Crime do Colarinho Branco e a Delinquencia

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CENTRO DE CIÊNCIA JURÍDICAS DEPARTAMENTO DE DIREITO CURSO DE DIREITO 3ª FASE (NOTURNO) DISCIPLINA: CRIMINOLOGIA PROFESSORA: LEILANE SERRATINE GRUBBA ALUNOS: Ana Paula Kniess, Fernanda Nones, João Filgueiras Gomes Ramirez, Maria Eduarda Basilio Koenig, Paula Laurenne Jacobsen Valkinir e Rafael Ricardo Godoy E-MAIL DO GRUPO: [email protected] ---------------------------------------------------------------- ------------------------------------------------ TEORIA DA ASSOCIAÇÃO DIFERENCIAL E TEORIA DA SUBCULTURA DELINQUENTE Ana Paula Kniess, Fernanda Nones, João Filgueiras Gomes Ramirez, Maria Eduarda Basilio Koenig, Paula Laurenne Jacobsen Valkinir e Rafael Ricardo Godoy Resumo: O presente artigo busca abordar os elementos presentes nas teorias criminológicas da associação diferencial e da subcultura do delinquente, dando ênfase à corrente de pensamento que expõe os mais favorecidos social e economicamente também como delinquentes. Palavras-chave: Criminologia. Teoria da Associação Diferencial. Crime de Colarinho Branco. White Collar Crime. Edwin Sutherland. Teoria da Subcultura Delinquente. 1INTRODUÇÃO Com o desenvolvimento da Criminologia nos últimos séculos, diferentes correntes foram sendo construídas: correntes clássicas, positivistas – ligadas às ciências naturais e questões biológicas como características e traços individuais – críticas, estruturalistas – que passam a receber influência das ciências sociais – dentre outras.

Transcript of Crime do Colarinho Branco e a Delinquencia

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINACENTRO DE CIÊNCIA JURÍDICASDEPARTAMENTO DE DIREITOCURSO DE DIREITO3ª FASE (NOTURNO)DISCIPLINA: CRIMINOLOGIAPROFESSORA: LEILANE SERRATINE GRUBBAALUNOS: Ana Paula Kniess, Fernanda Nones, João Filgueiras Gomes Ramirez,Maria Eduarda Basilio Koenig, Paula Laurenne Jacobsen Valkinir eRafael RicardoGodoyE-MAIL DO GRUPO: joaofgramirez@gmail.com----------------------------------------------------------------------------------------------------------------

TEORIA DA ASSOCIAÇÃO DIFERENCIAL E TEORIA DASUBCULTURA DELINQUENTEAna Paula Kniess, Fernanda Nones, João Filgueiras Gomes Ramirez,MariaEduarda Basilio Koenig, Paula Laurenne Jacobsen Valkinir e Rafael Ricardo Godoy

Resumo: O presente artigo busca abordar os elementospresentes nas teorias criminológicas da associaçãodiferencial e da subcultura do delinquente, dando ênfase àcorrente de pensamento que expõe os mais favorecidossocial e economicamente também como delinquentes.Palavras-chave: Criminologia. Teoria da AssociaçãoDiferencial. Crime de Colarinho Branco. White Collar Crime.Edwin Sutherland. Teoria da Subcultura Delinquente.

1INTRODUÇÃO

Com o desenvolvimento da Criminologia nos últimos séculos, diferentescorrentes foram sendo construídas: correntes clássicas, positivistas – ligadas àsciências naturais e questões biológicas como características e traços individuais –críticas, estruturalistas – que passam a receber influência das ciências sociais –dentre outras.

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As correntes estruturalistas, oufuncionalistas, surgem um pouco antes dateoria diferencial e de certa forma dão início à alguns de seus preceitos, pois têmcomo ponto de partida a ideia de que o crime é produzido pela própria estruturasocial, tendo sua função dentro do sistema, e por isso não deve ser visto comomoléstia social. O crime passa a ser perigoso para o desenvolvimento da sociedadeapenas quando exceder certos limites. Apesar dessa semelhança, algumasconcepções são contrárias, sendo importante destacar as ideias de Merton (1957), oqual desenvolve a Teoria da Anomia estruturalista e defende que o desvio é umproduto da própria estrutura social, onde o sistema o compele à conduta desviantepois apresenta-lhe metas, mas não disponibiliza os meios necessários para suaconsecução.A crítica que se faz à essa doutrina de Merton é que ela explicaapenas acriminalidade de classes sociais mais baixas, e, por isso, não serviria como exemplodos crimes das classes sociais mais altas, como a sonegação fiscal, crimesambientais e econômicos, fraudes, suborno, peculato, uso de informaçõesprivilegiadas, etc. O próprio Baratta afirma isso ao evidenciar que “uma parte dosistema produtivo legal se alimenta de lucros de atividades delituosas em grandeestilo” (BARATTA, 2002, p. 67).Apresentaremos ao decorrer deste artigo uma alternativa à teoriafuncionalista: a teoria da associação diferencial. Quem desenvolveu essa teoria,explicando como sujeitos de classe alta, mesmo tendo acesso à meios legítimospara o alcance de determinados fins culturais, ainda cometem crimes, foi Edwin H.Sutherland, em 1939, no seu discurso proferido pela American Sociologial Society(Sociedade Americana de Sociologia). A partir desse discurso, o termo “associação

diferencial” foi incorporado no meio científico e passou a explicar tanto as condutasdesviantes das classes mais baixas como as das classes mais altas. “Segundo ela,a criminalidade é apreendida de acordo com os convívios específicos segundo aqual se submete o sujeito, em seu ambiente social e profissional” (BARATTA, 2002).Sutherland desconfiava da ideia de que a conduta delituosa provinhaapenas de classes sociais baixas, como revela Wright em seu estudo sobre oassunto.Sutherland considerava a associação diferencial como uma teoria geralsociológica do comportamento criminoso. Ele suspeitava especialmente de

3teorias que relacionavam a pobreza ao crime, acreditando que asestatísticas policiais eram tendenciosas quando mostravam que a maiorparte dos crimes ocorria em bairros da classe mais baixa (WRIGHT, 2002)

Com isso, o autor começa a analisar o comportamento de homens denegócio, empresários, políticos (etc.), e seus crimes, anteriormente ignorados. Taisdelitos passam a ser chamados de crimes de colarinho branco, ganhando grandeimportância nos estudos criminológicos, os quais passam a analisar o fenômeno doscrimes associativos, como, por exemplo, o crime organizado.Seguindo essa base de pensamento, surge, ainda, uma nova teoria ligadaà Associação Diferencial: a Teoria das Subculturas Deliquentes. Nesse espaço,construiremos a ideia de que o indivíduo aprendeo crime de acordo com seuconvívio em determinados meios e assume feições de certo grupos,aos quaisestaria ligado por aproximação voluntária (convívio opcional comcertos grupossociais); ocasional (classe social) ou coercitiva (prisão), comodesenvolve Zaffaroni(ZAFFARONI, 2001).Diante disso, apresentaremos uma crítica à Criminologia que vinha sendoestudada até então. Vamos analisar uma nova classe, um novo tipode delinquente,que antes era ignorado e que não fazia, ou ainda não faz, parte das estatísticasoficiais. Veremos o surgimento de uma nova forma de enxergar a realidade eentender a criminalização, associando ela à conceitos antes obscuros.

2TEORIA DA ASSOCIAÇÃO DIFERENCIAL

A teoria da associação diferencial, elaborada por Edwin Sutherland, éfundamental para uma compreensão abrangente e específica dos crimesassociativos e, inclusive, do fenômeno do crime organizado.

De acordo com essa teoria, o comportamento delituoso nasce peloaprendizado, ou seja, é resultado da interação entre as pessoas,não sendo inerenteàs condições sociais e nem à personalidade do indivíduo. Para Sutherland, fatorescomo classe social, raça, idade, lares instáveis, distúrbios mentais, localizaçãourbana ou rural propiciam a criminalidade por aumentarem as chances de indivíduos

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se associarem com outros que lhes apresentem argumentos favoráveis para ocometimento de delitos. Em suas palavras,A hipótese da associação diferencial consiste na ideia de que a condutadelituosa se aprende em associação com aqueles que definem talcomportamento favoravelmente, separando-se dos indivíduos queodefinem desfavoravelmente, e que uma pessoa em situação apropriadaparticipa dessa conduta delitiva somente quando o peso das definiçõesfavoráveis supera ao das desfavoráveis. (SUTHERLAND, 2009, p. 349)

A teoria em questão pode ser exposta na forma de nove proposições, asquais dizem respeito ao processo pelo qual uma determinada pessoa ingressa nocomportamento criminoso. Conforme expostas e organizadas por AnaLuiza AlmeidaFerro (FERRO, 2008, p. 145-147), tais proposições são as seguintes:1)O comportamento criminoso é aprendido, o que implica que este não éherdado e que a pessoa não treinada no crime não inventa talcomportamento;2)O comportamento em questão é aprendido em interação com outraspessoas, em um processo de comunicação;3)A principal parte da aprendizagem do comportamento criminoso severifica no interior de grupos pessoais privados;4)A aprendizagem de um comportamento criminoso compreende astécnicas de cometimento do crime (aspecto objetivo), bem como aorientação específica de motivos, racionalizações, impulsos e atitudes(aspecto subjetivo);5)Os impulsos e os motivos são aprendidos a partir de motivaçõesfavoráveis ou desfavoráveis aos códigos legais;6)O fato de a pessoa se tornar delinquente se deve ao excesso dedefinições em favor da violação da lei sobre aquelas em oposiçãoaodesrespeito desta;7)A associação diferencial pode variar em frequência, duração,

prioridadee intensidade;

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8)O processo de aprendizagem criminosa por associação compadrõescriminosos e não criminosos envolve os mesmos métodos daaprendizagem de comportamentos lícitos;9)O comportamento criminal expressa necessidades e valoressemelhantes aos que se expressam pelos comportamentos lícitos.

Logo, é possível verificar que, para a teoria da associação diferencial, ocrime é aprendido por meio de técnicas, orientações, racionalizações, atitudes eimpulsos no grupo de referência, ou seja, entre amigos, familiares, na escola eoutros ambientes. O comportamento criminoso não é uma herança genética e muitomenos algo inerente às condições geográficas, mas sim um aprendizado, da mesmaforma que se aprende um comportamento conforme a lei. Pode-se dizer que ocomportamento criminoso é apenas favorecido pelo ambiente em quese dão oscontatos da aprendizagem.Uma das grandes contribuições da teoria de Sutherland, à Criminologia,foi a de refutar a ideia de que a classe pobre é quem comete a maior parcela doscrimes. A teoria mostra, implicitamente, que o crime não parte somente das classesmenos favorecidas, mas também emerge das classes mais favorecidas. A partirdessa concepção, o autor publicou sua obra White Collar Crime, em que retratou acriminalidade econômico-financeira.

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WHITE COLLAR CRIME

2.1.1 ConceitoSutherland, no decorrer de seus estudos acerca da AssociaçãoDiferencial, concluiu que o desvio de conduta não parte somente das classes menosfavorecidas, as lower classes, passando a estudar os crimes praticados por pessoasde alto nível social, no curso de sua ocupação comercial

ouindustrial – os WhiteCollar Crimes, crimes de colarinho branco – por ele conceituadoscomo “um crimecometido por uma pessoa de respeito e status social elevado no exercício de suaocupação” (SUTHERLAND, 1983, p.7).

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Importante salientar que o autor discorre acerca do caráter sociológicoexperimental atribuído à esta definição, afirmando não ser um conceito definitivo,mas em fase de construção.Nas palavras de Mannheim, para que um White Collar Crime sejacaracterizado como tal, deve-se levar em conta quatro requisitoselementares: deveser um crime; cometido por pessoas respeitáveis; com elevado status social; noexercício de sua profissão. Ainda, muitas vezes têm-se a aparição de um quintoelemento, não elementar, mas bastante frequente: a violação de confiança.(MANNHEIM, 1984, p. 725)Acerca do primeiro requisito, a priori, pode parecer um tanto quanto óbvioo fato de que um White Collar Crime deve ter o fator crime como uma elementar.Entretanto, na época em que Sutherland desenvolveu sua teoria, apunição paraesses tipos de crime era baixíssima. Não haviam tipos penais para criminalizar taiscondutas e, principalmente, não haviam discussões sobre quais condutas deveriamser criminalizadas ou não.White-collar crime is real crime. It is not ordinarily called crime, and calling itby this name does not make it worse, just as refraining from calling it crimedoes not make it better than it otherwise would be. It is calledcrime here inorder to bring it within the scope of criminology, which is justified because itis in violation ofthe criminal law. (...) The definition should not be the spirit ofthe law for white-collar crimes and the letter of the law for other crimes, or inother respects be more liberal for one class than for the other.Since thisdiscussion is concerned with the conventional theories of the criminologists,the criterion of white-collar crime must be justified in terms of the proceduresof those criminologists in dealing with other crimes. (AMERICAN

SOCIOLOGICAL ASSOCIATION, 1940)

2.1.2 A teoria da associação diferencial e os White Collar CrimesAs teorias criminológicas até então desenvolvidas não eram capazes deexplicar o fenômeno dos crimes do colarinho branco. Isto porque,para essas teorias,o crime estaria majoritariamente atrelado à pobreza e à desorganização social.Para analisar os White Collar Crimes por um prisma criminológico, eranecessária uma reformulação em tais teorias. Inclusive, a própria teoria daassociação diferencial, desenvolvida por Sutherland, carecia de um novo olhar e deuma maior abrangência para conseguir explicar e destrinchar esses delitos.

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Sutherland, através de suas pesquisas, em que se valeu principalmentede depoimentos de profissionais que estavam ingressando no mundodos negócios,concluiu que o modo de transmissão dos crimes do colarinho branco era igual aodos crimes comuns: o aprendizado.Nesse contexto, a principal forma de aprendizagem dos comportamentosdefinidos como crimes do colarinho branco era o contato do indivíduo compessoas próximas, geralmente bem sucedidas dentro de seu ramoprofissional, que definiam o comportamento criminoso como favorável erecomendável. Tal contato colocava o indivíduo a par de todas asvantagensde cometer tais crimes e afastado das definições desfavoráveis. Portanto, oindivíduo passaria a se envolver com condutas ilícitas quando seconvencesse de que maiores eram as definições favoráveis do que asdefinições desfavoráveis. (VERAS, 2006, p. 50)

Quando o autor começou a formular a teoria da associação diferencial,focava unicamente na explicação da delinquência juvenil e dos moradores de bairrosdesorganizados.Os criminosos do colarinho branco não foram jovens delinquentes.Muitopelo contrário, faziam parte de uma elite com excelente formação, princípios eideais, e que posteriormente corromperam-se dentro do mundo dos negócios.Portanto, a associação diferencial apresenta-se como a primeira teoria que procurouestudar e abarcar os White Collor Crimes dentro de seus entendimentos.

2.1.3 Causas de menor punição dos White Collar CrimesSutherland chegou a conclusão de que era muito mais difícil descobrir esancionar os crimes do colarinho branco do que os crimes comuns – sendo que a

punição dos primeiros é muito menor quando comparada à dos segundos. Para oautor, a causa desta brecha sancionatória pode ser atribuída a três fatores, expostosa seguir.Primeiramente, o status de seus agentes, que discorre sobre comoosautores têm influência no aparato estatal, fazendo com que, muitas vezes, os juristasevitem persegui-los por seus delitos, com medo de que sua carreira política, ou suasrelações interpessoais venham a ser afetadas. Assim, os órgãos governamentaispodem se tornar, até mesmo, grandes aliados na ocultação de certos fatos

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O segundo fator é a tendência de reprimir tais condutas em outros ramosdo direito. Este termo encontra fundamentação no princípio da intervenção mínimado direito penal, ocorrendo a substituição de sanções penais poroutras medidasalternativas.Por fim, o terceiro fator é conhecido como a falta de organização dasvítimas dos White Collar Crimes, que é sustentado pela complexidade dos crimes docolarinho branco, pois seus atos e efeitos podem se dispersar notempo. Ainda, pelodesinteresse ou o acobertamento midiático quanto a divulgação dos crimescometidos e, por fim, o pouco tempo de existência das leis reguladoras dessascondutas.

3TEORIA DA SUBCULTURA DELINQUENTE

A Teoria da Subcultura Delinquente passou a ser desenvolvida a partir de1950, principalmente nos Estados Unidos, tendo como principais expoentes osautores Cohen e Whyte, e sendo investigada mais tarde também porMatza, Bloch,Ohlin, Cloward, Wolfgang e Ferracuti.Os autores dessa teoria propuseram que a sociedade é formada pordiversos subgrupos, os quais possuem seus próprios valores sociais, culturais enormativos discrepantes daqueles inerentes à ordem social majoritária e oficial.Decorre daí o conceito de subcultura, isto é, uma “cultura dentro da cultura”, o quepressupõe a existência de uma sociedade pluralista, complexa.Acerca do conceito de subcultura, dissertam Antonio García-Pablos deMolina e o Dr. LuizFlávio Gomes:Com efeito, o conceito de subcultura pressupõe a existência de umasociedade pluralista, com diversos sistemas de valores divergentes emtorno dos quais se organizam outros tantos grupos desviados.

Obriga,ademais, examinar internamente referidas minorias e seus códigosaxiológicos, é dizer, a partir da óptica dos próprios subgrupos.Maisimportante: obriga compreender o delito como opção coletiva, como opçãode grupo, com um particular simbolismo ou significado. No caso concreto dadelinquência "juvenil", ela deveria ser vista como decisão de rebeldia aosvalores oficiais das classes médias, não como atitude racional eutilitáriaprópria do mundo dos adultos. Todas essas premissas, logicamente, sãoinadmissíveis para as teorias da "anomia. (MOLINA;GOMES, 2007)

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A partir dessa ideia de subcultura e da Teoria da Associação Diferencial,elaborada por Sutherland, entende-se que o indivíduo aprenderia o crime (técnicas efins) de acordo com o seu convívio em determinados meios e assumiria as feiçõesde certos grupos aos quais estaria ligado por aproximação voluntária (convívioopcional com certos grupos sociais); ocasional (classe social) ou coercitiva (prisão).Os crimes de colarinho branco, por exemplo, representam os delitoscometidos por indivíduos que compõem os subgrupos referentes às camadaseconomicamente mais altas da sociedade, na qual aprendem a sistemática do crime,devido ao seu convívio nessa esfera social.A Teoria da Subcultura Delinquente estabelece, também, que há umacoincidência entre os mecanismos deaprendizagem e interiorizaçãodas normas eparadigmas comportamentais ligados à delinquência e aqueles mesmosmecanismos da socialização normal, como afirma Baratta:A teoria das subculturas criminais nega que o delito possa ser consideradocomo uma expressão de atitude contrária aos valores e às normas sociaisgerais, e afirma que existem valores e normas específicos dos diversosgrupos sociais (subcultura). Estes, através de mecanismos deaprendizagem e interação no interior dos grupos, são interiorizados pelosindivíduos pertencentes aos mesmos e determinam, portanto, ocomportamento, em concurso com os valores e as normasinstitucionalizadas pelo direito ou pela moral “oficial” (BARATTA, 2002, p. 73e 74).

Dos diversos subgrupos e, consequentemente, de subculturas abordadaspela Teoria da Subcultura Delinquente, a estratificação da sociedade através daconsolidação de variadas classes sociais é determinante para

essa teoria. É o quemostra o artigo publicado por Cloward em 1959, indicado na obra de Baratta:Entre os diversos critérios que determinam o acesso aos meios ilegítimos,as diferenças de nível social são, certamente, as mais importantes (…).Também no caso em que membros de estratos intermediários e superioresestivessem interessados em empreender as carreiras criminosas doestratosocial inferior, encontrariam dificuldades para realizar essa ambição, porcausa de sua preparação insuficiente, enquanto os membros da classeinferior podem adquirir, mais facilmente, a atitude e a destrezanecessárias.A maior parte dospertencentes às classes média e superior não sãocapazes de abandonar facilmente sua cultura de classe, para adaptar-se auma nova cultura. Por outro lado, e pela mesma razão, os membrosdaclasse inferior são excluídos do acesso aos papéis criminososcaracterísticos do colarinho branco (BARATTA, 2002, p. 70).

Portanto, a Teoria da Subcultura Delinquente procurou estudar e definircomo um comportamento de transgressão que é determinado por um subsistema de

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conhecimento, crenças e atitudes, possibilitam, permitem ou determinam formasparticulares de comportamento transgressor em situações específicas.Dessa forma, os autores concluíram que os gruposdenominados subculturais criam para si novos fins e ideais, colidentes com aquelesdeterminados pela maioria da sociedade, e encontram-se em diversas esferassociais, como por exemplo voltadas ao âmbito econômico, à parcela jovem dasociedade ou à determinados grupos raciais.

4CONCLUSÃO

Primeiramente, não se pode olvidar a importância que a Escola Positivatrouxe à esse novo estudo da criminologia – a teoria da associação diferencial -,visto que a Escola incluiu ao debate criminológico o personagem esquecido pelaEscola Clássica: a pessoa do delinquente. Graças a ela, começou-se a estudar oporquê das condutas delitivas, isto é, os fatos determinantes docomportamentocriminoso, a fim de combatê-lo.Com esse novo foco, e conforme exposto no decorrer deste artigo,foipossível alcançar um maior desenvolvimento da teoria da associação diferencial,constatando que o comportamento docriminoso não possui sua explicação empatologias sociais, ou seja, não é um fenômeno determinado pelo fator classe.Conclui-se que o criminoso não é, necessariamente, o etiquetado ou apenas oestereotipado. E aqui nos remetemos ao Baratta, ao dizer que a criminalidadeenvolve convívios específicos em âmbito tanto social quanto profissional.A teoria da associação diferencial, proposta por Sutherland, é essencialpara um maior entendimento do fenômeno do crime organizado, ao estabelecer uma

ponte entre o underworld, com seus delitos peculiares, como os patrimoniais, e oupperworld, com seus crimes de colarinho branco; e, portanto, entre a criminalidadedos indivíduos das classes sociais mais baixas, recrutados em favelas, bairrospropícios ao seu desencadeamento e em prisões divididas em facções, e acriminalidade dos indivíduos das classes mais altas, recrutados,por exemplo, nopróprio ambiente de trabalho, em contato com homens de negócios,executivos,autoridades e membros do governo.

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É importante salientar, ainda, a importância das leis e do legislador, bemcomo da sociedade e da mídia, no controle desses comportamentos delitivostratados no presente artigo. Nesse contexto, há autores que dizem que as leisostentam pouca força para deter tal tipo de comportamento, assimcomo há os queafirmam que o legislador criou um arsenal incontável de condutasdelitivas quetransformaram o sistema jurídico num direito do terror. Entende-se, aqui, que taisconsiderações estão a fim de atender às expectativas populares, bem como as damídia.Explicitando melhor a conduta destas duas últimas camadasmencionadas, estas acabam por insuflar uma verdadeira caça às bruxas, isto é,propalam um encarceramento indiscriminado, sendo evidenciado o perigososentimento de vingança, o que há muito tempo, principalmente conforme a teoria deBeccaria – em seu livro Dos Delitos e Das Penas – e também de Foucalt – no livroVigiar e Punir –, foi afastado pelas funções da pena (retributiva e preventiva).Cumpre salientar que o Ministério Público e a Mídia, em seu papeldenunciador e informativo, influenciaram diretamente na democratização do DireitoPenal, pois nunca se viu tantos criminosos de status avantajado,digamos assim,sendo processados e condenados, não apenas por crimes comuns, mas tambémpor crimes de colarinho branco. Embora louvável essa mudança, é bastantedesmedido querer vingar décadas, senão séculos, de desigualdade.Devem serlembrados e garantidos os princípios que regem o Direito Penal, como o devidoprocesso legal, e não apenas as demandas populares que veem no Direito Penal agrande saída para a maioria das nossas mazelas.Por conclusão, o sociólogo observa a pouca eficácia das leis no controle

do comportamento no mundo dos negócios, faltando um apoio por umaadministração com disposição política para combater o comportamento ilegal. Esta,por sua vez, ostenta pouca força para deter tal tipo de comportamento, salvo seapoiada por um público disposto ao cumprimento da lei. Percebe-se, portanto, umclaro antagonismo entre o público e o governo, de um lado, e os homens decolarinho branco infratores da lei, do outro.

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REFERÊNCIAS

AMERICAN SOCIOLOGICAL ASSOCIATION. American Sociological Review:vol.5, n. 1, 1940.BARATTA, Alessandro. Criminologia Crítica e Crítica do Direito Penal. 3. ed. Riode Janeiro: Revan, 2002;FERRO, Ana Luiza Almeida. Sutherland: a teoria da associação diferencial e ocrime de colarinho branco. De jure: revista jurídica do Ministério Público do Estadode Minas Gerais, Belo Horizonte, n. 11, p. 144-167, jul./dez. 2008. Disponível em: <https://aplicacao.mpmg.mp.br/xmlui/bitstream/handle/123456789/102/Sutherland_Ferro.pdf?sequence=1>. Acesso em: 4 jun. 2014;MANNHEIM, Hermann. Criminologia comparada. Trad. J. F. Faria Costa e M.Costa Andrade. Lisboa: Fundação Calouste Gulbekian, 1984.MOLINA, Antonio García-pablos de; GOMES, Luiz Flávio. Criminologia. 5. ed. SãoPaulo: Revista dos Tribunais, 2007.SUTHERLAND, Edwin H. White collar crime: the uncut version. Yale: YaleUniversity Press, 1983.;SUTHERLAND, Edwin H.. El delito de cuello blanco: versión completa. Trad. LauraBelloqui. Supervisionado por Carlos Alberto Elbert. Buenos Aires: Editorial B de F,2009. p. 349;VERAS, Ryanna Pala. Os Crimes do Colarinho Branco na PerspectivadaSociologia Criminal. 2006. Tese (Mestrado) - PUC São Paulo. São Paulo, 2006;WRIGHT, Richard A; SUTHERLAND, Edwin H. In: ENCYCLOPEDIA ofCriminology. Disponível em: . Acesso em: 3 jun. 2014;ZAFARONNI, Eugenio Raúl. Em busca das penas perdidas. 5. ed. Trad. VâniaRomano Pedrosa e Amir Lopes da Conceição. Rio de Janeiro: Revan,2001;