% do total de funcionários pertencem ao

quadro funcional próprio da empresa. Considerando a totalidade do quadro funcional

para o ano de 2012, o somatório da remuneração (salários, gratificações, comissões e

121

abonos), 13º salário, férias e encargos sociais compulsórios (INSS, FGTS e contribuição

social) correspondeu a 9,3% da receita líquida.

As contribuições sociais realizadas pela Fibria nas comunidades em que suas

fábricas estão inseridas atingiram 0,3 % da receita líquida (R$ 18,370 milhões) no ano

de 2012, o que caracteriza a mesma configuração percentual verificada pela Suzano. Os

dados comprovam que, dentro da lógica do capital, não há como desenvolver as regiões

e gerar emprego e renda para as comunidades inseridas no perímetro de ação desses

empreendimentos, uma vez que o objetivo maior é aumentar a lucratividade média, de

forma que a tônica do processo de reestruturação é diminuir os custos com a força de

trabalho, através da precarização e redução do emprego, inclusive do terceirizado, que

começou a diminuir em 2012.

A Fibria atua diretamente em seis Estados brasileiros (Figura 48), com fábricas

em quatro Estados (Espírito Santo, Mato Grosso do Sul, São Paulo e Bahia) e terras em

seis Estados (São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Mato Grosso do Sul, Bahia e

Espírito Santo).

Com relação às fábricas, a capacidade anual instalada é de 5,25 milhões de

toneladas, sendo Aracruz-ES com 2,3 milhões t/ano, Três Lagoas-MS com 1,3 milhão

de t/ano, Jacareí-SP com 1,1 milhão de t/ano e Veracel-BA43

com 0,55 milhão t/ano.

Com esses números, a Fibria é a maior produtora mundial de fibra curta de eucalipto e,

para manter em operação as quatro fábricas, utiliza os transportes rodoviário, ferroviário

e marítimo. O meio rodoviário é o mais utilizado e serve para transportar a madeira das

áreas produtoras até as unidades industriais de Três Marias, Jacareí, Aracruz e Veracel,

sendo que o transporte ferroviário é utilizado no trajeto entre os territórios produtores de

madeira de Minas Gerais e os depósitos da Fibria no Espírito Santo. Do Terminal

Marítimo de Caravelas saem barcaças44

carregadas de madeira com destino ao Terminal

de Barcaças de Portocel, onde a madeira segue para a unidade industrial Aracruz. A

celulose produzida na unidade Veracel segue em barcaças por navegação de cabotagem

até Portocel, no Espírito Santo, onde é exportada. Já a celulose produzida em Jacareí e

Três Lagoas é escoada pelo porto de Santos. Quanto à produção da unidade Aracruz,

também é escoada em Portocel, que fica localizado a cerca de três quilômteros de

43

A Veracel tem capacidade total para produzir 1,1 milhão de toneladas anuais, sendo 50% da Fibria e

50% da Stora Enso. 44

A Norsul Navegação é a empresa responsável pelo transporte de barcaças e pertence ao empresário

norueguês Erling Sven Lorentzen, fundador da ex-Aracruz Celulose (FOLHA DO LITORAL, 2011).

122

distância. Toda essa logística é fundamental para otimizar o transporte e assegurar

estabilidade operacional e competitividade, uma vez que 89% da produção é exportada

para a Europa, América do Norte e Ásia, sendo que a Fibria já colocou em operação o

STX Arborella, navio cargueiro especializado no transporte de celulose, com

capacidade para transportar 54 mil toneladas.

Figura 48 – Fibria: Presente em seis Estados.

Fonte: Mapa produzido pelo autor a partir de dados da FIBRIA, Demonstrações

Financeiras, 2012a.

A empresa possui quase um milhão de hectares de terra em seis Estados, sendo

que 563 mil hectares são utilizados para o plantio do eucalipto, notadamente, em Mato

Grosso do Sul (228 mil ha), Bahia (135 mil ha) e Espírito Santo (105 mil ha). A área

plantada varia de 33% a 40% do total da área em cada Estado, o que indica ainda uma

margem para a ampliação dos plantios para atender à demanda crescente da produção

123

para atendimento do mercado externo. A empresa ainda possui 100 mil hectares em

Capão Leão, no Rio Grande do Sul, com aproximadamente 39 mil hectares plantados de

eucalipto, mas não foram contabilizados porque fazem parte de uma negociação entre a

Fibria e a CMPC Celulose Riograndense S.A., em que ambas as empresas assinaram,

em 28 de dezembro de 2012, um compromisso de compra e venda dessas terras no valor

de R$ 615 milhões. Dessa forma, a Fibria desistiu de abrir uma fábrica de celulose no

Rio Grande do Sul e, nesse sentido, não seria interessante, economicamente, manter

essas áreas em função da distância entre os territórios produtores de madeira e as

unidades industriais mais próximas (Três Lagoas-MS e Jacareí-SP). Além disso, a

produtividade do eucalipto na Bahia (42,2 m3/ha/ano) e no Espírito Santo (40,3

m3/ha/ano) é bem superior à registrada pelo Rio Grande do Sul (22,9 m

3/ha/ano),

conforme dados da Bracelpa (2010a).

Com relação à Veracel, joint venture 50/50 da Fibria e da Stora Enso, a área de

polarização se estende por 10 municípios no sul baiano, com destaque para Santa Cruz

Cabrália, Eunápolis, Itagimirim, Porto Seguro e Belmonte, que possuem os maiores

territórios produtores de madeira, conforme pode ser visualizado na Figura 49.

Em 2011, a produção conjunta dos 10 municípios atingiu 3,8 milhões de metros

cúbicos de madeira em tora de eucalipto e ocupou, aproximadamente, 86 mil hectares,

considerando a produtividade média de 44 m3/ha/ano (BRACELPA, 2013). O consumo

de madeira da unidade fabril Veracel para o mesmo ano foi de 3,67 milhões de

toneladas (VERACEL, 2012) o que corresponde a 97,4 % de toda a madeira em tora

produzida pela região. O município de Santa Cruz Cabrália produziu 1,85 milhão de m3

de madeira em tora, que representa quase a metade (49,1%) do total produzido pela

região. Em seguida, os maiores produtores são Eunápolis (19,2%), Itagimirim (12,9%) e

Porto Seguro (11,7%). A importância da proximidade com os territórios produtores de

madeira como fator primordial para a indústria de celulose fica evidente na localização

da fábrica, que foi construída no ponto central da região, diminuindo os custos de

transportes e otimizando a logística de integração dos dez municípios ao ritmo de

funcionamento da fábrica, que fica a uma distância média de 47 km das plantações de

eucalipto.

124

Figura 49 – Território da Veracel: Produção de madeira em tora em 2011.

Fonte: Mapa produzido pelo autor a partir de dados do IBGE: Produção da Extração

Vegetal e da Silvicultura: madeira em tora para papel e celulose, 2011.

Obs.: Para o cálculo da área em hectares foi utilizada a produtividade média do

eucalipto: 44 m3/ha/ano (BRACELPA, 2013).

A Veracel abriu 330,3 km de estradas para realizar a integração de seus

territórios produtores de madeira e, em parceria com o Governo do Estado construiu três

rodovias para ligar a fábrica a três pontos estratégicos: ao Terminal Marítimo de

Belmonte, à Santa Cruz Cabrália e à BR-101. Dessa forma, a Veracel dispõe de uma

estrutura completa para o escoamento da produção que sai da fábrica em caminhões até

o Terminal Marítimo de Belmonte (Figura 50), onde a celulose é colocada em barcaças

que seguem para Portocel, em Barra do Riacho, no Espírito Santo, de onde partirão em

navios cargueiros especializados para fábricas de papel localizadas na Europa, nos

Estados Unidos e na Ásia.

125

Figura 50 – Terminal Marítimo de Belmonte.

Fonte: Fotos selecionadas e organizadas pelo autor a partir de dados da Veracel,

Relatórios de Sustentabilidade, 2007, 2010 e 2012.

Desde que iniciou suas atividades de fabricação de celulose, a Veracel aumentou

a sua produção em 169%, saindo de 392 mil toneladas em 2005 para 1.055 mil

toneladas em 2011 (Figura 51), assim como aumentou sua receita líquida em 162%, de

R$ 323,5 milhões em 2005 para R$ 847,6 milhões em 2011.

126

Figura 51 – Veracel: Produção de Celulose e Receita Líquida: 2005/2011.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados da Veracel, Relatórios de

Sustentabilidade, 2005/2011.

Para fazer frente a essa expansão da produção e manter a capacidade instalada de

produção de celulose em seu nível máximo, a Veracel adquiriu mais terras nos dez

municípios de abrangência, saindo de 172.982 hectares em 2005 para 211.380 em 2011

(Figura 52), resultando em um crescimento de 22,2%, sendo que pouco mais de 90 mil

hectares são utilizados para as plantações de eucalipto (Figura 53).

Para complementar 20% da demanda de madeira exigida pela fábrica, a Veracel

criou, em 2003, o Programa Produtor Florestal - PPF, em que estabelece contratos com

produtores da região para implantarem o cultivo do eucalipto em suas propriedades, de

forma que a Veracel financia e dá suporte técnico em todas as etapas (preparo do solo,

fornecimento de mudas clonais45

, plantio, manutenção e colheita) e, em contrapartida, o

produtor vende a madeira à empresa com exclusividade, que, por sua vez, abate do valor

pago ao produtor as despesas realizadas no processo de produção da madeira. Nesses

contratos, a Veracel é livre para escolher os locais de plantação e ao final do sexto a

sétimo ano de plantio tem direito a comprar 97% da madeira produzida, bem como

descontar os valores pecuniários adiantados a título de financiamento da produção.

45

A Veracel possui um viveiro em Eunápolis (Figura 54), com capacidade para produzir 24 milhões de

mudas clonais de eucalipto por ano, em um ambiente com sistema automatizado de controle das

condições de umidade e temperatura que favorecem o crescimento rápido, encurtando o ciclo de produção

para apenas 75 dias. Sem a climatização o ciclo de produção poderia se estender por 110 dias

(VERACEL, 2007).

127

Além disso, a Veracel assume a obrigação de providenciar a documentação necessária

para a regularização legal dos empreendimentos, tendo o direito de abater esses custos

na época da venda da madeira.

Figura 52 – Terras da Veracel na Bahia - 2012.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados da VERACEL, Relatório de

Sustentabilidade, 2012.

Para realizar a regularização legal do agronegócio do eucalipto é necessário que

os imóveis rurais estejam com a documentação regular no cartório de registro de

imóveis, incluindo a averbação dos 20% da reserva legal. Nos casos de exploração de

madeira em áreas acima de 100 hectares, o CONAMA estabelece que seja feito o

Estudo de Impacto Ambiental/Relatório de Impacto Ambiental – EIA/RIMA (Art. 2º,

inc. XIV, Resolução CONAMA nº 001/86).

128

Figura 53 – Plantios de eucalipto da Veracel.

Fonte: Fotos selecionadas e organizadas pelo autor a partir de dados da Veracel,

Relatórios de Sustentabilidade, 2007, 2008, 2010 e 2012.

Num estudo de 2008 realizado pelo IMA denominado “Silvicultura de eucalipto

no sul e extremo sul da Bahia” ficou constatado que 70% dos plantios nas área de

fomento da Veracel estavam sem licença ou com a mesma vencida. Além disso, 60%

das 85 propriedades vistoriadas não possuíam Reserva Legal averbada e 15% não

possuíam nem área disponível para esse fim, estando o imóvel todo ocupado por

eucalipto ou pastagens. No tocante a Área de Preservação Permanente – APP, apenas

30% dos imóveis apresentaram conformidade. O estudo envolveu 85 propriedades em

10 municípios (Itamaraju, Porto Seguro, Itabela, Guaratinga, Sta Cruz de Cabrália,

Eunapólis, Itagimirim, Belmonte, Mascote), atingindo uma área total de 43.189 ha,

sendo com plantio efetivo o total de 16.000 ha (IMA, 2008, p. 13-14).

129

Figura 54 – Viveiro da Veracel.

Fonte: Fotos selecionadas e organizadas pelo autor a partir de dados da Veracel,

Relatórios de Sustentabilidade, 2005 e 2008.

Para o Ministério Público da Bahia (2009), o estudo do IMA serviu para

comprovar que os plantios da Veracel ultrapassavam a área determinada pelo

CEPRAM, que estava licenciada para ampliar os cultivos em até 96.000 hectares:

[...] O IMA também constatou que, somente em plantios próprios, a

VERACEL tinha autorizações ambientais concedidas pelo Estado da Bahia

que somavam 112.380,24 hectares — extensão esta que nem o próprio IMA

130

tinha anterior conhecimento, pois ultrapassava a área delimitada pelo

CEPRAM, através da RESOLUÇÃO DE Nº 1.239/96 — resolução que

somente autorizava uma ampliação do plantio de eucaliptos para 96.000

hectares e não para 112.380,24 hectares, como foi levantado. O diagnóstico

que integra as provas da presente ação enfatiza que o excedente de 96.000

hectares, além de estar em descompasso com a Resolução do CEPRAM de nº

1.239/96, também não consta em bancos de dados dos referidos órgãos

ambientais, nem mesmo do programa CERBERUS. Esta ilegalidade, como

outras já apontadas, repercute na necessidade de um exame mais apurado por

parte do Poder Judiciário, já que, supostamente, as autorizações excedentes

têm origem ilícita — o que não é de se estranhar em face de tantos outros

atos ilegais que já foram praticados em favor da VERACEL (MINISTÉRIO

PÚBLICO DA BAHIA, 2009, p. 11).

O Ministério Público do Estado da Bahia46

(2012) ofereceu denúncia contra a

Veracel Celulose e outros por irregularidades no PPF. Segundo a denúncia, na fazenda

Monte Pascoal, com área total de 803,75 hectares, de propriedade de Armando

Rodrigues Gomes, localizada no município de Itabela-BA, a produção de madeira em

tora procedeu de forma irregular porque as licenças ambientais foram forjadas no

município de Itabela. A fraude contou com a participação do prefeito municipal da

época e com a conivência do diretor geral do INEMA e de um técnico desse órgão em

Itabela. Como o PPF tem âmbito regional, o licenciamento só poderia ser realizado

pelos órgãos ambientais do Estado da Bahia (CRA e CEPRAM47

), de forma que eram

ilegais as licenças ambientais concedidas pelo município de Itabela:

Portanto, o Município de Itabela nunca poderia ter concedido licenciamento

ambiental aos fomentos florestais desenvolvidos e financiados pela empresa

Veracel, por falta de competência licenciatória, e, também, pelo fato de, à

época, aquele município não dispor da estrutura administrativa necessária

como estabelecido no art. 20 da Resolução do CONAMA de nº 237/97 e no

art. 7º, incs. I a V da Resolução do CEPRAM de nº 3.925/2009

(MINISTÉRIO PÚBLICO DA BAHIA, 2012, p. 5).

No caso da fazenda Monte Pascoal, os plantios de eucalipto foram iniciados sem

a devida licença ambiental e, em março de 2012, a imprensa local flagrou o corte e o

armazenamento da madeira na fazenda.

O Ministério Público (2012) mandou ofício ao INEMA cobrando providências

no sentido de lavrar um auto de infração ou de apreensão da madeira ilegal, mas o

diretor geral pediu prazo de 90 dias, tempo suficiente para que o INEMA concedesse

uma licença ambiental unificada:

[...] apesar do ofício ter chegado ao INEMA na data de 25/04/2012, o sétimo

denunciado [Júlio Mota, diretor geral do INEMA] somente encaminhou

resposta no dia 02/05/2012 e ainda assim para pedir 90 (noventa) dias para

adotar uma providência o que nunca fez. Tal procrastinação somente visava

agilizar o deferimento ilegal – como fez – de uma licença ambiental para o

46

Por intermédio do Promotor de Justiça Substituto João Alves da Silva Neto. 47

Centro de Recursos Ambientais – CRA e Conselho Estadual de Meio Ambiente – CEPRAM.

131

empreendimento da Fazenda Monte Pascoal e, assim, encobrir os crimes

praticados pela Veracel e dos outros denunciados que cortaram eucaliptos

ilegalmente (MINISTÉRIO PÚBLICO DA BAHIA, 2012, p. 16).

Assim, verifica-se a estreita ligação entre o Estado e o capital numa tentativa

criminosa de ignorar as leis para diminuir o tempo de giro do capital e reduzir custos,

uma vez que a realização do EIA/RIMA demandaria tempo e gastos adicionais ao

empreendimento. A licença para plantio deve anteceder os próprios plantios e, no caso

da fazenda Monte Pascoal, ela foi concedida oito anos após os plantios ilegais terem

sido realizados e para dar valor legal ao corte irregular da madeira e assim alimentar a

indústria de celulose. E mesmo assim, o licenciamento foi irregular, uma vez que não

considerou os impactos cumulativos, como parte integrante do PPF da Veracel, que é

desenvolvido em escala regional e conta com 23.000 hectares, não poderia ser objeto de

licenciamento simplificado. Isso foi realizado para poder dispensar a Avaliação de

Impacto Ambiental – AIA. A denúncia do Ministério Público tramita no Tribunal de

Justiça do Estado da Bahia e pede a condenação pelos crimes praticados no processo de

licenciamento ambiental e no corte irregular dos eucaliptos.

Em 2005, o PPF contava com 64 contratos e uma área plantada de 11,2 mil

hectares. O Relatório de Sustentabilidade 2012 divulgado pela empresa aponta para a

existência de 135 contratos, abrangendo uma área plantada de 20,3 mil hectares

(crescimento de 81,5% em sete anos). Os 135 contratos correspondem a 104 produtores

rurais e, como a área total das propriedades é de 52.535 hectares, o tamanho médio das

propriedades é de 505 hectares, demonstrando que os pequenos produtores rurais não

participam desse processo.

Segundo o Ministério Público da Bahia48

(2011) o PPF serviu para a Veracel

burlar os limites impostos pelo CEPRAM, na forma de condicionantes em seu

licenciamento principal, que restringiu o plantio de eucalipto em 15% da área total para

os municípios do litoral e 20% da área total para os municípios do interior:

Deve ser lembrado que a licença ambiental deferida pelo CEPRAM em favor

do grupo assumido pela Veracel se iniciou com uma área de 48.000 hectares

de eucalipto. Posteriormente, os três primeiros notificados concederam uma

nova ampliação daquele empreendimento para 96.000 hectares, sem que

fosse determinado, à época, um prévio estudo de impacto ambiental (EIA).

Além disso, num diagnóstico produzido pelo próprio Estado da Bahia, foi

constatada a existência de autorizações ambientais para plantios de eucaliptos

que não constavam sequer em registro ou banco de dados dos três primeiros

réus [Estado da Bahia, CEPRAM e INEMA], e, que tratavam da área total de

112.000 hectares. E foi naquele mesmo diagnóstico que o Estado da Bahia

também reconheceu a existência de enormes plantios clandestinos de

48

Por intermédio do Promotor João Alves da Silva Neto.

132

eucaliptos, os quais somavam, segundo levantamentos do IMA49

, mais de

37.000 hectares (MINISTÉRIO PÚBLICO DA BAHIA, 2011, p 24-25).

Nesse sentido, o PPF aumentava a área real de atuação da Veracel porque as

licenças ambientais eram concedidas sem entrar no cômputo geral dos percentuais

estabelecidos pelo CEPRAM. Além disso, a deliberação do CEPRAM seria mais

coerente se estabelecesse limites a partir das áreas agricultáveis dos municípios e não da

área total dos municípios, uma vez que não há possibilidade de plantar eucaliptos em

áreas urbanas, nas reservas legais, nas APPs e sobre os corpos hídricos. Assim, a

decisão de propor condicionantes a partir da área total dos municípios restringiu ainda

mais as terras disponíveis para as demais atividades agropecuárias, bem como a compra

desenfreada de terras na região estimulou a elevação dos preços dos imóveis rurais,

inviabilizando a aquisição de terras por parte dos camponeses produtores de alimentos

para a subsistência e/ou mercado local.

Segundo o Ministério Público da Bahia50

(2006), houve várias irregularidades no

processo de concessão das licenças ambientais para quatro projetos de fomento de

eucalipto, em Eunápolis no ano de 2003. Na composição do Conselho Municipal do

Meio Ambiente daquele município, um dos conselheiros era funcionário da Veracel e

não poderia ter votado, contando com a omissão do presidente do Conselho que deveria

ter impedido que o funcionário participasse da votação. Além disso, o prefeito da época,

interessado em receber adiantamento de impostos nomeou, por exigência da Veracel,

um ex-funcionário da empresa para o cargo de Secretário de Meio Ambiente. O

regimento interno do Conselho estabelecia que o Presidente do CEDEMA fosse o

Secretário do Meio Ambiente. Assim, o prefeito e o presidente do CEDEMA travavam

a pauta do Conselho enquanto não fossem deliberadas as licenças ambientais dos

fomentos de eucalipto.

Na sessão realizada no dia 25 de novembro de 2003, a discussão da concessão da

licença ambiental para os quatro fomentos dividiu o plenário, sendo necessário que o

presidente utilizasse o voto de Minerva. Esta dificuldade na aprovação das licenças

incomodou a Veracel e em 30 de dezembro de 2003 o executivo encaminhou um projeto

de lei, que foi aprovado pela Câmara de Vereadores, esvaziando as competências do

Conselho de Meio Ambiente, que não poderia mais deliberar sobre licenças ambientais:

49

O Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos – INEMA foi criado através da Lei nº 12.212, de 04

de maio de 2011, extinguindo o Instituto de Meio Ambiente – IMA, anteriormente denominado Centro de

Recursos Ambientais – CRA. 50

Através do Promotor Dinalman Mendonça Messias.

133

Saliente-se ainda, que em decorrência das dificuldades que os projetos de

fomentos estavam tendo para ser aprovados pelo Conselho do Meio

Ambiente, no mês de dezembro de 2003, ao “apagar das luzes” do exercício

legislativo, foi sancionada a Lei Municipal 497 de 30.12.2003 (fls. 140/174),

que revogou a lei ambiental anterior (410/2001 – fls. 11/54) extinguiu o

CEDEMA e criou o COMDAU – Conselho de Desenvolvimento e Defesa

Ambiental e Urbana (art. 9º da L. 497/03 – fls. 145). Suprimiu a função

precípua do então CEDEMA, prevista no art. 7º, IX da L. 410/2001 (fls. 15),

que era a de deliberar sobre as licenças ambientais de atividades e

empreendimentos de impacto ambiental local, passando essa competência

para o órgão executor, o SEMEM (MINISTÉRIO PÚBLICO DA BAHIA,

2006, p. 6).

Segundo a Rede Brasileira de Justiça Ambiental (2009), que avaliou quatro

projetos de grande impacto socioambiental, entre eles o licenciamento da monocultura

do eucalipto no norte do Espírito Santo e sul da Bahia, as diversas instâncias

governamentais tendem a ceder às pressões dos grandes grupos econômicos e facilitar o

processo de licenciamento, com destaque para o esvaziamento do papel dos conselhos

de meio ambiente:

Os casos estudados revelam que os conselhos – embora importantes

instâncias de participação e exercício do controle social – estão muitas vezes

sujeitos a mudanças arbitrárias nas suas regras de composição e

funcionamento e à exclusão e/ou cooptação de seus membros. [...] Por esses

motivos, os conselhos - importante conquista da sociedade civil a partir da

Constituição de 1988 – vêm sendo esvaziados em seu papel de promotores de

uma maior democratização das decisões políticas (JUSTIÇA AMBIENTAL,

2009, p. 7).

Essa mesma estratégia jurídica foi utilizada, em maio de 2011, pelo Estado da

Bahia, quando criou o Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos - INEMA, em

substituição ao Instituto de Meio Ambiente – IMA, bem como suprimindo a

competência do Conselho Estadual de Meio Ambiente – CEPRAM para expedir

licenças ambientais.

Mais uma vez, fica constatada a postura classista do Estado em utilizar todo o

seu aparato para desobstruir as barreiras e permitir o livre desenvolvimento desigual e

combinado do capital em escala ampliada. Marx e Engels (1980) afirmaram que o

governo moderno é um comitê criado para a gestão dos negócios burgueses e, nesse

sentido, a figura do Estado como árbitro neutro é desmascarada diante das ações estatais

em garantir os interesses do capital, mudando até o sistema legal quando for o caso.

Meszáros (2011) destaca que o sistema de leis existe para garantir o controle do capital

sobre a sociedade e perpetuar a subordinação estrutural do trabalho ao capital:

Obviamente, a verdade, que está longe de ser “racionalmente

tranqüilizadora”, é que o sistema atual de leis impostas constituiu-se (e

continua a ser modificado em seus delineamentos fundamentais e dimensões

sociais vitais), acima de tudo, com o objetivo de assegurar e salvaguardar o

134

controle do capital sobre o corpo social e, simultaneamente, perpetuar a

subordinação estrutural do trabalho ao capital (MÉSZÁROS, 2011, p. 412).

Além de servir para burlar as condicionantes estabelecidas pelo CEPRAM, o

PPF também servia aos propósitos de sonegação fiscal, em que a Veracel utilizava as

contas correntes dos fomentados para a realização de pagamentos a empreiteiras, de

acordo com denúncia do Ministério Público da Bahia, de 05 de julho de 2012, tombada

sob o nº 0001057-79.2012.805.0111.

Na pesquisa de campo realizada no primeiro semestre de 2013, com 10

fomentados da Veracel, apenas dois se declararam insatisfeitos com a vinda da

eucaliptocultura; a grande maioria ressaltou que compensa mais para o produtor rural

plantar eucalipto e produzir madeira para celulose do que investir na criação de gado ou

na produção de café, cacau ou mel:

Hoje, com o eucalipto, consigo tirar R$ 4.192,00/ha/ano e com a criação de

gado tirava apenas R$ 100,00 ha/ano, sendo que a mesma coisa vale para o

café, o cacau ou o mel. Os críticos falam que a Veracel comprou todas as

terras, mas isso não tem importância... Eles compraram a terra e pagaram.

Não importa se foi dinheiro do BNDES ou não. Importa que pagou e pagou

bem. A Veracruz chegou a pagar 500 arrobas de boi por alqueire. Foi um

bom negócio na época e muitos venderam suas terras (G. P. S. – Fomentado

da Veracel, 19 mar. 2013).

Assim, a maioria dos entrevistados ressaltou que não dependem totalmente da

produção de eucaliptoe por isso podem esperar de 5 a 7 anos para realizar o corte dos

eucaliptos e receber o dinheiro da Veracel, pois mantêm outras atividades paralelas que

garantem a geração de renda no período de crescimento das árvores, conforme os dados

apresentados na Figura 55:

Figura 55 – Programa Produtor Florestal da Veracel: Profissões dos Proprietários de

Terras.

Fonte: Pesquisa de campo, março/abril de 2013.

40,0%

20,0%

10,0%

10,0%

10,0%

10,0% Pecuarista

Advogado

Engenheiro

Médico

Contador

Comerciante

135

Os fomentados encaram a renda obtida com a venda da madeira como uma

espécie de poupança de médio prazo. Todo o processo produtivo é financiado pela

Veracel e, como o eucalipto não precisa de muita mão de obra, os gastos são mínimos,

não importando se essa atividade diminua as áreas disponíveis para a agricultura de

alimentos e gere desemprego no campo:

Na verdade, para o produtor rural retirar da terra e se manter ele está sendo

um verdadeiro gigante. O governo quer que a gente faça um banheiro para os

trabalhadores na fazenda que nem na nossa casa tem. Por isso, muitos estão

aderindo ao fomento da Veracel, porque a gente não tem esse tipo de

problema. O produtor é livre para produzir o que ele quiser. É dono da terra e

deve escolher a atividade que dá mais retorno. O gado e a lavoura hoje não tá

dando retorno. O eucalipto dá retorno... De que adianta o produtor gerar

empregos e falir? Esse negócio de função social da terra só existe no papel

(A.S. - Fomentado da Veracel, 20 mar. 2013).

Todos os fomentados entrevistados declararam ter propriedades acima de 250

hectares, o que confirma a hipótese de que apenas médios e grandes proprietários

(Figura 56) participam do agronegócio do eucalipto:

Figura 56 – Programa Produtor Florestal da Veracel: Área das Propriedades.

Fonte: Pesquisa de campo, março/abril de 2013.

De acordo com os dados do Censo Agropecuário de 2006 do IBGE, a grande

maioria dos proprietários de terra nos municípios polarizados pela Veracel pertence à

classe de menos de 20 hectares e para eles não existe viabilidade econômica no plantio

de eucaliptos. Isso acontece porque o tamanho exíguo de suas terras não permite a

10,0%

30,0%

60,0%

250 - 300 hectares

300 - 500 hectares

mais de 500 hectares

136

fragmentação da fazenda em áreas de pecuária e de plantio de eucaliptos, como fazem

os grandes pecuaristas. Também não são profissionais liberais que atuam em outras

áreas e possuem a terra como forma de complementação de renda e/ou poupança. Para

os pequenos proprietários rurais, viver com a família em uma área inferior a 20 hectares

é fazer milagres diários e muitos só permanecem no campo por causa dos programas de

distribuição de renda do Governo Federal.

Com relação ao PPF, alguns fomentados reclamam da Veracel porque temem

sofrer punição jurídica pelos problemas verificados no processo de licenciamento, em

que as licenças ambientais só foram concedidas muitos anos após terem sido realizados

os plantios. Outros fomentados querem renovar o contrato com a Veracel, mas devido à

repercussão negativa da eucaliptocultura na região e o fortalecimento dos movimentos

socioterritoriais, temem sofrer invasões de sem terra e destruição da sede e das

benfeitorias da fazenda. Além desses problemas, existem questões relacionadas aos

contratos de fomento que suprimem a autonomia dos proprietários. No mês de março de

2013, em Eunápolis, um fomentado de Porto Seguro se acorrentou no pátio do centro

administrativo da Veracel, localizado às margens da BR 101, para protestar contra a

empresa:

[...] Os motivos que levaram Márcio a cometer este desatino, foi às falsas

promessas da empresa, de que daria ao fomentado toda sustentação

necessária o que não vem acontecendo. A falta de atenção por parte dos

diretores da empresa também tem sido um martírio para o fazendeiro. [...] O

desespero tem sido tanto que ele chegou a comprar um tipo de veneno

popularmente conhecido por chumbinho. [...] Um dos motivos de tanto

desespero por parte do fomentado, é um contrato entre a empresa e o

fazendeiro [...] que assegura a averbação de sua propriedade junto a empresa

Veracel celulose, o que impede que o fazendeiro tome qualquer decisão sem

o consentimento da empresa (JORNAL GIRO DE NOTÍCIAS, 2013).

Assim, além de ser a maior proprietária de terras no Estado da Bahia, a Veracel

também monopoliza o território (OLIVEIRA, A., 1991) através do seu programa de

fomento, decidindo o que, como e quanto produzir nas terras dos fomentados,

relegando-os à função de meros proprietários nominais das terras, configurando uma

situação de sujeição da renda da terra ao capital (MARTINS, 1986).

Dessa forma, com a garantia da oferta de madeira necessária para o pleno

funcionamento da fábrica, aliado ao processo de reestruturação produtiva que otimizou

a logística de transporte e reduziu os custos com investimentos sociais e com a força de

trabalho, a Veracel desponta hoje como uma empresa altamente competitiva no mercado

mundial, apresentando um dos mais baixos custos de produção de celulose branqueada

de fibra curta de eucalipto. A margem de lucro EBITDA (Figura 57) indica uma perda

137

de eficiência do negócio após 2008, muito mais em função da queda do preço da

celulose no mercado internacional (US$ 648 por tonelada em 2011) do que com o

processo produtivo, que leva à redução da receita líquida e, consequentemente, a uma

menor margem de lucro.

Figura 57 – Veracel: EBITDA 2005/2011.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados da Veracel, Relatórios de

Sustentabilidade, 2005/2011.

Com o aumento do preço dessa commodity no ano de 2012, a margem de lucro

EBITDA segue com tendência de alta, uma vez que a receita líquida subiu 19,5%,

saindo de R$ 848 milhões em 2011 para um bilhão de reais em 2012, com o lucro

líquido atingindo a marca de R$ 47,9 milhões, demonstrando a alta produtividade e

eficiência do negócio na Bahia. Comparando a margem de lucro EBITDA, que reflete

apenas os recursos gerados na atividade principal da empresa, com os lucros líquidos,

que englobam também os efeitos financeiros e os impostos, nem sempre uma margem

positiva de lucro EBITDA significa lucro líquido conforme os dados apresentados na

Figura 58.

Assim, enquanto a margem EBITDA sempre foi positiva no período analisado,

os anos de 2005 e 2011 representaram para a Veracel um prejuízo operacional, de R$ 71

milhões e R$ 35 milhões respectivamente. Isso ocorre porque a empresa tem despesas

que não são contabilizadas pelo indicador EBITDA, como o pagamento de empréstimos

e de impostos e, dessa forma, nos anos em que os preços da celulose estão abaixo da

média no mercado internacional, o resultado da receita líquida não é suficiente para

gerar lucro líquido.

138

Figura 58 – Veracel: Lucro líquido ou prejuízo - 2005/2011.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados da Veracel, Relatórios de

Sustentabilidade, 2005/2011.

Os empréstimos foram contraídos entre dezembro de 2003 e janeiro de 2004,

junto a bancos europeus e ao BNDES, com a finalidade de construir a fábrica da

Veracel, nos limites dos municípios de Eunápolis e Belmonte, com capacidade instalada

de produção de 900 mil t/ano de celulose, conforme dados da Figura 59:

Figura 59 – Construção da Fábrica Veracel: Participação no investimento.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados da Veracel, Relatório de

Sustentabilidade, 2005.

-70,9

27,1

2,4

34,7

46,0

-34,8

47,9

-80

-60

-40

-20

0

20

40

60

2005 2006 2007 2008 2010 2011 2012

R$

milh

õe

s

44%

33%

11%

6% 6%

BNDES

STORA ENSO E ARACRUZ

ACIONISTAS

EIB

NIB

TOTAL: US$ 1,24 BILHÕES

139

O BNDES financiou R$ 1,452 bilhão (US$ 545,28 milhões), correspondentes a

44% do total investido na construção da fábrica, com juros anuais variando de 1 a 3,3%

e parcelamento em 78 meses a contar de dezembro de 2006; O Banco Europeu de

Investimento – EIB financiou US$ 80 milhões, com juros anuais de 0,4% em 19

parcelas com o início do pagamento em setembro de 2006; O Banco Nórdico de

Investimento – NIB entrou com US$ 70 milhões, a serem pagos em 19 parcelas com

início do pagamento em setembro de 2006 e juros anuais de 1,45%; Os acionistas

injetaram US$ 134 milhões, correspondendo a 10,8% do total; Aos proprietários da

joint venture, as empresas Aracruz e Stora Enso, coube o investimento de US$ 410,7

milhões.

De acordo com o cronograma de pagamento, os empréstimos realizados junto

aos bancos europeus serão amortizados em março de 2015 e a última parcela do

financiamento do BNDES terminou em junho de 2013. Isso significa que os resultados

financeiros da Veracel para o ano de 2013 serão bastante promissores, tanto pela

amortização da dívida com o BNDES quanto pelo aumento do preço da celulose de

fibra curta no mercado internacional, que atingiu US$ 819,07/tonelada em junho de

2013 (CIFLORESTA, 2013). Além disso, o real segue desvalorizado em relação ao

dólar, o que representa um aporte significativo de reais nas contas da Veracel.

Com o pagamento da maior parte da dívida junto ao BNDES e com os preços

elevados da celulose no mercado internacional, a Veracel se prepara para expandir a

produção de celulose de 1,2 para 2,7 milhões de toneladas anuais, conforme

informações da própria empresa:

Ainda em 2012, conquistamos a primeira das licenças para dar continuidade

ao projeto de expansão da Veracel, a partir da decisão de empreender por

parte dos nossos acionistas. Com a implementação desse projeto,

conseguiremos ampliar a capacidade atual da Fábrica de 1,2 milhão para 2,7

milhões de toneladas de celulose por ano (VERACEL, 2012, p. 4).

É bastante provável que a empresa consiga, novamente, junto ao BNDES, a

maior parte dos recursos necessários para construção da linha 2 da Veracel e avançar,

também, com seu projeto de expansão dos territórios produtores de madeira paras as

regiões Sudoeste e Litoral Sul51

, envolvendo mais nove municípios na sua área de

polarização. A licença prévia para a expansão foi concedida em março de 2012 pelo

51

O Relatório de Impacto Ambiental divulgado em abril/2011 pela Veracel apresenta o projeto de

ampliação da fábrica e da base florestal, com a expansão dos territórios de produção de eucalipto para

duas regiões baianas: Na Região Sudoeste envolve os municípios de Encruzilhada, Macarani,

Maiquinique, Itapetinga, Itarantim e Portraguá; Na Região Litoral Sul abrange os municípios de Santa

Luzia, Mascote e Canavieiras (VERACEL, 2011).

140

Instituto de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (INEMA), que é o órgão licenciador

do Estado da Bahia.

Quando o BNDES apoiou a construção da fábrica, assinando um contrato de

financiamento de R$ 1,45 bilhões em 26 de janeiro de 2004, havia a promessa de

geração de mais de 12 mil empregos na região. No pico da obra, em 2004, foram

gerados 11,5 mil empregos nas fases de preparação do terreno e construção da

infraestutura física e instalação dos equipamentos. Com o início das operações da

fábrica em 2005, o número de empregados próprios da Veracel passou para 739 e o de

terceirizados 3.150.

No período 2005/2012, enquanto a receita líquida saiu de R$ 323,5 milhões para

R$ 1,012 bilhão, acusando um crescimento de 213%, a geração de empregos minguou

13%, saindo de 3.889 para 3.345, sendo aproximadamente 80% de funcionários

terceirizados. Os gastos com a folha de pagamento cresceram apenas 34%, saindo de R$

12,2 milhões para R$ 16,4 milhões no período 2005/2011. Considerando a receita

líquida de 2011, que foi de R$ 847,6 milhões, os gastos com salários e encargos sociais

representaram apenas 1,93%.

Nesse contexto, o investimento bilionário do BNDES a juros baixos no

empreendimento Veracel com o argumento da geração de emprego e renda e da

promoção do desenvolvimento regional não consegue escapar da real situação de

poucos empregos criados para muito investimento público, oriundo de fontes como o

Tesouro Nacional, o FAT e o PIS/PASEP52

, sendo os dois últimos recursos

provenientes dos trabalhadores brasileiros.

Outro argumento utilizado no discurso do desenvolvimento para justificar o

enorme apoio do Estado a esse tipo de empreendimento envolve o compromisso da

empresa em pagar corretamente os seus impostos e investir na infraestrutura da

comunidade através de sua contribuição com o financiamento de projetos sociais.

No tocante ao pagamento de impostos nas esferas federal, estadual e municipal,

é importante destacar que, da mesma forma que a unidade Mucuri da Suzano, a Veracel

também se beneficia por estar localizada em área menos desenvolvida classificada pela

SUDENE como apta para receber a redução de 75% do Imposto de Renda pelo prazo de

dez anos. Uma estratégia das empresas para não perderem esse incentivo fiscal é

52

81,7% das fontes de recursos do BNDES originam da estrutura governamental, sendo 49,7% do

Tesouro Nacional, 28,5% do FAT/PIS-Pasep e 3,5% de outras fontes governamentais (BNDES, 2011).

141

realizar a ampliação do empreendimento, inclusive com grande parte dos recursos

financiados pelo próprio governo e, assim, estender por mais dez anos a redução da

alíquota do imposto de renda devido, uma vez que a SUDENE garante esse benefício às

pessoas jurídicas titulares de projetos de implantação, modernização, ampliação ou

diversificação de empreendimentos, protocolizados até 31/12/2018 (SUDENE, 2013).

Além disso, a Veracel também tem tratamento diferenciado nas esferas estadual

(pagando menos pelo ICMS) e municipal, com a redução da alíquota do Imposto Sobre

Serviços – ISS de 5% para 2% (VERACEL, 2005).

Assim, beneficiada pela política de incentivos fiscais por todas as esferas de

governo, a Veracel no período 2005/2012 realizou o pagamento dos impostos sempre

próximo à faixa de 10% da receita líquida (Figura 60), com exceção do ano inicial das

operações fabris, em que a margem foi de 19,2%.

Figura 60 – Veracel: Participação dos impostos na receita líquida no período 2005/2012.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados da Veracel, Relatórios de

Sustentabilidade, 2005/2012.

Isso aconteceu porque em 2005 a empresa ainda realizava gastos com a

conclusão da obra (e, portanto pagava impostos sem gerar produção e renda) e porque a

produção teve início apenas em maio de 2005, utilizando ainda muito pouco da

capacidade instalada, resultando em uma produção anual de apenas 392 mil toneladas,

bem abaixo da capacidade instalada de 900 mil toneladas de celulose kraft branqueada

de eucalipto. Dessa forma, a baixa produção representou a geração de uma menor

receita líquida, num momento em que os gastos com a construção da fábrica ainda eram

142

altos, resultando em um prejuízo de R$ 70,9 milhões. A partir de 2006, a Veracel

passou a produzir celulose superando, inclusive, a capacidade máxima instalada e o

pagamento dos impostos se manteve abaixo de 10% da receita líquida, na maior parte

do período analisado.

Dentro da linha de justificativas para a vinda dessas empresas está o argumento

de que elas pagam muitos impostos na região, contribuindo com o aporte de recursos

importantes através do Imposto Sobre Serviços – ISS, cobrados pelas prefeituras nos

dez municípios em que atuam. No período 2005/2012, correspondente ao tempo de

existência da Veracel na região, a participação dos impostos municipais na receita

líquida da empresa vem caindo ao longo do período, conforme atestam os dados da

Figura 61:

Figura 61 – Veracel: Participação dos impostos municipais na receita líquida no período

2005/2012.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados da Veracel, Relatórios de

Sustentabilidade, 2005/2012.

A arrecadação das prefeituras via impostos pagos pela Veracel que começou em

5% da receita líquida em 2005 vem caindo ao longo do período, sendo que no ano de

2012 representou menos de 1% do faturamento líquido da empresa, que consegue pagar

menos impostos inclusive com o aumento da receita líquida. Isso ocorre porque não há

uma relação direta entre receita líquida e pagamento de impostos, dependendo muito

das especificidades dos vários impostos em diferentes esferas, uns incidindo mais em

143

produtos, outros em serviços, outros ainda em mercadorias importadas, etc. Não cabe

nesta pesquisa aprofundar as minúcias do sistema tributário brasileiro que determinam a

quantidade e os valores dos impostos pagos pelas empresas, mas constatar que grandes

empresas de atuação internacional pagam muito menos impostos do que empresas

nacionais do mesmo porte ou menor, que não contam com tantos incentivos financeiros

e isenções fiscais. É difícil entender porque a produção aumenta, as vendas aumentam, a

receita líquida aumenta, o lucro líquido aumenta e o pagamento de impostos cai, sendo

que é justamente o recolhimento de tributos uma das premissas fundamentais utilizadas

pelos defensores do desenvolvimentismo de inspiração cepalina.

Com base na distribuição municipal dos impostos pagos pela Veracel na região

(Figura 62), verifica-se que a Prefeitura de Eunápolis recebe mais da metade dos valores

monetários recolhidos na forma de Imposto Sobre Serviços (ISS):

Figura 62 – Veracel 2011: Distribuição dos impostos municipais.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados da Veracel, Relatório de

Sustentabilidade, 2011.

No ano de 2011, o município de Eunápolis recolheu R$ 5,77 milhões oriundos

do ISS, funcionando a uma alíquota reduzida de 2%. Caso fosse mantida a alíquota

normal estabelecida para as demais empresas que é de 5%, a arrecadação subiria para

52,8%

17,7%

11,0%

7,0%

6,3%

3,6% 0,8% 0,5% 0,2% 0,1%

EUNÁPOLIS

BELMONTE

SANTA CRUZ CABRÁLIA

ITAGIMIRIM

PORTO SEGURO

ITABELA

CANAVIEIRAS

GUARATINGA

ITAPEBI

MASCOTE

TOTAL: R$ 10,92 milhões

144

R$ 14,4 milhões, representando uma contribuição 150% maior. Para o município de

Eunápolis, que sedia a empresa e fica com mais da metade dos impostos pagos pela

Veracel na região, o montante recolhido em 2010, cerca de R$ 5,4 milhões representa

3,1% do orçamento total de 2011, que atingiu R$ 176,5 milhões. Já a contribuição da

Veracel para o PIB industrial do município foi bastante significativa, conforme

demonstram os dados da Figura 63:

Figura 63 – Eunápolis: PIB industrial e participação no ranking estadual – 2004/2010.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados do IBGE/SIDRA, Produto Interno

bruto dos Municípios, 2004/2010.

Mesmo no ano inicial de operação da Veracel, em que a fábrica produziu apenas

44% da capacidade instalada de celulose, o PIB de Eunápolis cresceu 57,5% em 2005 e

atingiu 156% em 2006, saindo da posição 21ª no ranking do PIB estadual em 2004 para

a 12ª posição em 2006. A variação da receita líquida da Veracel no período 2005/2010

com crescimento constante até 2008 e queda entre 2008 e 2010 reflete uma dinâmica

ascendente/descendente que se repete no comportamento do PIB industrial de

Eunápolis, movimentando-se de maneira semelhante, na direção do crescimento e na

intensidade, para o mesmo período analisado, indicando a superinfluência que a

empresa exerce sobre o PIB municipal.

Assim, enquanto o PIB industrial de Eunápolis mais que dobrou no período

2004/2006 (crescimento de 233,7%), a contribuição da Veracel para os cofres da

145

prefeitura através do pagamento do ISS representou apenas 3% do orçamento, valores

insuficientes para alterar alguma coisa do ponto de vista da melhoria significativa da

qualidade dos serviços públicos ofertados à população. Nesse contexto, considerando

que Eunápolis é o município que recepciona mais da metade (52,8%) dos impostos

pagos pela empresa, a contribuição regional para os outros nove municípios da área

polarizada é ainda menor, uma vez que precisam dividir, de maneira não igualitária, os

47,2% restantes.

No tocante à contribuição da Veracel no financiamento de projetos sociais e

melhoria da infraestrutura da comunidade, que representa outro argumento utilizado no

discurso do desenvolvimento para justificar o enorme apoio do Estado aos grandes

empreendimentos industriais, a empresa destaca em seus Relatórios de Sustentabilidade

que o investimento social é o condutor do relacionamento com as comunidades e, nesse

sentido, são aplicados recursos financeiros para o desenvolvimento econômico, cultural

e social das comunidades vizinhas:

Além do apoio social feito pela Veracel por meio de projetos, programas e

fortalecimento de políticas públicas, visando ao desenvolvimento econômico,

cultural e social das comunidades vizinhas, realizamos ações consideradas de

investimento social privado que consistem em doações e melhorias de

infraestrutura como as obras nas estradas da região. Esse apoio é

significativo, pois proporciona mais qualidade de vida e facilidade de acesso

aos municípios e localidades vizinhas ao empreendimento (VERACEL, 2012,

p. 34).

No entanto, os valores investidos pela empresa em projetos sociais e de

infraestrutura minguaram ao longo do período de existência da fábrica, conforme os

dados demonstrados na Figura 64, e o investimento de R$ 19,4 milhões em abertura de

estradas foram realizados, prioritariamente, para atendimento da logística de transporte

da Veracel, que precisa integrar seus territórios de produção de madeira à fábrica e

necessita de boas estradas. Na pesquisa de campo realizada entre os meses de março e

abril de 2013, cerca de 70% dos entrevistados destacaram o cuidado que a empresa tem

na manutenção dessas estradas, realizando freqüentemente os serviços de patrolamento

e cascalhamento a fim de manter o fluxo dos caminhões em uma velocidade capaz de

satisfazer as demandas da fábrica que não pode parar por falta de madeira. Assim, os

benefícios que a população recebe ao utilizar essas estradas se restringem às áreas onde

se localizam as terras, funcionando então como um efeito colateral ou ação social

indireta decorrente do imperativo logístico imprescindível para realizar a produção de

celulose e, por conseguinte, a reprodução ampliada do capital.

146

Figura 64 – Veracel: Investimentos Sociais no período 2005/2012.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados da VERACEL, Relatórios de

Sustentabilidade, 2005/2012.

Outra vez, ocorre uma incompatibilidade entre o discurso apresentado às

comunidades na época de implantação da fábrica na região e o que, efetivamente, foi

investido em projetos sociais e obras de infraestrutura. O valor aplicado em 2005, ano

inicial da produção de celulose, correspondente à 6,6% da receita líquida da empresa

daquele ano, em nenhum momento posterior foi repetido53

. Pelo contrário, enquanto a

receita líquida cresceu 213% no período 2005/2012, os investimentos sociais

despencaram 88,9%, saindo de R$ 21,3 milhões em 2005 para R$ 2,4 milhões em 2012,

correspondendo, atualmente, a 0,2% do total da receita líquida.

Portanto, por todos os parâmetros analisados, não há correspondência entre o

discurso do desenvolvimento, da empregabilidade e da renda quando confrontado com a

realidade dos investimentos realizados, tributos pagos e empregos gerados ao longo da

existência da fábrica na região. Enquanto a receita líquida e a produção praticamente

triplicaram no período 2005/2012, a contribuição para as comunidades regionais sofreu

53

Segundo informações do Jornal A Gazeta, de 30 de janeiro de 2004, do total de R$ 1.452.192.000,00

financiados pelo BNDES para a construção da fábrica da Veracel, há um subcrédito de R$ 18.900.000,00

(1,3%) destinados à implantação do Programa de Investimentos Sociais nos municípios polarizados. Isso

significa que do total de R$ 21,3 milhões investidos em 2005 a título de contribuição social da Veracel,

88,7% foram financiados pelo BNDES.

21,3

5,2 4,4

6,3

1,2 1,3 2,4

0

5

10

15

20

25

2005 2006 2007 2008 2010 2011 2012

R$

milh

õe

s

147

uma forte redução, evidenciada pela queda no número de funcionários próprios e de

terceirizados (- 14%), nos impostos totais recolhidos (- 57%), nos impostos municipais

recolhidos (- 81,6%) e nos investimentos sociais (- 89%).

3.2.3.1 Os próximos territórios a serem incorporados

Atualmente, existe um projeto de expansão da base florestal da Veracel para

outras regiões, como a Região Sudoeste da Bahia e a Região Litoral Sul. No Sudoeste,

envolvendo os municípios de Encruzilhada, Macarani, Itapetinga, Maiquinique,

Itarantim e Potiraguá. Na Região Litoral Sul, a expansão envolve os municípios de

Mascote, Canavieiras e Santa Luzia. Os municípios supracitados estão em média a 75

km de distância da Fábrica da Veracel e o projeto pretende a implantação de 92.000

hectares de plantio próprio e 15.000 hectares de produtores florestais (VERACEL,

2011).

Segundo Oliveira, E. (2012, p. 304), que analisou a expansão da eucaliptocultura

no Planalto da Conquista, na Região Suodeste da Bahia, a ausência de um grande

projeto liderado por grandes empresas de papel e celulose reduziu a ocupação contínua

e manteve a pequena e média propriedade, mas, existe a ameaça real de mudança desse

cenário em função do projeto de ampliação da fábrica da Veracel:

Se a estrutura fundiária do Planalto da Conquista é ainda desconcentrada para

os padrões regionais, não faltam ameaças, principalmente nas áreas de maior

potencial hídrico. Se a ausência de investimentos, nas áreas subúmidas e

semiáridas, consiste em pequenos projetos que envolvem as comunidades

locais, sob o argumento de geração de emprego e de renda, a ausência de

grandes investimentos do Estado se faz sentir, se bem que tais projetos não

têm beneficiado o produtor local. Fica, então, a cargo das grandes empresas,

dispondo de capital e de aporte do Estado, a disseminação de políticas de

ampliação da produção, em espaços ditos “luminosos”, para a reprodução do

mesmo capital. É o caso da ampliação da fábrica da Veracel que, diante da

pressão sobre a terra, no sul do Estado, busca ampliar a produção de celulose

e de papel, com plantios de eucalipto.

Em Abril de 2011, a Veracel Celulose S.A publicou o Relatório de Impacto

Ambiental (RIMA) para o seu projeto de Ampliação da Fábrica e Base Florestal nos

Municípios de Belmonte, Canavieiras, Encruzilhada, Eunápolis, Guaratinga, Itabela,

Itagimirim, Itapebi, Itapetinga, Itarantim, Macarani, Maiquinique, Mascote, Porto

Seguro, Potiraguá, Santa Cruz de Cabrália, Santa Luzia e Indústria de Celulose no

Município de Eunápolis e Belmonte, na Bahia (VERACEL, 2011).

De acordo com o documento, a Veracel já está licenciada para produzir 1,2

milhão de toneladas de celulose branqueada por ano, a maior parte vendida ao exterior,

148

fruto do plantio de eucalipto em 119 mil hectares no Extremo Sul da Bahia, sendo 96

mil hectares de área própria e 23 mil hectares por meio do Programa Produtor Florestal.

Para a expansão está prevista a incorporação de mais 107 mil hectares

envolvendo a ampliação do cultivo no Extremo Sul e a sua introdução nas regiões

Sudoeste e Litoral Sul (Figura 65):

O novo objetivo é aumentar a produção de celulose de fibra curta em mais

1,5 milhão de toneladas secas ao ar por ano (tsa/ano). Para tanto, será

necessário aumentar a área de plantio de eucalipto existente em 107 mil

hectares (plantio próprio e/ou arrendado e em parceria com Produtores

Florestais no Sul e Extremo Sul da Bahia). Isso será possível com a

ampliação da Veracel, nova fábrica com essa capacidade de produção maior

que a atual, que será localizada ao lado da unidade já existente nos

municípios de Eunápolis e Belmonte, na Bahia. Essa quantidade de celulose

produzida vai atender à demanda do mercado de produção de papel

(VERACEL, 2011, p.1).

Figura 65 – Projeto de Expansão da Veracel.

Fonte: Mapa produzido pelo autor a partir de dados da VERACEL, Relatório de

Impacto Ambiental, 2011.

149

Pelo texto apresentado no RIMA, não está claro se a Veracel vai lançar o PPF na

Região Sudoeste, uma vez que a afirmação está restrita ao Sul e Extremo Sul da Bahia,

nem se a ampliação da área através do PPF será incluída nos limites condicionantes pelo

CEPRAM. A incerteza do RIMA serve para encobrir os impactos causados pela

atividade eucaliptocultora nas áreas de fomento, uma vez que se não estão definidas as

áreas de cada um (Veracel e PPF), não se sabe ao certo se os fomentos florestais serão

incluídos no total da área a ser licenciada. A Resolução Conama 001/86, em seu artigo

6º determina que sejam consideradas no EIA/RIMA as propriedades cumulativas e

sinérgicas dos impactos, contemplando o conjunto das atividades florestais, haja vista

que a produção de madeira realizada no PPF fica sob o domínio e supervisão da

Veracel, devendo sim fazer parte de um só licenciamento.

O eucalipto é uma espécie vegetal de crescimento muito rápido e depende,

fundamentalmente, do consumo de água em grande quantidade para poder realizar o seu

processo acelerado de fotossíntese, com rebatimentos na disponibilidade hídrica da

região em que está inserido. Considerando os estudos de Ceroni (1972 apud BUCKUP,

2006), a taxa de transpiração do eucalipto (Eucalyptus rostrata) fica em torno de 100

litros por dia de 10 horas, resultando em uma transpiração, pelos estômatos, de 36.500

litros/ano. Adicionando-se a evaporação epidérmica, calculada em torno de 4% do total,

cada árvore elimina 36.646 litros de água por ano. Agora, considerando que os plantios

clonais de eucalipto utilizam espaçamentos de 3 m X 3 m, a densidade resultante de

árvores por hectare é de 1.111. Com esses dados, é possível estimar a quantidade de

água necessária para o crescimento dos eucaliptos em cada um dos municípios onde está

prevista a expansão, conforme informações apresentadas na Tabela 9. Para realizar os

cálculos adotou-se o referencial de 63,1% sobre o total de terras a ser adquirido pela

Veracel nos municípios, uma vez que este representa o percentual a ser utilizado pela

empresa para formar os territórios produtores de madeira.

Pelo exposto, o crescimento de 118,877 milhões de árvores de eucalipto

distribuídos pelos 107.000 hectares planejados pela Veracel para realizar a sua

duplicação exigirá o consumo de 4,356 trilhões de litros de água. Os seis municípios da

Região Sudoeste (Encruzilhada, Macarani, Maiquinique, Itapetinga, Itarantim e

Potiraguá) responderão por 30.918 hectares (29%); Os três municípios da Região

Litoral Sul (Santa Luzia, Mascote e Canavieiras) ficarão com 17.017 hectares (16%) do

total; A grande maioria dos cultivos permanecerá mesmo na Região Extremo Sul

150

envolvendo seis municípios (Itapebi, Belmonte, Itagimirim, Guaratinga, Itabela e Porto

Seguro), com 59.065 hectares, perfazendo 55% do total. Eunápolis e Santa Cruz

Cabrália não foram relacionados porque o limite de 20% estabelecido pelo CEPRAM já

foi atingido naqueles municípios.

Tabela 9 – Projeto de Duplicação da Veracel - Cálculo da Evapotranspiração Total

Anual das árvores de eucalipto.

Município Área/Plantio

(hectares)

Densidade

média

(Árvores/

ha)

Total de

árvores

Evapotranspi-

ração por

árvore

(litros/ano)

Total da

Evapotranspi-

ração

(litros/ano)

Encruzilhada 3.155 1.111 3.505.083 36.646 128.447.279.187

Macarani 6.310 1.111 7.010.166 36.646 256.894.558.374

Maiquinique 2.524 1.111 2.804.067 36.646 102.757.823.350

Itapetinga 6.310 1.111 7.010.166 36.646 256.894.558.374

Itarantim 9.465 1.111 10.515.250 36.646 385.341.837.561

Potiraguá 3.155 1.111 3.505.083 36.646 128.447.279.187

Santa Luzia 1.892 1.111 2.102.349 36.646 77.042.678.056

Mascote 6.371 1.111 7.078.165 36.646 259.386.435.591

Canavieiras 8.754 1.111 9.725.905 36.646 356.415.510.289

Itapebi 11.496 1.111 12.771.822 36.646 468.036.195.902

Belmonte 7.038 1.111 7.819.140 36.646 286.540.190.411

Itagimirim 2.807 1.111 3.118.122 36.646 114.266.699.565

Guaratinga 17.575 1.111 19.526.118 36.646 715.554.102.896

Itabela 7.046 1.111 7.828.253 36.646 286.874.153.337

Porto Seguro 13.103 1.111 14.557.312 36.646 533.467.239.920

Total 107.000 1.111 118.877.000 36.646 4.356.366.542.000

Fonte: Tabela produzida pelo autor a partir de dados da Veracel, Relatório de Impacto

Ambiental 2011; SEI-BA, Estatísticas dos Municípios Baianos, 2012; e BUCKUP,

2006.

Agora, confrontando o consumo de água necessário para alimentar as plantações

de eucaliptos com a média plurianual histórica dos índices pluviométricos registrados

pelos municípios (Tabela 10), é possível constatar a existência ou não de

compatibilidade entre consumo de água pelos territórios produtores de madeira e

realimentação do sistema hídrico limitado pela pluviometria regional.

151

Tabela 10 – Projeto de Duplicação da Veracel – Relação entre Evapotranspiração Total

Anual das árvores de eucalipto e Pluviometria Regional.

Município Total da

Evapotranspi-

ração

(litros/ano)

Pluv.

(mm/

ano)

Pluv.

(litros/ha/

ano)

Total

pluviométrico da

área

(litros/ano)

Diferença

(litros/ano)

Encruzilhada 128.447.279.187 976,1 9.761.000 30.794.884.950 -97.652.394.237

Macarani 256.894.558.374 796 7.960.000 50.225.854.769 -206.668.703.605

Maiquinique 102.757.823.350 796 7.960.000 20.090.341.908 -82.667.481.442

Itapetinga 256.894.558.374 803,3 8.033.000 50.686.468.764 -206.208.089.611

Itarantim 385.341.837.561 814,7 8.147.000 77.108.675.654 -308.233.161.908

Potiraguá 128.447.279.187 814,7 8.147.000 25.702.891.885 -102.744.387.303

Santa Luzia 77.042.678.056 1.637,6 16.376.000 30.988.357.971 -46.054.320.085

Mascote 259.386.435.591 1.637,6 16.376.000 104.331.260.564 -155.055.175.026

Canavieiras 356.415.510.289 1.806,5 18.065.000 158.144.438.960 -198.271.071.328

Itapebi 468.036.195.902 1.232,7 12.327.000 141.708.597.760 -326.327.598.142

Belmonte 286.540.190.411 1.534,3 15.343.000 107.982.951.527 -178.557.238.884

Itagimirim 114.266.699.565 1.232,7 12.327.000 34.596.840.817 -79.669.858.748

Guaratinga 715.554.102.896 1.247,3 12.473.000 219.216.259.149 -496.337.843.747

Itabela 286.874.153.337 1.247,3 12.473.000 87.886.406.474 -198.987.746.863

Porto Seguro 533.467.239.920 1.758,2 17.582.000 230.375.024.378 -303.092.215.542

Total 4.356.366.542.000 1.222,3 12.223.333 1.307.896.666.667 -3.048.469.875.333

Fonte: Tabela produzida pelo autor a partir de dados da Veracel, Relatório de Impacto

Ambiental 2011; SEI-BA, Estatísticas dos Municípios Baianos, 2012; e BUCKUP,

2006.

Assim, os dados mostram que existe um descompasso entre a quantidade

necessária de água para prover adequadamente as plantações de eucaliptos e o total

pluviométrico anual de cada área, sendo mais grave nos municípios da Região Sudoeste,

onde os índices pluviométricos anuais são inferiores a 1.000 mm e a diferença entre

consumo/pluviometria é de 4 a 5 vezes em anos de normalidade pluviométrica. Isso

indica que a expansão da eucaliptocultura pelo Sudoeste Baiano incorre em grandes

possibilidades de ressecamento do solo e redução gradativa dos cursos d’água e das

reservas do subsolo. Os dados analisados sobre pluviometria resultam de uma média

histórica de precipitações pluviométricas que configuram a normalidade climática da

região. Considerando os anos anormais, como as secas que ocorreram nos anos de 2011

e 2012, retratadas com as mais intensas dos últimos 40 anos, a situação de escassez

hídrica poderá ser ainda maior, podendo resultar em dessecamento e morte dos rios.

152

Para a empresa não é interessante plantar eucaliptos em locais onde os índices

pluviométricos são inferiores a 1.000 mm/ano, mas em função da necessidade de

encorpar seu rol de justificativas sociais para conseguir a aprovação da duplicação da

produção de celulose, foi necessário envolver municípios da Região Sudoeste e

defender o velho discurso do desenvolvimento e da geração de emprego e renda que os

investimentos no agronegócio do eucalipto vão proporcionar para as comunidades

pobres das áreas rurais.

Nesse contexto, apenas 29% dos plantios serão realizados no Sudoeste Baiano,

uma vez que a climatologia da região não favorece a elevada produção de biomassa

requerida pela empresa. Sendo assim, a grande maioria dos plantios (55%) foi

direcionada para os municípios mais próximos da fábrica e com maiores índices

pluviométricos, respondendo aos propósitos do capital, que objetivam a redução de

custos com transportes e aumento da produtividade da biomassa proporcionado pelo

crescimento rápido das árvores nas áreas de maior pluviosidade.

No RIMA para o seu projeto de Ampliação da Fábrica e Base Florestal, a

Veracel afirma que se pautou por critérios sociais e ambientais quando optou pela

expansão dos territórios produtores de eucalipto para outras regiões:

[...] Apesar de não ser a melhor segundo os critérios técnicos e econômicos,

uma vez que aumenta os custos com transporte e madeira e infraestrutura,

tem menor produtividade pelas condições edafoclimáticas (solo e clima), ela

é a opção prefencial por ter maiores vantagens ambiental e social

(VERACEL, 2011, p. 14).

No entanto, essa afirmação não é coerente com os dados de expansão da base

florestal pelas regiões, uma vez que 55% dos cultivos permaneceram na região de maior

pluviosidade e onde se localiza a fábrica de celulose. Apenas 29% serão plantados na

Região Sudoeste, que apresenta desvantagem edafoclimática, conforme o texto do

RIMA. Embora no plano do discurso a empresa afirme que está levando em conta os

interesses ambientais e sociais, na análise dos dados apresentados pelo mesmo RIMA

está claro e evidente que os principais critérios considerados para duplicar a produção

de celulose foram os interesses econômicos da Veracel, a qual terá menores custos para

transportar a madeira até a fábrica e maior produtividade de madeira proporcionada

pelos atributos edafoclimáticos que permitem um encurtamento do ciclo de cultivo do

eucalipto, concorrendo assim, para a redução de tempo de giro do capital e uma maior

lucratividade dos negócios com a produção de celulose.

153

De acordo com um vereador de Eunápolis, em função do encurtamento no ciclo

de cultivo do eucalipto proporcionado pela qualidade do clima e do solo, não haveria

necessidade de expansão para outros territórios:

[...] Na verdade, eu acredito que eles não precisem plantar mais nenhum

eucalipto em outras regiões porque eles chegaram aqui com a ideia de colher

eucalipto com 8 ou 9 anos. Hoje eles cortam eucalipto com seis anos e tem

projeto para diminuir para cinco anos, pela excelência das terras da região.

No sul e sudeste demora 15 e ate 21 anos por causa do clima frio e tal... Aqui

eles acharam o melhor lugar do mundo para plantar eucalipto. Mas eu

acredito que aqui também seja o melhor lugar do mundo para plantar muita

coisa: café, (que produz sem irrigação), fruticultura, você vê aqui frutas como

graviola, pinha. Aqui foi o primeiro lugar do mundo a fazer duas colheitas

anuais de pinha... Então aqui é um lugar excelente, nem tanto de solo, mas de

clima... O solo não é tão fértil, mas é plano e todo boqueirão tem água. A

gente está perto do Sudeste, tem aeroporto e o prejuízo é muito grande se a

gente ficar só com o eucalipto. Aqui, na época da fruticultura a gente vivia

pleno emprego; tinha até dificuldade em arrumar caixote para armazenar as

frutas e caminhão para transportar. Hoje, praticamente não há emprego... A

Veracel paga milhões de impostos para a prefeitura na forma de ISS, não é

pouca coisa não, mas aí a corrupção some com tudo... Para a prefeitura foi

muito bom, mas para a geração de emprego e renda foi um desastre! (L.L –

vereador de Eunápolis, 18 mar. 2013).

Para o vereador eunapolitano, a vinda do eucalipto foi uma decisão errada do

governo que definiu o Extremo Sul como zona produtora de eucalipto. Segundo ele, se

fossem aplicados apenas 10% do total investido pelo BNDES no desenvolvimento da

agroindústria de frutas na região, a quantidade de empregos a serem gerados seria

infinitamente maior.

No projeto de expansão da eucaliptocultura para outras regiões, além do

consumo de água representado pelo crescimento do monocultivo, a empresa prevê

também a retirada de 9.216 metros cúbicos por hora (m3/h) do rio Jequitinhonha para

poder realizar todas as etapas necessárias para a produção da celulose. Segundo o RIMA

o total a ser captado representaria 2,5% do volume total de água do rio no período de

estiagem. A Veracel acrescenta ainda que devolverá 90 % do volume captado na forma

de efluente industrial tratado, mas no RIMA não há nenhuma informação sobre as

fontes que balizaram tais afirmações sobre o rio Jequitinhonha que se encontra

atualmente bastante degradado e já está impactado pela instalação da usina hidrelérica

de Itapebi. Também não existem informações sobre como será realizado o

monitoramento e avaliação da quantidade e qualidade das águas do rio Jequitinhonha.

É importante destacar que as alterações provocadas pela instalação dos

monocultivos do eucalipto na Bahia vão além da problemática da água, tendo

repercussões na alteração dos ecossistemas como um todo. A floresta tropical é um

bioma de alta biodiversidade e a eucaliptocultura também avançou incorporando essas

154

terras. Nesse sentido, a expansão dos monocultivos contribuiu decisivamente para

fragmentação e destruição dos hábitats, impedindo que as espécies (vegetais e animais)

nativas se reproduzam ao longo do tempo, prejudicando o eficiente sistema de

reciclagem de nutrientes presente na floresta tropical, onde os nutrientes são

reincorporados à biomassa numa velocidade maior do que na monocultura do eucalipto.

No RIMA apresentado, a Veracel destaca o cronograma de realização dos

plantios de eucalipto, das melhorias de estradas e das atividades de colheita florestal.

Pelo cronograma, a empresa estabelece o período de quatro anos para iniciar as

atividades de colheita florestal e, contraditoriamente, não existe nenhuma espécie clonal

de eucalipto capaz de realizar o seu ciclo de cultivo dentro desse prazo. Em condições

excepcionais de clima e solo, o prazo mínimo para realizar a colheita fica em torno de

cinco anos. A questão importante que essas indagações suscitam é a hipótese de plantio

antecipado dos eucaliptos, sem que a empresa esteja licenciada para tal, assim como foi

realizado na fazenda Monte Pascoal, em Itabela, quando o licenciamento ambiental foi

concedido oito anos após os plantios, já com a madeira cortada, armazenada e pronta

para ser transportada para a fábrica.

A Veracel garante a produção de uma celulose de altíssima qualidade a partir

dos processos químicos adotados para separar a lignina da celulose, com a utilização de

soda cáustica e sulfeto de sódio, sendo o material posteriormente levado a etapa de

branqueamento, onde a lignina mais resistente é retirada através da utilização de

compostos clorados, que são potencialmente cancerígenos. Ao final do processo, a

celulose está livre de outros materiais como areia, borracha, plástico, etc. e apresenta

altos níveis de brancura. Quanto mais branca, mais nobre e cara é a celulose, garantindo

para a Veracel maior competitividade no mercado internacional pela qualidade do

produto e maior lucratividade pelos preços alcançados. O grande problema é que para

atingir um maior branqueamento, mais cloro precisa ser utilizado no processo. Sobre

este tema se posicionou Ministério Público da Bahia54

(2011):

[...] Para qualquer avaliação e viabilidade, tem que se considerar muito mais

do que uma simples afirmação destituída de fundamentos técnicos; não foi

mencionada, por exemplo, a escala de produção que determinará as

quantidades de emissões reais de organoclorados. Existem no EIA/RIMA

afirmações do emprego das “melhores tecnologias disponíveis” e expressões

como “níveis bem baixos de compostos de cloro”, o que não diz

ABSOLUTAMENTE nada; o principal se omitiu que é o fato de que entre os

baixos níveis de compostos de cloro se insere a dioxina, um dos produtos

mais tóxicos existentes no mundo. Não esclareceu ainda aqueles estudos que

54

Representado pelo Promotor de Justiça João Alves da Silva Neto.

155

o ECF (Elementar Chlorine Free) é a tecnologia mais adotada no processo de

branqueamento da celulose porque é a mais barata; a TCF seria a melhor

tecnologia, em termos de emissões de organoclorados, contudo, é uma

tecnologia mais cara, o que a torna pouco atrativa para as indústrias por conta

da necessidade de maiores investimentos financeiros. Daí não foi explicado

pelo EIA/RIMA que a escolha da tecnologia por parte da VERACEL não está

levando em conta os interesses ambientais, ou da sociedade, mas, sim os

interesses econômicos daquela empresa, a qual economizando nos seus

investimentos era uma maior margem de lucros no seu empreendimento

(MINISTÉRIO PÚBLICO DA BAHIA, 2011, p. 13).

O posicionamento contundente do Ministério Público desmascara a tentativa da

empresa de minimizar os pontos negativos e supervalorizar os pontos positivos. Com

um discurso científico controverso e repleto de afirmações social e ambientalmente

corretas sem comprovação nos dados apresentados e até mesmo contraditórias, a

empresa tenta viabilizar seu empreendimento a qualquer custo, sem revelar para a

comunidade o real objetivo do RIMA que é informar, com clareza, imparcialidade e

precisão os benefícios e os prejuízos da atividade proposta, bem como contemplar todas

as alternativas tecnológicas confrontando-as com a hipótese de não execução do projeto,

conforme determinado pela Resolução Conama nº 001/86, em seu artigo 5º. O

Ministério Público ressalta ainda que a CEPEMAR Serviços de Consultoria de Meio

Ambiente LTDA, empresa responsável pela elaboração do EIA/RIMA de duplicação da

Veracel, pertence ao conglomerado SUZANO. Segundo o Ministério Público da Bahia55

(2011), a CEPEMAR não tinha representante técnico quando elaborou o EIA/RIMA e

apresentou uma equipe técnica com a maioria de seus membros em situação de

irregularidade perante o CREA-BA e, dessa forma, o INEMA nem poderia ter aceitado

o projeto, uma vez que estavam ausentes as Anotações de Responsabilidade Técnica –

ARTs necessárias:

[...] a maioria dos profissionais referidos como encarregados de elaborar o

EIA/RIMA estão irregulares no CREA-BA e [...] nenhuma ART foi

originada para o serviço de EIA/RIMA para ampliação da Veracel. Portanto,

é com a utilização de uma equipe de profissionais, na sua maioria

desqualificados, e em situação profissional irregular, que a VERACEL vem

tentando omitir dados importantes para análise dos impactos ambientais já

ocorridos com o seu empreendimento, e os que estão para ocorrer, caso a

pretendida ampliação ocorra na forma almejada pela VERACEL. [...] Daí a

conclusão óbvia é que se os prepostos do INEMA tivessem, de fato,

interessados em cumprir suas atribuições funcionais observariam que os

profissionais encarregados da elaboração do EIA/RIMA representam uma

equipe desqualificada, e que se encontra [...] em estado de irregularidade aqui

no CREA/BA, pois sequer providenciaram os seus vistos ou as ARTs

necessárias para aqueles estudos, como determina o art. 1º da Lei Federal de

nº 6.496/97 (MINISTÉRIO PÚBLICO DA BAHIA, 2011, p. 8).

55

Por meio do Promotor João Alves da Silva Neto.

156

Nesse contexto, percebe-se uma articulação integrada em todos os níveis

estatais para favorecimento dos interesses da indústria de celulose e seu projeto

produtor de madeira, desde as mudanças na legislação federal que favoreceram o

projeto neoliberal de abertura econômica e flexibilização das leis trabalhistas até o

investimento direto de recursos públicos via BNDES e renúncia de arrecadação através

das isenções e incentivos fiscais. No plano estadual, a conivência dos órgãos

responsáveis pelo licenciamento em facilitar o processo de aprovação dos projetos do

agronegócio do eucalipto e interesse pessoal do governador em suprimir todas as

barreiras necessárias ao pleno funcionamento da indústria de celulose na Bahia,

atendendo aos pedidos das empresas que contribuíram para a sua campanha em 2006 e

bradando o discurso da modernidade e da geração de empregos para uma região pobre

que necessita desses investimentos. No plano municipal, a conivência dos prefeitos,

também interessados em recursos para as suas campanhas e utilizando do poder do

cargo para impor mudanças no texto legal municipal com o claro objetivo de aprovar os

projetos de qualquer forma e a qualquer preço.

Por outro lado, é curioso notar que além do grande apoio do Estado ao projeto de

produção de eucalipto e de celulose, há também uma articulação entre concorrentes

(VERACEL e SUZANO) para realizar a expansão da eucaliptocultura na Bahia, uma

vez que a empresa responsável56

pela elaboração do EIA/RIMA pertence à Suzano

Celulose e Papel. As empresas disputam o mesmo mercado de celulose no plano

internacional, mas demonstram uma grande capacidade de articulação bilateral, uma vez

que dividem o território baiano a partir do paralelo 16,7º Sul, sendo ao norte desse

paralelo território da Veracel Celulose e ao sul território da Suzano, onde uma não

interfere no território da outra, figurando como as maiores proprietárias de terras na

Bahia. Além disso, as empresas utilizam o mesmo porto (Portocel, porto pertencente à

Fibria e à Cenibra) para escoar a produção e a Veracel não teve nenhum problema em

contratar uma empresa da concorrente para elaborar o EIA/RIMA da duplicação. A

concorrência está apenas no plano da venda da celulose, porque no plano da formação

dos territórios produtores de madeira, cada empresa tem o seu monopólio territorial

assegurado limitado pelo paralelo 16,7º Sul.

A Tabela 11 destaca o quantitativo de terras que a Veracel já

monopoliza/territorializa a produção e o quantitativo de terras a serem incorporadas no

56

CEPEMAR, Serviços de Consultoria de Meio Ambiente LTDA.

157

processo de expansão da empresa nas regiões Sudoeste (implantação), Litoral Sul e

Extremo Sul (Ampliação), processo que levará quatro anos para ser concluído e previsto

para ser iniciado a partir do momento em que o INEMA conceder a licença de

implantação do empreendimento.

Tabela 11 – Quantitativo de terras atuais e futuras da Veracel.

MUNICÍPIOS ÁREAS

FUTURAS (HA)

ÁREAS ATUAIS +

FUTURAS (HA)

Encruzilhada 5.000 5.000

Macarani 10.000 10.000

Maiquinique 4.000 4.000

Itapetinga 10.000 10.000

Itarantim 15.000 15.000

Potiraguá 5.000 5.000

TOTAL REGIÃO SUDOESTE 49.000 49.000

Santa Luzia 2.999 3.000

Mascote 10.097 14.000

Canavieiras 13.874 15.000

TOTAL REGIÃO LITORAL SUL 26.970 32.000

Itapebi 18.219 19.000

Belmonte 11.154 30.000

Itagimirim 4.448 16.000

Eunápolis 0 22.362

Santa Cruz Cabrália 0 25.224

Guaratinga 27.854 35.000

Itabela 11.167 17.000

Porto Seguro 20.766 35.000

TOTAL REGIÃO EXTREMO SUL 93.608 199.586

TOTAL GERAL 169.578 280.586

Fonte: Veracel, Relatório de Impacto Ambiental, 2011.

Um dos argumentos para a expansão da empresa na Bahia é a geração de

empregos, mas o que se verifica é a redução deles na região Extremo Sul, em que o

eucalipto já foi consolidado como a atividade principal:

Atualmente, as empresas Suzano, Fibria, Veracel e Plantar possuem juntas

mais ou menos 600.000 hectares. Ao comprar essas terras criaram 24.000

desempregos! Compreendendo a relação em que as empresas de eucalipto,

individualmente, geram, em média, a cada 100 ou 122 hectares apenas 1

emprego, poderíamos estimar que, atualmente, as empresas geram apenas

6.000 empregos, o que quer dizer um déficit de 18.000 empregos que foram

perdidos ao longo do tempo de plantio (CARRERE, 2011).

O estudo considerou a média de um emprego fixo a cada 25 hectares nas

atividades agropecuárias que existiam anteriormente para calcular o número dos

empregos que foram perdidos com a implantação do monocultivo do eucalipto (24.000).

Dados do Censo Agropecuário do IBGE (2006) apontam que para se criar um emprego

158

na atividade da monocultura do eucalipto são necessários 153,3 hectares de terra. A

agricultura patronal gera, em média, um emprego na lavoura temporária a cada 23,9

hectares e a agricultura camponesa (familiar para o IBGE), por sua vez, gera um

emprego na lavoura temporária a cada 2,5 hectares.

Dessa forma, considerando os dados apresentados na Tabela 11, os 49.000 ha

pretendidos pela Veracel na Região Sudeste para realizar a sua expansão gerariam

apenas 320 empregos fixos contra 2.050 empregos fixos na agricultura patronal (lavoura

temporária) e 19.600 empregos fixos na Agricultura Camponesa (lavoura temporária).

Sobre a geração de empregos por conta da ampliação da fábrica da Veracel, o

RIMA destaca o seguinte:

Após o início da operação, está prevista com a ampliação da Veracel a

geração de 2.880 empregos permanentes a mais na região. Sendo cerca de

250 empregos nas operações industriais, 2.600 empregos nas operações

florestais e cerca de 30 empregos em atividades administrativas. Atualmente,

a Veracel gera 3.205 empregos permanentes (Fonte: Veracel, dez/2010). Isso

significa que, com a ampliação da Veracel, haverá um aumento de quase 90%

no quadro atual de empregos. Durante a construção da fábrica, serão gerados

em torno de 8.000 empregos ao longo de 48 meses (Veracel, 2011, p. 4).

Na verdade, a empresa omite a informação sobre a composição dos empregos

gerados pela Veracel em 2010. Os dados da própria empresa, em seu Relatório de

Sustentabilidade 2010, destacam que foram empregados naquele ano 3.232

trabalhadores, sendo 715 empregados próprios e 2.517 terceirizados, ou seja, apenas

22% são empregos próprios, com vínculo direto com a Veracel. O RIMA também não

aborda a redução do número de empregados ao longo do tempo nas operações da

Veracel: Em 2005 eram 739 empregados próprios e 3.150 terceirizados. Em 2012, o

número de empregos próprios foi reduzido para 705 (-4,6%) e o de terceirizados para

2.640 (-16,2%), ao passo em que a receita líquida saiu de R$ 323,5 milhões em 2005

para mais de um bilhão de reais em 2012, perfazendo um crescimento de 213%.

O RIMA da duplicação da Veracel não aborda a questão da terceirização porque

essa modalidade de relação de trabalho é a forma preferencial que as empresas

capitalistas utilizam para aumentar ainda mais a lucratividade dos seus negócios, pois

através dela podem se isentar dos encargos trabalhistas e previdenciários. Quase 80% do

quadro da Veracel são formados por terceirizados e a insatisfação dos trabalhadores fica

patente quando se verifica a existência de mais de mil reclamações trabalhistas contra a

empresa na Justiça do Trabalho de Eunápolis.

159

O processo de licenciamento da expansão da Veracel está em pleno andamento e

o Governo Estadual já sinalizou que apóia o empreendimento, inclusive com alterações

na legislação ambiental para agilizar o processo, numa tentativa de facilitar/simplificar

ao máximo a liberação das licenças ambientais. Com a Lei 12.212/2011 não é mais

necessária a anuência do Conselho Estadual de Meio Ambiente – CEPRAM para

expedir as licenças ambientais, sendo suficiente apenas a assinatura do Secretário

Estadual de Meio Ambiente para dar legitimidade ao processo de licenciamento.

A iniciativa do estado da Bahia em dar maior celeridade ao processo de

licenciamento ambiental, suprimindo a participação do CEPRAM, que é um órgão

colegiado com participação de vários setores da sociedade, revela a postura classista do

Estado e o comprometimento pessoal do governador em fazer o que esteja ao seu

alcance para transformar em realidade o projeto de duplicação da Veracel, conforme

informações do Jornal Brasil de Fato, de 08 de dezembro de 2008, que destacou a visita

de Jaques Wagner à Estocolmo para tratar do processo de expansão da Veracel:

[...] Em novembro [2008], o governador Jaques Wagner (PT) foi para

Estolcolmo para acelerar o processo e acertar os detalhes da negociata. No

programa de rádio “Conversa como Governador” – programa semanal feito

pelo seu gabinete –, ele confirmou que a Stora Enso irá investir 2,5 bilhões de

dólares no novo projeto. “Eu me encontrei com o diretor presidente da

Veracel mundial e o diretor presidente do grupo Stora Enzo. Para minha

alegria, vi a absoluta disposição deles em confirmar o investimento de 2,5

bilhões de dólares para fazer a Veracel II e, portanto, duplicar sua produção”,

informou, e completou que o empreendimento garantirá “mais investimento,

mais obra, mais emprego e mais riqueza para o Estado” (JORNAL BRASIL

DE FATO, 2008, p. 1).

O jornal informa ainda que na campanha para governador do Estado da Bahia de

2006, Jaques Wagner recebeu doações das empresas de celulose instaladas na Bahia

para a sua campanha, sendo R$ 100 mil doados pela Aracruz, R$ 100 mil doados pela

Veracel e R$ 70 mil pela Suzano.

É importante destacar que seis meses antes da visita do governo à Suécia, o

principal executivo da Veracel, o Sr. Jouko Karvinen declarou no Jornal Valor

Econômico, de 29 de maio de 2008, que “o licenciamento em si não preocupa. A

ampliação dos negócios já foi comunicada ao governador da Bahia, Jaques Wagner”

(JORNAL AMBIENTE JÁ, 2008, p.1).

Considerando as informações apresentadas é possível concluir que existe uma

estreita ligação entre a empresa e o governo do Estado e um interesse comum em

prosseguir com o processo de duplicação da Veracel, mesmo após as denúncias de

irregularidades ambientais e trabalhistas. Em 26 de maio de 2008, portanto no mesmo

160

período em que prosseguiam as negociações para a duplicação da Veracel Celulose, a

Justiça Federal condenou, em primeira instância, a Veracel por desmatamento no bioma

da mata atlântica, determinando a restauração de todas as áreas compreendidas nas

resoluções CEPRAM 707/93, 1.115/95 e 1.235/96 e multa de vinte milhões de reais. A

decisão judicial federal foi fruto de uma ação civil pública movida pelo Ministério

Público da Bahia tombada sob o número 2006.33.10.005010-8 (MINISTÉRIO

PÚBLICO DA BAHIA, 2009). A anulação das licenças ambientais indica também

cumplicidade do CRA e do CEPRAM que autorizaram a implantação de territórios

produtores de eucalipto em áreas do bioma mata atlântica. Nesses termos, fica patente o

empenho de várias instâncias governamentais, com a inobservância dos critérios legais

existentes para o licenciamento e, inclusive, com alterações no conjunto de normas

legais para poder facilitar a realização do empreendimento capitalista de celulose na

Bahia. A visita do governador à Estocolmo para tratar das negociações para a

duplicação da Veracel ocorreu no mesmo ano em que a empresa foi condenada por

desmatamento ilegal, sem falar nas centenas de denúncias ambientais e trabalhistas

movidas pelo Ministério Público dando ciência dos efeitos danosos da eucaliptocultura

para a sustentabilidade econômica da agropecuária dos municípios envolvidos.

Os conflitos estabelecidos entre capital X trabalho, com rebatimentos na questão

ambiental, são levados às instâncias estatais para que tenham uma solução. O capital

não enxerga os últimos fragmentos naturais como a base que sustenta a biodiversidade

sobrevivente, mas os vê como uma barreira a ser removida, como um entrave natural

desnecessário que precisa ser destruído para dar lugar ao aumento da produção e dos

lucros, convenientemente apropriado por poucos. O Estado é visto pelo trabalho como o

juiz que vai deliberar sobre estes conflitos, mas o que se verifica é que as instituições

legais e políticas da sociedade tradicionalmente sustentam os pilares do sistema

capitalista e agem para manter o funcionamento permanente do sistema do capital.

Nesse sentido, enquanto o agronegócio da celulose expande a sua base florestal

na Bahia, incorporando milhares de hectares de terra, o outro lado dessa moeda é a

existência de milhares de camponeses divorciados da terra, ratificando a escrita

colonial, imperial e republicana da expansão da concentração fundiária no país, com

amplo apoio do Estado. A expansão da monocultura na Bahia tem rebatimentos

importantes na produção de cultivos necessários à segurança alimentar, na geração de

emprego e renda para os homens e as mulheres do campo e na configuração urbana e

161

rural, de forma que é necessário aprofundar a análise e verificar as alterações territoriais

decorrentes da penetração do capital produtor de madeira no campo baiano,

notadamente naqueles municípios em que essa expansão ocorreu de forma mais

contundente, uma vez que, dialeticamente, a territorialização das empresas capitalistas é

também a desterritorialização do trabalho.

162

4. A GEOGRAFIA DESIGUAL DA ACUMULAÇÃO CAPITALISTA DAS

EMPRESAS DE PRODUÇÃO DE EUCALIPTO E DE CELULOSE NA BAHIA

A lógica do desenvolvimento desigual deriva especificamente das tendências

opostas, inerentes ao capital, para a diferenciação, mas com a simultânea

igualização dos níveis e condições da produção. O capital é continuamente

investido no ambiente construído com o fito de se produzir mais-valia e

expansão da base do próprio capital. Mas, da mesma forma, o capital é

continuamente retirado do ambiente construído de forma que ele possa se

deslocar para outra parte e se beneficiar com taxas de lucro mais altas. [...]

Assim, é possível ver o desenvolvimento desigual do capitalismo como a

expressão geográfica da contradição mais fundamental entre o valor de uso e

valor de troca (SMITH, Desenvolvimento Desigual, p. 19).

A reestruturação mundial do capital verificada nas últimas décadas teve como

diretriz primordial a procura de áreas de menor tempo de giro e de maior lucratividade,

de forma que unidades inteiras de produção ou determinados setores produtivos foram

deslocados dos países centrais para as áreas periféricas do sistema. No caso específico

do setor de celulose, dois fatores concorreram para a territorialização das empresas de

produção de eucalipto e de celulose na Bahia: Em primeiro lugar, o avanço das políticas

neoliberais que facilitaram o processo de instalação de grandes empresas, tanto pela via

do financiamento público e mecanismos de isenção fiscal, quanto pela flexibilização das

leis trabalhistas e simplificação do licenciamento ambiental. Em segundo lugar, isso

ocorreu no momento em que os avanços tecnológicos ligados aos modernos sistemas de

transporte e comunicações permitem a circulação das mercadorias em uma velocidade

compatível com o tempo de produção das fábricas, que podem estar localizadas na

Europa, na Ásia e nos Estados Unidos e receber, do Brasil, por exemplo, a celulose de

que precisam para o processo de fabricação de papel.

Essas duas condições foram suficientes para que empresas nacionais e

transnacionais pudessem aproveitar as condições edafoclimáticas do litoral baiano que

sustentam a maior produtividade mundial do eucalipto, assim como os baixos custos da

terra e da força de trabalho. Assim, é importante refletir sobre as alterações territoriais

decorrentes da instalação dessas empresas na Bahia, notadamente nos municípios em

que elas atuaram de forma mais intensa, a fim de entender a interação dialética entre

capital X trabalho e os conflitos dessa relação antagônica que permeiam os processos de

territorialização do capital e desterritorialização do trabalho.

163

4.1 O território da Bahia Speciality Cellulose

Em 1992, o Grupo Klabin iniciou as atividades de produção de celulose na

Bahia, instalando a fábrica Klabin Bacell S.A. no município de Camaçari, com

capacidade para produzir 115 mil toneladas anuais de celulose solúvel. Em 2003, o

grupo Sateri Holdings Limited adquiriru a fábrica, juntamente com a Copener Florestal

Ltda., empresa responsável pelo gerenciamento dos territórios produtores de madeira no

Nordeste Baiano. A partir daí, o grupo Sateri mudou o nome da fábrica para Bahia Pulp

S.A.; em 2008, aumentou a capacidade industrial para 485 mil toneladas anuais e, em

2010, rebatizou a empresa para Bahia Specialty Cellulose.

Além de Camaçari, a empresa atua em 15 municípios do Nordeste Baiano

(Figura 66), com destaque para Entre Rios, Alagoinhas e Inhambupe, que detêm mais

de 60% dos territórios produtores de eucalipto.

Nesse contexto, é importante verificar a existência ou não de alterações na

estrutura produtiva desses três municípios em que a expansão do cultivo de eucalipto

ocorreu de forma mais intensa, bem como se o processo de urbanização foi diferenciado

em relação aos demais municípios do Nordeste Baiano. Considerando o ano de 1992

como a partida das operações de produção de celulose em Camaçari e o tempo médio de

sete anos para o eucalipto atingir o ponto de corte, temos que os dados do Censo

Agropecuário de 1985 mostram a realidade agropecuária anterior à expansão do

agronegócio do eucalipto na região, servindo como parâmetro para identificar as

possíveis mudanças ou reorientações de cultivos que ocorreram nos três municípios no

período 1985/2011.

164

Figura 66 – Território da Bahia Specialty Cellulose: Produção de eucalipto no período

2000/2011.

Fonte: Mapa produzido pelo autor a partir de dados do IBGE: Produção da Extração

Vegetal e da Silvicultura: madeira em tora para papel e celulose, 2000/2011.

A produção de madeira em tora para papel e celulose em Entre Rios e

Alagoinhas teve início no ano de 1990 e para o município de Inhambupe, ela ocorreu

três anos mais tarde, no ano de 1993. Conforme os dados da Produção da Silvicultura do

IBGE no período 1985/2011 apresentados na Figura 67, a introdução e expansão do

cultivo do eucalipto nos três municípios saiu de zero hectare em 1985 para quase 20 mil

165

hectares em 1995, sendo Entre Rios líder da produção de madeira, com 65% do total

produzido no conjunto dos três municípios, em 1995.

Figura 67 – Território da Bahia Speciality Cellulose: área de produção de madeira no

período 1985/2011.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados do IBGE: Produção da

Silvicultura, 1985, 1995 e 2011.

Obs.: Para o cálculo da área ocupada pelo eucalipto foi considerada a produtividade

para o ano de 1995: 33m3/ha/ano e para o ano de 2011: 44m

3/ha/ano (BRACELPA,

2013).

A partir de 1995, a empresa passou a reorientar os seus cultivos de eucalipto de

forma a alcançar uma distribuição mais uniforme nos três principais municípios

produtores em seu território, em que a redução da área colhida do eucalipto em

Alagoinhas foi compensada pelo aumento nos municípios de Entre Rios (agora com

39% do total) e Inhambupe (22%).

Nesse contexto, uma questão importante é descobrir de onde vieram os 20 mil

hectares de terra utilizados para a introdução e expansão do eucalipto no período

1985/1995. Quais as atividades no meio rural que foram prejudicadas com a produção

de madeira para celulose em alta escala?

Os dados dos Censos Agropecuários de 1985 e 1995 sobre a área colhida das

lavouras temporária e permanente apontam para uma redução de 900 hectares

envolvendo o conjunto dos municípios analisados (Figura 68), insuficientes para

atender, plenamente, a demanda dos 20 mil hectares de terra do eucalipto. Em

0

12,6

9,9

0

2,3

9,5

0

4,6

5,6

0

2

4

6

8

10

12

14

1985 1995 2011

Em m

il h

ect

are

s

Entre Rios

Alagoinhas

Inhambupe

166

Alagoinhas, por exemplo, a área colhida de madeira foi de 12,6 mil hectares em 1995 e

o recuo na área colhida das lavouras, no período 1985/1995, foi de apenas 1200

hectares, bem inferior ao necessário para fazer frente ao crescimento do eucalipto. Outro

ponto a se considerar é que as lavouras no Nordeste Baiano estão submetidas às

limitações hídricas e pluviométricas típicas do clima semi-árido, que frequentemente,

contribuem para a redução da área colhida e, até mesmo, resultam em perda total das

plantações.

Figura 68 – Território da Bahia Speciality Cellulose: área de produção de lavouras

(temporária e permanente) no período 1985/2011.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados do IBGE: Censos Agropecuários

de 1985 e 1995; Produção Agrícola Municipal, 2011.

Assim, os dados do IBGE para os três municípios não apontam grandes

alterações na área de lavouras no período 1985/2011, de forma que a redução verificada

no período 1985/1995 foi largamente compensada pelo aumento de 3,6 mil hectares no

período 1995/2011, com destaque para Inhambupe que apresentou aumento constante

no período 1985/2011. Considerando que Inhambupe e Alagoinhas também

incrementaram suas áreas de produção de eucalipto no período 1995/2011, é necessário

verificar o comportamento da tradicional atividade do meio rural no território: a

pecuária de bovinos.

Ao contrário das lavouras, em que as alterações verificadas nas áreas colhidas

estão dentro dos padrões típicos de variabilidade climática e produtiva para o Nordeste

Baiano, a análise dos dados do IBGE (Figura 69) para a pecuária extensiva aponta para

2,1 1,6

2,9

4,0

2,8

3,8

5,8

8,3

9,6

0

2

4

6

8

10

12

1985 1995 2011

Em m

il h

ect

are

s

Entre Rios

Alagoinhas

Inhambupe

167

uma resposta convincente à demanda de terras para a introdução e expansão do

eucalipto.

Figura 69 – Território da Bahia Speciality Cellulose: área de pecuária de bovinos no

período 1985/2011.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados do IBGE: Censos Agropecuários

de 1985 e 1995; Pesquisa Pecuária Municipal, 2011.

Obs.: Para o cálculo da área ocupada pela pecuária de bovinos foi considerada a área

média de pastagem por cabeça de bovino apresentada pelo IBGE, Censo Agropecuário

(1985: 1,4; 1995: 1,16; 2006: 1,1).

Para o conjunto dos municípios, a área de pecuária de bovinos diminuiu em 74,4

mil hectares no período 1985/1995, número que atende de sobra às necessidades da

eucaliptocultura da BSC no mesmo período, de forma que os dados do IBGE atestam

reduções muito significativas, que não podem ser explicadas pela variabilidade

climática e produtiva, corroborando a ideia da redefinição dos usos do território a partir

dos interesses da BSC, com rebatimentos na redução da pecuária extensiva de bovinos.

Na análise individual dos municípios, o padrão se repete, com a introdução da

eucaliptocultura bem articulada ao movimento de declínio da área de pastagens, com

destaque para o município de Entre Rios, em que o aparecimento da área de eucalipto de

12,6 mil hectares em 1995 ocorreu, concomitantemente, com a retração da pecuária de

bovinos em 16,7 mil hectares no período 1985/1995.

Existe um argumento muito utilizado pelos grupos opositores à expansão do

eucalipto na região, que trata da relação entre avanço da produção de madeira e

esvaziamento da população do campo, em função da voracidade com que o capital

44,4

27,7 28,9

35,7

9,1

17,9

52,9

21,8

33,1

0

10

20

30

40

50

60

1985 1995 2011

Em m

il h

ect

are

s

Entre Rios

Alagoinhas

Inhambupe

168

produtor de madeira e de celulose se apropria das terras agricultáveis. Assim, outra

indagação que emerge é: qual a contribuição da expansão do agronegócio do eucalipto

no processo de urbanização dos municípios polarizados pela BSC?

Esta pergunta tem rebatimentos importantes em outro aspecto da população que

reside no campo: a empregabilidade. De acordo com o IBGE, no âmbito da variável

pessoal ocupado na Agricultura Familiar, a produção de madeira é a atividade que

menos gera empregos no campo, conforme já demonstrado na Figura 46. Por aqueles

dados, conclui-se que o Campesinato (que o IBGE denomina Agricultura Familiar) é

imbatível em todas as atividades realizadas no meio rural, no que diz respeito à geração

de empregos, mesmo não gerando a mesma renda que o Agronegócio (Agricultura

Patronal para o IBGE), nem captando os mesmos recursos do crédito rural

proporcionado pelo Estado. Nesse contexto, considerando que no território da BSC a

eucaliptocultura avançou em áreas de pastagens, o aspecto prático empregatício disso é

o aumento do número de hectares para gerar um único emprego, ou seja, houve

desemprego no campo.

A tradicional atividade rural no território da BSC é a pecuária extensiva de

bovinos que precisa de 94 hectares para gerar um emprego no campo. Com a troca,

agora cada emprego só é possível com a utilização de 153 hectares, em função da alta

mecanização e especialização do trabalho na eucaliptocultura. Exemplificando, uma

fazenda de 500 hectares teria a capacidade de gerar, em média, cinco empregos no

sistema pastagem patronal. Com a eucaliptocultura, esse número cai para três. E, caso

essas mesmas 500 hectares fossem utilizadas na agricultura camponesa, a fazenda seria

suficiente para gerar 200 empregos. Esses números demonstram que a substituição

pastagem/eucaliptocultura conseguiu intensificar ainda mais a situação de baixo

aproveitamento da força de trabalho disponível no campo e que a produção de madeira

não é atividade econômica adequada para uma região com grande disponibilidade de

pessoas para trabalho no campo.

Assim, os dados mostram que o avanço da produção de madeira no território da

BSC é compatível com a redução das áreas de pastagens, que tradicionalmente,

representam a atividade exclusiva dos latifúndios na região. Dessa forma, é mais fácil

para a empresa de celulose instalar o seu território produtor de madeira a partir da

aquisição de grandes áreas já caracterizadas por empregarem pouca força de trabalho do

169

que incorporarem áreas de lavouras pulverizadas nas mãos de muitos proprietários

rurais, com extensões menores de terra e maior utilização de força de trabalho.

Nesse sentido, por reorganizar o território anteriormente dominado pelos

latifundiários pecuaristas, caracterizado, do ponto de vista da empregabilidade, pela

baixa utilização de força de trabalho, a BSC não pode ser apontada como a única e

principal agente responsável pelo processo de urbanização verificado pelos municípios,

segundo informações oficiais do Censo Demográfico do IBGE (Figura 70):

Figura 70 – Território da Bahia Speciality Cellulose: taxa de crescimento da

Urbanização no período 1980/2010.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados do IBGE, Censos Demográficos,

1980/2010.

Isso porque esses dados mostram que não há relação direta entre urbanização e

crescimento da eucaliptocultura no território da BSC. O município de Entre Rios, com

mais de um terço da área total cultivada, não foi o que apresentou o maior crescimento

urbano, assim como os municípios de Alagoinhas e Inhambupe. O próprio município de

Alagoinhas, segundo colocado no ranking de produção de madeira da BSC, ficou

abaixo das médias de crescimento da Bahia e do território da empresa. O município de

Inhambupe, por sua vez, apesar de ter obtido o maior crescimento da taxa de

urbanização entre os três maiores produtores de madeira da BSC, ainda é um município

predominantemente rural, com apenas 43,1% de população urbana e vem registrando,

concomitantemente, crescimento conjunto das populações urbana e rural.

152

104 97

74 68

51 46 38 36 34

23 19 15 12 11 6 2 0

20

40

60

80

100

120

140

160

%

170

Logicamente, o cultivo de eucalipto para produção de madeira em tora para

papel e celulose contribui para a diminuição de empregos no campo, mas é incorreto, no

caso do território da BSC, afirmar que esse cultivo gerou sozinho o êxodo rural

responsável pelo aumento nas taxas de urbanização.

Considerando o período 1995/2011 verifica-se que houve retomada das

atividades agrícolas e pecuárias nos três principais municípios produtores da BSC,

mesmo com o avanço da eucaliptocultura que se consolidou como a segunda atividade

econômica nos campos de Entre Rios e Alagoinhas e como a terceira maior no campo

de Inhambupe. Essa retomada, principalmente dos cultivos temporários e permanentes,

explica o crescimento da população rural nos municípios analisados, conforme os

censos de 2000 e 2010.

Em franca expansão pelo território e consumindo recursos naturais

anteriormente alocados para a pecuária de bovinos, a produção de madeira em tora para

papel e celulose não contribuiu significativamente para a urbanização regional. Todos

os dados apontam para isso. A opção pela eucaliptocultura não beneficiou as populações

camponesas e não representou a melhor alternativa para o campo, do ponto de vista das

pessoas que precisam da terra para manter as suas tradições e sustentar suas famílias.

Apenas piorou uma situação que já era muito ruim em um campo já dominado pela

grande propriedade rural.

Nesse sentido, é importante verificar se os dados oficiais traduzem esse

movimento na estrutura fundiária. Isso porque a produção de celulose é uma atividade

industrial de base florestal e necessita de grandes áreas para produzir milhões de m3 de

madeira em tora para o pleno atendimento da demanda da fábrica. A questão é: os dados

oficiais dos censos agropecuários disponíveis (1985 e 2006) registraram aumento na

concentração de terras nos municípios analisados?

O próximo censo agropecuário será realizado em 2016, de modo que o

movimento de expansão do agronegócio do eucalipto até 2011 está sem registro há pelo

menos meia década. Mas, os dados disponíveis apontam que a atividade de produção de

madeira tem uma relação direta com a concentração de terras, conforme as informações

apresentadas na Figura 71:

171

Figura 71 – Território da Bahia Speciality Cellulose: Coeficiente de Gini no período

1985/2006.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados do IBGE, Censos Agroecuários,

1985/2006.

A formação dos territórios produtores de madeira nos três municípios saiu de

zero hectare em 1985, passando por 19,5 mil hectares em 1995 e chegando em 25 mil

hectares em 2011. Esse crescimento interferiu na estrutura fundiária, aumentando ainda

mais a concentração das terras, com o coeficiente de Gini57

aumentando em todos eles.

De acordo com a metodologia Gini, nos municípios de Entre Rios e Inhambupe, a

estrutura fundiária saiu de uma classificação de “forte a muito forte” em 1985 para

“muito forte a absoluta” em 2006. Para o município de Alagoinhas, a classificação se

manteve na faixa de “forte a muito forte”, com aumento no índice.

Responsável pelo maior território produtor de madeira, o município de Entre

Rios é também o que apresenta a maior concentração, conforme informações

apresentadas na Figura 72:

57

O controle do território pelo capital é efetivado sob modalidades distintas que servem ao propósito da

reprodução ampliada e, como a monocultura do eucalipto é uma atividade que concentra terra, uma

análise importante para avaliar as transformações provocadas pela expansão do plantio de eucaliptos na

Bahia é verificar a evolução da estrutura fundiária a partir de dados anteriores a entrada dessa atividade.

Em virtude de a entrada ter ocorrido nos anos iniciais da década de 1990 são utilizados dados dos Censos

Agropecuários do IBGE no período 1985/2006. O Coeficiente de Gini é um indicador que varia de 0 a 1,

indicando máxima desconcentração e concentração absoluta, respectivamente.

0,878

0,849

0,887

0,924

0,855

0,914

0,8

0,82

0,84

0,86

0,88

0,9

0,92

0,94

Entre Rios Alagoinhas Inhambupe

Co

efi

cie

nte

de

Gin

i

1985

2006

172

Figura 72 – Entre Rios: Estrutura Fundiária – 1985/2006.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados do IBGE, Censos Agropecuários

de 1985 e 2006.

Em 1985, o município já apresentava uma estrutura fundiária bastante

concentrada, onde apenas 2 % dos estabelecimentos agropecuários dominavam quase

60% da área total. Em 2006, as grandes propriedades (mais de 500 hectares) subiram a

participação no conjunto da área para 72,4 % e as pequenas propriedades diminuíram

em número e em área, atestando o recrudescimento da concentração da terra no

município. Os dados mostram que as grandes propriedades, embora tenham mantido

praticamente o mesmo número de estabelecimentos avançaram nas áreas das pequenas e

médias propriedades, que diminuíram de tamanho em todos os estratos de área.

Assim, diante dos dados apresentados, verifica-se que a implantação e a

expansão da eucaliptocultura do eucalipto no Nordeste Baiano capitaneada pela empresa

Bahia Speciality Cellulose se deu, primordialmente, através da incorporação de áreas

anteriormente ocupadas pela pecuária de bovinos, de forma que os territórios produtores

de eucalipto passaram a representar a segunda maior atividade econômica em domínio

de terras para Entre Rios e Alagoinhas e a terceira maior para Inhambupe, contribuindo

sobremaneira para o aumento da concentração fundiária nos três municípios, inclusive

com mudança de classificação na metodologia Gini para os municípios de Entre Rios e

Inhambupe, que saíram da faixa de “forte a muito forte” para a faixa de “muito forte a

absoluta”.

Com relação às mudanças verificadas no processo de urbanização ocorrido,

principalmente, no período entre censos de 1980/1991, em que todos os municípios

tiveram uma redução da população rural, variando de -11,9% a -22,7%, não há dados

173

suficientes para afirmar que esse processo teve a eucaliptocultura como o agente

principal, uma vez que a expansão do eucalipto incorreu sobre áreas tradicionais de

pecuária de bovinos em que a utilização de força de trabalho já se apresentava de forma

reduzida. Por outro lado, a compra de terras para produzir madeira em tora para papel e

celulose só é viável em grandes propriedades, o que desfavorece a aquisição de

pequenas propriedades rurais.

4.2 O território da Suzano Papel e Celulose

O início das operações de fabricação de celulose no extremo sul da Bahia

aconteceu no ano 1991, quando a Suzano, a CVRD, o Bndespar e o IFC se uniram para

formar a então denominada Bahia Sul Celulose S/A, construindo uma fábrica no

município de Mucuri com capacidade para produzir 420 mil toneladas/ano de celulose

de fibra curta branqueada de eucalipto (JUVENAL; MATOS, 2002). No ano de

2007, com a nova denominação de Unidade Mucuri e com o controle acionário total da

Suzano, entra em operação a segunda linha de produção de celulose, elevando a

produção total para um milhão de toneladas anuais. No período 1991/2006, a Unidade

Mucuri consolidou a sua área de influência sobre 13 municípios no extremo sul baiano,

com destaque para os municípios de Mucuri, Caravelas e Nova Viçosa, que possuem

mais de 74% dos territórios produtores de madeira, conforme pode ser visualizado na

Figura 73:

174

Figura 73 – Território da Suzano Papel e Celulose – Unidade Mucuri: Produção de

eucalipto 2000/2011.

Fonte: Mapa produzido pelo autor a partir de dados do IBGE: Produção da Extração

Vegetal e da Silvicultura: madeira em tora para papel e celulose, 2011.

Percebe-se que a quantidade dos territórios produtores de madeira é

inversamente proporcional à distância da fábrica em Mucuri, sendo também mais

presentes nos municípios litorâneos que possuem características de pluviosidade

elevada e solos de boa qualidade. Enquanto os municípios litorâneos e mais próximos

da fábrica atenderem à demanda de madeira, a empresa não aumentará o seu efetivo de

árvores nos municípios interiores, uma vez que trazer madeira de locais mais distantes

aumentam os custos com transporte, força de trabalho e diminui o tempo de giro do

capital. Mas, caso a demanda por madeira se torne maior do que a capacidade de

atendimento dos municípios mais próximos, a empresa certamente fará o seu ajuste

espacial em territórios localizados na periferia de seu sistema de polarização.

175

Segundo um estudo do IMA (2008) intitulado “Silvicultura de eucalipto no Sul e

Extremo Sul da Bahia”, em vários municípios polarizados pela Suzano Papel e Celulose

as áreas plantadas de eucalipto já superam os limites estabelecidos pelo CEPRAM para

o licenciamento, quais seja 15% da área total dos municípios litorâneos e 20% para os

municípios do interior. Em Nova Viçosa os territórios produtores de madeira já

dominam 44% da área total; Em Alcobaça, 34,3%; Em Caravelas, 34%; e em Mucuri,

33,5%. Além disso, o IMA detectou a existência de 37.037 hectares de eucaliptos, no

Sul e Extremo Sul da Bahia, que não estão licenciados, sobre os quais o instituto não

tem conhecimento ou qualquer tipo de controle.

Considerando o período 2000/2011, a produção de madeira em tora para papel e

celulose em Mucuri, Caravelas e Nova Viçosa representaram 74,4% de toda a produção

do território da Unidade Mucuri, de forma que é importante avaliar as mudanças

ocorridas em relação à produção agropecuária desses três municípios no período de

implantação do agronegócio do eucalipto na região.

A produção de madeira em tora para papel e celulose em Caravelas teve início

no ano de 1991 e para os municípios de Mucuri e Nova Viçosa ela ocorreu no ano

seguinte. Assim, ela sai de zero hectare em 1985 para 121 mil hectares em 2006,

alcançando 172 mil hectares em 2011 (Figura 74), representando a maior área de

produção de eucalipto do estado da Bahia, com o município de Mucuri se destacando

como líder na série histórica 2000/2011 (31% do total do território Mucuri) e o

município de Caravelas como o maior produtor em 2011 (49% do total produzido no

conjunto dos três municípios).

176

Figura 74 – Território da Suzano Papel e Celulose – Unidade Mucuri: área de produção

de madeira no período 1985/2011.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados do IBGE: Produção da

Silvicultura, 1985, 2006 e 2011.

Obs.: Para o cálculo da área ocupada pelo eucalipto foi considerada a produtividade

para o ano de 2006: 39m3/ha/ano e para o ano de 2011: 44m

3/ha/ano (BRACELPA,

2013); Em 2006, Mucuri não apresentou produção, de forma que os dados plotados são

de 2005.

Assim, tomando-se como referência a série histórica 2000/2011, os três

municípios se consolidaram como os principais produtores do território Mucuri, com o

município de Mucuri alcançando a liderança da produção em seis anos, Nova Viçosa em

três anos e Caravelas nos anos de 2010 e 201158

.

Com o objetivo de verificar a hipótese de o eucalipto ter avançado em áreas de

lavouras, foi realizada uma busca de dados na base do IBGE, considerando os Censos

Agropecuários de 1985 e 2006, que cobrem o período da implantação e expansão da

eucaliptocultura no território Mucuri. O resultado dessa pesquisa aparece na Figura 75:

58

O outro município foi Alcobaça, que liderou a produção em 2001.

0

46,3 46,6

0

50,6

84,5

0

24,0

40,6

0

10

20

30

40

50

60

70

80

90

1985 2006 2011

Em m

il h

ect

are

s

Mucuri

Caravelas

Nova Viçosa

177

Figura 75 – Território da Suzano Papel e Celulose – Unidade Mucuri: área de produção

de lavouras (temporária e permanente) no período 1985/2011.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados do IBGE: Censos Agropecuários

de 1985 e 2006; Produção Agrícola Municipal, 2011.

No conjunto, os municípios apresentaram um pequeno aumento da área de

lavouras, que atingiu pouco mais de três mil hectares no período 1985/2011, refutando a

hipótese de incorporação da área de lavouras pelo latifúndio eucaliptocultor, como

movimento principal de reordenação do território. Uma análise mais específica do

gráfico mostra que o município de Caravelas foi o único a apresentar uma redução

significativa na área de lavouras, caindo – 6,5% no período 1985/1995 e – 10,8% no

período 1995/2011, totalizando, aproximadamente, uma retração de dois mil hectares.

Assim, os 121 mil hectares de eucalipto registrados em 2006 não vieram,

predominantemente, de áreas originárias de lavouras.

O passo indagatório seguinte é: as terras originárias da expansão são

provenientes das pastagens de bovinos, a atividade tradicional do Extremo Sul Baiano?

Nesse sentido, os dados oficiais indicam que apenas a contração da área de

bovinos não explica a totalidade da expansão do território produtor de eucalipto (Figura

76). No período 1985/2006, a produção de madeira saiu de zero hectare para 121 mil

hectares e no período 2006/2011 houve novo salto de crescimento, atingindo 172 mil

hectares em 2011. Já no tocante à pecuária de bovinos, os dados do IBGE caracterizam

duas situações diferentes: para o primeiro período houve recuo de 120 mil hectares e

para o segundo ocorreu um crescimento de 10 mil hectares. Assim, não há

9,3

12,5

13,7

10,5 9,7

8,7

3,0 3,6 3,8

0

2

4

6

8

10

12

14

16

1985 2006 2011

Em m

il h

ect

are

s

Mucuri

Caravelas

Nova Viçosa

178

correspondência nos períodos, notadamente no segundo, quando o déficit alcança mais

de 50 mil hectares.

Figura 76 – Território da Suzano Papel e Celulose – Unidade Mucuri: área de pecuária

de bovinos no período 1985/2011.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados do IBGE: Censos Agropecuários

de 1985 e 1995; Pesquisa Pecuária Municipal, 2011.

Obs.: Para o cálculo da área ocupada pela pecuária de bovinos foi considerada a área

média de pastagem por cabeça de bovino apresentada pelo IBGE, Censo Agropecuário

(1985: 1,4; 1995: 1,16; 2006: 1,1).

Considerando ainda que a área de lavouras cresceu três mil hectares no período

1985/2011, a incorporação das pastagens e sua transformação para a nova

funcionalidade madeireira não foi suficiente para o pleno atendimento da área de

produção registrada pelo IBGE, levantando a hipótese da reorientação funcional de

terras não utilizadas anteriormente para a criação de bovinos e/ou agricultura, tais como

os remanescentes da mata atlântica.

O território Suzano Unidade Mucuri é a maior área produtora de madeira da

Bahia, com 62% do total, seguido do território Veracel (23%) e BSC, considerando a

série histórica 2000/2011. Isso significa que a demanda por terras, além de provocar a

contração áreas das pastagens e matas, também teve rebatimentos significativos nos

índices de urbanização do território Mucuri, conforme dados dos Censos Demográficos

expressos na Figura 77:

91,8

54,3 50,9

119,5

50,5

61,4

45,4

31,7 34,5

0

20

40

60

80

100

120

140

1985 2006 2011

Em m

il h

ect

are

s

Mucuri

Caravelas

Nova Viçosa

179

Figura 77 – Território da Suzano Papel e Celulose – Unidade Mucuri: taxa de

crescimento da Urbanização no período 1980/2010.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados do IBGE, Censos Demográficos,

1980/2010.

Mucuri, Caravelas, Nova Viçosa e Alcobaça são os principais produtores de

madeira do Território Mucuri, representando 91% do total e, não por coincidência, são

também os que observaram as maiores variações positivas nas taxas de crescimento da

taxa de urbanização, juntamente com o município de Jucuruçu. Essas taxas foram

superiores às registradas na média do território Mucuri e bem acima de média baiana,

indicando que fatores regionais são responsáveis pelas alterações. Sendo assim, na

análise da história econômica das últimas três décadas, a única atividade com potência

suficiente para alterar de forma significativa o território foi a implantação/expansão da

eucaliptocultura. Só a redução da pecuária de bovinos de 178,9 mil hectares no período

1985/2011 eliminou 1900 postos de trabalho no campo dos três principais municípios

produtores, considerando a média de 94,2 ha/emprego do IBGE.

Em Caravelas e Nova Viçosa a produção de madeira já representa a principal

atividade econômica do campo, superando a tradicional pecuária de bovinos. Em

Mucuri, o território produtor de eucalipto está bem próximo do total de pastagens e,

considerando a manutenção, por sete anos, dessa tendência de queda da pecuária e

362

309

206

175 165 142

115 88 85 79

63 47 46

34 8

0

50

100

150

200

250

300

350

400

%

180

aumento da área de eucalipto, a eucaliptocultura também passará a ser a maior atividade

em extensão de terras.

No período 1985/2011, enquanto a eucaliptocultura nos três municípios passou

para 178,9 mil hectares, as lavouras temporária e permanente cresceram apenas 3,4 mil

hectares. Dessa forma, enquanto as alterações na estrutura produtiva do agronegócio, os

números se localizam na casa das centenas de milhar, para as lavouras que mais

empregam força de trabalho o aumento fica na ordem das unidades de milhar, revelando

que o avanço do capital no campo contribui para o aumento da concentração fundiária,

conforme dados apresentados na Figura 78:

Figura 78 – Território da Suzano Papel e Celulose – Unidade Mucuri: Coeficiente de

Gini no período 1985/2006.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados do IBGE, Censos Agroecuários,

1985/2006.

A alteração na estrutura produtiva segue a taxa de utilização decrescente do

capital, concentrando a terra e reduzindo as oportunidades de emprego no meio rural.

Os dados mostram que a eucaliptocultura intensificou a característica da concentração

fundiária no território, empurrando o coeficiente de Gini para o limite da faixa “forte a

muito forte”, que varia de 0,701 a 0,900, prenunciando uma mudança de faixa no

próximo Censo Agropecuário previsto para 2016.

Em Caravelas (Figura 79), a intensificação da concentração da terra atingiu o

nível mais alto no período 1985/2006, com 9,7 % de crescimento no coeficiente de Gini.

Essa informação tem relação direta com o encolhimento das áreas de lavouras

0,777

0,765

0,817

0,849

0,839 0,834

0,72

0,74

0,76

0,78

0,8

0,82

0,84

0,86

Mucuri Caravelas Nova Viçosa

Co

efi

cie

nte

de

Gin

i

1985

2006

181

permanente e temporária, uma vez que Caravelas foi o único município entre os três

maiores produtores a registrar declínio constante das lavouras no período 1985/2006.

Figura 79 – Caravelas: Estrutura Fundiária – 1985/2006.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados do IBGE, Censos Agropecuários

de 1985 e 2006.

As mudanças na estrutura fundiária do município de Caravelas foram no sentido

de concentrar ainda mais a posse da terra, uma vez que houve, de um lado, a

pulverização da propriedade na formação de minifúndios, que correspondem a mais da

metade do número total de estabelecimentos agropecuários e, de outro lado, o aumento

do tamanho médio da grande propriedade que reduziu o número de estabelecimentos e

aumentou a participação no conjunto da área total, fatores fundamentais para a elevação

do coeficiente de Gini de 0,765 em 1985 para 0,839 em 2006. Esses dados confirmam o

potencial concentrador de terra das atividades que mais se desenvolveram em Caravelas

no período, reduzindo ainda mais a oferta de empregos e a disponibilidade de terras para

a agricultura camponesa, com rebatimentos no processo de urbanização do município,

que foi intensificado no período analisado.

Os dados mostram que o avanço do agronegócio do eucalipto no extremo sul da

Bahia motivada pela instalação da fábrica da Suzano Papel e Celulose afetou bastante a

estrutura produtiva dos municípios de Mucuri, Caravelas e Nova Viçosa, com

rebatimentos importantes na redução da área de pecuária de bovinos e incorporação de

áreas novas.

Nesse contexto, o processo de expansão do agronegócio do eucalipto no extremo

sul foi muito mais intenso e nocivo do que o verificado no Nordeste Baiano, no qual

182

atingiu principalmente a pecuária de bovinos e ocupou menor quantidade de terras

produtivas. A projeção das tendências aponta para o processo de avolumamento e

expansão ainda maior dos territórios produtores de eucalipto, tanto pela territorialização

quanto pela monopolização do território através dos programas de fomento,

configurando uma situação de favorecimento à urbanização, à concentração de terra e

de desterritorialização da agricultura camponesa.

4.3 O território da Veracel

O início das operações da Veracel no Sul da Bahia foi em 1991 através da

empresa Veracruz Florestal LTDA, responsável pela implantação e desenvolvimento da

base florestal, sob o controle das empresas Odebrecht. A incessante compra de terras

para formar a base florestal elevou o preço do alqueire na região, inviabilizando a posse

da terra pelos pequenos produtores rurais e reservando a maior parte do território para a

eucaliptocultura, sem que o Estado estabelecesse limites para a expansão:

[...] Sem nenhuma transparência no processo de compra, venda e troca de

terras, os pequenos e médios proprietários, sem qualquer proteção ou apoio

do Estado, aos poucos, foram entregando, a preços de ocasião, as melhores

terras da região. O Estado e os governos municipais foram novamente

negligentes ao não estabelecer restrições aos plantios e a aquisição de terras.

[...] A empresa continua se vangloriando da rapidez de seus plantios, repete

insistentemente seu recorde de 15 mil hectares em 1998. Seu orgulho é

proporcional à decadência da agropecuária regional (JORNAL A GAZETA,

07 fev. 2000).

Em 2001, com a proibição do plantio de eucaliptos no Estado do Espírito Santo,

houve nova corrida pela compra de terras no extremo sul, com reflexos no aumento dos

preços do alqueire na região:

Com a proibição do Governo do Estado do Espírito Santo, de se plantar

eucalipto naquele Estado, [...] as empresas plantadoras como a Aracruz e

Bahia Sul Celulose, que se encontram na divisa entre os Estados da Bahia e

do Espírito Santo, optaram pela compra de terras na região do extremo sul da

Bahia. [...] Os proprietários de terra [de Teixeira de Freitas] elevaram o preço

do alqueire para até 60 mil reais. [...] Fugindo dos altos preços da terra em

Teixeira de Freitas, essas empresas estão optando em comprar terras na

região de Eunápolis, onde ainda se adquire terras boas e baratas. [...] A

notícia se espalhou e com isso o preço da terra nessa região tende a se

valorizar, podendo alcançar o dobro do valor que está sendo negociado

(JORNAL A GAZETA, 20 nov. 2001).

183

No processo de formação dos territórios produtores de eucalipto, a então

empresa Veracruz Florestal avançou em área protegidas de mata atlântica59

e o projeto

foi embargado pelo Ministério do Meio Ambiente, a partir de denúncias das ONGs

Greenpeace e SOS Mata Atlântica:

O embargo é conseqüência de denúncia feita pelas organizações Greenpeace

e SOS Mata Atlântica, que apresentaram um vídeo com imagens aéreas da

destruição por milhares de hectares. O vídeo mostrou ainda dezenas de

árvores sendo derrubadas péla prática do correntão (JORNAL DO BRASIL,

12 mai. 1993)

No parecer técnico do CRA, os plantios de eucalipto só poderiam ocorrer em

áreas já degradadas pela ação antrópica, como áreas queimadas ou de pastagens, sendo

vedada a utilização e o desmatamento em áreas de mata atlântica, cerrado, restinga ou

áreas de tensão ecológica entre elas. No entanto, segundo o Greenpeace/Fase/Ibase

(1993), foram muitas denúncias de fontes variadas dando conta de que a empresa estava

destruindo a mata atlântica:

A partir de denúncias de moradores e grupos locais, de que estariam

acontecendo práticas de desmatamento em grande escala nas áreas da

Veracruz, e que, portanto, a empresa não estaria respeitando os

compromissos assumidos com o Governo da Bahia no processo de

licenciamento, foi possível realizar uma documentação direta da área,

inclusive mostrando placas de identificação da própria empresa. [...] As

filmagens revelam [...] que remanescentes de mata nativa dentro das

propriedades estão sendo destruídos através de queimadas e tratores com

correntões, sem autorização do IBAMA, órgão federal que é responsável pelo

resguardo da Mata Atlântica. As plantações de eucalipto estão sendo feitas

não apenas nas áreas já degradadas, mas também em áreas que estão sendo

desmatadas com essa finalidade! O vídeo mostra o correntão em

funcionamento, e o depoimento de trabalhadores que estão atuando nas

derrubadas. O vídeo mostra áreas recém queimadas, e também áreas

queimando! (GREENPEACE, 1993, p. 7-8).

Para os ambientalistas, o correntão (Figura 80) é uma das técnicas mais

predatórias de desmatamento e corte raso, consistindo na utilização de dois tratores de

esteira que ficam lado a lado, a 50 metros de distância, arrastando uma grande e pesada

corrente, em que cada elo pesa aproximadamente 50 quilos. Conforme os tratores

avançam sobre a floresta, as árvores vão tombando em sequência, arrancadas da terra

pela raiz. As ONGs Greenpeace e SOS Mata Atlântica flagraram, em fevereiro de 1993,

59

[...] O consultor da Veracel, João Borges, disse, enquanto acompanhava o tour dos finlandeses [visita

de jornalistas ao Brasil para conhecer a Veracel Celulose e ouvir ambientalistas, sindicalistas, pequenos

produtores agrícolas e integrantes do MST], que a empresa tem consciência dos erros do passado, que

foram frutos de um contexto histórico no qual o desmatamento não era visto como erro e sim como algo

que era ensinado nas próprias universidades. ‘A sociedade evoluiu na direção da proteção das florestas

nativas, mas é preciso lembrar que os engenheiros florestais, há cerca de 30 anos, tinham, em sua

formação, aulas de técnicas de desmatamento’ (JORNAL A TARDE, 18 abr. 2004).

184

a empresa Plantar, uma das terceirizadas contratadas pela Veracruz Florestal, realizando

um desmatamento ilegal utilizando o correntão. A partir daí, as ONGs acionaram a

Procuradoria Geral da República, que por sua vez, encaminhou Ação Civil Pública

contra a Veracruz, o CRA e o IBAMA. Após 15 anos de tramitação, em 17 de junho de

2008, a então empresa Veracel Celulose foi declarada culpada pelo desmatamento

ilegal, sendo obrigada a pagar uma multa de R$ 20 milhões e tendo anuladas as licenças

ambientais concedidas irregularmente, significando que a empresa deverá arrancar todos

os eucaliptos e reflorestar a área com espécies da Mata Atlântica.

Figura 80 – Empresa Plantar utilizando o correntão em um desmatamento ilegal nas

terras da Veracruz Florestal em 1993.

Fonte: CEPEDES, 2008.

Também como fruto das pressões dos ambientalistas e objetivando a certificação

de suas atividades de produção de celulose, a empresa resolveu transformar a Fazenda

Americana, com 6.100 hectares de mata atlântica preservados, em uma Reserva

Particular do Patrimônio Natural – RPPN:

A Estação Veracruz, Reserva Particular do Patrimônio Natural, mantida pela

Veracel Celulose é parte das propriedades compradas das Florestas Rio Doce,

a Fazenda Americana e esteve na mira do correntão. Só foi poupada graças às

185

denúncias dos ambientalistas. Hoje, é o cartão postal da empresa Veracel,

exibida para mostrar para o público seu compromisso com a preservação

ambiental! (CEPEDES, 2008, p. 22).

Por outro lado, as denúncias que culminaram com o embargo do Ministério do

Meio Ambiente sobre as ações da Veracruz também motivaram a empresa a se

posicionar no sentido de ameaçar a suspensão do projeto, utilizando o discurso do

desenvolvimento e da geração de emprego e renda para conseguir o apoio da

comunidade regional:

A Veracruz Florestal, do grupo Odebrecht, ameaçou ontem suspender o

projeto de implantação da unidade de produção de celulose em Porto Seguro,

na Bahia, e acusou o organismo ecológico internacional Greenpeace e SOS

Mata Atlântica de exercerem pressão sobre o ministro do Meio Ambiente,

Fernando Coutinho Jorge, para impedir a execução do projeto, com

investimentos previstos de US$ 190 milhões. A nova unidade do grupo, que

tem parecer favorável sobre impacto ambiental elaborado por técnicos da

Universidade Federal de Viçosa, geraria mais de mil empregos diretos e

indiretos na região, com reflorestamento de 12,6 mil hectares de áreas

devastadas na Mata Atlântica, e criaria uma área de proteção ambiental de

12,4 mil hectares (JORNAL O ESTADO DE MINAS, 12 jun. 1993).

Assim, reforçando o discurso desenvolvimentista, prometendo milhares de

empregos e garantindo a preservação ambiental com o aval científico de uma

universidade federal, a empresa Veracruz Florestal consegue uma reação regional

envolvendo os políticos locais, regionais, estaduais e nacionais, bem como vários

setores sociais, arregimentando 15 mil pessoas num protesto no dia 16 de junho de

1993, por ocasião da visita do ministro do Meio Ambiente, Coutinho Jorge à cidade de

Eunápolis:

O pequeno município de Eunápolis, a 62 quilômetros de Porto Seguro, viveu

ontem o mais agitado dia de sua curta história de cinco anos. Mobilizada por

rádios e jornais do Sul da Bahia, boa parte de seus 80 mil habitantes saiu às

ruas com faixas e panfletos, para pedir ao ilustre visitante, o ministro de Meio

Ambiente, Fernando Coutinho Jorge, que lhes devolvesse os empregos,

ameaçados desde 12 de maio passado, quando o ministro embargou o

desmatamento da Veracruz Florestal, do grupo Odebrecht (JORNAL

GAZETA MERCANTIL, 17 jun. 1993).

A audiência pública foi realizada no auditório da CEPLAC, em Eunápolis, sendo

presidida pelo ministro do Meio Ambiente, que ouviu várias autoridades de diferentes

níveis da esfera estatal defenderem o projeto do agronegócio do eucalipto na região. Nas

ruas a população estampava faixas com frase como “O meu pai quer trabalhar”, “Viva

a Veracruz”, “Não queremos morrer de fome”, “A Veracruz é coisa nossa”, “Não à

miséria, sim à Vercruz”, “SOS Veracruz, essa luta é nossa!”. O prefeito de Eunápolis,

Feruk Felipe de Abraão, afirmou que o protesto não foi planejado nem fruto de

186

manipulação do povo, mas de uma resposta espontânea de uma população carente de

investimentos, de emprego e renda e que a Veracruz Florestal representaria a saída para

a crise econômica do município:

Creia-me Sr. Ministro, vivemos hoje um grande dia. A grande mobilização da

comunidade regional não teve causa num planejado e eficiente esquema de

mídia, especialmente preparado para este momento. Na verdade, a grande

motivação da nossa gente é a crise que toma conta da nossa região, onde as

alternativas e perspectivas, até muito pouco tempo, eram sombrias. [...] Eis

que a iniciativa privada interessa-se pela nossa mata devastada e pretende,

ali, implantar uma cobertura vegetal, economicamente viável, geradora de

riquezas, capaz de restituir os empregos que nos foram roubados, dando novo

alento à nossa comunidade e abrindo perspectivas de dias melhores, ante a

crise que nos encontramos (JORNAL FOLHA DE SANTA CRUZ, 17 jun.

1993).

Já o então deputado federal Benito Gama qualificou a suspensão do embargo

como uma questão de Estado, de forma que o ministro não poderia tomar nenhuma

decisão naquele momento sem se reunir com o então governador Antônio Carlos

Magalhães:

[...] não concordo com esta posição de Vossa Excelência estar tomando

decisões aqui, agora. Eu gosto de me reservar o direito de discutir com Vossa

Excelência depois e com o governador Antônio Carlos Magalhães, porque é

pela Bahia, não é só do meu partido, nem individual. Acho que isso é uma

questão de Estado, que não vamos aceitar passivamente nada que não for de

uma decisão absolutamente técnica sem descarga ideológica, sem demagogia.

Este projeto é uma necessidade imperiosa, senhor ministro [...] (JORNAL

FOLHA DE SANTA CRUZ, 17 jun. 1993).

Para convencer a população da necessidade de sair às ruas para protestar a favor

da Veracruz Florestal, foi criado também um grupo de formadores de opinião

denominado Grupo de Fomento ao Progresso – GFP, defendendo que a ação dos

ambientalistas colocava em risco a geração dos empregos que seriam oferecidos pela

indústria. A Figura 81 destaca o convite feito pelo GFP à população para protestar

durante a visita do ministro do meio ambiente.

No panfleto, o capital a ser investido pela Veracruz Florestal é tido como a

solução para os problemas do município, capaz de gerar empregos e acabar com a fome

de milhares de pessoas, enquanto os ambientalistas são considerados românticos, sem

nenhum projeto concreto para resolver os problemas da região. A frase de efeito Sim ao

desenvolvimento e não à miséria reforça o discurso maniqueísta do bem contra o mal,

do progresso contra o atraso, simplificando a questão e fazendo crer que o valor

bilionário a ser investido será revertido para a melhoria da qualidade de vida da

população local.

187

Figura 81 - Panfleto distribuído pelo GFP convidando à população de Eunápolis para

protestar a favor da Veracruz Florestal em 16 de junho de 1993.

Fonte: Arquivo do CEPEDES, 2013.

Em outro panfleto, distribuído no dia do protesto, o GFP elaborou um

documento com 12 pontos intitulado Carta de Eunápolis (Figura 82), reforçando o

discurso desenvolvimentista e qualificando o projeto Veracruz como a oportunidade

única para alavancar o crescimento econômico da região.

No documento, novamente os ambientalistas são tachados de românticos e

atrasados (item 5) e que o discurso de preservação deveria ser feito na Europa (item 6)

onde a indústria e o crescimento econômico já resolveram todos os problemas, de

maneira que o Brasil não poderia abrir mão de US$ 1,2 bilhões (item 9), para gerar

empregos e acabar com a miséria. Mais uma vez é reforçado o discurso linear e

simplista de que a industrialização por si só leva ao desenvolvimento e a solução de

todos os problemas, com os países europeus retratados como modelos de

desenvolvimento e de pleno emprego, quando mesmo naquela época a Espanha já

apresentava uma taxa de desemprego de 20,5% (julho/93) e entre os jovens de 41,9%

(EUROSTAT, 2013).

188

Figura 82 – Carta de Eunápolis: panfleto desenvolvimentista distribuído pelo GFP no

dia 16 de junho de 1993.

Fonte: Arquivo do CEPEDES, 2013.

Atualmente, a Europa atravessa uma forte crise com países apresentando altas

taxas de desemprego, conforme os dados apresentados na Figura 83:

189

Figura 83 – Desemprego na Europa – Maio de 2013.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados da EUROSTAT, 2013.

Segundo Mészáros (2011), o desemprego atual não atinge somente as áreas

subdesenvolvidas, como uma passagem temporária em direção aos modelos avançados

de capitalismo, mas assola as partes mais privilegiadas do capitalismo avançado, como

forma de desemprego estrutural que, por definição, não deveriam ocorrer nessas áreas,

colocando em crise todos os modelos de desenvolvimento do século XX, desde o

modelo sueco de democracia social até o capitalismo avançado, bem como os modelos

russo e chinês:

O crescimento do desemprego na Europa Oriental, na antiga União Soviética

e na China é significativo e extremamente desconcertante para os apologistas

do capital precisamente por isto. Pois a adoção dos ideais da “prosperidade

de mercado” não trouxe para a população desses países a “nova

prosperidade” prometida. Ao contrário, ela os expôs aos perigos do

capitalismo selvagem e do desemprego em massa, generalizando assim por

todo o mundo a condição do desemprego crônico como a tendência mais

explosiva do sistema do capital (MÉSZÁROS, 2011, p. 336).

A promessa de desenvolvimento e de prosperidade são palavras fecundas em

regiões pobres, como no extremo sul baiano. Os dados comprovam que os românticos,

no sentido de acreditarem em sonhos e fantasias, sem sentido objetivo e prático, foram

os próprios defensores do empreendimento eucaliptocultor, atribuindo ao capital a

qualidade de gerar empregos e evitar a fome de milhares de pessoas, quando, na

realidade, o investimento do capital de acordo com a lógica do lucro é o instrumento

27,6 26,4

17,6 16,5

14,3 12,2

62,9

55,8

41,9

55,6

35,2 38,3

0

10

20

30

40

50

60

70

Grécia Espanha Portugal Croácia Eslováquia Itália

%

Total

Jovens

190

básico que o capital possui na luta de classes (SMITH, 1984, p. 225-226), utilizado não

para desenvolver regiões, mas, notadamente, para explorar as potencialidades do

território, no caso do extremo sul, o preço baixo das terras e da força de trabalho, as

excepcionais condições edafoclimáticas e o apoio do Estado, contribuindo, dessa forma,

para aumentar a lucratividade e o ritmo da acumulação capitalista.

Nos encontros com a comunidade regional, em nenhum momento, houve a

discussão aprofundada sobre como seriam realizados esses investimentos e para quem

seria revertida a produção de riquezas oriunda da formação dos territórios produtores de

eucalipto e da produção industrial de celulose, nem como seriam os empregos a serem

gerados, envolvendo o quantitativo real de empregos a serem criados na fábrica e na

base florestal, bem como o problema da terceirização e os investimentos sociais na

comunidade. Na análise da Rede Brasileira de Justiça Ambiental (2009) que avaliou

quatro projetos de grande impacto socioambiental, entre eles o licenciamento da

monocultura do eucalipto no norte do Espírito Santo e sul da Bahia, as audiências

públicas acabam servindo apenas para dar publicidade aos empreendimentos:

[...] Nos casos estudados, [...] as audiências públicas foram usadas pelos

empreendedores e órgãos estaduais como instâncias formais de transmissão

de informações sobre os benefícios econômicos dos empreendimentos, em

detrimento do debate amplo e transparente sobre seus impactos sócio-

ambientais atitude que impõe limites claros ao seu papel efetivamente

democratizante. Não raras vezes, exercem-se constrangimentos morais sobre

os interessados, presentes ou não nas audiências, para que estes silenciem

(JUSTIÇA AMBIENTAL, 2009, p. 5).

Vários panfletos foram distribuídos no município de Eunápolis para formar uma

opinião pública favorável ao empreendimento, conforme cópias dessas publicações

apresentadas nas Figuras 83 a 86, com a participação de uma empresa terceirizada da

área de plantio (Marco Florestal Ltda), da Câmara de Vereadores e do Deputado Federal

João Almeida.

A cooperação da Marco Florestal Ltda é evidente, uma vez que estava implícito

o interesse da empresa em participar dos trabalhos de plantios e manutenção dos

territórios produtores de eucalipto. Os eleitos para defenderem as leis ignoraram as

denúncias de destruição da mata atlântica e o descumprimento da legislação ambiental

para apoiar, incondicionalmente, o projeto, considerando o crescimento econômico e o

progresso como sinônimos da Veracruz Florestal, sem discutir para quem seria

revertida toda a produção de riqueza realizada com os plantios de eucaliptos e com a

produção de celulose.

191

Figura 84 – Panfleto distribuído pela empresa Marco Florestal no município de

Eunápolis em Junho de 1993.

Fonte: Arquivo do CEPEDES, 2013.

192

Figura 85– Panfleto distribuído pela Câmara de Vereadores no município de Eunápolis

em Junho de 1993.

Fonte: Arquivo do CEPEDES, 2013.

193

Figura 86 – Panfleto distribuído pela Deputado Federal João Almeida no município de

Eunápolis em Junho de 1993.

Fonte: Arquivo do CEPEDES, 2013.

O trabalho de formação da opinião pública foi tão forte que no dia da Audiência

Pública com o ministro do Meio Ambiente, os ambientalistas foram obrigados a deixar,

rapidamente, o local, ameaçados de linchamento por uma população enfurecida,

conforme depoimento do Padre Koopmans:

Durante as falações do Ministro e do grupo a favor da empresa o povo lá fora

prestava muita atenção e havia muitos aplausos. Quando eu comecei a falar,

como primeiro do grupo ‘crítico’, o povão, incentivado e manipulado por

‘agentes bem preparados’, começou a gritar e bagunçar de tal maneira que era

194

impossível de ouvir a minha falação. Duas, três vezes o próprio ministro

pediu silêncio e respeito ao povão, mas o mesmo, incentivado mais ainda

pelos ‘agentes’, gritava mais e mais. Finalmente, quando terminei a minha

fala e saindo do prédio da CEPLAC, de repente um amigo me puxou

fortemente pelo braço e me empurrou dentro de um carro que estava com o

motor ligado. Eu não entendendo o que estava acontecendo e bastante

assustado, depois que essa pessoa me acalmou explicando o que estava

acontecendo, fiquei triste e preocupado. Triste, porque eu sabia que o povo

manipulado, cheio de esperança para ganhar um emprego, estava sendo

enganado pelos ‘agentes da empresa e capangas dos políticos’, preocupado

porque não entendia nada da situação. [...] Mas, recentemente eu tenho

escutado: ‘É padre José, naquela época você tinha razão, pois a cidade

cresceu muito, a violência aumentou e os empregos são poucos’ (CEPEDES,

2008, p. 23).

Após tanta pressão, o embargo é suspenso, conforme uma entrevista coletiva

concedida pelo ministro do Meio Ambiente em Salvador, no dia 05 de julho de 1993,

logo depois de uma reunião com o governador:

O Ministério do Meio Ambiente deverá suspender hoje o embargo às obras

de florestamento que a Veracruz Florestal realiza na região sul da Bahia. [...]

Ontem, em Salvador, o ministro do Meio Ambiente, Fernando Coutinho

Jorge, sinalizou pela liberação, alegando que ‘a priori sei que grande parte do

projeto não tem problemas. Algumas áreas devem ser recusadas e

classificadas como proteção ambiental’. [...] ‘Não queremos atrapalhar; o

projeto está viabilizado’, disse o ministro. [...] A liberação da Veracruz para

continuidade de suas atividades é defendida pelo governador da Bahia,

Antônio Carlos Magalhães. Ele observou que ‘se o embargo fosse feito por

uma razão plausível, tudo bem, mas não era’. E explicou: ‘O próprio ministro

e outras autoridades constataram que, em prevalecendo a medida,

cometeriam grande injustiça’. Magalhães considera que a ausência do projeto

seria prejudicial para o Estado, principalmente por situar-se numa região em

crise, a do cacau (JORNAL GAZETA MERCANTIL, 06 jul. 1993).

A Veracruz pôde continuar as suas atividades de desmatamento e plantio dos

eucaliptos, mas a Licença de Localização só foi concedida em meados de 1995,

conforme informações do Jornal A Gazeta, de Eunápolis:

Em meados de 1995, o Conselho Estadual do Meio Ambiente, finalmente

concede a Licença de Localização do empreendimento industrial Veracel

Celulose e o complicado processo só foi concluído em benefício do Grupo

Odebrecht porque a empresa, associada aos interesses do Estado, lançou mão

de seu rolo compressor, cooptando ambientalistas no CEPRAM,

flexibilizando perigosamente a Legislação Ambiental e negligenciando o

aprofundamento dos estudos que conferissem maior segurança à sociedade

regional, tanto em termos dos impactos da poluição industrial e da epidemia

de eucaliptos, quanto às perspectivas socioeconômicas (JORNAL A

GAZETA, 7 fev. 2000).

Assim que a empresa obteve todas as licenças necessárias para realizar a

produção de celulose e estava iminente a data de inauguração das instalações

industriais, a comunidade teve conhecimento dos números reais de empregos a serem

criados:

195

Em entrevista à imprensa no dia 22 de dezembro [2004], na recepção da

empresa, um dos diretores da Veracel Celulose, Walter Pinto, foi enfático

quando disse que a fábrica, quando estiver em pleno funcionamento, no

próximo mês de setembro, só empregará cerca de 380 pessoas. Isso com a

utilização de pouca mão de obra desta região, em razão da falta de

especialização. [...] Portanto, a partir de setembro, quando os mais de oito mil

trabalhadores na fase atual de construção da fábrica forem embora, data

quando a unidade estará sendo inaugurada, só restarão duas centenas de

empregados, acabando de vez com o sonho dessa comunidade, de que a

fábrica da Veracel absorveria milhares de empregos e que contribuiria para

equacionar parte do problema do desemprego que aflige o Extremo Sul da

Bahia (JORNAL A GAZETA, 07 jan. 2005).

A fábrica (Figura 87) foi inaugurada em 28 de setembro de 2005, com a

participação do Presidente Lula, do governador Paulo Souto, dos ministros Luiz

Fernando Furlan (Indústria e Comércio) e Jaques Wagner (Relações Institucionais) e

não cumpriu a promessa de gerar milhares de empregos na região. Gerou em 2005

apenas 739 empregos próprios e 3.150 através de suas terceirizadas. Os últimos dados

da Veracel apontam para uma redução ainda maior do total de empregos criados, em

que os empregos próprios foram reduzidos para 705 (queda de 4,6%) e os terceirizados

2.640 (queda de 16,2%). No mesmo período, a receita líquida da Veracel saiu de R$

323,5 milhões em 2005 para mais de um bilhão de reais em 2012, perfazendo um

crescimento de 213%. Assim, a frieza dos números identifica, com clareza, para quem

ficou o desenvolvimento e o progresso.

No longo caminho percorrido pela empresa desde o início dos anos 1990 e após

várias aquisições, fusões e associações envolvendo empresas nacionais e estrangeiras a

Veracruz Florestal LTDA passou a se denominar Veracel Celulose, uma joint venture

das empresas Fibria e Stora Enso, constituída por base florestal e fábrica com

capacidade de produzir 1,1 milhão de toneladas anuais de celulose. A fábrica fica

localizada no município de Eunápolis, próxima à divisa com o município de Belmonte e

começou a produzir celulose em 2005. A Veracel atua em dez municípios do Sul

Baiano: Santa Cruz Cabrália, Eunápolis, Itagimirim, Porto Seguro, Belmonte, Itabela,

Itapebi, Guaratinga, Canavieiras e Mascote, que podem ser visualizados na Figura 88.

196

Figura 87 – Fábrica Veracel.

Fonte: Fotos selecionadas e organizadas pelo autor a partir de dados da Veracel,

Relatórios de Sustentabilidade, 2005, 2006e 2009.

197

Figura 88 – Território da Veracel Celulose: Produção de eucalipto no período

2000/2011.

Fonte: Mapa produzido pelo autor a partir de dados do IBGE: Produção da Extração

Vegetal e da Silvicultura: madeira em tora para papel e celulose, 2002/2011.

A distribuição geográfica dos territórios produtores de eucalipto está relacionada

aos fatores de proximidade da fábrica e pluviosidade elevada, que permitem a redução

dos custos com o transporte da madeira e o aumento da produtividade através da maior

produção de biomassa proporcionada pelas excepcionais condições edafoclimáticas dos

municípios litorâneos.

De acordo com um estudo realizado pelo IMA em 2008, em Eunápolis e Santa

Cruz Cabrália, os plantios de eucalipto já atingiram os limites determinados pelo

CEPRAM para o licenciamento, segundo os quais os municípios litorâneos podem

absorver os plantios até o limite de 15% da área total e os municípios do interior até o

limite de 20%. Pelo estudo, em Eunápolis a área total de eucalipto já representava 20%

198

do total e em Santa Cruz Cabrália, o limite foi ultrapassado, uma vez que a área

eucaliptocultora já representava 18% do total.

O somatório da produção municipal de madeira em tora para papel e celulose no

período 2002/2011 indica que em três municípios a formação dos territórios produtores

de madeira foi mais intensa e como a expansão do eucalipto se faz mediante a

concentração de terras é importante avaliar as alterações na estrutura produtiva do

campo de Santa Cruz Cabrália, Eunápolis e Porto Seguro, que concentraram 75,4% da

produção total de madeira no período supracitado. Em alguns anos essa concentração

esteve próxima de seu valor máximo, como no ano de 2004 (Figura 89), sendo que no

período 2006/2009 a Veracel reduziu a participação percentual dos principais

municípios produtores em função da necessidade de colheita nos demais, em sintonia

com a logística de corte e transporte e obedecendo aos parâmetros biológicos intrínsecos

do ciclo de crescimento da planta, estabelecidos no plano de manejo, de forma a

otimizar a produtividade. Nos últimos anos, verifica-se nova retomada da concentração

nos municípios mais próximos e com maior quantidade de territórios produtores de

eucalipto e essa situação tende a perdurar até que um novo ciclo de produção nos

municípios mais afastados se complete.

Figura 89 – Território da Veracel Celulose: Participação percentual dos três principais

municípios produtores no conjunto da produção do território Veracel no período

2002/2011.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados do IBGE: Produção da Extração

Vegetal e da Silvicultura: madeira em tora para papel e celulose, 2002/2011.

75,8

66,1

99,6

79,6

94,5

75,8 68,4

56,6

66,3

79,9

0

20

40

60

80

100

120

2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011

%

199

Considerando o ano de 1991 como a partida das operações florestais da empresa

no Sul Baiano, temos que os dados do Censo Agropecuário de 1985 mostram a

realidade agropecuária anterior à expansão do agronegócio do eucalipto na região,

servindo como parâmetro para identificar as possíveis mudanças ou reorientações de

cultivos que ocorreram nos três municípios no período 1985/2011.

A produção de madeira em tora para papel e celulose nos três municípios teve

início no ano de 2002, mas como a fábrica da Veracel só começou as suas atividades em

2005, a produção foi destinada para outras indústrias. Entre os anos de 1985 e 2006, em

que adveio a implantação e a expansão dos territórios produtores de eucalipto, a área

conjunta de produção sai de zero hectare para 84 mil hectares (Figura 90), caindo para

68 mil hectares em 2011, com a alternância de Santa Cruz Cabrália e Eunápolis como

principais produtores. É importante ressaltar que essa queda reflete apenas as variações

normais de colheita e logística priorizadas pela empresa para aperfeiçoar seu

desempenho financeiro e aumentar a produtividade, porque no conjunto dos dez

municípios constituintes do território Veracel, a produção total de madeira cresce

anualmente.

Figura 90 – Território da Veracel: área de produção de madeira no período 1985/2011.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados do IBGE: Produção da

Silvicultura, 1985, 2006 e 2011.

Obs.: Para o cálculo da área ocupada pelo eucalipto foi considerada a produtividade

para o ano de 2006: 39m3/ha/ano e para o ano de 2011: 44m

3/ha/ano (BRACELPA,

2013).

0

26,3

42,0

0

45,0

16,4

0

12,8 10,0

0

5

10

15

20

25

30

35

40

45

50

1985 2006 2011

Em m

il h

ect

are

s

Santa Cruz Cabrália

Eunápolis

Porto Seguro

200

Diferentemente dos Territórios BSC e SPC, em que a implantação e o

crescimento da eucaliptocultura não provieram, significativamente, de áreas de

lavouras, o Território Veracel, mesmo não sendo a maior área produtora de madeira da

Bahia, foi o que mais prejudicou a agricultura camponesa, conforme dados do IBGE

representados na Figura 91.

O crescimento de 84 mil hectares de madeira na área conjunta dos três

municípios no período 1985/2006 foi acompanhado de uma redução de 53,55% da área

total de lavouras, onde aproximadamente 11 mil hectares das lavouras temporária e

permanente deixaram de existir. Considerando a média de 9,6 hectares para gerar um

emprego nas áreas de lavouras (IBGE), foram extintos 1.146 postos de trabalho no

campo dos três principais municípios produtores do Território Veracel.

Figura 91 – Território da Veracel: área de produção de lavouras (temporária e

permanente) no período 1985/2011.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados do IBGE: Censos Agropecuários

de 1985 e 2006; Produção Agrícola Municipal, 2011.

É importante registrar que, no período 2006/2011, houve uma retomada

significativa das áreas agrícolas, que atingiram 25 mil hectares (154% de crescimento)

chegando, inclusive, a superar os valores de 1985, com destaque para outro

agronegócio: cana-de-açúcar.

Nos territórios BSC e SPC a implantação do agronegócio do eucalipto adveio,

notadamente, de áreas originalmente dedicadas à criação do gado bovino. No Território

Veracel, tal qual a relação com as áreas de lavouras, a diferença surge novamente: a

6,6

2,0

6,4

5,0

2,0

10,1 9,5

5,8

8,7

0

2

4

6

8

10

12

1985 2006 2011

Em m

il h

ect

are

s

Santa Cruz Cabrália

Eunápolis

Porto Seguro

201

expansão intercorreu, concomitantemente, com o crescimento das pastagens, conforme

dados do IBGE, demonstrados na Figura 92:

Figura 92 – Território da Veracel: área de pecuária de bovinos no período 1985/2011.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados do IBGE: Censos Agropecuários

de 1985 e 1995; Pesquisa Pecuária Municipal, 2011.

Obs.: Para o cálculo da área ocupada pela pecuária de bovinos foi considerada a área

média de pastagem por cabeça de bovino apresentada pelo IBGE, Censo Agropecuário

(1985: 1,4; 1995: 1,16; 2006: 1,1).

Pelos dados apresentados no gráfico, apenas o município de Santa Cruz Cabrália

experimentou uma redução constante na área de bovinos, totalizando 3,7 mil hectares no

período 1985/2006. No entanto, o crescimento da eucaliptocultura no município foi de

26,3 mil hectares no mesmo período. Mesmo considerando a redução na área de

lavouras (-4,6 mil hectares), restam 18 mil hectares de produção de eucalipto

decorrentes da incorporação de novas áreas.

Nos demais municípios (Eunápolis e Porto Seguro) houve crescimento da área

de pastagens (53 mil hectares) e redução da área de lavouras (-6,6 mil hectares) para o

período 1985/2006. Considerando a incorporação de 57,7 mil hectares para a produção

de madeira, o balanço fundiário resulta em 104 mil hectares de terra de incorporação de

novas áreas ao processo produtivo.

Considerando o balanço fundiário da área conjunta dos três municípios são 122

mil hectares de novas áreas incororadas ao processo produtivo no período 1985/2006,

34,9 31,2

19,3

26,7

70,8

85,4

54,7

63,6

44,3

0

10

20

30

40

50

60

70

80

90

1985 2006 2011

Em m

il h

ect

are

s

Santa Cruz Cabrália

Eunápolis

Porto Seguro

202

provenientes da reutilização de pastagens ociosas, áreas de fomento florestal e

remanescentes de mata atlântica, conforme denúncias do Minstério Público.

Nesse sentido, há denúncias de que a Veracel tenha se apropriado de terras

devolutas no Sul da Bahia, motivando o Estado da Bahia a acionar a Veracel para tentar

reaver essas terras através do processo 0000627-97-2010-805-0079, conforme

reportagem do Jornal A Tarde, de 15 de outubro de 2010:

O governo do Estado está reivindicando – na Vara da Fazenda Pública da

Comarca de Eunápolis, a 643 km de Salvador, no extremo sul da Bahia –

uma área com plantio de eucaliptos com pouco mais de 1.333 hectares,

registrada, desde 1997, no Cartório de Imóveis e Hipotecas, como

propriedade da Veracel Celulose S.A, empresa que atua no ramo do plantio

de eucalipto para produção de celulose na região. [...] A área em questão é a

Fazenda São Caetano, localizada a 18 km de Eunápolis, ocupada no dia 4 de

novembro de 2008 por famílias do Movimento de Luta Pela Terra (MLT). O

grupo solicitou à Coordenadoria de Desenvolvimento Agrário (CDA), órgão

ligado à Secretaria de Agricultura da Bahia (Seagri), que fosse feita a

discriminatória da fazenda – espécie de medição da terra, que avalia o limite

da área e a quem pertence. Após os trabalhos de medição, a conclusão a que

chegou, em 5 de outubro de 2009, a Comissão Especial de Discriminação de

Terras Devolutas do Estado da Bahia, foi que a Fazenda São Caetano

pertence ao Estado e deve ser destinada a assentamentos de reforma agrária

(MINISTÉRIO PÚBLICO DA BAHIA, 2009;2011).

Por sua vez, a empresa apresentou resposta em seu site afirmando não existe

irregularidade e que vai apresentar a cadeia sucessória e as provas que confirmam a

legalidade da propriedade:

A fazenda São Caetano, no município de Eunápolis, foi adquirida pela

Veracel em 22/12/1997, de proprietários privados que já a possuíam há mais

de 20 anos. A área de 1.995 hectares é completamente produtiva, com cerca

de 980 hectares destinados ao plantio comercial e o restante é considerada

área de proteção ambiental. [...] Todos os imóveis adquiridos pela Veracel

são escriturados, registrados e licenciados em seu próprio nome. A escritura e

o registro são feitos nos cartórios competentes e o licenciamento é obtido

junto ao Instituto do Meio Ambiente (IMA) para uma atividade produtiva,

seja para plantio comercial, edificação de infraestrutura ou preservação

ambiental (VERACEL, 2010, p. 1).

O fato é que, de acordo com os dados apresentados pelo IBGE, a expansão da

eucaliptocultura no território da Veracel incorporou áreas que não estavam sendo

utilizadas para o processo produtivo, até aquele momento.

O Ministério Público da Bahia (2009) destaca ainda a existência de denúncias de

desmatamento ilegal de milhares de hectares de mata atlântica por parte da Veracel,

inclusive com condenação, como foi o caso da ação civil pública tombada sob o número

2006.33.10.005010-8, em que várias licenças ambientais foram anuladas e a empresa foi

obrigada a recompor as áreas utilizadas indevidamente para o plantio de eucalipto, além

de pagar R$ 20 milhões a título de danos ambientais.

203

A magnitude do processo de expansão da produção de madeira no território

Veracel teve rebatimentos importantes nos índices de urbanização dos municípios.

Enquanto no território BSC a maior taxa de crescimento da urbanização foi de Água

Fria, com 152% e no território SPC foi do município de Alcobaça, com 362%, para o

território Veracel os números são bem mais expressivos, conforme os dados do IBGE

revelados na Figura 93:

Figura 93 – Território da Veracel: taxa de crescimento da Urbanização no período

1980/2010.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados do IBGE, Censos Demográficos,

1980/2010.

Em todos os territórios produtores de madeira houve crescimento da taxa de

urbanização numa dinâmica bem superior a média do Estado (46%), evidenciando o

avanço do capital produtor de madeira no campo, que concentra terras, reduz as

oportunidades de emprego no campo e contribui para o processo de mobilidade do

trabalho. A diferença é que, enquanto nos territórios BSC e SPC as taxas de crescimento

da urbanização residiram na ordem das centenas, para o território Veracel elas

cresceram de forma tão intensa que atingiram a classe dos milhares, como por exemplo,

o município de Santa Cruz Cabrália, que apresentava uma taxa de urbanização de 3,1%

em 1980 e trinta anos depois atingiu a marca de 72,3%.

Com efeito, foi em Santa Cruz Cabrália que mais cresceu a produção de

madeira, atingindo 42 mil hectares em 2011, superando a tradicional pastagem de

bovinos. Nos demais municípios, o eucalipto representa a segunda maior atividade do

2.211

1.100

697 563

130 100 90 65 46 18 17 4 0

500

1.000

1.500

2.000

2.500

%

204

campo em ocupação das terras. O avanço de atividades econômicas poupadoras de força

de trabalho e concentradoras de terra também movimentou para cima o coeficiente de

Gini nos três municípios, conforme cálculos realizados a partir de dados dos censos

agropecuários (Figura 94):

Figura 94 – Território da Veracel: Coeficiente de Gini no período 1985/2006.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados do IBGE, Censos Agroecuários,

1985/2006.

Assim, nos três territórios baianos, os principais municípios produtores de

madeira apresentaram um aumento nos valores do coeficiente de Gini, concentrando

ainda mais a terra em áreas já reconhecidas, historicamente, como latifúndios bovinos

ou terras improdudivas de especulação.

Em Porto Seguro (Figuras 90 e 92), constata-se que a maioria absoluta das terras

é utilizada para a pecuária de bovinos e para a eucaliptocultura, de forma que a

predominância dessas atividades econômicas no período 1985/2006 contribuiu para o

aumento da concentração fundiária, conforme as informações demonstradas na Figura

95:

0,695 0,659

0,770 0,735

0,837

0,859

0

0,1

0,2

0,3

0,4

0,5

0,6

0,7

0,8

0,9

1

Santa Cruz Cabrália Eunápolis Porto Seguro

1985

2006

205

Figura 95 – Porto Seguro: Estrutura Fundiária – 1995/2006.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados do IBGE, Censos Agropecuários

de 1995 e 2006.

O aumento da concentração fundiária em Porto Seguro no período 1985/2006 se

deu pelo processo de parcelamento da propriedade rural, com o aumento do número dos

estabelecimentos agropecuários com menos de 20 hectares, caracterizando a

minifundização da terra. Esse processo foi favorecido pela criação de três assentamentos

federais no município, envolvendo a redistribuição de 3,2 mil hectares de terra,

beneficiando 191 famílias (INCRA, 2013). Do outro lado, as classes de área acima de

100 hectares diminuíram em termos de número (de 21,5% para 18,9%) e incrementaram

a área de 83% em 1985 para 89,9% em 2006, reforçando ainda mais a concentração da

terra no município, com o coeficiente de Gini saindo de 0,77 em 1985 para 0,859 em

2006.

Com base nos dados apresentados, a expansão da eucaliptocultura no território

Veracel aponta para a intensificação do processo de concentração fundiária, na medida

em que as movimentações na estrutura fundiária sempre seguiram em direção ao

aumento da concentração da terra, numa clara referência de que a disponibilidade do

meio de produção terra foi minimizada para o campesinato e maximizada para o

agronegócio. O aumento da concentração fundiária nos municípios analisados, atestado

por estatísticas oficiais, durante o período da expansão da monocultura do eucalipto é

um indicativo das mudanças territoriais provocadas pela alteração da base produtiva

agrícola regional. O processo é contraditório porque, de um lado, gera riqueza para o

capital, a partir da elevada produtividade e, de outro, gera pobreza para o trabalho, na

206

medida em que afeta a condição camponesa, a partir da diminuição das terras

disponíveis para a produção de alimentos.

Além de se territorializar através da compra direta de terra, as empresas também

realizam a monopolização do território através de subordinação da produção. Nesse

contexto, a situação ainda é pior para o trabalho, uma vez que, mesmo as propriedades

que não foram compradas pelo capital podem ser subsumidas a ele, configurando uma

relação de poder em que o capital, efetivamente, controla o território e ainda aprofunda

a sua dominação mediante a dependência tecnológica e comercial.

Raffestin (1993) destaca que as relações de poder perpassam a integração e

coesão dos territórios hierarquicamente organizados, em que as tessituras, os nós e as

redes podem transcender os limites político-administrativos dos territórios e os limites

jurídicos da propriedade:

De fato, muitos limites são zonais na medida em que a área delimitada não é,

necessariamente, a sede de uma soberania fixada de forma rígida, mas a sede

de uma atividade econômica ou cultural que não se esgota bruscamente no

território, mas de maneira progressiva. É suficiente dizer que as tessituras se

superpõem, se cortam e se recortam sem cessar. Lembremos, por exemplo, da

tessitura agrícola: as parcelas de cultura, malhas funcionais, não

correspondem necessariamente, mesmo raramente, às parcelas como

expressão da propriedade (RAFFESTIN, 1993, p. 154).

Nesse contexto, a estrutura tessituras-nós-redes organizada pelo capital nas

atividades necessárias à indústria do papel e celulose se desdobra em várias escalas,

transcendendo os limites territoriais da propriedade rural em direção a dimensões

escalares nacionais e internacionais. Na Bahia, em pouco mais de 20 anos, a

monocultura do eucalipto adentrou o território e estabeleceu dois perímetros de

expansão que ultrapassam milhares de quilômetros, um ao nordeste e outro ao sul,

inicialmente lançando suas bases nos municípios litorâneos e, paulatinamente,

interiorizando sua ação territorial com o aval do Estado, através dos processos de

territorialização do capital e monopolização do território.

Conforme Oliveira, A. (1987) a ação do capital monopolista em se territorializar

e participar diretamente da produção agrícola depende, fundamentalmente, do tempo de

trabalho necessário para realizar a produção e da possibilidade tecnológica de diminuir

o tempo de produção. Nos setores em que o tempo de trabalho é menor, o capital se

territorializa e, quando isso não ocorre, ele atua na esfera da circulação, monopolizando

a produção.

207

Nesse sentido, a territorialização do capital e a monopolização do território nas

regiões analisadas atende aos dois pré-requisitos: a eucaliptocultura emprega pouca

força de trabalho e o tempo de produção é reduzido em função do avanço tecnológico,

promovido pelas pesquisas biotecnológicas que objetivam produzir espécies híbridas

capazes de produzir mais e melhor, em menos tempo e com maior resistência a pragas e

a condições edafoclimáticas adversas, e das vantagens comparativas do território baiano

relacionadas às suas características físicas que proporcionam maior produtividade.

Assim, no território da Veracel, a implantação e o desenvolvimento dos

monocultivos do eucalipto aumentaram a concentração fundiária e contribuíram para a

redução da população rural, diminuindo as opções de realização da agricultura

camponesa. A pecuária de bovinos, caracterizada como outra atividade rural que

concentra terra e emprega pouca força de trabalho também colaborou nos processos de

urbanização e concentração fundiária.

No território Veracel, a intensidade do processo de implantação/expansão do

agronegócio do eucalipto atingiu a tradicional atividade da pecuária de bovinos, oprimiu

ainda mais a agricultura camponesa e até avançou em áreas protegidas por lei, em

bioma ameaçado de extinção. Como expressão das contradições de seu

desenvolvimento desigual, é nesse território que também a luta dos trabalhadores do

campo é mais bem organizada e já forçou a ação corretiva do Estado em criar nove

assentamentos rurais, seis em Santa Cruz Cabrália, envolvendo a redistribuição de 6,5

mil hectares de terra para 296 famílias e três em Porto Seguro, redistribuindo 3,2 mil

hectares de terra para 191 famílias de camponeses.

Com 3,8 milhões de m3 de madeira em tora para papel e celulose produzidos em

2011, equivalente a 22% do total da produção do Estado da Bahia, o território da

Veracel representa a segunda área intermunicipal produtora e comprova a expansão

espacial do eucalipto na Bahia, como expressão do avanço do agronegócio e de seu

crescente controle do território. Para Raffestin (1993) quando as empresas realizam um

programa de produção, sua ação é sintagmática e se inscreve num campo de poder, em

função de todas as relações que abrange no processo de organização do território,

através de novos recortes, novas implantações e novas ligações:

Ora, a produção, por causa de todas as relações que envolve, se inscreve num

campo de poder. Produzir uma representação do espaço já é uma apropriação,

uma empresa, um controle portanto, mesmo se isso permanece nos limites de

um conhecimento. Qualquer projeto no espaço que é expresso por uma

208

representação revela a imagem desejada de um território, de um local e

relações (RAFFESTIN, 1993, p. 144).

Com efeito, o avanço da monocultura do eucalipto reorganiza o território,

transforma a cesta de produtos tradicionalmente cultivados pelos camponeses e

aprofunda a divisão social e territorial do trabalho, demonstrando a consolidação do

controle do território pelo agronegócio, gerando desemprego e expulsão rural, conforme

o imperativo do capital em reduzir o tempo de trabalho (taxa de utilização decrescente).

Santos (2002) afirma que o controle do território pelo capital depende da técnica da

inovação organizacional que impõe novas sociabilidades:

Esse mundo da técnica invasora é também o mundo do capital tecnológico

invasor que busca, e consegue, contagiar as diversas esferas rurais. É assim

que se expande no campo o domínio desse capital hegemônico com as suas

exigências de racionalidade, impondo novos usos e novas definições do

tempo social. Juntos, as novas técnicas e o novo capital, deixam de ser, como

no passado, exclusivamente de um domínio particular de atividade e se

espalham por todo corpo social, tornando-se os verdadeiros regedores do

tempo social (SANTOS, 2002, p. 305).

Na monocultura do eucalipto para a produção de celulose são realizados grandes

investimentos, tanto para a aquisição de terras quanto para atender ao necessário

complexo tecnológico, representado pela automatização em alta escala da produção e

emprego de maquinário de última geração, que conferem ao capital amplos poderes

sobre o território.

Nesse contexto, o que se desenrola na expansão do eucalipto na Bahia é a

interação de dois processos: o da territorialização do capital, onde capitalista da

indústria, proprietário de terra e capitalista da agricultura têm um só nome; e o da

monopolização do território, onde capitalista industrial é uma pessoa e proprietário e

trabalhador é(são) outra(s) pessoa(s). No primeiro processo o capital se territorializa e

no segundo processo o capital monopoliza o território sem se territorializar, quando o

controle do que, como e quanto produzir não pertence mais ao proprietário da terra, mas

sim às grandes empresas. (OLIVEIRA, A., 1991).

No plano do discurso, a territorialização das empresas de produção de eucalipto

e de celulose nos municípios baianos com condições edafoclimáticas favoráveis precisa

ser justificada e a estratégia adotada para convencimento das comunidades locais tem

seu alicerce nas ideias de desenvolvimento e geração de emprego e renda, com o apoio

incondicional nos três níveis de governo. No entanto, após décadas de promessas de

desenvolvimento e progresso não concretizadas, fica cada vez mais difícil convencer

essas comunidades, notadamente, no período histórico atual em que as empresas, em

209

todos os níveis e escalas, realizam a reestruturação produtiva, convergindo para a

redução do quadro de funcionários e utilizando, cada vez mais, das contratações via

terceirizadas. O processo de precarização do trabalho é fruto das necessidades de

aumento da lucratividade média do capital que motivou os diferentes Estados a

executarem políticas neoliberais de flexibilização das leis trabalhistas, de forma que é

necessário analisar a precarização do trabalho no contexto da crise estrutural do capital.

210

5. A PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO NO CONTEXTO DA CRISE

ESTRUTURAL DO CAPITAL E RESISTÊNCIA CAMPONESA NOS

TERRITÓRIOS DA EUCALIPTOCULTURA NA BAHIA

[...] Para o capital, o trabalhador não é uma condição de produção, mas só o

trabalho. Se ele puder realizá-lo por meio de máquinas ou até por meio da

água, do ar, ‘tanto melhor’. E o capital não se apropria do trabalhador, mas

do seu trabalho — não diretamente, mas pela mediação da troca (MARX,

Grundrisse, p. 409).

As medidas neoliberais adotadas pelos países em seus territórios permitem que o

capital circule de forma ampla e irrestrita, aproveitando as vantagens comparativas

representadas pelos recursos naturais e baixo custo da força de trabalho, fatores que

conduzem a uma produção em alta escala, capaz de competir com êxito no comércio

mundial.

No caso específico da expansão do agronegócio do eucalipto, existem estudos

científicos que alardeiam as vantagens dessa atividade econômica, tanto para preservar

os recursos naturais quanto para distribuir renda através da geração de empregos e da

dinamização/modernização das economias locais.

A ancoragem científica do discurso ideológico favorável ao grande capital é

realizada por profissionais de universidades renomadas no Brasil e no exterior que

apresentam pesquisas favoráveis ao cultivo de eucalipto, visto como capaz de ser

economicamente viável, ambientalmente correto e socialmente justo. Segundo o plano

de manejo da Fibria a aplicação desses princípios garante a sustentabilidade:

Economicamente viável: garante o abastecimento de madeira no curto e no

longo prazo, a um custo que possibilite retorno econômico para a empresa e a

manutenção de suas atividades;

Ambientalmente correto: adota práticas de controle de impactos ambientais,

de respeito aos recursos naturais e de conservação da biodiversidade;

Socialmente justo: respeita os trabalhadores das regiões onde a empresa

desenvolve suas atividades, buscando a melhoria da qualidade de vida e

compartilhando localmente os benefícios da atividade econômica (FIBRIA,

2010, p. 10).

De acordo com Mora e Garcia (2000) a eucaliptocultura pode promover o

desenvolvimento sustentável60

, mediante tratamento correto dos aspectos sociais,

60

Existem mais de 80 significados para o termo desenvolvimento sustentável, mas basicamente se refere

ao desenvolvimento capaz de suprir as necessidades da geração atual, sem comprometer a capacidade de

atender as necessidades das gerações futuras. Aquele que não esgota os recursos para o futuro e parte de

um planejamento que leve em conta que os recursos naturais são finitos criando um modelo econômico

capaz de gerar riqueza e bem estar, promovendo a coesão social sem destruição da natureza.

211

econômicos e ambientais relacionados com a atividade, sendo assim capaz de gerar os

seguintes benefícios:

Redução da pressão sobre as florestas naturais: as plantações

de eucalipto tem se destacado como o principal instrumento para a

recuperação de áreas desmatadas e a utilização dessas madeiras tem

contribuído para reduzir a pressão sobre os fragmentos vegetais

nativos, protegendo, assim, a biodiversidade;

Recuperação de áreas degradadas: As plantações têm

ocupado áreas degradadas com vocação florestal, recuperando os

solos, principalmente, no que diz respeito ao controle da erosão e da

compactação;

Geração de empregos no interior do país: Distribuído em

quase todos os estados do Brasil, o setor de base florestal gera 500 mil

empregos diretos e 2 milhões indiretos. Em 1998 gerou receitas de

US$ 13 bilhões e contribuiu com US$ 1,5 bilhão em impostos,

participando com 4% do PIB nacional;

Fornecem produtos competitivos na economia globalizada: A disponibilidade de terras, boas condições climáticas e as tecnologias

empregadas são fatores que contribuem para favorecer a

competitividade brasileira no setor florestal;

Retêm CO2 da atmosfera: Cada árvore de eucalipto pode

sequestrar até 20 kg de gás carbônico por ano. Um hectare de floresta

jovem sequestra, em média, 35 toneladas de CO2 por ano;

Vantagens para as comunidades locais: valorização das

terras; melhor ocupação das mesmas; melhoria na infraestrutura das

cidades (hospitais, postos de saúde, escolas, pontes, estradas vicinais,

creches, obras de saneamento básico e clubes de lazer); aumento na

geração de empregos; empresas promovem programas de Educação

Ambiental e Melhoria da Qualidade de Vida como forma de

integração e interação com as comunidades.

Lima (1993) é outro estudioso que contribui para a ancoragem científica desse

discurso e direciona seus trabalhos experimentais para tentar comprovar as virtudes do

eucalipto nos aspectos econômicos, sociais e ambientais. Logo no início da década de

1990, quando os plantios extensivos se expandiram no Brasil, o referido autor lançou

O conceito de desenvolvimento sustentável tem sido amplamente disseminado pelo mundo a partir da

Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente realizada no Rio de Janeiro em junho de 1992,

com a assinatura de vários documentos, tais como a Agenda 21, a Convenção Marco sobre o Clima, a

Convenção de Biodiversidade e o Protocolo de Florestas.

Para Veiga (2006), o termo aponta para a possibilidade de conciliar crescimento econômico e

conservação do meio ambiente, sem prejuízo para nenhuma esfera: econômica, política ou social.

Lafer (1996) define desenvolvimento sustentável como um conceito que alia a preocupação ambiental à

preocupação com a economia e a pobreza.

Segundo Jara (1998, p. 35) o desenvolvimento sustentável engloba “dimensões ambientais, econômicas,

sociais, políticas e culturais, o que necessariamente traduz várias preocupações: com as necessidades

básicas de subsistência; com os recursos naturais e o equilíbrio ecossistêmico; com as práticas decisórias

e a distribuição do poder e com os valores pessoais e a cultura. O conceito é abrangente e integral e,

necessariamente, distinto, quando aplicado às diversas formações sociais e realidades históricas”.

Para o ICLEI (Governos Locais pela Sustentabilidade) A noção de sustentabilidade é baseada na

necessidade de se “garantir a disponibilidade dos recursos da Terra hoje, assim como para nossos

descendentes, por meio de uma gestão que contemple a proteção ambiental, a justiça social e o

desenvolvimento econômico equilibrado de nossas sociedades (ICLEI, 2010, p, 4).

212

um livro sobre o impacto ambiental do eucalipto para mostrar que era infundado o

receio que as comunidades locais demonstravam em relação a essa atividade. Uma das

maiores preocupações das comunidades estava relacionada ao grande consumo de água

do eucalipto e o temor era a diminuição da disponibilidade hídrica para a população,

pois havia relatos de ressecamento do solo e esgotamento de nascentes onde essa

atividade foi implantada. Sobre esse tema, o autor destacou que não havia relação entre

diminuição da oferta de água com as plantações de eucalipto, sendo essa variação mais

dependente das condições climáticas, geológicas e pedológicas da bacia hidrográfica:

Para a bacia como um todo, isto é, para a qualidade da água do deflúvio, os

estudos com espécies de eucalipto, assim como com outras espécies

florestais, demonstram que a qualidade final da água é, em condições

naturais, mais dependente da geologia e do solo da bacia hidrográfica, assim

como do regime de chuvas da região, através da interação dos processos

hidrológicos envolvidos na geração do deflúvio pela bacia (LIMA, 1993, p.

70).

Em um estudo mais recente, o autor refina o discurso destacando que além do

eucalipto consumir água no mesmo quantitativo de outros tipos florestais, no quesito

eficiência do uso dessa água, o eucalipto é superior, uma vez que produz mais madeira

por unidade de água consumida:

Esta evidência já se encontra bastante consistente a partir de inúmeros

resultados experimentais. O consumo de água pela vegetação depende do

clima e da área total das folhas da floresta (o chamado índice de área foliar),

guarda relação direta com a fotossíntese. Por outro lado, este consumo de

água deve ser sempre analisado de duas maneiras, primeiro, em termos do

consumo total anual do eucalipto, comparativamente ao consumo de outros

tipos florestais, o qual como já afirmado, não é diferente; segundo, em

relação à eficiência do uso desse total de água, em termos da quantidade de

madeira produzida por unidade de água consumida na transpiração, na qual o

eucalipto leva até ligeira vantagem, ou seja, usa água disponível de forma

mais eficiente (LIMA, 2004, p.2).

Rovedder e Eltz (2008, p. 88) destacam o impacto positivo do plantio de

eucalipto e pínus desenvolvido em áreas degradadas, com solos de baixa fertilidade, na

presença de erosão ou em áreas de pastagens, contribuindo para a elevação da

fertilidade do solo, em virtude da queda das folhas e galhos (matéria orgânica) sobre o

solo:

O eucalipto e o pínus apresentaram boa adaptação às condições desfavoráveis

para o crescimento vegetal em solos afetados pela arenização. [...] A

influência da competição interespecífica no tratamento Campo + Plantas de

Cobertura foi mais prejudicial ao crescimento das plantas do que as

condições ambientais desfavoráveis do solo degradado, sendo o pínus mais

sensível a esta competição do que o eucalipto, tanto em sobrevivência das

mudas, quanto em crescimento das plantas. [...] O uso do eucalipto para a

contenção da arenização pode ser iniciado sobre o solo já arenizado e em

consórcio com plantas de cobertura. Já no plantio do pínus, deve-se ter maior

213

cuidado com consórcio com espécies herbáceas, devido à competição

interespecífica.

Verifica-se que há um grande empenho em demonstrar, cientificamente, as

qualidades econômicas, sociais e ambientais dos cultivos monocultores florestais, como

estratégia de facilitar a expansão dessas atividades em áreas favoráveis à reprodução do

capital, sempre à procura de uma alta taxa de lucro.

A alta taxa de lucro no caso da expansão do eucalipto na Bahia procede das

vantagens comparativas naturais, representadas pelas espetaculares condições

edafoclimáticas (que aceleram a produção biológica da planta), isenção fiscal, baixo

preço das terras, baixo custo da força de trabalho, apoio financeiro de capitais estatais e

privados, etc. Mas, torna-se necessário que as populações locais aprovem o projeto e

elas precisam ser convencidas que as empresas trarão o desenvolvimento para a região.

Para Lisboa (2007) as estratégias do capital para obter o consentimento da

população local e assim poder explorar as riquezas do território passam pelo discurso do

desenvolvimento sustentável, veiculado ideologicamente como capaz de conciliar

riqueza econômica e social com preservação ecológica:

[...] a ideologia do desenvolvimento sustentável com ênfase no local, como

aparece nas propostas de políticas públicas no Brasil, se generalizou. Esta

ideologia se afirmou tornando-se, de acordo com os seus interlocutores, a

estratégia de desenvolvimento que permite fazer uso do potencial

competitivo do território, de modo a melhorar sua eficiência na utilização dos

recursos, no usufruto do sistema de relações e das especificidades culturais

(LISBOA, 2007, p. 196).

A autora destaca que o desenvolvimento sustentável é um fetiche do capital, pois

é travestido de linguagem científica e tem forte apelo ecológico, com penetração

eficiente nos vários estratos sociais, contribuindo sobremaneira para o consenso das

propostas, que, por sua vez, jamais se tornarão realidade em virtude da impossibilidade

de conciliar preservação ambiental com justiça social dentro da lógica do capital, que

persegue a acumulação lucrativa no seu movimento desigual e combinado.

Nesse sentido, para construir a roupagem científica do discurso do

desenvolvimento são necessários recursos financeiros para promover pesquisas

ressaltando as benesses do cultivo do eucalipto para a recuperação e conservação dos

solos, melhoria da qualidade da água, geração de renda, emprego e bem estar social. A

participação de uma parte dos pesquisadores no processo de ancoragem científica da

eucaliptocultura pressupõe a existência de fortes ligações entre o poder econômico e o

saber científico, numa tentativa de legitimar cientificamente a territorialização do

214

capital via expansão da eucaliptocultura, escamoteando e secundarizando as questões

sociais.

5.1 A expansão aparentemente ilimitada do capital em escala ampliada

A criação do mercado mundial foi prenunciada por Marx, em pleno século XIX,

quando verificou que o capital tem uma característica inata de encarar cada limite como

uma barreira a ser suplantada, onde as contradições imediatas que criam estes limites

são deslocadas e utilizadas como impulsos para a expansão aparentemente ilimitada do

capital em escala cada vez mais ampliada:

[...] Uma condição da produção baseada no capital é a produção de um

círculo sempre ampliado da circulação seja o círculo diretamente ampliado

ou sejam criados nele mais pontos como pontos de produção. [...] A

tendência de criar o mercado mundial está imediatamente dada no próprio

conceito de capital. Cada limite aparece como barreira a ser superada. [...] O

comércio não aparece mais aqui como uma função operando entre as

produções autônomas para a troca do seu excedente, mas como pressuposto e

momento essencialmente universais da própria produção (MARX, 2011, p.

332).

Para Mészáros (2011) enquanto este mecanismo vital de autoexpansão continuar

funcionando a crise é apenas conjuntural, podendo se apresentar em graus variados de

duração, frequência e severidade que afetam as três dimensões fundamentais do capital

(produção, consumo e circulação/distribuição/realização), mas esse processo de

deslocamento não pode se prolongar indefinidamente e a crise estrutural se instala

quando os limites absolutos do capital são ativados, não havendo mais condições de

estender as fronteiras historicamente dadas do capital:

Com certeza, os apologistas da ordem estabelecida saúdam cada escapada da

crise como sua vitória final, e como a refutação definitiva do marxismo. Já

que eles não podem, nem vão pensar em termos históricos, também não

conseguem compreender que os limites do sistema do capital podem de fato

se expandir historicamente — por meio da abertura de novos territórios,

protegidos por impérios coloniais, ou pelos modos mais modernos de

“neocapitalismo” e “neocolonialismo”. Do mesmo modo, eles podem se

expandir graças à colonização interna, isto é, pelo estabelecimento

implacável de novas válvulas de escape nos próprios países, protegendo as

condições de sua expansão sustentada por uma exploração mais intensiva

tanto do produtor como do consumidor etc. — sem se livrar dos limites

estruturais e contradições do próprio capital (MÉSZÁROS, 2011, p. 586).

Mészáros aponta, então, dois caminhos para a perpetuação da sobrevivência e do

poder do capital diante do problema da ativação de seus limites absolutos: a

multiplicação do seu poder em escala global e a intensificação do seu domínio interno.

215

Com relação à primeira válvula de escape expansionista61

, entendida como a constante

expansão da escala de operações, o capital pôde criar o mercado mundial e relativizar

os seus limites absolutos, ou seja, adiar o seu fenecimento. Nesse processo, o capital se

impôs como o modo de produção dominante e, além de abrir novas rotas de suprimento

de recursos materiais e humanos, cria também necessidades de consumo nos territórios

recém incorporados à dinâmica capitalista.

Nesse contexto, o fracasso do modelo soviético implicou também na diminuição

do peso das fronteiras e no aprofundamento da divisão internacional do trabalho, na

medida em que novos territórios foram incorporados ao capitalismo hegemônico. Para

Ianni (1992) o fim do experimento socialista não significou, automaticamente, o

término das desigualdades, tensões e contradições que estavam e continuam a estar na

base das populações:

O mesmo capitalismo que começa a ser derrotado com a Revolução Soviética

de 1917, em pouco tempo se mundializa, universaliza. Readquire tal ímpeto

que invade os espaços até então protegidos pelo regime de economia

centralmente planificada, nos países onde se ensaiam, ou se ensaiavam,

experimentos socialistas (IANNI, 1992, p. 23).

A mundialização do capital em curso diminui o papel dos Estados Nacionais,

derruba fronteiras e representa um processo de aceleração capitalista jamais visto antes.

Graças aos avanços tecnológicos é possível para uma empresa transnacional atuar em

escala planetária, produzindo em um território, tendo seu centro de comando a milhares

de quilômetros distante desse espaço e exportando essas mercadorias para todo o

mundo.

Os avanços tecnológicos, notadamente os relacionados às telecomunicações e

aos transportes, permitem que territórios distantes se tornem cada vez mais próximos

entre si. Dessa forma, há uma mudança qualitativa nos processos produtivos: as

empresas se instalam nos países da periferia e não geram os empregos nem o

desenvolvimento prometido nas ideologias modernizantes, reduzindo o processo de

produção à importação de peças e equipamentos com alto valor agregado, onde as

tarefas locais não passam da simples montagem de bens.

Com relação à segunda válvula de escape expansionista, entendida como uma

colonização interna, o capital pode enfrentar a ameaça de atingir seus limites estruturais

através da dupla exploração dos trabalhadores: como produtores e como consumidores.

61

David Harvey (2005) denominou ajuste espacial o processo de criação do mercado mundial como

estratégia vital para a sobrevivência do capitalismo que tem necessidade de reinvestir o capital excedente

em novas regiões promissoras de altas taxas de lucro e, com isso, resolver, temporariamente, as crises.

216

Assim, os limites do consumo são artificialmente ampliados porque o sistema

deliberadamente produz novas necessidades que transcendem as reais necessidades do

sujeito, transformando o supérfluo em necessário. Marx já apontava para essa tendência

do capital em criar apetites artificiais:

O luxo é o contrário do naturalmente necessário. As necessidades naturais

são as necessidades do indivíduo, ele próprio reduzido a um sujeito natural. O

desenvolvimento da indústria abole essa necessidade natural, assim como

aquele luxo — na sociedade burguesa, entretanto, o faz somente de modo

antiético, uma vez que ela própria repõe uma certa norma social como a

norma necessária frente ao luxo. [...] Essa remoção do solo natural sob o solo

de toda indústria e a transposição de suas condições de produção para fora

dela em uma conexão universal — por conseguinte, a transformação daquilo

que aparece supérfluo em algo necessário, em necessidade historicamente

produzida — é a tendência do capital (MARX, 2011, p. 435).

A criação histórica das necessidades sociais exclusivamente para fins de

expansão dos lucros ativa um dos limites absolutos do capital uma vez que há restrição

de recursos de produção disponíveis para atender a demanda ilimitada desse modo de

produção que não pode admitir qualquer necessidade de restrição62

. Mészáros chama a

atenção para essa contradição insuperável do capital:

A utilização predatória dos recursos renováveis e não renováveis e o

correspondente desperdício em escala monumental é o corolário fatal dessa

maneira alienada de se relacionar com a necessidade humana individual. No

que se refere à influência desse mesmo fato no sistema produtivo em si,

descobrimos que a série de carências historicamente criadas (e dos bens

correspondentes, não importando a sua artificialidade) está incorporada num

quadro reprodutivo altamente ampliado, com dificuldade cada vez maior de

garantir a exigida continuidade da produção e das necessárias “realização” e

“valorização” do capital em escala sempre crescente (MÉSZÁROS, 2011, p.

260).

Harvey (2011) também destaca a impossibilidade de ajustes espaciais infinitos

para contrabalançar a tendência da queda de rentabilidade que ameaça o capital, mas

reconhece a sobrevida que esses mecanismos concedem ao sistema, mesmo que de

forma restrita dada a insustentabilidade das sociedades de consumo que são criadas para

manter a reprodução ampliada do capital e afastar as crises:

[...] A elaboração de novas linhas e nichos de produtos tem sido um salva-

vidas para o desenvolvimento capitalista, ao mesmo tempo que tem

transformado a vida diária, até mesmo das populações de baixa renda dos

chamados países em desenvolvimento (como demonstra a rápida proliferação

62

Marx teorizou sobre essa característica do capital em não aceitar nenhum tipo de restrição e considerar

cada expansão como ponto de partida inicial para uma nova expansão: “Quanto mais desenvolvido o

capital, quanto mais distendido, portanto, o mercado em que circula, tanto mais ele se empenha

simultaneamente para uma maior expansão espacial do mercado e para uma maior destruição do espaço

pelo tempo. [...] Aqui, aparece a tendência universal do capital que o diferencia de todos os estágios de

produção precedentes. Embora limitado por sua própria natureza, o capital se empenha para [o]

desenvolvimento universal das forças produtivas [...] — livre, desobstruído, progressivo e universal —

[que] constitui o pressuposto da sociedade e, por isso, de sua reprodução, onde o único pressuposto é a

superação do ponto de partida” (MARX, 2011, p. 446).

217

de rádios e telefones celulares em todo o mundo em poucas décadas). [...] A

inovação e o desenvolvimento de produtos, como todas as outras coisas, tem

se tornado um grande negócio, aplicável não só para a melhoria dos produtos

existentes (como automóveis), mas também de setores da indústria

inteiramente novos (como computadores e eletrônicos e seus enormes

campos de aplicação no governo, produtos farmacêuticos, cuidados de saúde,

organização empresarial, entretenimento e similares, além de bens de uso

doméstico). [...] Mas a propensão espantosa para a criação de linhas de

produtos totalmente novas e a aceleração que ocorreu [...] desde a década de

1950 colocou o desenvolvimento do consumismo e de uma crescente

demanda efetiva no centro da sustentabilidade do capitalismo contemporâneo

(HARVEY, 2011, p. 82-83).

Isso evidencia que a tentativa de ampliar a escala das operações, tanto no

domínio externo, com a incorporação de novos territórios, quanto no domínio interno,

com a exploração mais intensiva tanto do produtor como do consumidor, são suficientes

apenas para deslocar as contradições por algum tempo, mas jamais oferece condições

para superar os antagonismos que são, inclusive, aprofundados com a usurpação

contínua e crescente da totalidade de recursos renováveis e não renováveis, culminando

com a limitação irreversível do capital como modo de reprodução sociometabólica,

quando o processo se completar historicamente. A crise estrutural é evidenciada pelo

encurralamento do capital: nem pode retroceder para uma situação anterior, com menor

integração e expansão, nem há possibilidade de prosseguir em seu ajuste espacial na

escala necessária.

Durante certo tempo, a criação do mercado mundial permitiu a formação de

taxas diferenciais de lucro e superlucro que puderam ser deslocadas, em pequena fração,

para a força de trabalho localizada nos países centrais, conforme exemplifica Mészáros

(2011, p. 340):

Quando a Ford das Filipinas paga 30 centavos por hora à força de trabalho

local, conseguindo, desta forma, um retorno de 121,3 por cento sobre o

capital próprio, em contraste com uma média mundial de 11,8 por cento

(valor que inclui, evidentemente, os lucros imensos de fábricas no Terceiro

Mundo), é óbvio que isto ajudou a Ford Corporation a pagar o salário de 7,50

dólares no mesmo ano (1971) pelo mesmo tipo de trabalho à sua força de

trabalho de Detroit, ou seja, 25 vezes mais que o salário das Filipinas.

O próprio autor chama a atenção para o fato de que essas práticas se tornaram

inviáveis com o passar do tempo em função das próprias contradições do sistema que

persegue uma expansão ilimitada, onde esses deslocamentos expansionistas conseguem

apenas um alívio temporário ao transferir o problema do desemprego dos países

capitalistas avançados para outras partes do mundo, resultando na tendência atual da

equalização da taxa diferencial de exploração em todos os ramos da indústria em todos

os países.

218

O fenecimento do Estado de Bem-Estar a partir da intensificação de medidas

neoliberais para tratar o problema do crescente desemprego estrutural só reforçou a

subordinação do trabalho ao capital, agora com a aprovação de leis antitrabalhistas,

veiculadas como necessárias para gerar mais empregos, uma vez que, segundo os

apologistas do capital, a excessiva proteção legal seria a causa principal do desemprego

e, portanto, a flexibilização das leis trabalhistas possibilitaria ao capital contratar mais

força de trabalho. Nesse sentido, Chesnais (1996, p. 42) destaca a mercadorização do

trabalho e o desmantelamento das legislações trabalhistas:

O trabalho humano é, mais do que nunca, uma mercadoria, a qual ainda por

cima teve o seu valor venal desvalorizado pelo “progresso técnico” e assistiu

à capacidade de negociação de seus detentores diminuir cada vez mais diante

das empresas ou dos indivíduos abastados, suscetíveis de comprar o seu uso.

As legislações em torno do emprego do trabalho assalariado, que haviam sido

estabelecidas graças às grandes lutas sociais e às ameaças de revolução

social, voaram pelos ares, e as ideologias neoliberais se impacientam de que

ainda restem alguns cacos delas.

Na realidade, as medidas neoliberais adotadas para resolver a questão do

desemprego intensificaram o problema, até mesmo nas áreas privilegiadas, como

Europa Ocidental e Estados Unidos, resultando na redução dos níveis salariais, na

precarização do trabalho e no aumento do próprio desemprego.

Isso ocorre porque a produção em tempo real (just in time) permite romper a

rigidez na montagem de produção característica do sistema fordista e, assim, a produção

acontece em escala diferenciada, sendo possível o atendimento individual ao

consumidor. Por outro lado, os contratos flexíveis de trabalho pioraram as condições de

vida dos trabalhadores, uma vez que só há empregos se houver demanda. Associado a

isso, a introdução, cada vez mais intensa, da robótica nos processos industriais vem

contribuindo para diminuir os custos das empresas e aumentar o desemprego,

enfraquecendo o movimento dos trabalhadores que, atualmente, não vêm lutando por

melhores condições de trabalho, mas pela inclusão no mercado, a qualquer preço e sob

quaisquer condições, conforme aponta Harvey (2011, p. 56):

As tecnologias de economia de trabalho e as inovações organizacionais

podem mandar as pessoas para fora do trabalho e de volta à reserva

industrial. O resultado é um exército “flutuante” de trabalhadores demitidos

cuja existência coloca uma pressão descendente sobre os salários.

No caso específico do setor de plantações de eucalipto, a ideologia subjacente

aponta para a geração de milhões de empregos nessa atividade que monopoliza milhares

de hectares no campo brasileiro. No entanto, uma característica fundamental da

produção de celulose é a necessidade de grandes investimentos por causa da

219

automatização e mecanização, o que entra em choque com a premissa original.

Considerando a indústria de celulose da Aracruz, a produtividade por trabalhador direto

cresceu 178% no período 1989-2002:

Na indústria de celulose da Aracruz, o processo produtivo é muito

mecanizado, desde a inauguração da primeira fábrica em 1978. E a exigência

de produtividade por trabalhador direto tem crescido de forma constante com

o processo de modernização e terceirização, que se intensificou a partir da

década de 90. Em 1989, 1.329 trabalhadores da indústria produziam 502.000

toneladas de celulose, ou seja, cada trabalhador produzia 378 toneladas de

celulose. Doze anos depois, 1.543 trabalhadores (a grande maioria ativa na

indústria) produziam 1.240.000 toneladas de celulose, o que quer dizer que

cada trabalhador produzia 804 toneladas de celulose em 2001. A inauguração

da nova fábrica C, em 2002, elevou a produtividade: cada trabalhador passou

a produzir 1.052 toneladas de celulose em 2003 (DE’NADAI et al., 2005, p.

20).

Com efeito, o capital é muito competente em transformar os ganhos do trabalho

em alavanca para a sua expansão quando incrementa, constantemente, a produtividade

do trabalho através da introdução de novas tecnologias e processos organizacionais,

conforme visto nas fábricas da Aracruz Celulose, mas, contraditoriamente, não

consegue equacionar o problema do desemprego crônico e da superprodução, fatos que

são indicadores da crise estrutural do capital.

Nesse sentido, o avanço das forças produtivas é, simultaneamente, uma resposta

à irrefreável necessidade do capital em expandir a produção e a produtividade em escala

infinita, bem como representa, contraditoriamente, um entrave a sua expansão, em

função do objetivo de toda criação da riqueza servir aos interesses do capital e não da

sociedade e, sendo assim, nunca ocorre a saciedade, o que representa um risco potencial

e imediato para todo o planeta.

No processo de modernização tecnológica, o capital segue a tendência da taxa de

utilização decrescente que atinge a produção de bens e serviços, a maquinaria industrial

e a própria força de trabalho. No primeiro caso, ocorre a transformação do supérfluo em

necessidade ao mesmo tempo em que as mercadorias são projetadas para durarem cada

vez menos (obsolescência planejada) e, quando isso não acontece, a propaganda

massiva motiva os consumidores a trocarem seus bens usados e velhos por bens novos e

modernos, atendendo aos ditames da moda e da ostentação social que conduzem ao

consumo perdulário; No segundo caso, a subutilização também ocorre no plano das

fábricas e do maquinário, obedecendo ao imperativo da inovação tecnológica, onde

máquinas ainda capazes de produzir são substituídas por outras mais modernas e mais

avançadas, muitas vezes com financiamento de recursos estatais; Finalmente, a taxa de

220

utilização decrescente também afeta a força de trabalho, pois os novos processos

produtivos concorrem para a expulsão maciça de trabalhadores, inclusive nos países

capitalistas avançados.

Os movimentos sociais ligados ao trabalho sempre foram contrários à

implementação de novas tecnologias, desde o movimento luddita63

do início do século

XIX até a formação dos conhecidos acordos de produtividade, nos países capitalistas

avançados, entre capital e trabalho, no período posterior a Segunda Guerra Mundial até

a crise da década de 1970, por meio dos quais os trabalhadores aceitaram as novas

tecnologias em função da segurança no trabalho. Mas, como a história demonstrou, a

luta parcial dos trabalhadores contra a inovação tecnológica e organizacional ataca

apenas um dos elementos do sistema e é incapaz de modificar as bases desse modo de

produção sociometábólica que precisa converter parte da mais-valia para mobilizar a

ciência a desempenhar a dupla tarefa de inventar novas máquinas economizadoras de

energia e força de trabalho e encontrar métodos mais eficazes de produzir mercadorias

com maior lucratividade64

.

Para Chesnais as novas tecnologias e as técnicas organizacionais do trabalho,

tais como a automatização baseada em microprocessadores, o sistema toyotista de

63

Marx relatou as revoltas dos trabalhadores contra as máquinas, como a invenção do tear de fitas na

Alemanha do século XVII que causou agitação em várias cidades da Alemanha e Inglaterra, inclusive

motivando o assassinato de seu inventor. Sobre o movimento luddita, Marx comenta que “a destruição

maciça de máquinas nos distritos manufatureiros ingleses durante os 15 primeiros anos do século XIX,

provocada, sobretudo pelo emprego do tear a vapor, ofereceu, sob o nome do movimento luddita, pretexto ao governo antijacobino de um Sidmouth, Castlereagh etc., para as mais reacionárias medidas de

violência” (MARX, 1984, Volume I, Tomo 2, p. 47). 64

Nesse processo, os apologistas das relações capitalistas de produção teorizaram sobre o desemprego

como um mal necessário para se atingir o desenvolvimento e a modernização com a promessa de um

futuro melhor para todos, com mercadorias mais baratas e de melhor qualidade acessíveis a todos. Os

postos de trabalhos perdidos na indústria em função da implementação de novas tecnologias produtivas

seriam criados no setor de serviços, de maneira que só ficariam desempregados os trabalhadores que não

procurassem realizar a sua qualificação profissional. Em outras palavras, a culpa do desemprego seria do

próprio trabalhador preguiçoso que não quis estudar. No entanto, essas ideias não passaram de simples

canto das sereias para a classe trabalhadora, uma vez que a modernização capitalista tem por objetivo

maior o aumento da lucratividade e a expansão do valor de troca, sendo bastante limitado o processo de

transferência do trabalho não qualificado para o trabalho qualificado, de forma que, atualmente, o

desemprego já atinge trabalhadores altamente qualificados, inclusive de setores de ponta como a indústria

naval, aeronáutica, eletrônica, mecânica e espacial: Portanto, não estamos mais diante dos subprodutos

“normais” e voluntariamente aceitos do “crescimento e do desenvolvimento”, mas de seu movimento em

direção a um colapso; nem tampouco diante de problemas periféricos dos “bolsões de

subdesenvolvimento”, mas diante de uma contradição fundamental do modo de produção capitalista como

um todo, que transforma até mesmo as últimas conquistas do “desenvolvimento”, da “racionalização” e

da “modernização” em fardos paralisantes de subdesenvolvimento crônico. E o mais importante de tudo é

que quem sofre todas as consequências dessa situação não é mais a multidão socialmente impotente,

apática e fragmentada das pessoas “desprivilegiadas”, mas todas as categorias de trabalhadores

qualificados e não qualificados: ou seja, obviamente, a totalidade da força de trabalho da sociedade

(MÉSZÁROS, 2011, p. 1005).

221

terceirização e o just in time serviram para impor aos assalariados o peso da

precariedade contratual e baixos salários65

.

Nesse contexto, outra investida do capital é subordinar os grupos que ainda não

foram proletarizados, tais como os camponeses e as populações rurais dos países da

periferia e a força de trabalho das mulheres, notadamente nos países capitalistas

avançados, onde a maior parte dos camponeses e da população rural já desapareceu.

Segundo Mészáros, a força de trabalho feminina é obrigada a aceitar salários mais

baixos e ocupações mais inseguras e já constitui a maioria da população ativa dos países

avançados, o que constitui uma vantagem para o capital, mas, contraditoriamente,

coloca em risco o futuro da família nuclear, o microcosmo insubstituível de reprodução

e consumo e da manutenção da propriedade:

Outro aspecto importante da extralimitação do capital relacionado com as

mulheres é a fragmentação e a redução da família nuclear a seu âmago mais

interior (comprovadas pelos índices crescentes do divórcio), que, na

qualidade de “microcosmo” e unidade consumidora básica da sociedade,

tende a contribuir para a maior instabilidade da própria família, sob enormes

pressões num momento de crise estrutural cada vez mais profunda, e por sua

vez tem sérias repercussões negativas para todo o sistema (MÉSZÁROS,

2011, p. 305).

A fragmentação do trabalho é uma das estratégias do capital para impedir a

unificação do trabalho, na medida em que alimenta a divisão de interesses no interior do

próprio trabalho, em virtude das diferenças existentes no tocante a gênero, raça, etnia,

língua, política, orientação sexual e crença religiosa. Isto é visível nos dias de hoje

quando se observa o fosso salarial existente entre homens e mulheres, entre negros e

brancos, bem como os atritos entre a força de trabalho dos países avançados e os

imigrantes latinos, africanos e asiáticos, fazendo crescer a xenofobia na Europa e nos

Estados Unidos. Para Harvey (2011, p. 58):

Ao longo de sua história, o capital não foi de maneira nenhuma relutante em

explorar, se não promover, fragmentações, e os próprios trabalhadores lutam

para definir meios de ação coletiva que muitas vezes se defrontam com os

limites das identidades étnicas, religiosas, raciais ou de gênero.

Dessa forma, a fragmentação do trabalho conduz também a lutas parciais contra

o capital, representadas pelas demandas por empregos, saúde, educação, meio ambiente,

lutas pela discriminação sexual e racial, entre outras. Tais lutas são reconhecidamente

justificadas, mas insuficientes para alterar a estrutura do capital, dada a inviabilidade de

65

O efeito combinado das novas tecnologias e das modificações impostas à classe operária, no tocante à

intensidade do trabalho e à precariedade do emprego, foi proporcionar aos grupos americanos e europeus

a possibilidade de constituir, com a ajuda de seus Estados, zonas de baixos salários e de reduzida proteção

social (CHESNAIS, 1996, p. 35).

222

soluções parciais e reformistas atingirem esse sistema totalizador e irreformável.

Mészáros (2011, p. 181) observa que:

Baseada na dolorosa evidência histórica, surge a verdade desconcertante:

através das interconexões estruturais das partes que o constituem, o sistema

do capital consegue se impor sobre os esforços emancipadores parciais que

visam alvos específicos limitados. Com isso, os adversários da ordem

estabelecida da reprodução sociometabólica, incorrigivelmente

discriminatória, têm de enfrentar e superar não apenas a força positiva

autossustentada de extração do trabalho excedente pelo capital, mas também

a força devastadoramente negativa (a inércia aparentemente ameaçadora) de

suas ligações circulares.

A fragmentação e precarização do trabalho levam também à fragmentação e à

precarização das lutas contra o capital que, estrategicamente, utiliza as diferenças

sociais para perpetuar o domínio sobre o trabalho, mesmo em momentos de crise66

.

Isso ocorre porque o trabalho pode existir sem o capital, mas o capital é

completamente dependente do trabalho, uma vez que o trabalhador é o agente criador,

mesmo que os capitalistas organizem o processo de trabalho. É em função dessa

dependência estrutural que surgem as táticas capitalistas para dominar o trabalho, tais

como a utilização das diferenças sociais para fragmentá-lo e precarizá-lo,

Para Mészáros (2011), não há como reformar o capital e, nesse sentido, não há

futuro em lutar por causas parciais. É preciso haver uma unificação política das diversas

lutas. Em tal abordagem, o trabalho é a única alternativa estrutural viável para superar o

capital, pois somente ele é capaz de fornecer o referencial estratégico para integrar todos

os movimentos emancipadores de questão única na causa comum de manter a

sobrevivência da humanidade. No entanto, para ter sucesso global, o trabalho precisa

apresentar alternativas para cada estrutura do capital, desde o microcosmo até o

macrocosmo da vida política e econômica, deve “abranger todos os aspectos

complementares do processo de reprodução social, desde as funções estritamente

produtivas e distributivas até as dimensões mais amplas da direção política” (p. 848).

Por essa análise, não basta apenas tomar o poder político para que o trabalho

cumpra sua função social de produzir a riqueza para o conjunto da sociedade, sendo

imprescindível erradicar a extração de trabalho excedente, tanto pelos capitalistas ou por

qualquer outra personificação do capital e, para que isto ocorra, torna-se necessário

substituir e superar a divisão social do trabalho hierárquica e antagônica. Mészáros

66 [...] O capitalista tem de mobilizar qualquer relação social de diferença, qualquer distinção dentro da

divisão social do trabalho, qualquer preferência ou hábito cultural especial, tanto para impedir a

uniformização inevitável da localização no mercado de trabalho que pode ser consolidada em um

movimento de solidariedade social quanto para sustentar uma força de trabalho fragmentada e dividida

(HARVEY, 2011, p. 90).

223

(2011, p. 188) destaca a importância da internacionalização das lutas dos trabalhadores

para fazer frente à atual mobilidade do capital e credita à educação de baixo nível um

dos obstáculos para a conscientização do trabalho:

[...] O capital é espontâneo e necessariamente móvel em sua busca da

maximização do lucro e hoje pode ser transferido na velocidade da luz de um

país para outro sob as circunstâncias de expectativas favoráveis de lucro. Em

compensação, a “mobilidade do trabalho” internacional depara com imensos

obstáculos práticos e custos materiais proibitivos, pois deve estar sempre

subordinada ao imperativo da acumulação lucrativa de capital — para não

mencionar o fato de que a prática consciente da educação de baixo nível e da

mistificação ideológica dos trabalhadores, exercida em nome do interesse de

seu capital nacional, ergue obstáculos enormes para o desenvolvimento da

consciência internacional do trabalho.

O embate capital X trabalho é inevitável e se alimenta das contradições entre

elementos antagônicos67

. Até aqui, o capital vem superando suas crises conjunturais

graças ao mecanismo de deslocamento das contradições, inclusive transformando-as em

mola de propulsão para expandir o sistema, até onde seja possível. Mas, as contradições

permanecem e até passam a existir também em caráter ampliado, uma vez que é

impossível para esse sistema resolver as contradições sem deixar de ser capital. Nesse

contexto, diante de uma crise estrutural, as contradições se intensificam e se tornam

mais explosivas para o capital, que passa a ter maiores dificuldades em realizar o

deslocamento através de seus ajustes espaciais e da colonização interna, resultando no

momento histórico privilegiado em que a ofensiva do trabalho tem plenas

potencialidades de superar e transcender o capital como modo de reprodução

sociometabólica.

Assim, em tempos de crise estrutural, o deslocamento das contradições fica

comprometido, porque agora ela afeta a totalidade do complexo social, em todas as suas

partes constituintes, do microcosmo ao macrocosmo, colocando em xeque a existência

do capital como modo de reprodução sociometabólica e possibilitando a janela histórica

para a sua substituição e superação por um complexo alternativo.

67

Harvey também destaca o problema da mobilidade do trabalho e afirma que a governabilidade para o

capitalismo contemporâneo depende da criação de autoridades supranacionais, tais como o NAFTA e a

União Européia, bem como de organismos multilaterais como o FMI, a OMC e o Banco Mundial e que o

trabalho também precisa atuar nas mais variadas escalas para fazer frente ao domínio do capital: [...] A

esquerda tem de aprender a combater o capital em ambas as escalas espaciais ao mesmo tempo. [...]

Refugiar-se na nação-Estado como o lugar estratégico exclusivo da organização e da luta de classes é

cortejar o fracasso (assim como flertar com o nacionalismo e tudo aquilo que ele envolve). Isso não

significa que a nação-Estado tenha se tornado irrelevante — na realidade, ela está mais relevante do que

nunca. Mas a escolha da escala espacial não é uma questão de “ou isto ou aquilo”, mas de “tanto isto

como aquilo” (HARVEY, 2006, p. 75).

224

Em relação a essa pesquisa, destaca-se que a partir dos anos 2000 as grandes

empresas transnacionais do setor de papel e celulose realizaram um processo de

reestruturação econômica, com base na transferência de setores florestais e de produção

de celulose dos países centrais para países localizados em áreas com condições

edafoclimáticas mais favoráveis à produção de biomassa, com destaque para o Brasil e,

especificamente, para a Bahia que detém as maiores taxas de produtividade do eucalipto

(44m3/ha/ano). Com a transferência desses setores para áreas periféricas, as empresas

conseguem aumentar a lucratividade através do baixo investimento relativo necessário

para formar os territórios produtores de madeira, uma vez que as terras são mais baratas

e também porque conseguem financiamentos públicos e isenção fiscal para realizar as

suas atividades, principalmente no setor de produção de celulose.

5.2 A precarização do trabalho no setor de papel e celulose

Considerando o processo global de reestruturação das empresas, as aquisições e

fusões de empresas diminuíram a concorrência no mercado mundial e também

contribuíram para aumentar a produção e reduzir os custos operacionais, bem como

proporcionaram a otimização da logística de transportes e comunicações, elevando

assim a taxa média de lucro. Nesse contexto, verificou-se na última década que a

maioria das empresas incorporou novas tecnologias poupadoras de trabalho, reduziu o

número de empregados diretos e aumentou a quantidade de terceirizados (Tabela 12),

como mais uma estratégia do capital rumo à taxa de utilização decrescente da força de

trabalho e aumento da lucratividade.

Tabela 12 – Grandes empresas do setor de papel e celulose: taxas de crescimento do

número de empregados e das vendas no período 2000/2010.

Empresa Taxa de crescimento (%) – 2000/2010

Nº de Empregados Vendas

INTERNATIONAL PAPER -45,9 15

STORA ENSO -38 11

UPM -33 39

NIPPON PAPER -15 11

OJI PAPER -5 14

SMURFIT KAPPA GROUP -4 8

Fonte: RISI/PPI, 2000 e 2010.

225

As empresas relacionadas são líderes no segmento de celulose e papel, com ação

global em vários países e os dados mostram que, através do processo de reestruturação

efetuado na década de 2000, as empresas conseguiram aumentar as vendas mesmo com

a redução do número de empregados diretos.

No Brasil, as maiores empresas também adotaram as estratégias de

reestruturação da produção, transferindo setores de produção florestal e de celulose para

áreas mais produtivas e com financiamentos públicos e isenção fiscal, bem como

reduzindo os custos com a força de trabalho, tanto pela contração do número de

funcionários diretos quanto pela terceirização, facilitada pelo avanço do projeto

neoliberal no país.

A Suzano, segunda maior empresa produtora de celulose do Brasil, com 17% da

produção, reestruturou seu quadro funcional e diminuiu os custos operacionais a partir

da redução dos empregados diretos e aumento dos terceirizados. Entre os anos de 2004

e 2010 a receita líquida da empresa cresceu 71%, saindo de R$ 2,6 bilhões para R$ 4,5

bilhões, ao mesmo tempo em que o crescimento do número de empregados cresceu

apenas 27%, de 3.425 para 4.352 no mesmo período, conforme dados da Figura 96:

Figura 96 – Suzano: Quadro Funcional 2004/2010.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados da SUZANO, Relatório Anual de

Sustentabilidade, 2004, 2007, 2010.

3425 3525

4352

5123

6010

8084

25 42 157

0

1.000

2.000

3.000

4.000

5.000

6.000

7.000

8.000

9.000

2004 2007 2010

Empregados

Terceirizados

Estagiários

226

Paralelamente, aproveitando a flexibilização das leis trabalhistas proporcionadas

pelo aprofundamento das políticas neoliberais no Brasil, a empresa aumentou em 58% o

número de empregados terceirizados e em 528% o número de estagiários. Estas ações

concorrem para a redução dos custos com a força de trabalho, uma vez que sobre a

terceirização e a contratação de estagiários não incidem os mesmos salários, benefícios

e condições de trabalho, configurando uma situação de precarização do trabalho.

Atualmente, apenas 34,6% do quadro funcional da Suzano são empregados regulares e

essa participação vem caindo ao longo do tempo.

Considerando a totalidade do quadro funcional para o ano de 2010, o somatório

da remuneração (salários, gratificações, comissões e abonos), 13º salário, férias e

encargos sociais compulsórios (INSS, FGTS e contribuição social) correspondeu a

apenas 9,2% da receita líquida.

A Fibria, a maior empresa produtora de celulose do Brasil, com 39% da

produção, também adotou as estratégias de reestruturação econômica, reduzindo o

número de empregados próprios e aumentando o total de terceirizados, conforme os

dados apresentados na Figura 97:

Figura 97 – Fibria: Quadro Funcional 2010/2012.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados da FIBRIA, Relatório Anual de

Sustentabilidade, 2012.

5.037

4.006 3.827

11.919

14.523 13.343

0

2.000

4.000

6.000

8.000

10.000

12.000

14.000

16.000

2010 2011 2012

Próprios

Terceirizados

227

Com relação ao número de empregados, em 2007, a Aracruz possuía 2.303 e a

Votorantim 2.855, totalizando 5.158 funcionários próprios. Três anos após a fusão

Aracruz/VCP, a Fibria destacou em seu Relatório de Sustentabilidade-2012 que possuía

3.827 funcionários próprios, uma redução de 25,9% no período. Nesse processo de

reestruturação, a empresa vem aumentando a participação de terceirizados que em 2010

era de 11.919 funcionários e em 2012 estava em 13.343. Assim, em 2012, a Fibria

contava com 17.170 empregados, sendo que apenas 22,3% eram funcionários próprios

da empresa, demonstrando o avanço da precarização do emprego no processo de

reestruturação efetuado para ter maior competitividade no mercado internacional e

maior lucratividade, notadamente, com a redução dos custos com a força de trabalho.

Considerando a totalidade do quadro funcional para o ano de 2012, o somatório

da remuneração (salários, gratificações, comissões e abonos), 13º salário, férias e

encargos sociais compulsórios (INSS, FGTS e contribuição social) correspondeu a 9,3%

da receita líquida.

Mesmo gastando menos com a força de trabalho, a produção de celulose da

Fibria saiu de cinco milhões de toneladas em 2010 para 5,3 milhões de toneladas em

2012, seguindo a receita de reestruturação das grandes transnacionais do setor que

defende os processos de aquisição/fusão de empresas e a redução dos custos com a força

de trabalho.

Na Bahia, as três empresas que operam no processo de fabricação de celulose

também apresentam predominância de terceirizados no quadro funcional, contrariando

as promessas originais de desenvolver a região e gerar emprego e renda, razões pelas

quais se justificariam os financiamentos públicos e a isenção fiscal concedidos pelo

Estado.

5.2.1 A Bahia Specialty Cellulose

A Bahia Specialty Cellulose pertence ao grupo transnacional Sateri Holdings

Limited e tem sua fábrica localizada no Complexo Industrial de Camaçari, com seus

ativos florestais espalhados por 15 municípios do Nordeste Baiano. A empresa tinha em

2003 uma capacidade instalada de produção de 115 mil toneladas anuais de celulose

dissolvida, que foi ampliada em 2008, por ocasião da implantação da segunda linha

industrial, que elevou a capacidade para 485 mil toneladas anuais.

228

A precarização do trabalho é evidenciada pela grande quantidade de

terceirizados no conjunto total de funcionários da empresa. Em 2009, do total de 2.747

empregados da BSC, apenas 633 (23%) eram do quadro próprio e 2.114 eram

terceirizados (77%), sendo que desse total de terceirizados 529 trabalhavam em

operações industriais e 1.585 eram trabalhadores do campo envolvidos nas operações

florestais. De acordo com a empresa, nas épocas de plantio das mudas clonais de

eucalipto, a contratação temporária de trabalhadores rurais pode chegar a 4.000 pessoas:

As at the end of 2009, Bahia Specialty Cellulose had 633 employees, of

which 526 work on our plant. In addition, the company contracted other staff

through third parties. These employees comprised 529 working in the

industrial plant and 1,585 working in the field. In the forestry base, we hire

temporarily up to 4,000 professionals during the planting season, which

generally occurs between April and July (BSC, 2010, p. 37).

Em 2012, o grupo Sateri faturou US$ 720,3 milhões e os custos com salários

foram de US$ 72 milhões, constituindo um percentual de 10% contra 28% de margem

de lucro EBITDA. Considerando apenas a BSC essa margem de lucro sobe para 40%

em função dos baixos custos operacionais na Bahia.

A área colhida de madeira em tora para papel e celulose nos 15 municípios do

Nordeste Baiano polarizados pela BSC variou de 31 mil hectares a 51 mil hectares, com

uma média de 40,8 mil hectares no período 2007/2011, envolvendo a ampliação da base

florestal para atendimento da expansão da produção de celulose na fábrica em

Camaçari, que recebeu uma segunda linha de produção em 2008. Nesses termos,

considerando a participação dos salários (10%), dos impostos (7,3%) e da contribuição

social (<1,0%) sobre o faturamento global da empresa e tendo em vista que a

eucaliptocultura é uma atividade que concentra terras e reduz as possibilidades de

reprodução da agricultura camponesa, constata-se que os benefícios e as facilidades

concedidos pelo Estado não se traduziram em geração significativa de emprego e renda

que beneficiassem a maioria das pessoas que residem no território, nem cumpriu as

promessas de desenvolvimento regional alardeada na época da implantação da fábrica e

dos territórios produtores de madeira.

Os 40,8 mil hectares utilizados pela eucaliptocultura no Nordeste Baiano seriam

suficientes para a agricultura camponesa criar 16,3 mil empregos na lavoura temporária

ou 13,1 mil empregos na lavoura permanente ou 6,2 mil empregos na pastagem,

contribuindo muito mais para a fixação das populações rurais e redução da concentração

fundiária, com a produção de gêneros agrícolas voltados para o abastecimento das

populações locais e regionais.

229

5.2.2 A Unidade Mucuri

A Unidade Mucuri pertence à Suzano e apresenta uma capacidade instalada de

produção de um milhão de toneladas de celulose, com atuação em 13 municípios do

Extremo Sul Baiano. Nos processos de implantação da fábrica e formação dos

territórios produtores de madeira na região, as comunidades receberam a informação de

que “seriam gerados milhares de empregos e que a vinda da indústria de celulose traria

o desenvolvimento e a melhoria da qualidade de vida para a população” (Pesquisa de

Campo, 2013).

Na verdade, a utilização de força de trabalho foi significativa apenas na época da

construção da fábrica em Mucuri, quando chegou a empregar 12 mil homens. Com o

início das operações industriais, em março de 1992, esse número foi bastante reduzido,

uma vez que a produção de celulose e várias etapas da produção de madeira são

poupadoras de força de trabalho. O relatório de sustentabilidade publicado anualmente

pela Suzano não traz as informações do quantitativo de funcionários por unidade fabril,

mas dados da CUT (2009) apontaram para a existência de 800 funcionários diretos

trabalhando nas dependências da unidade e pelo menos o dobro disso de trabalhadores

indiretos.

Tomando-se como referência a receita líquida da Suzano em 2010, que atingiu

R$ 4,5 bilhões, o lucro líquido correspondeu a 17%, os salários 9,2%, os tributos 7,7% e

a contribuição social apenas 0,35%. Além disso, do total de empregados da Suzano em

2010 (12.593) apenas 34,6% são do quadro próprio da empresa que se beneficia da

flexibilização das leis trabalhistas que permitem a terceirização e a precarização do

trabalho. Assim, não se sustenta o argumento de que a vinda de empresas para regiões

pobres gera empregos e renda e, por extensão, o desenvolvimento, uma vez que na

lógica do capital a prioridade não é desenvolver regiões e sim aumentar a produtividade,

explorando todas as potencialidades que os territórios possam ter, tanto do ponto de

vista das riquezas naturais quanto das facilidades concedidas pelo Estado.

A área colhida de madeira em tora para papel e celulose nos 13 municípios do

Extremo Sul Baiano polarizados pela Unidade Mucuri variou de 175 mil hectares a 254

mil hectares, com uma média de 206 mil hectares no período 2007/2011. Como a

eucaliptocultura precisa de 153,3 hectares para gerar um emprego, tem-se que foram

gerados 1.344 empregos com a expansão dos territórios produtores de madeira que,

somados aos 800 que trabalham na fábrica totalizam 2.144 empregos.

230

Caso esses 206 mil hectares fossem utilizados para a reprodução da agricultura

camponesa seriam criados 82.400 empregos na lavoura temporária ou 66.452 empregos

na lavoura permanente ou 31.212 empregos nas pastagens, além de contribuir para a

redução da concentração da posse da terra e evitar o crescimento exagerado da

população urbana.

5.2.3 A Veracel

A Veracel é uma joint venture das empresas Fibria e Stora Enso localizada no

município de Eunápolis e atua em dez municípios do Sul Baiano, com uma capacidade

de produzir 1,1 milhão de toneladas anuais de celulose. Da mesma forma que as

empresas BSC e Suzano, a vinda da fábrica da Veracel para o município de Eunápolis e

a formação dos territórios produtores de madeira em dez municípios do Sul Baiano

foram marcadas pelas promessas de desenvolvimento e geração de emprego e renda.

No entanto, a promessa de milhares de empregos só se verificou no pico da obra,

em 2004, quando foram gerados 11,5 mil empregos nas fases de preparação do terreno e

construção da infraestrutura física e instalação dos equipamentos. Com o início das

operações da fábrica em 2005, o número de empregados próprios da Veracel passou

para 739 e o de terceirizados 3.150, conforme informações apresentadas na Figura 98:

Figura 98 – Veracel: empregos gerados no período 2005/2012.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados da Veracel, Relatórios de

Sustentabilidade, 2005/2012.

739 741 725 764 695 715 745 705

3.150 3.133 3.134 3.258

2.445 2.517

2.898

2.640

0

500

1.000

1.500

2.000

2.500

3.000

3.500

2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012

Próprios

Terceirizados

231

Ao longo do tempo, enquanto a produção de celulose cresceu de 392 mil

toneladas em 2005 para 1,1 milhão em 2011(crescimento de 169%) e a receita líquida

aumentou de R$ 323,5 milhões para R$ 847,6 milhões no mesmo período (crescimento

de 162%), o quadro de funcionários foi reduzido em 6,3%, saindo de 3.889 em 2005

para 3.643 em 2011.

Considerando o período 2005/2012, a redução do número de funcionários foi

ainda maior, apresentando uma contração de 14%, sendo que do total de 3.345

funcionários da Veracel, apenas 705 (21,1%) são empregados próprios da empresa.

Já a participação dos salários e encargos sociais na receita líquida da empresa

que representavam 3,8% em 2005 caiu ainda mais em 2011, quando o pagamento dessa

rubrica ficou em apenas 1,9%.

Considerando o quadro funcional da Veracel em sua composição de cargos,

existe uma variação salarial muito grande entre o maior salário (R$ 42.520,00) e o

menor salário (R$ 2.235,00), conforme dados da Figura 99:

Figura 99 - Veracel: Empregados Próprios – 2012: Composição salarial por cargo.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados da Veracel, Relatório de

Sustentabilidade, 2012.

Os cargos de diretores e gerentes correspondem a 3% do total de funcionários,

mas percebem 16% do total da folha de pagamento e são ocupados por pessoas das

próprias empresas (Fibria ou Stora Enso) remanejadas de outros locais para atuar na

Veracel, com o argumento de que não existem pessoas na região que preencham as

232

especificidades necessárias para os cargos de diretoria e gerência. Dessa forma, o total

de empregos próprios criados pela Veracel está restrito aos cargos inferiores, totalizando

687 empregos, notadamente os funcionários operacionais que representam 79% do

quadro de empregados e recebem quase a metade de renda direcionada para o

pagamento de salários.

A Veracel não divulga informações detalhadas sobre a folha de pagamento dos

terceirizados, que totalizam 2.640 pessoas, representando 79% do quadro funcional

total, mas de acordo com o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de

Eunápolis – STTR (Pesquisa de Campo, 2013), a empresa paga salário mínimo aos

funcionários do viveiro e R$ 1.689,00 aos funcionários da colheita:

Um trabalhador da Fibria do Espírito Santo e de São Paulo, fábrica de

celulose do mesmo grupo da Veracel, ganha R$ 2,6 mil para trabalhar

operando uma máquina colheitadeira, enquanto um funcionário da Veracel

ganha R$ 1,8 mil fazendo a mesma coisa, explica um dirigente sindical

(V.A.O. – Diretor do STTR, 20 mar. 2013).

Além disso, o dirigente sindical explica:

O trabalhador da colheita fica várias horas em trânsito em função do

deslocamento da cidade até as fazendas, chegando a sair 4 horas da manhã e

só retornar as sete, oito horas da noite e que essas horas adicionais não são

computadas na folha salarial, resultando em uma jornada exaustiva de

trabalho, típica da precarização por terceirização (Pesquisa de Campo, 2013).

De acordo com o Relatório de Sustentabilidade da Veracel (2012), as 2.640

pessoas são contratadas por cerca de 50 empresas diferentes. Dessa forma, a empresa

reduz os custos com a folha de pagamento, na medida em que os salários pagos aos

terceirizados são inferiores aos recebidos pelos funcionários próprios, bem como impõe

a esses trabalhadores condições precárias de trabalho, não coerentes com o discurso de

empregabilidade, renda e desenvolvimento regional veiculados à época da implantação

no início da década de 2000.

Conforme as informações colhidas através de 32 questionários aplicados junto

aos trabalhadores do viveiro da Veracel em março de 201368

, todos consideraram muito

importante a vinda da Veracel porque gerou muitos empregos. Em resposta à pergunta

“Você considera importante o cultivo do eucalipto na região?”, as respostas mais

comuns foram:

- Sim, porque hoje estou trabalhando graças à Veracel!

- Sim, pela geração de empregos na cidade.

- Sim, porque mudou a vida de muitos pais de família que estavam sem

emprego!

68

Através de amostragem com erro amostral tolerável de 15% (TRIOLA, 1998).

233

- Sim, porque é um trabalho muito bom e gera muitos empregos (Pesquisa de

Campo, 2013).

Todos eles declararam utilizar equipamento de proteção individual (EPI) e

seguir jornada de trabalho diária de oito horas. Conforme os dados apresentados na

Figura 100, os salários variam de R$ 650,00 a 1.830,00:

Figura 100 – Viveiro da Veracel: Salários 2013.

Fonte: Pesquisa de campo, março de 2013.

A grande maioria dos trabalhadores do viveiro da Veracel percebe salário

mensal próximo a um salário mínimo e todos declararam que a vida mudou para melhor

com a vinda da empresa para Eunápolis. Essa avaliação revela o caráter individual de

percepção dos benefícios gerados pela empresa, alicerçado na justificativa pessoal de

estar participando das atividades de preparação das mudas clonais, como uma etapa da

base florestal do empreendimento da celulose no Sul da Bahia, notadamente em

Eunápolis. Não se questiona o fato de que foram prometidos milhares de empregos,

principalmente nas atividades de formação dos territórios produtores de madeira, que

envolvem o trabalho nos viveiros, o plantio, a manutenção e a colheita.

Apesar de todos os empregados do viveiro da Veracel se declararem bastante

satisfeitos com a empresa, contraditoriamente, no dia 18 de março de 2013 o Sindicato

de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Eunápolis (STTR) realizou um bloqueio

(Figura 101) no portão de entrada do Núcleo Florestal (viveiro) da empresa, localizado

na cidade de Eunápolis, com a participação dos trabalhadores do viveiro e da colheita e

40,0%

50,0%

10,0%

R$ 650,00

R$ 750,00

R$ 1.830,00

234

apoio da Federação dos Trabalhadores na Agricultura (FETAG), da Confederação dos

Trabalhadores na Agricultura (FETAG) e da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras

do Brasil (CTB).

Figura 101 – Greve dos funcionários da Veracel: março/2013.

Fonte: Pesquisa de campo, março de 2013.

A deflagração da greve por tempo indeterminado teve por objetivo a

reivindicação de aumento salarial para os trabalhadores do viveiro e da colheita,

defendendo os salários de R$ 750,00 e R$ 2.600,00, respectivamente. A greve contrasta

com as declarações dos trabalhadores nas entrevistas de campo e significa que eles não

estão tão satisfeitos assim com a empresa, uma vez que estão reivindicando melhores

salários e condições de trabalho e denunciando violações das leis trabalhistas cometidas

pela Veracel.

235

O trabalho terceirizado na manutenção dos plantios e nas colheitas é altamente

vantajoso para a Veracel, pois serve para impor aos assalariados o peso da precariedade

contratual e baixos salários. A não contratação direta pela empresa concorre para a

redução dos custos com a força de trabalho, uma vez que sobre a terceirização não

incidem os mesmos salários, benefícios e condições de trabalho, configurando uma

situação de precarização do trabalho.

Apesar das promessas realizadas na época do licenciamento ambiental, os

empregos gerados pela Veracel são muito poucos em função da alta mecanização do

processo produtivo. Conforme as informações apresentadas na Figura 102, em todas as

etapas do plantio, colheita e transporte até a fábrica, são utilizadas diferentes máquinas,

todas elas poupadoras de força de trabalho. No plantio, as máquinas além de fixarem as

mudas clonais de eucalipto no solo a uma profundidade padrão, também realizam a

adubação de nitrogênio, fósforo e potássio e aplicam um gel pré-hidradado para reter a

umidade nas raízes; Na colheita, as máquinas denominadas harvesters cortam,

descascam e dividem o tronco do eucalipto em toras de seis metros de comprimento

cada; Em seguida, entram em ação as máquinas forwarders, que empilham as toras de

eucalipto na beira da estrada para serem, posteriormente, recolhidas pelos caminhões

especialmente adaptados com três compartimentos que transportam a madeira até a

fábrica; Na fábrica, uma máquina denominada Kalmar 3026 descarrega o caminhão

com apenas três movimentos e faz o reempilhamento da madeira, que segue para os

picotadores, onde a madeira é cortada em pequenos pedaços que passam por peneiras

para selecionar os cavacos e seguem através de esteira rolante para o digestor, onde

serão cozidos e transformados em celulose.

A qualificação dos operadores de máquinas é realizada pelo SENAI, SETEC e

pelas empresas fabricantes. A Veracel paga aproximadamente 2,5 salários mínimos aos

operadores da colheita, que trabalham em máquinas automatizadas, equipadas com ar

condicionado e equipamentos de última geração, facilitando o trabalho do operador que

alcança grande produtividade. Considerando que apenas uma pessoa operando uma

máquina capaz de cortar, descascar e seccionar o tronco faz o trabalho de 100 homens

contratados pelo valor mínimo estabelecido por lei, a empresa economiza o pagamento

de 97,5 salários mínimos por máquina de colher. Assim, mesmo que esse operador

receba um valor acima do salário mínimo e trabalhe em ambiente climatizado, a mais

valia relativa extraída garante a alta lucratividade e como a mecanização atinge todas as

236

etapas de produção de madeira, desde o preparo do solo, plantio, manutenção, colheita e

transporte, o número de empregos gerados é muito pequeno, principalmente, quando se

analisa os milhares de hectares de terra imobilizados nas plantações de eucalipto que

poderiam gerar milhares de postos de trabalho nas lavouras temporária e permanente.

Figura 102 – Veracel: processo produtivo altamente mecanizado.

Fonte: Fotos selecionadas e organizadas pelo autor a partir de dados da Veracel, Ver

Agora, 2005; e Relatórios de Sustentabilidade, 2006, 2007, 2008 e 2010.

Dessa forma, tomando-se como parâmetro a receita líquida da Veracel em 2011,

que atingiu R$ 847,6 milhões, a margem de lucro EBITDA correspondeu a 25,7%, os

237

salários 1,9%, os tributos 9,2% e a contribuição social apenas 0,2%. Os dados mostram

a inoperância das políticas públicas de desenvolvimento que privilegiam a vinda de

empresas industriais como fomentadoras de emprego e renda e promotoras do

dinamismo econômico. Entre as três empresas que se instalaram na Bahia e foram

beneficiadas com financiamentos públicos e isenção fiscal, a Veracel foi a que

apresentou o menor retorno social, notadamente na baixa participação da folha salarial e

da contribuição social sobre o total de receita líquida.

A área colhida de madeira em tora para papel e celulose nos 10 municípios do

Sul Baiano polarizados pela Veracel variou de 57,7 mil hectares a 85,7 mil hectares,

com uma média de 78 mil hectares no período 2007/2011. Como a eucaliptocultura

precisa de 153,3 hectares para gerar um emprego, tem-se que foram gerados 509

empregos com a expansão dos territórios produtores de madeira que, somados aos 705

empregos próprios da Veracel totalizam 1.214 empregos.

Caso esses 78 mil hectares fossem utilizados para a reprodução da agricultura

camponesa seriam criados 31.200 empregos na lavoura temporária ou 25.161 empregos

na lavoura permanente ou 11.818 empregos nas pastagens, que seriam muito mais

efetivos na melhoria da qualidade de vida da população, garantindo território para a

reprodução da agricultura camponesa com produção de alimentos e maior povoamento

rural.

Nesse contexto, em todos os territórios produtores de madeira baianos

envolvendo o domínio das três empresas de celulose, o cultivo do eucalipto, ao longo

das últimas duas décadas, se tornou uma das principais atividades rurais e até mesmo a

principal atividade rural em alguns casos (Caravelas, Nova Viçosa e Santa Cruz

Cabrália), e, em todos os casos, superando os cultivos tradicionais das lavouras

temporária e permanente, diminuindo as oportunidades de reprodução camponesa.

Ao mesmo tempo, paralelamente ao crescimento do agronegócio do eucalipto

concentrador de terra e minimizador de emprego houve um revigoramento da luta

contra o capital, como expressão contraditória do processo de desenvolvimento desigual

e combinado desse sistema, tendo como principal destaque a luta dos movimentos

socioterritoriais nas duas últimas décadas.

Shanin (1980) resgata a expressão marxiana classe para si para enfatizar o

caráter político das lutas camponesas pela terra, segundo o qual as classes se definem

através da práxis e não por meio de sua definição analítica e, nesse sentido, quando os

238

camponeses engrossam as fileiras dos movimentos socioterritoriais e avançam sobre o

latifúndio capitalista através das ocupações e criações de acampamentos, eles estão

atuando, verdadeiramente, como classe social. A expansão do agronegócio do eucalipto

na Bahia aguçou o conflito capital X trabalho, como expressão contraditória da forma

desigual e combinada com que avança o capitalismo no campo.

Na análise de Raffestin (1993) em um território podem coexistir vários poderes

atuando ao mesmo tempo, em diferentes níveis hierárquicos e/ou em formas

sobrepostas, sobre o qual não incide apenas o poder do Estado ou das empresas, mas

também das organizações e até mesmo dos indivíduos, resultando em uma situação de

diferentes projetos territoriais em disputa, onde todos são atores sintagmáticos, ou seja,

produtores de territórios.

Assim, é importante analisar o processo de resistência camponesa frente ao

avanço da capital produtor de madeira e de celulose na Bahia, com destaque para os

municípios em que a eucaliptocultura obteve maior crescimento, expondo de maneira

mais explícita as contradições do desenvolvimento capitalista desigual e combinado e,

assim, convergindo para a eclosão do conflito entre capital X trabalho no campo baiano,

onde os sem terra arriscam a própria vida para participar das ocupações de fazendas,

criação de acampamentos e forçam o Estado a criar assentamentos rurais na região.

5.3 A Resistência Camponesa

Considerando que o avanço do capital através da expansão da monocultura do

eucalipto intensificou a concentração fundiária e alterou a base produtiva agrícola

regional, a produção camponesa foi minimizada, com rebatimentos na diminuição do

território disponível para a produção de alimentos, uma vez que o agronegócio do

eucalipto está voltado para a produção de mercadorias, notadamente, para o mercado

mundial, e a agricultura camponesa produz alimentos, prioritariamente, para a

sobrevivência familiar e, havendo excedente, para abastecimento do mercado interno.

Oliveira, A. (2007) destaca que o avanço do agronegócio no campo brasileiro

produz, contraditoriamente, um revigoramento da luta contra o capital por parte dos

camponeses que lutam em duas frentes, uma para se tornarem proprietários de terra e

outra para produzirem matérias-primas para a indústria e alimentos para a sociedade

brasileira, entendendo o campesinato como classe social e destacando a ação do MST:

239

É por isso que a luta pela terra desenvolvida pelos camponeses no Brasil, é

uma luta específica, moderna, característica particular do século XX. Dessa

forma, o século XX, foi um século por excelência na formação e

consolidação do campesinato brasileiro enquanto classe social. É por isso,

que este camponês não é um camponês que na terra, entrava o

desenvolvimento das forças produtivas impedindo, portanto, o

desenvolvimento do capitalismo no campo. Ao contrário, ele praticamente

nunca teve acesso a terra, é, pois, um desterrado, um sem terra que luta para

conseguir o acesso a terra. São no interior destas contradições que tem

surgido muitos movimentos sociais de luta pela terra, e com eles os conflitos,

a violência tem também, aumentado. O MST que nasceu dessas contradições

é, portanto, um movimento social moderno que faz da luta por direitos, a

essência de sua ação. Como a contrapartida do Estado não chega até eles, o

MST tem que lutar em todas as frentes para garantir aos camponeses

assentados e acampados o acesso a estes bens e serviços essenciais à

dignidade humana (OLIVEIRA, A. 2007, p. 152).

Martins (1986) também credita ao avanço do capitalismo no campo o

alastramento rápido e violento dos conflitos pela terra em todo o país, notadamente

contra as grandes empresas capitalistas, destacando a inviabilidade da reforma agrária

distributivista em resolver o problema:

[...] Comprando a terra, para explorar ou vender, ou subordinando a produção

de tipo camponês, o capital mostra-se fundamentalmente interessado na

sujeição da renda da terra, que é a condição para que ele possa sujeitar

também o trabalho que se dá na terra. [...] Nessas condições, que divergem

neste momento das condições clássicas de confronto entre terra e capital, as

tensões produzidas pela estrutura fundiária, pela chamada “injusta

distribuição da terra”, já não podem ser resolvidas por uma reforma dessa

estrutura, uma vez que não há como reformar a exploração capitalista que já

está completamente embutida na propriedade fundiária (MARTINS, 1986, p.

177).

Nesse sentido, a natureza contraditória do desenvolvimento capitalista

moderniza o campo, eleva a produtividade e a lucratividade para o capital, mas também

intensifica o antagonismo original com o trabalho, resultando em conflitos pela terra.

Nesses termos, o avanço da eucaliptocultura do eucalipto no território baiano

alterou a estrutura produtiva do campo, aumentando ainda mais a concentração da posse

da terra, reduzindo as terras disponíveis para a reprodução camponesa e, dessa forma,

contribuiu para a expulsão rural que tem rebatimentos importantes na elevação dos

índices de urbanização, notadamente nos municípios em que a atividade de produção de

eucalipto e de celulose ocorreu de forma mais intensa.

É importante ressaltar que a eucaliptocultura não encontrou um território

dominado pela agropecuária camponesa. Muito pelo contrário, o território baiano já se

mostrava dominado pelo latifúndio, com destaque para a pecuária de bovinos que, no

caso dos nove municípios analisados, predominava com uma variação de 84% a 95,5%

do total de terras utilizadas na agropecuária, de acordo com os dados do Censo

240

Agropecuário de 1985. De acordo com Eliane Oliveira, líder regional do MST, no

extremo sul, o enfrentamento que antes era com o latifundiário, agora é com as

empresas de celulose:

[...] Antes a gente enfrentava o latifundiário... Hoje, a empresa comprou todas

as terras do latifundiário, então a gente só tem ela mesma para tá

enfrentando... Assim a gente tem vários acampamentos e pré-assentamentos

nas terras da Veracel e, nas conversas a empresa fez muitas promessas, mas

não tem se empenhado a fazer o social na região. Talvez, por isso, também o

selo de exportação dela tá travado... Então, a gente pensa que devido ao

nosso enfrentamento e da necessidade da certificação eles tem chamado a

gente para resolver um pouco dos nossos problemas, que seria assentar todas

as famílias acampadas. E aí a nossa demanda é que as famílias permaneçam

no local onde elas estão acampadas e que essas áreas se tornem

assentamentos. Desde 2011, estamos em negociação com a empresa,

envolvendo também o INCRA e o governo estadual, mas até agora não temos

nada de concreto. A única certeza que temos é que vamos permanecer nos

acampamentos até que se resolva essa situação (E. O. – Dirigente Estadual do

MST, 19 mar. 2013).

Nesse contexto, os dados mais recentes da agropecuária baiana confirmaram o

grande avanço do agronegócio do eucalipto sobre as terras próximas às fábricas de

celulose, passando a dominar o campo em três municípios (Nova Viçosa, Caravelas e

Santa Cruz Cabrália), aonde chegou a superar a tradicional atividade de criação de

bovinos. As mudanças na estrutura produtiva do campo dos municípios localizados no

Sul Baiano foram maiores porque são justamente a Suzano Unidade Mucuri e a Veracel

que apresentam a maior capacidade de produção de celulose, superior a um milhão de

toneladas anuais cada uma e, dessa forma, pressionam mais o campo desses municípios

para pode realizar a produção de madeira em tora para papel e celulose. Na maioria dos

municípios analisados a eucaliptocultura se tornou a segunda maior atividade

econômica presente no campo, com exceção apenas de Inhambupe, onde o cultivo do

eucalipto ficou em terceiro lugar, perdendo para a pecuária de bovinos e para a lavoura

permanente.

Dessa forma, se já eram reduzidas as possibilidades de reprodução camponesa

na década de 1980, com as transformações proporcionadas pela entrada do agronegócio

do eucalipto no campo baiano a partir da década de 1990, a situação dos camponeses

ficou ainda pior, uma vez que o cultivo do eucalipto concentra terra e gera poucos

empregos no campo, notadamente nos territórios da BSC, da Suzano e da Veracel.

241

5.3.1 A resistência camponesa no território da BSC

Com relação ao território da BSC, a extrema concentração da posse da terra

coloca, de um lado, a agricultura capitalista detentora de muita terra e poucos empregos

gerados, e de outro lado, a agricultura camponesa com pouca terra e grande densidade

populacional, conforme pode ser visualizado na Figura 103:

Figura 103 – Território da BSC: Agricultura Familiar e Não Familiar: Número, Área e

Pessoal Ocupado (em %) – 2006.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados do IBGE – Censo Agropecuário,

2006.

Os dados mostram a resistência camponesa no seu embate histórico com a

grande propriedade rural, evidenciando uma situação de grande opressão no campo,

caracterizada pela desigual distribuição da posse da terra entre os estabelecimentos

agropecuários. Mesmo encolhida e oprimida pela grande propriedade, é a agricultura

camponesa (familiar para o IBGE) que apresenta o maior número de pessoal ocupado.

Em Entre Rios, por exemplo, o município em que a eucaliptocultura mais se expandiu,

os estabelecimentos não familiares representam apenas 26% do total, mas dominam

93% da área e geram apenas 55% dos empregos no campo. Os estabelecimentos

familiares, com somente 7% da área dão suporte para 45% do pessoal ocupado. Em

Alagoinhas e Inhambupe, os estabelecimentos familiares representam mais de 90% do

total e empregam a maioria das pessoas que trabalham no campo (94% em Alagoinhas e

87% em Inhambupe), mesmo ocupando a menor porção da área total (44% em

Alagoinhas e 22% em Inhambupe).

242

Nesse contexto, espremidos pela grande propriedade rural, os estabelecimentos

familiares proporcionalmente geram mais empregos em Entre Rios e, no caso de

Alagoinhas e Inhambupe, isso acontece em termos absolutos. Outra questão importante

a ser analisada é o avanço das relações de produção tipicamente capitalistas que

predominam nos estabelecimentos não familiares e que ocorrem em menor intensidade

nos estabelecimentos familiares, conforme dados colocados na Figura 104:

Figura 104 – Território da BSC: Assalariamento – 2006.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados do IBGE – Censo Agropecuário,

2006.

Nos estabelecimentos não familiares, quase a totalidade do pessoal ocupado é

assalariada, indicando a relação primordial do capital em dominar os meios de

produção, contratar força de trabalho, produzir riquezas e extrair o trabalho excedente.

No sistema camponês, a capacidade de suporte para a empregabilidade é maior porque

não funciona com base no assalariamento, mas na divisão do trabalho e repartição dos

seus produtos pelas famílias, que realizam a contratação apenas em época de colheita ou

quando as atividades de preparo, plantio e manutenção dos cultivos excedem a

capacidade de trabalho das famílias.

A extrema concentração do meio de produção terra nas mãos de poucos grandes

proprietários deriva do processo de expansão das relações capitalistas de produção no

campo que realiza o divórcio do camponês com seu substrato de sustentabilidade. Nesse

contexto, a resistência camponesa em lutar pela base de sua sobrevivência entra em

choque com a classe detentora dos meios de produção, produzindo conflitos pela posse

13,2 15,9

30,4

97,2

89,8 94,9

0

20

40

60

80

100

120

ENTRE RIOS ALAGOINHAS INHAMBUPE

% FAMILIAR

NÃO FAMILIAR

243

da terra que se exprimem em ocupações, acampamentos e manifestações urbanas e

rurais que mobilizam os camponeses, os proprietários, os movimentos sociais, a

sociedade civil e o Estado. De acordo com dados da Comissão Pastoral da Terra, entre

os anos de 1985 e 2012 foram registradas quatro ocupações de terra em Entre Rios, uma

ocupação de terra organizada pelo MST em Alagoinhas e um assassinato de camponês

em Alagoinhas no ano de 1990, demonstrando a existência de um campo em conflito

que se alimenta do processo desigual e combinado do capital.

5.3.2 A resistência camponesa no território da Suzano Unidade Mucuri

No território da Suzano Unidade Mucuri, as possibilidades de reprodução

camponesa são ainda menores do que no território da BSC, uma vez que a agricultura

capitalista domina, aproximadamente, 90% da área total, conforme os dados

apresentados na Figura 105.

Em Caravelas, mesmo com apenas 12,6% da área total, os estabelecimentos

familiares são responsáveis por ¾ do total de pessoas ocupadas no campo naquele

município. Em Mucuri e Nova Viçosa, a agricultura familiar se restringe a menos de

10% da área total, mas emprega a maior parte do pessoal ocupado na zona rural. O

território da Unidade Mucuri é o que apresenta a maior área de produção de madeira em

tora para papel e celulose na Bahia, com uma produção de 11,2 milhões de m3 (65% da

produção baiana), sendo que em Caravelas e Nova Viçosa a eucaliptocultura já se

tornou a principal atividade do meio rural. Nesse sentido, a expansão da

eucaliptocultura potencializou a eclosão de conflitos porque reduziu ainda mais a

disponibilidade de terras para a reprodução camponesa.

244

Figura 105 – Território da Suzano Unidade Mucuri: Agricultura Familiar e Não

Familiar: Número, Área e Pessoal Ocupado (em %) – 2006.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados do IBGE – Censo Agropecuário,

2006.

As informações sobre o assalariamento nos três municípios analisados (Figura

106) apontam para as diferenças nos dois sistemas de produção, revelando a

predominância das relações capitalistas de produção na agricultura não familiar, em que

mais de 90% das pessoas que trabalham são assalariadas.

Figura 106 – Território da Suzano Unidade Mucuri: Assalariamento – 2006.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados do IBGE – Censo Agropecuário,

2006.

Na agricultura não familiar o assalariamento é superior a 90% nos três

municípios analisados e, embora tenha o controle de aproximadamente 90% do

território não conseguem empregar nem a metade do pessoal ocupado no campo. Isso

3,6

13,7 18,6

93,8 90,9 96,5

0

20

40

60

80

100

120

MUCURI CARAVELAS NOVA VIÇOSA

% FAMILIAR

NÃO FAMILIAR

245

significa que o campo desses municípios está entregue ao domínio do latifúndio

capitalista, com destaque para a eucaliptocultura e para a pecuária de bovinos,

potencializando a eclosão de conflitos com os camponeses que querem a terra para

produzir alimentos e reproduzir o meio de vida camponês.

De acordo com a CPT, no período 1985/2012 foram realizadas sete ocupações

de terra em Mucuri e uma em Caravelas. Em 2012, o MST ocupou duas fazendas da

Suzano em Mucuri: a fazenda Conceição da Barra, com a participação de 30 famílias e a

fazenda Coração da Bahia, com 170 famílias. No geral, das oito ocupações, seis foram

organizadas pelo MST, que também arregimentou camponeses para estabelecer um

acampamento às margens da BR 101, nas proximidades de Mucuri em 2003,

envolvendo 350 famílias. Em Mucuri e Caravelas, os conflitos pela posse da terra

resultaram em dois assassinatos de camponeses, em 2010 e 2011, respectivamente.

5.3.3 A resistência camponesa no território da Veracel

No território da Veracel, assim como nos demais territórios analisados, a

disponibilidade de terras para a reprodução camponesa é bastante restrita, variando de

9,9% a 15,6% da área total, conforme os dados apresentados na Figura 107:

Figura 107 – Território da Veracel: Agricultura Familiar e Não Familiar: Número, Área

e Pessoal Ocupado (em %) – 2006.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados do IBGE – Censo Agropecuário,

2006.

246

Em Eunápolis e Porto Seguro, a maior parte do pessoal ocupado trabalha nos

estabelecimentos não familiares, mas proporcionalmente, a agricultura familiar gera

mais empregos porque possui uma área menor. No caso de Santa Cruz Cabrália, a

maioria absoluta do pessoal ocupado trabalha nos estabelecimentos familiares. O

território da Veracel respondeu por 22% do total da produção baiana de madeira em tora

para papel e celulose em 2011, sendo a segunda área mais importante da

eucaliptocultura na Bahia e, no caso de Santa Cruz Cabrália, a eucaliptocultura já ocupa

42 mil hectares, contra 19,3 mil hectares da pecuária de bovinos e 6,3 mil hectares de

lavouras. Em Eunápolis e Porto Seguro, a produção de madeira em tora é a segunda

atividade econômica mais importante do meio rural. Mesmo dominando mais de 80%

das terras, a agricultura capitalista emprega pouco porque o objetivo não é a

empregabilidade ou a repartição da produção com os verdadeiros produtores, mas a

exploração do trabalho excedente como forma de produção de riquezas a serem

apropriadas pelos detentores dos meios de produção. Por isso, predominam as relações

de assalariamento nos estabelecimentos não familiares, conforme dados da Figura 108:

Figura 108 – Território da Veracel: Assalariamento – 2006.

Fonte: Gráfico produzido pelo autor a partir de dados do IBGE – Censo Agropecuário,

2006.

15,7

13,8

20,8

79,9

93,7 94,0

0

10

20

30

40

50

60

70

80

90

100

SANTA CRUZCABRÁLIA

EUNÁPOLIS PORTO SEGURO

%

FAMILIAR

NÃO FAMILIAR

247

Nos municípios analisados, os estabelecimentos não familiares dominam mais

de 80% da área total e empregam de 45% a 62% do total do pessoal ocupado no campo

através de relações assalariadas de produção, em que o trabalhador rural é obrigado a

vender a sua única propriedade, a força de trabalho. Os dados retratam um campo

dominado pela grande propriedade rural, que espreme a população rural em territórios

cada vez menores e incapazes de garantir a sobrevivência adequada das variadas formas

camponesas de produzir, todas elas baseadas na repartição dos frutos do trabalho com a

terra e que foram impedidas da continuidade histórica pelo avanço das relações

capitalistas de produção no campo. A expansão do agronegócio do eucalipto nesses

municípios contribuiu para reduzir ainda mais o território camponês, alimentando o

processo de expulsão rural, tanto pela supressão de áreas camponesas quanto pela

redução da oferta de empregos no campo, potencializando os conflitos entre os

divorciados da terra e os detentores dos meios de produção.

De acordo com a CPT, entre os anos de 1985 e 2012 foram realizadas 36

ocupações de terra nos três municípios analisados, sendo 23 em Eunápolis, 10 em Porto

Seguro e três em Santa Cruz Cabrália, conforme os dados apresentados na Figura 109.

Nas 36 ocupações de terra realizadas no período 1985/2012 foram mobilizadas

mais de oito mil famílias nos três municípios analisados, notadamente em Eunápolis,

onde a resistência camponesa é mais organizada. Do total de ocupações, sete foram

organizadas pelo MST, cinco pela FETAG-BA, quatro pelos índios e duas pelo MLT.

Com relação ao enfrentamento com a Veracel, os sem-terra realizaram oito ocupações,

sendo seis em Eunápolis e duas em Porto Seguro.

Em Eunápolis, as fazendas da Veracel Celulose ocupadas foram: 1: fazenda Boa

Vista, em 31 de dezembro de 2005, com a participação de 120 famílias; 2: ocupação de

área da Veracel não denominada, em 15 de setembro de 2008, com a participação de 50

famílias organizadas pelo MLT; 3: fazenda Putumuju/Barrinha, em oito de abril de

2009, com a participação de 800 famílias organizadas pelo MST; 4: fazenda

Queimadinha, em dois de janeiro de 2009, com a participação de 400 famílias lideradas

pelo MLT; 5: nova ocupação da fazenda Putumuju/Barrinha em 21 de abril de 2010,

com a participação de 40 famílias lideradas pelo MST; e 6: fazenda Nova América, em

três de abril de 2011, com a participação de 400 famílias organizadas pelo MST. De

acordo com a CPT, o MST organizou em 2009 um grande acampamento com a

participação de 800 famílias na fazenda ocupada da Veracel denominada

248

Putumuju/Barrinha, sendo que, atualmente, o acampamento se transformou em pré-

assentamento e é denominado pelo MST Pré-Assentamento 25 anos do MST.

Figura 109 – Território da Veracel Celulose: Resistência Camponesa em três municípios

- 1985/2012.

Fonte: Mapa produzido pelo autor a partir de dados da CPT, 1985/2012.

Em Porto Seguro, as fazendas da Veracel Celulose ocupadas foram a fazenda

Água Fria, em oito de abril de 2004, com a participação de 3.000 famílias organizadas

pelo MST e uma área não denominada da Veracel em dois de abril de 2001, com a

participação de 250 famílias também lideradas pelo MST. Segundo a CPT, em 2003, o

MST comandou a formação de um grande acampamento às margens da rodovia

Eunápolis - Porto Seguro, com a participação de 1.350 famílias, resultando na criação

de dois assentamentos federais realizados pelo INCRA: Bela Vista/Movelar e Coroa de

Cabrália, ambos localizados em terras do município de Santa Cruz Cabrália.

No período 1985/2012 a CPT registrou três assassinatos nos três municípios

analisados, sendo de um trabalhador rural na fazenda Santa Luzia em Porto Seguro no

ano de 1985; de um índio pataxó em Porto Seguro no ano de 1990 e de um posseiro em

Eunápolis em 1990.

249

Apesar das primeiras ocupações de terra terem se iniciado em 1988, os primeiros

Assentamentos Rurais realizados pelo INCRA nos três municípios só começaram em

1992, quando foram assentadas 99 famílias no Assentamento Imbirussu de Dentro, em

Porto Seguro, ocupando uma área de 1.514 hectares. De 1992 até 18 de agosto de 2011,

data da última atualização da relação de projetos de reforma agrária do INCRA, foram

criados dez assentamentos federais, em quase onze mil hectares, beneficiando 549

famílias, conforme os dados apresentados na Figura 110:

Figura 110 – Território da Veracel Celulose: Assentamentos Rurais realizados pelo

INCRA.

Fonte: Mapa produzido pelo autor a partir de dados do INCRA, 2013.

Do total de dez assentamentos criados, a maior parte coube ao município de

Santa Cruz Cabrália, com seis assentamentos, numa área total de 6.502 hectares e

beneficiando 296 famílias; em seguida, foram criados três assentamentos em Porto

Seguro, numa área total de 3.154 hectares, beneficiando 191 famílias; em Eunápolis,

apenas um assentamento foi criado, com 1.309 hectares e concedendo título de

propriedade da terra para 62 famílias.

250

A ausência de informações detalhadas sobre esses acampamentos, pré-

assentamentos e assentamentos nos municípios analisados motivou a realização de

visitas in loco para realizar o levantamento de dados sobre a resistência camponesa em

Santa Cruz Cabrália, Eunápolis e Porto Seguro (Figura 111), com vistas ao

entendimento das estratégias adotadas pelo movimento social para enfrentar o grande

capital e combater o latifúndio eucaliptocultor/pecuarista.

Figura 111 – Território da Veracel Celulose: Resistência Camponesa: Locais Visitados.

Fonte: Mapa produzido pelo autor com base cartográfica do IBGE e dados da Pesquisa

de Campo, abril de 2013.

5.3.3.1 Assentamento Lulão

O Assentamento Luiz Inácio Lula da Silva – Lulão aparece cadastrado no

INCRA como PA Coroa de Cabrália, sob o registro BA0615000, criado em 21 de

dezembro de 2005 através de processo de desapropriação, ocupando uma área de

672,8627 hectares no município de Santa Cruz Cabrália que serviu para o assentamento

de 59 famílias. Atualmente, o assentamento permanece na fase de criação, quando o

INCRA transfere o imóvel rural ao beneficiário da reforma agrária em caráter provisório

e assegura aos assentados o acesso à terra, aos créditos disponibilizados pelo Incra e a

251

outros programas do governo federal. Nessa fase, os assentados assinam o Contrato de

Concessão de Uso (CCU). A titulação definitiva, com a respectiva liberação do

documento (escritura) da terra é garantida pela Lei 8.629/93, quando verificado que

foram cumpridas as cláusulas do contrato de concessão de uso e o assentado têm

condições de cultivar a terra e de pagar o título de domínio em 20 (vinte) parcelas

anuais.

O acampamento Lulão foi organizado pelo MST em 25 de março de 2003 e

arregimentou 1.350 famílias às margens da rodovia Eunápolis-Porto Seguro e, nesse

sentido, foram necessários dois anos e nove meses para que o Estado realizasse a

desapropriação de duas fazendas (Bela Vista/Movelar e Coroa de Cabrália) e criasse

dois Assentamentos: o Coroa de Cabrália, com 59 famílias assentadas e o Bela

Vista/Movelar com 83 famílias assentadas. Dessa forma, do total de 1.350 famílias

acampadas desde 2003, apenas 10,5% foram assentadas, fato que comprova a

insuficiência da política estatal de reforma agrária que contribui para a manutenção da

injusta distribuição da posse da terra que vigora nos três municípios.

Durante a pesquisa de campo, foram encontradas no Assentamento Lulão

(Figura 112) 60 casas, uma a mais do que o total registrado pelo INCRA. Elas foram

construídas em sistema de agrovila, onde a infraestrutura é composta por rede de água

encanada e energia elétrica, existência de uma escola do ensino fundamental (até o nono

ano) e posto de saúde. O assentamento dispõe ainda de campo de futebol, sede da

associação e trator. Em pesquisa de campo realizada no mês de abril de 2013, o líder do

MST responsável pelo Assentamento, o Sr. Antonio Pestana, destacou o processo de

construção das casas, os projetos em andamento e as carências do assentamento:

As 60 casas foram construídas com recursos do INCRA que disponibilizou

R$ 15.000,00 para a compra de material de construção e R$ 2.000,00 para o

pagamento da mão de obra. Conseguimos vários projetos com os governos

federal e estadual, na casa dos cinco milhões de reais, para trazer posto de

saúde, casa do mel, laticínio, ambulância, caminhão, trator completo, pontes,

estradas, cursos como piscicultura. O governo quer transformar o

assentamento em modelo de assentamentos dinâmicos69

, com produção

69

O projeto Assentamento Dinâmicos lançado pelo governador Jaques Wagner em três de dezembro de

2012 pretende transformar os assentamentos Nova Canaã, em Pindobaçu, no bioma caatinga; Ilha da

Liberdade, em Barreiras, no bioma cerrado; e Lulão I e II, em Santa Cabrália, no bioma mata atlântica,

em referência nacional de produção, elevando a renda mensal familiar em média de R$ 310,00 para R$

1.500,00. Nas palavras do governador, nós queremos dar à agricultura familiar a grandeza que ela

merece, mostrando que com planejamento, técnica e apoio nosso é possível melhorar as sementes, o

plantel, plantar mais, criar mais e aumentar muito a renda. Com recursos de R$ 17,6 milhões, o projeto

conta com a parceria da Sedir/Car, do Banco do Brasil, da Fundação Banco do Brasil, do Sebrae e dos

movimentos sociais. Os recursos serão investidos em ações de infraestutura, desde fornecimento de água

e luz até o apoio técnico para a produção (SEAGRI, 2012).

252

integrada ao mercado. Existe um projeto de agroindústria para fabricação de

compotas, de doce e de polpas, com financiamento do governo do Estado e

da Veracel. Temos problemas com a água porque o poço secou e o sistema

não tá funcionando e a CERB até o momento não veio resolver. Precisamos

de projetos de esgotamento sanitário e de pavimentação das ruas da agrovila.

Os assentados reclamam da poeira na época de sol e da lama na época de

chuva. Mas, com o tempo vamos conseguir realizar todos os nossos objetivos

(A.P. – Líder do MST no Assentamento Lulão, 24 abr. 2013).

Figura 112 – Fotos do Assentamento Lulão.

Fonte: Pesquisa de campo, março e abril de 2013.

Nesse sentido, é notável a influência do Governo (e da Veracel) em conduzir os

processos de produção do Assentamento Lulão, através dos financiamentos para a

construção da infraestrutura, dos serviços básicos, da instalação da agroindústria, da

promoção de cursos técnicos, entre outros, como forma de controlar o que, o quanto, o

como e para quem se produz, configurando uma situação de monopolização do território

que coloca o mercado e o capital como os definidores e controladores de todo o

processo produtivo dentro do assentamento.

Do total de 672,9 hectares do Assentamento Lulão, a maior parte é formada por

mata Atlântica (60%) e cerca de 30% é utilizada para a distribuição de lotes de 3,4

hectares para os 60 assentados, conforme dados destacados na Figura 113. Há ainda 56

hectares reservados para pastagem coletiva e nove hectares para as lavouras coletivas.

253

Figura 113 – Assentamento Lulão: Distribuição da terra – 2013.

Fonte: Pesquisa de campo, abril de 2013.

De acordo com o líder do assentamento, assim que os projetos de laticínio, de

produção de mel e da produção de compotas, doces e polpas estiverem funcionando de

forma efetiva, será necessária a incorporação de mais hectares de terra para alimentar o

processo produtivo.

Os principais cultivos do assentamento são café, feijão, mandioca, hortaliças,

banana, manga, graviola, cacau e goiaba. As principais criações são de gado bovino,

porco, cabra e galinha.

Conforme as informações colhidas através de 26 questionários aplicados através

de amostragem com erro amostral tolerável de 15% (TRIOLA, 1998), a grande maioria

das famílias assentadas pertence aos municípios de Porto Seguro (47%), Eunápolis

(28%) e Santa Cruz Cabrália (17%) e apenas 7% do total declararam que já foram um

dia proprietários de terra, mas tiveram que vender por causa das dificuldades

financeiras. Isso significa os assentados já eram divorciados da terra e detinham apenas

a posse da força de trabalho quando resolveram entrar no MST para lutar pela terra.

Dessa forma, sobreviviam como trabalhador rural nas lavouras e pastagens da região,

notadamente na colheita do café e também trabalhavam como servente de obras,

pedreiro, carpinteiro, jardineiro, pintor, etc. Após sete anos residindo e trabalhando nos

lotes, as famílias ainda percebem rendimentos baixos, em torno de apenas um salário

mínimo, de acordo com os dados apresentados na Figura 114:

30,3%

8,3%

1,3%

60,0%

Lotes

Pastagem Coletiva

Lavoura Coletiva

Mata

254

Figura 114 – Assentamento Lulão: Rendimento das famílias – 2013.

Fonte: Pesquisa de Campo, abril de 2013.

Assim, 88% das famílias sobrevivem com um salário mínimo obtido a partir da

venda semanal dos produtos cultivados nos lotes e, considerando a média de três

pessoas por família, está configurada uma situação de pobreza nos assentamentos:

É patrão, a vida aqui não tá muito boa, mas tá melhor do que antes. Aqui a

gente pode plantar uma mandioquinha, um feijãozinho pra comer, criar uma

galinha, comer seu ovinho... Tem a escola aí para os meninos. Pior já teve. O

ganho aqui ainda tá pouco e agora mesmo tem muita gente indo catar café

nas roça da região. Tenho fé em Deus que vai melhorar ainda mais e

agradeço muito ao movimento, porque se não fosse o MST nós tava aí jogado

no mundo, sem ter onde trabalhar e até passando fome (J.B.S – Camponês do

Assentamento Lulão, 24 abr. 2013).

Eles acreditam no aumento dos rendimentos e na melhoria da qualidade de vida

através da transformação do assentamento em Assentamento Dinâmico, com a

efetivação da agroindústria voltada para o atendimento das demandas de mercado,

notadamente o abastecimento de hotéis e Porto Seguro e firmando contratos com as

escolas da região para o fornecimento de gêneros para a merenda escolar. Do total de 60

famílias, 25 recebem o Bolsa Família do Governo Federal, variando de R$ 60,00 a R$

320,00. Além disso, existem 13 idosos aposentados no Assentamento e as famílias

consideram o rendimento das aposentadorias um providencial reforço de caixa no

orçamento apertado:

É bom porque o aposento cai todo mês certinho, você pode contar com ele

que vai tá lá, pode fazer o compromisso sem medo. Eu já imagino quando os

velhinhos faltar, mode que a gente já tá acostumado com eles e com o

dinheirinho que cai todo mês na conta pra gente poder comprar a mistura

(M.J.S. – Camponesa do Assentamento Lulão, 24 abr. 2013).

6,7%

88,3%

5,0%

até 0,5 SM

0,5 a 1 SM

1 a 5 SM

255

Assim, mesmo sobrevivendo em situação de pobreza, os assentados confirmam

que sua qualidade de vida aumentou com a entrada no MST e que a participação das

famílias na formação do acampamento em 2003 foi fundamental para a desapropriação

que originou o Assentamento Lulão. Segundo eles, ainda são filiados ao MST e

participam periodicamente das reuniões, assembleias e coletivas organizadas pelo

movimento, mas ressaltam também que não colaboram mais nas ocupações de terra nem

nas ocupações de prédios públicos.

Nesse sentido, a formação dos assentamentos nos moldes da reforma agrária de

mercado do Governo Federal não consegue alterar a configuração fundiária de extrema

concentração que predomina nos três municípios analisados, nem atender a demanda

existente de camponeses sem terra que engrossam as fileiras dos movimentos sociais

que lutam pela terra. Mas, por outro lado, os camponeses à medida que vão sendo

assentados e passam a ter títulos de propriedade da terra, mesmo que muito pequena e

insuficiente para atender às demandas das famílias, passam também a defender o

sistema de propriedade da terra e se afastam do processo de formação das ocupações de

terra e acampamentos que poderiam levar a novas conquistas e fortalecer os

movimentos sociais territoriais. Esses dois fatores acabam colaborando para a

manutenção do latifúndio eucaliptocultor/pastoril.

5.3.3.2 Assentamento Ojefferson

O Assentamento Ojefferson (Figura 115) aparece cadastrado no INCRA como

PA Bela Vista/Movelar, sob o registro BA0542000, criado em 28 de dezembro de 2005

através de processo de desapropriação, ocupando uma área de 1.469,046 hectares no

município de Santa Cruz Cabrália que serviu para o assentamento de 83 famílias. Assim

como o assentamento Lulão, está na fase de criação.

Essas famílias assentadas também são oriundas do Acampamento Lulão iniciado

em 2003 com a organização do MST. Na pesquisa de campo, constatou-se que o

Assentamento Ojefferson é formado por 75 famílias distribuídas em duas agrovilas,

uma com 40 famílias e outra com 35 famílias, sendo que o sistema de construção das

casas foi o mesmo adotado no Assentamento Lulão, com o INCRA financiando R$

15.000,00 para a compra de material de construção e R$ 2.000,00 para o pagamento da

mão de obra. As famílias utilizam em média sete hectares de terra para realizar os seus

cultivos de feijão, mandioca, café, hortaliças, banana, manga, graviola, cacau e goiaba.

256

As principais criações são de porco, cabra e galinha. Os assentados estão esperando a

delimitação oficial do INCRA para poder estabelecer as áreas coletivas de pecuária e

lavouras.

Figura 115 – Fotos do Assentamento Ojefferson.

Fonte: Pesquisa de campo, março e abril de 2013.

Todos os entrevistados condenaram a expansão do eucalipto na região, tanto

pela concentração de terras que se verifica nessa atividade quanto pela pouca geração de

emprego e também pela degradação ambiental:

A vinda da Veracel só trouxe miséria para o trabalhador rural, não gera

emprego e ainda mata o solo e seca a água. Muitas famílias que trabalhavam

nas lavouras agora estão morando nas cidades em condições precárias. Tinha

uma terrinha e não tava dando nada. Então, vendi e fui para a cidade, botei

um negócio, fali e entrei no MST para ver se conseguia um pedaço de terra

para plantar, que é o que sei fazer e para que fui criado. O governo tem de

apoiar o MST porque luta pelo pobre e tira o inchaço das cidades (A.P.M. –

Camponês do Assentamento Ojefferson, 30 abr. 2013).

No processo de coleta de informações junto aos assentados, ficou patente a

eficiência do discurso da reforma agrária de mercado pautado na criação de valor

agregado e na pluriatividade:

A nossa expectativa é muito boa... Com os projetos e cursos financiados pela

Fundação Banco do Brasil, Sebrae, INCRA, Veracel e pelo Governo vamos

poder comprar equipamentos agrícolas e industriais para agregar valor ao

nosso produto, como a agroindústria de polpas e compotas. Os cursos

também ajudam porque permite ganhar dinheiro com outras atividades:

artesanato, turismo, piscicultura, hotelaria, pintura, etc. A gente precisa

aprender a produzir mais, gastando menos para entrar no mercado e ganhar.

A agroecologia está valorizada e a gente quer produzir sem agrotóxico, trazer

257

a certificação para poder ganhar mais e competir no mercado (L.F.A –

Camponês do Assentamento Ojefferson – 30 abr. 2013).

De acordo com o responsável pelo Assentamento Ojefferson, o Sr. Valtamar

Caires, os rendimentos das famílias ainda são insuficientes e eles esperam os

investimentos governamentais para melhorar a qualidade de vida dentro do

assentamento:

Hoje nós temos 40 famílias assentadas na agrovila 1 e 35 famílias assentadas

na agrovila 2, sendo que não dispomos de escola e posto de saúde dentro do

assentamento e as pessoas precisam se deslocar até o Assentamento Lulão

para ter acesso à escola e ao posto de saúde. Na agrovila 1, cada casa tem a

sua cisterna para captação de água e o tratamento é feito com o hipoclorito

que o agente de saúde disponibiliza todo mês para as famílias. Já na agrovila

2, as famílias precisam carregar água na cabeça ou com o auxílio de animais.

O Governo do Estado perfurou um poço artesiano, mas a água deu imprópria

para o consumo humano e estamos esperando uma solução para esse

problema da água na agrovila 2. Atualmente, as famílias vivem com renda

em torno de um salário mínimo por mês, mas estamos animados com as

promessas de investimento de mais de R$ 4 milhões para melhorar a

infraestrutura, comprar equipamentos agrícolas e promover a capacitação

profissional, dentro do projeto Assentamentos Dinâmicos do Governo da

Bahia (V.C – Líder do MST no Assentamento Ojefferson, 29 abr. 2013).

A infraestrutura do Assentamento Ojefferson é bem inferior à apresentada pelo

seu irmão gêmeo, o Assentamento Lulão, que dispõe de rede física de água encanada,

escola e posto de saúde, mesmo com menor quantidade de família de assentados. Isso

decorre da posição estratégica do Assentamento Lulão, localizado às margens da

rodovia Eunápolis/Porto Seguro, de grande visibilidade para o governo. As duas

agrovilas do Assentamento Ojefferson ficam localizadas em uma área de acesso por

estradas de chão em que o trânsito de veículos e pessoas é restrito e, portanto, de menor

visibilidade, o que dificulta a ação governamental. Os dois assentamentos foram criados

na mesma época e ambos não possuem a infraestrutura de esgotamento sanitário e

pavimentação e, no caso do Assentamento Ojefferson, a sua posição geográfica

localizada em uma área de visibilidade restrita foi um fator que representou uma perda

de investimento do governo na infraestrutura de água encanada, bem como em educação

e saúde.

Conforme as informações colhidas através de 28 questionários aplicados através

de amostragem com erro amostral tolerável de 15% (TRIOLA, 1998), a grande maioria

das famílias assentadas pertence aos municípios de Porto Seguro, Eunápolis e Santa

Cruz Cabrália (Figura 116) e apenas 6% declararam que já foram pequenos

proprietários de terras no passado, mas que tiveram que vender porque precisaram de

dinheiro para prover a sobrevivência da família.

258

Figura 116 – Assentamento Ojefferson: Procedência das famílias – 2013.

Fonte: Pesquisa de Campo, abril de 2013.

Da mesma forma que o registrado no Assentamento Lulão, a maioria já dispunha

apenas da força de trabalho para vender quando ingressaram no movimento

socioterritorial e trabalhavam anteriormente como lavradores, vaqueiros e/ou

realizavam serviços temporários em atividades urbanas. Depois de sete anos residindo e

trabalhando nos lotes, as famílias ainda percebem rendimentos baixos, em torno de

apenas um salário mínimo, segundo dados apresentados na Figura 117:

Figura 117 – Assentamento Ojefferson: Rendimento das famílias – 2013.

Fonte: Pesquisa de Campo, abril de 2013.

45,3%

29,3%

20,0%

5,3%

Porto Seguro

Eunápolis

Santa Cruz Cabrália

Outros

8,6%

85,7%

5,7%

até 0,5 SM

0,5 a 1 SM

1 a 5 SM

259

Nesse contexto, 94% das famílias sobrevivem com renda mensal até um salário

mínimo, configurando uma situação de pobreza no assentamento Ojefferson que conta

também com 35 famílias beneficiárias no programa Bolsa Família do Governo Federal,

bem como existem 28 aposentados que ajudam no orçamento das famílias.

De acordo com o Sr. Valtamar Caires, existem assentados que ainda trabalham

nas cidades circunvizinhas como professores, enfermeiros, pintores, pedreiros, serventes

de obras, colhedores de café, carpinteiros, etc. Nesse sentido, a produção dos lotes ainda

não é suficiente para prover todas as necessidades da família e os assentados precisam

continuar trabalhando em outras atividades para complementar a renda. Atualmente, do

total de 1.469 hectares do assentamento Ojefferson, aproximadamente 525 hectares

(35,7%) estão divididos em 75 lotes provisórios aguardando a delimitação oficial do

INCRA.

Essa situação de insegurança jurídica diminui a produção dos lotes que teriam

capacidade para produzir muito mais, de forma que os assentados temem investir em

uma determinada área e receber o documento de outra. Isso demonstra o quanto a ideia

de posse está presente no imaginário das pessoas e como a política de assentamento

reforça o sistema do capital que se assenta na propriedade privada dos meios de

produção. Além disso, à medida que as famílias acampadas vão sendo assentadas, não

participam mais dos processos de ocupações organizados pelo movimento e,

paralelamente, não conseguem sobreviver apenas com os rendimentos oriundos dos

lotes, sendo necessário realizar migrações pendulares entre o assentamento e as cidades

circunvizinhas.

Nesse sentido, a vida do assentado mudou muito pouco, mas está um pouquinho

melhor do que antes, porque agora ele tem (ou terá) uma escritura de um imóvel rural e

a promessa governamental de investir milhões de reais nos assentamentos dinâmicos.

Enquanto isso, a grande propriedade rural continua intocada e a concentração fundiária,

inclusive, aumenta conforme os dados analisados sobre a distribuição das terras nos três

municípios a partir dos Censos Agropecuários e utilização da metodologia Gini.

5.3.3.3 Assentamento Milton Santos

O Assentamento Milton Santos localizado em Porto Seguro (Figura 118) é fruto

da ocupação realizada pelo MST em 08 de abril de 2004 quando ocupou a fazenda Água

Fria da Veracel com a participação de mais de mil famílias.

260

Figura 118 – Fotos do Assentamento Milton Santos.

Fonte: Pesquisa de campo, março e abril de 2013.

O assentamento ainda não foi oficialmente criado porque parte da área é

devoluta e há indícios de que a Veracel estava se apropriando dessas terras de forma

irregular. Enquanto aguardam a regularização das terras ocupadas, os assentados

produzem cacau, café, banana, mandioca, feijão, milho, hortaliças e frutas,

principalmente. Para poder vender a produção para o programa municipal de merenda

261

escolar, eles criaram uma associação e através dela receberam melhorias nas estradas

vicinais do assentamento e receberam implementos agrícolas.

Conforme as informações colhidas através de 38 questionários aplicados através

de amostragem com erro amostral tolerável de 15% (TRIOLA, 1998), a grande maioria

das famílias assentadas pertence aos municípios de Porto Seguro, Itabela e Eunápolis

(Figura 119) e apenas 9% declararam que já foram pequenos proprietários de terras no

passado, mas que tiveram que vender porque precisaram de dinheiro para prover a

sobrevivência da família e custear tratamento de saúde.

Figura 119 – Assentamento Milton Santos: Procedência das Famílias.

Fonte: Pesquisa de campo, abril de 2013.

Nesse sentido, a participação de 90% de famílias de assentados que nunca foram

proprietárias de terra revela o caráter concentrador da estrutura fundiária regional, em

que a apropriação injusta do meio de produção terra é de longa data, restando aos sem

terra apenas a venda da força de trabalho em atividades predominantemente temporárias

no campo ou na cidade. Atualmente, existem 250 famílias morando em 137 lotes de

nove hectares cada, ocupando uma área total de 2.400 hectares envolvendo os lotes, a

área coletiva e a mata, conforme os dados apresentados na Figura 120:

54,4% 33,2%

10,8%

1,6%

Porto Seguro

Itabela

Eunápolis

Outros

262

Figura 120 – Assentamento Milton Santos: Distribuição da terra – 2013.

Fonte: Pesquisa de campo, abril de 2013.

O principal produto cultivado na lavoura coletiva é o cacau e na pastagem

coletiva é realizada a criação de bovinos. Nos lotes, as famílias do assentamento Milton

Santos declararam um rendimento maior do que o registrado pelas famílias nos

assentamentos Lulão e Ojefferson, mas ainda caracterizando uma situação de pobreza,

conforme os dados informados na Figura 121:

Figura 121 – Assentamento Milton Santos: Rendimento das famílias – 2013.

Fonte: Pesquisa de Campo, abril de 2013.

51,4%

1,7% 1,3%

45,7%

Lotes

Pastagem Coletiva

Lavoura Coletiva

Mata

7,2%

78,0%

11,6%

3,2%

até 0,5 SM

0,5 a 1 SM

1 a 2 SM

2 a 5 SM

263

Nos assentamentos Lulão e Ojefferson apenas cerca de seis por cento das

famílias percebiam rendimentos acima de um salário mínimo, faixa que atinge 15% no

Assentamento Milton Santos. Mesmo assim, esse pequeno diferencial de renda

registrado no Assentamento Milton Santos não é suficiente para garantir o pagamento

das despesas mensais e do total de 250 famílias, 130 são beneficiárias do programa

Bolsa Família do Governo Federal, 15% recebem ajuda financeira de parentes de fora

do assentamento e existem 250 aposentados residindo nos lotes. Além disso, 80%

afirmaram que saem dos lotes para trabalhar na colheita do café e muitos deles

trabalham nas cidades realizando tarefas informais de pedreiro, servente de obras,

carpinteiro, vendedor do comércio, etc.

Com relação à infraestrutura do assentamento há energia elétrica, escola do

ensino fundamental, sede da associação, campo de futebol e posto de saúde, mas o

sistema de abastecimento de água ainda é precário, realizado através de barragens ou

cisternas. De acordo com a responsável pelo Assentamento, a Srª Neuza Biscoito existe

a previsão de instalação de um poço artesiano a ser perfurado pela CERB para

atendimento de 27 famílias em uma agrovila:

A gente já conseguiu um poço artesiano para atender a escola e o posto de

saúde, mas muitas famílias ainda sofrem com o problema da água porque

retiram a água de barragem ou cisterna e como o agente de endemias do

assentamento foi cortado, o hipoclorito não tá sendo disponibilizado para as

famílias, o que aumenta as possibilidades de contraírem doenças. Aqui no

Assentamento existem seis agrovilas e temos a promessa do Governo da

Bahia que a CERB vai construir um poço artesiano para uma agrovila agora e

depois para as demais agrovilas (N.B. – Líder do MST no Assentamento

Milton Santos, 22 abr. 2013).

Os depoimentos dos assentados revelam unanimidade no tocante à percepção

negativa sobre a vinda da Veracel para a região, tanto no aspecto da ocupação

desenfreada do território quanto na expulsão do homem do campo e da degradação

ambiental:

A vinda do eucalipto não teve nada de positivo, a não ser para ela mesma [a

Veracel] e para a prefeitura que recebe os impostos que a Veracel paga. Para

nós que trabalhamos na roça só restou o caminho da cidade e ingressar no

movimento para lutar por um pedaço de chão. Eles destruíram a mata para

plantar eucalipto, envenenam a terra com seus produtos tóxicos e seca os rios.

As pessoas são substituídas por máquinas e quando eles formam alguém é

para mão de obra para eles mesmo. Nada, nada, nada... Para nós não veio

nada! (J.D.A – Camponesa do Assentamento Milton Santos, 23 abr. 2013).

A maioria (70%) destacou que houve melhoria nas estradas porque a Veracel

realiza, constantemente, o patrolamento e o cascalhamento das vias e isso beneficia os

assentados que precisam se deslocar para resolver problemas nas cidades

264

circunvizinhas. Mas todos reconheceram a melhoria das estradas vicinais como um

benefício indireto, entendendo que esses investimentos realizados pela Veracel servem

para resolver o problema da sua logística de transporte e fazer chegar a madeira em tora

até a fábrica, no menor tempo e custo possíveis.

Todas as famílias são filiadas ao MST e participam das reuniões, encontros e

assembléias quinzenais realizadas pela organização, mas, assim como ocorre nos

assentamentos Lulão e Ojefferson, a ausência dos assentados no processo de novas

ocupações e mobilizações prejudica e enfraquece o movimento socioterritorial como um

todo. Os mais velhos declararam que estão sem forças para ficar deslocando de um

lugar para o outro e que os jovens não estão querendo mais ficar no campo:

Eu já batalhei muito nessa vida e ainda trabalho na roça, mesmo aposentado.

A mocidade de hoje só quer saber de festa, de computador, celular, comprar

roupa da moda, não quer saber de trabalhar no duro. Trabalhar na roça é

serviço pesado e muitos não têm coragem de enfrentar. Eu quando tinha a

idade deles já sabia fazer de um tudo na roça e esses meninos não sabem

fazer nada. Eu fico preocupado com isso porque é como o pessoal do MST

fala: se o homem do campo não planta, a cidade não janta!. Talvez com

essas coisas que eles estão falando que vai ter nos assentamentos pode ser

que eles fica, mas do jeito que tá eu acho difícil (M.J.B – Camponês do

Assentamento Milton Santos, 23 abr. 2013).

A fala dos assentados reflete a expressão de um discurso elaborado que

demonstra a eficiência do processo de formação crítica que o MST promove nos

acampamentos e assentamentos, através de seminários, manhãs de formação, oficinas e

encontros, onde são trabalhados temas relacionados à história do movimento, bem como

atividades de formação política, com ênfase na questão agrária brasileira e a

necessidade da realização da reforma agrária. Os assentados reconhecem o caráter

injusto da distribuição de terra no Brasil e entendem que a reforma agrária só virá com

muita pressão e mobilização, legitimando a atuação rigorosa do MST como um caminho

viável para forçar o Governo Federal a realizar as desapropriações e criações de

assentamentos rurais com garantia de infraestrutura de saneamento, energia elétrica,

acesso à educação, saúde, cultura e lazer, como forma de melhorar as condições de vida

no meio rural e assim, fixar o homem no campo e impedir o crescimento desordenado

das cidades.

5.3.3.4 Pré-Assentamento 25 Anos do MST

Nos registros da CPT, o Pré-Assentamento 25 anos aparece como uma ocupação

de terra na Faz Putumuju/Barinha da Veracel em 08 de abril de 2009, realizada pelo

265

MST, com a participação de 800 famílias. Em visita ao Pré-Assentamento, localizado às

margens da BR 101, a 22 km de Eunápolis, constatou-se a presença de 360 famílias

morando em barracos construídos com madeira de eucalipto em condições precárias,

sem existência de infraestrutura básica.

De acordo com um dos líderes do Pré-Assentamento, o Sr. Lucas Carvalho, o

processo de ocupação da fazenda da Veracel foi marcado por conflito com a empresa,

envolvendo mandado judicial de reintegração de posse, despejos e retomadas, no

período compreendido entre abril de 2009 e abril de 2010:

Iniciamos a ocupação em 8 de abril de 2009, com aproximadamente 800

famílias de sem terra, onde cortamos os pés de eucalipto e construímos os

barracos. Começamos também a cortar o eucalipto para plantar feijão, milho,

mandioca, hortaliças, etc. Em julho de 2009, a justiça decretou a reintegração

de posse e a polícia militar nos despejou à força do acampamento, destruindo

tudo o que a gente tinha construído. Ficamos perto da pista e depois de oito

dias retomamos a ocupação. Em agosto, enfrentamos nova repressão da

polícia militar e ficamos afastados por oito meses preparando uma nova

ocupação. Em abril de 2010 retomamos o acampamento e a Veracel desistiu

de pedir a reintegração de posse. O MST foi chamado pela empresa para

negociar porque ela precisa da certificação ambiental para poder exportar e o

conflito com os sem terra prejudica a liberação do certificado, de forma que

estamos esperando para breve a criação do assentamento (L. C. – Líder do

Pré-Assentamento 25 anos, 18 mar. 2013).

Após três anos residindo no local, as 360 famílias conseguiram trazer muitos

benefícios que elevaram a condição de acampamento para Pré-Assentamento, que conta

hoje com escola até o 9º ano do ensino fundamental, 2 caixas d’água de 5 mil litros,

igreja, 2 farinheiras, pocilga, campo de futebol, cozinha comunitária, horticultura,

tanques de piscicultura, galpão para reuniões, sede da associação, sala de informática,

secretaria da escola, biblioteca, parque infantil, casa de arte, estrutura reservada para o

posto de saúde e guarita, conforme informações apresentadas nas Figuras 122 e 123:

266

Figura 122 – Croqui do Pré-Assentamento 25 anos do MST.

Fonte: Croqui elaborado pelo autor a partir de dados coletados no campo em março e

abril de 2013.

267

Figura 123 – Fotos do Pré-Assentamento 25 anos do MST.

Fonte: Pesquisa de campo, março e abril de 2013.

O sucesso na metamorfose de acampamento para pré-assentamento e com uma

organização, diversificação econômica e cultural que não encontra paralelo em muitos

assentamentos já criados, fizeram do Pré-Assentamento 25 anos uma referência para o

MST. Além disso, a sua trajetória de enfrentamento com a Veracel, traduzida pela

resistência a dois mandados de reintegração de posse executados pela Polícia Militar em

268

2009 é utilizada como exemplo de união e persistência nas palestras motivacionais

realizadas pelo movimento. Essas histórias de resistência e os vários assentamentos

criados pelo INCRA na região são fatores que favorecem a arregimentação de mais

pessoas na luta pela terra, inclusive daquelas que não têm histórico de camponês:

Eu vim aqui fazer uma visita e acabei ficando. Fui sargento da PM, delegado

de polícia em Itagimirim e Santa Cruz Cabrália. Já fui importador, mas fali

por causa dos elevados impostos. Após uma vida na cidade, agora com 57

anos tomei a decisão de ir para o campo. Acho melhor. Eu vi que a cidade

cresceu muito e o eucalipto só trouxe miséria. Botou as pessoas para ir para a

cidade e como elas não sabem fazer nada lá, só vai roubar. Eunápolis tinha

uma grande feira e hoje não tem mais produtos daqui. Tudo vem de fora.

Pretendo utilizar as terras do meu lote para produzir mandioca porque quero

montar uma farinheira e só vou poder fazer isso quando o governo criar o

assentamento. Agora não dá porque eu não sei qual vai ser o meu lote e pode

ser que eu gaste o dinheiro num local e depois tenha que ir para outro (J.F.S –

Sem terra do Pré-Assentamento 25 anos, 20 mar. 2013).

Para o MST é o mais organizado Pré-Assentamento da região, sendo

considerado um modelo a ser seguido pelos demais acampamentos. Conforme as

informações colhidas através de 40 questionários aplicados através de amostragem com

erro amostral tolerável de 15% (TRIOLA, 1998), a grande maioria das famílias pertence

ao município de Eunápolis, com 342 famílias (95%) e o restante dividido entre Porto

Seguro, Itabela e outros municípios (Figura 124). Os resultados da pesquisa

demonstraram que apenas 5% já foram pequenos proprietários de terras no passado, mas

que tiveram que vender para tentar resolver problemas financeiros, significando que a

imensa maioria já era deserdada da terra bem antes da entrada do agronegócio do

eucalipto na região.

Figura 124 – Pré-Assentamento 25 anos do MST: Procedência das famílias.

Fonte: Pesquisa de Campo, março e abril de 2013.

95,0%

2,8% 1,4% 0,8%

Eunápolis

Porto Seguro

Itabela

Outros

269

Os rendimentos das famílias do Pré-Assentamento 25 anos do MST foram

superiores aos verificados nos Assentamentos Lulão e Ojefferson e semelhantes aos do

Assentamento Milton Santos. Isso se deve à organização do Pré-Assentamento que tem

uma produção diversificada, envolvendo a produção de gêneros agrícolas, piscicultura,

produção de farinha e artesanato. Mesmo assim, está caracterizada uma situação de

pobreza das famílias, uma vez que 90% sobrevivem com um salário mínimo ou menos

(Figura 125). Existem 40 famílias recebendo a ajuda do Governo Federal através do

Bolsa Família, com benefícios variando de R$ 60,00 a R$ 420,00. Além disso, existem

15 aposentados residindo nos lotes e algumas famílias recebem ajuda de parentes.

Figura 125 – Pré-Assentamento 25 anos do MST: Rendimento das famílias – 2013.

Fonte: Pesquisa de Campo, março e abril de 2013.

Mesmo diante da situação de pobreza, os pré-assentados ressaltam que a vida

deles melhorou com a entrada no movimento, pois têm um pedaço de terra para plantar,

um lugar para morar, escola para os filhos e a promessa da criação do assentamento,

onde poderão produzir mais e viver melhor. Considerando a precariedade existente no

Pré-Assentamento e a percepção de melhoria relatada pelos pré-assentados é possível

supor que o nível anterior de qualidade de vida deles era muito baixo, sendo extensível a

todos os outros trabalhadores rurais que habitam o campo brasileiro.

Nos depoimentos, os pré-assentados imaginam como será a nova vida quando

tiverem o título de propriedade da terra, com muitas expectativas em relação às

promessas do governo em criar os Assentamentos Dinâmicos, bem como discordam da

organização do assentamento em agrovilas:

8,9%

80,0%

8,9%

2,2%

até 0,5 SM

0,5 a 1 SM

1 a 2 SM

2 a 5 SM

270

Espero ter o meu pedaço de chão para poder plantar. A vinda da Veracel não

teve pontos positivos, ela ficou com a maior parte das terras, prometeu

muitos empregos, mas depois trouxeram as máquinas. Eu entrei no MST

porque acredito que a terra é para quem nela trabalha e porque se nós não

fornecer os alimentos para a cidade quem é que vai fornecer? A gente quer a

terra para produzir alimentos e se o governo cumprir o que tá prometendo vai

ser muito bom para nós... Só não concordo com esse negócio de agrovila

porque acho melhor ficar perto do roçado. O MST fala que é melhor porque

na agrovila fica todo mundo unido, mas nem sempre é assim. Tem vizinho de

todo jeito e antes só do que mal acompanhado. Tem mulher, criança, gente

que bebe e quando pensa que não já tá dando briga (D.M.S – Camponesa do

Pré-Assentamento 25 anos, 19 mar. 2013).

Esse negócio de agrovila só é vantagem para o governo porque fica mais fácil

pra por a água e a energia, mas para nós não presta não. A gente tano no

roçado tá lá vigiando o tempo todo e fica mais difícil pros esperto atacar as

plantação. Pode também fazer um galpão para guardar as ferramenta, um

puleiro para as galinha e um chiqueiro para os porcos. Como é que a gente

vai pra agrovila e deixa a roça sem ninguém. Assim fica difícil... (D.S.O -

Camponês do Pré-Assentamento 25 anos, 19 mar. 2013).

Nesse sentido, o MST vai ter muita dificuldade em implantar o sistema de

agrovilas no futuro Assentamento 25 anos, uma vez que os pré-assentados não querem

que a casa fique localizada numa vila distante dos lotes, pois isso dificulta a vigilância

das lavouras e das criações, bem como desfavorece o investimento na infraestrutura das

parcelas individuais de terra. Logicamente, a formação de agrovilas não é garantia da

integração e união das famílias em torno da causa camponesa e da luta por melhores

condições de vida, com a oferta de escolas, saúde e lazer nos próprios assentamentos.

Mas a fragmentação das famílias em lotes isolados e distantes dificulta ainda mais o

processo de integração e participação nas reuniões, encontros e oficinas, enfraquecendo

o movimento e a conquista de novos benefícios.

5.3.3.5 Acampamento Irmã Dorothy Stang70

Nos registros da CPT o acampamento Irmã Dorothy aparece como uma

ocupação de terra realizada na fazenda Nova América da Veracel Celulose, em três de

abril de 2011, com a participação de 400 famílias organizadas pelo MST, mas na

realidade, os primeiros movimentos se iniciaram na manhã do dia 28 de marco de 2011

70

A ocupação foi batizada de Irmã Dorothy Stang em homenagem à missionária estadunidense

naturalizada brasileira que lutava pelos direitos dos povos da floresta e foi assassinada com seis tiros no

Estado do Pará: É nosso respeito pela história de vida dela, por ter morrido brutalmente, sem que tivesse

medo. É como diz o ditado: os mortos governam os vivos. Cada um que morre na luta, cada um que

tomba diante do jugo do colonizador é tomado para nós como heróis que lutaram por um mundo mais

justo. Eles são lembrados nos nossos encontros, servem de inspiração para as nossas músicas, para a

nossa poesia. A mística do MST se alimenta disso e realimenta os nossos companheiros a persistirem

firmes na luta contra o latifúndio. O nosso lema é: enquanto houver tanta gente sem terra e tanta terra sem

gente a luta vai continuar (E. O. – Dirigente Estadual do MST, 19 mar. 2013).

271

(Figura 126), quando 1.200 mulheres, com idade entre 16 e 80 anos, avançaram com

facões e foices e derrubaram cerca de 30 hectares de eucalipto, conforme destaca

Gonçalves (2011, p.1):

Na noite do dia 27 para o dia 28 as mulheres chegaram de todas as partes do

Extremo Sul da Bahia no local, onde mais tarde viria a ser o acampamento

Irmã Dorothy Stang. Muitas delas carregavam os seus filhos e filhas como se

fossem para a melhor festa do planeta. E por volta das 4:00 horas, do dia 28,

antes mesmo que o Rei Sol surgisse no horizonte, centenas de árvores inúteis

do deserto verde de eucaliptos tombavam numa área de cerca de 8 mil

hectares da Veracel Celulose, a maior proprietária de terras do Estado da

Bahia. E foi assim durante os 10 dias que resistem no local.

Figura 126 – Criação do Acampamento Irmã Dorothy Stang.

Fotos: Adilson Fonseca.

Fonte: Radar 64, março de 2011.

De acordo com uma das lideranças estaduais do MST, Eliane Oliveira, da

Brigada Elias Gonçalves de Meura (Elias do Paraná), nos anos anteriores, eram

realizados encontros estaduais em Salvador, durante o mês de março, para as mulheres

do movimento, mas que em 2011, o MST resolveu promover ações mais diretas que

chamassem a atenção da sociedade e dos governantes:

Nossa intenção foi pressionar os governos estadual e federal a transferir parte

das terras da região para a reforma agrária, aproveitando as comemorações do

Dia Internacional da Mulher e a visita da presidente Dilma Rousseff que se

encontrava em Irecê, no dia 4 de março. São cerca de 2.000 famílias vivendo

debaixo de lonas pretas em sol escaldante, enquanto a região possui cerca de

700 mil hectares de eucalipto. A nossa meta é que o governo crie projetos

para as mulheres que trabalham no campo. Não adianta assentar sem que

sejam dados subsídios para a sustentabilidade das famílias (Eliane Oliveira –

Dirigente Estadual do MST, 19 mar. 2013).

Em visitas realizadas nos meses de março e abril de 2013, constatou-se a

presença de 168 famílias residindo no acampamento em condições precárias, sem

energia elétrica e habitando barracos de madeira. Segundo um dos líderes do MST no

272

acampamento, o Sr. Sivanildo Ramos, popularmente conhecido como Chocolate, o

processo de ocupação da fazenda Nova América realizado pelas mulheres do MST foi

pacífico e não teve confronto com a Veracel:

Já estamos aqui há mais de dois anos e não enfrentamos nenhuma ação de

despejo. Parece que a Veracel não quer se envolver em escândalo que possa

prejudicar seus negócios com as exportações de celulose. Já melhoramos

muita coisa no acampamento, mas ainda temos muito a fazer, como a energia

elétrica que já colocamos os postes e logo, logo vamos ligar na rede. Já

conseguimos duas caixas d’água e também vamos fornecer água encanada

aos companheiros. Nós lutamos pela terra e somos contra o latifúndio e as

pessoas que criticam o MST só vão saber a importância do movimento

quando sentir fome e perceber que ninguém come eucalipto. Hoje mesmo

está tendo no acampamento um estudo de formação, onde os companheiros

recebem informação sobre o MST e a luta pela terra no Brasil (S.R – Líder do

Acampamento Irmã Dorothy Stang, 24 abr. 2013).

No estudo de formação, o MST procura desenvolver a consciência política dos

acampados, através da exposição de temas relacionados à história das lutas no campo no

Brasil, destacando as Ligas Camponesas, a Guerrilha do Araguaia, os massacres de

Eldorado dos Carajás/PA e Corumbiara/RO, bem como enfatizam as pessoas que

morreram lutando contra o capital, como Chico Mendes, Dorothy Stang e integrantes do

MST. No encontro também são realizadas diversas atividades culturais voltadas para a

união do grupo, sempre dentro da mística do MST. As mulheres cantam paródias

musicais tais como Olê mulher rendeira, olê mulher rendar, saia do fogão e venha se

libertar e todos evocam palavras de ordem. Os acampados são acolhidos, integrados ao

movimento e aprendem mais sobre a história do grupo, reconhecendo a legitimidade da

luta pela terra no Brasil:

Eu acho bom porque a gente aprende mais sobre o movimento; fica sabendo

o tanto de pessoas que morreram lutando pela terra no Brasil, desde as épocas

antigas até hoje. Hoje, a gente já sabe que se ficar esperando pelos políticos

não vai vir nada porque eles também têm muita terra. O que a gente

conquistou até hoje foi com muita luta, na base da foice e do facão e vai ser

sempre assim: se a gente quiser vai ter que arrancar deles. Aqui mesmo no

acampamento Irmã Dorothy, foi a primeira vez que as mulheres tomaram a

frente na ocupação de terras. Quando a gente chegou aqui, ainda tava escuro

e só tinha o silencio dos eucaliptos. Aí foi a maior festa, a brincadeira das

crianças, o barulho do facão cortando as árvores para construir os barracos. A

gente já parou a BR, já ocupou a prefeitura e se for preciso a gente tem

coragem pra ir de novo, porque a gente tem certeza que vai conseguir nossa

terra (M.S.S – Camponesa do Acampamento Irmã Dorothy Stang, 19 mar.

2013).

Os acampados resistem a mais de dois anos em condições insalubres e os líderes

do MST afirmam que é preciso muita conversa e informação política para manter o

engajamento e a motivação das pessoas, porque a fase de acampamento é a mais difícil.

De fato, a infraestrutura do Acampamento Irmã Dorothy Stang ainda é muito precária,

sem água encanada ou energia elétrica e com apenas uma escola funcionando no turno

273

noturno para educação de adultos. As crianças precisam se deslocar para Eunápolis para

estudar. Possui duas farinheiras, campo de futebol, cisterna, espaço físico reservado

para o posto de saúde e duas caixas d’água para realizar o abastecimento futuro do

acampamento, conforme informações apresentadas nas Figuras 127 e 128:

Figura 127 – Croqui do Acampamento Irmã Dorothy Stang.

Fonte: Croqui elaborado pelo autor a partir de dados coletados no campo em março e

abril de 2013.

274

Figura 128 – Fotos do Acampamento Irmã Dorothy Stang.

Fonte: Pesquisa de campo, março e abril de 2013.

De acordo com as informações colhidas através de 35 questionários aplicados

através de amostragem com erro amostral tolerável de 15% (TRIOLA, 1998), as

famílias são procedentes de apenas dois municípios, com predominância de Eunápolis

de onde vieram165 famílias (Figura 129). Os resultados da pesquisa demonstraram que,

assim como em todos os outros locais visitados, apenas 3% já foram pequenos

275

proprietários de terras no passado, mas que tiveram que vender para tentar resolver

problemas financeiros, significando que a imensa maioria já era deserdada da terra bem

antes da entrada do agronegócio do eucalipto na região.

Figura 129 – Acampamento Irmã Dorothy Stang: Procedência das famílias – 2013.

Fonte: Pesquisa de Campo, março e abril de 2013.

Dos locais de resistência camponesa visitados, o Acampamento Irmã Dorothy

Stang foi o que apresentou a maior carência em infraestrutura e também onde as

famílias vivem com mais dificuldade, dependendo da ajuda financeira do Governo

Federal, do dinheiro dos aposentados e do auxílio de parentes. Os dados apresentados na

Figura 130 destacam o baixo rendimento das famílias:

Figura 130 – Acampamento Irmã Dorothy Stang: Rendimento das famílias – 2013.

Fonte: Pesquisa de Campo, março e abril de 2013.

98,2%

1,8%

Eunápolis

Belmonte

19,6%

71,4%

8,9%

até 0,5 SM

0,5 a 1 SM

1 a 2 SM

276

Pelos dados coletados, mais de 90% das famílias tem que realizar a subsistência

com base num orçamento mensal que não ultrapassa um salário mínimo. Do total de

168 famílias, quase a metade (80 famílias) são beneficiárias do Bolsa Família,

percebendo valores entre R$ 60,00 a R$ 400,00 mensais. Em função dos baixos

rendimentos e da incipiente produção agrícola do acampamento, cerca de 60 famílias

trabalham em Eunápolis, a 12 km de distância, nas funções de pedreiro, servente de

obras, enfermeira, merendeira, doméstica, zeladora de idosos e comerciário. Eles saem

de manhã, retornam no final da tarde e passam a noite no acampamento. De acordo com

o líder Sivanildo, uma das regras do MST é que os acampados duram no local e caso

essa determinação não seja cumprida sem justificação plausível, ocorre a substituição da

família.

A gente faz o controle diário das famílias para garantir a unidade do

movimento. No MST, são dois líderes por acampamento, um homem e uma

mulher. Eu e a companheira Anália recebemos capacitação para organizar e

liderar o acampamento. É raro acontecer, mas quando acontece de uma

família deixar de freqüentar as atividades programadas pelo MST, ou de ficar

vários dias sem pisar no acampamento, a gente vai, com toda a educação,

saber o que está acontecendo e explicar que as regras do MST são para o bem

de todos e para o sucesso da ocupação, que é a criação do assentamento. É

como a gente diz no movimento: enquanto houver terra sem gente e gente

sem terra, o movimento está lá para ajudar. Mas, para isso é preciso que

todos estejam firmes e fortes porque nada vem de graça e é preciso muita

força e coragem para morar nos acampamentos (S.R – Líder do

Acampamento Irmã Dorothy Stang, 24 abr. 2013).

Em todos os locais visitados, as condições de vida dos acampados/assentados

ainda estão muito distantes dos objetivos do próprio MST e, por extensão, dos

camponeses ou aspirantes a camponeses. Os rendimentos das famílias, mesmo nos

locais em que os assentamentos já foram criados, se mostraram abaixo da linha de

pobreza.

Os dados coletados através de pesquisa de campo demonstraram que mais de

85% das famílias sobrevivem com renda mensal de até um salário mínimo (R$ 678,00),

correspondendo a R$ 4,52 per capita/dia para uma família de cinco pessoas, que é a

média predominante nos acampamentos/assentamentos. Esse rendimento é inferior ao

estabelecido pelo Banco Mundial (2013) para a linha de pobreza, que é de US$ 2,00 per

capita/dia, calculado hoje (julho/2013) em R$ 4,54.

Em todos os locais visitados, tanto em acampamentos quanto em assentamentos,

a insuficiência da produção nos lotes leva a maioria das famílias ao deslocamento para

as cidades circunvizinhas ou para as fazendas da região, a fim de trabalharem em vagas

temporárias na construção civil ou no comércio e serviços em geral, no caso das cidades

277

e, notadamente, na colheita do café, no caso das fazendas. É bastante frequente o

otimismo entre os acampados/assentados. Eles acreditam muito no poder de negociação

do MST com o governo e esperam a vinda dos milhões de reais prometidos para

melhorar a infraestrutura e a produção dos assentamentos e, no tocante aos acampados,

a esperança comum é a criação dos assentamentos e a obtenção do título de propriedade

da terra.

Todavia, os pré-assentados e acampados desejam mudar a forma de organização

dos assentamentos, porque consideram o sistema de agrovilas improdutivo, devido ao

problema da falta vigilância nos lotes. Eles alegam que a agrovila só beneficia o

governo porque facilita a implantação dos serviços de água encanada e energia elétrica.

Querem que as casas sejam construídas nos próprios lotes, porque assim fica melhor

para fiscalizar as lavouras e as criações e também porque favorece maiores

investimentos na infraestrutura dos próprios lotes, uma vez que os assentados podem

construir galpões para armazenamento da produção e dos equipamentos e ferramentas

agrícolas. Nesse sentido, caso seja adotada essa nova forma de organização dos lotes, o

MST terá mais dificuldade em realizar suas atividades de integração das famílias, o que

enfraquece o movimento de luta pela terra.

Outra informação comum nos acampamentos/assentamentos foi a pequena

participação de camponeses no conjunto das famílias, sempre inferior a 10% do total.

Isso confirma a hipótese de que a Veracel instalou o seu território produtor de eucalipto,

prioritariamente, a partir da aquisição de médias e grandes propriedades, notadamente

de áreas que não eram anteriormente incorporadas ao processo produtivo, uma vez que,

no período de expansão da eucaliptocultura, houve avanço das áreas de criação de

bovinos e o recuo das lavouras se deu numa escala muito pequena para ser responsável

pelo grande avanço do eucalipto na região, em que se tornou a principal atividade do

campo de Santa Cruza Cabrália e a segunda maior atividade nos campos de Eunápolis e

Porto Seguro.

Nesse contexto, a grande maioria das famílias que residem nos

acampamentos/assentamentos é formada por pessoas que nunca possuíram a terra,

sendo proprietárias apenas da força de trabalho para vender aos empregadores nas áreas

de criação de bovinos, nas lavouras e em ocupações temporárias nas cidades

circunvizinhas. Eles não eram camponeses, mas trabalhavam no campo como

trabalhadores rurais e, com a vinda do agronegócio do eucalipto, as possibilidades de

278

emprego foram reduzidas e aumentou a concentração da terra, motivando as famílias a

ingressarem nas fileiras dos movimentos socioterritoriais e realizar o sonho de possuir

um imóvel rural.

Nas entrevistas com os acampados/assentados, a grande maioria destacou que a

vinda da Veracel não trouxe nada de positivo para eles, porque existe muita

mecanização e a promessa de milhares de empregos não foi cumprida. Alguns

entrevistados ainda relataram como pontos positivos a melhoria das estradas vicinais, a

qualificação de mão de obra e o pagamento de impostos, mas sempre com a ressalva de

que as estradas e a mão de obra servem para a própria empresa e os impostos pagos

beneficiam apenas a prefeitura, de forma que eles não acham justo que uma empresa

tenha tanta terra, produza tanta riqueza, enquanto os moradores da terra, os camponeses

e os índios, verdadeiros donos do território, vivam na pobreza, sem um pedaço de terra

para poder prover a sua existência.

Dessa forma, a expansão do agronegócio do eucalipto na Bahia, com os próprios

dados oficiais atestando a magnitude das transformações que foram realizadas na base

produtiva agrícola dos municípios analisados, contribuiu diretamente para a redução do

território disponível para a produção camponesa. O baixo desempenho das lavouras

temporária e permanente, associado à intensificação da concentração fundiária nos

territórios analisados, demonstra, claramente, que o movimento do capital em realizar

sua expansão para sair das crises representadas pela tendência da queda da taxa de lucro

intensifica ainda mais as contradições e os conflitos.

279

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

6.1 O CONFLITO IRRECONCILIÁVEL ENTRE O CAMPESINATO E O

AGRONEGÓCIO

A questão de se ir para além do capital depende da capacidade ou

incapacidade de os produtores associados criarem um novo “sistema

orgânico” — genuinamente socialista e sustentável: uma totalidade social

coerente que não apenas quebre o círculo vicioso da totalidade orgânica

autossustentada do capital mas que também coloque em seu lugar um

desenvolvimento irreversivelmente aberto. [...] A questão fundamental que

não pode ser evitada é o poder do capital e a necessidade de superá-lo. O

capital não entregará o poder aos representantes “democraticamente eleitos”

de algum partido anticapitalista simplesmente porque assim o determina a

etiqueta do comportamento democrático nos Estados que se definem como

donos de “tradições democráticas” (MÉSZÁROS, Para Além do Capital, p.

726-727).

A expansão do agronegócio do eucalipto no Brasil é fruto do movimento global

de reprodução ampliada do capital em direção aos territórios com condições

edafoclimaticas favoráveis à elevada produtividade de biomassa, onde os maciços

florestais atingem a idade de corte em períodos curtos de cinco a oito anos, contra

períodos de vinte a vinte e cinco anos nos países de origem dessas empresas. Além

disso, grandes extensões de terra podem ser adquiridas a um custo baixo e o Estado

financia grande parte do empreendimento industrial e florestal, cria e/ou melhora a

infraestrutura de transportes e comunicações e ainda flexibiliza as leis trabalhistas, que

permitem às empresas gastarem menos com a força de trabalho.

Conforme Marx demonstrou, no capitalismo o monopólio tende a prevalecer

sobre a concorrência e, nas últimas décadas, as maiores empresas do ramo de celulose e

papel realizaram uma reestruturação produtiva baseada em fusões e aquisições que

reduziram os custos com a força de trabalho, aumentaram a economia de escala com a

concentração das atividades e introdução de novas tecnologias poupadoras de mão de

obra no processo produtivo, bem como investiram em áreas de maior produtividade e

lucratividade situadas fora das zonas temperadas do hemisfério norte.

Santos (2002) caracterizou como coesão vertical (verticalidade) a tendência

atual do capital em expandir a sua ação para as regiões mais pobres, estabelecendo redes

entre pontos distantes entre si, mas unificados a partir da imposição externa de normas

utilitárias, parciais e egoísticas favoráveis aos grupos hegemônicos e destruidoras da

coesão horizontal (horizontalidade), que, por sua vez, pode ser reconstruída a partir da

280

rebeldia dos lugares, protagonizada pela ação política solidária da sociedade local na

luta anti-capital.

No Brasil, a indústria de celulose e papel necessitou do Estado para se

consolidar, sendo que o BNDES foi o órgão governamental que mais participou desse

processo, inclusive com o desembolso de recursos para empresas estrangeiras. A

política de financiamento executada pelo Estado na década de 1970/80 serviu de

estímulo à capitalização das empresas e considerando os recursos emprestados no

período 1975/87 apenas 26% foram amortizados, representando um grande calote aos

cofres públicos.

A territorialização das empresas de produção de eucalipto e de celulose na

Bahia, através da compra direta de terras (territorialização do capital) ou do controle

indireto do uso da terra a partir da subordinação da produção (monopolização do

território), teve sua expansão nos anos 1990 bem articulada ao processo de execução

dos projetos neoliberais preconizados pelo Consenso de Washington, que apresentava o

Estado interventor como o grande responsável pela crise e, nesse contexto, a solução

seria a diminuição do seu papel como agente econômico, realizando as reformas

necessárias para dar maior liberdade às empresas privadas e ao movimento do capital.

A expansão do agronegócio na Bahia contou com a participação de capitais

privados nacionais e transnacionais, bem como recursos provenientes do Governo

Federal através do BNDES. Além do apoio financeiro, várias esferas de governo

colaboraram alterando leis e simplificando procedimentos legais para agilizar o

licenciamento do agronegócio do eucalipto, com graves prejuízos para a população

regional e para o meio ambiente. A estratégia de implantação e desenvolvimento do

projeto de monocultura do eucalipto em grandes extensões de terra supra-municipal

passou pelo convencimento das populações e autoridades locais acerca dos benefícios

que a atividade geraria no tocante à produção de riquezas, criação de empregos,

melhoria da infraestrutura urbana, valorização das terras, melhoria das estradas vicinais,

etc.

A difusão dessas ideias na sociedade tinha o claro propósito de associar a

expansão capitalista no campo como sinônimo de desenvolvimento e modernização,

inaugurando uma fase de crescimento econômico que viria acompanhada de melhoria

da qualidade de vida no campo e na cidade.

281

Na realidade, enquanto a expansão do agronegócio da eucaliptocultura passou a

dominar o campo nos municípios mais polarizados, a produção de alimentos cresceu

pouco e até mesmo diminuiu em alguns casos nos três territórios analisados, com o

aumento da concentração fundiária em todos os municípios onde a formação dos

territórios produtores de madeira ocorreu de forma mais intensa, apesar das ações

corretivas do Estado em criar assentamentos rurais. O agronegócio do eucalipto contraiu

ainda mais o já reduzido território camponês, potencializando os conflitos e dificultando

a permanência da população no campo, num processo de expulsão rural que alimenta a

urbanização acelerada dos municípios polarizados.

No território da Bahia Speciality Cellulose, a expansão do agronegócio do

eucalipto em 15 municípios do Nordeste Baiano se deu, primordialmente, através da

incorporação de áreas anteriormente ocupadas pela pecuária de bovinos, de forma que

os territórios produtores de madeira passaram a representar a segunda maior atividade

econômica em domínio de terras para Entre Rios e Alagoinhas e a terceira maior para

Inhambupe.

No território da Suzano Papel e Celulose está localizado o maior território de

produção de eucalipto da Bahia distribuído em 13 municípios, sendo que a expansão

afetou bastante a estrutura produtiva dos municípios de Mucuri, Caravelas e Nova

Viçosa, com rebatimentos importantes na redução não somente da área de pecuária de

bovinos, mas, sobretudo, no encolhimento dos produtos tradicionais das lavouras

permanente e temporária. No caso de Mucuri e Nova Viçosa, além do avanço sobre

áreas onde antes se desenvolviam atividades agropecuárias, o processo de expansão

também incorporou áreas novas.

No território da Veracel Celulose a polarização atinge dez municípios e os

maciços florestais representam a segunda maior área estadual de produção de madeira

em tora para papel e celulose, sendo que a expansão se deu, prioritariamente, a partir da

incorporação de áreas novas nos municípios de Santa Cruz Cabrália, Eunápolis e Porto

Seguro, com denúncias de avanço em áreas do bioma mata atlântica e ocupação de áreas

devolutas. Em Eunápolis e Porto Seguro houve crescimento da população rural no

período 2000/2010 em decorrência da expansão das lavouras temporária e permanente e

da redução da área colhida dos territórios produtores de eucalipto. Já em Santa Cruz

Cabrália, onde a expansão da eucaliptocultura superou todas as atividades do meio rural,

atingindo 42 mil hectares em 2011, contra 19,3 mil hectares da criação de bovinos e 6,3

282

mil hectares das lavouras, a população rural apresentou um déficit de 3.099 pessoas no

período 2000/2011, configurando uma redução de 30%, apesar da ação corretiva do

Estado em criar seis assentamentos rurais.

Duas décadas após a instalação das primeiras plantações de eucalipto é possível

perceber o fracasso dessas políticas de desenvolvimento que apenas efetivaram o lado

econômico do projeto apresentado às populações locais, que viram diminuir as

oportunidades de trabalho no campo, a redução da oferta de alimentos, a contração no

território camponês e o rápido crescimento das cidades localizadas no território

eucaliptocultor.

Isso ocorre porque dentro da lógica do capital é impossível realizar a redução

das desigualdades sociais e espaciais, pois elas fazem parte do sistema e representam

uma condição básica para a sua existência e reprodução. Segundo Smith (1984, p. 213):

[...] O subdesenvolvimento, como o desenvolvimento, ocorre em todas as

escalas espaciais e o capital tenta se movimentar geograficamente de tal

maneira que continuamente explora as oportunidades de desenvolvimento,

sem sofrer os custos econômicos do subdesenvolvimento. [...] O capital busca

não um equilíbrio construído na paisagem, mas um equilíbrio que seja viável

precisamente em sua capacidade de se deslocar nas paisagens de maneira

sistemática.

Assim, não é objetivo das empresas realizar o desenvolvimento ou a

modernização em direção à redução das disparidades sociais e espaciais e, mesmo que

fosse esse o objetivo, seria impossível dentro do sistema do capital. Essa intenção existe

apenas no plano do discurso como estratégia de obter o consentimento da sociedade

local acerca do projeto de territorialização do agronegócio do eucalipto, consoante o

atual projeto de ampliação para incorporar mais 170 mil hectares em 17 municípios

baianos das regiões Sudoeste, Litoral Sul e Extremo Sul. As vantagens comparativas da

região, relacionadas ao potencial hídrico, climático e edáfico que puderam ser inseridas

no processo de mundialização do capital a partir das reformas neoliberais dos anos

1990, representam o verdadeiro motivo da vinda dessas empresas que, nessas

condições, conseguem uma redução do tempo de giro do capital (HARVEY, 2005)

proporcionada pela elevada produtividade, uma vez que na Bahia os maciços florestais

apresentam a maior produtividade do planeta.

O discurso ideológico recebe uma ancoragem científica para demonstrar que o

cultivo de eucalipto pode ser economicamente viável, ambientalmente correto e

socialmente justo. No entanto, em função dos defeitos estruturais do sistema

sociometabólico do capital oriundos da ausência de unidade entre produção e controle,

283

produção e consumo e produção e circulação (MÉSZÁROS, 2011), ocorre,

necessariamente, uma fragmentação que assume a forma de antagonismos sociais

impossíveis de serem resolvidos no âmbito do capital.

No quesito economicamente viável a grande quantidade de capitais investidos

garante o alcance desse objetivo, inclusive com enorme participação do Estado na

liberação de recursos públicos a custos baixos e prazos longos, concessão de benefícios

fiscais, construção da infraestrutura de transportes e comunicações, qualificação de mão

de obra e flexibilização das leis trabalhistas e ambientais. O apoio incondicional do

Estado foi fundamental para a realização do agronegócio do eucalipto em todas as suas

fases: aquisição de terras férteis para o cultivo de eucalipto; melhoria e construção de

estradas; melhoria e construção dos terminais marítimos; aquisição de equipamentos;

construção da fábrica, etc.

Com relação ao quesito ambientalmente correto, o agronegócio do eucalipto é

bastante discutível. Em primeiro lugar, a ideia de respeito aos recursos naturais e

conservação da biodiversidade quando se trata de uma monocultura não corresponde à

realidade porque os monocultivos, independentemente da espécie cultivada, não

permitem a manutenção de um ambiente equilibrado (ecossistema); Em segundo lugar,

não é ambientalmente correta uma atividade que avança sobre biomas protegidos como

a mata atlântica e incorpora terras devolutas, conforme denúncias do Ministério Público

que redundaram em condenação da Veracel, em 2008, sendo obrigada a pagar 20

milhões de reais por dano ambiental; Em terceiro lugar, não é ambientalmente correta

uma atividade que utiliza o correntão para destruir os últimos remanescentes florestais

da mata atlântica na Bahia, quando o uso dessa técnica brutal de desmatamento já foi

banido do meio científico; Finalmente, não pode ser ambientalmente correta a ação

leviana dos apologistas do agronegócio do eucalipto, inseridos nas diversas esferas de

governo, em alterar, deliberadamente, as leis ambientais para facilitar o licenciamento,

bem como deixar de observar, com rigor, os parâmetros legais que balizam a atividade

no Estado.

No quesito socialmente justo, o agronegócio do eucalipto fica no plano da

retórica do desenvolvimento e da geração de empregos, sem correspondência com a

realidade. Em primeiro lugar, a ideia de respeito aos trabalhadores com melhoria da

qualidade de vida da comunidade local não procede quando se verifica que as melhores

terras e a maior quantidade das terras estão nas mãos das grandes empresas

284

nacionais/internacionais que, dentro da lógica da taxa de utilização decrescente,

procuram mecanizar a produção e gastar pouco com o pagamento da força de trabalho;

Em segundo lugar não é socialmente justa uma atividade que, ao longo do tempo,

aumenta a base florestal e a aquisição de terras, duplica a capacidade de produção e a

geração de riquezas e, paralelamente, utiliza-se das práticas de terceirização e

precarização do trabalho para economizar com força de trabalho e maximizar a

lucratividade; Em terceiro lugar, não é socialmente justa uma atividade que monopoliza

a terra, diminui o território de reprodução camponesa, gera uma riqueza crescente ano a

ano e, a despeito do aumento da lucratividade, movimenta-se no sentido da redução do

quadro de empregados, tanto próprios quanto terceirizados; Em quarto lugar, foi

desmascarado o discurso veiculado na época da implantação do agronegócio do

eucalipto, segundo o qual as fábricas de celulose injetariam bilhões de reais na

economia regional melhorando a qualidade de vida das comunidades. Com efeito, os

bilhões de reais foram investidos e continuam proporcionando altos lucros para as

empresas, mas no tocante à tão propalada contribuição social, os dados mostraram a sua

inoperância e incapacidade de alterar a qualidade de vida das comunidades, uma vez

que essa contribuição não chega a meio ponto percentual da receita líquida gerada pela

atividade. Finalmente, dentro do sistema do capital, não existe a possibilidade de uma

atividade produtiva ser socialmente justa, porque na base do processo está a propriedade

privada dos meios de produção e a extração de trabalho excedente, onde a riqueza

socialmente produzida é objeto de apropriação restrita das empresas capitalistas.

Não é possível melhorar a qualidade de vida da população local se aumenta o

monopólio privado sobre os meios de produção, no caso específico o meio de produção

terra. Não é possível melhorar a qualidade de vida da população local se a reorientação

do uso da terra contribui para a diminuição da oferta de empregos no campo, para a

queda na produção de alimentos e na intensificação do processo de expulsão rural.

Nestes termos, a afirmação das empresas sobre desenvolver suas atividades buscando a

melhoria da qualidade de vida e compartilhando localmente os benefícios da atividade

econômica não encontra correspondência com a realidade.

Porto-Gonçalves (2006, p. 377-378) acrescenta que na mundialização do capital

houve a transferência de empresas industriais e agrícolas que consomem muita matéria-

prima, energia, terra e fotossíntese, inaugurando uma nova geografia mundial dos

proveitos e dos rejeitos em que se exporta o proveito para os mercados centrais e os

285

países produtores ficam com o rejeito, que causa poluição, empobrecimento genético e

desequilíbrio hídrico:

A mesma lógica pode ser observada na transferência de indústria de papel e

celulose para o Terceiro Mundo, sobretudo para os países tropicais. São

indústrias altamente poluidoras que, além disso, se beneficiam (1) de terras

abundantes e baratas, (2) da maior incidência da radiação solar, enfim, da

fotossíntese abundante nas regiões tropicais [...] e, mais ainda, (3)

relativamente próximos ao seu consumo produtivo. Os rejeitos ficam por

aqui, assim como a perda de diversidade biológica e, no caso brasileiro, perda

também de diversidade cultural.

Para Smith (1985, p. 213) o que se universaliza são as forças produtivas e não o

desenvolvimento uniforme, sendo esse desenvolvimento desigual e combinado, onde o

capital se movimenta para as áreas de alta taxa de lucro:

[...] O subdesenvolvimento de áreas específicas eventualmente conduz

precisamente àquelas condições que faz uma área altamente lucrativa e

suscetível de rápido desenvolvimento. [...] O capital tenta fazer um “vaivém”

de uma área desenvolvida para uma área subdesenvolvida, para então, num

certo momento posterior voltar à primeira área que agora se encontra

subdesenvolvida.

Assim, não é objetivo do capital desenvolver regiões, mas, no plano ideológico,

a ação de instalação de fábricas desse porte precisa ser bem executada e ter caráter

científico para convencer as populações nas audiências públicas de lançamento dos

projetos de expansão da atividade de produção de eucalipto e de celulose. O capital não

procura um equilíbrio espacial, mas como afirmou Marx no Manifesto Comunista “cria

um mundo à sua imagem e semelhança” graças a sua capacidade de se movimentar nos

diferentes territórios pela busca da alta taxa de lucro.

As distorções que surgem da fragmentação da produção e do consumo precisam

de uma ação corretiva do Estado (MÉSZÁROS, 2011) que atua no sentido de impedir

que os antagonismos cresçam a tal ponto de implodir o sistema. No âmbito das

atribuições do Estado estão as políticas públicas de redução das disparidades regionais,

o provimento dos serviços públicos, da infraestrutura, da seguridade social, a regulação

das atividades econômicas e o gerenciamento de crises. No entanto, há um limite para

essa ação representado pelas determinações estruturais do próprio processo de

reprodução do capital, que necessita, fundamentalmente, da separação entre

produção/controle/consumo/circulação.

Os autores que defendem o desenvolvimento coordenado pelo Estado capitalista

(SACHS, 1995; ARAÚJO, 2000; FURTADO, 1983) não consideram como estruturais

os problemas representados pelas desigualdades sócioespaciais, mas como uma questão

286

conjuntural capaz de ser resolvida pelo Estado, entendido como um organismo neutro

que tem a função de frear a exploração capitalista, imprimindo-lhe uma face humana.

Da mesma forma, os defensores do desenvolvimento via agronegócio

(MARSDEM, 1989; MULLER, 1986; SILVA, 1999; SCHNEIDER, 2003;

KAGEYAMA; HOFFMANN, 2000; ROS FILHO, 1994), também acreditam na

necessidade de se modernizar a agricultura brasileira nos parâmetros do agronegócio,

com a coexistência de um Estado reformista regulando as atividades no meio rural,

cuidando do bem-estar social e qualificando a mão de obra para poder se integrar ao

circuito produtivo do capital. Para esses autores, o problema da concentração fundiária

não atrapalha o processo de melhoria da qualidade de vida das populações que

trabalham no campo, sendo necessário apenas que as classes trabalhadoras atuem junto

ao Estado para garantir os seus direitos políticos de participar dos frutos do progresso

técnico implantado no meio rural.

Na realidade, o que se verifica, efetivamente, nas regiões em que o cultivo do

eucalipto foi implantado há mais tempo é que as expectativas criadas não foram

atendidas e os dados do próprio governo apontam para a redução da produção de

alimentos e de empregos no campo, com crescimento desordenado das cidades onde a

população expulsa do campo passa a morar em assentamentos precários, desprovidos de

infraestrutura urbana adequada e baixas condições de habitabilidade.

As ideologias do desenvolvimento e da modernidade são estratégias do capital

para continuar seu processo de reprodução ampliada pelo mundo, fazendo acreditar que

a vinda de grandes empresas representa a inserção do lugar no mundo globalizado e que

a entrada de investimentos produtivos é capaz de melhorar a qualidade de vida de todos

que ali moram.

Conforme a análise de Santos (2007, p.70) que resgata o pensamento de

Gramsci, o desenvolvimento é uma estratégia utilizada pelos prepostos do capital para

obter o consentimento comum a projetos de interesses articulares e, como tal, funciona

como um cimento social entre as diferentes classes sociais:

A ideologia do desenvolvimento, enquanto um conjunto relativamente

consistente de ideias que dariam conta de constituir a meta coletiva mais

legítima ou como nas palavras de Gramsci, a ideologia como um cimento

social, responsável por alianças entre grupos antagônicos, garantiu a

propagação do progresso técnico. Este foi sendo engendrado pelo atraso

histórico das sociedades tidas como de desenvolvimento tardio.

287

Segundo Gómez (2006, p. 117) a ideia de desenvolvimento é uma estratégia

dinâmica de controle social que persiste por várias décadas no Brasil, mudando as

aparências, mas mantendo o chamado núcleo duro associado à manutenção do sistema

capitalista:

O desenvolvimento prossegue mantendo sua força, tanto no imaginário

coletivo como na essência das políticas públicas, a despeito da seguinte

espiral nada virtuosa: implementação de estratégias de desenvolvimento

promessas de melhora geral da qualidade de vida fracassos

reformulações novas estratégias novas promessas novos fracassos.

Apesar de tudo, o desenvolvimento continua representando uma esperança

concreta e possível.

Ainda segundo o autor o desenvolvimento como forma de controle social

representa uma estratégia de dominação, ordenação, fiscalização e adoutrinamento da

sociedade que podem envolver mecanismos repressores para coibir reivindicações dos

movimentos sociais e, sobretudo, mecanismos sutis de controle como o estímulo à

participação popular nas decisões.

Nesse sentido, a pretendida participação social faz crer que a sociedade está

decidindo o seu destino quando, na verdade, trata-se de mais um engodo da democracia

representativa, onde as propostas locais são diluídas e até mesmo suprimidas quando as

discussões vão para as escalas superiores. Isso quando não são simplesmente rejeitadas

por falta de recursos financeiros. A despeito da ineficácia dessas políticas, novas

promessas e novos projetos com roupagem moderna ressurgem a todo instante,

renovando as esperanças de desenvolvimento e progresso. A política atual do governo,

baseada nos territórios de identidade, defende o controle social como forma primordial

para a sociedade discutir os seus problemas, apresentar o diagnóstico nas diversas

escalas espaciais das conferências territoriais, onde a população é chamada, de dois em

dois anos, para discutir os mesmos problemas que continuam sem solução.

Para Esteva (2000) não há outro conceito na atualidade que tenha poder

comparável de influenciar o pensamento e comportamento social, se constituindo em

um conceito globalmente hegemônico que rouba dos diferentes povos a oportunidade de

definirem outras formas ou modelos de desenvolvimento. Nesse sentido, embora

historicamente construído, marcado por pressões de poder e calcado na racionalidade

ocidental, o desenvolvimento se apresenta como natural e que não existe outro caminho

para resolver os problemas que não seja dentro dos limites do capitalismo.

De acordo com Rist (2011, p.1) a força do discurso do desenvolvimento está na

capacidade de sedução que este termo exerce como capaz de curar todos os males:

288

La fuerza del discurso del "desarrollo" procede de su capacidad de seducción.

En todos los sentidos del término: atraer, agradar, fascinar, hacer ilusión, y

también, engañar, alejar de la verdad, embaucar ¿Cómo no rendirse a la idea

de que pudiera existir un método para eliminar la pobreza que aparece por

todas partes? ¿Cómo atreverse a pensar, al mismo tiempo, que el remédio

pudiera agravar el mal que se quiere combatir? Ulises tuvo que taponar los

oídos de sus compañeros y atarse al mástil de su barco para no ceder a los

cantos de las sirenas...

Assim, para Rist (2011) o desenvolvimento é o moderno canto das sereias e, da

mesma forma que Ulisses impediu seus companheiros de ouvir o canto sedutor e fossem

atraídos para a ilha das sereias é preciso que se analise seu caráter contraditório para

perceber a grande distância que existe entre os discursos e os resultados alcançados.

Para o autor, o desenvolvimento promete melhorar as condições de vida da humanidade,

mas os procedimentos adotados para o atingimento dos objetivos aprofundam ainda

mais as condições de pobreza e miséria, haja vista que ocorre a manutenção e até

mesmo aprofundamento do núcleo duro do capitalismo, que tem por característica

fundamental a ampliação das desigualdades sociais.

Lisboa (2007), ao discutir a trajetória do discurso do desenvolvimento e sua

inserção no modelo da economia brasileira, verificou que a modernização capitalista é

anunciada, ideologicamente, como a única via capaz de reduzir as disparidades sociais e

regionais, mas, na realidade objetiva, o que acontece é a intensificação do antagonismo

capital X trabalho e o aumento das mesmas disparidades que os apologistas do

desenvolvimento e da modernização prometeram diminuir, conforme a lei do

desenvolvimento desigual e combinado:

[...] o que vemos é que a mundialização do capital opera em favor dos que

controlam a tecnologia e sobrevivem das diferenças de desenvolvimento das

forças produtivas entre os países. Isso nos leva a concluir que, em países

como o Brasil, de elevadas potencialidades e disparidades sociais

consideradas, a erosão provocada pela globalização agudiza as contradições,

tornando-as irreversíveis. [...] Em sua tendência constante para a reprodução

do lucro, acumulando quantidades vorazes de riqueza social, o capital

transforma o mundo sem socializar as benesses e traz à tona as contradições

do desenvolvimento desigual (LISBOA, 2007, p. 263).

Portanto, as ideologias do desenvolvimento e da modernização são estratégias

para a expansão do capital em territórios atraentes do ponto de vista da reprodução

ampliada e funcionam como cimento social, resgatando as ideias de Gramsci, para

articular classes antagônicas e reduzir os conflitos ou como controle social, no

pensamento de Gómez, para a dominação da sociedade preferencialmente de forma sutil

e legitimada. O discurso do desenvolvimento como o moderno canto das sereias, na

analogia mitológica de Rist, que, no caso específico da expansão do eucalipto pelo

território baiano, pretende convencer a sociedade que o aumento da concentração

289

fundiária e a expansão de um monocultivo com baixa utilização de mão de obra será

capaz de melhorar as condições de vida da população local.

A despeito de todo o arsenal ideológico utilizado com a chancela do Estado para

difundir a modernização e o desenvolvimento dentro da lógica do capital como a única

alternativa para resolver os problemas das sociedades, cresce a luta anti-capital nas mais

variadas partes do planeta, alimentada pelo acirramento das contradições que expõe os

defeitos estruturais inerentes ao capital.

Nesse sentido, Oliveira, A. (2007) afirma que a modernização capitalista

resultou na exclusão dos pobres na cidade e no campo, alimentando os movimentos

sociais de luta pela terra:

Assim, o campo contém as duas faces da mesma moeda. De um lado, está o

agronegócio e sua roupagem da modernidade. [...] Vive-se no Brasil

cotidianamente, a rebeldia dos camponeses no campo e na cidade. Na cidade

e no campo eles estão construindo um verdadeiro levante civil para buscar os

direitos que lhes são insistentemente negados. São pacientes, não têm pressa,

nunca tiveram nada, portanto, apreenderam que só a luta garantirá no futuro,

a utopia curtida no passado. Por isso avançam, ocupam, acampam, plantam,

recuam, rearticulam-se, vão para as beiras das estradas, acampam novamente,

reaglutinam forças, avançam novamente, ocupam mais uma vez, recuam

outra vez se necessário for, não param, estão em movimento, são movimentos

sociais em luta por direitos. Têm a certeza de que o futuro lhes pertence e que

será conquistado (OLIVEIRA, A. 2007, p. 153).

Considerando que o conflito capital X trabalho é a contradição mais explosiva

desse modo de reprodução sociometabólica, seu recrudescimento na Bahia é a expressão

da forma desigual e combinada em que avança a monocultura do eucalipto nas regiões

analisadas, em que, num pólo, o controle do território pelo agronegócio gera uma

riqueza estranha à população local e é apropriada por grupos internacionais e, e no outro

pólo, a intensificação da concentração fundiária e a substituição da produção de

alimentos por produção de madeira conduz a pobreza repartida na dimensão social do

território, afetando a produção camponesa e servindo de combustível para a luta pela

terra e contra o capital.

O avanço da agronegócio do eucalipto aprofundou as relações capitalistas no

campo, acirrando ainda mais o conflito capital X trabalho no processo de

territorialização do capital efetuado por grandes empresas internacionais em sincronia

com grupos nacionais e sob o consentimento e apoio direto do Estado.

Nos três territórios produtores de madeira e de celulose analisados, o capital se

territorializou, através da compra direta dos milhares de hectares antes destinados ao

cultivo de alimentos ou à criação de animais ou como fragmentos florestais da mata

290

atlântica e monopolizou o território, mediante a subordinação da produção camponesa

agora direcionada ao cultivo de eucalipto para ser aproveitado nas fábricas de celulose e

papel. Essa subordinação da produção camponesa é realizada através dos programas de

fomento, que no contexto do projeto neoliberal conclama os camponeses, agora

chamados de agricultores familiares71

, a se tornarem empreendedores e se integrarem ao

circuito produtivo do capital.

De acordo com Oliveira, A. (1987, p. 65) o campo é um setor de baixa

rentabilidade onde o tempo de produção é muito maior que o tempo de trabalho e o

capital monopolista normalmente realiza o monopólio da produção na esfera da

circulação, mas, em alguns casos o capital se territorializa, notadamente os setores

(como a eucaliptocultura, por exemplo) em que o processo produtivo necessita de pouco

tempo de trabalho, permitindo assim a relação social de produção baseada no trabalho

assalariado:

Na agricultura, para que essa relação ocorra, é necessário que o capitalista

compre ou arrende a terra, que é o principal meio de produção no campo. É

preciso também que compre os demais meios de produção, as máquinas, as

ferramentas, os insumos etc. É por isso que o capitalista contrata no mercado

o trabalhador livre de todos os meios de produção, inclusive da terra, e em

troca lhe paga um salário em dinheiro, com o qual ele compra tudo o que

necessita para continuar a ser trabalhador e vender a sua força de trabalho ao

capitalista.

Assim, a territorialização do capital representada pela incursão das empresas

eucaliptocultoras na Bahia reorientou o uso da terra e prejudicou a produção de

alimentos para o mercado local, além de aumentar a concentração fundiária,

contrariando as promessas anunciadas no início da década de 1990 de melhoria da

qualidade de vida e geração de emprego e renda.

Conforme Mészáros (2011), o desenvolvimento do sistema sociometabólico do

capital ocorre replicando seus defeitos estruturais de ausência de unidade entre a

71

Dentro do pensamento neoliberal, as transformações capitalistas no espaço agrário são responsáveis

pela integração do camponês ao circuito produtivo do capital e o conceito de agricultura familiar

explicaria melhor essas mudanças. A derivação disso é que os problemas do campo não passariam pela

reforma agrária, mas pela expansão do agronegócio, onde os camponeses se transformariam em

assalariados e receberiam qualificação para o desempenho de outras funções (pluriatividade). Nesse

sentido, não há luta de classes nem conflitos no campo brasileiro e a concentração da terra não é ponto

importante na discussão. Dentro dessa lógica, o camponês não decide mais sobre qual cultivo vai produzir

na sua terra, nem quanto e nem como. Transforma-se em agricultor familiar e sua produção passa a ser

realizada em função das necessidades do mercado, que determina inclusive a quantidade e as formas de

produzir. Esse pensamento encontra eco na Geografia Brasileira e em outras áreas como a Economia e a

Sociologia, onde seus autores defendem a inserção dos agricultores familiares no processo produtivo, não

somente com atividades agrícolas, mas também realizando atividades nos setores indústria e serviços, não

havendo alternativa que não seja a tecnificação e a especialização, dentro das demandas estabelecidas

pelo mercado e orientadas pelo Estado.

291

produção e as demais esferas de controle, consumo e circulação, resultando em uma

intensificação dos antagonismos sociais. O acirramento das contradições é um terreno

fértil para a conscientização da classe trabalhadora de sua importância histórica e

política na construção de novos referenciais para a organização social. Para Harvey

(2006, p. 161):

[...] mesmo que o trabalho esteja em grande parte condenado, sob o domínio

do capital, a produzir as condições e instrumentos de sua própria dominação

[...], as capacidades transformadoras e criadoras do trabalhador sempre

trazem em si a potencialidade [...] de moldar um modo alternativo de

produção, de troca e de consumo.

Nesse contexto, as diferentes corporificações do trabalho vivo, representadas por

assalariados, camponeses, sem-terras, desempregados etc. já começam a tomar

consciência de seu poder e de seu papel histórico e social de luta anti-capital, haja vista

a proliferação de movimentos sociais que resistem à proletarização tanto em nível

nacional quanto internacional, demonstrando, cabalmente, a possibilidade real de

construção de um mundo novo, para além das amarras do capital e de seus mecanismos

de alienação social.

Mészáros (2011, p. 1010) resgata a análise marxiana para enfatizar a necessidade

de atuação nas várias escalas espaciais:

No mundo tal como tem sido – e continua a ser – transformado pelo imenso

poder do capital, as instituições sociais constituem um sistema perfeitamente

articulado. Por isso não há qualquer esperança de sucessos parciais isolados,

mas somente de sucessos globais – por mais paradoxal que isto possa soar.

De fato, o critério crucial para a avaliação de medidas parciais é se são ou

não capazes de operar como “pontos de Arquimedes”, ou seja, como

alavancas estratégicas para uma reestruturação radical do sistema global de

controle social. Por isso Marx falou da necessidade vital de mudar, “de cima

a baixo”, as condições de existência como um todo, sem o que todos os

esforços direcionados à emancipação socialista da humanidade estão

destinados ao fracasso.

A tendência histórica do capital em superar as barreiras espaciais e expandir

continuamente a produção para garantir sua reprodução ampliada faz com que sejam

construídas redes geográficas para circulação dos fluxos de capital financeiro global, a

fim de conectar as zonas de excedente de capital com as regiões de escassez de capital.

Para que tudo isso funcione, o capital precisa formar um sistema coordenado e

articulado nas mais diferentes escalas espaciais. É em função dessa onipresença do

capital que Mészáros reafirma a necessidade de combatê-lo da mesma forma,

estabelecendo, também um sistema coordenado para que as lutas parciais se

transformem em alavancas de Arquimedes para mover/transcender o capital.

292

Nesse sentido, Harvey afirma que a acumulação do capital sempre foi uma

ocorrência profundamente geográfica, motivada pelos constantes “ajustes espaciais”

para tentar superar as contradições internas que levam a crises cíclicas limitadoras da

percepção da taxa média de lucro. O poder do capital aumentou e é exercido na escala

global, em variados territórios, mas, contraditoriamente, o proletariado global também é

o maior da história e sua dispersão geográfica pode ser reconduzida para a construção

de um movimento político, em diversas escalas espaciais, para fazer frente às estratégias

geográficas e geopolíticas do capital:

Alianças têm de ser construídas entre e por aqueles que trabalham em esferas

distintas. Isso significa que um movimento anticapitalista tem de ser muito

mais amplo do que os grupos mobilizados em torno de relações sociais ou

sobre questões de a vida cotidiana (HARVEY, 2011, p. 186).

Para Smith (1984), na lógica do capital, o mundo funciona como uma

“superfície de lucro” onde o capital se movimenta em direção à taxa de lucro máxima,

num movimento “em vaivém” que produz áreas desenvolvidas e áreas

subdesenvolvidas, diferenciadas, mas articuladas entre si. Esse desenvolvimento

desigual reproduz no território a desigualdade social que deriva das contradições do

capital em seu processo de reprodução ampliada e permite que o capital explore essa

situação de diferenciação para fragmentar cada vez mais o trabalho. O controle é

efetuado nas três escalas (local, nacional e internacional) e o capital atua,

simultaneamente, em todas elas universalizando a relação assalariada de trabalho. Para

poder confrontar o capital, Smith (1984) aponta a necessidade de uma cooperação

espacial da classe trabalhadora a nível mundial a fim de construir a unificação global e a

homogeneização do trabalho previstas na perspectiva marxiana:

Já vimos que, dada sua tendência global inerente, em direção à igualização

[geográfica das condições e dos níveis de produção], o capital busca

diferenciar o espaço abaixo da escala global como um meio de controle

político, bem como de sobrevivência econômica. A classe trabalhadora deve

tentar precisamente o oposto; como uma classe dividida, ele deve lutar pela

igualização em escala global. O futuro político para a classe trabalhadora está

precisamente na igualização de condições e de níveis de produção, processo

este continuamente frustrado dentro do capitalismo. Esta é a resolução

histórica real da contradição entre igualização e diferenciação. Ela pode ser

realizada na medida em que a cooperação espacial entre a classe trabalhadora

se desenvolver como força política (SMITH, 1984, p. 218).

Isso significa que existe uma premissa da fragmentação no interior da divisão do

trabalho servindo como formador de demandas singulares (empregos, saúde, educação,

luta pela emancipação feminina e contra a discriminação racial, etc.) que se

transformam em lutas parciais não somente insuficientes para abalar as estruturas do

293

capital, mas, sobretudo, sustentadoras do capital que se aproveita dessas questões

singulares para dividir e fragmentar ainda mais o trabalho, incentivando a disputa entre

os vários grupos de trabalhadores.

Conforme afirma Mészáros (2011) o proletariado tem a potencialidade para

superar a fragmentação e a sua posição subordinada na divisão do trabalho, mas a

realização depende da autodeterminação coletiva consciente da classe trabalhadora

(produtores livremente associados):

[...] Enquanto o capital puder encontrar novas saídas para a expansão através

do vasto terreno de sua ascendência global, a não possibilidade de realização

do indivíduo social permanece apenas como uma contradição latente desta

sociedade, em vez de “explodir” suas bases estreitas (MÉSZÁROS, 2011, p.

1057).

Oliveira, A. (2004, p. 40), também enfatiza a forma desigual e combinada com

que o capital avança e entende o território72

a partir das contradições do modo de

produção/distribuição/circulação/consumo, que envolve, inclusive, as relações não-

capitalistas, subordinando-as ao seu movimento maior de produção e reprodução:

A construção do território é, pois, simultaneamente,

construção/destruição/manutenção/transformação. É, em síntese, a unidade

dialética, portanto contraditória, da espacialidade que a sociedade tem e

desenvolve. Logo, a construção do território é, contraditoriamente, o

desenvolvimento desigual, simultâneo e combinado.

Na Bahia, a penetração do capital no campo via expansão do agronegócio do

eucalipto intensificou a concentração fundiária e reorganizou a base produtiva agrícola

regional, com rebatimento direto na contração do território de reprodução camponesa e

alimentando o processo de expulsão rural e reorganização dos sem terra em movimentos

socioterritoriais.

Mesmo comprimido pela grande propriedade rural pecuarista e eucaliptocultora,

o campesinato resiste nos três territórios empresariais analisados, apresentando o maior

número de pessoal ocupado e produzindo alimentos para o abastecimento das

populações regionais.

No território da Veracel, somente nos três municípios onde a eucaliptocultura se

expandiu de forma mais intensa, foram realizadas 36 ocupações de terra, sendo 23 em

Eunápolis, 10 em Porto Seguro e três em Santa Cruz Cabrália no período 1985/2012,

posto como o da introdução e expansão da base florestal da indústria de celulose. A

72

Enquanto Oliveira, A. (2004) destaca as contradições e o desenvolvimento desigual e combinado do

capital, Haesbaert, ao criticar a análise marxiana como economicista, vai propor a ideia de

multiterritorialidades sob várias dimensões (econômica, política, cultural, social).

294

resistência camponesa e o recrudescimento das lutas no campo baiano demonstram o

conflito irreconciliável entre o campesinato e o agronegócio, comprovando através da

práxis das ocupações a ineficácia, ineficiência e inefetividade das políticas

desenvolvimentistas de cunho cepalino defendidas pelo Estado nos projetos de

territorialização das empresas produtoras de eucalipto e de celulose.

Na longa luta pela posse da terra, os integrantes dos movimentos socioterritoriais

precisam enfrentar a empresa e o Estado nas ocupações e na criação dos acampamentos,

num processo exaustivo e insalubre que pode durar vários anos até que o Governo

Federal reconheça a legitimidade da ocupação e realize o assentamento rural, que nem

sempre consegue atender a totalidade das famílias que são novamente reorganizadas

pelos movimentos para a ocupação das terras improdutivas e despovoadas.

A pesquisa de campo mostrou que, mesmo nos assentamentos criados — Lulão,

Ojefferson e Milton Santos — os rendimentos obtidos nos lotes não são suficientes para

garantir a sobrevivência das famílias, fazendo com que a maioria dos camponeses saia

para procurar emprego em outras fazendas ou desenvolver atividades temporárias na

zona urbana dos municípios circunvizinhos.

Essa situação em que a renda obtida no lote não é suficiente para prover a

subsistência da família, sendo necessária a saída do pequeno camponês para

desenvolver outras atividades rurais ou urbanas foi descrita por Lênin (1982) no século

XIX quando analisou as transformações capitalistas na Rússia, resultando em um

campesinato pobre que poderia ser incluído dentro da categoria proletariado rural:

O outro tipo novo é o proletariado rural, a classe dos operários assalariados

que possuem um lote comunitário. Esse tipo envolve o campesinato pobre,

incluído aí o que não possui nenhuma terra. Mas o seu representante típico,

entre nós, é o assalariado agrícola, o diarista, o peão, o operário da

construção civil ou qualquer outro operário com um lote de terra. Eis os

traços característicos do proletariado rural: possui estabelecimentos de

extensão ínfima, cobrindo pedacinhos de terra, e, ademais, em total

decadência [...]; não pode sobreviver sem vender a sua força de trabalho [...];

seu nível de vida é extremamente baixo (LÊNIN, 1982, p. 116).

Para Chayanov (1981), contrariando a tese de Lênin, o campesinato não seria

desintegrado com o avanço das relações capitalistas no campo, pois seria capaz de

entrar e sair do mercado livremente, em função da sua grande capacidade de adaptação

e da não dependência ao mercado, uma vez que a produção camponesa é ao mesmo

tempo unidade de produção e unidade de consumo, sendo mais determinada pelo

tamanho e composição da família do que pelo mercado, podendo assim buscar

295

estratégias de sobrevivência ajustando o tipo de cultivo e a intensidade do trabalho,

mesmo em condições de escassez de terra.

Rosa Luxemburg (1984) ao analisar a resiliência do campesinato, destacou a

incapacidade do capitalismo em promover por completo o assalariamento na

agricultura, deixando em estado de latência o domínio da produção para atuar no

domínio da circulação, subordinando a produção camponesa e transformando os

camponeses em consumidores de produtos industrializados, a partir da extinção do

artesanato. Assim, no processo de implantação da economia mercantil em detrimento da

economia natural, o capitalismo em seu desenvolvimento contraditório, desigual e

combinado também sobrevive a partir da instalação de relações não-capitalistas de

produção.

Para autores como Graziano da Silva, Ricardo Abramovay, Sérgio Schneider,

Angela Kageyama e Rodolfo Hoffmann, as rendas não agrícolas (RNA) fazem parte do

conceito de pluriatividade, onde as famílias agrícolas se integram ao mercado local

através do artesanato, da agroindústria, do turismo, etc., sendo uma estratégia de

elevação do rendimento total das famílias que converge para a manutenção da

propriedade agrícola e redução da pobreza rural.

Essa argumentação favorece a manutenção do latifúndio capitalista no Brasil

porque mascara a luta de classe e os conflitos existentes no meio rural, fazendo crer que

não há problema algum na concentração de terra, pois ela permitiria os investimentos

necessários para uma agricultura técnica e moderna, impossíveis de serem realizados

na pequena propriedade rural. Assim, restaria aos camponeses acionar o Estado para

garantir as políticas de qualificação de mão de obra para a obtenção de rendimentos em

setores não agrícolas (pluriatividade).

Para Shanin (1980), Martins (1981), Conceição (1991) e Oliveira, A. (1991),

embasados nos estudos de Marx, Chayanov e Rosa Luxembrug, o capitalismo não

conseguiu extinguir o campesinato e se desenvolve também pela forma contraditória das

relações não capitalistas de produção. O campesinato faz parte do sistema do capital e o

camponês é visto como sujeito social, capaz de se transformar em classe social através

da práxis revolucionária dentro do conflito capital X trabalho.

Nos assentamentos é notável a influência do discurso desenvolvimentista de

inspiração cepalina voltados para a reforma agrária de mercado, onde os assentados

depositam suas esperanças na instauração dos denominados assentamentos dinâmicos,

296

postos como projetos pilotos de referência nacional para realizar a integração produção

agrícola-indústria-mercado, onde as decisões sobre o que, quanto e como plantar

migram das vontades dos camponeses para as necessidades do mercado, caracterizando

uma situação de monopolização do território e de sujeição da renda da terra ao capital.

Assim, verifica-se que a criação dos assentamentos não consegue resolver o

problema dos conflitos no campo e nem altera a concentração fundiária regional, em

função da pequena quantidade de terras que são desapropriadas, representando muito

pouco no conjunto da área total. Por outro lado, para o capital é benéfica a criação de

assentamentos porque difunde a ideia de propriedade privada, um dos pilares desse

sistema de extração de trabalho excedente. A ilusão de ter uma pequena propriedade de

terra incapaz de satisfazer as necessidades básicas das famílias dos assentados leva os

camponeses a não participarem mais dos processos de ocupações organizados pelo

movimento, enfraquecendo a luta anti-capital. Enquanto isso, a grande propriedade rural

continua intocada e a concentração fundiária, inclusive, aumenta conforme os dados

analisados sobre a distribuição das terras nos municípios a partir dos Censos

Agropecuários e utilização da metodologia Gini.

Nos acampamentos (Pré-Assentamento 25 anos do MST e Acampamento

Dorothy Stang) a resistência camponesa se manifesta no cotidiano difícil de residir em

barracos sem infraestrutura adequada e sob ameaça constante de despejos e confrontos

com a polícia militar, resultando em uma situação de intranqüilidade, desassossego e

inquietação. No processo inicial de ocupação das fazendas ocorre o delineamento do

ponto máximo de tensão entre o agronegócio do eucalipto e o campesinato, motivando o

Estado a sair da posição de neutralidade e expedir mandados de reintegração de posse a

serem concretizados pela ação de policiais armados que se deslocam para o local das

ocupações e confrontam os sem terra, que são retirados à força, independentemente de

serem homens, mulheres, idosos ou crianças, com a destruição sumária dos barracos

construídos, conforme aconteceu nos primeiros momentos do Pré-Assentamento 25

anos.

Nos acampamentos do MST, a organização criou os estudos de formação, onde

os líderes do movimento procuram desenvolver a consciência política dos acampados,

através da exposição de temas relacionados à história das lutas no campo no Brasil e da

necessidade de confrontar o agronegócio e o Estado para poder conseguir a terra de

trabalho. Nesses estudos, são realizadas diversas atividades culturais voltadas para a

297

união do grupo, sempre dentro da mística do MST, onde os sem terra cantam paródias

musicais, dançam samba de roda, evocando palavras de ordem numa riquíssima

demonstração de diversidade cultural que encanta, conscientiza e integra o grupo, numa

clara preparação para a longa luta e enfrentamento contra o capital. Os acampados são

acolhidos, integrados ao movimento e aprendem mais sobre a história do grupo,

reconhecendo a legitimidade da luta pela terra no Brasil, entendendo que não há

esperança de reforma agrária que venha pela livre e espontânea vontade dos homens

públicos que governam o Estado e fazem as leis, uma vez que o próprio sistema jurídico

está voltado para a preservação da propriedade privada e, por conseguinte, garante a

perpetuação das injustiças sociais através do monopólio dos meios de produção, entre

eles a terra.

Nos estudos de formação, os acampados aprendem o seu valor e reconhecem os

seus direitos em buscar a terra de trabalho através do confronto direto com o

agronegócio latifundiário; descobrem que enfrentarão uma luta desigual contra aqueles

que são protegidos pelas leis e que, muitas vezes, os próprios prepostos do governo são

latifundiários e, portanto, não têm nenhum interesse em realizar qualquer reforma, a não

ser por meio de retórica. Assim, os sem terra constatam que para conseguir a terra de

trabalho precisam muito mais do que as promessas da democracia representativa e dos

projetos desenvolvimentistas de inspiração cepalina; descobrem, no final, que precisam

sair do plano do discurso e enfrentar os defensores da terra de negócio no próprio

campo, na própria terra, reorganizando as relações de poder e estabelecendo novas

hierarquias no território.

Nesse sentido, Ramos Filho (2008, p. 350-351) destaca a importância dos

acampamentos e dos encontros para a socialização política e formação histórica da

consciência de classe dos camponeses:

[...] O envolvimento das famílias nas diferentes dimensões do espaço de

socialização política promove um processo de aprendizagem, reflexão da sua

condição e construção histórica da sua consciência de classe. A construção

dos acampamentos, ainda no processo de luta, cria um fato político e acirra o

conflito com os latifundiários, denuncia, para o Estado e sociedade, a

existência da desigualdade no campo e o descumprimento da Constituição

Federal, no tocante ao cumprimento da função social da propriedade. É a

resistência no acampamento, associada com a construção de redes de apoio e

outras formas de pressão, que pode desencadear a desapropriação do

latifúndio e implantação de um assentamento de reforma agrária. Portanto,

neste caso, ganha proeminência o controle do espaço, a partir de uma relação

de poder, o controle do território.

298

A territorialização das empresas de produção de eucalipto e de celulose na Bahia

ocorreu num contexto onde a distribuição da terra já se encontrava, primordialmente,

sob o domínio do latifúndio pecuarista. Por esta razão, na pesquisa realizada junto aos

acampamentos/assentamentos foi detectada a pequena participação de famílias

proprietárias de terra conjunto das famílias organizadas pelo MST, sempre inferior a

10% do total. Isso significa que a grande maioria das famílias que residem nos

acampamentos/assentamentos é formada por pessoas que nunca possuíram a terra,

sendo proprietárias apenas da força de trabalho para vender aos empregadores nas áreas

de criação de bovinos, nas lavouras e em ocupações temporárias nas cidades

circunvizinhas. Eles trabalhavam no campo como trabalhadores rurais e, com a vinda do

agronegócio do eucalipto, as possibilidades de emprego foram reduzidas e aumentou a

concentração da terra, motivando as famílias a ingressarem nas fileiras dos movimentos

socioterritoriais para realizar o sonho de possuir um imóvel rural. Nesse sentido, a

territorialização das empresas de produção de eucalipto e de celulose, ao reduzir ainda

mais o território de reprodução camponesa e intensificar o processo de expulsão rural,

contribuiu, indiretamente, para o recrudescimento dos conflitos, fortalecendo a ação dos

movimentos de luta pela terra73

.

Porto-Gonçalves (2006, p. 455-456) afirma que a mundialização além de

facilitar a integração do capital nas porções do planeta que possibilitam explorar ao

máximo as vantagens comparativas dos lugares, proporcionou também a integração

mundial das lutas de classes, nas suas variadas facetas culturais e de gênero:

O processo de integração capitalista mundial atingiu nas três últimas décadas

um patamar tal que acabou por integrar de modo mais complexo as próprias

desigualdades que sustentavam a sua própria dinâmica. A busca incessante de

lucros, aproveitando-se, inclusive, das diferentes taxas de exploração dos

trabalhadores e da natureza, com as diferentes fertilidades das terras, dos

solos e teores dos subsolos, vendo [nos] Estados Nacionais um obstáculo ao

seu livre curso, não só aumentou o poder de quem já os concentrava como,

73

Ramos Filho (2008, p. 350) discute a importância da ação política dos movimentos socioterritoriais na

luta pela reforma agrária, como forma de estabelecer novas hierarquias de poder nos territórios

socialmente construídos a partir do enfrentamento com o capital e seus prepostos: Os movimentos sociais,

quando implementam suas formas organizativas e respectivas lutas reivindicatórias, produzem relações

sociais. Estas, por sua vez, ocorrem em dado momento histórico e porção espacial e, inevitavelmente,

produzem alterações nos espaços e podem criar novos espaços. Quando se dá a apropriação de uma dada

porção espacial, ocorre a construção dos territórios. O movimento do real tem mostrado que somente por

meio da ação política coletiva e organizada é que os diferentes setores do campesinato têm conquistado

direitos, ainda que de forma incompleta. [...] Origina-se na luta pela terra como o exercício da pressão

coletiva sobre o Estado, latifundiários, enfrentamento com o capital e judiciário, entre outras. Seus

objetivos extrapolam o acesso a uma porção de terra, direcionando-se para a ruptura da estrutura da

propriedade fundiária e a garantia de direitos sociais e políticas agrícolas, compatíveis com a lógica da

agricultura de pequena escala.

299

contraditoriamente, unificou as diferenças e as desigualdades dos que

sofreram seus efeitos.

Para Mészáros (2011) as lutas parciais podem se transformar em alavancas de

Arquimedes para mover/transcender o capital, mas enquanto esse mesmo capital reunir

as condições para continuar realizando a sua reprodução ampliada, através dos

mecanismos de colonização interna e ajuste espacial (totalidades intensiva e extensiva),

essa potencialidade para a realização segue em estado de latência, dependendo,

fundamentalmente, da autodeterminação coletiva consciente da classe trabalhadora

(produtores livremente associados).

Segundo Thomaz Júnior (2008, p. 281) a permanência do campesinato no

interior do capitalismo faz parte do próprio processo contraditório de desenvolvimento

desigual e combinado que cria e recria relações não-capitalistas de produção e nesse

contexto, o camponês e o campesinato faz parte da classe trabalhadora e sua resistência

tem papel importante na luta de classes:

Assim, é no interior da ordem metabólica do capital, das contradições que

regem os mecanismos centrais da produção e ao processo mais geral da

reprodução ampliada do capital e os impactos para o universo do trabalho, e

que também reproduzem relações não essencialmente capitalistas — são as

que indicam a realidade camponesa na viragem do século 21 — é que

podemos entender o camponês e o campesinato como integrante da classe

trabalhadora, imerso, pois, no metabolismo social do capital e,

consequentemente, no ambiente da organização, das disputas e das alianças

políticas.

Para Harvey (2006) ao mesmo tempo em que existe uma extensiva expansão

geográfica das relações produtivas capitalistas, amplia-se também o campo de ação para

as contradições internas desse sistema e as possibilidades para a revolução socialista.

Para ele, a estratégia revolucionária consiste na ligação do micro espaço do corpo ao

macro espaço da globalização, partindo da premissa de que o trabalho é vivo (de Marx)

e, dessa forma, possui as potencialidades tanto para a manutenção quanto para a

transformação do sistema de produção:

[...] não é casual o fato de Marx adicionar o qualificativo “vivo” ao trabalho

incorporado à circulação do capital variável não apenas para acentuar suas

qualidades fundamentais de dinamismo e criatividade, mas também para

indicar onde está a força de vida e o poder subversivo para a mudança

(HARVEY, 2006, p. 161-162).

Segundo Oliveira, A.74

o campesinato deve ser entendido como classe social de

dentro do capitalismo que subsiste aos grandes monopólios capitalistas e que apresenta

74

É, pois, por esses caminhos contraditórios que o modo capitalista de produção se desenvolve, e,

desenvolvendo-se, cria as condições para a sua reprodução ampliada, mas cria também as contradições

desse processo. A reforma agrária não pode ser entendida como solução para essas contradições, mas sim

como um paliativo. Paliativo que resolve mais as questões do modo capitalista de produção como um

300

perspectiva de realizar a luta não somente pela propriedade da terra, mas, sobretudo, a

luta contra o capital.

Dentro da ideia da necessidade de superação do modo de produção capitalista,

Porto-Gonçalves (2006, p. 458) alerta para o desafio ambiental contemporâneo, em que

os limites da humanidade para com o planeta estão sendo encurtados pela lógica do

capital, sendo necessária outra globalização que prime pela justiça social e pela

sustentabilidade:

Assim, não podemos mais pensar o indígena ou o camponês ou uma

comunidade afrodescendente nos seus pallenques e quilombos como o atraso

a ser superado. Surpreendendo a muitos que viam nessas populações a

expressão do localismo e do atavismo conservador, o que vemos nesse

mundo de novas territorialidades em gestação é que, até mesmo, uma

internacional camponesa se constitui, como a Via Campesina, colocando para

todos que o urbano não mais se restringe à cidade. É todo o espaço que está

envolvido, é todo o planeta que está imbricado.

Portanto, entendendo o território como uma realidade posterior ao espaço que se

forma a partir de uma ação humana imersa em relações de poder (RAFFESTIN, 1993),

o reconhecimento do poder não se dá apenas no âmbito do Estado e dos grupos

dominadores, mas, sobretudo, no âmbito dos grupos dominados, responsáveis pela

produção da riqueza. Esse poder potencial da classe trabalhadora é, paradoxalmente,

maior quanto mais se intensificam os antagonismos decorrentes do movimento de

reprodução do capital que replica seus defeitos estruturais, processo que possibilita a

formação da consciência de classe e a construção de novos referenciais de vida e de

organização social para além da lógica do capital e de seus pressupostos.

todo do que a da agricultura em particular. No fundamental, as soluções para os problemas da agricultura

estão inscritas na necessidade de superação desse modo de produção (OLIVEIRA, A.,1987, p. 83)

301

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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