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Mnemosine Vol.17, nº1, p. 253-274 (2021) Parte Especial - Artigos. DOI: 10.12957/mnemosine.2021.61852 Departamento de Psicologia Social e Institucional/ UERJ Comissões de Saúde do Trabalhador da Educação em Serra-ES Education Worker Health Commissions in Serra-ES Jomar da Rocha Farias Zahn; Maria Elizabeth Barros de Barros; Cristiane Bremenkamp Cruz; Danuza de Oliveira Fonseca Universidade Federal do Espírito Santo RESUMO: Este artigo traz discussões e fragmentos de uma trajetória de pesquisa-intervenção em Educação, utilizando o recurso de uma personagem, cujo nome é Celina, como dispositivo metodológico. Buscou-se acompanhar os processos em curso, relacionados à implementação da Comissão de Saúde do Trabalhador da Educação (Cosate) nas escolas públicas municipais na cidade de Serra, no Espírito Santo, de modo que ela funcione como um disparador de discussões em torno da forma como a educação se organiza e se atualiza. O estudo destaca a potência das redes para a contração de grupalidade no enfrentamento de políticas despotencializadoras dos coletivos de trabalho na educação. As Cosates, como espaços dialógicos de análise coletiva das práticas educacionais nas escolas, possibilitaram trocas e formação de redes afetivas de trabalho e saúde. O artigo apresenta, ao final, a potencialidade de coletivos de trabalho como modo de fazer frente à massificação e individualização que segmentariza e despotencializa no contemporâneo. Palavras-chave: metodologia; trabalho; coletivo ABSTRACT: This article brings discussions and fragments of a research-intervention jorney in Education, making use of a character, whose name is Celina, as a methodological device. We sought to monitor the ongoing processes, regarding the implementation of the Education Worker's Health Commission (Cosate) in municipal public schools in the city of Serra, in Espírito Santo state, so that it functions as a trigger for debates around the way education is organized and updated. The study emphasises the power of networks for the contraction of the groupality in the confrontation of depotentializing policies of working groups in education. Cosates, as dialogic spaces for collective analysis of educational practices in schools, enabled exchanges and the formation of affective networks of labor and health. In the end, the article presents the potential of working collectives as a way to face the massification and individualization that segment and undermines in the contemporary. Keywords: methodology; work; collective DOI: 10.12957/mnemosine.2021.61852 Este artigo narra uma experiência que se atualizou entre 2017 e 2019 no decurso da pesquisa “Comissão de Saúde do Trabalhador de Serra/ES: sejamos realistas, tentemos o impossível”, realizada no Programa de Pós -Graduação em Psicologia Institucional da

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Mnemosine Vol.17, nº1, p. 253-274 (2021) – Parte Especial - Artigos.

DOI: 10.12957/mnemosine.2021.61852

Departamento de Psicologia Social e Institucional/ UERJ

Comissões de Saúde do Trabalhador da Educação em Serra-ES

Education Worker Health Commissions in Serra-ES

Jomar da Rocha Farias Zahn; Maria Elizabeth Barros de Barros; Cristiane Bremenkamp

Cruz; Danuza de Oliveira Fonseca

Universidade Federal do Espírito Santo

RESUMO: Este artigo traz discussões e fragmentos de uma trajetória de pesquisa-intervenção em

Educação, utilizando o recurso de uma personagem, cujo nome é Celina, como

dispositivo metodológico. Buscou-se acompanhar os processos em curso, relacionados à

implementação da Comissão de Saúde do Trabalhador da Educação (Cosate) nas escolas

públicas municipais na cidade de Serra, no Espírito Santo, de modo que ela funcione

como um disparador de discussões em torno da forma como a educação se organiza e se

atualiza. O estudo destaca a potência das redes para a contração de grupalidade no

enfrentamento de políticas despotencializadoras dos coletivos de trabalho na educação.

As Cosates, como espaços dialógicos de análise coletiva das práticas educacionais nas

escolas, possibilitaram trocas e formação de redes afetivas de trabalho e saúde. O artigo

apresenta, ao final, a potencialidade de coletivos de trabalho como modo de fazer frente

à massificação e individualização que segmentariza e despotencializa no contemporâneo.

Palavras-chave: metodologia; trabalho; coletivo

ABSTRACT: This article brings discussions and fragments of a research-intervention jorney in

Education, making use of a character, whose name is Celina, as a methodological device.

We sought to monitor the ongoing processes, regarding the implementation of the

Education Worker's Health Commission (Cosate) in municipal public schools in the city

of Serra, in Espírito Santo state, so that it functions as a trigger for debates around the

way education is organized and updated. The study emphasises the power of networks

for the contraction of the groupality in the confrontation of depotentializing policies of

working groups in education. Cosates, as dialogic spaces for collective analysis of

educational practices in schools, enabled exchanges and the formation of affective

networks of labor and health. In the end, the article presents the potential of working

collectives as a way to face the massification and individualization that segment and

undermines in the contemporary.

Keywords: methodology; work; collective

DOI: 10.12957/mnemosine.2021.61852

Este artigo narra uma experiência que se atualizou entre 2017 e 2019 no decurso

da pesquisa “Comissão de Saúde do Trabalhador de Serra/ES: sejamos realistas, tentemos

o impossível”, realizada no Programa de Pós-Graduação em Psicologia Institucional da

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Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Na pesquisa, foi construído um

personagem conceitual, cujo nome é Celina, mulher, nordestina, professora em uma

escola pública municipal na cidade de Serra, Espírito Santo. A partir de Celina, buscamos

abordar a experiência de constituição de um fórum que envolveu diferentes atores da rede

de ensino dessa cidade e se revelou um dispositivo para o fortalecimento e ampliação dos

espaços coletivos de gestão do trabalho na referida rede. Indicamos, ainda, como efeito

desse processo, a instituição da lei 4.513/181, que trata da constituição das Comissões de

Saúde do Trabalhador em Educação (Cosates) como uma estratégia importante nessa

direção ética e política, tendo como proposta contrair grupalidade.

Movimento 1- do método da pesquisa

Quando olhamos para o céu na sua concretude, vislumbramos movimentos,

imagens em forma de objetos. A algumas dessas imagens atribuímos um sentido habitual

e não nos surpreende, mas outras nos impactam e produzem sentimentos insuspeitos, bem

como um curiosiar.

A azul cor do céu seria também a cor do mar? Ou o mar só reflete a cor que paira

sobre ele? Ce, céu, linda, nasce Celina, uma personagem que vai crescendo, ganhando

movimento no percurso Rio das Ostras x Vitória2. Afinal, o caminho é constituído de

passos que se sucedem e não pode parar, mas há pausas, análises e outros movimentos.

Num desses momentos, criamos Celina para auxiliar a cartografar os processos

em curso na rede de ensino do município da Serra/ES e trabalhar os tensionamentos entre

conceitos e práticas, um instrumento importante durante a produção de dados na pesquisa,

a fim de captar o dia a dia dos eventos vividos, as conversas, mas também o que

acontecimentaliza nos caminhos da pesquisa.

Celina, nosso personagem conceitual (DELEUZE; GUATTARI, 1992), foi criada,

portanto, para nos ajudar a compor as cenas que dão expressão à pesquisa. Um

personagem que serve para transmitir eventos, de forma que seja possível uma

ressonância com a pesquisa. Toda a narrativa foi construída em torno da experiência dessa

personagem, que buscou expressar as apostas éticas, políticas e epistemológicas do

processo investigativo. Celina é dotada de vida própria, atuando de forma a expressar

essas diretrizes. A personagem conceitual, assim, não é a representante das pesquisadoras,

mas, ao contrário, as pesquisadoras são apenas invólucros dessa personagem, uma espécie

de ‘heterônimo’ das pesquisadoras e o nome das pesquisadoras são pseudônimos da

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personagem (DELEUZE; GUATTARI, 1992).

O diário de campo, uma escrita transversal, foi outra estratégia utilizada e sua

leitura um modo que nos colocava a pensar no caminho investigativo que íamos

construindo, a fim de operar nos eixos de duração e intensidade da pesquisa. A escrita

transversal potencializa a superação de dois impasses: o de uma pura verticalidade e o de

uma simples horizontalidade, uma vez que ela tende a se realizar quando uma

comunicação máxima se efetua entre os diferentes níveis e, sobretudo, os diferentes

sentidos que a escrita vai produzindo. Fala do que se faz, no que se faz e do que se faz,

do que se fala. Fala do que nos escapa em meio às nossas ações, das invenções em meio

às prescrições, fala das frestas que abrimos para oxigenar nosso poder de agir. Fala de

(im)possibilidades, de saúde, de adoecimentos, de alegrias, de como habitamos os

espaços do trabalho e como ele nos habita. Essa era a pista que essa modalidade de escrita

nos facultava.

Ao lançar mão de uma personagem como percurso metodológico, tivemos o

objetivo de captar as forças que emergem dos protagonistas das cenas que constituíram a

história de um movimento de produção de grupalidade, de produção de coletivos que dão

condições de emergência a uma política efetivamente pública.

Assim, entendemos que o diário transcende o registro. A escuta sensível das vozes

dos trabalhadores/as/atores/as desse percurso e seu registro são fundamentais, pois elas

caracterizam-se como elementos preciosos que atuam como potencializadores do

processo de produção de dados e do mergulho numa teia que vamos tecendo num campo

problemático, atentas a seus movimentos diários.

Movimento 2 – do nascimento da personagem conceitual Celina

Entre areia, barro, poeira, solo árido e ressecado, rachado pela seca, há crianças

brincando na terra vermelha. É uma cidade pequena, com pouco mais de 146 mil

habitantes. Há várias casas na vila chamada Bartolomeu, ponto de encontro das crianças

do vilarejo para brincadeiras e, consequentemente, muito barulho, quintal com alguns pés

de frutas. Nesse cenário, onde o sol forte castiga quase o ano todo, moram mulheres que

têm muita força em seus olhos, corpos marcados pelas lutas travadas a cada dia de ida à

roça, fazer o plantio, cultivo e colheita da cana-de-açúcar; mulheres que acariciam e

incentivam o ruflar do ninho. Em uma dessas casas vive uma família formada por oito

pessoas: pai, mãe e seus seis filhos; a mais nova é uma menina, Celina. Tertulina, mãe de

Celina, é ‘a maior das mulheres’, ‘a grande ‘madre’... é uma sábia mulher. Possui estes

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atributos, pois está sempre atenta aos acontecimentos, sempre à sua espreita, e disposta à

produção de novos saberes e conhecimentos; confiável; criativa e obstinada; ousada e

precavida; abriga o tradicional e o original, inovadora.

Celina gosta de estar rodeada de gente, tem prazer em estar com todos, sejam de

sua idade ou não. Ama deixar o tempo correr em rodas de conversa. Sua mãe diz que é

meio intrometida, mas ela é mesmo curiosa. “Curiosidade é uma coceira que dá nas

ideias” (ALVES, 2004: 22). Além disso, Celina sempre foi desbravadora. Desde a

infância, observava tudo e perguntava o porquê disso, o porquê daquilo. Cresceu ouvindo

folclore, músicas de cantigas de roda, como muitas das crianças daquele vilarejo. O

curioso é que ao ouvir as canções cantadas pelos adultos e as histórias que seus pais

contavam à noite ou pela manhã – depois do trabalho na roça –, lá ia ela recontar o que

ouvira para os amigos.

Uma das brincadeiras favoritas das crianças era encenar as histórias que ouviam:

o Saci, a mula sem cabeça, o homem do saco... Celina era a “diretora das

peças/brincadeiras”, dizendo onde cada um deveria ficar e que personagem ser, ou então

uma atriz das histórias. E a imaginação dela e das outras crianças ia longe. Na escassez

de brinquedos industrializados, tudo virava brinquedo.

Celina começa a experienciar a escola. A cada ano, novas descobertas: as letras,

as palavras, as frases, os números, as continhas, as equações. Por assim dizer, vai se

formando e formando os espaços escola/vida. Entre a dureza e a alegria que sustenta os

modos de vida na roça, a escola com seu velho quadro-negro e os livros, as brincadeiras

com os colegas, crescia a menina. Na escola, Celina era dedicada, mas brincava, fazia

bagunça e comia a merenda duas vezes, se possível. Aprendeu as letras, que a levaram a

livros cujas histórias a transportavam a outros mundos, outros saberes. Celina compôs

com elas e compôs também.

A cada passo de Celina na escola, ela é tomada pela paixão de compartilhar.

Compartilhar com os amigos vizinhos tudo que aprende. Quando decide pelo Magistério,

talvez não soubesse que a “professora Celina” já estava sendo produzida, desde a infância

e/ou adolescência. Vai saber! Na verdade, isso importa menos.

***

Professora Celina. Quem poderia imaginar? Muitos. Talvez até ela, em algum

momento da sua vida. Alguns da vizinhança já diziam: “Essa menina tem jeito de

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professora!” Pronto, habemus Professora Celina.

E nesse arremesso da vida, agora a mulher cujo nome é Celina, sai para estudar,

traçar um novo percurso, caminhos que uma garota de vila nem imaginava. É vida, tecida

por encontros e desencontros, fazeres e desfazeres. Uma hora nosso corpo sente que

somos um corpo formado de outros. Celina, corpo aberto, poroso, ora seguindo a cartilha

pré-fabricada, ora se inventando. Segue para o inusitado. Celina vai dando passos, criando

trilhas que a levam para outras paisagens. Celina sente o que pode o seu corpo-professora

em um cenário no qual produzir brechas, criar rupturas, tensionar são necessários para

não ser tão forma-atada às inúmeras regras e capturas de um mundo que nos busca

formatar. Moça com sede de conhecer o mundo, que caminha para uma formação, mas

formação além da lógica informacional, além do campo de saber escolarizado, formação

para a própria vida nas dimensões variadas e diversas que a constitui (HECKERT;

NEVES, 2007).

Estágio. É a hora pela qual Celina ansiava, ao contrário de algumas colegas, que

descobriram que não queriam ser professoras, acreditavam que daria “muito trabalho”.

Outros sabiam que, apesar de esperarem melhor salário, um diploma nas mãos em um

mundo tão competitivo ajudava. Celina observava aulas, ajudava a professora regente a

preencher os muitos documentos que o Estado exigia: “Mas precisa de tanta burocracia?!”

Celina adorava as séries iniciais, sentia-se em casa. Em casa com as crianças, em

casa nas atividades lúdicas, à vontade. Até se lembrou de quando era criança em seu

vilarejo. Pois é. Agora é ir aprendendo a lidar com isso, com outros desafios. Celina estava

se tornando professora. Seu sonho começava a ganhar concretude.

E, nesse caminhar, muitos flashbacks emergem nos pensamentos de Celina... Lá

vem um pau de arara, e no seu balangar é perceptível que está lotado. Há trabalhadores

de mãos calejadas pela enxada, outros com as mãos lisas sem ao menos ter trabalhado,

talvez sonhadores, alguns com a pele ressecada pelo sol causticante, outros prospectando

ganhar dinheiro, outros mudar de vida, outros apenas de carona, ou seja, o retorno de um

dia laboral. Em cima do pau de arara há uma jovem, olhos amendoados cheios de

expectativas. Durante o percurso, um buraco aqui, outro ali, uma descida, nova subida,

costelinhas formadas pela chuva e o transporte trepida, o corpo todo chacoalha e vai se

constituindo o caminho.

Ao passarem por uma curva, essa jovem mulher levanta sua cabeça para o céu,

percebe que, para variar, hoje está sem nuvens, o sol escaldante sobre as cabeças

novamente, dirige o olhar para o horizonte e vislumbra um solo árido, rachado e lembra:

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“É tempo de seca. Ah, meu sertão! ” Na dança de seus pensamentos, sua trajetória

vai se delineando.

Tempos difíceis aqueles que viveu, escassez de água e de comida e de muitas

outras coisas necessárias para a sobrevivência das pessoas do vilarejo. Agora inicia seu

jornadear a vida de retirante. Depois de tanta poeira e balangar, é hora de descer. Celina,

a professora do Nordeste vai tentar a sorte numa outra cidade. Adeus, meu Nordeste, é o

movimento da vida, vai ser gauche,3 agora será moradora da Região Sudeste.

***

Celina e a nova cidade onde residirá. Embarca no ônibus, sabendo que serão

alguns dias, quem sabe de sol, quem sabe de chuva, quem sabe de engarrafamento, quem

sabe de fome, frio e durezas. Naquele momento, nada importava para Celina. O pulsar do

seu coração é “esperançar” outros ares, outra vida, com sua peixeira, que é o exercício de

pensamento que corta e nos livra de várias estratégias de poder que tendem a nos capturar,

nos fixar num modo sujeito.

O grande dia: o do desembarque, na rodoviária da Grande Vitória. A expectativa

de novas oportunidades quase salta em seu peito, desafios por todos os lados, mas a

certeza de que deseja desbravar novos caminhos.

Celina chega à cidade de Vitória, que faz parte da Grande Vitória. Abre sua

pequena mala marrom, na tentativa de encontrar a garrafa de água. Passa a mão e percebe

algumas roupas, um par de chinelos, um caderno de anotações, uma caneta sem tampa,

duas escovas, uma para o cabelo e outra para os dentes, é o que trazia.

Ao desembarcar, Celina vê um livro de literatura da moça que desce na sua frente,

lembra-se de um poema de Fernando Pessoa.

“Há doenças piores que as doenças

Há dores que não doem nem na alma

Mas que são dolorosas mais que as outras.

Há angústias sonhadas mais reais

Que as que a vida nos traz,

Há sensações

Sentidas só com imaginá-las

Que são mais nossas do que a própria vida.

Há tanta cousa que, sem existir,

Existe, existe demoradamente

E demoradamente é nossa e nós...

Por sobre o verde turvo do amplo rio

Os circunflexos brancos das gaivotas...

Por sobre a alma o adejar inútil

Do que não foi, nem pôde ser e é tudo.

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("Há doenças piores que as doenças",

Fernando Pessoa, 2012)

Seu telefone toca, é Deize, prima de Celina, moradora dessa cidade, avisando que

já está chegando na rodoviária. As primas encontram-se, beijos, abraços, sorrisos e muito

falatório. Celina respira fundo. Tem muito ar no peito, tem força de uma jovem iniciante

na profissão.

Movimento 3 – da emergência de uma professora

Processo Seletivo Simplificado para professoras por Designação Temporária

(DT). Celina prepara currículo, junta documentos, porque lera nos jornais sobre um

processo seletivo da Prefeitura de Serra. Está animada com a possibilidade de se tornar

professora, está animada a mostrar as maravilhas do seu sertão, gente beleza, povo

guerreiro.

Sala 05. Turma A. Novo endereço de Celina. 87, número de matrícula. Os

números organizam, identificam. Mundo estranho para Celina; de onde veio não era

assim. Ela nem lembrava exatamente como era, só sabia que não era assim, parecia ser

mais simples. De onde vinha, fazer amigos era algo mais simples: “Povo fechado.

Sorrisos amarelos. Olhares assustados. Vai ver que é só no primeiro dia.”

Brigas por direitos. Cotas, greve de professoras, greve das funcionárias,

paralisação de ônibus, “dia de luta contra isso, contra aquilo”. Concursos. Processos

seletivos. Passeatas. Greve. Polícia nas ruas. Concursos. Cortes no orçamento da

educação... Passeatas. Silêncios. Polícia. Barulho. Sindicatos. Certificados. Protestos.

Silêncio. Barulhos. Processos... assim caminha a cidade. Tudo muito, às vezes vácuos,

perguntas sem respostas, e Celina tenta captar quais caos-processos que ela agora passa a

(con)viver.

Diploma. Agora os movimentos são outros: ter um emprego, autonomia

financeira. Currículo pronto. Processos seletivos. Contratos temporários. Concursos. É

também hora de atualizar os ensinamentos da academia: “No estágio, parecia que a

professora fazia diferente. Ou ela vem de uma formação pedagógica diferente da minha?

Designação Temporária. Agora Celina vai ter o seu campo de trabalho. Celina-

DT, professora de séries iniciais de uma escola pública. O corpo professora se prepara, se

prepara até onde acha que pode. Ela sabe que tem muito a aprender. Já percebeu que são

muitas as regras que compõem a instituição Escola. Enfim, de início, é vislumbrar o

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compartilhamento do que aprendera na faculdade. Além disso, já imagina que nas suas

práticas seria difícil não trazer traços de onde veio, da Celina menina, da Celina que

também foi aluna das séries iniciais, da guria contadora de histórias.

“Por que na escola tudo parece ser tão formatado, mensurado, calculado e

burocratizado?”

Esse incômodo da nossa personagem pode parecer coisa de gente que está

começando a carreira. De fato, os estranhamentos de quem entra no campo de trabalho,

em particular o campo da educação (nosso destaque aqui), podem ser habituais. Mas como

saber? Celina precisa garimpar esse campo, agora como educadora-aluna-do-mundo.

As muitas perguntas de Celina são perguntas de um corpo aberto, um corpo de

escuta sensível. Sede de uma jovem profissional cheia de ideias, força física e que acredita

que pode ajudar a mudar o mundo para um mundo mais solidário. “Quando uma pessoa

vive de verdade, todos os outros também vivem. E todos nós, por meros momentos,

voltamos a ser selvagens” (ESTÉS, 2007: 5). Quando uma criatura resolve se dedicar a

viver do modo mais pleno possível, muitas outras que estiverem por perto se “deixarão

contagiar”.

A DT4. Escola pública municipal. Colegas experientes-concursados.

“Só eu como DT? ”

O espaço público parece um espaço privado. As professoras daquele turno, ao

mesmo tempo em que não trocam ideias, parecem cada uma em casa no seu quarto, com

seus televisores. O silêncio reina. As cadeiras da sala das professoras parecem ter nome;

todos os dias as professoras sentam-se nas mesmas cadeiras. Olham para os relógios.

Sinal. Recreio. Pedagoga. Silêncio quebrado. Uma circular. Reclamações.

Que movimentos são esses que os olhos, ouvidos e fala de Celina nos trazem

acerca da instituição escola?

“Circular no 10? As aulas começaram esta semana, eu fui contratada semana

passada e já recebo a 10ª circular? A pedagoga entrega, professoras reclamam. Quanto

mais alto falam, menos eu as ouço. O povo não conversa aqui não? ”

“Quanto menos puderem criar formas de trabalhar compatíveis com nossas

expectativas e modificar o ambiente de trabalho de acordo com as nossas necessidades e

desejos, maiores serão essas dificuldades” (BRITO; ATHAYDE; NEVES, 2003: 52).

Analisam/conhecem o ambiente em que trabalham? “Relações hierarquizadas e

censura de diálogos não podem fazer bem à saúde”, pensava Celina.

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Talvez Celina esteja comparando essa escola com o modelo de escola que ela

imaginava e idealizava. Difícil. Difícil responder a tantas perguntas que iam surgindo a

cada momento que transitava na escola. E as questões não cessavam: será que tem que

ser assim mesmo? Por que é assim? Qual o motivo de tantas circulares? Reclamações,

SEDU, circulares... Celina já mexe o corpo como quem estivesse tentando achar a postura

ideal, melhor, uma postura que a fizesse caber ali.

Celina ia se constituindo como uma mulher aberta ao mundo e incomodada com

forças que pareciam querer capturar suas ideias e movimentos. Celina sente que escola,

educação e ocupar espaços eram muito mais do que tudo que ela presenciava nos seus

primeiros dias de professora (DELEUZE; GUATTARI, 1992).

Sala cheia. Um ventilador. Se por um lado o calor já fazia parte da vida de Celina,

aquele cenário era outro. “Como suam os pobrezinhos...” “Professora, quantos anos você

tem?” Celina sabe bem o que é ser criança curiosa, faladeira...

Celina tentava construir um outro caminho, um outro corpo, corpo da rapidez

daquela cidade, de outro tipo de escassez. Escassez de espaços de conversa, de tempo de

parar e tomar um café, não o engolir, escassez de ouvir o outro, escassez do improviso

nas aulas quando não se tem material.

Que modo é esse dessa professora que vivencia e pratica o “curiosar” entrando no

movimento da educação? Que práticas são essas de formação e burocratização que ela

entende como pouco potentes? E as experiências de vida de suas amigas professoras?

Como poderia tudo isso contribuir nas práticas educativas e no corpo-professora cujo

“chefe” é o Governo?

Na escola, as instruções a serem seguidas pelo corpo pedagógico a incomodavam.

Ela não as entendia – não eram práticas educativas que promoviam uma educação que

aguçasse a curiosidade dos alunos, nem mesmo a imaginação. Celina, tocada pelo

tarefismo escolar, o qual lhe era imposto, colocava tudo em questão.

Educação? Qual? O que queremos?

Como desenvolver um exercício autônomo das práticas educacionais se as

políticas de governo estão mais para enquadrantes? Como pensar uma formação que

possibilite saberes e relações sociais e efetivamente públicas? Como o corpo-professora

vai se forjando formador e em formação junto com seus alunos, seus pares e o espaço-

escola em meio a tudo isso?

Afinal, pensava Celina, por mais opressivo que seja o campo de trabalho, sempre

é possível criar um espaço de liberdade, uma fresta que, mesmo que mínima, abra

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caminho para outros possíveis (GUATTARI; ROLNIK, 1996).

Alunos. Um aluno chega à escola de bermuda e uma camiseta vermelha com a

foto do Che Guevara5 e não pode entrar, por conta da cor da roupa. A própria pedagoga

não sabe onde estão as normas. Só diz: ‘‘Não pode, é uma regra. ” Lá, meninos não podem

usar brincos, meninas não podem usar legging para não marcar a genitália.

Recreio. Surge um assunto entre um grupinho de meninas, alunas das séries finais.

“Machista”. Um “não” da pedagoga. Celina estranha. “Não é fácil tomar conta de tantas

crianças. Ser administradora de escola é um desafio. Só uma pedagoga para trezentos

alunos! Ela não deve ter muito tempo para atendê-los ou para pensar nas suas práticas.

Deve falar muitos ‘não’ sem explicações”.

Corpo pedagógico. “Sim.” “Não.” “São as regras.” “Não tem jeito.” “Assine a

lista.” “Atestado.” “Atestado?!”

Celina ouve quase que diariamente tanto seus colegas quanto a coordenação

pedagógica repetirem tais expressões. “Que profissionais cansados! Será que eu vou dizer

as mesmas coisas?”

“Celina? É o seu nome, não é? Você é a novata. Olha, não se assuste com as nossas

reuniões. Você está começando agora. Depois se acostuma. ”

Acostumar-se...

Será que a iniciante professora Celina, jovem e cheia de ideias, se acostumaria

com falas que denotam tanto cansaço? O que pode um corpo6 inquieto? Na verdade, mais

do que a sua jovialidade, as jovens, na vida real, geralmente têm uma impressionante

sabedoria própria. Às vezes, porém, é também dominada pelo medo de seguir o que sua

alma sabe. Ou ainda está num processo de aprendizado de enorme importância que, de

repente, ou mesmo com o tempo, chegou a um impasse. O destaque a ser dado é seu modo

de ver o mundo. Celina nasce e cresce em meio a inúmeras dificuldades, chega à

Academia. A reinvenção sempre foi parte dela.

São as regras. “Esta informação, professora, só na SEDU. ”

Espaços de diálogo? Celina não via nem muito espaço, quanto mais diálogo... A

impressão é que o importante é a ocorrência.7 Como formar cidadãos nesse espaço sem

diálogo? Quem sempre tem razão? É a direção? Ou a Secretaria de Educação? Ou o que

é definido para ela e os demais atores da escola? Que modos de fazer educação se atualiza

quando não nos escutamos? Essas questões insistiam... Celina não cessava de se indagar.

Fatos e memórias. As memórias... Celina as deixava fluir.

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“Que valor tem um fato? O que resta dele além das sensações que nos deixa? ”

(RAMOS, 1982: 82).

Dias de sol, dias de chuva... Como fazer emergir Celina-mulher-adulta?

“Se Deus quiser quando eu voltar do mar, um peixe bom eu vou trazer”8. A música

de Caymmi vai trazendo à memória o artista, porque ele capta o movimento do mundo e

o expressa na obra de arte. Nesse sentido, o mais importante nos diálogos não é o

elemento racional ou as contas, as argumentações, mas o sentido do que nos atravessa no

momento desse encontro.

6:47. Parada solicitada. Seu telefone toca. Celina não consegue atender, pois o

ônibus continua muito lotado. Mais um dia!

Passa pela banca da praça e vê no display de jornais:

“Concurso para professor efetivo no final no ano. Está aqui no jornal.” Emprego.

Concorrer a uma vaga de emprego para professora efetiva anima Celina. “Já que faltam

uns meses ainda, consigo acumular um tempinho de experiência e fazer alguns daqueles

cursos de formação na SEDU. Quantas horas devem ter cada curso? ”

Tempo que passa. Até que consiga se inscrever em um concurso e tentar ser

aprovada, Celina tem muito caminho pela frente.

Habitar a cidade, seus espaços é o que convocava Celina, professora da educação

infantil no turno vespertino há quase seis meses. No seu campo-escola de trabalho, ao

formar crianças para darem seus primeiros passos na escola e lerem o mundo, também

ajuda, em seu(s) campo(s) de atuação, os que por ela passam a exercitar o posicionar-se

diante da vida. A prática educativa exige uma trabalhadora capaz de dar respostas para

cada atitude, decisão, estratégias, novos olhares, pensar-se e construir outras bases,

sempre novas às suas práticas educativas.

A escola é, geralmente, o lugar onde passamos o maior tempo de nossas vidas. É

comum as pessoas pensarem que a escola é o único espaço de formação9. É usual pensar

muito mais na formação do aluno e menos na formação do educador. Para muitos, a

professora já vem formada, como se o(s) diploma(s) fosse(m) o suficiente para lidar com

tantas histórias diferentes numa sala de aula – lidar com tantos colegas que carregam

múltiplas marcas e histórias ao longo da profissão, sem falar do ‘chefe’ maior: a máquina-

governo.

Celina está sempre de olhos atentos aos movimentos da instituição escolar, o

modo como as relações são atualizadas no cotidiano, a dinâmica de um sistema em que a

burocracia se faz presente constantemente. Professoras trabalham também fora da sala de

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aula: elaboram murais, trabalhos a corrigir, atividades complementares a pensar,

planejamentos diários e outras atividades. Muitas vezes, não é fácil pensar onde começa

e termina o trabalho. É um cotidiano que envolve um emaranhado de tarefas: lançar notas,

fazer correção de provas, planejamento de diários e de aulas, reuniões etc. Mas também

sonhos...

Celina fecha a porta da sala de aula, põe os pés fora da escola; mas, ao chegar em

sua casa, o trabalho não fica na escola; ele a acompanha.

Dever de casa da professora. Celina chega na escola pela manhã e tem as

atividades que ao longo do dia vão se desdobrando. Quando encerra o dia, já se vê com

as atividades do próximo. “Que dia exaustivo hoje. É a vida de professora que demanda

muitos outros tempos. Tempo de hora-aula, tempo-espaço fora da escola.... Não nos

contaram na faculdade que seria assim. Mas... tarefismos e burocracias à parte, não vou

me deixar adoecer por isso. Vou criando linhas de vida, criando possíveis. ”

Na escola, muitas vezes considera-se o trabalho das professoras reduzido à sala de

aula e não se considera o restante do trabalho realizado, tampouco todo o esforço que as

trabalhadoras da escola despendem para dar conta do que se espera e do que cada situação

exige.

Escola rima com gaiola, mas não podem ser as mesmas coisas. Como é difícil um

ofício no qual muitas vezes a profissional fica amarrada ao tecnicismo escolar.... Em

apenas cinquenta minutos de aula, trinta alunos, fazer chamada, fazê-los se acalmarem,

dar atenção àquele que faz perguntas e ter somente poucos minutos para dar o conteúdo

pensado. Afinal, o trabalho na escola não é só o que ele parece ser (para quem está de

fora, mas até mesmo para quem está dentro); ele não é só aquilo que segue um fluxo sem

percalços e que é contabilizado em relatórios. As atividades desenvolvidas na escola são,

muitas vezes, feitas silenciosamente, ninguém percebe o esforço excessivo praticado pela

trabalhadora (BRITO; ATHAYDE; NEVES, 2003).

Celina encontra uma amiga no mercado.

“Ei Celina, e aí? Tá gostando?”

E ela pensa: “Como narrar para pessoas que não são da área de educação o que é

ser professora, os baixos salários, o montante de trabalho, o lidar com crianças, a

burocracia, o trabalho que não existe só no espaço da sala de aula? E se a pessoa que

pergunta for da área, dependendo de como ela vê a profissão, posso corroborar algum

pensamento desfavorável que ela possa ter. Enfim, a vida como ela é. Bem, a vida pode

Comissões de Saúde do Trabalhador da Educação em Serra-ES. 265

Mnemosine Vol.17, nº1, p. 253-274 (2021) – Parte Especial - Artigos.

também ser outra. É movimento incessante. E falando em movimentos, por conta deles

estou eu aqui.”

“É. Ser professora tem seus desafios, demanda paciência, como todas as

profissões. Mas é isso, vamos caminhando. Estou aprendendo muito. ”

Solidão. “Quem entenderia a solidão de uma professora? Uma outra professora.

Ora, se passamos por demandas parecidas, por que não nos unirmos? ”

Tarefa de casa da professora. São quatro horas da manhã. Entre os livros, artigos

e rabiscos, Celina não consegue dormir, precisa escrever um projeto que vai desenvolver

com seus alunos sobre História às avessas, mas as ideias não vêm, ela não consegue

dormir.... Põe uma música para relaxar, é Chico, o Buarque: Cálice.10 Canta Celina:

“Quero beber um pouco de Chico, relaxar e, quem sabe, retomar a escrita no dia seguinte.”

Eu canto: Como é difícil acordar calado / Se na calada da noite eu me dano / Quero

lançar um grito desumano / Que é uma maneira de ser escutado.

(Cálice, Chico Buarque e Gilberto Gil)

Ao mesmo tempo que ouvir uma canção a ajuda a pausar o pensamento que corria

como um cronômetro, a canção a provoca no sentido de pensar a sua própria existência.

Quantas vezes Celina é “calada” em seu trabalho, como formato-verticalidade da

instituição em que ela trabalha?

Na educação, essa racionalidade se expressa nas práticas de gestão autoritárias,

verticalizadas, hierarquizadas que não afirmam protagonismo de trabalhadoras que atuam

no campo educacional, acarretando efeitos nas relações de trabalho na escola e,

consequentemente, entre o trabalho e a saúde (CARDOSO; CÉSAR; BARROS, 2018).

Condições físicas de trabalho, modos de gerenciamento e gestão de trabalho,

aspectos financeiros e relacionais falam de saúde e adoecimento na educação.

Investigando esses fatores, destacam-se algumas fontes de tensão e adoecimento

relacionadas com as condições de trabalho das profissionais da educação, em especial as

professoras, como o ritmo intenso de trabalho, o número excessivo de alunos e a política

de gestão da educação verticalizada e autoritária (GOTARDO et al., 2016).

O som abafado. Ao fazer um movimento para tranquilizar a mente, a canção a

desperta. O que seria uma maneira de ser escutada? Como fazer surgir “essa palavra”?

Essa palavra presa na garganta? Isso. Indo ao encontro das vozes. Ainda mais inquieta,

volta à escrita. Retoma a empreitada.

Algumas coisas, Celina vai pensando.... É nas situações cotidianas da escola que

os movimentos podem aparecer. Vem à mente um livro da adolescência, Aventuras de

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Alice no País das Maravilhas, de Lewis Carroll11, um relampejo a partir do qual

evidentemente a primeira coisa a fazer seria um levantamento da região que iria

atravessar. Alice também tinha um campo a atravessar. É muito parecido com estudar

geografia, erguendo-se nas pontas dos pés na esperança de conseguir ver um pouco mais

longe.

Celina pensa sobre o projeto que irá desenvolver na escola, batizado por ela de

História às avessas. Precisa terminar a escrita deste projeto, que será desenvolvido com

seus alunos. A proposta é que eles manuseiem os livros que só terão imagens, para depois

criarem suas próprias versões das histórias e as contarem do jeito que quiserem,

assentados em roda. Cada um terá a oportunidade de contar sua versão da história. Como

proposta inicial, o primeiro livro de figuras será A flor do lado de lá, de Roger Mello.12

O projeto é uma nova experiência para Celina, que está empolgadíssima. Foi

ligando para alguns colegas para ver se poderiam emprestar almofadas ou colchonetes

para que, no momento da experimentação, a atmosfera ajudasse os/as alunos/as e colegas

a serem contagiados pela proposta.

A atividade aqui é tomada como criação de mundos compartilhados. Ainda que o

trabalho seja desenvolvido por um/a único/a trabalhador/a, a atividade pode ser entendida

como encontro entre corpos. A trabalhadora constitui a sua atividade e é constituída por

ela, corpo aberto às afecções do mundo. Trabalhar é ser capaz de estabelecer

engajamentos em história coletiva. Um coletivo que possa compartilhar narrativas e

análises sobre os processos de trabalho se fortalece com a sua própria renovação (SILVA;

CÉSAR; BARROS, 2016).

Ela não está só. Uma professora informa a Celina que a professora de educação

física possui tatames e que ela poderia conversar com a professora de Artes, a qual

também poderia auxiliar com algumas misturas de cores das tintas, uma vez que estavam

com poucas tintas. Assim, as crianças poderiam se pintar ou criar no próprio papel sua

história. Celina começa a divagar em seus pensamentos...

A professora de Artes pergunta: “Celina, você não quer juntar as turmas? ” Um

projeto tão pequeno, sem grandes pretensões, agora está viabilizando outros

agenciamentos, outros intercessores13 nesse processo. E como atrair mais colegas? O que

as fariam motivadas a se envolverem nesse projeto?

O coletivo: como é dialogar com outros que têm outra experiência? Haveria coisas

que precisariam ser pensadas quanto ao projeto e ao movimento em que seríamos

Comissões de Saúde do Trabalhador da Educação em Serra-ES. 267

Mnemosine Vol.17, nº1, p. 253-274 (2021) – Parte Especial - Artigos.

inseridos. Como construir espaços de análise coletiva? Criar o coletivo para ultrapassar

os modos individualizados que foram naturalizados. A liberdade é se indagar: Como estou

fazendo? O coletivo é plano de coengendramento e de criação, indica um caminho

peculiar e fecundo para a superação da dicotomia indivíduo e sociedade. É campo de

forças que dá nascimento a outras formas, outras realidades, outros mundos (ESCÓSSIA;

KASTRUP, 2005).

Como se constrói um coletivo na escola?

Dois é bem melhor, “eu e +1...”14; mais pessoas pensando juntas é melhor ainda.

Celina alegra-se em ver a movimentação. “Demorou! Mas é possível. Que legal! ” É

notório que as relações contemporâneas têm sido marcadas pela proliferação de

comportamentos individualizados. Paradoxalmente, no campo da educação, vão sendo

demarcadas necessidades de trabalhos colaborativos, em equipe, em rede, trabalhos

solidários num processo de comunicação transversalizado, ou seja, em diferentes e

múltiplas direções, sem direção hierarquizada.

Celina fala: “O que nos impede de nos colocarmos em conversa? Um põe uma

ideia, outro coloca outra, que pode se conectar à outra ideia, e assim vamos construindo

um novo saber para o trabalho que não estava posto?” O convite de Celina: criar

impensáveis percursos, impulsionar movimentos diversos, de forma coletiva.

A ideia do projeto vem de antigos escritos de Celina. Um caderno da faculdade no

qual ela rabiscava possíveis projetos para algumas de suas disciplinas. Sempre gostou de

escrever, fazia registros acerca do que se passava com ela. A escrita é um caso de devir,

sempre inacabado, sempre em vias de se fazer e que extravasa qualquer matéria vivível

ou vivida. É um processo, ou seja, uma passagem de Vida que atravessa o vivível e o

vivido. A escrita deve ser vista como um corpo entre outros corpos e não como um plano

paralelo que os espelharia. Produz real e age diretamente nele, escrita ao rés do real... para

falar desse corpo do escrito, que é tão real e interventivo na realidade quanto os demais

corpos ou objetos do mundo, Celina pensava... É nesse sentido que talvez possa falar de

uma poética, na contramão, metafórica ou representacional. Não se trata de representar

um sujeito na escrita, mas de fazer da escrita o drama de uma voz que se faz na própria

superfície das palavras, em meio a muitos cruzamentos que passam por elas, entre elas.

De um colega que a ajudaria inicialmente, agora já são quatro. O professor de

Educação Física, a de Artes, o de Matemática e a de Português se ofereceram para ajudar

na logística no dia da apresentação, e as turmas também iriam se juntar.

Proposta entregue à pedagoga: “Que dia vocês estão pensando em fazer isso? ”

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“No dia da família. Já está no calendário mesmo. [...]”

“Não temos dinheiro. ”

“E se enviássemos uma carta aos pais para trazerem algum lanche? São quatro

turmas envolvidas e os colegas de Artes e de Educação Física ensaiarão uma música com

as crianças. Bom, vai sujar um pouquinho, mas é conversar com as meninas da limpeza e

faremos um esforço coletivo de higienização do espaço, não será fora do horário delas. ”

“Ufa! Como contagiar um colega de trabalho? Melhor, como contagiar vários

colegas de trabalho? ”

Contágio como movimento para colaborar na construção de um corpo coletivo

mais aberto e vital, aquele sem narrativa linear, mas que os agrupamentos circunstanciais

e a proposição de mente e corpo façam vir à tona afetos, produzir contágios a partir do

processo movente.

Contagiar é o processo de propagação de crenças e desejos em um campo de abertura

e de afinidades construídas em relação, é muito mais que convencer. Podemos

convencer trabalhadores a participar de um projeto? Mas podemos partilhar com eles

sonhos e desejos, de tal forma que esses trabalhadores também abracem o movimento

e produzam estratégias para continuar participando, se disponham a conversar sobre

sua experiência em diversos espaços com o fim de também produzir deslocamento em

outros trabalhadores da educação. É muito mais que convencer. Contagiar, imitação,

compreende uma abertura ao plano comum, no qual há a intensificação e o

fortalecimento das linhas que unem o coletivo heterogêneo. O processo de contágio diz

do engendramento de uma relação, da efetivação da intervenção na qual não há efeitos

prontos e conhecidos (BRITO, 2018: 49).

Movimento 4 - Celina encontra as COSATES

Essa inquietação levou Celina para a universidade federal da cidade. Será que

posso encontrar lá alguma coisa que me ajude a fortalecer essa grupalidade na escola?

Uma consulta à biblioteca, quem sabe?

O tempo estava cinza, parecia que ia chover, mas Celina, mesmo assim, decide ir

à Biblioteca da Universidade. Ao chegar no campus, avista um prédio cinza, com janelões

cheios de grades, e se inquieta: por que os livros vivem presos, como que engaiolados?

Tantos saberes detidos, proibidos de voarem, devaneia Celina enquanto caminha

vislumbrando a grama, os micos e pássaros, até a entrada principal.

Dirige-se até o balcão de atendimento e pergunta: “Onde posso encontrar a

bibliotecária”? É informada que deveria subir um lance de escada e lá encontraria a

bibliotecária de plantão cujo nome era Joanna.

Celina sobe ligeiramente a escadaria e procura por Joanna, que a recebe com um

Comissões de Saúde do Trabalhador da Educação em Serra-ES. 269

Mnemosine Vol.17, nº1, p. 253-274 (2021) – Parte Especial - Artigos.

olhar simpático e atento.

Juntas, vão ao computador da biblioteca e Joanna explica como usar a tecnologia

para pesquisa.

Joanna lhe diz: “Acho que você pode encontrar alguma coisa que te interessa

naquela estante no primeiro andar à esquerda. ”

Depois de algumas olhadas na estante, depara-se com um documento cujo título é

Caderno de Formação: Saúde no Trabalho e Educação e que lhe parece interessante. O

material narra uma experiência que teve início em 2012, quando um Programa de

Formação e Investigação em Saúde do Trabalhador (PFIST), vinculado ao Núcleo de

Estudos em Subjetividade e Políticas (Nepesp) do departamento de Psicologia da

Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), realizou um mapeamento das condições

de trabalho e saúde das professoras do ensino fundamental da rede pública da Serra/ES.

As docentes foram selecionadas a partir de uma amostragem estatística aleatória,

com base nos dados fornecidos pela Secretaria de Educação da Serra (SEDU) em 2011,

referente ao quantitativo de 2.566 professores da rede de ensino, efetivos ou contratados.

A pesquisa foi distribuída pelas seis Regiões Geopedagógicas15 do município,

envolvendo 50 professores por região, totalizando 300 professores participantes do

estudo.

Celina suspirou. Ufa... e olhando na mesma prateleira, encontra outro material.

Era um artigo sobre a mesma temática; começa a folhear e, na sua leitura, depara-se com

a escrita:

As pesquisadoras do PFIST relatam que um mapeamento foi realizado por meio da

aplicação de um Questionário para inquérito epidemiológico com levantamento de

dados relacionados às variáveis sociodemográficas, de percepção sobre saúde e

trabalho e sobre situações relacionadas à saúde mental baseado no Self Report

Questionnaire (SRQ 20). De modo geral, esse levantamento apontou altos índices de

transtornos cardiovasculares e gastrointestinais entre os docentes que, articulados ao

stress, tensão e ritmos intensos nos levaram a compreender também os problemas

osteoarticulares, auditivos e vocais que vêm marcando os modos de organização e

gestão da Educação e do ofício de professor (LUCIANO et. al, 2012).

Os dados desse mapeamento indicaram que o processo de doença não é uma

questão pessoal, individual, já que os índices mais expressivos quanto à fonte de tensão,

adoecimento e cansaço no trabalho apontaram exatamente os processos de trabalho: salas

superlotadas, sensação de isolamento, carga horária intensa, individualização, política de

gestão autoritária, ruídos excessivos etc.

Diante deste quadro, as pesquisadoras definiram uma estratégia para intervir nas

condições e modos de organização do trabalho e investir em práticas cogestivas e

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Bremenkamp Cruz; Danuza de Oliveira Fonseca.

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coletivizadas como estratégia na direção da produção de saúde. Assim, nasceu o PFIST:

uma aposta na produção de uma política pública via implantação das Comissões de Saúde

do Trabalhador (COSAT).

A partir dessa leitura, algumas coisas começam a fazer outras conexões com o que

Celina vinha arquitetando. Prossegue lendo o texto.

Para elaborar uma política pública de saúde para a Educação de Serra, em 2012

foi constituído um fórum, o qual foi denominado Fórum de Discussão das Comissões de

Saúde do Trabalhador da Educação (Fórum Cosate). Diversas pessoas, grupos e agentes

de órgãos municipais (CEREST, Medicina do Trabalho, Perícia Médica, Escolas,

Ministério Público, Sindicato Estadual dos Professores (SINDIUPES), Associação de

Pais ASSOPAES/Serra), dentre outros, compuseram o Fórum Cosate, que se estendeu até

o ano de 2018 com periodicidade variável, quinzenal ou mensal, neste período.

Os encontros do Fórum Cosate aconteciam predominantemente no Centro de

Formação de Professores, órgão da Secretaria de Educação Municipal de Serra/ES e, às

vezes, em escolas da rede, tendo como uma das suas principais metas discutir sobre as

condições de saúde e trabalho com os trabalhadores da Educação e elaborar uma lei

Cosate para a Educação de Serra.

Empolgada com a leitura, Celina compreende como se deu a constituição do

fórum e prossegue lendo sem perceber as horas passarem.

A aposta não era unicamente criar uma lei de forma burocrática, como acontece

em muitas proposições legais desvinculadas dos debates para suas constituições, mas sim

afirmar a elaboração de uma Lei-Cosate como um dispositivo capaz de disparar produção

subjetiva em favor da saúde. A inclusão das trabalhadoras-educadoras na produção da lei

tornou o fórum um espaço de produção de saúde e a elaboração da Lei Cosate um

dispositivo dinâmico e pulsante que alinhavava, encontro a encontro, um movimento de

construção de uma política de saúde na educação para o município de Serra. A proposição

da Lei Cosate, feita pelo Fórum Cosate, perseguiu outras formas de constituição e

movimento que estivessem pautadas na coconstrução com as trabalhadoras da educação.

Celina respira, suspira e sussurra que a Cosate foi feita para/com as trabalhadoras

da educação.

Assim, os autores destacam, no caderno de formação, que, ao pensar o projeto de

lei que institui as Cosates como ferramenta para construir e contagiar, a lei se torna um

dispositivo. A lei que abre... A ideia, que só foi possível ser elaborada depois de vários

Comissões de Saúde do Trabalhador da Educação em Serra-ES. 271

Mnemosine Vol.17, nº1, p. 253-274 (2021) – Parte Especial - Artigos.

encontros do grupo do PFIST, era usar os modos de funcionamento que achatam o tempo

e o diálogo para possibilitar o inverso; um impulso no jogo de forças que movimentam

esse cenário, mas ela em si não resume ou se constitui como finalidade de política pública

– ela possibilita a participação das professoras na sua constituição, o que define uma

política pública: participação coletiva com todos os embates e tensionamentos que um

processo de formação de um ‘grupo sujeito’16 exige. A lei, entretanto, alerta o documento,

não é suficiente, não resolve por si; é necessário um processo de contágio que tome as

pessoas, de forma que possam apostar e dar credibilidade a esse processo para a produção

de saúde nas escolas. Por outro lado, é produção de abertura quando ela se

converte/constitui como uso dos efeitos de lutas (BRITO, 2018).

Joanna aproxima-se de Celina e pergunta se conseguiu encontrar o que procurava

e, então, explica que está em estágio probatório na biblioteca e, anteriormente, trabalhou

como professora de Serra e participou do movimento da Cosate.

E começam a conversar.

Joanna diz: “Durante esse movimento da Cosate, que se deu na educação pública

no município de Serra, a experiência de debater, propor e aprovar uma lei de

implementação de Comissões de Saúde do Trabalhador da Educação foi muito rica. O

objetivo não era tornar as Cosates um modelo a ser implantado, tampouco apostar que

fosse a única forma de organizar espaços cogestivos nas escolas”. E, então, pergunta: “A

partir dessa rápida olhada, você percebeu esse movimento das Cosates como um

dispositivo para experimentar e ampliar a experiência cogestiva? Para mim ficou bem

nítido que é preciso apostar na criação de muitos dispositivos que possam ser inventados

a depender dos contextos singulares e dos trabalhadores envolvidos em seus territórios

específicos de atuação. O objetivo era dar visibilidade a um trabalho que realizamos

cotidianamente e não está prescrito nos regulamentos das escolas”.

Celina sorri e responde: “Sim, o que se destaca, nessa primeira olhada, é que a

proposta da Cosate está para além de uma lei, ou de uma experiência acadêmica, acho

isso muito bom!”

Joanna prossegue: “A aposta é de nos orientarmos por uma análise que possa

acompanhar os processos em curso no trabalho docente. A força dos debates produzidos

no Fórum Cosate nos indica a potência desse processo para uma vida mais potente e

criativa, nos faz pensar que é sempre possível criar modos de viver menos limitadores.”

Essa é, então, a proposta das Cosates, pensa Celina: criar meios para a efetivação

de uma análise dos processos de trabalho e o compartilhamento de estratégias de ação

272 Jomar da Rocha Farias Zahn; Maria Elizabeth Barros de Barros; Cristiane

Bremenkamp Cruz; Danuza de Oliveira Fonseca.

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como formas genuínas de fazer frente à massificação, sujeição e despotencialização da

vida coletiva. A produção e análise, a experiência permanente de coletivização se fez

possível e se operou no transcurso de ações vinculadas às Comissões de Saúde do

Trabalhador de Serra-ES entre 2017 e 2019.

Joanna sugere que Celina procure frequentar os Fóruns Cosates para compreender

melhor a proposta.

Celina parecia ter encontrado algumas pistas.... Foi se aproximar do fórum e

aprender no processo cogestivo como constituir/criar uma política pública na educação.

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Jomar da Rocha F. Zahn

Universidade Federal do Espírito Santo

E-mail: [email protected]

Maria Elizabeth B. de Barros

Universidade Federal do Espírito Santo

E-mail: [email protected]

Cristiane Bremenkamp Cruz

Universidade Federal do Espírito Santo

E-mail: [email protected]

Danuza de Oliveira Fonseca

Universidade Federal do Espírito Santo

E-mail: [email protected]

1 Decreto de Lei N. 4513.05 de maio de 2016 da Prefeitura de Serra/ES que criou a Comissão de Saúde do

Trabalhador da Educação (COSATE) como um serviço público do referido município, assim como o

Conselho das Comissões de Saúde do Trabalhador da Educação (CONCOSATE).

2 A autora principal do artigo reside em Rio das Ostras e realizava seu mestrado no Programa de Psicologia

Institucional da UFES/Vitória.

3 Gauche refere-se ao Poema de sete faces, de Carlos Drummond de Andrade (1930).

4 DT é um termo que é utilizado para Designação Temporária, um tipo de contrato de trabalho por tempo

determinado.

5 Ernesto Guevara (Rosário, 14 de junho de 1928 – La Higuera, 9 de outubro de 1967), mais conhecido

como “Che” Guevara, foi um revolucionário marxista, médico, autor, guerrilheiro, diplomata e teórico

militar argentino.

6 Ao usarmos “O que pode um corpo inquieto?’’, nos remetemos a Espinoza em um de seus textos: “O que

pode um corpo?” O que pode o corpo? Corpografias de resistência, Ética. São Paulo: Abril Cultural, 1973.

(Coleção Os pensadores, v. XVII).

7 Ocorrência é um documento utilizado quando a(o) aluna(o) comete um ato infracional ou quando comete

três atos indisciplinares, daí assina uma ocorrência. O aluno deverá estar acompanhado pelos pais ou

responsáveis para a assinatura.

274 Jomar da Rocha Farias Zahn; Maria Elizabeth Barros de Barros; Cristiane

Bremenkamp Cruz; Danuza de Oliveira Fonseca.

Departamento de Psicologia Social e Institucional/ UERJ

8 A letra cantada por Celina é de Dorival Caymmi. Chama-se “Suíte do pescador” e está no álbum Caymmi

e o Mar.

9 Usamos aqui o sentido habitual de formação, aquela que se opera por processos de escolarização.

10 Cálice é uma canção escrita e originalmente interpretada pelos compositores brasileiros Chico Buarque

e Gilberto Gil em 1973, mas lançada somente em 1978. Censurada pela ditadura militar, a canção foi

liberada cinco anos depois e apareceu pela primeira vez no álbum Chico Buarque, tendo Milton Nascimento

e MPB4 cantando com Chico e, em seguida, no álbum Álibi, de Maria Bethânia.

11 Charles Lutwidge Dodgson, mais conhecido pelo seu pseudônimo Lewis Carroll (Daresbury, 27 de

janeiro de 1832 – Guildford, 14 de janeiro de 1898), foi um romancista, contista, fabulista, poeta,

desenhista, fotógrafo, matemático e reverendo anglicano britânico. Lecionava matemática no Christ

College, em Oxford. É autor do clássico livro Alice no País das Maravilhas, além de outros poemas escritos

em estilo nonsense ao longo de sua carreira literária, que são considerados políticos, em função das fusões

e da disposição espacial das palavras, como precursores da poesia de vanguarda.

12 Roger Mello é um escritor e ilustrador brasileiro. Nasceu em Brasília, em 1965. Vencedor do Prêmio

Internacional Hans Christian Andersen 2014, na Categoria Ilustrador. O prêmio é concedido pelo

International Board on Books for Young People (IBBY), considerado o Prêmio Nobel da Literatura Infantil

e Juvenil. A patrona do prêmio é a Rainha Margrethe II, da Dinamarca.

13 Intercessores podem ser pessoas, coisas, plantas; é o exercício do pensamento a possibilidade de novas

formas de expressar o pensar. É um companheirismo na escrita e na leitura.

14 Nome de um documentário de Eliane Brum, com o título n+1. Disponível no canal youtube.

15 O município de Serra/ES está dividido em seis regiões geopedagógicas, caracterizadas de acordo com a

localização. São elas: José de Anchieta, Carapina I, Carapina II, Serrana, Civit e Litoral.

16 Grupo sujeito é uma formulação de Felix Guattari para se referir a um grupo cuja transversalidade é

ampliada, conectado a elementos complexos, históricos, sociais, político-econômicos, estéticos. Um grupo

que cada vez mais, toma posse de sua própria voz. A esse grupo Guattari (1987) definiu como sendo "grupo

sujeito", em contraposição ao "grupo sujeitado", cujas leis de funcionamento lhe vinham de instâncias

exteriores.