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CLEMILTON LOPES PINHEIRO INTEGRAÇ ÃO DE FATOS FORMULATIVOS E INTERACIONAIS NA CONSTRU ÇÃO DO TEXTO: UM ESTUDO A PARTIR DA TOPICALIDADE FACULDADE DE CIÊNCIAS E LETRAS DE ASSIS/SP 2003

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CLEMILTON LOPES PINHEIRO

INTEGRAÇÃO DE FATOS FORMULATIVOS E INTERACIONAIS

NA CONSTRUÇÃO DO TEXTO:

UM ESTUDO A PARTIR DA TOPICALIDADE

FACULDADE DE CIÊNCIAS E LETRAS DE ASSIS/SP 2003

CLEMILTON LOPES PINHEIRO

INTEGRAÇÃO DE FATOS FORMULATIVOS E INTERACIONAIS

NA CONSTRUÇÃO DO TEXTO:

UM ESTUDO A PARTIR DA TOPICALIDADE

Tese apresentada ao Programa de Pós-graduação da Universidade Estadual Paulista, Campus de Assis, para a obtenção do título de Doutor em Letras, área de Filologia e Lingüística Portuguesa. Orientadora: Profª. Drª Clélia C. A. S. Jubran

FACULDADE DE CIÊNCIAS E LETRAS DE ASSIS/SP 2003

Ficha Catalográfica elaborada pela Biblioteca Central - UECE

P654i Pinheiro, Clemilton Lopes

Integração de fatos formulativos e interacionais na construção do texto: um estudo a partir da topicalidade/ Clemilton Lopes Pinheiro. 2003. 223 p.; 31 cm Orientadora: Profª Drª Clélia Cândiada Abreu Spinardi Jubran. Tese (Doutorado em Letras) – Universidade Estadual Paulista, 1. Lingüística. 2. Estratégia textual-interativa. 3. Interação. 4. Organização tópica. 5. Texto. I. Universidade Estadual Paulista CDD 410

FOLHA DE APROVAÇÃO

CLEMILTON LOPES PINHEIRO

Tese apresentada ao Programa de Pós-graduação da Universidade Estadual Paulista,

Campus de Assis, para a obtenção do título de Doutor em Letras, área de Filologia e

Lingüística Portuguesa.

BANCA EXAMINADORA

___________________________________________________ Profa. Dra. Clélia C. A. S. Jubran – Orientadora ___________________________________________________ ___________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ Assis/SP, _____, _____ de 2003.

À Karine, pelo amor e dedicação, essenciais no início deste trabalho,

Aos meus pais, pelo exemplo de perseverança e coragem,

Ao Gabriel, por ter compreendido a minha ausência,

À Nadja, pelos momentos de companheirismo,

Às colegas profas. Mônica, Nukácia, Áurea, Aluíza e Helenice, pela colaboração na análise da organização tópica dos textos,

À Isaura, pelos favores e sobretudo pela amizade,

À Clélia, pela competente “desorientação”, fundamental para minha formação de pesquisador,

À UECE, pelo afastamento das minhas atividades docentes,

À CAPES, pelo apoio financeiro

AGRADEÇO

RESUMO

Neste trabalho, investigo a integração de fatos formulativos e interacionais, na construção do texto, a partir da análise da sua organização tópica. A análise da organização tópica leva em consideração a identificação e delimitação de segmentos tópicos e dos procedimentos pelos quais esses segmentos se distribuem na linearidade do texto e se recobrem hierarquicamente. A maneira como os segmentos tópicos, nível intertópico, e os enunciados que compõem esses segmentos, nível intratópico, se vinculam lingüisticamente na materialidade do texto constitui a estratégia textual-interativa que denomino de articulação tópica. Tomo, então, a articulação tópica como uma estratégia de formulação textual que apresenta demandas pragmáticas, e detecto os mecanismos pelos quais ela se atualiza em diferentes usos da língua, analisando-os como fatos textuais-interativos. Os postulados da Pragmática, da Lingüística Textual de orientação mais recente e da perspectiva textual-interativa formam o tripé teórico que orienta o trabalho. Os dados foram coletados em um corpus constituído de textos selecionados entre gêneros textuais prototípicos de fala e de escrita e intermediários: carta pessoal, artigo de opinião, artigo científico, conversação espontânea, aula, palestra, entrevista falada e escrita e reportagem, de televisão e de revista. Os resultados mostraram que, como mecanismos de articulação tópica, são empregados marcadores discursivos, formas referenciais, formulações metadiscursivas, perguntas e paráfrases, que realizam, tanto no plano da constituição interna dos segmentos tópicos mínimos, intratópico, como no plano da articulação desses segmentos entre si, intertópico, movimentos que sinalizam a construção textual, relacionados a diversos aspectos do processo interacional.

Palavras-chave: estratégia textual-interativa, interação, organização tópica, texto.

ABSTRACT

In this work, I investigate the integration of facts formulativos and interactive, in the operation of the text, starting from the analysis of its topical organization. The analysis of the topical organization takes in consideration the identification and delimitation of topical segments and of the procedures for the which those segments are distributed in the sequencing of the text and is recovered hierarchically. The way as the topical segments, level intertopical, and the statements that compose those segments, level intratopical, is linguistically linked in the text surface constitutes the textual-interactive strategy that denominate of topical articulation. I take, then, the topical articulation as a strategy of textual formulation that it presents pragmatic demands, and I detect the mechanisms for the which she is used in different instances of the language, analyzing them as textual-interactive facts. The postulates of the Pragmatic, of the Textual Linguistics of more recent orientation and of the textual-interactive perspective they form the theoretical tripod that guides the work. The data were collected within a corpus constituted of texts selected among spoken, written and intermediate prototypical textual genres: personal letter, opinion article, scientific article, spontaneous conversation, class, lecture, written and spoken interviews and of magazines and televisions report. The results showed that, as mechanisms of topical articulation, discursive markers, referential forms, formulations metadiscursivas, questions and paraphrases are used. This mechanisms accomplish, so much in the plan of the internal constitution of the minimum topical segments, intratopical, as in the plan of the articulation of those segments to each other, intertopical, movements that signal the textual construction, related to several aspects of the process interactive. Keyword: textual-interactive strategy, interaction, text, topical organization.

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO..................................................................................................... 8

2. MODELOS TEÓRICOS DE ABORDAGEM DO TEXTO ........................... 18

2.1. OS ESTUDOS SOBRE O TEXTO E O DISCURSO................................... 18

2.2. PRAGMÁTICA............................................................................................. 22

2.3. LINGÜÍSTICA TEXTUAL........................................................................... 25

2.3.1. O conceito de texto ..................................................................................... 27

2.3.2. A composição do texto ............................................................................... 29

2.4. PERSPECTIVA TEXTUAL-INTERATIVA ................................................ 46

2.4.1. A análise textual-interativa no contexto do PGPF...................................... 46

2.4.2. A extensão do enfoque textual-interativo................................................... 49

2.4.3. O processo interacional............................................................................... 52

3. O TÓPICO DISCURSIVO COMO CATEGORIA ANALÍTICA

TEXTUAL-INTERATIVA ................................................................................ 60

3.1. O CONCEITO DE TÓPICO ......................................................................... 60

3.2. A ORGANIZAÇÃO TÓPICA....................................................................... 69

3.3. O SEGMENTO TÓPICO .............................................................................. 80

3.4. TÓPICO DISCURSIVO E ESTRATÉGIA TEXTUAL-INTERATIVA...... 85

4. A INTEGRAÇÃO DE FATOS FORMULATIVOS E

INTERACIONAIS NA ARTICULAÇÃO TÓPICA ....................................... 88

4.1. PROCEDIMENTOS ADOTADOS NA ANÁLISE...................................... 88

4.2. MECANISMOS DE ARTICULAÇÃO TÓPICA......................................... 92

4.2.1. Emprego de Marcadores Discursivos ......................................................... 94

4.2.1.1. O emprego de marcadores na seqüenciação tópica ................................104

4.2.1.2. O emprego de marcadores na retomada após inserção parentética ........116

4.2.1.3. O emprego de marcadores na retomada de discurso após

interrupção situacional............................................................................125

4.2.1.4. O emprego de marcadores na mudança tópica .......................................129

4.2.2. Emprego de formas referenciais ................................................................139

4.2.2.1. Encadeamento de referentes vinculados a um contexto central .............143

4.2.2.2. Reiteração de um mesmo referente .........................................................154

4.2.2.3. Conferição de estatuto de referente a um conjunto de informações

difundidas no cotexto.............................................................................167

4.2.3. Emprego de formulações metadiscursivas .................................................179

4.2.4. Emprego de perguntas ...............................................................................191

4.2.5. Emprego de paráfrases...............................................................................200

5. CONCLUSÃO................................................................................................211

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.........................................................217

ANEXOS

8

1. INTRODUÇÃO

Saussure, no início do século XX, lançou as bases para a compreensão do

conceito de estrutura, e desencadeou os estudos científicos da linguagem. Opondo-se a

todos os critérios normativos e elitistas subjacentes à concepção de linguagem

dominante até então, esses estudos se caracterizam pela formalização e pela abstração.

A língua é vista como um sistema de signos, uma entidade abstrata, exterior ao

indivíduo.

Por volta da década de 1970, outros lingüistas passaram a voltar sua

atenção para a linguagem enquanto processo interacional dinâmico. Considerou-se, a

partir de então, a própria essência do homem, que é social, discursiva e contextual.

Dessa forma, os estudos lingüísticos, pós-estruturalistas, caracterizam-se pela

consideração do processo discursivo. A significação torna-se fluida e cambiante. Da

mesma forma, o sujeito produtor da linguagem passa a ser visto no contexto de um

processo cultural e social.

Como a linguagem é discursivamente produzida, as diferenças não são mais

absolutas, mas relativas às suas condições de produção, o que torna o signo

descentrado, subjetivo, contraditório e fragmentado. As estruturas lingüísticas não

significam por si mesmas, mas pelo sentido que se dá a elas, em um intercâmbio

comunicativo. Nas referências feitas ao discurso, assinala-se uma preocupação não só

com o que as estruturas significam, mas sobretudo com o valor discursivo que elas

assumem em uma relação interacional complexa. A língua não pode mais ser tomada

como um elemento isolado do seu uso, porque o discurso pressupõe que não existe um

só sentido, mas diversos sentidos.

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Essa nova posição dos estudos lingüísticos é a base para a reflexão que

desenvolvo nesta pesquisa. Tomo como objeto de análise o texto, concebido como o

espaço de interação em que dois ou mais interlocutores, dialogicamente, nele se

constroem e são construídos. O enfoque teórico compatível com essa perspectiva de

texto é o textual-interativo, segundo o qual os dados pragmático-situacionais se

introjetam no texto, de forma que o interacional é inerente ao lingüístico. Esse enfoque

parte, então, do texto, como unidade global de análise, identifica processos de

composição textual e infere funções pragmáticas relativas a esses processos, que são,

assim, entendidas como estratégias textuais-interativas.

A estratégia textual-interativa objeto desta reflexão é a articulação tópica. A

topicalidade é tomada como um princípio organizador do texto. A análise da

organização tópica leva em consideração a identificação e delimitação de segmentos

tópicos e dos procedimentos pelos quais esses segmentos se distribuem na linearidade

do texto e se recobrem hierarquicamente. Dessa forma, é possível depreender dois

planos de organização tópica do texto: um horizontal, correspondente à progressão dos

tópicos no desenrolar do texto; e outro vertical, decorrente de uma sucessiva

especificação do tópico em pauta. Esses planos de organização tópica constituem

estratégias de montagem do texto, em função das relações interpessoais dos

interlocutores.

A maneira como os segmentos tópicos, nível intertópico, e os enunciados

que compõem esses segmentos, nível intratópico, se vinculam lingüisticamente na

materialidade do texto constitui a estratégia textual-interativa que estou denominando de

articulação tópica. A distinção entre os níveis intra e intertópico é uma opção

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metodológica, para englobar tanto a análise interna de cada segmento tópico mínimo,

depreendido na linearidade textual, quanto a análise das articulações entre esses

segmentos.

Tomo, então, a articulação tópica como uma estratégia de formulação

textual que apresenta demandas pragmáticas, e detecto os mecanismos pelos quais ela se

atualiza em diferentes usos da língua, analisando-os como fatos textuais-interativos.

Meu objetivo geral, nesta pesquisa, é, portanto, investigar a integração de fatos

formulativos e interacionais, na construção global do texto, a partir da análise da sua

organização tópica.

Muitos são os trabalhos que estudam a organização global do texto e a

atuação de aspectos de natureza pragmática nessa organização. No entanto, esses dois

aspectos são comumente considerados separadamente, ou seja, estudam-se, na

construção do texto, de um lado, os aspectos lingüísticos, de formulação, e de outro, os

de natureza pragmático-interacional. Esta pesquisa vem, portanto, contribuir para o

entendimento da organização do texto, tanto falado como escrito, na perspectiva

segundo a qual o seu processo de formulação está ancorado no processo interacional.

Para a análise, procurei constituir um corpus diversificado em termos de

gêneros textuais e de modalidade falada e escrita, com o propósito de verificar,

primeiramente, nessa diversidade, se há a recorrência de mecanismos de articulação

tópica. Além disso, fui guiado também pela hipótese de que um corpus heterogêneo me

daria possibilidades de perceber uma diversidade de fatos formulativo-interacionais, já

que estou considerando a articulação tópica como uma estratégia de construção do

texto, interacionalmente motivada. Esse levantamento, inevitavelmente, não poderia

11

deixar de passar pela discussão sobre relações entre fala e escrita e sobre tipologias

textuais.

Como essa questão é bastante complexa e o fato de aprofundá-la poderia

desvirtuar o trabalho do seu propósito principal, optei por analisar alguns estudos já

disponíveis e relacionar as principais conclusões aos objetivos da pesquisa de modo a

estabelecer os critérios de constituição do corpus.

Num trabalho sobre classificação de gêneros textuais, Marcuschi (1999a)

destaca questões fundamentais para a discussão sobre tipologias textuais e sobre a

relação fala e escrita. Uma dessas questões diz respeito à distinção entre tipo e gênero

de texto.

Além da falta de um consenso terminológico nas classificações textuais, que

incluem “tipo de texto, gênero textual, classe de texto, forma textual, espécie de texto”,

segundo o autor, as propostas de tipologias textuais não distinguem “tipo como

fenômeno teoricamente claro e empiricamente heterogêneo enquanto forma textual, e

gênero como fenômeno teoricamente pouco claro e muito difuso, mas empiricamente

claro e constituído como forma textual realizada de fato” (1999a, p. 27-8). O autor,

então, sugere a necessidade de determinar com certa precisão o que se entende por

gênero ou tipo textual.

Marscuschi (1995, 1999a) considera que os tipos textuais, tradicionalmente

estudados e designados como narração, descrição, argumentação, exposição e injunção,

são construtos teóricos, e, por não haver textos homogêneos em relação a esses tipos,

não dão conta dos textos efetivamente produzidos na fala e na escrita. Para o autor, um

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tipo textual é algo bem diverso do que uma forma textual empiricamente realizada.

“Uma forma textual se dá como um evento de fala e é uma ocorrência empírica de um

tipo possível, mas raramente se realiza como um tipo puro numa dada circunstância”

(1999a, p. 42).

Essas formas lingüísticas “empiricamente realizadas” são identificadas com

base no conhecimento intuitivo do falante sobre formas de comunicação manifestadas

em determinados textos. A sua pluralidade constitui os gêneros. A noção de gênero é

vaga, reconhece o autor, mas empiricamente clara. “Um gênero seria, pois, uma noção

cotidiana usada pelos falantes que se apóiam em características gerais para identificá-

lo” (1995, p. 3). Designações do tipo o artigo sobre..., na aula de hoje, a carta de minha

mãe e muitas outras são bastante claras e mostram que esses gêneros têm elementos

distintivos suficientes para serem identificados com relativa segurança, embora não haja

indicadores que possibilitem uma organização da tipologia.

A noção de gênero textual que leva em conta o conhecimento partilhado

sobre formas de comunicação realizadas em contextos específicos de uso, oposta à

noção de tipo textual que leva em conta um construto teórico, vai ao encontro da

perspectiva teórica deste trabalho, segundo a qual os usos lingüísticos são impregnados

pelo contexto de produção. Essa noção se apresentou, então, como um primeiro e

fundamental aspecto a ser considerado na constituição do corpus.

Uma outra questão que emerge da discussão de Marcuschi (1999a) diz

respeito à correlação dos gêneros com as modalidades oral e escrita da língua. Segundo

o autor, uma relação com rigor metodológico entre textos falados e escritos tem que ser

feita através de comparações de fenômenos similares. Isso quer dizer que seria

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inconveniente estabelecer relações entre fala e escrita partindo da análise de textos

acadêmicos, de um lado, e conversações espontâneas, de outro, por exemplo. O mais

próprio é estabelecer relações entre fenômenos comparáveis, tais como uma

conversação espontânea e uma carta pessoal ou como uma conferência acadêmica e um

artigo científico.

Dessa forma é que o autor propõe que as diferenças entre fala e escrita se

concebem num continuum tipológico de gêneros de textos, determinado pela correlação

entre essas modalidades. Entender a relação fala-escrita a partir dessa concepção

significa, antes de tudo, negar a polarização de parâmetros e a estigmatização da

modalidade falada.

O continuum tipológico apresenta dois planos: o superior representa o da

escrita; o inferior, o da fala. O plano superior inicia-se com TE1, que representa o texto

escrito prototípico. A partir dele identificam-se, do ponto de vista medial, outros textos

escritos (TE2, TE3... TEn), os quais vão assumindo, gradativamente, do ponto de vista

conceptual, características da fala. No plano inferior, TF1 representa o texto falado

prototípico. A partir dele, identificam-se sucessivamente os textos TF2, TF3... TFn,

todos medialmente falados, mas, gradativamente, percebidos conceptualmente como

textos escritos.

São exemplos de gêneros textuais prototípicos da escrita e da fala,

respectivamente, os gêneros acadêmicos como artigos científicos, contratos, e as

conversações como conversação espontânea, conversação telefônica. À medida que vai

havendo um afastamento dos pólos prototípicos para os extremos opostos, a afinidade

entre meio e concepção vai diminuindo, nos limites de cada plano do continuum, até se

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constituir uma nova afinidade com o plano oposto. Isso permite se observarem gêneros

textuais como os bilhetes, que são conceptualmente falados, mas medialmente escritos;

e as exposições acadêmicas, que são medialmente faladas, mas conceptualmente

escritas. Já notícias de jornal e revistas (na escrita) e notícias de televisão e de rádio (na

fala) constituem gêneros textuais, do ponto de vista conceptual, equilibradamente

marcados tanto pela fala como pela escrita. Em resumo, o autor propõe que os textos

devem ser observados dentro de uma escala que vai do mais prototípico da fala ao mais

prototípico da escrita, e uma tipologia textual concebida a partir disso deve ser

entendida como uma gradação de gêneros textuais.

Biber (1988, p. 18) é outro autor que comunga da idéia de que fala e escrita

formam “um contínuo distribuído numa escala de parâmetros empiricamente

detectáveis”. Para o autor, os textos se diferenciam em duas dimensões tomadas como

escalas contínuas: uma funcional, que diz respeito às características da situacionalidade

e discursividade do texto; e uma lingüística, que se reporta a traços gramaticais, lexicais

e fonológicos.

A partir de um conjunto de características observadas em formas

prototípicas da fala e da escrita, Biber (1988) estabelece alguns parâmetros situacionais

associados à dimensão funcional. Esses parâmetros relacionam-se ao canal físico, ao

uso cultural, à relação entre os participantes, à relação dos participantes com o texto, e

ao propósito comunicativo. O canal é caracterizado como unicanal, no caso da escrita, e

multicanal, no caso da fala. O uso cultural é definido pela natureza da aquisição e pelo

valor social da língua. A relação entre os participantes se define pela possibilidade de

interação face a face, pelas relações pessoais e pelo grau de conhecimento mútuo. A

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relação dos participantes com o contexto, com o próprio texto e com o objetivo da

comunicação dizem respeito, respectivamente, às características temporais e espaciais

do discurso, actoriais e propósitos do texto.

Observando os textos a partir dessas características situacionais, constata-se

que eles apresentam valores de fala, de escrita ou um valor intermediário. Por exemplo,

quanto à escolha do assunto, um dos valores relacionados ao parâmetro relação entre os

participantes, a conversação espontânea é um gênero típico de fala (a escolha do

assunto é negociada entre os participantes), o artigo científico é típico de escrita (a

escolha do assunto não é negociada), já a entrevista é um gênero intermediário (o

assunto é previamente proposto pelo entrevistador, mas pode ser também negociado).

Cada gênero textual é construído em diferente situação de comunicação,

para diferentes propósitos, ou seja, são modos e formas diversos de produzir sentido e

de se estabelecerem relações entre sujeitos. Considerei, então, o fato de que essa

diversidade pode exercer influências sobre o tópico discursivo e a maneira como ele é

conduzido; e, dessa forma, sobre a articulação tópica. Assim selecionei dez gêneros

textuais, entre prototípicos de fala e de escrita e os intermediários: carta pessoal, artigo

de opinião, artigo científico, conversação espontânea, aula, palestra, entrevista falada e

escrita e reportagem, de televisão e de revista. Não é meu objetivo, no entanto,

estabelecer diferenças entre fala e escrita e gêneros textuais no que diz respeito à

articulação tópica. O que levei em consideração foi mesmo a hipótese de que um corpus

heterogêneo me daria boas possibilidades de perceber uma diversidade de fatos

formulativos e interacionais, e, assim, fazer discussões compatíveis com o propósito da

pesquisa.

16

Alguns exemplares dos textos foram extraídos do corpus do projeto

PORCUFORT1, alguns do corpus do NELFE2, e ainda outros foram coletados por mim

mesmo, especialmente para este fim. Há gêneros que apresentam um número de

exemplares maior do que outros. Isso ocorre em virtude da necessidade de equilibrar a

dimensão entre os textos.

Cada texto foi segmentado, com base no princípio da topicalidade, e foi

depreendida a organização linear e hierárquica dos tópicos. À medida que fui

observando construção interna dos segmentos e a interligação entre eles, nos diferentes

planos hierárquicos, fui identificando recorrências, formulativas e interacionais, na

interligação dos segmentos e dos enunciados. Finalmente, classifiquei e organizei os

fatos recorrentes no conjunto da análise em grupos de mecanismos, através dos quais se

realiza a articulação tópica. Através da descrição do funcionamento desses mecanismos

fui mostrando como os fatos textuais se integram ao interacionais.

A apresentação do percurso da pesquisa está dividida em três partes.

Primeiro, faço uma exposição sobre os postulados da Pragmática, da Lingüística

Textual de orientação mais recente e da perspectiva textual-interativa, que juntos

constituem um tripé que dá a orientação teórica geral do trabalho. Num segundo

momento, aponto a topicalidade como uma propriedade geral da organização do

discurso. A partir da discussão dos principais conceitos relacionados a essa propriedade,

proponho o tópico discurso como categoria que possibilita a análise textual-interativa. O

1 O projeto PORCUFORT (Português Oral Culto de Fortaleza) constitui uma aplicação, na cidade de Fortaleza-Ce, do projeto NURC (Norma Urbana Culta), cujo objetivo é a descrição do português falado culto no Brasil. Os inquéritos são distribuídos de acordo com o sexo e a faixa etária dos informantes e com o grau de formalidade. 2 O NELFE (Núcleo de Estudos da Língua Falada e Escrita) é um núcleo de pesquisa cadastrado no Diretório de Grupos de Pesquisas do CNPq, inserido no programa de Pós-Graduação em Lingüística da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco). O objetivo central do núcleo é investigar questões ligadas à fala e à escrita (MARCUSCHI, 1996).

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terceiro e último momento constitui a análise da articulação tópica propriamente dita,

em que reúno os principais dados encontrados nos textos que compõem o corpus.

Descrevo os mecanismos mais recorrentes através dos quais a articulação intra e

intertópica se manifesta em diferentes gêneros textuais, falados e escritos, e discuto os

fatos formulativos e interacionais que se integram para a construção do texto.

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2. MODELOS TEÓRICOS DE ABORDAGEM DO TEXTO

Neste capítulo, apresento postulados da Pragmática, da Lingüística Textual

e da perspectiva Textual-interativa, que constituem uma base teórica para a discussão da

organização do texto. A dimensão pragmática possibilita a descrição de fenômenos

lingüísticos textuais a partir do uso da língua em situações concretas. A Lingüística

Textual, particularmente a de orientação pragmática, possibilita perceber o texto como

unidade globalizadora e sócio-comunicativa, caracterizado também por uma seqüência

de atividades de composição. Enquanto unidade que ganha existência dentro de um

processo interacional, o texto congrega e sinaliza seu processo de formulação e

interação. Esse enfoque é abordado pela perspectiva textual-interativa.

2.1. OS ESTUDOS SOBRE O TEXTO E O DISCURSO

A linguagem verbal, dentro do contexto maior das atividades simbólicas

humanas, tem sido o objeto de reflexão da ciência lingüística ao longo dos seus quase

cem anos. A natureza complexa e heterogênea desse fenômeno fez com que essa

reflexão fosse desenvolvida a partir de abordagens e orientações diversas. Cada uma

delas procede, claro, a um trabalho de delimitação de seu objeto, isto é, estabelece um

recorte relativamente ao fenômeno de linguagem que se propõe a estudar.

O estruturalismo, corrente teórica que coincide com o surgimento da

Lingüística, centra a sua análise no estudo da língua enquanto sistema. Ao estabelecer

seus parâmetros, a abordagem estruturalista faz uma escolha pelo estudo da língua em

abstrato (a langue em oposição à parole, nos termos de Saussure), para analisá-la num

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determinado espaço de tempo, ou seja, em um estado sincrônico. Os estudos

estruturalistas se desenvolveram em especial nos campos da Fonologia e da Morfologia,

com relevantes descrições sobre as línguas em geral, inclusive línguas indígenas. Até os

anos 50, o estruturalismo foi hegemônico nas reflexões lingüísticas (ORLANDI, 1993).

O propósito de uma lingüística assim imanente, preocupada com um falante

ideal, foi abraçado por Chomsky, com os postulados da teoria gerativa. Baseado no

racionalismo, Chomsky afirma que os seres humanos nascem com uma capacidade

natural para o uso da linguagem e a tarefa do lingüista é explicar os princípios que

subjazem a esse uso (ORLANDI, 1993). As hipóteses gerativistas têm sido responsáveis

por inúmeros estudos, em especial na área da Sintaxe.

Essas correntes, que constituem uma lingüística do sistema, se por um lado

foram de reconhecida importância para situar a Lingüística entre as ciências humanas,

por outro, foram alvo de severas críticas. A principal diz respeito à forma

excessivamente redutora de definir o seu objeto, quando separaram rigidamente a língua

da fala, o lingüístico do extralingüístico. Essa separação foi a responsável pelas

insuficiências de algumas análises, sobretudo as relativas a questões de significado e

sentido.

Para preencher os espaços deixados pelas dicotomias estáveis da lingüística

do sistema e resgatar outros elementos importantes para a reflexão lingüística,

desenvolve-se uma série de estudos cujas orientações teóricas gerais caracterizam a

lingüística da enunciação, ou seja, a lingüística que se ocupa das manifestações

lingüísticas produzidas por indivíduos concretos, em situações concretas de interação

verbal, sob determinadas condições de produção. Barros (1999) aponta algumas dessas

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linhas teóricas em desenvolvimento no Brasil e as reúne sob o rótulo de estudos do texto

e do discurso. Entre essas teorias a autora cita a Análise do discurso francesa, a

Semiótica Narrativa e Discursiva, os estudos funcionalistas do discurso, a Lingüística

Textual, a Análise da Conversação e/ou análise da organização textual-interativa.

Para a autora, o que caracteriza os estudos sobre o texto e o discurso é a

ruptura de duas barreiras impostas pela lingüística imanente: a que impede a passagem

da frase ao texto e a que separa o enunciado de sua enunciação. Essas barreiras são

rompidas a partir do momento em que é considerado o exame da organização do texto e

das relações entre discurso, enunciação e fatores sócio-históricos.

Ainda segundo Barros (1999), o novo caminho percorrido pelos estudos do

texto e do discurso não trouxeram apenas acréscimos à teoria lingüística, mas,

sobretudo, mudanças significativas de posicionamentos frente ao heterogêneo fenômeno

da linguagem. A principal mudança de posicionamento, da qual decorrem todas as

outras, foi a própria forma de conceber a linguagem, a qual deixou de ser vista apenas

como meio de transmissão de informação e passou a ser concebida como instrumento de

interação. Como conseqüência dessa nova visão sobre a linguagem, é o texto e não mais

a frase a unidade de análise, porque a interação verbal se faz por meio de texto e não de

frases isoladas. O que funda a linguagem concebida como interação e o que dá sentido

ao texto como também o que constrói os próprios sujeitos produtores do texto são as

relações intersubjetivas. Isso faz com que se coloque a intersubjetividade como anterior

à subjetividade. O discurso, assim, passa a ser visto como lugar, ao mesmo tempo, do

social e do individual.

21

Segundo Barros (1999, p. 3), essa nova forma de conceber a linguagem

aponta para a Lingüística um novo objeto, com as seguintes características: “Ao mesmo

tempo social e individual, instrumento de argumentação e informação, fundado pela

interação ou pelas relações de intersubjetividade que antecedem e criam a subjetividade,

de dimensão maior que a da frase e com organização própria”.

Os estudos lingüísticos desenvolvidos a partir dessas novas posições

teóricas preenchem o espaço deixado pela bem definida lingüística do sistema.

Amalgamou-se o que antes era nitidamente separado. Isso causou uma crítica a esses

estudos, a fragilidade e a instabilidade de não serem nem uma coisa nem outra. No

entanto, segundo Barros (1999, p 4), se a instabilidade é o ponto fraco dos estudos do

texto e do discurso, é ela também a sua maior grandeza.

São os fatos lingüísticos instáveis, aqueles que não se resolvem como “ou isto ou aquilo”, que instigam os estudiosos da linguagem, e os do discurso e do texto, antes de todos. O estudioso do discurso, bravamente, acredita poder dizer alguma coisa sobre essas questões, sem, no entanto, estabilizar o instável, pois cria apenas, e o reconhece, um equilíbrio precário.

Em resumo, quero destacar que a grande alteração nos paradigmas

teóricos da Lingüística, sobre a qual acabei de discorrer, decorre, em parte, do advento

da Pragmática, da Lingüística Textual e da perspectiva textual-interativa, que, juntas,

formam um triplé sobre o qual se orienta este trabalho. A seguir, passo a discorrer sobre

cada um desses campos de investigação lingüística, situando o trabalho no contexto de

cada um deles.

22

2.2. PRAGMÁTICA

Apesar de ser tida como indefinida quando às suas linhas de fronteira, a

Pragmática indica uma perspectiva específica e uma atitude reconhecível em relação aos

fatos lingüísticos (PARRET, 1984). Os estudos de orientação pragmática têm como

foco de interesse as condições que governam a utilização da linguagem, a prática

lingüística. Daí o fato de a Pragmática ser tomada como campo de investigação do uso

lingüístico. Costuma-se atribuir a origem da Pragmática às reflexões de Austin (1990),

Searle (1991) e Grice (1975) sobre a linguagem.

Austin introduziu a noção de ato de fala, que se colocou como fundamental

para o desenvolvimento dos estudos pragmáticos. Essa noção se opõe à reflexão

filosófica, reinante até então, segundo a qual a função da linguagem, em geral, e das

afirmações em particular, é a de descrever um “estado de coisas”. As afirmações, por

essa razão, podem ser verdadeiras ou falsas. A condição de veridicidade depende da

conformidade entre o que elas descrevem e a realidade.

Para Austin (1990), a função da linguagem não é meramente a descrição da

realidade. Ele introduziu a distinção entre as afirmações que descrevem um estado de

coisas (as constativas) e as afirmações que não são descritivas (as perfomativas).

Através dessas últimas realizam-se ações, são os atos de fala.

Austin definiu, assim, o ato de fala como uma ação lingüística mínima, que

ocorre simultaneamente em três níveis: a) o ato locucionário: é o que se realiza ao se

enunciar uma frase; b) o ato ilocucionário: é o que se realiza na linguagem; c) o ato

perlocucionário: é o que se realiza pela linguagem. Quando se toma, por exemplo, a

23

frase “Advirto-o a não fazer mais isso”, o ato de enunciar cada um dos elementos

lingüísticos que a compõem é o locucionário. Através dessa enunciação realiza-se o ato

ilocucionário da advertência, que, inclusive, é marcado pela forma verbal “advirto”. O

resultado da enunciação pode ser a persuasão do interlocutor. Essa persuasão é o ato

perlocucionário, que não se realizou na linguagem, mas por ela.

A ação lingüística assim entendida divide-se em três dimensões de sua

realização: a do ato de expressão mesmo, da produção do enunciado; a do plano da

expressão com força ilocutiva, do enunciado associado a uma intenção objetiva pelo

locutor, e a do plano da interpretação, por parte do alocutário, do enunciado associado a

uma intenção e sua correspondente interpretação por parte do receptor.

Relevante é o aspecto da convencionalidade que norteia o ato ilocucionário.

De um lado, há as regras gramaticais que determinam a locução; de outro, as regras de

enunciação que determinam o ato intencional (ilocucionário), que são fundamentais

para a realização efetiva e satisfatória da intencionalidade no plano do ato

perlocucionário. Assim, da mesma forma que há regras morfossintáticas que regem a

elaboração do enunciado, há regras de convenção que regem a relação locutor/alocutário

no processo da ação lingüística.

Searle (1991), um dos sucessores de Austin, retoma seu programa e

desenvolve uma série de aspectos de sua teoria. Na continuidade da reflexão sobre os

atos de fala, Searle parte do princípio segundo o qual a unidade de comunicação é o

enunciado e desenvolve a idéia de que a produção do enunciado é um ato de fala. Não é

pertinente aprofundar aqui essa reflexão. O fundamental é a noção de que a teoria da

linguagem não pode deixar de considerar o fato de que ela é também uma ação.

24

A linguagem como ação também é tema de reflexão de Grice (1975). Para

ele, essa ação é norteada por um princípio geral da comunicação: o da cooperação.

Considerando esse princípio, o falante leva em conta sempre, em suas intervenções, o

desenrolar da conversa e a direção que ela toma. Em outras palavras, isso quer dizer que

a contribuição do falante à conversação deve ser, no momento em que ocorre, tal como

requer o objetivo ou a direção aceita da troca verbal em que está engajado.

O princípio da cooperação é explicado por quatro categorias: a da

quantidade das informações dadas, a da sua verdade, a da sua pertinência e a da maneira

como são formuladas. Essas categorias constituem as máximas conversacionais.

Grice (1975) também aborda a noção de implicatura, que são as inferências

que se extraem dos enunciados. As implicaturas podem ser convencionais, as

provocadas por uma expressão lingüística, ou conversacionais, as suscitadas pelo

contexto. Como a implicatura conversacional depende de elementos contextuais, ela

está intimamente ligada às noções do princípio de cooperação e das máximas

conversacionais.

As reflexões de Austin, Searle e Grice são fundamentalmente importantes

para os estudos lingüísticos, na medida em que elas permitiram aos estudiosos da

linguagem levantar a questão da relação entre a língua e o seu uso. Foram assim os

primeiros estudos sistematizadores da idéia de que na linguagem se estabelecem

relações que se situam além da superfície lingüística imediata, ou seja, relações

fundamentalmente discursivas.

25

O que quero mostrar com essa breve alusão aos estudos de Pragmática é a

maneira como foi surgindo a linha que compreende os dados lingüísticos na relação

entre língua e uso. Nos próximos itens, sobre a Lingüística Textual, principalmente a

sua fase mais recente, e sobre a perspectiva textual-interativa, mostrarei de forma mais

explícita como a Pragmática orienta os estudos sobre o texto.

2.3. LINGÜÍSTICA TEXTUAL

Dentro do amplo contexto dos estudos do texto e do discurso, a Lingüística

Textual se apresenta como um ramo da Lingüística que toma como objeto particular de

investigação os aspectos mais especificamente relacionados aos processos de construção

e organização do texto. Apesar de apresentar um objeto relativamente bem definido, a

história da sua constituição como corrente de investigação lingüística mostra que ela

não se desenvolveu de forma homogênea.

Koch (2001, p. 72) aponta a existência de três momentos no

desenvolvimento da Lingüística Textual que abrangem preocupações teóricas diversas

entre si. Para a autora, embora seja possível, em linhas gerais, perceber uma

superposição entre esses três momentos, “há uma certa cronologia envolvida nessa

sucessão”.

O primeiro momento se caracteriza pela preocupação com fenômenos cuja

explicação não era recoberta pelas teorias que se limitavam ao nível da frase. É o

momento da análise transfrástica. Passou-se, assim, a observar no nível interfrasal uma

série de fatos como a co-referenciação, a pronominalização, a seleção de artigos

26

(definidos e indefinidos), a concordância de tempos verbais, a relação tópico-

comentário, entre outros. Essa tentativa de desenvolver uma Lingüística Textual na

linha de uma lingüística da frase ampliada ou corrigida mostrou-se insatisfatória e foi

abandonada. Cogitou-se, então, a elaboração de gramáticas textuais, que não

considerassem o texto apenas como uma soma dos sentidos das frases que o constituem.

Nesse momento, o texto é entendido como unidade teórica formalmente

construída em oposição ao discurso, unidade funcional, de uso. As estruturas dessa

unidade deviam ser determinadas pelas regras de uma gramática textual. Essa

perspectiva de ver a organização do texto foi bastante influenciada pela teoria gerativa.

A gramática textual, assim como a gramática de frases proposta por Chomsky, consistia

num sistema finito de regras, comum a todos os usuários de uma língua, o qual lhes

permitiria perceber se uma seqüência lingüística é ou não um texto bem formado. A

novidade foi a legitimação do texto como objeto da Lingüística.

As gramáticas textuais também mostraram suas insuficiências. Uma delas

foi a inoperância de se estabelecerem regras capazes de descrever todos os textos

possíveis numa determinada língua, em virtude da possibilidade de aparecerem novos

textos, cujas regras de formação não estariam previstas pela gramática. Surgiu, então, o

momento em que os textos passaram a ser estudados dentro de seu contexto, entendido,

de modo geral, como o conjunto de condições (externas a ele) de produção, recepção e

interpretação.

Segundo Koch (2001, p.81), a Lingüística Textual, atualmente, vem

cobrindo um domínio multi e interdisciplinar, em que se busca explicar como se dá a

27

interação social através do texto, visto como “fruto de um processo extremamente

complexo de produção da linguagem”.

É nessa vertente mais atual da Lingüística Textual em que vou buscar

subsídios para a discussão que pretendo desenvolver nesta pesquisa, exatamente porque

é a que apresenta uma forte inclinação para a adoção de uma perspectiva interacional no

tratamento da linguagem. Das discussões realizadas sob esse enfoque, interessam-me

mais especificamente as relacionadas ao conceito e à construção do texto.

2.3.1. O conceito de texto

Ao longo do desenvolvimento teórico da Lingüística Textual, o conceito de

texto passou por profundas modificações. Ele passou a ser concebido não mais como

um produto acabado e pronto, resultado de uma competência lingüística social e

idealizada, mas como uma atividade verbal, consciente e interacional. Desenvolve-se,

assim, uma dimensão discursiva de texto. Seguindo essa última concepção, Koch (1997,

p. 22) define texto da seguinte forma:

Poder-se-ia, assim, conceituar o texto como uma manifestação verbal constituída de elementos lingüísticos selecionados e ordenados pelos falantes, durante a atividade verbal, de modo a permitir aos parceiros, na interação, não apenas a depreensão de conteúdos semânticos, em decorrência da ativação de processos e estratégias de ordem cognitiva, como também a interação (ou atuação) de acordo com práticas socioculturais.

Nesse quadro de reconceitualização, o texto passa a ser entendido como

uma unidade lingüística material dotada de sentidos, que é produzida por um ou vários

enunciadores, em uma situação de interação específica. O texto é o resultado de uma

atividade comunicativa efetiva. Um aglomerado de frases não produz, por si só, um

28

texto. Para que haja texto, é preciso haver coerência e dialogia, entre o enunciado

presente e os enunciados passados do gênero discursivo que está sendo re-atualizado.

O diálogo do enunciado presente com os enunciados passados do gênero

discursivo é que faz do texto um espaço de significação passível de reconhecimento e

interpretação. Se a memória discursiva se apagasse a cada instância de interação social,

a pronta comunicação pragmática do cotidiano seria impensável. É, pois, a partir do

suposto de um determinado gênero discursivo que uma seqüência lingüística é

percebida como um todo coerente, ou seja, como um texto que contém suas próprias

pistas de interpretação. O gênero é decisivo não só na percepção da coerência externa e

contextual do texto, mas também na sua coerência interna. Cada tipo de gênero está

associado a uma forma de organização textual.

Nessa perspectiva, o texto não é um hiper-significante fechado, que encerra

um único significado a ser depreendido pelo leitor/ouvinte, mas como um espaço a ser

preenchido com as projeções feitas por esse leitor/ouvinte. Com base nessa visão de

texto, Koch (2002, p. 17) define a compreensão da seguinte forma:

Ela (a compreensão) é, isto sim, uma atividade interativa altamente complexa de produção de sentidos, que se realiza, evidentemente, com base nos elementos lingüísticos presentes na superfície textual e na sua forma de organização, mas que requer a mobilização de um vasto conjunto de saberes (enciclopédia) e sua reconstrução no interior do evento comunicativo.

Nessa perspectiva de ver a compreensão, o leitor/ouvinte é também re-

significado: deixa de ser paciente, um decifrador do sentido depositado no texto para ser

um co-enunciador, que exerce um papel ativo na construção das significações geradas

pelo texto. No “jogo” interacional de produção do texto, segundo Koch (2002), há,

então, três peças: 1) o produtor/planejador, que procura viabilizar o seu “projeto de

29

dizer” através de estratégias de organização textual e de orientações para o interlocutor;

2) o texto, que é organizado estrategicamente para estabelecer limites quanto às

compreensões possíveis; e 3) o leitor/ouvinte, que, a partir do modo como o texto se

encontra construído, das sinalizações que lhe oferece e da mobilização de contextos

relevantes, constrói-lhe o sentido.

Estudar o texto em sua dimensão discursiva requer, portanto, a consideração

da questão do sujeito e sua participação nesse processo, já que "todo texto tem um

sujeito, um autor" (BAKHTIN, 1997, p. 330), que o produz e que se produz ao produzi-

lo. É com as palavras e com as idéias do outro que o próprio "eu" é tecido. Isso requer

também que o texto seja considerado em suas múltiplas situações de interlocução, como

resultado de trocas verbais e sociais e concretamente situadas, as quais configuram a

dinâmica de uma dada comunidade lingüística.

A essa concepção de texto como atividade verbal-interacional subjaz a

orientação pragmática de compreender os fatos lingüísticos no âmbito de situações

concretas de uso.

2.3.2. A composição do texto

Os estudos em Lingüística Textual postulam que no texto são utilizados

determinados recursos que servem para realizar sua organização. No entanto, não é

unânime a forma de conceber e explicar esses recursos, nem a de mostrar como eles se

inter-relacionam para formar o texto. A seguir discorro sobre alguns estudos sobre a

construção e a organização do texto.

30

Segundo Halliday & Hasan (1980), um dos componentes formadores do

texto é a coesão. Trata-se de um mecanismo através do qual se estabelecem entre as

orações as relações de significado que definem um texto como tal e determinam o seu

padrão de tessitura.

A coesão é entendida, então, como “o conjunto de recursos semânticos que

liga uma frase ao que a antecede no texto” (1980, p. 10). “A coesão ocorre quando a

interpretação de algum elemento do discurso depende do outro. Um pressupõe o outro

no sentido de que um não pode ser efetivamente decodificado a não ser por recorrência

a esse outro” (1980, p. 4).

A coesão, nessa ótica, ocorre quando, num texto, tem-se um termo que

pressupõe (o referente) e um outro que é capaz de resolver essa pressuposição (o termo

referido). A força da coesão se forma na relação estabelecida entre esses dois termos. A

cada ocorrência de coesão tem-se o que os autores denominam tie, o elo coesivo. Os

padrões de tessitura de um texto podem ser analisados em termos dos elos coesivos que

exibe.

A coesão se realiza através do sistema léxico-gramatical da língua. É,

portanto, “expressa em parte através da gramática e em parte através do vocabulário”

(1980, p. 5). Halliday & Hasan definem três categorias de itens coesivos: a coesão

gramatical, que compreende a referência, a substituição e a elipse, a conjunção e a

coesão lexical.

A coesão estabelecida através da referência compreende itens para cuja

interpretação é necessário se recorrer a outros elementos do texto. A referência é

31

potencialmente coesiva quando envolve relações endofóricas, isto é, relações que se

estabelecem dentro do texto, em oposição às relações exofóricas, que são determinadas

pela situação, portanto, extra-textuais e não coesivas. A referência compreende três

subcategorias: pessoal, demonstrativa e comparativa.

A substituição, como o próprio nome indica, envolve a substituição de um

item por outro. Trata-se, assim, de uma relação gramatical entre unidades lingüísticas,

cuja função determina seus diferentes tipos: nominal, verbal e oracional.

A elipse é um caso de substituição por zero. Sua função é, pois, estabelecer

relações de coesão através da omissão, sob regras definidas, de parte do discurso que

pode ser recuperado, tornando explícito apenas o que é novo e não pode ser recuperado.

A elipse compreende também três categorias: a nominal, a verbal e oracional.

A conjunção estabelece relações semânticas que indicam que o que se segue

está sistematicamente ligado ao que ocorreu anteriormente. Os elementos conjuntivos

são coesivos não por si mesmos, mas indiretamente, em virtude das relações semânticas

específicas que estabelecem entre as orações. Em outras palavras, isso significa dizer

que há uma relação semântica pré-existente entre duas orações de um texto e que a

conjunção assinala formalmente tal relação.

Halliday & Hasan classificam essas relações em quatro categorias: aditivas,

adversativas, causais e temporais. Os autores postulam ainda a presença do que

denominam “itens conjuntivos”, ou seja, elementos que fazem a coesão entre as orações

sem estabelecer nenhum dos quatro tipos de relação semântica, assumindo apenas uma

função continuadora.

32

A conjunção é interpretada ainda em termos da função interpessoal e

experiencial da linguagem. Essa interpretação gera duas subcategorias de relações

aditivas, adversativas, causais e temporais: externas e internas. As relações externas são

relações entre eventos do mundo real, as internas são relações entre eventos lingüísticos

que ocorrem no tempo de organização do discurso do falante/escritor.

Os autores apontam uma série de subcategorias para cada um dos quatro

tipos de relações conjuntivas e para os elementos continuativos, em que procuram

inserir o maior número de relações semânticas possíveis de serem estabelecidas entre

orações de um texto. Para cada subcategoria de relação, eles fazem o levantamento dos

termos capazes de expressá-las, em inglês. Por exemplo, as relações causais são

expressas por thus, therefore, consequence e apresentam subtipos como causais

específicas (razão, resultado e propósito), causal condicional, causal delimitadora de

assunto; todas ainda podendo ser internas ou externas.

A coesão lexical é obtida por meio da seleção vocabular. Os autores

distinguem dois tipos: a reiteração e a colocação. A reiteração compreende a repetição

de um item, o uso de um nome genérico, de sinônimos e de superordenados. A

colocação se estabelece através da associação de itens lexicais que regularmente co-

ocorrem. São itens que participam do mesmo ambiente semântico.

Em resumo, na perspectiva de Halliday & Hasan (1980) são as relações de

coesão, entendidas como relações de inter-dependência entre orações, que formam a

unidade textual. Essas relações assumem um papel fundamental na formação do texto,

elevadas à condição de quase suficiência. Os autores chagam a afirmar que a coesão “é

33

comum ao texto de toda espécie e é, de fato, aquilo que faz um texto ser um texto”

(1980, p. 13).

Segundo Antunes (1996, p. 49), a coesão é realmente comum a toda a

espécie de texto, mas “não constitui sozinha o mecanismo de criação das configurações

lingüísticas textuais. Muitos elementos apontam para a suposição de que a coesão, a

despeito da significativa função que desempenha, não chega a ser determinante daquilo

que faz um texto ser um texto”.

Para essa autora, a coesão se define como um fenômeno de organização da

superfície do texto, orientado para o estabelecimento da continuidade seqüencial, que,

por sua vez, viabiliza e assinala um outro tipo de continuidade que a constituição

semântica do texto impõe. Essa definição parte do princípio de que a organização do

texto está pautada por exigências de continuidade e de progressão, que se instauram

para assegurar a sua unidade semântica. O que sustenta a continuidade da seqüência

superficial do texto é a continuidade de conceitos e das relações subjacentes. Mas são as

relações fundamentalmente semânticas as implicadas na coesão, ou seja, “a

continuidade da superfície que a coesão cria e assinala opera-se pelas relações

semânticas que ligam os vários segmentos desta superfície” (1996, p. 39).

Essa concepção de coesão de Antunes se apóia na ótica de Halliday &

Hasan (1980), segundo a qual a coesão fundamenta-se em relações de significado. Os

recursos que ligam os elementos da superfície do texto são, ao mesmo tempo,

operadores e sinais indicativos de inter-relações semânticas. No entanto, a autora

reconhece o aspecto apenas parcial da coesão como dispositivo de organização do texto.

A autora recorre a Beugrande & Dressler (1983), que consideram a coesão apenas como

34

um dos fatores de textualidade, ou seja, o conjunto de características que fazem com que

um texto seja um texto3. Para esses autores, a coesão e a coerência são fatores de

textualidade que dizem respeito ao material conceitual e lingüístico do texto.

Koch (1997) também relaciona coesão e coerência. Segundo a autora,

sempre que se faz necessário algum tipo de cálculo a partir dos elementos expressos no

texto, já se está no campo da coerência. A autora define coesão “como o fenômeno que

diz respeito ao modo como os elementos lingüísticos presentes na superfície textual se

encontram interligados, por meio de recursos também lingüísticos, formando seqüências

veiculadoras de sentido” (1997, p. 35).

A partir de algumas considerações sobre as categorias coesivas propostas

por Halliday & Hasan (1980), Koch (1991) passa a classificar os mecanismos de coesão

fundamentalmente com base em sua função textual. Distingue, assim, dois grandes

grupos de recursos coesivos: os que são responsáveis pela remissão a outros elementos

textuais ou inferíveis (coesão remissiva ou referencial)4 e os que se destinam a tornar

possível a progressão textual, garantindo a continuidade de sentidos (coesão

seqüencial)5.

A coesão referencial ocorre quando “um componente da superfície do texto

faz remissão a outro(s) elementos(s) do universo textual” (1991, p. 30). Os elos

coesivos referenciais são classificados em formas remissivas não-referenciais presas (as

que acompanham um nome, antecedendo-o, artigos, pronomes adjetivos, numerais),

3 Beaugrande & Dressler (1983) apontam sete fatores responsáveis pela textualidade de um texto: coerência, coesão, intencionalidade, aceitabilidade, situacionalidade, informatividade e intertextualidade. 4 A coesão referencial de Koch abarca as categorias de referência, substituição, elipse e coesão lexical, de Haliday & Hasan. 5 A coesão seqüencial equivale à conjunção de Halliday & Hasan (1980).

35

formas remissivas não-referenciais livres (pronomes pessoais, demonstrativos,

advérbios pronominais), e formas remissivas referenciais (os grupos nominais).

A coesão seqüencial, segundo a autora, “diz respeito aos procedimentos

lingüísticos por meio dos quais se estabelecem, entre segmentos de texto (enunciados,

partes de enunciados, parágrafos e mesmo seqüências textuais), diversos tipos de

relações semânticas e pragmáticas” (1991, p. 49). O que permite o estabelecimento

dessas relações é o que a autora chama de “encadeamento”, que pode ser obtido por

justaposição ou conexão.

A conexão é o tipo de encadeamento marcado por conectores inter-frásticos

(conjunções, advérbios e outras palavras de ligação) que estabelecem os diversos tipos

de relações “entre as orações, enunciados e partes do texto” (1991, p. 61).

Para classificar esses tipos de relações, Koch se baseia na proposta de

Ducrot (1972, 1973 apud KOCH, 1995a) sobre a natureza e a organização da

articulação de orações que tradicionalmente se conhece sob o rótulo de subordinação e

coordenação.

Nessa proposta, Ducrot postula a existência de frases ligadas com predicado

complexo e de coordenação semântica. Nas frases ligadas, tem-se um predicado

complexo e, portanto, um enunciado único, resultante de um único ato de enunciação.

Na coordenação semântica o que ocorre é uma sucessão de proposições, resultantes de

dois atos de enunciação diferentes. Nas frases ligadas, a intenção principal do locutor é

apontar para a relação existente entre duas orações, em um único ato de enunciação; na

36

coordenação semântica, apenas enunciam-se dois fatos, introduzindo um por intermédio

de sua ligação com o outro.

Seguindo esse raciocínio, Koch (1995a) distingue as relações semânticas

das relações pragmáticas. As relações semânticas são expressas em um único ato de

fala, no qual se apresenta um tema e, a partir dele, se enuncia uma relação entre dois

fatos (frases ligadas com predicado complexo). As relações pragmáticas são o resultado

de dois ou mais atos de fala (coordenação semântica).

A autora caracteriza ainda essas relações em termos de funções da

linguagem. As relações semânticas são caracterizáveis em termos ideacionais,

“expressam relações entre estados de coisas, entre fatos do mundo e/ou mundos

possíveis” (1995a, p. 16). Incluem-se aí as relações de causalidade, condicionalidade,

mediação, conformidade, tempo (pontual ou simultâneo, anterior/posterior, contínuo ou

progressivo etc), modo, disjunção (inclusiva ou exclusiva). As relações pragmáticas são

caracterizáveis em termos funcionais. São as que se instauram entre dois enunciados em

que o segundo encadeia-se sobre o primeiro para justificá-lo, contraditá-lo, comprová-lo

etc. Incluem-se as relações de conjunção e disjunção, contrajunção,

explicação/justificativa, comprovação, conclusão, entre outras6.

A justaposição é o tipo de encadeamento em que não atuam os conectores

inter-frásticos. Os elementos da superfície do texto são conectados em seqüências, com

ou sem o uso de partículas seqüenciadoras. Os casos de justaposição sem partícula,

segundo Koch, extrapolam o âmbito da coesão textual.

6 Esses tipos de relações são explicadas e exemplificadas em Koch (1991 e 1995b).

37

A justaposição com partículas “estabelece um seqüeciamento coesivo entre

porções maiores ou menores da superfície textual” (1991, p. 60). Entre essas porções

textuais, há o tipo de relação que Koch (1995a, p. 17) denomina de “relações

textualizadoras ou textuais no sentido restrito”, que têm “a função específica de

organizar a superfície textual e, portanto, de garantir uma melhor compreensão do

leitor/ouvinte”.

Além de Koch (1991) e Halliday & Hasan (1980), alguns outros autores

também apresentam propostas de classificação de recursos coesivos7. Não é pertinente

para meu propósito discutir todas essas classificações. O essencial desses trabalhos é o

fato de que os autores concebem a coesão como um fator de textualidade ligado à

estruturação de seqüências da superfície do texto, ou seja, como um mecanismo de

construção textual. Nesse sentido, o texto é visto como uma sucessão linear de unidades

lingüísticas relacionadas semanticamente. É essa relação que gera a coesão. Se a relação

não é formalmente marcada, entende-se que o texto é destituído de recursos coesivos.

Dessa forma, a coesão não é condição nem suficiente nem necessária para a formação

do texto. A textualidade pode se dar no nível da coerência (FÁVERO, 1995). Embora

entendidos como fenômenos distintos, há uma imbricação natural entre coesão e

coerência, o que permite que os dois fenômenos sejam estudados como instâncias

relacionadas, constituídas mutuamente. A coesão e a coerência são propriedades

responsáveis pela textualidade, ligadas ao material conceitual e lingüístico do texto.

Trata-se assim de uma textualidade interna que se opõe a uma externa, em que atuam

aspectos pragmáticos.

7 Beaugrande & Dressler (1983), Brown & Yule (1983), Marcuschi (1983), Van Dijk (1995) e Fávero (1995), para citar só alguns.

38

Analisar a organização interna do texto, na perspectiva desses estudos, é,

então, explicar como funcionam as suas partes, ou seja, as relações coesivas,

referenciais e seqüenciais, nos termos de Koch (1991), tendo em vista a construção do

sentido (a coerência).

A expressão “partes do texto”, segundo alguns autores, se limita à oração ou

frase. Já segundo Koch (1991, p. 60), as relações que se estabelecem para formar o texto

ocorrem não só entre orações, mas entre “segmentos textuais de qualquer extensão”. A

noção de “segmento textual”, apesar de ser mais ampla do que a de oração, não é

objetivamente definida pela autora.

Com base nessa perspectiva de entender a construção do texto, inúmeros

trabalhos vêm sendo desenvolvidos com o objetivo de explicar os tipos de recursos

coesivos empregados em diferentes tipos de texto. Antunes (1996), por exemplo, detém-

se na análise dos recursos da repetição e da substituição (coesão lexical) em textos

escritos. Uma das principais conclusões da autora assinala o fato de que a coesão pela

repetição ou pela substituição cumpre um ato discursivo, uma estratégia textual para

deixar a seqüência do texto interligada e interarticulada. A repetição favorece ainda a

marcação lexical de tópicos e subtópicos, a indicação do fechamento, do resumo, da

recapitulação de segmentos. Também a substituição, além de orientar para o

estabelecimento da continuidade do texto, assume uma função resumitiva, quando o

autor pretende condensar o tópico.

Enquanto os autores até aqui mencionados explicam a organização do texto

a partir de critérios de textualidade, como a coesão e a coerência, outros o fazem com

base em outros critérios. Adam (1993), por exemplo, apresenta um enfoque de natureza

39

modular. Para esse autor, “o texto é uma configuração regulada por diversos módulos

ou sub-sistemas em constante interação” (1993, p. 21).

Baseado nessa noção, o autor entende que o texto apresenta duas dimensões:

a pragmática e a seqüencial. A dimensão pragmática compreende três módulos: o

objetivo ilocutório, que produz o macro-ato de fala que unifica a intenção central do

texto; a organização enunciativa, que produz a contextualização do evento discursivo

em relação a como deve ser tomado; e a coesão semântica, que é representada pelo

“tópico” desenvolvido. A dimensão seqüencial regula a organização proposicional,

impedindo que o texto seja uma sucessão aleatória de fatos lingüísticos. Essa dimensão

compreende dois módulos: a conexão, que diz respeito a todos os elementos que

“costuram” o texto (modos gerais de estruturação); e a seqüenciação, que diz respeito a

modos específicos de estruturação textual. Esses módulos ou subsistemas são

apresentados em Adam (1990) como planos de organização do texto. Esses planos

servem como base para a descrição do funcionamento do texto8.

A conexão envolve, segundo o autor, “os aspectos mais propriamente

textuais dos encadeamentos lingüísticos” (1990, p. 97): as ligações em cadeias, a

segmentação e os períodos e parenthésages9.

As ligações em cadeias dizem respeito aos fenômenos de retomada que

asseguram a continuidade temática e garantem a progressão textual. A retomada, para o

autor, “aparece como uma condição necessária, mas não suficiente, para a coerência de

8 São seis os planos de organização, segundo o autor: 1) as cadeias ou fenômenos de ligação local, em que inclui os fenômenos de referenciação; 2) os espaços semânticos; 3) a segmentação; 4) o período; 5) a estrutura seqüencial e 6) a dimensão pragmático-configuracional. 9 Por falta de um termo adequado em português, resolvi deixar o termo parenthésage sem tradução.

40

uma seqüência” (1990, p. 52). As retomadas ocorrem através dos processos de

pronominalização, definição, referenciação dêitica cotextual e substituição lexical.

A segmentação é a divisão do texto em partes, demarcadas graficamente.

Entram nesse plano as mudanças de capítulo, de parágrafo, os títulos e subtítulos, assim

como as diferentes formas de distribuição espacial do material lingüístico na página.

Naturalmente, trata-se de um aspecto exclusivo do texto escrito.

Os períodos e os parenthésages constituem o primeiro modo de

“agrupamento de proposições”. Períodos e parenthésages são unidades que estruturam

os enunciados, formando um todo, coerente em si mesmo, embora não isolado do resto

do texto. O período é um modo de estruturação essencialmente rítmico, marcado pela

sintaxe e pela pontuação; os parenthésages constituem o modo de estruturação marcado

por conectores ou organizadores.

A seqüenciação é o segundo tipo de “agrupamento de proposições” proposto

por Adam, que se refere à articulação das seqüências que constituem o texto. Ao

produzir o texto, o falante/escritor organiza representações e/ou conhecimentos relativos

a um dado tema, estocados na memória em forma lógica ou hierárquica, inserindo-os

em estruturas sintáticas básicas, que, por sua vez, são organizadas de forma sucessiva.

Adam propõe a noção de seqüência para teorizar sobre essa organização do texto.

Para o autor, as seqüências são unidades estruturais relativamente

autônomas, que integram e organizam macroprosições, que, por sua vez, combinam

diversas proposições, podendo a organização linear do texto ser concebida como o

produto da combinação e da articulação de diferentes tipos de seqüências.

41

Adam propõe cinco tipos básicos de seqüências: narrativa, descritiva,

argumentativa10, explicativa e dialogal. Essas diferentes seqüências podem ser

combinadas em um texto, em várias modalidades, e é da diversidade das seqüências e da

diversidade de suas modalidades de articulação que decorre a heterogeneidade

composicional da maioria dos textos.

Algumas aproximações podem ser feitas entre a noção de textualidade e

esse modelo de funcionamento do texto proposto por Adam (1990). A textualidade

externa parece corresponder à dimensão pragmática e a interna à dimensão seqüencial.

Já a coesão textual, mecanismo de organização do material lingüístico-conceitual na

superfície do texto, fator de textualidade interna, se assemelha aos fenômenos da

conexão e da seqüenciação, que são os módulos da dimensão seqüencial. No entanto, se

a coesão textual, enquanto fator de textualidade, pode ser dispensável, a conexão e a

seqüenciação, enquanto subsistemas configuradores do texto, não chegam a ser tomadas

como condição ou não para a formação do texto, são inerentes a essa formação.

A coesão, como fator de textualidade, é entendida como um processo de

articulação semântica entre as orações de um texto. A unidade de análise, nesse caso, é,

portanto, a oração. Para Adam (1990, p. 49), a unidade de análise é a proposição, que,

de uma certa forma, pode ser entendida como uma noção redefinida de oração. “Um

texto é uma série configuracionalmente orientada de unidades (proposições) e

seqüencialmente ligadas para atingir um fim”.

10 O sentido de argumentação aqui não é o mesmo do empregado por Anscombre & Ducrot (1976). Uma seqüência argumentativa é aquela em que há apresentação, defesa e refutação de uma tese.

42

A proposição, segundo o autor, é uma unidade autônoma. Ela pode ser

entendida do ponto de vista do ato de referência, do ato de enunciação e do modo de

relação. As proposições se agrupam, como já foi descrito, formando períodos,

parenthésages e seqüências.

Bronckart (1999) propõe um outro modelo de análise e de descrição de

textos, em que estabelece uma relação entre as suas condições de produção e sua

organização material. O autor concebe a organização do texto como um “folhado”

constituído por três camadas superpostas: a infra-estrutura geral do texto, os

mecanismos de textualização e os mecanismos de enunciação.

Os mecanismos de textualização são fundamentalmente articulados à

linearidade do texto, e servem para explicitar, tendo em vista o destinatário, as grandes

articulações hierárquicas, lógicas e/ou temporais do texto. Ligam-se à progressão do

conteúdo temático, tal como é apreensível no nível da infra-estrutura. Explorando as

cadeias de unidades lingüísticas (ou séries isotópicas), organizam os elementos

constitutivos desse conteúdo em diversos percursos entrecruzados, explicitando ou

marcando as relações de continuidade, de ruptura ou de contraste, contribuindo, desse

modo, para o estabelecimento da coerência temática. (1999, p. 259-60).O autor

distingue três mecanismos de textualização: a conexão, a coesão nominal e a coesão

verbal.

A conexão está relacionada à organização da superfície do texto em

unidades estruturais. “Os mecanismos de conexão explicitam as relações existentes

entre os diferentes níveis de organização de um texto” (1999, p. 264).

43

Para o autor, o texto se organiza em três níveis, de um mais englobante para

um mais inferior. No nível mais englobante, os mecanismos de conexão explicitam as

articulações no plano do texto. Assumem o que ele considera “função de segmentação”

e servem para delimitar as partes constitutivas do texto e assinalar os diferentes tipos de

discurso correspondentes a essas partes. No nível inferior, os mecanismos de conexão

“podem marcar os pontos de articulação entre fases de uma seqüência” (1999, p. 264). É

o que ele denomina de função de demarcação ou balizamento. No nível mais inferior

ainda, esses mecanismos explicitam as modalidades de integração das frases. Trata-se

de uma função chamada “empacotamento”. São também esses mecanismos que

articulam frases, exercendo uma função de ligação (justaposição, coordenação) ou de

encaixamento (subordinação).

Em resumo, as informações de um texto se organizam em unidades

estruturais, que, por sua vez, se articulam em três níveis: a primeira articulação ocorre

entre as maiores partes constituintes, que são as seqüências; essas, por sua vez, são

compostas de fases, cujas relações constituem a segunda articulação. E, sendo as fases

compostas de frases sintáticas, a terceira articulação se dá na integração das frases à

estrutura da fase. A articulação das frases sintáticas nas fases, a das fases nas seqüências

e a das seqüências em textos constitui, portanto, o que Bronckart considera conexão.

Ainda segundo esse autor, as marcas de conexão pertencem a diferentes

categorias gramaticais (advérbio, preposição, substantivo, conjunções coordenativas e

subordinativas, etc), que, com base no critério da função de conexão que exercem,

formam uma classe funcional denominada “organizadores textuais”. Alguns desses

organizadores têm um valor semântico mais temporal (depois, antes que); outros um

44

valor mais lógico (ao contrário, porque); outros ainda um valor espacial (no alto, desse

lado). No entanto, para Bronckart, muitos organizadores “não têm valor semântico a

priori ou podem ter seu valor transformado, devido à sua própria inserção em um

determinado tipo de discurso” (1999, p. 268).

Além da conexão, os dois outros mecanismos de textualização, apontados

por Bronckart, como já disse, são a coesão nominal e a verbal. A coesão nominal exerce

uma dupla função. De um lado, introduz os temas e/ou personagens novos, e, de outro,

assegura sua retomada ou sua substituição no desenvolvimento do texto. Os

mecanismos de coesão nominal “explicitam as relações de dependência existentes entre

argumentos que compartilham uma ou várias propriedades referenciais (ou entre os

quais existe uma relação de co-referência)” (1999, p. 268). Essas relações são marcadas

por sintagmas nominais ou pronomes, que constituem cadeias anafóricas.

A coesão verbal assegura a organização temporal e/ou hierárquica dos

processos verbalizados no texto, ou seja, “contribuem para a explicitação das relações

de continuidade, descontinuidade e/ou de oposição existentes entre os elementos de

significação expressos pelo verbo” (1999, p. 273). Dessa forma, é essencialmente

realizada pelos tempos verbais.

O conceito de coesão aqui corresponde parcialmente ao manejado pelos

autores que explicam a organização do texto a partir do critério da textualidade. Se, para

aqueles autores, a coesão diz respeito aos processos que asseguram uma ligação

lingüística significativa entre os elementos que ocorrem na superfície do texto, para

Bronckart (1995) a coesão diz respeito apenas aos processos de dependência entre os

referentes nominais e verbais. A conexão, um tipo de recurso coesivo para aqueles

45

autores, é uma forma de organização do texto em unidades estruturais, para esse autor.

Não se relaciona com dependência de significado entre os elementos da superfície do

texto. Essa idéia de conexão corresponde ao conceito de seqüenciação, tal como

apresentado por Adam (1990).

Nesse modelo de análise e descrição de textos proposto por Bronckart

(1999), há também uma distinção entre organização interna e externa. Para esse autor, a

coerência geral do texto “procede, de um lado, do funcionamento dos mecanismos de

textualização e, de outro, dos mecanismos enunciativos” (1999, p. 259). Os mecanismos

de textualização são articulados à progressão do conteúdo temático, responsáveis assim

pela coerência temática (interna). Os mecanismos enunciativos referem-se à

clarificação de posicionamentos enunciativos, responsáveis pela coerência pragmática

(externa).

Essa distinção entre componentes de organização interna (aspectos

lingüístico-conceituais) e componentes de organização externa (aspectos enunciativos e

pragmáticos) é o que, em última análise, aproxima todos os autores aqui citados.

Halliday & Hasan (1980), Beaugrande & Dressler (1983) e seguidores separam a

textualidade interna da textualidade externa. Para Halliday & Hasan, além da coesão, há

outro princípio decisório para a constituição do texto. Trata-se do recurso ao contexto de

situação (natureza da audiência, o meio, os propósitos comunicativos), que eles

denominam de “registro”. Beaugrande & Dressler separam a coesão e a coerência

(padrões internos de textualidade) da intencionalidade, aceitabilidade, situacionalidade,

informatividade e intertextualidade (padrões externos de textualidade). Adam (1990)

46

separa a dimensão pragmática da seqüencial, e Bronckart (1999) separa os mecanismos

de textualização dos mecanismos enunciativos.

O fato de esses estudos considerarem a organização global do texto e a

atuação de aspectos de natureza enunciativa nessa organização se apresenta como a

grande contribuição desses trabalhos, por romperem as barreiras impostas pela

lingüística do sistema11. No entanto, eles acabam criando uma outra barreira, a imposta

pela separação do lingüístico e do pragmático-interacional no estudo dos componentes

da construção do texto.

Considero, assim, que alguns dos conceitos discutidos no âmbito da

Lingüística Textual, a de orientação pragmática, friso, como a própria noção de texto,

são pertinentes para a discussão que pretendo desenvolver na pesquisa. No entanto, no

que diz respeito à relação do lingüístico com o interacional na formação do texto, vejo

que o enfoque textual-interativo apresenta considerações mais relevantes.

2.4. PERSPECTIVA TEXTUAL-INTERATIVA

A perspectiva textual-interativa, como proposta teórica de análise

lingüística, surgiu no interior do subgrupo Organização textual-interativa do Projeto de

Gramática do Português Falado (PGPF), o qual tem como objetivo maior a elaboração

de uma gramática de referência para o português culto falado no Brasil12. Esse enfoque

teórico foi previsto, portanto, tendo em vista apenas o texto falado. Apresento, a seguir,

seus principais fundamentos e mostro que eles podem ser tomados como base para

11 Cf. seção 2.1. 12 A história do PGPF está traçada por Mary Kato no prefácio ao volume V da Gramática do Português Falado. Cf. Kato (1996).

47

explicar fenômenos relativos ao funcionamento dos textos, independente de serem

falados ou escritos.

2.4.1. A análise textual-interativa no contexto do PGPF

A base da proposta teórica do subgrupo Organização textual-interativa do

PGPF está no conceito de linguagem como interação, como atividade verbal

impregnada pelo contexto espaço-temporal e sócio-histórico em que os interlocutores se

relacionam.

A interação verbal é vista como resultado do exercício de uma competência

comunicativa. Essa competência se manifesta na contingência da efetivação da

atividade lingüística do falante/ouvinte e é caracterizável a partir de regularidades,

observáveis no texto e nas operações envolvidas em sua produção, que evidenciam um

sistema de desempenho lingüístico constituído de vários subsistemas: o fonológico, o

morfossintático e o textual. Através dos dados presentes no texto, é possível identificar

os indícios do modo de funcionamento desse sistema de desempenho do falante (KOCH

et al., 1994).

No que diz respeito ao subsistema textual, as regularidades observáveis “se

manifestam como princípios de estruturação, definidos pelo caráter sistemático de

determinados procedimentos de formulação textual” (KOCH et al., 1994, p. 6). Assim, a

descrição desse subsistema apresenta a particularidade de “apontar regularidades na

construção do texto falado, mais relacionadas ao processamento de estruturas” (KOCH

et al., 1994, p. 6).

48

Com base na postulação desse sistema de desempenho lingüístico, em que

as estruturas lingüísticas e as suas formas de processamento se integram num só

conjunto, o enfoque textual-interativo concebe, então, o texto como algo

simultaneamente estruturado e emergente. A partir disso, postula-se que os dados

pragmático-situacionais se introjetam no texto, de forma que o interacional é inerente ao

lingüístico.

O texto, enquanto realização concreta da atividade interacional, emerge de um jogo de atuação comunicativa, que se projeta na sua materialidade lingüística. Em decorrência, observam-se, na superfície textual, marcas do processo formulativo-interacional, a serem detectadas nas descrições da organização do texto. (KOCH et al., 1994, p. 5)

O texto falado apresenta especificidades relacionadas às contingências de

sua formulação: ele é co-produzido dinâmica e momentaneamente pelos interlocutores.

Essa natureza emergencial do texto falado reflete-se na concretude lingüística, através

de fenômenos como interrupções, reinícios, correções, paráfrases, repetições, inserções,

que evidenciam o processo formulativo do texto e desempenham funções pragmáticas

de importante papel na sustentação da interação. Em outras palavras, isso quer dizer

que, guiados pelas injunções da interação, os interlocutores recorrem a esses

procedimentos lingüísticos para construir o texto. Dessa forma é que se postula que

“nos textos de língua falada, o processo e o resultado se confundem, o que leva a um

produto lingüisticamente materializado, que congrega e sinaliza o processo de produção

e interação” (KOCH et al., 1994, p. 8).

Em face dessas postulações, o percurso de análise textual-interativa é

definido da seguinte forma: toma-se o texto como objeto global de análise, para dele

serem depreendidas regularidades configuradoras das estruturas e das formas de

49

processamento das estratégias de composição, e inferidas funções pragmáticas relativas

a essas estratégias.

Seguindo esse percurso de análise, é desenvolvida, pelos membros do

subgrupo Organização textual-interativa do PGPF, uma série de estudos que dizem

respeito às atividades de formulação do texto, no caso, especificamente do texto falado.

A atividade de formulação pode ser entendida de uma forma específica e de uma

genérica.

Para Hilgert (1993), a formulação é desencadeada por um problema de

construção do texto. Os problemas podem ser formulados ou não. No caso dos

problemas não formulados, o locutor capta a sua dimensão e não recorre a nenhuma

atividade metaformulativa para resolvê-lo. Quando, numa conversação, o locutor

demora a se definir por uma palavra, por exemplo, ele pára o desenvolvimento da

formulação, preenche com sinais variados a lacuna de tempo necessário para definição,

e, após definida a alternativa, prossegue com a formulação. Esse é um caso de problema

não formulado. Mas, quando o locutor só percebe o problema e suas dimensões após ou

durante a formulação e procede a uma atividade metaformulativa, tem-se o caso de um

problema formulado.

Para o autor, o texto falado é extremamente suscetível de problemas de

formulação, e, a cada problema formulado segue, em princípio, uma solução. As

diferentes soluções para os problemas constituem as estratégias de formulação. Nessa

perspectiva, a formulação é vista de uma forma específica.

50

No entanto, a formulação também pode ser entendida como o processo geral

de produção do texto, independentemente de ocorrerem ou não “problemas” e de esses

problemas serem ou não formulados. É essa noção genérica que fundamenta a descrição

das estratégias de formulação. A correção, a paráfrase, a repetição são algumas dessas

estratégias. Além dessas, outras estratégias de construção e mecanismos, que fazem

parte do subsistema textual, são estudados no âmbito do PGFP, tendo em vista o

objetivo final, que é a elaboração de uma gramática de referência da língua falada13.

2.4.2. A extensão do enfoque textual-interativo

No âmbito do PGPF, as noções de formulação, no sentido geral de

processamento textual, e de interação estão intimamente ligadas às contingências

próprias da construção do texto falado. Os processos formulativos descritos são os

decorrentes da relação entre planejamento verbal e realização lingüística, e os fatores

interacionais mais considerados são os mais específicos da co-produção textual

realizada no “status nascendi” do texto.

A constituição dinâmica do texto falado permite deixar à mostra a relação entre o planejamento verbal e sua realização lingüística, bem como a interferência, nessas atividades, das características dos interlocutores, das relações que os unem ou desunem e do contexto espaço-temporal de fala. (KOCH et al., 1994 p. 8)

Como o enfoque textual-interativo foi pensado especificamente para

descrever as regularidades de construção do texto falado, vejo que se pode ter a falsa

impressão de que o princípio segundo o qual os fatos formulativo-interacionais estão

13 No volume VII da Gramática do Português Falado (NEVES, 1999), há cinco estudos que contemplam especialmente estratégias de construção textual do texto falado: a segmentação, a correção, o relevo, os parênteses e a hesitação; e outro três que se centram nos marcadores discursivos como mecanismos de organização e interação textual.

51

imersos na materialidade lingüística do texto se aplica apenas a textos falados. No

entanto, “o conceito de texto como unidade globalizadora, sócio-comunicativa, que

ganha existência dentro de um processo interacional, é comum a textos falados e

escritos” (KOCH et al., p. 6). As marcas do processo formulativo-interacional se

materializam, então, tanto em textos falados como escritos.

Muitos dos estudos em Lingüística Textual mostram que o texto,

independente da modalidade em que se apresenta, resulta de uma seqüência de

atividades de constituição ou de composição14. Há estratégias de composição comuns a

textos falados e escritos, estratégias mais incidentes em uma modalidade do que em

outra, e outras que são específicas apenas de uma modalidade, como a hesitação, que é

uma estratégia de construção textual exclusiva da modalidade falada (MARCUSCHI,

1999b).

Considerando esses pressupostos, esta pesquisa segue o seguinte

percurso: tomo como ponto de partida o funcionamento do subsistema textual, e analiso

um tipo de estratégia de formulação comum a textos falados e escritos: a articulação

tópica. Essa estratégia emerge do jogo interacional do ato comunicativo e se projeta na

materialidade lingüística do texto, daí ser entendida como um fato formulativo-

interacional.

Um analista que tem por objetivo desenvolver uma Gramática, no plano do

texto, considera que um fato lingüístico-discursivo é regular ou sistemático, quando tal

fato se manifesta com propriedades que o particularizam, e, portanto, que permitem a

sua identificação. Essas propriedades envolvem a recorrência, no texto, de traços

14 Cf. seção 2.3.2.

52

formais específicos e funções relativamente constantes. O analista, então, constata a

recorrência do fato, descreve seus traços formais e aponta suas funções, as quais,

segundo a base teórica textual-interativa, são sinalizadoras de aspectos da construção do

texto e das relações interativas, sem isolá-los.

O Grupo de Organização textual-interativa do PGPF tem uma posição

teórica acentuadamente funcional, por entender que a linguagem é interação social e que

a descrição das expressões lingüísticas devem levar em conta o seu funcionamento em

situações comunicativas concretas. No entanto, como já disse, o projeto desse grupo se

enquadra em um projeto maior, o de elaboração de uma Gramática. Isso implica

mostrar, além das funções formulativo-interacionais dos fatos lingüístico-discursivos, as

suas marcas formais identificadoras, ou seja, na descrição do subsistema textual, são

depreendidas regularidades relativas a estratégias de construção textual. Como não é

meu objetivo a elaboração de uma gramática, mas uma descrição eminentemente

funcional, focalizarei o subsistema textual sem a preocupação de observar

regularidades, conforme entendem os membros do Grupo de Organização Textual-

interativa do PGPF. Observarei fatos significativamente recorrentes nos textos para

descrever as funções formulativo-interacionais relacionadas à estratégia em questão.

2.4.3. O processo interacional

Como já apresentei, um dos pontos centrais da orientação teórica estabelece

o princípio de que os fatos formulativo-interacionais estão materializados no texto, de

forma que o interacional é inerente ao lingüístico. Ficou claro, ao longo da exposição

desse enfoque teórico, que os fatos formulativos dizem respeito ao processamento geral

53

do texto, às suas estratégias de construção. No entanto, nenhuma consideração

específica sobre o processo interacional foi feita. Apesar de não pretender separar o que

é formulativo do que é interacional, julgo aqui necessário tecer alguns comentários

sobre a forma como o processo interacional está sendo entendido neste trabalho.

Nos estudos lingüísticos, o termo interação apresenta diferentes acepções.

Fernandes (2002) faz um levantamento do conceito de interação, em nove trabalhos

publicados em uma revista acadêmica da área de Letras. O autor constata que alguns

autores empregam o termo sem evidenciar uma concepção teórica subjacente, outros,

como sinônimo para a situação específica de conversação face a face, e outros adotam

claramente a concepção bakhtiniana de interação. Aqui já descarto a acepção de

interação enquanto dinâmica de alternância de turnos, por ser bastante restrita ao texto

falado conversacional.

Na sua teoria da interação verbal, Bakhtin (1992, p. 112) assegura que “a

enunciação é o produto da interação de dois indivíduos socialmente organizados”. Os

interlocutores situam-se num espaço físico-temporal bem definido. E “a palavra é

determinada tanto pelo fato de que procede de alguém como pelo fato de que se dirige a

alguém. Ela constitui justamente o produto da interação do locutor e do ouvinte (1992,

p. 113).

Para o autor, o indivíduo está envolvido pelo meio social, no interior do qual

se encontra em constate interação. É o meio social o centro organizador de toda

enunciação, de toda expressão.

54

Assim, de maneira bastante concisa, interação para Bakhtin é o meio de

constituição do indivíduo como um sujeito social pleno, o que inclui o “sujeito

discursivo”. O processo interacional se dá em uma relação dialógica, por meio da qual

os sujeitos envolvidos se constituem como tal, para si e para o outro, diante de si e

diante do outro.

Seguindo a perspectiva de dialogicidade, Marcuschi (1999c, p.143) toma

interatividade como o “movimento típico e explícito do escrevente direcionado a um

leitor pretendido”15, que aparece marcado na própria realização textual. Esse processo

de marcar a presença do interlocutor na própria realização textual não é exclusivo da

modalidade falada, embora nem todos os gêneros, escritos ou falados, apresentem essas

marcas na mesma intensidade e com evidências tão claras. Numa carta pessoal, por

exemplo, a relação interpessoal do escrevente com o destinatário é bastante direta (o

interlocutor é definido, único, bem desenhado e íntimo), e, por isso, a interatividade é

bastante marcada na textualidade. Já numa notícia de jornal, que tem uma audiência

genérica e a intenção é informar, não se verifica uma diretividade concreta com o leitor.

Nesse caso, a interatividade é menos marcada na textualidade, mas, mesmo assim,

haverá uma série de sugestões de relação com o leitor, “e, sobretudo, um trabalho de

explicitação e explicação para o leitor convidando-o a partilhar algo que supostamente

não lhe era conhecido” (MARCUSCHI, 1999c, p. 145).

Ainda segundo o autor, “as marcas de interatividade atuam como operadores

de orientação cognitiva que sugerem perspectivas de interpretação preferencial por parte

do escrevente/falante” (1999c, p. 155). Através dessas marcas se instauram propostas,

15 Nessa definição, o autor usa o termo “escrevente”, porque seu objetivo é estudar as marcas de interatividade na escrita.

55

negociações, contratos, e se definem posicionamentos para uma relação intersubjetiva

ou interação comunicativa mais eficaz.

Realmente, a interatividade é uma propriedade geral de todo e qualquer uso

da língua e não apenas de uma das modalidades de uso. Não há quem fala/escreva sem

ter em mente um ouvinte/leitor. Isso corresponde à propriedade dialógica da linguagem,

no dizer de Bakhtin.

Em síntese, a interação, enquanto “meio de constituição do sujeito

discursivo”, é sempre envolvimento entre interlocutores em um ato comunicativo. No

entanto, a natureza desse envolvimento, ou seja, o modo como os interlocutores criam

as suas relações interpessoais durante o ato comunicativo, associa-se a fatores

contextuais. Isso equivale a dizer também que as contingências situacionais atuam sobre

o processo interativo.

Tomado como objeto de estudo por pesquisadores, não só da área de

lingüística, e servindo como recurso analítico para explorar variados tipos de dados, a

noção de contexto também é bastante variada. Considerado literalmente, o contexto

rodeia o texto. É algo circundante no qual o texto se insere ou ocorre. Nesse sentido,

contexto é visto como o ambiente sócio-físico, um receptáculo que contém algo, uma

entidade extrínseca.

Lyons (1977, p. 572) define contexto como “um construto teórico em cuja

postulação o lingüista abstrai da situação atual e estabelece como contextuais todos os

fatores que, em virtude de sua influência nos participantes e no evento lingüístico,

sistematicamente determinam a forma, a adequação ou o significado do enunciado”.

56

Para esse autor, o processo de contextualização corresponde ao uso de certos princípios

e regras a partir dos quais os falantes de uma língua criam e interpretam enunciados de

maneira coerente. Trata-se, assim, de uma noção teórica desenvolvida pelo lingüista

para descrever categorias e aspectos das línguas particulares.

Nos termos da sociolingüística variacionista (LABOV, 1972), contexto é

entendido como uma variável social (idade, sexo, classe social, escolaridade,

procedência), ou seja, algo a ser controlado, de tal forma que seu impacto sobre a

linguagem possa ser examinado. Dessa forma, o pesquisador se preocupa em verificar

se e como o contexto afeta seu objeto de análise.

No quadro teórico da sociolingüística interacional, Gumperz (1982, p. 230)

apresenta uma visão mais dinâmica de contexto. Ele é interpretado como uma

propriedade de “mão dupla”, no sentido de que o uso lingüístico tanto reflete como

produz contextos. “A contextualização deve ser entendida com referência a uma teoria

da interpretação”. Segundo Gumperz (1982), a contextualização, na interação, se

efetiva através de pistas co-textuais e contextuais (escolhas lexicais, expressões

formulaicas, prosódia, elementos paralingüísticos) que determinam a interpretação de

enunciados.

No âmbito da etnografia da comunicação, Hymes (1974) inclui em sua

tipologia de contexto a situação (localização temporal e física), os participantes (suas

relações uns com os outros e os objetivos da interação, o texto (conteúdo, forma e

gênero da mensagem) e as normas sociais de interação e de interpretação. Nessa

perspectiva, aspectos como etnicidade dos participantes, ambiente e outros não são

tratados como fatores separados, que podem estar simplesmente relacionados à

57

interação. Contexto é visto como algo construído, negociado e orientado pelos

participantes.

Essas formas de conceber o contexto sugerem que, nesse construto,

justapõe-se sempre uma dualidade: um evento focal e um campo de ação, elementos

que estão relacionados ora a entidades constitutivas, intrínsecas, ora a entidades

separadas, extrínsecas. Essas entidades são interpretadas tanto como partes do

processamento discursivo como a ele apenas vinculadas, na função de determinadores

de significação. Trata-se de um conceito que, pelo seu próprio caráter multifacetado,

está ligado a vários outros conceitos, como os de linguagem, discurso, texto, fala,

comunicação, processos conversacionais, interpretação, os quais, por sua vez, envolvem

aspectos de natureza variada: cognição, conhecimento, processamento, memória,

percepção, realidade, papéis sociais, cultura, planos, crenças, normas, frames, ações

não-verbais. Isso remete à noção de contexto da forma como é hoje entendido no

interior da Lingüística Textual, conforme esclarece Koch (2002, p. 24):

(...) abrange, portanto, não só o co-texto, como a situação de interação imediata, a situação mediata (entorno socio-político-cultural) e também o contexto sociocognitivo dos interlocutores que, na verdade, subsume os demais. Ele engloba todos os tipos de conhecimentos arquivados na memória dos actantes sociais, que necessitam ser mobilizados por ocasião do intercâmbio verbal: o conhecimento lingüístico propriamente dito, o conhecimento enciclopedético, quer declarativo, quer episódico (frames, scripts), o conhecimento superestrutural (tipos de textos), o conhecimento estilístico (registros, variedades de língua) e sua adequação às diversas práticas sociais, bem como o conhecimento de outros textos que permeiam nossa cultura (intertextualidade).

Segundo Koch (2002), todos esses conhecimentos são mobilizados por

ocasião do processamento textual, através de estratégias diversas, atuam, portanto, sobre

o processo interacional. Julgo necessário esclarecer ainda que esse conjunto de

58

conhecimentos de que fala Koch (2002), embora bastante amplo, não recobre todos os

fatores pragmáticos importantes para a interação.

As características psico-sociais dos interlocutores e as particularidades

relativas à forma de atuação de cada um no ato comunicativo também são fatores que

atuam na organização da interação. No que diz respeito às características psico-sociais

dos interlocutores, Charaudeau (1984) refere-se à identidade pessoal, social (idade,

sexo, etnia, classe social) e psicológica (qualidades afetivas, intelectuais e de

sociabilidade); ao estatuto sócio-insitucional ou sócio-profissional, como cargos e

funções; e à relação interpessoal, ou seja, a identidade dos indivíduos de acordo com o

grau de conhecimento e aproximação de um com o outro.

O fato de as situações serem ritualizadas ou não particularizam a forma de

atuação dos participantes no ato comunicativo. Uma conversação, por exemplo, é

minimamente ritualizada, o que define relações interacionais simétricas. Já uma

entrevista ou uma palestra, por outro lado, são ritualizadas, com papéis previamente

estabelecidos (ao entrevistador, por exemplo, cabe o papel de fazer as perguntas e, ao

entrevistado cabe responder).

Acompanhando o pensamento de vários estudiosos acerca da interação, Brait

(1999, p. 200) faz a seguinte afirmação acerca do processo interacional.

Um ato de linguagem é uma interação pelo fato de fundar-se no olhar avaliativo dos parceiros, isto é, daqueles que participam desse ato com a atenção profundamente voltada para todos os aspectos que, de alguma forma, interferem nesse evento.

O processo interacional pode, assim, ser entendido como o vasto conjunto

de todos esses aspectos que interferem no ato de linguagem. Esse processo conduz os

59

procedimentos lingüísticos adotados na construção do texto, ou seja, o processo

formulativo.

60

3. O TÓPICO DISCURSIVO COMO CATEGORIA ANALÍTICA TEXTUAL-INTERATIVA

Os estudos desenvolvidos na área da lingüística discursiva têm apontado

a topicalidade como uma propriedade geral da organização do discurso. É com base

nessa propriedade que vejo ser possível depreender o tópico discursivo como uma

categoria analítica compatível com a perspectiva textual-interativa. Neste capítulo,

discuto alguns dos principais conceitos relacionados a essa propriedade, e apresento a

idéia de que a articulação tópica constitui uma estratégia textual-interativa.

3.1. O CONCEITO DE TÓPICO

O termo tópico é usado na literatura lingüística para conceituar fenômenos

relativos à organização da sentença ou à organização do discurso, mas em ambos os

casos ele é contextualizado lingüística e situacionalmente.

Dentro dos limites da oração, o termo é empregado por Li e Thompson

(1976 apud PONTES, 1987) numa proposta de tipologias de línguas. Segundo esses

autores, as línguas seriam divididas em quatro tipos: a) com proeminência de sujeito,

em que a estrutura das sentenças é descrita em termos de sujeito e predicado; b) com

proeminência de tópico, em que a estrutura das sentenças é descrita em termos de tópico

e comentário; c) com proeminência de tópico e sujeito, em que há os dois tipos de

sentenças descritos em a e b; e d) sem proeminência de tópico e sujeito, em que o

sujeito e o tópico se mesclam e não se distinguem mais os dois tipos de construção.

61

Nessa perspectiva, o tópico apresenta as seguintes características: é sempre

definido, não determina, não concorda, nem precisa manter relações selecionais com o

verbo, é sempre centro da oração, vem sempre em posição inicial, não governa

processos sintáticos como reflexivização, passivização e imperativização. A partir das

características do tópico, arrolam-se as características das línguas com proeminência de

tópico: não apresentam ou apresentam de forma rara construções passivas, apresentam

sujeitos vazios e duplos sujeitos, a co-referência é controlada pelo tópico e não pelo

sujeito, não há restrições a respeito do que pode ser tópico. Aplicando essas

características a dados do português, Pontes (1987) constata que as sentenças de tópico

são comuns e que essa língua partilha com as línguas de proeminência de tópico a

maioria das características.

Pontes (1987) acrescenta que os lingüistas costumam distinguir as

construções de tópico, que são geradas por uma regra de topicalização, das que são

geradas por uma regra de Deslocamento à Esquerda. A distinção foi proposta por Ross

(1967 apud PONTES 1987) com base no fato de que, no deslocamento à esquerda,

aparece um pronome cópia, o que não ocorre na topicalização. Segundo Pontes (1987),

além desse, os outros critérios usados para distinguir deslocamento à esquerda de

topicalização pela análise de orações isoladas apresentam muitos problemas. A autora

procura, então, a partir de dados do português, a distinção no nível do discurso, e

conclui que os dois tipos de construção exercem funções discursivas diferentes: a

topicalização está associada à mudança de tópico, “usa-se topicalização para mudar de

um tópico para outro, contrastando com o anterior, mas relacionado com ele”; e o

deslocamento à esquerda está associado à continuidade do discurso, “sua função é

62

eminentemente coesiva” (1987, p. 83-4). Essa análise coloca o fenômeno no nível do

discurso. Assim, embora possa ser identificado no âmbito da oração, o tópico não pode

ser tratado como uma categoria exclusivamente sintática. Ele é uma categoria

discursiva.

Givón (1983, p. 5) define tópico como um domínio funcional complexo,

identificado como “grau de acessibilidade ao tópico”. Não é uma entidade atômica,

discreta, mas se manifesta num contínuo, o que lhe confere uma natureza escalar. A

escala que reflete a codificação do grau de continuidade tópica, proposta pelo autor,

apresenta a seguinte ordem: anáfora zero, pronome átono, pronome tônico, SN definido

deslocado para a direita, SN definido em ordem neutra, SN definido deslocado para a

esquerda, SN em topicalização contrastiva, construção clivada e SN indefinido

referencial.

Givón (1990, p. 740) afirma que a topicalidade é uma “propriedade dos

participantes nominais (referentes) – mais comumente sujeitos e objetos – de orações” e

destaca que “quando eventos e estados como um todo se tornam tópicos, são quase

sempre nominalizados”. O mesmo autor reafirma essa posição (GIVÓN, 1993), quando

destaca o fato de que o mesmo tópico pode ser codificado sob diferentes perspectivas,

como agente tópico ou evento tópico, por exemplo.

Givón (1993) enfatiza, no entanto, que, apesar de se manifestar

gramaticalmente no nível da oração, a topicalidade é uma propriedade que depende do

discurso, pois os tópicos só podem ser considerados como tais e assim codificados em

virtude de serem recorrentes em um discurso multiproposicional.

63

O autor reconsidera a natureza escalar anteriormente atribuída ao tópico

(GIVÓN, 1983) e assume que a topicalidade implica uma organização discreta dos

participantes/referentes no discurso. As evidências que mostram ser o sujeito mais

tópico que o objeto direto, e esse ser mais tópico que o objeto indireto são os indícios

que, segundo o autor, apontam para o caráter discreto da organização discursiva. Ele

admite, então, que a linguagem humana parece codificar somente três níveis discretos

de topicalidade dos participantes: a) tópico primário – sujeito; b) tópico secundário –

objeto direto; e c) não-tópico – todos os outros casos.

Considerar o tópico como uma entidade discreta, isolável em diferentes

posições na frase, não implica, porém, a desconsideração do aspecto de

continuidade/descontinuidade de um tópico no fluxo do discurso. Um participante pode

se manter no discurso como tópico contínuo primário em várias frases, pode alternar as

funções de tópico primário e secundário em frases consecutivas ou não, ou pode sair

subitamente do fluxo discursivo. Cada uma dessas possibilidades corresponde a uma

estratégia diferente de codificação. Tópicos contínuos são preferencialmente

codificados por anáfora zero ou pronome átono, tópicos não-contínuos próximos são

codificados por pronome tônico, e assim por diante.

Na perspectiva de Givón, o tópico é sempre codificado pelo falante e

concretamente percebido pelo ouvinte, e, embora se manifeste no âmbito da frase, ele é

também entendido como uma noção discursiva. Essa “gramática da topicalidade”

proposta por esse autor foi desenvolvida a partir do discurso narrativo conversacional. O

escopo do tópico, no entanto, é ampliado, em outros estudos, e passa a abrigar a noção

mais geral de “assunto” ou “tema” que é abordado em um texto.

64

Garcia (1992), a partir da descrição de textos escritos, enfatiza a posição

inicial do parágrafo como sendo o lugar por excelência do tópico. Para o autor,

“constituído por um ou dois períodos curtos iniciais, o tópico frasal encerra de modo

geral e conciso a idéia-núcleo do parágrafo” (1992, p. 206). A noção, nesse caso, se

restringe a um tópico frasal, cuja função é garantir a “objetividade, a coerência e a

unidade do parágrafo, definindo-lhe o propósito e evitando digressões impertinentes”

(1992, p. 207).

Embora tenha objetivos especificamente didáticos, o texto de Garcia

apresenta um fato relevante para a discussão de tópico, no âmbito textual. Para o autor,

o tópico frasal não corresponde a um elemento que é o tópico da frase, mas a uma frase

que é tópico do parágrafo, ou seja, uma espécie de resumo do que virá a seguir ou do

que já foi dito. Para o autor, o tópico frasal se restringe a textos descritivos e

dissertativos, uma vez que, segundo ele, não há, via de regra, em narrações, tópico frasal

explícito.

Essa idéia de tópico como “assunto”, tema que sintetiza um segmento

discursivo reaparece em outros estudos. Mentis (1988 apud GORSKI, 1994) investiga a

organização do tópico na conversação e o define como uma oração ou SN que identifica

a questão de interesse imediato e que fornece uma descrição global do conteúdo de uma

seqüência de enunciados. Para essa autora, o tópico não precisa aparecer explicitamente

no discurso. Uma denominação lhe é atribuída, para fins de análise, (por exemplo, festa

das bruxas, viagem, etc) de modo a indicar o que os falantes estão conversando e

identificar o interesse central num trecho de discurso.

65

Van Dijk (1995) associa o conceito de tópico à noção de micro e

macroestrutura semântica. Para o autor, o tópico pode ser descrito em termos da

macroproposição, ou seja, uma proposição complexa que sintetiza o conteúdo das

demais proposições. Corresponde, assim, também a uma reconstrução abstrata, que não

precisa aparecer explícita no texto.

Para Gorski (1994, p. 34), o tópico “é uma categoria discursiva que se

manifesta simultaneamente em dois planos hierárquico (vertical) e linear (horizontal)”.

No nível semântico-discursivo, os tópicos sintetizam fragmentos de discurso; no nível

sintático fornecem pistas lingüísticas para a reconstituição dos tópicos semântico-

discursivos. As construções de tópico, juntamente com outras estratégias de construção

frasal, constituem mecanismos de codificação a serviço do tópico discursivo. Nesse

tratamento de Gorski ao conceito de tópico, ela coloca as duas abordagens básicas –

sintática e discursiva – como as duas faces de uma mesma moeda, que se “imbricam

numa inter-relação entre função e forma, já que o que é dito se projeta necessariamente

no como é dito” (1994, p.34-5).

Também para Brown & Yule (1983, p. 73), a noção de tópico está

relacionada a representações do conteúdo, que se organiza de forma hierárquica. O

tópico pode, então, ser entendido como “o assunto acerca do qual se está falando ou

escrevendo”, e está na dependência de um processo colaborativo que envolve os

participantes do ato comunicativo.

Nessa mesma linha se posiciona o trabalho de Jubran et al. (1992).

Conforme os autores, o tópico é uma categoria abstrata, primitiva, que se manifesta “na

conversação, mediante enunciados formulados pelos interlocutores a respeito de um

66

conjunto de referentes explícitos ou inferíveis, concernentes entre si e em relevância

num determinado ponto da mensagem” (1992, p. 361).

O tópico, nessa perspectiva, abrange duas propriedades que o

particularizam: a centração e a organicidade. A centração abrange os seguintes traços:

a) concernência: relação de interdependência semântica entre os enunciados – implicativa, associativa, exemplificativa ou de outra ordem – pela qual se dá sua integração no referido conjunto de referentes explícitos ou inferíveis; b) relevância: proeminência desse conjunto, decorrente da posição focal assumida pelos seus elementos; c) pontualização: localização desse conjunto, tido como focal, em determinado momento da mensagem. (JUBRAN, et al., 1992, p. 360)

Considerando que, em uma única conversação, os interlocutores podem

desenvolver vários temas, e, portanto, vários tópicos, é possível abstrair-se desse evento

uma dada organicidade, expressa na distribuição dos assuntos em quadros tópicos. Essa

organicidade pode ser também observada e analisada em dois níveis: no plano

hierárquico e no plano seqüencial.

Não pretendo fazer uma apresentação aprofundada acerca da discussão que

todos esses autores levantam sobre a questão que envolve o conceito de tópico. O que

julgo pertinente mostrar é a idéia comum de que o tópico sintetiza um fragmento de

discurso coerente, sem que seja, via de regra, explicitamente mencionado pelo

falante/escritor. O tópico se relaciona com os assuntos tratados no texto. Trata-se de um

conceito consensual, conforme destaca Fávero (1999, p. 39): “é consenso entre os

estudiosos que os usuários da língua têm noção de quando estão discorrendo sobre o

mesmo tópico, de quando mudam, cortam, criam digressões, retomam, etc”.

O tópico, portanto, se identifica com a questão de interesse imediato, serve

para descrever o conteúdo sobre o qual se fala/escreve e sinaliza a perspectiva

67

focalizada. Nesse sentido ele é visto como uma categoria analítica, de base textual-

discursiva, ou seja, relaciona-se ao plano global de organização do texto. Mas é também

uma categoria interacional, pois é resultante da natureza interativa e colaborativa do

discurso. Segundo Jubran et al. (1992, p. 361), a construção tópica envolve “um

complexo de fatores contextuais, entre os quais as circunstâncias em que ocorre o

intercâmbio verbal, o conhecimento recíproco dos interlocutores, os conhecimentos

partilhados entre eles, sua visão de mundo, o background de cada um em relação ao que

falam, bem como suas pressuposições”. Esses fatores envolvidos na construção do

tópico o caracterizam como uma categoria interacional.

Para Mondada (2001), os objetos de discurso elaborados pelos locutores são

entidades que não nascem de uma relação de especulação com os objetos do mundo ou

de uma representação cognitiva, pelo contrário, são entidades interativa e

discursivamente produzidas pelos participantes de um evento comunicativo. Os objetos

de discurso são constituídos nas e pelas relações discursivas. Por essa razão, eles não

são pré-existentes ao discurso e não apresentam estrutura fixa, ao contrário, emergem e

se elaboram progressivamente na dinâmica discursiva. Ainda segundo essa autora, os

objetos de discurso podem assumir um estatuto particular no discurso e na interação.

Uma vez identificados, reconhecidos e definidos como tais pelos próprios participantes,

podem ser assim tratados como tópicos, isto é, objetos considerados e manifestados

como o assunto sobre o qual o discurso se porta.

Essa perspectiva de Mondada (2001) ratifica a idéia de que o tópico

discursivo é uma entidade pertinente para os locutores, que atribuem a ele propriedades

específicas, conforme suas práticas interacionais.

68

O fato de não se encontrar necessariamente materializado no texto, mas de

ser dele extraído pelo analista, desencadeia a crítica de que a noção de tópico é intuitiva

e, dessa forma, apresenta dificuldades de operacionalização. É verdade que a

comunicação humana supostamente se faz em torno de um tema, um assunto, mas nem

sempre é fácil identificar esse assunto. No entanto, os traços de concernência e

relevância que precisam a centração, uma das características do tópico, segundo Jubran

et al. (1992), se apresentam como um critério concreto a partir do qual o tópico pode ser

identificado e depreendido. Ilustro a aplicação desse critério, no trecho a seguir.

(01) [8 O sucesso da droga sugere que o espectro da impotência é mais amplo no Brasil que em países como o Japão ou a Argentina, nos quais a aceitação da pílula azul foi mais restrita. A impressão é falsa. O Japão rejeitou o Viagra pela rigidez de sua cultura. Na Argentina, o remédio custa caro. Sai pelo dobro dos R$ 76,68, preço máximo cobrado nas farmácias brasileiras por uma caixa com quatro comprimidos de 50 miligramas. O paradigma dos EUA, onde 3 milhões de pessoas usam o Viagra, mostra que o consumo nacional poderia ser maior.] [9 Em outubro, foi lançado no Brasil o Uprima (Leia o quadro). É o primeiro de uma série de concorrentes do Viagra que estarão nas farmácias em breve. “Em cinco anos, teremos opções para vários tipos de paciente”, prevê o urologista paulista Eduardo Bertero. Duas drogas chegam ao mercado neste ano. O Vardenafil, da Bayer, é um primo irmão do Viagra. Age da mesma forma, mas minimiza efeitos colaterais como dores de cabeça, náuseas e rubor facial. O Cialis, do laboratório Eli Lilly, terá efeito mais duradouro. Vai atuar no sangue por 17 horas, período quatro vezes maior que o da ação do Viagra. Com um comprimido, o homem poderá desfrutar melhor uma relação sexual. A Pfizer, fabricante do Viagra, não se assusta. Acredita que um exército de 11 milhões de brasileiros poderia ser beneficiado com seus efeitos. Há espaço para todos.]

(Reportagem escrita, E-01)

Esse trecho, parte de uma reportagem escrita sobre o uso do Viagra no

Brasil, compreende duas seqüências textuais, descritas, respectivamente, como

segmento 8 e 9. Quero mostrar, primeiro, a visível mudança de centração na passagem

69

desses segmentos, o que permite identificar que eles recobrem tópicos diferentes. O

primeiro enunciado do segmento 8 expressa de forma sumária o seu tema: o espectro da

impotência, que no contexto mais amplo da reportagem se apresenta como um aspecto

da discussão sobre os fatos desencadeados pelo uso do Viagra. Esse enunciado integra

os demais em torno desse tema. Já no segmento 9, os enunciados se relacionam à

“concorrência”. Além do próprio item lexical “concorrentes”, ocorre uma série de

outros itens relacionados a esse assunto (Uprima, teremos opções, Vardenafil, Cialis, Há

espaço para todos).

A centração, assim, é a propriedade, que, além de definir o tópico, serve

como critério para operar concretamente com essa categoria numa análise textual-

interativa, o que também evidencia que não se trata de uma noção tão intuitiva assim.

3.2. A ORGANIZAÇÃO TÓPICA

Segundo Givón (1995, p. 345), o texto é representado na memória

episódica como uma “rede de nós conectados”, com uma estrutura hierárquica e

seqüencial. Esses nós que se conectam em rede, formando uma cadeia temática, são

identificados através de referentes tópicos; entre outras razões, segundo o autor, porque

os referentes nominais são, do ponto de vista perceptual, mais salientes.

Quanto ao processamento desses referentes, segundo o autor, o acesso ao

referente que está no foco da consciência se dá pela busca na memória, através do

exame de contextos partilhados, culturalmente (busca no estoque de conhecimentos

genéricos armazenados na memória semântica permanente) e textualmente (procura no

70

discurso precedente, armazenado na memória episódica). Já a importância temática do

referente que vai ser introduzido no modelo mental do ouvinte/leitor é sinalizada pela

ativação de atenção, através de mecanismos de codificação que operam como instruções

de processamento mental. Quando um referente tópico é ativado, ele serve como

endereço do arquivo ou nó que vai receber a informação relativa a ele na memória

episódica (GIVÓN, 1990).

Esse procedimento diz respeito ao tópico referencial ou sintático-discursivo.

Considerando a unidade discursiva global, Gorski (1994) amplia o domínio de

abrangência para o tópico semântico-discursivo. Dessa forma, a autora admite que a

organização do tópico discursivo envolve a ativação de arquivos (tópicos ou nós

temáticos) sob cujo domínio se localizam outros arquivos (subtópicos), numa estrutura

hierarquizada, ordenada por graus de abrangência, “de modo que tópicos mais gerais

dominam e recobrem tópicos que sejam especificações do tópico geral” (1994, p. 32).

Os tópicos semântico-discursivos são mantidos por algum tempo (ativação

contínua de arquivo aberto), desenvolvendo-se em subtópicos até que se inicie um novo

tópico e assim sucessivamente (ativação de novo arquivo). É possível ainda o retorno a

um tópico já abordado anteriormente (reativação de arquivos). Nesse retorno, segundo a

autora, ocorreria uma aparente digressão, correspondente a deslocamentos no plano

linear da codificação, mas não do plano da organização hierárquica, pois, nesse plano,

todas as informações se acomodam em seus respectivos arquivos.

Também para Jubran et al. (1992) a organização tópica pode ser observada

em dois níveis: no plano hierárquico e no plano seqüencial. No plano hierárquico, as

seqüências textuais se desdobram em supertópicos e subtópicos, dando origem a

71

quadros tópicos, caracterizados, obrigatoriamente, pela centração num tópico mais

abrangente e pela divisão interna em tópicos co-constituintes; e, possivelmente, por

subdivisões sucessivas no interior de cada tópico co-constituinte, “de forma que um

tópico pode vir a ser ao mesmo tempo supertópico ou subtópico, se mediar uma relação

de dependência entre dois níveis não imediatos” (1992, p. 364).

Comento a organização tópica de um dos textos do corpus desta pesquisa

para ilustrar essas relações de dependência. O texto é um artigo científico (E-053) e

apresenta como tópico geral a Relação da AIDS com a sexualidade. Esse tópico é

desenvolvido a partir de quatro desdobramentos, que constituem seus subtópicos:

Possibilidades de abordagem do tema, Natureza sexual da AIDS, Modificações de

padrões e práticas sociais provocadas pela AIDS e Lições da relação AIDS x

sexualidade. Forma-se aí um quadro tópico, que pode ser tomado como de primeiro

nível, com um supertópico e quatro subtópicos. Cada um dos subtópicos apresenta

outros desdobramentos. O tópico Possibilidades de abordagem do tema se desdobra em

dois subtópicos: Abordagens cogitadas e Abordagem adotado no artigo; o tópico

Natureza sexual da AIDS se desdobra em Tipos de transmissão e A AIDS e a revolução

sexual; o tópico Modificações de padrões e práticas sociais provocadas pela AIDS se

desdobra em mais três subtópicos: Liberação do discurso sexual, Visualização do sexo e

Legitimação de práticas sexuais discriminadas; e, finalmente, o tópico Lições tiradas

da relação AIDS x sexualidade se desdobra em Semelhança entre “safe sex” e

repressão sodomista e Natureza dos valores e preferências sexuais. Tem-se aí quatro

72

quadros tópicos de outro nível hierárquico, e o que é subtópico em um nível passa a ser

supertópico em outro16.

Assim caracterizado, Quadro Tópico constitui, como o tópico, uma noção

abstrata e relacional, cujo estatuto concreto é determinado pelo nível de hierarquia

selecionado pelo analista, para operar na descrição de um corpus. É essa seleção que vai

definir concretamente o QT tomado para análise em cada caso. Tendo em vista que cada

tópico tem um valor relacional na linha de subordinações contínuas, o recorte de QT

feito pelo analista fixará, conseqüentemente, em cada caso, a condição de super ou

subtópico (JUBRAN et al., 1992, p. 364).

No que diz respeito ao plano seqüencial, dois processos básicos

caracterizam a distribuição de tópicos na linearidade discursiva: a continuidade e a

descontinuidade. A continuidade se caracteriza por uma relação de adjacência entre dois

tópicos, com abertura de um tópico subseqüente somente quando o anterior é esgotado.

A organização tópica linear do artigo E-053, cuja organização tópica hierárquica

comentei anteriormente, se caracteriza pelo processo de continuidade. Os tópicos se

apresentam de forma adjacente na linearidade discursiva e a abertura de um tópico

subseqüente somente ocorre após o esgotamento do precedente.

A descontinuidade se caracteriza por uma perturbação da seqüencialidade

linear, causada ou por uma suspensão definitiva de um tópico, ou pela cisão do tópico,

que passa a se apresentar em partes descontínuas (JUBRAN, 1993).

Jubran et al. (1992, p. 366) observam que a organização seqüencial, que é

perturbada na linearidade, tende a se estabelecer hierarquicamente, ou seja, “a 16 A organização tópica completa do artigo pode ser visualizada no diagrama 13, anexo C, p. 396.

73

continuidade, postulada em termos de só se abrir um novo tópico após o fechamento de

outro, reaparece nos níveis mais altos da hierarquia da organização tópica”.

A cisão do tópico que causa a descontinuidade constitui, segundo esses

autores, o fenômeno da inserção, que pode ser vista por dois ângulos: um amplo, que

consiste na ocorrência de um tópico no interior de outro; e um restrito, que é associado

ao fenômeno da digressão.

A digressão, segundo Andrade (2001), se caracteriza por um desvio no fluxo

informativo. Implica a substituição de um domínio de relevâncias por outro, num

movimento momentâneo de suspensão do tópico em andamento. Seguindo Dascal e

Katriel (1982), Andrade assim define digressão:

Ela é uma estratégia por meio da qual os interlocutores conduzem o texto, manifestando na materialidade lingüística o quadro de relevâncias acionado na situação comunicativa. O deslocamento e conseqüente focalização de um novo ponto no domínio de relevâncias se instaura a partir da percepção de um dos participantes e se efetiva por meio de marcas formais que apontam para algo que estava no entorno e que agora é inserido no contexto situacional. (ANDRADE, 2001, p.100)

Dascal e Katriel (1982) propõem a existência de três tipos de digressões: a)

digressões baseadas no enunciado, nas quais se estabelece uma espécie de relação de

conteúdo (semântico ou pragmático) entre o enunciado principal e o digressivo; b)

digressões baseadas na interação, que remetem à instância da relação conversacional, ou

seja, são partes relacionadas à situação imediata, na qual os falantes estão inseridos

(perguntar sobre o horário, por exemplo); c) digressões baseadas em seqüências

inseridas, através das quais se executam esclarecimentos e correções. Já Jubran et

al.(1992, p. 367) consideram apenas dois tipos de digressão: as baseadas no enunciado,

“que ocorrem quando o segmento inserido constitui um tópico que se relaciona, de

74

algum modo, a outro(s) tópico(s) da conversação, por se subordinar a algum tópico

hierarquicamente superior a que esse(s) outro(s) tópico(s) também se submetem”; e as

baseadas na interação, “que não apresentam relações de conteúdo com outro(s)

tópico(s), justificando-se por contingências interacionais”.

No entanto, os próprios autores questionam a natureza digressiva do

primeiro tipo. Como os segmentos se subordinam a outros do mesmo nível, acabam por

perder o caráter digressivo. Por considerar de um lado a organização tópica do texto e

de outro as contingências da interação, esse conceito de digressão, por outro lado,

separa o lingüístico-textual do “entorno” (o interacional). Explicar os processos de

descontinuidades na linearidade discursiva dessa forma é incompatível com a

perspectiva teórica segundo a qual o interacional é inerente ao lingüístico, exatamente

porque toma esses dois fenômenos de forma isolada.

Jubran (1993) postula um conceito de inserção, tomando como critério a

natureza tópica ou não do segmento encaixado. Seguindo esse critério, a autora

identifica duas modalidades de inserção: uma em que o elemento inserido não se

configura como tópico, e outra em que o elemento constitui um tópico, por apresentar a

propriedade de centração. Essa forma de entender o fenômeno da inserção possibilita a

compreensão dos processos de descontinuidade a partir da perspectiva textual-interativa.

As inserções sem estatuto tópico são as que a autora caracteriza como

parentéticas, cujo critério primeiro de identificação é o desvio tópico. “O encaixe

efetuado não tem estatuto tópico, por não preencher a particularidade da centração, isto

é, por não projetar e desenvolver um tópico discursivo em determinado ponto do texto”

(1999, p. 2). As inserções parentéticas desempenham uma função pragmática,

75

“promovendo avaliações e comentários laterais sobre o que está sendo dito, e/ou sobre

como se diz, e/ou sobre a situação interativa e o evento comunicativo” (JUBRAN, 1999,

p. 3).

Para a autora, o desvio tópico caracterizador das inserções parentéticas

manifesta-se “em graus variáveis, que vão desde uma proximidade maior com a

construção tópica do segmento contextualizador da inserção, até uma maior

aproximação com a situação enunciativa” (1999, p.19). Assim, as inserções parentéticas

passam a ser entendidas em termos de desvio tópico, relacionadas a aspectos

formulativos e interacionais. Como a noção de graus de digressionalidade polariza esses

aspectos, a autora traça um contínuo entre os tipos de digressão apontados por Dascal e

Katriel (1982).

Esse critério (o foco sobre o qual incide o parênteses) norteará o recorte de classes de parênteses, dispostas ao longo do contínuo dado pela gradiência do desvio tópico, conjugada à gradiência de materialização das relações interacionais no texto, de forma que à maior proximidade do desvio ao seu contexto corresponde uma menor projeção dos dados interacionais e, sucessivamente, à menor aproximação do desvio em relação ao tópico discursivo corresponde uma maior incidência das condições enunciativas no texto. (JUBRAN, 1999, p. 20)

Destaco um trecho de um dos textos do corpus em que se evidenciam alguns

casos de parênteses.

(02) [1 Inf. 2 - -- já me sentei o que eu queria::... dizer o seguinte... sa/ saiu aí um:: disco... laser ((ruído estranho)) é uma é uma:: gravação feita antiga que agora foi quase ( ) para pra venda ao público... Inf. 1 - é mesmo? Inf. 2 - eu vou atrás desse aí porque ele disse que aquele can/ que:: que ele tem uma voz lindíssima:: e que ele canta que é uma maravilha... ele canta uma:: um Angelus uma Ave-Maria... e o que é a outra? e tem outras músicas cantadas por ele... Inf. 1 - em gregoriano? ((interrupção estranha))

76

Inf. 2 - em gregoriano... e também canção:: e::... outros cantos aí num sei...{num sei se música também Inf. 1 - também Inf. 2 - ... como a popular na igreja num sei com/é... (I) Inf. 1 - não porque { o GREGOriano é o próprio... Inf. 2 - HINOS Inf. 1 - cantochão Inf. 2 - hinos e:: tudo mais num sei{ eu sei que eles falam Inf. 1 - olha Inf. 2 - que ele canta:: e:: Angelus... e::... uma Ave-Maria... ((ruído)) diz que é muito bonito muito bem gravado muito bem feito... o disco {dele... Inf.1- ótimo... ótimo porque ele então /tá se revelando... porque:: ah também tem um livro aqui né/ No Limiar da Esperança {tu já ouviste falar?... Inf. 2 - ah não não... não Inf. 1 - ih:: Livro de de João Paulo segundo... responde ao per/ à perguntas e procura mostrar as realizações de seus QUINzes anos de papado... eh::{ ele... é Inf. 2 - para católicos e leigos Inf. 1 - ele deveria faZER... (II) pelo que eu tenho ouvido falar... ele deveria fazer... uma entrevista... numa das:: RÁdios lá dumas... da... rádio?... não televisão uma das... da:: televisão MAIS importante lá da Itália Inf. 2 - uhn uhn Inf. 1 - então... ele deveria falar ser entrevistado talvez umas duas horas... e:: ... por causa do trabalho DEle muita... ocupaÇÃO... então::... o::... o repórter... conversando com ele encontrando-se com ele (III) porque é um:: teÓlogo... lá da Itália... então... entregou a ele as perguntas que ele iria responder né?... Inf. 2 - cer::{to Inf. 1 - então ele::pegou as perguntas e levou o santo padre... Inf. 2 - uhn uhn Inf. 1 - tomou as perguntas... e levou pra ele... muito tempo dePOIS talvez algum tempo num sei quanto tempo... ele::... enviou ao repórter... esse:: esse JÁ TUDO... respondido... e essas respostas... então foi formado o livro... diz que é um livro MUIto bom... e::foi esgota/ foi esgotado TOda a edição aqui que foi publicada aqui em Fortaleza... Inf. 2 - é? Inf. 1 - As Paulinas ti::nha... mas eu já:: andei... procuRANdo... mas disseram que já estava esgotado mas COM certeza... virão novas... novas...(IV) comé que se chama? Doc. - {novos livro novas edições eu num sei o nome Inf. 2 - livros... novas edição... ah deve ser... né Inf. 1 - pois é ((pigarreou)) ] (Conversação espontânea, D2-39)

Nesse trecho, o tópico desenvolvido é Artigos religiosos. As informantes

falam sobre um disco e um livro, ambos de temática religiosa (dizer o seguinte... sa/

77

saiu aí um:: disco laser...; ah também tem um livro aqui né/ No Limiar da Esperança).

Nas quatro passagens desse trecho que estão em itálico e numeradas por algarismos

romanos, esse tópico é momentaneamente suspenso, para que as interlocutoras

promovam esclarecimentos sobre o conteúdo tópico, como em (I) e (III), manifestem o

processamento momentâneo do texto, em termos de busca de denominações, como em

(IV), ou ainda atribuam a terceiros as opiniões que emitem, como em (II). São, assim,

inserções parentéticas, que constituem um dos casos de descontinuidades da linearidade

discursiva.

Além dos parênteses, Jubran (1993, p. 65) aponta um outro tipo de inserção

não tópica. Trata-se de casos que a autora considera resquícios de tópicos já abordados

ou indícios de tópicos que se projetarão em outro ponto do texto, com força de elemento

central e proeminente. “Os resquícios ou os indícios de tópicos são meras referências a

um conjunto conceitual claramente diferente daquele que está em relevância no

momento em que elas ocorrem”.

No que diz respeito à inserção tópica, a autora postula que há dois casos.

O primeiro é o de tópicos paralelos encaixados em um tópico em desenvolvimento.

Chamamos de tópico paralelo aquele que se centra num assunto proeminente, diferente do assunto focal no ponto onde ele se intercala, e que não tem nenhuma relação de subordinação nem ao tópico mais amplo que recobre e encabeça o tópico cindido por ele, nem a qualquer outro tópico do discurso. (JUBRAN, 1993, p. 67)

Apresento, para ilustrar, um segmento textual, que, na conversação

espontânea D2-39, recobre um tópico paralelo.

(03) [23 Inf. 2 - eh::... olha... agora eu tive u/ uma:::::::: {idéia

78

Inf. 1 - conclusão de cursos essa {que é Inf.2- uma idé/ôh:: talvez quem consiga esse o endereço do G. pra voCÊ... seja::... a cunhada da E. ... que é desse curso que é da:: Inf. 1 - Universidade::{aber/ sem fronteiras né?.../tá bom Inf. 2 - a Universidade... é porque ela faz os convites para os professores pra:: ver quem::... pode:: dar as aulas os cur{sos que ela Inf. 1 - uhn uhn Inf. 2 - arranja... que ela faz... Inf. 1 - e qual é a... qual é a::... o curso que ele vai dar? tu sabes?... Inf. 2 - eu num lembro não Inf. 1 - não né? É da R.M.? a {R.M.? Inf. 2 - é não a R.M. matriculou e ela disse que me matriculou também pra ir pra esse curso...{eu vou no dia que quiser((risos)) Inf.1- ah são poucos... é pouco tempo é? Inf. 2 - eh:::...{ é pouco tempo e depois o seguinte esses cursos Inf. 1 - porque Inf. 2 - ela tem::: duas vezes na seMA::na é uma hora duas hora de Aula por sema::::na.... Inf. 1 - ah é? Inf. 2 - ás vezes no MÁximo quatro horas no máximo uma aula com {duas hora de aula... num sei... não sei... a Inf. 1 - e quanto tempo é que é a matrícula? Inf. 2 - R.M. quem fez e... ela me disse que ele ia fazer... que ela já tinha::... dado o nome pra menina... Inf. 1 - é né?...]

(Conversação espontânea, D2-39)

Esse trecho compreende o segmento textual identificado pelo número 23,

em que é desenvolvido o tópico Curso da Universidade sem Fronteira. Esse tópico não

se subordina a nenhum dos supertópicos desenvolvidos no texto, ou seja, Religião,

Valores e Problemas sociais e políticos, conforme pode ser observado no diagrama da

organização tópica17. Ele ocupa uma posição marginal em relação a esses supertópicos.

Trata-se, assim, de um tópico paralelo, que se caracteriza como um dos processos

responsáveis pela descontinuidade.

17 Esse tópico, inclusive não aparece no diagrama 16, anexo C, p. 401.

79

O aparecimento de um quadro tópico completo no interior de outro é o

segundo caso de inserção tópica, conforme Jubran (1993). Continuo tomando a

conversação espontânea D2-039 para retirar os exemplos. Através do diagrama da

organização tópica desse texto, é possível observar que o quadro tópico que se

desenvolve em torno do tópico Religião, segmentos 1 a 5, 7 e 8, 21, 24 e 26, sofre

algumas inserções tópicas. Há, por exemplo, o rompimento que ocorre no segmento 5,

em que se interpola um tópico paralelo, segmento 6, e o que ocorre no segmento 8,

quando é introduzido o quadro tópico Valores, segmentos 9 a 18.

Jubran (1993, p. 68) destaca o fato de que a inserção tópica não pode ser

abordada meramente no plano da horizontalidade, “pois seu estudo implica o

conhecimento da organização vertical, na medida em que o tópico inserido e o rompido

por ele podem pertencer a níveis hierárquicos diferentes”.

Um outro fenômeno apontado por Jubran (1993) como um caso de

descontinuidade é a alternância, ou seja, a divisão de um tópico em partes intercaladas.

Para a autora, as alternâncias constituem uma variação das inserções tópicas, uma vez

que têm a propriedade de serem uma interpolação em um tópico em desenvolvimento, o

que também provoca descontinuidade. Os subtópicos do tópico Capacidade de

expressão (Informante 1 e Informante 2), por exemplo, também da conversação

espontânea D2-39, se desenvolvem na linearidade do texto de forma alternada. Esse fato

pode ser observado também a partir do diagrama de organização tópica. Nos segmentos

9 a 15 se alterna o desenvolvimento dos dois subtópicos.

Do que foi apresentado até aqui sobre organização tópica, concluo o

seguinte: o texto se organiza topicamente em dois planos: um vertical, que diz respeito à

80

particularização hierarquizada do assunto em pauta; e um horizontal, que diz respeito à

distribuição dos tópicos na linha discursiva. A topicalidade desponta, assim, “como um

princípio organizador do discurso, que apresenta, no plano de sua realização, uma

estrutura passível de ser identificada e descrita” (Jubran, 1993, p. 64).

Jubran et al. (1992) e Jubran (1993) discutem a topicalidade tendo em vista

especificamente o texto falado conversacional. Gorski (1994) aplica o princípio na

análise de narrativas orais e escritas. Em trabalho anterior (PINHEIRO, 2002),

verifiquei as formas de organização tópica de diferentes gêneros textuais, falados e

escritos. Constatei que a noção de topicalidade permeia todos os gêneros textuais e que

é possível depreender uma organização dos assuntos, nos plano vertical e horizontal. No

que diz respeito à organização linear dos tópicos, constatei que os gêneros mais

prototípicos de fala apresentam um processo maior de descontinuidade. A topicalidade

se apresenta, portanto, como uma noção textual-interativa que se evidencia em

diferentes usos da língua.

3.3. O SEGMENTO TÓPICO

Segundo Gorski (1994, p. 34), os tópicos e subtópicos “sintetizam

fragmentos de discurso”, no nível semântico-discursivo, e, nesse sentido, identificam

um arquivo. Em outras palavras, os tópicos e subtópicos assinalam o lugar de uma

seqüência na organização discursiva, permitindo ao ouvinte/leitor localizar a posição

que eles ocupam no esquema hierarquizado do discurso.

81

Ainda segundo Gorski (1994), tanto na perspectiva da produção como da

compreensão do texto, os tópicos precisam ser apreendidos e controlados para que a

comunicação se efetive. Já na perspectiva do analista, além da necessidade de se captar

o grau de abrangência desses tópicos, é preciso explicitá-lo, conferindo-lhe um rótulo

adequado, de modo a recobrir a seqüência discursiva sob seu domínio. O mecanismo de

explicitação do tópico semântico-discursivo é semelhante ao processo de identificação

do referente que é tópico frasal, no sentido de que se procura saber sobre o que se fala.

O que distingue os dois processos é o fato de que, enquanto o tópico referencial é

codificado na frase, e, assim, concretamente audível ou visível, o tópico discursivo não

é explicitamente codificado. Ele precisa ser depreendido e nomeado.

O procedimento de identificar seqüências discursivas que configuram um

tópico discursivo é concretamente desenvolvido por Jubran et al. (1992). Operando com

a categoria de tópico discursivo, os autores chegam à identificação e delimitação de

segmentos tópicos, “isto é, unidades discursivas que atualizam as propriedades do

tópico” (1992, p. 363). Dessa forma, enquanto o tópico discursivo é uma categoria

analítica abstrata, o segmento tópico é a seqüência textual que preenche as propriedades

dessa categoria.

O segmento tópico é, portanto, a unidade que, em termos de centração,

revela concernência e relevância no conjunto de seus elementos e se localiza num

determinado ponto do evento comunicativo (pontualização), submetida à organização

tópica negociada pelos falantes. O segmento tópico, em outras palavras, constitui cada

conjunto de enunciados tematicamente centrados.

82

A noção de segmento tópico é importante na medida em que se pode ser

tomado como uma unidade a ser considerada na análise textual-interativa. Os diferentes

gêneros de texto apresentam uma extensão variada, por isso é necessário recortar uma

unidade menor para analisá-los. Na perspectiva de que a topicalidade é um princípio

geral de organização do texto, o segmento tópico se apresenta, então, como a unidade de

composição do texto.

Como unidade de composição textual, o segmento tópico reúne as mesmas

características formulativo-interacionais do texto, ou seja, se constitui como uma

unidade estrategicamente organizada veiculadora de sentido. Através da observação do

segmento tópico é possível isolar convenientemente as informações do texto e

acompanhar os seus diferentes estágios de desenvolvimento, o que permite verificar

processos globais de organização do texto. Apresenta-se também como uma unidade

compatível com a análise textual-interativa, sobretudo se comparado à oração, à

proposição ou à seqüência, unidades que não dão conta de dados pragmáticos-textuais,

“que interessam fundamentalmente a uma perspectiva discursiva de análise” (JUBRAN

et al., 1992, p. 359).

Ressalto que, em virtude da organização tópica hierárquica, a noção de

segmento, do ponto de vista prático de análise, é relacional, porque está associada aos

diferentes níveis dessa organização hierárquica. Tomo o artigo, a seguir, como exemplo

para ilustrar como o texto pode apresentar uma segmentação tópica relacional, que

depende dos objetivos do analista.

(04)

83

[1 No prólogo do segundo volume de seus Diálogos, São Gregório Magno escreve que ao desprezar os estudos literários iniciados em Roma, adotando a vida monástica, nosso pai São Bento preferia ser “doutamente ignorante e sabiamente insensato” (scienter nescius et sapienter indoctus). Reportava-se, evidentemente, à douta ignorância de que fala Santo Agostinho em carta à Proba. Mais tarde, Nicolau de Cusa definiu a expressão em seu livro de 1440 De docta ignorantia: “Nada podemos saber de Deus que, por ser infinito, está além de toda proporção com o finito, isto é, o homem”. Mas douta ignorância também se define, de modo genérico, como “a consciência dos limites do próprio saber”, como ensina Nicola Abbagnamo em seu excelente Dicionário de filosofia.] [2 Lembrei-me disso ao ler a reportagem da revista Veja sobre as misérias da pós-graduação no Brasil. Quando o professor Newton Sucupira escreveu seu histórico e lúcido parecer a respeito do assunto, advertiu as universidades para o perigo que podia transformar a pós-graduação num fracasso: o de contaminar-se com a impostura do chamado ensino superior entre nós. Como a voz do Batista, a de meu amigo Sucupira foi vox clamantis in deserto, porque as universidades não fizeram outra coisa senão abastardarem os graus de mestre e doutor. Temos, aliás, no Brasil, a triste tradição de desmoralizar palavras que, no estrangeiro, são quase sagradas. Já me referi, neste jornal, ao que acontece com filósofo, historiador, antropólogo e sociólogo, títulos com os quais são brindados entre nós, simples professores de filosofia, história, antropologia e filosofia.] [3 Para que serve a pós-graduação? Para fazer com que as universidades sejam não apenas transmissoras, mas produtoras de cultura, contribuindo para o desenvolvimento da filosofia, da ciência, das letras e das artes.] [4 Exige-se do candidato ao grau de mestre que demonstre em sua dissertação o domínio de métodos, conhecimento da matéria e capacidade de sistematização. Mas a quem pretende o grau de doutor a exigência é que sua tese contenha uma contribuição original à área do conhecimento que se insere determinado tema.] [5 Vê-se pela reportagem aqui comentada que nas universidade brasileiras, com raras exceções, não acontece nada disso. Que as teses são verdadeiros bestialógicos, como a de um professor de filosofia do Recife, aprovada porque os examinadores queriam se ver livres dele (sic!). Sabe-se também que depois de obterem o grau, os doutores não fazem mais pesquisas nem publicam. Mas ganham gratificações que tornam seus salários muito mais altos do que os dos simples bacharéis. Estes, coitados, continuam pesquisando, publicando e até integrando bancas examinadoras de teses de doutoramento.] [6 As universidades valorizam mais os doutos indoutos do que os não doutores que pesquisam mesmo depois de aposentados por limite de idade, que integraram colegiados de pesquisa e pós-graduação e foram assessores de instituições nacionais e estrangeiras. Valorização do formal em detrimento do essencial. Desserviço ao desenvolvimento científico e humanístico. Traição aos objetivos da pós-graduação.]

(Artigo de opinião, E-257)

84

Com base na categoria analítica de tópico discursivo, o texto pode ser

recortado em seis segmentos, tal como está transcrito em (04). Cada um desses

segmentos corresponde aos tópicos que estão no último nível da hierarquia, dentro de

cada quadro tópico, ou seja, aos quais nenhum outro tópico se subordina18. Dependendo

do nível que o analista colocar sob enfoque, diferentes formas de segmentação são

possíveis. Se a segmentação for depreendida somente a partir dos quadros tópicos de

segundo nível (A idéia de “Douta ignorância”, Funcionamento da pós-graduação no

Brasil e Avaliação geral sobre a pós-graduação), por exemplo, o texto apresentará

apenas três segmentos: o primeiro, que corresponde ao segmento 1, o segundo, que

corresponde a toda a extensão textual que vai do segmento 2 ao 5, e o terceiro, que

corresponde ao segmento 6. Não será levada em conta, portanto, a subsegmentação do

segundo tópico.

Isso vem enfatizar a questão levantada por Jubran (1993) em relação ao

fato de que a organização tópica envolve simultaneamente interdependências tópicas

seqüenciais e hierárquicas, o que sustenta também a concepção de organicidade tópica

que compreende dois planos, o linear e o vertical.

A partir da análise de um texto falado conversacional, Jubran et al. (1992)

demonstram que o recorte de um texto, fundamentado na propriedade tópica de

centração, pode vir a apresentar marcas que delimitam seu início, seu meio e seu fim.

Perguntas introdutórias, troca de turno, deslocamento à esquerda, topicalização são

alguns mecanismos encontrados pelos autores em início de segmentos. Enunciados

conclusivos, parafrásticos, resumitivos, entonação conclusa, marcadores do tipo não é,

18 Cf. diagrama 09, anexo C, p. 392.

85

né marcaram final de segmentos. Quanto aos procedimentos que delimitam o meio do

segmento, correspondente ao desenvolvimento do tópico, os autores não chegam a

analisar elementos como os identificados em início e final, mas os recursos que inter-

relacionam os enunciados no interior do segmento. “As vinculações que inter-

relacionam os enunciados constituintes do segmento tópico apresentam-se marcadas

lingüisticamente por lexemas que se relacionam por sinonímia, por oposição ou por

algum tipo de associação” (1992, p. 392).

3.4. TÓPICO DISCURSIVO E ESTRATÉGIA TEXTUAL-INTERATIVA

Operando com a categoria de tópico discursivo, e sob a perspectiva textual-

interativa, alguns autores têm desenvolvido estudos sobre as estratégias e mecanismos

de construção textual que fazem parte do subsistema textual19. Só para ilustrar, remeto a

alguns dos estudos publicados no volume VII da Gramática do Português Falado

(NEVES, 1999).

Koch (1999) examina um tipo de articulação tema-rema em que, em virtude

de deslocamentos de constituintes, ocorre um grau de segmentação sintática do

enunciado. Para a autora, nesse caso, há a utilização de estratégias de tematização e

rematização, ou seja, de deslocamentos do tema ou do rema20. Para autora, entre outras

funções de natureza textual-discursiva, a tematização é uma estratégia de introdução e

mudança de tópico. Fávero, Andrade e Aquino (1999) investigam a correção como um 19 Cf. capítulo 2. 20 A autora opera com os conceitos de tema e rema tal como postulados pelos autores da Escola Funcionalista de Praga, ou seja, “do ponto de vista funcional, cada enunciado divide-se em (pelo menos) duas partes – tema e rema -, a primeira das quais consiste no segmento sobre o qual recai a predicação trazida pela segunda. Isto é, tem-se um segmento comunicativamente estático – o tema – oposto a outro segmento comunicativamente dinâmico – o rema, núcleo ou comentário” (KOCH, 1999, p. 29-30).

86

processo de formulação do texto falado. Para as autoras, uma das funções dessa

estratégia é orientar o foco de atenção para elementos específicos sobre do tópico,

através da adequação de um enunciado ao conteúdo tópico. Marcuschi (1999b) trata dos

aspectos textuais-discursivos da hesitação. Na análise dos papéis da hesitação, o autor

propõe a sua distribuição em três classes: papéis formais, papéis cognitivos e papéis

interacionais. Os papéis cognitivos se relacionam a “todos os fenômenos relacionados à

compreensão, intenção e organização tópica” (1999b, p. 188). Entre os papéis

cognitivos mais comuns da hesitação, o autor destaca: sinalização de saturação de

tópico, sinalização de atividade de compreensão, indicação de organização tópica e

atividade de planejamento.

Um achado comum desses trabalhados é o fato de que as funções das

estratégias de construção textual se relacionam ao percurso do tópico, ou seja, como o

tópico entra no discurso (introdução), como se mantém em cadeia (manutenção) e como

sai (mudança). A questão da gestão do tópico permeia, portanto, praticamente todas as

estratégias textuais e interacionais estudadas, nesses e em outros estudos, o que mostra

que a composição do texto pode mesmo ser associada à topicalidade.

Conforme apresentei no primeiro capítulo, estou considerando a noção de

sistema de desempenho lingüístico. A competência comunicativa do usuário da língua

se manifesta na efetivação da produção e recepção de textos, falados ou escritos. A

pedra angular desse sistema é o subsistema textual cuja descrição tem como objetivo

apontar aspectos da construção do texto, relacionados ao processamento de estruturas. O

tópico discursivo é uma categoria que possibilita a análise do texto sob essa perspectiva.

87

Assim, operando com essa categoria, estou considerando a possibilidade de

observar, em diferentes usos da língua, recorrências que caracterizam a articulação

tópica como um aspecto da composição do texto, que faz parte do subsistema textual de

desempenho lingüístico.

Segundo Koch (1999, p.29), “é sabido que cada língua apresenta uma

variedade de formas de expressão, abrindo-se, desta maneira, para o falante um amplo

espaço de formulação, isto é, a possibilidade de escolha entre um leque de opções

possíveis”. No que diz respeito à construção tópica do texto, as atividades de

formulação e interação que emergem do percurso do tópico e das formas como se

articula fazem parte desse leque de opções.

Articulação tópica constitui, assim, a forma como os segmentos tópicos,

considerados a partir dos diferentes planos hierárquicos, e os enunciados que integram

os segmentos em particular se vinculam lingüisticamente. Os diferentes mecanismos

pelos quais se realiza a articulação tópica são entendidos, de acordo com a perspectiva

teórica aqui assumida, como fenômenos textuais e interacionais. Através da análise

desses mecanismos é possível perceber a integração de fatos formulativos e

interacionais na composição do texto, conforme o demonstrarei no próximo capítulo.

88

4. A INTEGRAÇÃO DE FATOS FORMULATIVOS E INTERACIONAIS NA ARTICULAÇÃO TÓPICA

No primeiro capítulo deste trabalho, apresentei a idéia de que a competência

comunicativa dos usuários da língua se manifesta através do sistema de desempenho

lingüístico, composto pelos subsistemas fonológico, morfossintático e textual. As

estratégias de construção textual que caracterizam o funcionamento do subsistema

textual emergem da interação, o que caracteriza o fenômeno da inscrição do interacional

no lingüístico. No segundo capítulo, discuti a topicalidade como um princípio de

organização textual a partir do qual é possível compreender a organização do texto,

numa perspectiva textual-interativa. Neste capítulo, eu me detenho na articulação

tópica, entendendo-a como uma estratégia de construção do texto, assentada em

propósitos interacionais. Identifico, em um corpus constituído de diferentes gêneros

textuais, falados e escritos, os mecanismos através dos quais a estratégia de articulação

tópica se manifesta, e os descrevo como fatos de formulação e interação.

4.1. PROCEDIMENTOS ADOTADOS NA ANÁLISE

Conforme expus no capítulo anterior, a organização tópica se manifesta por

meio de relações de interdependência no plano hierárquico (dependência de super-

ordenação e sub-ordenação entre tópicos determinada pelo grau de abrangência do

assunto) e no plano seqüencial (relação de adjacência ou interposição de segmentos

89

tópicos na linha discursiva)21. Considerando essa concepção de organização tópica,

identifiquei, em cada texto do corpus, a particularização hierarquizada dos tópicos e a

sua distribuição seqüencial na linha discursiva. Para isso todos os textos22 foram

divididos em segmentos lineares, e foram atribuídos rótulos aos tópicos recobertos por

cada segmento, com base no critério da centração.

No que diz respeito à delimitação, Jubran et al. (1992, p. 371) constatam que

“a delimitação dos segmentos tópicos pode ser justificada por marcas, cuja identificação

constitui um critério auxiliar de segmentação, já que elas não configuram um padrão de

ocorrências que possibilite a categorização segura”. Não foi utilizado, portanto, nenhum

critério formal para delimitar os segmentos tópicos, o que prevaleceu foi mesmo o

critério da centração no conjunto de enunciados.

Após a segmentação dos textos em seus tópicos constituintes, observei as

dependências desses tópicos no plano vertical, detectando as relações de super e sub-

ordenação entre eles e demonstrando a sua organização hierarquizada por meio de

diagramas. A seguir, verifiquei os mecanismos através dos quais os segmentos tópicos

se constroem e se articulam nos diferentes planos hierárquicos.

Para efeito de exemplificação, descrevo o procedimento adotado para a

análise de um dos textos, a palestra F-033. O texto foi dividido em 13 segmentos,

organizados em torno de dois tópicos principais, correspondentes a um primeiro nível

da organização tópica hierárquica: (A) A palestra e (B) Efetividade de três princípios

constitucionais. O tópico (A) apresenta apenas um segundo plano de desdobramento,

21 A segmentação de todos os textos do corpus se encontra no anexo B, p. 230. Os segmentos estão delimitados por colchetes e identificados por numerais ordinais. A organização tópica hierárquica está representada pelos diagramas, no anexo C, p. 380. 22 A lista dos textos utilizados na análise encontra-se no anexo A, p. 225.

90

compreendendo os subtópicos: (A1) O palestrante, (A2) Saudação do palestrante, (A3)

Estrutura e enfoque de análise do assunto e (A4) Pontos de partida para a análise. Já o

tópico (B) se subdivide em níveis sucessivos de detalhamento, de modo que os seus

subtópicos se desdobram em outros. Assim, (B) apresenta, no segundo nível hierárquico

do texto, três tópicos: (B1) Direito justo, (B2) Conciliação e (B3) Desobediência civil.

Dentro de (B1) há um terceiro plano, com os subtópicos (B1.1) Demora na entrega da

prestação jurisdicional e (B1.2) Conceito de direito justo. E há, ainda, um quarto plano,

já que cada um desses dois subtópicos, por sua vez, se subdivide em outros dois: (B1.1)

comporta o (b1.1) Popularização da demora e o (b1.2) Exemplo do segurado 663681-

04/43, enquanto (B1.2) engloba o (b2.1) Linhas que definem e o (b2.2) Aplicação no

caso do segurado 663681-04/43. Os desdobramentos dos tópicos (B2) e (B3) atingem

somente o terceiro nível da hierarquia tópica do texto. (B2) tem por subtópicos (B2.1)

Conceitos, (B2.2) Postura do processo brasileiro e (B2.3) Proposta para o

cumprimento do direito à conciliação. (B3) se desdobra em (B3.1) Conceitos e (B3.2)

Conseqüência do exercício do direito à desobediência civil23.

Em termos de linearidade discursiva, o tópico (A) recobre os segmentos de

1 a 4, correspondentes a seus quatro subtópicos e o (B) abarca os segmentos de 5 a 13,

assim distribuídos: os de 5 a 8 configuram o tópico (B1), sendo que 5 e 6 integram

respectivamente as subdivisões de (B1.1) em (b1.1) e (b1.2), e 7 e 8 as subdivisões de

(B1.2) em (b2.1) e (b2.2); os segmentos de 9 a 11 constituem os desdobramentos de

(B2) nos seus três subtópicos; e, finalmente, o 12 e o 13 formam os dois subtópicos de

(B3). No interior de alguns desses segmentos ocorrem inserções parentéticas24.

23 Essa organização pode ser acompanhada pelo diagrama 25, anexo C, p. 413. 24 Nesse e nos demais textos, as inserções parentéticas aparecem em itálico.

91

Essa distribuição seqüencial dos tópicos na linha discursiva, claramente

visível no diagrama referente a esta palestra, mostra que, nesse texto, a sucessão tópica

caracteriza-se pela continuidade (relação de adjacência entre os tópicos).

Assim, analisei primeiramente os mecanismos de articulação entre os

segmentos de cada um dos quadros tópicos. Por exemplo, no quadro tópico (A),

verifiquei como se articulam os segmentos 1, 2, 3 e 4, que o constituem. No caso do

quadro tópico (B), como há quadros tópicos em diferentes níveis hierárquicos, a análise

contemplou a articulação entre 5 e 6, de um lado, e entre 7 e 8, de outro, e depois entre

9, 10 e 11 do quadro tópico (B2), e entre 12 e 13 do quadro tópico (B3). Depois analisei

a articulação entre os conjuntos de segmentos. O 5 e 6 passaram a ser vistos como um

só segmento, que se conecta ao conjunto formado por 7 e 8. Esses 4 segmentos, por sua

vez, passaram a ser vistos como um só, na medida em que formam o quadro tópico

(B1), que se conecta ao conjunto 9, 10 e 11 do quadro tópico (B2), que se articula com o

conjunto 12 e 13 do quadro tópico (B3). E assim até chegar aos dois grandes segmentos

(conjuntos formados por 1 a 4 e por 5 a 13), que recobrem os dois principais tópicos (A)

e (B), desenvolvidos no texto. Esse nível de análise denominei de intertópico.

Num segundo momento, analisei cada um dos 13 segmentos, de acordo com

sua apresentação na linearidade textual, observando como eles se estruturam

internamente, como é realizada a articulação entre os enunciados que os constituem. É o

que denominei de nível intratópico.

Na verdade, a distinção inter e intratópica é apenas uma opção

metodológica, para englobar tanto a análise interna de cada segmento tópico mínimo,

depreendido na linearidade textual, quanto a análise das articulações entre esses

92

segmentos. A partir do momento em que levo em consideração a hierarquia tópica, a

relação entre os segmentos do mesmo nível, integrantes de um quadro tópico, é inter e

intratópica. Por exemplo, a relação entre os tópicos A1 e A2, da palestra F-033, é

intertópica, se estiver em foco o nível hierárquico mais baixo e último, mas é também

intratópica, se levo em consideração que eles estão no interior do tópico A, e a análise

passa para o plano hierárquico imediatamente superior, focalizando o tópico A, ou seja,

vendo como um único segmento textual a porção recoberta por A1 e A2.

Na medida em que fui aplicando esse procedimento em cada um dos textos

que compõem o corpus, fui identificando recorrências na interligação dos segmentos

tópicos e dos enunciados que os integram. Os fatos recorrentes no conjunto da análise

foram categorizados como mecanismos de articulação tópica.

4.2. MECANISMOS DE ARTICULAÇÃO TÓPICA

Os mecanismos de articulação tópica identificados na análise dos textos

foram divididos em cinco grupos, conforme os recursos lingüísticos empregados: a)

marcadores discursivos, b) formas referenciais c) formulações metadiscursivas, d)

perguntas e e) paráfrases. A análise consiste na descrição da funcionalidade desses

mecanismos no processo de formulação textual e interação. A descrição de cada um

desses mecanismos foi feita a partir dos tipos de relações que se estabelecem entre os

tópicos e entre os enunciados intratópicos: seqüenciação, retomada ou mudança.

Alguns estudos desenvolvidos por pesquisadores brasileiros sobre a

organização do texto falado dão destaque à seqüenciação como uma função que justifica

o emprego de muitos dos termos que servem para estabelecer ligações entre partes do

93

texto. Em uma pesquisa sobre marcadores conversacionais no português falado,

Andrade (1990) mostra que uma das funções de aí, daí e então é a de indicar seqüência.

Risso (1996) destaca a função do articulador então de apresentar, de forma linear,

dentro de um dado tópico as várias porções de informações. A autora vê no

encadeamento de porções de informações pelo então “o efeito de alinhavo carreado por

esse articulador” (1996, p.435). Em pesquisa sobre o emprego variável de um grupo de

conectores, Tavares (1999) também destaca o papel de aí, daí, então e e no

estabelecimento de sucessão entre eventos, idéias, tópicos. Naturalmente, cada pesquisa

interpreta os resultados conforme sua perspectiva teórica e o tipo de dados, mas o

fenômeno da seqüenciação se mostra significativo na discussão de todos os resultados.

Nesta pesquisa, a seqüenciação tópica foi interpretada como o processo que

estabelece uma ponte entre os enunciados que constituem as partes internas de um dado

segmento tópico ou entre tópicos co-constituintes de um supertópico, no sentido de que

o primeiro enunciado ou tópico serve de base para o que será dito no segundo. Além de

apresentar essa noção ampliada de seqüenciação, focalizo outros mecanismos de

articulação tópica que também são seqüenciadores, além dos marcadores discursivos.

No capítulo anterior, mostrei que dois tópicos podem ser descontínuos e até

distanciados na linearidade discursiva, por efeito da inserção de outro tópico ou outro

quadro tópico. Pode haver também descontinuidade dentro de um mesmo segmento

tópico mínimo, provocada por inserções não tópicas. O processo através do qual ocorre

a compensação dessa descontinuidade é o que estou considerando de retomada.

Conforme também expus no capítulo em que tratei da topicalidade, o tópico

discursivo envolve a noção mais geral de “assunto” ou “tema” que é abordado em um

94

texto. Dependendo dos propósitos e das condições de produção, em um mesmo texto

podem ser desenvolvidos diferentes assuntos, que podem ou não estar vinculados no

plano da organização tópica hierárquica do texto. Numa conversação espontânea, por

exemplo, em que os locutores, a princípio, não têm pré-definidos os assuntos sobre os

quais irão conversar, é comum que diferentes tópicos, não concernentes entre si, sejam

desenvolvidos. Nesse caso, ocorre o processo de mudança entre tópicos do primeiro

plano da hierarquia. Mas a mudança também pode ocorrer no interior de um mesmo

tópico, através do seu desdobramento em quadros tópicos, e destes em subtópicos.

4.2.1. Emprego de Marcadores Discursivos

Diferentes são as designações encontradas na literatura lingüística para os

elementos que exercem a função de ligar seqüências textuais. Conectores, operadores

argumentativos, articuladores, marcadores discursivos são algumas dessas designações.

Naturalmente, cada uma está relacionada a um olhar teórico acerca do movimento de

junção entre partes do texto; o que, na verdade, evidencia que não são diferentes apenas

as designações, mas também os conceitos.

Os conectores são elementos entendidos por alguns estudiosos como sinais

de articulação, responsáveis pelo tipo de coesão textual denominado de conexão ou

junção25. Trata-se de um conjunto heterogêneo de formas lingüísticas que envolvem não

só as conjunções, tradicionalmente conhecidas como elos de ligação entre orações, mas

também alguns advérbios, locuções adverbiais, prepositivas e conjuntivas.

25 Cf. Koch (1991).

95

Segundo Koch (1991), as relações lógico-semânticas entre orações que

compõem um enunciado são estabelecidas por conectores do tipo lógico. Já as relações

do tipo discursivas, que ocorrem entre partes maiores de texto, são estabelecidas por

conectores discursivos. Uma outra distinção para os conectores é proposta por Van Dijk

(1979). Para esse autor, há conectores semânticos, que servem para expressar uma

relação semântica entre proposições ou fatos; e conectores pragmáticos, que servem

para expressar relações entre atos de fala.

Dessa forma, o critério que parece mais significativo para definir os

conectores é a existência de algum tipo de relação que se estabelece, através deles, entre

partes do texto. Assim é que, segundo Roulet (1997), os conectores são as marcas que

servem para especificar uma relação, que pode ser percebida por meio de inferência.

Tavares (1999), por exemplo, utiliza esse critério para classificar os

elementos aí, daí, e, e então como conectores, numa pesquisa variacionista. Segundo a

pesquisadora, aí, daí, e, e então conectam orações ou partes maiores do discurso,

desempenhando as seguintes funções semântico-discursivas: seqüenciação retroativo-

propulsora, adversão, adição”(1999, p. 19).

Quando os conectores estabelecem, entre partes do texto, uma relação do

tipo argumentativa, eles são tratados especificamente como operadores argumentativos.

Essa concepção de conector se baseia na perspectiva da semântica argumentativa

(ANSCOMBRE E DUCROT, 1979).

Segundo esses autores, a argumentação é intrínseca à língua, constitutiva

dos enunciados. Isso quer dizer que um locutor argumenta em favor de uma

96

determinada conclusão (que pode ser simbolizada por C), quando apresenta um

determinado enunciado (que pode ser simbolizado por A) através do qual pretende levar

seu interlocutor àquela conclusão. Nos termos dos autores, assim, “argumentar para C

(uma conclusão) através de A (empregar A em favor da conclusão C) é apresentar A

como devendo levar o destinatário a concluir C”, “dar A como uma razão para crer em

C” (ANSCOMBRE E DUCROT, 1979, p. 14).

Guimarães (1995, p. 78) esclarece essa noção de argumentação e a define

como a orientação da seqüência do discurso em uma certa direção. Nas palavras do

autor, “mais especificamente, argumentar é dar uma diretividade ao dizer”.

Há na língua uma diversidade de tipos de elementos que servem para

conferir aos enunciados uma certa orientação argumentativa. Alguns desses elementos

são exatamente os conectores argumentativos, que estabelecem a conexão entre os

enunciados.

A articulação das informações, expressa em enunciados lingüísticos, por

meio de um conector, está vinculada à interpretação ou diretividade do enunciado.

“Conectores são signos que podem servir à união de dois ou mais enunciados,

assinalando neles um papel particular em uma estratégia argumentativa” (DUCROT,

1983, p. 9). Assim, além de vincular partes do discurso, os conectores dão a elas um

papel argumentativo.

Ao analisar as relações que se estabelecem entre os tópicos e os enunciados

que formam os segmentos tópicos, observei que elas não podem ser vistas apenas do

ponto de vista semântico ou argumentativo. Como mostrarei mais adiante, as relações

97

são do tipo discursivas, no sentido de que são construídas pelo falante/escritor no ato da

produção do discurso, tendo em vista os objetivos interacionais. Dessa forma, a noção

de conector como elemento que serve para ligar partes do texto, estabelecendo entre elas

relação do tipo semântica ou argumentativa, é, assim, redutora para os limites teóricos

desta pesquisa.

Uma outra visão a partir da qual podem ser interpretados os elementos

lingüísticos usados para ligar partes do texto é proposta por Koch (2002). Segundo essa

autora, os recursos lingüísticos utilizados no encadeamento de segmentos textuais

constituem uma categoria identificada como articuladores textuais. Para a autora, a

função dos articuladores não é apenas a de estabelecer a coesão textual. Eles “são

multifuncionais, já que desempenham no texto funções das mais variadas, de ordem

cognitiva, discursivo-argumentativa, organizacional, meta-enunciativa e interacional”

(2002, p. 141).

Koch classifica os articuladores em três classes: os de conteúdo

proposicional, os enunciativos e os meta-enunciativos. Os articuladores da primeira

classe atuam no plano do conteúdo e servem para indicar relações espaço-temporais e

lógico-semânticas. Os da segunda atuam no plano dos atos de fala e servem para indicar

relações do tipo discursivo-argumentativo. Essas duas classes de articuladores parecem

corresponder à de conectores, tal como discuti anteriormente. Finalmente, os

articuladores da terceira “conectam, de alguma forma, a própria enunciação” (KOCH,

2002, p. 138).

Nessa classificação, os articuladores meta-enunciativos apresentam ainda

outras subdivisões. Mas essa subdivisão é feita a partir de critérios de naturezas

98

diversas, o que a torna confusa. Por exemplo, o tipo de articulador que forma o

subgrupo dos metaformulativos inclui, entre outros, comentadores da forma como o

enunciador se representa perante o outro no ato de enunciação, introdutores de

reformulações ou correções e marcadores conversacionais que operam no

“amarramento” de porções textuais. Ora, todos os articuladores, segundo a própria

definição da autora, atuam no “amarramento” de porções textuais, tanto que sua função

primeira é exatamente a de estabelecer a coesão textual. Assim, a função de ligar partes

do texto não define apenas um subtipo, mas a classe dos articuladores como um todo.

Além disso, fica confuso entender como um marcador conversacional pode ser um

subtipo de articulador, haja vista que, pelo menos no domínio da Análise da

Conversação (MARCUSCHI, 1991), os marcadores conversacionais constituem uma

classe de elementos e não uma função.

Por outro lado, nessa perspectiva de entender os articuladores textuais, os

fatos de natureza textual se separam dos de natureza interacional. Isso acaba por deixar

também essa noção de articulador incompatível com a perspectiva teórica desta

pesquisa.

Assim como os conectores e os articuladores textuais, os marcadores

discursivos são também elementos lingüísticos a que se faz referência nos estudos sobre

a ligação de entre partes do texto. Risso, Silva e Urbano (1996, p. 55-6) apresentam a

seguinte definição para esses elementos:

(...) mecanismos verbais da enunciação, atuam no plano da organização textual-interativa, com funções normalmente distribuídas entre a projeção das relações interpessoais – quando o foco funcional não está na seqüência entre de partes do texto, e a proeminência da articulação textual – quando a dominante deixa de estar no eixo da interação.

99

Esses autores depreenderam as regularidades constantes em ocorrências de

marcadores em quinze inquéritos do projeto NURC-Br e propuseram matizes de traços

que dão suporte a uma delimitação dessa classe de elementos. Os dados apurados

apontaram para as seguintes características:

a) atuam no plano da organização textual-interativa, com tônica na função de

articulação entre segmentos textuais ou na sinalização de relações interpessoais;

b) são exteriores ao conteúdo informativo do tópico;

c) não são transparentes do ponto de vista semântico-referencial;

d) apresentam pouca variação fonológica, flexional ou sintática;

e) são sintaticamente independentes;

f) geralmente, acompanham-se de uma pauta prosódica demarcativa, bem definida;

g) apresentam massa fônica reduzida.

Esses traços foram tomados como critérios para o estabelecimento de um

núcleo-piloto que define um contínuo de marcadores prototípicos, não prototípicos e

unidades limítrofes à classe. O preenchimento ou afastamento gradativo de

combinações desses traços serve de critério para enquadrar um dado elemento em algum

dos pontos desse contínuo.

O subconjunto de marcadores discursivos prototípicos, assim definidos por

apresentarem combinações de traços estatisticamente relevantes, inclui elementos

fortemente seqüenciadores e interativos, ou seja, exercem, conjuntamente, na

construção do texto, funções articuladoras e interacionais. Trata-se, portanto, de uma

noção perfeitamente compatível com a perspectiva teórica desta pesquisa.

100

A análise realmente revelou que os marcadores discursivos exercem a

função de unir segmentos tópicos ou enunciados intratópicos, contíguos ou não, na

superfície textual. A essa função de organizador da estruturação do texto se congregam

outras, de natureza interacional. O locutor imprime a seu texto uma certa orientação de

sentido e pretende que seu interlocutor a assimile. Essa orientação de sentido

corresponde às relações discursivas que se instauram no texto e constitui uma das

demandas interacionais para o emprego de marcadores discursivos na articulação tópica.

No capítulo de fundamentação teórica, mostrei que, para alguns autores, se

estabelece, na superfície textual, uma relação, que pode ser dois tipos: semântica ou

pragmática. Detenho-me, aqui, apenas na análise de Koch (1991, 1995a, 1996), porque

é nos trabalhos dessa autora em que essas relações são explicitamente distinguíveis.

Para Koch, as relações semânticas são as dadas objetivamente, em termos de

função referencial da linguagem. As relações pragmáticas, também chamadas de

discursivas, argumentativas, são dadas subjetivamente.

Koch (1996) faz essa distinção em conformidade com o princípio geral da

Retórica segundo o qual existe diferença entre convencer e persuadir. Para se convencer

utiliza-se de provas, para se persuadir, de argumentos. Assim, se p é apresentado como

prova de r, p é condição suficiente para r. Por outro lado, p é argumento para r, se de p

for possível tirar uma conclusão, dentro de uma determinada situação.

Na visão da autora, as relações semânticas são, portanto, as relações do

provar, baseadas no pressuposto da “condição suficiente”. No texto, essas relações são

apenas reveladas, em virtude de serem inerentes aos enunciados, daí objetivas. As

101

relações pragmáticas, por outro lado, são criadas, construídas subjetivamente pelo

usuário, em um contexto específico de produção do discurso. São da ordem do

convencer.

A análise dos dados desta pesquisa aponta para o fato de que, na articulação

tópica, estabelecida por marcadores discursivos, ocorrem alguns tipos de relações (como

as de oposição, causalidade, explicação, exemplificação, entre outras). O produtor do

texto estabelece, seja no nível intra ou intertópico, por exemplo, uma relação de

oposição (o tópico ou enunciado que se segue tem um teor que se opõe ao que está

sendo desenvolvido). Mas, considerando a base teórica que fundamenta a pesquisa, não

é possível interpretar os dados a partir da noção de que as relações são semânticas ou

pragmáticas, tais como concebidas em alguns estudos do texto.

Se parto do princípio de que os tópicos de um texto são construídos

interacionalmente, devo postular também que as relações que se estabelecem entre eles

são do tipo discursivas, ou seja, são também relações criadas pelos locutores, que,

dialogicamente, produzem o texto.

Em um estudo sobre as relações de causalidade, Paiva (1996) discute a

inadequação de uma definição puramente semântica da relação causal na análise de

muitos dos enunciados que ocorrem no discurso oral. Segundo a autora, a noção de

“condição suficiente”, bem como a de tempo e agentividade, também de natureza

puramente semântica, não conseguem abranger todas as relações classificáveis como

causais que aparecem no discurso cotidiano.

102

A autora sustenta, então, que a ligação entre um enunciado antecedente e

seu conseqüente não é lógica, em termos de “condição suficiente”, mas discursiva, uma

vez que envolve o conhecimento de mundo partilhado pelos participantes do ato de

comunicação. Paiva utiliza a noção de topos, desenvolvida por Ducrot (1983) para

explicar a relação entre dois segmentos de discurso. Há um princípio argumentativo

mais geral que autoriza, por exemplo, a passagem de uma causa a um efeito. Esse

princípio é atualizado por um enunciado específico, numa situação particular de

discurso. Em (01), por exemplo, a passagem da causa “eles xingaram a professora e a

inspetora escutou” para o efeito “colocou a gente de castigo” é garantida por um

princípio mais geral, segundo o qual todos os que desrespeitam uma autoridade

merecem punição. O topos que garante essa passagem da causa para o efeito é pré-

existente ao discurso particular dos falantes.

(01)

Eles xingaram a professora e a inspetora escutou, colocou a gente meia hora de castigo.

A partir dessa análise, Paiva tenta mostrar que a relação de causalidade é

“construída discursivamente” (1996, p. 73). A relação causal é alegada. Causa alegada,

segundo Anscombre (1984) é aquela criada pelo falante no ato da enunciação,

estabelecida a partir de seu julgamento acerca da relação entre os fatos. Assim um fato

A só pode produzir um fato B, na perspectiva de um falante específico, em uma situação

particular de discurso. Paiva (1996, p. 73) traduz isso da seguinte forma:

O falante dispõe de relações causais virtuais, garantidas por princípios argumentativos gerais, e as concretiza num discurso específico, a partir de suas intenções comunicativas. São as intenções do falante que selecionam princípios argumentativos e os estruturam sob a forma de relações causais. Nesse sentido, o discurso não é apenas uma reprodução de princípios do senso comum, mas sim um quadro de referência em que esses princípios se

103

localizam, de forma seletiva, a fim de validar as relações causais que nele serão construídas.

Na perspectiva da autora, portanto, é o discurso do falante o quadro de

referência para a criação das relações, cuja explicação não se dá apenas pelas definições

semânticas ou pragmáticas (especificamente em termos de topos discursivo).

De fato, para interpretar os tipos de relações na articulação tópica, foi

preciso considerar o contexto de uso, como sugere Paiva (1996), o que demonstra que é

o próprio falante/escritor quem cria uma dada relação entre tópicos, considerando as

direções interpretativas que pretende apontar para o seu interlocutor e as condições

específicas em que o texto é desenvolvido. Assim, essas relações são de natureza

discursiva.

Isso está em conformidade com os princípios teóricos deste trabalho,

segundo o qual as estruturas lingüísticas não significam por si mesmas, mas somente em

uma relação interacional complexa. Assim, as relações textuais só podem ser

discursivamente construídas.

Essas relações são textualmente estabelecidas por diferentes mecanismos

lingüísticos, como apontarei no decorrer desta análise. Neste item, detenho-me nas

relações instauradas por marcadores discursivos, num processo de união, na linearidade

do texto, de segmentos tópicos ou de enunciados que os constituem. O emprego do

marcador apresenta uma demanda interacional, ou seja, o produtor do texto, ao marcar

uma relação discursiva entre tópicos ou enunciados, realiza uma atividade de auxílio do

interlocutor no sentido de levá-lo a perceber a informação de uma forma e não de outra.

104

Na análise do emprego de marcadores discursivos como mecanismo de

articulação tópica, segui os seguintes passos: identifiquei os marcadores que atuam nos

processos de seqüenciação, retomada ou mudança, e os tipos de relações entre tópicos e

enunciados que eles estabelecem. Depois destaquei os mais recorrentes segundo o

processo e o tipo de relação. Esse procedimento me possibilitou depreender e descrever

as funções textuais-interativas dos marcadores discursivos na articulação tópica.

4.2.1.1. O emprego de marcadores na seqüenciação tópica

Enquanto seqüenciadores, os marcadores exercem a função textual de

integrar tópicos e enunciados dispostos de forma contígua na linearidade do texto e

orientar a atenção do ouvinte/leitor para as partes que compõem o texto, tendo em vista

facilitar o acompanhamento do desenrolar da informação. Essas partes podem ser os

eventos de uma narração, as fases de uma descrição ou exposição, ou as etapas de uma

argumentação.

O trecho (02) é um fragmento do segmento 8, da conversação espontânea

D2-30, que recobre o tópico Trabalho da Inf. 1. Nesse segmento, a informante faz uma

descrição da sua atividade profissional. As fases dessa descrição são delimitadas pelos

marcadores então e aí, algumas vezes combinados entre si ou com o e. Esses

marcadores atuam integradamente no movimento textual articulador e no movimento

interacional de guiar a atenção do interlocutor para a organização da informação26.

26 Os vários empregos do “então” e do “aí”, nesse trecho, exercem diferentes funções textuais-interativas. No entanto, estou focalizando apenas os que estão sendo usados para marcar as fases da descrição da atividade profissional da informante, em negrito na transcrição. As outras funções, como a retomada após inserção parentética, serão tratadas, nos item seguintes. Há também alguns usos, no trecho em destaque, que, pela grande reincidência, parecem idiossincráticos.

105

(02) [8 Inf. 1 - BOM então deix/ eu falar agora do meu traBAlho {da minha pra:: Inf. 2 - é acho bom né? Inf. 1 - ...né?... falar um pouquinho Inf. 2 - ((ri))... Inf. 1 - bom... aPESAR da gente ser técnico operacional né? eu e ela a gente... técnico operacional mas desenvolve... eu acho que é só na nomenclatura porque cada qual desenvolve um trabalho {diferente do outro né?... Inf. 2 - ((tosse)) Inf. 1 - enTÃO como eu a minha formação é em HisTÓria... então:: eu busco sempre procuRAR... as FONtes de pesquisa né?... então eu vim:: aqui para o SINE e notei que os::... os pesquisadores que são TOdos econoMIStas... tinha NAda a ver comigo... Inf.2 - pensadores{((riu)) Inf.1- é os pensadores... e incluSIve:: eu costumo dizer que aqui também tem muito é fiLÓsofo e pouco economista né? porque na verDAde a gente desenvolve mais um trabalho de filosofia do que propriamentede Inf.2 - econo{mia Inf.1 - economista... enTÃO... eh:: eu pensei numa maNEIra... de:: suPRIR... as necessiDAdes... DEles... em relação à economia... então::... eu vinha duma:: dum:: dum traBAlho... que era um trabalho de pesquisa... em cima de jornais... né? então relacionado à História e aqui então eu transformei... esse traBAlho... PARA... o lado da:: Economia... economia trabalho emPREgo desemprego... PIB... e:: outras VAriante de economia né?... e então eu leio... por dia aQUI os jornais... O DIÁrio... A Tribuna Inf.2 - Follha... Inf. 1 - O Povo... A Folha... A Gazeta Mercantil e o Jornal do Brasil... então a gente faz... de todo esse jornais... a gente faz uma triAgem... e seleciona... todo esses jornais... então reCORta... aquilo ali é colocado numa FIcha... e aquela ficha... ela é... ela:: é cadastrada... com um NÚmero... e um assunto... então no fiNAL... do MÊS no final dos trinta dias... eh:: eh... a gente junta TOdo esse materiAL... faz uma SEleção desse materiAL... e então publica um boletim... interno... sobre TOdos os assuntos que circularam... Inf.2 – durante o mês Inf.1 – durante aque{le mês Inf.2- EU/tava até vendo ontem chegou né? na minha mesa... Inf.1-é Inf. 2 - aí sai assim... o primeiro foi assim... "URV... eh:: vai muDAR dia tal tal tal" eu digo "valha como chega atrasado" chega atrasado que eu digo logicamente que aquilo a{li Inf.1- é porque a gente FAZ Inf.2- aquilo é um resumo do mês inteiro{né? Inf.1-do mês passado sem{pré o mês anterior Inf.2- ((tosse))é...aí eu achei até engraçado... Inf. 1 - enTÃO agora no fiNAL... aí nós temos as tabelas... então:: são::... são em torno de OIto tabelas... aí tem a cotação... diÁria do dólar... a cotação da URV... a cotação da TR... né?... tem o o:: MerCAdo... eh eh:: as taBElas sobre emPREgo... sobre

106

desemprego... sobre sobre emprego em Fortaleza... emprego no interior... e eh::... sobre desemPREgo nas capiTAIS... nas grandes capitais... Produto Interno Bruto... Produto Interno Bruto do Ceará então tudo isso... eh:: per capta... então todas essas informações que são::... eh:: relacionadas ao trabalho... do trabalhador... seguRANça do trabalho... QUALIDAde do trabalho... TOdo tudo isso a gente...publica nesse boletim mensal... Inf.2((tosse)) Inf. 1 - E O que não é publiCAdo... é passado... PAra... quer dizer é resumido e publicado o que não é... publiCAdo... porque:: Isso a gente FAZ uma média de oitenta a cem artigos por MÊS... e a gente só publica... cinco ou seis porque... se não fica muito extenso... Inf.2 -porque tem que resumir ao má{ximo né? Inf.1- tem que resumir ao máximo... e então o restante... repassado... exatamente para os TÉCnico... que:: elaBOram... os boletins menSAIS... trimestrais semestrais e anuais do SINE... aí então isso AÍ... SERve de emBAsamento... quer dizer NUM É que eles vão publicar o que tem ali mas a leiTUra... daquele conteúdo possibilita uma::... formação de uma BAse... para que seja escrito:: o artigo que ele... /tá pensando né?... a iDÉia... e ÀS vezes ele já tem a iDÉIa... porque ele SAbe... que HOUve... uma... digamos esTÁ haVENdo:: um momento de desemprego na faixa etária entre trinta a quarenta anos... e naquele jorNAL... TEM alguma coisa falando daquilo então o jornal passa a ser o subSÍdio... do ARtigo que ele vai escrever né?... seria mais ou menos isso... (Conversação espontânea, D2-30)

O trecho (03) ilustra a seqüenciação no nível intertópico. O marcador

discursivo “e” é empregado na articulação dos tópicos Novelas, segmento 13, e

Programas infantis, segmento 14. Esse marcador indica a relação seqüencial que ocorre

entre os segmentos e assinala que o subtópico Programas infantis constitui mais uma

fase da exposição sobre o tópico Televisão27.

(03) VEJA – [13 E o que acha das novelas? BUSSUNDA - Eu sou noveleiro desde criança, embora meus pais me proibissem de ver novela. Eles eram do Partido Comunista e eu não podia ver novela porque era coisa “de alienado”. Aí, eu via escondido. Foi minha primeira rebeldia. As marcantes para mim foram O Bem Amado e Saramandaia. Agora estamos numa fase meio baixa das novelas. As do horário das 8 são um ótimo exemplo de que a teledramaturgia brasileira

27 Cf. diagrama 05, anexo C, p. 386.

107

está burocrática. Elas se dividem em dois tipos: com sotaque baiano e sem sotaque baiano. Quando está no ar uma novela sem sotaque, o espectador pode esperar que a próxima vai ter sotaque. E o sotaque baiano é o refúgio dos canastrões. Com o sotaque, até eu ganho o Oscar. VEJA – Como fã de novelas, o que acha das mexicanas apresentadas pelo SBT? BUSSUNDA - A última que acompanhei foi Carrossel, que eu confesso que gostava, achava muito engraçada. Também vi uns pedaços de outra hilariante, em que a mulher usava um tapa-olho combinando com a cor do vestido. Mas nunca mais assisti. É engraçado um dia, no segundo já fica aborrecido. A Globo também concorreu com algumas novelas mexicanas faladas em português - e continua apresentando o gênero. Essa que está no ar no horário das 6, Sonho Meu, é a própria novela mexicana, parece até dublada.] VEJA – [14 E os programas para os jovens são bons? BUSSUNDA - O do Serginho Groissman é o único bom. Para concorrer com ele a Globo inventou o Radical Chic - uma maldade que fizeram com a Maria Paula. O Radical Chic parecia um vestibular para bobos, um Sexolândia para adolescentes, só que no Sexolândia do Faustão pelo menos vai gente famosa. A pobre da Maria Paula lá fazendo papel de Xuxa dos adolescentes. (Entrevista escrita, E-162)

Do movimento textual de seqüenciação, estabelecido por meio de

marcadores discursivos, além da orientação da ordem seqüencial em que os segmentos

tópicos ou seus enunciados são apresentados e desenvolvidos no discurso, indicando a

progressão, emergem outros tipos de relações discursivas. As mais recorrentes na

análise foram as de ressalva, reforço, inferência, conseqüência e acordo.

No trecho (04), da palestra EF-53, na articulação intratópica se instaura uma

relação de ressalva. O assunto abordado pela palestrante é a posição dos lingüistas de

orientação funcionalista acerca da transitividade, tópico Ternière, segmento 11. Em um

conjunto de enunciados, é mostrado que, segundo essa orientação, “a estrutura

lingüística existe em razão da função”. A palestrante compreende que a palavra

“função” tem diferentes acepções. Trata-se de uma informação que pode ou não ser

conhecida pelos seus interlocutores, e por isso ela julga necessário ressalvar de que

108

forma os lingüistas funcionalistas concebem o termo “função”. Essa ressalva é feita no

conjunto de enunciados subseqüente, iniciado pelo marcador “mas”. A relação de

ressalva co-ocorre com o movimento textual articulador, e ambos se instauram no

espaço da interação, já que se estabelecem em função do julgamento que a palestrante

fez sobre a informação pragmática que seus interlocutores possuíam.

(04) [11 posição dos funcionalistas... TerniÈre Halliday e Dick... Simon Dick... TerniÈre..." a estrutura existe em razão da função... e a função serve ao mecanismo da expressão do pensamento"... embora Ternière tenha... eh::... exisTIdo... viVIdo... no AUge do estruturalismo ortodoxo... a posição dele é já é basTANte diferente... do estruturalismo de Hjelmslev... então pra ELE... a a estrutura eXISte em função da razão em si... ah oh... desculpe ((ri)) em razão da função ((falou rindo))... mas... FUNÇÃO pra Ele... não é a mesma coisa que função para o Hjelmslev... para o Hjelmslev função era FORma... né?... então "a função serve ao mecaNISmo de expressão do pensamento"... então... JÁ ele já comeÇOU... a introduzir... BAses seMÂNticas pra uma análise... da sintaxe né?... (...) (Palestra, EF-25)

No exemplo (05), ocorre um caso também de articulação intratópica em que

se estabelece uma relação de reforço. No tópico Solução para superar a dificuldade,

segmento 13, a locutora opina sobre uma maneira de superar a dificuldade de falar em

público e sugere que é preciso buscar sempre “novos caminhos, novos rumos”, dando

um exemplo próprio de como buscar esses novos caminhos. Um conjunto de

enunciados, o que compõe o exemplo, é usado para reforçar outro, o que expressa a

opinião. Essa relação de reforço e exemplificação está integrada à de seqüenciação, nas

quais reside a articulação intratópica, realizada através do marcador discursivo “por

exemplo”. Essa relação não é inerente aos enunciados, ao contrário, é

109

interacionalmente, construída, ou seja, trata-se da maneira como a locutora pretende que

sua interlocutora perceba as informações, nesse contexto.

(05) Inf. 2 - ((risos)) Inf. 1 - sem PARAR né?... mas... eu sinto uma dificuldade sim... a memória não me ajuda muito não mais... as coisas que eu estudei já muitas vezes eu esqueço... mas é isso mesmo] [13 mas a gente vai adiante vai LENdo sempre lendo lendo e procurando... novos:: novos caminhos novos {novos rumos Inf. 2 - NOvos rumos... Inf. 1 - exatamente... Inf. 2 -e { vai encontrar né? Inf. 1 - e É ISSO QUE EU... é isso que eu tenho encontrado... por exemplo na igreja... pra mim graças a Deus... o::... esta Renovação CarisMÁtica... né?... me tem::: dado muitas oportunidades:: e isto é BOM... porque acomodada também como eu sou... EU como certeza... estaria HOJE SÓ em casa... porque não gosto de sair... num gosto de passear num gosto de diversão... então eu estaria em CAsa somente lendo lendo lendo lendo lendo pra meu deleite e pra... e pra ficar com aquilo pra mim somente e num levar mais nada pra ninguém mas assim... mas graças a Deus... eu vou eu fui para esse grupo de oração... onde LÁ... eu faço outros exercícios... por exemplo... falar em público... né?... evangelização evangeliZANdo... numa praça como tem a praça do LiCEU... eu vou... e falo... no iNÍcio eu tinha que escrever Tudo que eu ia dizer... e eu num podia sabe? Tirar a vista daquilo que eu estava... lendo porque... SE EU tirasse... eu num sabia mais o que... dizer... ficava parada... hoje não graças a Deus{ eu:: me] (Conversação espontânea, D2-39)

O fragmento destacado mais a seguir, da entrevista falada F-037, ilustra uma

ocorrência de seqüenciação intertópica em que se instaura uma relação de inferência. O

tópico Dificuldades da língua, segmento 4, representa uma inferência conclusiva feita

pela entrevistadora a partir do tópico Concepção de língua, segmento 3. A idéia

conclusiva de que “a língua portuguesa não é difícil” é depreendida, por um dos

locutores, tanto com base em elementos do segmento anterior como em conhecimentos

partilhados. No segmento 3, a entrevistada se refere a heterogeneidade e mudança

lingüística e afirma que o aluno “já é um falante e um usuário da língua portuguesa...”.

110

Esses elementos constituem referências textuais nas quais se ancoram a pergunta da

entrevistadora. Mas, a pergunta está calcada também no senso comum de que o

português é difícil, noção que se firmou a partir do ensino tradicional dessa língua, com

tantas regras e exceções. Os subtópicos Concepção de língua e Dificuldades da língua

estão, portanto, vinculados seqüencialmente na linearidade do texto e relacionados pela

inferência. Essa relação é também discursivamente construída, ou seja, é na interação, a

partir do que os locutores dizem ou dos conhecimentos pressupostos entre eles, em que

ela se instaura.

(06) [3 a língua portuguesa não é esse fenômeno éh:: homogêneo... estático... que é vinculado pela gramática normativa... e pela/ infelizmente... pela maioria dos professores de língua portuguesa mas observamos que a língua evolui... a língua muda... e a escola precisa mudar e evoluir pra trazer o aluno que já é um falante e um usuário da língua portuguesa... a se envolver com o estudo da língua portuguesa] [4 F1 o português então não é uma língua difícil? F2 ...olha se você parte do princípio... de que a língua portuguesa não é só regras gramaticais não se você se apaixona pela língua que você... já domina que você já fala ao chegar na escola (...) (Entrevista falada, F-037)

Em (07), ocorre um caso de uma articulação no nível intratópico em que o

marcador “então” é empregado para destacar o valor consecutivo de uma informação. O

tópico em questão é Diferença entre legislativo e executivo, segmento 10. Os

informantes discorrem sobre uma possível administração de Lula, na presidência da

República, realizando uma série de avaliações sobre o próprio Lula (“ele pode fazer

muita COIsa”, “essa força de vontade que ele tem perseverança”), sobre sua situação

eleitoral (“tá caindo caindo mesmo /tá despenCANdo”) e sobre o que ele terá que fazer

caso assuma a presidência da República (“ele vai ter que nomear DEZ mil pessoas”). Os

111

enunciados que constituem essa última avaliação servem de base para que o conjunto de

enunciados seguinte seja tomado como uma conseqüência, ou seja, como a

administração pública federal depende de muitas pessoas, se os dirigentes nomeados

não forem de confiança do presidente, essa administração será um fiasco. Essa

conseqüência não é dada como certa, mas como uma hipótese, que emerge das inter-

relações que os locutores estabelecem entre as informações, nesse evento comunicativo

específico. Trata-se, portanto, de uma construção discursiva.

O exemplo mostra, assim, que a articulação tópica está assentada nessa

relação de conseqüência, congregada à de seqüencialidade, e materializada, na

superfície textual, através do emprego do marcador discursivo “então”.

(07) Inf. 2 - quando tu chega assim Ai S. fui p/ o Besame mucho num sei que OpÇÃO na praia de Iracema pra mim os barzinho da praia de Iracema é freqüentado por petista... tem nada a ver uma coisa com a outra mas petista pra mim... aquele pessoal gaLE::ra /tá entendendo aqueles caras assim barBU::do... pessoal que quer inovar tudo num inova NAda -- ah minha Nossa Senhora /tá gra{vando aí-- ((riu)) Inf. 1 - sei ((falou rindo)) Inf. 2 - sabe? cheiro de coisa ((riu))... não eles podem até ter boa vontade só que:: /tá entendendo?... num vai...] [10 como o Lula... o Lula /tava hoje dizendo pa/ E. "E. já /tô pa/ votar no Lula"... num é por outra coisa... eu sei até que:: ele pode fazer muita COIsa... /tá entendendo? muita coisa mesmo... MAS... é a é aque/ essa força de vontade que ele tem perseverança ele... vai SAbe?... essa caravana da cidadania e tudo... quer dizer eu acho que tem como ele chegar de repente só que ele /tá caindo né?... Inf. 1 – é Inf. 2 - /tá caindo /tá caindo caindo mesmo /tá despenCANdo /tá nem caindo lá {/tá despencando Inf. 1 - /tava vendo um dia desse... que o o:: presidente da República tem DEZ mil cargo de confiança... Inf. 2 - eu vi Inf. 1 - quer dizer na HOra que ele assumir ele vai ter que nomear DEZ mil pessoas... enTÃO se você num tiver... eu num digo NEM:: eh se você num tiver nos seus quadros né?... pessoas... capaciTAdas preparadas vai ser um {fiasco Inf. 2 - pra assumir né? {assessores

112

Inf. 1 - pra assumir Inf. 2 - porque num é só brincadeira política num é essa brincadeira (...) (Conversação espontânea, D2-30)

Uma outra relação que também ocorre no processo de seqüenciação

tópica estabelecida por um marcador discursivo é a de acatamento, acordo em relação à

informação que está sendo proferida. Nos primeiros enunciados do tópico Influências,

segmento 3, da aula EF-56, destacado a seguir, a professora mostra que a poesia Morte e

Vida Severina é um “auto medieval... transPOSto para o Nordeste brasileiro....”. No

conjunto de enunciados iniciados pelo marcador “então”, ocorre uma conclusão

resumidora, através da qual a professora assinala também sua concordância em relação

à informação, ou seja, a locutora reativa a idéia de que a poesia Morte e Vida Severia é

um auto medieval e ativa sua concordância com essa idéia. Esse fato pode ser

comprovado pelo emprego do advérbio epistêmico “realmente”, que escopa os

enunciados seguintes a ele, revelando a avaliação do teor de verdade que a locutora faz

do conteúdo proposicional desses enunciados28.

Em estudo específico sobre as funções do marcador discursivo “então”,

Risso (1996, p. 438) destaca que o emprego desse marcador no fecho geral de um tópico

está também associado à reiteração de um ponto de vista já manifestado em momentos

anteriores. “O efeito é o de uma conclusão fortemente respaldada em todo o

pronunciamento anterior, que lhe serve de suporte”. Relacionando essa questão com o

que ocorre no exemplo (08), percebi que, no estabelecimento de uma relação de

acatamento, pode ocorrer também um auto-posicionamento do locutor em relação ao 28 Castilho e Castinho (1992) destacam essa função epistêmica dos advérbios.

113

teor de verdade da informação. Ao se posicionar em relação à certeza da informação,

reativando-a de forma resumida, a professora também sinaliza para os alunos

interlocutores um grau maior de importância que eles devem dar a essa informação. É

nesse sentido que o acordo e o auto-posicionamento constituem fatos interacionais.

(08)

[3 é o caso de Morte e Vida Severina... "um AUto medie-val... auto medieval... transPOSto para o Nordeste brasileiro... MOStra bem a preocupação de João CaBRAL... em não ficar dis-TANte das formas RIcas... e tradicionais da poeSIa... mas NUNca as repetindo nunca as imiTANdo... e faz exatamente aqui... a estili-zação do proCEsso... como OUtros poetas já haviam FEIto... desde a época madieVAL... a nossos dias... é sabido que o AUto tem um sentido religioso... sem falar no seu arraigado sentido Étido... no caso de João Cabral ele nada mais quis mostrar... do que situar no Nordeste a crucificaÇÃO... do retiRANte e do trabalhador do EIto... em MORte e Vida SeveRIna... as preocupações de João Cabral vão além da estrutura meLÓdica... ou lingüística... quando situa como nenhum outro poeta brasileiro... o HOmem e a TErra... o homem sem POUso no Nordeste... que é o HOmem que se sente PRÓximo... à MORte... e proCUra" eh "um itinerário... a lingua-gem é ainda medieval daí o paralelismo com o mundo nordesTIno... onde se acenTUa/ a GLÓria... e o heroÍSmo do anti-herói nordes-tino"... então realmente... MORte e Vida Severina... AUto de Natal pernambucano AUto... é exatamente uMA::... uma eh:: o teAtro medieVAL... nós encontramos... eh algumas esPÉcie/ do teatro medieVAL... que é exatamente o AUto... e as farsas né?... a gente sabe que:: em PortuGAL foi Gil Vicente... o criaDOR do teatro popular... MAS existia é:: é criando sempre seus AUtos... né?... autos da Trilogia das BARcas... e algumas FARsas né?... foi Gil Vicente que ao... foi o fundador do teatro potuguês... né?... NA:: EsPAnha Juan del Cina... seria o grande MEStre do teatro espa-NHOL... e exatamente AUto foi uma espécie de eh do teAtro medieVAL... e Ela exatamente ela tem ela na sua origem... eh::... o teatro popular... é:: os AUtos eles têm:: uma origem religiosa... né?... o teatro popular antes de ser... eh:: proFAno... ele foi religi-oso... liGAdo à vida dos santos à vida de Cristo né?... daí porque os autos... muito voltados para a:: vida... eh dos SANtos... e a própria vida de Cristo né?...

(Aula, EF-56)

Ainda no processo de seqüenciação, um marcador discursivo pode ser

empregado no encerramento de um quadro tópico ou de um segmento em particular,

estabelecendo entre os subtópicos ou enunciados a relação de conclusão finalizadora.

114

Em (09), por exemplo, o último conjunto de enunciados é articulado aos anteriores

através do marcador “então”. Trata-se do tópico Os dois aspectos de João Cabral de

Melo Neto, segmento 1, da aula EF-53. No movimento textual de articulação

intratópica, a locutora orienta seus interlocutores para o fato de que esse conjunto de

enunciados constitui uma paráfrase resumitiva de todo o desenvolvimento do tópico, o

qual será encerrado nesse ponto do texto. Essa sinalização do encerramento do tópico

apresenta também o propósito interacional de ratificar a informação, sobressaindo-se aí

uma preocupação didática, já que o gênero em questão é uma aula.

(09)

[1 Inf. bom na aula paSSAda nós... eh:: vimos um TEXto de João CaBRAL... que é:: exatamente o Cão Sem Plumas... né?... e que ESte TEXto que esse texto ele... e/ pode ser enQUADRAdo dentro da feição sociAL... realmente João CaBRAL e::le apresenta dois PÓlos... da sua atitude como poeta... duas eh:: duas feições que são distintas... mas que revelam o mesmo poeta... João Cabral poeta a::ltamente consciENte de seu papel de poeta... e do papel da poe-sia HOje né?... enTÃO eh:: como diz Assis Brasil que aqui:: eu vendo aqui a... A Nova... A Nova Literatura... Brasileira a poe-sia... o Assis Brasil diz que... João CaBRAL apresenta dois PÓ-LOS... quer dizer da sua a ah:: poesia de João Cabral... um que é essencialmente esTÉtico... e OUtro É::... de sentido social... como vocês viram aquelas... poesias anteriOres como é o caso da a poe-sia A MEsa... e a:: Psicologia da ComposiÇÃO... (...)

aquele homem não tem como retornar... porque... LÁ naquele serinGAL eXISte... uma venda... naquela venda... ele compra sapatos ROUpas comidas remédios... e ele jamais vê a cor do dinheiro porque ele recebe uma tampa de lata amassada... que é o pagamento do seu trabalho... quer dizer então ele SEMpre está escraviZAdo à venda porque quando ele termina aquela jornada de traBAlho... que ele quer vol-tar pra sua terra aí chega o dono da venda diz "olha... o senhor não POde porque o senhor comprou além da medida... o senhor está devendo ao patrão... /cê vai ter que trabalhar pra pagar"... e quando ele faz hora extra quando ele já ele vai fazer paGAR o patrão... e que ele... aparentemente o patrão diz "/tá certo tudo pago você pode saIR"... ele é TOcaiado e MORto lá adiante... ante/ de pegar o navio-gaiOla ele é tocaiado e MORto pra que ele não vá contar lá fora o que se PAssa... o que se PAssa naquela naquela... naquela fazenda né?... então Essa é a realiDAde do Cão Sem Plumas... e Essa mesma realiDAde... vai vai ser estamPAda né?... em Morte e Vida Severina... novamente aquela crítica social contunDENte... ela é uma poesia crítica... de preocupação Essencialmente social com o Nordeste então realmente... ele::... ele... como diz o Assis

115

Brasil... o Assis Brasil ele nos mostra... João CaBRAL... "os dois pólos da atitude cabralina... o essencialmente estético... e o de sen-tido sociAL são claros e definidos...] (Aula, EF-53)

No que diz respeito aos marcadores empregados no processo de

seqüencialização, a análise desses exemplos já mostra que um dos mais recorrentes é o

“então”. Depois desse vêm o “aí” e o “e”. Esses marcadores têm em comum a

propriedade retroativo-propulsora, ou seja, apontam para trás para estabelecer a

sucessão entre tópicos ou enunciados.

Essa particularidade é destaca por Risso (1996) na análise dos empregos do

“então”. Segundo a autora, esse marcador se define por uma constante ancoragem em

instância preliminar do discurso, viabilizando a continuidade desde em consonância

com uma seqüência informacional já posta. Essa ancoragem é responsável pelo efeito de

previsibilidade obtido pela sua utilização.

(a ancoragem no discurso preliminar) cria, com respeito à informação a ser introduzida por então, um efeito de previsibilidade: a expectativa que automaticamente aparece, a partir do uso desse articulador, é de algo novo a ser posto no discurso, em continuidade ou consonância com o que já é dado, sempre na mesma linha sucedânea de argumentação antes delineada (RISSO, 1996, p. 431).

Os marcadores retroativo-propulsores, ao estabelecerem a articulação

tópica, no processo de seqüenciação, criam um contexto de linearidade informativa no

discurso. O exemplo (03), comentado anteriormente, pode ser tomado novamente para

ilustrar essa questão. O efeito retroativo do emprego do marcador “e” torna, do ponto de

vista do desenvolvimento tópico, previsível a entrada do tópico Programas para jovens,

dada a sua continuidade e consonância com o tópico Novelas.

116

Alguns outros marcadores, que atuam na articulação tópica, no processo de

seqüenciação, são mais propulsores, ou seja, possuem um traço mais acentuadamente

catafórico. Os mais recorrentes na análise foram o “mas” e o “agora”. A natureza

essencialmente prospectiva desses marcadores gera a expectativa de introdução de um

novo tópico ou enunciado no discurso, mas não em consonância com os anteriores, e,

por isso, menos previsível. É o caso, por exemplo, do marcador “mas”, no trecho (04),

também já comentado. O conjunto de enunciados desencadeado a partir do emprego

desse marcador faz avançar o discurso, mas não há uma remissão anafórica aos

enunciados anteriores pelo marcador. Dessa forma, o discurso avança em contraste com

os enunciados anteriores, ou seja, a linha sucedânea de exposição é oposta à delineada

no conjunto de enunciados anterior.

4.2.1.2. O emprego de marcadores na retomada após inserção parentética

A retomada do tópico após a quebra da linearidade discursiva por uma

inserção do tipo parentética pode ser efetuada por um marcador discursivo. Como as

inserções ocorrem sempre no interior de um segmento tópico, esse processo de atuação

dos marcadores é próprio do nível intratópico. Essa atuação está relacionada à classe e à

função dos parênteses.

Segundo Jubran (1999), as inserções parentéticas podem ser agrupadas em

quadro classes, conforme estejam relacionadas à elaboração do tópico, ao locutor, ao

interlocutor ou ao ato comunicativo em si. Em cada uma dessas classes, a autora

identifica diferentes funções. Por exemplo, um parêntese relacionado à elaboração do

tópico pode ser utilizado na focalização do conteúdo, através de exemplo,

esclarecimento, ressalva; na formulação lingüística do tópico, num processo de

117

explicitação do significado de palavras, de busca de denominação; e na construção

textual, através da marcação de subdivisões de um tópico.

Quanto mais os parênteses se afastam do enfoque da elaboração tópica mais

o processo de retomada é feito através de um marcador. Ao darem relevo à elaboração

do tópico (principalmente quando focalizam o conteúdo), os parênteses atenuam a

propriedade de desvio tópico, e, dessa forma, acaba se diluindo a idéia de retomada.

Como o desvio é pouco saliente, a possibilidade de haver uma marca textual para a

retomada é também menor.

Os casos de parentização englobados neste tipo estão na situação-limite de reconhecimento de um segmento textual como parentético ou não, porque atenuam a propriedade de desvio tópico particularizadora de parentização, na medida em que, enfocando o conteúdo tópico, mantêm algum traço de conexão com ele (JUBRAN, 1999, p. 20).

No exemplo destacado a seguir, o trecho em itálico constitui um parêntese

que focaliza o conteúdo através de um esclarecimento. O foco é o próprio tópico e,

como o desvio é pouco perceptível, o movimento de retomada não apresenta nenhuma

marca textual. Já no exemplo (11), existe um parêntese, também em itálico, relacionado

ao ato de comunicação em si, ou seja, um desvio que provoca “uma mudança de planos

de centração sobre o tópico discursivo para o ato de interagir verbalmente” (JUBRAN,

1999, p. 35). No caso, uma locutora questiona a predisposição da outra para a conversa,

a partir da avaliação de que ela está tendo pouca participação no diálogo e pouco

envolvimento com os assuntos abordados.

A locutora salienta, por meio do parêntese, que essa predisposição e

envolvimento são contingências necessárias para a existência do ato de comunicação.

Com o parêntese, o tópico Política, iniciado no segmento 34, com o subtópico Resgate

118

da cidadania, é notoriamente suspenso. No segmento 35, começa a ser desenvolvido o

subtópico Conscientização política dos alunos de Inf.1, que põe novamente em

evidência o tópico Política29. O movimento de retomada é sinalizado pelo marcador

“então”.

(10)

[3 A maioria das legislações antitruste no mundo se fundamentou no Sherman Act, de 1890. A tradição democrática americana alimentava aversão a quaisquer grupos que parecessem ter posição dominante no mercado. Era a época dos “robber barons”, que mais tarde Theodore Roosevelt, num arroubo populista, chamaria de “malfeitores de grande fortuna”. Era uma visão estática, que não compreendia como a concorrência se desenrola no tempo e é afetada pelas mudanças tecnológicas, pela variação nas preferências dos consumidores, e pela sempre cambiante oferta de importações competitivas.

Desde então o mundo mudou. Com a globalização dos mercados e a revolução tecnológica, novos conceitos surgiram em lugar dos tradicionais “grau de concentração” ou “domínio do mercado”. Surgiram conceitos mais sofisticados, como a “elasticidade de substituição” e “contestabilidade”. Como no ditado popular, “tamanho não é documento” (exceto no raríssimo caso de produtos insubstituíveis). Qualquer açambarcador do mercado local pode ser “contestado” pela abertura a importações. (...)

(Artigo de opinião, E-149)

(11)

Inf. 1 - é porque não comprava mas o pai paga... o feijão que você compra... ele tem também... imposto... você paga... então você num num... acabar com a iDÉia de que... o goVERno... o governo dá o governo num dá nada... nós... temos diREItos... a tudo isso nós temos direito adquiRIdo... por sermos cidadãos... né? a nossa cidadania consiste Nisso... PRImordialmente... nisto... depois enTÃO... nós temos a obrigação de... votar::... com esses... esses desMANdos que s/ que existe AÍ... nós Temos o direito e a obrigaÇÃO...DE... repudiAR... de:::... eh protestar contra isso... e nós ficamos calado... então por QUE isso?... porQUE o brasileiro aINda não se conscientizou de que é brasileiro e de que este país é dele... ele PENsa... por causa... também isso... mas também eu tô falando demais né? D.? e tu nem estás falando né?--... Inf.2- é {mas não pode deixar... eu trabalho a Português Inf.1 ((risos)) Inf.2- ...num é que fala mais ou menos {((risos))... ah ah Inf.1- ((risos)) ... pois é ...] [35 então eu... eu acho assim eu vejo eu analiso e eu falava muito às vezes eu ia falar uhn... ensinar Português para os meus alunos né?... e eu... fazia uma digressão eu saía do da:: do Português e passava pra política... U::I mas

29 Cf. diagrama 16, anexo C, p. 401.

119

os alunos gosta::vam... então os da oitava série como adorava... eh:: enTÃO uma vez um chegou pra mim e disse assim "olha... professora... EU... votei no Lula... por causa da senhora" eu digo "pelo amor de Deus num diga isso "eu nunca disse {a você que fala/ ((falou rindo)) (Conversação espontânea, D2-39)

No texto falado, junto ao movimento textual de articulação tópica que

permite que um dos locutores identifique e ponha novamente em evidência, para fazer

progredir, o tópico suspenso, ocorre o movimento interacional de sinalização do fato de

que o tópico desperta interesse em um dos locutores, o qual se mostra disposto a

desenvolvê-lo e não a abandoná-lo.

Esse movimento que um dos locutores da conversa faz para evitar a fuga

do tópico, que poderia ser desencadeada com a inserção do parêntese, é uma evidência

também da intenção desse locutor de retomar ou manter sua posição de falante, na

relação de poder que se instaura durante a conversação. A retomada de tópico após

inserção parentética por meio de um marcador discursivo está vinculada também à

definição de papéis discursivos dos locutores na situação comunicativa: o de falante ou

o de ouvinte.

Conforme Brait (1999, p. 207), há uma norma conversacional segundo a

qual, na conversação, cada um dos participantes deve falar de cada vez.

Esse fato que visa a disciplinar a atividade conversacional, funcionando como um mecanismo central da organização do texto, demonstra, por meio de uma série de aspectos, as estruturas de poder que governam a conversação: quem fala primeiro, tendo esse direito previamente estabelecido ou não, as falas simultâneas ou sobrepostas, os silêncios, as hesitações, o assalto ao turno do outro etc.

É no movimento de tomada e manutenção de turno, por exemplo, em que é

possível perceber a disputa pela palavra, o jogo de poder que se estabelece em uma

120

interação verbal. A observação da organização de uma conversação em turnos

demonstra que um dos locutores pode falar mais que o outro, pode iniciar ou propor o

aspecto do tópico etc. Assim, quando um dos locutores retoma um tópico suspenso,

articulando-o por meio de um marcador, ele pode assumir também a direção da

conversação, se não a tem, ou reforçar a sua posição de falante, colocando o outro na de

ouvinte.

O trecho destacado mais adiante apresenta parte do tópico Novenas de natal,

segmento 5, e o tópico paralelo Aniversário do pai, segmento 6, da conversação

espontânea D2-39. Nesses segmentos ocorrem cinco inserções parentéticas30. A

primeira focaliza o ato comunicativo em si. A documentadora evita que um fato

externo, voz de terceiro, perturbe o contato entre os locutores. Trata-se de um desvio,

que, apesar de rápido, se afasta muito do tópico, e a retomada é feita pela reiteração da

sentença “ela está fazendo”, projetada no início do segmento. A segunda se relaciona ao

processo de formulação lingüística do tópico. A locutora faz um comentário acerca da

inadequação do emprego de um termo. O grau de desvio é menor, e a retomada não é

marcada. As inserções III, IV e V representam uma introjeção da locutora no próprio

discurso para expressar opiniões, comentários acerca do que está dizendo. Considerando

os graus de desvio tópico das classes de parênteses, nessas três inserções, há um grande

afastamento do tópico e a retomada é sinalizada pelos marcadores “e”, “e... então” e

“pois”, respectivamente.

Nas inserções III e IV, quando a informante emprega um marcador

discursivo no processo de retomada, ocorre apenas a orientação que ela dá a sua

30 Para facilitar a exposição, as inserções estão identificadas por números romanos.

121

interlocutora para a continuação do tópico. Já na retomada após a inserção (V), além da

orientação para a continuação do tópico, a informante 1 evita que a informante 2 assuma

a posição de detentora da fala. Como ela desenvolveu o tópico paralelo, no segmento 6,

e, retomou o tópico Novenas de natal, que havia sido suspenso, poderia assumir a

direção da conversa. No próprio parêntese (V), desenvolvido pela informante 1, a

informante 2 também dá sinais de concordância, demonstrando também interesse pelo

comentário feito. Mas a informante 1 se mantém com o turno e impede que o tópico

suspenso seja abandonado, insistindo na sua retomada. Há, inclusive, uma outra

inserção, “mas num é o caso”, que reforça a postura da informante 1 em relação à

natureza secundária da informação parentética e seu interesse em voltar ao tópico e

manter sua posição de detentora da fala. Assim, o que distingue a retomada do tópico

após a inserção V das retomadas após as inserções III e IV é o movimento que uma das

locutoras realiza para se manter na posição de falante.

(12)

Inf. 1 – bem aos paroquianos] [5 mas engraçado eu estava hoje... porque a E. /Tá fazendo aí no Morro do Ouro... ela está fazendo uma:: ((ruído)) Doc. - (I) pode conti{nuar ((voz de terceiro)) Inf. 1 - ela está fazendo aí a noVEna... do Natal né::? que agora é a preparação que é o adVENTO... Inf. 2 - o /P. até me deu uma revista pra eu ler... e ver:: mais ou menos... como seria o que a gente poderia fazer essa novena depois então nós temo que conversar sobre isso... Inf. 1 - {certo Inf. 2 - tu já viste o livro?... Inf. 1 - não:: o livro não { eu vi a:: o folheto da F. que ela Inf. 2 - viu não Inf. 1 - tem:: inclusive hoje nós estivemos escolhendo umas músicas... pra que ela::... va::/ ela hoje à tarde vai {ontem eu fui com ela... Inf. 2 - ((pigarreou)) Inf. 1 - mas infelizmente::... ou felizmente (II) num há num há o infelizmente não... eu num POsso ir né? por causa da entrevista eu num posso acompanhá-la mas... com cerTEza... a::lgumas pessoas lá da igreja vão acompanhá-la... E:: então também tenho

122

um aMIgo... aquele rapaz que::... vem aqui... eh:: me ensinar a a utilizar aquela MÁ{quina eletrônica... e que Inf. 2 - ah... ah Inf. 1 – (III) eu já estou sabendo... pelo meno/ já... copiei VÁrios textos na máquina está:: eu estou muito bem... na máquina... E:: ele me pediu... que queria para a::... pra família Dele... uma alguma dramatização::... algum trabalho pra eles fazerem mais um Natal só de de... de papai Noel uma um... (IV) eu achei tão interessante isso viu? Inf. 2 - {uhn uhn Inf. 1 - é um rapaz:: que::... num faz parte de movimento de IGREja... e /tá intereSSAdo em fazer na casa Dele um Natal diferente... e pediu... não uma espécie de jogral... mas uma encenação... e eu então encontrei aqui nessa revista... e copiei pra ele... muito interessante... e poderíamos também lá na nossa casa lá:: na casa na tua casa... faZERmos uma adaptaÇÃO... Inf. 2 - a R.M. tem uma tão interessante... Inf. 1 - é? Inf. 2 - tem... ] [6 {aliás nós estava/ ela estava pensando Inf. 1 - é Inf. 2 - organizar pra fazer no DIA... do aniversário do papai mas eu tenho impressão que num:: Inf. 1 - num vai{dar Inf. 2 - não vai num vai... primeiro porque nós num vamo ter tempo de:: copiar aquilo tudim pa/ distribuir com todos os sobri::nhos né?... Inf. 1 - só essa Inf. 2 - pra traZER:: então depois aí tem umas MÚsicas que EU não conheço... quer dizer é aquela é a tal história você sabe... mas num LEMbra aí fica enganchado aquele negócio que vo/ que::... na hora h vaia dar...{num vai dá certo Inf. 1 - errado Inf. 2 - vai dá errado mesmo ((riu))... aí é melhor num fazer...((falou rindo))] mas é bem bonitinho eu tinha umas... também umas representaçõezinhas também muito bonitinhas... que a E. me deu... se eu procurar eu encontro... são bem bonitim mesmo assim pra criANça pra criança mesmo fazer... essa... tem até uma:: que tem uma enTRAda as crianças bo/ eh o menino Jesus no meio da SAla aí vem as criança ((interrupção)) nela fica no escuro aí as crianças entram com a VEla... aí cantam aquele... Inf. 1 - os cânticos próprios do Na{tal né? Inf. 2 - próprio do Natal é... Inf. 1 - é isso é muito interessante pelo menos { vai dar uma conotação Inf. 2 - ((pigarreou)) Inf. 1 - (V) ... a/ aliás num é nem uma conotação... eh:: o sentido REAL... né?... Inf. 2 - eh:: Inf. 1 - porque:: eh::... o sentido... conotativo é um:: sentido figurado né?... e nós... podemos até lembrar ((fala rindo)){isso de português né?... Inf. 2 - ah é Inf. 1 - a palavra tem dois... valores eh conotativo e denotativo... mas num é o caso... pois olha tem aqui olha dezembro Natal é o fim do ano essa aqui é MUIto interessante... VEM senhor Jesus... e são POU::cos olha é pouco olha como é pequeno... viu?... ((tosse

123

distante de terceiro)) é muito pequeno dá pra gente fazer:: rapidamente::eu poderia copiar... aqui na... na máquina... copiar na máquina e e... e distribuir (...) (Conversação espontânea, D2-39)

Com o movimento textual de retomada de tópico após inserção parentética

pode ocorrer ainda o movimento de instauração de outras relações discursivas. Isso

pode ser observado também no exemplo (12). O marcador “e”, combinado ao “então”,

instaura entre os enunciados cindidos pela inserção (IV) uma relação de causa-

conseqüência. O que é dito no conjunto de enunciados que sucedem a inserção é posto

como resultado do que é afirmado no conjunto de enunciados que antecedem a inserção.

Entre os enunciados cindidos pelo parêntese (V) se estabelece uma relação de

explicação: o conjunto de enunciados posterior ao parêntese é posto para justificar o que

está sendo dito no conjunto de enunciados anterior. Em ambos os casos, as relações não

são inerentes aos enunciados. São formas de perceber e relacionar informações dos

locutores, na própria conversação, daí serem construídas no próprio discurso.

Os marcadores mais recorrentes em contexto de retomada tópica após

inserção parentética são o “então”, o “aí” e o “e”, os mesmos retroativo-propulsores

empregados em contexto de seqüenciação. Não são empregados marcadores

essencialmente propulsores, porque esses não realizam movimento anafórico, e a

retomada pressupõe necessariamente a ancoragem numa instância anterior do discurso.

O conjunto de enunciados retomado após o parêntese faz avançar o discurso em

continuidade e consonância com o conjunto de enunciados anteriores ao parêntese,

porque o retoma, anaforicamente.

124

Cabe aqui uma discussão entre esses resultados e os resultados de análises

anteriores sobre o emprego de marcadores discursivos na retomada após inserção tópica

e parentética.

Em estudo sobre o “agora”, Risso (1993, p. 51) destaca a função de

retomador de tópico após inserção tópica como um aspecto desse marcador: “o seu

funcionamento no reatamento de nexos com uma informação central, interrompida em

decorrência da inserção de informações paralelas não-atinentes a um dado tópico”. No

entanto, essa mesma autora aponta a natureza essencialmente prospectiva do “agora”:

“tem um foco catafórico que direciona a atenção sobre aquilo que o falante está para

dizer, ainda que seu pronunciamento tenha como referente a informação dada em ponto

anterior da fala” (RISSO, 1993, p. 39)31. Dessa forma, a característica prospectiva desse

marcador é incompatível com a noção de retomada. Nos casos analisados pela autora, o

“agora” atua na abertura de um novo quadro tópico ou de subtópico no interior de um

mesmo quadro tópico, e não no retorno. O recurso responsável pela retomada é “a

repetição de informações dadas anteriormente” (1993, p. 52), como assinala a própria

autora. Ainda segundo Risso (1996), o reatamento de um tópico suspenso por uma

inserção tópica pode ser definido também pelo “então”. No corpus que analisei não

houve casos nem de “então” nem de “agora” nessa função.

Os elos de segmentos tópicos suspensos por partes ou segmentos tópicos

completos não são reatados por intermédio de um marcador, mas por outros

mecanismos, como o emprego de formas referencias ou de formulações

metadiscursivas. Essa constatação me fez interpretar que um tópico suspenso por outro

31 Essa análise é ratificada em Risso (1998).

125

tópico, na linearidade discursiva, não serve de ancoragem para um marcador. A direção

anafórica dos marcadores retroativos é uma porção discursiva imediatamente contígua

ou um pouco mais distante, como é o caso de um segmento interpolado por uma

inserção parentética, mas que deve estar no interior de um mesmo segmento tópico. A

remissão a um tópico mais distante envolve um grau maior de complexidade, que um

marcador não contempla, daí, nesse contexto serem empregados outros mecanismos,

com maior capacidade de retroação32.

Minha análise aponta, portanto, para uma compreensão diferente desse

aspecto do emprego dos marcadores discursivos. Na retomada tópica após inserção de

parêntese ocorre retroação através do próprio marcador, daí a atuação de marcadores

retroativos, como o “então”, o “aí” e o “e”. Já na retomada tópica após inserção tópica,

não atuam nem marcadores retroativos, porque não há porção discursiva para a qual

possam retroagir, nem essencialmente propulsores, como o “agora” e o “mas”, porque

não têm a característica de retomador.

4.2.1.3. O emprego de marcadores na retomada de discurso após interrupção

situacional

A continuação de um evento comunicativo face a face, após uma

interrupção provocada pela incidência de um fato situacional, é um outro processo em

que atuam os marcadores discursivos como mecanismos de articulação tópica. Nesse

caso, não se trata de uma retomada após inserção tópica ou parentética, mas de

retomada do próprio discurso interrompido, que pode continuar com o tópico que vinha

32 É o que ocorre com o emprego de formas referenciais lexicais e formulações metadiscursivas, conforme irei descrever nos itens seguintes.

126

sendo desenvolvido ou com o desenvolvimento de outro, entre os quais o marcador é

empregado para estabelecer a articulação.

Um exemplo disso pode ser notado em outra passagem da conversação

espontânea D2-39. O trecho, que transcrevo a seguir, apresenta os segmentos 29 e 30,

os quais recobrem, respectivamente os tópicos Exploração do trabalho do pobre pelo

rico e Causas da violência. Durante o desenvolvimento do primeiro tópico, a

conversação é interrompida pelo toque de um telefone33. Quando a conversação é

retomada, o tópico que estava sendo desenvolvido é abandonado e a locutora passa a

desenvolver outro. Com os marcadores discursivos “pois é” e “então”, a locutora retorna

ao discurso e realiza um movimento textual de articulação entre os tópicos Exploração

do trabalho do pobre pelo rico e Causas da violência.

Nesse retorno ao discurso interrompido, ocorre uma mudança em relação ao

tópico que vinha sendo desenvolvido antes da interrupção (Exploração do trabalho do

pobre pelo rico), mas também uma retomada, já que a locutora volta ao tópico

Violência, iniciado em um momento anterior da conversa. Essas relações textuais são

também interacionais, pois, ao assinalar o reinício do ato comunicativo, a locutora, além

de estabelecer a articulação tópica, redefine seu papel de falante, assumindo a direção

do diálogo.

(13)

[29 Inf. 2 - é a história você ver os pobres trabalham para os Ricos dão a ele a:: a eles as riqueza que eles têm né? e o que é que eles fazem com os os operário dele? Com os trabalhador dele? num dão nada...

33 Na transcrição, consta a informação de que o gravador é desligado, o que sugere que a conversação realmente foi interrompida.

127

Inf. 1 - e{xatamente Inf. 2 - num dão nada... se:: se pego querem aumentar um:: salário mínimo então aquele aumento tem que sair na costa daquele p/ da dos OUtros que num têm nada a ver{lá com a riqueza deles... são incapazes são Inf. 1 - pois é s::/ são REPAssados Inf. 2 - incapazes... de... se conformarem com ganharem um pouco menos... né?... Inf. 1 - pois é Inf. 2 - num se con{forma então pronto Inf. 1 - e/... então eu fico pensando... o o engenheiro ah então eu fui até::a::a::a quitanda lá pra comprar umas laranjas e umas... verdura fruta aqui em casa... E:: o rapaz /tava me dizendo... a senhora veja..."quem mais trabalha AÍ são esses operários... porque passam o dia TOdim neste sol... desde sete horas da manhã aTÉ à noite... até cinco seis horas... são Eles ali... eh:: tirando aquela areia é verdade que tem aquele:: aquela pá mecânica... mas eles estão LÁ empuRRANdo soCANdo... E... olha aí comé que eles come? o engenheiro vem aqui talvez sendo uma vez por semana... no carrão dele ba/ "eh o rapaz falando pra mim né?... chega na:: e::... bota o Carro AÍ... num vai lá olha e tal......vem aquele... apontador "que ele chamou apontador... "e MOStra a Ele o serviço:: conversa com ele ali ele num passa nem meia Hora... aqui na obra... Inf. 2 - pois é Inf. 1 - e vai embora... quem ganha o dinheiro é ele "...então isso... eu sei::... que a gente:: a gente LU::ta a gente batalha a gente faz uma Faculdade pra estuDAR pra aprenDER... pra melhorar... MAS::... as nossas necessiDAdes... biológica as nossas /sidade de... de... sobre/vivência... eles também têm:::... eles têm necessidade de comer bem... eles eles fazem força podem num ter::... aquela o trabalho... intelectuAL ou o trabalho mental ele talvez não TEnha o intelectual porque até o mental porque um doido num trabalha... não produz ali... né?... ele ele NÃO pode... trabalhar ali... então:: eXISte um trabalho mental sim... ele sabe QUAL... QUAL... é a hora de colocar aquelas estacas de FErro... Inf. 2 - uhn uhn Inf. 1 - ah:: então eles chegam com aquela... aquela PÁ... meCÂnica com aquele trata num sei comé que chama aquele...{ caRRÃO... aí elas ela... vai colocando e eles vão Inf. 2 - é uma pá mecânica né? Inf. 1 - dizendo... "não ente/... afasta um pouco mais nem um pouco mais pra frente"quer dizer... há um raciocínio há um trabalho mental... e há o trabalho físico também esforço né? Inf. 2 – uhn Inf. 1 - E... quando {acabar o quê que eles têm direito? a comer Inf. 2 - ((pigarreou)) Inf 1 – aquele feijão aQUIlo me doEU mas ainda NÃO esqueci até ((telefone toca)) hoje ((desliga o gravador))] [30 pois é então eu acho eu acho que nós:::... depois faz/falamos contra a violência mas... num tem::: num tem assim enQUANto enquanto nós brasileiros... não... modificarmos... ess/ essa problemática... (...)

(Conversação espontânea, D2-39)

128

Casos como esse, além de se aplicarem apenas a textos falados

conversacionais, não apresentaram grande reincidência no corpus. Nas poucas

ocorrências, o marcador empregado foi o “então”, que sofre uma atenuação da sua

função articuladora e uma ênfase na sua função interacional, ou seja, trata-se de um

marcador fortemente interacional e fracamente seqüenciador. Essa tônica interacional é

típica de itens discursivisados, ou seja, itens lexicais ou gramaticais que adquirem

funções relativas à interação entre os participantes da conversação ou ao processamento

da fala (MARTELLOTA et al., 1996).

Esse emprego guarda uma semelhança como o que é registrado por Risso

(1993, p. 432) como “evidente recurso propiciador de abertura de contato entre

interlocutores”. No uso que estou analisando, cabe falar de uma reabertura de contato.

Como o discurso foi interrompido, o marcador é empregado para estabelecer novamente

o contato entre as interlocutoras e para iniciar o tópico.

A autora registra também que, com isso, o “então” não perde sua condição

de item remissivo retroativo. O que é peculiar, nesse emprego, é o fato de que “a

retroação se faz não propriamente para uma instância discursiva em presença na

superfície do texto em curso, mas a momentos anteriores de cumplicidade entre os

interlocutores” (RISSO, 1996, p. 433). No entanto, esse argumento justifica apenas a

natureza remissiva retroativa do “então”, mas não sua fraca função seqüenciadora.

Dessa forma, embora Risso (1996) não tenha destacado, o “então” iniciador de diálogo

apresenta também, nesse estudo, uma particularidade em relação aos demais usos

denominados pela autora de coesivos.

129

Esse uso do “então” mostra como um procedimento lingüístico-discursivo

predominantemente interacional exerce uma função textual. Conforme os postulados

teóricos que dão suporte a este trabalho, os aspectos interacionais e textuais atuam de

forma integrada no funcionamento do texto. Esse dado vem destacar que, além da

integração, pode ocorrer também uma gradiência com que esses aspectos aparecem na

composição do texto. Ou seja, os mecanismos de articulação tópica podem apresentar

funções predominantemente interacionais ou textuais. No exemplo em questão, como já

expus, a retomada do tópico (função textual) é secundária em relação à retomada da

conversação (função interacional).

4.2.1.4. O emprego de marcadores na mudança tópica

Em contexto de mudança de tópico, a função dos marcadores discursivos é

realizar o processo textual de ligar, na linearidade do texto, dois quadros tópicos que

podem ocupar ou não o mesmo plano na hierarquia da organização tópica do texto, ou

dois subtópicos no interior de um mesmo quadro tópico. Nesse processo textual, ocorre

também o movimento interacional através do qual o locutor orienta seu interlocutor para

a entrada de um novo tópico no discurso, não atinente ao que está sendo desenvolvido.

Na conversação espontânea D2-30, por exemplo, são desenvolvidos

diversos tópicos hierarquicamente independentes. Os tópicos Fortal, Política e

economia, Trabalho, Cinema, Pegadinhas do programa “Topa tudo por dinheiro” não

apresentam entre si nenhuma relação de dependência. Eles surgem naturalmente na

conversa, a partir dos diferentes interesses dos locutores.

130

Para não transcrever todo o texto, dada a sua extensão, apresento em (14)

apenas os trechos de transição entre os supertópicos, cuja articulação é feita por meio de

um marcador. A articulação entre os tópicos Fortal e Política e economia (no segmento

4) é feita pelos marcadores “bom” e “agora”. No segmento 7, também o marcador

“agora” realiza o movimento textual de ligação entre os tópicos Política e economia e

Trabalho. Finalmente, a articulação entre os tópicos Hábitos do homem moderno e

Pegadinhas do programa “Topa tudo por dinheiro”, no segmento 18, se realiza pelo

marcador “por sinal”. Nos três casos, através do movimento textual que articula os

tópicos, o locutor orienta seus interlocutores para a mudança de centração, ou seja, a

partir do ponto em que o marcador é empregado um novo conjunto de referentes

concernentes entre si entra no discurso.

A mudança é desencadeada por diferentes fatores interacionais (AQUINO,

1991). No exemplo em questão, o tópico Fortal apresenta sinais de esgotamento. No

final do segmento 2, subtópico O bloco Sirigüela, após a inserção do segmento 3,

subtópico Período do evento, as repetições “quatro mil pessoas é::...” e “é uma escola de

samba do Rio de Janeiro...” sugerem que, para os locutores não há mais o que dizer

sobre esse tópico. No ponto da conversa em que ocorre a passagem do tópico Política e

economia para Trabalho, parece ocorrer um desinteresse por parte do informante 1

sobre a falta de hábito da informante 2 de ler jornal, questão que desencadeia um

parêntese, pois não chega a desenvolvida. Essa falta de interesse motiva a mudança. Já o

tópico Pegadinhas do programa “Topa tudo por dinheiro” emerge na conversa por

decorrência do anterior. No segmento 17, tópico paralelo Hábitos do homem moderno, a

informante opina sobre a forma de vestir dos homens, que pode comprometer a

131

masculinidade. Essa questão a faz lembrar de um programa de televisão em que uma

mulher aparece vestida de homem, o programa “Topa tudo por dinheiro”, que passa a

ser o novo foco da conversa. Essa relação de associação entre os tópicos é inclusive

manifestada pelo emprego do marcador “por sinal”.

(14)

Fortal x Política e economia

Inf. 1 - agora quantos componente tem o Sirigüela? e os e quanto segurança tem?... Inf. 2 - ah eu num sei mas eu escutei alguma a respeito de:: novecento segurança foi?... foi {tu que me disse? Inf. 1 - foi foi eu vi que ia ter TRÊS MIL... Inf. 2 - três mil Inf. 1 - três mil e cem... Inf. 2 - pe{ssoas né? Inf. 1 - quem me disse foi o::... o dono LÁ do::... com/ é o nome?... o besame mucho é?... Inf. 2 - Besame mucho {EH tem esse barzinho tem esse barzim Inf. 1 - EH besame mucho que falou que eram três mil e cem onde /tava a sua amiga T. lá T. ((riu)) Inf. 1 - nunca ouvi falar ( ) Inf. 2 - T. Inf. 1 - pois é aí ele me falou que eram TRÊS mil e cem... e:: novecento segurança... Inf. 2 - mas os três mil e CEM mais novecento segurança dá quatro mil pessoa {dentro duma corda só Inf. 1 - dá quatro mil pessoas ...eu até falei pra Ele que QUAtro mil pessoas... seria::... uma escola de samba do Rio de Janeiro... Inf. 2 - é meu filho é mais ou {meno/ por aí Inf. 1 - é Inf 2 – o negócio é animado veja bem... /ta pensando o quê Inf 1 – ((riu)) Inf 2 – ((riu)) Inf 1- {quatro mil pessoas é::.... Inf 2 – ((riu)) é:: Inf 1 – é uma escola de samba do Rio de Janeiro... Inf 2 – é...exatamente... Inf 1 – [4 bom... agora... quem é que voCÊ::... quem é que você vai votar pa/ presidente? Inf 2 – { ((risos)) Inf 1 – você num ((falou rindo))

132

Inf 2 - ... hoje eu /tava hoje eu /tava dizendo pro::... pro menino lá que eu te falei... que eu chamo ele de petista né? (...) Política e economia x Trabalho Inf. 1 - ...e o salário né? Inf. 2 - e o salário a{inda por cima Inf. 1 - ah sim Inf. 2 - o saLÁrio... tem TUdo isso e o salário... fica hospedada na sua casa... pelo meno/ EU trato muito bem... pode ser até que tenha CAsa aí que num trate mas eu acho... mas num querem:: num quer trabaLHAR... num querem saber de nada... ficam naquelas poBREza na miséria lógico... problema delas... que que a gente pode fazer?... a gente até que TENta tal e tal... lógico que existe as fatalidades como aquele caso da Irlan né? Irlan Inf. 1 – é Inf. 2 - {que a mulher matou a pobre da doméstica né? que foi... Inf. 1 - que matou a:: Inf. 2 - tempos e tempo que eu acompanhei no jornal... quase todo dia saía uma pontinha sobre aquilo... MAS... o que se pode fazer lógi{co:: Inf. 1 - há tempo que /cê num lê jornal né?... Inf. 2 - tempo que eu leio jornal lá na sala ao lado... NÃO agora eu leio eu tenho direito ao Diário do Nordeste agora eu leio... esse é o meu hoRÁrio de ler jornal... Inf. 1 – [7 agora qual é o trabalho que /cê faz aqui no SINE... Inf. 2 - AH:: ((risos)) o meu trabalho AH:: H. é tão::... é muito diversificado... Inf. 1 - o que é a O & M? o que é? Hábitos do homem moderno x Pegadinhas do programa “Topa tudo por dinheiro”

[17 Inf. 2 - é igual à história hoje eu dizendo pra pra pra... E. né? dizendo pra E. que aCHAva... que HOmem pra mim que usa... cabelim de rabo né? cabelo grande cabelo grande é pa/ mulher homem HOmem que é macho macho que é MAcho ele não usa brinco... ele não usa cabelo GRANde nem ele usa macacão... macacão que eu digo n/é macacão bombeiro de posto não macacão aqueles macacão jeans assim ((riu)) sabe? ((falou rindo))... então MAcho que é MAcho... assim por exemplo um PAI meu você:: o M. meu irmão M. o povo que eu conheço jamais... olhe que eu conheço macho muito macho... mas esse negócio {desse po/ Inf. 1 - macho muito macho Inf. 2 - macho muito macho... homem pra mim que tem esse negócio "não:: galera hoje é assim mesmo ( ) e tal vamo/ usar"... pode ser que ele nem seja eu já /tô é generalizando já /tô dizendo que é tudo veado... mas pra mim é que eu jamais iria namorar com um homem cutucar ele aqui... sentir o brinquinho e os cabelo grande maravilhoso jamais... Deus me livre... {quero distância... rabo de cavalo lá vem... Inf. 1 - rabo de cava::lo Inf. 2 - já imaginou hoje em dia eh /tá tudo trocado hoje em dia eh /tá tudo trocado hoje em dia os homem têm o cabelo grande as mulher /tão pelando as cabeça... imaginou... um /tar se agarrando com outro aí um passa a mão no outro não::... {gosto disso não

133

Inf. 2 - vai saber Inf. 1 - ...não... [18 por sinal tu viu o Sílvio Santo?... domingo? Inf. 1 - ... não Inf. 2 - aquele Topa tudo por dinheiro ((riu))... {aí tinha uma artista ((falou rindo)) Inf. 1 - que foi Inf. 2 - /cê viu? não... tinha uma artista... daquelas de Sílvio Santo né?... ela se vestia todinha de homem de PASta executivo e tal terno gravata bigode /tá /tá... aí ia p/ o meio da rua aí de repente chegava um cara que também é::... do elenco lá do SBT... aí diz "oh:: querida há quanto tempo" aí abraÇAva e beiJAva né? o maior agarrado do mundo... e o povo que ia passando no meio da rua... pensava que Era... que eles dois eram:: na{morados (Conversação espontânea, D2-30)

No trecho (15), da palestra EF-25, destaco um caso em que um marcador

estabelece a articulação em um contexto de mudança tópica, no interior de um mesmo

quadro tópico. O tópico em questão é Transitividade, que se desdobra em três quadros

tópicos do segundo plano da hierarquia: Visões sobre transitividade, Conceitos

relacionados à transitividade e Abordagem para o estudo da transitividade34. O

terceiro quadro tópico é articulado aos demais pelo marcador discursivo ”bom”. Essa

articulação é decorrente de uma avaliação da palestrante acerca do momento adequado

para o desencadeamento do tópico Abordagens para o estudo da transitividade,

segmento 14. Após mostrar as diferentes visões e os diferentes conceitos sobre

transitividade, ela passa a falar sobre os tipos de abordagens sob as quais esse fenômeno

pode ser tratado.

Segundo Risso (1999, p. 271), o tópico que é aberto pelo marcador “bom”

“vem, geralmente, em feitio de um ato discursivo preliminar, destinado a definir o novo

passo”. No caso da palestra tomada aqui como exemplo, o tópico aberto pelo “bom”

34 Cf. diagrama 26, anexo C, p. 414.

134

vem em feitio de um ato discursivo preliminar, que se destina a definir o novo passo do

discurso. A abertura do segmento 14 constitui esse ato discursivo preliminar: “bom... eu

acho que duas DOIS estudos podem ser feitos em termos de transitiviDAde dependendo

da aborDAgem que você escolha...”. É esse trecho que define o novo tópico sobre

abordagens para o estudo da transitividade. O emprego do marcador “bom” exerce

também a função de assinalar a constituição desse ato.

(15)

[13 eh... UMA OUtra visão de um funcionalista SImon Dick... do ponto de vista FUNcional... a lingüística tem de ocupar-se de dois sistemas de regras... AMbos de natureza social... regras GRAmaticais... fazem muita coincidência com a:: a posição do Halliday... né?... que REgem a interação verBAL como uma FORma de atividade cooperativa"... ((vozes de ouvintes)) eu disse o quê?... ((vozes de ouvintes)) desculpe pragmática ((ri)) regras pragmáticas ((falou rindo))... obSERve que ele coLOca as regras pragmáticas em primeiro lugar... né?... E REGRAS SEMÂNTICAS... SINTÁticas... MORFOLÓgicas e fonológicas... que REgem a expreSSÃO das estruturas linGÜÍSticas... utilizadas como INSTRUMENTO da atividade cooperativa... (...) COmo o estado de coisa se apresenta na expressão lingüística... sujeito objeto direto... etc. funções pragMÁticas as funções pragmáticas dizem respeito ao status INformativo... DOS constituintes dentro da situação comunicativa... TEma e apêndice tópico e foco a diferença é tão sutil que... nem vale a pena comentar... eu só quero mostrar a semeLHANça entre as funções... propostas pelo Halliday e essas funções... que ele estabeleceu aqui... como se as seMÂNticas... correspondessem à ideacional... né?... as sinTÁticas segundo Halliday seriam determinadas pela... interpessoal né?... E... as fun/ a função textual corresponderia às funções pragmáticas... né?... conclusões... a transitividade pode ser definida... como uma relação sintático-semântica ao nível do sisTEma... embora fatores de ordem pragmática ((pigarreou)) informacional... possam interferir nessa relação...] [14 bom... eu acho que duas DOIS estudos podem ser feitos em termos de transitiviDAde dependendo da aborDAgem que você escolha... se vo/ você POde fazer um esTUdo de transitividade em BAses puramente semânticas ... e POde fazer um estudo de transitividade... em eh::... como como alguma relação sinTÁtico-semântica... e nesse CAso você teria que saber o QUE É que representa... o núcleo sintático... que nem SEMpre vai coincidir com o núcleo semântico... um exemplo muito claro disso... é o do verbo de ligação... eu digo... eh::... "o assunto... é palpitante"... você vai dizer... que ESte verbo aQUI... eu vou dizer que ESte verbo aqui... é o núcleo sintático... é Ele que vai me dizer o TIpo de sujeito que ele /tá exigindo... é Ele que vai me dizer o tipo de de de predicativo... né?... então ele constitui o núcleo sintático... ele é um verbo transiTIvo como os outros... com as suas especificidade mas é um verbo transitivo... certo?... mas ele não É não constitui o núcleo

135

semântico... daí porque a gramática tradicional diz que este predicado é nomiNAL... com base no critério semântico... NUM OUtro momento ela classifica verbos intransitivo mas já com base no critério sintático... então Essa confuSÃO aí é que num dá... é preciso você tomar uma decisão... ou você parte de um ponto ou você parte de outro... né?... que o predicativo é o núcleo seMÂNtico desse tipo de predicado não resta dúvida... certo?... o... o meu estudo pretende se basear NUma classificação... sintático-semântica... mas... preTENde analisar... TOdos os outros fatores que interferem... nessas relações... é apenas o o o PONto de partida vai ser esse... a aborDAgem vai ser essa... né?... SENdo uma relação seMÂNtica a transitiviDAde não se estabelece com instrumentos gramatiCAis... porque isso seria a tal da transitividade morfoLÓgica... certo?... então... também Acho que ela deve ser sepaRAda do que a gente enTENde por transitividade... transitividade TEM que ter... o o elemento semântico... que não constituem uniDAdes de significado funcional... porTANto podem ser transiTIvos... VERbos... substantivos... adjetivos advérbios... se o VERbo é o elemento central da oraçÃO... o processo da transitividade se dá... PAra a diREIta e para a esquerda como nós já vimos... né?... e OUtra coisa... aQUI... nos casos de predicado nominal... também é o verbo o elemento central da oração... então as MESmas relações que você... estabelece para os verbos transitivos você tem que estabelecer pra cá... quero dizer que esta posição diFEre... do que... eh::... PENsa Tesnière por exemplo... que mosTROU que o verbo era... era o elemento cenTRAL... ah::... aquele liVRInho aquela gramática de valências também Acha que... Isso aqui... o predicaTIvo é que é o elemento central... emBOra tenha dito que... o verbo é o elemento central da oração... né?... bom... TOdos os prediCAdos se TÊM como núcleo o verbo... são considerados verbais... de um ponto de vista sintático-seMÂNtico... emBOra o ponto de vista seMÂNtico-pragmático... que é isso?... do emBOra do ponto de vista seMÂNtico-pragmático o NOme seja ás vezes o núcleo semântico é o caso do... dos predicados... nominais... né?... bom e/ era só isso... muito obrigado... ((ri))... ((palmas))]

(Palestra, EF-25)

Um marcador discursivo pode ainda assinalar conjuntamente a mudança de

tópico e a mudança de modo discursivo, de declarativos a interrogativos, de narrativos a

avaliativos, por exemplo. É o que ocorre na articulação tópica destacada no exemplo

(16). O trecho compreende dois subtópcios do quadro tópico Administração pública35.

No segmento 13, tópico O ex-governador Tasso Jereissati, os informantes discorrem

sobre a atuação política do então e ex-governador do estado do Ceará. No segmento 14,

tópico Problema do serviço público, um dos informantes se centra no serviço público.

35 Cf. diagrama 15, anexo C, p. 398.

136

Um novo conjunto de centração é, então, aberto, e ocorre também uma mudança de

discurso narrativo para avaliativo. O tópico O ex-governador Tasso Jereissati é

predominantemente narrativo, porque centrado nos feitos do governador (“na Secretaria

de CulTUra... ele fez....”, “trouxe TÉCnico trouxe GENte”, “ele FEZ... deixou

PRONto... o Museu do Ceará”). Já no tópico Problema do serviço público, não ocorre

narração de fatos, mas julgamentos, impressões dos locutores sobre os fatos. Nesse

segmento é bastante recorrente, inclusive, o marcador de opinião “eu acho que”.

(16)

[13 Inf. 2 - {porque os Inf. 1 - os nossos candidato que /tão aí /cês acham que::... são bons?... nós temos boas opções aí?... nas eleições?... PRA governador?... Inf. 2 - pra governador... eu acho... Doc.1- que que /cê acha?... Inf. 2 - eh:: eu votaria no Tasso... eu votaria... nele Doc.1- {por quê? Inf. 2 - num tenho nada num tenho nada contra ele não... num acho que:: Inf. 1 - é... o {governo Inf. 2 - tenho Inf. 1 - do Tasso o priMEIro goVERno... o Tasso fez um governo até::... bom Inf. 2 - foi... Inf. 1 - foi... em TERmos por exemplo... lá da minha secretaria onde eu trabaLHAva... na Secretaria de CulTUra... ele fez... PAra a Secretaria de Cultura... ele fez um exCELENte governo... trouxe aquela Maria A::... Violeta ARRAes... e em TERmos DE Secretaria de Cultura que eu... posso falar só no daquilo que eu entendo né? os número de economia tal... o pessoal pode até MAIS... Secretaria de Cultura funcioNAva... em CIma... da biblioteca então nã/ num existia Secretaria de Cultura era um::... um poLEIro lá em cima da... da Biblioteca Pública... CHEIo de vazamento quando chovia o pessoal botava esse cesto de lixo pingando... na HOra que ela chegou disse "não isso aqui né? Secretaria de Cultura... eu quero o Palácio da Abolição"... aí NÃO num sei o que deram a metade do palácio... Inf. 2 - eh já mudou né? Inf. 1 - já muDOU... "eu quero"... só tinha um carro... "eu quero num sei quantos carro eu quero reformar o palácio todo"... quer dizer a secretaria que ocupava... umas:: OIto ou nove salas... hoje ocupa umas TRINta ou quarenta salas... e AÍ trouxe TÉCnico trouxe GENte né?... ela::... reformou o Teatro José de Alencar... TOdo... dizem que foi três milhões de dólares... ela reformou o Palácio da Luz... ELA::... conseguiu faZER... o arquivo público... que o Tasso deixou e o Ciro deixou acabar e teve que refazer de novo

137

porque não usaram o TEMpo... ficou tanto tempo fechado que tiveram que fazer de novo... Doc.1 - ((ri)) Inf. 1 - né?... ele FEZ... deixou PRONto... o Museu do Ceará... que s/ que DEMOROU tanto pa/ inaugurar que o Ciro teve que pintar de novo porque já /tava sujo mas foi Ele que fez né?... eu digo sempre que o s/ o Tasso fez e o Ciro acabou né?... Inf. 2 – é Inf. 1 - quer dizer então o o TOdos os PRÉdios que a Secretaria de Cultura TEM... ele reformou todos... TOdos que foi o o Arquivo Público o Teatro José de Alencar o Museu do Ceará o Palácio da Luz... Academia Cearense de Letras... eh o Palácio da Luz Palácio da Abolição... né? tudo tudo tudo ele fez... e deixou pronto... e Ela quis implantar aqui a história do::... com o Fest-Rio... a história do cinema no Ceará... que achava que o CeaRÁ que é o Estado do Brasil onde tem MAIS luz durante o ano né?... comparado com todos os Estado do BraSIL... (...) Inf. 1 - enTÃO... É então já ela e/ ela... conseguiu aí o TErreno conseguiu tudo mais... a época parece que num foi muito propícia criOU... um departamento SÓ pra cuidar disso... se investiu MUIto ((fim do lado A)) Doc.2- {/tava falando aí do Tasso Jereissati da da e Inf. 1 - ((tosse)) Inf. 2 - cinema... Inf. 1 - eh {então ele ela ela ela criOU LÁ... um departamento de A/ Inf. 2 - ((tosse))...-- /tá saindo a tosse?... Doc.2- po{de Doc.1- eu {transcrevo Inf. 1 - ((ri)) Inf. 2 - mas NÃO... Inf. 1 - ((ri))... {essa tosse é conhecida dela... ela ela Inf. 2 - ((tosse)) Inf. 1 - criOU... Inf. 2 - ((tosse)) {((tosse)) Inf. 1 - um departamento de ÁUdio-visual... né?... ele é esse departamento de áudio-visual que é uma era uma... funcionava na Casa da::... Vice-governadoRIA em frente o PaLÁcio... era colocou lá uma::... uma videoteca... ((voz de estranho)) Inf. 2 - ...NAda num conseguiu não... ((voz de estranho)) Inf. 1 - uma:: Inf. 2 - foi... por quanto...((voz de estranho)) cento e oitenta rea/ ((ruído)) Doc.1- pode falar sobre o SINE também se qui{serem dizer com/ é que é viu?... Inf. 1 - certo tudo bem... tem muito chão pa/ frente Inf. 2 - raPAZ mais trinta minutos {aí... falando Inf. 1 - ((riu)) fala do {SINE da vida alheia de tudo... então ele criOU Inf. 2 - fala... é::... ( ) Doc.1- ((ri)) Inf. 2 - {assim /tá ( ) Inf. 1 - ele criOU A::... Doc.2- videoteca né? a a {videoteca

138

Inf. 1 - a:: DENtro... desse departamento de áudio-visuAL... ele criou uma videoTEca... que é exatamente... você... tem lá VÍdeos... você PEga:: gratuitamente só ir lá pegar... que são temas... de filmes conhecidos... E você tem uma::... uma::... discoteca... que seria de discos... mas não discos... de mú::sica popular um disco mais de... jingle de propaganda... eh:: arquivos do::... de RÁdios da cidade né?... e:: uma filmoteca também formado por::... filmes de propaganda da:: TV Ceará antiga TV Ceará... Inf. 2 - ((tosse)) (...) Inf. 1 - enTÃO... eh:: ele CRIOU ela criou tudo isso...] [14 agora quer dizer pa/ você aí teve TOdo o... a equipe... TÉCnica... e TOdo o material foi comprado só que /tá lá tudo parado isso... não funciona nada... {PORQUE Inf. 2 - olhe só veja bem... Inf. 1 - eu Acho que essa PARte... SÓ SÓ SÓ Inf. 2 - é finalizan{do Inf. 1 - só terminando {aqui eu Inf. 2 - né? o Inf. 1 - acho que essa parte Inf. 2 - {((tosse)) Inf. 1 - o serviço público.. de... de um modo GERAL... NÃO aqui no SINE porque o o diretor que começou é o que está até hoje... então num HÁ::... QUEbra de:: solução de continuidade né?... quer dizer o cara começa e termina mas o serviço público tem muito Inf. 2 - ...{com o quê? Inf. 1 - é muito parecido com o mar... é chei/ de ONda né?... {então CADA S/ CADA... cada secretário Inf. 2 - então uma hora /tá em cima outra hora /tá em baixo Inf. 1 - que ENtra tem uma onda então o cara "bom... VAmo/ faZER uma::... hemeroteca"... aí pronto aí pega tudo quanto é de jornal aquele negócio todo né?... "vamo/ fazer o departamento de ÁUdio-visual"... aí... aí faz aquele negócio todo... "vamo/ fazer o muSEU da imagem e do som"... aí FAZ aquele negócio então CADA UM... Inf. 2 - vai fazer alguma coi{as Inf. 1 - vai faZENdo e vai quebrando os que ficam atrás né? quer dizer aquela idéia do de trás... tudo bem que ele faça a idéia dele mas que num aCAbe...{com a idéia do outro Inf. 2 - com a idéia do outro Inf. 1 - {esse eu Acho que o serviço público tem muito disso né?... Inf. 2 - isso é verdade... é Inf. 1 - você desPREZAR o que foi feito... Inf. 2 – é Inf. 1 - veja BEM diga lá]

(Conversação espontânea, D2-30)

139

O marcador “agora” é o mais recorrente na articulação tópica em contexto

de mudança. Além desse aparecem outros como “mas”, “bom”, “ainda”, “depois”, “já”.

Alguns, como o “agora” e o “mas”, são essencialmente prospectivos, ou seja, apontam

para frente e focalizam o fato de que o discurso avança para uma situação nova,

imprevisível. Outros, como o “ainda”, que, por apontarem para trás, são retroativos e

criam um certo grau de previsibilidade na mudança.

Em resumo à análise desse e dos demais usos de marcadores discursivos

desenvolvida neste item, destaco a sua dupla função, organizar segmentos tópicos e

enunciados na linearidade do texto e sinalizar aspectos do processo interacional, e

ressalto a relevância desse dado para o entendimento dos processos de organização

textual. Os estudos sobre articulação do texto pautados na noção de conectivos, como

se detém apenas à estrutura do texto, sem referências às motivações pragmáticas,

atribuem ao conectivo a função de estabelecer os diferentes tipos de relações que

ocorrem entre partes do texto. Conforme mostram os resultados aqui apontados, as

orientações de sentido bem como os demais objetivos interacionais que se congregam à

função articuladora de um marcador são construídos no e pelo discurso. E por isso não

são inerentes à relação entre segmentos tópicos ou enunciados ou ao próprio marcador.

4.2.2. Emprego de formas referenciais

Referenciação está sendo entendida aqui, conforme Koch e Marcuschi

(1998), como uma atividade discursiva, ou seja, como um processo realizado

negociadamente no discurso e que resulta na construção de referentes. A noção de

referência, nesse sentido, não é a tradicionalmente conhecida, ligada ao fato de a

140

linguagem referir o mundo, e, conseqüentemente, à relação de correspondência entre as

palavras e as coisas.

Essa noção de referência é sintetizada na seguinte formulação de Koch

(2002, p. 81):

(...) não se entende aqui referência no sentido que lhe é mais tradicionalmente atribuído, como simples representação extensional de referentes do mundo extramental: a realidade é construída, mantida e alterada não somente pela forma como nomeamos o mundo, mas, acima de tudo, pela forma como, sociocogtivamente, interagimos com ele: interpretamos e construímos nossos mundos através da interação com o entorno físico, social e cultural. A referência passa a ser considerada como o resultado da operação que realizamos quando, para designar, representar ou sugerir algo, usamos um termo ou criamos uma situação discursiva referencial com essa finalidade: as entidades designadas são vistas como objetos-de-discurso e não como objetos-do-mundo.

Assim como uma noção não realista de referência supõe que os referentes

não sejam objetos do mundo, mas objetos de discurso, as cadeias referenciais também

não se fundam exclusivamente na correferencialidade, ou seja, “a continuidade

referencial não implica referentes sempre estáveis nem identidade entre referentes”

(KOCH, 2002, p. 84).

A construção de cadeias referenciais se dá por intermédio de pronomes,

numerais, advérbios, e de formas nominais definidas e indefinidas (KOCH, 2002). Na

descrição definida, há a referência a um único objeto por enumeração das propriedades

que o identificam. Tradicionalmente, as descrições definidas são conceituadas como

expressões determinadas pelos artigos definidos o/a, em oposição às indefinidas,

determinadas pelos artigos indefinidos um/uma. Porém, já se entendem como descrição

definida as expressões determinadas por demonstrativos, possessivos, numerais,

elementos quantificadores e totalizadores.

141

As pesquisas sobre o emprego de expressões referenciais apontam para dois

tipos de análise: uma em que essas expressões são tomadas como elos coesivos e a

partir daí se descreve como se obtém a unidade formal do texto36; e outra em que se

analisam os processos de introdução e manutenção de referentes, e se destacam funções

responsáveis pela construção textual (através dos processos de retroação e prospecção) e

pela orientação argumentativa, entendida como uma forma de realçar partes ou

propriedades do objeto discursivo que mais favorecem a intenção do falante/escritor.

Nessa segunda perspectiva, as expressões referenciais são tomadas como

multifuncionais. É o que destaca Koch (2002, p. 106), na seguinte passagem.

A função das expressões referenciais não é apenas referir. Pelo contrário, como multifuncionais que são, elas contribuem para elaborar o sentido, indicando pontos de vista, assinalando direções argumentativas, sinalizando dificuldades de acesso ao referente e recategorizando os objetos presentes na memória discursiva.

Marcuschi (2000) também destaca a idéia de que os processos referenciais

estão relacionados com a construção da coerência na atividade discursiva. Nesse estudo,

o autor ressalta uma importante imbricação entre os processos de referenciação,

condução tópica e coerência discursiva.

(...) parece de extrema importância que um discurso, seja ele falado ou escrito, deve necessariamente preencher o requisito da topicalidade fundada na referenciação continuada, seja ela na base pronominal ou na base lexical. Pode haver lacunas preenchíveis por atividades cognitivas e investimento de conhecimentos externos. Podem ocorrer relações globais, ou seja, de extensões maiores ou outros aspectos que exijam maior esforço interpretativo. O que não pode faltar é uma base referencial preservada que permita a construção da coerência. É nisto que reside a possibilidade de identificar sobre o que se fala, ou então se em dado momento, se volta a falar sobre o mesmo tópico já apresentado (MARCUSCHI, 2000, p. 11).

Seguindo essa linha de raciocínio, Cavalcante (2002, p. 1) destaca que o

estudo da coesão referencial e a análise dos processos referenciais são geralmente

36 Cf. capítulo 2, em que discuto o conceito de coesão referencial, conforme Koch (1991).

142

abordados de forma separada na Lingüística de Texto. Para a autora, o limite entre esses

dois conteúdos “é muito mais extenso do que normalmente se costuma supor. É antes

uma escolha de perspectiva do que uma focalização de paisagens distintas”.

Cavalcante (2002) propõe, então, uma superposição entre o estudo dos elos

coesivos e dos elementos referenciais. Ela parte da divisão dos elos coesivos

referenciais proposta por Koch (1991) e os distribui segundo a ótica da referenciação.

Nessa distribuição, se distinguem as formas referenciais gramaticais presas, que se

prendem sintaticamente a um nome; as formas referenciais gramaticais livres, que

substituem um grupo nominal; e as formas referenciais lexicais. A autora não se detém

nas formas referenciais gramaticais presas, porque elas se caracterizam pela não-

autonomia referencial.

Analisando as formas referenciais gramaticais livres sob a ótica da

referenciação, Cavalcante salienta que, embora essas formas pareçam meras substitutas

de referentes anteriormente introduzidos no texto, nem todas operam uma retomada

total e pontual. Outro ponto destacado pela autora são os traços de saliência discursiva e

de pressuposição das coordenadas da enunciação que essas formas carregam, o que lhes

confere um comportamento dêitico. No que diz respeito às formas referenciais lexicais,

a autora salienta que elas costumam “recategorizar os referentes, somando significados

e atributos e – principalmente – veiculando pontos de vista do enunciador, o que lhes dá

enorme força argumentativa” (2002, p.5).

Em síntese, a proposta de Cavalcante (2002, p. 7) prevê uma análise do

emprego das formas referenciais sob o viés do exame da construção da coerência, como

“dispositivos de que dispõe a língua para remodelar os sentidos”.

143

A análise desenvolvida neste trabalho mostrou que as formas referencias,

especificamente as gramaticais livres e as lexicais, podem ser também estudadas como

mecanismo de articulação tópica, em que atuam como elementos formulativo-

interacionais. Diferentes são as atividades de referenciação que esses tipos de formas

referenciais promovem. Três tipos de processos de referenciação atuam na articulação

tópica: a) encadeamento de referentes vinculados a um contexto central, b) reiteração de

um mesmo referente, e c) conferição de estatuto de referente a um conjunto de

informações difundidas no cotexto anterior.

4.2.2.1. Encadeamento de referentes vinculados a um contexto central

Esse processo consiste no emprego de referentes que mantém entre si uma

inter-relação criada a partir de um determinado contexto textual-interativo. A

articulação de tópicos e de enunciados que constituem um segmento tópico em

particular é estabelecida através do encadeamento desses referentes na superfície

textual.

O contexto que permite o vínculo entre os referentes tem a ver com o que

Brown e Yule (1983) consideram o Princípio da Analogia, o qual prevê uma “armação”

que possibilita ao leitor/ouvinte interpretar seqüências discursivas sucessivas como

relativas a um mesmo tópico. Por essa ótica, a expectativa normal na construção e

interpretação do discurso é a manutenção do assunto que começou a ser tratado, numa

determinada condição, ou seja, se um locutor se propõe a tratar de um tópico, o

esperado é que todas as seqüências produzidas sejam atinentes a esse tópico, a menos

que o próprio locutor ou o interlocutor, na fala, sinalize para alguma mudança.

144

Esse contexto é criado por diferentes mecanismos. Um conjunto de

enunciados introdutórios, um enunciado metadiscursivo, a presença de títulos e

subtítulos, no caso de textos escritos, e perguntas são alguns desses mecanismos.

O segmento destacado a seguir recobre o tópico Fontes de inspiração, da

entrevista escrita E-162. Esse tópico é explicitamente apontado pela pergunta do

entrevistador, “Qual a maior fonte de inspiração da turma do Casseta e Planeta?”. É essa

pergunta que cria o contexto a partir do qual é possível se esperar que as informações

subseqüentes sejam atinentes ao tópico apresentado. Os referentes “políticos”, “CPI da

corrupção”, “João Alves”, “PC Farias”, “candidatura de Esperidião Amim”, “governo

Itamar Franco” e “governo Collor” não guardam em todo e qualquer contexto uma

ligação semântica subjacente. O vínculo entre eles é específico desse contexto, criado

pela explicitação do tópico, no início do segmento37.

(17)

VEJA –[4 Qual a maior fonte de inspiração da turma do Casseta e Planeta? BUSSUNDA - Estamos num fase muito boa. Os políticos têm colaborado muito, Brasília tem dado ótimas pautas. No ano passado, o ponto alto foi a CPI da Corrupção e o João Alves foi o patrono dos humoristas, mas saturou um pouco. Agora, estamos esperando o suicídio dele; afinal o político tem que honrar suas promessas. O PC Farias também ajudou bastante, porque, além de ser ladrão, é careca. Neste ano, os humoristas torcem pela candidatura do Esperidião Amin para a gente ficar quatro anos fazendo piadinha de careca. A gente vai poder até tirar férias e colocar uns iniciantes para fazer piadas no nosso lugar. VEJA – O governo Itamar Franco não é bom de humor? BUSSUNDA – No governo Collor, havia personagens muito fortes, que rendiam muita piada. O Itamar prestou um desserviço aos humoristas: montou um ministério de desconhecidos. Por causa de seu estilo centralizador, a gente está com um problema dentro do grupo Casseta e Planeta. O Reinaldo, que interpreta o Devagar Franco, não era muito conhecido de o Itamar substituir o Collor. Agora, ficou muito famoso, é reconhecido nas ruas e está entrando em crise porque o Itamar vai sair do governo. Ele pretende até defender a possibilidade de reeleição do Itamar na revisão constitucional. 37 O emprego de perguntas constitui um mecanismo de articulação tópica. A função de apresentar e introduzir um tópico novo no discurso é uma das funções interacionais que se congrega à função articuladora da pergunta.

145

O Itamar dá caldo em matéria de humor, mas, na época do Collor, da Zélia, nós fazíamos graça em cima do comportamento deles. Com o Itamar, a graça é em cima do que ele não faz.] (Entrevista escrita, E-162)

Do ponto de vista da organização textual, esse processo possibilita que os

segmentos tópicos e enunciados constitutivos de cada segmento sejam dispostos de

forma adjacente na superfície do texto. Com base em um segmento ou em um

enunciado se segue outro segmento ou outro enunciado, configurando-se o processo de

seqüenciação.

Além desse movimento textual que o encadeamento de referentes permite,

se instaura um movimento interacional, que é a indicação da forma continua e

progressiva como as informações devem ser assimiladas. O interlocutor é orientado a

perceber a montagem do texto, ou seja, com apresentação do tópico e seu

desenvolvimento em partes contínuas, e a interpretar que nenhuma dessas partes é mais

relevante ou importante, elas constituem uma espécie de enumeração de diferentes

aspectos do tópico.

Esse tipo de montagem tem a ver com a continuidade, a qual, segundo

Goutsos (1996), baseado no Princípio da Analogia (BROWN E YULE, 1983), é o

processo mais amplo que se deve esperar do texto.

Essa atividade de atribuição de referente enquanto mecanismo de

articulação tópica ocorre tanto no nível intra como intertópico. A articulação no nível

intertópico da reportagem de televisão F-04 pode ser tomada como um exemplo. O

texto apresenta o tópico Animais que sobrevivem na Antártica, que se desdobra em

146

quatro subtópicos. Esse tópico é anunciado no início da reportagem, no subtópico

Condições climáticas da Antártica, segmento 1, através do enunciado “Pouquíssimos

animais conseguem sobreviver nessas condições extremas”. Cria-se, assim, um contexto

de interpretação para os subtópicos seguintes, todos desenvolvidos em segmentos

adjacentes38. O subtópico Pingüins Imperadores, segmento 2, se articula ao anterior por

meio do referente “os imponentes pingüins”. Esse subtópico por sua vez se articula ao

subtópico Focas Wendell, segmento 3, através do referente “um outro animal”.

Finalmente, o referente “Pingüins Barbados” estabelece a articulação entre esse e o

último subtópico, segmento 439.

Esse tipo de mecanismo de articulação tópica sinaliza para a forma como a

reportagem está montada: o assunto central é apresentado e, em seguida, os comentários

sobre dados levantados formam progressiva e continuamente o desenvolvimento.

Esse mesmo procedimento é percebido no nível intratópico, em que a

articulação entre os enunciados que constituem um segmento tópico em particular é

feita através de referentes vinculados ao tópico do segmento. Tomo o seguinte trecho

para exemplificar a questão.

(18)

[6 (a) Com o alastramento da Aids presenciamos não apenas um significativo incremento do discurso sobre a sexualidade, como também uma gradativa exibição de imagens relacionadas ao sexo sem risco. (b) A camisinha, até então escondida nas prateleiras das farmácias e nos recônditos das gavetas, passou a ser exposta em lugar de destaque dos supermercados. (c) Cartazes, panfletos e filmetes oficiais passaram a mostrar o preservativo em sua nudez, fora da embalagem, manipulado como se fosse uma luva de proteção. Para ensinar como usá-lo, utilizaram-se primeiro objetos fálicos - a aeromoça que enfiava a camisinha no dedo, ou numa banana - o que levou os grandes

38 Cf. diagrama 22, anexo C, p. 409. 39 A reportagem está transcrita no anexo B, p. 327.

147

empresários desta fruta a protestar na televisão norte-americana. (d) Hoje, sobretudo nos países mais desenvolvidos, cartazes e folders mostram com todo realismo corpos dos entrelaçados e membros eretos protegidos pelo profilático, material destinado tanto às clientelas heteros quanto homossexuais. (e) Nesta VI Conferencia Internacional de Aids, enquanto uma fração do grupo anti-Aids "Act Up" comandava manifestações na rua, em protesto contra a política discriminatória à entrada dos HIV positivos nos Estados Unidos, dentro do centro de convenções, outros membros do Act Up optaram por outra estratégia de luta - vendiam e exibiam um vídeo ultra realista sobre o safe sex, filme cujo roteiro não ficava nada a dever às imagens mais sensuais das Mil e uma Noites ou do Kama Sutra. A Aids levando o sexofóbico Ocidente às intimidades da alcova da ars erotica oriental. (f) Nos pontos de ônibus e nos transportes coletivos de algumas grandes cidades norte-americanas e européias, cartazes sempre bastante explícitos, evocam aos passantes detalhes do sexo sem risco. (g) No Brasil, o moralismo oficial e a pobreza dos recursos das organizações comunitárias e dos órgãos não-governamentais explicam a falta de imaginação e pudicícia do material visual relacionado ao sexo sem risco, se comparado com o dos países mais ricos. A maior audácia visual com chancela oficial foi produzida pela Secretaria de Saúde da Bahia, ao divulgar em Salvador, no verão de 1988, out-doors e cartazes com um casal deitado juntinho, na praia, ela com sumaríssima tanga, ele de sunga, com as duas mãos enlaçando as pernas da companheira. O texto dizia "O verão da Bahia chegou... Turistas chegam de todas as partes e se entregam de corpo e alma às delícias desta terra morena, hospitaleira e sensual. Na Bahia, 70% dos casos de Aids foram adquiridos através do ato sexual. Isto não quer dizer que as pessoas estão condenadas a um verão triste e sem amor. Você pode relaxar e curtir o verão desde que tome diversos cuidados. Não deixe de usar o preservativo! A camisinha é seu único amuleto: feche seu corpo, abra seu coração!". (h) Na falta de cartazes específicos com visual homoerótico, o Grupo Gay da Bahia aproveitando este material oficial, fez uma montagem onde em vez do casal modelo, dois rapazes se entrelaçavam tendo a mesma praia e dizeres como pano de fundo. (i) Na televisão foram exibidos filmetes com cenas bem realistas de "pegação", mostrando cenas de promiscuidade na área do meretrício: mulheres e travestis abraçados a seus clientes, sugerindo aos telespectadores o risco da troca de casais e sexo com qualquer pessoa. Salvo erro, foram as imagens mais ousadas veiculadas pelo Ministério da Saúde. (j) Quanto ao visual mais explicito divulgado no Brasil relativamente ao sexo sem risco - alem de uma história em quadrinhos do Grupo Atobá de Emancipação Homossexual, do Rio de Janeiro, onde Batman e seu companheiro Robin eram mostrados com superdotados membros eretos, dando lições de como usar a camisinha, destaca-se o livrete publicado pela Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids, com patrocínio da Fundação Ford, onde cenas eróticas extraídas de revistas gays mostram diversos atos sexuais rotulados alguns como muito arriscados (dar e comer), arriscados (chupar), sem risco (beijo, punheta e consolos). (...)

(Artigo científico, E-053)

Esse trecho é um segmento textual de um artigo científico que recobre o

tópico Visualização do sexo, um dos desdobramentos do tópico Modificações de

148

padrões e práticas sociais provocadas pela Aids40. Esse subtópico é explicitado no

início do segmento, através do enunciado introdutório “Com o alastramento da Aids

presenciamos não apenas um significativo incremento do discurso sobre a sexualidade,

como também uma gradativa exibição de imagens relacionadas ao sexo sem risco”. O

autor inicia o segmento, apresentando seu conteúdo. Estabelece-se, assim, o contexto

para que todos os enunciados seguintes possam ser interpretados como relacionados a

esse conteúdo41. É isso que cria, conforme assinalam Brown & Yule (1983), a

expectativa de que o que é dito ou escrito fará sentido no contexto em que aparece.

Os demais conjuntos de enunciados que se seguem constituem o

desenvolvimento desse assunto, ou seja, são postas as evidências que demonstram que a

Aids serviu para liberar a exibição de imagens relacionadas ao sexo42. Esses conjuntos

de enunciados estão dispostos de forma adjacente, num processo semelhante ao de uma

lista detalhadora. O encadeamento dos referentes vinculados à idéia de imagens

relacionadas ao sexo é a forma empregada para articular esses conjuntos de

enunciados43. Do ponto de vista interacional esse mecanismo sinaliza para o tipo de

montagem do segmento: introdução e desenvolvimento em partes contínuas.

A forma como os tópicos ou enunciados são distribuídos na linearidade do

texto permite uma certa mobilidade das informações, ou seja, com exceção da

introdução do quadro tópico ou do segmento, a ordem de colocação dos subtópicos e

enunciados pode ser alterada. Para alguns estudiosos da Lingüística Textual, que

entendem a coesão como elemento que garante a estruturação da seqüência superficial

40 Cf. diagrama 13, anexo C, p. 396. 41 No artigo, o subtóptico é explicitado também por um subtítulo: Liberação visual. 42 No trecho em destaque, identifico cada conjunto de enunciados com letras entre parênteses. 43 Destaco, em negrito, no próprio trecho, as formas referenciais empregadas.

149

do texto, representado por elementos formais, esses textos seriam destituídos de

recursos coesivos e a progressão temática se estabeleceria apenas no nível do sentido e

não no nível das relações entre constituintes lingüísticos (MARCUSCHI, 1983). Porém,

na perspectiva que estou adotando para compreender a organização do texto, fica

evidente que a relação entre tópicos e enunciados, nesse mecanismo de articulação

tópica, se estabelece pelos referentes que aparecem na superfície do texto. A unidade

entre as informações que permite entender o texto como coerente não se estabelece no

nível de uma abstração, mas pela atividade formulativa que gera a organização

superficial do texto. Nessa atividade formulativa está congregada uma atividade

interacional, o tipo de montagem que o produtor pretende dar ao texto e a tentativa de

sinalizar isso para seu interlocutor.

Trata-se de um mecanismo que guarda uma relativa semelhança com o tipo

de coesão lexical denominado por Halliday e Hasan (1980) como colocação. Segundo

esses autores, a colocação resulta da associação entre unidades lexicais que

regularmente tendem a dividir contextos similares, ou seja, tendem habitualmente a co-

ocorrer.

O conceito de colocação tal como postulado pelos autores põe em evidência

a interdependência entre os planos sintagmático e paradigmático da língua, ou seja, ao

mesmo tempo em que é possível entender que as unidades co-ocorrem em contextos

similares, porque a relação entre elas já está prevista pelo sistema da língua, é possível

entender também que elas estão relacionadas, porque co-ocorrem em contextos

similares. Isso significa que a associação sintagmática que caracteriza a colocação se

fundamenta em relações semânticas paradigmáticas que as palavras mantém entre si.

150

Assim é que Antunes (1995, p.102) vê “a possibilidade de que unidades vinculadas

paradigmaticamente venham a vincular-se, de forma reincidente, no eixo sintagmático

de contextos similares, criando, assim, padrões sintagmáticos de contextos recorrentes”.

Segundo Antunes (1995), as motivações que presidem a instauração da

colocação são de natureza tanto lingüística como não lingüística. As motivações de

natureza lingüística dizem respeito exatamente às relações paradigmáticas de sentido, a

partir das quais se organiza o léxico de uma língua; e às relações de ordem sintático-

semântica. A coesão por colocação em que entram, por exemplo, as unidades “matar”,

“assassino”, “vítima”, “crime” deriva de relações sintático-semânticas. Já as motivações

de natureza não lingüística dizem respeito “àquelas relações derivadas das convenções

que determinam e especificam o que é usual ou típico para um evento, numa situação

particular, numa determinada cultura” (1995, p.103).É o que permite, por exemplo, a

associação entre as unidades “boi”, “arado”, “campo”, ou entre “boi”, “força”,

resistência”.

Para Antunes são, portanto, os conhecimentos lexical (informação

semântica) e enciclopédico (as convenções externas à língua) que funcionam como

cálculo das relações semânticas entre as unidades lexicais dos textos, em condição de

colocação. Destaca-se aí o fato de que, tanto para Antunes (1995) como para Halliday e

Hasan (1980), as unidades lexicais em colocação se associam em virtude de alguma

ligação semântica.

Como mostrei, nos exemplos, o tipo de vínculo entre as formas referenciais

lexicais que instauram um movimento de articulação tópica é de outra natureza. É,

inclusive, esta uma das diferenças entre o mecanismo de articulação tópica que envolve

151

o encadeamento de referentes e a coesão lexical por colocação, como postulada por

Halliday e Hasan (1980).

O que evidenciei nos dados que analisei foi o fato de que a relação entre os

referentes que atuam na articulação tópica não decorre de uma ligação semântica

subjacente a eles. As escolhas lexicais são definidas pelo tópico, que emerge

interacionalmente no processo de produção do texto. Quando o tópico é explicitamente

apresentado, cria-se um contexto em torno do qual os referentes são criados e em

virtude do qual é possível se estabelecer o vínculo entre esses referentes. A articulação

tópica é promovida por essa atividade de referenciação.

Além da seqüenciação, o encadeamento de referentes atua também no

processo de retomada tópica, ou seja, ao empregar um referente vinculado ao contexto

de um tópico suspenso, o produtor do texto orienta seu interlocutor para a retomada

desse tópico. Na entrevista escrita E-162, por exemplo, da qual destaco um trecho, mais

a seguir, o quadro tópico Televisão, do terceiro plano hierárquico, apresenta três

subtópicos: Programas infantis, Novelas e Programas para jovens. Entre os dois

primeiros subtópicos (segmentos 11 e 13), ocorre na linha discursiva o tópico Pessoas

chatas (segmento 12). Esse tópico é introduzido pelo entrevistador, por meio da

pergunta Quem são hoje os outros campeões da chatice no país?, que, embora derive da

avaliação que o entrevistado faz, no tópico anterior, dos programas infantis da TV como

chatos, ultrapassa o circuito da TV, na medida em que desloca a questão da chatice da

TV para o país. Esse deslocamento, evidente na resposta do entrevistado, que cita vários

tipos de chatos em geral, leva a uma suspensão do tópico Televisão, que estava em

pauta, mas que voltará a ser focal no segmento 13, quando entra o subtópico Novelas.

152

Por não ser assim concernente com o quadro tópico Televisão, e por

entremear-se nesse quadro tópico, o tópico Pessoas chatas configura, na linearidade

textual, uma inserção. A retomada do tópico Televisão, após essa inserção, é marcada

pelo emprego do referente “novela”, que articula os dois primeiros subtópicos desse

tópico, dispostos em segmentos não contíguos na linearidade discursiva. À pergunta

introdutora do primeiro subtópico do quadro tópico Televisão (O que você acha dos

programas infantis da TV?) soma-se a que inicia o segundo subtópico (E o que acha das

novelas?), para restabelecer e dar prosseguimento ao tópico cindido pela inserção. Isso é

possível porque o referente “novela” se vincula a “programas infantis”, nesse contexto.

Através desse procedimento, o entrevistador orienta a atenção do entrevistado par o fim

do tópico inserido e o convida a retornar ao que havia sido iniciado e suspenso44.

(19)

[ 11 VEJA – O que você acha dos programas infantis da TV? BUSSUNDA - A Xuxa, a Angélica e a Mylla Christie são bonitinhas e inofensivas, gostaria que fossem babás da minha filha, mas os programas são de lascar. No Canta Conto, da TVE, a Bia Bedran conversa com o mar e ele responde, fala “oi, bondinho” para o bonde do Pão de Açúcar e ele retruca “oi, Bia”. Eu não deixo a minha filha ver uma coisa dessas de jeito nenhum. Em matéria de chatice, a Bia Bedran é o Oswaldo Montenegro de saias.] [ 12 VEJA – Quem são hoje os outros campeões da chatice no país? BUSSUNDA - Há vários tipos de chato. O Humberto Gessinger, do grupo Engenheiros do Hawaii, e o Gabriel o Pensador, por exemplo, são chatos do mesmo tipo: fazem música óbvia para que pessoas que nunca leram um livro se sintam inteligentes. Podem ser chamados de os chatos ginasianos. O maior chato do Brasil é, sem dúvida alguma, o Beijoqueiro. É o chato mala, que dispensa maiores explicações. Mas o pior tipo de chato é o chato bêbado, que fica com um copo em uma das mãos e a manga da camisa alheia na outra. Foi esse tipo que me fez parar de sair à noite, porque sempre tinha um representante da categoria que vinha parar na minha mesa e contar uma piada nova que eu já conhecia há mais de cinco anos. Há também o chato dono da verdade, como o Agnaldo Timóteo - se acha um primor de inteligência e é o única que enxerga essa qualidade nele. Há os chatos de plantão, como o Amaral Netto e o Jair Meneguelli. E

44 Essa análise pode ser acompanhada pelo diagrama 05, anexo C, p. 386.

153

não se pode esquecer dos chatos centrados, tipo Mário Covas, que não dizem nada com uma firmeza impressionante.] [ 13 VEJA – E o que acha das novelas? BUSSUNDA - Eu sou noveleiro desde criança, embora meus pais me proibissem de ver novela. Eles eram do Partido Comunista e eu não podia ver novela porque era coisa “de alienado”. Aí, eu via escondido. Foi minha primeira rebeldia. As marcantes para mim foram O Bem Amado e Saramandaia. (...) (Entrevista escrita, E-162)

Segundo Koch (2002, p. 121), na construção do texto ocorrem dois grandes

movimentos, um de retroação e outro de prospecção. “Como imperativos de ordem

cognitivo-discursiva que são, esses movimentos de avanço e recuo – tal como acontece,

por exemplo, na ação de tricotar – presidem à criação da tessitura do texto”. É também

nessa perspectiva que Charroles (1997) apresenta como duas das quatro meta-regras de

coerência do texto a repetição e a progressão. A primeira determina que “para que um

texto seja (microestruturalmente e macroestruturalmente) coerente é preciso que

contenha, no seu desenvolvimento linear, elementos de recorrência estrita” (1997, p.

49). A segunda completa a primeira já que prevê que a coerência de um texto advém

também da condição de que seu desenvolvimento contenha um aspecto semântico

constantemente renovado.

Nessa perspectiva, seja no processo de seqüenciação, seja no de retomada,

os referentes vinculados ao mesmo contexto atuam retroativa e prospectivamente,

promovendo o movimento de progressão do texto. Essa constatação mostra que as

atividades formulativas que garantem a progressão textual não se limitam a alguns tipos

de recorrências (reiteração de itens lexicais, paralelismos, paráfrases, recorrência de

elementos fonológicos, de tempos verbais etc) e aos articuladores textuais, conforme

154

aponta Koch (2002). Atuam também as formas referenciais, constituídas por sintagmas

nominais que apresentam diferentes tipos de estruturação interna.

Algumas dessas diferenças estruturais dos sintagmas nominais podem ser

observadas no exemplo (18). Os referentes que se encadeiam na articulação intratópica,

no segmento 6, do artigo científico, são expressos por sintagmas nominais definidos, “a

camisinha”, indefinidos, “um vídeo”, ou genéricos, “cartazes, panfletos e filmetes”.

Essas diferenças de constituição não estão relacionadas com a articulação tópica em si.

Elas contribuem para os processos de delimitação, por parte do falante/escritor, e

identificação, por parte do ouvinte/leitor, do referente (LIBERATO, 2001).

4.2.2.2. Reiteração de um mesmo referente

A atividade de reapresentar seguidas vezes um mesmo referente discursivo

emergiu na análise também como um importante mecanismo de articulação tópica. Um

mesmo referente é reiterado com o objetivo de aumentar o efeito de presença de um

tópico. Salientando a presença do tópico, o produtor do texto prepara o seu interlocutor

para o desenvolvimento de subtópicos, no processo de seqüenciação tópica, ou para a

retomada, quando ocorrem desvios de tópico.

Na reportagem de televisão, destacada em (20), por exemplo, a articulação

intertópica é estabelecida pela reiteração de um mesmo referente, “o candidato do PT

Luiz Inácio Lula da Silva”. Esse referente constitui o supertópico do texto. Em cada um

dos três desdobramentos, subtópicos Encontro com os aposentados (segmento 2),

Participação no encontro de meninos e meninas de rua (segmento 3) e Reunião com a

cúpula da Assembléia de Deus (segmento 4) esse tópico é reativado pelos sintagmas

155

nominais “Lula” e “O candidato petista”45. Ocorre, nesse caso, uma sucessão de

informações, ou seja, um processo de seqüenciação tópica, para o estabelecimento do

qual atuam as referidas formas referenciais.

(20) [1 Apresentador – O candidato do PT Luiz Inácio Lula da Silva teve encontros hoje em Brasília com líderes de ruas, líderes evangélicos e aposentados. A reportagem é de Cristina Lemos.] [2 Repórter – Dos aposentados Lula ouviu denúncias: querem um salário mínimo de 350 reais, mas o candidato petista evitou promessas. Em meio às turbulências do mercado Lula não poupou críticas à área econômica do governo. (Fala de Lula - inaudível)] [3 Repórter - No encontro nacional de meninos e meninas de rua no plenário da câmara, Lula foi surpreendido com a saudação da ex-colega de partido, deputada Erundina, hoje aliada a Anthony Garotinho, do PSB. (Fala de Erundina - inaudível)] [4 Repórter – O candidato petista fechou o dia com uma reunião com a cúpula da assembléia de Deus, que congrega 18 milhões de evangélicos. A eles Lula prometeu tentar melhorar o relacionamento das prefeituras com as igrejas. Mais tarde em entrevista Lula voltou a responsabilizar o governo pela instabilidade do mercado. (Fala de Lula - inaudível)] (Reportagem de televisão, F-01)

A atividade de reiteração do referente assume também a função de salientar

o tópico, direcionando a atenção do interlocutor para o movimento de retomada após

inserção tópica ou parentética. Quando o tópico é suspenso, seja para o

desenvolvimento de outro tópico ou de um parêntese, o seu retorno ao discurso é

sinalizado através da reiteração do referente, que o coloca novamente em posição focal.

Na passagem da conversação espontânea D2-30, destacada a seguir, o

tópico em desenvolvimento é O impacto da morte, segmento 19, um desdobramento do

45 Cf. diagrama 19, anexo C, p. 406.

156

supertópico Morte de Airton Senna46. Esse tópico é interrompido pelo parêntese “/tá

perto Inf. 1 - terminou Doc.2- não”, que quebra o fluxo temático para focalizar

contingências do ato de comunicação em si (JUBRAN, 1999). O retorno é sinalizado

pelo sintagma nominal “Airton Senna”, que, por reiterar o referente que é tópico do

segmento, articula os enunciados cindidos pela inserção.

(21)

[19 Doc.2- só vo/ voltando aqui um pouquinho... eh e a morte do Ayrton Senna {vamo/ falar um pouquinho Inf. 2 - ah:: não fale do meu {lindinho ((risos)) Inf. 1 - ((riu)) Inf. 2 - oh bi{chinho que é o::... Ave Maria Doc. 2 - com/ é que é o bichinho pra cada um de vocês Inf. 2 - pra mim Deus me livre eu faltei foi a minha irmã ficou viúva né? uma semana Inf. 1 - ((riu)) Inf. 2 - viúva porque o marido dela disse que num agüentava mais... e ela chorava mais do qualquer outra coisa que ela tivesse visto ela CHOROU... literalmente mais de uma semana a M. Inf. 1 - M. {foi? Inf. 2 - a M. M. simplesmente ela num chorava não ela ficou de CALdo ela num foi trabalhar no dia porque /tava toda inchada de tanto que ela chorou... Inf. 1 - ((riu)) Inf. 2 - ((riu))... {mas a M. foi mesmo não /tá perto Inf. 1 - terminou Doc.2- não Inf. 2 - ...mas a M. o Ayrton Senna Ave Maria... foi triste aquilo ali foi triste eu achei assim... a morte DEle assim uma coisa assim muito::... sa{be uma coisa que ninguém Inf. 1 - é Inf. 2 - espera{va:: que Inf. 1 - a gente VÊ a gente vê muita morte só que aquela morte foi ao vivo {né?... então ele Inf. 2 - foi ao VIvo exatamente né? Inf. 1 - /tava... no Ápice da carreira né?... {e::... representava Inf. 2 - Ave Maria já devia ter parado há muito tempo] (Conversação espontânea, D2-39)

46 Cf. diagrama 15, anexo C, p. 398.

157

Nessa mesma conversação espontânea ocorre um exemplo em que a

reiteração de um referente exerce a função de salientar o tópico e orientar a atenção do

interlocutor para o processo de retomada após inserção tópica. O trecho transcrito se

inicia no segmento 21, que recobre o tópico Festas de fim de ano na igreja,

desenvolvido pela informante 1. No segmento 22, ocorre uma mudança de centração. A

informante dois passa a falar dos hábitos do seu pai e desenvolve o tópico Hábito do pai

de Inf. 2, subtópico de outro quadro tópico, Família. No segmento 23, novamente se

instaura uma nova mudança de centração. A locutora passa a desenvolver o tópico

paralelo Visita da irmã47. Ocorrem, assim, no interior do tópico Festas de fim de ano na

igreja duas inserções tópicas. O retorno a esse tópico é construído no próprio discurso,

quando a informante reitera o referente “igreja”. O sintagma nominal “na igreja” exerce

a função de articular o segmento 24 ao 21 e orientar a atenção da interlocutora para a

retomada do tópico suspenso.

(22)

Inf. 1 - porque o negócio dele é MORRER porque ele num pode mais anDAR... então:: num adianta mais... pra quê viver? se num:: num posso mais andar... o negócio dele é andar na rua como ele andava em em Fortaleza toda ele andava a pé né?... tem horror a andar de a/ de... automóvel... num carro pra ele é é a pior coisa do mundo... é uma verda/ é um flaGElo... andar de carro pra ele é um flagelo...] [21 pois é D. eu /tava... eh engraçado... Esse fim de mê/... esse fim de Ano... as festas /tão se assim atropelando... aqui na iGREja no Bom Pastor nós temos no dia sete pela maNHÃ... a festa da::... do:: das BOdas de::: PRAta do padre... capelão aí... depois... ANtes... no dia quatro... tem a nossa investidura né? os {ministros da eucaristia Inf. 2 - uhn... ((ruído))... às dez horas né? Inf. 1 - ... é ás dez hora{s... na igreja do:: São Benedito Inf. 2 - lá na:::... igreja do São Benedito...{ah Inf. 1 - eh... então nós vamos eh a investidura vai ser] [22 eu acredito que o papai não POssa {ir porQUE... Inf. 2 - não vai não

47 Cf. diagrama 16, anexo C, p. 401.

158

Inf. 1 - é MUIto demorado Inf. 2 - depois tem que subir aquela escada ali na frente da igreja e ele num consegue mais Inf. 1 - por isto não porQUE:: LÁ Inf. 2 - uhn Inf. 1 - pela rua do Imperador você poderia... fazer... estacionar seu carro lá e ele e entraria diretamente na igreja... ali na Impe{rador... aí você:: ali num tem:: num tem Inf. 2 - eu sei eu sei... num sei eu vou perguntar se ele quer ir mas eu acho difícil ele querer ir... Inf. 1 - agora:: o que eu{ VEjo... é o... é o padre A. Inf. 2 - quem que vai fazer a a?... padre A. Inf. 1 - é... ele tem muita ad{miração:: pelo padre A. Né? Inf. 2 - uhn uhn... é... quem sabe né?... Inf. 1 - mas é muito demora:::do vai {ser demorado demais Inf. 2 - é né? Inf. 1 - são cento e tantos ministros... cada um::: tem que... aquela história VAI:: em procissão:: bem devagar e dePOIS:: passa no pa::dre o padre... num SEI:: como é dá uma benção e tal isso é:: uma coisa dimiNUta realmente mas são cento e tantos né?... Inf. 2 - é... não assim também não talvez ele num queira ir {não:: Inf. 1 - eh:: além do mais tem os cânticos tem a fa::la tem essa... tem leiTU:::ras... e:: eu acho que vai ser uma::... uma solenidade MUIto lon{ga... pra ele... Inf. 2 - demorada... Inf. 1 - ele já num agüenta {tanto tempo ficar sentado assim... Inf. 2 - ((pigarreou)) Inf. 1 - e vai ser difícil... mas::... {eu FALEI Inf. 2 - ( )] [23 Inf. 1 - ... sim fala Inf. 2 - a R. de C. vem... Inf. 1 - eh?... Inf. 2 - vem {ela disse que vem chegando quinta-feira pela maNHÃ Inf. 1 - que dia?... a{gora? quinta-feira primeiro? Inf. 2 - né?... não:: no dia do aniversário dele... no {dia OIto né?... ela vem pra chegar aqui no dia Oito Inf. 1 - ah::::... ah cer{to Inf.2 - né?... aí ela fica sexta sábado... e viaja domingo só... Inf. 1 - eh? Inf. 2 - é... Inf. 1 - ótimo... é bom Inf. 2 - passar uns diazinhos aqui{agora [24 Inf. 1 - pois é já:: na igreja nós temos eh:: a/ assim festividades da igreja é... TANta... confraternização é do grupo de oraÇÃO... eh::... do grupo do::... do Cristo é vida com outro grupo que tem aqui na paróquia... eh::... eh a::... festa da ordenação do nosso vigário né? de quarenta e dois anos de sacer{ dócio... e... tudo isto e a gente chega Fica Inf. 2 - uhn Inf. 1 - ... pensando eh:: o que o mês de dezembro devia ter uns sessenta dias... pelo menos... porque::... /tá

159

Inf.2- ((risos))... Inf. 1 - olhe{ trinta num /tá mais dando... porque]

(Conversação espontânea, D2-39)

Um outro aspecto interacional vinculado à reiteração de um mesmo

referente na articulação tópica é a sinalização da atitude assumida pelo produtor em

relação ao conteúdo do texto. Segundo Koch (2002, p.88), “a escolha de determinada

descrição definida pode trazer ao leitor/ouvinte informações importantes sobre as

opiniões, crenças e atitudes do produtor do texto”. Ao reiterar o referente com uma

expressão nominal definida, o produtor do texto pode também deixar transparecer seu

ponto de vista em relação ao que está dizendo.

O trecho destacado a seguir apresenta partes do segmento em que se

desenvolve o quadro tópico Sistema Seae-SDE-Cade, do artigo de opinião E-149. Esse

quadro que se desdobra em cinco subtópicos48. No primeiro subtópico (segmento 4), o

produtor do texto trata dos objetivos do Sistema, inserindo-o no contexto de órgãos

criados para a defesa da concorrência no Brasil. Cria-se, no início desse subtópico, um

contexto que integra os subtópicos subseqüentes, o que possibilita que a articulação seja

realizada através do encadeamento de referentes vinculados ao contexto. É exatamente o

que ocorre entre os subtópicos Poderes do sistema (segmento 5), Infrações previstas

pelo sistema (segmento 6) e Penalidades previstas no sistema (segmento 7): a

articulação é realizada, respectivamente, através do emprego dos sintagmas nominais

“as infrações” e “as multas”.

48 Cf diagrama 10, anexo C, p. 393.

160

A articulação entre os segmentos 4 e 5 poderia também ser realizada por um

sintagma nominal através do qual fosse criado, no texto, um referente vinculado ao

contexto do Sistema Seae-SDE-Cade, como “os poderes”, por exemplo. No entanto, é a

reiteração do referente “Sistema Seae-SDE-Cade” pela expressão nominal definida “o

monstrengo” que realiza a articulação. Nesse caso, prevalece a avaliação que o produtor

do texto faz em relação ao que ele está dizendo, e ocorre a reativação do referente para o

desenvolvimento de um subtópico. Ao reiterar assim o referente, o produtor do texto

deixa transparecer sua posição em relação ao sistema, ou seja, trata-se de algo que, na

sua avaliação, não é bom.

(23)

[4 No Brasil, complicado sistema Seae-SDE-Cade (Secretaria de Acompanhamento Econômico do MF, Secretaria de Direito Econômico do Ministério MJ, e Cade) foi montado a pretexto de “defesa da concorrência”. Mas o que fez foi encobrir uma estapafúrdia combinação de objetivos de controle de preços e de intimidação das empresas privadas. No clima “antibusiness” da administração brasileira, infiltrada de petistas, a soma de poderes dados ao Cade equivale à doação de um revólver a lunáticos de asilo...]

[5 O monstrengo tem poderes para meter o bedelho em “aumentos injustificados de preços ” ou “imposição de preços excessivos”. Numa economia de mercado, quem julga os preços é o consumidor, e o único instrumento eficaz a respeito é a concorrência. E “preços excessivos” são criados pelo governo, via inflação.

Transformado em autarquia caríssima, o Cade ganhou poderes inquisitoriais como: “Requisitar informações de quaisquer pessoas, órgãos, autoridades públicas ou privadas”, e ter submetidos “à sua apreciação os atos que possam de qualquer forma prejudicar a livre concorrência”.]

[6 As infrações são expressas, no melhor estilo totalitário, de forma genérica e vaga, repleta de adjetivos e advérbios sem conteúdo preciso: “Aumentar arbitrariamente os lucros”, ou “exercer de forma abusiva posição dominante”. O art. 20 da lei 8884 chega ao cúmulo de criar a figura da infração “independentemente de culpa”! Relacionam-se 24 tipos de infração, dos quais apenas oito têm algo a ver com a preservação da concorrência, propriamente dita. Um proíbe “exclusividade para divulgação de publicidade aos meios de comunicação de massa” (como ficarão as nossas agências de publicidade?). Há outras idiotices como: “Açambarcar ou impedir a exploração de direitos de propriedade industrial ou intelectual ou de tecnologia” (lá se vai a Lei de Patentes!...); “abandonar, fazer abandonar ou destruir lavouras ou

161

plantações, sem justa causa comprovada” (milhões de agricultores todos os anos teriam de dar explicações ao Cade, porque o preço caiu ou o financiamento do Governo não chegou a tempo...); “vender injustificadamente mercadoria abaixo do preço de custo”; “interromper ou reduzir em grande escala a produção” ou “cassar parcial ou totalmente as atividades da empresa sem justa causa comprovada” (o empresário que quiser mudar de ramo ou fechar o negócio tem de pedir licença e “comprovar” a “justa causa”, que naturalmente é definida pelo arbítrio do Cade!) e “impor preços excessivos ou aumentar sem justa causa o preço do bem ou serviço”.] [7 As multas são brutais; 1 a 30% do faturamento bruto no último exercício, mais 10 a 50% sobre o administrador direta ou indiretamente responsável. Além de outras penas, como a proibição de contratar com instituições financeiras oficiais e participar de licitações por prazo “não inferior a cinco anos”, transferência compulsória de patentes do infrator, não parcelamento de tributos, transferência do controle acionário, venda de ativos, cessação parcial de atividade ou qualquer outro ato ou providência necessários... (sic). A pena de morte seria supérflua...]

(Artigo de opinião, E-149)

Até aqui mostrei a atuação do processo de reiteração do mesmo referente na

seqüenciação e na retomada tópica, em conformidade com os tipos de relações que se

estabelecem entre os segmentos tópicos: seqüenciação, retomada ou mudança.

Ocorreram no corpus, no entanto, alguns casos de articulação tópica pelo processo de

reiteração sem a existência de uma dessas relações. Ocorre que as condições de

produção do discurso fazem com que um mesmo tópico seja abordado várias vezes,

como se fosse um novo tópico, dando a impressão de segmentos dispersos na superfície

do texto. Dessa forma, o locutor não reitera o mesmo referente para orientar a atenção

do seu interlocutor para a retomada, mas como uma forma de repisar o mesmo tópico

que aparece ao longo do texto.

Na carta pessoal E-137, há um caso ilustrativo desse fato. O tópico

Entusiasmo é abordado várias vezes durante a carta, em segmentos descontínuos

(segmentos 1, 4, 10, 12, 19). O supertópico a que esse tópico se subordina é a

repercussão de uma carta anterior que a escrevente recebera da destinatária. Toda vez

162

que a escrevente sente esse entusiasmo, ela passa a falar dele na carta que está

escrevendo, que, inclusive é escrita, em momentos diferentes, como é possível perceber

através do trecho destacado em (24). Ao sentir o entusiasmo, inclusive quando retoma a

escrita da carta, a escrevente o percebe como um novo tópico, e, por isso, não é possível

afirmar que se trata de um processo de retomada. A forma adjacente como apresentei

esses segmentos, em (25), mostra como eles constituem uma unidade. Há aí a atividade

de representar seguidas vezes um mesmo referente discursivo, através da qual se

estabelece a articulação entre os segmentos: “ler sua carta”, “ler de novo”, “acabei de

ler”, processos realizados pela escrevente; “devorei-a”, “adorei”; e “sorrir”, “chorar”,

avaliações e manifestações emotivas da escrevente diante desses processos,

respectivamente.

(24)

Agora tenho muito o que fazer (hoje quarta-feira) no domingo (meu dia livre) eu termino com calma, detalhes, observações, novidades, conclusões... Até breve!!!! JÁ DEVO ESTAR VOLTANDO A ESCREVER! AGUARDE!!! EM BREVE, NA SUA CASA!!!!! Voltei, demorei mas voltei. (Carta pessoal, E-137)

(25)

[1 Acabei de ler sua carta, devorei-a, acho que vou até ler de novo. Sabe quando se quer saber logo tudo de uma vez, pois é! Ao terminar a carta, quer dizer, agora: estou tremendo, sorrindo, chorando, sentido algo muito estranho, por isso corri para escrever para você.] [4 Senti uma emoção enorme ao ler sua carta, adorei, parecia que estava falando com você!] [10 Acabei de ler (de novo!) sua carta. Adorei] [12 Não sei se com você é assim, mas quando chegam cartas aqui leio a primeira vez com tanta ânsia que certas idéias fogem e eu tenho que ler de novo, mais analítica e calma.] [19 Quero pegar nossas cartas, lê-las daqui a uns 20 30 40 ou 50 anos e ri, chorar, comentar, sentir saudades...] (Carta pessoal, E-137)

163

Os estudos que relacionam a estruturação da seqüência superficial do texto

unicamente com a presença de elementos formais, certamente, não conseguiriam

explicar a estruturação de textos como esse. Apenas, no caso de enunciados adjacentes,

é possível afirmar, com base nesses estudos, que a progressão temática se estabeleceria

apenas no nível do sentido e não no das relações entre constituintes lingüísticos

(MARCUSCHI, 1983).

Costa Val (1999, p. 07), por exemplo, registra que o nexo lingüístico que

garante que uma seqüência de frases possa ser tomada como um texto coerente não

“precisa estar explícito na superfície do texto por um mecanismo de coesão gramatical”.

“O nexo entre as frases se constrói não no nível gramatical, mas no nível semântico-

cognitivo” (1999, p. 08). Apesar disso, a autora considera necessária a explicitação dos

nexos, como forma de garantir a eficiência do discurso.

Entretanto, é inegável a utilidade dos mecanismos de coesão como fatores da eficiência do discurso. Além de tornar a superfície textual estável e econômica, na medida em que fornecem possibilidades variadas de se promover a continuidade e a progressão do texto, também permitem a explicitação de relações que, implícitas, poderiam ser de difícil interpretação, sobretudo na escrita. (COSTA VAL, 1999, p. 08-9).

Em oposição a essa perspectiva, a análise da articulação tópica, segundo o

modelo teórico que adotei, aponta para o fato de que a forma como se organiza a

superfície do texto não é e nem pode ser estável, porque está diretamente vinculada à

dinâmica interacional, através da qual o usuário da língua exercita sua competência

comunicativa.

164

As formas referenciais empregadas nessa atividade de reiteração de um

referente são constituídas por sintagmas nominais definidos, com ou sem

modificadores. Algumas dessas formas pode realizar ainda um processo de

recategorização, ou seja, as representações podem ser alteradas. Isso implica uma

reorganização de informações em que são expressos pontos de vistas e intenções

particulares do produtor do texto. A alteração dos objetos de discurso é feita em

conformidade com um saber disponível, de maneira a conciliar o novo e o retomado ou

de maneira a realçar partes ou propriedades do objeto de discurso que mais favoreçam

uma intenção comunicativa. É o que ocorre no exemplo (23), em que a representação do

“Sistema Seae-SDE-Cade” é alterada por “monstrengo”.

Segundo Koch (2002), quando uma forma nominal definida opera uma

recategorização ou refocalização de um referente, ela exerce, ao mesmo tempo, uma

função predicativa, isto é, veicula tanto informação dada, como informação nova. Nesse

sentido, na atividade de reiteração de um referente, as formas referenciais atuam tanto

no movimento de retroação como no de prospecção. O movimento retroativo é de base

anafórica, ou seja, na reiteração de um mesmo referente, há uma remissão a sua

ocorrência anterior, que se configura como fonte de anáfora49. É nessa remissão que

reside a articulação tópica.

Esse processo de reiteração de um mesmo referente, tratado aqui como

mecanismo de articulação tópica, guarda uma semelhança com o que alguns autores

consideram coesão lexical.

49 Emprego aqui, em conformidade com a perspectiva teórica sob a qual vejo a referenciação, colocada de forma sumarizada no início desse item, uma concepção estendida de anáfora. Segundo Marcuschi e Koch (1998), nem sempre a anáfora é pronominal, correferencial nem co-significativa. Também nem sempre retoma referentes e nem sempre tem antecedente explícito no contexto.

165

Halliday e Hassan (1980) apresentam a reiteração, repetição de uma mesma

unidade lexical ou ocorrência de uma unidade à outra relacionada, como um tipo de

realização da coesão lexical. Segundo Antunes (1995), a noção de reiteração de

Halliday e Hasan é demasiada genérica e não chega a dar conta das particularidades

distintivas que sua utilização assume. Por essa razão a autora distingue, no interior da

reiteração, a repetição e a substituição lexical.

A repetição está implicada “no fato de que, num texto, elementos

lingüísticos voltam a ocorrer, isto é, são duas ou mais vezes formalmente atualizados”

(ANTUNES, 1995, p. 86). No texto, podem se repetir lexias simples ou complexas e

seqüências de unidades, segmentos de frases ou frases inteiras. As unidades lexicais

podem re-ocorrer sem alteração morfológica, no que há uma repetição total, ou com

alteração, no que há uma repetição parcial.

Antunes destaca que, através da repetição, é cumprida uma determinada

intenção comunicativa, e é assegurada a continuidade tópica requerida pelo texto. Ou

seja, ela assume uma importante função na composição textual.

No que diz respeito à substituição, Antunes (1995, p. 92) a caracteriza da

seguinte forma: “como um expediente coesivo de natureza reiterativa, pelo qual se

permite a ligação entre dois ou mais segmentos textuais, através da variação lexical, ou

seja, através da substituição de um elemento por outro semântica ou discursivamente

equivalente”.

Para o reconhecimento das relações entre dois segmentos textuais em

condição de substituição lexical, Antunes se baseia nos seguintes critérios: a) os

166

segmentos guardam entre si uma relação sinonímica e têm, como tal, o mesmo sentido;

b) os segmentos guardam entre si uma relação de hiperonímia, dentro dos distintos

níveis de generalidade que esse tipo de relação admite; e c) os segmentos guardam entre

si uma relação de equivalência dada por algum tipo de caracterização nominal não

contida nas condições da sinonímia e da hiperonímia.

Quanto à natureza dos segmentos textuais em condição de substituição, a

autora estabelece que o segmento substituto é “uma unidade lexical, uma perífrase

sinonímica ou, no máximo, um grupo nominal” (1995, p. 59). Para não ficar na idéia de

que a substituição é apenas uma permuta de uma palavra por outra, Antunes frisa que o

segmento substituto pode retomar o conteúdo expresso em um parágrafo, em um ou

mais períodos, em um ou mais sintagmas e em uma ou mais unidades lexicais.

A substituição, assim como a repetição, segundo a autora, também constitui

um dispositivo de relevância lingüístico-discursiva orientado para o encadeamento de

seqüências textuais.

No entanto, a postulação de Antunes (1995) de que um determinado

elemento pode retomar o conteúdo de uma passagem maior de texto, que não seja

apenas uma unidade lexical, deixa de ressaltar as particularidades de dois processos

diferentes de atuação de formas referenciais na organização textual.

Por essa razão, especifiquei como “reiteração de um mesmo referente”

apenas a retomada, mais de uma vez no texto, pela mesma unidade lexical ou não, de

um mesmo referente pontualmente identificável no texto. Tal processo equivale ao que

Antunes (1995) considera repetição e, apenas em parte, ao que a mesma autora

167

considera substituição. Já o processo de substituição em que um elemento retoma um

conjunto maior de informação do texto, que não seja um referente pontualmente

identificável, eu considero um outro processo de atribuição de referentes, que será

discutido no item seguinte.

No que diz respeito à função do processo de reiteração do mesmo referente,

a minha análise confirma a relevância da reiteração na composição do texto, conforme

destaca Antunes (1995). No entanto, como venho apontando, o processo de composição

do texto não está dissociado do processo interacional. Se a elaboração referencial é

construída e negociada no próprio discurso, e é através dela que se estabelece a

articulação tópica, não se pode afirmar que a reiteração de um referente exerce apenas

uma função formulativa, mas formulativo-interacional.

4.2.2.3. Conferição de estatuto de referente a um conjunto de informações

difundidas no cotexto

Nesse processo de atribuição de referentes, um conjunto de informações

difundidas no cotexto anterior é erigido em referentes, que não apresentam, no universo

discursivo, antecedentes pontualmente delimitáveis. Esse tipo de elaboração referencial,

também ancorada no processo interacional, atua como mecanismo de articulação tópica,

estabelecendo seqüenciação e mudança.

Ao atribuir a um conjunto de informações o estatuto de referente, o produtor

do texto deixa transparecer seu ponto de vista em relação a essas informações. Esse é

um dos aspectos interacionais vinculados à conferição de estatuto de referente a um

conjunto de informações difundidas no cotexto como mecanismo de articulação tópica.

168

Ao sumarizar todo o conteúdo de tópico através de uma forma referencial, o produtor do

texto pode realçar uma parte desse conteúdo, avaliando-a.

Destaco, a seguir, um trecho do artigo de opinião E-149 em que esse fato

acontece. O tópico Penalidades previstas pelo sistema, segmentos 7, é sumarizado pelo

referente “arbítrio”. Por meio dessa sumarização, o produtor do texto introduz um

referente novo no discurso, sinalizando o início de um novo tópico. Ocorre, assim, tanto

o processo de sinalização da seqüenciação tópica, articulação entre os subtópicos

Penalidades previstas pelo sistema com Conseqüência do sistema para a economia

brasileira, segmento 850, como a explicitação da avaliação do articulista de que as

multas previstas pelo sistema Seae-SDE-Cade são arbitrárias, o que constitui o aspecto

do segmento 7 que é realçado.

(26)

[7 As multas são brutais; 1 a 30% do faturamento bruto no último exercício, mais 10 a 50% sobre o administrador direta ou indiretamente responsável. Além de outras penas, como a proibição de contratar com instituições financeiras oficiais e participar de licitações por prazo “não inferior a cinco anos”, transferência compulsória de patentes do infrator, não parcelamento de tributos, transferência do controle acionário, venda de ativos, cessação parcial de atividade ou qualquer outro ato ou providência necessários... (sic). A pena de morte seria supérflua...] [8 Tal arbítrio gera graves incertezas para os investimentos produtivos e a gestão normal das empresas, aumentando o bestial “custo Brasil”, que está nos empurrando para fora do mercado internacional.] (Artigo de opinião, E-149)

Através da condensação de um conjunto de informação já apresentadas, o

produtor do texto pode orientar também a atenção do seu interlocutor para a suspensão

ou fechamento de um quadro tópico e apontar para o desenvolvimento de um novo

50 Cf. diagrama 10, p. 393.

169

tópico, que pode ou não constituir um novo quadro tópico, caracterizando um processo

de mudança. Ocorre uma espécie de convite, ou seja, o interlocutor demonstra interesse

por um assunto e sugere que ele seja mais desenvolvido.

O trecho (27), uma passagem da entrevista escrita E-162, ilustra essa

questão. Ao elaborar a pergunta, o entrevistador cria um novo referente no discurso a

partir da condensação de um conjunto de informações anteriores, que constituem o

tópico Programas infantis, segmento 11. Esse referente, “campeões de chatice”, sinaliza

a finalização desse tópico, e, simultaneamente, a suspensão do quadro tópico

Televisão51, do qual constitui um desdobramento, ou seja, estabelece a mudança de

centração que ocorre entre os segmentos, articulando-os na linearidade do texto. O

recurso à forma referencial definida como expressão desse referente destaca também

uma avaliação do entrevistador acerca da informação condensada. Ele demonstra

concordar com o ponto de vista do entrevistado: a chatice de alguns programas infantis

da televisão brasileira.

(27)

VEJA –[11 O que você acha dos programas infantis da TV? BUSSUNDA - A Xuxa, a Angélica e a Mylla Christie são bonitinhas e inofensivas, gostaria que fossem babás da minha filha, mas os programas são de lascar. No Canta Conto, da TVE, a Bia Bedran conversa com o mar e ele responde, fala “oi, bondinho” para o bonde do Pão de Açúcar e ele retruca “oi, Bia”. Eu não deixo a minha filha ver uma coisa dessas de jeito nenhum. Em matéria de chatice, a Bia Bedran é o Oswaldo Montenegro de saias.] VEJA –[12 Quem são hoje os outros campeões da chatice no país? BUSSUNDA - Há vários tipos de chato. O Humberto Gessinger, do grupo Engenheiros do Hawaii, e o Gabriel o Pensador, por exemplo, são chatos do mesmo tipo: fazem música óbvia para que pessoas que nunca leram um livro se sintam inteligentes. Podem ser chamados de os chatos ginasianos. O maior chato do Brasil é, sem dúvida alguma, o Beijoqueiro. É o chato mala, que dispensa maiores explicações. Mas o pior tipo de

51 Cf. diagrama 05, anexo C, p. 386.

170

chato é o chato bêbado, que fica com um copo em uma das mãos e a manga da camisa alheia na outra. Foi esse tipo que me fez parar de sair à noite, porque sempre tinha um representante da categoria que vinha parar na minha mesa e contar uma piada nova que eu já conhecia há mais de cinco anos. Há também o chato dono da verdade, como o Agnaldo Timóteo - se acha um primor de inteligência e é o única que enxerga essa qualidade nele. Há os chatos de plantão, como o Amaral Netto e o Jair Meneguelli. E não se pode esquecer dos chatos centrados, tipo Mário Covas, que não dizem nada com uma firmeza impressionante.] (Entrevista escrita, E-162)

Os exemplos que comentei demonstram que, tanto a seqüenciação como a

mudança tópica, podem ser sinalizadas pela criação de um novo referente discursivo

que conduz um elemento avaliativo, que, por essa razão, exerce também a função de

instaurar um ponto de vista do produtor do texto. Mas podem ocorrer também, em

ambos os contextos, a criação de referentes sem função atributiva. Nesse caso,

compreendo que há uma explicitação da postura neutra do locutor em relação ao

assunto. No artigo científico E-020 ocorre um exemplo disso. Todo o quadro tópico

Posição da mulher no século XIX, segmentos 7 e 8, é retomado de forma sumarizada

pelo referente “nível de aspiração”, que, o articula ao quadro tópico seguinte Exclusão

da educação formal nacionalista, iniciado no segmento 9. Com esse processo de

atribuição de referente, o produtor do artigo orienta seu leitor para a mudança de quadro

tópico, mas, ao empregar um referente não avaliativo, cria também um efeito de

neutralidade, ou seja, ele se coloca de forma imparcial em relação ao tópico.

(28)

[7 A construção é enviesada na medida em que o século XIX foi essencialmente o período em que se cultuou a missão "natural" da mulher para o casamento, a criação dos filhos e vida no lar. Para evocar essa ideologia dominante escolheram-se citações do Opúsculo humanitário, de Nísia Floresta, não só por seu estatuto de pioneira do feminismo, como

171

por sua defesa do direito da mulher à educação, para não ficar em situação inferior à do homem, mas também para tornar-se mais apta a educar seus filhos e os alheios. Em 1853, com uma perspectiva afrancesada e positivista, ela deixou indicada a necessidade desse esforço de construção de uma unidade nacional: "Dissemos que não limitaríamos a nossa análise sobre a educação de nossas mulheres a esta ou aquela outra província, mas sim a todo Brasil. Nunca nos assomaram os epidêmicos delírios de mal-entendido orgulho provincial, funesto germe fomentado outrora entre nós por disfarçados inimigos da prosperidade desta grandiosa e rica peça, tão invejada pelos estrangeiros e tão ameaçada por seus próprios possuidores de perder em sua divisão o prodigioso valor que o seu todo constitui". Foi realmente depois de 1840 que surgiram os romances nacionalistas que vieram reforçar uma representação da realidade capaz de vincular a produção artística à realidade nacional, dentro de uma tradição literária. Tudo levaria a crer que o nacionalismo estivesse inteiramente ausente das preocupações femininas. Circunscritas ao círculo familiar e às obrigações cotidianas, restringiam-se a atividades domésticas e as religiosas quando se afastavam do círculo da família ou dos pesados encargos para sobrevivência. Toda uma literatura de louvação à mulher aponta nela virtudes "úteis" de capacidade de sacrifício, de dedicação e de fidelidade. Ao examinar escolas primárias e secundárias para mulheres no Brasil em 1853, Nísia Floresta considerou uma vantagem a educação dirigida pelas próprias mães, "em condições apropriadas para o que desejaríamos proporcionar a todas conhecimentos, aptidão e gosto, a fim de preencherem elas mesmas, como deviam, a honrosa e sublime missão de preceptoras de suas filhas e da mais útil amiga do homem".] [8 As mulheres de letras do século XIX insistem na necessidade de educar a mulher para que ela possa exercer com maior eficiência suas atribuições de esposa, mãe e mestra do homem. A luta em que se empenham é contra toda uma tradicional desconfiança da educação, que tiraria as mulheres de suas atribuições sagradas e "naturais". Ler romances, saber ler e escrever, exercer uma profissão fora de casa, gostar de escrever eram considerados deslizes perigosos, transgressões da "verdadeira" missão feminina que era casar e cuidar de filhos, obedecendo aos sucessivos amos e senhores. Como exprimiu Nísia Floresta: "Em vez de leitura de inflamantes e perigosos romances que imprudentemente lhes deixais livre, fornecei-lhes bons, escolhidos livros de moral e de filosofia religiosa, que formem o seu espírito, esclareçam e fortifiquem sua razão. A história, principalmente a de nossa terra, de que bem poucas se ocupam, é um estudo útil e agradável, mais digno de ocupar as suas horas vagas que certos contos de mau gosto, inventados pela superstição ou fanatismo ignorantes para recriar (sic) a mocidade sem espírito".] [9 Com esse nível de aspiração focalizado na unidade familiar e na procriação, não seria de esperar que as mulheres contribuíssem para a construção do pensamento nacionalista, nem fossem alvo de sua atuação. Dirigida para a guarda do lar, com todas as pressões ideológicas a estimular os corações maternos, desmerecendo qualquer colaboração mais ativa nos diversos setores da vida nacional, a mulher do século XIX viu-se excluída da construção educacional do nacionalismo realizada através dos livros didáticos de história pátria, que começaram a aparecer nos colégios masculinos. Eram histórias de um Brasil que surgia e se desenvolvia num espaço muito extenso e cheio de florestas, governado por um Estado unitário, resultante de uma

172

história comum dos diferentes tipos de convivência humana, mas, principalmente, masculina e referente ao domínio progressivo de portugueses e europeus. Não só as mulheres estavam excluídas dessa história, mas também todas as camadas subalternas - índios, negros e imigrantes. Elas apareciam apenas para permitir a vitória dos vencedores. (...) (Artigo científico, E-020)

Nesse três últimos exemplos, ocorre também recategorização, assim como

acontece no processo de reiteração do mesmo referente. Ao criar um referente novo no

discurso a partir de um conjunto de informações difundidas no cotexto, o produtor do

texto está também alterando a representação dessas informações. Os referentes

“arbítrio”, “campeões da chatice” e “nível de aspiração” reorganizam informações

anteriores, transformando-as, seja pela introdução de informação nova, como no caso de

“arbítrio, ou pela sua fragmentação, como é o caso de “campeões de chatice”.

A sumarização de um conjunto de informações em forma de referente novo

no discurso se presta ainda para o produtor do texto dá um enfoque preferencial a uma

determinada passagem do texto, e envolver o interlocutor na construção de um

argumento.

No trecho (29), a articulação entre o tópico Idéia de douta ignorância

(segmento 1) e o quadro tópico Funcionamento da pós-graduação no Brasil (iniciado

no segmento2) é estabelecida pelo demonstrativo “isso”, que, ao sumarizar as

informações anteriores, indica uma novo estágio de desenvolvimento do texto, ou seja, a

mudança de tópico. Esse demonstrativo dá um enfoque para essas informações,

destacando-as como uma justificativa para o desenvolvimento do tópico seguinte,

Funcionamento da pós-graduação no Brasil. Com esse enfoque, o produtor do texto

173

procura compartilhar com seu leitor a razão pela qual relaciona os dois tópicos: a

questão da “consciência dos limites do próprio saber”.

(29)

[1 No prólogo do segundo volume de seus Diálogos, São Gregório Magno escreve que ao desprezar os estudos literários iniciados em Roma, adotando a vida monástica, nosso pai São Bento preferia ser “doutamente ignorante e sabiamente insensato” (scienter nescius et sapienter indoctus). Reportava-se, evidentemente, à douta ignorância de que fala Santo Agostinho em carta à Proba. Mais tarde, Nicolau de Cusa definiu a expressão em seu livro de 1440 De docta ignorantia: “Nada podemos saber de Deus que, por ser infinito, está além de toda proporção com o finito, isto é, o homem”. Mas douta ignorância também se define, de modo genérico, como “a consciência dos limites do próprio saber”, como ensina Nicola Abbagnamo em seu excelente Dicionário de filosofia.] [2 Lembrei-me disso ao ler a reportagem da revista Veja sobre as misérias da pós-graduação no Brasil. Quando o professor Newton Sucupira escreveu seu histórico e lúcido parecer a respeito do assunto, advertiu as universidades para o perigo que podia transformar a pós-graduação num fracasso: o de contaminar-se com a impostura do chamado ensino superior entre nós. Como a voz do Batista, a de meu amigo Sucupira foi vox clamantis in deserto, porque as universidades não fizeram outra coisa senão abastardarem os graus de mestre e doutor. Temos, aliás, no Brasil, a triste tradição de desmoralizar palavras que, no estrangeiro, são quase sagradas. Já me referi, neste jornal, ao que acontece com filósofo, historiador, antropólogo e sociólogo, títulos com os quais são brindados entre nós, simples professores de filosofia, história, antropologia e filosofia.] (Artigo de opinião, E-257)

Esse enfoque pode ser dado tanto para um segmento recoberto por um

subtópico, como o exemplo do artigo de opinião E-257, num mecanismo de articulação

intertópica, como para conjuntos de enunciados que constituem um segmento em

particular, num mecanismo de articulação intratópica. É o que ocorre na passagem da

carta pessoal E-002, transcrita a seguir. O segmento 6 recobre o tópico Trabalho na

Furnas, em que o escrevente descreve parte de sua atividade profissional. O conjunto de

enunciados que se inicia com “Lá eu faço a previsão das chuvas” e segue até “Todos os

174

estados da região Sudeste e Sul ficam sem energia” é condensado, no conjunto de

enunciados subseqüente pela expressão referencial “por aí”. Essa expressão articula os

dois conjuntos de enunciados, assinalando a relação de seqüenciação que se estabelece

entre eles, e dá um enfoque para o conjunto antecedente, destacando-o como um

argumento para a idéia desenvolvida no conjunto subseqüente, ou seja, a importância da

profissão do escrevente. Instaura-se também um movimento de suposição do locutor de

partilhamento do interlocutor nesse argumento.

(30)

[6 Bem, já estou estagiando em Furnas Centrais Elétricas. É uma das empresas que gera eletricidade para o Brasil, com suas usinas hidroelétricas. Você deve estar pensando: mas porque eles querem um meteorologista? Lá eu faço a previsão das chuvas, ou seja, digo se vai chover e quanto vai chover em todas as cidades por onde passam os rios Paraíba do Sul e Grande. Com minha previsão eles sabem o quanto vão abrir as comportas das usinas. Assim a chuva não inunda as cidades. Imagine se eu digo que vai chover, eles abrem as comportas e na verdade não chove? A hidroelétrica fica sem água para transformar em energia elétrica e o que acontece? Todos os estados da região Sudeste e Sul ficam sem energia. Vou almoçar. Pronto, já almocei. Por aí você tira a importância da minha profissão. Muita gente pensa que meteorologia é só fazer previsão do tempo; mas esquecem que sem a meteorologia não haveriam alimentos, nem viagens de navio ou de avião. Já notou que sou fascinado por meteorologia, não é? Adoro minha profissão é super interessante.] (Carta pessoal, E-002)

Esse enfoque preferencial se relaciona também ao relevo, ou seja, fenômeno

que diz respeito a um destaque que o falante/escritor dá a determinados elementos do

texto, colocando-o em proeminência em relação a outro, ou a um rebaixamento,

ocultando determinados elementos em relação a outros (TRAVAGLIA, 1999). Segundo

Travaglia (1999), a proeminência caracteriza um relevo positivo ao passo que o

rebaixamento caracteriza um relevo negativo. Isso dá aos elementos do texto um

“status” proeminente, normal ou rebaixado.

175

Ao provocar a concentração da atenção do interlocutor em um determinado

tópico ou conjunto de enunciados, o produtor do texto assinala um relevo positivo, ou

seja, em favor de uma determinada orientação de sentido, criada na relação entre os

interlocutores, esse tópico ou esse conjunto de enunciados assumem maior importância

em relação aos outros, ganham posição em um plano mais elevado.

No que diz respeito aos elementos lingüísticos empregados no processo de

atribuição de referentes em questão, a análise revelou que os referentes são expressos

por sintagmas nominais definidos, pronomes demonstrativos e advérbios pronominais.

Esses dados vão, em parte, ao encontro da análise dos recursos lingüísticos que,

segundo Cavalcante (2001a), expressam a nomeação, noção proposta pela autora para

explicar a operação através da qual porções textuais de extensão variada são erigidas em

forma de referente.

Seguindo Apothéloz e Chanet (1997), Cavalcante (2001a) destaca que os

casos de nomeação manifestada por sintagmas nominais podem consistir de a) um nome

morfologicamente derivado de um verbo da proposição que fornece a informação-

suporte, como “alegar – a alegação”, “afirmar – a afirmação”; b) um nome que

evidencia o valor ilocutório ou perlocutório da enunciação, como “o aviso”, “essa

explicação”; c) um nome que transforma processos específicos em processos genéricos,

como “essa tarefa”, “a análise”; e d) um nome que exprime juízo de valor, como “essa

desculpa”, “esse preconceito”52.

52 As nomeações realizadas por sintagmas nominais são tratadas por Francis (1994 apud CAVALCANTE, 2001a) como “rótulos”.

176

Cavalcante (2001a) propõe que as nomeações realizadas por sintagmas

nominais se subdividem, ainda , conforme seus papéis discursivos, em três grupos: a) os

que introduzem um referente novo para o discurso, dotado de valor axiológico, mas

ancorado em pistas contextuais; b) os que instituem referentes novos, mas sem valor

axiológico, e que se caracterizam por apresentar nomes nucleares que representam

atividades lingüísticas, processos mentais e classes metalingüísticas, que realizam uma

classificação; e c) os que também instituem referentes novos, sem valor axiológico, e se

caracterizam por apresentar um nome genérico como “coisa”, “negócio”, “questão”, que

não exercem função classificatória, nem avaliativa.

No exemplo (26), o sintagma nominal “tal arbítrio”, composto por um nome

e um determinante, introduz um referente novo no discurso, que apresenta um valor

axiológico, ancorado em pistas contextuais. Embora não haja, no tópico anterior, um

antecedente pontualmente delimitável, a alusão a “multas brutais” e a “outras penas”, no

tópico anterior, se configura como uma “pista” para sustentar a interpretação referencial

de “arbítrio” e a conotação negativa de arbitrariedade. Além disso, o emprego do

demonstrativo “tal” permite que o interlocutor reconheça o referente como sendo

compartilhado. Assim como esse, muitos outros casos de sintagmas nominais

rotuladores empregados na articulação tópica, identificados na análise, são

contemplados pela classificação proposta por Cavalcante (2001a). Há, no entanto,

outros sintagmas nominais empregados na articulação tópica que não são previstos por

essa classificação. É o caso do exemplo (28), em que o núcleo do sintagma nominal

“esse nível de aspiração” não é um nome derivado de um verbo, não evidencia um ato

177

ilocutório ou perlocutório, não transforma processo específico em genérico, nem

exprime juízo de valor.

No que diz respeito aos papéis discursivos, a análise aqui desenvolvida

aponta também para outra interpretação. Ao separar em grupos diferentes nomeações

dotadas de valor axiológico, classificadoras e não avaliativas e não classificadoras,

Cavalcante (2001a, p. 6) afirma que, apenas no primeiro caso, ocorre indicação de uma

orientação de sentido por parte do produtor do texto. Segundo a pesquisadora, as

nomeações que contém valor axiólogico “desempenham uma função dupla, referencial e

atributiva”. As demais servem “apenas para encapsular informações” (2001a, p. 2).

Como mostrei, na análise do exemplo (28), o fato de o núcleo do sintagma nominal que

confere a um conjunto de informações o estatuto de referente não portar um valor

axiológico não significa que não haja função interacional. A não-avaliação é também

uma tomada de posição do produtor do texto, a de neutralidade.

O referente que sumariza um conjunto de informações pode ser expresso

também por pronomes demonstrativos, como o “isso”, no exemplo (29), ou advérbios

pronominais, como o “aí”, no exemplo (30). Segundo Cavalcante (2001b), nas

nomeações realizadas por pronomes, o produtor do texto não tem o trabalho de escolher

um nome que mais apropriadamente designe sua intenção comunicativa, como tem ao

realizar uma nomeação por meio de sintagma nominal. Para autora, as nomeações

pronominais despendem pouco esforço cognitivo e não acrescentam nenhum conteúdo

argumentativo. Nesse caso, os resultados desta pesquisa apontam também para uma

interpretação diferente. O emprego de uma pro-forma resumidora, demonstrativo ou

advérbio pronominal, não parece estar relacionado simplesmente a uma questão de

178

menor esforço cognitivo. As pro-formas, como mostrei na análise dos exemplos (29) e

(30) servem para dar um enfoque preferencial ao conjunto de informações sumarizadas

e atribuir a elas relevo positivo, exercem, portanto, também uma importante função

interacional.

Outro ponto que merece destaque no que diz respeito tanto aos sintagmas

nominais como aos demonstrativos e advérbios pronominais nessa atividade de

atribuição de referentes é o fato de que, ao encapsular as informações contidas no tópico

ou no enunciado anterior, essas formas referenciais fazem uma remissão a elas. Nessa

remissão se institui uma relação anafórica, porque são essas informações as pistas para

que a representação do referente criado e a percepção do ponto de vista do produtor

sejam interpretadas. É essa remissão anafórica que permite que as formas referenciais

possam ser empregadas como mecanismo de articulação tópica.

A comparação entre essa análise que fiz sobre o emprego das formas

referenciais que são utilizadas para conferir estatuto de referente a um conjunto de

informações difundidas no cotexto e a de trabalhos anteriores se aplica também aos

outros dois processos de referenciação anteriormente analisados. Portanto, a retomo

aqui como fecho deste item. Nos estudos anteriores sobre coesão referencial e processos

de referenciação, as formas referenciais são vistas sob dois ângulos, o da função textual,

quando atuam na organização do texto, e o da função pragmática, quando atuam “para

elaborar o sentido, indicando pontos de vista, assinalando direções argumentativas,

sinalizando dificuldades de acesso ao referente e recategorizando os objetos presentes

na memória discursiva” (KOCH, 2002, p. 106). Os resultados da análise aqui

desenvolvida mostram que a articulação tópica se estabelece com base nas relações

179

referenciais, que são textual e interacionalmente construídas. Assim, os fenômenos

distintos, estudados em trabalhos anteriores, aqui são concebidos de forma integrada, ou

seja, como fatos formulativo-interacionais, que estão imersos na materialidade

lingüística.

4.2.3. Emprego de formulações metadiscursivas

O que caracteriza o metadiscurso é a propriedade básica da auto-

reflexividade. Segundo Jubran (2002, p. 01), essa auto-reflexividade do metadiscurso

“promove a conjunção do que é dito com o ato de dizer, na medida em que referencia,

no corpo do texto, a atividade enunciativa que lhe dá origem”.

Os enunciados metadiscursivos têm um estatuto discursivo diferente do dos enunciados veiculadores de conteúdo informacional. “Enquanto esses atuam imediatamente no plano ideacional, aqueles atuam no âmbito da atividade enunciativa, tomando-a como objeto de referenciação” (JUBRAN, 2000, p.97). O fundamento dessa diferença, no entanto, não pressupõe que o metadiscurso esteja desvinculado do contexto em que se situa. Na verdade, ele exerce um papel importante no estabelecimento da significação de base informacional, porque a ancora no espaço discursivo que a gerou.

Como os mecanismos de articulação tópica descritos nos itens anteriores, as

formulações metadiscursivas atuam em contextos de seqüenciação, retomada e mudança

de tópico. Da mesma forma, a função textual dessas formulações de vincular na

linearidade textual segmentos tópicos ou enunciados que integram um dado segmento

não se dissocia de outras funções de natureza interacional.

Enquanto mecanismo de seqüenciação, essas formulações atuam, por

retroação, no amarramento, na superfície do texto, de subtópicos que integram um

mesmo tópico e de enunciados que compõem um segmento tópico em particular. No

trecho (31), destaco um exemplo ilustrativo de metadiscursivo que atua no nível

180

intertópico. Na articulação entre os tópicos Abordagens cogitadas, segmento 1, e

Abordagem adotada no artigo, segmento 2, a formulação “como se vê” constitui um

discurso e um comentário sobre o próprio discurso no qual está imersa, fato que a

caracteriza como metadiscursiva. Ao articular os dois tópicos, essa formulação exerce

uma função dupla, uma interacional e uma textual, porque chama a atenção do leitor

para o acompanhamento da progressão tópica do texto na medida em que toma como

escopo uma informação decorrente do primeiro tópico (as várias possibilidades de

abordagem do tema Aids) para encaminhar o segundo (a abordagem que será dada à

Aids no artigo).

(31)

[1 INTRODUÇÃO Ao refletir sobre o tema "Aids e Sexualidade", deparei-me com várias possibilidades de abordagem, todas igualmente interessantes e importantes para o conhecimento das relações entre a "epidemia do século" e a sexualidade humana. Poderia centralizar esta exposição nas implicações sociológicas provocadas pelo surgimento da Aids na alteração dos padrões ideológicos e nas condutas sexuais da população, desvendando os mecanismos que têm levado à estigmatização de certas minorias sociológicas identificadas como praticantes de comportamentos sexuais de risco, como os homossexuais masculinos, as pessoas promíscuas, as que vivem de prostituição, etc. Uma outra perspectiva sugerida pelo mesmo tema, seria aprofundar as reações psicológicas provocadas por esta síndrome no comportamento sócio-sexual dos indivíduos: em que medida o medo da contaminação pelo vírus da Aids, o HIV, tem modificado os hábitos sexuais da população em geral, provocando novas ansiedades ou neuroses coletivas, a "Aidsteria", sobretudo nos chamados grupos de risco, receosos não só da contaminação, mas também de terem seus "desvios" sexuais clandestinos tornados públicos no caso de virem a contrair tão estigmatizante doença. Cogitei ainda um terceiro enfoque para este mesmo tema, "Aids e Sexualidade": os efeitos econômicos desencadeados pela epidemia no universo da sexualidade. Poderia começar pelo nível macroeconômico, trazendo à baila a polêmica discussão sobre a paternidade do HIV: seria um vírus criado pelos laboratórios capitalistas, para dizimar populações indesejadas, e vender medicamentos para seu tratamento, ou tratar-se-ia de um vírus inventado pelo bloco comunista e disseminado secretamente pela KGB no Metrô de Nova York a fim de destruir o rival libertino? Ou então, deslocando a analise para a esfera microeconômica: que efeitos perversos a Aids vem provocando na indústria do

181

sexo, com o fechamento ou drástica redução orçamentária dos motéis, saunas e das diferentes formas de prestação de serviços sexuais? Ou ainda: quais os efeitos desta epidemia mundial no mercado de preservativos, lubrificantes e demais produtos destinados ao novato "sexo sem risco''?] [2 Como se vê, inúmeras alternativas teóricas ou empíricas se apresentam ao estudioso a partir deste único tema. Após refletir sobre estas três possibilidades de relacionar Aids e Sexualidade - a sociológica, a psicológica e a econômica - decidi concentrar minhas indagações num nível mais pragmático- ou profilático, se preferirem - perspectiva inquestionavelmente mais excitante que as anteriores. (...) (Artigo científico, E-053)

No exemplo (32), a formulação “acrescente-se”, ao indicar que a informação

contida no enunciado no qual ela ocorre tem um estatuto de adição de mais informação,

sinaliza a estruturação do discurso, ou seja, faz referência ao próprio discurso. Trata-se,

pois, de um fato metadiscursivo. Essa formulação marca a seqüencialidade intratópica,

exercendo uma função articuladora, através da soma do enunciado “a mulher escrava

sequer era considerada mulher” aos enunciados anteriores. Esse enunciado constitui

mais uma informação importante na construção do tópico Indefinição da idéia de

brasileira sobre a mulher, segmento 4. Do ponto de vista interacional, esse

procedimento metadiscursivo exerce a função de conduzir o leitor para a apreensão do

movimento de raciocínio que o escritor faz na montagem dessa parte do texto.

(32)

[4 Se bem que visto de fora e de longe o Brasil ganhasse mais facilmente uma unidade, a análise do material escrito sobre a mulher brasileira esbarrou na indefinição do que seria a brasileira. Não são consideradas, nem se consideram, mulheres brasileiras todas aquelas que habitavam as terras do Brasil. Em alguns casos, acrescente-se, a mulher escrava sequer era considerada mulher. (...) (Artigo científico, E-020)

182

Ainda no contexto de seqüenciação, tanto intra como intertópica, merece

destaque a função interacional das formulações metadiscursivas de indicar o estatuto

discursivo do segmento ou do enunciado que elas escopam. O artigo científico E-053

pode ser tomado como um exemplo disso. O último parágrafo do tópico Liberação do

discurso sexual, segmento 5, destacado em (33), começa com a formulação

metadiscursiva “em resumo”, que, numa relação intratópica, articula os enunciados

desse parágrafo aos precedentes, sinalizando que ele tem um estatuto discursivo

diferente dos anteriores, ou seja, o de síntese das informações anteriormente expostas.

Enquanto os enunciados anteriores desenvolvem o tópico, o conjunto que integra o

último parágrafo resume esse tópico.

Nesse mesmo artigo, o subtítulo “concluindo”53 constitui uma formulação

discursiva indicadora da composição textual que, interacionalmente, localiza o leitor em

relação aos passos de construção do texto. Esse subtítulo articula o quadro tópico Lições

tiradas da relação Aids x sexualidade, segmentos 8 e 954, aos quadros tópicos

anteriores. Nesse movimento, ocorre a orientação do leitor para o fato de que esse

quadro tópico tem o estatuto discursivo de fecho do texto e de conclusão sobre o tema,

que o diferencia do teor informativo dos demais.

(33)

[5 DESBLOQUEIO DO DISCURSO Já é clássica a oposição proposta por Michel Roucault, de um lado a ''ars erótica" das civilizações orientais, onde a verdade do sexo é extraída do próprio prazer, e a sexualidade encarada como busca da satisfação máxima; do outro lado, a "scientia sexualis", típica do nosso mundo ocidental, onde a verdade do sexo se obtém a partir da 53 Cf. íntegra do artigo, anexo B, p. 276. 54 Cf. diagrama 13, anexo C, p. 396.

183

prática do discurso sexológico, em função de uma forma de poder-saber que tem na confissão seu principal fundamento. (...) Num dos primeiros folhetos produzidos pelo Ministério da Saúde, intitulado "Aids, quanto mais você conhece, mais pode evitar", na parte dedicada ao sexo sem risco, podemos ler: "A forma mais segura que se conhece para evitar o contágio da Aids é o uso do preservativo de borracha, a camisinha. Com ela o vírus não entra em contacto com o órgão genital do parceiro. Homem ou mulher, estabeleça o uso do preservativo nas suas relações. Converse com seu parceiro. Deixe claro que não é uma questão de desconfiança, mas um meio seguro de prevenir a doença". Em resumo: malgrado a forte oposição dos setores mais moralistas de nossa sociedade, notadamente da CNBB, informações detalhadas sobre o sexo sem risco passaram a fazer parte integrante de todas campanhas contra a Aids tornando a sexualidade tema muito mais freqüente de conversa e discurso do que no período da decantada euforia da revolução sexual. Nunca se falou tanto de sexo como depois da Aids: nas prateleiras das livrarias os livros sobre sexo aumentam dia a dia; cursos e conferências sobre educação sexual tornaram-se moda; o sexo por telefone, ou através do computador ganha mais adeptos nos países mais modernos. Finalmente, a língua travada por tantos séculos, foi liberada. Somos contemporâneos da "desnefandização" da sexualidade: o que era proibido falar tornou-se tema de conversas, músicas, manchete dos jornais. Com a Aids, a scientia sexualis tornou-se objeto de consumo universal: falar abertamente sobre sexo faz parte da profilaxia da epidemia do século. Nos Estados Unidos, campanhas enfatizam a urgência de dialogar sobre sexualidade com todos os grupos, inclusive com as crianças e adolescentes: ' Você está falando sobre Aids com as crianças?" é a frase de um broche (botton) muito distribuído na última Conferência Internacional de Aids em S. Francisco.] (Artigo científico, E-053)

Em contexto de retomada de tópico após inserção tópica, uma formulação

metadicursiva constitui, assim como algumas formas referenciais, um recurso de

compensação da descontinuidade na linearidade discursiva. Nesses casos, há um

processo de referenciação, no interior do próprio texto, da sua montagem. As retomadas

tornam-se, portanto, evidentes: o falante/escritor verbaliza a sua atividade enunciativa

de retorno a um tema já abordado. Como a reintrodução do tópico é explicitada na

superfície do texto, o locutor, muito mais do que sinalizá-la para o seu interlocutor,

convida-o a compartilhar dela.

184

Um exemplo disso pode ser observado na conversação espontânea D2-30. O

tópico Política e Economia, é introduzido no diálogo, no segmento 4. Através do

diagrama55, é possível perceber que esse tópico sofre duas inserções tópicas. No

segmento 6, ocorre a interpolação de parte do tópico Trabalho. No segmento 9, ele é

retomado, e mais uma vez interrompido no segmento 15, com a inserção de quatro

outros tópicos Cinema, Hábitos do homem moderno, Pegadinhas do programa “Topa

tudo por dinheiro” e Morte de Airton Senna, que é concluído no segmento 22, com o

subtópico Vida pessoal de Airton Senna. Nesse ponto, o tópico Política e Economia é

novamente retomado.

Nesse processo de retomada, o tópico Aspectos da novela Pátria Minha,

segmento 23, se liga, por retroação, ao quadro tópico Administração pública, que havia

sido suspenso no segmento 14, através da formulação “voltando aqui um pouco assim

na política né?”. A auto-reflexividade metadiscursiva é dada pelos elementos

“voltando”, que deixa de indicar movimento de regresso no espaço físico, para

referenciar retroação no espaço discursivo, ou seja, no interior do texto; e “aqui”, que

reforça a referência ao interior do texto como espaço discursivo, pois não se comporta

como advérbio circunstancial de lugar exofórico. Dessa forma, o locutor faz referência

ao próprio discurso, sinalizando aspectos da sua construção.

Além desse, um outro procedimento metadiscursivo, o de fazer menção ao

tópico reintroduzido, completa a formulação. Ao dizer “na política”, o locutor anuncia a

centração do segmento, evidenciando também a construção do texto. Como esse tópico

já tinha sido abordado anteriormente, essa nomeação confirma a retomada.

55 Cf. diagrama 15, anexo C, p. 398.

185

Os movimentos de sinalização metadiscursiva de retomada e de nomeação

do tópico funcionam interacionalmente como orientadores da condução do intercâmbio

comunicativo. Ocorre ainda a manifestação da atitude de um dos locutores de evitar o

esgotamento da conversa ou que ela fique centrada apenas em um ponto que não

desperta mais interesse nos demais participantes. No final do segmento 22, a alternância

de turnos entre os dois informantes se torna repetitiva. Eles fazem a mesma afirmação,

“mas ela nem tchum pra ele...”, o que revela que o tópico já apresenta sinais de

esgotamento. Para manter a conversa em movimento, a documentadora propõe o retorno

ao tópico que já havia sido abordado e abandonado em outros pontos do diálogo.

(34)

[22 (...) mas a Xuxa meu filho de besta... que num quis ele naquela é/ "AI foi o homem certo na hora errada" que história de homem certo na hora errada menino quando tem que dar:: certo dá é tudo certo... negócio DUvido... que vem de história de homem homem errado na hora certa homem certo na hora errada... quando tem que... que emplacar emPLAca num tem esse negócio de por MAIS tempo que ela tenha ou tempo que ela... deixe de ter sei lá... isso aí é o de menos Inf. 1 - ela achava que ele era pa/ ser agora é? Inf. 2 - era... ia muito bem bonito... o Ayrton Senna ia esperar a Xuxa bonitim ia ficar só correndo ((imita o barulho do motor de carro)) pa/ cima e pa/ baixo bufo-bufo... fazia nada... aí ploft né? e o pobre... e ela lá só:: cantando né?... todo dia ((vozes incompreensíveis)) aquelas besteira de Xuxa Inf. 1 - fazia programa no MUN{do todo... Inf. 2 - é:: fazia no mundo todo Inf. 1 - {( ) Inf. 2 - e o desgraçado só correndo ((imita o barulho do carro)) e {morre Inf. 1 - ((riu)) Inf. 2 - ...ficou morre num morre morre num morre morre o amigo na pista e vai e faz... e LÁ aí depois quando ela decidiu-se... bonitinha "/tô aqui Ayrton venha" Inf. 1 - ela:: {ela conta... Inf. 2 - bonito Inf. 1 - que era um naMORO no no {começo ((riu)) tinha u::ma coisa Inf. 2 - ((tosse)) Inf. 1 - que era um negócio bem gozado ela mandava ele mandava um avião ela vinha... num sei pra onde aí eles iam aí era um negócio assim todo compliCAdo... Doc.1- ((riu))

186

Inf. 1 - negócio de avião pra cá avião pa/ lá os dois /tavam sempre... na na... nas PONtas aí viajando... Inf. 2 - é mas fica até mais romântico mesmo né?... se ela pudesse curtir... realmente... mas ela nem tchun pra ele... Inf. 1 - nem tchun pra {ele... ((risos)) Inf. 2 - nem tchun ((risos))] [23 Doc.2- voltando aqui um pouco assim na política né? essa novela Minha PÁtria que /tá passando agora... vocês acham que ela veio {be/ beneficar ou... Pátria minha Inf. 1 - Pátria minha não... ((riu)) Doc.2- /brigado pela retificação ...eh:: vocês acham que ela veio pra beneficiar:: o F. H. C.?... Inf. 2 - não... tu acha que {veio H.? Inf. 1 - eu acho Inf. 2 - tu acha? eu num acho não Inf. 1 - eu Acho que:: o que vier daqui pa/ frente Inf. 2 - tu acha que vai ser tudo isso? Inf. 1 - vai... o que vier {daqui pa/ frente] [24 Inf. 2 - eh:: agora eu faço como o T. "não me VEnha com FAL::so mora{lis::mo:: diz né? T. Inf. 1 - não o que o T. diz o que {o que... NÃO... não o que o T. quis dizer... é exatamente Inf. 2 - que o plano eleitoreiro se fôssemos nós faríamos a mesma coisa Inf. 1 - o que o T. ... quis dizer o seguinte não é que o PLAno... não seja eleitoreiro {o plano É eleitoreiro aGOra o que ELE quis Inf. 2 - o plano É eleitoreiro mas SÓ que Inf. 1 - dizer... Inf. 2 - qualquer {um faria Inf. 1 - que se QUALQUER um que tivesse naquele luGAR {TAMBÉM faria um plano eleitoreiro MAS o plano É eleitoreiro Inf. 2 - fa/ também faria a mesma coisa... lógico que faríamos você faria eu faria... todo mundo faria Inf. 1 - aGOra... a a:: aquela novela... vai mosTRAR... o OUtro lado do Brasil... que dá certo né?... o LAdo que dá certo... o LAdo que num é corrupto o LAdo que é honesto... né? Inf. 2 - é porque o José Maia né? quando voltar aí voltou a mulher dizia que num ia voltar porque o Brasil tinha verGOnha de dizer que era brasileiro e tal... ele DIZ ele não ele já HONra {né? o nome do PAÍS... Inf. 1 - e é exatamente isso que Inf. 2 - maraviLHOso... e ta Inf. 1 - estão pregando né? Inf. 2 - eh:: e tem de tudo na {novela (...)

(Conversação espontânea, D2-30)

187

As formulações metadiscursivas realizam também a articulação em

contextos de mudança tópica, tanto entre tópicos integrantes de um mesmo quadro

tópico, como entre quadros tópicos de níveis hierárquicos diferentes. O procedimento

metadiscursivo permite que, além da indicação da mudança de centração, o locutor

também anuncie o novo tópico, direcionando para ele a atenção do interlocutor. No

trecho da carta pessoal E-002, destacado a seguir, a mudança de centração que ocorre na

passagem do segmento 8, fragmento do tópico Viagem para Recife, para o segmento 9,

tópico Rotina, é indicada pela formulação “agora, a minha rotina”. Através do “agora”,

que tem como ponto de referência o momento do texto no qual se inicia o tópico, o

escrevente marca pontualmente esse momento, em uma atividade de auto-reflexividade

metadiscursiva. Com a nomeação do tópico, “a minha rotina”, ele realiza outro

procedimento metadiscursivo, através do qual seleciona o tópico, preparando o seu

leitor para recebê-lo.

(35)

[8 Não sei ao certo se vou ou não, mas fique certa que farei de tudo para conhecer vocês o mais rápido possível. Posso te dizer uma coisa? Adoro muito vocês!] [9 Agora, a minha rotina: Às segundas, quartas e sextas-feiras trabalho de 8:00 às 17:00h, em Botafogo - Rio. De lá vou para o CEFET, minha aula vai de 18;30 às 22:40h. Chego aqui em Niterói quinze para meia-noite. E às terças e quintas fico em Furnas só de 8:00 às 12:30h. Vou para o CEFET; às 13:30 começa o meu curso de Francês (vou me formar ano que vem ) e vai até 15:30h. 16:00h vou dar aula e fico até 17:30h. 17:40h às 18:30h faço natação ( no CEFET também ) e até 22:40h tenho aula. É barra, por aí você vê porque eu demoro tanto a escrever. E ainda nas horas vagas estudo para o Vestibular!] [10 Ontem eu e Simone fizemos 3 meses de namoro; você sabia que eu estava namorando? Ela mora aqui mesmo no ((ilegível)) (nome do condomínio). A gente se gosta muito, às vezes eu acho que nunca vamos terminar, depois eu acho que o namoro não vai durar muito, entende? O problema é que ela é muito ciumenta, principalmente porque eu já fui a fim da Betinha, que mora aqui também. Nem posso falar com a garota que Simone já fica com raiva. Ontem mesmo, só porque eu cheguei da janela e, como ela foi a 1 pessoa que eu vi, pedi que me esperassem (fomos à Kool Ibiza ); só que Simone estava perto e, sinceramente, não a vi. Senão é claro que teria

188

falado com ela que é minha namorada. Acabamos brigando, depois ficou tudo bem. Vamos ver!] (Carta pessoal, E-002)

Além desses procedimentos metadiscursivos empregados na articulação

tópica em contexto de mudança, ocorre também o de fazer menção ao tipo de atividade

discursivo-enunciativa que será realizada durante a construção do tópico. É o que

acontece na palestra F-033, com a formulação “analiso agora o problema da

conciliação”. Além dos procedimentos metadiscursivos realizados pelo “agora”, que

indica o momento do texto em que se inicia o tópico, e pelo “o problema da

conciliação”, que o seleciona e nomeia, ocorre a indicação do fato de que o tópico será

abordado a partir de uma postura analítica do enunciador. Esse procedimento está

presente no “analiso”, que faz referência a essa postura, explicitando-a. A formulação

metadiscursiva, que é constituída por uma unidade frasal que comporta diversos

recursos metadiscursivos, articula o tópico Aplicação no caso do segurado 663681-

04/43, segmento 8, ao tópico Conceitos, segmento 9, ambos subtópicos de quadros

tópicos diferentes. Nesse movimento textual articulador, o palestrante orienta os seus

ouvintes para a mudança de tópico, prepara-os para o tópico seguinte e destaca a postura

analítica que irá adotar.

(36)

[8 pergunto aos senhores ao segurado meia meia três meia oito um traço zero quatro barra quarenta e três...o direito material sim... profundamente porque foi reconhecido o direito a revisão: na sua/ nos seus proventos de aposentadoria ↓agora vem o processo civil através de suas amarras e por oito anos... após cinco anos de luta de direito e material e: e formal (0.2) e: nega à aplicação deste direito justo (0.3) temos que rever (0.2) estes aspectos... viu (0.3)e fazer com que (0.3) o processo civil... encontre... soluções (0.3) hoje buscadas embora de modo TÍMIdo do meu entender... pela reforma

189

que se iniciou do do no final de mil novecentos e noventa e quatro ↓ ou e: meses e meses antecedentes mais de qualquer maneira é uma esperança viu... que :: (0.2) modificações ocorra o tempo faz com que: e e olho aqui para o relógio e vejo que só estão: me fal/ só estão:... me restan:do cinco minutos ↓ (0.3)] [9 analiso agora o problema da conciliação (0.4) nós sabemos que: todos nós sabemos e defendemos... que... (0.4) o estado democrá:tico (0.3)defendido e implantado na constituição federal deve construir uma sociedade fraterna ↓ fundada na harmonia social e comprometida das soluções pacíficas das controvérsias... tais valores entre tantos outros (tosse) estão postos a carta magna nunca foram merecedores de destaque do ordenamento jurídico processual brasileiro por exemplo... o valor de haver harmonia social do processo ser dirigi:do para imposição: da harmonia social através da conciliação...vejam que no preâmbulo da carta magna... viu... estará a pregação de que a função do estado brasileiro é resolver na ordem interna os seus confli:TOS através da conciliação como também na ordem... na ordem externa ↓...] (Palestra, F-033)

O emprego de formulações metadiscursivas na articulação tópica mostra,

assim como os outros mecanismos já analisados, como fatos interacionais e

formulativos se congregam e se materializam na superfície do texto. Cabe aqui uma

comparação com a análise que Borillo (1985) propõe para o metadiscurso. Segundo esse

autor, há três tipos de modalidades de intervenções metadiscursivas: a) as que fazem

referência ao discurso para explicar o código usado na construção do texto; b) as que

fazem referência ao discurso como fato enunciativo para explicar suas condições

dialógicas; e c) as que fazem referência à própria construção do discurso, sinalizando

sua estruturação. Essa separação entre procedimentos metadiscursivos interacionais e

textuais subjacente às modalidades do tipo (b) e (c) não condiz com uma perspectiva

teórica que integra formulação e interação. No exemplo (32), apesar de ser mais

evidente a função textual da formulação “acrescente-se”, porque sinaliza a construção

do discurso, ela não deixa de exercer uma função interacional, condução do leitor para o

movimento do raciocínio do escritor. Por outro lado, o procedimento metadiscursivo

190

realizado pelo “analiso”, no exemplo (36), não deixa de exercer uma função textual

articuladora, embora pareça predominantemente interacional, por se destacar a

indicação da postura analítica do escritor na construção do texto.

Outra questão que emerge da análise das formulações metadiscursivas na

articulação tópica é a relação entre elas e a classe dos marcadores discursivos

prototípicos. Segundo Risso, Silva e Urbano (1996), esse tipo de formulação está entre

as unidades limítrofes, que estão passando por um processo de gramaticalização, em

direção à classe dos marcadores. A partir da comparação de alguns dos exemplos

comentados neste item, é possível aceitar essa hipótese. As unidades “analiso agora o

problema da conciliação”, do exemplo (36), “agora, a minha rotina”, do exemplo (35) e

o “agora”, no exemplo (14), do item 4.2.1.4, que atuam prospectivamente em contexto

de mudança tópica, sugerem etapas de passagem de uma unidade limítrofe para uma

prototípica, dentro da classe dos marcadores. No que diz respeito à massa fônica, ocorre

uma gradativa diminuição de itens lexicais, de uma unidade frasal completa para apenas

um item. A reincidência de “agora” é maior, e esse elemento é mais opaco do ponto de

vista semântico. Já no que diz respeito à articulação tópica e orientação para a interação,

essas unidades apresentam os mesmos traços, articulador tópico e basicamente

interacional, respectivamente. Essa gradação de características sugere um percurso de

discursivização que tem como ponto de partida uma formulação metadiscursiva, em

função textual-interativa, e de chegada um marcador discursivo.

A função textual-interativa do procedimento metadiscursivo é enfocada por

Jubran (2002). Em um estudo sobre marcadores metadiscursivos provenientes da classe

de numerais, como “em primeiro lugar”, “ponto um... ponto dois”, a autora mostra que

191

esses marcadores assumem duplamente funções textuais: indicar estruturação tópica, e

interacionais, marcar relevo, por exemplo. Os resultados da análise desenvolvida neste

item ampliam para um contexto metadiscursivo maior, o das formulações, a constatação

de Jubran (2002), que é feita sobre um procedimento específico, o de um grupo de

marcadores. Por outro lado, esses resultados ressaltam o papel das formulações

metadiscursivas com função textual articuladora, o que constitui um elemento a mais

para a compreensão da organização do texto, e do próprio metadiscurso em especial.

4.2.4. Emprego de perguntas

As perguntas constituem um dos componentes do denominado par adjacente

Pergunta-Resposta, considerado uma unidade dialógica mínima (SCHEGLOFF e

SACKS, 1973). A pergunta é comumente definida como um enunciado que pode exigir

uma resposta. Mas, neste trabalho, o critério que serviu para identificar um enunciado

como uma pergunta foi a sua atualização em um contexto particular, caracterizado por

pronomes interrogativos, entonação ascendente e o ponto de interrogação56.

Segundo Urbano et al. (1993), existem dois grandes tipos de perguntas: as

de sim ou não e as sobre algo. O que caracteriza o primeiro tipo é o fato de que ele gera

no ouvinte a interpretação de que a resposta deve ser “sim” ou “não”, ou seja, uma

resposta fechada. Já o segundo tipo é a imprevisibilidade da resposta, que passa a ser

aberta.

A análise dos textos revelou que as perguntas abertas atuam na

articulação tópica, exercendo funções textuais-interativas. Esse mecanismo é mais

56 Na transcrição dos textos falados, a interrogação é também marcada pelo ponto de interrogação. Cf. normas de transcrição dos textos falados, no anexo D, p. 415.

192

recorrente nos contextos de mudança, mas também ocorre, embora com bem menos

freqüência, nos contextos de seqüenciação e retomada tópica.

No caso da mudança, a pergunta atua no nível intertópico. A mudança de

tópico constitui um contexto em que atuam também outros mecanismos de articulação

tópica, como já mostrei nos itens anteriores. Uma das características das ocorrências de

mudança desencadeada por perguntas é o estabelecimento de um movimento de

gerenciamento específico do tópico. De forma geral, em textos falados, sobretudo em

entrevistas, um dos locutores detém um controle maior sobre a introdução dos tópicos e

exerce o poder de avaliar o grau de completude ou pertinência das respostas. Ao

perceber, por exemplo, que um determinado tópico já foi suficientemente abordado, o

locutor passa para o tópico seguinte, que, inclusive, já pode estar previsto na agenda

tópica que orienta o seu desempenho no discurso. Em outros gêneros textuais, como a

conversação espontânea, por outro lado, o movimento de gerenciamento do tópico é

diferente. Os locutores discorrem e opinam sobre diferentes assuntos, sem qualquer

planejamento prévio, e têm, teoricamente, o mesmo papel na condução dos tópicos.

Como nos outros mecanismos de articulação tópica em contextos de

mudança, as perguntas exercem a função de orientar a atenção dos interlocutores para o

fato de que cessa um tópico e que outro será iniciado. Nessa orientação de mudança, é o

locutor quem aponta o novo tópico que deve ser desenvolvido. O trecho a seguir é um

exemplo ilustrativo dessa função textual-interativa do emprego de pergunta na

articulação tópica. Os tópicos Fonte de inspiração, segmento 4, Motivo do sucesso,

segmento 5, e seleção de matérias, segmento 6, são articulados, na linearidade do texto,

193

por perguntas abertas, através das quais o entrevistador seleciona o tópico e guia o

entrevistado para a mudança.

(37)

VEJA –[4 Qual a maior fonte de inspiração da turma do Casseta e Planeta? BUSSUNDA - Estamos num fase muito boa. Os políticos têm colaborado muito, Brasília tem dado ótimas pautas. No ano passado, o ponto alto foi a CPI da Corrupção e o João Alves foi o patrono dos humoristas, mas saturou um pouco. Agora, estamos esperando o suicídio dele; afinal o político tem que honrar suas promessas. O PC Farias também ajudou bastante, porque, além de ser ladrão, é careca. Neste ano, os humoristas torcem pela candidatura do Esperidião Amin para a gente ficar quatro anos fazendo piadinha de careca. A gente vai poder até tirar férias e colocar uns iniciantes para fazer piadas no nosso lugar. VEJA – O governo Itamar Franco não é bom de humor? BUSSUNDA – No governo Collor, havia personagens muito fortes, que rendiam muita piada. O Itamar prestou um desserviço aos humoristas: montou um ministério de desconhecidos. Por causa de seu estilo centralizador, a gente está com um problema dentro do grupo Casseta e Planeta. O Reinaldo, que interpreta o Devagar Franco, não era muito conhecido de o Itamar substituir o Collor. Agora, ficou muito famoso, é reconhecido nas ruas e está entrando em crise porque o Itamar vai sair do governo. Ele pretende até defender a possibilidade de reeleição do Itamar na revisão constitucional. O Itamar dá caldo em matéria de humor, mas, na época do Collor, da Zélia, nós fazíamos graça em cima do comportamento deles. Com o Itamar, a graça é em cima do que ele não faz.] VEJA –[5 Qual o motivo do sucesso do programa de vocês? BUSSUNDA - Fazemos humor com atualidade. A televisão despertou há pouco tempo para a febre do jornalismo. A concorrência nessa área é a maior que existe na TV. A gente faz a paródia do jornalismo, uma coisa que funciona muito bem. Todos os outros programas de humor, como vêm da época do rádio, já têm um formato muito conhecido e brincam só com os costumes. É muito raro pegarem pela atualidade. A gente trabalha quase como num programa jornalístico. Temos a pauta do mês, e a agilidade é importante. Às vezes, fazemos matérias dois dias antes de o programa ir ao ar. Essas matérias fazem muito sucesso. O segredo está aí.] VEJA –[6 Como vocês selecionam as “matérias” que vão ao ar? BUSSUNDA - Só fazemos piada com o que deu no Jornal Nacional, porque a gente sabe que o nosso público é o que assiste à Globo e o grau de informação que ele tem é aquele. Não adianta fazer uma piada sobre o Gerald Thomas na TV, porque a maioria do público não sabe quem ele é.] (Entrevista escrita, E-162)

194

Na indicação da mudança de tópico, os dados mostram que as perguntas

podem ser prefaciadas, ou seja, podem ocorrer preâmbulos à proposta de centração, o

que também é bastante comum em entrevistas. Destacou-se, na análise, o tipo de

prefácio constituído por uma referência intertextual. No exemplo a seguir, a pergunta

“O que isso significa?” assinala a mudança de centração e articula os tópicos O

presidencialismo, segmento 3, ao tópico Responsabilidade do Congresso Nacional,

segmento 2, pertencentes a diferentes quadros tópicos. A pergunta é prefaciada por uma

referência, feita pelo entrevistador, a um discurso proferido pelo entrevistado há um

tempo anterior à entrevista. Esse prefácio, que traz para dentro do texto uma opinião

manifestada pelo entrevistado em outro momento e em outra situação comunicativa, cria

para ele uma condição que lhe propicia desenvolver o tópico como sendo do seu

domínio.

Desencadeia-se, aí, uma atividade interacional de qualificar o interlocutor

como habilitado a abordar um dado tópico. No processo interacional os locutores

estabelecem uma espécie de contrato implícito de troca simbólica de enunciados. Esse

contrato institui suas posições na interação, ou seja, a de falante/escritor autorizado a

falar/escrever daquilo que fala/escreve e a falar/escrever do modo que fala/escreve, e a

de ouvinte/leitor. Essa posição conquistada - por direito juridicamente regulamentado

ou espontaneamente aceito – permite ao falante/escritor proferir determinado discurso.

(38)

[2 (...) Veja – A impressão é que o Congresso aprovou sem convicção a contribuição para os servidores inativos – e só depois de o Brasil ter sido obrigado a gastar mais de 40

195

bilhões de dólares de suas reservas cambiais por falta de credibilidade. O senhor concorda? Jaguaribe – A crise é uma mestra. Ela conduz a opções racionais, de autodefesa. A mais recente foi o fato responsável pela aprovação dessa medida. Acredito que, nos últimos dias, o Congresso constatou que todo o país perderia se não fossem aprovadas as reformas que o Executivo queria. O Congresso tem problemas. Alguns dos partidos brasileiros apresentam um índice de disciplina interna muito baixo. Outros não têm disciplina alguma. Nessas circunstâncias, a formação de uma frente em torno de um programa de governo é muito difícil. Cada medida de interesse do governo precisa ser negociada isoladamente e é comum que, em cada negociação, os congressistas tentem sacar da União proveitos para seus grupos. É um problema que decorre de deficiências na nossa legislação partidária e eleitoral.] [3 Veja – O senhor tem dito que o sistema político brasileiro apresenta os defeitos mas não as qualidades do parlamentarismo. O que isso significa? Jaguaribe – Significa que o atual regime político é inviável. Todos concordam com isso. Sociólogos, estudiosos da política e analistas da sociedade brasileira vêm apontando essa distorção há tempos. (...) (Entrevista escrita, E-03)

Outro fato de natureza interacional que se congrega à função textual

articuladora das perguntas é o interesse de um dos locutores em obter mais detalhe ou

uma explicação sobre o tópico. A pergunta tem como objetivo realizar o pedido de

detalhamento ou esclarecimento. Se a resposta se estende, se aprofunda, surge um novo

tópico e a articulação ocorre no nível intertópico, relacionada à mudança de centração

ou à seqüenciação. Se o detalhamento ou o esclarecimento não é suficiente para

constituir um novo conjunto de centração, a pergunta atua no nível intratópico, atuando

na seqüenciação dos conjuntos de enunciados que formam o segmento.

Na entrevista escrita E-03, por exemplo, ao desenvolver o tópico O

presidencialismo, segmento 3, o entrevistado aborda uma questão que envolve o poder

do Congresso Nacional. O entrevistador solicita uma explicação em relação a isso,

196

através da pergunta “o poder do congresso é exagerado?”. O entrevistado esclarece a

dúvida do entrevistador, mas não desenvolve um novo tópico.

Um dos pontos tocados pelo entrevistado no segmento 4, tópico A

dissolução do Congresso, é a mudança no sistema político brasileiro. Esse assunto

desperta o interesse do entrevistador, que realiza um pedido de detalhamento através da

pergunta “O que mais deveria mudar para que o sistema atual ganhasse maior

racionalidade?”. Essa pergunta articula o segmento 4 ao segmento 5, a partir do qual é

desenvolvido o tópico Tipo de mudança no sistema, como mais um desdobramento no

interior do quadro tópico Sistema político brasileiro57. As duas perguntas são, assim,

respectivamente, empregadas na articulação intratópica, relacionada a um pedido de

esclarecimento, e na articulação intertópica, relacionada a um pedido de detalhamento.

(39)

[3 Veja – O senhor tem dito que o sistema político brasileiro apresenta os defeitos mas não as qualidades do parlamentarismo. O que isso significa? Jaguaribe – Significa que o atual regime político é inviável. Todos concordam com isso. Sociólogos, estudiosos da política e analistas da sociedade brasileira vêm apontado essa distorção há tempos. Temos um sistema presidencialista enfraquecido por um Congresso que funciona mal, que não tem coerência, mas tem enorme poder. Esse sistema é inviável porque gera conflito permanente entre o Congresso e o governo. A força do poder Executivo decorre de sua capacidade de gestão. Mas o verdadeiro poder está sempre nas mãos do Legislativo. É ali que se fixam as grandes normas, as grandes leis. Veja – O poder do congresso é exagerado? Jaguaribe – O congresso brasileiro, na prática, tem tanto poder quanto no sistema parlamentarista. O desequilíbrio decorre do fato de que, ao contrário do que ocorre no parlamentarismo, aqui não está prevista a possibilidade de dissolução do Congresso. Isso deveria ser adotado. Seria bom ter um mecanismo para dissolver o Congresso.] [4 Veja – Mesmo sem a adoção do parlamentarismo seria possível acrescentar às regras atuais um mecanismo que permitisse dissolver o Congresso caso houvesse impasse paralisante entre o Legislativo e o Executivo? Jaguaribe – Não tem sentido falar em dissolução do Congresso se não houver condições de assegurar a estabilidade política. Dissolver por dissolver não faz sentido. 57 Cf. diagrama 6, anexo C, p. 398.

197

O necessário é ter um regime institucional que obrigue os parlamentares compor uma maioria estável em torno de um programa de governo. Deveria haver, após cada eleição, a obrigação de se formar uma maioria parlamentar em torno dessas metas gerais. Essa maioria poderia sair diretamente das urnas se um único partido tivesse mais cadeiras que os demais. Realizada a eleição e não havendo um partido majoritário, seria dado ao Congresso um prazo para compor uma coalizão de governo. Os partidos que a integrassem estariam obrigados a ter fidelidade ao programa e o dever de sustenta-lo durante toda a legislatura. Não se chegando a esse acordo, o Congresso seria dissolvido e novas eleições seriam convocadas. Essa é, ao meu ver, a única forma de dar coerência ao funcionamento do Congresso.] [5 Veja – O que mais deveria mudar para que o sistema atual ganhasse maior racionalidade? Jaguaribe – O Brasil deveria adotar o voto distrital misto. Na Alemanha, os eleitores escolhem parte dos parlamentares entre candidatos que representam as comunidades locais. Os demais são pinçados entre políticos cuja liderança ultrapassa os limites do bairro, da cidade e do Estado. Ou seja, os parlamentares são escolhidos ou porque representam de forma clara os interesses de uma comunidade ou porque defendem princípios gerais aceitos pelos eleitores, independentemente da região onde moram. Essa seria uma mudança crucial. Também deveria ser adotado um mecanismo que negasse vaga no Congresso ao partido que não conseguisse pelo menos 5% dos votos válidos nas eleições parlamentares nacionais. (...) (Entrevista escrita, E-03)

Além das perguntas abertas, atuam também como mecanismo de articulação

tópica, com funções textuais-interativas, as denominadas perguntas retóricas, ou seja,

perguntas para as quais não se pressupõe uma resposta por parte do interlocutor

(FÁVERO, ANDRADE e AQUINO, 1996). Nesses casos, o falante/escritor age na

suposição de um ouvinte/leitor específico e explicita sua suposição de que esse

ouvinte/leitor compartilha o conhecimento que é apresentado. Os trechos a seguir são

ilustrativos desse fato. Em (40), a pergunta retórica “Para que serve a pós-graduação?”

realiza a articulação entre os tópicos Parecer de Newton Santos, segmento 2, e

Princípios da Pós-graduação, segmentos 3 e 4, desdobramentos do supertópico

Funcionamento da Pós-graduação no Brasil58. Além de orientar a atenção do

58 Cf. diagrama 09, anexo C, p. 392.

198

interlocutor para a mudança de centração no texto, a pergunta é uma sugestão de

alteridade efetiva. O leitor do artigo aparece concretamente como um parceiro no

desenvolvimento da informação.

O mesmo ocorre no trecho (41), da palestra EF-25, em que a palestrante

emprega a pergunta retórica “que fatores são esses?” para realizar o movimento de

seqüenciação entre os tópicos Sechehaye, segmento 6, e Traços que definem a

transitivdade, segmento 7, bem como o movimento de retomada do quadro tópico

Conceitos relacionados à transitividade, que se inicia no segmento 5, Verbo de ligação,

e é interrompido pela interpolação do segmento 6, fragmento de subtópico de outro

quadro tópico. Essa pergunta chega a se caracterizar quase como um turno de um dos

interlocutores da palestra, fato fortemente interacional no qual está integrada uma

função textual.

(40)

[2 Lembrei-me disso ao ler a reportagem da revista Veja sobre as misérias da pós-graduação no Brasil. Quando o professor Newton Sucupira escreveu seu histórico e lúcido parecer a respeito do assunto, advertiu as universidades para o perigo que podia transformar a pós-graduação num fracasso: o de contaminar-se com a impostura do chamado ensino superior entre nós. Como a voz do Batista, a de meu amigo Sucupira foi vox clamantis in deserto, porque as universidades não fizeram outra coisa senão abastardarem os graus de mestre e doutor. Temos, aliás, no Brasil, a triste tradição de desmoralizar palavras que, no estrangeiro, são quase sagradas. Já me referi, neste jornal, ao que acontece com filósofo, historiador, antropólogo e sociólogo, títulos com os quais são brindados entre nós, simples professores de filosofia, história, antropologia e filosofia.] [3 Para que serve a pós-graduação? Para fazer com que as universidades sejam não apenas transmissoras, mas produtoras de cultura, contribuindo para o desenvolvimento da filosofia, da ciência, das letras e das artes.]

(Artigo de opinião, E-257)

199

(41)

[5 então... NÃO conCORdo com esse tipo de visão porque... me parece haver uma diferença muito clara ENtre os verbos de ligação... não só semanticamente como sintaticamente... um verbo ser... é muito diferente de um verbo estar... se eu digo "a seleção é RUIM"... é uma coisa mas se eu digo "a seleção esTÁ ruim ou esTEve ruim no último jogo"... é uma coisa completamente diferente... né?... então... HÁ diferença semântica entre os verbo de ligação ninguém pode negar isso... ser é uma coisa parecer é outra coisa... PERMANECER é outra coisa... né?... então não se POde negar --... diga... chamando --... a transiti/ ((falou rindo))... eh::... NÃO se pode negar que HÁ... SENtido difeRENça de sentido entre os VERbo de ligação não se pode negar que eles são... doTAdos de significação... né?... e TAMBÉM não se pode neGAR... que... eles eXIgem... POdem exigir... eleMENtos... difeRENtes... por exemplo... como faz o verbo TORNAR-se... com o verbo ficar... você pode dizer que semanticamente AMbos vão exigir um complemento que é resulTAdo... é é um é um proDUto... né?... aquilo que... sofreu uma mudança... certo?... semanticaMENte eles são semeLHANtes... mas... ocorre que o verbo torNAR-se... vai aceitar por exemplo sintagma adjetiVAL... e vai aceitar sintagma nomiNAL... do tipo... ((ruído))... "ele tornou-se... eu posso dizer... belo... e posso dizer... um belo rapaz"... o verbo tornar-se aceita AMbas as estruturas... MAS quando eu vou... substituo pelo verbo virar... num dá certo... eu digo "ele ele virou belo"... pelo menos não me parece aceitável... num sei se pra vocês... mas a mim não parece aceitável a num ser que eu TEnha u/ uma construção paralela... ele "Era:: feio e virou belo" num sei... talvez até seja mais aceitável... mas o fato é que esse verbo reSISte a determinadas formas... né?... o que significa dizer... que... Ele... é que eXIge um complemento... Ele tem... é doTAdo de significação... e ele é que dá as ordens pra exiGIR... determinados complementos... né?... então não se pode dizer que o verbo de ligação seja simplesmente um elemento relacional... como uma preposição...] [6 depois ele classifica transitividade de relação... que ocorreria com verbos transiTIvos... em... "não exprimem uma idéia auTÔnoma acabada em si mesma é a mesma visão da gramática tradicional... "na verdade a transitividade de relação eXISte em TOdos os níveis é uma questão de dosagem"... essa afirmação eu achei importante porque esTUdos mais recentes sobre transitividade... TÊM tentado trabalhar exatamente isso... que a TRANsitividade... se dá num... como se fosse uma medida escalar... né?... então... como se houvesse um contínuo não se POde falar de transitividade isoLAdas... mas como se houvesse um contínuo uma gradaçÃO de transitividade... e Essa gradação dependeRIA... de uma SÉrie de fatores... e ESte me parece exatamente o xis do problema] [7 que fatores são esses?... é preciso que se determine... há pelo menos dois esTUdos que tratam disso da da... da classificação dos TRAÇOs que determinariam a transitividade tem estudo de... ( ) ...e/ esses dois autores... tentaram... trabalhar exatamente esses... ah::... QUAIS os fatores que deterMInam os GRAUS de transitividade? (...)

(Palestra, EF-25)

200

Fávero, Andrade e Aquino (1996) destacam a funcionalidade das perguntas

e respostas, na atividade conversacional, como estratégia de introdução, manutenção e

mudança de tópico. Da mesma forma, em um estudo sobre o par pergunta-resposta em

entrevistas, Fávero (2001) assinala que a escolha de uma pergunta pode decorrer de um

sistema de negociação entre os locutores. Destaca-se aí a negociação tópica. Segundo a

autora, “os interlocutores formulam suas perguntas, tendo em vista o tópico:

introduzindo-o, dando-lhe continuidade por não ter sido suficientemente explorado,

redirecionado, etc” (2001, p. 86). Essas abordagens, embora discutam aspectos textuais

e interativos do par pergunta-resposta, interpretam-nos de forma separada, como

fenômenos distintos, ora formulativos, ora interacionais. No que se refere

especificamente à tipologia de pergunta, Fávero (2001), por exemplo, distingue função

(introdução, continuidade, redirecionamento e mudança de tópico), de natureza (pedido

de informação ou confirmação). Os resultados sobre o emprego de perguntas como

mecanismo de articulação tópica, discutidos neste item, redimensionam essa perspectiva

de análise. Conforme mostrei, o pedido de informação é uma das diversas funções

interacionais de uma pergunta, que não ocorrem de forma desvinculada de uma função

textual, quais sejam a seqüenciação, a retomada ou a mudança de tópico.

4.2.5. Emprego de paráfrases

A paráfrase, segundo Hilgert (1999), consiste no estabelecimento de uma

relação de equivalência semântica entre um enunciado de origem, a matriz, e um

enunciador reformulador, a própria paráfrase. A relação é de equivalência semântica “na

medida em que a paráfrase retoma, em maior ou menos grau, a dimensão significativa

da matriz” (1999, p. 121). Assim, se entre paráfrase e matriz ocorre uma grande

201

identidade significativa, “isto é, a paráfrase explicita os mesmos traços semânticos da

matriz” (1999, p. 122), o grau de equivalência semântica na relação parafrástica é forte.

Se a paráfrase atualiza apenas um dos traços do vasto quadro de traços semânticos

presente na matriz, a equivalência já é menor. Finalmente, se, na relação parafrástica, os

traços semânticos comuns são apenas reduzidos, o grau de equivalência é fraco. Nesse

caso, a similaridade entre os componentes da paráfrase só é perceptível “graças ao

conhecimento extratextual comum aos interlocutores”. Manifesta-se “não uma

equivalência textual, mas uma equivalência referencial, condição bastante para fundar

uma relação parafrástica” (Hilgert, 1999, p. 122).

Hilgert (1999) apresenta dois tipos de classificação para as paráfrases. Uma

baseada na distribuição dos constituintes da relação parafrástica e outro baseado nas

suas possibilidades de produção. O primeiro critério permite identificar as paráfrases

adjacentes, que se seguem imediatamente à matriz; e as não adjacentes, que se

manifestam mais adiante na seqüência textual. “Às primeiras cabe uma função local no

desenvolvimento do texto, as últimas estruturam a conversação num nível mais

abrangente” (1999, p. 116-17). O segundo critério permite identificar a autoparáfrase,

em que o falante parafraseia o próprio enunciado, e a heteroparáfrase, em que um

interlocutor parafraseia o enunciado produzido pelo outro.

No que diz respeito à sua estruturação formal, Hilgert (1999) identifica três

tipos de paráfrase: expansivas, redutoras e paralelas. No primeiro tipo, o

parafraseamento se dá por meio de uma unidade sintaticamente mais complexa do que a

matriz. No segundo, ocorre uma condensação da matriz numa unidade sintática mais

simples. E, no terceiro, há uma simetria sintática entre paráfrase e matriz.

202

O emprego de paráfrases constitui mais um mecanismo de articulação

tópica, identificados no corpus. As autoparáfrases são as mais recorrentes. Elas ocorrem

em contextos de seqüenciação, e mudança tópica, articulando tópicos e enunciados e

marcando diferentes objetivos interacionais do falante/escritor. Além de realizar o

movimento textual articulador, a autoparáfrase é empregada pelo locutor para favorecer

o aporte de um novo tópico, inserir informações novas dentro de um mesmo segmento

tópico e destacar avaliação sobre o que ele diz.

A seguinte passagem do artigo científico E-053 contém uma ocorrência de

uma paráfrase que prepara o leitor para a introdução de um novo subtópico, no

movimento de articulação intertópica. Entre o enunciado “Com o alastramento da Aids

presenciamos não apenas um significativo incremento do discurso sobre a sexualidade”,

que inicia o segmento 6, e todo o conteúdo do tópico Liberação do discurso, segmento

5, ocorre uma equivalência semântica caracterizadora de uma paráfrase. O grau de

similaridade é forte. O enunciado parafrástico contempla toda a dimensão semântica da

matriz, condensando-a, o que caracteriza uma paráfrase, do ponto de vista estrutural,

redutora.

Parafraseando o tópico anterior, o autor do texto o retoma como um aporte

cujo objetivo é orientar a atenção do leitor para a introdução do tópico seguinte,

Visualização do sexo, segmento 6. Ao empregar, no enunciado parafrástico, a expressão

“não apenas”, o autor estabelece também a relação de adição entre os tópicos, ou seja, o

tópico Visualização do sexo constitui mais um aspecto, que se soma ao tópico

203

Liberação do discurso, acerca do tópico Modificações de padrões e práticas sociais

provocadas pela Aids59.

(42)

[5 DESBLOQUEIO DO DISCURSO (...) Em resumo: malgrado a forte oposição dos setores mais moralistas de nossa sociedade, notadamente da CNBB, informações detalhadas sobre o sexo sem risco passaram a fazer parte integrante de todas campanhas contra a Aids tornando a sexualidade tema muito mais freqüente de conversa e discurso do que no período da decantada estória da revolução sexual. Nunca se falou tanto de sexo como depois da Aids: nas prateleiras das livrarias os livros sobre sexo aumentam dia a dia; cursos e conferências sobre educação sexual tornaram-se moda; o sexo por telefone, ou através do computador ganha mais adeptos nos países mais modernos. Finalmente, a língua travada por tantos séculos, foi liberada. Somos contemporâneos da "desnefandização" da sexualidade: o que era proibido falar tornou-se tema de conversas, músicas, manchete dos jornais. Com a Aids, a scientia sexualis tornou-se objeto de consumo universal: falar abertamente sobre sexo faz parte da profilaxia da epidemia do século. Nos Estados Unidos, campanhas enfatizam a urgência de dialogar sobre sexualidade com todos os grupos, inclusive com as crianças e adolescentes: ' Você está falando sobre Aids com as crianças?" é a frase de um broche (botton) muito distribuído na última Conferência Internacional de Aids em S. Francisco.] [6 LIBERAÇAO DO VISUAL Com o alastramento da Aids presenciamos não apenas um significativo incremento do discurso sobre a sexualidade , como também uma gradativa exibição de imagens relacionadas ao sexo sem risco. A camisinha, até então escondida nas prateleiras das farmácias e nos recônditos das gavetas, passou a ser exposta em lugar de destaque dos supermercados. Cartazes, panfletos e filmetes oficiais passaram a mostrar o preservativo em sua nudez, fora da embalagem, manipulado como se fosse uma luva de proteção. Para ensinar como usá-lo, utilizaram-se primeiro objetos fálicos- a aeromoça que enfiava a camisinha no dedo, ou numa banana - o que levou os grandes empresários desta fruta a protestar na televisão norte-americana. Hoje, sobretudo nos países mais desenvolvidos, cartazes e folders mostram com todo realismo corpos dos entrelaçados e membros eretos protegidos pelo profilático, material destinado tanto às clientelas heteros quanto homossexuais. (...) (Artigo científico, E-053)

Algo semelhante acontece no exemplo (43). Só que o enunciado parafrástico

ocorre no interior de um mesmo segmento. O enunciado “A preocupação de construir 59 Cf. diagrama 13, anexo C, p. 396.

204

um sentimento nacionalista através da história do Brasil já vinha do primeiro instituto

científico brasileiro” parafraseia o conjunto de enunciados que o precede, resumindo-o

para, a partir dele, inserir um novo conjunto de enunciados com novas informações

dentro do mesmo conjunto de referentes sobre o qual se centra o segmento.

Ocorre, nesse caso, entre paráfrase e matriz uma equivalência semântica

fraca. Só pelo contexto é possível perceber essa relação de equivalência. O quadro

tópico em questão trata da exclusão da mulher da educação formal nacionalista. No

segmento 9, tópico História da pátria, para situar essa exclusão, o autor faz referência

às histórias escritas sobre o Brasil, principalmente, masculinas e referentes ao domínio

progressivo de portugueses e europeus. É a partir dessa referência que se pode construir

a informação de que havia uma preocupação de construir um sentimento nacionalista

através da escrita da História do Brasil. Essa referência implícita constitui um dos traços

semânticos do conjunto de enunciados matriz que é atualizado no enunciado

parafrástico.

Com o conjunto de enunciados introduzido pela paráfrase, o autor retoma a

informação sobre o interesse em contar a história da pátria em livros, apenas implícita

nos enunciados anteriores, acrescentando que esse interesse é antigo, para ressalvar o

fato de que também é antiga a exclusão do papel da mulher nessa história. A paráfrase

exerce, assim, nesse caso, as funções de articular enunciados no interior de um mesmo

segmento, seqüenciando-os na linearidade do texto, e de ater a atenção do leitor para a

introdução de um novo aspecto acerca da informação que está sendo desenvolvida, bem

como para o teor de ressalva dessa nova informação.

205

Esse fato é destacado por Nogueira (1999), em uma análise sobre paráfrases

referenciais em construções apositivas. Assumindo uma concepção construtivista e

estratégica da referenciação lingüística, a autora descreve a segunda unidade (paráfrase)

de uma aposição referencial como o expediente de refocalizar, caracterizar ou

especificar o referente discursivo já designado na unidade imediatamente anterior,

ajudando o ouvinte/leitor a construí-lo, identificá-lo e mantê-lo em sua memória

discursiva. Esse raciocínio se aplica aos dados deste trabalho no sentido de que as

paráfrases podem ser utilizadas, na articulação tópica, com o objetivo de orientar o

interlocutor na concepção do tópico ou da informação que compõem um segmento.

(43)

[9 Com esse nível de aspiração focalizado na unidade familiar e na procriação, não seria de esperar que as mulheres contribuíssem para a construção do pensamento nacionalista, nem fossem alvo de sua atuação. Dirigida para a guarda do lar, com todas as pressões ideológicas a estimular os corações maternos, desmerecendo qualquer colaboração mais ativa nos diversos setores da vida nacional, a mulher do século XIX viu-se excluída da construção educacional do nacionalismo realizada através dos livros didáticos de história pátria, que começaram a aparecer nos colégios masculinos. Eram histórias de um Brasil que surgia e se desenvolvia num espaço muito extenso e cheio de florestas, governado por um Estado unitário, resultante de uma história comum dos diferentes tipos de convivência humana, mas, principalmente, masculina e referente ao domínio progressivo de portugueses e europeus. Não só as mulheres estavam excluídas dessa história, mas também todas as camadas subalternas - índios, negros e imigrantes. Elas apareciam apenas para permitir a vitória dos vencedores. A preocupação de construir um sentimento nacionalista através da história do Brasil já vinha do primeiro instituto científico brasileiro, fundado em 1838. Em seus primeiros anos, o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro instituiu um prêmio para o trabalho que respondesse a seu apelo: Como se deve escrever a história brasileira? O Botânico alemão von Martius foi o premiado, e sua memória foi publicada nas páginas 389 e seguintes da Revista Trimestral de História e Geografia, de janeiro de 1845. Von Martius foi um dos naturalistas que veio ao Brasil em 1817, na missão científica que acompanhou a princesa D. Leopoldina, e suas sugestões, muito criticadas pelos contemporâneos) e vistas com restrições até hoje, incluíam o estudo da reunião e contato das raças branca, africana e indígena, e ao movimento histórico que esse caldeamento imprimiu ao povo brasileiro. A história brasileira, incluída nos textos didáticos, contudo, interessou-se mais pela sedimentação dos feitos políticos dos governantes. Somente a

206

segunda metade do século XX é que incorporou a ela o estudo das diferentes camadas da população brasileira. (...) (Artigo científico, E-020)

No trecho (44), destaco um exemplo de paráfrase que exerce, além da

função articuladora, a de portar uma avaliação do locutor sobre o próprio discurso.

Através do enunciado “eu acho que enquanto ela for uma elite fechada”, no início do

segmento 21, o locutor parafraseia o próprio discurso, o enunciado “e acha que ciência

deve ser uma elite fechada”, que fecha o segmento 20. Ocorre, nesse caso, uma

paráfrase paralela e de equivalência semântica forte, dada a simetria sintática e

semântica entre seus componentes.

Essa autoparáfrase marca a mudança do tópico Idéias de Stéphan Hanks,

segmento 20, para o tópico Forma de estudar a humanidade, segmento 21. Como o

locutor acrescenta ao enunciado parafrástico o marcador de opinião de valor atenuativo

“eu acho”, ele indica também ao interlocutor que a interpretação desse novo tópico

segue uma posição que lhe é própria.

Segundo Galembeck (2002, p. 84), os marcadores de opinião de valor

atenuativo assinalam uma opinião pessoal, marcadamente individual. “Por isso mesmo,

eles possuem um valor de subjetividade acentuado, já que são usados não só para

assinalar a presença do interlocutor no processo interacional, como também para

diminuir a responsabilidade do falante em face do juízo exposto”. O marcador de

atenuação preserva a auto-imagem do falante, ou seja, atua também como um

preservador de face. No exemplo em questão, o locutor atenua sua opinião, livrando-se

207

antecipadamente de uma crítica de que poderia ser alvo ao falar sobre a relação da

ciência com a sociedade.

(44) [20 e também mudar um pouco de dosagem de Stephan Hanks... tem muita coisa que eu não concordo com Stephan Hanks como a bipolaridade... ele sempre trata o universo dele o buraco negro de bipolaridade... eu acho que não que a coisa só começa a ter existência reAL quando você tem três dimensões mais o tempo e o espaço e a quarta... E DESDE quando Einstein provou isso... eu acho muito difícil o cara querer provar alguma coisa lidando com o número um... o número dois ou com o número três é bom lidar com uma matemática de quatro pra cima... né?... essa é a divergência que eu tenho com Stephan Hanks... mas eu sou considerado um amarelinho do Ceará ele é considerado um dos maiores gênio/ do mundo... por isso que eu num posso /tá falando discutir com ele né? "quem é você?"... né?... ( ) pistolão (danado)... mas eu gostaria de perguntar a ele por que que ele usa o duAl... quando poderia usar o ( )... DUAL tudo dele é de DOIS entrou por aqui saiu por ali tudo é geminado tudo é o PAR... se é fácil de você verificar porque sempre que aparece duas opções aparece uma terceira lógico que é também a soma das outras ( )... né?... e que todo jogo de duas opções só tem função de existir uma em função da outra... como uma MOEda... você só tem um lado da moeda a função é do outro lado pra num trocar os lado/... se num for em função disso num adianta dá o lado A ou lado B duma moeda o dia e a noite... /cê só conhece o dia e a noite porque existe o outro contrário se existir SOmente só aquilo... perderia a função... nunca ninguém teria imaginado né?... existiria o dia da noite é a mesma coisa... do bem e o mAl... SE EXISTISSE SÓ BEM... SÓ MAL nenhum:: deles teria função se num existisse o outro pra gente pesar e comparar... percebe?... mas tem uma coisa que eu /tô com ele e não abro... é quando ele diz... "quando o homem realmente entender o universo... a explica/ a explicação será tão simples... que qualquer criança qualquer analfabeto vai entender" aí essa eu acredito que é a explicação verdadeira... isso eu /tô com ele e não abro... enQUANto a explicação for comPLExa... e pertencer a uma meia dúzia de privilegiAdos... eu ainda considero arranjo... tapa-buraco... solução tamPÃO ela /tá /í pra ( )... porque no dia que for uma solução definitiva ela terá que ser... entendida facilmente por qualquer pessoa... nisso aí eu concordo plenamente... com seu Stephan... e ele também é muito combatido né? pelo pessoal que não concorda... começa a tirar o pé... e acha que ciência deve ser uma elite fechada...] [21 eu acho que enquanto ela for uma elite fechada ela é uma confraria... problema é que nós somo/ totalMENte né?... era dialogar totalmente com a sociedade... aí ela deixará de ser uma confraria... e começará a esclarecer toda a sociedade e a sociedade intervirá... um contrato ( ) né?... é a mesma coisa se você estudar Sociologia e ver por exemplo o Donald Pierson... o cara ficou faMOso virou doutor tal porque... descobriu uma coisa MUIto interessante você num pode pegar a humanidade e botar dentro do microscópio e

208

estudar essa humanidade sem você /tá lá dentro porque você também é humanidade... (...) (Aula, EF-53)

Da mesma forma que as autoparáfrases, embora menos recorrentes, as

heteroparáfrases também atuam na articulação tópica, e são usadas pelo falante para

propor uma colaboração ao discurso do ouvinte e para sublinhar pertinência temática.

No trecho (45), há exemplos de duas heteroparáfrases, com funções

textuais-interativas diferentes. No interior do segmento 5, através do enunciado “a

melhora foi assim vários níveis”, a entrevistadora parafraseia o conjunto de enunciados

anteriormente proferidos pelo locutor. A paráfrase condensa sintaticamente a matriz, e

entre esses componentes se estabelece uma relação semântica forte, dada a grande

identidade de sentido.

O enunciado parafrástico articula o conjunto de enunciados ao que se segue

a ele, seqüenciando, no interior do segmento, as informações relativas à avaliação que o

locutor faz da sua moradia em Santa Luzia, tópico Avaliação de L.. Além desse

movimento textual articulador, a heteroparáfrase indica uma explícita colaboração da

entrevistadora ao discurso do entrevistado. Nesse sentido, ela revela um alto grau de

sintonia do ouvinte com o desenvolvimento do tópico e interesse no desempenho do

falante na conversa.

Com o tópico paralelo, segmento 6, o tópico A moradia em Santa Luzia, que

vinha em desenvolvimento no segmento 5, subtópico Avaliação de L. é

209

temporariamente suspenso60. O retorno a esse tópico suspenso pela inserção tópica, no

segmento 7, é marcado pela heteroparáfrase “você disse que se sente muito melhor”,

que toma como matriz os enunciados proferidos no segmento 5. Com essa

heteroparáfrase o subtópico Avaliação de L. é novamente posto em evidência para servir

de aporte para o desenvolvimento do subtópico seguinte. Esse aporte serve também para

justificar a introdução desse subtópico e não a de outro. Um tópico como Preferência de

L. aparece como uma expectativa da documentadora, mas é excluído porque o conteúdo

é dado implicitamente pelo locutor. Dessa forma, a entrevistadora assinala para o seu

interlocutor a pertinência temática.

(45) [5 DOC.: ô L. tu achas melhor antes ou agora? L1: isso aí é notório que é agora agora ((pigarreia)) me sinto estabilizado [... DOC.: [uhum L1: me sinto... bem éh: fisicamente bem psicologicamente... e: regular financeiramente ((ri)) DOC.: ((rindo)) é mas então a melhora foi assim vários níveis [... não é? L1: [a é... eu tive eu tive condições de:: aprender muito... aprender muito Vila da Prata... entende? Não sei se é (burrice) interiormente eu... estudei fiz o segundo grau cheguei a uma faculdade... num é mas me formei dentro da das favelas Vila da Prata DOC.: o que é que você quer dizer com isso? L1: eu daí encontrei meus mestres [... DOC.: [ uhum L1 lá encontrei: campo pá desenvolver como coloquei anteriormente o senhor de engenho que tava preso dentro de mim] [6 DOC.: então você se identifica com o senhor de engenho? L1: me identifico com o trabalhador sou um trabalhador das causas DOC.: uhum mas o senhor de engenho tem uma relação de opressor com os empregados L1: não mas éh::... quando eu falo... eu falo senhor de engenho [ DOC.: [ sim L1: é é pelo potencial [que esse senhor de engenho tem DOC.: [ ( )

60 Cf. diagrama 18, anexo C, p. 405.

210

L1: aquele potencial que é preso a:través de um sistema que ele já viveu no outro nível ele não tem nada a ver com opressão sã/ éh: opressão eu sou uma pessoa... totalmente respeitadora do direito de cada um DOC.: uhum... vê se eu entendi é como se você quisesse resgatar a memória do senhor de engenho você vê outras coisas nele?... tá certo é muito bonito de sua parte] [7 DOC.: você disse que se sente muito melhor então: num precisa perguntar se você gosta ou não... agora... o processo foi simples pra você:... você mudar da Vila da Prata pra Vila de Santa Luzia?... fale um pouco disso L1: não foi simples porque... o fato de de Vila Santa Luzia ela ta situada na Torre [... DOC.: [uhum L1: nós tivemos vários muitos problemas até cum circunvizinhante também (...) (Entrevista falada, F-018)

Os resultados da análise realizada neste item apontam para o entendimento

da paráfrase como um mecanismo que faz parte de uma estratégia maior de construção

do texto, a articulação tópica. A presença de paráfrases em textos escritos mostra que

esse recurso não se relaciona a problemas na construção do texto, que, por isso, precisa

ser reformulado, conforme sugere Hilgert (1993). Se assim o fosse, não haveria

paráfrases no texto escrito, já que, na modalidade escrita, as marcas de planejamento

lingüístico não são visíveis.

No que diz respeito às funções da paráfrase, os dados aqui discutidos vão ao

encontro de alguns trabalhos já desenvolvidos acerca do assunto. Algumas das funções

interacionais aqui apontadas são previstas em estudos anteriores, como os de Hilgert

(1993), Galembeck (1999) e Nogueira (1999). A inclusão da paráfrase no conjunto de

recursos responsáveis pela articulação textual e a relação mútua que mostrei existir entre

as funções interacionais e as textuais são dados que contribuem para um entendimento

mais amplo dos processos de organização textual.

211

5. CONCLUSÃO

Neste trabalho, desenvolvi um estudo que toma como objeto o texto,

concebido como o espaço de interação em que dois ou mais interlocutores,

dialogicamente, nele se constroem e são construídos. Aplicando um enfoque teórico

compatível com essa perspectiva, segundo o qual os dados pragmático-situacionais se

introjetam no texto, me propus a verificar a forma como os aspectos formulativos estão

integrados aos interacionais, e juntos se materializam lingüisticamente.

Considerei a topicalidade como um princípio de organização geral do texto

que apresenta, no plano de sua realização, uma estrutura passível de ser identificada e

descrita, e adotei o tópico discursivo como categoria analítica textual-interativa. A

análise da organização tópica leva em consideração a identificação e delimitação de

segmentos tópicos e dos procedimentos pelos quais esses segmentos se distribuem na

linearidade do texto e se recobrem hierarquicamente. Disso se conclui que o texto se

organiza topicamente em dois planos: um vertical, que diz respeito à particularização

hierarquizada do assunto em pauta; e um horizontal, que diz respeito à distribuição dos

tópicos na linha discursiva.

Caracterizei, então, a articulação tópica como uma estratégia textual-

interativa, ou seja, como o vínculo lingüístico que relaciona, na superfície textual, os

segmentos tópicos, considerados a partir dos diferentes planos hierárquicos, nível que

denominei intertópico, e os enunciados que integram os segmentos em particular, nível

intratópico. Através da análise dos mecanismos pelos quais se realiza essa estratégia

212

pude identificar a forma como os fatos formulativos e interacionais interagem na

organização do texto.

Os resultados mostraram que, como mecanismos de articulação tópica, são

empregados marcadores discursivos, formas referenciais, formulações metadiscursivas,

perguntas e paráfrases, que realizam, tanto no plano da constituição interna dos

segmentos tópicos mínimos, intratópico, como no plano da articulação desses

segmentos entre si, intertópico, movimentos que sinalizam a construção textual,

relacionados a diversos aspectos do processo interacional.

Os marcadores discursivos atuam na construção do texto, seqüenciando

tópicos e enunciados e marcando retomadas e mudanças tópicas. Nesses movimentos

textuais ocorrem também indicações dos seguintes fatos interacionais: instaurar relações

discursivas de ressalva, reforço, inferência, avaliação, acordo, causa-conseqüência,

explicação, marcar auto-posicionamento do locutor, orientar o interlocutor para a forma

de progressão do texto, pôr em evidência um tópico, compartilhar com o interlocutor a

reintrodução de um tópico, após inserção tópica ou parentética, assinalar introdução de

um novo tópico no discurso e destacar um ato preliminar que define um novo tópico.

Três processos de elaboração referencial atuam como mecanismos de

articulação tópica: o encadeamento de referentes vinculados a um contexto central, a

reiteração de um mesmo referente, e a conferição de estatuto de referente a um conjunto

de informações difundidas no contexto. Em cada aspecto da formulação do texto no que

diz respeito à seqüenciação, retomada ou mudança de tópico, em que esses processos

participam, ocorrem a indicação de alguma atividade interacional. Através do uso de

formas referenciais o locutor pode destacar a montagem do texto em introdução e

213

enumeração de fatos ou argumentos, reativar na memória discursiva do interlocutor um

tópico para desenvolver outro ou retomá-lo após uma inserção, marcar seu ponto de

vista em relação ao tópico, e realçar uma parte do conteúdo, para avaliá-la ou atribuir

relevo positivo.

Com o emprego de formulações metadiscursivas, o locutor, além de

sinalizar os aspectos da formulação tópica do texto, verbaliza esses aspectos. Nessa

atividade de verbalização do processo de formulação do próprio texto, o locutor chama

a atenção do interlocutor para o acompanhamento do tópico, no movimento de

seqüenciação ou retomada, faz com que ele apreenda um dado raciocínio ou o estatuto

discursivo de um segmento ou enunciado, anuncia a introdução de um novo tópico no

discurso ou de uma nova informação no interior de um segmento, e faz menção ao tipo

de atividade discursivo-enunciativa que realiza.

Enquanto mecanismo de articulação tópica, as perguntas são empregadas

principalmente no movimento de mudança tópica. Ao marcar esse aspecto da

construção do texto com uma pergunta, o locutor toma a iniciativa de introduzir um

tópico novo no discurso, solicita do seu interlocutor detalhamento ou explicação sobre

um tópico ou uma informação específica de um segmento mínimo, traz para o espaço do

texto um discurso anterior do interlocutor, criando para ele uma condição propícia ao

desenvolvimento do tópico, bem como a presença do próprio locutor, numa atitude

efetiva de alteridade.

A paráfrase também se destaca como mecanismos de articulação tópica em

contexto de mudança, apesar de ser usada também na seqüenciação tópica. As funções

interacionais das paráfrases relacionam-se as suas possibilidades de produção, ou seja,

214

conforme a matriz parafraseada seja o discurso do próprio locutor, autoparáfrase, ou o

do interlocutor, heteroparáfrase. Através da autoparáfrase, o locutor pode indicar que

um tópico novo tem como aporte o seu antecessor ou atenuar o próprio discurso, numa

atitude de preservação de face. Já a heteroparáfrase permite ao locutor propor uma

colaboração ao discurso do ouvinte e sublinhar pertinência temática.

Ao fazer a análise desses mecanismos, conjugando o formulativo e o

interacional, admito que estou contribuindo para um avanço da pesquisa lingüística em

português. Este trabalho se diferencia da maioria dos estudos sobre organização textual

que separam o lingüístico do pragmático ou nem mesmo tocam em questões

interacionais, porque se restringem a uma abordagem eminentemente textual, de

composição estrutural do texto, conforme mostrei no item 2.3.2, no segundo capítulo.

Aponto também avanços em relação à concepção de articulação textual baseada em

conectores e relações referenciais, já que mostro, além das funções interacionais

presentes na articulação textual, a existência de outros procedimentos lingüísticos com

funções articuladoras, além da referenciação e da seqüenciação (KOCH, 1991), como o

metadiscurso, as perguntas e as paráfrases.

No capítulo de introdução, expus que a constituição do corpus foi guiada

por duas hipóteses: a) a diversidade de gêneros textuais nas modalidades falada e escrita

me permitiria perceber a recorrência de mecanismos de articulação tópica, e b) essa

heterogeneidade me daria boas possibilidades de perceber uma diversidade de fatos

interacionais. E realmente a análise de um corpus tão diversificado serviu para

demonstrar que os textos, independentemente de serem falados ou escritos, apresentam

os mesmos mecanismos de articulação tópica, ainda que alguns possam ser mais

215

freqüentes em uma ou outra modalidade, e que a topicalidade pode ser entendida como

uma estratégia de construção textual. A identificação de diferentes fatos formulativo-

interacioais também só foi possível graças à diversidade formal e funcional dos textos.

No que se refere especificamente à topicalidade, os resultados confirmam

também o fato de que o segmento tópico, a partir da categoria analítica de tópico

discursivo, pode ser tomado como unidade de composição textual. A análise intratópica

apresenta resultados semelhantes aos da intertópica, evidenciando que o segmento

tópico reúne os mecanismos formulativo-interacionais que ocorrem no nível do texto.

Alguns outros aspectos deixarem de ser considerados na análise assim como

ficaram em aberto outras questões que demandam investigações futuras. A comparação

entre mecanismos de articulação a partir dos contextos de seqüenciação, retomada ou

mudança tópica deixou de ser investigada. A análise não explicita, por exemplo, se

existe, e qual é a diferença entre a seqüenciação realizada pelo encadeamento de

referentes ligados a um contexto central e a feita por marcadores discursivos. Já o

estabelecimento de diferenças entre fala e escrita e gêneros textuais no que diz respeito

à articulação tópica é um exemplo de questão que demanda uma investigação futura.

Como fechamento a este trabalho, afirmo que o tipo de investigação

lingüística que realizei apresenta uma certa instabilidade, por lidar com uma categoria

tão subjetiva como as relações interpessoais que se estabelecem através da língua. Por

outro lado, reitero a posição de Barros (1999, p. 3), apresentada no segundo capítulo, de

que essa instabilidade é condição do estudo da linguagem. “São os fatos lingüísticos

instáveis, aqueles que não se resolvem como ‘ou isto ou aquilo’, que instigam os

estudiosos da linguagem, e os do discurso e do texto, antes de todos”. Enquanto

216

estudioso do texto e do discurso, consciente dessa instabilidade, reconheço que as

conclusões a que cheguei, neste trabalho, não passam de uma pálida certeza das

incertezas todas sobre a linguagem.

217

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CLEMILTON LOPES PINHEIRO

INTEGRAÇÃO DE FATOS FORMULATIVOS E INTERACIONAIS NA CONSTRUÇÃO DO TEXTO:

UM ESTUDO A PARTIR DA TOPICALIDADE

- ANEXOS -

Tese apresentada ao Programa de Pós-graduação da Universidade Estadual Paulista, Campus de Assis, para a obtenção do título de Doutor em Letras, área de Filologia e Lingüística Portuguesa.

Orientadora: Profª. Drª Clélia C. A. S. Jubran

FACULDADE DE CIÊNCIAS E LETRAS DE ASSIS/SP 2003

225

SUMÁRIO

ANEXO A – LISTA DE TEXTOS QUE CONSTITUEM O CORPUS...............228

ANEXO B – SEGMENTAÇÃO TÓPICA LINEAR DOS TEXTOS..................230

CARTA PESSOAL E-002......................................................................................231

CARTA PESSOAL E-137......................................................................................235

CARTA PESSOAL E-138......................................................................................237

ENTREVISTA ESCRITA E-128 ............................................................................238

ENTREVISTA ESCRITA E-162 ............................................................................241

ENTREVISTA ESCRITA E-03 ..............................................................................246

ARTIGO DE OPINIÃO E-149.. .............................................................................250

ARTIGO DE OPINIÃO E-152...............................................................................252

ARTIGO DE OPINIÃO E-154...............................................................................255

ARTIGO DE OPINIÃO E-257...............................................................................257

REPORTAGEM DE REVISTA E-01......................................................................258

REPORTAGEM DE REVISTA E-02......................................................................266

ARTIGO CIENTÍFICO E-020................................................................................270

ARTIGO CIENTÍFICO E-053................................................................................276

PALESTRA F-033 .................................................................................................284

PALESTRA EF-25.................................................................................................290

AULA EF-53 .........................................................................................................300

AULA EF-56 .........................................................................................................314

REPORTAGEM DE TELEVISÃO F-01 .................................................................321

REPORTAGEM DE TELEVISÃO F-02 .................................................................322

REPORTAGEM DE TELEVISÃO F-03 .................................................................324

REPORTAGEM DE TELEVISÃO F-04 .................................................................327

ENTREVISTA FALADA F-018.............................................................................328

ENTREVISTA FALADA F-037.............................................................................335

226

CONVERSAÇÃO ESPONTÂNEA D2-30 .............................................................337

CONVERSAÇÃO ESPONTÂNEA D2-39 .............................................................363

ANEXO C – DIAGRAMAS DE ORGANIZAÇÃO TÔNICA HIERÁRQUICA

DOS TEXTOS...............................................................................380

Diagrama 01 – Carta Pessoal E-002 ........................................................................381

Diagrama 02 – Carta Pessoal E-137 ........................................................................382

Diagrama 03 – Carta Pessoal E-138 ........................................................................384

Diagrama 04 – Entrevista Escrita E-128..................................................................385

Diagrama 05 – Entrevista Escrita E-162................................ ................................ ...386

Diagrama 06 – Entrevista Escrita E-03.....................................................................388

Diagrama 07 – Reportagem de Revista E-01............................................................389

Diagrama 08 – Reportagem de Revista E-02............................................................391

Diagrama 09 – Artigo de Opinião E-257................................ ................................ ...392

Diagrama 10 – Artigo de Opinião E-149................................ ................................ ...393

Diagrama 11 – Artigo de Opinião E-152................................ ................................ ...394

Diagrama 12 – Artigo de Opinião E-154................................ ................................ ...395

Diagrama 13 – Artigo Científico E-053.....................................................................396

Diagrama 14 – Artigo Científico E-020.....................................................................397

Diagrama 15 – Conversação Espontânea D2-30 .......................................................398

Diagrama 16 – Conversação Espontânea D2-39 .......................................................401

Diagrama 17 –Entrevista Falada F-037.....................................................................404

Diagrama 18 – Entrevista Falada F-018....................................................................405

Diagrama 19 – Reportagem de Televisão F-01 .........................................................406

Diagrama 20 – Reportagem de Televisão F-02 .........................................................407

Diagrama 21 – Reportagem de Televisão F-03 .........................................................408

Diagrama 22 – Reportagem de Televisão F-04 ........................................................409

Diagrama 23 – Aula EF-53......................................................................................410

Diagrama 24 – Aula EF-56......................................................................................412

227

Diagrama 25 – Palestra F-033 .................................................................................413

Diagrama 26 – Palestra EF-025...............................................................................414

ANEXO D – NORMAS DE TRANSCRIÇÃO DOS TEXTOS FALADOS ........415

228

ANEXO A

LISTA DE TEXTOS QUE CONSTITUEM O CORPUS

229

CARTA PESSOAL E-002 (NELFE)

CARTA PESSOAL E-137 (NELFE)

CARTA PESSOAL E-138 (NELFE)

ENTREVISTA ESCRITA E-128 (NELFE)

ENTREVISTA ESCRITA E-162 (NELFE)

ENTREVISTA ESCRITA E-03 (Coletado para a Pesquisa)

ARTIGO DE OPINIÃO E-149 (NELFE)

ARTIGO DE OPINIÃO E-152 (NELFE)

ARTIGO DE OPINIÃO E-154 (NELFE)

ARTIGO DE OPINIÃO E-257 (NELFE)

REPORTAGEM DE REVISTA E-01 (Coletado para pesquisa)

REPORTAGEM DE REVISTA E-02 (Coletado para a pesquisa)

ARTIGO CIENTÍFICO E-020 (NELFE)

ARTIGO CIENTÍFICO E-053 (NELFE)

PALESTRA F-033 (NELFE)

PALESTRA EF-25 (PORCUFORT)

AULA EF-53 (PORCUFORT)

AULA EF-56 (PORCUFORT)

REPORTAGEM DE TELEVISÃO F-01 (Coletado para a pesquisa)

REPORTAGEM DE TELEVISÃO F-02 (Coletado para a pesquisa)

REPORTAGEM DE TELEVISÃO F-03 (Coletado para a pesquisa)

REPORTAGEM DE TELEVISÃO F-04 (Coletado para a pesquisa)

ENTREVISTA FALADA F-018 (NELFE)

ENTREVISTA FALADA F-037 (NELFE)

CONVERSAÇÃO ESPONTÂNEA D2-30 (PORCUFORT)

CONVERSAÇÃO ESPONTÂNEA D2-39 (PORCUFORT)

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ANEXO B

SEGMENTAÇÃO TÓPICA LINEAR DOS TEXTOS

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CARTA PESSOAL E-002 Carta pessoal de um amigo para uma amiga. Niterói, 31/08/1991 Amiga A.P. Oi! [1 Para ser mais preciso estou no meu quarto, escrevendo na escrivaninha, com um Micro System ligado na minha frente (bem alto, por sinal ). Está ligado na Manchete FM - ou rádio dos funks -] [2 eu adoro funk, principalmente com passos marcados. Aqui no Rio é o ritmo do momento... e você, gosta? Gosto também de house e dance music, sou fascinado por discotecas! Sempre vou à Kool Ibiza, ontem mesmo ( sexta-feira ) eu fui e cheguei quase 4 horas da madrugada. Dançar é muito bom, principalmente em uma discoteca legal. Aqui no condomínio onde moro têm muitos jovens, somos todos muito amigos e sempre vamos todos juntos. É muito maneiro! Celso foi três vezes à Kool Ibiza, pergunte só a ele como é! Está tocando agora agora o “Melô da Mina Sensual”, super demais! Aqui ouço também a Transamérica e RPC FM. E você, quais rádios curte? Demorei um tempão pra responder, espero sinceramente que você não esteja chateada comigo.] [3 Eu me amarrei de verdade em vocês aí do Recife, principalmente a galera da ETFPE, vocês são muito maneiros!] [4 Meu maior sonho é viajar, ficar um tempo por aí, conhecer legal vocês todos, sairmos juntos...vai ser demais ! Só que , infelizmente, não sei ao certo se vou realmente no início de 1992. Mas pode ser que dê, quem sabe?!] [5 É o seguinte: como você sabe, estudo no CEFET - RJ e estou no último ano do curso técnico de Metereologia.] [6 Bem, já estou estagiando em Furnas Centrais Elétricas. É uma das empresas que gera eletricidade para o Brasil, com suas usinas hidroelétricas. Você deve estar pensando: mas porque eles querem um metereologista? Lá eu faço a previsão das chuvas, ou seja, digo se vai chover e quanto vai chover em todas as cidades por onde passam os rios Paraíba do Sul e Grande. Com minha previsão eles sabem o quanto vão. abrir as comportas das usinas. Assim a chuva não inunda as cidades. Imagine se eu digo que vai chover, eles abrem as comportas e na verdade não chove? A hidroelétrica fica sem água para transformar em energia elétrica e o que acontece? Todos os estados da região Sudeste e Sul ficam sem energia. Vou almoçar. Pronto, já almocei. Por aí você tira a importância da minha profissão. Muita gente pensa que metereologia é só fazer previsão do tempo; mas esquecem que sem a metereologia não haveriam alimentos, nem viagens de navio ou de avião. Já notou que sou fascinado por metereologia, não é? Adoro minha profissão é super interessante. Mas vamos voltar ao assunto da viagem.!] [7 Sabe Ana Paula, assim que entrei em Furnas eu não via possibilidades em ser efetivado, já que é uma empresa estatal e de grande porte. Só que a cada dia as chances foram aumentando e demonstrei ser um bom profissional. Acho que tudo que fazemos quando gostamos de verdade, fazemos bem feito. E estão aparecendo oportunidades de ser contatado. Eu não queria trabalhar como técnico, queria mesmo fazer Universidade; só que oportunidades como essa só aparecem uma vez na vida; lá eles pagam muito bem (mesmo!) e com essa crise que o país atravessa... espero que dê tudo certo! De qualquer forma esta vaga pode não surgir; por isso que estudo tanto para o vestibular. Acho que vou tentar para Informática. Está tocando o Melô da Dengosa, simplesmente adoro!]

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[8 Não sei ao certo se vou ou não, mas fique certa que farei de tudo para conhecer vocês o mais rápido possível. Posso te dizer uma coisa? Adoro muito vocês!] [9 Agora, a minha rotina: Às segundas, quartas e sextas-feiras trabalho de 8:00 às 17:00h, em Botafogo - Rio. De lá vou para o CEFET, minha aula vai de 18;30 às 22:40h. Chego aqui em Niterói quinze para meia-noite. E às terças e quintas fico em Furnas só de 8:00 às 12:30h. Vou para o CEFET; às 13:30 começa o meu curso de Francês (vou me formar ano que vem ) e vai até 15:30h. 16:00h vou dar aula e fico até 17:30h. 17:40h às 18:30h faço natação ( no CEFET também ) e até 22:40h tenho aula. É barra, por aí você vê porque eu demoro tanto a escrever. E ainda nas horas vagas estudo para o Vestibular!] [10 Ontem eu e Simone fizemos 3 meses de namoro; você sabia que eu estava namorando? Ela mora aqui mesmo no ((ilegível)) (nome do condomínio). A gente se gosta muito, às vezes eu acho que nunca vamos terminar, depois eu acho que o namoro não vai durar muito, entende? O problema é que ela é muito ciumenta, principalmente porque eu já fui a fim da Betinha, que mora aqui também. Nem posso falar com a garota que Simone já fica com raiva. Ontem mesmo, só porque eu cheguei da janela e, como ela foi a 1 pessoa que eu vi, pedi que me esperassem (fomos à Kool Ibiza ); só que Simone estava perto e, sinceramente, não a vi. Senão é claro que teria falado com ela que é minha namorada. Acabamos brigando, depois ficou tudo bem. Vamos ver!] [11 Achei um barato sua carta, sabia? você deve ter um humor ótimo; eu também sou assim. É muito difícil eu não estar rindo; não fico chateado por qualquer coisa. Aliás, carioca em geral é assim: com super bom humor, sempre descontraído. Leva a vida na praia e discotecas.] [12 Por falar nisso, estou louco que chegue logo o verão e ir à praia; um tempão que eu não vou. Quem sabe se não vamos juntos à Boa Viagem hein Ana Paula?] [13 Agora vou “entregar”: pelo que Celso diz você deve ter um corpo!... Não é só eu que ganha elogios, viu?! Maneiro vocês me acharem um gato, fiquei super hiper feliz! Quem não gosta de ganhar elogios? Principalmente de “altas gatas” como vocês! Celso me mandou a foto da turma, cada gatinha!... Pelo que soube o aniversário do Celso foi demais e o seu quando é? Eu faço 18 dia 07/11. É acho que vou terminando... ...escreva! Faz um favor? Diga pra Michelli, Anna Paula e Celso que esperem, não demoro a escrever Adoro vocês!] OBS: Acho que vou mandar uma fita pra Celso, depois pede pra ouvir! Não esquece, mas por enquanto não diz a ele, OK? Um beijão! Do amigo Pedro Paulo 15:16h

RIO. UM ESTADO DE ESPÍRITO

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CARTA PESSOAL E-137 Carta pessoal entre duas amigas “VIVER É AFINAR O INSTRUMENTO DE DENTRO PRA FORA, DE FORA PRA DENTRO, A TODA HORA, A TODO MOMENTO... DE DENTRO PRA FORA, DE FORA PRA DENTRO...” (ouvi essa música no rádio) São Paulo, 02 de abril de 1997 Oi Suzi!!! [1 Acabei de receber sua carta, devorei-a, acho que vou até ler de novo. Sabe quando se quer saber logo tudo de uma vez, pois é! Ao terminar a carta, quer dizer, agora: estou tremendo, sorrindo, chorando, sentindo algo muito estranho, por isso corri para escrever para você.] [2 Já que não posso armazenar as imagens que tenho aqui dentro e mandar, pelo menos escrevendo logo eu mando os pensamentos “fresquinhos”, o problema é que as palavras são lentas em relação as idéias/pensamentos/fatos/relatos.] [3 Amei o tamanho da carta, ideal, por favor se for mandar, ouça meu conselho: faça MAIOR.] [4 Senti uma emoção enorme ao ler sua carta, adorei, parecia que estava falando com você!] [5 Ao ler o começo qnd você falou que o nosso convívio tinha mudado com o meu namoro com DUDA, fiquei um pouco triste com o que li, eu só tive idéia do que você pensava agora que vim pra cá. Na verdade me senti como se tivesse abandonado você. Suzi, nunca te abandonei. Irmã não se abandona.] [6 Na verdade, eu sei o que você sentiu, afinal já estive no seu lugar por um bom tempo. O que acho que aconteceu foi o fato de você ter ficado só o ano passado, com o colégio em fase “crítica” e eu ter conhecido Edu, você precisava de farra, saídas, paqueras (o que é normal) só que comigo não podia ser a mesma coisa pois sabemos que qnd se sai com namorado é diferente. Com as meninas você não podia contar sempre, eu é que era um pouco mais “estável”. Você sabe que namoro ocupa um certo tempo, (não que isso justifique algo) como você ocupava com Anderson e vem ocupando com Tércio (como percebi na carta,] [7 bom nesse assunto falo adiante, deixa só eu terminar o tema anterior). O que senti aqui foi arrependimento e vontade de pedir desculpas por ter feito você se sentir assim, acho que isso acontece principalmente porque eu estou aqui e não posso vê-la, nem falar com você o tempo que quiser. Acho que você deve estar percebendo que estou tentando me explicar; as coisas (ano passado) foram se atropelando, e acontecendo. Edu é uma pessoa maravilhosa, incrível e ao mesmo tempo um pouco inseguro; você sabe que qnd são da mesma idade, as mulheres costumam ser mais madura (acho que isso acontece entre nós!!!). Bem, várias vezes briguei com ele p/ estar com vocês (entende-se amigas) e ele usava aquela velha “ladainha” (já conhecida por você) de “troca” e adjacências... Resumindo todo esse blá, blá, blá...] [8 peço desculpas caso tenha feito você se sentir só e acredito que isso não tenha interferido na nossa amizade (bem é quase “fraternidade”). Bom, essa pequena introdução eu tinha que fazer logo, antes que as idéias fugissem sem que eu percebesse; as próximas idéias podem ser reobtidas ao reler sua carta.] [9 Agora tenho muito o que fazer (hoje é quarta -feira) no domingo (meu dia livre) eu termino com calma, detalhes, observações, novidades, conclusões... Até breve!!!!! JÁ DEVO ESTAR VOLTANDO A ESCREVER! AGUARDE!!! EM BREVE, NA SUA CASA!!!!!

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Voltei, demorei mas voltei, hoje →12/04/97. Sábado à noite, depois do dia inteiro de aula, estou ouvindo MPB e escrevendo calmamente.] [10 Acabei de ler (de novo!) sua carta. Adorei! Antes que eu me esqueça mande um beijo p/ Tércio (na boa!!!) e diga ele que juízo, avise-o p/ tomar conta de você direitinho, já que eu não estou aí! ] [11 Pelo que percebi em sua carta vocês estão vivendo um relacionamento maduro, cheio de novas experiências, trocas e cumplicidade (isso é importante, é bom p/ um casal ter coisas só suas, de mais ninguém), fico muito feliz de você estar passando por essa experiência. Quando fez uma espécie de “comparação” com Anderson você tem que levar em consideração que o que você aprendeu foi fundamental para a Suzi de agora, além de que na nossa idade, meses mais velho significa muita coisas em termos de crescimento.] [12 Não sei se com você é assim, mas quando chegam cartas aqui leio a primeira vez com tanta ânsia que certas idéias fogem e eu tenho que ler de novo, mais analítica e calma.] [13 Outra coisa que eu observei na sua carta foram os seus vocábulos rebuscados, não que antes não fosse assim também, é que achei-os mais intensos;] [14 espero que você tenha paciência com o português de sua humilde amiga simples aluna de cursinho; não sou aluna de Letras não se esqueça disso e não leve em consideração meus erros; se parar p/ pensar em escrever politicamente correto as idéias fugiriam.... por isso não posso perder tempo.] [15 Pelo que li você está mais integrada na Federal, percebi que você está dinâmica, disposta, em boa forma física, mental e sentimental, é claro. Sabemos que as adversidades surgem, mas não são em vão, nem á toa, elas têm um objetivo: serem enfrentadas.] [16 Sobre o seu avô acredito que Deus sabe o que faz. Sempre que me lembro, rezo por ele e pa todos aí! Inclusive você! Lembra uma vez em que estávamos lá em casa nessas últimas férias e eu disse que você estava com ar leve, ar saudável, com mais vida!?? Acho que você se lembra, cê até falou que já tinham dito a mesma coisa, lembra? Pois é, depois de nosso papo (ah! Que falta estou sentindo dos nossos papos ecléticos) “via correio” acredito que você continua assim.] [17 Ando refletindo muito sobre amizade, família, amor, convívio, diferenças, enfim sobre a vida de maneira geral, estou numa fase de grande introspecção e amadurecimento, isto está sendo muito bom para mim. [18 Sabe o que descobri? Precisei (não necessariamente) me afastar um pouco, para assim acabar unindo pela minha ausência as pessoas que me rodeiam. Outra coisa é o que tenho lido nas cartas, não só sua mas das outras pessoas, as cartas dizem impressões, coisas bonitas, reflexões, opiniões que às vezes pensamos e não as registramos. Estou escrevendo e lendo coisas que talvez tenham sido sempre pensadas mas como se tinha a pessoa perto todo tempo, deixavasse para depois e acabavam perdidas.] [19 Quero pegar nossas cartas, lê -las daqui a una 20, 30, 40 ou 50 anos e ri, chorar, comentar, sentir saudades...] [20 Estou aprendendo muito, muito, muito. Não me arrepende de Ter vindo , mas a saudade é muita! Tente se colocar no meu lugar, você tem uma amiga distante. Estou distante praticamente de tudo.] [21 Sinto falta de discutir minhas reflexões com alguém, ainda não tive a oportunidade aqui de fazer isso, pois companheiros de conversa não se encontra todos os dias.] [22 Na minha sala tem de tudo desde de uns “veadinhos” até um japonês que varia a cor do cabelo do roxo (roxo mesmo!) ao verde-limão. O pessoal mais cabeça é do grupo de humanas, pessoal mais “certinho”, de biológicas. Os jovens são no geral como eu, os que estudam de manhã não trabalham, não passam dificuldades (assim como eu)! Estou andando duas meninas que sentam perto de mim, mas não dá pra conversar sobre tudo com elas porque: 1º) não as conheço bem e 2º) elas ainda são meio imaturas, sei lá, eu ainda sou uma criança. As aulas são legais e descontraídas, os professores são bons, ótimos e as piadas são bem escrachadas, nunca seriam ditas no Sta. Maria. Os professores são apaixonados por sua matérias. Os de humanas vão das aula de moleton e sandália hippie e os de física também. Muitos deles são bem jovens, cerca de 25 anos. Um dos meus professores de Geografia foi aluno de FHC na USP. Tenho no mínimo 4 professores por matéria (a matéria que tem menos é Inglês, são quatro!!!!)

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Aproveite o MAR e o AR PURO daí! Eles estão fazendo muiiita falta aqui!!!] [23 Vou aproveitar minha estadia ao máximo, estou drenando meus objetivos num sentido de engrandecimento cultural, pessoal. Estou me dedicando ao estudo e minhas horas vagas pretendo dedicar a museus, teatros, leituras, exposições.] [24 A variedade no aspecto cultural aqui é bem mais ampla. Você precisa vir p/ cá assim que for possível, existem mais lugares, centros, enfim, mais oportunidades (claro que você já sabe disso!)] Irmãzinha vai estrear aqui esse mês uma exposição de Monet, ela agora está no RJ. Amanhã vou ao teatro com Tati, peça na FIESP da Paulista, onde as peças são de graça. A noite daqui é muito diversa, cada bairro tem suas atrações, shows, barzinhos e muitas, mas muitas boates. Acredito que não vou ter esse ano muita oportunidade de conhecer esse lado de Sampa, mas tenho que abrir mão de certas coisas a meu próprio favor.] [25 As coisas aqui vão se estabilizando com o tempo, virando rotina o que é normal.] [26 Desculpa pela sujeira da folha é que a caneta tá uma droga! Prometo que a próxima carta vai ser mais “clean”! All right??] [27 Irmãzinha estou de bem com a vida, mesmo com a saudade, se soubermos explorá-la bem, pode-se aprender mais do que sofrer com ela, afinal não morremos, estamos VIVOS!] “Valeu a pena? TUDO vale a pena se a alma não é pequena!” (Fernando Pessoa) Beijos Roberta Santiago

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CARTA PESSOAL E-138 Carta pessoal entre amigas Manaus, 06 de março de 1997 Oi, Suzy! Como vai você? Ainda muito apaixonada ou só mesmo curtição? [1 Sú, aqui é tudo tão diferente, as pessoas são estranhas, o cotidiano do pessoal e até mesmo a própria cidade : muito tranquila em termos de assaltos ( aqui andamos c/ jóias, pulseiras etc em pleno Centro!) e ao mesmo tempo é bem movimentada, as pessoas ñ param de trabalhar ou estudar, é sempre no maior pique. Até eu já estou me sentindo uma típica cidadã manauará, estou trabalhando como secretária do consultório de minha tia (ginecologista). Estou gostando à beça apesar do pique de conciliar c/ os estudos, e ainda estou procurando outro emprego (profa de inglês p/ crianças) na qual deixei meu “grande currículo”, aguardando resposta. Sei que pagam muito bem nesta instituição (faculdade).] [2 Ah! Eu vou até tentar nela meu curso de Odonto mas ñ pretendo seguir pois prefiro passar na Federal (UA) onde é a única que serve por aqui, na área de saúde. Agora terei que esperar até o final do ano!] [3 E como vai a Paulinha, a Ana Flávia, tia Sônia, tio Arthur, Demétrio, “Cocó” (tô morrendo de saudade dela!), a Net, a Rafaela, a Margot, Renatinha, o Técio... mande um beijo p/ todos eles e que em breve estaremos curtindo à beça por aí em Recife.] [4 Ah! Me fala do Técio! Vocês ainda estão namorando, hein? Espero que sim, ele se mostra uma maravilhosa pessoa, não vai largá-lo, viu? E o Anderson? Ele têm visto vocês juntos? Mande lembranças por mim!] [5 Ah, Suzy, você vai me fazer um favor, pergunta p/ o Técio qual o dia do aniversário do “mudinho” (Alexandre) sem que ele saiba que sou eu que quero saber, ok?!?] [6 Mande um beijão também p/ o Charlies quando o encontrar e avise a ele que estou aprendendo muitas coreografias do boi p/ gente dançar quando tiver por aí. Ah! E mande um beijão especial p/ “meu mudinho”, apesar de já ter escrito p/ ele. O cafezinho c/ coca-cola vai ficar mesmo p/ o final do ano.] [7 Ah, Suzy, aqui tem o tempo mais doido que já vi, numa hora chove, chove que vejo a hora tudo cair, chuva c/ trovões e relâmpagos é muito freqüente. Depois de um tempinho, abre o maior sol que ninguém agüenta de tão forte que é!...] [8 Sú, eu pensei muito em suas palavras logo que o avião subiu, o engraçado que o meu companheiro de viagem era um senhor espírita, o coronel Nunes, e ele foi me consolando e contando aquelas lindas mensagens até Manaus. O maior barato! Ainda parei em Fortaleza p/ comer e cheguei em Manaus eram umas 5:00 h. Justamente no mesmo dia estava havendo a festa de aniv. de minha prima, Valéria, e ainda fui me arrumar p/ receber os convidados. Foi jóia!] [9 Ah! Você lembra do William? O Doidinho da lente (carnaval)? Ele me ligou no outro dia e já me escreveu mandando a foto da gente, tudo azuzinho, parecendo os “smurfs”. Ficou uma gracinha, aparece quase todo mundo , pena que você ñ estava no momento. ] [10 Ah, Suzy, como ficou a estória do gaúcho c/ Helguinha? Tens conversado c/ ela? Eu ainda falto lhe escrever.] [11 Ah, já estou c/ um pretendente por aqui, o pior é que eu nem conheço a “peça” direito, mas este disse que me adorou e que têm sonhado até comigo. Ele se chama Léo, amigo d+ de minha prima Simone, faz medicina e é muito estudioso, é o que falam! Esse fim-de-semana, marcamos de todos nós saímos p/ dançar.] [12 Suzy, aqui só fala em boi, tudo que é bom tem o boi no meio, tem rádios que só tocam o boi, currais da alegria, onde os grupos (Garant. e Capric) cada um tem o seu. Uma loucura, uma boiada só!] [13 Tenho falado muito por aqui é c/ o Fred, este tá morando umas 2 ruas daqui de casa e já me encomendou uma caixa c/ todos os livros e apostilas. Puxa, eu achei o máximo da parte dele está podendo me ajudar. Suzy, eu já estou c/ a mão estalando, daqui a uns dias, eu te escrevo novamente e me manda uma resposta também, viu? Tenho ligado (pelo orelhão

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pois no momento mamãe ñ quer que gastemos muito!) mas você não se encontrava em casa. Me diz a hora em que eu te pego pois vou logo renovar os meus cartões telefônicos.] Sinto muita, muita... saudades de todos vocês! Um beijão da amiga Renata Farias [14 OBS→ meu telefone é (092) 6422149, e é mais fácil me encontrar à noite! OBS→ Se você tiver, me manda o endereço da Tati, pois o meu ficou em Recife, ok?!? OBS→ Me manda umas fotos de você c/ a galera por aí p/ eu guardar em meu mural! OBS→ Se quiser, pegue minha fita da formatura c/ Silvestre ou c/ Beta, tire cópia e depois me manda! (é claro, a original!)] SAUDADES !

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ENTREVISTA ESCRITA E-128 Entrevista Luiza Erundina ‘As coisas mudaram, não sou mais xiita’ Candidata à sucessão de Maluf admite que errou ao governar São Paulo sem alianças e sem administrar as crises no PT [1 Houve um tempo, nos primeiros anos do PT, que a facção mais radical do movimento era chamada de xiita, referência ao grupo fundamentalista iraniano do aiatolá Khomeini, o mais impaciente e rebelde. “A gente não queria tudo, agora e já. E dava para entender: estávamos saindo de uma ditadura, existia uma espécie de febre de realizar, na prática, todas as teorias. Foi um erro”. Quem faz esta confissão de culpa é Luíza Erundina de Sousa, nascida há 61 anos na periferia de um povoado do sertão da Paraíba — Belém do Rio do Peixe. Prefeita de São Paulo entre 1989 e 1992, Erundina está de volta. Agora, numa casa pequena de quarto e sala no bairro de classe média de Perdizes, onde acaba de estabelecer o QG da campanha, Erundina parte para o ataque tentando ocupar novamente, em 1° de janeiro de 1997, a poltrona que cedeu a Paulo Maluf.] Alessandro Porro O GLOBO: [2 Qual é a diferença entre esta campanha e a de 1988 ? ERUNDINA: A mesma diferença que passa entre dois momentos da vida de um país.] [3 Em oito anos o país mudou, nós mudamos. Mas, minha preocupação não é o estilo da minha campanha: o que vai ser novo é o tipo de governo que vou fazer, na forma e na substância.] [4hA senhora também mudou ? ERUNDINA : Sim, certamente. Aprendi muito, apanhei muito, errei muito.] [5hQuais os principais erros ? ERUNDINA : Diria que foram três, igualmente graves. O primeiro: governei uma prefeitura, a mais importante do país, sem preocupar-me com alianças políticas. Achei que dava para fazer tudo sozinha, ignorando o jogo das coalizações e das alianças. Apenas o PCdoB e o PCB estavam ao meu lado, e assim mesmo sem muita utilidade: a oposição, maioria na Câmara dos Vereadores, acabava sempre derrubando meus projetos, obstaculizando até aquelas medidas que — fora de qualquer contexto ideológico — só serviriam para aliviar os sacrifícios dos cidadãos. hQuer dizer que houve excesso de confiança na sua capacidade de administrar sozinha ? ERUNDINA : Quer dizer que houve erro de interpretação. Quando comecei meu governo, achei que o PT, por ser honesto, limpo, íntrego, teria o apoio incondicional de todo mundo. Pode chamar esta atitude de ingênua, se quiser. Mas a verdade é esta, em toda sua gravidade. Assim como foi

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grave o segundo erro: o de não ter administrado como precisava, com força e severidade, os conflitos internos de meu partido, conflitos que acabavam incomodando e até atrasando o trabalho que planejara. hA senhora está se referindo`as intemperanças da facção xiita ? ERUNDINA : Também. ] [6 Mas agora a situação mudou bastante. Devo repetir o que já disse: houve um amadurecimento, uma mudança no partido e em seus membros. Hoje, o sectarismo e a intolerância estão reduzidos ao mínimo. Quero dizer-lhe uma coisa: sim, fui xiita, quando era necessário ser xiita, no momento da luta contra o arbítrio. Hoje as coisas mudaram. Hoje não sou mais xiita. Ainda existem pequenos grupinhos no partido que continuam com sua visão revanchista: são uma minoria, que respeito como devem ser respeitadas todas as minorias. Até lhe reconheço uma certa função positiva: a de ajudar-nos a manter vivos os ideais, que são os de sempre.] [7hE o terceiro erro ? ERUNDINA : Talvez não seja nem o terceiro, nem o primeiro, nem o segundo. Mas foi grave, gravíssimo: nos quatro anos de meu primeiro governo, houve uma falta completa de comunicação entre a minha administração e a mídia. Fomos tratados com desdém e crueldade, até quando a gente fazia um trabalho que não podia ser considerado politicamente ameaçador pelos opositores. Devo reconhecer que confiamos, de maneira mais uma vez ingênua, na simpatia dos jornalistas, sem nos preocupar em estabelecer um contato sério e responsável com os donos dos grandes meios de comunicação. Acabamos achando que não era preciso dizer, com toda a clareza possível, a quem poderia ter nos ajudado, e muito, quais eram nossos planos, nossas previsões, nossas necessidades. Não se tratava de querer que todos se filiassem ao PT, mas que todos entendessem que o que a gente queria fazer era melhorar a vida de uma cidade.] [8hParece um apelo. É um apelo ? ERUNDINA: Quero que seja um dos pontos principais de meu programa. Não me interessa o rótulo: apelo, convite, oferta, possibilidade de encontro... Para mim está tudo bem. O que gostaria é que ficasse clara uma coisa: Erundina não vai governar sozinha, Erundina não quer mais quatro anos de solidão. hJá ganhou ? ERUNDINA: Absolutamente não. Mas o panorama não é sombrio. Nosso adversário é Francisco Rossi, do PDT, um partido que em São Paulo não existe. Assim mesmo, se as eleições se realizassem hoje, estaríamos tecnicamente empatados, com 25 ou 26% dos votos. Mas até outubro muita coisa vai ser esclarecida, muita coisa vai ficar mais nítida. hRossi tem o apoio da Igreja Universal do “ bispo “ Macedo... ERUNDINA: Pelo amor de Deus, não quero tocar neste assunto. Já está resolvido: a religião vai ficar de fora da campanha. Não quero transformar minha campanha numa guerra santa. Baixaria não é comigo, garanto. Saí primeiro no campo de luta. Vamos ver os primeiros candidatos: sei que Fernando Henrique ainda não encontrou o seu, e vai ser difícil o aparecimento de um nome válido.

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Mas ainda é cedo. Até agora, a coisa mais importante de minha campanha é o apoio de Lula, que me disse : “ Vou ser seu cabo eleitoral, conte comigo”. hJá pode anunciar seu vice ? ERUNDINA : Não, ainda é cedo. Em meados de maio teremos o encontro municipal do partido, no qual serão tomadas as decisões. Só posso adiantar uma certeza: meu vice será um homem. O eleitor paulistano não vai agüentar duas mulheres administrando sua cidade...] FONTE: O GLOBO - O PAÍS- DOMINGO, 7 DE ABRIL DE 1996.

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ENTREVISTA ESCRITA E-162 ENTREVISTA: BUSSUNDA Queremos um careca O humorista espera que o próximo presidente seja mais engraçado, dá a lista dos maiores chatos do país e diz que 1994 promete muitas piadas. VIRGINIE LEITE [1 Com seus 115 quilos mal distribuídos por 1,73 metro de altura, o humorista Cláudio Besserman Viana, o Bussunda, de 31 anos, é a imagem acabada do escracho e da irreverência do grupo de sete rapagões que escrevem e interpretam as piadas do programa Casseta e Planeta, Urgente , da Rede Globo. [2 O programa entra no seu terceiro ano em abril, amparado por uma média de audiência de 42 pontos no Ibope, e, para comemorar, a turma lança nesta semana O Grande Livro de Pensamentos da Casseta e Planeta , uma antologia de frases impagáveis.] A figura de Bussunda sempre chamou a atenção. Aos 12 anos, numa colônia de férias, o menino ficou cinco dias sem tomar banho (“Pulava na piscina e achava que já estava limpo”, conta) e ganhou o apelido de Bessermundo. Era uma mistura de seu sobrenome com Sujismundo, personagem de uma campanha na TV para incentivar as crianças a tomar banho. Bussunda, a alcunha que carrega orgulhosamente até hoje, é a corruptela mais atrevida desse apelido, criada tempos depois. A incursão de Bussunda no mundo da galhofa se deu na faculdade de Jornalismo, quando se juntou aos amigos para fazer o Casseta Popular, então um jornalzinho mimeografado. Antes disso, aos 13 anos, seguindo os passos dos pais, tornou-se militante do Partido Comunista Brasileiro, mas diz que logo se decepcionou: “Para mim, a militância era uma coisa meio polícia e bandido, porque eu via os amigos do meu pai sendo presos e queria pegar em armas - só que entrei no partido errado, porque o PCB era contra pegar em armas”. Hoje, o ex-comunista (“Meu muro caiu bem antes do que o de Berlim”) não se acanha em debochar da esquerda, assim como assume com naturalidade ter ganho 10 000 dólares para protagonizar um anúncio contra a privatização da Petrobrás. Casado com a radialista Angélica Nascimento, pai de uma filha de 3 meses, Bussunda recebeu VEJA na semana passada para falar de televisão, humor, juventude e política.] VEJA – [3 Os humoristas têm tido material farto para trabalhar? BUSSUNDA - Este ano é de eleição e Copa do Mundo - certamente vai ter material de sobra.] VEJA –[4 Qual a maior fonte de inspiração da turma do Casseta e Planeta? BUSSUNDA - Estamos num fase muito boa. Os políticos têm colaborado muito, Brasília tem dado ótimas pautas. No ano passado, o ponto alto foi a CPI da Corrupção e o João Alves foi o patrono dos humoristas, mas saturou um pouco. Agora, estamos esperando o suicídio dele; afinal o político tem que honrar suas promessas. O PC Farias também ajudou bastante, porque, além de ser ladrão, é careca. Neste ano, os humoristas torcem pela candidatura do Esperidião Amin para a gente ficar quatro anos fazendo piadinha de careca. A gente vai poder até tirar férias e colocar uns iniciantes para fazer piadas no nosso lugar. VEJA – O governo Itamar Franco não é bom de humor? BUSSUNDA – No governo Collor, havia personagens muito fortes, que rendiam muita piada. O Itamar prestou um desserviço aos humoristas: montou um ministério de desconhecidos. Por causa de seu estilo centralizador, a gente está com um problema dentro do grupo Casseta e Planeta. O Reinaldo, que interpreta o Devagar Franco, não era muito conhecido de o Itamar substituir o Collor. Agora, ficou muito famoso, é reconhecido nas ruas e está entrando em crise porque o Itamar vai sair

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do governo. Ele pretende até defender a possibilidade de reeleição do Itamar na revisão constitucional. O Itamar dá caldo em matéria de humor, mas, na época do Collor, da Zélia, nós fazíamos graça em cima do comportamento deles. Com o Itamar, a graça é em cima do que ele não faz.] VEJA –[5 Qual o motivo do sucesso do programa de vocês? BUSSUNDA - Fazemos humor com atualidade.] [24 A televisão despertou há pouco tempo para a febre do jornalismo. A concorrência nessa área é a maior que existe na TV.] A gente faz a paródia do jornalismo, uma coisa que funciona muito bem.] [25 Todos os outros programas de humor, como vêm da época do rádio, já têm um formato muito conhecido e brincam só com os costumes. É muito raro pegarem pela atualidade.] [26 A gente trabalha quase como num programa jornalístico. Temos a pauta do mês, e a agilidade é importante. Às vezes, fazemos matérias dois dias antes de o programa ir ao ar. Essas matérias fazem muito sucesso. O segredo está aí.] VEJA –[6 Como vocês selecionam as “matérias” que vão ao ar? BUSSUNDA - Só fazemos piada com o que deu no Jornal Nacional, porque a gente sabe que o nosso público é o que assiste à Globo e o grau de informação que ele tem é aquele. Não adianta fazer uma piada sobre o Gerald Thomas na TV, porque a maioria do público não sabe quem ele é.] VEJA –[7 Vocês se consideram bons atores? BUSSUNDA - Como atores, somos como o Tom Jobim cantando - o único charme é que somos nós que fazemos as piadas. Nós somos sem jeito, todos homens, e muito feios.] VEJA –[8 O humor de vocês é politicamente incorreto - vocês já foram chamados de racistas, machistas e fascistas. Isso incomoda? BUSSUNDA - Isso é uma injustiça. Somos o grupo de humoristas mais politicamente correto do Brasil - debochamos de todas as minorias sem nenhuma distinção de raça, credo ou sexo. E temos amparo para isso porque há no grupo dois judeus, dois negros e até um bicha, que não posso dizer quem é. Só não temos um português, porque não encontramos nenhum que tivesse capacidade de entender as nossas piadas. O movimento negro e o movimento das mulheres têm sua razão de ser, mas são grupos mal-humorados. Eles deviam voltar suas baterias contra o que é sério, e não contra o que é piada.] VEJA – [9 Que problemas vocês já tiveram com grupos militantes por causa de piadas? BUSSUNDA - O único grupo com que não tivemos problemas até hoje foi o dos anões, que não são uma categoria organizada e não têm tamanho para bater na gente. Tivemos problemas, por exemplo, com o movimento negro, por causa do nosso disco Preto com um Buraco no meio. Foram, inventar que o título era por causa dos cadáveres de negros encontrado na Baixada Fluminense. O título não tinha nada a ver com isso. Era porque o disco é uma bolacha preta de vinil, com um buraco no meio. As feministas também ficaram furiosas com aquela música que eu fiz dizendo que “mãe e mãe, paca é paca, mulher é tudo vaca”. Elas não entenderam a letra da música que eu fiz quando estava tentando namorar a minha atual mulher. Dizer que mulher é tudo vaca é a mesma coisa que as mulheres dizerem que “homem é mesmo tudo igual” ] VEJA –[10 Quando a turma da Casseta e Planeta foi contratada pela Globo, o Chico Anysio se sentiu ameaçado e reclamou que a empregada dele não entenderia aquele tipo de humor. A briga entre as partes continua? _________ As novelas das 8 se dividem em dois tipos: com sotaque baiano e sem sotaque baiano. Quando está no ar uma novela sem sotaque, o espectador pode apostar que a próxima vai ter. E o sotaque baiano se tornou o refúgio dos canastrões. Com sotaque, até eu ganho o Oscar. _________ BUSSUNDA – A empregada dele pode não ter entendido, mas as pessoas da classe social dela entenderam, porque TV Pirata dava audiência de 40%. Mas o Chico é um excelente comediante. Não temos nada contra ele e ele não tem nada contra o grupo. Estamos de bem. Já fomos uma

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classe mais desunida. Hoje, o movimento humorístico brasileiro está unido com um corporativismo forte, e até pretendemos fazer a primeira grave dos humoristas a qualquer momento. Às vezes, fazemos alguma brincadeira com a Zélia, mulher do Chico, mas ela é uma pessoa pública. Ele tem todo o direito de não gostar, mas não podemos esquecer uma mulher que passou a mão na poupança de todo mundo. Eu acho a Zélia o fim, uma mala sem alça, com os dentes separados e aquela pose de gostosa.] VEJA –[11 O que você acha dos programas infantis da TV? BUSSUNDA - A Xuxa, a Angélica e a Mylla Christie são bonitinhas e inofensivas, gostaria que fossem babás da minha filha, mas os programas são de lascar. No Canta Conto, da TVE, a Bia Bedran conversa com o mar e ele responde, fala “oi, bondinho” para o bonde do Pão de Açúcar e ele retruca “oi, Bia”. Eu não deixo a minha filha ver uma coisa dessas de jeito nenhum. Em matéria de chatice, a Bia Bedran é o Oswaldo Montenegro de saias.] VEJA –[12 Quem são hoje os outros campeões da chatice no país? BUSSUNDA - Há vários tipos de chato. O Humberto Gessinger, do grupo Engenheiros do Hawaii, e o Gabriel o Pensador, por exemplo, são chatos do mesmo tipo: fazem música óbvia para que pessoas que nunca leram um livro se sintam inteligentes. Podem ser chamados de os chatos ginasianos. O maior chato do Brasil é, sem dúvida alguma, o Beijoqueiro. É o chato mala, que dispensa maiores explicações. Mas o pior tipo de chato é o chato bêbado, que fica com um copo em uma das mãos e a manga da camisa alheia na outra. Foi esse tipo que me fez parar de sair à noite, porque sempre tinha um representante da categoria que vinha parar na minha mesa e contar uma piada nova que eu já conhecia há mais de cinco anos. Há também o chato dono da verdade, como o Agnaldo Timóteo - se acha um primor de inteligência e é o única que enxerga essa qualidade nele. Há os chatos de plantão, como o Amaral Netto e o Jair Meneguelli. E não se pode esquecer dos chatos centrados, tipo Mário Covas, que não dizem nada com uma firmeza impressionante.] VEJA – [13 E o que acha das novelas? BUSSUNDA - Eu sou noveleiro desde criança, embora meus pais me proibissem de ver novela. Eles eram do Partido Comunista e eu não podia ver novela porque era coisa “de alienado”. Aí, eu via escondido. Foi minha primeira rebeldia. As marcantes para mim foram O Bem Amado e Saramandaia . Agora estamos numa fase meio baixa das novelas. As do horário das 8 são um ótimo exemplo de que a teledramaturgia brasileira está burocrática. Elas se dividem em dois tipos: com sotaque baiano e sem sotaque baiano. Quando está no ar uma novela sem sotaque, o espectador pode esperar que a próxima vai ter sotaque. E o sotaque baiano é o refúgio dos canastrões. Com o sotaque, até eu ganho o Oscar. VEJA – Como fã de novelas, o que acha das mexicanas apresentadas pelo SBT? BUSSUNDA - A última que acompanhei foi Carrossel, que eu confesso que gostava, achava muito engraçada. Também vi uns pedaços de outra hilariante, em que a mulher usava um tapa -olho combinando com a cor do vestido. Mas nunca mais assisti. É engraçado um dia, no segundo já fica aborrecido. A Globo também concorreu com algumas novelas mexicanas faladas em português - e continua apresentando o gênero. Essa que está no ar no horário das 6, Sonho Meu, é a própria novela mexicana, parece até dublada.] VEJA – [14 E os programas para os jovens são bons. BUSSUNDA - O do Serginho Groiasman é o único bom. Para concorrer com ele a Globo inventou o Radical Chic - uma maldade que fizeram com a Maria Paula. O Radical Chic parecia um vestibular para bobos, um Sexolândia para adolescentes, só que no Sexolândia do Faustão pelo menos vai gente famosa. A pobre da Maria Paula lá fazendo papel de Xuxa dos adolescentes. VEJA – [15 A juventude brasileira merece coisa melhor? BUSSUNDA – Para começar, não acho o jovem brasileiro alienado. Na minha época, tinha uma meia dúzia de pessoas com boa formação, uma pequena parte da juventude tinha um bom acesso à informação, lia muito mais do que se lê hoje. Havia expoentes com mais cultura e que apareciam

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mais. No meu tempo de adolescência, era a época da ditadura, a informação era restrita, quem tinha acesso aparecia muito. Hoje, os expoentes não são tão letrados e inteligentes, mas a média está mais bem informada, até porque a televisão está informando mais. VEJA – Muitas pessoas dizem que os jovens foram às ruas mais pela farra do que pelo impeachment. O que você acha disso? BUSSUNDA - Quanto mais as pessoas entram para participar fazendo festa e se divertindo, mais se ganha dos chatos. É a eterna briga dos malas contra os não malas. A política era para ser muito mais interessante e agradável. No meu tempo de militante do Partido Comunista eu me divertia muito indo a passeatas. Adorava correr de polícia para ter história para contar. Quando não tinha polícia, eu ficava desolado. VEJA – A volta por cima de Jorge Ben Jor e Tim Maia na MPB é um sinal de nostalgia da juventude? BUSSUNDA – Sempre gostei dos dois. O Tim Maia ficou irritado por causa da imitação que fiz dele e disse que ia me dar porrada. Mas no dia em que ele marcar a briga não vou ficar preocupado porque sei que ele vai furar. Acho muito bom os jovens resgatarem ou descobrirem os grandes talentos da MPB. Não tenho nada contra o rock, sempre ouvi, mas ele tem muita coisa sem qualidade. E esse resgate do que é bom não é só nas coisas nacionais. No Hollywood Rock quem fez sucesso foram Robert Plant e Aerosmith. Meu sobrinho de 11 anos adora Led Zeppelin e Eric Clapton, bons artistas que foram substituídos por imitações pioradas. O futuro músico de 16 anos que hoje houve Chico, Caetano, Ben Jor e Tim Maia tem muito mais informação para fazer música de qualidade do que os jovens que ouviam há pouco tempo os Menudos e os New Kids on the Block.] _________ No meu tempo de militante do Partido Comunista eu me divertia muito indo a passeatas. Adorava correr de polícia para ter história para contar. Quando não tinha polícia, eu ficava desolado. A política hoje era para ser muito mais interessante e agradável. _________ VEJA –[16 Recentemente você participou de um anúncio contra a privatização da Petrobrás. Foi só pelo cachê de 10 000 dólares ou você é a favor de mantê-la como estatal? BUSSUNDA - Eu me defini quanto a isso há muito pouco tempo. Primeiro, achava que o Estado só devia preocupar-se com saúde e educação. Mas o Lula falou um negócio que me balançou: os Estados Unidos invadiram o Iraque e quase se provocou uma guerra mundial por causa do petróleo. Por que motivo o Brasil vai abrir mão do petróleo? Esse argumento foi o que me definiu. Hoje acredito que saúde, educação e energia devem ficar na mão do Estado. Além disso, a Petrobrás é uma empresa que dá lucro, não recebe um tostão do Estado para funcionar e paga bastante imposto. Por outro lado, sou contra o trabalhador da Petrobrás ter direitos adquiridos, vantagens que o funcionário de uma empresa particular não tem. Isso tinha de acabar.] VEJA – [17 A Casseta está participando da Campanha contra a Fome, do Betinho? BUSSUNDA - O grupo gravou um comercial, que passou na Bandeirantes mas foi suspenso. Criamos os slogan: “Campanha da Fome - Você vai participar ou vai ficar reclamando de barriga cheia?” A gente tentava tratar o assunto com humor. Havia um personagem no comercial contra a campanha: um cara num botequim dizendo que não ia ficar colocando azeitona na empada dos outros se eles não tinham nem empada. Todo mundo fala que é uma campanha assistencialista. Mas não dá para achar que, com tanta gente passando fome, não pode haver assistencialismo. Essa história que não tem de dar o peixe, tem de ensinar a pescar, é furada. Se não der o peixe antes de o cara aprender a pescar, ele morre.] VEJA –[18 Como militante do PCB na juventude, você nunca se acanhou em malhar a esquerda? BUSSUNDA - É muito mais legal fazer humor sobre aquilo que você conhece bem. Eu me lembro quando a gente ainda fazia jornalzinho na Casseta Popular e bolou uma piada com a foto de um

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Fusca e a legenda: “Descoberto o local onde se realizará o VII Congresso do Partido Comunista”. Eu era do partido nessa época e todos ficaram furiosos. Foi muito engraçado. A gente gostava de implicar justamente com quem ficava irritado. É que nem dar apelido. Se o cara fica furioso é porque funcionou e você faz mais mil piadas com aquilo.] VEJA – [19 Numa roda social, os humoristas são sempre chamados para contar piadas. Isso acontece muito com você? BUSSUNDA - É um saco. Eu não sou um anedoteiro, simplesmente escrevo piadas e vou para a televisão interpretar. Quando vem me pedir para contar uma, eu pergunto logo a profissão do cara. Se for dentista, por exemplo, peço para fazer uma obturação no meu dente.] VEJA –[20 Vocês acabaram de lançar O Grande Livro de Pensamentos da Casseta e Planeta. Quais são os seus prediletos? BUSSUNDA - Gosto de vários. Um deles é “Não tenho tudo que amo, mas um muambeiro de Miami ficou de me arrumar”. Outro é “Neurônio de roqueiro é que nem mãe, só tem um”.]

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ENTREVISTA ESCRITA E-03 Entrevista: Hélio Jaguaribe Ditadura do Congresso O cientista político diz que o Parlamento tem mais poder que o presidente e propõe a mudança do modelo eleitoral Ricardo Galuppo [1 Ninguém pode atribuir ao cientista político Hélio Jaguaribe, de 75 anos, o pensamento que a esquerda batizou de neoliberal. Sem ter como trabalhar no Brasil depois do golpe militar de 1964, ele passou alguns anos lecionando em universidades americanas. Há pelo menos duas décadas defende que a solução para melhorar as condições de vida do brasileiro é um investimento radical em educação. Acreditou que colocaria suas idéias em prática ao ser convidado pelo então presidente Fernando Collor, em 1992, a assumir a Secretaria de Ciência e Tecnologia. Ficou seis meses no cargo. Há duas semanas, Jaguaribe, que não pretende trabalhar outra vez no governo, conversou com VEJA durante duas horas na sede do Instituto de Estudos Políticos e Sociais, Ieps, no Rio de Janeiro, do qual é decano. A entrevista foi complementada, na semana passada, com um telefonema para Havana, onde o professor participava, a convite da Associação dos Economistas da América Latina e do Caribe, de um congresso que discutia os efeitos da globalização no continente. ] [2 Veja — O Congresso Nacional é de alguma forma responsável pela crise financeira vivida pelo Brasil nos últimos dias, com perda de divisas, desvalorização do real e juros nas alturas? Jaguaribe — É preciso ver essa crise por etapas. O que deu evidência a ela foi a atitude irresponsável do governador de Minas Gerais, Itamar Franco. Ele decretou moratória unilateral e passou ao mundo a falsa impressão de que o Brasil não conseguiria honrar seus compromissos. Antes disso, havia outros problemas. Não sou economista, sou cientista político, mas acho que o Banco Central, na administração anterior, era muito otimista no cálculo da taxa de câmbio. Teria sido melhor adotar uma nova política cambial há um ano. A responsabilidade do Congresso, nesse episódio, foi negar-se a aprovar várias das propostas que o governo apresentou para reduzir o déficit fiscal. ] Veja — A impressão é que o Congresso aprovou sem convicção a contribuição para os servidores inativos — e só depois de o Brasil ter sido obrigado a gastar mais de 40 bilhões de dólares de suas reservas cambiais por falta de credibilidade. O senhor concorda? Jaguaribe — A crise é uma mestra. Ela conduz a opções racionais, de autodefesa. A mais recente foi de fato responsável pela aprovação dessa medida. Acredito que, nos últimos dias, o Congresso constatou que todo o país perderia se não fossem aprovadas as reformas que o Executivo queria. O Congresso tem problemas. Alguns dos partidos brasileiros apresentam um índice de disciplina interna muito baixo. Outros não têm disciplina alguma. Nessas circunstâncias, a formação de uma frente em torno de um programa de governo é muito difícil. Cada medida de interesse do governo precisa ser negociada isoladamente e é comum que, em cada negociação, os congressistas tentem sacar da União proveitos para seus grupos. É um problema que decorre de deficiências na nossa legislação partidária e eleitoral. ]

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[3 Veja — O senhor tem dito que o sistema político brasileiro apresenta os defeitos mas não as qualidades do parlamentarismo. O que isso significa? Jaguaribe — Significa que o atual regime político é inviável. Todos concordam com isso. Sociólogos, estudiosos da política e analistas da sociedade brasileira vêm apontando essa distorção há tempos. Temos um sistema presidencialista enfraquecido por um Congresso que funciona mal, que não tem coerência, mas tem enorme poder. Esse sistema é inviável porque gera conflito permanente entre o Congresso e o governo. A força do poder do Executivo decorre de sua capacidade de gestão. Mas o verdadeiro poder está sempre nas mãos do Legislativo. É ali que se fixam as grandes normas, as grandes leis. Veja — O poder do Congresso é exagerado? Jaguaribe — O Congresso brasileiro, na prática, tem tanto poder quanto no sistema parlamentarista. O desequilíbrio decorre do fato de que, ao contrário do que ocorre no parlamentarismo, aqui não está prevista a possibilidade de dissolução do Congresso. Isso deveria ser adotado. Seria bom ter um mecanismo para dissolver o Congresso. ] [4 Veja — Mesmo sem a adoção do parlamentarismo seria possível acrescentar às regras atuais um mecanismo que permitisse dissolver o Congresso caso houvesse impasse paralisante entre o Legislativo e o Executivo? Jaguaribe — Não tem sentido falar em dissolução do Congresso se não houver condições de assegurar a estabilidade política. Dissolver por dissolver não faz sentido. O necessário é ter um regime institucional que obrigue os parlamentares a compor uma maioria estável em torno de um programa de governo. Deveria haver, após cada eleição, a obrigação de se formar uma maioria parlamentar em torno dessas metas gerais. Essa maioria poderia sair diretamente das urnas se um único partido tivesse mais cadeiras que os demais. Realizada a eleição e não havendo um partido majoritário, seria dado ao Congresso um prazo para compor uma coalizão de governo. Os partidos que a integrassem estariam obrigados a ter fidelidade ao programa e o dever de sustentá -lo durante toda a legislatura. Não se chegando a esse acordo, o Congresso seria dissolvido e novas eleições seriam convocadas. Essa é, a meu ver, a única forma de dar coerência ao funcionamento do Congresso. ] [5 Veja — O que mais deveria mudar para que o sistema atual ganhasse maior racionalidade? Jaguaribe — O Brasil deveria adotar o voto distrital misto. Na Alemanha, os eleitores escolhem parte dos parlamentares entre candidatos que representam as comunidades locais. Os demais são pinçados entre políticos cuja liderança ultrapassa o limite do bairro, da cidade e do Estado. Ou seja, os parlamentares são escolhidos ou porque representam de forma clara os interesses de uma comunidade ou porque defendem princípios mais gerais aceitos pelos eleitores, independentemente da região onde moram. Essa seria uma mudança crucial. Também deveria ser adotado um mecanismo que negasse vaga no Congresso ao partido que não conseguisse pelo menos 5% dos votos válidos nas eleições parlamentares nacionais. Isso garantiria a representatividade dos partidos e impediria que as legendas fantasmas tivessem assento no Congresso. Não faz sentido para o Brasil ter trinta, quarenta partidos. Veja — Não seria preciso antes corrigir a distorção maior do sistema atual, em que um eleitor de Roraima vale dezesseis eleitores de São Paulo ou um do Amapá vale oito do Rio de Janeiro? Jaguaribe — É fundamental corrigir essa maluquice. Isso nós herdamos da ditadura, a desvalorização do voto dos grandes Estados, como São Paulo e Minas Gerais, em benefício de lugares onde só tem índio e onça. Podemos apontar dezenas de motivos para mudarmos a atual

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situação. O atual modelo está viciado. O sistema de escolha dos congressistas incentiva o clientelismo. Ele passa a ser condição da própria sobrevivência política do deputado ou do senador. O Congresso atual não é representativo da sociedade. Ou o parlamentar atende aos interesses de sua clientela ou não se reelege. É uma loucura, mas o congressista, para garantir sua reeleição, muitas vezes é obrigado a adotar posições que vão contra o interesse nacional. Veja — Como assim? Jaguaribe — Por culpa do modelo eleitoral confuso, o brasileiro nem se lembra mais em quem votou para deputado na penúltima eleição. Acredito que mais da metade dos eleitores já esqueceu em quem votou nas últimas eleições. A nação tem um corpo de representantes que não é representativo de sua população. Assim, o Congresso acabou se tornando muito sensível às minorias organizadas. Pergunte aos eleitores se eles concordam que um grupo ínfimo de aposentados consuma a maior parte dos recursos destinados à Previdência. A grande maioria discorda, acha um escândalo, mas não tem voz. Quem vence sempre são os grupos minoritários que defendem seus privilégios graças a seu extraordinário poder de pressão sobre o Congresso. ] [6 Veja — Que outros problemas o senhor apontaria no Congresso? Jaguaribe — Um aspecto que me preocupa no cenário político brasileiro é a falta de uma oposição autêntica. É evidente que há coisas erradas no governo. O próprio presidente é o primeiro a reconhecer que o governo precisa de críticas. Mas não vejo sentido na oposição ditada pelo ressentimento nem em atitudes tomadas por gente eleitoralmente interessada em ficar do lado oposto ao do governo. Como é que a esquerda, ou esses partidos que se dizem de esquerda, vota contra uma reforma que visa eliminar os marajás da Previdência? Quero crer que não votam pela preservação dos marajás por princípio, mas por conveniência. Existem raivinhas. É uma reação raivosa a de quem diz: "Eu não gosto do presidente e sou contra tudo o que ele propuser". Uma oposição útil ao país tem de ter uma proposta alternativa válida. Não pode viver de ressentimento apenas. Veja — Como e sperar que o Congresso aprove uma auto-reforma que contraria seus próprios interesses? Jaguaribe — Esse é um dos problemas. Eu diria que é necessária uma grande campanha por parte dos setores responsáveis pela vida pública brasileira, inclusive do Congresso, onde há um grande número de parlamentares interessados na solução dessa questão. O objetivo de tal campanha seria gerar um movimento de opinião pública em torno da necessidade de mudança do modelo de organização do poder político. Se for possível gerar um movimento nacional de grande repercussão a favor de um novo modelo institucional, o Congresso terá de se mexer. Ou ele será conduzido a apoiar a mudança ou a questão terá de se resolver por via plebiscitária. Essa é uma discussão urgente. Ela tem de se dar durante o segundo mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso. A sucessão do presidente Cardoso não pode fazer-se, no interesse do desenvolvimento brasileiro, dentro das normas institucionais vigentes. ] [7 Veja — Essa questão foi levada a plebiscito em 1993 e o resultado foi a vitória do presidencialismo... Jaguaribe — Sim. A questão foi levada a plebiscito de uma forma absolutamente irresponsável. Nas condições da legislação brasileira, eu, que sou parlamentarista, votei pelo presidencialismo. O parlamentarismo, no Brasil, só faz sentido com o voto distrital misto, com a limitação do número de partidos por um mecanismo eleitoral e com a obrigação da formação de um pacto em torno de um programa de governo. Fazer o parlamentarismo sem mexer nesses pontos, como se pretendia na época, seria muito pior do que manter o presidencialismo. ]

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[8 Veja — Qual seria o papel dos Estados e dos municípios num sistema político como esse que o senhor propõe? Jaguaribe — Eu sou favorável a uma legislação que imprima aos governos estaduais e às prefeituras um caráter eminentemente gerencial. Os governos estaduais e as prefeituras teriam poder circunstancial sobre seu território. Os partidos estariam inteiramente voltados à união. A verdade é que o Brasil gerou uma federação que deu poder em excesso aos governadores. O papel das administrações locais é gerir os recursos públicos, não fazer política. O Estado e o município são importantes para garantir à população segurança, iluminação e limpeza pública. As opções políticas num mundo globalizado ultrapassam completamente o microcosmo da fronteira do município e do Estado. A globalização reduz completamente a importância do poder normativo do município e do Estado em relação aos interesses coletivos do país. Veja — Muitos governadores se queixam de que o poder está excessivamente concentrado em Brasília. Jaguaribe — Em parte eles têm razão. Relativamente à despesa e à receita líquida, os recursos que eles têm são pequenos. O poder deles se tornou mínimo por razões de deficiência gerencial. Mas a culpa, aí, é da estrutura da despesa dos Estados. Quase todos ultrapassam o limite de gastos com a folha de pagamento. Já sob o ponto de vista institucional, eles têm muito poder. Se as despesas dos Estados fossem limitadas a um montante compatível com a arrecadação, o poder institucional de um governador seria enorme. Veja — Haveria espaço, dentro do modelo que o senhor propõe, para atitudes semelhantes à moratória do governador de Minas Gerais, Itamar Franco? Jaguaribe — Certamente não, certamente não. A posição que o governador Itamar Franco adotou não foi determinada por razões administrativas. Ele foi movido a declarar a moratória por razões políticas. Aliás, eu nem diria políticas. Foi uma reação psicológica, determinada por um ressentimento pessoal com o presidente da República. ] [9 Veja — Algum tempo atrás, o senhor se referiu à situação social brasileira como explosiva. De que forma o senhor a enxerga hoje? Jaguaribe — Assim como o perfil institucional é inviável, a situação social do país também é inviável. As potencialidades do Brasil são extraordinárias, mas as armadilhas institucionais são muito preocupantes. Hoje se diz que o Brasil tem uma das piores distribuições de renda do mundo e que é um país injusto. É verdade, mas é preciso um pouco de calma. Não se trata, vistas as coisas sem demagogia e com objetividade, de dizer que a classe dirigente brasileira é mais ávida do que outras. A verdade é que o Brasil tem uma gigantesca população com capacitação apenas para o trabalho manual, quando a oferta desse tipo de ocupação só diminui em virtude do progresso tecnológico. A solução, a curto prazo, depende da aprovação das reformas. A longo prazo, é preciso investir tudo o que for possível em educação. Se eu tivesse apenas 1 real para gastar e devesse escolher para onde destiná-lo, se à saúde ou à educação, investiria na educação. ]

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ARTIGO DE OPINIÃO E-149 Artigo sobre economia

As siglas perigosas

[1 No capitalismo, a promoção da concorrência no mercado é uma das poucas intervenções desejáveis do Governo. O socialismo, ao contrário, privilegia os trustes estatais.] [2 No Brasil, a agência antitruste é o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). Foi criado por legislação de 1942, que se tornou mais abrangente e intrusiva pela lei nº 8884 (junho de 1994). Isso ocorreu precisamente no momento em que as leis antitrustes no mundo começavam a ser flexibilizadas. O Governo brasileiro nunca teve autoridade, ou credibilidade, para fomentar a concorrência, pois nasceu cevado na cultura (ou incultura) dos monopólios estatais. Temos hoje, talvez, a maior manada de monopólios no planeta. Além dos dinossauros de petróleo e telecomunicações, que sobreviverão até que se regulamentem recentes emendas constitucionais, há vários monopólios virtuais, como eletricidade, ferrovias, portos e correios. Estes somente agora começam a ser timidamente flexibilizados. Existem coisas esquisitas, como o monopólio de resseguros, ou agressivas, como o monopólio de câmbio. A moeda nacional é de “curso forçado”, o que significa que o Governo se reserva o direito de confiscar , pelo imposto inflacionário, parte da receita do cidadão. Paradoxalmente, às vezes se oferecem reservas de mercado ao setor privado, como aconteceu na criminosa política de informática dos anos 80...] [3 A maioria das legislações antitruste no mundo se fundamentou no Sherman Act, de 1890. A tradição democrática americana alimentava aversão a quaisquer grupos que parecessem ter posição dominante no mercado. Era a época dos “robber barons”, que mais tarde Theodore Roosevelt, num arroubo populista, chamaria de “malfeitores de grande fortuna”. Era uma visão estática, que não compreendia como a concorrência se desenrola no tempo e é afetada pelas mudanças tecnológicas, pela variação nas preferências dos consumidores, e pela sempre cambiante oferta de importações competitivas. Desde então o mundo mudou. Com a globalização dos mercados e a revolução tecnológica, novos conceitos surgiram em lugar dos tradicionais “grau de concentração” ou “domínio do mercado”. Surgiram conceitos mais sofisticados, como a “elasticidade de substituição” e “contestabilidade”. Como no ditado popular, “tamanho não é documento” (exceto no raríssimo caso de produtos insubstituíveis). Qualquer açambarcador do mercado local pode ser “contestado” pela abertura a importações. Numa economia fechada, o oligopolista é uma hiena. No mercado global, vira um carneiro (no máximo, um bode...). A preocupação obsessiva de limitar preventivamente o tamanho das empresas é como castrar os homens para evitar estupros. O que se tem de avaliar é o efetivo “comportamento” da empresa (benigno ou predatório), em face do consumidor. Não existe nenhum critério teórico absoluto para se distinguir o que seja abuso do que seja apenas concorrência eficiente. Nem para determinar o tamanho “justo” de uma empresa, ou “regular” a ocorrência sem prejudicar seriamente a eficiência da economia. A mera existência da legislação antitruste americana era apontada até recentemente (exageradamente, aliás) como fator de perda de competitividade econômica e tecnológica dos Estados Unidos em relação ao Japão e à Alemanha. Dúvidas quanto ao que a burocracia considera o tamanho “bom” da empresa faz com que este hesite

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em associar-se, investir e atingir a escala ótima para enfrentar a concorrência mundial. E entorpece o desenvolvimento tecnológico e o espírito de iniciativa, porque o empresário, em vez de ir à luta, vive pendurado em advogados e burocratas para saber o que pode fazer.] [4 No Brasil, complicado sistema Seae-SDE-Cade (Secretaria de Acompanhamento Econômico do MF, Secretaria de Direito Econômico do Ministério MJ, e Cade) foi montado a pretexto de “defesa da concorrência”. Mas o que fez foi encobrir uma estapafúrdia combinação de objetivos de controle de preços e de intimidação das empresas privadas. No clima “antibusiness” da administração brasileira, infiltrada de petistas, a soma de poderes dados ao Cade equivale à doação de um revólver a lunáticos de asilo...] [5 O monstrengo tem poderes para meter o bedelho em “aumentos injustificados de preços ” ou “imposição de preços excessivos”. Numa economia de mercado, quem julga os preços é o consumidor, e o único instrumento eficaz a respeito é a concorrência. E “preços excessivos” são criados pelo governo, via inflação. Transformado em autarquia caríssima, o Cade ganhou poderes inquisitoriais como: “Requisitar informações de quaisquer pessoas, órgãos, autoridades públicas ou privadas”, e ter submetidos “à sua apreciação os atos que possam de qualquer forma prejudicar a livre concorrência”.] [6 As infrações são expressas, no melhor estilo totalitário, de forma genérica e vaga, repleta de adjetivos e advérbios sem conteúdo preciso: “Aumentar arbitrariamente os lucros”, ou “exercer de forma abusiva posição dominante”. O art. 20 da lei 8884 chega ao cúmulo de criar a figura da infração “independentemente de culpa”! Relacionam-se 24 tipos de infração, dos quais apenas oito têm algo a ver com a preservação da concorrência, propriamente dita. Um proíbe “exclusividade para divulgação de publicidade aos meios de comunicação de massa” (como ficarão as nossas agências de publicidade?). Há outras idiotices como: “Açambarcar ou impedir a exploração de direitos de propriedade industrial ou intelectual ou de tecnologia” (lá se vai a Lei de Patentes!...); “abandonar, fazer abandonar ou destruir lavouras ou plantações, sem justa causa comprovada” (milhões de agricultores todos os anos teriam de dar explicações ao Cade, porque o preço caiu ou o financiamento do Governo não chegou a tempo...); “vender injustificadamente mercadoria abaixo do preço de custo”; “interromper ou reduzir em grande escala a produção” ou “cassar parcial ou totalmente as atividades da empresa sem justa causa comprovada” (o empresário que quiser mudar de ramo ou fechar o negócio tem de pedir licença e “comprovar” a “justa causa”, que naturalmente é definida pelo arbítrio do Cade!) e “impor preços excessivos ou aumentar sem justa causa o preço do bem ou serviço”.] [7 As multas são brutais; 1 a 30% do faturamento bruto no último exercício, mais 10 a 50% sobre o administrador direta ou indiretamente responsável. Além de outras penas, como a proibição de contratar com instituições financeiras ofic iais e participar de licitações por prazo “não inferior a cinco anos”, transferência compulsória de patentes do infrator, não parcelamento de tributos, transferência do controle acionário, venda de ativos, cessação parcial de atividade ou qualquer outro ato ou providência necessários... (sic). A pena de morte seria supérflua...] [8 Tal arbítrio gera graves incertezas para os investimentos produtivos e a gestão normal das empresas, aumentando o bestial “custo Brasil”, que está nos empurrando para fora do mercado internacional.] [9 Outra sigla perigosa é Cadin, criado pela MP 1320 de 9 de fevereiro, ora em sua sétima edição. Não se trata de um simples cadastro de indivíduos e empresas inadimplentes com órgãos da administração pública direta ou indireta. Os supostos devedores poderão ser inscritos no Cadin, à base de informações de qualquer órgão de administração pública, sem a efetiva comprovação da existência de débito líquido e certo. E sem que a parte tenha sido previamente notificada para esclarecer equívocos ou para reclamar encontro de contas quando tem crédito a receber do Governo.]

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[10 Não é raro que um microdevedor de uma agência governamental seja macrocredor de outra... Com a simples inscrição no Cadin, a vítima fica proibida de fazer qualquer negócio com a administração (inclusive operações de crédito), receber garantias ou firmar contratos que impliquem desembolso de recursos públicos. Numa economia altamente estatizada como a nossa, isso é nada menos do que uma eletrocução financeira... O Congresso deveria rejeitar liminarmente a MP em causa. É inútil, porque já existe no Tesouro o Serviço da Dívida Ativa. É injusta porque, além dos vários monopólios que já tem, o Governo inadimplente pretende também monopolizar o direito de inadimplência.] Roberto Campos. Jornal do Commercio. 17/03/96

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ARTIGO DE OPINIÃO E-152

Nós não somos ianques, mas falamos inglês Como o escriba perdeu de ver Pulp Ficcion

porque o título estava em português

[1 Tudo bem, a gente foi criado escutando rock, vestindo calça coringa americana, usando camiseta com nome em inglês, brincando de camonibói, e masclando chiclete. Mas a coisa agora já está passando dos limites, como disse o assaltado, depois que os marginais acertaram-lhe três tirombaços no toitiço, passaram-lhe duas rasteiras, afanaram-lhe o salário e ainda o deixaram nu na mata de Paratibe. Meus resmungos são contra o excesso de inglês. Não sei se a senhora notou, mas desde que Collor inventou este negócio de modernidade que a gente só tá faltando falar com legendas. ]

[2 Aqui mesmo em Boa Viagem, se distrair-se o sujeito acaba pensando que se encontra em outro país. As poucas casas comerciais que ostentam nome em português, pra não ficarem tão por fora da onda, acrescentam aquele apóstrofo, que os ianques tanto gostam de usar. Hoje em dia, loja por aqui nunca está aberta, está open, tampouco jamais fecha, ela simplesmente fica closed. Não adianta, por exemplo, a senhora procurar artigos para presentes, isto é coisa da Velha República. O negócio atualmente é conhecido como gift, mais precisamente imported gift, que naturalmente tudo que se vende por aqui é importado; de Cavaleiros do Zodíaco (um boneco que mais parece uma boneca desfilando no Bal Masqué), a canivetes de mil e uma utilidades, papel higiênico sabor groselha, pneu recauchutado, enfim estes artigos de primeira necessidade dos quais éramos tão carentes e não sabíamos.

E aí chamo a atenção para o óbvio ululante que ninguém ainda sacou: nos tornamos um país bilingüe. Senão como é que o brasileiro se viraria? Ninguém aqui mais perde avião: comete no show. Tampouco se deixa de hospedar-se por estar o hotel lotado.Hotel lotava no tempo da onça. Hoje eles ficam overbooked . De igual maneira, só loca um carro quem souber o que dizer rent-a-car, e daí por diante, ou so on , para empregar o termo apropriado.

As propagandas, estas nem mais se preocupam com a última flor do Lácio, vão logo no inglês mesmo. Os outdoors são tudo ilustrados com Oh, yeah, That’ it. Até a Coca-Cola, aquele refrigerante que a gente começou a consumir junto com o leite materno, virou Coke. Aliás eu nunca entendi porque se chama aqui cartaz de outdoor (os próprios americanos o têm por billboard), por que não imitar os portugueses que o tratam por cartazes de publicidade exterior, ou externa, não estou bem certo (Duda Guennes pode me corrigir), da mesma forma como em vez de Shopping Center dizem Centro Comercial. Mas eu estou tergiversando. ]

[3 Sem querer dar uma de xenófobo, eu acho que as autoridades constituídas deviam prestar atenção nesses inglesismos todos, porque a coisa às vezes descamba para a galhofa. Imaginem o que pensará um americano ao deparar-se com uma sorveteria batizada de John’s. John, no idioma de Mike Tyson, tanto significa João, quanto sanitário. Tudo bem, minha senhora, eu sei que estou me repetindo, que já comentei sobre este assunto há uns dois anos. Mas é que, tornando a repetir-me, não tenho culpa de ser assim meio tautológico (ao Aurélio, minha senhora), mas a coisa está feia mesmo! ]

[4 Afirmo isto porque ela já contaminou os meus conhecidos. Eles que são avessos a modismo, intelectuais que assistiram a todos estes filmes chineses com Gong Li,. leram Favela High-tech, estão irremediavelmente perdidos. Veja a senhora que, dias atrás, em qualquer mesa de bar que eu sentava só se comentavam sobre Pulp Fiction. Uns consideravam o filme uma porcaria. Outros retrucavam que porcaria podia ser a mãe de quem achou. Enfim, uma obra polêmica.

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Então eu fiquei doido para ver o tal Pulp Fiction. Acabei não assistindo porque não descobri onde ele estava passando. Perdi o filme por causa dos meus colegas. Enquanto eles só falavam em Pulp Fiction, o infeliz do filme rolava no cinema como Tempo de Violência. Quer dizer, os caras já passaram a expressarem-se em inglês e, intelectuais que são, sem legendas nem dublagem. ] Jornal do Commercio - 30/04/95

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ARTIGO DE OPINIÃO E-154

A GREVE NAS UNIVERSIDADES E AS LIÇÕES DE 68 Fernando Magalhães

[1 Reflexão e racionalidade sempre foram instrumentos essenciais às discussões em sala de

aula. Há ocasiões, porém, em que, por necessidade histórica ou social, a discussão obrigatoriamente transpõe este restrito ambiente e adquire uma dimensão mais ampla e popular. A teoria cede lugar à prática. A reflexão ultrapassa as fronteiras dos campi e alcança setores da sociedade que, não obstante e pouca intensidade de seus efeitos, é compensada por alguma forma de simpatia. ] [2 Quando falo em reflexão penso especificamente na greve dos professores universitários que ainda não foi satisfatoriamente divulgada. E por um motivo muito simples: o movimento começou, agora, a chegar às ruas. Mas é preciso esclarecer, desde já, uma questão que, não raro, destaca-se nos movimento grevistas mas nem sempre é o foco exclusivo das paralisações: a questão salarial. Mesmo importante, á medida que três anos de arrocho transformaram professores em indigentes culturais, o problema que aflige, hoje, nossas universidades, possui uma densidade mais rica do que a luta apenas pela melhoria dos salários. O assalto à Universidade faz parte de um projeto que tem como meta o esvaziamento do ensino público através da evasão dos professores para o campo da iniciativa privada e a sumária eliminação da pesquisa da vida acadêmica.

O produto bruto , o aluno, é visto, exclusivamente, como um instrumento para engordar a esfera do mercado. Trata-se, portanto, de um projeto que tem um escopo muito mais lato do que habitualmente se pensa. Por trás desses fatos encontra-se uma concepção de mundo voltada para a destruição de todo o espectro soc ial por meio da privatização, da qual a Universidade é um dos alvos preferidos do governo. Não é sem razão que a grande maioria dos estudantes está disposta a apoiar a greve dos docentes, e é a partir desse movimento que alguma esperança pode se vislumbrar no horizonte. ] [3 Não é segredo que a grande revolta estudantil de maio de 1968 nasceu de um descontentamento social generalizado, produzido pela pressão da sociedade tecnológica.

Esse fato ficou evidente nos depoimentos de pensadores da época. A força do movimento estudantil foi comprovada até mesmo na pena de um intelectual brasileiro, hoje um reacionário defensor (e ministro) do sistema estabelecido que um dia combateu: A revolução política social do nosso tempo é a revolução estudantil. São os estudantes e os intelectuais não comprometidos o grupo... de onde poderá germinar... as consciências contra a ordem tecnoburocrática em emergência. Essas palavras foram escritas por Bresser Pereira em 1979. Como o nosso sociólogo de Brasília, certamente ele esqueceu o que escreveu um dia. Coincidentemente, estamos ás vésperas de maio, exatamente há trinta anos daqueles acontecimentos que abalaram o mundo. ]

[4 Evidentemente, não se espera que o movimento estudantil atual seja a repetição do passado. Os caras-pintadas do universo pós-moderno já não estão dispostos a fazer barricadas como há três décadas. Mas, de alguma forma, eles podem mostrar o lado oculto do descontentamento, tornar visível para a sociedade o que esconde sob a capa da tranqüilidade consensual, caso saia às ruas em defesa da Universidade. Mas se as barricadas estão superadas pelo tempo, 68, pelo menos, nos deixou uma grande lição. A reflexão entre professores e estudantes no campus é de extrema importância para a compreensão dos novos métodos de luta; mas como ponto de partida. A presença no interior dessa restrita área acadêmica é insuficiente para qualquer espécie de mudança.

A proposta tem que ganhar as ruas com a agressividade que o problema exige. De forma ostensiva, porém, sem perder a ternura. Apenas o corpo docente é impotente para fazê-lo. Novamente, como trinta anos atrás, uma parte da responsabilidade cabe àquela geração que, como diz Habermas, é a única que não tem medo de enfrentar seu passado. Mesmo muitos de nós, que

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pensamos utopicamente transformar o mundo, fazemos parte desse passado. A rebeldia, sim, é sempre jovem. É aquela que começa na nossa casa e tem o nome de juventude. Discute conosco, mas também nos desafia, apontando nossas limitações, nosso conservadorismo. ] [5 A reflexão e a racionalidade não podem ser banidas da vida acadêmica, mas não têm sentido ou se tornam irracionais sem o entusiasmo e a paixão que movem a história. Não pretendemos transformar a tragédia em farsa, mas a luta por uma universidade pública e de qualidade passa, necessariamente, pela negação do modelo vigente. (A exemplo do que advertiu Marcuse, os estudantes, os deserdados - veja-se o caso do MST - são o termômetro da vida social). A distância que separa um maio do outro é grande, mas certos ensinamentos não estarão superados enquanto a opressão tecnológica e a visão destruidora do social permanecerem em seu contínuo histórico. ] Diário de Pernambuco, 24 de Abril de 1998.

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ARTIGO DE OPINIÃO E-257 Opinião Doutores indoutos Edson Nery da Fonseca As universidades brasileiras valorizam mais os doutos indoutos do que os não doutores [1 No prólogo do segundo volume de seus Diálogos, São Gregório Magno escreve que ao desprezar os estudos literários iniciados em Roma, adotando a vida monástica, nosso pai São Bento preferia ser “doutamente ignorante e sabiamente insensato” (scienter nescius et sapienter indoctus). Reportava-se, evidentemente, à douta ignorância de que fala Santo Agostinho em carta à Proba. Mais tarde, Nicolau de Cusa definiu a expressão em seu livro de 1440 De docta ignorantia: “Nada podemos saber de Deus que, por ser infinito, está além de toda proporção com o finito, isto é, o homem”. Mas douta ignorância também se define, de modo genérico, como “a consciência dos limites do próprio saber”, como ensina Nicola Abbagnamo em seu excelente Dicionário de filosofia .] [2 Lembrei-me disso ao ler a reportagem da revista Veja sobre as misérias da pós-graduação no Brasil. Quando o professor Newton Sucupira escreveu seu histórico e lúcido parecer a respeito do assunto, advertiu as universidades para o perigo que podia transformar a pós -graduação num fracasso: o de contaminar-se com a impostura do chamado ensino superior entre nós. Como a voz do Batista, a de meu amigo Sucupira foi vox clamantis in deserto, porque as universidades não fizeram outra coisa senão abastardarem os graus de mestre e doutor. Temos, aliás, no Brasil, a triste tradição de desmoralizar palavras que, no estrangeiro, são quase sagradas. Já me referi, neste jornal, ao que acontece com filósofo, historiador, antropólogo e sociólogo, títulos com os quais são brindados entre nós, simples professores de filosofia, história, antropologia e filosofia.] [3 Para que serve a pós-graduação? Para fazer com que as universidades sejam não apenas transmissoras, mas produtoras de cultura, contribuindo para o desenvolvimento da filosofia, da ciência, das letras e das artes.] [4 Exige-se do candidato ao grau de mestre que demonstre em sua dissertação o domínio de métodos, conhecimento da matéria e capacidade de sistematização. Mas a quem pretende o grau de doutor a exigência é que sua tese contenha uma contribuição original à área do conhecimento que se insere determinado tema.] [5 Vê-se pela reportagem aqui comentada que nas universidade brasileiras, com raras exceções, não acontece nada disso. Que as teses são verdadeiros bestialógicos, como a de um professor de filosofia do Recife, aprovada porque os examinadores queriam se ver livres dele (sic!). Sabe-se também que depois de obterem o grau, os doutores não fazem mais pesquisas nem publicam. Mas ganham gratificações que tornam seus salários muito mais altos do que os dos simples bacharéis. Estes, coitados, continuam pesquisando, publicando e até integrando bancas examinadoras de teses de doutoramento. ] [6 As universidades valorizam mais os doutos indoutos do que os não doutores que pesquisam mesmo depois de aposentados por limite de idade, que integraram colegiados de pesquisa e pós-graduação e foram assessores de instituições nacionais e estrangeiras. Valorização do formal em detrimento do essencial. Desserviço ao desenvolvimento científico e humanístico. Traição aos objetivos da pós-graduação. ] _________ Edson Nery Fonseca é escritor

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REPORTAGEM DE REVISTA E-01 MEDICINA O tabu acabou Brasileiros exorcizam o fantasma da impotência e assumem sem constrangimento o uso do Viagra Cristiane Segatto e Nelito Fernandes Nicette Bruno, de 69 anos, atriz Foi de uma hora para outra: Paulo me contou que estava usando o Viagra. É constrangedor falar sobre nossa intimidade, eu ainda fico vermelha, mas posso dizer que ele nunca me decepcionou em 47 anos de casamento. Agora, então, está tudo perfeito! Ele é meu tigrão, eu realmente não tenho do que reclamar. Paulo Goulart, de 69 anos, ator Assim que o Viagra foi lançado procurei um médico para ver se podia usá-lo. Quando se passa dos 60, é preciso um empurrãozinho, sim, para melhorar o desempenho. É um problema de circulação que vai atingir todo mundo nessa idade, uma coisa normal. Há mais de 15 anos faço tratamento geriátrico e acho que todos deveriam procurar a melhor maneira de envelhecer. Os efeitos são bons. Se dizem que até os jovens estão usando o remédio, então é porque é bom. Agora existe um novo medicamento, chamado Uprima. Estou pensando em experimentá-lo. Prefiro não dar detalhes, mas Nicette anda dizendo que eu ainda sou o tigrão dela. E olha que Nicette é séria, não brinca não: se ela fala é porque é isso mesmo.

[1Paulo Goulart, de 69 anos, toma sempre a pílula – e não se embaraça ao admitir que precisa dela. “Vamos falar sério: todo mundo em minha idade precisa de um empurrãozinho”, resume o ator, casado há 47 anos com a atriz Nicette Bruno. O compositor Juca Chaves, de 63, também é usuário freqüente. “Com o remédio, recuperei a assiduidade da juventude”, diz. O playboy Jorginho Guinle, de 85, se entusiasma quando fala dos efeitos do medicamento. “Meia hora depois de usá-lo, sinto que estou de volta a meus 30 anos de idade”, exagera.]

[2 Paulo, Juca e Jorginho referem-se, é claro, ao Viagra, a prodigiosa pílula azul em forma de diamante que restabelece o desempenho sexual corroído pelas mazelas da idade e pelo estresse.] [3 O remédio chegou ao país em junho de 1998 e conquistou uma clientela entusiasmada. O Brasil é um dos campeões mundiais em consumo, atrás dos Estados Unidos e em patamar semelhante ao de países desenvolvidos, como a Alemanha e a Inglaterra. A cada mês, 1,2 milhão de relações sexuais são lastreadas pelos poderes do Viagra no país. O exército de consumidores freqüentes, que já alcança 400 mil brasileiros, aumenta 3,3% mensalmente.

O crescente interesse pelo medicamento levou o Sindicato Nacional dos Aposentados da Força Sindical a abrir uma negociação direta com a Pfizer. A entidade tenta incluir a pílula azul entre os remédios vendidos com desconto a seus 315 mil sócios. “Quando divulgamos o benefício,

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os aposentados logo perguntam se dá para comprar Viagra”, conta o presidente do sindicato, João Batista Inocentini. “Decidimos ouvir os apelos porque o remédio é importante para manter a qualidade de vida”, diz.

A droga é um daqueles marcos da medicina que transformam para melhor a vida de milhões de pessoas, como as descobertas da penicilina contra infecções, do AZT no controle da Aids e dos antidepressivos no tratamento de doenças mentais. Oferece solução eficaz, embora paliativa, a um grande número de vítimas da impotência, uma gente que vivia angustiada com oscilações e abalos no desempenho sexual.] [4 Com essas qualidades, o Viagra desencadeou uma revolução de costumes. Antes de sua chegada, depoimentos sinceros dessas vítimas eram escassos e marcados pelo constrangimento. Falar sobre o problema era tabu até na relação entre médicos e pacientes, quanto mais nos diálogos, nem sempre fáceis, entre marido e mulher. Muitos homens esperavam até cinco anos para procurar ajuda, mesmo porque não se conhecia nada que produzisse efeito de forma quase garantida. Depois que o Viagra surgiu, passou-se a procurar um especialista, em média, um ano após o problema dar os primeiros sinais. “Mesmo quem não tem dificuldades de ereção se sente aliviado em saber que existe uma solução para o grande problema masculino”, diz a antropóloga Mirian Goldenberg, professora da UFRJ, uma estudiosa do relacionamento entre homens e mulheres.] Ivald Granato, de 51 anos, artista plástico O Viagra está no cotidiano de todo mundo, e não só de quem está falhando. Eu o tomei algumas vezes e foi ótimo. Provoca uma sensação poderosa, faz você se sentir mais viril. Experimentei o remédio pela primeira vez numa roda de amigos, cheguei tarde em casa e não comentei com minha mulher que o havia tomado. Mas rolou maravilhosamente bem. Eu não digo quando tomo. Dou uma de menino que faz uma traquinagem e não conta nada. Mas minha mulher sabe, afinal estamos juntos há 28 anos. Juca Chaves, de 63 anos, compositor Há 27 anos, tomei um remédio exclusivo: Yaragra (fusão de Yara, nome da mulher de Juca, com Viagra). Sem paixão pela mulher amada, qualquer remédio só pode funcionar como paliativo. Mas o Viagra me ajuda a manter a assiduidade. Afinal, já estou com 63 anos de idade. Tomo o remédio desde que foi lançado, faz alguns anos, receitado por meu médico. Graças a meu tesão por Yara e ao apoio do Viagra, tento manter em minha vida conjugal um ritmo de timbalada, não de valsa. Yara Chaves, de 48 anos, artista plástica Acho que a descoberta do Viagra favoreceu mais a mulher que o homem. Tempos atrás, o homem encerrava a vida sexual cedo e, com isso, a mulher que ainda estava acesa tinha de dar a sua por terminada. Foi o caso de muitas pessoas da geração de meus pais. Com a expectativa de vida maior, o Viagra é essencial. Em nosso caso, somos bastante ativos sexualmente, não apenas domingueiros. Como o desejo é intenso e paralelamente temos a agenda cheia de compromissos, a ajuda veio em boa hora.

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[5 Os efeitos da pílula azul atingiram a psique masculina. “Antes do Viagra, os homens achavam que os vizinhos nunca falhavam e só eles tinham problemas”, diz a antropóloga. “Esse remédio é tão libertador para o homem quanto a pílula anticoncepcional foi para a mulher”, compara Olenka Franco, psicóloga. Dona de um instituto de pesquisas de mercado em São Paulo, Olenka entrevistou milhares de usuários do medicamento para esmiuçar as mudanças de comportamento. Concluiu que os homens ficam aflitos diante da vulnerabilidade de três órgãos: o coração (temem ser fulminados por um enfarte), o cérebro (têm horror de perder o controle intelectual) e o pênis (a ausência da virilidade fere a identidade masculina e dá vida ao fantasma da traição feminina). Quando começam a falhar na cama, sentem-se fracassados integralmente. “Há três anos, o terror provocado pela ameaça da impotência era comparável à perspectiva da morte”, afirma a psicóloga.] Combate em duas frentes Uprima 1 - O remédio atua no cérebro, amplificando a mensagem para a ereção começar 2 - A ordem segue pela medula e provoca a dilatação das artérias do pênis 3 - O tecido enche-se de sangue e ocorre a ereção Viagra 1 - A droga age no pênis. Combate a ação de uma enzima que inibe a ereção 2 - Também prolonga o efeito de uma substância que facilita a ereção 3 - O fluxo de sangue nas artérias do pênis aumenta Uprima Viagra Início da ação 20 minutos 1 hora Intervalo 8 horas 1 dia Principais contra- indicações Insuficiência cardíaca, enfarte recente, pressão baixa, angina instável Remédios à base de nitrato, insuficiência cardíaca, derrame, doença hepática Efeitos colaterais Dores de cabeça, náuseas, tontura Dores de cabeça, rubores, má digestão A pílula vermelha O Uprima trata a impotência atuando no cérebro e é indicado para quem não pode tomar Viagra As vítimas dos problemas de ereção já não dependem só do Viagra. O Uprima, lançado em outubro pelo laboratório Abbott, oferece uma vantagem em relação ao concorrente: pode ser utilizado por pacientes cardíacos que tomam medicamentos à base de nitrato. O comprimido de 3 miligramas é um triângulo vermelho de meio centímetro. Para evitar confusão sobre as dosagens, a versão de 2 miligramas tem a forma de um pentágono. Basta colocar o comprimido sob a língua um pouco antes do encontro amoroso. Enquanto o homem é estimulado sexualmente, o remédio atua no cérebro e amplifica o sinal natural que

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ordena o início da ereção. "Imagine um telefone celular com sinal fraco", diz Martha Penna, diretora-médica do Abbott. "O Uprima aumenta a nitidez da mensagem natural", compara. A droga não passa pelo sistema digestivo e, por isso, age rapidamente. A ereção ocorre em 20 minutos, um terço do tempo necessário para o início do efeito do Viagra. O aposentado Fausto Pereira, de 74 anos, toma um comprimido de Viagra e outro de Uprima antes do sexo. Sozinha, a pílula azul não garantia ereção satisfatória. Tampouco a vermelha. O coquetel vitorioso foi sugerido pelo médico. A estratégia é atacar em duas frentes. Enquanto o Viagra aumenta o fluxo sanguíneo no pênis, o Uprima amplifica a ordem enviada pelo cérebro para que a ereção comece. Por enquanto, ainda não há dados científicos definitivos que mostrem qual dos remédios é mais eficiente. Os pacientes costumam alternar os medicamentos de acordo com a ocasião, segundo o médico Celso Gromatzky, da clínica urológica do Hospital das Clínicas, em São Paulo. Escolhem o Uprima se querem um efeito rápido e o Viagra se pretendem jantar com a parceira antes do sexo. Em alguns, a pílula azul provoca dores de cabeça. Em outros, a vermelha acarreta náuseas. A cada dez pacientes de Gromatzky, sete já usaram o Viagra e decidiram experimentar o concorrente. "O Uprima está sendo muito bem aceito porque, ao contrário do que ocorreu no lançamento do Viagra, ninguém mais tem medo do tratamento", diz.

[6 O advento do Viagra teve o dom de diluir o caráter trágico da impotência. O testemunho do casal de atores Paulo Goulart e Nicette Bruno é emblemático. Profissionais bem-sucedidos, eles estão juntos há 47 anos, têm três filhos e sete netos. Encarnam o modelo do casamento feliz e duradouro no imaginário de gerações de espectadores. A revelação de que, às portas dos 70 anos, sua felicidade conjugal é embalada pelo Viagra desponta como símbolo da mudança. “Ele é meu tigrão”, diz Nicette. “Todo mundo deve ter o direito de envelhecer bem”, afirma Paulo.

Aos poucos, a impotência assume o contorno de um distúrbio meramente periférico, limitado ao pênis. Não por coincidência, a geração que recorre à droga se refere ao problema com um eufemismo: disfunção erétil. É um cuidado útil. “Ao tratar do assunto como um problema localizado, os homens mantêm a auto-estima em outros campos da vida”, explica o psicanalista Joel Birman, do Rio de Janeiro.]

[7 O remédio reduz a sensação de culpa, relaxa as tensões, faz com que homens e mulheres se reencontrem. Esse fenômeno desponta nas declarações de um grupo de parceiras de usuários do Viagra, entrevistadas por Olenka Franco. “Ah, se todos os homens descobrissem o Viagra”, disse uma delas. “Ele é maravilhoso porque garante a ereção do homem e dá tempo para a mulher se realizar plenamente.” A artista plástica Yara Chaves, de 48 anos, casada há 27 com o compositor Juca Chaves, entoa o coro feminino. “O Viagra veio em boa hora, porque eu ainda estou muito acesa”, afirma. Juca começou a tomar o remédio há mais de três anos, incomodado pela progressiva perda de desempenho.

Muitas mulheres já encaram o Viagra com naturalidade. O empresário mineiro Raimundo Cícero Lage, de 56 anos, gosta de namorar moças jovens – e não esconde delas que usa a pílula. “As garotas de hoje têm a cabeça arejada”, garante Lage, que é divorciado. “O Viagra é um remédio como outro qualquer Quando se está com enxaqueca, não se toma analgésico? É a mesma”, diz. José Leite Lopes, de 83 anos, físico O Viagra é uma grande invenção. Comecei a tomá -lo já faz dois anos. Foi meu urologista quem o recomendou. Resolvi experimentar e aprovei. Com 83 anos, já não dá para pensar em fazer sexo

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sem esse remédio. Posso afirmar que a pílula atende plenamente a minhas expectativas. Nem preciso ir à farmácia. Peço pelo telefone e eles entregam em casa. Aí é só tomar uma hora antes do sexo e esperar pelo resultado. A freqüência das relações hoje em dia depende muito da sorte. Já passei por quatro casamentos, atualmente estou separado. Com minha idade, não é sempre que encontro parceiras. Paulo Sant’ana, de 62 anos, cronista gaúcho O Viagra veio atender à ancestral aflição masculina diante da reclamação das mulheres que sempre acusaram o homem de se satisfazer muito rapidamente. As mulheres adoram o Viagra. Minha parceira, por exemplo, acha o remédio um espetáculo. A única coisa ruim que eu já senti foi uma pequena dor de cabeça. Mas não sei exatamente se era uma conseqüência do Viagra. Ele ajuda na potência, prolonga por um bom tempo a ereção. Para evitar contratempos, tomo todos os dias. Assim, estou sempre pronto para qualquer emergência.

O psiquiatra Flávio Gikovate, que há 34 anos lida com distúrbios da sexualidade, acredita que as mulheres só se sentem ludibriadas quando o parceiro esconde que está recorrendo ao remédio. “Elas se impressionam muito com o efeito, acham que a ereção é uma homenagem e ficam desapontadas quando percebem que o companheiro colou na prova”, afirma. A recriminação é injusta. O Viagra não fará efeito se o homem não sentir uma sincera atração física pela parceira. Não produz milagres em relacionamentos nos quais a libido hibernou definitivamente.]

[8 O sucesso da droga sugere que o espectro da impotência é mais amplo no Brasil que em países como o Japão ou a Argentina, nos quais a aceitação da pílula azul foi mais restrita. A impressão é falsa. O Japão rejeitou o Viagra pela rigidez de sua cultura. Na Argentina, o remédio custa caro. Sai pelo dobro dos R$ 76,68, preço máximo cobrado nas farmácias brasileiras por uma caixa com quatro comprimidos de 50 miligramas. O paradigma dos EUA, onde 3 milhões de pessoas usam o Viagra, mostra que o consumo nacional poderia ser maior.] [9 Em outubro, foi lançado no Brasil o Uprima (Leia o quadro). É o primeiro de uma série de concorrentes do Viagra que estarão nas farmácias em breve. “Em cinco anos, teremos opções para vários tipos de paciente”, prevê o urologista paulista Eduardo Bertero.

Duas drogas chegam ao mercado neste ano. O Vardenafil, da Bayer, é um primo irmão do Viagra. Age da mesma forma, mas minimiza efeitos colaterais como dores de cabeça, náuseas e rubor facial. O Cialis, do laboratório Eli Lilly, terá efeito mais duradouro. Vai atuar no sangue por 17 horas, período quatro vezes maior que o da ação do Viagra. Com um comprimido, o homem poderá desfrutar melhor uma relação sexual. A Pfizer, fabricante do Viagra, não se assusta. Acredita que um exército de 11 milhões de brasileiros poderia ser beneficiado com seus efeitos. Há espaço para todos.]

[10 Um estudo feito pela psiquiatra Carmita Abdo, do Hospital das Clínicas de São Paulo, concluiu que 46,2% dos brasileiros entre 18 e 70 anos têm alguma dificuldade de ereção.] [11 Mas a maioria das falhas na cama envolve fator emocional. No universo de vítimas, há uma multidão de homens com o desempenho sexual ofuscado por pequenos problemas circulatórios, associados a doses gigantescas de estresse e ansiedade. Muitos se tornaram vítimas de um círculo vicioso. Falham uma vez e ficam traumatizados com o fiasco. Diante da possibilidade de repetir a má experiência, são tomados por ondas de nervosismo que alimentam novos fracasso. O marketing das injeções Clínica que divulga anúncios em jornais oferece coquetel de remédios superado pelo Viagra

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Nos últimos meses, leitores dos principais jornais de São Paulo depararam com um anúncio pouco convencional. Em meio às reportagens sobre política, a foto de um casal em pose sensual ilustra a propaganda com o título Sexo É Vida! Mensagens semelhantes vêm sendo publicadas em jornais de outros países como The New York Times e o argentino Clarín. A campanha é obra do Boston Medical Group, rede de 83 clínicas espalhadas pelo mundo que oferece um tipo antiquado de tratamento para a impotência. São injeções no pênis com um coquetel de substâncias vasodilatadoras capazes de produzir ereções instantâneas. Cada ereção, uma picada. Para o Boston Medical Group, o coquetel é a solução para 95% dos pacientes. "Desconheço um tratamento com índice de sucesso tão bom", desconfia Eric Wroclawski, presidente da Sociedade Brasileira de Urologia. Quase 1.200 brasileiros já foram seduzidos pelo anúncio. No mundo, foram atraídos mais de 200 mil homens, muitos talvez influenciados pelo nome pomposo do estabelecimento. Boston é a cidade onde fica a prestigiada Escola de Medicina da Universidade Harvard. "O nome é uma homenagem a Harvard", informa Paulo Fontão, diretor-médico no Brasil.

O grupo tem, na verdade, duas sedes: uma em Melbourne, na Austrália, e outra na Califórnia, nos Estados Unidos. O Boston Medical Group emprega mais operadores de telemarketing que médicos. Oferece um serviço telefônico gratuito por meio de um número 0800. São 12 atendentes, todos homens, que falam pouco e são bons ouvintes. Agendam horário com um dos três médicos da clínica. Na grande maioria dos casos, o paciente desembolsa R$ 250 pela consulta e por alguns exames e sai com uma receita da fórmula mais adequada a seu problema. O tratamento custa de R$ 600 a R$ 2 mil e dura de dois a seis meses, com doses para duas a três tentativas por semana. "Estou gostando", afirma Marth Kumada, de 23 anos. "Senti dor, mas depois da décima picada me acostumei." Os médicos receitavam largamente essas aplicações, até que o Viagra surgiu e tomou o lugar delas. Hoje, as injeções costumam ser indicadas em situações extremas, em que problemas circulatórios bloqueiam definitivamente a ereção. AIDA VEIGA

A tensão libera na corrente sanguínea a adrenalina, substância indispensável para manter o corpo em alerta, mas capaz de arrefecer até a mais sincera das ereções. É o fenômeno que faz adolescentes fracassarem na primeira experiência sexual, apesar de todo o vigor juvenil. Se os homens contivessem a ansiedade, muitos episódios de impotência seriam evitados. “Bastaria que eles se comportassem como as mulheres”, propõe o urologista paulista Sidney Glina, presidente da Sociedade Internacional de Pesquisa em Impotência. “Quando a mulher está sem vontade de transar, diz que está com dor de cabeça e ponto final. O homem não diz não. Sente-se cobrado e insiste em fazer sexo mesmo quando indisposto. Falha, e o fracasso vira uma tragédia”, explica.]

[12 A psicanálise era a única opção para a impotência com raízes emocionais, até a chegada do Viagra. O efeito do remédio é revolucionário porque, além de produzir ereções, restabelece a confiança. Ingerida uma hora antes do sexo, a pílula bloqueia a ação da adrenalina por algum tempo e estimula a produção de uma substância que favorece a ereção, o GMP cíclico. Sem medo de falhar, os homens retomam o controle da situação e reencontram-se com a virilidade, condição fundamental da identidade masculina.

O corretor de seguros José Guilherme Kesselring, de 53 anos, testou as promessas da pílula azul em 1997, antes de seu lançamento no Brasil. Estava envolvido com uma mulher mais jovem, Fernanda, de 26 anos, sua atual esposa, e procurava uma solução para a impotência. Do primeiro comprimido, ele não esquece. Aparentemente, a pílula não tinha funcionado, e Kesselring deixou a cama desanimado. No chuveiro, depois de alguns minutos, começou a sentir um forte calor. Surpreendeu-se com a reação e, entre eufórico e assustado, chamou a parceira. O remédio fortaleceu

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o relacionamento do casal e permitiu o nascimento do primeiro filho. “O Viagra esvazia minha cabeça e dá segurança”, diz.

Para o psiquiatra Flávio Gikovate, a ansiedade masculina tem origem na cultura machista dos povos latinos. “Os brasileiros temem o julgamento de seu desempenho”, afirma. “Têm a impressão de que as parceiras estão sempre prontas a avaliar a performance depois do sexo e morrem de medo de falhar.” Gikovate diz que esse comportamento está perdendo fôlego. “Os garotos de 20 anos estão mais desencanados e já não são escravos do julgamento das mulheres. Vão envelhecer livres dessa pressão cultural”, afirma.

Não se deve imaginar, contudo, que a franqueza dos usuários do Viagra representa uma quebra radical de valores masculinos. “Ao assumir o uso do remédio, os homens estão reafirmando a conquista da virilidade, que tem um valor simbólico fundamental mesmo quando conseguida com auxílio químico”, diz o antropólogo americano Richard Parker, professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e autor do livro Corpos, Prazeres e Paixões, lançado em 1991. ] David Cardoso, de 56 anos, ex-ator de pornochanchadas Tenho ejaculação precoce desde a juventude. Há dois meses, resolvi experimentar o Viagra. Queria tentar prolongar o tempo da transa ou ter duas relações na mesma noite. Tive a segunda ereção, mas não cheguei até o fim. Sentia um calor horrível e precisei ligar o ventilador. É provável que eu volte a usá-lo, mas, depois da experiência, resolvi dar um tempo. Se ainda consigo a primeira ereção, acho que não vale a pena tomar Viagra só para tentar a segunda. Estou com a mesma companheira há cinco anos. Transamos duas vezes por semana. Se ela quiser todos os dias, não vou conseguir. Minha libido diminuiu depois dos 45 anos. Hoje não sou mais o mesmo. Richard Harris, de 71 anos, ator irlandês Experimentei o Viagra há pouco tempo, quando levei uma namorada para jantar. O efeito foi fortíssimo. Eu não me agüentava em minhas calças. Não pretendo usá-lo de novo. É tão poderoso que você precisa estar com o coração em ordem para tomá-lo, o que não é meu caso. É uma pena, porque eu apostava no Viagra para melhorar minha vida sexual. Quando eu era jovem, tinha todas as mulheres do mundo a meus pés, não precisava fazer nada para atraí-las. Isso não acontece mais hoje. Eu é que tenho de correr atrás.

[13 A impotência sexual está associada ao avanço da idade. No mesmo processo que entope as coronárias, as veias do pênis são bloqueadas pelo acúmulo de placas de gordura e enrijecem em decorrência da hipertensão. O diabetes causa estragos mais profundos: destrói terminações nervosas indispensáveis ao mecanismo da ereção. O envelhecimento dita mudanças previsíveis, embora difíceis de aceitar. Depois dos 40, o homem deixa de ter ereções espontâneas com a mesma rapidez da puberdade. Não basta ver uma mulher nua e mergulhar em fantasias eróticas para conseguir uma reação instantânea. A rigidez do pênis não é a mesma. O intervalo mínimo entre duas relações sexuais aumenta. Aos 50 anos, o indivíduo ainda consegue uma nova ereção horas depois de ter feito sexo. Aos 70 anos, esse período é medido em dias.]

[14 A pílula combate os efeitos da impotência, mas não as causas. O desempenho de um homem diabético vai melhorar com o Viagra, mas o processo degenerativo causado pela doença continuará. Se o problema se tornar muito grave, com o comprometimento total da circulação ou danos neurológicos irreversíveis, o remédio deixará de ter efeito. Para casos extremos, os médicos continuam a prescrever as soluções antigas, como as próteses ou as injeções de vasodilatadores no pênis.]

[15 Até junho de 2000, o Viagra era vendido com retenção de receita, o que restringia bastante o acesso ao remédio. Abolida essa exigência, o medicamento passou a ser comercializado

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com mais liberalidade. É relativamente fácil comprá-lo no balcão sem exibir a prescrição médica, embora isso seja proibido. Essa mudança catapultou o Viagra no ranking dos remédios que mais faturam no Brasil. Segundo levantamento do Instituto Brasileiro de Defesa do Usuário de Medicamentos, a pílula pulou do 14o lugar para o primeiro. As vendas anuais chegam a US$ 60 milhões.

Entre os responsáveis pelo salto estão pessoas que usam a droga recreativamente, como um aditivo prazeroso, nome politicamente correto para o velho afrodisíaco. “O Viagra cria uma sensação de virilidade que vai além dos ganhos no desempenho sexual”, diz o artista plástico Ivald Granato, de 51 anos, que tomou contato com o remédio numa roda de amigos e recorre à pílula de vez em quando.

[16 Nem sempre a experiência é satisfatória. O cantor Wando, de 56 anos, usou o Viagra uma vez, para experimentar. Diz que não repetiria a dose. “Fiquei com mais energia e a relação durou mais tempo. Mas, depois da transa, me senti mal”, recorda-se. “Tive dor de cabeça, fiquei fora do normal.” O Viagra é contra-indicado para alguns pacientes, como cardíacos que tomam medicamentos à base de nitratos. Mas não representa ameaça para quem está com a saúde em ordem. A automedicação encarna outro perigo, o da dependência psicológica. O uso contínuo da pílula azul pode criar uma muleta emocional para indivíduos que, na verdade, não precisam do estímulo artificial. “Eles usam a pílula para aplacar a ansiedade e acabam sem saber se devem creditar o bom desempenho à ajuda química ou à fantasia de que teriam uma noite memorável”, diz a antropóloga Mirian Goldenberg. A professora tem razão, mas em parte. O sucesso do Viagra ensina que, seja como remédio necessário, seja como amuleto, é melhor ter uma vida sexual plena do que nenhuma.] Jorginho Guinle, de 85 anos, playboy carioca Uso Viagra e tenho ótimos resultados. Tomo por conta própria, pois não gosto de ir ao médico. Uso só quando vou ter alguma relação amorosa, uma hora e meia antes do encontro. O efeito dura umas cinco horas. Tenho 85 anos, meia hora depois que tomo já passo a ter uns 30. É fantástico: não precisa nem namorar muito, não, que eu já fico todo animadinho. Minha parceira, não vou dizer quem é, sabe que tomo. Mas eu nem precisava contar. Com 85 anos, para ser assim, só mesmo com o Viagra. Com Sílvio Ferreira, de Porto Alegre, Denise Silva, de Belo Horizonte, e Victor Javoski, do Rio de Janeiro

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REPORTAGEM DE REVISTA E-02 A vida globalizada Os perigos e as vantagens que a economia oferece aos países num mundo interligado Eurípedes Alcântara

[1 Os brasileiros já vinham tomando contato há cinco anos com os ventos da globalização, que sopraram por aqui trazendo produtos importados e modernização, mas também um certo grau permanente de instabilidade e um aumento lento do desemprego. Nos últimos tempos, os brasileiros foram apresentados ao lado explosivo do processo. O país perdeu mais de 40 bilhões de dólares em seis meses de luta para defender o real antes que o governo deixasse o câmbio flutuar, numa manobra que provocou no mercado um clima próximo da histeria. Agora, o Brasil está diante de um futuro desconhecido. Há risco de recessão e o fantasma da inflação ameaça reencarnar. É bom que o país se acostume com essas reações desmesuradas vindas de fora. Na economia globalizada, os países têm telhado de vidro. São permanentemente vigiados. Se eles descuidam de suas contas públicas, fazem acionar os alarmes da selva financeira global. E, para horror dos países conectados com a vítima principal de um ataque especulativo, o sarampo se espalha em todas as direções. Com a desvalorização do real, a Argentina, maior parceiro comercial do Brasil no continente, ficou em péssima situação. No final do ano passado, a estimativa de crescimento dos argentinos era superior a 4%. Depois do vacilo do Brasil, as estimativas mais pessimistas falavam em 5% de encolhimento. O plano de emergência da Argentina prevê até a dolarização completa da economia, com a abolição da moeda local.]

[2 Em seus tempos de calmaria, a globalização provoca mudanças positivas. Em seus tempos de crise, arrasa economias frágeis. Por maiores que sejam os riscos colocados pela interligação dos mercados mundiais, é vã a esperança de que o Brasil possa criar suas próprias regras de convívio ou escapar ileso do clube global, cujo ingresso buscou com sofreguidão nos últimos cinco anos. Nesse período, fez sacrifícios enormes para se adaptar às regras do novo jogo econômico planetário e ensaiar a entrada no milênio. Mais de 100.000 pessoas perderam o emprego ao cabo do processo de privatização das estatais. Dez anos atrás, havia 1 milhão de bancários no país. Sobraram 470.000 — e, no ritmo de automação das agências, prevê -se que só restarão 300.000. O país modernizou a fórceps seu parque industrial, tornando obsoletos setores inteiros da economia sem chance de competir internacionalmente, como os têxteis e os de calçados. Só nesses dois setores 2 milhões de operários foram para a rua nos últimos anos.

Postos de trabalho foram varridos do mapa pela robotização de fábricas e pela invasão dos computadores nos escritórios. O país deixou que esse processo de destruição criativa mandasse pelo ralo, ao todo, 4 milhões de empregos. Segundo um estudo da consultoria McKinsey, a taxa média de produtividade na indústria brasileira vem crescendo 7% ao ano — um fenômeno quando se sabe que no Japão esse número não ultrapassou 3% nos últimos cinco anos. Com cinco centenas de robôs operando nas montadoras de automóveis, o tempo de montagem de um veículo foi reduzido de 48 para 33 horas — com a conseqüente diminuição da necessidade de mão-de-obra. "A produção de carros melhores e mais baratos vai fazer muita gente perder o emprego", diz o professor José Roberto Ferro, da Fundação Getúlio Vargas. Quando se acrescenta a recessão ao quadro do desemprego tecnológico, o resultado é horroroso. Na semana passada, esse drama se desenrolou com toda sua crueza nos telejornais, com os 2.800 metalúrgicos demitidos da Ford lutando para manter o emprego. ]

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[3 Todo esse sacrifício foi feito e tantas vítimas inocentes foram sacrificadas em nome de não deixar fechar o atalho que a globalização abre rumo ao futuro. Imenso progresso foi efetivamente alcançado. Nestes cinco anos, o país mudou de fisionomia e atraiu 60 bilhões de dólares de investimentos estrangeiros diretos, aplicados principalmente na construção de fábricas modernas e na aquisição de empresas. Criou milhões de empregos em setores de futuro da economia, com salários mais altos e qualificação profissional de Primeiro Mundo. O esforço dos brasileiros para entrar no vagão da modernidade tem sido notável. As pessoas grudaram-se à tela do computador e debruçam-se na internet como numa janela para o futuro. O número de usuários da rede mundial de computadores no Brasil saltou de 70.000 em 1995 para 3,4 milhões no ano passado, crescendo num ritmo que supera o de todos os demais países do mundo.

"O brasileiro decidiu mesmo se tornar mais internacional nos últimos anos. É brutal o esforço da classe média para que o filho saiba usar computador e fale inglês", observa Luiz Carlos Cabrera, professor da Fundação Getúlio Vargas e consultor especializado na contratação de executivos. Já são 20 milhões os brasileiros que estudam o idioma. Há quinze anos, havia 25 brasileiros matriculados nas dez melhores faculdades americanas para fazer mestrado. Hoje são 250. É correta a sensação de que a educação é o melhor instrumento para ganhar terreno no mercado de trabalho, que se vem modificando. "Para reencontrar seu caminho no mundo globalizado, o governo brasileiro tem de redirecionar seus esforços. O investimento que faz diferença é em educação", diz José Alexandre Scheinkman, diretor da faculdade de economia da Universidade de Chicago. Ele acredita que a segunda grande crise de integração que o Brasil enfrentará, depois de vencido o problema da credibilidade financeira, será educativa. "Na Coréia, 90% da população entre 12 e 18 anos freqüenta a escola. No Chile, esse número bate em 70%. Na Argentina, em 60%. No Brasil não passa de 40%", afirma Scheinkman. "É preciso tratar com todo o cuidado a educação dos brasileiros. Para ser competitivo, um país precisa de uma força de trabalho educada." Segundo os dados de Scheinkman, apenas vinte em cada 100 trabalhadores brasileiros têm mais de oito anos de escolaridade. Na Coréia do Sul, esse número é quatro vezes maior. ]

[4 As ondas de choque das últimas semanas doeram muito também porque muita gente fez investimentos no aprimoramento da carreira, em polir a habilidade em idiomas estrangeiros, em roupas e atitudes que só fazem sentido num mundo globalizado. E se o Brasil se fechar ou for excluído do clube dos países modernos? De que terá valido tanto esforço? A crise espantou porque, durante um período que ninguém pode precisar qual será, o Brasil sofrerá a desconfiança dos investidores estrangeiros. A capacidade de investimento da economia brasileira não passa de 19% do PIB. Se quiser voltar a crescer num ritmo que satisfaça as imensas necessidades do país, será preciso investir de 25% a 30% do PIB. A fonte externa secou. Ela poderá voltar a jorrar desde que o governo acerte suas contas e reconquiste a formosa dama da credibilidade internacional. Por enquanto, o mundo nos deu as costas.

"O Brasil não fez outra coisa senão estraçalhar de vez a noção que se vinha firmando de que a economia mundial estava aos poucos voltando aos eixos", escreveu o colunista Robert Samuelson, da revista americana Newsweek . De centenas de outras fontes, em dezenas de idiomas, se ouviu ou se leu na semana passada preocupação semelhante: o Brasil estava ameaçando a estabilidade mundial dos mercados. Era grande o temor de que a amargura disseminada por um eventual colapso da experiência brasileira de integração global pudesse colocar em risco todo o processo. Ou, na melhor das hipóteses, atrasá-lo. Durante uma hora Alan Greenspan, presidente do banco central americano, falou sobre o Brasil numa sessão do Congresso dos Estados Unidos. O cenário é esse: o Brasil preocupa os outros países.

"Precisamos ainda aprender a controlar as forças desencadeadas pela globalização", diz Stuart Eizenstat, subsecretário para Assuntos Econômicos do Departamento de Estado Americano. ] [5 Só agora, anos depois que esse processo de integração mundial dos mercados financeiros teve início, ainda sobre os escombros do comunismo, ele começa a ser plenamente entendido. Essa usina

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— ora construtiva, ora destrutiva — deriva da liberdade de fluxo que os capitais privados, as tecnologias, os bens de consumo e os serviços passaram a desfrutar nos últimos anos. A cada dia mais de 1 trilhão de dólares viajam ao redor do mundo fazendo várias escalas diárias em busca do maior lucro. Para se ter uma idéia real do tamanho e da afoiteza dessa riqueza, é preciso lançar mão de uma comparação. A nuvem do capital global é dezenas de vezes maior e infinitamente mais ágil do que o comércio internacional, que até duas décadas atrás tinha reputação de ser a mais formidável máquina de gerar riqueza já montada pelas sociedades organizadas. A globalização, portanto, pode produzir o bem ou o mal das economias nacionais quase instantaneamente. Poucos analistas acreditam na eficiência de tentar controlar esse fluxo nervoso de capital por meio de taxações e leis. O ex-ministro Roberto Campos diz que a única maneira de domar o ímpeto de fuga do capital especulativo é sanear as contas do governo e privatizar com fúria.

"A luta para domar a globalização será sem dúvida uma das tarefas prioritárias para os governos no próximo milênio", afirma Eizenstat. A idéia é minimizar os prejuízos que essa manada de dólares produz quando é espantada por algum problema num país qualquer do planeta. ] [6 Já seus benefícios são sobejamente conhecidos. Em pouco menos de duas décadas, o fluxo livre de recursos pelo mundo, de São Paulo a Budapeste, de Buenos Aires a Seul, elevou o ganho real nos países emergentes em quase 50%. Os países da Ásia que mergulharam nessas águas em meados dos anos 70, justamente quando o Brasil se encolhia na política fechada das reservas de mercado, colheram os maiores benefícios. A taxa de pobreza absoluta na Ásia foi reduzida à metade. Durante os últimos anos, os países das bordas do Pacífico criaram e acumularam riquezas e mudaram drasticamente seu perfil, de nações de pescadores e plantadores de arroz, transformaram-se em exportadores de artigos e componentes eletrônicos de alta tecnologia. Mais de 350 milhões de pessoas foram arrancadas da vida miserável nas palafitas de Taiwan ou Hong Kong e das favelas da Coréia para ser inseridas no mercado de trabalho.

A transformação foi obra da ação bruta do mercado, e não fruto de custosas engenharias de assistência social e intervencionismo na economia, fato que irrita grandemente os analistas de esquerda. Foi visível o contentamento deles quando a chamada crise da Ásia, no final de 1997, desnudou o fato de que não se tratava de sociedades perfeitas. A Coréia escondia déficits bilionários no sistema de empréstimos estatais a bancos e empresas. A Indonésia era uma ditadura familiar que loteava setores inteiros da economia entre seus membros. Malásia e Tailândia tinham sérias deficiências de controle do mercado de moedas. Feitas as contas das perdas dessas nações nas turbulências recentes, nota-se que o progresso material acumulado pela sociedade foi apenas arranhado. A maioria desses países teve redução do PIB anual. A Coréia refluiu 7%, a Indonésia 15% e a Tailândia 8% no ano passado. Mas em todos eles a retomada do crescimento já está em andamento. A Coréia obteve, em 1998, quase 30 bilhões de dólares de superávit na balança comercial. "O maior retrocesso provocado pelas crises recentes nesses países talvez seja o surgimento de um sentimento contrário à globalização", diz o americano Eizenstat. "Especialmente entre a classe média de alguns países em desenvolvimento, a confiança na liberalização econômica está irremediavelmente abalada."

[7 Economistas e especialistas no assunto, de diversos matizes ideológicos, ouvidos por VEJA são quase unânimes em afirmar que a inserção do Brasil no processo de globalização não pode ser revertida. "Não há a menor possibilidade de voltarmos atrás. No Brasil estão instaladas 405 das 500 maiores empresas multinacionais do planeta. Hoje, só os setores de papel, celulose, aço e cimento são liderados por grupos nacionais", observa Octávio de Barros, economista e diretor da Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas Transnacionais e da Globalização Econômica, Sobeet. Barros sustenta que a desvalorização do real vai simplesmente mudar o foco das empresas estrangeiras no país rumo ao mercado externo. A parte do faturamento das múltis instaladas no Brasil que se deve à exportação pode saltar, de 12% para 30% em alguns anos. Seria uma mudança muito bem-vinda. "Hoje temos compromissos externos a cumprir e uma dependência externa de

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componentes básicos, como petróleo, trigo e tecnologias cruciais", diz Alcides Amaral, presidente do Citibank. "Não somos auto-suficientes nem em comida. Se quebrarmos o contrato com o mundo exterior, o brasileiro médio vai sofrer muito." Pode parecer assustador. Não é. A maioria dos países aprendeu a conviver no mundo global e tirar proveito dele adquirindo bens, capitais e tecnologias onde eles são mais baratos, em benefício do bem-estar de seus cidadãos. O Brasil pode ainda encontrar o lado certo de montar o potro selvagem da globalização. ]

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ARTIGO CIENTÍFICO E-020 Artigo Científico da Revista Ciência e Cultura – ENSAIO. Uma construção enviesada: a mulher e o nacionalismo Miriam Lifchitz Moreira Leite Centro de Apoio à Pesquisa em História, USP Abstract. Women and nationalism: a biased construction.. During the 19th century, in Brazil, history school books had their share in the construction of the idea of nantionalism. Boys learnt a collective memory of the ruling class. Girls read in the schoolbooks stories about women who killed or sent their husbands and sons to death in defense of the nation. Girls were subjected to paradoxical ideas: while convinced that women were destined to reproduce life, their books told them about women who killed or induced men to kill in defense of the nation. Resumo. Durante o século XIX, os livros didáticos participaram da construção da idéia de nacionalismo no Brasillil. Enquanto os meninos aprendiam uma memória coletiva dos grupos dominantes, as meninas eram submetidas a duas ideologias paradoxais. De um lado, a idéia de que a mulher é principalmente a reprodutora da vida e, de outro, o culto de mulheres que, em nome da defesa da idéia de nação, mataram ou induziram à morte maridos e filhos.

[1 O pensamento nacionalista brasileiro foi construído durante o século XIX, através de vários processos paralelos: lutas armadas, medidas políticas, obras literárias e um esforço concentrado de europeização e modernização do país.] [2 A independência de Portugal em 1822, ainda que seja um marco no desenvolvimento do conceito de uma nação brasileira autônoma, não é a primeira manifestação, nem a mais importante. É a partir de então que se estabeleceu, em ritmos e com alcanços diversos, a construção de uma simbologia e uma atmosfera de concentração de interesses brasileiros, incorporando antes a natureza tropical, depois a população indígena o culto da língua portuguesa e o estabelecimento de cores, hinos, costumes e aspirações que se opusessem à identidade de outras nações.

Durante o período colonial, a existência de ilhas de população branca e mestiça em algumas regiões afastadas umas das outras, sem transportes nem comunicações, dificultou o estabelecimento de uma unidade territorial. As diversidades étnicas da população, nesses diferentes núcleos, criavam ainda maiores entraves à totalidade implícita no pensamento nacionalista. Com a Independência ocorreu um aprofundamento do sentimento antiportuguês, que sempre apresentou muitas nuances, pois a Corte reinante continuava sendo um ramo da dinastia que governava Portugal. Nem a personificação da nação na figura do monarca permitia reforçar valores nacionais, pois o monarca era português. Somente depois do deflagrar político da descentralização brasileira, durante o período regencial, é que D. Pedro II e Caxias, no chamado Segundo Império, se empenharam em estabelecer uma unidade com desígnios controlados e, nos diferentes setores da população, procurou-se fazer com que alguns se sentissem como representantes de um todo, com interesses e aspirações comuns.]

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[3 O exame das obras de viajantes estrangeiros que visitaram o Brasil dá uma medida da situação do nacionalismo. Este aflora nas observações sobre as reações de suscetibilidade dos brasileiros (o grupo letrado dirigente) diante de descrições críticas da vida brasileira. Nem sequer críticas precisavam ser as descrições. Bastava que não refletissem o "progresso" que esse grupo de leitores considerava ter atingido. Sem levar em conta se a surpresa maravilhada provinha de visitiantes oficiais ou de livros escritos a fim de atrair imigrantes europeus, tomavam-se sempre as restrições apresentadas como exageros de má fé, busca de pitoresco ou calúnias de inimigos do Brasil. Trata -se aqui da unidade nacional construída em oposição ao estrangeiro, caluniador e ingrato. O material abundante que os viajantes apresentam sobre as relações entre brasileiros e estrangeiros oscila entre manifestações apreciadoras de uma hospitalidade extrema a constatações de uma hostilidade desconfiada diante dos estrangeiros. O estudo da literatura de viagem, atavés do século XIX, permitiu constatar a ambigüidade extrema dessa variação, distante da verdade expressa pelo viajante e do nacionalismo de seus leitores ou anfitriões. Nos casos em que os viajantes chegavam com cartas de recomendação de pessoas conhecidas ou autoridades estrangeiras ou nacionais eram bem recebidos, sendo festejados com muita curiosidade até pelos membros femininos das famílias. Quando apareciam sem qualquer apresentação, a ingenuidade dos primitivos habitantes da terra diante dos europeus já tinha sido soterrada por suspeitas bem compreensíveis quanto aos resultados desastrosos do encontro.] [4 Se bem que visto de fora e de longe o Brasil ganhasse mais facilmente uma unidade, a análise do material escrito sobre a mulher brasileira esbarrou na indefinição do que seria a brasileira. Não são consideradas, nem se consideram, mulheres brasileiras todas aquelas que habitavam as terras do Brasil. Em alguns casos, acrescente-se, a mulher escrava sequer era considerada mulher.

Para os letrados brasileiros do grupo dirigente, a brasileira era a branca que se comunicasse em português, com família fixada no país há umas quatro gerações. Para os escritores do início do século XIX, as brasileiras seriam as mulheres indígenas, sendo consideradas prtuguesas as de famílias brancas e que falavam a língua portuguesa. Negras e mulatas foram tratadas, nos livros de viagens, quase sempre como africanas, se bem que da metade do século XIX em diante passaram a ser consideradas brasileiras, em oposição às mulheres brancas, que seriam européias. Aos poucos, os diferentes grupos europeus estabelecidos no Brasil começaram a ser diferenciados, não apenas pela língua falada, como também pela religião e por padrões culturais. A miscigenação das diferentes etnias não contribuiu para tornar a população brasileira um grupo homogêneo. O que ocorreu foi que, em diferentes momentos do século XIX, designava-se como brasileiras outras pessoas, dependendo de que designasse e do elemento físico, social, econômico ou lingüístico de que se servia a designada para falar de alguém. Observou-se que uma rede de convenções, crenças, escritos e polêmicas maiores ou menores foi necessária para se construir a idéia de uma unidade nacional a que homens e mulheres, vivos e mortos, estivessem ligados por um sentimento de dever e pertencer.] [5 É também da segunda metade do século XIX a elaboração de livros escolares, em que os autores procuravam transmitir e cultuar a idéia de uma nação unificada, cujo passado era preciso incorporar, procurando transformar os acontecimentos políticos do grupo dominante em memória coletiva. A leitura desses livros não era feita por toda a população. Era tão diferenciada a educação de meninos e meninas quanto o preparo da vida adulta das diferentes camadas sociais. No caso das meninas, as de família medianas e mais abastadas é que recebiam uma educação mais formal, com exceções que sempre surpreendem. ] [6 Ao procurar compreender o enviesamento da construção da idéia de nacionalismo para as mulheres convém lembrar que não foi construído com e para todas as mulheres brasileiras. Só atingiu as que tinham a possibilidade de freqüentar escolas e ler os livros didáticos. Essa camada de mulheres absorveu o nacionalismo através do culto à heroínas guerreiras, que fugiam da família ou

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levavam-na à morte em nome da defesa da nação.] [7 A construção é enviesada na medida em que o século XIX foi essencialmente o período em que se cultuou a missão "natural" da mulher para o casamento, a criação dos filhos e vida no lar. Para evocar essa ideologia dominante escolheram-se citações do Opúsculo humanitário, de Nísia Floresta, não só por seu estatuto de pioneira do feminismo, como por sua defesa do direito da mulher à educação, para não ficar em situação inferior à do homem, mas também para tornar-se mais apta a educar seus filhos e os alheios. Em 1853, com uma perspectiva afrancesada e positivista, ela deixou indicada a necessidade desse esforço de construção de uma unidade nacional: "Dissemos que não limitaríamos a nossa análise sobre a educação de nossas mulheres a esta ou aquela outra província mas sim a todo Brasil. Nunca nos assomaram os epidêmicos delírios de mal-entendido orgulho provincial, funesto germe fomentado outrora entre nós por disfarçados inimigos da prosperidade desta grandiosa e rica peça, tão invejada pelos estrangeiros e tão ameaçada por seus próprios possuidores de perder em sua divisão o prodigioso valor que o seu todo constitui". Foi realmente depois de 1840 que surgiram os romances nacionalistas que vieram reforçar uma representação da realidade capaz de vincular a produção artística à realidade nacional, dentro de uma tradição literária. Tudo levaria a crer que o nacionalismo estivesse interiramente ausente das preocupações femininas. Circunscritas ao círculo familiar e às obrigações cotidianas, restringiam-se a atividades domésticas e as religiosas quando se afastavam do círculo da família ou dos pesados encargos para sobrevivência. Toda uma literatura de louvação à mulher aponta nela virtudes "úteis" de capacidade de sacrifício, de dedicação e de fidelidade. Ao examinar escolas primárias e secundárias para mulheres no Brasil em 1853, Nísia Floresta considerou uma vantagem a educação dirigida pelas próprias mães, "em condições apropriadas para o que desejaríamos proporcionar a todas conhecimentos, aptidão e gosto, a fim de preencherem elas mesmas, como deviam, a honrosa e sublime missão de preceptoras de suas filhas e da mais útil amiga do homem".] [8 As mulheres de letras do século XIX insistem na necessidade de educar a mulher para que ela possa exercer com maior eficiência suas atribuições de esposa, mãe e mestra do homem. A luta em que se empenham é contra toda uma tradicional desconfiança da educação, que tiraria as mulheres de suas atribuições sagradas e "naturais". Ler romances, saber ler e escrever, exercer uma profissão fora de casa, gostar de escrever eram considerados deslizes perigosos, trangressões da "verdadeira" missão feminina que era casar e cuidar de filhos, obedecendo aos sucessivos amos e senhores. Como exprimiu Nísia Floresta: "Em vez de leitura de inflamantes e perigosos romances que imprudentemente lhes deixais livre, fornecei-lhes bons, escolhidos livros de moral e de filosofia religiosa, que formem o seu espírito, esclareçam e fortifiquem sua razão. A história, principalmente a de nossa terra, de que bem poucas se ocupam, é um estudo útil e agradável, mais digno de ocupar as suas horas vagas que certos contos de mau gosto, inventados pela superstição ou fanatismo ignorantes para recriar (sic) a mocidade sem espírito".] [9 Com esse nível de aspiração focalizado na unidade familiar e na procriação, não seria de esperar que as mulheres contribuíssem para a construção do pensamento nacionalista, nem fossem alvo de sua atuação. Dirigida para a guarda do lar, com todas as pressões ideológicas a estimular os corações maternos, desmerecendo qualquer colaboração mais ativa nos diversos setores da vida nacional, a mulher do século XIX viu-se excluída da construção educacional do nacionalismo realizada através dos livros didáticos de história pátria, que começaram a aparecer nos colégios masculinos. Eram histórias de um Brasil que surgia e se desenvolvia num espaço muito extenso e cheio de florestas, governado por um Estado unitário, resultante de uma história comum dos diferentes tipos de convivência humana, mas, principalmente, masculina e referente ao domínio progressivo de portugueses e europeus. Não só as mulheres estavam excluídas dessa história, mas também todas

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as camadas subalternas - índios, negros e imigrantes. Elas apareciam apenas para permitir a vitória dos vencedores. A preocupação de construir um sentimento nacionalista através da história do Brasil já vinha do primeiro instituto científico brasileiro, fundado em 1838. Em seus primeiros anos, o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro instituiu um prêmio para o trabalho que respondesse a seu apelo: Como se deve escreveer a história brasileira? O Botânico alemão von Martius foi o premiado, e sua memória foi publicada nas páginas 389 e seguintes da Revista Trimestral de História e Geografia , de janeiro de 1845. Von Martius foi um dos naturalistas que veio ao Brasil em 1817, na missão científica que acompanhou a princesa D. Leopoldina, e suas sugestões, muito criticadas pelos contemporâneos )e vistas com restrições até hoje, incluíam o estudo da reunião e contato das raças branca, africana e indígena, e ao movimento histórico que esse caldeamento imprimiu ao povo brasileiro. A história brasileira, incluída nos textos didáticos, contudo, interessou-se mais pela sedimentação dos feitos políticos dos governantes. Somente a segunda metade do século XX é que incorporou a ela o estudo das diferentes camadas da população brasileira. Havia uma distinção muito grande entre os currículos dos cursos oferecidos a meninos e a meninas, predominando para estas os de trabalhos manuais e o preparo para o magistério primário. "Certo o que se chama por via de regra no Brasil dar boa educção a uma menina? Mandá-la aprender a dançar, não pela utilidade que resulta aos membros de tal exercício, mas pelo gosto de a fazer brilhar nos salões; ler e escrever o português, que, apesar de ser o nosso idioma, não se tem grande empenho de conhecer cabalmente; falar um pouco o francês, o inglês, sem o menor conhecimento de sua literatura; cantar, tocar piano, muita vez sem gosto, sem estilo, e mesmo sem compreender devidamente a música; simples noções de desenho, geografia e história, cujo estudo abandona com os livros ao sair do colégio; alguns trabalhos de tapeçaria, bordados, crochê etc., que possam figurar pelo meio dos objetos de luxo expostos nas salas dos país a fim de granjear fúteis louvores à sua autora". Apesar de ter havido inúmeras profissionais, religiosas e leigas, em diferentes áreask, a amiroia das mulheres só se preparava para se desincumbir de práticas domésticas e maternais, dentro ou fora do casamento, e eram desqualificadas ou desaconselhadas suas intervenções públicas, intelectuais ou outras quaisquer.] [10 Paralelamente às Histórias pátrias, que visavam à construção da idéia de nação , apareceram outras, enaltecendo heoínas, com atributos masculinos de bravura guerreira, em defesa imediata ou simbólica do que viria a ser a nação. A incorporação dos ssentimentos e pensamentos nacionalistas às mulheres foi feita por uma aparente substituição dos valores femininos de faceirice, esquivança e medo, por valores viris que se revelavam em figuras excepcionais ou simbólicas de donzelas guerreiras ou mulheres guerreiras, que cortavam os cabelos, vestiam-se de homem e exerciam ou estimulavam o exercício mais radical das virtudes masculinas em lutas armadas, em defesa da pátria. "Recebi hoje uma visita de D. Maria de Jesus, jovem que se distinguiu ultimamente na guerra do Recôncavo. Sua vestimenta é a de um soldado de um dos batalhões do Imperador, com a adição de saiote escocês, que ela me disse ter adotado da pintura de um escocês, como um uniforme militar mais feminino. (...) Seu pai é um português, chamado Gonçalves de Almeida e possui uma fazendo no Rio pex (sic) (...) Sua mãe era também portuguesa; contudo, as feições da jovem, especialmente os olhos e a testa, apresentam os mais acentuados traços dos índios. "Desobedecendo ordens paternas, para quem o lugar da mulher é em casa, cosendo e parindo, vestiu a roupa do cunhado e partiu com a tropa para Cachoeira, onde subjugou os soldados de Tapajós, à frente de um batalhão, combatendo com água até o peito". A celebração passa a ser feita ao rompimento dos padrões de obediência e omissão das guardiãs da casa, da família e da vida para apontar exemplos de penetração no mundo masculino, e

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desempenho de ações bélicas, que exigiam audácia, firmeza e coragem para lidar e provocar a morte. "Por ocasião da luta da Independência, quando as tropas do General Madeira tomaram Salvador, Joana Angélica resistiu aos invasores, que aterraram as religiosas com sua violência, querendo invadir a clausura. A oposição de Joana Angélica permitiu que as outras irmãs se refugiassem no Convento do Desterro, enquanto ela morria atravessada por uma bioneta. "Ana de Jesus Ribeiro, nascida em Morrinhos e habitando em Laguna, por ocasião da Guerra dos Farrapos, abandonou o noivo e os pais para acompanhar um estrangeiro que viera lutar pela República. Além de participar dos combates navais e terrestres com uma coragem e um despojamento totais, instigava os combatentes navais e terrestres com uma coratgem e um depojamento totais, instigava os comatentes a prosseguir a luta apesar de ferida e em precárias condições de saúde (...) Em 1847 partiu com Garibaldi para a Itália, onde lutou ao lado do marido pela unificação italiana, contra as tropas austríacas". Não eram mais as rainhas do lar, as louvadas, nem aquelas que estimulavam pelo sofrimento e o ódio a vingança contra famílias rivais, mas as que partiam para combater o inimigo da pátria, substituindo ou acompanhando oshomens, ou ainda fazendo com que os filhos partissem para a morte. "Na revolução de 1817 vemos d. Barbara Pereira de Alencar, mãe sublime, que se votou aos sacrifícios por amor da causa santa de sua pátria e de seus filhos". Observou-se que não só na segunda metade do século XIX, mas em diferentes momentos de exacerbação do nacionalismo, como durante a Primeira Guerra Mundial e a Revolução Constitucionalista de 32, apareceram essas seletas de biografias de mulheres, para utilização nas escolas femininas, onde se enaltece o patriotismo, a abnegação e a bravura das biografadas. Em muitos casos as heroínas não defendem ainda a nação, que ainda não se formulara como tal, mas são lembradas pela vitória dos portugueses sobre outros europeus ou pela luta de libertação ou pela República de uma parte do Brasil.. São heroínas locais, como as de Tejucupapo, anônimas celebradas pela coragem varonil como ilustres pernambucanas que deixaram "o Hollandez espavorido em face de tanto denodo e de tanto heroísmo, abandona o combate, deixando o campo juncado de cadaveres e de munições!...", ou "de d. Clara Camarão, a quem o autor oferece como epígrafe versos de Jeanne D'arc à Orleans: 'Le nom de patrie Fait battre mon coeur Mon âme est remplei D'une sainte ardeur'" Na verdade, heroínas de todo o Nordeste são transformadas em pernambucanas ilustres, o que não só indica uma certa indefinição dos teritórios, como uma necessidade de incorporar em seus habitantes a idéia de a eles pertencer. Os mais conhecidos livors sobre brasileiras célebres, do século XIX, são os de Joaquim Norberto de Souza e Silva (1862) e o de Joaquim Manuel de Macedo (1878). Os dois são frequentemente citados nos artigos e conferências parciais, sobre baianas, mineiras e pernambucanas ilustres. Não chegam a explicitar a intenção de fazer uma bíblia de instrução moral e cívica, como Mulheres ilustres do Brasil, de Ignez Sabino (1899), mas produzem um texto cheio de ambiguidades diante da lição de moral que a instrução feminina deve retirar da galeria de brasileiras apresentadas. Joaquim Norberto de Souza e Silva, apesar de classificar suas brasileiras por atitudes fundamentalmente varonis, como "Amas e virtudes", "Religião e vocação", "Gênio e glória", "Pátria e independência", está convencido da importância da missão da mulher como esposa e mãe, não deseja seduzir as meninas das escolas com exemplos de mulheres guerreiras, nem sequer de outras que se dedicaram exclusivamente à arte.

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Joquim Manoel de Macedo é o conhecido autor de Moreninha (1844), médico, professor de história do Colégio Pedro II, para o qual escreveu Lições de história do Brasil (1861= e Noções de corografia do Brasil (1863). Político e escritor prolífico, seu projeto nacionalista circunscreveu-se aos romances localizados no Rio de Janeiro e a suas obras didáticas como um livro para leitura das classes superiores de instrução primária feminina. Aqui, a ambiguidade está bem explicitada. Ao se referir a dona Maria ursula de Alencastre, que abandonou a casa paterna para assentar praça como soldado, lembras as leitoras que esse não é um exemplo a ser seguido. "...O que de sua história deve ficar como exemplo é a esplêndida virtude com que em 13 anos de serviço militar e campanha - soube conservar-se tão honesta, tão casta que mereceu, depois, e pobre como era, ser desposada por um oficial militar".] [11 Afora o livro de Ignez Sabino, os trabalhos das escritoras e jornalistas do século XIX não porcuraram criar a idéia de nação entre as mulheres pelo exemplo de brasileiras guerreiras. Procuravam exemplos de mulheres universais, que lideraram a emancipação feminina em outros países.] [12 O exemplo feminino para a criação de uma pátria brasileira só vai se intensificar com as redes de professoras normalistas que, na década de vinte deste século, vão investir-se da missão de salvar o Brasil pela alfabetização de seus habitantes.]

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ARTIGO CIENTÍFICO E-053

AIDS E SEXUALIDADE

Luiz MOTT* INTRODUÇÃO [1 Ao refletir sobre o tema "Aids e Sexualidade", deparei-me com várias possibilidades de abordagem, todas igualmente interessantes e importantes para o conhecimento das relações entre a "epidemia do século" e a sexualidade humana. Poderia centralizar esta exposição nas implicações sociológicas provocadas pelo surgimento da Aids na alteração dos padrões ideológicos e nas condutas sexuais da população, desvendando os mecanismos que têm levado à estigmatização de certas minorias sociológicas identificadas como praticantes de comportamentos sexuais de risco, como os humossexuais masculinos, as pessoas promíscuas, as que vivem de prostituição, etc. Uma outra perspectiva sugerida pelo mesmo tema, seria aprofundar as reações psicológicas provocadas por esta síndrome no comportamento sócio-sexual dos individuos: em que medida o medo da contaminação pelo vírus da Aids, o HIV, tem modificado os hábitos sexuais da população em geral, provocando novas ansiedades ou neuroses coletivas, a "Aidsteria", sobretudo nos chamados grupos de risco, receosos não só da contaminação, mas tambem de terem seus "desvios" sexuais clandestinos tornados públicos no caso de virem a contrair tão estigmatizante doença. Cogitei ainda um terceiro enfoque para este mesmo tema, "Aids e Sexualidade": os efeitos economicos desencadeados pela epidemia no universo da sexualidade. Poderia começar pelo nível macroeconomico, trazendo à baila a polêmica discussão sobre a paternidade do HIV: seria um vírus criado pelos laboratórios capitalistas, para dizimar populações indesejadas, e vender medicamentos para seu tratamento, ou tratar-se-ia de um vírus inventado pelo bloco comunista e disseminado secretamente pela KGB no Metrô de Nova York a fim de destruir o rival libertino? Ou então, deslocando a analise para a esfera microeconômica: que efeitos perversos a Aids vem provocando na indústria do sexo, com o fechamento ou drástica redução orçamentária dos motéis, saunas e das diferentes formas de prestação de servicos sexuais? Ou ainda: quais os efeitos desta epidemia mundial no mercado de preservativos, lubrificantes e demais produtos destinados ao novato "sexo sem risco''? ] [2 Como se vê, inúmeras alternativas teóricas ou empíricas se apresentam ao estudioso a partir deste único tema. Após refletir sobre estas três possibilidades de relacionar Aids e Sexualidade - a sociológica, a psicológica e a econômica - decidi concentrar minhas indagações num nível mais pragmático- ou profilático, se preferirem - perspectiva inquestionavelmente mais excitante que as anteriores. Tratarei, em vez da sexualidade em geral, a relação da Aids com o Sexo, entendendo sexo aqui não em seu sentido cromossômico, genético, gonádico, nem dos papeis de gênero ou da orientação sexual, mas sexo no sentido mais popular, de ato sexual, de práticas libidinosas, de sensualidade e erotismo. Afinal, é através do sexo - da "sacanagem", da "putaria" e da "viadagem", que esta epidemia tem feito suas principais vítimas. E meu objetivo, enquanto estudioso e lutador contra esta síndrome tem sido exatamente este: impedir que mais pessoas venham a se contaminar pela ignorancia sexual. Tentarei, portanto, mostrar, como a Aids tem provocado questionamentos e modificações substantivas nos padrões e práticas sexuais contemporâneos, tirando o véu da hipocrisia e obrigando toda a sociedade falar de sexo, ver objetos ou imagens sexuais, e encarar as diferentes performances eróticas ou orientações sexuais com maior naturalidade do que nos tempos anteriores ao aparecimento desta síndrome. Em última análise desejo mostrar como a sexualidade humana e uma construção social e histórica, o que vale dizer,

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didática, e que a Aids, apontada inicialmente como a maldita água fria castradora da fervura da revolução sexual das últimas duas décadas, em vez disso, ela tem impulsionado importantes modificações, nem sempre negativas, nos padrões sexuais contemporaneos. E mesmo que temporariamente, a fim de nos precavermos contra a contaminação pelo HIV, tenhamos de abrir mão de algumas poucas variantes libidinosas, tudo nos leva a crer que desde o momento em que se descobrir a vacina e o remédio contra a "epidemia do século", a humanidade estará muito mais informada e convencida em fazer do sexo e da sexualidade não apenas a fonte da vida, mas o espaço privilegiado da comunicação e da felicidade.]

AIDS: DOENÇA PREDOMINANTEMENTE SEXUAL [3 A Aids, "a mais misteriosa das doenças", embora strictu sensu não seja uma DST (doença sexualmente trasmissível), podendo ser contraída através de formas não sexuais de interação, tanto na África, quanto na América e Europa, é sobretudo através dos flúidos sexuais que o HIV tem se alastrado entre jovens e adultos de ambos os sexos. A "peste gay'', como foi chamada no início, que atingia sobretudo os homossexuais masculinos, tende cada vez mais a se heterossexualizar de acordo com os últimos boletins do Ministério da Saúde, em 1984, 54% dos casos de Aids notificados no Brasil eram homossexuais, para 3,4% de heterossexuais; hoje os gays representam 30,5% e os heterossexuais, 14,2'. Quer dizer, em 5 anos, os homossexuais diminuiram quase à metade, enquanto os heterossexuais aumentaram em quatro vezes o seu número. Continua, contudo, a ser uma epidemia primordialmente transmitida por via sexual: 66,5% das notificações do Brasil entram hoje nesta categoria. ] [4 Como é do conhecimento geral, a Aids surgiu no Ocidente na virada dos anos 80, coincidindo com o clímax da moderna revolução sexual. A descoberta de eficazes antibióticos no controle das DST, a popularização da pílula anticoncepcional e de outros metodos antinatalistas, a descriminalização do aborto e legalização do divórcio em muitos países, a consolidação do movimento feminista e expansão do movimento gay - todas estas modernas conquistas pareciam encaminhar a parte mais civilizada do mundo para uma mudança radical dos valores e práticas sexuais herdados da trimilenar tradição judaico-crista. De repente, como que num passe de magica ou de humor negro, surge e se alastra pelo mundo todo uma doença misteriosa, mortífera e até agora incuravel, saudada pelos moralistas como o chicote divino contra a libertinagem conteporânea. Doença que passa a dizimar primordialmente as pontas de lança da revolução sexual: os homossexuais, bissexuais, heterossexuais promíscuos e de roldão, outra minoria da tribo dos desviantes: os viciados em drogas injetáveis. Todos nós aqui presentes, contemporâneos desta tragédia humana, certamente lastimamos ou ouvimos alguém maldizer o terrível azar de que somos vítimas, pois existindo o ser humano há vários milhões de anos sobre a face da terra, logo na nossa geração, no momento que nos coube na história, exatamente quando as barreiras da milenar repressão sexual começavam a desmoronar, surge este vírus desgraçado, trazendo o medo, a doença, a dor e a morte à flor da idade, jogando água fria na fervura do erotismo recém alforriado da Inuisição, da sífilis, da gravidez indesejada e do moralismo vitoriano. O que vou tentar nesta comunicação, senão provar o contrário, ao menos relativizar este quadro. Para mim, a epidemia da Aids tem colaborado de maneira significativa para redimensionar e legitimar a revolução sexual contemporânea, sobretudo em três níveis da sexualidade: na liberação do discurso sexual, na maior visualização do sexo e das práticas libidinosas e ainda mais importante, tem favorecido a crescente desmistificação do tabu sexual em geral, tornando legítimas e oficializando certas performances eróticas e orientações sexuais até então ultra discriminadas, as quais, nem mesmo em pleno frenesi dos anos hippies não chegaram a ganhar tanto destaque nos meios de comunicação e na aceitação da sociedade em geral como atualmente. ]

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DESBLOQUEIO DO DISCURSO

[5 Já é clássica a oposição proposta por Michel Roucault, de um lado a ''ars erótica" das civilizações orientais, ondee a verdade do sexo é extraída do próprio prazer, e a sexualidade encarada como busca da satisfação máxima; do outro lado, a "scientia sexualis", típica do nosso mundo ocidental, onde a verdade do sexo se obtém a partir da prática do discurso sexológico, em função de uma forma de poder-saber que tem na confissão seu principal fundamento. Foucault, malgrado ter atrás de si uma plêiade de famosos seguidores, e ser inegável sua importância nos estudos da história da sexualidade, não fez de sua condição de homossexual e aidético uma arma política na luta pelo desbloqueio do discurso humanitário com vistas à desistigmatização destas duas minorias: recusou-se falar sobre estas esferas nebulosas de sua biografia. Quando de sua visita a Salvador, preferiu praticar a ars erotica da diáspora africana, do que palestrar sobre a scientia sexualis. Morreu em 1984. Com o surgimento da Aids e a identificação de sua transmissão também por via sexual, delinearam-se duas grandes tendências no enfrentamento desta epidemia. Primeiramente a ala mais conservadora das diferentes igrejas cristãs, secundadas pelos médicos travestidos em cães de guarda da moral dominante, propuseram como principal estratégia profilática contra a "peste gay" a abstinência sexual, ou então, para os casados, a mais completa fidelidade conjugal, retomando o mesmo discurso dos moralistas religiosos de décadas anteriores quando tentavam reagir ao que chamavam de "pansexualismo de Freud". O Dr. Vicente Amato Neto, Diretor do Setor de Infectologia do Hospital das Clínicas de S. Paulo, declarou: "Costumo dizer, de brincadeira, que a melhor prevenção para a Aids é o sujeito tornar-se Testemunha de Jeov, por que os adeptos desta religiao não são homossexuais, nem bissexuais e são fiéis ao casamento." O Cardeal do Rio de Janeiro, D. Vicente Salles, corifeu das críticas a moderna revolução sexual no Brasil, na mesma trilha de Joao Paulo II, aponta o retorno incondicional ãos Dez Mandamentos como caminho certo e exclusivo para se debelar o flagelo da Aids, diagnosticada ora como vingança da natureza contra os ultrajes perpetrados pelos libertinos, ora como chicote divino contra os modernos filhos de Sodoma. Outra tendência, felizmente vitoriosa, e diametralmente oposta à repressão sexual: foi inventada pelos gays norte-americanos e batizada com o nome de "safe sex", traduzido entre nós por "sexo sem risco" ou "sexo seguro". Trata-se de uma reforma dos padrões tradicionais do erotismo, propondo-se alternativas libidinosas sem risco em substituição àquelas pr ticas perigosas de transmitrem o HIV. Felizmente, insisto, o ''safe sex" tem convencido cada vez mais amplos setores da sociedade, inclusive apontado pelos setores mais esclarecidos das igrejas cristãs como "um mal menor", do mesmo modo como Santo Agostinho apontava a prostituição como um mal menor necessário para preservar a virgindade das donzelas casadouras. Hoje, o sexo sem risco passou a fazer parte integrante inclusive do discurso oficial dos mais diferentes organismos e instituições envolvidos com o controle e prevenção da Aids, da Organização Mundial de Saúde, Ministério e Secretarias de Saúde, às organizações não governamentais e grupos de militância homossexual. A essência do sexo sem risco é que não se deve permitir que o sangue, esperma e secreção vaginal de outra pessoa entre dentro do próprio corpo. Portanto, um dos primeiros passos de todas campanhas anti-Aids, tem sido exatamente divulgar listas de atos sexuais que of erecem alto, medio e baixo risco de contaminação. E neste afã de ''congelar", ao menos até a descoberta da vacina e da cura desta síndrome, aqueles poucos atos de alto risco, toda a sociedade passou a receber sob a chancela do sexo sem risco, informações minuciosas sobre um sem número de alternativas eróticas, aprovadas e asséticas, algumas jamais mencionadas mesmo em rodinhas informais de adultos na era pré-Aids. Uma destas primeiras listagens de atos sensuais sem risco foi divulgada no Brasil pelo Grupo de Apoio e Prevenção à Aids de Sao Paulo, num sugestivo cartaz desenhado pelo artista

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plástico Darcy Penteado, ele próprio vrtima do HIV. Eis o seu texto: "Transe numa boa: sexo é bom. Nao deixe a Aids acabar com isso. Evite contacto com esperma. Use camisinha. Reduza o número de parceiros. Masturbação a dois é gostoso e oferece menos risco," E como pano de fundo deste cartaz, a lista, varias vezes repetida, das alternativas eróticas que se pode praticar sem risco de contaminação: "Paquerar, dançar, brincar, encoxar, fantasiar, sussurrar, olhar, encantar, beijar, badalar, cantar, acariciar, sassaricar, conversar, roçar, apalpar, bolinar, beliscar, balangar, apertar, cobiçar, tocar, segurar..." Haja fôlego para tanta sacanagem! Como era de se esperar, padres e médicos protestaram contra discurso tão explicitamente estimulador de erotismo alternativo. Com o tempo, porém, os próprios órgãos oficiais, à imitação do que já ocorria no exterior, tiveram de rasgar o véu do falso-moralismo e também incluir o sexo sem risco nas alternativas profiláticas contra a epidemia do século. E nesta cruzada contra a contaminação por via sexual, uma antiga estrela, praticamente aposentada com o advento da pílula anticoncepcional, passou novamente à condição de prima-dona: a camisinha de vênus, inquestionavelmente, a musa dos finais do segundo milênio. Considerada até bem pouco tempo como objeto tabu, seu nome impronunciável em público, as camisinhas alcançaram nos últimos anos notoriedade inaudita, sua produção e consumo crescendo sem parar, invadindo lares e repartições públicas, seu nome nefando sendo pronunciado por Ministros de Estado e Cardeais, sua imagem nua e seu uso veiculado por todos os meios de comunicação. Num dos primeiros folhetos produzidos pelo Ministério da Saúde, intitulado "Aids, quanto mais você conhece, mais pode evitar", na parte dedicada ao sexo sem risco, podemos ler: "A forma mais segura que se conhece para evitar o contágio da Aids é o uso do preservativo de borracha, a camisinha. Com ela o vírus não entra em contacto com o órgao genital do parceiro. Homem ou mulher, estabeleça o uso do preservativo nas suas relações. Converse com seu parceiro. Deixe claro que não é uma questão de desconfiança, mas um meio seguro de prevenir a doenca". Em resumo: malgrado a forte oposição dos setores mais moralistas de nossa sociedade, notadamente da CNBB, informações detalhadas sobre o sexo sem risco passaram a fazer parte integrante de todas campanhas contra a Aids tornando a sexualidade tema muito mais freqüente de conversa e discurso do que no período da decantada eutoria da revolução sexual. Nunca se falou tanto de sexo como depois da Aids: nas prateleiras das livrarias os livros sobre sexo aumentam dia a dia; cursos e conferências sobre educação sexual tornaram-se moda; o sexo por telefone, ou através do computador ganha mais adeptos nos países mais modernos. Finalmente, a língua travada por tantos séculos, foi liberada. Somos contemporaneos da "desnefandização" da sexualidade: o que era proibido falar tornou-se tema de conversas, músicas, ma nchete dos jornais. Com a Aids, a scientia sexualis tornou-se objeto de consumo universal: falar abertamente sobre sexo faz parte da profilaxia da epidemia do século. Nos Estados Unidos, campanhas enfatizam a urgência de dialogar sobre sexualidade com todos os grupos, inclusive com as crianças e adolescentes: ' Você está falando sobre Aids com as crianças?" é a frase de um broche (botton) muito distribuido na última Conferência Internacional de Aids em S. Francisco. ]

LIBERAÇAO DO VISUAL [6 Com o alastramento da Aids presenciamos não apenas um significativo incremento do discurso sobre a sexualidade, como também uma gradativa exibição de imagens relacionadas ao sexo sem risco. A camisinha, ate então escondida nas prateleiras das farmácias e nos recônditos das gavetas, passou a ser exposta em lugar de destaque dos supermercados. Cartazes, panfletos e filmetes oficiais passaram a mostrar o preservativo em sua nudez, fora da embalagem, manipulado como se fosse uma luva de proteção. Para ensinar como usá-lo, utilizaram-se primeiro objetos fálicos- a aeromoça que enfiava a camisinha no dedo, ou numa banana - o que levou os grandes

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empresários desta fruta a protestar na televisão norte-americana. Hoje, sobretudo nos países mais desenvolvidos, cartazes e folders mostram com todo realismo corpos dos entrelacados e membros eretos protegidos pelo profilático, material destinado tanto às clientelas heteros quanto homossexuais. Nesta VI Conferencia Internacional de Aids, enquanto uma fração do grupo anti-Aids "Act Up" comandava manifestações na rua, em protesto contra a política discriminatória à entrada dos HIV positivos nos Estados Unidos, dentro do centro de convenções, outros membros do Act Up optaram por outra estratégia de luta - vendiam e exibiam um vídeo ultra realista sobre o safe sex, filme cujo roteiro não ficava nada a dever às imagens mais sensuais das Mil e uma Noites ou do Kama Sutra. A Aids levando o sexofóbico Ocidente às intimidades da alcova da ars erotica oriental. Nos pontos de ônibus e nos transporte s coletivos de algumas grandes cidades norte-americanas e européias, cartazes sempre bastante explícitos, evocam ãos passantes detalhes do sexo sem risco. No Brasil, o moralismo oficial e a pobreza dos recursos das organizações comunitárias e dos orgãos não-governamentais explicam a falta de imaginação e pudicícia do material visual relacionado ao sexo sem risco, se comparado com o dos países mais ricos. A maior audácia visual com chancela oficial foi produzida pela Secretaria de Saúde da Bahia, ao divulgar em Salvador, no verão de 1988, out-doors e cartazes com um casal deitado juntinho, na praia, ela com sumaríssima tanga, ele de sunga, com as duas mãos enlaçando as pernas da companheira. O texto dizia "O verao da Bahia chegou... Turistas chegam de todas as partes e se entregam de corpo e alma às dellcias desta terra morena, hospitaleira e sensual. Na Bahia, 70% dos casos de Aids toram adquiridos através do ato sexual. Isto não quer dizer que as pessoas estão condenadas a um verão triste e sem amor. Voce pode relaxar e curtir o verao desde que tome diversos cuidados não deixe de usar o preservativo! A camisinha é seu único amuleto: feche seu corpo, abra seu coração!" Na falta de cartazes específicos com visual homoerótico, o Grupo Gay da Bahia aproveitando este material oficial, fez uma montagem onde em vez do casal modelo, dois rapazes se entrelaçavam tendo a mesma praia e dizeres como pano de fundo. Na televisão foram exibidos filmetes com cenas bem realistas de "pegação", mostrando cenas de promiscuidade na area do meretrício: mulheres e travestis abracados a seus clientes, sugerindo ãos telespectadores o risco da troca de casais e sexo com qualquer pessoa. Salvo erro, foram as imagens mais ousadas veiculadas pelo Ministério da Saúde. Quanto ao visual mais explicito divulgado no Brasil relativamente ao sexo sem risco - alem de uma história em quadrinhos do Grupo Atobá de Emancipação Homossexual, do Rio de Janeiro, onde Batman e seu companheiro Robin eram mostrados com superdotados membros eretos, dando lições de como usar a camisinha, destaca-se o livrete publicado pela Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids, com patrocínio da Fundação Ford, onde cenas eróticas extraídas de revistas gays mostram diversos atos sexuais rotulados alguns como muito arriscados (dar e comer), arriscados (chupar), sem risco (beijo, punheta e consolos). Neste afã do "liberou geral", os teóricos da Abia chegam a um extremo discutível: divulgam uma arriscadíssima performance erótica restrita à subcultura sadomasoquista norte-americana e européia - o "fist fucking" - que consiste na introdução da mão e parte do braço dentro do ânus do parceiro, erotismo praticamente desconhecido no nosso meio. (Entre Homens , Abia, 1988). Nunca o nu, inclusive o masculino, e mais ainda, o nu de dois homens entrelaçados, foi tão mostrado como nos posters, out-doors, filmetes e panfletos das campanhas anti-Aids: cartazes recebidos dos países mais desenvolvidos mostram explicitamente pênis eretos cobertos com o condom, cenas de felação e outras "perversões" inimagináveis em anos anteriores. Mesmo que medicalizada e tornada assética, a sexualidade tornou-se com a Aids materia inevitável de ser falada e visualizada por todas as pessoas, cumprindo-se tardiamente o postulado de São Clemente, que desde o primeiro século da era cristã, defendia que "não deveríamos ter vergonha de falar (e ver) o que Deus não teve vergonha de criar..." ]

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LEGITIMANDO O NEFANDO [7 Durante os últimos três milênios, no ocidente, a masturbação, o coito anal e o homossexualismo foram condutas sexuais ultra discriminadas, existindo rigorosa legislação civil e religiosa que condenava à pena de morte os praticantes de tais crimes. Dentre todos os delitos, o homossexualismo era considerado "o mais torpe, sujo e desonesto pecado", tão abominável que passou a ser chamado de "pecado nefando", isto é, "cujo nome não pode ser pronunciado, e muito menos praticado, pois provoca a ira de Deus, que porque manda tempestades, terremotos, pestes e fomes." Apesar da descriminalização da homossexualidade no Ocidente, a partir dos íncios do século XIX, sob influência do Código Napoleônico, e das novas teorias psicanalíticas, retirando a masturbação do rol das patologias sexológicas, não obstante, a força da intolerância precientífica ainda persistente, discriminando com impiedade sobretudo os homossexuais, considerados a minoria mais indesejada e violentada dentro de nossa sociedade. Com o advento da Aids, atacando inicialmente os homossexuais masculinos, os homófobos saudaram a "peste gay" como o golpe final contra a liberação desta minoria. Eis a opiniao do mais virulento opositor ãos direitos civis dos homossexuais no Brasil, o jornalista J.A. Berbert, porta-voz do principal jornal do Norte e Nordeste: "Em toda esta tragedia da Aids, há um lado positivo: o povo está ficando alerta contra os invertidos. Ja não são aceitos e todos passaram a temê-los como transmissores da terrível peste gay... Mantenha a cidade limpa: mate uma bicha todo dia !" De fato, depois da Aids, certos gays, temerosos primeiro em perder sua clientela, e com receio de tornarem-se bodes expiatórios desta pandemia, entraram em pânico, prevendo dias piores ou mesmo a erradicação desta "raça maldita", empregando aqui a expressão de Marcel Proust em Sodoma e Gomorra. Ledo engano! A realidade tem provado o contrário, tanto aqui como no exterior: a Aids vem conferindo ãos homossexuais um reconhecmento social e respeitabilidade inimagináveis em décadas anteriores. De principais vítimas do HIV os gays, e sobretudo o Movimento Homossexual, tornam-se cada vez mais, não so os principais experts e divulgadores do sexo sem risco, como os maiores aliados dos órgãos públicos no combate e atendimento dos portadores desta síndrome. Basta consultar as revistas e periódicos gays antes da Aids, para se constatar como o movimento homossexual, sem perder a alegria e frenesi que os caracterizam, tornou-se extremamente sério e responsável, como resposta a esta crise da saude pública mundial. Hoje, nos Estados Unidos e Europa, os governos encontraram nos grupos gays seus principais aliados, que com sucesso tem conseguido reduzir drasticamente a expansão do HIV dentro do seu principal grupo de risco. A homossexualidade e os homossexuais passaram, com a Aids, a merecer muito mais atenção e respeito das autoridades, inclusive no Brasil, país onde lastimavelmente o movimento gay pouco cresceu em sua primeira década de existencia: ja em finais de 1986 o então Ministro da Saúde, Roberto Santos "elogia a ação dos homossexuais contra a Aids", e desde 1988 o Grupo Gay da Bahia, na figura de seu fundador e autor deste ensaio, é indicado membro da Comissão Nacional de Controle da Aids, certamente a primeira e até agora a única vez que num Decreto Ministerial e no Diário Oficial apareceu a nefanda palavra "GAY''. Da mesma forma, ao tornar-se o GGB a primeira agremiação de homossexuais da América Latina a ser declarada de "utilidade pública", a Camara Municipal de Salvador salientava com destaque, na justificativa desta outorga, o pioneirismo e acerto deste grupo na prevenção da Aids neste Estado. Portanto, o surto da Síndrome da Imunodeficiência Adquirida, divulgando discursos e imagens do sexo seguro, tem contribuldo, de maneira fundamental, para a desmistificação e legitimação de certas pr ticas e orientações sexuais até então objeto do mais rigoroso tabu e complô do silêncio. Quando se imaginaria que um Ministro de Estado, ou uma emissora de Televisão iriam invadir a intimidade do lar e tratar de assuntos tão escabrosos, como sexo oral, coito anal, camisinha de vênus, promiscuidade sexual, sexo seguro, etc? Até do atual Presidente da República se exigiu

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que emitisse sua opinião sobre a camisinha. Disse Collor que em seu governo "será necessário uma permanente divulgação do como usar os preservativos..." ]

CONCLUINDO [8 Estudioso que sou da Inquisição, desde o início da crise da Aids chamou-me a atenção a semelhanca existente entre o moderno "safe sex" e o casuísmo inquisitorial na repressão à sodomia. De acordo com os Regimentos do Santo Ofício, só se consubstanciava em crime de "sodomia perfeita a penetração do membro viril desonesto dentro do vaso trazeiro com derramação de semente." Todos os demais atos homoeroticos, como os ósculos e amplexos, masturbação recíproca, "coxeta" e até a felação, eram condenadas como pecados cabeludos, crime porém, só a ejaculação dentro do ânus. Muitos "fanchonos" quando inquiridos pelos juízes inquisitoriais, confessaram ter praticado apenas o "conatus", i.e., a tentativa de penetração; outros, embora assumindo ter penetrado no vaso trazeiro, juraram ter derramado a semente fora, negando, mesmo debaixo de cruel tortura, a consumação da perfeita sodomia. Muitos declararam ter perfeito conhecimento de que apenas este ato era crime de morte, todos os demais, já no seculo XVI rotulados popularmente de "sacanagem", estavam isentos da condenação à fogueira. Custava-me acreditar na veracidade destas confissões, até que com a Aids, passei a dar mais crédito aos sodomitas luso-brasileiros processados pela Inquisição. Também hoje, o maior risco de contrair esta doença mortal esta exatamente na ejaculação dentro do ânus, divergindo os médicos, como os inquisidores de antanho, na gravidade exata a ser atribuída ao sexo oral. Tanto é assim que ainda agora alguns experts em Aids preferem dizer "safer sex", sexo mais seguro, do que o categórico "sexo sem risco", não havendo consenso nem certeza absoluta sobre a inocuidade ou não da felação e demais formas de oralidade, como a cunillngua e anuslíngua. Nos Estados Unidos, já virou quase piada a constatação de que em San Francisco, os teóricos do safe sex desaconselham a felação, enquanto em Nova York ensinam que chupar não of erece maiores riscos de contaminação pelo HIV. Portanto, chupe em Nova York, não chupe em S. F rancisco... O medo da pena de morte forçou muitos sodomistas a buscar outras alternativas eróticas além da ejaculação no ânus: o espectro da fogueira levou os mais temerosos, ou conscientes, a modificar suas práticas sexuais, transferindo o clímax do gozo venéreo de dentro do ânus, para o côncavo das mãos, para o meio das coxas, e mais raramente, gozando na boca. De mais de quatro mil homossexuais denunciados a inquisição, menos de quinhentos chegaram de fato a ser presos e processados, 30 foram queimados como praticantes incorrigíveis da perfeita sodomia. Estes infelizes, ou por ignorância da criminologia inquisitorial, ou por desprezarem-na, ou ainda, por temeridade, praticaram o modelo homoerotico já condenado pela Bíblia a mais de três mil anos: “O homem que dormir com outro homem como se fosse mulher, deve ser apedrejado.” Beijar podia, "fazer as sacanas" podia, praticar a coxeta era tolerado: só era crime ejacular dentro do reto. Certos autores, como o veterano Marquez de Sade (1740/1814), recuperado por alguns sexólogos modernos, ao desmistificarem a cópula anal, tornam-se grandes propagandistas da analidade, equiparando-a à quintessência do prazer, inclusive, confundindo-a com a própria definição da homossexualidade. O sexólogo Guy Hocquenghem, o mais assumido e radical dos intelectuais franceses, falecido recentemente de Aids, cunhou a célebre expressão "o buraco de meu cu é revolucionário", idéia retomada por certos militantes do movimento gay paulistano que costumavam repetir, como palavra de ordem nas passeatas contra a violência policia l, "o coito anal derruba o capital!" Eu próprio, numa tentativa de desmistificar o fantasma da sodomia, apresentei numa reuniao anual da SBPC, em Campinas/1982, um ensaio sobre o coito anal, denunciando o ridículo preconceito dos médicos brasileiros em relação a este terminal anatômico, em tempo que, com respeitavel bibliografia, resgatava as possibilidades eróticas do "vaso posterior" e da analidade, que segundo o antropólogo Roberto da Matta, constituem "a preferência nacional" dos brasileiros. ]

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[9 Longe de mim tornar-me agora corifeu da anti-sodomia. Continuo acreditando que em matéria de amor e erotismo, tudo é divino e maravihoso, desde que haja prazer e liberdade recíproca - postura aliás referendada oficialmente pela Associação Brasileira de Antropologia, quando em 1982 aprovou moção contra todas as formas de discriminação sexual. Porém, considerando que um vírus mortal tem encontrado na cópula anal sua principal porta de entrada na população, e que os preservativos, merecidamente saudados como "salva vidas" contra o HIV não oferecem 100% de segurança, a prudência e o bom senso obrigam-nos a temporariamente, ate que se descubra a vacina e remédio contra a epidemia do século, a procurar outras formas de prazer alem da sodomia. O surto da Aids tem nos obrigado a repensar e redefinir a morfologia de nossa cultura sexual: ate que ponto a ênfase na analidade, em vez de alternativa revolucionaria e contestadora do heterossexismo dominante, não representaria exatamente um arremedo inconsciente do mesmo dispositivo coitocêntrico, peça fundamental da moral sexual judaico-cristã? Sexo na Bíblia é sinônimo de ejaculação dentro do vaso. O desperdício da semente viril, chamado pecado de Ona ou onanismo, foi condenado por Jav‚ com a pena de morte. Mesmo Reich e os 300 sexólogos modernos, ao enfatizarem a função equilibrante do orgasmo como ingrediente necessário de uma vida sexual saudável, ratificam o mesmo imperativo judaico-cristão da obrigatoriedade da penetração e ejaculação com orgasrno. A descoberta, porém de outros modelos sexuais, como o Taoismo, por exemplo, onde no desempenho da sexualidade masculina valoriza-se mais a excitação máxima aquém de ejaculação, ocorrendo portanto um descentramento orgasmático, ou então, as modernas pesquisas sexológicas, de Kinsey e Hite, comprobatórias de que o prazer maior esta na excitação da periferia clitoriana, e não no recôndito do vaso pudendo - tais descobertas obrigam-nos a repensar nossos valores e preferências sexuais não como cristaliza,ções instintivas e imutáveis, mas como padrões culturais e históricos susceptíveis não só de mudança, como de planejamento. A revolução sexual moderna, ao liberar territórios e performances até então condenados à fogueira ou ao fogo do inferno, fez da sexualidade "uma busca de eficária e economia que comporta a um só tempo, a maximização do rendimento quantitativamente expresso em número de parceiros e orgasmos, e a minimização do custo, isto é, a perda de tempo e o risco de recusa diante dos avanços." Nossos pais copulavam para cumprir a ordem sagrada do crescei e multiplicai-vos. Nós limitamos a natalidade com pílulas, camisinhas, vasectomias, etc, mas continuamos sempre obsessivamente coitocêntricos e orgasmocêntricos. A Aids veio relembrar-nos daqueles momentos da história humana, ainda praticados por certas culturas distantes, onde o prazer sensual ‚ obtido através de um sem número de jogos e posições ultra-prazeirosos, e não exclusivamente da penetração-ejaculação. Com a modernização do sexo, nossa geração passou a desprezar os "entretantos", indo direto para o "finalmente". É tempo de voltarmos a curtir também o romantismo, o jogo da sedução, a carícia. Para os mais tradicionalistas, há sempre o recurso da camisinha, em brevemente, a "camisola feminina", já em experimentação no exterior. A Aids não veio portanto para acabar com os prazeres do sexo: ela só nos obriga a amar com cuidado. Continua valendo o refrão "Qualquer maneira de amor vale a pena, qualquer maneira de amor vale amar..." Ame com cuidado ' ]

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PALESTRA F-033 Projeto Integrado Fala e Escrita Palestra de Dr. Delgado [1 FM1eu tenho a::... subda honra de passar a palavra a: ao potiguar quase alagoano José Augusto Delgado... que vesará sobre o tema...o processo civil na constituição (risos)] [2 FM2(risos)... cari:ssímu:...ministru:...(suspiro) José de Jesus...(suspiro) através de vossa excelência...toda magistratura federal: estadual: os advogados: o superior de justiça os tribunais regionais federais... já foi saldado nu:.../ em razão do de pedido feito por sua excelência o ministro Admar Maciel permita -me vossa excelên:cia:... ministro José de Jesus... que: neste momento através da figu:ra:... do meu querido ami:gu: Pedro da Rocha Aciooly... ahm...símbolo:: de justiça e SIdo: muito MAis de uma justiça e cidadania brasileira... que também apresenta a minha saudação...a to:dos que fazem o poder judiciário brasileiro especialmente aos que fazem ... com Amor: dedicação↑... e com o símbolo da amizade (0.3)] [3 a minha missão é: em trinta minutos... falar sobre o proce:sso e efetividade dos princípios constitucionais...os senhores estão observan:do que é:rigorosamente impossí:vel nem que:: fosse dado o poder de efetuar milagre... em trinta minutos nós discorremos sobre os princípios constitucionais e a efetividade sobre os princípios no momento atual (0.2) então temos a responsabilidade de:: estabelecermos uma síntese: para... para tratarmos do do assunto...e para isso escolhemos: um enfoque em três aspectos... analisarmos hoje se o processo está cump rindo o dispositivo constitucional direito a direito justo... segundo se o processo um direito também constitucional de o cidadão ter os seus conflitos: soluciona:do por intermé:dio: da: conciliação e... e terceiro (0.3) se o cidadão em face dos seus conflitos não estarem sendo solucionado a tempo e a modo...( ) se ele... pode exercer o direito implícito na constituição na chamada desobediência civil (0.2) ativa (0.4) início (0.3) análise destes três aspectos pedindo permissão ao ministro Admar Maciel...para:... fazer minhas as palavras que sua excelência aqui anunciou... e que me pare:cem bem (0.3) colocadas dentro de um contexto constitucional hoje vivido e da necessidade de homenagear a constituição] [4 disse sua excelência que é bom que se pite que se repita e que se pita várias ve:zes: que se repita em muitas oportunida:des e que além de se repetir que essas palavras fiquem inseridas dentro do nosso espírito de juiz de cidadão de advogado... de procurador: viu... de assessor jurídico... enfim... dentro do nosso espírito de homem do povo... diz sua excelência... que a constituição fedeRAL: esta preocupada com a sociedade (0.3) que a constituição federal tem regras de obediência a serem cumpridas na sociedade ciVIL e mui:to mais do que isso a serem cumpridas pelos magistrados... disse o ministro Admar Maciel também... a constituição federal: não pode ser indiferentes não pode ficar indiferente a sociedade... estatuto jurídico dos políticos segundo expressão do canotíro... que eu acrescentaria estatuto político muito mais do dos políticos...ela é estatuto político dos cidadãos (0.3) e por fim (0.2) dissis:/dentro dessa linha (0.2) dessa linha de mensagem...principiológica disse sua excelência ministro Admar Maciel a função do juiz é modelar a sociedade”v ejam senhores (0.3) que são regras que nós não pudemos esquecer...são regras que não estão sen:do:: ao meu pensar devidamente valorizadas pela doutrina uhm... a não ser em rápidas passsagens e que não estão sendo transmitidas nas universidades como um DO:gma...entendeu ↓a ser inserido... no íntimo de cada operador...direito de (0.3) deste comando que é o meu sentir obrigatório e que se dirige especialmente ao cidadão e dentro do que nós construímos para análise (0.3) para a verificação de que se esses três princípios constitucionais aqui mencionados é o do do direito ao

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direito justo (suspiro) o de um direito ser solucionado através da conciliação e se o homem quando tem o seu direito não atendido pode se utilizar são regras que nós não pudemos esquecer... viu... são regras que não estão sendo:: ao meu pensar devidamente valorizadas pela doutrina ahn... a não ser em rápidas passagens e que não estão sendo transmitíveis nas universidades como um DOgma... viu... ou ser inserido no íntimo (0.2) de cada operador de direito (0.3) dentro ↑ (0.3) deste comando (0.2) que ao meu sentir é obrigatório e que se dirige especialmente ao cidadão... e dentro do que nós construímos para análise (0.3) para a verificação de se estes três princípios constitucionais aqui mencionáveis o do do direito ao direito justo o de um direito não vamos ser solucionado através da conciliação...e se o homem não tem atendido pode se utilizar da desobediência civil através da sua forma ativa não desobediência civil através da forma guerrilheira (0.2) viu... eu quero invocar para os senhores um fato (0.3) que a imprensa noticiou e que muito me preocupou...] [5 me preocupou porque...hoje nós temos:: no país a fome popularizada...nós temos no país a insegurança pública:: popularizada e a insegurança particular tam:bém: popularizada (0.2) nós temos a corrupção em determinados listamentos sociais também: popularizada... temos ainda também ainda a falta de assistência a saúde pelos poderes públicos popularizada...nós temos a falta de assistência educacional também popularizada nós temos o tráfego das de drogas especialmente os morros no Rio de Janeiro onde estão construindo um esta:do independente... também popularizada (0.2) e outros e outros aspectos nós podíamos mostrar que no país é de GRAve atenta:do ao direito do cidadão ↑todos os aspectos estão popularizados então me preocupo demais quando há demo:ra na entrega da prestação jurisdicional também esta se popularizando (0.3) se popularizando por quê?... porque ela está chegan:do a desenvolver a revolta no íntimo do povo no íntimo do cidadão e revolta essa a ser manifestada através de artigos (0.2) elaborado em fatos concretos pela empresa (0.2) vejam senhores que até o momento atual temos tratado da:: da demora da entrega da prestação juirisdicional só com aspectos genéricos: (0.3) só com teorias...só com teses... viu... só com representações de soluções e a imprensa também tem tratado do tema ... só em aspectos de generalidades...é muito bem dificilmente a impren:sa (0.2) VINHA destacando aspectos de situações concretas... situações por revelarem dor dor revelarem sentimentos as decepções nos afe-ta-vam ↓ (0.3) nos afetam diretamente más ultimamente vejam senhores que a imprensa tem repetido ... a situação de Mané ou a situação de João a situação de Joaquim... viu... ele... dando um um grito um grito de alerta a todo nós... viu... pelos males... que a entrega da prestação da pre/ ou pelos males que a demora na entrega prestação prestação cão esta::... acarretada] [6 vou contar para os senhores um caso e que eu intitulei do segurado meia meia três meia oito um ...traço zero quatro barra... quarenta e três aí já começa a minha preocupação (0.3)o homem sendo vista pelas instituições não com a sua identidade mas sendo visto como um número (0.3) como o homem esta sendo visto pelo INSS...o homem esta sendo visto também TALvez até... permita-me os senhores que pelo poder judiciário viu... no momento em que:: as suas ações os seus pedidos jurisdicionais estão se transformando hoje (0.2) até em preocupação estatística então o caso do segurado meia meia três meia oito um... traço zero quatro barra quarenta e três é um caso verídico e foi narrado por Clóvis Rossi jornalista da folha de São Paulo em onze de julho de noventa e cinco bem recentemente...e denunciou a nação o drama nascido por este segurado...não diz o nome do segurado é identificado repito pelo número meia meia três meia oito um traço zero barra quarenta e três mostra Clóvis Rossi em tal peça informativa... a incoerência... mais uma vez presen:te na execução de determinados tipos de credibilidades:: social (0.3) pela inexistência de um comportamento horizontal no trato de situações con-fli-TAN-tes e revestidas de idênticos caracteres... demonstram (0.3)o jornalista ↓ com apoio na força dos fatos acontecidos que enquanto todos os brasileiros é muito importante nós nos situar neste aspecto... todos os brasileiros fizeram um coro ( )fizeram um coro ensurdecedor:exigindo que os petroleiros obedecessem a

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determinação judicial que julgou abusiva a greve... por uma imposição de respeito ao tratamento/ ao ordenamento jurídico o único capaz de estabelecer a paz entre os homens (0.2) não há qualquer manifestação para se solucionar POR EXEMplo... o caso do segurado/manifestação que ele fala da sociedade (0.2) quando fala da sociedade representado seus vários listamentos (0.2) o caso do meia meia três meia oito um traço zero quatro barra...quarenta e três da previdência social que este caso é o símbolo de muitos outros é o símbolo de milhares e milhares de outros casos existen:tes: na nossa realidade... que há OIto anos espera receber o valor reajustado da sua aposentadoria situação reconhecida e transitada pelo poder judiciário há cinco anos oito anos mais cinco (0.2) treze anos (0.2) o artuculista argumenta que no trato da greve dos petroleiros abro aspas pra citá-lo de fato (0.2) é necessá:rio que haja o respeito a lei...como o primeiro passo para um vida mais ou menos mais ou menos civilizada fecha aspas adverte contudo logo em seguida (0.2) que em razão do problema vivido pelo segurado meia meia três meia oito um traço zero quatro barra quarenta e três idêntico ao de milhões de outros segurados e j urisdicionados impulsionados para níveis de idênticas potencialidades negativa ↓o problema é que a vida civilizada fica impossível ↓em um país em que decisões da justiça... quando contra o governo e em favor de gente comum sem lobby à apóia-la... são descompridas com uma tranqüilidade espantosa... e É muito perigoso em sociologia jurídica quando nós nos deparamos com uma análise de tranqüilidade espantosa toda tranqüilidade espantosa é geradora de um conflito também em intensa profundidade é uma regra sociológica que não podemos nunca nos esquecer (0.2 )isso é / essa regra sociológica é tirada da própria natureza... quando o mar esta muito calmo é porque se espera uma tempestade... estarrecedor digo eu por outro ângulo... é o EStado da caracterização da revolta íntima e silenciosa no ser de vários listamentos sociais... pela demora na entrega da prestação jurisdicional refletido no desabafo do segurado meia meia três meia oito um traço zero quatro barra quarenta e três assim relatado por Clóvis Rossi...abro aspas alguém disse na carta enviada a Clóvis Rossi vejam bem os senhores “alguém esta trapaceando com o meu direito com aquilo que me pertence além de me masssacrar física e moralmente ferindo os meus direitos e minha cidadania paguei a previdência durante toda a minha vida... mais de trinta anos para ser humilhado depois de velho”↓ ao completar oitenta anos de idade (0.3) meus amigos isso dói (0.2) dói profundamente (0.3) no cidadão menos letrado possível imagine todos cidadãos que cultivamos o direito (0.3) o segurado meia meia três meia oito um traço zero quatro barra oitenta e três que hoje é apenas um número para a previdência social... pelo desrespeito que é feito a sua cidadania tem...↓ oito décadas de vida... esta prestes a completar e Deus o proteja que complete... viu um SÉculo de existência cem anos (0.3) tem tem meio século e mais três décadas (0.2) veja o que essa representação de meio século mais de três décadas ela:... torna mais forte ainda a idade possuída... debruçado... sobre tal acontecimento conclui o jornalista acima citado se isso de um: de um direito ao um direito justo ↓] [7 o que é um direito justo (0.3) SE:I: que não é fá:cil construção de conceito a respeito de um direito justo ↓más alguns princípios já estabelecidos na doutrina... e que lhe servem como roteiros como bússolas... viu... determinadores do que seja à aplicação do direito justo e vicento ( ) filho... viu... toda recordando os ensinamentos recebidos de standler que o direito justo pode ser construído com base nas seguintes linhas primeiro o (0.3) a desobediência aos princípios de respeito... a uma vontade que não deve NUNca a mercê de o arbítrio de outro o a toda exigência jurídica que deverá ser de tal forma que o obrigado seja visto como próximo ↓ isto é como o semelhante (0.2) segundo só obedecer o princípio da solidariedade (0.2) caracterizado por ↓ primeiro... que o indivíduo juridicamente vinculado não deve nunca ser instruído da comunidade pela arbitrariedade do outro... segundo... todo poder de disposição outorgado pelo direito só poderá excluir os demais de tal modo que no no excluído se vela o próximo um semelhante ↓] [8 pergunto aos senhores ao segurado meia meia três meia oito um traço zero quatro barra quarenta e três...o direito material sim... profundamente porque foi reconhecido o direito a revisão: na sua/

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nos seus proventos de aposentadoria ↓agora vem o processo civil através de suas amarras e por oito anos... após cinco anos de luta de direito e material e: e formal (0.2) e: nega à aplicação deste direito justo (0.3) temos que rever (0.2) estes aspectos... viu (0.3)e fazer com que (0.3) o processo civil... encontre... soluções (0.3) hoje buscadas embora de modo TÍMIdo do meu entender... pela reforma que se iniciou do do no final de mil novecentos e noventa e quatro ↓ ou e: meses e meses antecedentes mais de qualquer maneira é uma esperança viu... que :: (0.2) modificações ocorra o tempo faz com que: e e olho aqui para o relógio e vejo que só estão: me fal/ só estão:... me restan:do cinco minutos ↓ (0.3)] [9 analiso agora o problema da conciliação (0.4) nós sabemos que: todos nós sabemos e defendemos...que... (0.4) o estado democrá:tico (0.3)defendido e implantado na constituição federal deve construir uma sociedade fraterna ↓ fundada na harmonia social e comprometida das soluções pacíficas das controvérsias... tais valores entre tantos outros (tosse) estão postos a carta magna nunca foram merecedores de destaque d o ordenamento jurídico processual brasileiro por exemplo... o valor de haver harmonia social do processo ser dirigi:do para imposição: da harmonia social através da conciliação...vejam que no preâmbulo da carta magna... viu... estará a pregação de que a função do estado brasileiro é resolver na ordem interna os seus confli:TOS através da conciliação como também na ordem... na ordem externa ↓...] [10 qual é a nossa postura? qual é a nossa postura tradicional ↑... do processo: brasileiro...e conseqüentemente dos operadores do proce:sso: brasileiro é da fuga a conciliação ↑nós somos em regra com exceção da justiça do trabalho e hoje do juizado das pequenas ca/causas nós somos cultivadores do dissídio (0.3) por que? porque nós somos cultivadores do liTÍ:gio existentes entre as partes ↓ nós juízes nós advogados nós promotores ↓primeiramente nós nos distanciamos... imensamente das partes↓...o juiz tem um medo da parte qua:se como o diabo tem medo da cruz... a tanto que muitos juizes não recebem as partes e nem os advogados das partes alguns juizes ↓ sei que isso constitui exceção ↓ e quando recebe em pé no seu gabinete viu... e estirando a mão... viu... para encerrrar a: audiência ali solicitada (0.2) o processo é todo criado para criar dificuldades: burocráticas... viu... em relação a parte...em relação o advogado e a parte em relação juiz advogado e parte absurdamente formalístico... ↓ a parte que é o elemento principal do processo é quem mais se distancia do processo (0.3) e o juiz brasileiro em todos os níveis primeiro grau segundo grau terceiro grau quarto grau... viu... o juiz brasileiro não cultiva a conciliação ↓ nós temos o código novecentos e setenta e três que lá...de modo tímido instituiu a conciliação... naquele no nos direitos não não disponível seu pergunto aos senhores houve contínuo em nossa querida classe de advogados pela nossa querida classe de advogados pela nossa querida classe de procuradores e por nós juízes da conciliação “não... ditava com a voz bem rude ...viu... que não houve possibilidade de conciliação (0.3) terminava aí aquela MISSÃO constitucional que esta posta no preâmbulo de nossa carta magna como direito fundamenTAL e que esta no código de setenta e três ↓ vem a reforma de dezembro de noventa e quatro e abre um leque... viu...colocando a nossa conciliação do nosso processo em três oportunidades (0.3) diz primeiramente no artigo cento e vinte e seis (riso)quatro que HOJE como função primordial de um juiz ao dirigir um processo é tentar tentar conciliação entre as parte seu entendo que é imperativo e é principiológico dentro do processo...não é um comando só de conteúdo pricipiológico mas é um é um é um comando de conteúdo principiológico constitucional que apenas o co/ o processo o... o absorveu... mas a reforma penso que foi tímida não: não colocou como um/ como causa de nulidade absoluta... viu... a não o não segmento ritual da conciliação do processual dos atos processuais civis ↓ como é na justiça (0.2) do... trabalho então penso que nós ficamos na mesma situação de antes porque não temos a cultura da conciliação ↓] [11 qual é a minha proposta? (0.2) a minha proposta é que sejam instituídos juiz/ juízos conciliatórios sei sei que de imediato há uma reação (0.3) da doutrina e de muitos operadores de direito e de que os JUÍZES que vão se envolver com: o: processo conciliatório eles podem ficar influenciados pelas (0.2) pela pelos reflexos da causa... ↓ mas não...

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penso que há uma solução é que aquele juízo conciliatório não seja o JUÍzo da decisão ↓na seção judicial de alagoas que partiu na frente de TODAS as seções judiciárias do país: viu...e de toda as e de de de todas as seções administrativas do poder judiciário estadual e trabalhista e militar ↓ que instituiu aqui o regime do (ambyuma) não sei se os senhores tem conhecimento por isso eu faço o elogio publicamente (0.3) os sen/ os senhores juízes se reuniram ↑ e estabeleceram em instrução normativa... viu...o direito de qualquer cidadão... chegar aqui e fazer as suas reclamações a respeito do andamento de processo e re/ reclamações que serão registradas ↓falta conferir sei que há resistência e alguns que afirmam ↑ MÁS há dificuldades especialmente na justiça federal...↓ penso que qualquer:: ju:ridicionado que receba uma carta do juiz o convocando para uma conciliação... viu... esse: jurisdicionado ele já pensa duas vezes... se vai ou não comparecer ou não e regra ele procurar atend/ vai procurar atender ao juiz pelo menos pra saber do que se trata E se forem propostas mil conciliações e apenas dez forem conseguidas penso que já é um um passo muito avançado... para (0.2) viu... um estabelecimento de uma conduta conciliatória do poder judiciário brasileiro ↓ NOS tribunais uma turma especializada em conciliar TURMA esta que para ela seriam distribuídos processos que não foi de sua responsabilidade ↓um dia na semana (0.2)um dia do mês... em que aquela turma nos casos direitos não disponíveis e dos direitos disponíveis por determinadas regras... viu/ como o próprio inss para solucionar aqueles conflitos como tantas vezes já milhares e milhares de vezes repetidas viu que tudo isso se transforma num processo conciliatório (0.2) qual é a conciliação na e -xe -cução na previdência social... então porque não se adotar tais tais soluções (0.3) penso que: é um tema de muita meditação viu... e que necessitas ter trabalho para se fazer cumprir a vontade da constituição e que a constituição (0.2) os seus princípios se ache:que se aproxime ↑ do cidadão entregando mais rapidamente a prestação jurisdicional... ↓ e afim de que? (0.2) afim de que o cidadão : não faça uso da /do direito fundamental da desobediência civil] [12 na sua forma ativa que está implícito no artigo quinto parágrafo segundo da constituição poderal/ federal nós temos uma obra neste sentido da: professo:ra Maria Garcia chamada desobediência civil...onde ela mostra NÃO a desobediência civil revolucionária que é a que ela prega de uma forma / más a (desavidiência) civil legal: a desobidiência JURÌdica a desobediência civil que esta posta no artigo quinto parágrafo segundo na constituição federal como direito fundamental implícito não seja exercida...] [13 pois no momento em que essa desobediência civil começar a ser EXERCIDA viu a de se reconhecer como direito fundamental...do cidadão ↓e se reconhecendo como direito fundamental do cidadão a que/ a que a a que se aceitar a que se aceitar viu um descumprimento de uma outra regra constitucional viu da tortura dos pré-católicos porque penso que esse direito é super-fundametal e o direito ao pré-católico é apenas um direito processual de natureza horizontal sem nenhuma verta cris/ sem nenhuma (0.2) certa e verticalidade... então se ele é o direito super-fundametal então ele está acima... ahm embora se defenda aqui n´s temos um mestre que é o o: o:nosso ministro admar maciel e (dado) não se defenda a vert/ a verticalização dos direitos fundamentais na carta magna más há outr/ outra corrente comandada por canotilho de que nós temos direitos SUPER-fundamentais direitos direitos fundamentais e direitos principiológicos da de natureza estruturalmente horizontal ↓afim de que não seja exercida esse direito (0.2)de desobediência civil pelo cidadão...para...que... viu... para que o poder judiciário... viu então vamos repetir a expressão bem nordestina se ache:guem ao cidadão que ele não se afaste do cidadão afim de que haja maior credibilidade: nas suas ações... e a paz entre os homens que é a nossa finalidade maior era se estabelecer ↓pela reforma que se iniciou no final de mil novecentos e noventa e quatro.

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PALESTRA EF-25 (CORPUS PORCUFORT) (PORTUGUÊS ORAL CULTO DE FORTALEZA) Coordenador - Prof. José Lemos Monteiro Inquérito nº 25 Informante - Mulher, 32 anos, fortalezense, filha de pais fortalezenses, licenciada em Letras. Tema - A omissão de complementos Data do registro - 01/07/94 Duração- 57 minutos [1 Inf. vou apresentar hoje... eh é muito mais... o coMEÇO de um estudo... que eu... que eu pretendo fazer... sobre omiSSÃO de complementos... né?... por isso eu escolhi o tema transitiviDAde por quê? pra falar de omissão de complementos eu preciso... estudar primeiro a transitividade DEFINIR primeiro a transitividade... e como num podia deixar de ser eu... eu resol/ eu bom TIve que começAR... pela visão das gramáticas tradicionais né?... então... tirei a citação de alguns auTOres... pra comentar e a partir dessas... eh num é nem propriamente uma citação é mais um... conteúdo do que dizem esses autores né?... e a partir DAÍ... eh formuLEI alguns questionaMENtos... e algumas coisas que a gente vai discutir...] [2 então "um predicado verbal apresenta como NÚcleo significativo um verbo significativo... TRANsitivo ou intransitivo... NOS intransitivos A AÇÃO... não vai além do VERbo..." Cunha e Cintra... a a primeira COIsa a se observar aQUI é que ele FAla... de predicado verbal como um prediCAdo... que indica ação... COmo se TOdo... predicado verbal tivesse que NECEssariamente indicar uma ação... né?... depois "o predicado verbal exprime um FAto... um acontecimento ou uma aÇÃO"... já ampliou... né? a a noção semântica... do verbo... "TEM por Núcleo um verbo transiTIvo... ou intransitivo... VERbos transiTIvos requerem para a cabal integridade do prediCAdo... a presença de um ou mais termos que lhes completem a compreensão"... então EMBORA tenham criAdo essa noção semântica do verbo para... exprimir FAto acontecimento ou aÇÃO... mesmo assim nã/ não há um... um estudo criteriOso... das funções semânticas porque isso aqui é semântico né? essa classificação aqui é semântica... dos prediCAdos... então... como se caracteriza... semanticamente ou sintatic amente um verbo transitivo?... é preciso que essas COIsas fiquem definidas pra que se possa... exatamente dizer... o QUE É a transitividade... o QUE é que deterMIna a transitividade... então na verdade eu tenho MUIto mais proBLEmas pra acrescentar ((falou rindo)) do que... do que propriamente cerTEzas quer dizer o esTUdo... /tá começando e eu não vou tratar... especificamente a transitividade verbal... né?... MAS SE ELA PRÓPRIA... que que é o coMEÇO... JÁ oferece problemas imagine tratar da omissão de complementos né?... a primeira coisa que eu questionaria é que criTÉrios LEvam... por exemplo au/... autores da gramática de gramáticas tradicioNAIS a classificar... apontar papéis semânticos... NÉ? ou ou caracterizações semânticas para os verbos... dizer que um verbo exprime um FAto um acontecimento ou uma ação está baseado em quê?... eu sei que é um critério semântico mas... a partir de que paRÂmetros... se afirma isso?... HÁ um estudo sobre classificação de... de prediCAdos... do Peres... John Andrade Peres... eh Elementos para uma gramática NOva em que ele traBAlha com dois parâmetros... de mudança... e causatividade... é um trabalho que me parece imporTANte porque pelo menos são critério cienTÍficos pra... propor um QUAdro de classificação dos predicados... uma classificação seMÂNtica... né?... mas com BAse em critérios cienTÍficos pra fazer a classificação... bom... a partir dessa... dessas::... definições que foram vistas aí da gramática tradicioNAL... MUItas MUItos questionamentos surgem como por exemplo... "a transitividade é um fenômeno seMÂNtico ou puramente gramatiCAL... morfossintático?"... transitiviDAde parece se referir à incompleTUde... mas essa incompleTUde pode ser... puramente gramatical... em termos

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de de FUNÇÃO... em termo de FORma... né?... MAS pode ser tamBÉM uma incompletude seMÂNtica... me PArece que as duas análises podem ser feitas... MAS quem quer que TRAte de transitividade TEM que dizer... a partir de que de que aborDAgem ela está sendo tratada... SE... ah eh:: PRIORIZANdo... um critério sintático-semântico... OU priorizando EXclusivamente um critério semântico... né?... "que outros eleMENtos podem ser considerados transiTIvos?"... muitas vezes nós ((tosse de ouvinte)) ouvimo/ falar de que UMA... eh:: u/ Uma FORma como DE sorVEte... a preposição é que rege... o o elemento sorvete... COmo se a preposição de exiGIsse o elemento sorvete... mas que TIpo de incompletude é essa? é uma incompletude semântica?... é uma uma incompletude... DE funÇÃO... certo?... me parece uma incompletude... GRAmatical... porque o elemento de... é quase que vazio de significado... né?... por exemplo... uma conjunção do tipo... "quando houver inflação em reais"... o elemento quando... estaria ((pigarreou)) regendo... o resto da oração... né?... então Essa incompletude aí TAMBÉM... seria gramatical... certo?... mas falar por exemplo que... "dirige... um carro novo"... "Pedro dirige um carro novo"... o ELEMENto diRIge que soliCIta... o sintagma um carro NOvo... já TEM... já é dotado de significação... certo?... é o que TesniÈre chamaria de palavra CHEIa... então me parece haver uma diferença MUIto grande entre ESte TIpo de transitividade e este... como nós vamos ver... que já foi abordado... pelos lingüistas... "a TRANsitivi/ a:: TRANsitividade verbal SÓ se DÁ para a diREIta?... é outro questionamento que deve ser feito... a gramática tradicional... e MESmo os estruturalistas e mesmo os gerativistas fizeram a divisão da oração... em... sujeito... predicado... se nós falarmos de função seNÂNtica...de função sintática... ou... de sintagma nominal... de sintagma verbal se nós falarmo/ de categorias ((tosse de ouvinte))... né?... MAS o fato é que Essa divisão aqui... está dando o MESmo sTAtus... tanto ao sujeito... quanto ao predicado... no momento em que se TOma essa decisão se está afirmando que a transitividade só se dá pra direita... né?... porque esses DOIS elementos aqui... têm o mesmo... status... sintático... então é preCIso saber se realMENte... o ELEMENto central da oração... são esses DOIS elementos com a MESMA com com a mesma... a mesma imporTÂNcia... sintática... ou é um deles... um deles é o mais importante por quê?... no MOMENto em que se define Isso talvez o... o conceito de transitividade tinha que mudar um pouco... né?... POde-se falar em transitividade verBAL... em predicados NOMINAIS e verbo-nominais?... a gramática tradicional só fala de transitividade em que tipo de predicado? no predicado verBAL... no predicado... VERbo-nominal... porque o verbo-nominal TERIA dois núcleos... um verbo... e um nome... né?... MAS nos predicados nominais não se fala de transitividade... e ah::... o que se DIZ é que um VERbo como o verbo ser... é vaZIO de significado e tem uma função puramente relacional... certo?... então... a viSÃO da gramática tradicional... é Essa... e e pra MUItos outros autores mesmo que não sejam... tradicionalistas... né?... então... um VERbo... como um verbo de ligação... é um elemento transiTIvo?... é um elemento puramente relacional que pare::ce com uma preposição? a TRANsitividade dele seria diferente?... ] [3 que explicações a lingüística pode dar pra isso? pra esses questionamentos?... posição de um estruturalista ortodoxo... Hjelmslev... a língua é uma estrutura... uma rede de funções com hierarquia própria... a significação só se reconhece depois de estabelecidos critérios funcionais... porTANto a significação pressupõe a função... então ESTE autor... simplesmente eliMIna... o estudo da significação... TUDO PRA ELE... é a forma... né?... bom a FORMA da expressão... a FORma do conteúdo... TUdo que dissesse respeito à subsTÂNcia... seria... simplesmente eliminado... e FORMA PRA ele... significa estruTUra... estrutura significa função... então... é um elemento... PURAmente abstrato é uma relação puramente abstrata... né?... Ora... QUEM PARte desse ponto de vista jaMAIS vai poder PENSAR EM incompletude semântica... então vai tratar Esse fenômeno de transitividade EXclusivamente... por um critério formal... POR ISSO ele não dá um num fala de transitividade ele fala de recção... mais ou menos quer dizer com reGÊNcia... né?... isso É um fenômeno de recção... como é que ele define?... "a recção é um fato estrutural por excelência"... já começa... definindo... as bases formais né?... É UMA RELAÇÃO SINTAGMÁTICA um requerimento neceSSÁrio... um movimento

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LÓgico de um reGENte... a um regido ((tosse de ouvinte))... certo?... então ele não fala em nenhum moMENto... em incompletude semântica... HÁ um elemento que eXIge... formalmente um OUtro elemento... de tal maneira que há uma depenDÊNcia entre os dois... essa de penDÊNcia pode ser obrigaTÓria... pode ser facultaTIva... pode ser... UNIlateral pode ser bilateral... mas há uma dependência de forma... certo?... então de aCORdo com a orientaçãodo proCEsso... pode haver três tipos de recção... Determinação que ele chama... ou dependência Unilateral e obrigatória como por exemplo... os exemplo são meus... de TUdo... em que o elemento DE... exigiria... um outro elemento como TUdo...mas o TUdo... não precisa do elemento de... por isso ela é unilateral... e obrigatória porque o de realmente exige um outro elemento... né?... UMA in/ a:: interdependência por exemplo... ah:: é bom salientar que ele ele também diz que Essa:: essa... recção é um processo... que se que pode se dar... ENtre os sintagmas... ou então DENtro... do sintagma... essa aqui por exemplo se daria dentro do sintagma... mas eu poderia ter... em peDIR ajuda... ((pigarreou))... ter uma recção que se dá entre os sintagmas... né?... MAS TAMBÉM... unilateral... também é uma relação de dependência... né?... interdependência... ou dependência BIlateral e obrigatória... imagine aí um caso como de mim em que o DE... eXIge... um elemento... e o mim não me parece que possa sobreviver sozinho... né?... então isso aí poderia ser um caso de interdependência... e ele fala ainda de constelação ou dependência facultaTIva... em que elementos como... contra todos... o CONtra... exigiRIA... um elemento... MAS não necessariamente porque eu posso ter contextos em... em que o CONtra... funciOna... sem sem... NEce/ necessariamente exiGIR... um outro elemento... certo? "ele é CONtra ou a favor"... contra né?... (é coisa desse jeito)... e o todos tamBÉM... enTÃO seria uma dependência facultaTIva diferente das outras né?... mas TUdo isso seria... todos esses seriam CAsos de recção... porque... HÁ uma relação... de dependência forMAL... entre eles... certo?...] [4 um estruturalista menos radical... Se/ Sechehaye..."se o que define a transitividade é a incompletude gramatical... então não há somente verbos transiTIvos... mas substantivos... adjetivos... instrumentos gramatiCAis como preposições e conjunções... elementos formativos de palavras como desinências prefixos sufixos... etc." ...então por exemplo... eh:: um TEma exigiria as desiNÊNcias... né?... TUDO isso seria uma relação de de transitiviDAde... se você for PENsar simplesmente... na incompletude de FORma... /cê vai dizer... que u/ uma uma:: consoANte vai exigir uma vogal... né?... e aí você vai descer... a todos os níveis... né?... caberia aPEnas decidir qual é a orientação do processo... se é se é uma denpenDÊNcia se é uma interdependência ou se é uma constelação... isso... voltando aí … classificação do... Hjelmslev... né?... bom... mas será que é NIsso que ele acredita?... ele vai se oPOR a esse tipo de visão... EMBOra ah eh... aCEIte que ela exista aCEIte que exista essa dependência formal... NÃO é ela que... seGUNdo Se/ SecheHAYE vai determinar a transitividade... então a proposta dele é que é preciso distinguir transitividade MORfológica... DE transitividade propriamente dita... bom ALgumas formas só constituem unidades significaTIvas... COM VALOR SEMÂNTICO ou sintático... QUANdo agrupadas em "SÍNteses de construção"... que que ele /tá chamando de SÍNtese de construção? ((ruído))... alguma coisa do tipo de TUdo... de MIM... o elemento DE... só vai ter valor seMÂNtico ou valor sinTÁtico... se ele se agrupar a um outro elemento de de forma a constituir um sintagma... certo?... então Isso pra ele... seria uma transitividade morfológica... E... Essa transitividade morfológica... que TEM... eleMENto vaZIO de significação... pra ele... não deveria ser considerado... transitividade... poderia chamar... um fenômeno de recção como Hjelmslev chamou... como se a recção fosse um fenômeno muito mais geral... que envolvesse Essa transitividade morfológica... e a OUtra transitividade... semântica... com e de base semântica... certo... então... por essa visão TOda transitiviDAde... seria uma recção... mas o inverso não se dá... nem toda recção seria uma transitividade PRA haver transitividade ((tosse de ouvinte))... era preciso que houvesse um componente semântico... né?... bom... eu ia dizer... o termo INcompleto deixa de ser uma palavra para tornar-se um auxiliar... um instrumento gramatical... por exemplo EM reais... o elemento EM... é simplesmente um instrumento gramatical... ele vai exiGIR um outro elemento pra poder COMpor... o sintagma em reais... e

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MESmo dentro do vocábulo REAL ((tosse de ouvinte))... o elemento re-... exigiria o sufixo -al... né?... mas simplesmente pra compor o todo... isso aí seria... a TRANsitividade morfológica né?... então... ele acha que isso aí deve ser excluÍdo dos caso de transitividade... a transitividade propriamente dita... só se conCEbe... com relação às unidades significativas... nesse caso haveria DOIS tipos de transitividade verbal segundo o autor... o que ele chama de TRANsitividade de ineRÊNcia... né?... ((ruído))... que aconteceria com os verbos de ligação... E uma transitividade de relaçÃO que aconteceria com os verbos transitivos... só que ao falar de transitividade de inerência... ele aFIRma que... o VERbo de ligação... se esvaZIA semanticamente... nesse ponto eu achei até que ele foi incoerente ((falou rindo)) ao fazer essa afirmação... porque ele diz que o verbo de ligação... se esvazia semanticamente e PAssa a funcionar quase como uma preposição ele é... ser simplesmente um elemento relacional... ] [5 então... NÃO conCORdo com esse tipo de visão porque... me parece haver uma diferença muito clara ENtre os verbos de ligação... não só semanticamente como sintaticamente... um verbo ser... é muito diferente de um verbo estar... se eu digo "a seleção é RUIM"... é uma coisa mas se eu digo "a seleção esTÁ ruim ou esTEve ruim no último jogo"... é uma coisa completamente diferente... né?... então... HÁ diferença semântica entre os verbo de ligação ninguém pode negar isso... ser é uma coisa parecer é outra coisa... PERMANECER é outra coisa... né?... então não se POde negar --... diga... chamando --... a transiti/ ((falou rindo))... eh::... NÃO se pode negar que HÁ... SENtido difeRENça de sentido entre os VERbo de ligação não se pode negar que eles são... doTAdos de significação... né?... e TAMBÉM não se pode neGAR... que... eles eXIgem... POdem exigir... eleMENtos... difeRENtes... por exemplo... como faz o verbo TORNAR-se... com o verbo ficar... você pode dizer que semanticamente AMbos vão exigir um complemento que é resulTAdo... é é um é um proDUto... né?... aquilo que... sofreu uma mudança... certo?... semanticaMENte eles são semeLHANtes... mas... ocorre que o verbo torNAR-se... vai aceitar por exemplo sintagma adjetiVAL... e vai aceitar sintagma nomiNAL... do tipo... ((ruído))... "ele tornou-se... eu posso dizer... belo... e posso dizer... um belo rapaz"... o verbo tornar-se aceita AMbas as estruturas... MAS quando eu vou... substituo pelo verbo virar... num dá certo... eu digo "ele ele virou belo"... pelo menos não me parece aceitável... num sei se pra vocês... mas a mim não parece aceitável a num ser que eu TEnha u/ uma construção paralela... ele "Era:: feio e virou belo" num sei... talvez até seja mais aceitável... mas o fato é que esse verbo reSISte a determinadas formas... né?... o que significa dizer... que... Ele... é que eXIge um complemento... Ele tem... é doTAdo de significação... e ele é que dá as ordens pra exiGIR... determinados complementos... né?... então não se pode dizer que o verbo de ligação seja simplesmente um elemento relacional... como uma preposição... ] [6 depois ele classifica transitividade de relação... que ocorreria com verbos transiTIvos... em... "não exprimem uma idéia auTÔnoma acabada em si mesma é a mesma visão da gramática tradicional... "na verdade a transitividade de relação eXISte em TOdos os níveis é uma questão de dosagem"... essa afirmação eu achei importante porque esTUdos mais recentes sobre transitividade... TÊM tentado trabalhar exatamente isso... que a TRANsitividade... se dá num... como se fosse uma medida escalar... né?... então... como se houvesse um contínuo não se POde falar de transitividade isoLAdas... mas como se houvesse um contínuo uma gradaçÃO de transitividade... e Essa gradação dependeRIA... de uma SÉrie de fatores... e ESte me parece exatamente o xis do problema ] [7 que fatores são esses?... é preciso que se determine... há pelo menos dois esTUdos que tratam dis so da da... da classificação dos TRAÇOs que determinariam a transitividade tem estudo de... ( ) ...e/ esses dois autores... tentaram... trabalhar exatamente esses... ah::... QUAIS os fatores que deterMInam os GRAUS de transitividade?... aí apontaram alguns... e há um outro estudo posterior a esse da Vanda Bittencourt... este aqui trabalha especificamente... com construções causativas... com as causativas sintéticas... ] [8 eu não sei se... conhecem o QUE É uma construção causativa... as construções causativas ((pigarreou)) estão muito relacionadas... à transitividade... tanto é que muitos autores que trabalham com o predicado SIMples e predi/ predicados deriVAdos... fazem... a associação...

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entre... determinado tipo de predicado que seria SIMples... e que originaria por exemplo predicados causativos... digamos a::... "a cortina... desceu" ESte verbo aqui seria intransitivo... né?... este elemento aqui seria o sujeito... inaniMAdo né?... não está exercendo ação nenhuma... me parece que não... né?... mas... eu poderia ter uma OUtra estrutura derivada dessa que seria justamente a estrutura causativa... no momento em que... eu introduzo... um elemento... agentivo... a gente... exemplo... "o rapaz... desceu... a cortina"... os autores que trabalham com derivação de predicado querem mosTRAR... que há MUIta relação entre essas duas estruturas... e realmente há isto é um processo... TÃO generalizado nas línguas de um modo geral... que... você percebe isso claramente na fala das crianças... né?... na na na AUla da do mestrado o A. citava um exemplo do filho dele... que era... o... alguma coisa com... a bola... pulou é?... Ouv. não... "pula eu pai" Inf. ((riu)) "pula eu pai"... mas isso aqui /tá certo... faça... que eu... pula... eu... pai... você diz "a BOla pula"... intransitivo né?... E diz... eh introduZINdo... um elemento agentivo... "o PAI... ia pular... o menino"... mas só que em português num dá certo mas o que que ele queria dizer?... "PAI... me FAça puLAR"... né?... então Essa essa construção foi transformada... em causativa... quer dizer é um processo MUIto muito GERAL na língua... outro exemplo que ele deu... Isso às vezes a gente faz sem se sentir numa situação de mais informalidade né?... aí e/ era... "ONtem... de repente eu funcionei a máquina" quer dizer "a MÁquina funciona... EU... funcionei... a máquina"... alguns VERbos como descer...já fazem o processo automaticaMENte você num num... num num percebe estranheza nenhuma... mas outros são mais resistentes na língua... PARECE haver uma tenDÊNcia a que os VERbos GRAdativamente... POssam ir se transformando... em causativos... né?... mas há uma relação muito grande entre... transitividade e causatividade... e Esse ve/ esse trabalho da Vanda Bittencourt TRAta exatamente disso... DOS dos causaTIvos sintéticos em português... ] [9 mas DENtro dessa visão de que a transitividade... é uma gradação... é uma medida escalar... onde está?... há verbos essencialmente transitivos segundo o auTOR... como os que pedem objeto do tipo fazer pôr prender... ele acha que há verbos que são MAIS transiTIvos do que outros verbos... então PRINcipalmente os que PEdem objeto direto pra ele... pelo menos objeto direto... s/ seriam os MAIS puramente... transitivos né?... OUtros... diz ele... outros são Acidentalmente transiTIvos como ler... então ele acha que em estruturas como "o menino leu"... pra ele leu aqui seria um verbo intransitivo... né?... veja que a a perspectiva dele era estrutural... né? então ele partia já dos dados pra... pra fazer análise... E... SÓ acidentalmente esse verbo seria... transitivo porque eu... poderia dizer o menino leu... ah o livro... qualquer coisa... né?... o livro o livro do colégio... certo?... PRA ele Esses verbos já seriam MEnos transitivos do que os outros verbos... OUtros ainda são puramente relacioNAIS... é aqui que eu discordo ((sorri))... radicalmente ((falou rindo)) deste autor... "equivalem a meras preposições"... tudo bem com relação aos verbos auxiliares do tipo... TER... haver... que FORma os tempos compostos... então quando eu digo por exemplo "TInha... quebrado"... esse tinha de fato... eXIge um outro elemento como eu num sei qual é a direção do processo mas... só serve pra compor esta unidade aqui... até aí tudo bem... mas ele dá eXEMplos com o verbo ter SEM formar esses tempos compostos... afirMANdo que isso que::... nesses casos que ele ciTOU... o verbo seria puramente relacional... um dos exemplos que ele cita é... era "o homem tem um chapéu"... ((tosse de ouvinte))... qualquer coisa parecida com isso... Isso equivaleria a "o HOmem... COM um chapéu"... esse tem se esvaziaria ((tosse de ouvinte)) semanticamente e equivaleria a uma preposição... porque... Acho que que esse exemplo... realmente... foi muito infeliz esse esse caso... que ele classificou... é como se eu dissesse eh::... "o jogador... tem perna de pau"... "o RAÍ tem perna de pau"... "o o RAÍ com perna de PAU" são duas coisa inteiramente diferentes... né?... bom... depois ele faz uma observação importante... "posição intermediária da preposição... a preposição seria responsável por uma dupla SÍNtese"...] [10 e Isso tem tem... eh::... motiVAdo muitos esTUdos sobre a preposição um deles é o do Travaglia... né?... a preposição eXIge um outro complemento?... é a preposição que REge... a preposição ao mesmo tempo é exiGIda por um outro

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elemento?... como é que se dá essa relação?... então ele disse que a preposição é responsável por uma dupla síntese... quando eu tenho... uma frase do tipo "a reunião começará por uma comunicação do presidente"... eu tenho... o verbo começar... que exigiRIA... uma preposição por... como o verbo gostar exige a preposição de... como o verbo depenDER exige a preposição de... etc. né?... então... Isso... formaria um tipo de SÍNtese... que ele chamou... SÍNtese lexicológica transitiva... né?... a TRANsitividade está aqui nessa construção... não está aPEnas no verbo... mas em começar por... então VERbo e preposição formariam essa SÍNtese lexicológica... e Isso é verdade... Isso está na nossa compeTÊNcia de falante da língua... nós sabemos quais são os verbos que exigem tais e tais preposições... QUAIS os verbos que perMItem ser substituídos por OUtras preposições nós fazemos isso... né?... por outro LAdo... é preciso admitir que HÁ também uma SÍNtese de construção que ele chama aí... ou seja a preposiçÃO... eXIge um eleMENto pra comPOR um sintagma... então COmo numa construção... formaria o sintagma... certo?... e isso aqui seria um outro tipo de síntese... e há muitas PROvas... pra mostrar que isso aqui REALmente constitui... um NÓ... por exemplo... podia cita r a prova do apagaMENto... quando você... se fosse o verbo gostar... gostar de... se eu dissesse... eh::... "você gosta de palestra?"... e a menina que /tá dormindo respondesse ((falou rindo)) "gosto"... ELA NUM DIRIA "GOSTO DE"... ela diria... "gosto"... ou "gosto de palestra"... conjunto... certo?... então... o apagamento seria uma das provas... uma outra prova seria a da intercalação... se em "gosto de palestra" eu introduzisse um elemento do tipo realMENte... você diria... "GOSto... realMENte de palestra"... ou colocaria em outra posição mas não poderia dizer... "GOSto DE... realmente palestra"... você não diria isso... então você não corta... o sintagma nem a preposição... né?... outra prova seria o deslo/ o... deslocamento... ela diria "DE palestra... ah... eu não gosto"... então QUANdo faz o deslocamento a preposição vai junto... do sintagma... então há muitas provas... em favor dessa desse tipo de síntese aqui... mas ((ruído))... me parece que as duas coisas não podem ser negadas... /cê não pode tomar uma posição em favor desse tipo de síntese e desse tipo de síntese... porque as duas coisas acontece ((fim do lado A)) ...quem é que exige a preposição... se a preposição é exigência do VERbo se a preposição é exigência... do elemento que vem depois da prepo/ depois dela né?... ((tosse de ouvinte)) ] [11 posição dos funcionalistas... TesniÈre Halliday e Dick... Simon Dick... TesniÈre..." a estrutura existe em razão da função... e a função serve ao mecanismo da expressão do pensamento"... embora Tesnière tenha... eh::... exisTIdo... viVIdo... no AUge do estruturalismo ortodoxo... a posição dele é já é basTANte diferente... do estruturalismo de Hjelmslev... então pra ELE... a a estrutura eXISte em função da razão em si... ah oh... desculpe ((ri)) em razão da função ((falou rindo))... mas... FUNÇÃO pra Ele... não é a mesma coisa que função para o Hjelmslev... para o Hjelmslev função era FORma... né?... então "a função serve ao mecaNISmo de expressão do pensamento"... então... JÁ ele já comeÇOU... a introduzir... BAses seMÂNticas pra uma análise... da sintaxe né?... a oração apresenta uma forma exTERna... das seqüências fônicas que seria objeto de estudo... da morfologia... ele tenta ah... mosTRAR... que a oração pode ser vista sob uma forma exTERna... sob uma forma interna... sob a forma exTERna que seria das seqüências fônicas... seria a parte formal que seria... objeto de estudo da... morfologia... né?... E... sob o o aspecto inTERno... que seria o estudo... do esquema... esTRUtural... abstrato MAIS esquema seMÂNtico... seria objeto de estudo... da sintaxe... então observe que pra Ele o esTUdo da sintaxe não é agora... exclusivamente... formal... mas TEM também o elemento semântico... e acho que ele tem toda razão... "o verbo é o eleMENto central da oração"... então veja que a parTIR daqui... aquela divisão... deixa de se estabelecer... entre sujeito e predicado... agora... o VERbo pra ele é o elemento central da oração... se o verbo é o elemento central da oração... então neste CAso a transitividade não vai se dar mais... SÓ pra direita ela vai se dá também... pra esquerda... e pra esquerda espeCIficamente... com relação ao sujeito... É O Único elemento que aparece à esquerda... tem características bem disTINtas dos OUtros elementos... é verdade... é o único que determina a concordância verbal... e tem outras características diferentes... né?... MAS não se pode negar que na verdade é o VERbo que solicita o

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eleMENto da esquerda... e é o verbo que solicita o elemento da direita... seMANticamente e sintaticamente... né?... a transitividade porTANto não se dá apenas para a direita mas também para a esquerda de vez que o sujeito é um dos complementos verbais... daí ele diz que uma frase se estrutura da seguinte forma com NÓS e NÚcleos... os NÓ seriam constituídos de reGENte e regidos... é aí que parece estar a noção de de transitividade... OS NÚcleo seriam comPLExos de conexões sinTÁticas e semânticas... então embora ele TEnha afirmado que realmente... a sintaxe é um estudo ao mesmo tempo sinTÁtico e semântico... veja... mais adiante aí como foi que ele fez a descriçÃO... da das orações... mecanismo de estruturação da frase... há dois mecanismo JUNÇÃO... que nós conhecemos por coordenação... e TRANSlação que equivaleria à subordinação... HÁ translação quando um componente lexical MUDA de classe... acarretando muDANça de função sintática... observe... ele DIZ que a que um uma FRAse... tem que ter uma estrutura sintática e tem que ter uma estrutura semântica... mas ao defiNIR os processos... né?... de construção de estruturação de FRAse... ele... termina falando nos MESmos processos... já já vistos pelas gramáticas tradicionais e::... pelos estruturalistas... né?... então ele fala de coordenação e fala de subordinação... NUMA perspectiva MUIto formal... quanto à muDANça de classe... E... CONseqüentemente muDANça de função... né?... função sintática... elementos responsveis pela translação olha aí... seriam os translativos mas VEjam qu/ quais são os translativos aí... termina coincidindo com a visão de Hjelmslev... né?... os translaTIvo seriam... eh conjunções subordinativas... artigos... verbos auxiliAres... preposições... afixos... então caiRIA na noçÃO de recção... do Hjelmslev... então TUdo pra ele aqui terminaria sendo... transitividade... subordinação...] [12 e essa... relação... né?... de transitividade morfológica... estaria incluída aí... uma outra visão de um outro funcionalista... Halliday... proposta... Halliday propõe que se faça uma SÍNtese dos enfoques... estruturalista... e... funcionalista... né?... "a estrutura de um enunciado se forma a partir de um conjunto de funções da linguagem... as QUAIS envolvem planejamento conTÍnuo e simultâneo"... então é como se em primeiro lugar ele pensasse na linguagem como comunicação... como sentido... NO MOMENto em que os enunc iados se formam... ENtram em jogo... TRÊS funções ao mesmo tempo... certo?... que ele vai falar aí da função ideacional da INterpessoal... e da textual... mas antes de definir é preciso que fique claro... que... PArece que o foco ((tosse de ouvinte)) agora muDOU inteiramente... enquanto ANtes a transitividade era definida... MUIto em bases formais... agora parece que ela vai ser definida em base semânticas... porque ele está preocupado com... com a informação que vai chegar... ao ouVINte ou ao leitor... né?... então "os Atos de fala selecionam SImultaneamente... MUItas opções inter-relacionadas... isso... me faz lembrar a CRÍtica que ele faz... ao Chomsky da dicotomia... compeTÊNcia... desempenho... ele mostra que é inconcebível que se... se Ache... que há um planejamento... mental... primeiro da competência lingüística... primeiro das estruturas sinTÁticas abstratas... né?... como Chomsky queria... que priMEIro... houvesse... na cabeça da pessoa primeiro existia uma estrutura sintática abstrata né?... QUE IRIA passando por uma SÉrie de transformações... até... aparecer na na... na realização... na estrutura de superfície... então ele mostra que Isso não se dá assim em etapas... mas é um planejamento contínuo é uma coisa feita ao mesmo tempo... então nesse caso não precisa falar de estrutura profunda e de estrutura de superfície... assim como não se deve falar... NUma compeTÊNcia isolada do desempenho... porque uma coisa... pode influenciar a outra... e influencia realmente... essas opções são categorias seMÂNticas e gramaticais... "qualquer oração se constrói a partir da combinação das estruturas que derivam de TRÊS funções... ideacional... INterpessoal... e textual"... a função ideacional... é aquela responsável pelos... pe/ pelos fatos semânticos... né? pelas relações semânticas... e pra ele é a função ideacional que é responsável pelas relações de transitividade... olha a diferença... a TRANsitividade agora... PARte daí... do plano semântico... certo?... então... no moMENto em que você... eh plaNEja um enunciado Uma das funções que entra em jogo... é exatamente... a da da transitividade... de de... dessas relações entre o VERbo... os argumentos que ele chama de paPÉis semânticos ((ruído))... ou seja... se havia na

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posição de sujeito você vai ter... um agente... ou um ator com/ ele chama... né?... ou se você vai ter... um um... olha essas classificações semânticas mudam MUIto de autor pra autor eu não trabalho com esta... do Halliday... trabalho com outra MAS IMAGINE que NESta posição você pudesse ter... um causaDOR... um elemento que fosse responsável... pelo... pela seqüência pelo... desencadeaRIA um estado de coisas... né?... um causador que que... afetasse... um objeto... /tá percebendo?... imagine que aqui você se fosse um um verbo que pedisse predicativo... você tivesse... um atributo... como predicativo... então... TRANsitividade pra ele é essa relação aqui do verbo... COM Esses papéis seMÂNticos... certo?... e com os papéis semânticos também das circunstâncias... que se relaciona ao verbo... as circunstância seriam MEnos fundamentais a esse processo aqui... mas TUdo isso aqui seria uma relação de transitividade... certo?... papéis semânticos que ele classifica aTOR... que seria o agente... obJEto... REsultante... BEneficiário... receptor instrumento e força... depois caberia estudar cada uma delas... observe enTÃO que TRANsitividade pra ele... é exatamente o oPOSto da noção de recção estabelecida pelo Hjelmslev... bom... A FUNÇÃO INTERPESSOAL... serviria para manifestar o MOdo como o falante se comuNIca... se ele se comunica através de uma perGUNta de uma de uma interrogação... né?... ou ou:: se é simplesmente através de uma frase imperaTIva... ou se é:: uma negaÇÃO etc. etc. mas a afirmação que ele faz é de que É ESSE sisTEma de MOdo que deterMIna as funções gramaticais... olha eu não não SEI se entenDI bem isso que ele disse mas num concordo num conCORdo que seja esse sistema de MOdo que deterMIne as funções gramaticais... é como se PRA ELE o SEMÂNtico estivesse em primeiro PLAno... e SEMpre... sempre que eu acho que o seMÂNtico está em primeiro plano... em MUItas ocasiões... mas nem SEMpre... me parece que há algumas determinações que são puramente sintáticas... por exemplo... voltando ao caso do verbo virar... no momento em que eu digo que o verbo virar eXIge um sintagma nominal e não um sintagma adjetival... não me paREce que essa determinação seja semântica... porque um OUtro verbo... semanticamente equivalente que é o tornar-se... aceitava as duas formas... né?... então eu Acho que... é preciso não radicaliZAR as coisas... HÁ determinações Ora PURAmente... formais... HÁ determinações ora puramente semânticas... e OUtras que vão ser puramente... pragmáticas ou semântico-pragmáticas... né?... então essa função INterpessoal pra ele seria o que DEterminaria as funções gramaticais... funções gramaticais que ele /tá chamando aí são as funções sintáticas... né?... uma outra função seria a função textual... função textual é a que maniFESta as opções através das quais... o falante Usa a linguagem de um modo pertinente ao contexto... essa é importantíssima sobre ela os outros ainda não tinham falado... PAra a comunicação ser eficiente... é preciso que uma informação NOva... seja GRAmaticalmente explicitada... um TEXto se organiza em termos das funções DAdo e NOvo... qualquer informa/ uniDAde de informação... consiste de um elemento NOvo obrigatório... e de um elemento DAdo... opcional... então veja que até agora se tinha falado de uma transitividade... que era... morfológica... ( )... falou-se de uma transitividade SINtática ou sintático-semântica... né?... MAS não se tinha falado em nenhum tipo de determinação... pragmática... então... o:: HAlliday MOStra que numa frase como... "dele... todos nós dependemos"... sem falar em transitividade... o que ele quer chamar de elemento... DAdo e elemento novo... é isto... existe uma informação DAda... que é aquela... que você acha que num é num é recupeRÁvel... pelo ouvinte então você precisa dizer "Olha eu eu /tô falando... disso aqui com relação a Isso... né?... então com relação a Ele... o QUE eu TEnho a afirmar é isso aqui... então... ESte seria o dado... e isso aqui seria o NOvo... que corresponde às noções de tópico e comentário... ou na:: na classificação de Simon Dick... de TÓpico e forma... o FOco seria isso aqui... QUAL É a importância que isso TEM na transitividade?... tem... há uma relação... PElo menos uma relação com a ((ruído)) a omissão de complementos HÁ uma relação muito forte... se eu digo assim..."ele dirige... eh:: qualquer carro"... né?... ((tosse de ouvinte))... me parece que a informação que eu quero salientar é esta "ele dirige... qualquer tipo de carro" é Isso aQUI... que é o elemento novo... né?... quando eu digo... "ele dirige BEM"... observe que o FAto... d/eu ter tirado o FOco DESte complemento aqui... e ter colocado o

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foco... no processo e no MOdo como esse processo se dá... FEZ com que... ESte elemento fosse omitido... então... é um CAso em que a função pragmática... a função textuAL... determina apagamento de complementos... mas será que com Isso com Esse fator aqui... INformacioNAL... ESte VERbo vai deixar de ser transitivo... porque ele sofreu... porque não a/ num num aparece um complemento... então ele vai deixar de ser transitivo... porque o que eu quero informar... é isso aqui... eu dirijo BEM... observe como a frase seria redundante ninGUÉM aceitaria... se eu dissesse... "o motoRISta... dirige"... é... simplesmente irreleVANte porque é ÓBVIO... que o motorista dirige... a num ser que eu esteja querendo definir... né?... o que o motorista faz? dirige... mas num é a situação mais normal... né?... então Essa frase aqui não apresentaria o elemento NOvo... num há... neNHUma informação nova que acrescento... por Isso que ela num é aceita... num é uma boa frase... ( )... certo?... informacionalmente ela num... diz nada...{diga...uhn... pode dizer... Ouv. bom ( ) porque:: embora não seja um ( )...que ( ) é possível dizer "o motorista dirige BEM"... Inf. SIM Ouv. porque o bem é informação nova... é possível {dizer também Inf. Exatamente Ouv. ..."PAUlo dirige"... porque o dirige aí é informação nova Inf. o diRIge é que é informação nova... É EXATAMENte porque o FOco se... se VOLta para o processo de diriGIR... QUE o complemento... é apagado... certo?... então o que eu pretendo eh investigar na dissertação de mestrado é exatamente isso... quais são os faTOres... QUE... favoREcem que... FAzem com que... certos complementos sejam omitidos... em determinadas estruturas?... ser que esses fatores... são de natureza... sintática?... são de natureza forMAL?... por exemplo... se eu tivesse falado contigo... uma transitividade determiNAda pela pela... CARga semântica do verbo aqui eu já num /tô nem falando de omissão... ( ) "ele... colocou... o livro... na estante"... graMÁtica tradicional costuma dizer que este verbo aqui é transitivo direto... mas observe que a CARga seMÂNtica desse verbo... eXIge... que eu tenha... TRÊS... papéis semânticos três funções semânticas três argumentos... ESte aqui... é que CAUsa... essa essa ação... o objeto... o afeTAdo... né?... que é o livro... e ONde porque colocar signiFIca... alguém pôr algo em algum luGAR... necessariamente... então eh eh a informação seMÂNtica que está... na no próprio Item lexical... que me diz que eu preCIso desses três complementos... certo?... então é um OUtro fator... que está... determinado a transitividade... estudos mais recentes de transitividade mas com relação ao NOme... têm tentado associar... a estrutura morfológica... dos nomes... COM os arguMENtos com os papéis semânticos... né?... que esse nome... exige... então por exemplo a... professora R. M. ... orientada pela professora M. B. fez um trabalho sobre complementos nomiNAIS... TENtando analisar a estruTUra dos NOmes... deverBAIS... pra saber... até que PONto a estruTUra... morfoLÓgica desses nomes... FAZIA com que determinados complementos... fossem exigidos... certo?... SERÁ que a estrutura morfológica é que... eXIge FAZ exiGIR... o complemento nominal? por exemplo... e um outro esTUdo... da Leda Márcia sobre adjeTIvos adjeTIvos derivados de verbo também tenta fazer a mesma associação... ENtre... estruTUra do adjetivo... e... NÚmero de argumentos... né? e tipos de argumentos... então vejam que... há MUIto que estudar ainda sobre ((falou rindo))... este assunto...] [13 eh... UMA OUtra visão de um funcionalista SImon Dick... do ponto de vista FUNcional... a lingüística tem de ocupar-se de dois sistemas de regras... AMbos de natureza social... regras GRAmaticais... fazem muita coincidência com a:: a posição do Halliday... né?... que REgem a interação verBAL como uma FORma de atividade cooperativa"... ((vozes de ouvintes)) eu disse o quê?... ((vozes de ouvintes)) desculpe pragmática ((ri)) regras pragmáticas ((falou rindo))... obSERve que ele coLOca as regras pragmáticas em primeiro lugar... né?... E REGRAS SEMÂNTICAS... SINTÁticas... MORFOLÓgicas e fonológicas... que REgem a expreSSÃO das estruturas linGÜÍSticas... utilizadas como INSTRUMENTO da atividade cooperativa... então ESSAS REgra que estão no sisTEma da língua... as regras GRAmatiCAIS...

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elas servem de INSTRUMENTO... pra comunicação... é exatamente isso que eu penso... o que eu condeno é o radicalismo de afirmar SEMpre que a transitividade é determinada OU SÓ sintaticamente... OU SÓ semanticamente... eu acho que é preciso ver... QUAIS os fatores... de modo geral que contribui pra isso... né?... as REgras estariam assim... formuladas em termos de propriedades categoriais... e funcionais... que seriam categorias pra ele?... as categorias especiFIcam as propriedades inTERnas dos constituintes... e AÍ seriam... eh tudo que que é gramatical mesmo né?... as as... a FORma... aliás o que ele chama de categoria é MUIto mais a forma... é dizer por exemplo... SE um determinado compleMENto... é constituído de um sintagma nomiNAL... ou é constituído de um sintagma adjetiVAL... etc. então Isso pra ele é que seriam as categorias... né?... e saindo do sintagma e entrando ( )... e também as funções as funções especiFIcam as propriedades relacionais dos constituintes... com relação às CONStruções em que aparecem né?... mas ele fala aí de três TIpos de funções funções seMÂNticas... que são os paPÉIS dos argumentos impliCAdos nos estados de coisas... ou seja... é o que... o o Halliday chamou... de papéis semânticos... o que Tesnière chamou de argumentos... né? e que ele está chamando de funções semânticas aGENte MEta receptor etc. AS funções sinTÁticas... né?... COmo o estado de coisa se apresenta na expressão lingüística... sujeito objeto direto... etc. funções pragMÁticas as funções pragmáticas dizem respeito ao status INformativo... DOS constituintes dentro da situação comunicativa... TEma e apêndice tópico e foco a diferença é tão sutil que... nem vale a pena comentar... eu só quero mostrar a semeLHANça entre as funções... propostas pelo Halliday e essas funções... que ele estabeleceu aqui... como se as seMÂNticas... correspondessem à ideacional... né?... as sinTÁticas segundo Halliday seriam determinadas pela... interpessoal né?... E... as fun/ a função textual corresponderia às funções pragmáticas... né?... conclusões... a transitividade pode ser definida... como uma relação sintático-semântica ao nível do sisTEma... embora fatores de ordem pragmática ((pigarreou)) informacional... possam interferir nessa relação...] [14 bom... eu acho que duas DOIS estudos podem ser feitos em termos de transitiviDAde dependendo da aborDAgem que você escolha... se vo/ você POde fazer um esTUdo de transitividade em BAses puramente semânticas ... e POde fazer um estudo de transitividade... em eh::... como como alguma relação sinTÁtico-semântica... e nesse CAso você teria que saber o QUE É que representa... o núcleo sintático... que nem SEMpre vai coincidir com o núcleo semântico... um exemplo muito claro disso... é o do verbo de ligação... eu digo... eh::... "o assunto... é palpitante"... você vai dizer... que ESte verbo aQUI... eu vou dizer que ESte verbo aqui... é o núcleo sintático... é Ele que vai me dizer o TIpo de sujeito que ele /tá exigindo... é Ele que vai me dizer o tipo de de de predicativo... né?... então ele constitui o núcleo sintático... ele é um verbo transiTIvo como os outros... com as suas especificidade mas é um verbo transitivo... certo?... mas ele não É não constitui o núcleo semântico... daí porque a gramática tradicional diz que este predicado é nomiNAL... com base no critério semântico... NUM OUtro momento ela classifica verbos intransitivo mas já com base no critério sintático... então Essa confuSÃO aí é que num dá... é preciso você tomar uma decisão... ou você parte de um ponto ou você parte de outro... né?... que o predicativo é o núcleo seMÂNtico desse tipo de predicado não resta dúvida... certo?... o... o meu estudo pretende se basear NUma classificação... sintático-semântica... mas... preTENde analisar... TOdos os outros fatores que interferem... nessas relações... é apenas o o o PONto de partida vai ser esse... a aborDAgem vai ser essa... né?... SENdo uma relação seMÂNtica a transitiviDAde não se estabelece com instrumentos gramatiCAis... porque isso seria a tal da transitividade morfoLÓgica... certo?... então... também Acho que ela deve ser sepaRAda do que a gente enTENde por transitividade... transitividade TEM que ter... o o elemento semântico... que não constituem uniDAdes de significado funcional... porTANto podem ser transiTIvos... VERbos... substantivos... adjetivos advérbios... se o VERbo é o elemento central da oraçÃO... o processo da transitividade se dá... PAra a diREIta e para a esquerda como nós já vimos... né?... e OUtra coisa... aQUI... nos casos de predicado nominal... também é o verbo o elemento central da oração... então as MESmas relações que você... estabelece para os verbos

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transitivos você tem que estabelecer pra cá... quero dizer que esta posição diFEre... do que... eh::... PENsa Tesnière por exemplo... que mosTROU que o ve rbo era... era o elemento cenTRAL... ah::... aquele liVRInho aquela gramática de valências também Acha que... Isso aqui... o predicaTIvo é que é o elemento central... emBOra tenha dito que... o verbo é o elemento central da oração... né?... bom... TOdos os prediCAdos se TÊM como núcleo o verbo... são considerados verbais... de um ponto de vista sintático-seMÂNtico... emBOra o ponto de vista seMÂNtico-pragmático... que é isso?... do emBOra do ponto de vista seMÂNtico-pragmático o NOme seja ás vezes o núcleo semântico é o caso do... dos predicados... nominais... né?... bom e/ era só isso... muito obrigado... ((ri))... ((palmas)) ] Ouv. /cê num acha que é morfológica é a MARca da transitiviDAde... em determinadas línguas?... e não a transitividade Inf. É Ouv. em si? Inf. ...a TRANsitividade MORfológica que /cê /tá querendo perguntar... se é A FORma como... como apaREce... {Né... com/ ela se dá em determinadas língua Ouv. é se há uma forma... se há ( ) Inf. é::... talvez o NOme se deva a isso POR ISSO que eu eu... quando a gente /tava vendo esse esse aSSUNto na aula né?... lá do mesTRAdo... eu achei que ele... deveria ter falado numa transitividade funcional... né?... uma transitividade num sei se funcional seria o termo mais... uma tran/ transitividade sinTÁtica porque é como se o elemento DE... estivesse soliciTANdo... um OUtro elemento... e Essa relação de de conexão... de recçÃO... é um elemento... DE função... é uma... um... uma relação DE função... mas talvez você tenha razão... talvez ele tenha chaMAdo de TRANsitividade morfológica por causa da FORma como se manifesta... DE e:: MUda né? de língua pra língua... talvez seja isso... ( )... Coord. mais alguma questão?... bem... então... não há algu/ nenhuma questão... a gente::

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AULA EF-53 CORPUS PORCUFORT (PORTUGUÊS ORAL CULTO DE FORTALEZA) Coordenador - Prof. José Lemos Monteiro Inquérito n° 53 Informante - Homem, 53 anos, fortalezense, filho de pai fortalezense e mãe cearense, graduado em História e Direito. Tema - Geografia Astronômica Data do inquérito - 10/03/95 Duração - 60 minutos [1 Inf. fundamentos... de... Astronomia... que seria pré-requisito de... Geografia Astronômica porque primeiro... a mesma coisa que a Meteorologia né pré-requisito de Climatologia... primeiro você vai saber... como colhe os dados né? pra depois saber o que fazer com esses dados... no caso aqui da... Geografia Astronômica priMEIro... você deveria saber o que É Astronomia pra depois saber o quê que a Geografia... aproveita da Astronomia... certo?... mas como Fundamentos... acabou ficando como optativa... e optativa do jeito que anda todo mundo carregado ninguém vai... né?... na prática acabou sobrando... foi a Geografia Astronômica... prática mesmo o programam que devia ser de duas disciplina/ distinta/ uma pré-requisito da outra... então... além de entrar... a Geografia... entra a Astronomia e entra também... a... Cosmografia... porque se chegou a conclusão que a necessidade de um senso a formação de um senso ecológico hoje em dia... é necessário o pessoal conhecer também a colocação do planeta em função de todo o universo pra saber a formulação... que tem o nosso planeta] [2 então a Cosmografia... é a parte da Astrologia que es{tuda Al. licença professor Inf. ...tudo bem... - - vocês no finzinho vocês num esqueçam de me pedir a presença certo? porque a essas altura/ são quatro geminada/... /tá valendo quatro certo?... se bem que isso aí num precisa... - - bom... então no CAso eu estava falando que... o quê que é Topografia? Topografia é uma parte da Astronomia que estuda o que os gregos antigo/ chamavam de COSmos... COSmos... ficou sendo traduzido pelos dicionários como uniVERso... só que o sentido verdadeiro de cosmo/ no grego antigo... era praticamente ORdem... organização era exatamente o contrário de CAos... /que também significava GÁS... mas que ficou com o sentido de desorganização... é claro que os antigos acreditavam que o cosmos fosse uma coisa toda organizada...] [3 hoje alguns teoristas modernos acreditam que num tenha nenhum senso nenhum planejamento nenhuma fabricação nenhuma organização... mas os caso/ que eu me lembrei foi por essa negócio que as água/ vinha/... o rolo aí foi deixar a gente onde num deveria deixar... né?... então parece que a coisa é organizada... tudo que a gente tem:: aprendido até HOje... LEva... a pensar... que praticamente as lei/ são as mesma/... se uma galáxia roda lá provavelmente ela está obedecendo as mesma/ lei/ de um furacão que roda aqui na Terra... então tudo indica que a coisa... tanto o macro-cosmo... como a gente chama que é o mundo aí fora grandão... os astro/ os universo/ como o mic ro-cosmo... que é objeto da da da... Física A/ tômicos A/ tômica ( )... parece que todos eles têm leis muito parecidas... porque enfim TUdo que é GRANde também é forMAdo... de tudo que é pequeno... é claro que uma estrela dessas aí pode ser eNORme mas ela é formada também de átomos como qualquer pedrinha aqui na Terra... e a tendência moderna é você... verificar que realmente... essas leis são fundamentais são válidas para quase todo canto hoje ele já interpreta por exemplo uma uma galáxia perto da outra galáxia dá uma forma a uma gaLÁxia... é a mesma coisa que chegar uma massa de ar aqui na Terra e perturbar uma outra massa de ar... e fazer ( )... de tempo... né?... a própria Geologia vocês já viram já interpreta a Geologia moderna essas MAssas... continentais e/ elas têm um... uma convecção... elas num estão parada/ estão todas se movendo... todas essas placa/ né?... do mesmo jeito que o AR... na nossa

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atmosfera também /tá circulando sempre trocando calor entre o Equador e o pólo... e tudo indica que quando o universo começou essas grandes MAssas que vão até o ponto alfa ( ) todos os corpo/ celeste/... também estejam circulando... me parece que por trás disso sempre está... a temperatura... porque ela é responsável pela densidade... então /cê tem uma alTÍssima temperatura tem uma baixa... densidade né? se você tem muito frio você tem uma alta densidade...] [4 só que quando a gente chega no mecanismo das estrelas... aí a gente verifica que... existe umas coisas curiosas... se uma estrela adquire... muito PEso... esse peso acaba esquentando o núcleo e esse núcleo acaba desencadeando... uma fusão espontânea entendeu? por exemplo o sol... o ciclo do sol é a transformação do hidrogênio... em hélio... isso foi descoberto por um físico... naturalidade alemão e que acabou migrando para os Estados Unido/ chamado Hans... Bich... e praticamente essa descoberta propiciou... a era chamada nuclear... vamos começar a tentar imitar aqui na Terra com as suas bombinhas... alguma coisa que acontecia dentro do Sol... e daí surgiram as bombas a/tômica/ as... bomba de hidrogênio... né?... então se uma estrela ganha... muito peso... muita MAssa ela vai ganhar muito peso... então as coisa/ vão ficar tão comprimida/ lá no seu centro que a temperatura no caso dessa compressão vai aumentar tremendamente... e se ela aumentar tremendamente ela pode fazer com que todos esses átomos entrem não SÓ... como a gente fazia aqui na bomba a/ tômica sacudindo uma pedrinha pra ver se pegava algum átomo e quebrava não ( ) espontaneamente por ( ) por alta temperatura e fusão... e é claro que essa fusão vai impedir... uma grande gama de radiações... pra toda ( ) essas radiações inclui a luz... o raio-x raios gamas raios CÓSmicos... e tudo mais que /cês já ouviram falar... é CLAro que como a pressão é muito grande... o interior duma estrela funciona como se fosse um trânsito congestionado... um:: local que diz um russo naturalizado americano chamado Jorge Gamour... fez um cálculo uma vez pra::... densidade do interior do Sol... e chegou à conclusão que uma partícula pra sair do interior do Sol do NÚcleo pra chegar à superfície do Sol poderia levar... oito milhões de ano/... mas depois que ela abandonou a superfície pra chegar até a Terra ela leva oito minutos... daí a gente tira a conclusão quanto menos congestionado o tráfego... mais veloz... ela se torna... pra vocês terem uma idéia do congestionamento que é o interior duma estrela... né?... e então... TOda essa pressão... provoca a radiação... e quando a gravidade e a pressão... contrabalança com a emissão... a radiaÇÃO... a estrela fica estável... enquanto ela /tiver esTÁvel ela fica brilhando aí... e a gente fica vendo... se for o caso do sol a gente fica se aquecendo com ela... o PROBLEma é perguntar quanto tempo permanecerá estável?... seria a mesma coisa que na meteorologia você perguntar quanto tempo o tempo vai permanecer bom num vai dar uma chuva aí só que mais cedo ou mais tarde ( ) ...né?... o tempo num pode ficar indefinidamente bom... só que o tempo pra dar uma chuva aqui pode ser MEses pode ser dias e o tempo pr/uma estrela se acabar... pode ser... com a por causa do Sol dez bilhões de anos teoricamente... e ainda é considerado média... tem estrela de vida mais curta e tem estrela de vida... mais longa... né?... MAS VAI CHEGAR a um PONto... em que ela vai se acabar nada dura... eternamente... algumas estrelas se aCAbam... desequilibrando essa pressão... então elas em um minuto às vez/ pode irradiar mais energia do que o Sol irradiaria em cem anos... aí é o fenômeno das nova/ e das super nova/ num significa que elas acabaram de nascer... talvez o nome foi muito precipitado... talvez signifique que elas acabem de começar a se aposentar pa/ depois morrer... agora só que uma estrela... assim como o ser humano normalmente o ser humano casa tem filhos quando morre deixa descendente/ então diz que ele se imortalizou através de descendentes... hoje se está descobrindo que quando as estrelas morrem por colapso... ou seja por explosão... elas espalham tanto a matéria e essa matéria no futuro vai ser... um aglomerado e gerar NOvas estrelas então também tem suas descendentes...] [5 Al. e o buraco negro? Inf. não o buraco negro aí já seria um HIper-furacão... ou um hiper-torNAdo... que aí ninguém sabe pra onde é que vai a idéia teórica pra onde é que vai toda a matéria que /tá entrando aí só se sabe que ela não /tá saindo de novo... então gente FAla que possa sair no outro universo paralelo gente

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fala que possa desaparecer... e gente que fala que possa ser transposta no tempo que é a teoria do espaguete... era alongado que nem uma borracha esticada e depois iam pro outro lugar ou ( ) e saía num ambiente totalmente novo saía até num outro universo paralelo... certo?... Al. mas... existe ((ruído)) Inf. então é mais FÁcil pegar um:: ambiente mais pesado do que um ambiente mais restrito.. mas teoricamente... isso num impossibilita... uma estrela... ser vítima duma crise de... buraquite negrite certo? Al. professor Inf. SÓ que até agora nenhum exemplo PRÁtico... só teórico comprovado agora de GALÁxias... se referindo ((ruído))... com cacos que /tão ao redor um tornado por exemplo o maior perigo dum tornado são os cacos voando é mais perigoso do que o próprio tornado em si tecnicamente chama de ((citação estrangeira)) só que no caso da meteorologia a gente chama de fly ... debly quer dizer... objetos... voadores sombras... voadoras... né?... já no caso que nós estamos falando aqui não... seriam SObras que vão formar OUtros astros menores... Al. no caso o bu{raco negro ( ) Inf. /tá certo?] [6 então a teoria mais usada atualmente... pra formação do sistema planetário... e mais aCEIta porque à medida que nós /tamos usando a técnica do CCV... que é uma das evoluções da Astronomia quer dizer da filmagem VHE associada ao computador em chip... então se tem podido ir muito mais longe... porque eletronicamente se pode fazer um telescópio funcionar com uma potência mediana ou funcionar com uma super potência... quer dizer a potência depende da puxada de ( ) e não... mas exatamente né? de... como ele foi projetado inicialmente agora o Palomar por exemplo eletronicamente ele foi duplicada a potência dele... eles acharam mais barato duplicar eletronicamente do que construir um outro Palomar maior... mas hoje já existem aparelhos... ou DObro do tamanho do Palomar... no Hawaí... o Malmaquer já tem onze metro/... Palomar tem cinco metro/ por dezoito... /tá certo?... então com todo esse avanço da puxada e a imagem trabalhada no computador ( ) o GAY... eu já tenho uma câmera que tem gay... significa um intensificador de imagem quer dizer... é uma mesma capacidade de você ver luz... a ponto de praticamente você ver o que o olho não registra... quer dizer ela /tá imitando já de PERto o olho humano... né?... TODA essa tecnologia tem permitido a gente pegar estrelas mais próximas e super ampliar e tentar verificar o quê que tem ao redor delas... já existe/ vários exemplos a pioneira foi a Beta Pictoria ou seja a estrela Beta da constelação do Pintor... BEta significa segunda mais brilhante... dentro da tradição... né? se fosse ALfa seria a primeira mais brilhante... então a BEta Pictoria... trabalhava principalmente com o:: chamado som eletrônico o som eletrônico é o seguinte agente pega o fixo da imagem... CRESce tremendamente esse fixo vai ficar tudo quadradinho... aí você pode entregar ao computador e dizer "devolva esse quadrado ao pontinho... eu só quero ele quadradinho pa/ descer depois diminui de novo CERTO?"... eu num gosto de da imagem quadradinha... eu acho que eu sou descendente de uma civilização redonda né? gosto ((falou quase rindo)) mais do redondo certo?... então num SOU muito babilônico babilônico gostava de tudo quadrado o pessoal diz que Atlântida é que gostava de tudo redondo... né?... bom mas o caso é que {eu prefiro uma redondinha mas você pode botar uma quadradinha... e ((falou rindo)) colocando uma quadradinha /cê pode ter uma imagem muito interessante que é a ((ruído muito forte)) seguinte... três quadradinha/... olha lá... aí o suJEIto pede p/o computador "bom agora dê cores a esses quadradinhos"... aí de repente esses quatro quadradinhos aí que a cor dele ficou vermelho digamos... de todos esses quadradinhos aqui ao redor ficam ligeiramente arroxeados... ou azuLADOS ((interferência acidental de estranhos))... -- ôh tudo bom? --... aí o quê que isso significa?... AO REDOR dessa estrela existe... qualquer coisa que num é a mesma coisa que a estrela... essa foi uma das fonte/ pra pesquisa certo?... se num é a mesma coisa que a estrela isso seria o quê?... o planeta se forma... DAÍ tem achado TANtos exemplos quanto esse que já /tão aplicado esses exemplo/ ao nosso sistema solar havia umas sete mil teoria/ diferente/...] [7 agora a teoria mais aceita... pelo meno/ nos último/ cinco ou seis anos... É

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A VELHA teoria da hipótese regular né? do do ( ) com alguns adeptos... já já tinha sido considerado há trinta anos atrás totalmente fora de moda... agora eu concluo... né? com plena posse... então tudo indica que o sistema planetário se forma... da seguinte maneira... essas nuvens que foram deixadas no espaço... de estrelas que explodiram... elas têm uma tendência de... circularem... circuLANdo... elas vão formando turbilhões formando turbilhões... digamos aqui no MEIo... era mais maCIço... tinha mais matéria por centímetro quadrado do que aqui na periferia Al. ah... Inf. então esse MEIO... começou a se agregar e começou a se tornar bem mais pesadinho do que... a periferia então é ÓBvio que esse meio LOGO VAI... acender o seu interior... ((pigarreou))... pela ( )... de BORner... venha ver o fim nascer... a estrela nascida... né?... então... quando surgiu uma luz NELA... ela nasceu ((ruído)) pra começar eu ainda insisto... tudo aquilo que... evaporou... né?... QUANdo surge a luz essa luz às vezes pode iluminar... outros grupinhos que /tão por aqui... é o ( )... que pode DAR... OU estrelas companheiras se for de massa... maciça... a última estatística feita a três a QUAtro em cada dez estrelas são duplas triplas ou quádruplas o o nosso sol é uma daquelas que por enquanto /tá sozinha... né?... então... se a MAssa for bastante grande aqui pode surgir uma rival dela... certo?... uma geminada não por trazerem gêmeos... como a mulher onde o normal seria nascer uma de cada vez né?... mas de vez em quando em cada dez caso/ eu acredito que um... né?... coisa da estrela... três a quatro vão ser gêmeos... né?... então no CAso... se adquirir massa constante seria uma gêmea dela... se não adquirir... vai ser alGUÉM... grandinho mas que ainda não... definiu o seu sexo... se vai ser estrela... ou se vai ser planeta acredita-se que os chamados quatro grande/ do sistema solar... Júpiter Saturno... URAno... e Netuno... pertence/ a essa categoria... a BRIga é saber se são EX/... estrela/ ou se são futuras estrela/... e como SEMPRE HÁ... DUAS teorias oposta/ sempre aparece uma terceira que é a combinação das duas... digamo/ que nem uma coisa nem outra simplesmente cismaram de ficar no terceiro sexo... há três hipótese/... /tão percebendo agora... NÉ?... o Júpiter por exemplo... ele emite um pouquinho... mais de luz do que recebe do sol... sinal que o núcleo dele /tá bem quentinho ( )... emBOra a temperatura superficial dele possa ser considerada bem gelada se o sujeito for considerar com o sol... perCEbe?...então eu pergunto segundo ( ) o vácuo continua gente batendo nele... continua engolindo gente agora engoliu o trabalho ( )... e MAIS algumas observações ( ) na escrita... chegaram depois trezentos e (oitenta) da pesquisa de que eles existiram e outras são fragmentações... né?... então... se ele continua engolindo MAssa pode ser que ele vá... também crescer e o seu núcleo vai ficar mais pesado e quem sabe se um dia... ele acende... alguém assistiu aquela seqüencia do:: do:: de filme... eh:: Dois mil um uma odisséia no espaço? ((ruído))... e o Dois mil e dez?... com subtítulo de O dia em que ( ) ...né?... a continuação do Dois mil e um e do Dois mil e dez... aqueles mistério/ /tão acontecendo em Júpiter são uma preparação pra... desenvolver uma estrela e que interromperia a Terceira Guerra Mundial que /tava em curso na Terra... então /tá /í a página aberta... e essa estrela apaREce... e um boNIto planetinha ao redor dessa estrela... é tido pelas entidades que provocaram o negócio como reservado pode mexer com todos outro/ menos com esse esse /taria reservado a uma futura vida muito parecida com a com a da Terra... certo?... é um filme muito bonito quem puder pegar numa locadora e assistir assista... É um teorista que defende que Júpiter vai ser uma estrela... assim como aqueles que defendem que já foi... porque tudo indica que depois que uma estrela explode ela também imPLOde... e acaba ficando meio desmoralizada e meio ( ) nem grandinha demais nem pequenininha demais... e HÁ outros teoristas que acha/ que ela fica tão pequenininha que pode ficar até menor que a Terra... eu num concordo muito com excesso não... prefiro mais... o meio-termo certo? ((tosse de aluno)) porque eu acho que os excesso/ são apenas ((tosse de aluno)) momento/ de desequilíbrio den/ dentro duma teoria não passageiro/... certo?... fale ((ruído forte )) Al. eh:: ((ruído)) Inf. nesse já é graduação... {certo?

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Al. ((vozes inaudíveis))...] [8 eh:: tem condições... da gente ((ruído)) Inf. atualizar /tá certo... já mudou tudo já virou tudo o que tinha ali /tá certo?... tanto que eu /tô com o primeiro capítulo NOvo... ele começa logo aos quinze minutos só ele reatualizando o os ano/ anterior/... ele já velhinho do jeito que ele /tá agora... né? magrinho certo?... AGORA... VOCÊ devia procurar séries atualizadas até noventa e quatro noventa e cinco como De Astronome... DE Astronome é uma série de seis fitas de uma hora... feita pela CASSET em Los Angeles... né?... e por uma fundação americana... e essa é simple/... você tem:: exa/ praticamente são seis HOras não só de mostrar os grandes observatório/ os grande/ instrumento/ mas de conversas com os próprios astrônomos que /tão envolvido nas pesquisa/ eles CONta/... o que /tão fazendo... Al. e::... Inf. certo?... manda buscar nos Estados Unido/ no Brasil não tem e nem vai vim tão cedo... certo?...E QUANto a/ ao que você chamou ( ) no caso já existe muito CD-rom... interessantíssimo é uma verdadeira enciclopédia... isso a respeito do assunto... né?... agora pra quem num tem CD-rom que /tá no disquete você vai encontrar vários disquetes né? que você chama o menu tem... estrelas principais duma constelação ligações entre as estrela/ situações criadas entre planetas... certo?... Al. inclusi/ agora tem até o:: a INTERNET né? o senhor {conhece? Inf. INTERNET que é uma maravilha certo? Al. ah:: é ] [9 Inf. que por sinal começou a ( ) /tá aparecendo os político/ os nazista/ já /tão mandando VÍrus pra quem é nazista /tá trazendo balbúrdia a INTERNET... porque a INTERNET foi criada com o objetivo de GUErra... como a tensão internacional entre a Rússia e Estados Unidos esfriOU... então agora resolveram abrir pro mundo todo porque dá um bom dinheiro... e aí sendo ficou o controle de toda informação de todas as funções do mundo mas o ( ) já começou a acontecer já começou a pintar desde desde e aí já era nazista... britânico né?... o o OUtro objetivo... fazer doutrinação... como acontece em TOda a comunicação... nesse planeta... Al. mas agora /tá havendo isso? Inf. já /tá havendo isso aí... né?... E:: o INTERNET é um negócio pra qualquer um de CAsa... o problema é que o Brasil caiu... o Brasil... o CNPq pagou a distribuidora e o Brasil /tá filiado... às instituições... porque é muito salgado pra você entrar sozinho ((tosse de aluno)) ( ) e a e a nossa universidade tem um projeto num sei se já /tá funcionando... Al. aqui tem... num tem? Inf. já /tá funcionando ( )... ora fazendo uma ligação telefônica... /cê quer saber por exemplo o que que os astronauta/ vão fazer nessa missão agora ( ) que que eles /tão fazendo lá em cima ( )... né?... Al. a NASA já ] [10 Inf. ( ) espiralou... aí vem o problema envolvendo a ( )... ela /tá fechando {ou /tá abrindo Al. eu /tava... queria dizer isso Inf. ... aí você fala em roda ao redor fica assim um pouquinho meio complicado... porQUE::... a volta... que /cê dá duma vez num é a mesma volta que /cê dá na próxima vez... num fica tão certinho como os ângulo/ desses planetas /tão entendendo?... do sistema solar NÉ?... existe galáxia também irregulares onde essa volta seria totalmente irregular... /tá certo?... aí no caso num se costuma MUIto chamar essa volta no sol das galáxia/ de volta... se costuma chamar VOLta mesmo... né? porque num há muita segurança de onde isso vai dar não... apenas teoricamente quantas vezes aconteceu... certo?... porque DEPENDENdo da do CÁLculo feito ( ) ... se esse cálculo for reviSAdo então... o mundo de vós também será... entende?... revisão... mas o fato é que ninguém FAla... de duração fala... e quando muito é nas laterais da de catorze a dezoito voltas se É que a galáxia tem a idade que nós presumimos que tem... tudo é na base do cinto... né?... é de quarenta e nove planetinhas aqui ao redor... é mais ou menos cronometrado agora {( )... Al. /sor...

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Inf. porque deu muito dentro... certo?... ?] [11 /TÁ CERto que foi um pouquinho de exagero a gente dizer que... Vênus saiu da mancha vermelha e ficou e ficou por ali... né? e causou um grande estrago na Terra... mas o estrago que ele descreveu... baseado nos textos antigo/ seja Vênus ou qualquer um... o qualquer um já causou esse estrago várias vezes na Terra daí ele começou a ser um pouquinho acreditado... né?... inclusive ( ) ... ((tosse de aluno)) absolutamente estranho que Júpiter encontrou os resto/ da família... pra começar logo ( )... né?... e essa rotação não é determinada... por ( )... ela é determinada por elos de radar assim como todo o mapeamento de Vênus que já vai muito avançado... é todo feito por elos de... sóis que são colocados em órbita de Vênus... repetindo o eco de radar e outras pesquisas são feitas daqui mesmo através dos rádio-telescópio certo? então existe um mapeamento muito preciso de Vênus... e esse mapeamento então nos dá a entenDER... que a escolha do nome ( ) ... não tem nada de a deusa da beleza devia ter sido Plutão o terror dos inferno/... é que a realidade ( )... certo?... ((ruído muito forte)) Manuel da Costa então acreditava que ( ) chegou e ficou... ((ruído de cadeiras arrastadas))... né?... ele só foi bastante combatido naquela que saiu da mancha vermelha de Júpiter porque depois que o o o té/ o TÉCnico... Fugita... provou pra NASA que a mancha não era um furacão... aí ficou meio difícil sustentar alguma coisa que num tenha saído do interior de um furacão num é exatamente um buraco vazio por cima não... certo?... pelo contrário é um... negócio cheio de coisa que /tá puxando cada vez mais coisa... aí ficou meio difícil mesmo né? dizer que o velho tinha razão quando que Vênus saiu da mancha vermelha de Júpiter... assim como muita gente chegou até imaginar que a mancha vermelha tinha sido causada por um impacto que ela num era no instante começou a ser visto de repente de mil e setecentos pra frente... o (citação estrangeira)... muita gente diz... "será porQUE... ele era bom na ótica e fez um telescópio um pouco melhorzinho ou porque antes num era visto mesmo?"... ninguém... saberá disso... nunca... é uma dúvida que vai ficar na História... o Schumaker descobridor do cometa acreditou que a quantidade de um fragmento maior poderia provocar em Júpiter algo semelhante... a grande mancha vermelha certo?... só que:: num /tá muito igual não... a única chance dele /tá CERto é que depois de A::nos e anos e anos e anos fique... mas até agora que eu verifiquei até enquanto pude filmar junto pessoalmente... nas minhas pesquisa/ independente/... o que eu verifiquei foi o seguinte TOdos os buraquinhos... é claro no começo eles tiveram uma tendência de onda de choque e tiveram uma tendência de espiraLAR... eu tenho filmagem deles onde eles /tão com verdadeiras ( )... são vários aspectos que realmente são... o furacão... e é claro... TOda mudança SÚbita de temperatura ocorrido na atmosfera... se for na latitude certa... provoca... o movimento de rotação por efeito de Coriós... certo?... então no CAso... JÁ no fuTUro a última vez que eu olhei essas bichinhas elas já /tavam com a tendência de se fundirem... e /tavam formando uma banda adicional que antes num existia num planeta ele né todo feito de faixas escuras e calras... /tava surgindo uma faixa super escura... então a tendência é ((aluno pigarreou)) saber no futuro agora o futuro comportamento... se ele vai ficar com uma banda escura... permanente a gente já podia até riscar que talvez essa seja a origem... dos choques meTRAlha que vocês chama/ /cês já viram nas banda/ escura/... mas se ela diluir... aí se pode chegar a uma conclusão... que não que o fato daquelas faixa/ de Júpiter ser/ escuras ou clara/ seria só o que /tá misturado ali...] [12 agora só que a Terra TEM essas mesmas circulações embora ela rode ao dobro do de Júpiter é claro é menos violenta... mas ho/ hoje concebendo a Terra de longe... essas circulações todas aparece/ com cores diferente/... elas aparece/ basicamente com as mesmas coisa/... embora eXISta também né? existe circulações na Terra que provoca o jet-stree... as corrente/ de jato... que são muito semelhante... ao que acontece com Júpiter... MAS com o efeito rotacionAl... depende da velocidade de rotação... /cê pode fazer a experiência facilmente num toca disco... se você colocar um toca disco que tenha várias velocidades... /cê coloca um disco... digamos aquele que tem quarenta e cinco trinta e três e setenta e oito... aqueles mais antigos né?... você coloca um cartão aqui do lado do disco... no lugar do braço da eletrola /cê coloca uma régua... presa aqui fixa mas não presa ao... prato se não vai prestar... né?... esse bastão começa a rodar /cê pode até desenhar tudo bonitinho como se fosse a

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Terra né? muita gente já vende até um... disco que... tem no centro a figura da Terra pra se fazer essa experiência... né?... mas só no estrangeiro porque no Brasil ainda num vi isso... então de FAto você pode pegar um pincel a/tômico com um retroprojetor e... fazer um risco aqui... você tem certeza que fez um risco reto porque o risco foi feito ao longo de... uma coisa reta... mas quando você... verificar vai verificar que só ficou reto se o prato /tá parado... se você puser o prato pra rodar... ou então você puser em trinta e três... que é a velocidade mais lenta... trinta e três de um terço... o que que vai acontecer? vai haver uma curvatura... /cê tem certeza que riscou reto mas quando você parar o prato vai ver que o prato saiu curvo... aí se você... ligar essa rotação pa/ quarenta e cinco /cê vai notar que fica mais curvo... e que o raio não aumentou... porque aumentou a velocidade... e se ligar pra setenta e oito num vai mais fechar... vai virar uma ( )... daí se conclui que quanto mais rápido girou lá... mais propenso será... ciclones e furacões... é o caso ((ruído)) de Júpiter que gira né?... duas vezes mais rápido do que a Terra então ele é duas vezes mais propenso então a grande parte da fenomenologia da alta atmosfera de Júpiter... é a fenomenologia dos furacões e dos ciclones... MAS o efeito de Coriós mexe com o seno e com o co-seno... aí tem aquela historinha do seno da latitude né? TAL se ele chegar a zero ele é zero se ele chegar a noventa ele é um... então fica muito difícil esse fenômeno se fazer nos pólo/ e no Equador... percebe?... nos pólo/ por quê? porque a rotação já seria uma roticidade ( ) do próprio pólo... os dois eixo/ coincidiram né?... e ele num regularizou por quê?... tudo no Equador teoricamente giraria o quê? mais rapidamente... por quê? porque o Equador... ( )... por causa do achataMENto... embora a Terra GIre... com uma velocidade uniFORme aquilo que gira no Equador parece percorrer mais espaço do que aquilo que gira no... trópico... entendeu? ((ruído)) mas a área tem o quê? um efeito ( )... Al. depois... falar contigo... Inf. percebeu?... e então é por isso que nós aqui no Ceará não vivemos cheio/ de furacões... felizmente... mas existe aquelas latitudezinha/ bem apropriadas... onde ( ) chega ao MÁximo... por exemplo no caso da FLÓrida... né? no caso do Atlântico Norte... é um verdadeiro ninho de furacões... percebe?... agora o movimento de Coriós é claro é invertido p/os dois hemisférios se você PEGAR aqui... o planeta Terra... colocar aqui o Equador... colocar aqui um canhão... e aqui outro canhão... e puser esses dois canhões pa/ disparar um contra o OUtro... e o general então lhe perguntar... se os dois almirante/ tiveram boa pontaria ( ) duas bolas colidir no Equador?... o que você responderia?... Al. que não Inf. não... a num ser que a Terra tivesse parada aí a pontaria dos artilheiro/ poderia influir eles poderiam conseguir mas com a Terra rodando por melhor que fosse a pontaria dos artilheiro/... uhn essas bala/ não se encontrariam por QUÊ?... é outro problema que seria aplicado pra cá digamos que a bala é instantânea... ela num tem a velocidade da luz ela num chegou na mesma hora que foi disparada ela vai levar um tempo pra chegar... e como vai levar um tempo pra chegar digamos que quando ela chegou bem aqui... ela /tava em cima... do meridiano que nós vamo/ chamar de um... mas quando ela chegou bem aqui a Terra rodou... então o meridiano um já /tá /qui a marca dela ficou aqui... ela /tá na realidade já sobre o meridiano dois... perCEbe?... quando ela chegou bem aqui... o meridiano um já /tá bem aqui com essa MARca o meridiano dois já /tá bem aqui com essa marca e o meridiano TRÊS... é que /tá /qui nela... aí agora você ver perfeitamente por que que num existe furacão né?... no pólo e no Equador... porque aqui ela dimensionou em meridiano... então são ( ) entendeu agora?... MAS SE você for juntar o que ela fez na realidade ela não fez isso... se você registrar na tela por onde ela passou ela fez isso... uma curva contrária as a/ a/ ao sentido de rotação da Terra... entendeu?... SÓ que se você fizer a mesma coisa pra outra BAla você vai obter o inverso... DAÍ que se diz né? que o/ os movimentos os sentido/ rotacionais são inversos nos dois hemisfério/... aí eles criaram a estória do nebulosa né? pra facilitar a gen/ ((ruído))... ((fim do lado A))]

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[13 ... a Terra por que que num levanta... a atmosfera e as marés... ((tosse de aluno))... ninguém NEga que levante a atmosfera a Geologia chegou aí e provou... ninguém NEga que levanta as marés a Oceanografia chegou aí e provou porque é que /tá negando... o MAIS LEve de tudo que é a atmosfera?... o mais fácil de ser levantado... ((aluno pigarreia)) então... TEM uma solução... que quando a lua /tá /í... ((pigarro de aluno)) houve um tempo perdido a num ser que seja nela mesmo vejam sempre isso... TOdo mundo diz comumente na Astronomia que a lua chama nuvem num é que ela chame ela num /tá gritando por ninguém... mas é que a tossidinha que ela dá na atmosfera... coloca... a condensação... e logo depois o céu vai se encher de nuvem... isso qualquer astrônomo que tenha como eu trinta ano/ de experiência... sabe que isso é uma regra que dificilmente falha... aGOra... se ( ) pode duvidar... ele pode não ter uma experiência de astrônomo... percebe?... mas que levanta levanta e /tá /í acabei de dizer pra você qual é a maneira que levanta agora se o cara se esqueceu de verificar que levanta problema dele... certo?... está claro que ela influencia... será que é coincidência que o nosso mês é lunar?... e a regra da mulher também é lunar?... aí /CÊS "AH é só coincidência" só uma coincidência por que ( ) que também não são como a primeira... então influi influi muita coisa porque ela é muito grandona e /tá muito perto... se influi gravitacionalmente... ele num influi em outros canto/... certo?... ficou claro... a lua influi a Terra no fato de nós termos o maior ou menor risco de sermos atingido por meteorito... viu?... elas têm um centro de divisória... onde a partir do ponto de gravidade dele se o treco passar pra ali já /tá na Terra fatalmente... talvez nem tivesse... fatalmente se num tivesse a lua perto...] [14 mas ainda tem gente tão antiquada que diz que a lua é um escudo que roda ao redor da Terra pa/ proteger a Terra bom... isso é a próxima teoria... e contando o ( ) lá que ela /tava... eu nunca conheci /cê conheceu /cê /cê fez o exame porque ( ) um estudo giratório ( ) ((voz de aluno))... isso é Óbvio... isso é uma BARbaridade de uma certa dupla que eu conheço... né?... então num é escudo... de NAda... simplesmente a Terra como sendo maior devia ter... ( ) do que a lua... sendo maior /cê devia ter mais gravidade a da luz... a Única diferença que existe é o in-tem-pe-ris-mo... aí sim... a LUA tem um intemperismo muito devagar num tem mar ela num tem atmosfera... num tem campo magNÉtico... né?... e quando diz não tem num significa não tem de jeito nenhum não... significa não tem como a Terra... tão mensuRÁvel tão forte quanto o nosso... né?... AGORA MESMO SE ACHOU uma atmosfera de sódio... SÓdio de sal de cozinha mesmo lá em Salvador... alguém pode perguntar "será que a lua teve mesmo mar?... e levou uma pancada e o mar foi todo lá pra cima e nunca mais voltou?"... ou são puro ( ) da formação da lua... um ((tosse de aluno)) satélite japonês descobriu... um asteroidezinho bem menor que a lua... ( )... a sonda Magalhães passou perto dele era orientado pelo magnetismo do sol quando chegou perto do asteróide desorientou-se completamente... porque quando ela /tava perto o magnetismo do asteróide foi mais forte do que o magnetismo do sol Al. num tem ( ) Inf. no pedaço de pedra... de alguns ( )... entende?... então... ((grito de aluno)) ((ruído)) Al. a questão do dilúvio né?... Inf. questão do dilúvio... eu sempre digo isso sabe por quê?... qualquer inundação que acontece em qualquer região... ( ) acontecer um dilúvio... mas isso antes de encarar a catastrofia depois que se encara uma pancadinha aqui ( ) e outras pancadinhas que aconteceram na Terra e na lua... o quê que o cara vai dizer então?... qualquer pancadinha de certo porte que tenha havido num mexeu só com região do Caribe mexeu pro mundo inteiro né? é é até visto tanto nos dilúvios universais quanto os buraco/ que tem na lua... mas na Terra que devia ter mais buraco... mas por queê que CENto e cinqüenta buracos grandes na Terra são todos recente/?... quando se fala recente sessenta milhão/ de ano/ p/a trás... porque num tiveram tempo de serem serem apagados ou disfarçado/ pela ( ) pelo... ( )... na lua num existe praticamente essas coisa/ o buraco /tá lá nem interessa ( )... ((tosse de aluno)) de ano/ pra lá... então ( ) como num tinha atmosfera micro-buraquinhos /tão se fazendo em cima... ao passo que nós como temos atmosfera ( ) queima no ar... dificilmente eles chegam na cabeça da gente... ( )...

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Al. oi C. tudo bom?... Inf. /que tem peDRINnhas lunares que foram levados pro laboratório e apresentou as característica/ NÍtida de miLÉsimo... ninguém viu... o tamanho... então se um pedacinho daquele tamanzinho a valir a lua bateu numa pedrinha MIcro-pedrinha de baixo e deixou uma micro micro micro craterinha que... ( )... entende?... por isso que eles têm que o gás carbônico... ((vozes distantes e sobrepostas de alunos))... a idéia original era o guarda-chuva mas só que o pessoal achou meio gaiato os cara/ iam passar ( ) fazer um passeiozinho curto né? aquela frescura né?... mas eu tenho um projeto mais antigos na na... ( ) da lua que previa o guarda-chuva... exatamente baseado nisso né?... a Terra SERIA a mesma coisa se perdesse a nossa atmosfera... perdendo a atmosfera perderia os mares... perdendo os mares perderia o campo magnético... aí pronto rapidinho ela se transformava numa lua um pouco maior... ((grito de aluno)) então será que a lua já nasceu daquele jeito ou ficou daquele jeito por que num teve tanta gravidade pra segurar a sua atmosfera?... percebe?...] [15 aí daí que fizeram as teorias mais ( )... que é uma coisa que hoje conta com poucos adeptos porque a grande maioria o pessoal chega logo viDRAdo... e chega logo nos buraco/ negro/ nas últimas gaLÁxia/ nas últimas teoria/ sobre o universo... e então /tão começando a achar o patrulhamento do sistema solar um pouco quadrado... não que eu considero muito mais importante do que nós dependemo/ pra viver que /tá /qui ao nosso redor do que ( ) que aconteceram no passado há bilhões de anos atrás porque quanto mais LONge... mais passado... mais ( )... ((voz distante de aluno)) agora é CLAro me inteREssa saber o passado né? porque você sabendo o passado e comparando com o presente você pode tentar o quê? estabelecer o futuro... aí ne/ nesse dia pode ser que num seja tão proibido falar em previsão né?... vamo/ dizer que a gente juntar o passado com o presente a gente pode arriscar... muito bem... o futuro... /tão entendendo a coisa?... agora fique CERto de uma coisa... ((voz distante de aluno)) existe os ASTROS têm tanta personalidade como tem as pessoas ((ruído)) ( ) agrupá-las e num... mas nenhum desses grupos são feito/ de... cores... os elementos perfeitamente iguais a num ser quando começaram a fabricar ( )... o que eu acho uma má idéia ((vozes sobrepostas de alunos))... né?... então... ÀS VEZ/ um astro pertence a um grupo tal é semelhante mas num é exatamente igual ((ruído)) e é por isso que o pessoal diz "bom igualzinho a Terra você num acha nunca"... quer dizer... é muito é muito arriscado... pode achar só que a PROBABILIDAde de achar se torna num seja muito eleVAda... MAS PARECIdo vai encontrar vários... é bom chamar atenção também pra outro aspecto da coisa... porque tem muita gente que usa esse ( )... pra dizer que só existe a Terra ( )... E MAIS NÉ OBRIGADO o tipo humano ser o único tipo de vida... os DOIS elementos que mais se ligam são o silício... e o carbono... hoje em dia o pessoal distingue o computador do ser humano... dizendo que um é de carbono e o outro é de silício... porque de certo modo mesmo não tendo nascido da natureza ( ) O HOmem.. o robô... é um ser de silício... ((voz de aluno fora da sala))... e o homem homem continua sendo um ser de carbono são os dois elementos que mais se LIga/... SENdo os que mais se liga/ são os que mais pode/ oferecer combinações que parta/ pruma coisa complexa ( )... /tá enten{dendo?... divisa... um pouquinho Al. eu sei ( ) conservar mais também né?... adaptar Marte à... às nossas condições {((voz incompreensível de aluno)) Inf. né?... eXAtamente preservar Marte do jeito que /tá... há uma pequena Al. modi{ficar pra adaptar Inf. ( ) modificar pra adaptar... e aGOra ADAPTAR pra quê? só pode ser por duas coisa/ ou por excesso de população no mundo... o pessoal entraria como tivesse passagem de graça pra lá pra todo mundo... OU a ganância de minerais explorar Al. /tá faltando minerais... ( ) Inf. e de Pauling nem quiseram ouvir... que é o mais provável SÓ QUE... o:: por exemplo o ( ) que é muito conhecido no Brasil... Ronaldo Rogério disse... "vamo/ poluir MARte... deixe a Terra em paz" BOM... no intuito de PRESERVAR a Terra... é uma BOA né? até que... é uma boa /cê

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mandar poluir MARte... MAS SE UM DIA DESCOBRIR que... que existe uma poluição universal tamBÉM aí a ótima seria num poluir em canto nenhum mas em canto nenhum por QUÊ?... a gente NÃO TEM um amadurecimento... pra saber as conseqüência/ de tal mudança Al. existe uma polui{ção ( ) Inf. né?... E/ ((ruído))... ] [16 que MAIS agüentou o descrédito público... ele merece alguma coisa ((riu)) né?... é lógico que uma pessoa babaca diz o ((falou rindo)) seguinte "quem pode em sã consciência DENtro da AstronoMIA admitir que só a Terra seja habitada"... o universo que se torna cada vez maior... Al. justamente o {pessoal pensa que é maior... ( ) Inf né?... E E AGORA que se descobre que quase que com quanto as estrela/ poderia é quase uma obrigação gerar um sistema planetário... antes se pensava que fosse uma exceção... RARÍssima na Terra... e principalmente depois que eles acharam que o universo /tava coalhado do da tal matéria escura aí o homem acaba enxergando o que num devia e num tem tanta matéria escura { ( ) Al. quer dizer professor Inf. ... êh... ((risos)) serviço de base né?... ( )... né?... ou então os ( ) chegavam babado mesmo porque num iam passar muito tempo... mas imagine aquele russo lá que passou um ano... né?... ele ia chegar na baba do Noé ((falou rindo)) lá nos pés... dizem até as más língua/ que que:: a barquinha do Noé num encalhou a BARba foi que enganchou lá e ele ficou pendurado... né?... mas é claro que isso é brincadeira certo? o que eu quero dizer na realidade... é isso... é QUE... a gente ainda desconhece muito... eh desconhece muito o nosso ao redor... embora a gente já pretenda... conhecer muito o Afastado da gente... por isso que eu opTEI... pessoalmente pa/ trabalhar com o pessoal ( )... não só porque mexe com o assunto de vida uma coisa interessante e /tá certo que a Astronomia de buraco negro e coisa... também é interessante... porque ela mexe com altos problema/ da Física... mexe com altas energia/ talvez um:: um dos episódio/ mais fantástico em termo de escala de luminosidade né?... em termo de universo certo?... mas de certo mesmo nem o big-bang... as observações (não podem) deixar o big-bang muito abalado... a auSÊNcia até agora da comprovaÇÃO das ondas gravitacionais pra ver qual é o número de big-bang... porque... PRA ... ele está ele estando certo vai permanecer... mas é o que está ele estando CERto... tem que achar as ondas gravitacionais... eu acho que eles criaram um paradoxo... se eles tiraram o MEIo quem foi que disse na Física que uma ONda progride sem um meio... /tão percebendo isso que eu quero colocar?... AÍ fica na base da solução tampão... um tapa buraco... e agora estão procurando as ondas gravitacionais sem achar com o mesmo tipo de MÉtodo... o método de testerometria que eles negaram com ( )... aí SÓ HOUve um jeito p/a acochandrar a confusão... não faz de conta que o espaço dele é o MEIo mas quem foi que disse que essas duas ondas se ( ) meio... até agora num vi nenhuma prova disso ( )... então você vê facilmente numa sala de aula se pode levantar problemas que podem encrencar... ( )... /tá compreendendo? então num é uma coisa TÃO:: segura tão fatal tão inevitável... eu acho que houve um excesso de euforia muito GRANde... entre o que é religião e o que é ciência... é ( )... o problema é levar que ( ) não é materialista e o cálculo é necessário ( ) de esquerda e tudo MAIS... mas vamo/ ser franco... eu num tenho antipatia nem simpatia ( ) eu acho que todo mundo tem direito ( )... né?... mas eu acho o seguinte o motor eLÉtrico ele só funciona... se você tiver alternando os pólos se você igualha os pólo/ o motor pára... /tá percebendo?... então... ( )... ultimamente eu /tive pesquisando... o problema da/ das chuvas aqui e fiz um gráfico bem grande fiz um gráfico também do comportamento da onda sola r e comparei um com o outro... de rePENte eu tive a impressão que se você puser uma linha aqui e disser que é a MÉdia... quando começa a acontecer as exceções ou seja secas inundações parece que a coisa se comporta como uma... um/ uma corda de violão que você toca rápido ( )... balança uma pra cima uma grande e outra pequena... e há outras épocas em que essa ( )... por isso... depois eu aumento de novo ( )... daí eu comecei a desconfiar bastante que não só isso deve ser tratado dentro da Mecânica como ( )

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da Matemática pra tratar isso aí tem que ser um um ( ) puramente a Estatística... ((ruído)) certo?... assim como comecei achar também... que o o universo ( )... eu não acredito mais no universo nasceu do nada e vai terminar no nada... eu prefiro acreditar que o universo seja uma serpente engolindo a própria cauda ( )... porque aí não terá sentido... é o sistema estelar... AÍ QUEM sabe se um DIA o tão combatido Aristóteles que resolvia tudo dizendo "isso É porque É"... volte a... ao IBOPE... né? e o PlaTÃO que eu adoro o Platão mas que sofro revanchezinha (ainda)] [17 aí... então o que tem acontecido é que a Ciência cresceu então se tornava tão independente tão distante se tornava tão comPLExa se tornava tão escluSIva... que num tem mais a Filosofia fazendo a função de ( )... ( )... certo?... então nós vamo/ ficar sabendo de muitas coisas mas um pouco... perdidões com o quê que a gente vai fazer... com essas muitas coisa/ que /tá sabendo... talvez mais feliz fosse o antigo... se soubesse menos coisa/ e soubesse o que fazer com elas... né?... agora VIre... ou MExa... a Ciência num é auto-suficiente num é soberana num é DEUS... e nem sabe de tudo... ela ainda depende muito da CRENça pessoal e da idéia pessoal de cada ser vivo quando ele interpreta determinado fato da natureza... claro que uma pedra cai todo mundo sabe que ela cai que até agora ninguém negou isso... pelo meno/ na Terra... e na superfície né?... MAS VÁRIAS VEZES já foi formulado e reformulado o porquê que ela cai... entendeu o que eu quero dizer?... pelo menos por questões antigas deverão estar ( ) e agora já tem negro aí contestando outra história... a eletricidade a gente faz o DIAbo com ela faz o miLAgre da InforMÁtica da Computação e coisa... quem é que sabe até HOje... o que é eletricidade? continuamo/ na mesma ignorância de Thomas Alva Edson... é isso... o HOMEM MEXE COM ÁTOMO DESDE mil novecentos e quarenta e cinco... respectivamente nas costa/ dos outro/... antes era através de teoria... NÉ?... por causa de Hiroxima... que que o HOmem sabe MESmo de átomo?... até agora quase o mesmo tanto que sabe da eletricidade... né?... a Teoria QUÂNtica por exemplo um dos maiores especialista/ de Mecânica Quântica dos Estados Unido/ declarou recentemente NEM ELE nem ninguém sabe o que é o quântico... ( ) o cara pirou eu acho que ele /tá mais do que lúcido... ninguém sabe MESmo... quântico é o nome arranjado pra se indicar uma coisa que ninguém não sabe o que é... /tá certo?... então se a gente chegar a uma conclusão ( ) num existe muita diferença entre ciência e religião quanto ao fato de ser fé ou não fé... aí o cara diz "não ( ) /cê ainda num pegou em Deus ainda num conversou com ele num sei quê... então ( )... é que a é a ciência também em questão de fé /cê num pegou no átomo no elétron em coisa alguma... percebe o que eu quero dizer?... MAS FAZEM uma discriminação tão GRAN::de o cara do lado de lá acha que é infaLÍ::vel o cara do outro lado acha também infalível porque /tá com ( ) ... pra quê essa confusão se poderia então uNIR... todos os seus esforço/ pra caminhar no mesmo sentido comé que essa pobre humanidade vai sobreviver e vai escapar dum acidente cósmico?... eu acho que todas as preocupações deveriam /tá... voltadas pra isso... caÍram por falta de conselho... ( ) viagem planetária ele VAI depois encontra a Terra no FIM... só que naquela época ele tinha que pregar aquilo por causa da distensão... ( )... uma mensagem ecológica ( ) agora que o homem tem um pouquinho mais de consciência né? ( ) né?... ISSO AÍ eu concordo com ele... alguém pode chegar de fora e dizer "qual da humanidade não passou pelo TESte ( )?"... saiu do engradado... correu a rua sem olhar e o carro atropelou... então se nós ainda não tivemos em outros planetas habitado num num conversamo/ ainda bastante com outros SEres em outros locais do universo somos iguais a uma criança... que num saiu do engraDAdo num foi à esCOla... e nem sequer descobriu ainda forma de vida... imaGINE A CARA DELA quando descobrir que tem outra criança do tamanho dela parecido com ela fazendo as mesma/ besteira/... né?... MAS ELA SEMPRE está com o pai... e a mãe... como Deus ( )... que é mais cresCIDO QUE É MAIS EXPERIENTE e que aparentemente já saiu do mundo e o conhece ((ruído)) é aí que entra a posição que você falou ( ) ... né?... ( )... agora é muito difícil /cê conceber... segundo o próprio Carl Seagan... que por exemplo se a nossa humanidade fosse extinta mas ficasse/ os ingredientes pra fazer de novo se é que ela foi feita quimicaMENte... e não laboriatoriamente... uma coisa é ser feita por alguém... que a TEse da religião ia... aí eles ( ) um

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laboratório com um poder... um poder tão transcendental que num precisasse nem dum laboratório... OU ENTÃO foi feito aos pouquinhos pela natureza juntando combinando pelo método de... tentativas e erro/... se FOR certo que a vida foi criada combinando pelo método de tentativas e Erros... a probabilidade da humanidade se extinguir e começar tudo de novo e ela voltar de NOVO... é uma em um bilhão... dela ser igualzinha o que é hoje... MESMo no próprio planeta... imagine em planeta diferente... certo?... então... ( ) passou... ( ) FAZ com que não tenha o menor sentido... eu consiDEro por exemplo a a conVERsa de que nós somos o único planeta habitado do uniVERso... iGUAL a um ratinho ( )... que começa a namorar uma ratinha... que morava na Basílica de São Pedro e ela /tava totalmente vazia... retiraram tudo de dentro onde tem aquela iMENsa cúpula... que /inda é um pouquinho maior que um Palomar... AÍ o camundonguinho pra fazer média se vira pra camundonga e diz "sabia que TOda essa construção foi feita pa/ me livrar dos gato/?... /tô numa BOA fica comigo que tu /tá numa boa"... tu acha que isso é papo desse ratinho? todo mundo sabe que a basílica foi feita pra botar uma igreja dentro num foi pra abrigar um rato nem um ca/ abrigar nem um casal de ratinho... aí EU Acho que o ser humano que pensa que a Terra é exclusiva e dono do universo /tá... pensando igual a esse ratinho que /tá trancado com a ratinha... um dia a ratinha reclamou que é pretensão e mentira dele a basílica num foi feita por causa dele... e NEM ele viveu bastante pra agüentar a própria construção da basílica ( )... em relação aos seres humanos NÉ?... E QUANTO À VIDA... EU... ouvi um um tape... de um excelente GE/... geólgo... ( )... ele coMEça... andando... num mar de lavra... aí PÁra... aí diz assim "sabe que eu acho que a Terra é um ser vivo"... engraçado... que todo mundo vai se arrupiar quando ele disse... disse engraçado... se uma borboleta que vive uma semana pousar numa sequóia que vive mil anos... e você chegar pra borboleta e perguntar "borboleta /cê acha que a sequóia é um ser vivo?"... a borboleta vai dizer "acho que não que eu tive aqui uma semana minha vida inteira ela num fez nada"... mas todo mundo sabe que sequóia é uma árvore e é um ser vivo... AÍ SE A GENTE chegar pra sequóia e perguntar "seQUÓia... a TERRA É UM SER VIVO?"... "mas claro que NÃO /que eu /tô aqui há mil Anos e ela num fez nada"... então a Terra pra ele ( )... percebe o que ele quis dizer?... né?... então quando /cê fala em problema de vida você /tá num problema que a... a gente conhece... TANTO quanto uma criancinha que ainda num saiu do engradado sabe que existe uma escola cheia de coleguinha/... ela tem que sair do engradado tem que ir pra escola tem que estraNHAR mesmo tem que se adaptar... e depois tem que reconhecer que num é sozinho...] [18 e a gente pode então configurar isso DENtro da nossa disciplina como uma eTERna batalha entre o Geocentrismo... eu num vou mais nem dizer Heliocentrismo porque ele limita muito... digamos POLIcentrismo... ou em universo inteiro... não apenas ao redor do sol... né?... ao redor do SOL ainda é na RODA do tempo que... posterior à Inquisição... mas na roda atual é melhor você dizer né?... Policentrismo do que... Heliocentrismo já sabe que o próprio sol depende da... Galáxia também é assim uma família... né?... e a PRÓpria Galáxia tem uma família que tem setenta exemplares... segundo há outras famílias que têm centenas a milhares de exemplares... então onde vai parar com isso?... EU acho muito difícil conceber... uma coisa infinitamente peQUEna que vá terminar numa coisa infinitamente GRANde... por isso é que eu prefiro a Astro-po-lo-gia..] [19. a minha solução pessoal a minha fotografia pessoal é topógrafo... ( ) ... é um ramo da Matemática que começou com aquela brincadeira dos mágico/ tirar alguns componentes sem tirar o paletó... então o cara entra aqui sai do outro lado ( )... /cê foi na festa das menina/ apareceu um tal de ( )... aí inventou uma fitinha que o cara emendou uma ponta na OUtra mas ela tem DAdo uma voltinha aqui no meio ou seja mudando a polaridade... aí eles começa/ a imaginar se você pegar todos os números... À... direita varia ( ) disser que são INfinitamente pequeno/... peGAR TODOS os número/ à esquerda da vírgula dizer que quanto mais eles crescerem mais /taremo/ infinitamente GRANde... colocarmos isso ao longo de uma fita... chegar lá na ponta nós emendamos essa fita com a ponta dobrada... quê que acontece?... bem aqui ela vai dar uma volta de polaridade o que /tá à direita vai virar pra esquerda então ( )... eu pensei ( ) de criança e essa foi a única maneira que eu

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cheguei à conclusão... pra poder encarar que talvez o infinito... não existe... que o infinito seja ( )... ( ) matemática... Al. {( ) Inf. né? ((ruído))... aqui entra dentro dela mesmo... Al. ( ) /fessor Inf. então isso fechou TODA a Galáxia mas comunicou Ela com o seu próprio interior... eu num chego a ( ) ser muito simpático de imaginar que talvez os caminho/ do universo seja/ uma coisa assim... aí pronto você tira totalmente o sentido de que precisa ter um começo e... precisa ter um fim... E A Única coisa disso tudo( ) ... é a única coisa... essa de ficar crescendo dum lado só... já parou de explicar desde quando Aristótele/ falou que num existe linha reta... ( ) voltar pelo outro lado... enquanto ela /tá pensando que /tá INdo... por ali ela já /tá voltando por acolá... aí eu comecei a imaginar se você pega um y... faz em forma de túnel... fecha aqui que nem um estestoscópio é... mas fecha mesmo ( ) com duas abertura/ nos ouvidos né?... aqui coloca uma cornetinha de entrada e aqui bota uma plaquinha... Quo Vadis? (non) igual aquele filme né? "aonde VAI senhor?"... né?... aí o cara "vou:: e agora vou?"... aí aqui tem uma setinha né? se for por aqui vai pra direita se for por aqui vai pra esquerda tem duas plaquinha/ aqui e aqui tem escrito Quo Vadis? (non)... ( )... aí o cara começa a pensar ( ) tem até uma certa tendência... socialista eu acho que eu vou pela esquerda eu sou canhoto ou adoro esquerda aí chega o outro "bom eu sou até nazista... eu adoro diREIta... eu ACHO que eu vou pela direita"... aí tal história... bom como eu num posso num é diDÁtico eu lidar com os dois exemplo/ ao mesmo TEM po então... vou optar para escolher a direita... né?... então... ( ) agora DESde quando ele entrou ele perdeu o referencial exTERno... então ELES SÓ SABE/ que entrou pela direita e /tá avanÇANdo... ( )... AÍ ele ((ruído)) continua avançando continua avançando continua avançando e ele nem se apercebe /que tudo é burro né? nem ( )... ele passou... no CENtro... então ele num /tá mais indo... né? aí no caso ela /tá me influenciando me perdoe é porque eu sou canhoto certo?... num /tá mais indo pela esquerda... ele já /tá VOLTANdo... pela direita mas enquanto o cara PARAR ele lá dentro e perguntar sempre ele tem uma ( ) que está indo pela esquerda... jaMAIS ele aceitará que está... voltando pela direita... então isso é motivo... NAda denuncia ele que ele deu uma volta... a NÃO SER quando ele chegar aqui e encontrar a plaquinha ao contrário... aí ele vai dizer "não... brincadeira o cara chegou aqui e trocou a placa... mas eu num vou acreditar não /tava indo pra direita... pra esquerda ou eu saí pela direita?"... aí é mais fácil ele acreditar que o cara trocou a placa... isso é o que eu chamo de cep-ti-cis-mo... e eu acho... baseado nesse exemplo que cepticismo não é... isso... seria essa AUto-imaginação... às vezes a MEnos provável de todas as soluções... é aquela que tem possibilidade de ser verdade é ( )... ele afirmou... textualmente se ele tiver que escolher outro extremo vai escolher o mais misterioso que tiver com convicção de que aquilo é que é verdade aquele babaca certamente não será verdade... são babaca/ demais ((falou rindo)) pra ser verdade...] [20 e também mudar um pouco de dosagem de Stephan Hanks... tem muita coisa que eu não concordo com Stephan Hanks como a bipolaridade... ele sempre trata o universo dele o buraco negro de bipolaridade... eu acho que não que a coisa só começa a ter existência reAL quando você tem três dimensões mais o tempo e o espaço e a quarta... E DESDE quando Einstein provou isso... eu acho muito difícil o cara querer provar alguma coisa lidando com o número um... o número dois ou com o número três é bom lidar com uma matemática de quatro pra cima... né?... essa é a divergência que eu tenho com Stephan Hanks... mas eu sou considerado um amarelinho do Ceará ele é considerado um dos maoires gênio/ do mundo... por isso que eu num posso /tá falando discutir com ele né? "quem é você?"... né?... ( ) pistolão (danado)... mas eu gostaria de perguntar a ele por que que ele usa o duAl... quando poderia usar o ( )... DUAL tudo dele é de DOIS entrou por aqui saiu por ali tudo é geminado tudo é o PAR... se é fácil de você verificar porque sempre que aparece duas opções aparece uma terceira lógico que é também a soma das outras ( )... né?... e que todo jogo de duas opções só tem função de existir uma em função da outra... como uma MOEda... você só tem um lado da moeda a função é do outro lado pra num trocar

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os lado/... se num for em função disso num adianta dá o lado A ou lado B duma moeda o dia e a noite... /cê só conhece o dia e a noite porque existe o outro contrário se existir SOmente só aquilo... perderia a função... nunca ninguém teria imaginado né?... existiria o dia da noite é a mesma coisa... do bem e o mAl... SE EXISTISSE SÓ BEM... SÓ MAL nenhum:: deles teria função se num existisse o outro pra gente pesar e comparar... percebe?... mas tem uma coisa que eu /tô com ele e não abro... é quando ele diz... "quando o homem realmente entender o universo... a explica/ a explicação será tão simples... que qualquer criança qualquer analfabeto vai entender" aí essa eu acredito que é a explicação verdadeira... isso eu /tô com ele e não abro... enQUANto a explicação for comPLExa... e pertencer a uma meia dúzia de privilegiAdos... eu ainda considero arranjo... tapa-buraco... solução tamPÃO ela /tá /í pra ( )... porque no dia que for uma solução definitiva ela terá que ser... entendida facilmente por qualquer pessoa... nisso aí eu concordo plenamente... com seu Stephan... e ele também é muito combatido né? pelo pessoal que não concorda... começa a tirar o pé... e acha que ciência deve ser uma elite fechada...] [21 eu acho que enquanto ela for uma elite fechada ela é uma confraria... problema é que nós somo/ totalMENte né?... era dialogar totalmente com a sociedade... aí ela deixará de ser uma confraria... e começará a esclarecer toda a sociedade e a sociedade intervirá... um contrato ( ) né?... é a mesma coisa se você estudar Sociologia e ver por exemplo o Donald Pierson... o cara ficou faMOso virou doutor tal porque... descobriu uma coisa MUIto interessante você num pode pegar a humanidade e botar dentro do microscópio e estudar essa humanidade sem você /tá lá dentro porque você também é humanidade... no entanto... ( ) a a paternidade... dessa descoberta sobre a Sociologia moderna... percebe? então... ninguém pode ter a autoridade de ficar FOra considerando eu aqui sou o sabido todo poderoso e aqueles são ( ) ele também faz parte da ( ) ignorante ( )... uma vez que ele também é um ser humano... certo?... agora a minha opinião pessoAL... é que essa vida aí por fora... nem DEve ser diviniZAda nem hostilizada... do MESmo jeito você então aí /tá sujeito a ser atacado por um... bandido... por um santo... por qualquer COIsa... vocês então que confiam no extra-terrestre tem gente de toda a espécie... né? que ( ) gente que tem um conceito x do que é bem ou MAL e gente que tem um conceito y... do que... é bem ou mAl... a idéia de que a gente precisa ter cuiDAdo no que se trata de vida terrestre... e é OU excessiva idolatria... ou... a excessiva ojeriza... são duas coisas que nós ( ) eu acho que deve ( )... VOCÊS CHEGA/ AQUI eu vou dar uma aula pra vocês o que me autoriza a dar uma aula a vocês é que PREsume-se que eu tenho um pouquinho de experiência do que vocês só isso... VOCÊS num vem aqui pa/ me adoRAR como se eu fosse um gênio e num vem aqui pa/ me escu/...

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AULA EF-56 CORPUS PORCUFORT (PORTUGUÊS ORAL CULTO DE FORTALEZA) Coordenador - Prof. José Lemos Monteiro Inquérito n° 56 Informante - Mulher, 54 anos, fortalezense, filha de pais cearenses, graduada em Letras. Tema - Análise da poesia Morte e Vida Severina Data do inquérito - 18/05/1995 Duração - 36 minutos Doc.1 uhn... [1 Inf. bom na aula paSSAda nós... eh:: vimos um TEXto de João CaBRAL... que é:: exatamente o Cão Sem Plumas... né?... e que ESte TEXto que esse texto ele... e/ pode ser enQUADRAdo dentro da feição sociAL... realmente João CaBRAL e::le apresenta dois PÓlos... da sua atitude como poeta... duas eh:: duas feições que são distintas... mas que revelam o mesmo poeta... João Cabral poeta a::ltamente consciENte de seu papel de poeta... e do papel da poe-sia HOje né?... enTÃO eh:: como diz Assis Brasil que aqui:: eu vendo aqui a... A Nova... A Nova Literatura... Brasileira a poe-sia... o Assis Brasil diz que... João CaBRAL apresenta dois PÓ-LOS... quer dizer da sua a ah:: poesia de João Cabral... um que é essencialmente esTÉtico... e OUtro É::... de sentido social... como vocês viram aquelas... poesias anteriOres como é o caso da a poe-sia A MEsa... e a:: Psicologia da ComposiÇÃO... elas têm:: uma preocupa/ elas TOda/... eh todas as duas poesias... elas têm uma peocupação bem nítida bem exPLÍcita... que é:: com a própria poe -sia... elas são refleXÕES... são questionamentos... são conCEItos... de ARte poeSIa... né?... que João Cabral emite... onde há explícita a preocupação... da arte pela arte... quer dizer a poesia BASta-se a si mesma NAda fora da poesia... então a poesia A Mesa... é exatamente a reflexão é uma:: um... toda uma discussão em cima de todo... é que seria a criação poética... né?... que passa por vários esTÁgios né?... um estágio da poesia laTENte... não nascida... poesia ainda iDÉIa... um esTÁgio... que JÁ agora as palavras pas-savam do estágio dicionário... uNÍvoco... para o estágio de poeSIa plurívoco... MAS à custa do trabalho... portanto o artesaNAto... /cês /tão recor/ /cês se recordam daquela::... daquele VERso que falava a lá/ o lápis "a FAca que aparou... teu lápis GASto"... exa-tamente... querendo nos remeter a idéia... de de traBAlho de artesanato... então... não foi a inspiração... e:: na poesia nos fala do "verso nascido de tua mão viva"... do trabalho... então exatamente aquela poesia discute TODO um::... todo uma iDÉIa... todo um conCEIto... eh:: de poesia CLÁssica conceito CLÁssico de poesia... onde eXAtamente... eh:: o conhecimento TÉCnico o conheci-mento... poÉtico... quer dizer unido ao conhecimento TÉCnico... então o poeta deve ser aquele artesão... o artesão da palavra né?... oh em Psicologia da ComposiÇÃO novamente vocês /tão vendo lá um discurso metalingüístico né?... onde nos FAla... da criação poé-tica... quer dizer usando a linguagem poética para falar da poesia metalinguagem... E... LÁ a atitude cabraLIna... ela é essencial-mente esTÉtica... como na poesia A Mesa... Psicologia da Composição... ela diz ela faz reflexões... sobre a criação poÉtica né?... onde ele coloca a nos nos doi/ nos estrofes finais... ela coloca em ah:: a maTÁfora... toda uma simbologia a metáfora da aRAnha... a teia da aRAnha... tecida por uma arteSÃ... né?... que é a aranha... e que tem... alta consciência do seu do seu traBAlho... eh:: criaDOR do seu processo criaDOR... alta consciência TÉCnica... marcada pela objetividade... e a teia da aranha seria um trabalho acabado completo... siMEtricamente perfeito... então aLI é uma meTÁfora que é a linguagem da substituição... onde ele nos nos quer reme-TER... à:: reflexão sobre a criação poética... quer dizer o trabalho do poeta... deve ser semelhante ao trabalho da aranha... a... a TEIA da aranha que é tecida... né?... exatamente eh:: o poeta seria a ara-nha uma arteSÃ... o poeta seria

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um artesão quer dizer da palavra... A:: NA:: poesia... Cão Sem Plumas...... como aqui na poesia de HOje Morte e Vida SeveRIna... você observa que a atitude ca/ cabralina... ela... desvia -se... da poesia... quer dizer ela não é não ela em ao invés de ser... a preocupação COM a poesia... muito embora... tanto Morte e Vida Severina como Cão Sem Plumas... vocês observe/ que há um trabalho com a:: linGUAgem um traba-lho... muito rigoROso né?... com a linGUAgem... mesmo assim... a preocupação agora o senTIdo... num é ma is... puramente estético... essencialmente estético o sentido agora já é social... são refle -XÕES... são... é uma poesia crítica... né?... só que não é mais uma crítica literária mas é uma crítica social... realmente... a crítica social é que repousa sobre o Nordeste... eu falei pra vocês em aulas passadas que uma das paixões do João Cabral... era o Nordeste... a outra paixão é o rigor formal... e uma e uma OUtra seria o Nordeste... notadamente Pernambuco... quer dizer Pernambuco vai estar presente... de uma maneira muito FORte... em suas poesias... né?... E... o Nordeste e:: falando em Pernambuco ele nos deixa... eh:: anteVER nos deixa exatamente... já que ele usa uma linguagem metafórica... no caso de Cão Sem PLUmas... quer dizer uma meTÁfora por ser uma meTÁfora... né?... Cão Sem PLUmas... nos leva a uma reflexão quer dizer crítica dessa realidade nordestina que ele coloca... o homem dos MANgues pernambucano/... Capibaribe... mas exatamente... quer dizer a presença daquele HOmem... na paiSAgem... quer dizer aquele homem que padece de TOdo... todas as FORmas... de privaÇÕes né?... quer dizer ele é priVAdo de esCOla de não ter uma moradia DIGna... não ter uma alimenta-ção... DIGna... de um ser huMAno... aquele homem que num tem nenhuma perspectiva de muDAR a sua vida né?... então aquele homem paDEce das mesmas... necessiDAdes... das mesmas adver-siDAdes econômico-sociais do RIo... do rio CapibaRIbe... um rio PObre que é mais LAma do que de Água... né?... que não tem a importância econômica de um rio... AmaZOnas... ou de um rio... eh São FranCISco... ou de um rio ParaNÁ... quer dizer não é impor-tante... num é um grande cauDAL muito pelo conTRÁrio... é um líquido es/ de de de uma "esPAda de líquido esPEsso"como ele mesmo diz... numa bonita meTÁfora né?... realmente... e... como uma comparação in/ uma comparação inSÓlita... "como um CÃO humilde e esPEsso"... como um cão vira-lata... que num tem pêlos cão sem pluma sem pêlos PÊlos... é regalia... PÊlos é uma vida digna... que esse homem não tem... entendeu?... quer dizer a partí-cula está neGANdo... sem... sem... o que a eu o que uma vida digna deveria ter... então exatamente há uma crítica contundente... lá na poesia... contra essa a::s adversidades econômico-sociais... desse NorDESte que que É PernamBUco... mas por extenSÃO é todo o Nordeste o Cão Sem Plumas... é é Pernambuco sim o homem dos MANgues... mas é o nosso homem o homem dos mangues do rio Cocó... entendeu?... é do Lagamar... É o nosso retirante que morre de fome nas grande/ cidades quer dizer... é o é o cearense é o mara-nhense é o piauiense é o paraibano enfim... NÉ?... é o nordestino o cão sem plumas... esse homem que que é esCRAvo nas fazendas... do Pantanal matogrossense ou em qualquer outro lugar... realmente esse mesmo HOmem que foi nos foi denunciAdo... por Fe/ Ferreira de Castro... no romance sociAL... como o romance A Selva de Fer-reira de Castro... que é um autor português do Neo-realismo portu-guês... da fase do Modernismo geração de trinta que... PortuGAL né?... ele nos de/ nos fala da-/quele homem que é... opriMIdo... que é o nordestino... que foi para a Amazônia... quer dizer trabalhar nos grandes seringais... e que eXAtamente... eles... se tornou-se es-CRAvo... daqueles grandes fazendeiros daqueles GRANdes... do-nos de terra grandes... serinGAIS... então aquele homem... QUE... é o nordestino... é o pernambucano é o paraibano é o cearense é o piauiense enfim... que não mo/ pa/ não morrer de fome na sua terra tangido pela seca... ou por outras... OU outras adversidade/ ele vai para... Amazônia né?... e vai trabalhar nos grandes seringais... e chegando ne/ LÁ na Amazônia... ele não pode mais retorNAR... é o caso... eh:: da triste partida do Patativa de Assaré o homem chegou em São PAUlo... pra trabalhar né? o nordestino... e depois não pôde mais retornar porque estava devendo ao patrão... quer dizer... e fica então só aquela sauDAde aquele sofrimento... teRRÍvel... que ele vai morrer de fome lá adiante... deixa de morrer de fome na sua terra pra morrer lá adiante... noutras terras... então o Ferreira de Castro denuncia... a escravização do homem à

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venda... quer dizer ele é um cão sem plumas... como fala João Cabral... ele esTÁ LÁ prisioNEIro porque aquelas grandes fazendas aqueles grandes... eh:: os grandes... eh:: os grande/ seringais... os donos de seringais... estão afastado/ da capital de MaNAUS... e só se pode o aCEsso é de BARco... navio navio-gaiOla né?... ou então de aviões quer dizer... então é o navio-gaiola mesmo... que você passa até às vezes até um mês viaJANdo pa/ chegar naquele/ naquele s locais da da... da floresta... onde estão os grande/ seringais né?... aquele homem não tem como retornar... porque... LÁ naquele serinGAL eXISte... uma venda... naquela venda... ele compra sapatos ROUpas comidas remédios... e ele jamais ver a cor do dinheiro porque ele recebe uma tampa de lata amassada... que é o pagamento do seu trabalho... quer dizer então ele SEMpre está escraviZAdo à venda porque quando ele termina aquela jornada de traBAlho... que ele quer vol-tar pra sua terra aí chega o dono da venda diz "olha... o senhor não POde porque o senhor comprou além da medida... o senhor está devendo ao patrão... /cê vai ter que trabalhar pra pagar"... e quando ele faz hora extra quando ele já ele vai fazer paGAR o patrão... e que ele... aparentemente o patrão diz "/tá certo tudo pago você pode saIR"... ele é TOcaiado e MORto lá adiante... ante/ de pegar o navio-gaiOla ele é tocaiado e MORto pra que ele não vá contar lá fora o que se PAssa... o que se PAssa naquela naquela... naquela fazenda né?... então Essa é a realiDAde do Cão Sem Plumas... e Essa mesma realiDAde... vai vai ser estamPAda né?... em Morte e Vida Severina... novamente aquela crítica social contunDENte... ela é uma poesia crítica... de preocupação Essencialmente social com o Nordeste então realmente... ele::... ele... como diz o Assis Brasil... o Assis Brasil ele nos mostra... João CaBRAL... "os dois pólos da atitude cabralina... o essencialmente estético... e o de sen-tido sociAL são claros e definidos...] [2 e O que se quer mostrar aGOra é que... a sua fala/ a sua falada rigidez poética... não atende à visão da literatura a formalista... ele usa métricos poéticos... ou não Usa... domina a rima toANte... em sua difícil elaboração RÍTmica... lembra as formas popuLAres... dos cantadores medie-VAIS e nordestinos... tudo com o fim único... de alcançar a sua melhor expressão... a forma NOva para a poesia... a sua marca pessoal... João Cabral viveu na Espanha... MUItos anos e acabou bastante impressioNAdo com a com a poesia espaNHOla"... que aliás eu falei pra vocês que foi uma OUtra paixão de João Cabral a Espanha... né?... "principalmente o baRROco" o barroco espa-nhol... "e a adoção quase sempre da quadra dos versos curtos... da dicção objetiva em seus poemas... o leva de imediato às raízes ibé-ricas... à poesia já... já de sentido popuLAR... humanista do século dezoito"...] [3 é o caso de Morte e Vida Severina... "um AUto medie-val... auto medieval... transPOSto para o Nordeste brasileiro... MOStra bem a preocupação de João CaBRAL... em não ficar dis-TANte das formas RIcas... e tradicionais da poeSIa... mas NUNca as repetindo nunca as imiTANdo... e faz exatamente aqui... a estili-zação do proCEsso... como OUtros poetas já haviam FEIto... desde a época madieVAL... a nossos dias... é sabido que o AUto tem um sentido religioso... sem falar no seu arraigado sentido Étido... no caso de João Cabral ele nada mais quis mostrar... do que situar no Nordeste a crucificaÇÃO... do retiRANte e do trabalhador do EIto... em MORte e Vida SeveRIna... as preocupações de João Cabral vão além da estrutura meLÓdica... ou lingüística... quando situa como nenhum outro poeta brasileiro... o HOmem e a TErra... o homem sem POUso no Nordeste... que é o HOmem que se sente PRÓximo... à MORte... e proCUra" eh "um itinerário... a lingua-gem é ainda medieval daí o paralelismo com o mundo nordesTIno... onde se acenTUa/ a GLÓria... e o heroÍSmo do anti-herói nordes-tino"... então realmente... MORte e Vida Severina... AUto de Natal pernambucano AUto... é exatamente uMA::... uma eh:: o teAtro medieVAL... nós encontramos... eh algumas esPÉcie/ do teatro medieVAL... que é exatamente o AUto... e as farsas né?... a gente sabe que:: em PortuGAL foi Gil Vicente... o criaDOR do teatro popular... MAS existia é:: é criando sempre seus AUtos... né?... autos da Trilogia das BARcas... e algumas FARsas né?... foi Gil Vicente que ao... foi o fundador do teatro potuguês... né?... NA:: EsPAnha Juan del Cina... seria o grande MEStre do teatro espa-NHOL... e exatamente AUto foi uma espécie de eh do teAtro medieVAL... e Ela exatamente ela tem ela na sua origem... eh::... o teatro popular... é:: os AUtos eles têm:: uma origem religiosa... né?... o teatro popular antes de ser...

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eh:: proFAno... ele foi religi-oso... liGAdo à vida dos santos à vida de Cristo né?... daí porque os autos... muito voltados para a:: vida... eh dos SANtos... e a própria vida de Cristo né?... posteriormente... ele foi se afastando do tem-plo... né?... daí porque a palavra PROFANO... quer dizer em frente ao TEMplo... quer dizer PRÓ em frente fano TEMplo né?... quer dizer o teatro foi saindo da igreja... e sendo exibida ah em frente ao templo... ainda com a participação TOTAL... de pessoas da igreja... à medida que o tempo foi passando... né? ao longo dos séculos... eh:: DOze treze quatorze então o tea/ o teatro foi se afas-TANdo do templo... e foi... adquirindo um caráter PRO-fano... temas populares e não mais temas religiosos eram cultivados né?... então a Morte e Vida Severina... está ligada à própria oRIgem... do AUto medieval... né?... religioso... entendeu?... simBOlicamente... AUto de Natal pernambucano está liGAdo... ao nascimento do meNIno... como NASce o menino nordestino... né?... como qual-quer criança que NASce... é uma explosão de vida de aleGRIa... só que este menino está predestiNAdo a ser crucifiCAdo... e morto... quer dizer HÁ uma predestinaÇÃO... quer dizer é um de/ é um destino traÇAdo... quer dizer... MAS apesar disso... ele nasce... continua nascendo os menino/ nordestinos... e são predestiNAdos o quê?... À... à MORte e vida severina... eXAtamente... quer dizer... êh a MORte severina... "que se MOrre de veLHIce antes dos trinta... de embosCAda antes dos dos vinte... de FOme um POUco por dia"... quer dizer... apesar de TUdo... esse menino nasce... por-que já:: está traçado o seu destino... OU ele vai ser aquele homem dos MANgues lá do rio do CapibaRIbe... de LA/ metido de LAma transformado em anfíbio... um caranguejo ou um siri... né?... com suas casas de lama plantadas na lama coaguladas na LAma... ou ele vai ser um retirante... nordestino... predestinado a eRRAR por outras terras... a ser um MARGINAL... mais tarde né?... eRRAR por por GRANdes ciDAdes né?... como diz o Fabiano em Vidas Secas... exatamente... um Fabiano um Chico BENto... uma Cordu-lina uma Sinhá Vitória né?... então exatamente... o AUto de Natal pernambuCAno... é porque... João CaBRAL ele QUIS... partir das fontes::... DA origem da própria poesia... quer dizer é a poesia medieVAL... quer dizer a origem do AUto religiOso... e simBOli-camente... ele não quis imiTAR ele não quis... copiar ele quis criar alguma coisa NOva... e simBOlicamente... ele coLOca... o AUto... de Natal onde ele coloca NÃO... o menino Jesus nascendo... pre-destiNAdo a ser crucificado e MORto... né?... ele coloca o menino nordestino... que também tem a mesma predestinação... de ser cru-cificado e MORto...] [4 quer dizer... realmente É... é o se/ é é a su/ é a maTÉria de sua poesia... é o Nordeste... é PernamBUco... mas é Pernambuco é o Nordeste... simbolicamente é o nordeste... e MORte e Vida Severina... ela ela embora fale de Pernambuco mas ela está nos levando a a... a uma idéia maiOR... a todo o NorDESte... que padece da Morte e Vida Severina... todo o nor-destino... porque SeveRIno... ele é um personagem... cole/ ele tem a FORça de um personagem coleTIvo... quer dizer ele num É... um um SeveRIno... quer dizer... ele é TODO o nordes/ TODOS são TODOS os nordestinos... Severino tem a FORça de um... de um personagem coleTIvo... simbolicamente... ele quer di/ ele quer quer dizer simboliza TODOS os nordestinos... TODOS os retirantes... todos aque/ que que padecem... TODOS os nordestino/ que pade-cem... realmente... eh:: dessa vida miseRÁvel... e MOrre de morte iGUAL né?... a morte da MacaBÉIA... lá de Clarice Lispector... quer dizer a nordestina coitada... que soNHAva... com A com o suCEsso com a GLÓria coitada... e realmente não teve sucesso... e morreu realmente atropelada quer dizer... é na grande cidade... então realmente é É o destino... quer dizer... HÁ há CLAro há:: uma uma uma:: uma poe/ é uma poesia CRÍtica né?... uma crítica contundente... onde você pensa... EH:: TODA::... o poeta derrama toda a sua indignaÇÃO... mas a sua indignaÇÃO... ela BAte com a nossa indignação de nordestinos... né?... a linGUAgem da poesia... por ser linguagem tão FORte... Ela... nos entra como por osMOse ela nos entra... de uma maneira muito inTENsa... e a indignaÇÃO do poeta é a NOssa indignação... quer dizer... POR QUE que existe os severinos...por que que no NorDESte não não MUda isso? ... por que SEMpre os nordestinos... paDEcem de FOme?... e MOr-rem dessa morte severina... por que que os nordestinos... sempre são marginaliZAdos... enTÃO... realmente há essa indignação... que PÁIra em nossa em nossa

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caBEça... e que é a indignação do poeta como também nordestino. .. e muito mais que NÓS nordes-tino/ que somos... ele é poeta... né?... e com muito mais FORça... ele canta a sua indigna/ indignaÇÃO... do que a nossa... vã pala -vra... de homens comuns de pessoas que têm sensibilidade sim... mas que... pelo menos e::u penso há poetas por aqui eu sei que existem... que talvez... é SOfra intensamente... MAIS do que eu que sou apenas uma professora de Literatura né?... mas que tenho a sensibiliDAde... e diANte duma poesia dessa me... realmente me emociona... a:: esse sofrimento que aqui está colocado... essa vida miseRÁvel... somada a um destino TÃO... adVERso... do nosso retirante... né?... e QUE nós sabemos que... eh é uma realiDAde... tão PRÓxima... porque é uma linGUAgem metonímica tão próxima da realidade que nós conhecemos... né?... não é NAda de fantasia... num é alguma coisa distante daquilo que conhecemos... e sim... de uma coisa profundamente verdadeira... e que nós conhecemos...] [5 então está aqui... MORte e Vida Severina... realmente publiCAda em mil novecentos e sessenta e cinco... né?... eh exibiram várias VEzes... eh::... na TV... premiAdo... porque foi ela foi adaptado para o teAtro... em mil novecentos e sessenta e CINco... o teAtro de São eh:: ah ah... Tuca... é TeAtro de São PAUlo... eh e foi foi eram foram exibir em:: na FRANça... em NanCY... com a música do Chico Buarque de Holanda... foi premiada premiada em Nancy... né?... então realmente Morte e Vida Seve/ Morte e Vida Severina... É... a expressão MÁxima... da poesia nordestina... né?... DEssa poesia... contemporânea moDERna contemporânea... onde o poeta tem ALta consciência do seu paPEL de poeta... eh:: de... ser exa-tamente um alguém que denunCIa... alguém que está... eh comun-GANdo... participando... exatamente de todas as preocupações... de HOje... então o Nordeste... que passou a ser... a preocupação... dos escritores de TRINta... né?... e foi a a a:: realmente continuou a ser... e continua a ser né?... a preocupação de muitos poetas do do PORte de João Cabral de Melo Neto... então a:: Morte e Vida Se-verina nos FAla... exatamente de toda uma travessia... né?... eh::... DO... NOsso HOmem... do nosso retiRANte nordestino... que PAra não morrer de fome NA::... sua TErra... ele vai em demanda das grandes ciDAdes... e realmente... é uma poeSIa... que... expressa muito bem... TOdo o êxodo rural... né?... e denuncia exatamente... a::... todo o desTIno... desse homem... quer dizer ele quesTIOna exatamente tudo isso...] [6 na poeSIa... nós tem/ aqui nós temos apenas um fragmento vamos ler... o fragmento Morte e Vida Severina... ONde o poeta nos quer mosTRAR... eXAtamente... quer dizer QUAL É a significaÇÃO do nome no/ do nome Severino?... quer dizer o Severino... e ele então há um persoNAgem... poético... que é Severino...] [7 e que é uma poesia narraTIva... que ela tem exata-mente... a dimensão de um poema épico... PEla riQUEza do as-sunto... de um poema épico... porque o poeta o poeta transCENde... quer dizer ele se auSENta... com o seu eu... e ele... realmente pro-JEta para FOra... os seus sentimentos... eh:: de quê?... eh:: senti-mento com a nação brasileiro com o NorDESte brasileiro... com o HOmem brasileiro né?... e então projetando essa preocupação... com a realiDAde da sua terra... a realidade... exatamente do Nordeste... que seria exatamente... algo muito maiOR que o sentimento do poeta... sentimentos pessoais... quer dizer então o seu tema é um tema... grandiOso... é um tema sociAL... voltado para a realidade nordestina para a questão... do Êxodo rural do a do problema da TOda a problemática... do retirante nordestino...] [8 então... aqui vocês /tão vendo... nesse primeiro fragmento... onde o o retirante se apre-senta... né?... e ele diz "o meu NOME é Severino... não tenho OU-tro de PIa... como há muitos Severinos... que é SANto de romaria... deram então de me chaMAR::... Severino de Maria... como há MUItos Severinos com mães chamadas Maria fiquei sendo o da Mari::a do finado Zacarias... mas" a "Isso ainda diz POUco... há muitos na fregueSIA... por CAUsa de um coronel que se chamou ZacaRIas... e que foi o mais antigo... seNHOR dessa/ sesmarias"... então /cês /tão vendo que ele está se apresentando... ele é ele NA/ é um é um narrador em primeira peSSOa... que o poeta coloca em primeira pessoa eXAtamente... porque a primeira peSSOa... É uma é um:: POUco narrativa... que... que:: nos COLOca... quer dizer que a que um que o narraDOR... ele se coloca tão PRÓximo do leiTOR... que o leitor TEM que senTIR... muito mais... intensa-mente... é muito mais dramático é muito mais intenso né?... a a situação que está sendo colocada está sendo naRRAa para

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o lei-TOR então então convivência muito mais... quando É... narrada em primeira pessoa do que em terceira peSSOa... daí porque ele colo-cou o PRÓprio Severino... contando a sua tragédia... a sua vida né?... e realmente... o Severino... ele simboliza TODOS os Seve-rino/ então ele não tem um nome de pia mesmo não... o retirante... que são muitas Marias que são muitos Josés que são muitos Rai-mundos... que são muitos Severinos... a gente sabe que Severino é muito um nome muito nordestino... Severino... é um nome muito nordestino então... realmente... a a o nome de família é o nome de quem tem pêlos regalia... então eu SOU... família... eu sou família BeZErra... eu sou família COSta... eu sou família Silva... mas o retirante ele num tem família... é apenas um retirante que chega na sua PORta... ele não tem família... realmente... a o próprio TRA/ o próprio o/ próprios anDRA::jos dele... certo?... eh ah o eh os SAcos tem que carregar nas COSta/... eh você já sabe que ele é um reti-rante... não precisa apresentação... então nós sabemos que as pes-soas... eh::... você tem que... quando você vai... ou um emPREgo... né?... ou:: você quer conseguir um emprego ou você vai ser você vai ter que tem tem que ter apresentaÇÃO... tem que se apresen-TAR... né?... quer dizer aQUI... exatamente ele é é o nome de fa-mília é insignificante... quer dizer... não TEM a significação do nome de família... ele é apenas um SeveRINO... um Severino... que se apresenta um Severino apenas um retirante... quer dizer o nome de faMÍlia... é mais um Severino... tanto as mães chamada/ Ma-rias... quer dizer E e e os e o e os coronéis... que fazem os seus filhos por aí... e num assume/ a paternidade de nenhum... eles são eles são senhores feuDAIS... são donos da TErra... o que está na terra é dele... então a mulher do seu morador é dele também a filha do morador também é DEle do filho DEle enfim né?... então num é ah isso ah não há... não TEM a significação do nome de família num tem... quer dizer... coMEça por aí o seu destino coitado né?... de marginal... depois... "como eu vou identificá-lo"... aí ele diz... "mas isso ainda diz POUco... há muitos na fregueSIa... por causa de um coronel que se chamou Zacarias... e que foi o mais antigo senhor dessa/ sesmarias"... exatamente quer dizer... há tantos Seve -rinos por aí... que ninguém sabe nem quem filho eles são... né?... mostrando que... a vida do Severino é uma vida TÃO sem sem significaÇÃO... que até nome de família nem tem né?... como en-TÃO dizer quem fala ((fim do lado A)) físico... aonde eles VIvem? quer dizer aonde eles vivem? lá na serra da Costela no início da Paraiba... "mas isso ainda diz POUco... ao menos mais cinco havia com o nome de Severino... filho de tantas MaRIas mulher de tanto... de de outros tantos... já finado Zacarias... viVENdo... na mesma serra magra e oSSUda em que eu vivia"... então real-mente... ah:: eles... o espaço FÍsico... lá estão os Severinos lá lá lá lá na serra da serra da CosTEla... lá na serra magra e oSSUda... realmente a conotação da palavra magra e ossuda... quer dizer... a serra a serra PeLAda sem nenhuma vegetaÇÃO né?... aonde as... aonde há pedra por não ter vegetaÇÃO... ela é magra e oSSUda exatamente... a FALta da vegetação... a poBREza na região... por-que padece da seca... né?... enTÃO... ele diz "somos muitos Seve-rinos iGUAIS em tudo na vida... na mesma cabeça GRANde que a custo é que se equilibra... NO MESmo ventre crescido sobre a/ mesmas pernas finas... e iguais TAMBÉM... porque o sangue que usamos tem pouca tinta"... então... Olha/ vejam bem o nivelamento dos Severinos... eles não têm nome de família... né?... eles habitam o mesmo esPAço... físico... no início da Paraíba... né? Paraíba Pernambuco Ceará né?... eles... eh:: não têm nome de família eh:: o mesmo espaço físico... de poBREza onde há a SEca né?... Eles... paDEcem dos mesmos MAles... tem as mesmas cabeça/ GRANde/... tem os ventre/ crescido com de vermiNOse né?... eles têm exatamente as pernas finas... a maGREza... a::... as carência/ nutricioNAIS... e Eles... exatamente paDEcem de aneMIa... exata-mente pela auSÊNcia de quê?... de glóbulos vermelho/ porque... os VERmes consomem tudo... em toda sua existência né?... eles pade-cem exatamente... de vermiNOse e:: de anemia né?... e Ele diz mais... olhe nivelando os Severinos todos são iGUAIS... né?... "e somos e se somos Severinos... iguais em tudo na VIda... morremos de morte iGUAL"... a "mesma MORte severina"... que MORte severina será Essa?... "é a MORte que... de QUEM se MOrre... de velhice antes do/... dos trinta"... exatamente de inanição... /que não comem... padecem de fome e sede né?... "de emBOSCAda antes dos vinte"... porQUE... eles forma/

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trabalham na laVOUra... nos roÇAdos... é a questão dos sem TErra né?... são emboscados e mortos... pelos grandes senhores... donos de grandes latifúndio/ né?... e "de FOme um pouco por DIA"... exatamente porque pade-cem de FOme... OU LÁ... no serTÃO... ou nas grandes ciDAdes... esmoLANdo pedindo esMOla né? morrendo de fome... e então diz João Cabral... ‘é que a MORte severina ataca em qualquer ci-DAde... e até" a "gente não nasCIda"... as crianças que são geRA-das... no ventre da mãe que passa fome da retirante... e:: a a reti-rante coitada não tem FORça... de exatamente... de parir aquela criança... ela morre antes de nascer de fome... porque a mãe /tá morrendo de fome... e diz "somos muitos" somos "Severinos... iGUAIS em TUdo e na SIna"... o "de abrandar estas pedras su-ando-se muito em cima... a de tentar despertar... terra sempre mais extinta... a de querer arrancar... algum roÇAdo da cinza... mas" pra que me re/ mas mas pra "que me conheçam melhor Vossas Senho-rias... e melhor posso seguir a minha "história a minha vida... PAsso a ser o Severino... que em VOssa presença emigra"... então gente quer dizer Ele Severino... ah só a presença DEle... coberto de anDRAjos... os PÉS calejados... o chapéu de palha... ah o sem-blante aflito né?... também... massaCRAdo... pela:: pelo SOL... causticado pelo SOL... ele por si já fala já diz tudo né?... daquela sua vida... e CAso da sua MORte também né?... então exata-mente... João CaBRAL... através de uma crítica contunDENte... né?... nos FAZ refletir... sobre essa realiDAde nordestina... que é a do pernambuCAno... mas que é de todo o Nordeste né?... o simboli/ eh o eh quer dizer... simboLIza o Severino... o retirante nordes-tino... né?... exatamente... quer dizer ele niVEla... todos são iGUAIS... daí porque ele é um personagem coletivo... há um nive-lamento todos são iguais... num tem nome de família... MOram vem procedem da mesma do mesmo esPAço... o Nordeste... MOr-rem da mesma MORte... PAssam a mesma fome... né?... então... é uma poesia exatamente... eh:: de uma riQUEza incrível... de uma crítica... realmente proFUNda... e que merece uma grande refle -xão... por parte... dos au/ dos leitores... né?... então gente é uma poesia profundamente engajada ... ]

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REPORTAGEM DE TELEVISÃO F-01 Reportagem – Jornal da Record – Rede Record 06/06/2002 [1 Apresentador – O candidato do PT Luiz Inácio Lula da Silva teve encontros hoje em Brasília com líderes de ruas, líderes evangélicos e aposentados. A reportagem é de Cristina Lemos.] [2 Repórter – Dos aposentados Lula ouviu denúncias: querem um salário mínimo de 350 reais, mas o candidato petista evitou promessas. Em meio às turbulências do mercado Lula não poupou críticas à área econômica do governo. (Fala de Lula - inaudível)] [3 Repórter - No encontro nacional de meninos e meninas de rua no plenário da câmara, Lula foi surpreendido com a saudação da ex-colega de partido, deputada Erundina, hoje aliada a Anthony Garotinho, do PSB. (Fala de Erundina - inaudível)] [4 Repórter – O candidato petista fechou o dia com uma reunião com a cúpula da assembléia de Deus, que congrega 18 milhões de evangélicos. A eles Lula prometeu tentar melhorar o relacionamento das prefeituras com as igrejas. Mais tarde em entrevista Lula voltou a responsabilizar o governo pela instabilidade do mercado. (Fala de Lula - inaudível)]

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REPORTAGEM DE TELEVISÃO F-02 Reportagem – Jornal nacional - Rede Globo 06/06/2002 [1 Apresentador – A polícia do Rio passou o dia fazendo várias operações em favelas próximas ao local onde o repórter da rede Globo Tim Lopes desapareceu no domingo. Até agora nenhum dos traficantes que comandam a região foi preso. Repórter – Os fogos avisam aos traficantes que a polícia está chegando. Quatro dias depois que Tim Lopes desapareceu nessa favela, o poder aqui ainda continua com a mesma quadrilha que o capturou. As tropas especiais sobrem o morro como quem invade o território inimigo. O batalhão de operações especiais da Polícia Militar voltou a subir as favelas da Penha onde Tim Lopes desapareceu. Dessa vez trazendo cães farejadores. A família do jornalista cedeu roupas e sapatos para que os cães farejadores pudessem identificar alguma pista de onde está Tim Lopes. A busca se concentrou no local que os traficantes usam como campo de tortura e execuções. Fica na parte mais alta da favela. Só em operações especiais a polícia chega aqui. No dia a dia esse território é dominado pelos traficantes. O mais assustador é essa caverna semidestruída pelo fogo. Em volta dezenas de rolos de arame, sobras de carcaça de pneus. Policial – Está comprovado que aqui é um local de execução. Nós imaginamos que aqui dezenas até centenas de pessoas já foram executadas é queimadas nessa grota que eles chamam de microondas. Repórter – Uma denúncia anônima levou a tropa à entrada da uma favela vizinha. Os cães farejaram a área, mas as buscas também não tiveram resultado. A polícia ouviu hoje no hospital um traficante da mesma quadrilha preso ontem. Ele não quis revelar o que aconteceu na favela. O material recolhido na segunda-feira no morro foi levado para o laboratório de análise de DNA da Universidade Federal do Rio. Parentes de Tim Lopes forneceram amostras de sangue para comparação. Quatro dias depois de desaparecido a polícia ainda não consegui localizar o jornalista e nem prender os chefes da quadrilha que controla a região. Governadora – A ação não está demorada, o que está acontecendo é que nós ainda não conseguimos é identificar o local, mas qualquer lugar que ele esteja dentro do Estado do Rio de janeiro ou fora, existe uma ação integrada e nós estamos investigando e com muita responsabilidade. ] [2 Ministro da Justiça – Há toda uma situação de domínio de certas regiões pela criminalidade. É necessário que essa que esse domínio esse estado paralelo que acabou de se constituir venha a ser é minimizar através de ações de presença do Estado. Associação dos Jornais – ( ) chegou o seguinte comunicado ( ) as autoridades o que a comunidade fez ela se dirigiu a um veículo de comunicação ( ) a última espernça dela de ver o problema solucionado. Federação dos jornais – Acreditamos que o crime cometido contra o profissional de imprensa é um crime cometido contra a sociedade pelo seu direito de ser bem informada e não era mais do que isso que Tim estava fazendo. Repórter – A coordenadora do comitê para a proteção dos jornalistas, com sede em Nova Iorque, está acompanhando de perto o caso. Ela destacou a coragem do jornalista e diz esperar que Tim Lopes não tenha que pagar com a vida pelo seu trabalho (fala em inglês da coordenadora). Apresentador – Agora há pouco o secretário de segurança pública do Rio se emocionou ao falar sobre o desaparecimento do repórter Tim Lopes. Secretário – Tim é um símbolo. O Tim é um jornalista de muito nome e a/ o sacrifício dele só me dá mais força pra que a gente trabalhe mais pra que a gente consiga eficácia. Eu me comovo porque eu sei que do trabalho do jornalista eu sei da força da da imprensa no sentido da busca da verdade. Eu me sinto também ofendido. ] [3 Apresentador – Entidades mundiais divulgaram notas oficiais hoje em protesto do desaparecimento do repórter. A organização dos estados americanos pediu urgência nas

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investigações e punição para os responsáveis. A sociedade interamericana de imprensa considerou preocupante o fato de que no Brasil os delinqüentes e o crime organizado estejam definido a liberdade de expressão. A entidade informou que está mandando um representante ao Brasil para acompanhar a apuração do caso. A associação internacional de rádio difusão pediu medidas urgentes para esclarecer o desaparecimento de Tim Lopes. A mulher do repórter fez hoje um apelo no Rio de Janeiro. ] [4 Mulher de Tim Lopes – O Tim tá vivo. Eu to convencida o Tim tá vivo. Sabe, eu peço, eu continuo pedindo o empenho de todas as pessoas, de todos os poderes, né? de todos os amigos, de todo mundo. Eu não posso subir lá na favela agora e buscar o meu marido, de trazer pra perto de mim de novo, então eu tenho que confiar que as pessoas vão fazer isso por mim. É a única coisa que eu posso fazer é um apelo a essas pessoas que estão me ouvindo, a essas pessoas que têm coração, que têm família também se coloquem um pouquinho, sabe? No lugar da gente, no lugar de Tim, sabe? E não tenham medo, como Tim nunca teve medo, sabe? De ir em socorro das pessoas pra denunciar e pra poder reverter uma situação de injustiça, sabe? Ele sempre foi a voz dessas pessoas e vai continuar sendo, pela vida dele dele pela luta dele por tudo que ele brigou e vai continuar brigando, ele não merece está passando por isso. ] [5 Apresentador – Também hoje o filho de 19 anos de Tim Lopes escreveu uma carta aos responsáveis pelo desaparecimento do jornalista (leitura da carta). ]

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REPORTAGEM DE TELEVISÃO F-03 Reportagem do Fantástico – Rede Globo, 09/06/2002 [1 Apresentador – ( ) Sobre a morte do Jornalista Tim Lopes. ] [2 Repórter 1- 51 jornalistas foram mortos no exercício da profissão até o fim do ano anterior. Os nomes das vítimas estão no memorial do fórum da liberdade em Washigton. A lista já soma 1.446 nomes de jornalistas assassinados deste 1812 na linha de frente da luta pela liberdade de informar. Ainda não entraram nessa lista os jornalistas assassinados este ano entre, eles um colobiano morto por traficantes de drogas, 4 russos mortos pela máfia local e m americano, Daniel ( ), assassinado no Pasquitão. A eles vão se juntar agora o nome do brasileiro Tim Lopes. A morte de Daniel ( ) traumatizou os americanos. O correspondente do ( ) foi seqüestrado no Pasquitão em janeiro. Os seqüestradores exigiam a libertação de integrantes da rede terrorista alcaida, presos numa base americana em Cuba. Um mês depois do seqüestro foi descoberta uma fita de védeo mostrando a execução do jornalista. Um crime bárbaro. Daniel ( ) foi torturado e decapitado. Quatro dos seqüestradores foram presos e estão sendo julgados ( ). Foi o 10º jornalista a morrer na cobertura da guerra contra o terrorismo no Afeganistão e no Pasquitão.] [3 A jornalista Lena Williams representa o jornal New York Times no sindicato nacional dos jornalistas dos EUA. Ela falou da repercussão aqui da morte de Tim Lopes. “Os jornalistas americanos ficam indignados quando ouvem uma notícia dessas. Estamos tentando fazer nosso trabalho com objetividade, sem tomar partido e quando matam alguém, que está denunciando o tráfego de drogas, chamando a atenção para um problema que é mundial, matar alguém assim é abominável” (fala em inglês da jornalista). Para Helen Nelson, diretora da escola de jornalismo da Comlombia University, quando um jornalista importante como Tim Lopes é morto, perde-se uma tremenda bagagem de conhecimento e experiência. Isso não pode ser copiado de um dia para o outro pelo repórter mais jovem. Ele tinha um dissernimento especial para cobrir assuntos difíceis. O tráfego de drogas é talvez o assunto mais difícil de cobrir. “É uma tremenda perda. Ele estava lutando pela comunidade. O cumprimento da lei é absolutamente crucial. É importante que o governo leve esse caso adiante e faça o processo com justiça, mas com muito rigor, investigue com energia. Em alguns países a corrupção faz as pessoas envolvidas no processo legal entenderem que é a vida delas e a de seus filhos que estão em jogo. No caso como esse processo legal tem que mandar a mensagem de que isso não vai ser tolerado.] [4 Durante a semana entidades mundiais ligadas ao trabalho da imprensa se manifestaram sobre o desaparecimento do repórter Tim Lopes”. Repórter 2 – A organização ( ) defensora há trinta anos da liberdade de expressão com sede na Inglaterra. “Lamentamos sempre que os jornalistas são vítimas de violência inclusive em guerras não declaradas como o tráfego de drogas. Do Sindicado Nacional dos Jornalistas da Grã-Betanha – Irlanda: “saudamos a coragem dos colegas brasileiros que persistem nas invetigações sobre o crime e a corrupção em condições óbvias de perigo”. A revista New Lick solicitou o apoio de todos os jornalistas: “a imprensa brasileira precisa ser solidária ajudando a descobrir o que aconteceu com o jornalista Tim Lopes”. A organização dos estados americanos pediu urgência nas investigações e punição para os repórteres e para a sociedade interamericana de imprensa: “consideramos preocupante o quadro de que no Brasil os delinqüentes e o crime organizado estejam definindo os limites de expressão. [5 Repórter 3 – Repórteres como Tim Lopes aprendem desde cedo que a busca da verdade pode passar por caminhos perigosos. Repórter 4 – É uma missão que dignifica o jornalismo Repórter 2 – Repórter de origem humilde, Tim Lopes era um profissional ocupado em retratar as dores profundas do povo. O bom repórter é um investigador de fronteira que atua numa zona cinzenta entre o legal e o ilegal, o ético e o criminoso, a fraude e a verdade. Com freqüência é ali

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que se descobre a notícia que vem ser aquilo que você não sabia antes de uma boa reportagem. Foi graças ao esforço de profissionais desse quilate que os americanos souberam do que ocorria no Vietnã, os italianos, hoje, possuem um retrato mais realista ( ), e os colombianos puderam conhecer melhor os narco-traficantes. Tim Lopes não desapareceu porque havia violência no Rio de Janeiro, mas porque tinha uma vontade ainda maior de descrevê-la para seus habitantes. É a busca corajosa da mlehor versão possível da verdade que honra a missão. É nesse terreno que os jornalistas se distinguem dos burocratas, superam a si próprios e produzem histórias de carne e osso, ajudando a tornar os homens livres, porque ficam aptos a conhecer e a entender o mundo em que vivem. Tim Lopes desapareceu num ponto obscuro do Rio de Janeiro, cumpriu od ever profissional de estar onde o povo está.] [6 Repórter 3 – Um ato ecumênico hoje em Ninopólis na Baixada Fluminense foi a 1ª homenagem à memória de Tim Lopes. Repórter 5 – Mãos e corações aos céus para homenagear Tim Lopes. Frei Daí celebrou o ato ecumênico na Baixada Fluminense, já sobre o impacto da notícia da morte do amigo (vozes). Durante uma hora, 300 pessoas e uma só intenção rezam pela alma do jornalista. Fotos dele foram levadas ao altar e cobertas por pétalas de flores. A carta escrita por Bruno, filho de Tim, foi lida durante a cerimônia (leitura da carta). A mulher do jornalista também fez uma declaração emocionada (voz da mulher). Frei Davi conhecia Tim Lopes há 15 anos, o admirava como amigo e jornalista. Frei Davi – Essa última reportagem ( ) por um lado o cru/ o/ a visão crua, o início da morte dele, mas por outro lado eu digo o/ que tem um lado bonito. Foi o início da retomada da sociedade dos direitos é de expressão. Com este grito, com a morte do Tim, vamos dizer um basta a todas as normas impostas aos bandidos em todas as favelas do Brasil e vamos tentar mudar essa situação, tomar de volta pra nós a cidadania. Repórter 1 – Há dois dias a Associa ção Brasileira de Imprensa convocou um ato de protesto pelo desaparecimento de Tim Lopes, um jornalista que despertou a admiração em todos os setores da sociedade. Senador – Eu pessoalmente era amigo de Tim Lopes, eu vi Tim Lopes começar a carreira. Ele trabalhava pela Última Hora e senti muito ( ). O senado vai tomar as providências que forem necessárias, embora não seja no momento uma providência do poder executivo do Rio de Janeiro. A polícia do Rio de Janeiro tem que tomar essas providências, a políc ia tem que dar uma satisfação á sociedade. Repórter 2 – Foram sete dias de agonia e também de esperança que a resposta a esta pergunta fosse a mais positiva possível. Mas agora a gente já sabe onde ele está: no céu, cavando alguma pauta, e nada mais justo afinal Tim é o apelido do homem que na pia de batismo recebeu o nome de arcanjo Antônio Lopes do Nascimento. (vozes cantando)] [7 Repórter 4 – Agora há pouco ao chegar em Brasília o presidente Fernando Henrique Cardoso disse que a morte de Tim Lopes é uma tentativa de calar a imprensa. Presidente – Olha, mais um crime hediondo, o assassinato do jornalista Tim Lopes teve mais uma conotação específica, porque se tratava de um repórter investigativo é uma maneira, uma tentativa de silenciar a imprensa na questão da da droga. Nós estamos passando todos os limites, é um momento de nos darmos as mãos uns aos outros. O governo federal, estadual, municipal e a sociedade e colocarmos um ponto final nessa série de barbaridades que estão ocorrendo. É a forma é como foi feita, o assassinato do jornalista indigna a todos os brasileiros.] [8 Repórter 5 – O brutal assassinato de Tim Lopes deixa consternados todos nós, seus companheiros de trabalho e todos os jornalistas brasileiros e cidadãos de bem desse país. Nesse momento, nossos pensamentos vão especialmente para a família de Tim, que tem toda a nossa e irrestrita solidariedade e apoio. Tim morreu em pleno exercício da profissão que tanto amava, na defesa de

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uma população que vive impotente, sob o terror do tráfego e do crime organizado. O jornalismo investigativo tem prestado inestimável serviço ao país, com a denúncia contundente de crimes, corrupção, prevaricação de autoridade e serviços mal prestados aos cidadãos. A grande parte da imprensa brasileira tem se dedicado a esse trabalho, com as técnicas suais da apuração jornalística ou se valendo de aparatos eletrônicos, no caso da Globo com uma microcâmera de vídeo, no caso de jornais e revistas e emissoras de rádio, com microcâmeras fotográficas ou microgravadores. E esse trabalho ressalta talvez o lado mais nobre do jornalismo: empenhar-se com tenasidade, mas dentro de limites rígidos que minimizem os riscos, para revelar os lados obscuros de nossa sociedade. O único objetivo é torná-la mais humana e mais justa. Nós temos certeza de que mesmo diante desse atentado, a imprensa brasileira não abrirá mão do seu papel. Nós da Globo continuaremos firmes nesse propósito. Tim era um apaixonado pelo jornalismo investigativo e se orgulhava dos resultados positivos de cada denúncia que fazia. Não permitamos que sua morte tenha sido em vão, que sirva ao menos de alerta para que as autoridades dêem um basta definitivo à violência e à criminalidade. Nós vamos cobrar.]

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REPORTAGEM DE TELEVISÃO F-04 Reportagem – Fantástico – Rede Globo 09/06/2002 (Música) [1 Repórter 1 – Do outro lado do planeta na Antártida, o céu também brilha (música). A Antártida acorda lentamente do inverno. Este é o lugar mais frio do planeta. A temperatura de menos 50 graus. O sol que reaparece ainda não aquece. Pouquíssimos animais conseguem sobreviver nessas condições extremas.] [2 De pé no mar congelado, os imponentes pingüins imperadores enfrentam corajosos as fortes tempestades (imagens e música) e só resistem porque ficam assim juntinhos, um grudado no outro. Eles se revesam na fila da frente para assegurar o frio e o vento. Os pingüins, diferentes dos animais do atiço não são ameaçados por predadores terrestres. A Antártica é redodeada pelo oceano Antártico e nenhum bicho que vive na terra consegue chegar até aqui.] [3 Um outro animal agüenta o inverno no pólo sul, a foca Wendell. Debaixo da água ela está protegida das tempestades lá de cima, mas precisa de um acesso à superfície para respirar (imagens).Ela cava um buraco com os dentes somente rapando o ge lo sem parar. A foca mantém o buraco aberto (pausa). Mas fazendo isso não consegue caçar nem comer direito. As focas Wendell morrem cedo (música).] [4 No inverno, o continente antártico dobra de tamanho, porque o mar congela. Terra e mar se confundem, encobertos pelo gelo (barulho e imagens do mar). Mais ao norte pra lá do mar de gelo, os pingüins Barbados passam o inverno no mar aberto. Os ice-bergs que passam por ali de vez em quando são um bom lugar para eles descansarem, se conseguirem subir. Mas nessa época do ano onde eles querem estar mesmo é em terra firme. O difícil é chegar lá. É na primavera que os pingüins procriam. Por isso precisam chegar no litoral. Sair do mar é só uma questão de oportunidade e de pegar a onda certa. Mas isso é só o começo da viagem. A maioria deles vai ter que andar muitos quilômetros até encontrar um lugar pra fazer seus ninhos.]

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ENTREVISTA FALADA F-018 Projeto Integrado LINGUAGEM DA MULHER – UFPE DATA DA COLETA: 03/05/1988 COLETADO POR: IVONETE LOCAL: VILA DA PRATA TIPO: ENTREVISTA REVISTA POR: ÂNGELA MOURA DATA: 01/11/1989 DOC.: /... [1 pelo menos gostaria de encontrar na companheira a inteligência? L1: justo [... eu acho que: antes de qualquer coisa... a inteligência [... DOC.: [uhum [uhum L1: porque eu acho que aí é:: ponto de partida de tudo DOC.: uhum L1: tudo pra mim é tão importante quanto tudo no mundo [... a inteligência DOC.: [uhum L1: porque: ... éh tantas e quantas vezes a gente passou... eu e eu e’a D. passamos por situação... difíceis... ta certo? e conseguimos superar... através da convivência através... do amor mesmo que nós sentimos um pelo outro e a necessidade da gente junto + superarmos ((bem baixo)) a: as dificulda[dês DOC.: [uhum éh e você também... amava ela? L1: amo DOC.: ama ((risos)) é como sábado passado a gente teve que/ mas alguma coisa que você se sentiu assim atraído por ela? fora essas qualidades que você citou? ((barulho)) L1: in por incrível que pareça éh é a rejeição dos pais... a nossa não teve nenhum problema ((pigarreia)) ... realmente ... o preconceito aí ... que havia né? + preconceito puro o a família ((muito baixo)) pensa que eu não tinha condiçõ/ ela poderia esco/ ter coisa melhor e: essas coisa toda e ela mostrava a família que tudo bem que a gente se parecia muito em relação a isso ela num... num media esforços de dizer que L. é uma pessoa inteligente... uma pessoa que: podia ajuda-la também [... seria a intenção da gente DOC.: [( ) L1: e ela me ajudar

ela ( ) me via uma relação recíproca com relação a isso então eu acho gue é isso gue a gente se ligou

DOC.: oquei ...muito bem .] [2 como você é a única pessoa que tem renda na casa ... a gente já ficou: sabendo que: ...ela te aju:da a pagar umas contas ...num é?

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num sei se você tinha alguma coisa a mais a acrescentar o que é que você faz com o dinheiro que você recebe?

L1: ((4 seg.)) primeiro as obrigações [... depois as devoções ((riem)) DOC.: [sim L1: eu sou devoto de uma cervejinha [... de uma caça de um futebol [... DOC.: [aham [sei L1: de um teatro [... de cinema [... e a vaidade né? DOC.: [aham [sei L1: a gente de repente a gente começou contando com pouco ...certo?

mantinha as aparências [ ... DOC.: [aham L1: então é disso aí que ele gasta ...o resto tudinho

daquilo gue se se chama renda DOC.: apesar/ eu gostei primeiro

você disse as obrigações então você estabelece uma prioridade né? tô vendo ô L. e ainda nesse esquema você faz alguma reserva de dinheiro?

L1: primeiro eu não sou mágico ((risos)) DOC.: ((rindo)) não somos não é mágico num é?

então é como se não sobrasse [né? L1: [ é ((ri)) faço tudo pra fazer milagre DOC.: ((rindo)) ô L.

e tu recebes assim alguma aju:da por parte de paren:tes? ...político né? num tem nada a ver

L1: não não não tenho nenhuma ajuda externa DOC.: não tem nenhuma ajuda externa ... ta bom... oquei] ((barulho no gravador))

[3 agora L. eu gostaria que você me contasse um pouco ... so:bre ...a questão de habitação ... onde você morava an:tes? todo esse processo de colocação: eu gostaria que você expusesse com clareza

L1: é como eu disse a você nós viemos de um bairro de um bairro pobre ...( ) apesar de: ser situado no Cordeiro ... esse trecho aí foi des chamava-se rua da Lama... ele fica entre aquele do Cordeiro e Bongi [... hoje Gomes Taborda [...

DOC.: [uhum [uhum L1: é um bairro que: ...n na época o problema de habitação

não ...não era tão causticante como é hoje [... DOC.: [uhum L1: mas se fosse ...daria o nome/ daria também o nome de favela ...

só que nós moramos ...cerca de:: eu tenho trinta e dois anos num é? moramos cerca de vinte anos em casa alugada

DOC.: sei L1: eu sou o mais velho da família né?

e vivemos em casa alugada [... DOC.: [uhm L1: depois meu pai ...func ionário público federal... ( ) na

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oportunidade ... é ( ) hoje ganha pouco na época ganhava bem menos [...

DOC.: [sei L1: e através do empréstimo ( ) ((muito baixo)) comprou através do

empréstimo ele comprou sempre urna casinha [...

DOC.: [uhum L1: mais ou menos na época cinquenta cruzados quer dizer cruzeiro [... DOC.: [uhm L1: então deteriorada mas era nossa [ ...( ) essa casinha DOC: [sei L1: e: daí nós passamos éh: s/ mais cerca de uns cinco anos

aí meu pai depois que ele comprou (pagar juro) e aí tive/ eu tive que: me separar da família porque me casei [... no casamento fui morar em casa alugada também

DOC.: [uhm lá na vila na rua da Lama ainda?

L1: não era no: Cordeiro DOC.: no Cordeiro L1: num era rua da Lama era [... Cabo Cabo Honorato [... ( ) DOC.: [certo [uhm L1: era urna área semelhante [ ... DOC.: [uhm L1: então passado esse sete a oito anos...

então voltei novamente pra urna outra ...quer dizer Alto José do Pinho DOC.: Casa Amarela L1: Casa Amarela também [ casa alugada ...também casa alugada DOC.: [isso L1: depois disso tive eu tive urna necessidade... por via das circunstâncias

mesmo ... me separar dessa outra relação e vir morar na: na Vila da Prata quando vim morar com meus pais ... depois como a casinha de meus pais era apertada ... eu aluguei um: barracozinho ( ) Que era esse barraco eu consegui minha casa ( ) ((muito barulho)) ter como inquilino ( [ )

DOC.: [tu passasse quanto tempo nesse barraco sozinho? morando só?

L1: sozinho ...em um ano oito meses [ ...aí foi quando veio o programa DOC.: [ sim L1: e eu fui cadastrado como inquilino

quando fui relocado nra essa casa que hoje eu moro como se ( ) [...

DOC.: [uhum] L1: [4 e um problema que é indefinido ...a gente tá indefinido

hoje a gente já mora há dois anos e quatro meses

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e a gente não pagou nada ainda por indefinição do novo programa DOC.: áh então deverá pagar? L1: é Vila da Prata [ ...agora Santatuzia DOC.: [uhum L1: quem tinha perdeu a casa que é recadastrado como proprietário. ..

a pessoa recebeu a casa ...tá certo? éh: a casa trocada por casa por casa [ ...

DOC.: [sei L1: quem morava ...teve vamos sul havia casas casas

porque tinha duas três famílias [... como a de algum outro DOC.: [uhm L1: que tinha família secundária

é associação dos moradores. ...juntamente com essas essas famílias é que pleiteavam junto à URB ... que conseguiram que houvesse um programa em cima do problema pra beneficiar essas pessoas

DOC.: então [todas essas ne/ es essas famílias secundárias... L1: [sei L1: ela ela foi relocada para a Vila Santa Luzia sem vencimento [ ... DOC.: [eu sei L1: e a primeira família não

e o primeiro proprietário não vai arcar nada DOC.: uhum ...e o seu caso como foi que ficou? L1: o meu é inquilino DOC.: como inquilino L1: que exis que existe um problema que não tá muito definido. ..

que seria o pagamento de ...dez por cento do salário mínimo em vinte anos [há um outro programa que nós estamos lutando por esse

DOC.: [sei L1: seria ...seria a dez por cento do salário mínimo em dois anos DOC.: un[hum L1: [nós estamos lutando por esse problema,

os inquilinos são famílias secundária e ( ) esse programa ] DOC.: [5 ô L. tu achas melhor antes ou agora? L1: isso aí é notório que é agora

agora ...((pigarreia)) me sinto estabilizado [ ... DOC.: [ uhum L1: me sinto ...bem éh: fisicamente bem psicologicamente ...

e: regular financeiramente ((ri)) DOC.: ((rindo)) é mas então a melhora foi assim-vários níveis [... não é? L1: [a ...

é ...eu tive eu tive condições de:: aprender muito ... aprender muito Vila da Prata ...entende? não sei se é (burrice) interiormente eu ... estudei fiz o segundo grau cheguei a uma faculdade ...num é mas me formei dentro da das favela Vila da Prataf

DOC.: o que é gue você quer dizer com isso? L1: eu daí encontrei meus mestres [ ...

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DOC.: [uhum L1: lá encontrei: campo pá desenvolver

como coloquei anteriormente o senhor de engenho que tava preso dentro de mim ]

DOC.: [6 ô então você se identifica com o senhor de engenho? L1: me identifico com o trabalhador

sou um batalhador das causas DOC.: uhum mas o senhor de engenho tem uma relação de opressor com os

empregados L1: não mas éh:: ...

quando eu falo ...eu falo senhor de engenho [... DOC.: [sim L1: é é pelo potencial [ que esse senhor de engenho tem DOC.: [( ) L1: aquele potencial que é preso a:través de um sistema dele ...

nós que vivemos numa cidade grande nós temos condições de ...de erguer os pen/ o pensamento [... de de: soltar ...essa nossa inteligência

DOC.: [é L1: e o senhor de engenho é é: ...é preso e é restrito a: ...aquele sistema...

que ele já viveu no outro no outro nível ele não tem nada a ver com opressão sã/ éh: opressão eu sou uma pessoa ... totalmente respeitadora do direito de cada um

DOC.: uhum ...vê se eu entendi é como se você quisesse resgatar a memória do senhor de engenho você vê outras coisas nele? ... tá certo é muito bonito de sua parte ]

DOC.: [7 você disse que se sente muito melhor então: num precisa perguntar se você gosta ou não ... agora ... o processo foi simples pra você: ... você mudar: da Vila da Prata pra Vila de Santa Luzia? ... fale um pouco disso

L1: não foi simples porque ... o fato de de Vila Santa Luzia ... ela tá situada na Torre [... onde é uma área nova

DOC.: [uhm L1: nós tivemos vários muitos problemas até cum circunvinzinhante também ...

porque a maioria deles não queria ...que ali fosse casá popular obviamente queriam que fosse ...apartamentos pros investidores [certo?

DOC.: [sim L1: que tivessem outra companhias ...

[então isso é uma luta que foi conjunta da da do conselho na época DOC.: [sei L1: que foi dos moradores da Vila da Prata [ ...com o grupo de de: de

moradores DOC.: [uhum L1: de ... Vila da ( ) perimetral Formiguei[ro DOC.: [se juntaram en[tão L1: [juntaram ...

e: em prol de uma causa ...

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já que o programa diria o seguinte é no no no programa no primeiro contato que nós tivemos cum ...coordenadores queria que nós ti/ ti/ teríamos que nos relocar ...pra Paulista ...é h pra Muribeca essas coisa toda certo? e nó:s furamos né? um um documento éh: eles tinham ( ) tivemos acesso a eles aí ele vimos o seguinte que nós não podíamos relocar a mais de quinhentos metros do local onde moramos morávamos né? já que o nosso problema era pra morar ... então a gente se: apegou a isso ... certo? e não só foi o fato de apegado é porque teve muita gente também da igreja

DOC.: da igreja? era isso que eu ia perguntar quem ajudou vocês?

L1: teve muita gente da igreja [... conselho da igreja padre Romeu ... DOC.: [uhum L1: éh grupo de casais a frente Zildo Sônia Caldas ...da irmã Paola da

congregação ...CECOSNE com assessoria ...técnica e até na formação mesmo de quadro né? formação de de de líder comunitário nós tivemos ...ajuda das pessoas pra poder porque a gente tinha que tá bem informado certo? tinha que: ...aprender ouvir e falar entende? nra esse novo pra poder debater chegar à luta que nós hoje é h podemos considerar vitoriosal

DOC.: é. eu notei que você já: fez alguma melhoria na casa ...num é? o: nessa melhoria ...você contou com a ajuda de alguém ou já é produto de tua renda de teu trabalho?

L1: não é produto de renda e trabalho DOC.: renda e trabalho tá certo ... ]

[8 quem você acha que tem mais facilidade para ...conseguir habilitação o homem ou a mulher em termos assim de família?

L1: dependendo duma necessidade [... cê hoje em dia DOC.: [uhum L1: porque existem ( )

tantas mães de família só tão vivendo na na Vila Santa Luzia mas temos sessenta por cento das da ( ) de casas que vivem só

DOC.: é verdade? L1: sessenta por cento DOC.: uhm é alta L1: quer dizer são mães solteiras ...

então éh: ...o poder ...de barganha entende? depende muito da necessidade [ ...

DOC.: [uhum L1: quando quando se tem consciente: ...

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se vê instituí/ é é constituído o casal ...tá certo ? existe a consciências dos dois ...entendeu? aí a luta é dividida quando existe a consciência de um só que é difícil hoje hoje a habitação ele é um mal comum [ ...

DOC.: [uhum L1: então hoje todo mundo tá engajado nessa briga que é habitação

eu acredito que num num há diferença ] DOC.: [9 ô L. no seu caso a sua esposa lhe ajudou: nessa luta?...

qual foi a participação dela? L1: olhe ...éh: ...na época n época que nós estávamos relocado

eu ( ) num num/ ainda não tínhamos essa relação afetiva direta [ ... tá certo?

DOC.: [uhum L1: mas tínhamos uma uma relação indireta tá certo?

e já domina/ porque eu sendo secretário da da [... da associ/

DOC.: [ da associação L1: do conselho na na oportunidade entendeu? [... ( ) DOC.: [uhm L1: éh toda essa documentação pra redigir

pra so/ pra solicitar e reivindicar isso aí partia tinha o apoio do grupo mas as idéias tinha ... que vim: acho que quarenta por cento dela tinha que vim de mim sabe? eu precisava reunir uma assessoria e essa assessoria era ela mesmo sem a gente saber do futuro de nós dois mas a gente já discutia como reivindicar ( ) ((muito baixo)) porque a gente tinha condição Mesmo né? com a imposição dos pais a gente tinha condições de suspender ela torrar uma aula a gente ir ir a um barzinho discutir [... o os problema ...em relação à moradia

DOC.: [uhum L1: com relação a pleitos ...

que: ... a nossa luta em Santa Luzia não só foi num foi especificamente moradia [...

DOC.: [uhum L1: a gente passou por saúde ...até:: saneamento [... entendeu? DOC.: [uhum L1: então a luta ela passou por cima de tudo isso

porque ...éh éh na questão do emprego de renda ...certo? [tudo isso a gente discutia

DOC.: [sei ]

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ENTREVISTA FALADA F-037 Tipo: Entrevista televisiva Tempo de duração: 5’45” Ano de coleta: Número de palavras: 924 (transcrição apenas) F1 – repórter (entrevistadora), mulher. F2 – professora universitária (entrevistada), mulher. F1 [1 depois da matemática o português talvez seja o maior problema dos alunos Que terminam

carregando pro resto das suas vidas uma certa briga com a gramática sobre esse assunto eu vou conversar com a professora a. d. ela que é doutora em lingüística] [2 por quê essas coisas da briga... que os alunos têm com a a/ o português?

F2 olha a meu ver... o principal: l entrave entre o estudo da língua portuguesa nas escolas de primeiro e segundo grau... e os alunos diz basicamente referência ao método como se se trabalha... e também à concepção de língua que se é trabalhada...] [3 a língua portuguesa não é esse fenômeno éh:: homogêneo... estático... que é vinculado pela gramática normativa... e pela/ infelizmente... pela maioria dos grandes professores de língua portuguesa mas observamos que a língua evolui... a língua muda... e a escola precisa mudar e evoluir pra trazer o aluno que já é um falante e um usuário da língua portuguesa... a se envolver com o estudo da língua portuguesa]

F1 [4 ...olha se você parte do princípio... que a língua portuguesa não é regras gramaticais... não se você se apaixona pela língua que você... já domina que você já fala ao chegar na escola se o teu professor CATIva você a ler obras da literatura... obras da/ dos meios de comunicação... se você tem acesso a revistas... éh:: a livros didáticos... a:: livros de literatura o mais formal... o e/ o difícil é porque a escola transforma como eu já disse as aulas de língua portuguesa em aNÁlises gramaticais]

F1 [5 e a escola hoje... como que ela trabalha? essa postura vem mudando? ta existindo uma nova consciência em termos de língua portuguesa na escola... ou ainda continua essa visão tradicional e conservadora da língua portuguesa?

F2 ainda bem que algumas escolas e alguns cursos... já se preocupam co::m uma... nova abordagem do ensino da língua portuguesa e um exemplo que a gente tem disso é a próprio:/ a própria formação do professor não é? se na graduação o professor já:: vê a língua como esse fenônemo di/dinâmico... que:: trabalha dentro de uma perspectiva textual e que as faculdades também começam a:: oferecer para a sua clientela... cursos de especialização... trazendo pra própria faculdade aqueles alunos que já saíram... que já são professores lá fora... então com esse intercâmbio... nós temos uma/ um começo de uma mudança no ensino da língua... ainda falta muito ((ri))]

F1 [6 o/ a coisa do certo e do errado né? às vezes as as pessoas confundem o regional... termina passando como coisa errada... comé que... está essa coisa? Está se considerando o regional... a regionalização?

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F2 como eu te disse... Tudo isso é porque não se levam em conta... as variações lingüística né? o brasil é essa dimensão toda... e:: se trabalha como uma única língua padrão... que é a que está presente nos livros de literatura tradicional... nada contra os livros de literatura tradicional... não é isso... mas nós não não podemos deixar de lado as variações lingüísticas que nós temos e as escolas ainda não trabalham]

F1 [7 a televisão... a senhora diria que atrapalha o ensino da língua...? atrapalha principalmente as crianças?... os alunos aprenderem ou ela ajuda?]

F2 por coincidência este curso... que nós estamos dando agora... Num dos momentos... nós fizemos um júri sobre os meios de comunicação... e nesse júri nós... observamos... a influência positiva dos meios de comunicação e:: a televisão pode ser um tipo de texto... trabalhado em sala de aula... onde se há na televisão programas o:u... sei lá hã... é programas que não...

F1 [8 não é uma linguagem pobre... a da televisão?

F2 linguagem pobre? eu diria que vocês tem níveis de linguagens... então linguagens que são mais adequadas a uma situação ou outra... a linguagem... ela tem uma/ a televisão... ela tem uma diversidade de linguagens... na hora que você tem os jornais... você tem as propagandas... você tem as novelas então você tem uma variedade... que pode ser aborDAda na sala de aula... se há ou não éh:: uma preocupação com o conteúdo que se passa... com a mensagem que se passa... com a ideologia que é vinculada pela televisão... isso cabe ao professor... fazer uma reflexão... com os meus alunos sobre isso... e sobre a adequação... dos vários níveis de linguagem utilizados... em situações específicas na televisão

F1 mesmo porque as crianças... estão aprendendo MUIto com a televisão... estão ouvindo televisão o tempo inteiro

F2 exatamente... e você pode pedir pra criança... fazer trabalhos comparativos na televisão... assiste um programa infantil... com as músicas de um canal x... compara com as músicas infantis... vinculada num canal y... e você tem... um confronto... co::m a criança analisando... quais as mais ricas em termos de tema... em termos de recursos literários... em termos de recursos lingüísticos... da mesma forma como por exemplo nos jornais... ce faz um confronto... qual o jornal que há uma tendência mais... a vincular mais informações pró ou contra... éh: determinada situação

F1 [9 qual a importância das pessoas... terem um domínio da da língua padrão? Isso na vida social... na vida profissional enfim

F2 olha... se você domina... a sua língua... se você é um poliglota na sua própria língua... e você tem u::m bom desempenho na língua padrão... você é uma pessoa que conseqüentemente terá um bom desempenho em éh:: termos sociais... em termos de participação nas mais diversas éh::: atividades que a sociedade lhe requer... então dominar a língua que você/ a sua língua nativa... significa você dominar o seu universos... pelo menos isso

ok obrigada brigada a vocês

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CONVERSAÇÃO ESPONTÂNEA D2-30 (CORPUS PORCUFORT) (PORTUGUÊS ORAL CULTO DE FORTALEZA) Coordenador - Prof. José Lemos Monteiro Inquérito nº 30 Informante 1 - Homem, 40 anos, fortalezense, filho de pais fortalezenses, graduado em História. Informante 2 - Mulher, 31 anos, fortalezense, filha de pais cearenses, graduada em Administração. Temas - Fortal, política, automobilismo, cinema Data do registro - 26/07/94 Duração - 60 minutos [1 Inf. 1 - bom eu queria saber... eh::... eu queria saBER... da da:: da minha amiga S. ... qual é a::expectativa né? {dela Inf. 2 - valha meu Deus Inf. 1 - ...((ri)) a expectativa dela em relação... ((falou rindo))... ao For{TAL Inf. 2 - ((tosse)) Inf. 1 - noventa e quatro... o que é que /cê pensava que eu ia perguntar? Inf. 2 - pensava que tu ia falar de política ((falou rindo)) Inf. 1 - ((riu)) Inf. 2 - eu ia dizer aqui principalmente PT {num ia dar certo ((falou rindo)) Inf. 1 - ((riu)) Inf. 2 - ((risos))... NÃO eu o Fortal... é o Fortal vai ser maraviLHO::so Inf. 1 - venha mais pa/ per{to Inf. 2 - tu acha que ( ) não ...{pronto Inf. 1 - /ta Inf. 2 - ...viu?... o Fortal vai ser maravilhoso embora eu tenha tido aquela::... problemática da minha morTAlha... que a menina que tinha me prometido vender a morTAlha quando foi hoje falta dois dia p/ o ForTAL ela inventou... que vai::... passou a mortalha adiante num vai mais me vender né?... aí eu fiquei com raiva... tudo bem... mas vou... procurar hoje à tarde com L. ... as... po{der:: comprar Inf. 1 - eu num sabia dessa história não... Inf. 2 - sabia A::I tu sabia não pois H. pois num foi ((riu)) Inf. 1 - ((riu)) Inf. 2 - ...a menina a G. que tinha me prometido as mortalha simplesmente ela... aí ela li/ ela ligou hoje pa/ E. faz dois dias que eu ligo pra ela pa/ saber da minha mortalha... ela... simplesmente disse pa/ I. que não que::... ela passou num vai mais... ao invés de ter chegado e ter dito "oh a mortalha de você está aqui" não simplesmente mandou outra pessoa vender as mortalha] [2 Inf. 1 - qual é qual é:: a::... qual é o nome do:: bloco?... Inf. 2 - Sirigüela... Inf. 1 - Sirigüela Inf. 2 - mas eu /tô querendo também Tropical pa/ sair com duas mortalha... /cabando um BLOco eu pulo e volto de novo noutro bloco... eu quero dois bloco... Inf. 1 - quer dois bloco?...] [3 agora quais são os dias que::... vai haver o desfile?... Inf. 2 - QUARta... não SEXta sábado e domingo... agora quinta-feira é que vai ter::... com/ é:: o nome daqui/ AH Alternativo... Alternativo... só que o SiriGÜEla que é justamente o meu bloco que

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é o mais CAro é justamente o que num DÁ a blusa... com Alternativa que é o Mana Banana na... quinta-feira... e OS OUtro são mais barato dão a blusa e eu dancei né?... Inf. 1 - ah isso aí eu vi no jornal... que tinha bloco aqui em Fortaleza que /tava exatamente dando... a camisa que era exatamente esse aí num sei o que banana Inf. 2 - eh o Mana Banana Inf. 1 - Mana Banana {por que é Mana Banana?... Inf. 2 - eu /tô na Alternativa porque é o Chiclete com Banana... NAna Banana... Inf. 1 – ahn Inf. 2 - que o Chiclete com Banana vai tocar... é o Alternativo DO... Sirigüela Sirigüela também é o mesmo... Chiclete com Banana... {o mesmo pessoal que toca... Inf. 1 - cer::to Inf. 2 - e é o melhor que vai ter né?... Inf. 1 - é o melhor que vai ter?... Inf. 2 - pelo menos dizem né?... eu espero ((falou rindo)) ] Inf. 1 - agora quantos componente tem o Sirigüela? e os e quanto segurança tem?... Inf. 2 - ah eu num sei mas eu escutei alguma a respeito de:: novecento segurança foi?... foi {tu que me disse? Inf. 1 - foi foi eu vi que ia ter TRÊS MIL... Inf. 2 - três mil Inf. 1 - três mil e cem... Inf. 2 - pe{ssoas né? Inf. 1 - quem me disse foi o::... o dono LÁ do::... com/ é o nome?... o besame mucho é?... Inf. 2 - Besame mucho {EH tem esse barzinho tem esse barzim Inf. 1 - EH besame mucho que falou que eram três mil e cem onde /tava a sua amiga T. lá T. ((riu)) Inf. 1 - nunca ouvi falar ( ) Inf. 2 - T. Inf. 1 - pois é aí ele me falou que eram TRÊS mil e cem... e:: novecento segurança... Inf. 2 - mas os três mil e CEM mais novecento segurança dá quatro mil pessoa {dentro duma corda só Inf. 1 - dá quatro mil pessoas ...eu até falei pra Ele que QUAtro mil pessoas... seria::... uma escola de samba do Rio de Janeiro... Inf. 2 - é meu filho é mais ou {meno/ por aí Inf. 1 - é Inf. 2 - o negócio é animado veja bem... /tá pensando o quê Inf. 1 - ((riu)) Inf. 2 - ((riu))... Inf. 1 - {QUAtro mil pessoas é::... Inf. 2 - ((riu)) é:: Inf. 1 - é uma escola de samba do Rio de Janeiro... Inf. 2 - é... exatamente...] [4 Inf. 1 - bom... aGOra... quem é que voCÊ::... quem é que você vai voTAR pa/ presidente?... Inf. 2 - {((risos)) Inf. 1 - você num ((falou rindo)) Inf. 2 - ...hoje eu /tava hoje eu /tava dizendo pro::... pro menino lá que eu te falei... que eu chamo ele de petista né? Inf. 1 – ahn Inf. 2 - hoje eu /tava dizendo pra Ele... que::-- {isso aí Inf. 1 - eh ...isso aí num quer dizer nada não... pode deixar ( )

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Inf. 2 - você sabe Inf. 1 - o volume de::... Inf. 2 - é o volume da gravação que {ENtra... que regula é dePOIS Inf. 1 - É... que entra o volume é constante {é Inf. 2 - /tá entendendo?... BOM pelo menos hoje em dia né? ninguém sabe {também agora né?... Inf. 1 - é Doc. 1 - o estado também Inf. 2 - problema é esse {((risos))— Doc. 2 - ((risos)) viu H. ... enTÃO o que foi que perguntou mesmo pra mim?... {AH do presidente Inf. 1 - perguntei quem é que /cê ia votar? Inf. 2 - eu /tava hoje dis{cutindo com a E. e com:: bichim que eu Doc. 1 - ((riu)) Inf. 2 - num sei mais o nome dele aquele menino que é petista que num dá certo comigo e diz que a burguesia com a pobreza... num dá certo... Inf. 1 - qual o nome dele? e o:: J. Inf. 2 - o J. Inf. 1 – é Inf. 2 - o J. diz que eu tenho né? raiva da:: mas num É Isso né? bem o caso... o que ele quer dizer ((falou rindo)) a história do J. todim começou... PORQUE a gente assistindo a novela no sítio o:: esse mesmo que a gente fez aqui todo mundo SINE... todo mundo do SINE oh... eh o pessoal da sala do H. a gente QUIS fazer um... com TOdo com o pessoal do SINE mas só foi... o pessoal da sala do H. mas umas amiga minha nós fomo/ todas p/ o sítio... e AÍ que depois do jogo do Brasil foi naquele jogo do Brasil no domingo... primeiro isso aí dia de SÁbado... {foi::... Bra/ Inf. 1 - foi Bra::sil e Holanda Inf. 2 - Brasil e Holanda Inf. 1 - dos três a dois Inf. 2 - foi exatamente... o desespero né?... Inf. 1 – é Inf. 2 - eu só sei que::... esse rapaz foi discutir comigo e uma amiga minha pa/ falar de:: ele é mei/ PT mei/... Rosa da Fonseca mei/ PT {mas ele Inf. 1 - ele É do:: PCB... Inf. 2 - PCB que é pior do que PT né? Inf. 1 - ((sorri)) Inf. 2 - ((risos)) aí o que é que aconteceu ele... discutindo... aquele problema da noVEla num tem a Letícia com o pescador... e o raio do homem do:: do menino dizendo QUE... a Letícia DÁ muito bem certo com o pescador uma filha de milionário com um:: lascado daquele um pobre liso... quer dizer num daria jamais né?... certo Ave Maria em tempo algum... AÍ HOje ele se encontrou comigo aí veio dizer assim foi dizer pa/ E. que eu digo que burg/ burguesia não se mistura com a pobreza... mas eu num quero dizer que a burgueSIA... é uma questão de... NÍvel... intelectuAL... lógico que o dinheiro influi muito né::? uma pessoa:: fodida Inf. 1 - ((riu))... Inf. 2 - ((riu))... a::i quer dizer ... ((falou rindo)) ele num SAbe... eh:: com/ é que eu posso dizer eh::... lógico que sabe o {que é bom na vida né? Inf. 1 - é o que eu queri/... o que eu digo é... eu Acho o seguinte que a gente /tava discutindo né?... esses asPECto... era QUE::... o problema não Era... queiMAR... a burguesia em si né? num é::... que:: os os rico fique mais pobre mas sim que os pobre fique {mais rico né?... é Inf. 2 - mais rico e os rico fique do jeito que /tão que /tá bom demais

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Inf. 1 - é claro que vai ter que ceder alguma coisa também eu acho que tem que ceder agora num POde é você querer iGUALHAR todo mundo... Inf. 2 - não isso num dá isso {é Inf. 1 - porque:: não DÁ:: e já foi provado né?... em todo canto que num dá o que você tem que fazer é procuRAR... digamos... fazer uma socieDAde... segundo o Lula mais justa né?... MAS eu Acho que o justo é nesse aspecto Inf. 2 - num precisa derrubar os {outro né? Inf. 1 - num precisa::... passar por cima eu acho que /cê tem que melhorar a qualidade de vida... das pessoas mais PObre... DAR emPREgo ((ruído))... NÉ::?... DAR uma:: assistência MÉdica ((ruído)) uma qualiDAde...de :: digamos assim de razoável aCORdo... e aí assim eu acho que... parte por aí né? Inf. 2 - é exatamen{te Inf. 1 - e /tá provado que:: agora mesmo com a... com a queda aí da:: ((ruído))... União SoviÉtica... que essa discriminação de categoRIA nunca existiu né?... era isso que eu /tava falando com ele né?... Inf. 2 - que o {quê? Inf. 1 - inclusive... porque eu inclusive /tava conversando com {ele discutindo Inf. 2 - com o J.? Inf. 1 - ...E... eu acho que exatamente devido a essa FALta... de ter as categoRIAS porque:: eu acho que o:: a figura do HOmem... ele nunca é iGUAL... n/é como cachorro que você bota dez cachorro eles vão se comportar sempre igual e se você bota dez homem vai aparecer um líder... eh QUERENDO OU {NÃO VAI APARECER um líder Inf. 2 - pronto... vai aparecer é lógico Inf. 1 - e vai MANDAR e o outro vai ser mandado né?... a gente até conversando um:: um dia DEsse... eu::... eh::... conhecendo um pouco a estrutura do colégio de FREIra... a gente vê aquelas freirazinha tudo farDAda... né? com aqueles a::/ aqueles aven/ eh:: avental não {com/ é Inf. 2 - eh ...hábito Inf. 1 - HÁbito né?... {e a gente Inf. 2 - é Inf. 1 - pensando que era tudo igualzim... e eu fui... desmiuÇAR a coisa mais assim né?... Inf. 2 - mas cada um é uma pessoa di{ferente Inf. 1 - e aí você tem a diretora... /cê tem a secreTÁria... e tem aquele pessoal menos qualifiCAdo que vai varrer o chão lavar os banheiro ser cozinheiro... então... Inf. 2 - {aTÉ dentro de um:: né?... dum ambiente Inf. 1 - PERANTE... É perante a a a a quem quem /tá de fora a gente pensa que é tudo tudo iGUAL mas num é tudo igual... Inf. 2 - é... Inf. 1 - i/ inclusive na PRÓpria União Soviética... quer dizer o:: o pessoal... que fazia parte do parTIdo... tinha os privilégio de comprar no supermerCAdo... diferente dos outros comprava produtos {imporTAdo Inf. 2 - num tem (como) pra isso {não:: é tudo igual Inf. 1 - é o:: o próprio:: Líder tinha uma coleção de CArros importado quer dizer... {a a:: Inf. 2 - sempre vai existir... Inf. 1 - a a coisa iGUAL...num {existe... eh Inf. 2 - num existe... num existe num venha me dizer que existe NÃO... essa história de... Inf. 1 - eh a a a coisa iGUAL de fato num existe... {eu Inf. 2 - num existe não Inf. 1 - ...penso assim...]

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[5 Inf. 2 - também... coincidência NÉ … toa que eu... passo o tempo todo... discutindo com o J. ... o J. passa o tempo todo discutindo comigo... eu já disse pra ele "num adianta num adianta" é igual à história do jantar... "vamo/ jantar" eu digo "eu num vou jantar com povo petista num vou... num vai dar certo {eu vou discutir com o povo lá Inf. 1 - e/ eu ainda vou jantar né? Inf. 2 - tu ainda vai p/ o jantar e vai {se lascar Inf. 1 - o companheiro Inf. 2 - acho bom cair uma BOMba lá falar muito porque só vai DAR ( )((falou rindo)) Inf. 1 - ((risos))... não mas eu tenho eu tenho eu num SOU:: digamos assim... eu não sou nem o J. {e nem sou você né?... eu JÁ Acho que:: Inf. 2 - É você é você né? Inf. 1 - eu já sou mais... Inf. 2 - eu sou um tanto quanto realmente radi{cal nesse ponto... né? Inf. 1 - é ...nem radical pra mais nem radical pra menos eu acho que tem que ser mais ou menos a{té:: Inf. 2 - você vai se moldando né? Inf. 1 – é Inf. 2 - de acordo {com a coisa Inf. 1 - eu acho que tem que ter::... Inf. 2 - eh:: de repente podia até que ser mas eu num consigo... isso aí é o normal mesmo meu ((risos)) num adianta não] [6 Inf. 1 - o pessoal que /tá debaixo... {/tá entendendo né? Inf. 2 - eu sei quem /tá debaixo mas é aquela tal coisa que eu falei que o J. chegou pra mim e disse assim... "aí porque eu fui rodar todos os interiOres... e:: foi que aconteceu?... a miSÉria isso LÓgico... a miséria fome existe eu sei que existe... mas é aquela história que eu te falei hoje dentro do carro... se eu cheGAsse e dissesse assim "vou LÁ num interior desse"... chego eh:: a Mariinha Francisca sei lá porque normalmente no interior os nome são assim né?... VOCÊ QUER:: ((risos)) toMAra que num tenha ninguém do inte{rior Inf. 1 - ( ) Inf. 2 - ...MAS lógico que tem uns nome bonito... eu só /tô dizendo o:: normal iGUAL a a a... português né? Joaquim Francisco... aí acontece {quando Inf. 1 - é Chico de PEdro... Mané de João Inf. 2 - pois pronto {essas... é assim ((falou rindo)) Inf. 1 - pa/... pa/ botar o nome do pai né? Inf. 2 - aí /cê chega no interior como EU MESma já cheguei em interior de chegar e... de CHAMAR aquelas... menininhas de QUINze dezesseis ano... pra trabalhar na sua casa /cê dá ROUpa você dá comida você dá onde ela dormir televisão pa/ assistir tudo no mundo... num querem Inf. 1 - ...e o salário né? Inf. 2 - e o salário a{inda por cima Inf. 1 - ah sim Inf. 2 - o saLÁrio... tem TUdo isso e o salário... fica hospedada na sua casa... pelo meno/ EU trato muito bem... pode ser até que tenha CAsa aí que num trate mas eu acho... mas num querem:: num quer trabaLHAR... num querem saber de nada... ficam naquelas poBREza na miséria lógico... problema delas... que que a gente pode fazer?... a gente até que TENta tal e tal... lógico que existe as fatalidades como aquele caso da Irlan né? Irlan Inf. 1 – é Inf. 2 - {que a mulher matou a pobre da doméstica né? que foi... Inf. 1 - que matou a::

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Inf. 2 - tempos e tempo que eu acompanhei no jornal... quase todo dia saía uma pontinha sobre aquilo... MAS... o que se pode fazer lógi{co:: Inf. 1 - há tempo que /cê num lê jornal né?... Inf. 2 - tempo que eu leio jornal lá na sala ao lado... NÃO agora eu leio eu tenho direito ao Diário do Nordeste agora eu leio... esse é o meu hoRÁrio de ler jornal...] [7 Inf. 1 - agora qual é o trabalho que /cê faz aqui no SINE... Inf. 2 - AH:: ((risos)) o meu trabalho AH:: H. é tão::... é muito diversificado... Inf. 1 - o que é a O & M? o que é? Inf. 2 - Organizações e Méritos né? a gente trabalha com organização e mérito... DENtro... do CPD... você faz todo você faz manuAIS... relacionados com isso... você FA::Z formulários... tipo:: você quer::... digamos um formulário... /cê chega pra mim "S. é o seguinte... eu quero um formuLÁ::rio que diga::... com/ é que eu posso explicar só mas escrevendo" {tipo do (Mérito)... pedido de materiAL Inf. 1 - eh peDIdo::... de:: materiAL Inf. 2 - pedido dia a HOra o tipo discriminação disso daquilo daquilo então... eu PEgo... jogo no computador... FAço todo o formulário... todo::s itenzinhos e tal e tal depois sai todo correto todo feito já direto pra você... daí você utiliza então é justamente organiZAR... só que:: /tá /í /tá até mudando né? num fica mais tanto Organizações e Méritos... é o mais o {que va/ Inf. 1 - nem tem mérito nem organização mais {né? Inf. 2 - NÃO:: tem agora dentro disso ((falou rindo)) ninguém usa mais a palavra O & M né?... tem MUIto a ver hoje em dia o pessoa /tá muito::... tem MUIto se você prestar atenção a gente tem muito a ver com qualidade toTAL... já viu isso né? qua{lidade total e tal... Inf. 1 - é Inf. 2 - {então é Inf. 1 - é ( ) nove mil né? que recebe a qualidade ( ) nove mil Inf. 2 - ...é exatamente Inf. 1 - organizar e atingir é um::... esses nove mil parece que é uma... espécie duma categoria né? que quando você atinge a qualidade toTAL... aí você recebe essa... esse codinome ( ) nove mil... que é quando você::... o fato foi aPROVAdo... no controle de de... na qualidade {total Inf. 2 - é...exatamente... então a O & M é isso a O & M tem MUIta coisa pra se falar dela... aBRANge muita coisa... é tanto que eu faço algumas pra... J. né? doutora J. Inf. 1 - doutora {J. Inf. 2 - quando eu vou ela pede pr/ eu fazer uns formulário pra Ela e tal ela chega bom esBOço alguma coisa... e dali eu tiro eu faço né? eu faço o arranjo da coisa... o lay out e tal... Inf. 1 - da coisa em si como diz a A. Inf. 2 - a coisa em si...] [8 Inf. 1 - BOM então deix/ eu falar agora do meu traBAlho {da minha pra:: Inf. 2 - é acho bom né? Inf. 1 - ...né?... falar um pouquinho Inf. 2 - ((ri))... Inf. 1 - bom... aPESAR da gente ser técnico operacional né? eu e ela a gente... técnico operacional mas desenvolve... eu acho que é só na nomenclatura porque cada qual desenvolve um trabalho {diferente do outro né?... Inf. 2 - ((tosse)) Inf. 1 - enTÃO como eu a minha formação é em HisTÓria... então:: eu busco sempre procuRAR... as FONtes de pesquisa né?... então eu vim:: aqui para o SINE e notei que os::... os pesquisadores que são TOdos econoMIStas... tinha NAda a ver comigo... Inf. 2 - pensadores {((riu))

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Inf. 1 - é os pensadores... e incluSIve:: eu costumo dizer que aqui também tem muito é fiLÓsofo e pouco economista né? porque na verDAde a gente desenvolve mais um trabalho de filosofia do que propriamente de Inf. 2 - econo{mia Inf. 1 - economista... enTÃO... eh:: eu pensei numa maNEIra... de:: suPRIR... as necessiDAdes... DEles... em relação à economia... então::... eu vinha duma:: dum:: dum traBAlho... que era um trabalho de pesquisa... em cima de jornais... né? então relacionado à História e aqui então eu transformei... esse traBAlho... PARA... o lado da:: Economia... economia trabalho emPREgo desemprego... PIB... e:: outras VAriante de economia né?... e então eu leio... por dia aQUI os jornais... O DIÁrio... A Tribuna Inf. 2 - Follha... Inf. 1 - O Povo... A Folha... A Gazeta Mercantil e o Jornal do Brasil... então a gente faz... de todo esse jornais... a gente faz uma triAgem... e seleciona... todo esses jornais... então reCORta... aquilo ali é colocado numa FIcha... e aquela ficha... ela é... ela:: é cadastrada... com um NÚmero... e um assunto... então no fiNAL... do MÊS no final dos trinta dias... eh:: eh... a gente junta TOdo esse materiAL... faz uma SEleção desse materiAL... e então publica um boletim... interno... sobre TOdos os assuntos que circularam... Inf. 2 - durante o mês Inf. 1 - durante aque{le mês Inf. 2 - EU /tava até vendo ontem chegou né? na minha mesa... Inf. 1 – é Inf. 2 - aí sai assim... o primeiro foi assim... "URV... eh:: vai muDAR dia tal tal tal" eu digo "valha como chega atrasado" chega atrasado que eu digo logicamente que aquilo a{li Inf. 1 - é porque a gente {FAZ Inf. 2 - aquilo é um resumo do mês inteiro {né? Inf. 1 - do mês passado sem{pre o mês anterior Inf. 2 - ((tosse)) é ...aí eu achei até engraçado... Inf. 1 - enTÃO agora no fiNAL... aí nós temos as tabelas... então:: são::... são em torno de OIto tabelas... aí tem a cotação... diÁria do dólar... a cotação da URV... a cotação da TR... né?... tem o o:: MerCAdo... eh eh:: as taBElas sobre emPREgo... sobre desemprego... sobre sobre emprego em Fortaleza... emprego no interior... e eh::... sobre desemPREgo nas capiTAIS... nas grandes capitais... Produto Interno Bruto... Produto Interno Bruto do Ceará então tudo isso... eh:: per capta... então todas essas informações que são::... eh:: relacionadas ao trabalho... do trabalhador... seguRANça do trabalho... QUALIDAde do trabalho... TOdo tudo isso a gente... publica nesse boletim mensal... Inf. 2 - ((tosse)) Inf. 1 - E O que não é publiCAdo... é passado... PAra... quer dizer é resumido e publicado o que não é... publiCAdo... porque:: Isso a gente FAZ uma média de oitenta a cem artigos por MÊS... e a gente só publica... cinco ou seis porque... se não fica muito extenso... Inf. 2 - porque tem que resumir ao má{ximo né? Inf. 1 - tem que resumir ao máximo... e então o restante... repassado... exatamente para os TÉCnico... que:: elaBOram... os boletins menSAIS... trimestrais semestrais e anuais do SINE... aí então isso AÍ... SERve de emBAsamento... quer dizer NUM É que eles vão publicar o que tem ali mas a leiTUra... daquele conteúdo possibilita uma::... formação de uma BAse... para que seja escrito:: o artigo que ele... /tá pensando né?... a iDÉia... e ÀS vezes ele já tem a iDÉIa... porque ele SAbe... que HOUve... uma... digamos esTÁ haVENdo:: um momento desemprego na faixa etária entre trinta a quarenta anos... e naquele jorNAL... TEM alguma coisa falando daquilo então o jornal passa a ser o subSÍdio... do ARtigo que ele vai escrever né?... seria mais ou menos isso... {mais alguma coisa?... Inf. 2 - é não

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Inf. 1 - hein? Inf. 2 - /tô vendo a gente tem que falar ((falou rindo)) é muito aqui ((risos))] [9 Doc.1- eu gostaria que /cês {falassem mais sobre assim que ligação Inf. 2 - eh Doc.1- existe entre vocês e o PT? /cês falam tanto {no PT Inf. 2 - PT ah NAda {eu num tenho NAda com:: com ele ((risos)) Inf. 1 - ((riu)) Inf. 2 - não quando eu falei no PT... é porque... quando a gente... coincidentemente quando a gente foi a essa reunião lá no sítio... EH::... o PT... o PT imperava ah:: o PT que eu digo é... Inf. 1 - não {na ne/ na verdade Inf. 2 - o pessoal num é PT... como o H. diz num é o pessoal do {PT Inf. 1 - mas na verdade não não é o pessoal do PT... porque::... esse pessoal que foi com a gente... faz PARte... Inf. 2 - que a {gente fazia parte Inf. 1 - do GRUpo... não eles fazem parte... do do da aliança entre o PCB... e o PSTU... E... tem... LEVAR... a:: ROsa... pra governaDOra... a Maria Luíza para o SeNAdo e o Me{nelê que é um amigo Inf. 2 - Menelê Inf. 1 - NOsso que é daqui do SINE é candidato a deputado {federal Inf. 2 – deputado Inf. 1 - ...então essa aliança aí... como /tá tudo ligado …às esQUERdas né? {aí /tá /í né? Inf. 2 - aí por isso ...quando a gente fala PT que eu digo PT é um pessoal /tá entendendo? num é que seja... necessariamente PT PT não... aí quando eu brinco com H. eu digo esses teus amigos PT ((ri))... aí coincidiu lá no sítio aí rolou muito::... papo desse tipo de COIsa de PT e ver aquilo o pessoal faLANdo... S. fa{lava e a:: falava e Inf. 1 - é porque a:: eh eu acho que por exemplo a pa{lavra Inf. 2 - ((tosse)) Inf. 1 - essa palavra PT né? foi bem:: assim... desgasTAda esse nome assim de radical né? Inf. 2 - é exata{mente Inf. 1 - radical de::... de esquerda né?... como o::... PDS né?... virou radi/... eu diria que é o PPS agora né? {virou radical de Inf. 2 - é Inf. 1 - direita né?... Inf. 2 - pois é é TANto {que eu Inf. 1 - É as duas {pontas Inf. 2 - quando tu chega assim Ai S. fui p/ o Besame mucho num sei que OpÇÃO na praia de Iracema pra mim os barzinho da praia de Iracema é freqüentado por pe tista... tem nada a ver uma coisa com a outra mas petista pra mim... aquele pessoal gaLE::ra /tá entendendo aqueles caras assim barBU::do... pessoal que quer inovar tudo num inova NAda -- ah minha Nossa Senhora /tá gra{vando aí-- ((riu)) Inf. 1 - sei ((falou rindo)) Inf. 2 - sabe? cheiro de coisa ((riu))... não eles podem até ter boa vontade só que:: /tá entendendo?... num vai...] [10 como o Lula... o Lula /tava hoje dizendo pa/ E. "E. já /tô pa/ votar no Lula"... num é por outra coisa... eu sei até que:: ele pode fazer muita COIsa... /tá entendendo? muita coisa mesmo... MAS... é a é aque/ essa força de vontade que ele tem perseverança ele... vai SAbe?... essa caravana da cidadania e tudo... quer dizer eu acho que tem como ele chegar de repente só que ele /tá caindo né?... Inf. 1 – é

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Inf. 2 - /tá caindo /tá caindo caindo mesmo /tá despenCANdo /tá nem caindo lá {/tá despencando Inf. 1 - /tava vendo um dia desse... que o o:: presidente da República tem DEZ mil cargo de confiança... Inf. 2 - eu vi Inf. 1 - quer dizer na HOra que ele assumir ele vai ter que nomear DEZ mil pessoas... enTÃO se você num tiver... eu num digo NEM:: eh se você num tiver nos seus quadros né?... pessoas... capaciTAdas preparadas vai ser um {fiasco Inf. 2 - pra assumir né? {assessores Inf. 1 - pra assumir Inf. 2 - porque num é só brincadeira política num é essa brincadeira num é esse... SAbe esses coMÍcio esses foRRÓ:: essas música baiAna no MUNdo n/é só isso não... n/é fácil não n/é só querer enTÃO a gente se candidatava eu tu a gente ia e pronto acabou-se é?... muito bom... {assim é bom demais Inf. 1 - é porque inclusive eu acho que existe pessoas... que podem até se candidatar... PARA:: cargos eletivos mesmo do:: tipo::... eh:: eh:: vereaDOR:: depuTAdo:: deputado estadual federal etc. que... que são muito BONS BONS de:: BLÁ BLÁ BLÁ né?... por exemplo eu acho que a Maria Luíza e a ROsa nesse aspecto elas são Inf. 2 - de {blá blá blá? Inf. 1 - é::... são... Inf. 2 – é Inf. 1 - e de FAto FAzem {aquele auê todo e e levam população e Inf. 2 - ((tosse)) Inf. 1 - conseguem BRIgam e tudo bem... quando você passa para o cargo executivo... aí eu já acho que você... não SÓ tem que ser político ma/ você tem quer ser um administrador... e pa/ SER administrador você tem que entender de fiNANças... da COIsa pública né? tocar tudo isso] [11 AÍ é onde eu acho... que por exemplo no caso da:: Maria LUÍza... eh:: ela se borrou... porque ela não tinha a tal da experiência administrativa... né?... não tinha nos seus quadro pessoas... gabariTAdas e aí foi onde eu acho que ela se perdeu... Inf. 2 - foi se perdeu total {né? Inf. 1 - é...dizem que teve boiCOte de:: história de orçamento e tal ma/... pode até ter tido mas::... ah:: os NÚmeros... eh:: eu acho que::... são bem:: significativos quando... em TRÊS anos ela colocou... três diretores de... parece que do FRIFOR::... dois do::... daquele lá do hospital aí com/ é? o FROTA... e e:: TRÊS pa/ limpeza pública... TRÊS secretário de educação... TRÊS secretário... quer dizer então ela começou a mexer mexer terminou tu/ trazendo... secretário de cultura era um português um cara lá de AnGOla sei lá se era... Inf. 2 - fez a... panelada {todinha Inf. 1 - quer dizer aí:: se perdeu no fim né? de tudo... Inf. 2 - é... Inf. 1 - eu acho que essa parte aí num é:: num é brincadeira não eu acho que você pode até ser um vereador e... ir pra LÁ e brigar e defender e tal num sei o quê... né? Inf. 2 - ((tosse)) Inf. 1 - até aí tudo bem mas para o cargo... executivo eu acho que tem que ter mais experiência... Inf. 2 – lógico] [12 Doc.1- e o que que /cês acham do governa das mudanças?... NOsso governo atual... Inf.1 - bom euAcho que tem aspectos eu Acho que tem aspectos positivos... Inf. 2 - e aspectos nega{tivos Inf. 1 - e tem aspectos negativo como tudo no mundo né?... agora eu Acho o seguinte que o que... Ele... faz a coisa até::... digamos... até bem intencioNA::do até:: as coisas boas agora... o que eu

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Acho é que a mídia... SUpervaloriza o que ele /tá fazendo... digamos assim ele é um aluno tipo que tira... SEIS... e sete... Inf. 2 - num é um dez né? Inf. 1 - é?... MAS ele é tido como o meLHOR aluno do Brasil né?... quer dizer então eu Acho que de repente... ele num é nada demais mas o pavão que enfeita... transforma como se ele fosse o meLHOR aluno da classe... comPARAdo ao de nove e dez /tá entendendo? então eu acho que é mais ou menos por aí Ele faz as coisas... mais ou meno direito... mas num É o::::: eh o que se pinta é muito mais... a PROva foi aí da saúde né? quando ele ele disse que... que o:: tinha ganho o prêmio da UNICEF da mortalidade infanTIL... né?... quer dizer... ele dimiNUIU A MORTALIDADE mas não chegou... aí é onde eu faço a comparação ele não cheGOU ao índice... DE... NÃO VOLTAR mais... quer dizer ele baixou um POUco... mas essa BAIxa... foi tão POUca que agora esse ano a CNBB divulgou um documento que o Ceará foi o priMEIro em mortalidade infantil... então com/ é que no ano passado você ganha um prêmio... dizendo eXAtamente o {inverso do que você diz hoje... Inf. 2 - ((tosse)) Inf. 1 - quer dizer ficou AÍ... o paradoxo da coisa né?... eh:: você::... o Ceará era o priMEIro... em cólera... cólera num é nada mais do que uma diarréia... por FALta {de::::: Inf. 2 - diarréia que mata ((risos)) Inf. 1 - de exato por falta de higiene por falta de saúde Inf. 2 - é... Inf. 1 - então se você DÁ saúde e dá higiene com/ é que você... deixa a cólera entrar... e DENgue... e:: meninGIte... e num sei o quê... e o Estado... é o meLHOR do Brasil em saúde quer dizer AÍ é que eu digo... ONde... ele faz o serviço mais ou menos e VENde como o melhor... Inf. 2 – é Inf. 1 - é... enQUANto por exemplo ele traz aqui uma meia dúzia de inDÚStrias... de TaiWAN de num sei de quê e AÍ... esTAMpa no jornal... em outros EsTAdos aqui vizinho se traz vinte trinta mas num divulga o que ele divulga com as seis... quer o dizer o peixe que ele vende entre quatro e cinco é mais do que o outro lá vende por cinco seis né?... por vinte trinta Inf. 2 - é o marketing dele né?... Inf. 1 - é... é o MARketing Inf. 2 - é... Inf. 1 - que FAZ exatamente isso aí... é a reportagem da {Veja Inf. 2 a propaganda é a alma {do negócio... ((riu))... é Inf. 1 - é a novela Tropicaliente e eh num sei de quê né? Inf. 2 - é isso aí Inf. 1 - então eu acho que a divulGAção é que faz com que... eles... ele SAIba vender o peixe dele melhor do que os outros né?...] [13 Inf. 2 - {porque os Inf. 1 - os nossos candidato que /tão aí /cês acham que::... são bons?... nós temos boas opções aí?... nas eleições?... PRA governador?... Inf. 2 - pra governador... eu acho... Doc.1- que que /cê acha?... Inf. 2 - eh:: eu votaria no Tasso... eu votaria... nele Doc.1- {por quê? Inf. 2 - num tenho nada num tenho nada contra ele não... num acho que:: Inf. 1 - é... o {governo Inf. 2 - tenho Inf. 1 - do Tasso o priMEIro goVERno... o Tasso fez um governo até::... bom Inf. 2 - foi...

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Inf. 1 - foi... em TERmos por exemplo... lá da minha secretaria onde eu trabaLHAva... na Secretaria de CulTUra... ele fez... PAra a Secretaria de Cultura... ele fez um exCELENte governo... trouxe aquela Maria A::... Violeta ARRAes... e em TERmos DE Secretaria de Cultura que eu... posso falar só no daquilo que eu entendo né? os número de economia tal... o pessoal pode até MAIS... Secretaria de Cultura funcioNAva... em CIma... da biblioteca então nã/ num existia Secretaria de Cultura era um::... um poLEIro lá em cima da... da Biblioteca Pública... CHEIo de vazamento quando chovia o pessoal botava esse cesto de lixo pingando... na HOra que ela chegou disse "não isso aqui né? Secretaria de Cultura... eu quero o Palácio da Abolição"... aí NÃO num sei o que deram a metade do palácio... Inf. 2 - eh já mudou né? Inf. 1 - já muDOU... "eu quero"... só tinha um carro... "eu quero num sei quantos carro eu quero reformar o palácio todo"... quer dizer a secretaria que ocupava... umas:: OIto ou nove salas... hoje ocupa umas TRINta ou quarenta salas... e AÍ trouxe TÉCnico trouxe GENte né?... ela::... reformou o Teatro José de Alencar... TOdo... dizem que foi três milhões de dólares... ela reformou o Palácio da Luz... ELA::... conseguiu faZER... o arquivo público... que o Tasso deixou e o Ciro deixou acabar e teve que refazer de novo porque não usaram o TEMpo... ficou tanto tempo fechado que tiveram que fazer de novo... Doc.1 - ((ri)) Inf. 1 - né?... ele FEZ... deixou PRONto... o Museu do Ceará... que s/ que DEMOROU tanto pa/ inaugurar que o Ciro teve que pintar de novo porque já /tava sujo mas foi Ele que fez né?... eu digo sempre que o s/ o Tasso fez e o Ciro acabou né?... Inf. 2 – é Inf. 1 - quer dizer então o o TOdos os PRÉdios que a Secretaria de Cultura TEM... ele reformou todos... TOdos que foi o o Arquivo Público o Teatro José de Alencar o Museu do Ceará o Palácio da Luz... Academia Cearense de Letras... eh o Palácio da Luz Palácio da Abolição... né? tudo tudo tudo ele fez... e deixou pronto... e Ela quis implantar aqui a história do::... com o Fest-Rio... a história do cinema no Ceará... que achava que o CeaRÁ que é o Estado do Brasil onde tem MAIS luz durante o ano né?... comparado com todos os Estado do BraSIL... Inf. 2 - mais luz? Inf. 1 - mais luz... {MAIS SOL Inf. 2 ((tosse)){parece que num /tá mais tendo né?... Inf. 1 - é Terra do Sol Inf. 2 - ultimamente só chove Inf. 1 - {é mas a MÉdia anuAL Inf. 2 - ((tosse)) ... a média anual do:: quer dizer se CHOve aqui chove também nos outros... Doc.1- tanto é que é conhecida como a Noiva do Sol né? Fortaleza Inf. 1 – é Doc.1- Esposa do Sol {num tem né?... Terra da Luz Inf. 1 - é... enTÃO... nós temos... eh:: o lugar onde tem mais SOL no Brasil... é aqui então o SOL... é quase que uma matéria -prima para o cinema né?... Inf. 2 - é {num é … toa que /tá /í a Tropicaliente Inf. 1 - enTÃO... É então já ela e/ ela... conseguiu aí o TErreno conseguiu tudo mais... a época parece que num foi muito propícia criOU... um departamento SÓ pra cuidar disso... se investiu MUIto ((fim do lado A)) Doc.2- {/tava falando aí do Tasso Jereissati da da e Inf. 1 - ((tosse)) Inf. 2 - cinema... Inf. 1 - eh {então ele ela ela ela criOU LÁ... um departamento de A/ Inf. 2 - ((tosse))...-- /tá saindo a tosse?...

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Doc.2- po{de Doc.1- eu {transcrevo Inf. 1 - ((ri)) Inf. 2 - mas NÃO... Inf. 1 - ((ri))... {essa tosse é conhecida dela... ela ela Inf. 2 - ((tosse)) Inf. 1 - criOU... Inf. 2 - ((tosse)) {((tosse)) Inf. 1 - um departamento de ÁUdio-visual... né?... ele é esse departamento de áudio-visual que é uma era uma... funcionava na Casa da::... Vice-governadoRIA em frente o PaLÁcio... era colocou lá uma::... uma videoteca... ((voz de estranho)) Inf. 2 - ...NAda num conseguiu não... ((voz de estranho)) Inf. 1 - uma:: Inf. 2 - foi... por quanto...((voz de estranho)) cento e oitenta rea/ ((ruído)) Doc.1- pode falar sobre o SINE também se qui{serem dizer com/ é que é viu?... Inf. 1 - certo tudo bem... tem muito chão pa/ frente Inf. 2 - raPAZ mais trinta minutos {aí... falando Inf. 1 - ((riu)) fala do {SINE da vida alheia de tudo... então ele criOU Inf. 2 - fala... é::... ( ) Doc.1- ((ri)) Inf. 2 - {assim /tá ( ) Inf. 1 - ele criOU A::... Doc.2- videoteca né? a a {videoteca Inf. 1 - a:: DENtro... desse departamento de áudio-visuAL... ele criou uma videoTEca... que é exatamente... você... tem lá VÍdeos... você PEga:: gratuitamente só ir lá pegar... que são temas... de filmes conhecidos... E você tem uma::... uma::... discoteca... que seria de discos... mas não discos... de mú::sica popular um disco mais de... jingle de propaganda... eh:: arquivos do::... de RÁdios da cidade né?... e:: uma filmoteca também formado por::... filmes de propaganda da:: TV Ceará antiga TV Ceará... Inf. 2 - ((tosse)) Inf. 1 - enTÃO... e tem também um departamento de cinema animado de de de de Inf. 2 - desenho ani{mado Inf. 1 - desenho animado é... né? Inf. 2 - ((risos)) e eu disse desenho animado me abrindo pensando ((falou rindo)) que era esculhambação {dele Inf. 1 - NÃO é mesmo ((falou rindo))... Inf. 2 - {mas desenho animado daqueles Inf. 1 - então é Inf. 2 - desenho animado culturais assim:: {ou desenho animado normal Inf. 1 - não... aí Inf. 2 - Tom e Jerry... Inf. 1 - NÃO {aí você cria é mais naquele estilo... Inf. 2 - Aladim e a lâmpada maravilho/ {norMAL Inf. 1 - é canadense né? que... num sei se você já viu desenho animado de MAssa? assiste aquele {do Inf. 2 - AH eu acho lindo... Inf. 1 - pois é... {inclusive

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Inf. 2 - naquele estilo... Inf. 1 - é teve um que fez com areia Inf. 2 – uhn Inf. 1 - o cara fez TRÊS mil... desenho sabe aquelas coisinha de Aracati?... Inf. 2 - aquelas paisagem Inf. 1 - aquelas paisagem de né?... então ele montou TRÊS mil paisagens... de aREIa... pra dar o... o movimento... {né? Inf. 2 - é:: aquilo é lindo... Inf. 1 - enTÃO... eh:: ele CRIOU ela criou tudo isso...] [14 agora quer dizer pa/ você aí teve TOdo o... a equipe... TÉCnica... e TOdo o material foi comprado só que /tá lá tudo parado isso... não funciona nada... {PORQUE Inf. 2 - olhe só veja bem... Inf. 1 - eu Acho que essa PARte... SÓ SÓ SÓ Inf. 2 - é finalizan{do Inf. 1 - só terminando {aqui eu Inf. 2 - né? o Inf. 1 - acho que essa parte Inf. 2 - {((tosse)) Inf. 1 - o serviço público.. de... de um modo GERAL... NÃO aqui no SINE porque o o diretor que começou é o que está até hoje... então num HÁ::... QUEbra de:: solução de continuidade né?... quer dizer o cara começa e termina mas o serviço público tem muito Inf. 2 - ...{com o quê? Inf. 1 - é muito parecido com o mar... é chei/ de ONda né?... {então CADA S/ CADA... cada secretário Inf. 2 - então uma hora /tá em cima outra hora /tá em baixo Inf. 1 - que ENtra tem uma onda então o cara "bom... VAmo/ faZER uma::... hemeroteca"... aí pronto aí pega tudo quanto é de jornal aquele negócio todo né?... "vamo/ fazer o departamento de ÁUdio-visual"... aí... aí faz aquele negócio todo... "vamo/ fazer o muSEU da imagem e do som"... aí FAZ aquele negócio então CADA UM... Inf. 2 - vai fazer alguma coi{as Inf. 1 - vai faZENdo e vai quebrando os que ficam atrás né? quer dizer aquela idéia do de trás... tudo bem que ele faça a idéia dele mas que num aCAbe...{com a idéia do outro Inf. 2 - com a idéia do outro Inf. 1 - {esse eu Acho que o serviço público tem muito disso né?... Inf. 2 - isso é verdade... é Inf. 1 - você desPREZAR o que foi feito... Inf. 2 – é Inf. 1 - veja BEM diga lá ] [15 Inf. 2 - olhe só H. eh:: não... vamo/... falar do cineminha que /tá passando... do REi LeÃO tu já assistiu o Rei Leão? Inf. 1 - não... eu {assisti Quatro casamentos e um funeral Inf. 2 - não?... casamentos e um funeral gostou? /tô doida pa/ assistir aquele filme Inf. 1 - Médio Inf. 2 - ...médio?... H. eu num entendo porque... HOje mesmo... quando foi?... ( )... sei lá... quem sabe?... aDOROU amou o filme eu acho que é porque o teu estilo é diferente do meu es{tilo Inf. 1 - ((riu)) Inf. 2 - deve ser porque eu aDOro filme de água com açúcar

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Inf. 1 - não porQUE o o filme... em si ele ele tem uma história até boa... então ele VAI VAI VAI aí no FIM... é que eu acho que ele tem uma queda... Inf. 2 - o filme? Inf. 1 - é... ele vai mantendo assim um um pouco de huMOR... {até::: dava pa/... eh Inf. 2 - mas é só pa/ gente desopilar:: só pa/ brincar {eu num sei ainda Inf. 1 - mas ele tem no FINAL... é que eu acho que ele Inf. 2 - olhe {você... você assistiu:: Inf. 1 - teve uma queda na qualidade] [16 Inf. 2 - A lista de Schingler?... Inf. 1 - não... Inf. 2 - pronto um filme muito bom... mas parece mais um do/ um documentário mas um filme BOM um filme proFUN::do... um filme que a gente acaba /tá... agoniada tensa angustiada e tal mas é um filme {/tá entendendo? Inf. 1 - segundo a:: no no jornal que eu li né? a mulher dele disse que aquilo ali num foi nem a meTAde Inf. 2 - do que passaram {né?... e/ Inf. 1 - do que aconteceu?... NEM a metade Inf. 2 - eu imagino Inf. 1 - ela citou lá um exemplo... de um vagão... que chegou LACRAdo... jogaram as pessoa dentro e fecharam com SOLda... Inf. 2 - Ave Ma{ria Inf. 1 - tinha... o o quando abriram o vagão... teve que abrir com maçarico né? sabe o que é maçarico {aquele negócio de solda né? Inf. 2 - sei {((tosse)) Inf. 1 - psi:::: abir o maçarico Inf. 2 - aí /tava tudo morto? Inf. 1 - /tava... QUAse noventa por cento /tava morto... POdre já Inf. 2 - Ave Ma{ria Inf. 1 - e os que /tavam vivo /tava só o coração batendo... Inf. 2 - quer dizer {é uma:: Inf. 1 - respirando o mesmo ar e tal Inf. 2 - ((tosse)) aquele filme retrata muita coisa {dessa Inf. 1 - pra poder eles não fugirem né? agora ele não... ele {num cita o TEMpo né? Inf. 2 - ((tosse)) Inf. 1 - ...deve ter sido algumas horas de viagem porque se não tinha morrido todo mundo né?... Inf. 2 – é Inf. 1 - isso PRA poder eles não fugirem né?... Inf. 2 - não mas aquilo {é triste aquele filme Inf. 1 - e a::...é um negócio absurdo Inf. 2 - e o pior é que a/ /quilo tudo aconteceu né? {aí é que /ta Inf. 1 - é Inf. 2 - quando eu digo a diferença de água com açúcar... porque a gente pelo meno/ se anima ri brinca fresca e tudo né?... com essa besteirinha de cinema... porque esses profundo pra você ir uma vez ou outra tudo bem... é tanto que num vivem fazendo esses FILmes assim muito né?... que tinha:: que aconteCEU em mil oitocentos e TANto na Segunda Guerra e tal... porque justamente se a gente fosse viver assistindo esses filme a gente ia viver angustiado porque eu passei uma semana angustiada com A lista de Schingler... uma semana... aquele Nome do pai tu assistiu?... Inf. 1 – já

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Inf. 2 - também foi verídico brincadeira aquilo... os cara foram preso a mãe do cara sei lá o pai do homem num tinha nada a ver com nada a TI::A... o sobrinho num sei quem... foi tudo entrou numa leva só sem ter ninguém ter nada a ver com nada mas como eles precisava... de uns bode expiatório então LEva lá os pobre dentro da prisão... quer dizer e tudo aquilo foi verídico... tudo aquilo... quer dizer é:: justamente a história deles que se passou... mas... num sei QUAtro casamento e um funeral é bom demais deve ser né?... Inf. 1 - é {o negócio é que em Quatro casamento... Inf. 2 - um impasse eh... diante duma duma... Inf. 1 - o filme {/cês assistiram o filme? Inf. 2 - coisa dessa Doc.2- ainda {não Inf. 1 - você já?... já? Doc. 1 – não Inf. 1 - o filme todim é:: só casamento Inf. 2 - deve {ser maravilhoso Inf. 1 - é um casamento atrás do outro TOdo sábado Inf. 2 - ((tosse) Inf. 1 - ele bota um bocado de espertador... Inf. 2 - ((tosse)) Inf. 1 - pa/ poder acordar {o homem que todo sábado tem um casamento Inf. 2 - ((tosse)) Inf. 1 - e ele tinha verdadeira ojeriza a casamento né?... Inf. 2 - mas no final ele acaba casando é?... Inf. 1 - ele:: no fiNAL... ele diz assim "voc/ eu quero que você seja" como é?... eh:: "eTERnamente minha... mas NÃO... casar"... {ele ele Inf. 2 - ele num casa? Inf. 1 - é ele inverte... a história do casamento né? porque o casamento diz que você::... {né::?... eh seria:: eternamente Inf. 2 - eterno... não eterno enquanto dure é um negócio desse Inf. 1 - juntos... até que a morte se{pare tinha alguma coisa Inf. 2 - é Inf. 1 - desse tipo ele ele ele faz o seguinte... ele PEga só essa PARte mas não casa quer dizer... ele faz {u::ma Inf. 2 - aí no final ele não casa Inf. 1 - ele FIca com ela mas sem casar Inf. 2 - e ele é o funeral? Inf. 1 – não Inf. 2 - ma::s na história quem é que morre nesse filme que eu já /tô curiosa? ((riu)) Inf. 1 - é um dos amigos dele... Inf. 2 - ah um dos amigo {morre morre mesmo de morte morrida Inf. 1 - é... é um um um que é gay Inf. 2 - ...vixe assim ainda bem {veado Inf. 1 - e vivia com um cara lá né? ((falou rindo)) Inf. 2 - ((riu)) Inf. 1 - ((riu)) Inf. 2 - negócio de veado... Inf. 1 – é Inf. 2 - a::í ((falou rindo)) Inf. 1 - e bom que eu eu eu:: {no no no filme

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Inf. 2 - ((ri)) Inf. 1 - ...eu num tinha percebido por que {que o cara chorava Inf. 2 - o quê? Inf. 1 – tanto Inf. 2 - por causa do... {AH:: porque o veado era apaixonado por um Inf. 1 - ((tosse)) que era Inf. 2 – deles Inf. 1 - exatamente... eu digo... comecei a estranhar aí no fiNAL... que todos eles se aRRANjam... parece as novela da Globo todo mundo casa no fim né? Inf. 2 - ah eh:: {eu num sabia deste assunto... aparece com o outro Inf. 1 - aí o cara aparece com outro... aí pronto o OUtro... aparece com outro né? quer dizer o::: {o PAR dele tinha morrido é o veadinho lá... Inf. 2 - o veado que tinha morrido... vea{Dinho Inf. 1 - morreu e... Inf. 2 - ((ri)) Inf. 1 - aí pronto] [17 Inf. 2 - é igual à história hoje eu dizendo pra pra pra... E. né? dizendo pra E. que aCHAva... que HOmem pra mim que usa... cabelim de rabo né? cabelo grande cabelo grande é pa/ mulher homem HOmem que é macho macho que é MAcho ele não usa brinco... ele não usa cabelo GRANde nem ele usa macacão... macacão que eu digo n/é macacão bombeiro de posto não macacão aqueles macacão jeans assim ((riu)) sabe? ((falou rindo))... então MAcho que é MAcho... assim por exemplo um PAI meu você:: o M. meu irmão M. o povo que eu conheço jamais... olhe que eu conheço macho muito macho... mas esse negócio {desse po/ Inf. 1 - macho muito macho Inf. 2 - macho muito macho... homem pra mim que tem esse negócio "não:: galera hoje é assim mesmo ( ) e tal vamo/ usar"... pode ser que ele nem seja eu já /tô é generalizando já /tô dizendo que é tudo veado... mas pra mim é que eu jamais iria namorar com um homem cutucar ele aqui... sentir o brinquinho e os cabelo grande maravilhoso jamais... Deus me livre... {quero distância... rabo de cavalo lá vem... Inf. 1 - rabo de cava::lo Inf. 2 - já imaginou hoje em dia eh /tá tudo trocado hoje em dia eh /tá tudo trocado hoje em dia os homem têm o cabelo grande as mulher /tão pelando as cabeça... imaginou... um /tar se agarrando com outro aí um passa a mão no outro não::... {gosto disso não Inf. 2 - vai saber Inf. 1 - ... não ...] [18 por sinal tu viu o Sílvio Santo?... domingo? Inf. 1 - ... não Inf. 2 - aquele Topa tudo por dinheiro ((riu))... {aí tinha uma artista ((falou rindo)) Inf. 1 - que foi Inf. 2 - /cê viu? não... tinha uma artista... daquelas de Sílvio Santo né?... ela se vestia todinha de homem de PASta executivo e tal terno gravata bigode /tá /tá... aí ia p/ o meio da rua aí de repente chegava um cara que também é::... do elenco lá do SBT... aí diz "oh:: querida há quanto tempo" aí abraÇAva e beiJAva né? o maior agarrado do mundo... e o povo que ia passando no meio da rua... pensava que Era... que eles dois eram:: na{morados Inf. 1 - não Inf. 2 - ...aí tinha uma velhinha que dizia assim... "mas isso é uma pouca verGOnha com/ é que pode um negócio desse" OUtra dizia assim... "meu Deus se esses DOIS... /tão se agarrando desse jeito aqui na esquina imagine esses dois na cama {com/ é que num deve ser ((falou rindo)) Inf. 1 - ((ri))

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Inf. 2 - e a velhinha aí no final teve a última que era a velhinha... "ah:: eu acho que o amor o que vale é que se Amam... se eles dois se amam desse jeito tudo BEM tem mais é que se se aMAR e se beijar e se abraÇAR... independente se é mulher mulher com homem homem com homem"... aí olhe eu ri muito H. ... e o cinzeiro que o... pessoa /tá /qui né? filmando aí... tu/tuc... quando bate... a:: a cinza e o c::inzeiro explodia... {se o cinzeiro num chove né?... Inf. 1 - ((riu)) Inf. 2 - /tá /qui aí tuc/tuc... quando ele botava assim aí PUFO ia... pedaço de de coisa pa/ todo lado o povo saía correndo ((falou rindo))... {eu me abro tanto... é bom demais Inf. 1 - é mas... eu eu vi eu vi agora que /cê falou eu vi uns engraçado... num teve a num teve uma:: implosão aí em São Paulo Inf. 2 - teve {eu /tava lá Inf. 1 - que era uns QUATRO edifício segui{dos Inf. 2 - ah num /tava mais não Inf. 1 - era tipo um conjunto habitacioNAL Inf. 2 - porque num teve uma época que foi um do da {FIESP lá Inf. 1 - É mas esse eram QUAtro prédios... aí o cara chegou e disse "olhe /cê fique aqui nessa janela... e tem esse botão um verde um {azul e um amaRElo" Inf. 2 - ((tosse)) Inf. 1 - e o cara complicou bem... "agora /cê tem que apertar o azul o amarelo e o verde... não o verde o amarelo e o azul o azul o amarelo e o verde se você trocar Inf. 2 - ((riu)) Inf. 1 - isso {vai dar uma confusão Inf. 2 - ((ri)) Inf. 1 - ...que pode até explodir prédio por aqui... /cê decorou? Inf. 2 - ...isso era o quê? o Sílvio Santo Inf. 1 - Sílvio Santos Inf. 2 - ((ri)) Inf. 1 - cara botou ele ele assim na jaNEla... o cara botou ((falou rindo)) ele assim na jaNEla... mais ou menos assim perto do prédio e PERto da HOra... então na hora que a sirene tocasse lá ele dizia "aperte os botões"... né? um negócio... rapaz quando a sirene tocou que ia começar o cara disse assim... ah eh o cara aí o cara telefona pra ele Doc.1- ((ri)) Inf. 1 - "POde apertar o botão" Inf. 2 - aí aperta{va Inf. 1 - você sabe azul amarelo e verde ou não é verde amarelo e azul o cara rapaz quando o cara pá pá pá pá Inf. 2 - ((riu)) Inf. 1 - foi tipo um negócio assim sabe?... e/ eu num /tô bem de/ eh:: eh mas eh seria tipo... TRÊS botões mas que... complicasse o negócio... rapaz quando esse cara toca... rapa z PEI:: aí cai o primeiro prédio e o cara os olho PEI:: lá vem o segundo {prédio ((falou rindo)) Inf. 2 - ((riu)) Inf. 1 - {PEI::... rapaz Inf. 2 - ((riu)) Inf. 1 - esse cara botava a mão na cabeça {e dizia assim Inf. 2 - desesperado Inf. 1 - "meu Deus ((falou rindo)) o que é que eu {fiz Inf. 2 - ((riu)) Inf. 1 - rapaz era só caindo prédio Inf. 2 - a::i meu Deus ((falou rindo))

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Inf. 1 - ...QUAtro PRÉdios foram ao chão cara e ele só fazendo CAda... e ele aí ele continuava apertando quanto mais ele apertava caía outro né? que eram QUAtro n/ era uma seqüência... {tipo um conjunto habitacional era BLU:: Inf. 2 - ave Maria ((falou rindo)) Inf. 1 - e ele... ((vozes incompreensíveis))...((ruído)) Inf. 2 - ((risos)) Inf. 1 - e {só caindo os prédio esse foi um dos melhores viu? Inf. 2 - ah... não mas tu viu aquele do do do::... o motorista o cara pegava um táxi no meio da rua bufo né?... aí ele dizia assim "oh o senhor vai me levar em tal canto" aí quando chegava dizia "oh eu vou dar uma subidinha rápida o senhor esPEre que eu volto já"... aí o cara subia né?... correndo... AÍ... tipo um edifício... aí o cara o motorista ficava esperando daqui a pouco o motorista começava a olhar p/ o relógio cinco dez quinze minuto e nada né?... aí ele subia resolvia fechar o carro ir atrás do cara... aí BUfo entrava numa sala que tinha::... tipo um ( ) eh ti/ um velório... Inf. 1 - ((pigarreou)) Inf. 2 - aí ele dizia assim o pessoal LÁ ((finge chorar)) chorando ai ai naquela coisa toda assim... aí o que foi que aconteceu?... O... cara o motorista de táxi diz assim "mas vocês num viram um senhor que entrou aqui de TERno... com uma pasta assim assim assim... porque ele FOI... ele disse pr/ eu aguardar lá embaixo e num apareceu mais eu /tô preocupado eu queria só receber meu dinheiro"... aí o pessoal "não não ninguém viu ninguém viu num entrou ninguém só entrou o senhor agora aqui mas nós /tamo/ velando o corpo faz tempo /tá"... nisso ele num vê o corpo quando ele vai ver... o homem num é o homem {((risos)) Inf. 1 - ((riu)) Inf. 2 - ele foi e disse assim... mas num PODE ((falou rindo)) {SER ELE ((riu)) Inf. 1 - ((riu)) Inf. 2 - aí a mãe dele dizia assim ((falou rindo)) mas num pode ser Inf. 1 - ... ((riu)) agora pronto... ((falou rindo)) Inf. 2 - ((risos)) Inf. 1 - ((tosse)) Inf. 2 - toda vez que eu conto isso... eu fico me abrindo... e:: ((falou rindo)) aí o homem ficou olhando apavorado... mas era Ele... aí a velha foi e disse assim... "meu DEUS o meu filho... bem que eu sabia que ele /tava devendo alguma coisa ele veio BEM pa/ pagar as conta num sei o quê... ou então a pasta dele que ele esqueceu" (engraçado) menino era uma confusão tão grande... aí achava pouco o defunto se levantava... o::lhe o pobre desse motorista de táxi e são várias pessoa ( ) ... esse motorista de táxi sai CORRENdo desesperado ((falou rindo)) que aí ele pen::sou que tinha levado uma alma... eu pensaria isso né? {do jeito que eu tenho medo de alma eu Inf. 1 - é Inf. 2 - ia imaginar que eu {andei com uma alma dentro do carro Inf. 1 - tipo tipo aquele da múmia né? que o cara sai correndo também Inf. 2 - aí tem o da múmia {não então esse eu num vi não Inf. 1 - tem teve UM que o cara chegou... o cara disse assim "olhe... eu quero que /cê PREgue... eu vou colocar um QUAdro... nessa parede certo?"... Inf. 2 - {((tosse)) Inf. 1 - e você PREga ....então esse QUAdro aqui agora cuiDAdo... você bate bem devagarzim que tem um passa uns ca::nos dÁgua aqui atrás... aí o cara... bate o prego aí psi:: sai água sabe? Inf. 2 - aí ele tapa Inf. 1 - aí ele vai tapa o buraco assim quando ele tapa o buRAco aí psi:: sai outro {bem aqui ele tapa ( ) Inf. 2 - ((riu)) Inf. 1 - psi::... {psi

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Inf. 1 - ((riu))...eu num sei ((falou rindo))... raPAZ... a PObre DA mulher sai Inf. 2 - ((risos)) Inf. 1 - TOda molhada quanto mais botava a MÃO Inf. 2 - não mais buraco apa{recia Inf. 1 - mais buraco aparecia os cara fizeram de propósito {né? só pá pá pá pá Inf. 2 - rapaz ((riu)) Inf. 1 - ...aí telefona... aí quando quando ela PEga no teleFOne... pa/ diZER... aí começa a sair água no Doc.1- ((riu)) Inf. 1 - telefone ((falou rindo)) a mulher sai co::rrendo... os cara botaram água Inf. 2 - ((risos)) Inf. 1 - no telefone cara ((falou rindo)) Inf. 2 - ... não o Sílvio Santo tem disso eu Adoro aquele programa do Sílvio {Santo ( ) Inf. 1 - ah outro também Esse esse:: eu vi a hora... a mulher morrer... pegaram assim tipo um forro desse de GEsso... e a mulher o cara disse "Olhe cuiDAdo... que aqui /tá aqui /tá tendo muito assalto... e os ladrões eles não MEdem esforço... então você TRANque bem a PORta... ponha cadeado... que hoje é dia de pagamento e ladrão aqui chega de TOdo jeito... rapaz a mulher /tá toda trancada num sei o quê... BÁ:: desaba o teto todinho pois num é um {cara... um ladrão com uma CORda Inf. 2 - era os ladrões ((falou rindo)) Inf. 1 - "isso é um as{salto" rapaz a mulher... Doc. 1 - ((riu)) Inf. 1 - começa a fazer assim a mulher num fala{va cara porque o Inf. 2 - ((riu)) Inf. 1 - susto do FOrro... {né?... e o susto Inf. 2 - a::i meu Deus Inf. 1 - do ladrão né?... {aí a mulher "CALma Inf. 2 - aí... aí contou Inf. 1 - ...calma... isso é um assalto... ah o cara pega... "pode puXAR" aí o cara ps::... {sobe pela parede desaparece Inf. 2 - vai embora Inf. 1 - a mulher... ( ) entrega o dinheiro {p/ o cara oh Inf. 2 - ((riu)) tinha por /tava toda trancada {e o ( ) Inf. 1 - é... com aquela CORda o forro todim lá vem outro PLÁ:: cai os pedaço de gesso no chão {o cara vê Inf. 2 - Ave Maria é muito engraçado aquele Sílvio Santo eu aDOro Faustão quer até pensar mas num dá... num chega nem perto não... de{lê Inf. 1 - é Inf. 2 - ...é BOM demais aquele programa dia de domingo Ave Maria outro que eu vi também era num velório... lá vai o velório {no MEIO da rua Inf. 1 - Faustão era do Faustão era do tempo que:: comer um brotinho era comer uma {pizzazinha pequena né? Inf. 2 - é::((riu)) tem essas coisa ((falou rindo)) penTElho eh pentelho né? Inf. 1 - é Inf. 2 - no Faustão tem muito disso... pois no Sílvio Santo esse também era assim... ia... um enTErro o pessoal carregando né?... tuc-tuc usando as alça do caixão... AÍ... quando era mais adiante já tinha uma das artistazinha do Sílvio Santo... vestida de viúva... e a:: primeira que levava a primeira da a primeira alça do caixão era dela... aí ela vê o pessoal passando na es/ na calçada né? aí dizia assim "oh meu filho por favor me ajude eu sou uma viúva... acompanhei esse meu marido doente tantos

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ano... agora que ele morreu queria ao meno/ descansar um pouquinho dá pa/ /cê levar... essa alça pra mim" a pessoa "não pois não eu levo pa/ senhora /tá"... aí esse caboclim ia lá né?... PEgava na alça do caixão quando andava assim uns::... cinco PAsso... aí o caixão se abria aí o defunto dizia "esse enTErro sai ou num sai?" menina {quando dizia isso... esse homem Inf. 1 - ((riu)) Inf. 2 - despeRAdo ((riu))... saía correndo... aí o outro eh esse eu tive pena... vinha uma um CAra e o amigo dele na muleta o amigo dele vinha nas muleta né?... aí ele pediu pa/ ajudar aí o cara "não /tá certo eu ajudo" né?... aí o cara foi ((falou rindo)) já vinha... quando o... o caixão se abriu foi de frente pro dono das muleta... mas esse pobre num sabia se rebolasse muleta se saísse correndo se es/... ( )...na... no chão ((falou rindo)).... mas foi triste eu tive pena do de muleta... tive muita pena porque o de muleta coitadim... ele saiu PULANdo H. na mule/ a muleta era truc- truc- truc... ele não só era pof- pof- pof- pof... BATENdo sabe? aquela muleta assim despeRAdo o amigo dele... mais agoniado ainda e o defunto lá "sai ou num sai o enterro" ((falou rindo)) Inf. 1 - ou/ ou/ outro que eu vi também o cara pegou... pegou acho que era um CArro... um carro já batido... tipo um:: um ESCORT né? Inf. 2 – ahn Inf. 1 - da MESma cor igualzinho BAtido... aí o cara pegou e trocou a PLAca mudou a placa do carro o cara fiCOU... com o caminhão né? Inf. 2 - uhn... Inf. 1 - aí nisso quando o CAra VAI saindo o cara dá uma ré::: PÁ::: aí o carro da frente::... PÁ::: batia no da frente::... {PAft quando o cara viu meu amigo ((falou rindo))... Inf. 2 - {só olhando desesperado Inf. 1 - botou as mão na cabeça ((falou rindo))... "o que é que você /tá faZENdo meu amigo? você é DOIdo?..." "é sabe que é? eu num sei dirigir muito bem eu /tô mas /tô aprendendo agora" é BÁ:: na frente... PÁ:: de trás ((falou rindo))... e só amassando o cara do cara e o cara... ((falou rindo)) "você saia daí porque se não eu lhe MAto" o cara "meu amigo" Doc.1- ((riu)) Inf. 1 - saia do {meio porque se não quem morre é você" Inf. 2 - ((tosse)) Inf. 1 - e o ca{ra ia pa/ frente e pa/ trás e PÁ::: e PÁ Inf. 2 - Bufo Ave Maria ((riu)) {eu tinha ( ) Inf. 1 - acabando o carro o cara trocou a PLAca bem direitim botou a placa do cara né? Inf. 2 - é desesperador mesmo ali eles pega ( ) Inf. 1 - OUtro... o cara fez... tipo um guinDASte sabe?... guindaste né? o cara pegou... e e::... foi rebocar o CArro... aí levantava o carro... ah o aí o guindaste caía... PÁ quebrava esculhambava o carro todinho o cara "meu amigo num faça isso não... que você /tá acabando com o meu CArro" né?... o cara botou também um carro iGUALzim... e jogava pra cima e jogava pra baixo "não você /tá parado em lugar:: proibido vai ter que ser rebocado" e corre pra cá rapaz quando... a/ arranhou o carro do cara todo quebrou tudo... aí o cara chegou e disse assim... "mas meu amigo você... me diga uma coisa... com/ é o nome do senhor"... é fulano de tal... "e Esse carro é o seu?"... "cara é que eu botei aqui" "qual é a placa do seu carro?..." aí o cara::... disse LÁ né? qualquer coisa e... o cara olhou:: e disse assim... ah:: e esse carro num é o meu não ah o senhor me desculpe e tal Assim... "então com/ é que o senhor vem aqui eu /tô rebocando um carro e o carro num é do seNHOR"... aí o cara começa a esculhambar o cara porque ((riu)) o cara /tava se {metendo no serviço dele né? Inf. 2 - se metendo se metendo onde num... ((risos)) Inf. 1 - ...aí o CAra ficou até... tudo bem mas aí aonde era que /tava o carro dele né? ((falou rindo)) aí o cara depois PAssou assim rebocaram o {carro dele Inf. 2 - começou a se tocar

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Inf. 1 - aí o cara começou a se tocar e tudo bem o primeiro... digamos assim o primeiro perigo já passou "e aí onde é que /tá o meu carro?... cadê o meu carro num era o meu ca/" ((falou rindo))... lá vem o cara dirigindo {o carro dele Inf. 2 - o carro dele Inf. 1 - pára lá no mesmo lugar Inf. 2 - Ave Maria é desesperador... Inf. 1 - mas esse negócio de CArro... {( ) Inf. 2 - a/ Ave Maria... a pessoa cheGAR e:: num ver o carro Ave Maria... deve ser triste Inf. 1 - pois foi duas vezes fizeram isso rapaz... o cara brigou brigou brigou brigou mas o cara num foi olhar pa/ placa do carro dele né?... Inf. 2 - {diz] [19 Doc.2- só vo/ voltando aqui um pouquinho... eh e a morte do Ayrton Senna {vamo/ falar um pouquinho Inf. 2 - ah:: não fale do meu {lindinho ((risos)) Inf. 1 - ((riu)) Inf. 2 - oh bi{chinho que é o::... Ave Maria Doc. 2 - com/ é que é o bichinho pra cada um de vocês Inf. 2 - pra mim Deus me livre eu faltei foi a minha irmã ficou viúva né? uma semana Inf. 1 - ((riu)) Inf. 2 - viúva porque o marido dela disse que num agüentava mais... e ela chorava mais do qualquer outra coisa que ela tivesse visto ela CHOROU... literalmente mais de uma semana a M. Inf. 1 - M. {foi? Inf. 2 - a M. M. simplesmente ela num chorava não ela ficou de CALdo ela num foi trabalhar no dia porque /tava toda inchada de tanto que ela chorou... Inf. 1 - ((riu)) Inf. 2 - ((riu))... {mas a M. foi mesmo não /tá perto Inf. 1 - terminou Doc.2- não Inf. 2 - ...mas a M. o Ayrton Senna Ave Maria... foi triste aquilo ali foi triste eu achei assim... a morte DEle assim uma coisa assim muito::... sa{be uma coisa que ninguém Inf. 1 - é Inf. 2 - espera{va:: que Inf. 1 - a gente VÊ a gente vê muita morte só que aquela morte foi ao vivo {né?... então ele Inf. 2 - foi ao VIvo exatamente né? Inf. 1 - /tava... no Ápice da carreira né?... {e::... representava Inf. 2 - Ave Maria já devia ter parado há muito tempo] [20 Inf. 1 - eu Acho assim né? vendo... a coisa bem pelo lado... socioLÓgico né?... Doc.1- o salvador {da pátria Inf. 1 - repre/ exatamente o salvador da pátria Inf. 2 - era Ayrton {Senna do Brasil né? Inf. 1 - quer dizer JÁ é Ayrton Senna do Brasil né?... inclusive tem um artigo escrito... pelo RiCÚpero né? querendo fazer uma média Ayrton {Senna do Brasil... Inf. 2 - ahn é {mas Inf. 1 - e:: agora eu tenho um:: artigo MUIto interessante tu chegaste a ver que a gente... (recorreu) eu mandei tirar XErox distribuir aqui no SINE {todim Inf. 2 - de onde?... do Ayrton {Senna Inf. 1 - é um:: arTIgo... o cara mosTRANdo... que uma mulher na Avenida Brasil... morreu... foi atropelada morreu passaram por cima... ela passou CINco Horas Inf. 2 - o povo passando em cima

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Inf. 1 - na Avenida Brasil Inf. 2 - ai {H. que horror Inf. 1 - então o cara vem comparando... exatamente a MORte dela... com a morte do Ayrton Senna né?... foi LOgo depois... uns quatro dia depois o cara escreveu mas MUIto bem escrito... Inf. 2 - pois eu num vi não {passou na minha mesa não Inf. 1 - MUIto bem esCRIto... inclusive eu acho que eu tenho aí eu... depois te DOU... eu NUNca vi uma coisa tão bem escrita ele comparando... Doc.2- {onde foi? Inf. 2 - foi no jornal que saiu?... Inf. 1 - na Folha de São Paulo... Inf. 2 - tu ainda tem? será?... Inf. 1 - tenho... {eu nunca vi:: porque ele... PEgou assim Inf. 2 - ma/ eu num sabia disso não Inf. 1 - o momento e fez a a:: a comparação... do POvo... com o Ayrton Senna né?... quer dizer:: aquela toda aquela hisTÓria e tal... de de num sei quantos DIas e num sei o quê pa/ chegar e num cheGAva e ela... como era um um um Zé Ninguém:: u::ma pessoa despercebida passou cinco HOras... e ninguém disse NAda ninguém VIU ficou por isso... e ele... {FAz essa comparação Inf. 2 - Ave imaginou essa mulher passando o povo passando em cima dela {o tempo todo... Inf. 1 - é Inf. 2 - VAlha-me Deus valha-me Deus é igual aqueles gato no meio de estrada a gente passando em cima ai passou ploft... ai H. ((riu)) Inf. 1 - ((riu)) Doc. 1 -((riu)) Inf. 2 - ...ave Maria NÃO] [21 {mas aí também Inf. 1 - é as pessoas precisam né::?... o cara diz que o brasileiro... naquela viTÓria... também foi outro artigo que eu vi... que:: o:: brasileiro parece que num gosta da coisa... premediTAda calculada... ele é muito de imPULso... né?... do AUÊ... então ele queRIA... que:: duma hora pa/ OUtra o::... fizesse um chute que batesse numa TRAve e batesse na OUtra e enTRAsse aí pronto... né?... enTÃO... o TÉCnico... segundo o CAra... é um cara calculista... gaNHOU... porque se precaveu na deFEsa se precaveu no meio do campo e tinha um ataque razoável... então ele... mas não... o negócio era de:: daquela hisTÓria de... da do salvador da PÁtria né? o pessoal o Brasil gosta disso né? Inf. 2 - é... as coisa {certinha num serve Inf. 1 - daquele cara aparecer de relance e salvar {tudo pronto Inf. 2 - ((tosse)) Inf. 1 - aí esquece tudo pa/ trás pronto fica {tudo Doc.1- um povo romântico Inf. 1 - é... então::... o que aconteceu foi isso que ele:: num gostaram do Parreira por causa disso... Inf. 2 - do Par{reira? Inf. 1 - o Parreira foi aquele cara calculista que... tirava aqueles jogadores {que num alterava que era TEIMOso Inf. 2 - mas só foi co/ só quando deu certo né? Inf. 1 - pois é Inf. 2 - há vinte e quatro ano que num ga{nhava Inf. 1 - MAS exata{mente porque os OUTROS... Inf. 2 - aí o Parreira fez tudo Inf. 1 - fazia aquele futebol boNIto aquela coisa visTOsa campeão MORAL mas... num passava disso né? Inf. 2 - é o pro/ problema é esse adianta falar falar falar e não

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Inf. 1 – é Inf. 2 - fazer nada... Inf. 1 - {e o Ayrton Senna era tipo isso aí né? Inf. 2 - é por aí ...oh bichim {tão lindo meu Deus...] [ 22 Inf. 1 - é aquele GANHA{DOR::e Inf. 2 - morreu Inf. 1 - tudo aqui acoLÁ... quer dizer JÁ no fiNAL... ele já /TAva mais ponderado né?... já num faZIA mais aqui/ aquelas loucura que ele fazia {né? Inf. 2 - é ele devia ter parado mesmo saía como herói como o Pelé na vida e vai morrer he rói... pronto aca{bou-se Inf. 1 - mas ele ainda era ele /tava muito novo morreu com trinta e três ano {né? Inf. 2 - é mas já /tava BOM já tinha dinheiro sobrando num tinha mais o que fa{ZER já /tava com a fama lá em cima Inf. 1 - diNHEIro... não diNHEIro num faltava pra ele Inf. 2 - pois é já /tava bom... Inf. 1 - quarenta milhões de dólar trinta milhões de dólar por ano... Inf. 2 - podia muito bem te ter ter::... casado aí com a bichinha com/ é a:: {Adriana Galisteu? Doc.1- ele queria o TEtra né?... Inf. 1 - É {eh:: Inf. 2 - ele queria o tetra Inf. 1 - era de TEtra {pa/ tetra Inf. 2 - foi LINdo né? quando... ganhou aí botou num foi Ayrton... "nós... acele{Ramos Inf. 1 - "o TEtra também é nosso" {né Inf. 2 - SEnna o:: tetra também é... nós acele::ramos jun{tos... "o tetra também é nosso" um negócio desse Inf. 1 - parece que era pare/... era Inf. 2 - uma faixa que eles tinha... Ave Maria o bichim... saudade dele num é... Inf. 1 - /tá com saudade dele é a Xuxa não você... Inf. 2 - a Xuxa Adriane Galis{teu a pobre foi Inf. 1 - tudim Inf. 2 - jogada de lado pela família dele... mas a Xuxa meu filho de besta... que num quis ele naquela é/ "AI foi o homem certo na hora errada" que história de homem certo na hora errada menino quando tem que dar:: certo dá é tudo certo... negócio DUvido... que vem de história de homem homem errado na hora certa homem certo na hora errada... quando tem que... que emplacar emPLAca num tem esse negócio de por MAIS tempo que ela tenha ou tempo que ela... deixe de ter sei lá... isso aí é o de menos Inf. 1 - ela achava que ele era pa/ ser agora é? Inf. 2 - era... ia muito bem bonito... o Ayrton Senna ia esperar a Xuxa bonitim ia ficar só correndo ((imita o barulho do motor de carro)) pa/ cima e pa/ baixo bufo-bufo... fazia nada... aí ploft né? e o pobre... e ela lá só:: cantando né?... todo dia ((vozes incompreensíveis)) aquelas besteira de Xuxa Inf. 1 - fazia programa no MUN{do todo... Inf. 2 - é:: fazia no mundo todo Inf. 1 - {( ) Inf. 2 - e o desgraçado só correndo ((imita o barulho do carro)) e {morre Inf. 1 - ((riu)) Inf. 2 - ...ficou morre num morre morre num morre morre o amigo na pista e vai e faz... e LÁ aí depois quando ela decidiu-se... bonitinha "/tô aqui Ayrton venha" Inf. 1 - ela:: {ela conta... Inf. 2 - bonito

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Inf. 1 - que era um naMORO no no {começo ((riu)) tinha u::ma coisa Inf. 2 - ((tosse)) Inf. 1 - que era um negócio bem gozado ela mandava ele mandava um avião ela vinha... num sei pra onde aí eles iam aí era um negócio assim todo compliCAdo... Doc.1- ((riu)) Inf. 1 - negócio de avião pra cá avião pa/ lá os dois /tavam sempre... na na... nas PONtas aí viajando... Inf. 2 - é mas fica até mais romântico mesmo né?... se ela pudesse curtir... realmente... mas ela nem tchun pra ele... Inf. 1 - nem tchun pra {ele... ((risos)) Inf. 2 - nem tchun ((risos))] [23 Doc.2- voltando aqui um pouco assim na política né? essa novela Minha PÁtria que /tá passando agora... vocês acham que ela veio {be/ beneficar ou... Pátria minha Inf. 1 - Pátria minha não... ((riu)) Doc.2- /brigado pela retificação ...eh:: vocês acham que ela veio pra beneficiar:: o F. H. C.?... Inf. 2 - não... tu acha que {veio H.? Inf. 1 - eu acho Inf. 2 - tu acha? eu num acho não Inf. 1 - eu Acho que:: o que vier daqui pa/ frente Inf. 2 - tu acha que vai ser tudo isso? Inf. 1 - vai... o que vier {daqui pa/ frente ] [24 Inf. 2 - eh:: agora eu faço como o T. "não me VEnha com FAL::so mora{lis::mo:: diz né? T. Inf. 1 - não o que o T. diz o que {o que... NÃO... não o que o T. quis dizer... é exatamente Inf. 2 - que o plano eleitoreiro se fôssemos nós faríamos a mesma coisa Inf. 1 - o que o T. ... quis dizer o seguinte não é que o PLAno... não seja eleitoreiro {o plano É eleitoreiro aGOra o que ELE quis Inf. 2 - o plano É eleitoreiro mas SÓ que Inf. 1 - dizer... Inf. 2 - qualquer {um faria Inf. 1 - que se QUALQUER um que tivesse naquele luGAR {TAMBÉM faria um plano eleitoreiro MAS o plano É eleitoreiro Inf. 2 - fa/ também faria a mesma coisa... lógico que faríamos você faria eu faria... todo mundo faria Inf. 1 - aGOra... a a:: aquela novela... vai mosTRAR... o OUtro lado do Brasil... que dá certo né?... o LAdo que dá certo... o LAdo que num é corrupto o LAdo que é honesto... né? Inf. 2 - é porque o José Maia né? quando voltar aí voltou a mulher dizia que num ia voltar porque o Brasil tinha verGOnha de dizer que era brasileiro e tal... ele DIZ ele não ele já HONra {né? o nome do PAÍS... Inf. 1 - e é exatamente isso que Inf. 2 - maraviLHOso... e ta Inf. 1 - estão pregando né? Inf. 2 - eh:: e tem de tudo na {novela tem COR::no Inf. 1 - eu acho que eles vêm para o Ceará que é o Cea/ é o Estado {que deu certo Inf. 1 - também Inf. 2 - ( ) Inf. 1 - eles devem vim... vim... terminar aqui né não? Inf. 2 - o {quê? Inf. 1 - é o único Estado que deu certo né o Ceará? Inf. 2 - pois é... {vai ver que acaba aqui AÍ as novela

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Inf. 1 - vão terminar aqui né? Inf. 2 - vão virar tudim aqui {tudo nordestina... Inf. 1 - é Inf. 2 - tudo CeARÁ Fortaleza... vai dar é certo ((falou rindo))... NAS PRAIA da vida aí de Tropicalien{te Inf. 1 - então exatamente isso eu Acho que vai terminar eh eh eh tudo::... bem propício sabe?... Inf. 2 - eh mas já começou tu viu que ele empregou o dinheiro que ele TROUxe ele juntou quarenta mil dólar como se fosse o fim do mundo né? aí ele Acha que quarenta mil dólar ele voltou milionário realmente pra Ele... DIANte da situação dele que mora... o pai dele mora num morro e tal... quer dizer saiu daqui com uma mão na frente REALmente quarenta mil dólares é dinheiro] [25 Inf. 1 - e uma {uma uma jornalista... Inf. 2 - lógico Inf. 1 - que veio... morou na FRANça... e trouxe um dinheiro... uns dólares {ela num disse... verídico ela contando num Inf. 2 - mas isso é verídico ou é novela?... ahn Inf. 1 - num num... num jornal... que trouxe um:: diNHEIro pa/ comPRAR um carrinho quando chegasse aqui... e dava pa/ comprar um Gol oitenta e oito Inf. 2 - oxente juntou muito pouco Inf. 1 - pois é... AÍ... ela não quis comPRAR... esperando a valorização do dólar... Inf. 2 - aí las{cou Inf. 1 - HOJE só dá pa/ comprar um Gol oitenta e três ((falou rindo)) Inf. 2 - ((riu))... ( ){se lascar né? Inf. 1 - é Inf. 1 - é... enTÃO ELA ELA contando que as COIsas... de fato... QUEM TRAZ dólar p/o Brasil COMprando em DÓlar AINDA É... MUIto mais caro do que na Europa... ela falando essa PARte de... ela disse que tinha bem decoRAdo na cabeça a parte de eletrodoméstico geladeira som::... e num sei o quê... era em torno de TRINta a quarenta por cento... mais CAro do que na Europa ALÉM de se ganhar um salário mínimo de MIL e duzentos DÓlares... Inf. 2 - ainda é mais barato {lá Inf. 1 - você ainda compra mais barato lá do que aqui Inf. 2 - e aqui você ganha menos e... {compra mais caro Inf. 1 - e compra mais caro Inf. 2 - mas isso é né? realmente você... se você mandar buscar qualquer coisa num::... aí por fora Inf. 1 - num é À {TOA que eles trouxeram a copa e a cozinha né? Inf. 2 - ( ) mais lógico a copa e a cozinha... trouxeram {geladeira trouxeram fogão Inf. 1 - é Inf. 2 - trouxeram... eh:: aquelas televisão de num sei quantas polegada trouxeram trouxeram tudo... EU traria você traria /cê traria todo mundo traria Inf. 1 - deZESSETE {TONELAda sim mas o problema é PAGAR Inf. 2 - TOdo mundo traria... não o problema é pagar a fiscalização {num custa nada pagar os imposto... aí o Inf. 1 - é... é Inf. 2 - problema é que eles num querem pagar QUER DIZER... num sei nem se eles num querem pagar a confusão já fizeram foi tão GRANde disse que o Romário já /tá querendo pagar num sei quem quer pagar... porque fizeram uma confusão tão grande em cima disso... naquele {( ) Inf. 1 - e eles vão pagar trinta e cin{co por cento Inf. 2 - ahn Inf. 1 - ...o:: CENto e sessenta mil dólares... que eles vão receber... Inf. 2 - trin{ta por cento?... pronto... pronto... tranqüilo

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Inf. 1 - aí vão comer aí é... a:: mordida vai ser aí Inf. 2 - já vão ganhar dinheiro demais /tá bom... né não? Inf. 1 - pagar Inf. 2 - /tá de bom tamanho... Inf. 1 - terminar pagando por aí... Inf. 2 - é... é por aí mesmo -- /tá terminando –] [26 Doc.2- e o SINE aqui agora vamo/ ( ) pro... trabalho de vo{cês Doc.1- uhn Doc.2- ...o SINE... porque ele emprega pessoas quer dizer:: né? a gente sempre vê no jornal né? {oferta uma lista de oferta Inf. 2 - ((tosse))...ahn ahn Doc.2- de empregos... com/ é que /tá atualmente o campo de emprego aqui no Ceará?... Inf. 1 - olhe essa parte aí... apesar da gente ser:: Inf. 2 - do... {da /qui do SINE né? Inf. 1 - nós somo/ talvez os dois mais novo do SINE... Inf. 2 - é Inf. 1 - né?... então eh o SINE hoje... eh... ele ele tem ]

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CONVERSAÇÃO ESPONTÂNEA D2-39 (PORCUFORT) CORPUS PORCUFORT Coordenador - Prof. José Lemos Monteiro Inquérito nº 39 Informante 1- Mulher, 66 anos, fortalezense, filha de pais fortalezenses, graduada em Pedagogia. Informante 2- Mulher, 62 anos, fortalezense, filha de pais fortalezenses, graduada em Letras. Tema: Programação de festas religiosas e problemas humanos Data do registro: 29/11/94 Duração: 60 minutos [1 Inf. 2 - -- já me sentei o que eu queria::... dizer o seguinte... sa/ saiu aí um:: disco... laser ((ruído estranho)) é uma é uma:: gravação feita antiga que agora foi quase ( ) para pra venda ao público... Inf. 1 - é mesmo? Inf. 2 - eu vou atrás desse aí porque ele disse que aquele can/ que:: que ele tem uma voz lindíssima:: e que ele canta que é uma maravilha... ele canta uma:: um Angelus uma Ave-Maria... e o que é a outra? e tem outras músicas cantadas por ele... Inf. 1 - em gregoriano? ((interrupção estranha)) Inf. 2 - em gregoriano... e também canção:: e::... outros cantos aí num sei...{num sei se música também Inf. 1 - também Inf. 2 - ... como a popular na igreja num sei com/é... Inf. 1 - não porque { o GREGOriano é o próprio... Inf. 2 - HINOS Inf. 1 - cantochão Inf. 2 - hinos e:: tudo mais num sei{ eu sei que eles falam Inf. 1 - olha Inf. 2 - que ele canta:: e:: Angelus... e::... uma Ave-Maria... ((ruído)) diz que é muito bonito muito bem gravado muito bem feito... o disco {dele... Inf.1- ótimo... ótimo porque ele então /tá se revelando... porque:: ah também tem um livro aqui né/ No Limiar da Esperança {tu já ouviste falar?... Inf. 2 - ah não não... não Inf. 1 - ih:: Livro de de João Paulo segundo... responde ao per/ à perguntas e procura mostrar as realizações de seus QUINzes anos de papado... eh::{ ele... é Inf. 2 - para católicos e leigos Inf. 1 - ele deveria faZER... pelo que eu tenho ouvido falar... ele deveria fazer... uma entrevista... numa das:: RÁdios lá dumas... da... rádio?... não televisão uma das... da:: televisão MAIS importante lá da Itália Inf. 2 - uhn uhn Inf. 1 - então... ele deveria falar ser entrevistado talvez umas duas horas... e:: ... por causa do trabalho DEle muita... ocupaÇÃO... então::... o::... o repórter... conversando com ele encontrando-se com ele porque é um:: teÓlogo... lá da Itália... então... entregou a ele as perguntas que ele iria responder né?... Inf. 2 - cer::{to Inf. 1 - então ele::pegou as perguntas e levou o santo padre...

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Inf. 2 - uhn uhn Inf. 1 - tomou as perguntas... e levou pra ele... muito tempo dePOIS talvez algum tempo num sei quanto tempo... ele::... enviou ao repórter... esse:: esse JÁ TUDO... respondido,,, e essas respostas... então foi formado o livro... diz que é um livro MUIto bom... e::foi esgota/ foi esgotado TOda a edição aqui que foi publicada aqui em Fortaleza... Inf. 2 - é? Inf. 1 - As Paulinas ti::nha... mas eu j:: andei... procuRANdo... mas disseram que já estava esgotado mas COM certeza... virão novas... novas... comé que se chama? Doc. - {novos livro novas edições eu num sei o nome Inf. 2 - livros... novas edição... ah deve ser... né Inf. 1 - pois é ((pigarreou)) ] [2 enTÃO... graças a Deus que o santo padre... está:: dando uma resposta ao MUNdo... porque:: precisa o mundo precisa.../tá muito muito... fora da igre::ja e falando e... dizendo coisas que num:: devem dizer né? Está muito afastado da igreja e de Deus...{de Deus sobretudo de Deus... Inf. 2 - uhn uhn ] [3 Inf. 1 - então agora também teve essa essa SAgração... ou consagração... de NOvos cardeais:: né? foram mais de TRINta novos cardeais foram consagrado pelo santo padre... agora... o BraSIL... não recebeu nenhum né?...{ mas... América Latina... s/ f/... recebeu Inf. 2 - mas quantos latinos? Inf. 1 - mais:: SEIS... cardeais... América do Norte mais TRÊS OceaNIa quatro... a Ásia... quatro... e a África dois e a Europa QUINze {mas o Bra::sil não Inf.2- são... são oitenta e sete? é?... oitenta e sete ao Todo?... Inf. 1 - não... oitenta e sete todo não isso aqui são... os que JÁ existiam na Europa oitenta e sete MAIS o quinze Inf. 2 - ah só são quinze que vão ser... Inf. 1 - é... que já foram... aqui é porque... esse:: esse jornal aqui é:: quando aINda ia... acontecer mas agora já aconte{ceu esse aqui foi no Sábado... Inf. 2 - ah:: é antigo Inf. 1 - e a sagração foi e:: no domingo... eh o jornal aqui é de sábado... que diVULga... esta... esta:: sagrações de bispos aliás {num É uma sagração Inf. 2 - ((pigarreou)) Inf. 1 - num é?... num chega a ser uma sagração até o padre M.... na santa missa de domingo... ele explicou ao... o povo... aos paroquianos o que iri/ o que seRIA o que É... ser... cardeal na igreja {né? Inf. 2 - uhn uhn Inf. 1 - e muitas pessoas ficaram assim BEM admirada porque pensava... que... o::{cardea/ Inf. 2 - realmente o cardeal é cargo né?... Inf. 1 - pois é é uma FUNção Inf. 2 - é uma função ele num é::{ ele Inf. 1 - mas... a maioRIAdos católicos pensam que é... uma sagraÇÃO como é o bispo Inf. 2 - ... uhn Inf. 1 - como é... o::{sacerdócio né?... e não é... então ele Inf. 2 - padre Inf. 1 - mostrou que até o LEIgo pode ser cardeal na igreja né? e que é uma fun{ÇÃO... eh... eh... Inf. 2 - uma função uma escolha Inf. 1 - é como o ministro... é um ministro né? é um ministério num é num chega { a ser uma sagração Inf. 2 - eh Inf. 1 - {nem uma ordenação

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Inf. 2 - seria o mesmo que o monseNHOR::... Inf. 1 - eh... cô::nego Inf. 2 - ou {cônego Inf. 1 - são títulos Inf. 2 - eh são... uhn Inf. 1 - mas {tem um nome que eu:: num me foge agora... Inf. 2 - certo Inf. 1 - agora... ele expliCOU... inclusive também que SÓ até aos z/ ao oitenta Anos eles podem... eles podem... ser::... eleitores::... no::... na votação do Papa... né?... então isso foi tão interessante eu gostei mesmo] [4 até depois eu falei com padre M. parabenizando porque... ele faz os:: os sermões DEle... muito voltados para o sociAL... e também para a instrução do povo... sobre... a::... administração da igreja a dinâ::mica como... como se processa... essa hierarQUIa dentro da igreja... e:: também:: há o lado... administrativo... ele SEMpre fala ele é um homem MUIto culto o padre M. viu?... ele::... com/ ele::... estuda é estudioso... graças {a Deus ele é estudioso ele inFORma... muito Inf. 2 - ahn ahn Inf.1 - bem aos paroquianos...] [5 mas engraçado eu estava hoje... porque a E. /Tá fazendo aí no Morro do Ouro... ela está fazendo uma:: ((ruído)) Doc. - pode conti{nuar ((voz de terceiro)) Inf. 1 - ela está fazendo aí a noVEna... do Natal né::? que agora é a preparação que é o adVENTO... Inf. 2 - o /P. até me deu uma revista pra eu ler... e ver:: mais ou menos... como seria o que a gente poderia fazer essa novena depois então nós temo que conversar sobre isso... Inf. 1 - {certo Inf. 2 - tu já viste o livro?... Inf. 1 - não:: o livro não { eu vi a:: o folheto da F. que ela Inf. 2 - viu não Inf. 1 - tem:: inclusive hoje nós estivemos escolhendo umas músicas... pra que ela::... va::/ ela hoje á tarde vai {ontem eu fui com ela... Inf. 2 - ((pigarreou)) Inf. 1 - mas infelizmente::... ou felizmente num há num há o infelizmente não... eu num POsso ir né? por causa da entrevista eu num posso acompanhá-la mas... com cerTEza... a::lgumas pessoas lá da igreja não acompanhá-la... E:: então também tenho um aMIgo... aquele rapaz que::... vem aqui... eh:: me ensinar a a utilizar aquela MÁ{quina eletrônica... e que Inf. 2 - ah... ah Inf. 1 - eu já estou sabendo... pelo meno/ já... copiei VÁrios textos na máquina está:: eu estou muito bem... na máquina... E:: ele me pediu... que queria para a::... pra família Dele... uma alguma dramatização::... algum trabalho pra eles fazerem mais um Natal só de de... de papai Noel uma um... eu achei tão interessante isso viu? Inf. 2 - {uhn uhn Inf. 1 - é um rapaz:: que::... num faz parte de movimento de IGREja... e /tá intereSSAdo em fazer na casa Dele um Natal diferente... e pediu... não uma espécie de jogral... mas uma encenação... e eu então encontrei aqui nessa revista... e copiei pra ele... muito interessante... e poderíamos também lá na nossa casa lá:: na casa na tua casa... faZERmos uma adaptaÇÃO... Inf. 2 - a R.M. tem uma tão interessante... Inf. 1 - é? Inf. 2 - tem...] [6 {aliás nós estava/ ela estava pensando Inf. 1 - é Inf. 2 - organizar pra fazer no DIA... do aniversário do papai mas eu tenho impressão que num:: Inf. 1 - num vai{dar

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Inf. 2 - não vai num vai... primeiro porque nós num vamo tu temp o de:: copiar aquilo tudim pa/ distribuir com todos os sobri::nhos né?... Inf. 1 - só essa Inf. 2 - pra traZER:: então depois aí tem umas MÚsicas que EU não conheço... quer dizer é aquela é a tal história você sabe... mas num LEMbra aí fica enganchado aquele negócio que vo/ que::... na hora h vaia dar...{num vai dá certo Inf. 1 - errado Inf. 2 - vai dá errado mesmo ((riu))... aí é melhor num fazer...((falou rindo)) mas ] é bem bonitinho eu tinha umas... também umas representaçõezinhas também muito bonitinhas... que a E. me deu... se eu procurar eu encontro... são bem bonitim mesmo assim pra criANça pra criança mesmo fazer... essa... tem até uma:: que tem uma enTRAda as crianças bo/ eh o menino Jesus no meio da SAla aí vem as criança ((interrupção)) nela fica no escuro aí as crianças entram com a VEla... aí cantam aquele... Inf. 1 - os cânticos próprios do Na{tal né? Inf. 2 - próprio do Natal é... Inf. 1 - é isso é muito interessante pelo menos { vai dar uma conotação Inf. 2 - ((pigarreou)) Inf. 1 - ... a/ aliás num é nem uma conotação... eh:: o sentido REAL... né?... Inf. 2 - eh:: Inf. 1 - porque:: eh::... o sentido... conotativo é um:: sentido figurado né?... e nós... podemos até lembrar ((fala rindo)){isso de português né?... Inf. 2 - ah é Inf. 1 - a palavra tem dois... valores eh conotativo e denotativo... mas num é o caso... pois olha tem aqui olha dezembro Natal é o fim do ano essa aqui é MUIto interessante... VEM senhor Jesus... e são POU::cos olha é pouco olha como é pequeno... viu?... ((tosse distante de terceiro)) é muito pequeno dá pra gente fazer:: rapidamente::eu poderia copiar... aqui na... na máquina... copiar na máquina e e... e distribuir porque incluSIve essa Máquina... ela:: é::... ela reproduz o texto... ela tem MEMÓria... eu posso datilografar... na memória... e depois reproduzir quantas cópias eu queira Inf. 2 - é{ mesmo? Inf. 1 - é... Inf. 2 - {maquininha sabida né? ((risos)) Inf. 1 - é muito Inf. 2 - daqui a pouco...((falou rindo levemente)) daqui a pouco nós /tamo ficando pa/ trás...{((riu)) Inf. 1 - é isso aí ...{ nós temos que andar bem... rápido porque... Inf. 2 - ((ri levemente))... Inf. 1 - aí mas é tudo isto] [7 então essa essa revista você tem lido a revista? eu mando pra você eu mando pra:: Inf. 2 - eu leio{alguma... eu sei Inf. 1 - PRA E.... e mando para o P. o P. eu sei que ele lê porque ele me dá notícias ele diz "Olha tem este... esse arTIgo é muito BOM:: eu já li::...{e:: Inf. 2 - uhn Inf. 1 - ...copiEI vou mandar também... reproduzir no jornal da::... da paRÓquia "...] [8 ele SEMpre se interessa mas se interessa mesmo que eu num seis mesmo onde é que ele arranja TANto tempo... pra faz/ pra is/ pra LÊ... porQUE... ele::{ traBAlha Inf. 2 - trabalha que só... Inf. 1 - eu acho que ele trabalha vinte e quatro horas por dia... ou quarenta e oito num sei... eu sei que o:: tempo dele dá e ainda dá pra::... pra fazer parte da iGREja e:: fazer a a... a leitura desta desta reVISta... E... e refletir sobre o que:: eles dizem... eu muitas VEzes... muitas vezes... eu... só vou ler

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quando ele diz "Olha eu li um artigo assim assim assim" aí eu Abro a revista aí vou ler né?... ((riu)){são coisas... da preguiça preguiça Inf. 2 - ( ) Inf. 1 - mental que eu tenho hoRRÍvel hoje em dia... num dá mais pra eu...] [9 Inf. 2 - olha aqui... bota uma:: Para refletir na contra-capa né?... "o exercício do silêncio é TÃO importante quanto a prática da palavra" quer dizer que que o fato d/ eu ((falou rindo)) ser calada... num é mau não{((riu))... Inf. 1 - é não:: é Inf. 2 - num é mal ((falou rindo)) Inf. 1 - {num é mal:: num é MAL mas... mas... o... Inf. 2 - é benzinho... não:: Inf. 1 - mas o que acontece com voCÊ é que você quando... é muito mais caLAda do que... Inf. 2 - o normal Inf. 1 - é de{veria s::/ no::no no nos MOMENtos em que você Inf. 2 - num:: Inf. 1 - deveria falar você tem preguiça de falar... então você teRIA você {TERIA... QUE... ter mais expressão Inf. 2 - ah /ta Inf. 1 - ...por exemplo com suas FIlhas... com as suas filhas você conversar mais com elas elas preCIsam da da... da suas da sua palestra {da sua do seu ensinamento do seu conSElho da Inf. 2 - mas aí Inf. 1 - sua... adverTÊNcia... dum diÁlogo mais profun::do... porQUE... como é... como às vezes elas dizem né? elas se queixam... "ah:: mas a tinha que... ela... eu a gente nós perguntamos a ela... e ela diz assim "NÃO eu num sei"... num sei mais isso num sei"... até de inGLÊS mesmo que você é formada em inglês... você... se NEga... Inf. 2 - não mas assim é a tal história faz tantos anos que eu num estudo inGLÊS... que às vezes eu n/ existem algumas coisas... eh:::::::: modifiCAdas... existem muitas coisas assim que às vezes... porQUE... e inglês eu traduzo BEM sem haver:: sem haver necessidade de estar buscando isso aquilo mas eu traduzo às Vezes mais pelo sentido... daquilo que está escrito do que MESmo... buscando palavra por palavra... que eu toda vida aprendi que inglês você num estuda e nem traduz palavra por palavra você LÊ... comPREENde o sentido... aí você faz a sua tradução né?... então elas QUErem... saber palavra por palavra... aí eu traduzo "ah essa palavra significa isso essa significa Isso... essa tem esse significado então se você for traduzir assim uma em cima da outra você num vai ter sentido naquilo que v/ que ele REalmente está querendo dizer né?"... então Inf. 1 - {certo Inf. 2 - então pronto a gente dá uma uma:: explicação pra elas... Inf. 1 - CER{to Inf. 2 - mas Inf. 1 - certo MAS:::... isto is{to Inf. 2 - às vezes também falta assim:::... cheGAR Inf. 1 - ...pois é Inf. 2 - {((risos)) Inf. 1 - É ISto... o que faz... faz você ter preguiça talvez porque você não tem o exercício do ensino né?... de... SER professora... ] [10 PARA MIM muitas VEzes eu até nem sei BEM:: profundidade a matéria a ser explicada... MAS::... como eu fiz PedagoGIa... e:: a Pedagogia enSIna como se ensinar... né? tem as TÉCnicas... tem a maNEIra... tem a MEtodologia... tem a TÉCnica de:: ensiNAR... então... isto me DÁ... com a... o pouco conhecimento que eu tenho de qualquer maTÉria a num ser línguas porque língua é língua né? é diferente... mas sendo HisTÓria sendo:: Geografia... quantas vezes... elas veêm aqui com::... matéria de:: científico até terceiro científico de Geografia...

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Econo/ E::coNÔmica... é:: sobre assuntos assim mais profundos QUE EU num não me especializei... mas devido... eu ter a TÉCnica do enSIno... e TER... a::... a prática... de viver ensiNANdo... COM com o livro... acompanhando o livro que ela traz::... eu... sou capaz... de:: elucidar alguns problemas de:: ORIENtar... NÃO ensinar mas orientar COmo... as alunas como... as meninas tu conhece?... estas que vêm aQUI:... elas podem se... guiar se orientar e fazer o trabalho muitas vezes elas vêm ela mesmo a D. ME:: manda... para... eu resolve r os problemas das... filha dela mas DESta FORma porque s/ SEMpre... eu tive MUIta::... virei... em sala de aula ensinando ensinando ensinando... ensina::va... no:: alfabetização:: que foi... a minha preferência... sempre foi alfabetização... e depois então o:: primeiro grau:: maior como nós chamamos aqui né? o primeiro grau maior que é quinta à s::/ à:: oitava SÉrie... e EU susbtituÍA os professores mesmo na escola... "oh falTOU o professor tal "aí pra não de/ para não:: os alunos não voltarem eu assumia a classe... aquela:: aquele DIA naquela HOra... e EU... faZIA... e levava as TÉCnicas até diNÂmicas de grupo essa... tudo isto... e isto me faciliTAva... né? a orientação::... da da turma... e eles gostavam... agora eu sempre dizendo pra eles com muita honestidade que EU não era professora daquela matéria ((ruído forte)) eu não... dominava inteiramente a matéria... mas eles compreendiam geralmente os alunos de oitava série então eles compreendiam e eles me ajuda::vam... e nós e sempre nós... saíamos bem... os alunos num perdiam porque tinha um momento de... tinha um:: um TEMpo... não tinha o tempo ociOso... né?... teriam QUE esperar pela OUtra aula que o professor estava né? então eh::... dava certo...] [11 mas o que falta... em você é justamente isso é porque você SE... ocupou MUIto com::... a pal/ a::... parte burocrática né? você trabalhou muito com burocraCIA Inf. 2 – exato Inf. 1 - se ausentou aliás NUNca foi a uma sala de aula a num ser como aluna né?... né? ((ri levemente))mas ((falou rindo)) isso dificulta muito... e isso foi bom...] [12 hoje eu tenho uma certa dificuldade de expressão tenho:: num posso negar... me falha muito a memó::ria... a idade...PESA a gente diz "AH NÃO:: ficou ne::la num tem esse negócio idade... a idade está no espírito está num sei em quê:: mas /tá também:: no físico está também no psíquico tem está aSSIM" Inf. 2 - ... e como esTÁ... Inf. 1 - pois é... pra você VÊ essa { esse Inf. 2 - (...) como está às vezes a gente sente assim uma::... cê/ uhn:: você vai... conversando aí de rePENte aquele negó/ que você estava conversando... lhe FALta uma paLAvra lhe falta uma:: coisa que pra... pra você dizer que você fica... sem saBER como fazer... Inf. 1 - {é Inf. 2 - como dizer isso aí... existe... e eu, {acho que é também um pouco... né? Inf. 1 - e:: e eu Acho que isso me dificultou muito aquela... esquemia cerebral que eu tive... o ano passado estava quase há um ano... aquilo também me prejudicou MUIto... se não só a iDAde mas há também a esquemia cerebral aquele proBLEma... foi um problema que... perdi... completo a memória... e eu acredito que aquilo também me atrasou muito... me prejudicou muito sim... eu hoje:: eu num tenho mais a facilidade que eu tinha eu posso até conversar muito e::... e passar uma hora uma hora e MEIa num telefone conver{sando conversando Inf. 2 - ((risos)) Inf. 1 - sem PARAR né?... mas... eu sinto uma dificuldade sim... a memória não me ajuda muito não mais... as coisas que eu estudei já muitas vezes eu esqueço... mas é isso mesmo] [13 mas a gente vai adiante vai LENdo sempre lendo lendo e procurando... novos:: novos caminhos novos {novos rumos Inf. 2 - NOvos rumos... Inf. 1 - exatamente... Inf. 2 -e { vai encontrar né? Inf. 1 - e É ISSO QUE EU... é isso que eu tenho encontrado... por exemplo na igreja... pra mim graças a Deus... o::... esta Renovação CarisMÁtica... né?... me tem::: dado muitas oportunidades:: e

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isto é BOM... porque acomodada também como eu sou... EU como certeza... estaria HOJE SÓ em casa... porque não gosto de sair... num gosto de passear num gosto de diversão... então eu estaria em CAsa somente lendo lendo lendo lendo lendo pra meu deleite e pra... e pra ficar com aquilo pra mim somente e num levar mais nada pra ninguém mas assim... mas graças a Deus... eu vou eu fui para esse grupo de oração... onde LÁ... eu faço outros exercícios... por exemplo... falar em público... né?... evangelização evangeliZANdo... numa praça como tem a praça do LiCEU... eu vou... e falo... no iNÍcio eu tinha que escrever Tudo que eu ia dizer... e eu num podia sabe? Tirar a vista daquilo que eu estava... lendo porque... SE EU tirasse... eu num sabia mais o que... dizer... ficava parada... hoje não graças a Deus{ eu:: me] [14 Inf. 2 - eu /tava me rindo aqui é do REfletir daqui... Inf. 1 - pois é... "se tens palavras mais forte / que o silêncio fala... se não tiveres...{então guarda silêncio"... Inf. 2 - ((risos))... com/é?{((risos))... é Inf. 1 - é mas isso aí é pra é contigo né? tu { queres tu queres... tu Inf. 2 - é Inf. 1 - queres com ISSO... tu queres com isso daqui com {essa outra palavra justificar o teu silêncio né? Inf. 2 - justificar né? ... é mas eu... claro { que tenho que justificar Inf. 1 - aí t/ aí comé que diz::?...com/é que diz nesta outra revista sobre o silêncio?... Inf. 2 - nessa daqui é o seguinte "o exercício do silêncio é tão imporTANTE... quanto a prática da palavra"... Inf. 1 - pois é... claro... mas a... o negócio é a gente saber o que deve falar e como falar:: e... a QUEM deve falar... num é? Inf. 2 - {uhn:: ] Inf. 1 - [15 eh::... por isso eu eu falo... eu falo... eu tenho vonta{de de falar sobre Deus... Inf. 2 - ( ) Inf. 1 - eu vou pa/ pra/ vou para a praça... e:: lá... já tem o::... o aSSUNto... eh... LIdo... eh quer dizer esCRIto eu já escrevi eu já:: mediTEI eu já::... e eu falo sem olhar para o papel agora e... as pessoas podem até... eh::... me inga/ me indagarem... perguntarem alguma coisa e eu enTENdo... graças a Deus tô me saindo bem... E... é por causa desse... desse::... grupo de oração... mas::... eu sinto uma inibição QUANdo de repente alguém me pergunta uma coisa... né?... ontem por exemplo... e nosso coordenaDOR:: ele:::: se diri/ me se dirigiu a mim... pedindo que eu relembrasse... o assunto da semana anterior e eu num me lembrava mesmo não... então mas por QUÊ?... porque de... foi assim de CHOfre... "dona M. Diga o:: que a senhora se lembra da semana passada?" Inf. 2 - ( )...num me lembro nada... Inf. 1 - sim{plesmente nada... simplesmente... NAda"... Inf. 2 - ((risos)) Inf. 1 - dePOIS quando as outras pessoas começaram... a::... falar:: uma dizia um assunto "ah:: isso... ah sobre a Gra::ça... sobre:: a vocação de Moisés aí a COIsa veio... chegando a minha memória chegando a mim... e eu... fui me lembrando mas aí já tinha passado a minha vez:: Inf. 2 - ((riu))... Inf. 1 - ((riu))...num era mais... a minha VEZ... eu tive mais que... me calar e ficar escutando e ficar como uma pessoa que... mas ele sabe todo mundo sabe que eu estou:: nesse nesse problema e graças a Deus num é TANTO assim... que vai dando bem:: pra gente... começar vai DAR pra... pra que eu possa falar eu possa transmiTIR alguma coisa... e me sinta Útil... porque as pessoas dizem assim "ah:: é ah terceira idade hoje fala -se demais na:: terceira idade... a terceira idade é MU::Ito... solicitada para dizer alguma COIsa... para fazer alguma coisa tem essa... a Universidade aí sem

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fronTEIras... "ah por quê você num vai pra di/ pra... a Universidade sem fronteira?" num tenho necessidade eu já fiz a minha Faculdade... já tenho o meu curso {já tenho Inf. 2 - o:: G. C. vai dá agora um curso se eu num me engano é em janeiro... Inf. 1 - ah e por fa{lar em... E. em::G.... eu preciso Inf. 2 - é... G. Inf. 1 - MUIto... me comunicar... com ele... será que você sabe? o... o telefone dele?... Inf. 2 - sei nem como me comunicar com ele... sei não... {ele vai dar um curso na::na Universidade sem fronteiras né? Inf. 1 - foi... sem fronteiras Inf. 2 - {eu acho Inf. 1 - qualquer curso que ele DÊ será excelente porque é um GRANde professor... ele foi meu professor de Dinâmica de Grupo... foi assim MA-ravilhoso... é uma pessoa inteligenTÍssima... e::... sabe ser professor...] [16 eu sempre digo... que uma coisa na vida eu soube fazer... foi ser professora... de séries iniciais... e foi mesmo... eu me:: realizava PLEnamente dentro duma sala de aula... eu eu DENtro de uma sala de aula eu era... a pessoa MAIS feliz do mundo... é tanto... TANto é assim... tanto é que eu... hoje me encontro com ex-aLUnos... e eles sempre se lembram de MIM... "ah a senhora é aquela exigente... aquela que nem deixava que o aluno saísse da sala de aula... aquela que... reclamava... a posTUra... numa carteira"... eu exigia MUIto dos meus alunos exigi MUIto porQUE... eu fui de uma fase de escola... quando que::... a gente ensinava o aluno a entrar e a sair numa sala de aula... não admitia mesmo não que o aluno s::a/... chegasse... depois que eu entrasse na sala de aula ] [17 e eu me lembrava então do M. de A.... o meu professor de português aqui no Liceu... gran::de filólogo grande M. de A.... A. era uma... pessoa maravilhosa...ele deixava ((falou rindo)) ... ele ficava espeRANdo... fora da sala de aula... TOdos os alunos entrasse... depois do recreio ou não no início da aula né?... espeRAva que TOdo mundo entrasse... porque depois que Ele entrasse NINGUÉM MAIS entrava... mas eu num fazia tanto quanto o M. de A. não... eu achava muito engraçado porque o M. de A. tinha aquelas... suas peculiaridades... outra coisa nós tínhamos que ficar esperando por Ele... de pé... não podíamos sentar... sem que ele dissesse... "boa tar::de gente" ele falava assim... e depois enTÃO... nós nos sentávamos... mas ANtes disso ah:: ele saía ele fazia o seguinte ele saÍa da classe... ele chegava e tinha uma aluna na classe SENtada aí ele saía... aí a gente já olhava pa/ trás... QUEM está sentado? ((Risos)) Inf. 2 - uhn ((risos)) Inf. 1 - aí eu::... nós dizíamo "A::I é o M. de A.::: o A. o A." chamávamos o M. Quer dizer chamávamos {o A/...A. Inf. 2 - A.... Inf. 1 - olhe o A.... A. chegou e ele num fazia fazia questão que nós chamasse/ de voCÊ::... que ele:: era assim MUIto amigo mas ele TInha umas exigências IM-PRES-SI-O-NAN-TES porque... isso me marcou muito aí do Liceu e M. de A. um grande professor de Português... E... ensin/ estudei com ele Literatura Portuguesa mesmo... então é::... eu não fui tanto... né? mas fui quanto... eu gostava que o aluno se educasse era bom::] [18 as pessoas hoje em dia há MUIta liberdade... eu num:: eu acho que os excessos prejudicam... excesso de liberDAde como excesso de rigidez de::... cerceaMENto... e falta de liberdade de... é... tudo:: tudo deMAIS é... como minha mãe dizia "tudo demais { é veneno"... Inf. 2 - é veneno Inf. 1 - então isso é uma... é uma::... uma... num sei se eu posso chamar de axioma... é um dito popular que a minha mãe repetia tantas vezes para nós né? TUdo demais é veneno... a... a virtude está no meio... e assim... para que as pessoas enTENdam... como devem s/... proceder na vida ainda há poucos dias eu estava me lembrando a{qui até comentando Inf. 2 - ((pigarreou))

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Inf. 1 - ...ah essa menina que mora aqui comigo NÉ?... ela... s/... eu sou da antiga mesmo eu por exemplo eh:: a MEsa... ah somo/ sou eu minha irmã e ela... mas a dona da casa sou eu... então parece assim que eu quero autoritarismo não ela tem toda liberdade aqui em casa... mas a mesa está posta... vamos nos... nos sentar para o almoço... ela logo chega e s/... se senta... eu disse "olha... eu vou ainda lavar minhas mãos... você aguarde um pouco"... parece depois eu me recrimino porque eu digo "mas pôxa vida quê que tem essa menina"... mas eu acho... já {eu aprenDI... eu aprendi desta maneira... NÉ?... ah Inf. 2 - quer tudo em Ordem Inf. 1 - o dono da casa tem que se... sentar priMEIro] [19 eu vejo lá na casa do papai nonen/ ((fim do lado A))_ _ mesma FIta?... é?..._ _ ((ruído e voz incompreensível))... pois é o papai ele::... ele... U::sa aquele mesmo método anTIgo e faz com que nós façamos também ele:: parece assim parece aTÉ... né?... naquele dia domingo... como ele se irritou né? Inf. 2 - uhn uhn Inf. 1 - porquê nós estávamos conversando... e como nós estávamos conversando todos ao mesmo tempo...{ele ficou irritaDÍssimo... ficou irritadíssimo Inf. 2 - ((risos)) Inf. 1 - não adMIte que se conVERse à hora... no no alMOço na hora da Mesa que dePOis... pode conversar se re/... se reTIre da Mesa... e... lá... vocês conversam à vontade... então papai é assim eu acho::] [20 ainda outro dia... alguém /tava me contando que achou muito bonito você dizer no telefone... da residência de L. M. ... QUANdo... a residência é sua... {a pessoa :: admirou Inf. 2 - ((ri levemente))... eu toda vida que atendo o telefone digo que a residência é dele... residência L. M. ... que:: de qualquer maneira num é a casa dele?... né meu pai?... eu sou proprietária mas o dono é ele né?... ((risos)) Inf. 1 - ainda continua a hierarquia {né?... é isso é muito bom Inf. 2 - é::... é uhn Inf. 1 - ...{isso é muito bom mesmo pra ele... ele... e MESmo Inf. 2 - uhn Inf. 1 - aSSIM... ele acha ruim a:: idade muito avanÇAda... Inf. 2 - é Inf. 1 - ele acha que NÃO DEve né? num sa{be por QUE? Inf. 2 - é pra QUÊ viver tantos anos né?... como é que ele e/stá::... vendo agora essa festa de idade que vocês vão fazer para os noventa e cinco dele?... Inf. 2 - eu acho que ele está gostando da idéia né? só que ele pa/ ((ri)) {ele hoje / tava dizendo que::... ((ri levemente)) pode ser que depois dos noventa e cinco né? chegue a vez dele de parTIR ((risos)) eu digo ( )... ((fala rindo))... o senhor vai chegar vai:: atravessar o ainda o SÉculo seu L. va/..."DEUS:: me defenda eu:: lá quero I::sso num posso andar num saio de Casa num faço o que QUEro... só pela mão dos OUtros "imagine que ele num anda pela mão de ninguém hein?... dentro de casa ele faz TUdo tudo tudo tudo pra ele... num tem essa história de fazer as coisas por ele não {ele faz Inf. 1 - é Inf. 2 - tudo por Ele faz tudo por ele... ele anda sozinho dentro de CAsa ele toma o banho DEle a única coisa que ele num faz é BARba... porque toda vida a barba dele foi feita em barbeiro né?... então depois que ele decidiu que não ia mais pra barBEIro... ele começou a fazer mas ele acha ruim... aí eu faço a barba dele num sabe?... mas no mais o papai faz tudo... ele só não POde... andar muito... ele não pode andar muito Inf. 1 - como é ele já::... ficou mais::... cal::mo porque você falou pra ele não fazer mais aguação do:: do jar{DIM:: Inf. 2 - continua fazendo... continua fazendo agora aquela a::... aquela:: medicação que o doutor E. passou pra Ele... parece que /tá dando um pouquinho mais de resultado melhorando a situação

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dele pelo menos aquele canSAço que ele sentia depois de aguar o jardim... que ele ficava MORto de cansado... não ele tem... ele cansa mas num É:: como ele ficava que ele ficava mesmo esmorecido mesmo... sabe?...((voz de terceiro)) Doc. tchau /brigado... Inf. 2 - então depois disso e::le tem melhorado bastante ele /tá até mais::... mais firme {né?... graças a Deus /tá:: Inf. 1 - ótimo graças a Deus... é porque assim ele::... ele num vê os noventa e cinco anos muito... perto da morte{né?...((risos)) Inf. 2 - ((risos)) Inf. 1 - porque o negócio dele é MORRER porque ele num pode mais anDAR... então:: num adianta mais... pra quê viver? se num:: num posso mais andar... o negócio dele é andar na rua como ele andava em em Fortaleza toda ele andava a pé né?... tem horror a andar de a/ de... automóvel... num carro pra ele é é a pior coisa do mundo... é uma verda/ é um flaGElo... andar de carro pra ele é um flagelo...] [21 pois é D. eu /tava... eh engraçado... Esse fim de mê/... esse fim de Ano... as festas /tão se assim atropelando... aqui na iGREja no Bom Pastor nós temos no dia sete pela maNHÃ... a festa da::... do:: das BOdas de::: PRAta do padre... capelão aí... depois... ANtes... no dia quatro... tem a nossa investidura né? os {ministros da eucarísTIa Inf. 2 - uhn... ((ruído))... às dez horas né? Inf. 1 - ... é ás dez hora{s... na igreja do:: São Benedito Inf. 2 - lá na:::... igreja do São Benedito...{ah Inf. 1 - eh... então nós vamos eh a investidura vai ser] [22 eu acredito que o papai não POssa {ir porQUE... Inf. 2 - não vai não Inf. 1 - é MUIto demorado Inf. 2 - depois tem que subir aquela escada ali na frente da igreja e ele num consegue mais Inf. 1 - por isto não porQUE:: LÁ Inf. 2 - uhn Inf. 1 - pela rua do Imperador você poderia... fazer... estacionar seu carro lá e ele e entraria diretamente na igreja... ali na Impe{rador... aí você:: ali num tem:: num tem Inf. 2 - eu sei eu sei... num sei eu vou perguntar se ele quer ir mas eu acho difícil ele querer ir... Inf. 1 - agora:: o que eu{ VEjo... é o... é o padre A. Inf. 2 - quem que vai fazer a a?... padre A. Inf. 1 - é... ele tem muita ad{miração:: pelo padre A. Né? Inf. 2 - uhn uhn... é... quem sabe né?... Inf. 1 - mas é muito demora:::do vai {ser demorado demais Inf. 2 - é né? Inf. 1 - são cento e tantos ministros... cada um::: tem que... aquela história VAI:: em procissão:: bem devagar e dePOIS:: passa no pa::dre o padre... num SEI:: como é dá uma benção e tal isso é:: uma coisa dimiNUta realmente mas são cento e tantos né?... Inf. 2 - é... não assim também não talvez ele num queira ir {não:: Inf. 1 - eh:: além do mais tem os cânticos tem a fa::la tem essa... tem leiTU:::ras... e:: eu acho que vai ser uma::... uma solenidade MUIto lon{ga... pra ele... Inf. 2 - demorada... Inf. 1 - ele já num agüenta {tanto tempo ficar sentado assim... Inf. 2 - ((pigarreou)) Inf. 1 - e vai ser difícil... mas::... {eu FALEI Inf. 2 - ( ) [23 Inf. 1 - ... sim fala Inf. 2 - a R. de C. vem...

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Inf. 1 - eh?... Inf. 2 - vem {ela disse que vem chegando quinta-feira pela maNHÃ Inf. 1 - que dia?... a{gora? quinta-feira primeiro? Inf. 2 - né?... não:: no dia do aniversário dele... no {dia OIto né?... ela vem pra chegar aqui no dia Oito Inf. 1 - ah::::... ah cer{to Inf.2 - né?... aí ela fica sexta sábado... e viaja domingo só... Inf. 1 - eh? Inf. 2 - é... Inf. 1 - ótimo... é bom Inf. 2 - passar uns diazinhos aqui{agora ] [24 Inf. 1 - pois é já:: na igreja nós temos eh:: a/ assim festividades da igreja é... TANta... confraternização é do grupo de oraÇÃO... eh::... do grupo do::... do Cristo é vida com outro grupo que tem aqui na paróquia... eh::... eh a::... festa da ordenação do nosso vigário né? de quarenta e dois anos de sacer{ dócio... e... tudo isto e a gente chega FIca Inf. 2 - uhn Inf. 1 - ... pensando eh:: o que o mês de dezembro devia ter uns sessenta dias... pelo menos... porque::... /tá Inf.2- ((risos))... Inf. 1 - olhe{ trinta num /tá mais dando... porque] [25 Inf. 2 - eh::... olha... agora eu tive u/ uma:::::::: {idéia Inf. 1 - conclusão de cursos essa {que é Inf.2- uma idé/ôh:: talvez quem consiga esse o endereço do G. pra voCÊ... seja::... a cunhada da E. ... que é desse curso que é da:: Inf. 1 - Universidade::{aber/ sem fronteiras né?.../tá bom Inf. 2 - a Universidade... é porque ela faz os convites para os professores pra:: ver quem::... pode:: dar as aulas os cur{sos que ela Inf. 1 - uhn uhn Inf. 2 - arranja... que ela faz... Inf. 1 - e qual é a... qual é a::... o curso que ele vai dar? tu sabes?... Inf. 2 - eu num lembro não Inf. 1 - não né? É da R.M.? a {R.M.? Inf. 2 - é não a R.M. matriculou e ela disse que me matriculou também pra ir pra esse curso...{eu vou no dia que quiser((risos)) Inf.1- ah são poucos... é pouco tempo é? Inf. 2 - eh:::...{ é pouco tempo e depois o seguinte esses cursos Inf. 1 - porque Inf. 2 - ela tem::: duas vezes na seMA::na é uma hora duas hora de Aula por sema::::na.... Inf. 1 - ah é? Inf. 2 - ás vezes no MÁximo quatro horas no máximo uma aula com {duas hora de aula... num sei... não sei... a Inf. 1 - e quanto tempo é que é a matrícula? Inf. 2 - R.M. quem fez e... ela me disse que ele ia fazer... que ela já tinha::... dado o nome pra menina... Inf. 1 - é né?...] [26 não a mim num interessa mais isso não o que me interessa agora é trabalhar para o reino de Deus... gratuitamente como eu sempre digo... tem que ser gratuitamente... e CURsos... só mesmo... é de:::...aprimoraMENto... de como:: a gente pode levar o reino de Deus aos nossos irmãos::... porque::... eles tão precisando MUIto muito muito... da palavra de Deus... há tanta miséria...] [27 você VEja... D. é TANto... se fala... tanto na:: violência... e se::... praticamente na

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PRÁtica num... eu acho que num se faz nada... para debelar diminuir... a violência... porque você veja a pessoa que NÃO TEM...... que tem Fome... uma pessoa] [28 ou/ outro dia eu estava olhando ali... uns operários que estão fazendo esse saneamento aqui na::... na ave{nida... Filomeno Borges Inf. 2 - uhn Inf. 1 - ...aqueles operários... então eu pensei e estava lá um um::: uma TREMpe... com aqueles... PAUS... e uma lata... com feijão e água... cozinhando pra eles se alimentar aQUIlo... me deu uma dor TÃO grande no coração de ver... aquela miséria porque aQUIlo... eu pensei "senhor... QUEM come isto assim... ele não sabe o que é ser gente"... porque... qual de nós aqui... olhe uma cozinha a minha cozinha é pobre mas você veja tem um fogão:: tem uma gelaDEIra tem uma.... Inf. 2 - uma pi::{a onde lava a louça Inf. 1 - uma pia inoxidável tem uma... tem água corren::te tem num seu quê... a PAnela é fechada {panela de pressão... o feijão num é ali cozido... Inf. 2 - o feijão num é cozido só com água Inf. 1 - então uma amiga minha viu aquele horror... foi lá na casa dela trouxe uma TAMpa... né? da... na PAnela e colocou lá na tampa os o... operário chegou gostou... gostou da iDÉia... aí a tampa era... era êh:: parece que era peQUEna né?... ele então foi lá:: e veio um um pedaço de FErro e botou assim{((risos)) o ferro lá Inf. 2 - ((riu)) Inf. 1 - na paNEla... e já::: a tampa Inf. 2 - apoiou a {tampa... é Inf. 1 - apoiou a tampa né?... aquilo então eu fiquei achando que a menina tinha feito um ato de aMOR... porque... pelo menos a POEIra... não iria ingrossar o caldo do feijão... porque era MUIta poeira ventania e aquela... e aqueles aquelas pessoas e eu me indagava... quando acabar a gente diz assim "ah::...ah:: as pessoas pobre são... são... groSSEIras... são desuMAnas... se MAta vive bebendo" e num seu quê... mas aquelas pess/ elas num têm condição será que... um engeNHEIro... num enTENde... que::... se ele nã/ ele sozinho ele num fazia uma obra?... será que eles não percebem I{sso?] [29 Inf. 2 - é a história você ver os pobres trabalham para os Ricos dão a ele a:: a eles as riqueza que eles têm né? e o que é que eles fazem com os os operário dele? Com os trabalhador dele? num dão nada... Inf. 1 - e{xatamente Inf. 2 - num dão nada... se:: se pego querem aumentar um:: salário mínimo então aquele aumento tem que sair na costa daquele p/ da dos OUtros que num têm nada a ver{lá com a riqueza deles... são incapazes são Inf. 1 - pois é s::/ são REPAssados Inf. 2 - incapazes... de... se conformarem com ganharem um pouco menos... né?... Inf. 1 - pois é Inf. 2 - num se con{forma então pronto Inf. 1 - e/... então eu fico pensando... o o engenheiro ah então eu fui até::a::a::a quitanda lá pra comprar umas laranjas e umas... verdura fruta aqui em casa... E:: o rapaz /tava me dizendo... a senhora veja..."quem mais trabalha AÍ são esses operários... porque passam o dia TOdim neste sol... desde sete horas da manhã aTÉ à noite... até cinco seis horas... são Eles ali... eh:: tirando aquela areia é verdade que tem aquele:: aquela pá mecânica... mas eles estão LÁ empuRRANdo soCANdo... E... olha aí comé que eles come? o engenheiro vem aqui talvez sendo uma vez por semana... no carrão dele ba/ "eh o rapaz falando pra mim né?... chega na:: e::... bota o Carro AÍ... num vai lá olha e tal......vem aquele... apontador "que ele chamou apontador... "e MOStra a Ele o serviço:: conversa com ele ali ele num passa nem meia Hora... aqui na obra... Inf. 2 - pois é

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Inf. 1 - e vai embora... quem ganha o dinheiro é ele "...então isso... eu sei::... que a gente:: a gente LU::ta a gente batalha a gente faz uma Faculdade pra estuDAR pra aprenDER... pra melhorar... MAS::... as nossas necessiDAdes... biológica as nossas /sidade de... de... sobre/vivência... eles também têm:::... eles têm necessidade de comer bem... eles eles fazem força podem num ter::... aquela o trabalho... intelectuAL ou o trabalho mental ele talvez não TEnha o intelectual porque até o mental porque um doido num trabalha... não produz ali... né?... ele ele NÃO pode... trabalhar ali... então:: eXISte um trabalho mental sim... ele sabe QUAL... QUAL... é a hora de colocar aquelas estacas de FErro... Inf. 2 - uhn uhn Inf. 1 - ah:: então eles chegam com aquela... aquela PÁ... meCÂnica com aquele trata num sei comé que chama aquele...{ caRRÃO... aí elas ela... vai colocando e eles vão Inf. 2 - é uma pá mecânica né? Inf. 1 - dizendo... "não ente/... afasta um pouco mais nem um pouco mais pra frente"quer dizer... há um raciocínio há um trabalho mental... e há o trabalho físico também esforço né? Inf. 2 – uhn Inf. 1 - E... quando {acabar o quê que eles têm direito? a comer Inf. 2 - ((pigarreou)) Inf. 1 - aquele feijão aQUIlo me do EU mas ainda NÃO esqueci até ((telefone toca)) hoje ((desliga o gravador))] [30 pois é então eu acho eu acho que nós:::... depois faz/falamos contra a violência mas... num tem::: num tem assim enQUANto enquanto nós brasileiros... não... modificarmos... ess/ essa problemática... da economia... nós vamos ter violência e mais violência porque as pessoas perderam a SUA dignidade... eles NÃO têm... idoneidade não eles num TÊM... eles num sabe o que é ser GENte?... eles sabem... fazer... eh:: satisfazer as suas necessidades... por exemplo COMER qualquer coisa come... o jumento come... capim... come porque precisa se alimentar precisa... eh:: sobreviver e::: ele COme assim esses homens... que trabalham assim... come... come o feijão com água:: e sal talvez cheio de poEIra... sem a menor noção de higiene... depois uma colega minha estava dizendo "ora e o e o... e eles trouxeram um BALde d’Água...para adicioná -la... à água do feijão... e então veio um cachorro e começou a {((risos)) Inf. 2 - ((risos)) Inf. 1 - a TOMAR... aquela água bebendo a água... e alguém FOI e gritou "olha o cachorro /tá bebendo a água "ele disse "tem nada não"... Inf. 2 - ((risos)) Inf. 1 - o cachorro eles{ vão ter que botar dentro da:: ainda bem Inf. 2 - eh::... uhn Inf. 1 - que é dentro da água fervendo né? O soBEjo do cachorro eles botaram na/ naquela água... mas é natural que eles num num... façam diferença num faz diferença... por quê!... qual é a diferença que existe... eles num têm... ninGUÉM disse a eles que ele é gente nin{guém disse isso Inf. 2 - tem muita gente trabalhando aí? tem? Inf. 1 - tem:: os ope{rários Inf. 2 - ((pigarreou)) Inf. 1 - são muitos operários...] [31 então ninguém fala pra Eles que eles têm uma dignidade se a gente vai falar pra eles... da digniDAde da necessidade... então é por/aí ai ser pixado de... antigamente era comunista agora é petista... né?{((riu)) Inf. 2 - ((risos)) Inf. 1 - antiga/ no meu tempo ((falou rindo)) {na minha juventude... você falar-- é – você falar Inf. 2 - ((riu))... era comunista Inf. 1 - dos direitos de um opeRÁrio de um... era:: era comunista taxado de comuNIS::ta e::num tinha::OUtra... alternaTI::va e pronto... HOje... eh::... petista... quando a iGREja... quando um padre... fala no sermão em favor dos pobres e mostrando QUE... o a sociedade... está excluindo

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cada vez mais... os seus os seus os seus irMÃOS... do conVÍvio da... sadio da sociedade... ah então o padre também é taxado "eh::: só fala contra os Ricos num sabe mais falar sobre Deus" mas se Deus foi o prime/ Jesus cristo foi o primeiro... comunista do mundo... SE SE existe agora só que num foi um comunismo aTEU{ foi um co/ comunismo um comunismo Inf. 2 - ((pigarreou)) Inf. 1 - ...dentro da palavra de Deus...] [32 mas... NÓS... excluímos os nossos irmãos EXcluímos DEPOIS dizemos que eles se exclue porque mata...NÃO... num é isso eles num são excluídos porque matam... eles QUANdo MAtam já eram excluídos... Inf. 2 - {uhn Inf. 1 - é diferente... a colocação tem que ser assim... ((pigarreou)) porque eu eu Vejo esse meu irm/ esses meus irmãos ALI... desse desses empreGAdo da da construÇÃO... aí nem eu eu lendo... uma... outro dia eu eu li um::... artigo ôh:: ou era mesmo uma entrevista... com aquele secretário... um cearense... por sinal que eu... quero muito bem a ele... né?...] [33 então ele dizendo que:::... a construção ciVIL... é necessário... que... faz... comé::...{conGREga... né?... muita mão-de-obra muito::: Inf. 2 - congrega Inf. 1 - emPREgo mui/ GEra muito emp{rego... Inf. 2 - gera muito emprego Inf. 1 - eh gera muito emprego mas SUBemprego... é SUBemprego é carteira de::... a às vezes nem a carteira profissional está assinada... eh:::... eu vejo por esses... rapaz que /tão trabalhando aqui... nesse revestimento... num tem carteira assinada... Inf. 2 - são contratados por Obra... Inf. 1 - por Obra... nem sei:: sei sei lá se são contratados... quer dizer... uns homens desse... têm gosto de trabalhar?...] [34 nós agora NÓS que estuDAmos nós que:: que... fomos pra uma Universidade... e... FOmos pra Universidade COMO?... gratuitamente eu sempre analiso isso nós estuda/ EU por exemplo estudei fiz a minha Faculdade... gratuitamente... mas quem pagou a Universidade? quem foi?... fomos nós POvo... nós temos que nos e/... que entender isto... que a Universidade é gratuita porque alGUÉM... está pagando esta Universidade... a escola PÚblica é PAga eu sempre dizia aos meus alunos eu FIZ questão de ensinar meus alunos esta... essa questão de cidadaNIa... de::: de direitos e deVEres... como cidadão..." olha gente vocês num tra/ num estudam de gra/ de graça não... porque goVERno somos nós... somos nós que mantemos o país"... você quando compra um chinelo... havaiAna... ou seja esses... chinelos... como eles chamam num sei comé o termo que eles usam... pra dizer que é vagabundo que num::: é::: barato... mas você aí{DENtro esTÁ... Inf. 2 - ((pigarreou)) Inf. 1 - está:: colocado DENtro inserido:::... ali DENtro está embuTIdo... o ICM/... IS... o IPI que é o o::... Inf. 2 - o impos{to da indústria Inf. 1 - o imposto de indústria... de produto industrialiZAdo... está aí embutido... TUdo... então voCÊ... aqueles imPOStos são arrecadados PAra que o goVERno... conVERta... o governo é apenas um administraDOR... ele tem que ser um administrador... deCENte honesto... ele é um administrador DOS NOssos bens do POvo brasileiro... e vocês têm que saber que TUdo que vocês usam aqui na escola... é... eh:: NÃO digo vocês propriamente porque os jovens ainda não... Inf. 2 - pagam impostos {mas o pai já paga né? Inf. 1 - é porque não comprava mas o pai paga... o feijão que você compra... ele tem também... imposto... você paga... então você num num... acabar com a iDÉia de que... o goVERno... o governo dá o governo num dá nada... nós... temos diREItos... a tudo isso nós temos direito adquiRIdo... por sermos cidadãos... né? a nossa cidadania consiste Nisso... PRImordialmente... nisto... depois enTÃO... nós temos a obrigação de... votar::... com esses... esses desMANdos que s/ que existe AÍ...

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nós Temos o direito e a obrigaÇÃO...DE... repudiAR... de:::... eh protestar contra isso... e nós ficamos calado... então por QUE isso?... porQUE o brasileiro aINda não se conscientizou de que é brasileiro e de que este país é dele... ele PENsa... por causa... também isso.. mas também eu tô falando demais né? D.? e tu nem estás falando né?--... Inf. 2 - é {mas não pode deixar... eu trabalho a Português Inf. 1 - ((risos)) Inf. 2 - ...num é que fala mais ou menos {((risos))... ah ah Inf. 1 - ((risos))... pois é... ] [35 então eu... eu acho assim eu vejo eu analiso e eu falava muito às vezes eu ia falar uhn... ensinar Português para os meus alunos né?... e eu... fazia uma digressão eu saía do da:: do Português e passava pra política... U::I mas os alunos gosta::vam... então os da oitava série como adorava... eh:: enTÃO uma vez um chegou pra mim e disse assim "olha... professora... EU... votei no Lula... por causa da senhora" eu digo "pelo amor de Deus num diga isso "eu nunca disse {a você que fala/ ((falou rindo)) Inf. 2 - ((risos)) Inf. 1 - vo{tasse no Lula” ((risos)) Inf. 2 - vo/...((risos)) Inf. 1 - EU NÃO mando meus alunos votar em ninguém... eu mostro... como s/ como eu... eu pelo menos eu pretendo ensiNAR... a que você saiba escoLHER... o seu candidato...aí ele disse "não mas é por isso aí mesmo porque por causa da sua aula eu achei que ele devia" ah:: então diga assim... você depois que analiSOU... e... analisou... TOdos os candidatos as a o que os candidatos... eh ah... mostravam na televisão então você::... DELIBEROU... com sua liberdade... que você tem::... votou no Lula mas num diga que votou no Lula por causa da minha AUla... porque parece assim que EU... indico o Lula... eu num indico... e nunca disse a você que EU iria votar no Lula porque eu também não digo em quem eu vou votar sobretudo para os meus alunos que é pra num influenciar... mas eu eu da::va eu se... eu... quando era VÉSpera de eleição eu ensiNAva eu... eu mos{TRAva Inf. 2 - eles entendi::am né? Inf. 1 - é só tem oitava série que já eram a{lunos que iriam votar... Inf. 2 - eles entendi::a Inf. 1 - eles teriam que... que:: não eu falava bem de todos os candidato todos os candidatos eu fazia questão de NÃO ME ... não me envolVER não me envolver né?... com um candidato... embora EU... como::... votante como:::: eleitora... eu votasse no Lula... e votei... MAS... não:: isso aí num...] [36 por exemplo agora dessa vez eu num votei no Lula mas num voTEI::... num foi por causa do... medo eu tive m/ eu... eu digo mesmo... tinha medo que o Lula... não... pudesse... governar... e BASta... BAS::ta de confusão... eu já estou bastante Velha pra ver que um::um Jânio Quadro... saiu do goVERno... é o:: o Getúlio Varga se suicidou::... e:::: o:::: COllor foi... retirado do goVERno... quer dizer tantas desgraça no governo eu chamo isso desgraça... eu chamo isso desgraça... o::... comé o nome daquele lá do... Rio Grande do Sul? Inf. 2 - ( ) Inf. 1 - ... não o do Rio Grande do Sul que foi deposto... Inf. 2 - {João Goulart... o Jango Inf. 1 - na eleição de sessenta quatro... pois é... pois é... o Jango... então... tudo Isso é é... a gente quando é Jovem que num viu num assistiu tudo isso quem é Jovem que num assistiu tudo isso OUve através da História ouve falar através da História diferente de quem... viven{ciOU...as... vivenciou essas dificuldades... e:::... Inf. 2 - quem vivenciou Inf. 1 - e VIU... o que houve os desman::dos e depois quando... CAI um um poder totaliTÁrio aí VEM:: aquele... ali:: foi morto num sei QUEM::: foi... quer dizer... um um um:::... um reGIme... que é exceÇÃO é sempre um regime muito... autoritário é muito... {duro pra gente vi/ Inf. 2 - ((pigarreou))

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Inf. 1 – conviver] [37 E POR ISSO... é que o Brasil esTÁ... NESta... Inf. 2 – situação Inf. 1 - situação de atraso... porque nós vivemos MUIto TEMpo... dentro de um:: um um... é esses períodos di/ ditatoriais porque foi ditadura do Getúlio foi ditadura do... do::... dos militares foram as ditaduras da República... que... não havia... ninguém pode QUEM... quem lê a história do Brasil num pode em sã consciência diZER... que a República... foi uma República democrática desde... em que ela na/ desde que ela nasceu... porque num existia... o o a... o voto era... manobrado... num havia... democracia portanto NÉ?... então o Brasil ainda num TEM... num tem::: num num num podemo dizer que... que no Brasil o brasileiro tem exercício de democracia num existe... por isso esses ROUbos horríveis... a partir dos legisladores... que deveriam ser aqueles que mais::... deveriam defender a democracia... é:: uma é uma verdadeira é é mesmo um... uma coisa paradoxal uma coisa... abSURda a gente dizer que os legisladores do Brasil são os maiores ladrões do Brasil... por QUÊ?... porque Eles... é que::... eles... pelo menos... deveriam SER... os comé que eu chamo dizer... os DEFENSOres da democracia porque eles se ex/ eles exerCItam... a democracia... eles FAlam pelo povo... e o que é que acontece?... eles num fazem... num fazem nada pelo povo porque fazendo pelo povo ele está fazendo pelo Brasil... num faze/... NÃO fazem... haja vista esses ROUbos horríveis.../cê vê uma... a o INSS né? a::... o INSS... PARA nós aposentados... SEMpre há dificuldade para pagamentos... SEMpre há dificuldade e no entanto quando aquele aquele juiz roubou roubou.../tá /é rouBOU foi preso com TOdas as mordomias porque foi juiz... mas aquele homem num é mais juiz... ele é um ladrão comum... é um ladrão comum... até quando... não foi provado... que ele foi roubar tudo bem... mas depois... ele é um ladrão comum... ele é um marginal como outro qualquer... e o que o quê que acontece?... o único marginal que foi preso e que /tá sofrendo horrivelmente é o:: PC Farias Inf. 2 - é?... Inf. 1 - É... é o único marginal que /tá preso e que ainda /tá sofrendo um bocado... ainda num foi condenado mas pelo meno já /tá sofrendo já {num vai Inf. 2 - é mas eu tenho impressão que saiu saiu o julgamento do::... Fernando Collor né?... Inf. 1 – é Inf. 2 - é diz que sai agora em dezembro... Inf. 1 - é né? Inf. 2 - é capaz de ser inocente...{ é capaz de de sair em::... de:: Inf. 1 - sim Inf. 2 - ... ser inocentado... Inf. 1 - com certeza... pois é enTÃO... isto AÍ:: é é exercício de democraCIa?... é não... os cara-pintada eu acho assim... QUEM foi que incentivou... os cara-pinTAda... PARA... a:: o impeachment do Collor... DEVERIA TER... incentivado... TAMBÉM... para o impeachment para... a EXPULSÃO do do dos... da Câmara dos Deputados lá em Brasília:: no SeNAdo... OS QUE ROUBARAM... do orçamento...-- traga aqui... --((voz distante de terceiro))... então... deveRIa né?... mas NÃO... por QUÊ?... porque foram os deputados que tiveram interesse MESmo... e fizeram aquela promoção para QUE o Collor fosse... saísse do governo... não quero inocentá-lo num quero... não quero dizer que o Collor num tenha tido... mereceu... mereceu que foram fez o... mas devia ter sido mais... deviam ter ido a fundo... devia ter sido condenado e uma condenação dito porque que ele foi condenado... como esses a/ esses deputados agora esses... que eles chamam de anões... também deveriam ter sido exPULSOS por quê aposentadoria? por quê se eu tivesse roubado... no poder público... eu num teria me aposentado... eu teria sido DEmitida... fosse comprovado eu teria sido DEmitida... mas... um deputado assim o seu eu num sei que eu faço questão de não ler mais jornal porque... eu não posso ficar doente por conta dos outros... e eu/... então... ((fala rindo)) eu sei que:: é difícil... né não? agora... qual é a tua opinião aí?... faz um discurso aí... Inf. 2 - ((riu))...

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Inf. 1 - não mais é mesmo é mesmo e:: a minha opinião é Essa... e::: HOje eu:: acho até triste porque hoje eu não sou eu já ... ]

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ANEXO C

DIAGRAMAS DE ORGANIZAÇÃO TÓPICA HIERÁRQUICA

DOS TEXTOS

ANEXO D

NORMAS DE TRANSCRIÇÃO DOS TEXTOS FALADOS

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A transcrição dos textos falados coletados especificamente para a pesquisa não seguiu nenhum critério especial. Foi realizada uma transcrição ortográfica. Os demais textos falados seguem as normas de transcrição dos seus respectivos projetos, conforme apresentadas a seguir.

SISTEMA MÍNIMO DE NOTAÇÕES REELABORADO PARA AS TRANSCRIÇÕES DO PROJETO SOBRE FALA E ESCRITA

Luiz Antônio Marcuschi (UFPE)

0. Apresentação O sistema de transcrição aqui proposto contém apenas o conjunto dos sinais básicos para uma transcrição a partir de materiais em fita magnética e não em vídeo-tape. É uma transcrição convencional. Este modelo já fora sugerido para a transcrição dos materiais do Projeto/NURC/Recife e aqui é retomado (com modificações superficiais), com a finalidade especifica de servir ão Projeto/Hesitação, financiado pelo CNPq (desenvolvido como Projeto Integrado pela equipe Judith Hoffnagel/ Marigia Viana e Luiz Antônio Marcuschi). E também para guiar a transcrição para o Projeto da Gramática da Língua Falada, coordenado por Ataliba de Castilho. 1. Indicação dos falantes : Os falantes devem ser indicados em linha vertical, com letras (primeira letra do nome) ou alguma sigla convencional. No caso do PROJETO NURC utilizam-se as convenções DOC (Documentador); Ll (Locutor 1) e L2, L3 , etc., ou então LM e LF ou FM e FF (Locutor Masculino/Feminino, Falante Masculino/Feminino). 2) Marcação de pausas : As pausas devem ser marcadas com certa precisão. Contudo, é dificil determinar as durações abaixo de um segundo. Neste caso pode-se marcar simplesmente com pontos a duração aproximada. Por exemplo, uma micro-pausa se dá como um ponto . , uma pausa média de 0,5 a 1. seg pode vir entre parêntese com o tempo, p.ex. ( 0.8) e uma pausa maior (1.) ou (2.5) etc., com a indicação da duração medida no relogio em segundos. O NURC adota, nacionalmente, o sistema de pôr a indicação sempre de ... (apenas os três pontinhos) como notação geral para pausas micro e médias, indicando o tempo apenas para pausas longas como se fosse um comentário (pausa de 6 seg). No projeto sobre a hesitação será feita a tentativa de se marcar sempre a duração das pausas (uma marcação de finitiva será realizada com aparelhos eletrônicos). A necessidade de uma perfeita identificação e marcação das pausas no Projeto/Hesitação deve-se ão fato de a pausa ser um dos fatores básicos a comporem as hesitações. Mas também deve ser considerado que nem todas as pausas são hesitações. Esta distinção é complexa e será um dos objetivos centrais da investigação. 3) Marcação de ênfase: O segmento produzido em tom enfático, um tom mais alto,vem marcado com escrita em MAIUSCULA. No caso de tom alto em apenas uma parte da palavra (o que é bastante comum), é conveniente que se marque em maiúscula a silaba e não apenas uma letra. Veja-e este exemplo

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L2: /.../ vida intra intra EXtra-uterina /.../ Neste caso houve uma auto-correção (após uma hesitação), que o falante marcou com a elevação do tom de voz na sílaba inicial. 4) Marcação de alongamento de vogais: O alongamento de vogais aparece em vários momentos, como no caso das hesitações, pausas preenchidas e nos casos em que se planeja ou se faz correções, mas no Nordeste é muito comum que apareça para marcar o ritmo da fala, quase que virgulando entoacionalmente o texto, realizando com isto a coesão pela entoação, bem como montando um ritmo de marcação prosódica para unidades ideacionais. O sinal usado para marcar os alongamentos são os dois pontos após a silaba alongada , ou seja, : para alongamento breve e :: para alongamentos médios ou ::: para longos. Esta marcação é feita logo após a silaba ou vogal alongada, mesmo que ocorra no interior da palavra. 5) Marcação de sobreposição de vozes: A sobreposição de vozes e marcada para indicar que dois falantes (ou mais) produziram aquele segmento ao mesmo tempo. Uma sobreposição breve e que representa a entrada de alguém no turno de outro é indicada com um colchete, como noexemplo abaixo: L2: /.../ tem aquela velha história que a familia ainda é a célula mater Ll: a célula mater rda sociedade né /.../ L2: lda sociedade né a célula mater da sociedade né Ou então a sobreposição localizada, que em geral indica não se tratar de um turno aquela produção do falanteçomo o caso seguinte: L2: /.../ é dia que a criança começa a respirar é o momento... e:: ...porque por enquanto está na vida:: Ll: uhm L2: na vida intra-uterina /.../ Neste caso de sobreposição localizada situam-se os fenômenos listados em 8) abaixo. No caso da transcrição categorial, as falas sobrepostas, se vierem realizadas com pausas e for possivel determinar com precisão o momento da manifestação do ouvinte, e se isto indicar algum fenômeno relevante, deverá ser obedecida a transcrição categorial do fenômeno. No final, há alguns exemplos deste aspecto. 6) Marcação da entoa ção: A entoação é fundamental para as análises da conversação sob vários aspectos. Tanto do ponto de vista pragmático (interacional) como sintático. Em si seria bom adotar três símbolos hoje convencionais para este tipo de marcação, ou seja: a) ### para entoação ascendente b) ### para entoação descendente (uma queda tipo ponto final)

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c) ### para entoação constante (uma espécie de virgula) No caso do NURC, decidiu-se adotar apenas a notação comum na escrita, ou seja o ponto de interrogação ? para entoação e nenhuma outra notação para as demais entoações. Outros detalhes prosódicos, tais como velocidade, volume, altura do tom de voz etc., serão objeto de uma série de notações especificas ainda em estudo. O certo é que a trancrição, mesmo considerando todos estes aspectos, não será uma transcrição fonética nem morfofonológica e sim uma transcrição ortográfica com informações de natureza prosódica. 7) Marcação de citações: Trata-se do caso em que alguém, de repente, na sua locução, marca com tom de voz ou algum outro recurso, que produz um segmento de discurso de outro, (ou de si mesmo em outra oportunidade). Nestes casos usam-se as aspas no inicio e no final do segmento que figura como citação. Veja -se um caso: Ll:/.../ contestava o tempo o tempo todo altos pau altas brigas... sabe? com meu PAI com minha MÃE aquela visão ((elevando a voz)) "só pode sair se me PEDIR" (( baixando a voz)) e: quer dizer (( elevando a voz)) "não vai pro cinema hoje"... "mas porque não vai?... qual é o mal que tem:" ((elevando a voz)) "não não vai porque eu não quero que você vá"/.../ Note-se que Ll cita sua mae e a si própria (hetero e auto-citação), o que só pode ser distinguido pelo contexto, já que isto é feito no mesmo enunciado e com um tom de voz não alterado. Em geral, a citação é marcada com mudança de tom de voz (para mais baixo ou mais alto). A isto estou chamando em outro texto como uma mudança no estilo de fala (seguindo sugestão de Gumperz). 8) Sugestão para grafia de hesitações, exclamações e dúvidas: Listam-se aqui apenas os casos mais frequentes: áh ou áh:: ; éh ou éh:: ; ih ou ih:: ; óh ou óh:: ; uhm; uhum; ahn; ahahn; ôxe; vi:xe; i:xe . Esta coleção deve ser ampliada e testada. 9) Marcação de cortes sintáticos bruscos: Quando a produção é bruscamente cortada pode-se indicar com um travessão aquele ponto, como por exemplo: Ll: eu acho que/ deixe isso pra lá Uma condição para isso é que não haja pausa entre o corte e o novo início. Quando houver pausa, esta já marcará o fenômeno do corte. O travessão só é usado para indicar que a mudança de plano sintático foi brusca. 10) Marcação de silabação ou escansão de palavra: Quando o falante produz um segmento discursivo, geralmente uma palavra, silabadamente (como se estivesso escandindo a palavra), usa-se o hífem para marcar o fato, como por exemplo em:

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A: abram o livro na página oitenta... oi-ten-ta:: 11) Marcação de comentários ao segmento transcrito: Quando se quer fazer algum comentário, tal como ocorreu em alguns casos acima, usa-se parênteses duplos (( )) com o comentário no meio. A colocação do comentário vem antes ou depois do segmento a que se refere. É bom cuidar a forma do verbo. Por exemplo, um comentário como (rindo)) vem antes do segmento, ão passo que um como ((riso irônico)) vem após o segmento irônico. Os comentários podem ser dos mais variados tipos, comL p. ex. ((baixando o tom de voz)), ((pigarreou)), ((tossiu)), ((com irritação)), ((imitando)) etc. 12) Marcação de dificuldades na transcrição: Quando um segmento não foi compreendido ou é ininteligivel, não é aconselhável pôr algo imaginado como ouvido. Em geral marca-se com um espaço vazio aquele ponto pondo parênteses simples ( ) sem nada no meio, ou então, no máximo, informa-se (ininteligivel). As suposições só devem ser colocadas em casos muito especiais a fim de sugerir um possivel sentido quando este não for inferivel e é importante que se sa1ba o que foi dito. Portanto: (a) um ( ) parêntese sem nada dentro equivale a um segmento incompreensível; (b) um (muito) segmento dentro de um parêntese simples equivale a alguma produção suposta mas não claramente ouvida. 13) Sempre usar letras minúsculas: Só se usa maiúscula para indicar ênfase, ou então em nomes próprios. Parece aconselhável usar minúsculas também no caso de siglas, como p. ex.: bnh (e não BNH, já que neste caso se poderia imaginar que a produção foi enfática). Também é importante não cortar palavras no final da linha, já que ninguém faz hifen na sua fala. Os números devem também aparecer sempre escritos por extenso. 14) Marcação da fala simulânea: A fala simultânea é a que se dá na realização de dois turnos simultâneos desde o início. O mais comum é que isso aconteça quando há mais de dois falantes no evento interativo. Para essa marcação usam-se colchetes duplos, ou seja: [[ 15) Marcação de fenômenos inter-turno: Para indicar algo que ocorre entre um turno e outro pode-se fazer uma marcação intermediária, como nos exemplos inventados a seguir: A: isso é danado ((os dois riem juntos)) B: pois é não é ? Também pode haver uma pausa muito grande entre um turno e outro, que não pode ser atribulda a um dos falantes. esta pausa, que na verdade deve ser tratada como um silêncio, deve figurar no espaço entre dois turnos. 16) Grafia de palavras em situação de pronúncia não padrão:

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É dificil dizer como devem ser escritas as palavras, pois como a transcrição aqui sugerida é ortográfica, não se deve sobrecarregar de novidades nem de meros recursos morfofonêmicos discutiveis. Na verdade, alguns critérios podem ser definidos, como p. ex.: a) reduções morfológicas estereotipadas: tá (está), tô (estou), tive (estive), né (não é), comé (como é) e outras deste tipo. b) variacões de caráter sociolingüístico: fumo (fomos), tamo (estamos), semo (somos) e todas as que se acharem nesta linha. c) correções e truncamentos : "é um assassi é um asssassinato"; "nós qui queríamos"; "ele pi prometeu ir", etc. d) grafar no padrão da língua produções que são padrão, como por ex.: a conjunção "e" que se pronuncia "i", ou os finais o (com som de u) ou as eliminações de morfemas de formas infinitivas. 17) Continuidade de fala Trata-se aqui de indicar que o mesmo falante ou um outro falante produziram um segmento continuadamente, sem haver pausa ou ruptura naquele ponto. Para este fato pode-se usar o sinal = (um sinal de igualdade) que sugere continuidade. Isto pode ser feito na passagem de uma linha para a outra quando houver uma produção em sobreposição naquele momento. NORMAS DE TRANSECRIÇÃO DO CORPUS PORCUFORT (PORTUGUÊS ORAL CULTO DE FORTALEZA) A transcrição dos inquéritos do Corpus PORCUFORT segue basicamente as mesmas normas adotadas no Projeto NURC. Em linhas gerais, trata-se de uma escrita comum, com algumas características que tentam respeitar a natureza da oralidade. As observações mais importantes a esse respeito são as seguintes:

1. Não se utilizam sinais de pausa, típicos da língua escrita, como ponto-e-vírgula, ponto final, dois pontos e vírgula. Não se indica também o ponto de exclamação (frase exclamativa).

2. As frases interrogativas terminam normalmente pelo ponto de interrogação. 3. As reticências marcam qualquer tipo de pausa, suspensão ou interrupção. 4. As iniciais maiúsculas só se usam para nomes próprios ou siglas (UECE etc.). 5. Em geral, grafa-se apenas a inicial do nome das pessoas comuns citadas nos inquéritos. 6. Os números são escritos por extenso. Exemplo: vinte e oito. 7. A incompreensão de palavras ou segmentos fonológicos é marcada por meio de parênteses. 8. Quando há qualquer dúvida com relação ao segmento ouvido na gravação, a transcrição é

posta entre parênteses. 9. O truncamento de palavras é assinalado por uma barra oblíqua. Ex.: nor/ normografar o

bicho. 10. A entoação enfática é sugerida mediante o emprego de maiúsculas. Ex.: TRANsava com o

C. 11. O prolongamento de vogal ou consoante (como s, r) é marcado pelo emprego repetido do

sinal de dois pontos. Ex. /tava ensinando as gêmea as GÊ::meas a paquerar. 12. Nos casos de silabação usa-se o hífen. Ex.: ...SÓ co-mi-go só comigo. 13. Os comentários descritivos do transcritor aparecem dentro de parênteses duplos em

minúsculas. Ex.: ((risos)). 14. Os desvios temáticos, mudança de assunto ou qualquer comentário do informante que

quebre a seqüência ou coerência do texto são assinalados por -- . 15. O emprego da chave indica que houve superposição ou simultaneidade de vozes.

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16. Podem-se combinar sinais. Por exemplo: éh:::... (alongamento e pausa).