A vaca leiteira do século 21: lições de metabolismo e nutrição

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A vaca leiteira do século 21: lições de metabolismo e nutrição Faculdade de Veterinária Universidade Federal do Rio Grande do Sul Editor Félix H. D. González Coeditores: Ana C. R. Berreta Anne R. Guadagnin Pedro M. Mallmann Raquel Fraga e S. Raimondo Beatriz Riet-Correa Rivero Rodrigo Schallenberger Gonçalves André Dalto Porto Alegre - RS, Brasil 2021

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A vaca leiteira do século 21: lições de metabolismo e nutrição

Faculdade de Veterinária

Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Editor Félix H. D. González

Coeditores: Ana C. R. Berreta

Anne R. Guadagnin Pedro M. Mallmann

Raquel Fraga e S. Raimondo Beatriz Riet-Correa Rivero

Rodrigo Schallenberger Gonçalves André Dalto

Porto Alegre - RS, Brasil 2021

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CIP – CATALOGAÇÃO INTERNACIONAL DA PUBLICAÇÃO

A111 A vaca leiteira do século 21: lições de metabolismo e nutrição [livro

eletrônico] / Félix H. D. González, editor. – Porto Alegre : Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Faculdade de Veterinária, 2021.

3800 Kb ; PDF , 348 p. : il.

Bibliografia no final dos capítulos Vários autores ISBN 978-65-5973-073-5

1. Medicina Veterinária: vacas leiteiras 2. Bovinos: nutrição. 3. Bovinos: metabolismo 4. Qualidade do leite I. González, Félix H. D. CDD 636.2

Catalogação na fonte: Ana Vera Finardi Rodrigues – CRB-10/884

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Autores contribuintes

Álan Maia Borges. Departamento de Clínica e Cirurgia Veterinária – Universidade Federal

de Minas Gerais: [email protected]

André Thaler Neto. Centro de Ciências Agroveterinárias – Universidade do Estado de

Santa Catarina: [email protected]

Angélica Petersen Dias. Faculdade de Veterinária – Universidade Federal do Rio Grande

do Sul: [email protected]

Anne Rosi Guadagnin. Faculdade de Veterinária – Universidade Federal do Rio Grande do

Sul: [email protected]

Bolívar Nóbrega de Faria. Recursos Humanos no Agronegócio Ltda – Belo Horizonte:

[email protected]

Carla Bittar. Departamento de Zootecnia, ESALQ – Universidade de São Paulo:

[email protected]

Carlos Bondan. Serviço de Análises de Rebanhos Leiteiros – Universidade de Passo Fundo:

[email protected]

Enrico Lippi Ortolani. Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia – Universidade de

São Paulo: [email protected]

Felipe Cardoso. Department of Animal Science – University of Illinois:

[email protected]

Fernando Wittwer. Facultad de Ciencias Veterinarias – Universidad Austral de Chile,

Valdivia, Chile: [email protected]

Giovani Noro. Tortuga Companhia Zootécnica Agrária: [email protected]

Jessica Karina Poncheki. Programa de Pós-Graduação em Zootecnia – Universidade

Federal do Paraná: [email protected]

Jorge Henrique Carneiro. Cooperativa Castrolanda Agroindustrial:

[email protected]

Júlio Viégas. Departamento de Zootecnia – Universidade Federal de Santa Maria:

[email protected]

Leopoldo Braz Los. Frísia Cooperativa Agroindustrial: [email protected]

Luis Barros (In memoriam). Facultad de Veterinaria – Universidad de la República,

Uruguay: [email protected]

Luis Albornoz. Facultad de Veterinaria – Universidad de la República, Uruguay:

[email protected]

Marcelo Cecim. Departamento de Clínica de Grandes Animais – Universidade Federal de

Santa Maria: [email protected]

4

Márcio Nunes Correa. Faculdade de Veterinária – Universidade Federal de Pelotas:

[email protected]

María Cecilia Cajarville. Facultad de Veterinaria – Universidad de la República, Uruguay:

[email protected]

Mirela Noro. Curso de Medicina Veterinária – Universidade Federal do Pampa:

[email protected]

Paula Montagner. Programa de Pós-graduação em Biotecnologia – Universidade Federal de

Pelotas:[email protected]

Rodrigo de Almeida. Departamento de Zootecnia – Universidade Federal do Paraná:

[email protected]

Vivian Fischer. Departamento de Zootecnia – Universidade Federal do Rio Grande do Sul:

[email protected]

Andressa Stein Maffi, Beatriz Riet-Correa, Ismael Mateus Cavazini, Marcelo Moreira

Antunes, Viviane R. Rabassa, Cássio C. Brauner, Camila Pizoni, Joabel Tonellotto dos

Santos, Patrícia Mattei, Rafael da Fonseca Prietsch, Uriel Secco Londero: Núcleo de

Pesquisa, Ensino e Extensão em Pecuária (NUPEEC) – Universidade Federal de Pelotas

Marcelo Tempel Stumpf, Alexandre Sausenbach Abreu, Elissa Forgiarini Vizzotto:

Departamento de Zootecnia – Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Adriana Hauser, Marciel França, Veridiane Orsolin: Centro de Ciências Agroveterinárias –

Universidade do Estado de Santa Catarina

Telma da Mata Martins, Ana Carolina Leite, Philipe Pimenta Nunes: Programa de Pós-

Graduação em Ciência Animal – Universidade Federal de Minas Gerais

J. P. Albornoz, L.E Fidalgo: Universidade de Santiago de Compostela, Lugo, España.

M. Morales: Centro Diagnóstico Veterinario de Florida, Uruguay

5

Sumário

Página

Prefácio 6

Manejo nutricional pré e pós-parto para otimizar a

fertilidade em vacas de leite Felipe Cardoso 7

Como a dieta pode afetar a composição do leite Bolívar Nóbrega de Faria 17

Transtornos metabólicos da vaca leiteira no período

de transição Enrico Lippi Ortolani 35

Transtornos no período de transição da vaca leiteira

com ênfase nas enfermidades uterinas e da glândula

mamária

Márcio Nunes Correa et al. 47

Estresse calórico em vacas leiteiras: efeito sobre o

metabolismo e a qualidade do leite

Vivian Fischer et al.

61

Bem-estar de vacas leiteiras: melhor produção com a

vaca feliz Marcelo Cecim 74

Marcadores bioquímicos sanguíneos en el

diagnóstico y control de trastornos metabólicos en

vacas lecheras

Fernando Wittwer 79

Variações na qualidade composicional do leite no

Rio Grande do Sul Carlos Bondan 98

Acidose ruminal subaguda (SARA): monitoramento

e prevenção nos rebanhos leiteiros

Mirela Noro e Giovani Noro

118

Manejo nutricional da vaca leiteira para otimizar a

composição do leite Jessica Karina Poncheki et al. 136

Fundamentos y aplicaciones para la alimentación

proteica de vacas lecheras Cecília Cajarville 160

Cetose clínica e subclínica: manejo, diagnóstico e

efeitos no leite Marcio Nunes Correa et al. 169

Hipocalcemia e hipomagnesemia en vacas lecheras:

diagnóstico y control Luis Barros Vidal 181

Deslocamento de abomaso em vacas leiteiras:

ocorrência, manejo e indicadores diagnósticos Angélica P. Dias et al. 203

Alimentação e manejo de bezerras leiteiras Carla Maris Machado Bittar 215

Alimentação e manejo da novilha leiteira Júlio Viégas 235

Monitoramento de bem-estar e saúde em rebanhos

leiteiros Marcelo Cecim 253

Pontos críticos da qualidade do leite André Thaler Neto et al. 274

Relação entre metabolismo e reprodução em vacas

leiteiras Álan Maia Borges et al. 298

Prevenção das acidoses ruminais em rebanhos

leiteiros: novos conceitos Enrico Lippi Ortolani 311

Hipocalcemia puerperal bovina Luis Albornoz 318

Impacto da nutrição na composição e qualidade do

leite Leopoldo Braz Los 339

6

Prefácio

De 2014 a 2019 foram realizados anualmente seis Simpósios da Vaca Leiteira na Faculdade

de Veterinária da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Dos anais daqueles simpósios,

que podem ser consultados na página https://www.ufrgs.br/lacvet/extensao/, foram

selecionadas 22 palestras abrangendo exclusivamente temas de nutrição, metabolismo,

qualidade do leite e bem-estar animal. As palestras foram lecionadas por reconhecidos

professores e pesquisadores de várias universidades e de centros de pesquisa, do Brasil e do

exterior, engajados no estudo da clínica e da produção da vaca leiteira. Nosso mais sincero

agradecimento aos palestrantes, bem como aos nossos coeditores que colaboraram na

realização dos seis simpósios.

O editor

Félix Gonzalez

[email protected]

Porto Alegre, primavera de 2021

7

Manejo nutricional pré e pós-parto para otimizar a fertilidade em vacas

leiteiras

Felipe Cardoso

O sucesso reprodutivo é crítico para o sucesso econômico e para a sustentabilidade de

fazendas de leite em qualquer sistema de produção. O sucesso reprodutivo depende de uma

série de eventos fisiológicos coordenados, incluindo retorno da ciclicidade ovariana após o

parto, desenvolvimento e ovulação de um oócito viável, fertilização, involução uterina,

desenvolvimento e implantação embrionária e permanência da prenhez até a maturação fetal

(Butler, 2003; Garnsworthy et al., 2008). A formulação de dietas e o manejo da alimentação

durante o período seco, período do periparto e período imediato após o parto podem facilitar

ou interromper diversos dos passos citados acima antes da prenhez ser estabelecida e mantida

(Butler, 2003; Garnsworthy et al., 2008; Thatcher et al., 2011). As taxas de concepção para

vacas de alta produção que estão ciclando é alta (> 70%) mas muitas vacas (> 50%)

apresentam morte embrionária precoce e falham em manter a prenhez (Diskin and Morris,

2008). Os maiores pontos de ênfase relacionando nutrição e reprodução em vacas de leite

são a severidade e a duração do estado de nutrientes negativo, o chamado balanço energético

negativo (BEN), que no começo da lactação é fortemente influenciado pelo manejo

nutricional e do ambiente durante o período de transição desde o final da prenhez até o início

da lactação.

O período de 6 a 8 semanas em torno do parto é conhecido como o período de transição ou

peripartum, crítico para determinar o bem-estar e a lucratividade de vacas individualmente

durante a lactação seguinte (Drackley et al., 2005). Programas de manejo do período de

transição que não são adequados resultam em alta prevalência de doenças da producão (i.e.,

deslocamento de abomaso) em rebanhos leiteiros (Mulligan & Doherty, 2008). Distúrbios no

metabolismo durante o período de transição podem têr influência direta ou indireta na

fertilidade e transições difíceis têm impacto negativo posteriormente na reprodução

(Chapinal et al., 2012). Uma grande variedade de estratégias nutricionais para facilitar as

adaptações metabólicas e fisiológicas da gestação até o início da lactação têm sido propostas

(Friggens et al., 2004; Roche et al., 2013).

8

Os objetivos deste artigo são de revisar as causas do BEN e o impacto em distúrbios

metabólicos, de relacionar como estes distúrbios influenciam a reprodução e de avaliar como

diferentes estratégias nutricionais antes e depois do parto podem afetar o BEN e a adequação

dos nutrientes. O tema central do artigo é que o manejo para promover maior ingestão de

matéria seca (IMS) de dietas corretamente balanceadas após o parto é o fator unificador de

sucesso durante o período de transição para otimizar a reprodução.

Fertilidade, produção de leite e doenças do periparto

Uma informação que é aceita por todos é a de que a fertilidade de vacas de leite modernas

está piorando, especialmente para a genética Holandesa, pelo menos em parte pela

consequência indesejada de seleção continuada para alta produção de leite. Esta informação

já foi desafiada por LeBlanc (2010) e Bello et al. (2012). Existe uma grande distribuição do

sucesso reprodutivo tanto dentro do rebanho como entre rebanhos. Por exemplo, entre cinco

rebanhos na California totalizando 6.396 vacas, encontrou-se que vacas que estavam no mais

baixo quartil para produção de leite nos primeiros 90 dias após o parto (32,1 kg/dia) tiveram

menor probabilidade de retorno ao ciclo estral aos 65 dias pós-parto quando comparado a

vacas no 2º quartil (39,1 kg/dia), no 3º quartil (43,6 kg/dia) ou no 4º quartil (50,0 kg/dia), de

forma que a produção de leite não afetou a taxa de prenhez (Santos et al., 2009). Mudanças

de manejo e sistemas de manejo inadequados potencialmente são mais limitantes para a

fertilidade de vacas de leite modernas do que a sua genética per se.

Vacas de leite são suscetíveis a doenças da produção durante o periparto e início da lactação

(Mulligan et al., 2006; Ingvartsen & Moyes, 2013; Roche et al., 2013). Existe pouca

evidência de que a produção de leite per se contribua para maior ocorrência de doenças.

Entretanto, o pico de ocorrência de doenças logo após o parto corresponde com o momento

de maior BEN, com o pico de concentração sanguínea de ácidos graxos não esterificados

(AGNE) e com a maior aceleração na produção de leite (Ingvartsen et al., 2003). O pico na

produção de leite ocorre muitas semanas após. Doenças associadas com maior BEN no pós-

parto estão também relacionadas com subótima performance reprodutiva, incluindo fígado

gorduroso (Rukkwamsuk et al., 1999; Jorritsma et al., 2003) e cetose (Walsh et al., 2007;

McArt et al., 2012). Vacas que perderam mais de 1 unidade (escala de 1-5) no escore de

condição corporal (ECC) apresentaram maior incidência de metrite, retenção de placenta e

9

doenças metabólicas (deslocamento de abomaso, hipocalcemia e cetose) e também maior

intervalo do parto até a primeira cobertura do que vacas que perderam menos de 1 unidade

durante o período de transição.

Indicadores do BEN são altamente correlacionados com perda de produção de leite, aumento

da prevalência de doenças e redução na fertilidade (Ospina et al., 2010; Chapinal et al., 2012).

Entretanto, o grau no qual o BEN é o causador de doenças do periparto e não somente um

fenômeno associado, precisa ser examinado criticamente (Roche et al., 2013). Por exemplo,

a resposta inflamatória pode reduzir a IMS em vacas no período de transição, causando

alterações no metabolismo e predispor vacas a um maior BEN ou maior prevalência de

doenças (Bertoni et al., 2008; Graugnard et al., 2012, 2013; Ingvartsen & Moyes, 2013).

Aumento na concentração de AGNE no pós-parto imediato e redução na concentração de

glicose estão fortemente associados com a taxa de prenhez à primeira cobertura em um

programa de inseminação artificial em tempo fixo (IATF) (Garverick et al., 2013). Apesar

da concentração de AGNE não ter sido diferente entre vacas que ovularam ou não antes do

programa de IATF, a taxa de prenhez reduziu com a maior concentração de AGNE e

aumentou com a maior concentração de glicose 3 dias após o parto (Garverick et al., 2013).

McArt et al. (2012) concluíram que vacas com cetose subclínica diagnosticada entre 3 a 7

dias pós-parto tiveram 0,7 chances de serem classificadas como prenhes ao primeiro

serviço e 4,5 vezes mais chances de serem removidas do rebanho nos primeiros 30 dias

após o parto quando comparadas a vacas que desenvolveram cetose 8 dias após o parto ou

mais tardiamente. Vacas que conseguem se adaptar à subsequente lactação (Jorritsma et al.,

2003) e conseguem evitar problemas metabólicos (Ingvartsen et al., 2003) ou desbalanço

fisiológico (Ingvartsen and Moyes, 2013) são capazes de suportar alta produção de leite e

reproduzir com sucesso.

Balanço energético negativo (BEN) e fertilidade subótima

As vacas não têm a capacidade de consumir nutrientes energéticos através de IMS voluntária

após o parto para suprir os requerimentos para produção de leite. Consequentemente, o BEN

ocorre por um período de dias a semanas durante o começo da lactação. Apesar de estudos

não terem demostrado uma forte relação entre o grau de BEN e a fertilidade, o tempo para o

valor mínimo do BEN e a direção e/ou grau de mudança no BEN parecem ser fortes

10

indicadores (Whitaker et al., 1993; Butler, 2003; Reist et al., 2003). Os mecanismos

potencialmente envolvidos nos efeitos danosos do BEN na reprodução incluem: (1) lento

retorno da ciclicidade ovariana, (2) impacto na qualidade, viabilidade, ou função do ovócito

ou do corpo lúteo, e (3) desenvolvimento de lipidose hepática.

Em geral, vacas que ovulam mais cedo depois do parto tem maior fertilidade (Butler, 2003;

Bossaert et al., 2008; Galvão et al., 2010). A produção de estrógeno pelo folículo dominante,

a recuperação da secreção e pulsatilidade de LH, e a resposta do ovário ao LH vão determinar

o sucesso da ovulação. O estado do BEN no pós-parto é negativamente associado com a

performance reprodutiva em parte porque interrompe aqueles 3 fatores (Butler, 2003). A

insulina é o hormônio que normalmente reflete o estado energético e a adequação nutricional

à dieta, podendo ser a primeira ligação entre os sistemas metabólico e reprodutivo. Baixas

concentrações de insulina e IGF-I (insulin-like growth factor 1) foram associadas à baixa

qualidade do corpo lúteo e do ovócito (Jorritsma et al., 2003).

A lipidose hepática está negativamente associada com a fertilidade (Rukkwamsuk et al.,

1999), o que pode ser um efeito indireto do excessivo BEN em vacas. Entretanto, talvez

existam efeitos negativos diretos da infiltração hepática por lipídios e a reprodução. Um

grande número de funções vitais do fígado são negativamente afetadas por cetose e infiltração

hepática de lipídios no pós-parto imediato (Loor et al., 2007). Um exemplo é o aumento da

taxa de apoptose, identificada pela análise do fígado pela técnica de micro-arranjo (Loor et

al., 2007) e mais recentemente por métodos funcionais diretos (Tharwat et al., 2012).

Manejo nutricional para controlar o BEN e otimizar a fertilidade

O balanço energético negativo no pós-parto inicia com a síntese de leite, entretanto, a

severidade do BEN em vacas é fracamente associada com a produção de leite ou a secreção

energética de leite. O grau e duração do BEN está fortemente associado com IMS (Zurek et

al., 1995; Drackley et al., 2005). Consequentemente, alimentação e estratégias de manejo

para vacas no período seco, durante o período de transição ou no pós-parto imediato devem

buscar fornecer os nutrientes necessários, mas também promover o apetite e a vigorosa IMS

após o parto (Grummer et al., 2004).

Alguns fatores importantes a serem considerados para promover o apetite e a alta IMS após

o parto são: (1) reduzir fatores estressantes externos e manter as vacas confortáveis, (2) evitar

11

escore de condição corporal (ECC) excessivamente alto ou baixo, (3) prevenir o consumo

exagerado de energia durante o período seco, (4) assegurar a ingestão de forragens com alto

valor de fibra efetiva e evitar a ingestão excessiva de carboidratos rapidamente fermentáveis

na dieta após o parto, (5) reduzir a diferença cátion-ânion da dieta (DCAD) antes do parto

mas aumentar na dieta da vaca durante o pós-parto imediato, e (6) garantir suporte de

nutrientes para o sistema imunológico. Estratégias nutricionais para auxiliar vacas em fazer

estas adaptações foram revisados (Friggens et al., 2004; Beever, 2006; Ingvartsen, 2006;

Drackley & Dann, 2008; Lean et al., 2013a,b; Roche et al., 2013).

Bach et al. (2008) concluíram que o manejo não-nutricional representou mais de 50% da

variação média de produção de leite (20,6 a 33,8 kg/dia) entre 47 rebanhos que consumiam

exatamente a mesma dieta. Emmanuel et al. (2007, 2008) demonstraram que quantidades

crescentes de grão de cevada aumentaram as concentrações de endotoxina no fluído ruminal

e que, em situações de baixo pH no rúmen, aumentou a absorção ruminal de endotoxinas.

Fatores estressantes não-nutricionais podem reduzir a IMS e predispor vacas a problemas de

saúde no pós-parto. Vacas que desenvolveram metrite (Hammon et al., 2006; Huzzy et al.,

2007) ou cetose (Goldhawk et al., 2009) após o parto tiverem menor IMS ou comportamento

de consumo reduzido antes do parto.

Enquanto a utilização de dietas steam-up ou close-up antes do parto, recomendadas por

muitos anos, existe na literatura uma falta de fatores positivos associados ao seu uso com a

saúde, a produção, ou a reprodução de vacas. A estratégia mais simples e o princípio

nutricional mais facilmente defendido para a alimentação de vacas nos períodos seco e de

transição é o de alimentar vacas para atender, mas não exceder os requerimentos nutricionais

(Drackley & Dann, 2008). Diversos trabalhos do nosso grupo de pesquisa demonstraram que

dietas com energia controlada durante o período seco contribuem para um período de

transição de maior sucesso (Grum et al., 1996; Dann et al., 2005, 2006; Douglas et al., 2006;

Janovick et al., 2011; Graugnard et al., 2012, 2013; Ji et al., 2012). Nossos estudos indicam

que o consumo prolongado de energia durante o período seco pode reduzir a IMS após o

parto (Douglas et al., 2006; Dann et al., 2006; Janovick & Drackley, 2010, 2014). O consumo

excessivo de energia resulta em resposta negativa de indicadores metabólicos como altas

concentrações de AGNE e beta-hidroxibutirato (BHB) no sangue e mais triglicerídeos no

fígado após o parto (Douglas et al., 2006; Janovick et al., 2011). Alterações celulares e de

12

genes no fígado (Loor et al., 2006, 2007) e no tecido adiposo (Ji et al., 2012) potencialmente

podem explicar muitas das alterações que ocorrem na vaca. O consumo excessivo de energia

no pré-parto aumenta o “maquinário” enzimático no tecido adiposo para mobilização de

triglicerídeos após o parto, com alterações na transcrição de genes que levam à redução na

lipogênese, aumento da lipólise e redução na capacidade da insulina de inibir lipólise (Ji et

al., 2012). Controlar o consumo de energia no período seco também aumentou a função de

neutrófilos no pós-parto (Graugnard et al., 2012) ocasionando melhoria na função do sistema

imune.

Cardoso et al. (2013) analisaram as associações entre o regime energético de alimentação no

pré-parto e a performance reprodutiva de vacas de raça Holandesa. Dados individuais de 408

vacas foram utilizados. Tratamentos nutricionais foram divididos em vacas recebendo dieta

com energia controlada (CE; NEL = 13,7 Mcal/dia) ou vacas recebendo dieta com alta

energia (HE; NEL = 22,1 Mcal/dia) durante o período seco distante (FO, 60 até 28 dias antes

do parto) ou período seco próximo (CU, 28 dias antes do parto até o parto). O modelo COX

revelou uma diferença estatística em dias até a prenhez (DTP) entre HE e CE durante CU

(mediana = 167 e 157 dias, hazard ratio = 0,696; Figura 1). Vacas que foram alimentadas

com dietas HE durante CU perderam mais ECC (escala 1–5) durante as primeiras 6 semanas

pós-parto do que vacas alimentadas CE (−0,43 e −0,30, respectivamente). Vacas que foram

alimentadas com HE durante o período seco tiveram mais chances de apresentarem

deslocamento de abomaso ou cetose quando comparadas a vacas que receberam CE.

Conclusão

Formulação e alimentação de dietas apropriadas, que limitam o consumo total de energia

para suprir, e não exceder, os requerimentos de vacas durante o pré-parto podem auxiliar a

aliviar o BEN após o parto. Efeitos destas dietas em indicadores de metabolismo para saúde

são geralmente positivos, sugerindo o potencial para redução das doenças do periparto e

melhora da fertilidade. Estratégias para a formulação de dietas que estimulem a IMS e

diminuam o BEN no pós-parto imediato são menos pesquisadas. Entretanto, o balanço entre

fibra fisicamente efetiva e fermentação do amido nestas dietas é crítico.

13

Figura 1. Curvas de survival function para dias até a prenhez (DTP) para 332 vacas

Holstein alimentadas com dieta de energia controlada (CE = azul) ou alta energia (HE

= vermelho) durante as 4 últimas semanas antes do parto. Linhas azul e vermelha

representam a mediana dos valores para DTP onde 50% das vacas estavam prenhes.

Adaptado de Cardoso et al. (2013)

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17

Como a dieta pode afetar a composição do leite

Bolivar Nóbrega de Faria

A composição e a porcentagem de proteína do leite de vacas têm recebido grande interesse

nos últimos anos, principalmente por influir diretamente no rendimento industrial. Uma

queda na concentração de proteína de 3,55% para 2,90% representa a necessidade de

aproximadamente 1.580 litros de leite adicionais para se produzir uma tonelada de queijo do

tipo Cheddar. Os resultados da alteração no teor de proteína do leite através da manipulação

da dieta giram em torno de 0,6 unidades percentuais (sendo mais prováveis 0,1 a 0,2

unidades). É modesto, se comparado ao potencial de alteração do teor de gordura do leite,

que gira em torno de 3,0 unidades percentuais. Porém, à medida que se aumenta o teor de

proteína do leite, geralmente também aumenta a produção de leite, o que já não ocorre com

a gordura (Waldner et al., 2004).

Além da nutrição, vários aspectos como estação do ano, composição racial, estádio de

lactação e doenças podem afetar o teor de proteína do leite. A sazonalidade relaciona-se com

a temperatura ambiente e disponibilidade de alimentos. Altas temperaturas e umidade

reduzem o teor de proteína e a produção de leite, pois o animal reduz o consumo de alimento.

Entre as raças leiteiras, a Holandesa possui a menor porcentagem de proteína no leite

enquanto a Jersey é a que possui a maior. A mudança na composição do leite utilizando a

seleção de animais é lenta, e não produz resultados imediatos, pois a herdabilidade das

características é baixa.

Os níveis de gordura do leite podem ser mais influenciados pela dieta. Maiores níveis de

gordura no leite também têm sido buscados pelos laticínios, uma vez que aumenta do

rendimento de alguns produtos nobres, como alguns tipos de queijo. Com isso, novas formas

de pagamento têm sido propostas se valorizando cada vez mais os constituintes do leite. Além

disso, concentrações baixas de gordura do leite têm sido relacionadas direta ou indiretamente

a várias doenças metabólicas, como o deslocamento de abomaso, laminite e, principalmente,

a acidose ruminal subaguda. Dessa forma, saber como a dieta afetas o perfil dos constituintes

do leite pode ser uma boa forma de se monitorar ou estimar a saúde dos animais.

18

A compreensão da composição do leite pode ser interessante ao produtor que precisa planejar

a lactação da vaca para maximizar os lucros. Isso envolve a compreensão do efeito da

alimentação, do manejo reprodutivo e da genética sobre a lactação. O conhecimento da

composição do leite também é importante para a indústria processadora, que depende da

manipulação das suas características físicas e químicas para a elaboração de diferentes

produtos lácteos, assim como para assegurar a sua qualidade.

O objetivo desta revisão é abordar os fatores nutricionais da vaca que interferem na

concentração de alguns componentes do leite.

Síntese dos carboidratos do leite

A lactose é o principal carboidrato encontrado no leite, sendo um dissacarídeo composto por

uma molécula de glicose ligada a uma molécula de galactose (Figura 1).

Figura 1. Fórmula estrutural de uma molécula de lactose e suas moléculas formadoras

A lactose possui um papel muito importante na síntese do leite. Sua função está relacionada

com a manutenção da osmolaridade do leite e nos processos de produção e secreção (Larson,

1995), ou seja, é o grande responsável por atrair a água para o leite (cerca de 50% da pressão

osmótica para a síntese do leite), sendo o principal responsável pelo volume do leite

produzido (Mühlbach, 2003). Cada grama de lactose do leite arrasta aproximadamente 10

vezes o mesmo peso em água. Devido à estreita relação entre a síntese de lactose e a

quantidade de água atraída para o leite, a lactose é o componente menos variável do leite

(Tabela 1). Segundo Hurley (2004) a lactose é relativamente insensível às mudanças na dieta

19

das vacas, no entanto, vacas subnutridas apresentam redução na produção de leite e na

percentagem de lactose, sendo que estes sintomas são revertidos quando dietas adequadas

são fornecidas.

Tabela 1. Variações nos constituintes de 257.540 amostras de leite nos

estados de São Paulo, Paraná e Santa Catarina (Ribas et al., 2004)

Constituinte do leite Concentração

média (%) Desvio padrão

Lactose 4,55 0,19

Proteína 3,24 0,24

Gordura 3,69 0,62

Sólidos totais 12,32 0,79

Compostos nitrogenados do leite

Como principais representantes das proteínas do leite estão as caseínas (α, β, κ), e as

lactoglobulinas (α e β), que representam mais de 90% da proteína total do leite, além de

albumina sérica e imunoglobulina G (Figura 2). A caseína constitui de 76 a 86% da proteína

presente no leite, sendo o componente determinante do rendimento industrial na produção de

queijo. É sintetizada pelas células secretoras, como resultado da expressão de quatro genes

(dois genes para α-caseína, s1 e s2; um para β-caseína e um para κ-caseína), sendo secretada

na forma de micelas, que são grupamentos de várias moléculas de caseína ligadas a íons

como o fosfato e o cálcio, e se encontram em suspensão no leite (De Peters & Cant, 1992).

Figura 2. Composição da fração proteica do leite de bovinos (Reis et al., 2008)

20

Ao contrário das caseínas, existem proteínas que se encontram em solução no leite, sendo

chamadas de proteínas do soro do leite. Estas proteínas possuem duas fontes principais,

podendo ser produzidas na glândula mamária, como a α-lactalbumina e β-lactoglobulina, ou

podem passar diretamente do sangue para a glândula mamária, como a albumina sérica e as

imunoglobulinas (De Peters & Ferguson, 1992). O leite possui ainda uma fração de

nitrogênio-não proteico (NNP), constituindo cerca de 5% da proteína bruta do leite, composta

principalmente de ureia (aproximadamente 48%) e em menor quantidade de creatinina,

amônia e outros compostos nitrogenados (De Peters & Ferguson, 1992) (Tabela 2).

Tabela 2. Fração de nitrogênio-não proteico do leite bovino (Bremel, 1995)

Componentes Concentração (mg N/dL)

Aminoácidos 3,7

Ureia 8,4

Creatina 1,2

Creatinina 0,2

Ácido úrico 0,8

Ácido orótico 1,2

Carnitina e acetil-carnitina 0,2

Gordura do leite

A gordura é o principal componente energético do leite, sendo responsável pelas

propriedades físicas, características industriais, qualidades organolépticas do leite e seus

derivados e, por isso, possuem um importante valor econômico (Bauman e Griinari, 2003).

Segundo Riel (1991), o tipo de gordura predominante no leite de vaca, com 97% a 99% dos

lipídios totais são os triglicerídeos. Os restantes são os fosfolipídios e esteróis, especialmente

o colesterol. Os triglicerídeos são constituídos principalmente de ácidos graxos, sendo na

gordura do leite constituídos em sua maioria de ácidos graxos de cadeia saturada (Tabela 3).

A gordura é o constituinte do leite mais sensível às variações, sendo possível observar

variações não somente em relação à raça, mas também ao longo da lactação (Figura 3).

Ultimamente várias pesquisas têm despertado interesse para o perfil de lipídios do leite. Isso

está mais relacionado aos seus efeitos na saúde humana, como é o interesse nas concentrações

de ácido linoleico conjugado (CLA) e não somente em relação aos seus efeitos sobre os

21

bovinos. Os CLA são compostos naturalmente encontrados na gordura de ruminantes que

exercem efeitos benéficos à saúde humana. Dentre os benefícios destacam-se efeitos anti-

carcinogênicos, alterações na partição de nutrientes e no metabolismo de lipídios,

propriedades antidiabéticas e antiaterogênicas, modulação da resposta imune, dentre outras

(Bauman et al., 2001). Portanto, seria desejável que as concentrações do CLA no leite fossem

aumentadas, já que são a maior fonte de CLA na dieta de humanos (Bauman et al., 2000).

Tabela 3. Composição de gordura do leite in natura ou em pó

(Adaptado de Jenkins e McGuire, 2006)

Constituinte do leite In natura Em pó

Água 88,32 2,47

Gordura 3,25 26,71

Ácidos graxos

(% do total)

Saturados 64,90 66,10

Monoinsaturados 28,30 31,30

Poliinsaturados 6,80 2,60

Figura 3. Variação do perfil da gordura do leite durante as primeiras semanas de lactação

em relação às concentrações obtidas na 16ª semana (Adaptado de Palmquist, 1993)

22

Com relação aos ruminantes, o foco tem sido dado a dois isômeros específicos, o cis-9 trans-

11 e o trans-10 cis-12 (Figura 4). O primeiro devido ao seu papel como um anti-carcinogênico

e o segundo, devido aos seus efeitos sobre o metabolismo de lipídios (Bauman et al., 2001).

Figura 4. Estrutura química do ácido linoléico e dos isômeros de CLA C18:2

cis-9, trans-11 e C18:2 trans-10, cis-12 (Bauman et al., 2001)

Síntese de carboidratos do leite

A produção de lactose no úbere está relacionada à síntese de propionato no rúmen e

disponibilidade de produtos gluconeogénicos. Quanto maior a disponibilidade de glicose

para a glândula mamária, maior será a possibilidade de produção de lactose (Figura 5) e,

consequentemente, de produção de leite.

UTP + glicose 1-P UDP-glicose + P-P (1)

UDP-glicose UDP-galactose (2)

UDP-galactose + glicose lactose + UDP (3)

UTP= uridina trifosfato; UDP= uridina difosfato; UDP-glicose= uridina difosforil glicose; UDP-galactose=

uridina difosforil galactose; P-P= pirofosfato; Enzimas: (1) uridina difosforil glicose pirofosfarilase; (2)

uridina difosforil galactose-4-epimerase; e (3) lactose sintetase (composta por galactosil transferase e α-

lactoalbumina).

Figura 5. Via metabólica de síntese de glicose na glândula mamária (Larson, 1995)

A glicose que o bovino necessita como precursor para a síntese de lactose na glândula

mamária é sintetizada no fígado via gliconeogênese, principalmente a partir do ácido

23

propiônico, sintetizado via degradação ruminal dos carboidratos oriundos da dieta. Outra

fonte importante de substrato para a gliconeogênese são os aminoácidos, oriundos da dieta

ou de mobilização corporal, principalmente no período pós-parto e/ou balanço energético

negativo (Figura 6). Após a absorção pelas células secretoras da glândula mamária, cerca de

60 a 70% da glicose é destinada para a síntese de lactose. No entanto, a glicose também tem

outras funções importantes na síntese dos constituintes do leite, sendo um importante

estimulador para a síntese de proteica, substrato para síntese de glicerol e da gordura do leite.

Figura 6. Fontes dos principais substratos utilizados para a síntese da lactose do leite

Síntese de compostos nitrogenados do leite

As proteínas do leite (caseínas e lactoglobulinas) são sintetizadas nas células secretoras da

glândula mamária a partir de aminoácidos provenientes do sangue ou transportados do

sangue (Figura 7). No entanto, alguns aminoácidos podem ser sintetizados na própria

glândula mamária através da utilização de precursores como a glicose e outros aminoácidos.

A síntese de proteína nas células secretoras ocorre no retículo endoplasmático rugoso. A

estrutura da proteína é pré-determinada pela informação genética contida no DNA presente

no núcleo da célula. O DNA serve de molde para a síntese de uma fita de RNA que contém

a informação sobre a sequência de aminoácidos para as proteínas. Vacúolos presentes no

citoplasma são formados para transporte da proteína sintetizada até o lúmen.

Algumas proteínas presentes no leite não são sintetizadas na glândula mamária e são

transportadas pelo sangue até entrarem no lúmen alveolar. A albumina encontrada no leite é

24

produzida no fígado e sua concentração no leite reflete a concentração no sangue. As

imunoglobulinas são transportadas para o leite via sangue e vasos linfáticos de origem do

baço e linfonodos. Linfócitos B produtores de anticorpos podem se alojar na glândula

mamária para auxiliar na síntese de imunoglobulinas do colostro (Larson, 1995).

Outro composto nitrogenado importante do leite, a ureia, não é produzido diretamente pela

glândula mamária. O nível de nitrogênio ureico no leite (MUN) está negativamente associado

à eficiência da utilização do nitrogênio da dieta para síntese proteica do leite. Como a ureia

se difunde livremente entre os fluidos do organismo animal, sua concentração na glândula

mamária reflete a concentração no sangue (Nousiainen et al., 2004). Qualquer fator que

interfira na eficiência da utilização da amônia presente no rúmen pelos microrganismos

ruminais irá resultar em aumento da quantidade de ureia no sangue. A baixa eficiência é

parcialmente devido à perda de nitrogênio amoniacal no rúmen. Estima-se que entre 40 a

80% do nitrogênio bacteriano tem origem na amônia ruminal (Hristov e Broderick, 1996), e

que a concentração ruminal de amônia é inversamente relacionada à disponibilidade de

carboidratos.

Figura 7. Fontes dos principais substratos utilizados para a síntese da proteína do leite

25

Síntese de gordura do leite

Segundo Harding (1995), a gordura do leite é sintetizada nas células epiteliais alveolares,

mais especificamente nas áreas do citoplasma ocupadas pelo retículo endoplasmático rugoso.

Os principais precursores da gordura do leite são ácidos graxos voláteis (AGV), o acetato e

o butirato, originados na fermentação ruminal de forragens e outros alimentos ricos em fibra,

e os ácidos graxos não esterificados da corrente sanguínea. Esses substratos irão dar origem

aos ácidos graxos, que posteriormente formarão os triglicerídeos do leite (Figura 8).

Figura 8. Fontes dos principais substratos utilizados para a síntese da gordura do leite

Ácidos graxos de cadeia curta, contendo entre 4 e 8 carbonos, e de cadeia média, com 10 a

14 carbonos, provem quase que exclusivamente da síntese “de novo”. Já os ácidos graxos de

cadeia longa, constituídos por cadeias superiores a 16 carbonos, são derivados da captação

direta dos lipídios da corrente sanguínea pela glândula mamária (Bauman e Griinari, 2003).

Os ácidos graxos com 16 carbonos podem ser obtidos através das duas fontes. Cerca de

metade dos ácidos graxos do leite são sintetizados pela própria glândula mamária, a partir da

síntese “de novo” tendo como principal fonte de carbono, principalmente, o acetato

produzido na fermentação ruminal (Bauman e Griinari, 2003).

Outra fonte de carbonos para a síntese “de novo” na glândula mamária é o β-hidroxibutirato

produzido pelo epitélio ruminal, a partir do butirato. Os ácidos graxos pré-formados captados

pela glândula mamária e diretamente usados para a síntese de gordura do leite são derivados

das lipoproteínas circulantes e dos ácidos graxos não esterificados originários da absorção

26

dos lipídios no trato gastrointestinal e da mobilização de reservas corporais, respectivamente.

A lipólise (mobilização de gordura corporal) é responsável por menos de 10% dos ácidos

graxos da gordura do leite, sendo a maior parte dos ácidos graxos de cadeia longa do leite

proveniente da absorção intestinal (Bauman e Griinari, 2003).

As gorduras de origem vegetal da dieta das vacas leiteiras são altamente insaturadas, desta

forma, essas gorduras quando ingeridas sofrem no rúmen a biohidrogenação, antes de serem

absorvidas pela corrente sanguínea na forma de triglicerídeos ligados a lipoproteínas. Esses

triglicerídeos são transportados pelo sangue até a glândula mamária, onde sofrem a quebra

em subunidades de glicerol e ácidos graxos livres que podem, então, ser absorvidos pelas

células da glândula mamária.

Fatores nutricionais que interferem nos compostos nitrogenados do leite

De forma geral, as estratégias nutricionais que visam o aumento da proteína do leite devem

ter como princípio o maior suprimento de aminoácidos e energia (glicose) para a glândula

mamária. A utilização de aminoácidos pela glândula mamária é dependente de uma série de

fatores como, irrigação sanguínea da glândula mamária, concentração arterial de

aminoácidos, eficiência no transporte e regulação intracelular das vias metabólicas (Bequette

et al. 1998). A eficiência na conversão de aminoácidos em proteína é baixa e inconstante (27

a 42%), e varia de acordo com o fornecimento de aminoácidos metabolizáveis (Doeppel et

al., 2004). Segundo Murphy e O’Mara, (1993), a limitação da produção de proteína pela

glândula mamária é devida principalmente aos aminoácidos essenciais, como a metionina,

lisina e histidina. De forma geral, lisina e metionina são consideradas aminoácidos limitantes

(Schwab et al., 1992).

Vários experimentos têm sido realizados na tentativa de se corrigir a relação lisina/metionina

através da suplementação desses aminoácidos na forma protegida, como hidroxi-análogos ou

precursores. No entanto, os resultados quanto aos amentos das concentrações de proteína no

leite são variáveis (Figura 9), uma vez que está resposta depende de outras variáveis

importantes como dieta base, ingestão de matéria seca, níveis energéticos e proteicos da dieta,

quantidade de fibra fisicamente efetiva, além do potencial genético do animal.

O aumento no fornecimento de aminoácidos para a glândula mamária pode ser obtido através

do aumento na quantidade de aminoácidos que chegam ao intestino delgado, ou seja, proteína

27

microbiana e proteína degradável no rúmen (PNDR). Com o maior suprimento de

aminoácidos absorvidos e disponíveis, além de um melhor perfil de aminoácidos não haveria

ou diminuiria a limitação dos principais aminoácidos essenciais para a síntese proteica

(Murphy e O’Mara, 1993). Além disso, os aminoácidos resultantes da mobilização proteica

endógena também colaborariam para esse melhor e maior pool.

Figura 9. Variação da proteína do leite (%) de vários experimentos realizados com

diferentes dietas, fontes e concentrações proteicas (Jenkins & McGuire, 2006)

Em dietas a base de silagem de milho e/ou suplementadas com milho, o aminoácido mais

limitante tende a ser a lisina. Em dietas ricas em soja e outras leguminosas pode haver

limitação de metionina, por haver grande suprimento de lisina (Tabela 4).

A utilização de aminoácidos protegidos, em especial lisina e metionina, tem apresentado

resultados modestos (Misciatteli et al., 2003). No entanto, há aumentos significativos na

eficiência de absorção dos aminoácidos em função da energia metabolizável da dieta. Mais

estudos são necessários para verificar outros aminoácidos possivelmente limitantes. Além

disso, o alto custo de suplementação dos aminoácidos protegidos tem limitado seu uso nos

países onde estes suplementos estão disponíveis.

O teor de proteína bruta da dieta possui efeito muito pequeno sobre o teor proteico do leite

(De Peters e Ferguson, 1992), relatou aumento de 0,02% para cada 1% de aumento na

2,6 2,7 2,8 2,9 3 3,1 3,2 3,3 3,4

Met (16,1)

F. Soja + Met (15,6)

Met (19,5)

Met (19,5)

Milho moído (15,7)

Soja espandida + Met (15,7)

Controle (18,8)

Controle (19,5)

Proteína do Leite (%)

28

proteína da dieta. No entanto, o fornecimento de dietas com deficiências de proteína pode

reduzir a concentração deste nutriente em 0,1 a 0,2 unidades percentuais (Sutton, 1989), além

de limitar a produção de leite. Pode-se dizer que a variação no teor proteico da dieta afeta

muito mais a produção de leite do que sua composição. A proteína bruta da dieta não está

correlacionada (p> 0,25) com a porcentagem de proteína no leite, mas fracamente

correlacionada com a produção de proteína no leite. Por outro lado, a proteína do leite

aumenta linearmente com o teor de PNDR na dieta (NRC, 2001).

Tabela 4. Composição de aminoácidos essenciais da proteína do leite (g/100 g aminoácidos), proteína

microbiana (g/100 g aminoácidos) e fontes de alimentos (g/100 g aminoácidos). Adaptado de Fonseca e

Santos (2000)

Fonte Arg His Ile Leu Lys Met Phe Thr

Leite 3,7 2,7 6,0 10,0 8,3 2,7 5,3 4,6

Proteína microbiana 5,1 2,0 5,7 8,1 7,9 2,6 5,1 5,8

Silagem de milho 1,7 0,8 2,8 6,5 1,8 0,8 3,0 2,5

Farelo de glúten de milho (21%) 4,2 2,9 2,5 8,0 2,5 2,1 3,3 3,8

Farelo de glúten de milho (60%) 2,8 1,8 3,4 14,1 1,5 2,8 5,7 3,0

Farelo de soja 6,9 2,2 5,1 6,9 5,9 1,3 4,5 3,5

No entanto, é muito difícil separar o efeito proveniente do aumento do teor da proteína da

dieta e o aumento no teor de energia ingerido pelo animal, tendo em vista que o teor de

proteína da dieta aumenta a eficiência microbiana, influenciando positivamente a ingestão de

matéria seca e a digestibilidade da dieta. A relação entre o aumento na ingestão de energia e

o aumento no teor de proteína do leite é mais importante que a relação entre o teor de proteína

ingerido na dieta e o aumento no teor de proteína do leite (Griinari et al., 1997). O aumento

da ingestão de energia por vacas em lactação aumenta a concentração de proteína no leite.

Estas mudanças na ingestão de energia são geralmente, obtidas por aumento da relação

concentrado/volumoso (Erro! Fonte de referência não encontrada.), por mudanças na fonte

de carboidratos ou por utilização de grãos processados.

Há limites para a elevação da produção de proteína do leite, com o aumento de concentrados

na dieta, que seria no ponto em que o pH cai sensivelmente e reduz a população celulolítica

do rúmen. Dietas com elevados teores energéticos costumam reduzir a gordura e aumentar a

proteína do leite. Pode-se aumentar potencialmente o fornecimento ou perfil de aminoácidos

disponíveis no intestino através da utilização de maiores quantidades de proteína não

29

degradável nu rúmen. No entanto, só haverá benefício quando a fonte de PNDR completar

positivamente a proteína microbiana e a composição da proteína dos demais alimentos, uma

vez que as fontes de PNDR normalmente substituem as fontes de degradação ruminal na

dieta, que estimulam a fermentação microbiana (Wright et al., 1998). A subnutrição e dietas

com baixos teores de proteína diminuem a porcentagem de proteína no leite, sendo que este

quadro pode ser revertido por meio da adição de proteína extra, quando a proteína for o

limitante.

Tabela 5. Desempenho de vacas primíparas alimentadas com diferentes relações

volumoso/concentrado na dieta (De Peters & Cant, 1992)

Componente lácteo Relação concentrado/volumoso

80:20 65:35 50:50 35:65 Efeito1

Leite (kg) 20,8 21,6 22,3 23,4 L, Q

Proteína (%) 3,11 3,12 3,22 3,26 L, Q

Lactose (%) 5,28 5,33 5,33 5,55 L

Gordura (%) 3,83 3,72 3,68 3,33 L, Q 1Efeitos linear (L) ou quadrático (Q) do aumento da proporção de concentrado na dieta (p < 0,05)

Fatores nutricionais que afetam a gordura do leite

O conteúdo e composição da gordura do leite podem ser fortemente afetados pela dieta. Em

ruminantes, a composição dos ácidos graxos da dieta não é fortemente refletida na

composição dos ácidos graxos da gordura do leite. Isso ocorre devido à presença do rúmen,

onde os constituintes lipídicos da dieta são alterados pelo metabolismo microbiano (Bauman

e Griinari, 2003).

Os triglicerídeos não são fermentados no rúmen, portanto não são fonte de energia para os

microrganismos ruminais. Ao atingirem o rúmen, as gorduras podem passar por duas

transformações pelos microrganismos ruminais: lipólise e biohidrogenação. A lipólise é um

processo que libera ácidos graxos livres no rúmen a partir de lipídios esterificados das plantas

e, depois passam por um processo de biohidrogenação (Jenkins, 1993). A taxa de lipólise

varia de acordo com a quantidade e a composição dos ácidos graxos da gordura fornecida na

dieta (NRC, 2001). A biohidrogenação é uma forma de proteção, uma vez que os

triglicerídeos insaturados possuem certa toxicidade aos microrganismos ruminais. Esse

processo consiste em desfazer as duplas ligações dos triglicerídeos insaturados e acrescentar

30

um átomo de hidrogênio, formando uma ligação simples com o carbono (Figura 10). Isso é

nada mais que um processo de saturação do triglicerídeo.

Figura 10. Esquema da biohidrogenação ruminal

No processo de biohidrogenação, enzimas microbianas saturam o ácido linoleico (C18:2)

adicionando hidrogênio nas duplas ligações até que a molécula seja totalmente saturada e

transformada a ácido esteárico. No processo de formação do ácido esteárico, produtos

intermediários são formados, como os ácidos trans 18:1 e ácidos linoleicos conjugados

(CLA). Esses intermediários passam do rúmen ao intestino onde são absorvidos. Os maiores

substratos da biohidrogenação ruminal são o ácido linoleico e linolênico e a taxa de

biohidrogenação dos ácidos graxos é mais alta à medida que o grau de insaturação aumenta.

Para a maioria das dietas a taxa de biohidrogenação do ácido linoleico e linolênico é de 70-

95% e 85-100%, respectivamente (Doreau & Ferlay, 1994; Beam et al., 2000). Quando dietas

ricas em concentrado são fornecidas, a taxa de hidrogenação é reduzida, o que pode ser

atribuído à inibição da lipólise em pH ruminal baixo provocado por essas dietas (Van Nevel

& Demeyer, 1995; Van Nevel & Demeyer, 1996b). A hidrogenação também é afetada

quando uma quantidade excessiva de lipídios não protegidos está presente na dieta.

Dois importantes intermediários no processo de biohidrogenação são o trans-11 18:1 (ácido

trans-vaccênico) formados a partir de ácido linoleico e ácido linolênico e cis-9, trans-11

31

ácido linoleico conjugado (CLA) formado na biohidrogenação do ácido linoleico. Esses

intermediários estão presentes em quantidades apreciáveis na gordura dos ruminantes, em

uma relação de 3:1 (CLA: trans-vaccênico), mas no rúmen CLA cis-9, trans-11 é apenas um

intermediário transitório, enquanto o trans-vaccênico é que se acumula no rúmen.

Em condições de ácidos graxos insaturados em excesso no rúmen ou pH ruminal baixo,

alguns isômeros trans de ácidos graxos podem ser formados. Esses ácidos graxos estão

associados com depressão da gordura do leite (Griinari et al., 1998; Baumgard et al., 2000;

Bauman & Griinari, 2003). Portanto, dependendo de quanto os ácidos graxos saem do rúmen

na forma saturada, como ácido esteárico, ou na forma dos intermediários insaturados

influenciará em quanto de energia será disponibilizada para absorção e os efeitos dos ácidos

graxos na gordura do leite. Dessa forma, a dieta e alterações no ambiente ruminal podem

mudar as vias da biohidrogenação resultando em mudanças nos ácidos graxos

intermediários.

Outro aspecto importante que deve ser levado em consideração na dieta é a quantidade e

efetividade da fibra utilizada, o que reflete diretamente na condição ruminal e gordura do

leite (Tabela ). A fibra efetiva atua estimulando a ruminação e produção de saliva, o que

mantém o pH em níveis favoráveis para digestão da fibra, resultando em maior

disponibilidade de ácido acético, o principal precursor da gordura no leite.

Tabela 6. Ácidos graxos voláteis no rúmen e depressão da gordura do leite em vacas alimentadas com dieta

de baixa fibra, composta por alta quantidade de grãos e pouca forragem (Bauman & Griinari, 2003)

* p< 0,05

Parâmetro Dietas

Controle Baixa fibra

Leite (kg/dia) 19,1 20,9

Conteúdo de gordura (%) 3,6 1,7*

Produção de gordura (g/dia) 683 363*

Ácidos graxos voláteis no rúmen (% molar)

Acetato 67 46*

Propionato 21 46*

Butirato 11 9

Proporção acetato: propionato 3,2 1,0*

Produção no rúmen (moles/dia)

Acetato 29,4 28,1

Propionato 13,3 31,0*

32

Dietas com grandes quantidades de carboidratos prontamente fermentáveis e reduzida

quantidade de fibra, ou dietas com quantidade adequada de fibra, mas com fibra efetiva física,

possuem pouca habilidade de manutenção do funcionamento normal do rúmen, podendo

assim, levar a depressão na gordura do leite (Bauman e Griinari, 2003).

A inclusão de lipídios na dieta pode promover alterações sobre a gordura do leite, o que mais

uma vez é influenciado pelas alterações no ambiente ruminal (Palmquist et al., 1993). Os

efeitos observados, quando da adição de gordura à dieta, foram dependentes do tipo e

quantidade da gordura fornecida. O fornecimento de quantidades moderadas ou elevadas de

gordura insaturada reduz de maneira significativa o teor de gordura do leite, podendo esta

queda ser de até uma unidade percentual.

Griinari et al. (1998), confirmaram que dietas pobres em fibra e ricas em ácidos graxos

insaturados (óleo de milho) aumentam o conteúdo de C18:1 trans. Segundo estes mesmos

autores, este tipo de dieta está associado a uma diminuição significativa na produção e

conteúdo da gordura do leite, bem como nas concentrações de ácido esteárico, e menores

valores ruminais de pH. Isso provavelmente indica que houve uma redução das etapas finais

da biohidrogenação ruminal. O aumento da concentração intestinal de trans-vaccênico

diminui a capacidade lipogênica da glândula mamária (taxas de incorporação de acetato em

ácidos graxos) e a expressão de genes de enzimas relacionadas ao transporte de ácidos graxos

circulantes, diminui a síntese “de novo” de ácidos graxos, a dessaturação de ácidos graxos e

a formação de triglicerídeos. O mecanismo que provavelmente os esses ácidos graxos

insaturados diminuem a produção de gordura do leite envolve a redução na expressão do

mRNA de enzimas chave associadas à síntese de gordura do leite (Baumgard et al., 2002).

Kalscheur et al., (1997) observaram que vacas alimentadas com dietas ricas em concentrado

apresentaram diminuição da gordura do leite, acompanhada por aumento no conteúdo de C

18:1 trans.

Certos aspectos relacionados a formas de manejo de alimentação também alteram a ingestão

de fibra e, consequentemente, a gordura do leite. Pode-se destacar entre as deficiências no

manejo a baixa quantidade e qualidade de volumoso, sendo muitas vezes compensados pela

substituição por subprodutos fibrosos e concentrados; cochos mal dimensionados, o que

estimula a competição entre os animais, instalações inadequadas quanto ao conforto animal,

proporcionando menores tempos de ruminação e elevação do estresse.

33

Considerações finais

O aumento no teor de proteína do leite é interessante para as indústrias processadoras, pois

permite maior rendimento industrial, além da menor quantidade de água a ser transportada e

removida no beneficiamento. No entanto, para o produtor o aumento no teor de proteína do

leite só trará benefícios com a implementação de um sistema de pagamento por componentes,

onde o pagamento pela produção extra de proteína cobre os custos de produção. No entanto,

a opção por aumentar o teor de proteína do leite através da manipulação nutricional, deve

sempre avaliar a alternativa mais rentável disponível antes de proceder às alterações.

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35

Transtornos metabólicos da vaca leiteira no período de transição

Enrico Lippi Ortolani

Define-se período de transição como as quatro últimas e primeiras semanas em relação ao

parto. Nesse período a vaca leiteira está sujeita a ser acometida por várias enfermidades, com

destaque às de origem metabólica (Herdt, 2013). Várias condições predisponentes facilitam

o surgimento dessas enfermidades. No período pré-parto citam-se os seguintes fatores: (i) a

grande mobilização de nutrientes para o crescimento fetal, colostrogênese e o

desenvolvimento mamário; (ii) ajustes metabólicos necessários para favorecer a mobilização

de gordura e os teores de cálcio ionizável; e (iii) a representativa diminuição na ingestão de

matéria seca. No período pós-parto, embora ocorra uma lenta recuperação no apetite, o

animal deve subsistir a uma rápida mobilização e perda de nutrientes para atender a crescente

produção leiteira, em especial no concernente a gliconeogênese (Herdt, 2013).

Dentre as enfermidades metabólicas que se manifestam no período de transição, destacam-

se as seguintes: hipocalcemia acompanhada ou não de síndrome do animal caído; cetose com

presença ou não de esteatose hepática; edema mamário; deslocamento do abomaso e

hipomagnesemia (Herdt, 2013). Considerando a frequência e a relevância em nosso meio,

serão destacadas duas enfermidades: a hipocalcemia da vaca parturiente e a cetose da vaca

leiteira.

Hipocalcemia da vaca parturiente

Define-se a hipocalcemia como a dificuldade das vacas leiteiras em manter a homeostase do

cálcio livre plasmático, momentos antes ou em seguida ao parto, gerando inicialmente quadro

de tetania, seguido de paresia e paralisia, que se não foram tratadas levam frequentemente o

animal à morte (Ortolani, 1995b). A hipocalcemia tem as seguintes sinonímias: paresia da

parturiente, febre vitular ou febre do leite. Porém, essas duas últimas denominações são

incorretas, pois as vacas não têm síndrome febre e numa das fases clínicas podem até

apresentar hipotermia.

36

Aspectos epidemiológicos

O primeiro estudo epidemiológico no Brasil detectou uma incidência de 4,25% em rebanhos

leiteiros do Vale do Paraíba (SP). Contudo, deve-se mencionar que os rebanhos retinham

vacas além da 6ª gestação, e que a partir da 3ª lactação ocorreu aumento exponencial na

incidência, atingindo na 12ª lactação 31% (Ortolani, 1995a). A letalidade foi alta (12,8%),

em especial em vacas velhas ou tratadas em fases adiantadas da doença. Outros estudos

nacionais identificaram incidências de 1,8% e 5,2% (Corassin, 2004; Coelho, 2004). Vacas

das raças Jersey podem ser mais acometidas que outras raças, ocorrendo o mesmo em vacas

gordas (> 3,5 de condição corporal com escores entre 1-5) no dia do parto em relação às

magras (Radostits et al., 2007).

De acordo com dados nacionais, a hipocalcemia é inicialmente notada nas primeiras 24 horas

pós-parto (64%), reduzindo-se no segundo dia (31%) e diminuindo muito no 3º dia a seguir

(5%) (Ortolani, 1995 a). Porém, também é detectada em algumas vacas nos últimos dias

anteriores ao parto (Radostits et al., 2007).

Prejuízos econômicos

Essa enfermidade provoca grandes prejuízos econômicos, pois além de diminuir a produção

leiteira (até 80 L), nas primeiras seis semanas de lactação, causa mortalidade (Ortolani,

1995a) e predispõem a chance do surgimento de outras doenças do período de transição, na

seguinte ordem: cetose (23,5x), distocia (7,3x quando ocorre no período pré-parto), mamite

(5,4x) , metrite (4,7x), retenção de secundinas (4,3x), menor eficiência reprodutiva (4,2 x) e

deslocamento do abomaso à esquerda (3x) (Corassin, 2004; Herdt, 2013). A hipocalcemia é,

depois da distocia, a segunda principal causa de decúbito patológico (doença da vaca caída),

sendo responsável pelo surgimento de 38% destes casos (Herdt, 2013).

Metabolismo do cálcio na vaca leiteira

No plasma se encontram duas frações principais de cálcio (Ca): o cálcio livre (Ca2+) ou

ionizável (48%) e o cálcio ligado às proteínas (52%). Quadros de hipocalcemia só ocorrem

quando a fração de cálcio ionizável se reduz abaixo dos 50%. Os teores de cálcio ionizável

são finamente mantidos dentro de valores específicos (1,0 a 1,25 mmol/L) por vários

mecanismos hormonais. Na hipocalcemia a paratireoide produz o hormônio da paratireoide

37

(PTH), que estimula a hidroxilação da molécula 25-hidroxicolecalciferol nos rins, formando

a vitamina D3, muito mais potente que o composto anterior. A vitamina D3 aumenta a

absorção intestinal de Ca pela síntese de proteínas específicas para carrear Ca dos intestinos.

Porém, há necessidade dessa vitamina se ligar a receptores específicos e aptos nos

enterócitos. Além disso, a vitamina D3 aumenta a ressorção de Ca nos ossos e a reabsorção

nos túbulos renais. O PTH pode per se ter uma ação semelhante à vitamina D3 nos ossos e

rins. Na hipercalcemia entra em ação a calcitonina, produzida pela tireoide, que excreta Ca

pela urina e promove deposição de cálcio nos ossos (Ortolani, 1995b).

Patogenia da hipocalcemia

A hipocalcemia é fruto do déficit entre a demanda de Ca dispendido e a quantidade deste

elemento obtido na absorção intestinal e reabsorção óssea no período do periparto. A maior

perda de Ca é para a produção de colostro, que contém o dobro deste elemento (2,2 g/L) em

comparação ao leite normal. Vacas entre a 3ª e 6ª lactações atingem o ápice da produção de

colostro. Vacas boas produtoras podem perder muito mais Ca pelo leite (23 g/dia) que para

formação do feto no final da gestação (11 g/dia). Superordenha do colostro nos primeiros

dois dias de lactação podem desencadear quadros de hipocalcemia.

Toda vaca no dia do parto apresenta uma diminuta hipocalcemia. Para reduzir este déficit de

Ca tanto os processos de ressorção óssea como de absorção intestinal necessitam estar

bastante ativos. Porém, exatamente nestes dias existe uma crise na obtenção de cálcio.

Quanto mais velha for a vaca menor é a capacidade de mobilizar Ca dos ossos devido ao

reduzido número de receptores para a vitamina D3 nos enterócitos. Vacas Jersey também têm

o mesmo problema em relação ao número de receptores. Vacas que, em sucessivas lactações,

têm hipocalcemia apresentam dificuldade de aumentar os receptores para vitamina D3 antes

do parto (Goff, 2008). Dietas muito ricas em Ca, P, Na e K no pré-parto interferem na

produção de vitamina D3, ocorrendo o contrário em relação às dietas pobres em Ca. Vacas

que recebem no final da gestação dietas ricas em sais catiônicos (Na+; K+) apresentam pH

sanguíneo superior a 7,35, o que parece interferir negativamente na ligação do PTH aos seus

receptores nos ossos, diminuindo a ressorção óssea, e nos rins interferindo na reabsorção

tubular de cálcio (Herdt, 2000; Goff, 2008, DeGaris e Lean, 2008).

38

Quadro clínico

A hipocalcemia pode apresentar três estágios clínicos, de acordo com o teor de Ca livre no

plasma (Ortolani, 1995b). No primeiro estágio, o animal mantém a consciência, mas

apresenta os seguintes sinais nervosos: excitamento, tremores de cabeça e tetania com

hipersensibilidade. Manifesta ranger de dentes e protrusão de língua, rigidez dos membros e

aspecto de cavalete, podendo ficar em decúbito lateral. A temperatura retal pode se elevar até

os 41º C. Esse estágio dura no máximo 8 h.

No segundo estágio, a consciência fica deprimida e o animal se torna sonolento, a tetania

desaparece e há paresia muscular, as pupilas se dilatam e ocorre insensibilidade cutânea. O

esfíncter anal se relaxa e as fezes se tornam secas. E comum a atitude de “auto-auscultação”.

As vacas apresentam hipotermia, esfriamento de extremidade e a pele e muflo ficam secos.

Chama a atenção a taquicardia com hipofonese (Barreto Jr. et al., 2011). O pulso pode ficar

imperceptível, o movimento de rúmen desaparece e sobrevêm o meteorismo gasoso e é

comum a instalação da síndrome do animal caído. A temperatura retal diminuí sensivelmente

apresentando quando de hipotermia.

No terceiro estágio, há perda de consciência, flacidez de musculatura e instalação de quadro

comatoso, com hipotermia (<36ºC). A taquicardia é destacada (> 130 bat./min). A ausência

de tratamento provoca iminente morte por falência cardiorrespiratória.

Em condições nacionais os quadros de hipocalcemia são acompanhados de hipofosfatemia e

normomagnesemia (Ortolani, 1995a).

Tratamento

Deve ser realizado com infusão lenta (IV) de soluções contendo cálcio. A reversão do quadro

está intimamente ligada ao grau de hipocalcemia. Geralmente, o déficit de Ca plasmático é

na ordem de 6 g e tratamentos com essa quantidade resolvem 70% dos casos, porém parte

deles necessitam quantidades superiores (Ortolani, 1995a). Doses excessivas de cálcio

provocam recorrência da hipocalcemia horas após a terapia, devido à liberação de

calcitonina. Intoxicações iatrogênicas pelo Ca podem ocorrer matando o animal por parada

cardíaca, mas podem ser revertidas com uso de sulfato de atropina (10 mg/animal). Vacas

em decúbito respondem bem ao tratamento com doses adicionais (9 g) de fósforo (IV).

39

Prevenção

A prevenção deve ser realizada quando a incidência for superior a 1%. Isso é feito

manipulando a dieta nos últimos 20 dias pré-parto. Deve-se evitar o oferecimento dietético

excessivo de potássio e fósforo, que devem ficar restritos a 15 e 35 g/vaca/dia,

respectivamente. Por outro lado, estimula-se a adição de cloreto e enxofre na dieta para gerar

um balanço ligeiramente aniônico. As dietas usuais a base de volumosos, concentrados e

silagem têm mais cátions que ânions, contendo uma diferença cátion-ânion da dieta (DCAD)

em média de +100 a +300 mEq/kg MS. Para tornar a dieta aniônica existem sais comerciais

específicos ricos em cloreto (NH4+Cl) e enxofre (SO4Ca.2H20), os quais são suplementados

no final de gestação, em torno de 120 a 200 g/vaca/dia, suprimindo-os no dia do parto. Essa

quantidade proporciona que o balanço permaneça entre -150 a 0 mEq/kg MS, onde se obtêm

os melhores resultados na prevenção. A constatação que a dieta aniônica está atuando é a

queda no pH urinário, que se deve situar-se em torno de 6,0 em vacas de raça Holandesa e

entre 5,5 e 6,0 em vacas Jersey (Goff, 2008; DeGaris e Lean, 2008).

A dieta aniônica provoca uma ligeira acidose metabólica sistêmica que por seu turno aumenta

a produção de vitamina D3 e de PTH, aumentando a ação dos osteoclastos na ressorção óssea,

na reabsorção urinária e na absorção intestinal de Ca. Essa acidose provoca também melhor

aderência do PTH aos seus receptores ósseos e renais. Recomenda-se ainda na dieta pré-parto

que a quantidades de Ca não ultrapasse 70 g/vaca/dia e ofereçam entre 40 a 50 g de Mg

(Ortolani, 1995b; Goff, 2008; DeGaris e Lean. 2008).

Cetose da vaca leiteira

A cetose ocorre no início da lactação, devido a um déficit no metabolismo energético, em

especial na gliconeogênese, causado pela alta demanda de nutrientes no pico da lactação

podendo levar a um quadro de hipoglicemia e acetonemia. Isso provoca diminuições na

produção leiteira e no apetite e o surgimento de sinais nervosos.

Aspectos epidemiológicos

Teoricamente, quanto mais alta for a produção leiteira maior é risco do surgimento de cetose.

Vários trabalhos nacionais já relataram a presença de cetose em nossos rebanhos, com uma

incidência acumulada de 13 % a 24 % (Coelho, 2004; Corassin; 2004; Garcia, 2010). Ela é

40

mais frequente em vacas no decorrer da 2ª a 6ª lactações, com maior incidência na 3ª e 4ª

lactações, quando a produção leiteira é mais alta. A cetose tipo I é mais frequente em vacas

que pariram em condições corporais menores (< 3,5), enquanto na cetose tipo II ocorre o

contrário (> 3,5); a cetose tipo III (secundária) pode acometer fêmeas com diferentes

condições corporais. O pico de ocorrência é mais tardio no tipo I (3ª semana pós-parto) do

que no tipo II (1ª semana), podendo ser variado no tipo III.

Prejuízos econômicos

Estudo nacional constatou que vacas cetóticas têm uma redução láctea durante a lactação de

427 L, ou seja, 4,11% inferior a vacas hígidas (Corassin, 2004). A cetose aumenta o

surgimento de risco de doenças na seguinte ordem: 6,17x de deslocamento do abomaso à

esquerda e 3,4x para metrite e mamite. Por outro lado, aumentam o risco de cetose as

seguintes enfermidades: hipocalcemia 23,6x; retenção de placenta 3x e pneumonia 4,75 x

(Corassin, 2004; Herdt, 2013; Ortolani, 2014).

Metabolismo da glicose e geração de corpos cetônicos na vaca

Nos monogástricos, cerca de 60% da glicose sistêmica é proveniente da absorção dos

carboidratos dietéticos, porém nos ruminantes estes são fermentados no rúmen. Assim, os

ruminantes têm que gerar glicose quase que unicamente pelo processo de gliconeogênese

hepática. Cerca de 60% da fonte de glicose é derivada do propionato produzido no rúmen,

30% dos aminoácidos, 5% do lactato e 5% do glicerol. Os requerimentos de glicose são

variáveis de acordo com a fase produtiva. Uma vaca prenhe no final de gestação necessita de

500 g de glicose/dia, porém no pico da lactação esta quantidade mais que triplica numa fêmea

com produção acima de 20 L de leite (Herdt, 1988).

Os ruminantes têm pequeno estoque de glicogênio hepático, sendo os depósitos de gordura a

principal forma de energia armazenada no organismo. A mobilização dessas gorduras é feita

pela ação das lipases. No superávit energético as gorduras são estocadas, ocorrendo o inverso

em casos de déficit. Assim, a alta secreção de insulina bloqueia a ação das lipases, porém o

glucagon, o hormônio do crescimento, a adrenalina, o balanço energético negativo (BEN), o

estresse e o jejum fortemente estimulam as lipases, que mobilizam os triglicerídeos e os

transformam em glicerol e ácidos graxos livres, também denominados de ácidos graxos não

41

esterificados (AGNE). Esses últimos são carreados aos hepatócitos para serem oxidados ou

esterificados.

No déficit energético os AGNE são grandemente oxidados gerando energia e acetil-coenzima

A (acetil-CoA). Em condições normais, esse composto se combina com o oxalacetato

formando o citrato, que entra no ciclo de Krebs, gerando ATP e podendo formar glicose.

Porém, quando a produção de acetil-CoA for superior ao oxalacetato disponível ele é

transformado em acetoacetato e este em acetona e β-hidroxibutirato (βHB), conhecidos como

corpos cetônicos. Isso ocorre abundantemente na cetose, devido à grande oxidação dos

AGNE. Excesso de corpos cetônicos provocam redução da disponibilidade de glicose para a

glândula mamária, menor proliferação de linfócitos e decréscimo de atividade dos

neutrófilos. Conjuntamente com os altos AGNE os corpos cetônicos deprimem o apetite e

aumentam o grau de resistência insulínica. O βHB pode ser transformado, em 5% das vacas

cetóticas em álcool isopropílico, que provoca o surgimento de vários sintomas nervosos.

Os AGNE podem também ser esterificados no citosol dos hepatócitos, se unindo ao glicerol

e sendo envelopados por colesterol, fosfolipídios e proteína formando lipoproteína (LDH-

VLDL) para ser utilizada nos tecidos extra-hepáticos. Porém, se a quantidade de AGNE no

citosol for muito grande superior a capacidade da esterificação, as moléculas de AGNE se

condensam e são depositadas em forma de gordura provocando quadro de esteatose hepática,

comum na cetose tipo II.

O principal fator predisponente para o surgimento da cetose é a depressão e lenta recuperação

do apetite a partir do parto, acompanhado do pico da lactação nesse período quando a

mobilização de nutrientes é máxima. Assim, a cetose prevalece quando o BEN é muito

significativo, quer seja por desbalanço nutricional ou por menor apetite, ou pelo fato que as

vacas gordas apresentam menor depressão no apetite pós-parto e maior mobilização de

gorduras que vacas magras (Herdt, 1988; 2000; 2013).

Categorias de cetose

Várias classificações de cetose foram propostas até hoje. Classicamente, classificava-se

como primária ou secundária (Herdt, 2000). A primária causada pela falta de carboidrato na

dieta no pós-parto para prover de glicose e manter a alta produção de leite e a secundária,

determinada pelo menor apetite causado por outra doença concorrente.

42

Nova proposta foi feita por Holtenius e Holtenius (1996), comparando-se a cetose à diabetes

mellitus humana. A cetose tipo I ocorre no pico da lactação sem outra doença concorrente e

com esteatose hepática, caracterizada por hipoglicemia e hipoinsulinemia em vacas que

receberam dietas pobres em energia no pós-parto, e que parem com condição corporal abaixo

de 3,5 semelhante ao descrito na forma primária clássica.

A cetose tipo II se manifesta nos primeiros 15 dias pós-parto, caracterizada por

hiperinsulinemia, hiperglicemia e alta resistência insulínica (estado que a insulina diminui a

sua ação biológica nos tecidos insulino-dependentes: por exemplo, musculatura e gordura),

em vacas superalimentadas no pré-parto e que pariram com alta condição corporal (> 3,5),

frequentemente com doenças concorrentes e esteatose hepática. Contudo, estudos posteriores

verificaram que a hiperinsulinemia e hiperglicemia eram pouco frequentes e que muitos

quadros inflamatórios poderiam incrementar a resistência insulínica (Herdt, 2013).

Uma classificação errônea divide a cetose em clínica e “subclínica” de acordo com os teores

de corpos cetônicos e a presença ou não de sintomas clínicos (Herdt, 2013) ignorando que o

diagnóstico clínico é firmado pela presença de sinais clínicos e/ou exame laboratorial

positivo. Além disso, a presença de sinais clínicos está ligada a capacidade das vacas

tolerarem corpos cetônicos, pois algumas se mantem assintomáticas com alta acetonemia, e

outras manifestam a doença com teores menores (Herdt, 2000).

Assim, é lógico classificar a cetose em três formas. A cetose tipo I causada por privação

alimentar no pós-parto; a cetose tipo II gerada por excesso de alimentação no pré-parto; e a

cetose tipo III, ou secundária, em vacas bem manejadas dieteticamente no pré e pós-parto,

mas acometidas por enfermidades concorrentes após o parto.

Quadro clínico

Embora etiologicamente existam três tipos de cetose, quanto ao quadro clínico pode-se

dividir em duas formas: a típica, presente em 95% dos casos, e a nervosa ou bizarra. A forma

típica tem uma evolução clínica média de 16 dias no tipo I e de 8 dias no tipo 2. Em ambos

os casos, é marcada por um tripé de sintomas: hipogalaxia, hipofagia e sintomas nervosos. A

hipogalaxia gira em torno de 30%, mas pode atingir até 80%. A hipofagia chega a 50%, sendo

mais destacada nos casos tipo II. O apetite pode ser seletivo e o animal priva-se de consumir

primeiro o concentrado, depois o volumoso, podendo desenvolver pica, ingerindo cama, areia

43

ou terra. Isso leva a uma perda evidente de peso corpóreo atingindo até 70 kg no primeiro

mês pós-parto. Os animais podem apresentar sonolência, olhar fixo, ataxia, pequenos

cambaleios e cegueira parcial. As grandes funções podem estar modificadas devido aos

quadros concorrentes. Devido à diminuição do apetite pode ocorrer afundamento na fossa

paralombar esquerda em 70% dos casos e constipação e fezes ressecadas em 50%. Muitas

vacas com cetose tipo I e III apresentam pelame eriçado. Cerca de 50% das fêmeas

manifestam odor cetótico pelo ar expirado.

O quadro de cetose nervosa ou bizarra surge subitamente. São comuns os sintomas de

hiperestesia, delírio, agressividade, intensa sialorreia, amaurose levando a ataxia, cambaleios

e quedas, e apoio da cabeça em obstáculos. Caso esses animais não sejam devidamente

tratados podem sucumbir após o surgimento de quadro depressivo (Radostits et al., 2007;

Herdt, 2013).

Diagnóstico

Como os sintomas nem sempre são tão evidentes assim, é fundamental o diagnóstico

confirmativo da enfermidade. Nova ferramenta foi desenvolvida, disponível e barata em

nosso meio, que permite o diagnóstico rápido ao “pé-do-animal” por meio da determinação

de βHB em sangue total mensurado em tiras reativas, por química seca (Precision Xtra), o

qual apresenta alta sensibilidade e especificidade (Araújo, 2014). Confirma-se o diagnóstico

com valores iguais ou superiores a 1,4 mmol/L de βHB, e suspeito entre 1,2 e 1,3 mmol/L.

No rebanho pode ser realizada essa prova de rotina para o diagnóstico de cetose,

estabelecendo exames na cetose tipo I no 15º, 21º e 28º, e na cetose tipo II no 4º, 7º e 12º dias

pós-parto.

Tratamento

O tratamento deve atingir as seguintes metas: diminuições da lipólise e da cetogênese, e

aumentos da glicemia e do consumo de matéria seca. Geralmente, 50% das vacas não tratadas

apresentam recuperação espontânea lenta. O arsenal de tratamento conta com diferentes tipos

de medicamentos, a base de glicose (1.500 mL solução 20% IV); precursores de glicose

(propileno-glicol 300 mL/dia por 5 ou mais dias ou glicerol/glicerina 300 mL/dia por quatro

dias via oral); corticosteroides (dose única de 20 mg de dexametasona, 1 g de cortisona ou 5

44

mg de flumetasona); e medicamentos contendo fósforo e vitamina B12 (Butafosfan 25

mL/dia, correspondente a 0,43 g de P e 1.250 µg de vitamina B12/dose), por 3 dias

consecutivos (Herdt, 2013).

Os tratamentos devem ser priorizados de acordo com as condições clínicas, assim: a glicose

deve ser administrada na cetose tipos I e III e nas formas bizarras; precursores de glicose em

todos os tipos de cetose; corticosteroides na cetose tipo II, devendo ser evitado seu uso em

animais com quadros inflamatórios; e os suplementos de fósforo e B12 na cetose tipo I. Nos

quadros mais rebeldes de cetose tipo II (glicemia > 2,2 mmol/L; βHB > 2,4 mmol/L e alta

resistência insulínica) deve-se empregar glicose, os precursores e principalmente

corticosteroides (Gordon, 2013).

Prevenção

Deve-se iniciar na 8ª semana pré-parto com a oferta de quantidades adequadas de nutrientes.

Daí até o parto a ingestão de matéria seca (MS) reduz-se sensivelmente (2% do peso vivo a

1,5% em kg de MS; ex. vaca de 500 kg passa da ingestão de 10 kg MS/dia para 7,5 kg),

principalmente nas últimas três semanas. Isso deve ser compensado com o aumento na

densidade energética nessas semanas finais. Da 8ª à 4ª semana pré-parto as vacas devem

receber dieta com 12 % de proteína bruta (PB), 50% de NDT e 40% de Fibra Detergente

Neutro (FDN), passando a oferecer, em seguida, 15% de PB, 60% de NDT e 35% de FDN.

Do ponto de vista prático, no primeiro período a dieta deve conter 10% de concentrados

energéticos e 90% de volumosos (50% de silagem e 40% de capins tenros e feno), recebendo,

em seguida, 30% de concentrados e 70% de volumosos.

Durante as últimas oito semanas pré-parto o ganho de peso diário deve atingir 0,2 kg/dia

fazendo com que a condição corporal permaneça entre 3,0 e 3,25. No primeiro mês pós-parto

a dieta deve ser fornecida com 19% de PB, 73% de NDT e 30% de FDN, mantendo-se a

relação volumoso: concentrado em 60:40. Nos meses posteriores a dieta conterá 18% de PB,

60% de NDT e 32 % de FDN. Do ponto de vista prático, a quantidade de concentrados

energéticos oferecido nos primeiros três meses pós-parto é baseado na produção láctea, ou

seja: vacas produzindo mais de 27 L recebem 1 kg de concentrado/2 L de leite; com produção

de 18 a 27 L recebem 1 kg de concentrado/2,5 L de leite e com produção entre 13 e 18 L

recebem 1 kg de concentrado/3 L CE leite.

45

A suplementação da dieta com 335 g/vaca/dia de monensina no último mês de gestação e no

decorrer do pós-parto aumentou a gliconeogênese, diminuiu os teores de βHB e aumentou a

produção láctea. O combate aos vários tipos de estresse às vacas no período de transição é

essencial, para não provocar reduções na ingestão da matéria seca e aumento na incidência

de cetose. A prevenção das várias enfermidades presentes no pós-parto é de grande

importância para diminuir o risco de ocorrência de cetose (Herdt, 2013).

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47

Transtornos metabólicos no período de transição da vaca leiteira com

ênfase nas enfermidades uterinas e da glândula mamária

Marcio Nunes Corrêa

Andressa Stein Maffi

Beatriz Riet-Correa

Ismael Mateus Cavazini

Marcelo Moreira Antunes

Viviane R. Rabassa

Cássio C. Brauner

O período de transição em vacas leiteiras compreende as três semanas que antecedem e as

três que sucedem o parto (Goff & Horst, 1997). Doenças como a hipocalcemia, metrite,

cetose, deslocamento de abomaso e mastite geralmente ocorrem neste período (Ziguer et al.

2007). As doenças do periparto de vacas leiteiras constituem um complexo, de modo que

uma condição patológica predispõe a ocorrência de outra. Por exemplo, uma vaca que

apresenta hipocalcemia é 4 vezes mais susceptível à ocorrência de retenção de placenta e

16,4 vezes mais susceptível à ocorrência de cetose.

O início da produção de leite impõe grandes desafios para os mecanismos responsáveis pela

homeostase energética, proteica e mineral da vaca. Durante o início da lactação, fatores

homeorréticos são responsáveis pelo direcionamento de grande quantidade de energia para a

glândula mamária e síntese de leite. Nesta fase, a vaca acaba mobilizando reservas corporais

e passa a enfrentar um estado de balanço energético negativo (BEN). Neste período, as vacas

sofrem uma diminuição da resposta imunológica. Este estado de imunossupressão em que o

animal se encontra deve-se à diminuição da atividade dos neutrófilos e dos linfócitos (Kehrli

et al. 1989), decorrentes das alterações do padrão de consumo alimentar e das alterações

hormonais e metabólicas a que a vaca leiteira está sujeita durante o periparto. Todos esses

fatores predispõem a um aumento acentuado do risco de desenvolver doenças que

influenciam negativamente a resposta produtiva e reprodutiva (Youngquist & Threlfall,

2007). Assim, o BEN, a inflamação e a resposta imune estão diretamente relacionados,

podendo atuar como causa ou consequência de enfermidades comuns no periparto.

No periparto, a concentração de cálcio associa-se com o decréscimo na contração muscular

e com a imunocompetência. O cálcio é necessário para a realização de várias funções vitais,

na síntese de leite, na contração muscular e desempenhando funções como segundo

48

mensageiro ou como cofator em diversas vias metabólicas intracelulares (Bruno, 2010).

Durante o período seco, as necessidades de cálcio da vaca são baixas (manutenção e

desenvolvimento fetal), ocorrendo incremento acentuado após o parto para a síntese de leite.

Entretanto, os mecanismos de controle do organismo não conseguem mobilizar tamanha

exigência, levando a quadros de hipocalcemia subclínica e clínica.

A hipocalcemia na forma subclínica contribui para a diminuição da contração da musculatura

lisa, da motilidade do rúmen e abomaso, redução da ingestão de matéria seca e da produção

de leite no início da lactação, assim como predispõe ao desenvolvimento de outras doenças.

Esta desordem atinge cerca de 20 a 40% de vacas leiteiras no período pós-parto, e pode

persistir em até cerca de 22% dos animais até os 10 dias pós-parto (Charbonneau et al. 2008).

A diminuição das reservas de cálcio intracelular no sistema imune prejudica de forma direta

a resposta celular a um estímulo de ativação, contribuindo para um estado de supressão

imunitária. Diversos autores indicam que cortisol, hormônio do crescimento (GH) e fator de

crescimento semelhante a insulina (IGF) alteram a proliferação de linfócitos. Também, níveis

elevados de ácidos graxos não esterificados (AGNE) e de beta- hidroxibutirato (BHB) são

sugeridos como agentes imunossupressores. Estudos in vitro demonstram que a presença

desses metabólitos em níveis elevados reduz a atividade de polimorfonucleares e torna os

animais mais suscetíveis a doenças uterinas e a mastite.

Metabolismo e relação com enfermidades uterinas

Os casos de retenção de placenta, metrite e endometrite clínica e subclínica afetam a

regeneração do endométrio e o retorno a ciclicidade, resultando em atraso na primeira

inseminação, aumento no número de inseminações por concepção, aumento no intervalo

entre partos e redução da taxa de parição (Hussain & Daniel, 1991). Os tratamentos dessas

enfermidades resultam no aumento dos custos de produção.

Dentre os fatores decisivos para o sucesso de uma nova concepção no pós-parto recente de

vacas, estão o retorno à ciclicidade ovariana e o término da involução uterina de forma

fisiológica. Muitos são os fatores que influenciam o desempenho reprodutivo de bovinos de

leite, como a nutrição, o manejo, a detecção e sincronização de cio, e a correta inseminação

(Garnsworthy et al. 2008; Schefers et al. 2010). Além disso, algumas alterações ocorridas

durante o pré-parto, como a redução de ingestão de matéria seca e a maior demanda de

49

energia, podem comprometer o estado nutricional do animal e o seu sistema imunológico,

facilitando a ocorrência de doenças uterinas, afetando o desempenho reprodutivo (Sordillo,

2009).

Antes do parto o lúmen uterino é estéril, ocorrendo a contaminação do útero por

microrganismos durante o parto, os quais são eliminados durante o processo de involução

uterina. Quadros de infecção uterina ocorrem quando os mecanismos de defesa do organismo

não conseguem debelar a infecção havendo um desbalanço entre os mecanismos de defesa

local e as bactérias patogênicas. Animais que tiveram quadros de retenção de placenta,

distocias, partos gemelares, abortos e curtos períodos de gestação, têm mais risco ao

estabelecimento destas infecções (Sheldon et al. 2006; Benzaquen et al. 2007; Bell &

Roberts, 2007). O estabelecimento, a gravidade e a persistência dos diferentes tipos de

infecção são influenciadas basicamente pela condição do ambiente uterino, por fatores

genéticos, além da imunidade inata e adquirida (Willians et al. 2007). A expressão dos sinais

clínicos depende da interação entre resposta imunológica, quantidade e patogenicidade dos

agentes microbianos (Azawi, 2008).

Retenção de placenta

A retenção de placenta (RP) caracteriza-se pela falta de expulsão da placenta no período de

12 horas após o parto, sendo associado mais frequentemente com abortos, distocias e

gestações gemelares, mas apresentando também fatores de risco como idade avançada,

estresse, falhas de manejo, hipocalcemia e cetose, deficiências de vitaminas A e E,

deficiências minerais como iodo e selênio, intoxicações, distúrbios hormonais, doenças como

brucelose, leptospirose e rinotraqueite infecciosa bovina. A incidência de RP varia entre

rebanhos, sendo de 3 a 27%, podendo chegar a 46% em partos gemelares. Casos não

complicados não têm efeito significativo sobre a fertilidade e sobre o intervalo parto-

concepção, porém podem apresentar como sequela a ocorrência de metrite. Os prejuízos

causados pela retenção placentária podem ultrapassar 150 reais (em torno de U$68,00) por

caso tratado, e são devidos a perdas de leite, que alcançam 250 L em média (levando em

conta o leite descartado pelo uso de antibióticos mais o que a vaca deixou de produzir pela

enfermidade), gastos com tratamento e mão de obra, atraso de 15 dias para concepção,

50

descarte de 6% dos animais acometidos pela doença, além da mortalidade que apresenta

valores médios de 1,5% dos casos (Corrêa et al. 2010).

Além das consequências diretas da RP sobre a produção de leite, também é um fator de risco

para outras desordens reprodutivas e doenças como a cetose, laminite e mastite. Como

consequência, a RP afeta negativamente o desempenho reprodutivo, podendo ser observado

o aumento no intervalo entre o parto e a primeira ovulação, redução da taxa de concepção ao

primeiro serviço e menor taxa de prenhez (Fourichon et al. 1999; Bell & Roberts, 2007;

Tillard et al. 2008; Sartori et al. 2013). Relatos de ocorrência de RP em vários países incluem

os Estados Unidos com 7,8% dos animais, Coréia com 18,3% e Alemanha com 27,8%

(Drillich et al. 2006).

Estudos indicam a relação de RP com desbalanços de cálcio e fósforo (Pelissier, 1976). Vacas

hipocalcêmicas são mais pré-dispostas à ocorrência de RP, por via indireta, devido ao maior

risco de partos distócicos. Ademais, a imunossupressão gerada pelos baixos níveis de cálcio,

associada a quadros de RP, predispõem estes animais a um quadro clínico de endometrite.

Segundo Gunnink (1984), o sistema imune identifica a placenta como um corpo estranho.

Em seu estudo, avaliando nível de fagocitose dos leucócitos, observou que vacas com RP

tiveram menor capacidade fagocítica comparada à de vacas saudáveis. Esta menor atividade

de leucócitos foi observada antes, durante e após o parto em outros estudos (Gunnink, 1984a,

1984b, 1984c). Vacas com redução da atividade de leucócitos apresentam redução na

capacidade de ingestão de matéria seca duas semanas antes e duas semanas após o parto

(Romaniukowa, 1984). No estudo realizado por Kimura et al. (2002), vacas com RP

apresentavam baixa função de neutrófilos desde o pré-parto até duas semanas pós-parto.

Vacas com níveis elevados de AGNE, indicando alta lipomobilização, têm alteração tanto da

função dos linfócitos quanto da proliferação e secreção de imunoglobulina M e de interferon

(Lacetera et al. 2004), afetando também a capacidade oxidativa e viabilidade dos

polimorfonucleares (Scalia et al. 2006). Concentrações plasmáticas de AGNE pré e pós-parto

acima de 300 e 600 µmol/L, respectivamente, são consideradas fatores de risco para RP e

metrite (Ospina et al. 2010). A RP é um dos principais fatores predisponentes da metrite,

sendo que 20 a 25% das vacas com RP desenvolvem metrite (Dubuc et al. 2011).

51

Metrite

Os eventos do pós-parto, juntamente com vários mecanismos de defesa do útero, facilitam a

eliminação da flora bacteriana indesejável (Senger, 2005). As contrações do miométrio

permitem a eliminação de grande parte dos lóquios. O retorno à ciclicidade ovariana (estro)

é o fator natural mais importante, assim como o aumento das concentrações de estradiol, que

favorece a migração de leucócitos para o trato reprodutivo. A secreção ovárica de estrogênio

antes da primeira ovulação promove uma maior resistência uterina a infecções, possibilitando

o retorno precoce à atividade reprodutiva (Hafez & Hafez, 2000). Porém, casos de lipidose

hepática têm sido associados com uma extensão no período anovulatório no pós-parto (Reist

et al. 2000), reduzindo o desempenho reprodutivo de vacas leiteiras em lactação (Jorritsma

et al. 2000), e favorecendo a doenças uterinas, como a metrite.

A metrite séptica no pós-parto de vacas leiteiras caracteriza-se por toxemia grave e abundante

corrimento uterino com odor pútrido, acompanhado ou não de retenção de placenta, é uma

inflamação que atinge todas as camadas do útero. A sua etiologia é multifatorial, admitindo-

se uma combinação de fatores, como retenção de placenta, insuficiente involução uterina

pós-parto e infecção uterina ascendente. A ocorrência é maior no período de 2 a 4 dias pós-

parto, tendo como fatores predisponentes a ocorrência de distocias, retenção de placenta,

obesidade e debilidade orgânica.

A metrite puerperal aguda pode apresentar incidência variável entre 11 e 36%. As perdas

econômicas ocorrem de forma indireta, como a redução na produção de 266 L de leite até o

dia 119 de lactação, incluindo o leite descartado pelo tratamento. Além disso, prejuízos com

o aumento de 7% nas taxas de descarte e redução da vida útil da vaca em 6 a 8 meses. A

metrite ainda altera a involução uterina e reduz o desenvolvimento folicular pós-parto,

elevando o intervalo parto-concepção e comprometendo os resultados da inseminação

artificial (Corrêa et al. 2010).

A contaminação bacteriana do útero no pós-parto é comum, requerendo uma resposta imune

de forma rápida das células de defesa, principalmente neutrófilos. O recrutamento de

neutrófilos é iniciado por meio de citocinas pró-inflamatórias, geradas a partir do endométrio,

no momento de reconhecimento das bactérias. Produção de baixos níveis de citocinas pró-

inflamatórias, incluindo o fator necrose tumoral α (TNFa), IL-1β e IL-6, tem sido associada

com o desenvolvimento de metrite (Galvão et al. 2011). Vacas com atividade de leucócitos

52

reduzidos apresentam maior propensão a apresentarem quadros de metrite e mastite no pós-

parto (Cai et al. 1994). Além disso, a redução na ingestão de matéria seca que se inicia no

pré-parto e se estende até o pós-parto imediato, associada à grande demanda metabólica, gera

um déficit negativo de energia e, conforme abordado anteriormente, vacas com níveis

elevados de AGNE apresentam alteração da capacidade dos linfócitos de proliferar e secretar

imunoglobulina M e interferon (Lacetera et al. 2004), afetando também a capacidade

oxidativa e viabilidade dos polimorfonucleares (Scalia et al. 2006). Vacas que perderam entre

1 e 1,5 pontos de condição corporal entre o período seco e o pós-parto apresentam um balanço

energético negativo mais intenso e maior tempo para recuperação da condição corporal, entre

a primeira e quarta semana de lactação, do que as vacas que perderam 0,75 pontos de ECC.

Esses animais apresentam maior ocorrência de metrite (62% x 27%) e doenças metabólicas,

como cetose, deslocamento de abomaso e hipocalcemia (23% x 2%). Os animais com maior

perda de ECC apresentaram 103 dias em aberto, enquanto os animais com perda moderada

de ECC tiveram 87 dias em aberto (Kim & Suh, 2003).

Atualmente, vem-se estudando alguns marcadores que indicam o risco do animal apresentar

metrite antes da ocorrência de sinais clínicos. O quadro clínico de metrite é marcado por

alterações em proteínas hepáticas, conhecidas como proteínas de fase aguda, sendo a

haptoglobina uma proteína de fase aguda positiva e a paraoxanase e a albumina proteínas de

fase aguda negativa. Um estudo demonstrou aumento dos níveis de haptoglobina em torno

do parto, em vacas com metrite (Huzzey et al. 2009). Redução nos níveis de albumina

indicam alterações hepáticas e está relacionado com incidência de doenças uterinas (Bertoni

et al. 2008; Burke et al. 2010). No estudo realizado por Schneider et al. (2013) pode-se

observar que vacas com metrite apresentavam redução na atividade de paraoxanase no dia 7

pré-parto e de albumina aos 21 dias antes do parto. Neste estudo também foi possível

observar uma maior taxa de prenhez dos animais saudáveis aos 150 dias pós-parto,

comparado aos animais com metrite.

Endometrite

A endometrite é uma enfermidade caracterizada por uma inflamação do endométrio e sua

ocorrência se dá a partir dos 21 dias pós-parto, não estando associada com envolvimento

sistêmico. Esta enfermidade tem sido subdividida em endometrite clínica e endometrite

53

subclínica, sendo a endometrite clínica caracterizada pela presença de conteúdo purulento ou

mucopurulento dos 21 aos 26 dias pós-parto. O quadro de endometrite subclínica caracteriza-

se pela presença de mais de 18% de polimorfonucleares na citologia uterina no período de

21 aos 33 dias pós-parto, ou mais de 10% de polimorfonucleares dos 34 aos 47 dias pós-

parto. Vacas com quadros de endometrite subclínica não apresentam descarga de conteúdo

uterino, porém, apresentam efeito negativo na reprodução (Sheldon et al. 2006).

Um estudo recente realizado por Krause et al. (2014) demonstrou que vacas com ciclos estrais

normais tiveram menores níveis de células polimorfonucleares (26,3%) quando comparado

a vacas anovulatórias (53,4%). Estudos realizados por Sheldon et al. (2008, 2009)

demostraram que em torno de 40% dos animais de alta produção, mantidos em sistemas

intensivos, podem apresentar metrite nas três primeiras semanas após o parto, com

persistência da enfermidade na forma de endometrite clínica em até 20% dos animais. Assim

como na retenção de placenta e na metrite, os casos de endometrite estão associados com

uma redução da função imune. Kim et al. (2005) observaram que vacas com endometrite

apresentaram linfócitos com capacidade fagocítica reduzida já no pré-parto.

Há uma relação positiva entre endometrite, BEN (caracterizado por AGNE e BHB elevados)

e quadros de cetose (Hammon et al. 2006; Galvão et al. 2010). Demonstrou-se maior

incidência de endometrite em animais com esteatose hepática (Fronk et al. 1980) ou com

acetonemia durante o puerpério recente (Markusfeld, 1985).

Outro fator a ser levado em consideração é a maior tendência que animais com sobrepeso no

período seco têm de desencadearem quadros mais intensos de BEN e cetose no pós-parto,

por apresentarem maior perda de condição corporal e terem um maior atraso na recuperação

de condição corporal. É sabido que animais com sobrepeso no pré-parto tem maior tendência

à hiperlipomobilização no pós-parto, o que leva a quadros mais intensos de BEN e por

consequência acentuação da imunossupressão. Vacas com elevada condição corporal (acima

de 3,5) no pré-parto apresentam uma redução no metabolismo hepático, resultando em uma

menor atividade oxidativa quando desafiadas no pós-parto. A concentração elevada de

AGNE no fígado leva também ao aumento de proteínas de fase aguda, principalmente

haptoglobina, sendo possível detectar este perfil durante o pré-parto. Sua detecção pode ser

um bom indicador no diagnóstico precoce de enfermidades do periparto, uma vez que as

54

vacas com endometrite apresentam níveis mais elevados desta proteína já no pré-parto

(Schneider et al. 2013).

Metabolismo e relação com a mastite

Mastite é a inflamação da glândula mamária que afeta uma elevada proporção de vacas

(Seegers et al. 2003). Economicamente, é considerada a principal doença do gado leiteiro,

uma vez que apresenta elevada prevalência e os custos com perdas e tratamentos são

geralmente elevados (Seegers et al. 2003). Animais acometidos por mastite apresentam

alterações na glândula mamária (Schwegler et al. 2013), como edema, vermelhidão, dor;

alteração no aspecto e na composição do leite, como o aumento da contagem de células

somáticas (Hortet & Seegers, 1998), além de apresentarem uma queda crônica na produção

(Bar et al. 2007). Dependendo da severidade da mastite, alterações sistêmicas também podem

estar presentes e incluem a diminuição da ingestão de matéria seca e alterações dos padrões

fisiológicos durante o exame clínico. Em casos mais graves há severa desidratação e

endotoxemia. Além disso, a mastite clínica altera as concentrações metabólicas sanguíneas,

modificando assim o perfil hormonal da vaca, prejudicando sua fertilidade (Hockett et al.

2000; Lavon et al. 2010).

Dependendo do agente etiológico e das outras condições envolvidas, pode ocasionar a morte

do animal. Não é incomum a mastite ser um dos principais, senão o principal motivo de

descarte de vacas leiteiras nos rebanhos. Grande parte do que determina o animal a

desenvolver ou não a doença está relacionada com a capacidade do agente causador em

vencer as defesas inatas e adquiridas da glândula mamária e se multiplicar, assim como a

capacidade do animal em responder aos estímulos patogênicos e desenvolver uma resposta

imune de forma rápida e que seja eficaz.

Como já citado, durante o periparto, além do BEN, as vacas passam por uma fase de

imunossupressão, que pode ser definida como a baixa capacidade do organismo em formar

uma resposta imune rápida e eficaz para combater uma infecção. Durante esta fase, os

animais estão mais propensos ao surgimento de doenças infecciosas, entre elas a mastite.

Observa-se que aproximadamente 25% das mastites ocorrem durante as primeiras duas

semanas de lactação e que a maioria são causadas por agentes oportunistas, o que indica

influência da condição imune nesta fase.

55

Com o objetivo de avaliar se o BEN é o principal causador desses distúrbios, pesquisadores

induziram restrição alimentar em vacas no meio da lactação e procederam com infusões

intramamárias de endotoxinas, observando que o BEN neste momento não afetou

significativamente a expressão de moléculas de adesão sob a superfície de leucócitos bovinos

(Perkins et al. 2001; Moyes et al. 2009). Em outro estudo, inocularam quantidades

semelhantes de Escherichia coli em grupos de vacas no início ou meio da lactação,

identificando que as vacas periparturientes tiveram crescimento bacteriano mais rápido,

infecção mais severa e maior temperatura corporal do que as vacas no meio da lactação

(Shuster et al. 1996).

As principais células envolvidas no sistema imune da glândula mamária são os neutrófilos e

os linfócitos. Os neutrófilos são um dos principais tipos celulares do sistema imune, pois são

a primeira linha de defesa, respondendo de forma rápida (em minutos) e não precisam de

contato prévio com o agente. Uma de suas principais funções é a fagocitose. Os linfócitos

representam uma segunda linha de defesa, muito importante pelo fato da memória

imunológica. O estabelecimento de uma infecção em qualquer órgão ou tecido é dependente

de um balaço delicado entre os mecanismos de defesa nativos do organismo e a capacidade

da bactéria de resistir a condições desfavoráveis de crescimento. Quando há desequilíbrio,

como no caso da imunossupressão, a doença ocorre.

Com o objetivo de avaliar o efeito da produção de leite sobre a imunossupressão durante o

periparto, foram utilizadas um grupo de vacas com glândula mamária (inteiras) e outro com

vacas mastectomizadas, nas quais se avaliou a capacidade dos neutrófilos em eliminar

microrganismos (atividade da mieloperoxidade). As vacas mastectomizadas tiveram uma

rápida recuperação da habilidade fagocitária dos neutrófilos, enquanto que nos animais

inteiros foram necessárias cerca de três semanas após o parto para haver essa completa

recuperação (Kimura et al. 1999). Em virtude desse fato, alguns trabalhos vêm investigando

componentes metabólicos individuais associados ao BEN. A cetose é a elevação dos corpos

cetônicos na corrente sanguínea, urina ou leite, associado a um declínio na glicose sanguínea.

Os corpos cetônicos são resultado da excessiva mobilização lipídica que ocorre nas vacas em

BEN e da incapacidade do fígado em metabolizar o excesso de ácidos graxos (González et

al. 2000). Os corpos cetônicos são utilizados como energia alternativa por diversos tecidos.

Entretanto, muitas das células imunes são afetadas negativamente pelos níveis de metabólitos

56

típicos de um ambiente cetônico (baixa glicose, elevação nos corpos cetônicos e presença de

AGNE).

Dessa forma, diversos trabalhos vêm demonstrando que vacas cetônicas apresentam quadros

mais severos de mastite do que vacas saudáveis (Oltenacu & Ekesbo, 1994; Kremer et al.

1993). Linfócitos de vacas com cetose clínica e subclínica, cultivados in vitro, responderam

menos a desafios patogênicos, quando comparados com linfócitos de vacas saudáveis

(Kandefer & Szerszen et al. 1992). Ademais, houve uma diminuição na expressão de

moléculas de superfície associadas com a função de neutrófilos sanguíneos (Zerbe et al.

2000).

A excessiva mobilização lipídica no período de transição leva a um acúmulo de AGNE na

corrente sanguínea, o que causa efeitos maléficos sobre a função das células imunes. Estudos

in vitro demonstraram a diminuição da função, viabilidade e proliferação das células

mononucleares quando em contanto com AGNE (Scalia et al. 2006; Ster et al. 2012).

Portanto, níveis elevados de AGNE na proximidade do parto são preditivos para a

subsequente mastite (Moyes et al. 2009; Schwegler et al. 2013), além de outras desordens

como o deslocamento de abomaso, cetose clínica, metrite e retenção de placenta (Ospina et

al. 2010).

Além dos metabólicos envolvidos diretamente com o BEN (AGNE, corpos cetônicos) sabe-

se que o cálcio também exerce um papel importante sobre a ocorrência das mastites. A função

principal do cálcio está relacionada com a contração muscular. Dessa forma, em vacas

hipocalcêmicas o canal do teto da glândula mamária pode ficar aberto e favorecer a

penetração de patógenos ambientais para o interior da luz do órgão. Além disso, vacas caídas

e que ficam com os tetos expostos ao solo por longos períodos também tem chances maiores

de desenvolver mastites. A hipocalcemia também age como mais um fator estressante para a

vaca durante o pré-parto, já que os animais com hipocalcemia subclínica apresentam níveis

mais elevados nas concentrações plasmáticas de cortisol, quando comparados com vacas

saudáveis, prejudicando ainda mais o organismo já imunossuprimido (Horst & Jorgensen,

1982). Ademais, o cálcio também exerce influência sobre a imunocompetência celular, uma

vez que é importante na sinalização intracelular para a ativação das células imunes (Kimura

et al. 2006). Apesar dos maiores prejuízos serem observados com a forma clínica da doença,

é importante ressaltar que grande parte das vacas permanecem com hipocalcemia subclínica

57

durante as primeiras semanas após o parto, influenciando a função imune (Goff et al. 1996).

Foi demonstrado que as vacas com hipocalcemia clínica foram 8,1 vezes mais propensas a

desenvolverem mastite do que as vacas saudáveis (Curtis et al. 1983).

Considerações finais

O período de transição influencia a vaca leiteira em nível produtivo e reprodutivo no decorrer

da lactação, sendo por isso considerado um momento crucial no ciclo de produção da vaca.

A ocorrência de mastite e enfermidades uterinas são reconhecidas como os principais

problemas na sanidade dos rebanhos leiteiros e o metabolismo está diretamente relacionado

com a ocorrência dessas enfermidades, uma vez que fatores como o BEN, corpos cetônicos

e hipocalcemia influenciam diretamente a resposta imune dessas vacas nesse período.

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61

Estresse calórico em vacas leiteiras: efeito sobre o metabolismo e a

qualidade do leite

Vivian Fischer

Marcelo Tempel Stumpf

Alexandre Sausenbach Abreu

Elissa Forgiarini Vizzotto

Cenário – por que o estresse térmico é importante?

Cenários mais pessimistas apontam para um inequívoco aumento nas médias de temperatura

na Terra em até 4°C até 2100 (IPCC, 2007). Os sistemas de produção animal, ao estarem

inseridos e serem diretamente dependentes das condições naturais vigentes, serão afetados

por tais modificações.

As condições climáticas afetam e desafiam o animal a se adaptar às condições ambientais

para manter a homeostase e o bem-estar. Nos trópicos e em condições de pastagem, o gado

é exposto ao sol, além de outros agentes meteorológicos como umidade, chuva e vento

durante várias horas por dia. A intensificação da atividade pecuária, reduzindo o espaço por

animal e modificando o ambiente pode dificultar ou mesmo impedir que animais encontrem

alternativas para se adaptarem a essas condições, tornando-os mais suscetíveis ao estresse,

resultando em mudanças fisiológicas que diminuem o seu desempenho produtivo

(Deitenbach et al., 2008).

Podem se esperar efeitos diretos em animais expostos a altas temperaturas, tais como

alterações comportamentais, como o aumento na ocorrência de interações agonísticas

(Vizzotto, 2014), maior tempo em ócio, redução tempo de pastejo diurno e aumento no

noturno, maior ingestão de água (West, 2003; Fischer et al., 2014); alterações fisiológicas,

como aumento nas frequências respiratória e cardíaca (Mitlöhner et al., 2001; Dalcin, 2013),

escore de ofegação e temperatura retal (McManus et al., 2009; Stumpf, 2014; Fischer ET

AL., 2014) e redução no consumo de alimento (West, 1994; Rhoads et al., 2009).

Mecanismos homeorréticos são acionados de forma a tornar o animal capaz de se adaptar e

se manter em um equilíbrio dinâmico com as novas contingências impostas. O animal

necessita dissipar calor ao meio em busca de manter sua homeostase, ou seja, manter a

temperatura interna dentro dos níveis normais de 38 a 39,5˚C (Stober, 1993). Mecanismos

62

de dissipação de calor requerem energia, a qual pode provir da sua partição em detrimento

da glândula mamária através de alterações hormonais acionadas e controladas pelo eixo

hipotálamo-hipófise-adrenal (Baumgard & Rhoads, 2013).

Os efeitos negativos do estresse térmico são mais evidentes em animais com elevada

produção devido à maior geração de calor metabólico (Kadzere et al., 2002). Animais

zebuínos, normalmente mais tolerantes ao calor, devido às suas adaptações de forma

corporal, superfície de pele, número de glândulas sudoríparas e características do pelame,

sofrem mais intensamente à medida que a sua produtividade aumenta. Entre as estratégias

dos animais para minimizarem o estresse térmico, se destacam a redução da carga térmica,

redução da produção de calor metabólico e aumento da dissipação de calor (Berman, 2012).

Na zona de conforto térmico, em torno de 75% da perda de calor ocorre por radiação,

convecção e/ou condução. No entanto, quando a temperatura ambiente excede a temperatura

crítica superior, o gradiente de temperatura torna-se pequeno para que ocorra resfriamento

por esses meios. Inicia-se então a termólise, especialmente por mecanismos evaporativos

para manter o balanço térmico e a evaporação, por meio da sudorese e/ou respiração,

tornando-se a principal via de dissipação de calor, responsável por 80% da perda de calor

corporal. Em condições de umidade relativa do ar aumentada, há dificuldade na evaporação

e o ambiente torna-se mais estressante para o animal (Collier et al., 2006).

Animais mantidos em ambientes com temperaturas acima da temperatura crítica superior

podem se considerar em estresse térmico, já que dependem de mecanismos de dissipação de

calor. A mediação de tais mecanismos se dá pelo eixo hipotálamo-hipófise-adrenal, o qual é

abastecido de informações provenientes das unidades termorreceptoras e termosensitivas no

sistema nervoso central (Baker, 1989). Uma das primeiras respostas do animal ao ambiente

estressante é a redução no consumo de alimentos (Castanheira, 2009), na busca de reduzir a

produção de calor proveniente de processos digestivos (calor metabólico) e maior consumo

de água, para repor as perdas promovidas pela evaporação. Estima-se aumento de consumo

de 1,2 kg de água para cada 1˚C de aumento na temperatura ambiental mínima (West, 2003).

Em adição, os animais aumentam suas exigências de mantença, necessárias para suportar as

mudanças fisiológicas para dissipação de calor: ofegacão, suor, aumento nas reações

químicas, síntese e mantença da funcionalidade das proteínas de choque térmico (Tomanek

et al., 2010), e aumento na atividade celular induzida pelos níveis elevados de adrenalina

63

(Gaffin & Hubbard, 1996). De acordo com o NRC (2001), estresse médio a severo pode

elevar entre 7 a 25% tais exigências, embora Fox & Tyluki (1998) sugiram aumentos de até

30%. Ocorre vasodilatação das vias sanguíneas e aumento do fluxo de sangue para as zonas

periféricas do animal, para que ocorra resfriamento por contato com o ar mais frio. A

elevação na frequência cardíaca promove aumento nesse fluxo sanguíneo, auxiliando o

processo. Na busca de elevar as perdas de calor por evaporação, os animais elevam também

a frequência respiratória, podendo prevenir o aumento da temperatura retal até índices de

temperatura e umidade (ITU) de 80 (Silanikove et al., 2000). O aumento nas perdas de gás

carbônico em virtude do aumento da frequência respiratória altera a proporção entre as

concentrações de CO2:HCO3 sanguíneos, a qual deve se encontrar por volta de 20:1, e é o

principal sistema de tamponamento do sangue (Kadzere et al., 2002). Para compensar essas

perdas, o CO2 diminui, levando a um quadro de alcalose respiratória e aumento do pH

sanguíneo. A redução no teor de CO2 força os rins a excretarem maior quantidade de

bicarbonato (tamponante), na tentativa de manter a proporção de 20:1 estável (Beatty et al.,

2006). Além disso, a reação CO2 ↔ HCO3 se desloca para a esquerda, para compensar as

perdas de gás carbônico. O menor teor de bicarbonato promove uma subsequente redução no

pH sanguíneo, provocando acidose metabólica compensatória.

Mecanismos de sobrevivência sobrepõem aqueles relacionados à produção de leite. Os

efeitos aditivos do menor consumo de alimentos, maiores exigências de energia para

mantença, possíveis distúrbios metabólicos e maior destinação de energia aos processos de

perda de calor geram as reduções nos níveis produtivos dos animais.

Efeitos do estresse calórico sobre produção de leite

Até recentemente se creditava a redução na produção de leite à diminuição no consumo de

alimento (Baccari, 2001). A redução da produção leiteira varia entre 20 e 40% em animais

severamente estressados (West, 2003; Abreu et al., 2011). Segundo Wheelock et al. (2010),

40 a 50% dessa redução se deve ao menor consumo de alimentos (efeito indireto), sendo o

restante em virtude de outros mecanismos induzidos pelo estresse (efeitos diretos). Além do

menor consumo, ocorre redução de até 35% na eficiência de utilização de energia para fins

produtivos (McDowell et al., 1976).

64

Silanikove et al. (2009) sugerem outro mecanismo de ação para explicar a redução na

produção leiteira. Sob estresse térmico agudo, ocorre aumento na concentração de um

peptídeo derivado da clivagem da β-caseína pela plasmina, o qual bloqueia os canais de

potássio da membrana apical das células epiteliais mamárias, promovendo despolarização

potencial da membrana, reduzindo o metabolismo celular, sua atividade secretória e, por

conseguinte, diminuindo a produção láctea. Os efeitos negativos do estresse térmico sobre a

produção leiteira (Figura 1) dependem do nível de produção antes do estresse (quanto maior

a produtividade, maior a redução na produção) e do estádio de produção (vacas no terço

médio reduzem mais a produção do que vacas ao início ou final da lactação (Bernabucci et

al., 2010).

Figura 1. Variação do consumo e da produção leiteira em vacas estressadas

termicamente (HS) e vacas com alimentação restrita (PF). Fonte: Rhoads et al. (2009)

Efeitos do estresse calórico sobre a composição do leite – características químicas

Vacas mantidas em ambientes com índice de temperatura e umidade (ITU) superiores a 72,

produziram leite com menores teores de proteína, alfa e beta caseínas. Todavia, os efeitos

65

sobre os teores de gordura foram contraditórios (Bernabucci et al., 2002). A principal causa

da redução nos teores de proteína nesse estudo foi a redução nos níveis de αs e β-caseínas,

provavelmente em virtude do menor aporte de energia e proteína. Essas caseínas são ricas

em grupos fosfato e são os componentes acídicos das micelas (Schmidt, 1980).

Reduções no teor de proteína no leite foram descritos em bovinos por Rhoads et al. (2009),

embora não tenham detectado diferenças nos teores de gordura e lactose (Figura 2). Ao

contrário do relatado por Abreu et al. (2011) os quais verificaram que vacas leiteiras sob

estresse térmico severo sem acesso a sombra produziram leite com menores teores de

proteína (2,75 vs 2,99%), porém maiores teores de gordura (3,61 vs 3,40%) e nitrogênio

ureico (23,70 vs 18,81 mg/dL), não encontrando diferença para os teores de lactose (4,37 vs

4,34).

Segundo Sevi & Caroprese (2012), a exposição ao sol em altas temperaturas pode promover

aumento na permeabilidade dos capilares, elevando a quantidade de enzimas proteolíticas no

leite, de forma a reduzir a concentração proteica. Em adição, a redução na oferta e consumo

de pasto nos meses mais quentes, bem como o menor aporte de energia e nitrogênio,

contribuem para os valores encontrados. O citado aumento na permeabilidade dos capilares

também promove aumento nas concentrações de enzimas lipolíticas, resultando em

decréscimo na síntese e alteração no perfil lipídico do leite (Sevi & Caroprese, 2012). Esses

autores observam que a menor taxa de passagem no rúmen aumenta o tempo de exposição

da digesta ao processo de biohidrogenação, de forma que os ácidos graxos insaturados são

convertidos em saturados e têm seus teores reduzidos no leite. O estresse térmico e a redução

na qualidade da forragem em virtude da maior atividade metabólica vegetal atuam em

conjunto diminuindo o consumo (Renna et al., 2011) e a produção de ácido acético no rúmen,

principal precursor da gordura láctea.

Os efeitos negativos do estresse térmico sobre os níveis de lactose no leite são decorrentes

do uso da glicose como fonte de energia ao animal, reduzindo o aporte à glândula mamária

e posterior síntese desse componente, além do efeito direto da queda no consumo de

alimentos. Alterações na concentração de lactose, por sua vez, são mais difíceis de ocorrer,

já que sua queda é acompanhada por menores níveis de produção de leite.

66

Figura 2. Variação da concentração de lactose, proteína e gordura

lácteas provenientes de vacas estressadas termicamente (HS) e vacas

com alimentação restrita (PF). Fonte: Rhoads et al. (2009)

Efeitos do estresse calórico sobre a composição do leite – características físicas

Em trabalhos realizados durante o verão (Mariani et al., 1994; Bernabucci & Calamari, 1998;

Calamari & Mariani, 1999), foram verificados valores de pH mais alto e de acidez titulável

mais baixa em animais em estresse térmico. No entanto, Abreu et al. (2011) relataram

menores valores de pH, crioscopia e densidade e maior valor de acidez titulável em vacas

estressadas termicamente sem acesso a sombra em relação àquelas com acesso a sombra.

Também, os autores encontraram que vacas estressadas termicamente produziram leite com

menor estabilidade (testes do álcool e do tempo de coagulação sob temperatura de 144°C,

Figura 3).

67

12

14

16

18

20

22

24

Produção de Leite (L)

62

64

66

68

70

72

74

76

78

80

Teste do Álcool (%etanol v/v)

0

50

100

150

200

250

300

Tempo de coagulação a 144°C (s)

0

5

10

15

20

25

Acidez titulável (°D)

Figura 3. Valores de produção de leite, estabilidade no teste do álcool e tempo de

coagulação e acidez titulável de vacas com (linha preta) e sem acesso a sombra (linha

vermelha). Fonte: Fischer et al. (2012)

Os efeitos do estresse térmico sobre a estabilidade do leite no teste do álcool podem ser

relacionados à redução no consumo de alimentos dos animais. De fato, a restrição de

consumo per se resultou em redução na estabilidade do leite (Zanela et al., 2006; Abreu et

al., 2011; Stumpf et al., 2013) e épocas do ano de menor oferta de alimentos promovem maior

incidência de leite instável (Ponce & Hernández, 2001; Marques, 2004).

Ademais, distúrbios metabólicos provenientes do estresse térmico, ao alterar de forma

significativa as condições fisiológicas do animal, apresentam grande potencial de reduzir a

estabilidade do leite, conforme relatado por Marques et al. (2011) ao induzirem acidose

metabólica através do fornecimento de sal aniônico em bovinos leiteiros.

Efeitos do estresse calórico sobre o metabolismo

O estresse térmico provoca mudanças na homeostase e na homeorrese das vacas lactantes.

Ocorrem alterações no perfil hormonal caracterizadas principalmente por um declínio e

aumento, respectivamente, naqueles com efeitos anabolizantes e catabolizantes, alterando o

metabolismo pós-absortivo da energia, lipídios e proteínas, com prejuízos à função hepática

e aumento do estresse oxidativo. Ocorre prejuízo à resposta imunológica e ao desempenho

68

reprodutivo. Os efeitos sobre o metabolismo podem ser quantificados pela mensuração das

variáveis fisiológicas, tais como a temperatura corporal, frequência respiratória,

concentrações hormonais e equilíbrio ácido-base e hidroeletrolítico (Bernabucci et al., 2010).

Assim, ocorre diminuição do hormônio do crescimento, catecolaminas e glicocorticoides.

Este estado endócrino reduz os níveis circulantes de tiroxina (T4) e triiodotironina (T3), e, em

consequência, a diminuição da taxa metabólica basal e da produção de calor (Johnson, 1980;

Yousef, 1987).

Vacas em balanço energético negativo decorrente de estresse térmico, apesar de ingerirem

menos, não apresentam reduções na secreção e na sensitividade à insulina (Wheelock et al.,

2010) e podem ter seus níveis de somatotropina reduzidos (Li et al., 2006). Dessa forma, as

vacas se tornam metabolicamente inflexíveis, uma vez que não podem oxidar ácidos graxos

para gerar energia, pois esse processo contribui ao incremento de calor metabólico

(Baumgard & Rhoads, 2013). Não se detectam elevações em ácidos graxos não esterificados

no sangue (Shwartz et al., 2009) e os animais passam a ser dependentes de glicose como

fonte de energia. Como consequência, o aporte de glicose à glândula mamária diminui, com

consequente redução da síntese de lactose, o que diminui a produção de leite.

Vacas sem acesso a sombra, mesmo em condição de estresse térmico leve, apresentaram

maiores valores de sódio, mas valores menores de hematócrito, PCO2, TCO2, HCO3, excesso

de base, e tenderam a apresentar hemoglobina baixa (Abreu, comunicação pessoal). Foram

observadas maiores concentrações de ureia, creatinina e albumina no sangue de vacas

severamente estressadas pelo calor (Abreu, comunicação pessoal). Devido às maiores perdas

renais de HCO3- e perda de saliva, pela redução da ruminação nos animais ofegantes no calor,

as vacas estressadas pelo calor são mais propensas a sofrer acidose ruminal e metabólica.

Estresse térmico em fases não produtivas (novilhas e período seco de vacas)

Vacas que sofreram estresse térmico durante o período seco apresentaram menor produção

leiteira durante 280 dias na lactação subsequente (28,9 vs 33,9 kg/dia), possivelmente devido

à menor proliferação celular observada no pré-parto, não sendo observados efeitos sobre a

apoptose (Tao et al., 2011). Também foi observado menor concentração de proteína láctea

(3,01 vs 2,87%). O estresse térmico durante o período seco reduz o consumo e debilita a

imunidade dos animais (Tal et al., 2013).

69

Em comparação com as vacas estressadas termicamente durante o período seco, os animais

que ficaram sob resfriamento (ventiladores e aspersores) ganharam mais peso antes do parto,

mas perderam mais peso e condição corporal no início da lactação. As vacas com

resfriamento produziram mais leite do que vacas mantidas sob estresse térmico (34,0 vs 27,7

kg/dia), mas os tratamentos não afetaram a composição do leite (Figura 4). Os tratamentos

não influenciaram a insulina circulante e os metabólitos pré-parto, mas vacas sob

resfriamento apresentaram menor concentração plasmática de glicose, aumento dos ácidos

graxos livres, e tenderam a ter menor concentração de insulina no pós-parto em comparação

com vacas estressadas termicamente. O resfriamento das vacas no pré-parto não afetou as

respostas de insulina para o teste de tolerância à glicose e o teste de desafio à insulina antes

do parto e aos 28 após o parto (Tao et al., 2012).

Medidas mitigadoras de estresse térmico

Em termos de medidas de adaptação, é geralmente mais rápido alterar o ambiente para

melhorar o bem-estar, produção e reprodução (West, 2003; Renaudeau et al., 2012). Raças

de origem europeia sofrem mais o estresse térmico devido à sua alta produtividade, reduzindo

o seu limiar de conforto térmico (Silva et al., 2002). Por isso, os criadores brasileiros têm

procurado combinar as características desejáveis das raças europeias e zebuínas, através da

produção de animais mestiços, geralmente usando Holandês e Gir (Girolando). O rebanho

nacional é composto por aproximadamente 95% de animais mestiços (Martinez & Verneque,

2001), representando cerca de 70% da produção de leite (Alvim et al., 2005).

As raças diferentes reagem de forma diferente ao estresse térmico (McManus et al., 2009).

Além disso, os avanços na produção animais em áreas como a nutrição e a reprodução

resultaram em aumento significativo na produção de leite, o que resultou em uma maior taxa

de calor metabólico e, portanto, aumentando a necessidade de dissipação de calor (Silanikove

et al., 2000; Baumgard et al., 2007).

O cruzamento entre as raças Holandês e Gir é usado há décadas para obter animais mais

tolerantes ao calor. A comparação entre animais pertencentes aos grupos genéticos Holandês,

50% Holandês e 50% Gir e 75% holandês e 25% Gir, mostrou que as vacas 50% H 50% G

apresentaram menores frequências respiratórias e cardíacas, temperatura retal e escore de

70

ofegação comparadas ao grupo 100% Holandês, enquanto o grupo 75% H 25% G apresentou

valores intermediários (Stumpf, 2014).

Figura 4. Produção de leite de vacas sob estresse térmico com

(símbolo preto) ou sem resfriamento (símbolo vazado) durante o

período seco. Fonte: Tao et al. (2011)

Criar animais em um ambiente com conforto para proporcionar bem-estar, pode melhorar o

desempenho produtivo do animal. Portanto, para minimizar os efeitos nocivos do clima sobre

os animais em países tropicais é importante para mitigar o efeito negativo das variáveis

climáticas consideradas responsáveis pelo estresse por calor. Nos locais, caracterizado pelo

clima subtropical de altitude com umidade elevada, a velocidade do vento contribui para a

dissipação de calor dos processos de animais por convecção, mas a alta umidade reduz a

capacidade de dissipação de calor do corpo, por meio de evaporação (Azevedo et al., 2009).

O resfriamento evaporativo é a forma principal de perda de calor disponível para os animais

homeotérmicos quando a temperatura ambiente é superior à temperatura do corpo, e este

processo é mais eficiente quando a umidade relativa é baixa (Robinson, 2004).

O uso de sombra serve para atenuar o efeito da radiação solar, diminuindo a temperatura do

corpo (Mitlohner et al., 2001; Kendall et al., 2006; Tucker et al., 2007; Fischer et al., 2014).

No entanto, deve-se prover área em torno de 9 m2 por vaca para evitar competição entre os

animais pela sombra (Schutz et al., 2010).

O provimento de instalações como galpões dotados de aspersores na linha do cocho aliado a

ventiladores, tipo fixo ou tipo móvel, ou galpões com sistema de resfriamento no piso ou nas

camas, são ferramentas nos rebanhos comerciais dos países desenvolvidos. Existem

71

diferenças entre os sistemas quanto à capacidade de reduzir a temperatura corporal e a

frequência respiratória, aumentar o tempo em que a vaca fica deitada e aumentar o consumo

de alimentos. O provimento de conforto térmico durante o período seco exerce efeitos

positivos sobre o sistema imune, desenvolvimento placentário e desenvolvimento do terneiro,

com reflexos positivos sobre a produção de leite na lactação subsequente (Tao et al., 2013).

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74

Bem-estar de vacas leiteiras: melhor produção com a vaca feliz

Marcelo Cecim

Não há muito tempo atrás falar na preocupação com o conforto e o bem-estar de animais de

produção era um assunto que gerava risadas e desdém, pois acreditava-se que para um animal

ser lucrativo precisava apenas de boa sanidade, boa genética e boa nutrição. Hoje depois de

décadas de seleção, chegamos a um modelo de vaca leiteira que, apesar de produzir mais

leite, tem uma expectativa de vida cada vez menor e uma crescente infertilidade. Em termos

de evolução das espécies, uma raça que vive e se reproduz menos está fadada a extinção. No

entanto, insiste-se em chamar este fenômeno de "melhoramento genético".

É necessário entender que à medida que optamos por animais maiores e mais produtivos,

suas exigências serão maiores também. Muito trabalho tem sido direcionado no sentido de

reconhecer as demandas nutricionais crescentes nestes animais para poder produzir mais.

Infelizmente, isso não tem sido suficiente para mantê-las felizes. Ainda entendemos muito

pouco de necessidades sociais, de adaptação a técnicas de manejo e até mesmo da expectativa

individual de cada vaca. Em relação a isso, sempre vale lembrar o comentário de Louis

Patenaude, proprietário da recordista Gillette Smurf, uma vaca canadense que viveu 16 anos

e produziu mais de 225.000 kg de leite, quem disse: "Ela foi uma vaca que nunca precisou

ser mimada". Longevidade e fertilidade são indiscutivelmente a opinião das vacas sobre a

sua qualidade de vida. Em nossa realidade, o valor econômico da longevidade é enorme. A

maior parte das fazendas leiteiras no sul do Brasil está tentando aumentar o plantel, e cada

descarte involuntário atrasa o processo. Em rebanhos estáveis, cada descarte involuntário

precoce, representa uma novilha que o produtor precisa comprar de si mesmo. Com um custo

de recria da novilha oscilando entre R$ 850,00 e R$ 1.300,00 e um valor de mercado de

venda desta novilha entre R$ 4.500,00 e R$ 6.000,00, cada vez que isso acontece o produtor

faz uma operação comercial com algo próximo a 400% de prejuízo. Em um rebanho em

crescimento como o nosso, a venda de novilhas rende muito mais que a produção de leite.

Além disso, com um descarte menor, as novilhas selecionadas terão sem dúvida melhor

mérito genético. Também a lucratividade individual de uma vaca aumenta com a idade, pois

não só sua produção bruta aumenta até a quarta ou quinta lactação, mas quanto maior o

75

número de lactações menor será o custo proporcional da recria deste animal. O resultado final

é que animais com baixa vida produtiva, dificilmente serão lucrativos, mesmo que produzam

muito leite. Aí temos o impacto do bem-estar sobre a própria sustentabilidade do negócio.

Qual a expectativa de vida produtiva das vacas leiteiras ao redor do mundo? Estima-se que

esteja ao redor de 4,7 lactações no Reino Unido e 5,3 na Nova Zelândia. Um estudo avaliou

69 milhões de lactações de vacas de raça Holandesa em diferentes regiões dos EUA. A

expectativa de vida produtiva variou de 2,73 lactações na região nordeste até 1,94 lactações

na região sudeste. Este resultado assustador indica que se não fosse o advento da sexagem,

em breve haveria rebanhos em que cada vaca produziria menos de uma filha, e a raça entraria

em extinção. Qual a situação no sul do Brasil, onde a linhagem canadense é a mais utilizada?

Estes dados não existem. No entanto é bastante comum encontrarmos rebanhos onde 30 ou

até 35% dos animais em lactação são vacas de primeira cria. Nestes casos, a expectativa de

vida é menor que 3 lactações e é óbvio que a vida dos animais nestes rebanhos não é boa.

Existem diferentes formas para a vaca externar a sua insatisfação com o sistema, as mais

leves estão relacionadas a quadros depressivos e incluem comer menos, ficar menos tempo

deitada, estar mais tempo em pé, ter menor tempo de ruminação, ter cios mais curtos, etc.

Tais sinais, como são de difícil observação acabam passando despercebidos. Ou seja, como

elas não são escutadas, os transtornos tentam falar mais alto, deslocando abomaso, fazendo

cetose, metrite ou uma mastite séria. Quando nada funciona e elas de fato desistem, já que

vaca não foge, a solução é morrer. Um produtor ou técnico quando afirma que vai descartar

esta ou aquela vaca por problema de casco ou úbere, está no mínimo tendo uma atitude

covarde, jogando a culpa na vaca. Na verdade, é a vaca que está dizendo ao dono que não

quer mais viver ali, ou seja, ela o está descartando.

Hoje, na medicina humana, entendemos que prevenção e diagnóstico precoce são as melhores

estratégias de lidar com os nossos problemas de saúde. Em medicina de produção leiteira

temos a mesma situação, apenas chamamos de ambiência e monitoramento. Ambiência são

todos aqueles fatores pelos quais permitimos que as vacas expressem seu comportamento

normal, ou seja, ambiência são as ferramentas do bem-estar.

Se uma vaca pudesse de fato escolher o que fazer durante o dia, o que ela faria? A

distribuição do tempo das atividades é uma ferramenta básica na análise do bem-estar. Mais

especificamente, uma vaca gosta de deitar em cama seca por 12 a 14 horas por dia, a maior

76

parte deste tempo ruminando. Em torno de 5 horas são dedicadas à alimentação; 2 a 3 horas

elas passam bebendo caminhando e socializando; em torno de uma hora ruminando em pé;

até 3 horas por dia ela aceita estar presa ou na ordenha.

Aí iniciam os problemas: vacas pastando em piquetes com baixa oferta precisam comer por

cinco horas ou mais, vacas com calor deitam por menos tempo, duas ordenhas diárias mais o

tempo de espera normalmente passam de 4 horas, falta de cama seca aumenta o ócio em pé.

Este “tempo extra” acaba sendo retirado do tempo deitada, e ruminando, que é a grande

expressão de conforto da vaca. Todos estes fatos comuns no dia a dia de um rebanho são

sinais de que falta conforto e bem-estar para as vacas. No final das contas, prover conforto

para um rebanho leiteiro é um conjunto de atitudes, instalações e manejo que permitam que

o animal expresse o comportamento normal, em outras palavras, que façam o que uma vaca

feliz gostaria de fazer.

Reconhecer bem-estar de um rebanho leiteiro é algo que pode ser feito por qualquer um sem

nenhum equipamento especial, apenas precisa saber o que, quando e como observar,

quantificar os resultados e anotar. Para isso foram criadas classificações que são conhecidas

como escores de monitoramento, usando principalmente os escores de: consumo,

preenchimento de rúmen, uso do tempo, ambiência, interação social, conforto térmico,

consistência e composição de fezes, locomoção etc. Estes comportamentos representam a

opinião da vaca sobre as coisas que lhe são ofertadas. A análise conjunta de todos os escores

representa a análise do próprio sistema produtivo, mas, sob a ótica da vaca. Isto pode ser

usado com muita eficiência para a composição de um mapa de pontos de riscos e seguranças

do sistema, como uma análise FOFA (pontos fortes e oportunidades, pontos fracos e

ameaças). Esta é a estratégia básica das companhias de seguro na definição de risco do cliente

e do prêmio a ser pago. O problema inicia com o tempo que tudo isso consome, e, com a

capacidade do avaliador em entender a inter-relação dos escores e formular soluções práticas

e viáveis. É humanamente impossível acompanhar e anotar atividade de um rebanho 24 horas

por dia. Todo tratador experiente sabe quando uma vaca não está bem, muito embora ela não

esteja doente. Infelizmente esta informação, embora valiosa, é tardia. Se a vaca é reconhecida

como não estando bem, é porque ela não comeu, está deprimida, deu menos leite, andou mais

devagar etc. Tudo isso na verdade são sinais que a vaca “está mal” e o diagnóstico já é tardio,

em pelo menos 24 horas. Aí entram os sistemas de monitoramento de comportamento. São

77

ferramentas pelas quais a vaca pode dizer que não se sente bem, 1 ou 2 dias antes de deixar

de comer, 3 dias antes de diminuir a produção e 4 ou 5 dias antes de ficar doente, permitindo

desta forma uma ação proativa e não reativa ao problema. Entendemos que muito embora as

alterações de comportamento não digam qual é exatamente o problema da vaca, elas avisam

ao tratador que este animal requer uma olhada especial, ou seja, elas permitem um

diagnóstico precoce.

O uso do tempo e do consumo de alimento hoje são considerados os principais indicadores

de que um animal está bem. Portanto, cada vez que uma vaca altera estes parâmetros do seu

comportamento diário, sabemos que alguma coisa não vai bem, e que ela merece uma olhada

mais próxima. Esta é, sem dúvida, é a melhor medida preventiva que podemos usar. Os

pedômetros são usados essencialmente na identificação do cio. As coleiras que associam

deslocamento e ruminação tornam esta identificação bem mais precisa. A coleira brasileira

C-Tech, recentemente lançada no mercado, é a primeira a conter algoritmos relacionados ao

conforto, além da detecção de cio. Este sistema é provido de um acelerômetro que detecta a

posição da cabeça da vaca com 40 leituras por segundo, daí são formados pacotes de

comportamento a cada hora, onde são identificados minutos em: atividade (caminhando,

comendo, montando bebendo), minutos em ruminação e minutos em ócio. Estes pacotes de

dados são enviados automaticamente, 2 ou 3 vezes ao dia, para um programa que compara o

comportamento de cada vaca com ela mesma nos 15 dias anteriores e também com o resto

do rebanho. Cada vez que uma vaca aumenta seu tempo de atividade, diminuindo a

ruminação e o ócio, o programa reconhece como cio. Por outro lado, quando existe um

aumento no ócio com redução da ruminação e também da atividade, o sistema entende como

alteração de comportamento e o animal deve ser examinado. Ao final da ordenha, duas listas

são geradas contendo os brincos dos animais alterados. Se houver internet na fazenda, as

listas podem ser automaticamente enviadas por SMS para o celular do veterinário, por

exemplo. Também o comportamento individual e do lote a cada hora pode ser acompanhado

de qualquer lugar pelo gerente ou proprietário. É importante salientar, que este equipamento

à exceção de cio, não gera diagnósticos, mas reconhece que algo mudou para pior ou melhor

no dia de uma vaca em particular, ou no seu lote.

Classicamente, um bovino dedica seu dia a 3 atividades principais, de 8 horas cada:

ruminação, deslocamento e ócio. Hoje entende-se que a ruminação é uma variável mais

78

sensível que o consumo, pois ruminando menos, a taxa de esvaziamento cai e no dia seguinte

cai o consumo. O tempo de ruminação pode aumentar em consequência do aumento do

conforto, do consumo total e de fibra longa na dieta. Vai diminuir no estresse térmico, nos

quadros de dor, na redução de consumo ou simplesmente na falta de conforto. Os bovinos

preferem ruminar deitados, portanto a qualidade de cama também afeta a ruminação.

As primeiras observações de campo em rebanhos que utilizam esta tecnologia mostram

informações surpreendentes, como por exemplo, a alta frequência de cios curtos (5 ou 6

horas). A queda de minutos de ruminação é normal no dia do parto (até 50%), porém, vacas

que fazem uma boa transição, retornam aos 400-500 minutos de ruminação por dia, já no

quinto dia pós-parto. As vacas que apresentarão mastite, metrite ou cetose até o dia 21,

mostram uma ascendência da curva de ruminação bem mais lenta. As vacas que deslocam

abomaso entre o dia 14 e 21 mostram baixo tempo de ruminação entre os dias 0 e 7 depois

do parto.

Portanto, estamos aprendendo a escutar a opinião das vacas, principalmente durante uma fase

crítica que é a transição. Os próximos estudos devem direcionar-se no acúmulo destes dados

e a construção de uma base dados comportamentais das vacas em sistemas produtivos no

Brasil. Isto permitirá a criação de um programa de predição de desafios e doenças, que levará

ao diagnóstico precoce e, por fim, poderá diminuir o descarte involuntário através do

entendimento das necessidades individuais da vaca.

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79

Marcadores bioquímicos sanguíneos en el diagnóstico y control de

trastornos metabólicos en vacas lecheras

Fernando Wittwer

Enfermedades de la producción y estrés metabólico en vacas

La intensificación de los sistemas productivos junto a la selección genética de los animales

ha incrementado la producción animal. Paralelamente, se han impuesto mayores exigencias

metabólicas a los animales predisponiéndolos a desarrollar las enfermedades de la

producción. Éstas se producen debido a un desequilibrio entre los ingresos, circulación y

egresos de uno o más metabolitos en el organismo, alejando sus concentraciones de los

límites fisiológicos. En estas circunstancias se desarrollan alteraciones bioquímicas y

fisiológicas que inicialmente condicionan mermas productivas y de fertilidad en el rebaño

que culminan en trastornos clínicos e incluso la muerte de animales. Para prevenirlas es

fundamental mantener el equilibrio entre la cantidad de un nutriente que ingresa, es

absorbida, circula en la sangre, es depositada en los compartimientos u órganos de reserva y

egresa por conceptos de mantención y producción.

Los trastornos metabólicos en los rumiantes son en su mayoría relacionados con

desequilibrios nutricionales, incluidos las carencias nutricionales simples producto de mezcla

incompleta de la dieta o un manejo alimentario inadecuados, o bien por problemas más

complejos asociados a las interacciones entre la nutrición, el ambiente y el manejo (Cuadro

1). Su presentación es más frecuente en animales manejados en condiciones de pastoreo,

debido a la elevada variación en la disposición y contenido de nutrientes de los pastos

utilizados como forrajes, asociadas a características de suelo, composición botánica y estado

de desarrollo de los pastos y sus cambios estacionales y diarios. Los desequilibrios

nutricionales afectan a un grupo de animales en un rebaño, generalmente los

metabólicamente más susceptibles, que corresponden a los mayormente exigidos desde el

punto de vista productivo, vale decir vacas en el período de transición, ovejas al final de

gestación, animales en crecimiento, los que comúnmente cursan inicialmente con una

alteración en su salud de tipo subclínica o inaparente. Es en esta condición que se requiere

de un método de diagnóstico o evaluación de balance metabólico oportuno, antes que la

producción de los animales se vea afectada.

80

Cuadro 1. Alteraciones metabólicas en vacas

Carencia o disfunción Alteraciones metabólicas

Carencia de energía BEN, cetosis o acetonemia tipo 1 y 2, hígado graso

Desbalance de proteínas Desnutrición proteica, asincronía ruminal RDP/Eº

Disfunción ruminal Acidosis ruminal sub aguda “SARA”, acidosis láctica,

desvío a la izquierda del abomaso

Disfunción mineral Hipocalcemia, paresia puerperal, tetania hipomagnesémica

Carencia mineral Mg, P, Na, Se, Cu, Zn, Fe, Co, I

El período de transición de la vaca lechera (3 semanas preparto a 3 semanas posparto)

constituye el de mayor exigencia para mantener su homeostasia, producto de los cambios

fisiológicos, nutricionales, metabólicos e inmunes que se presentan en las 6 semanas

alrededor del parto. A ello hay que asociar los cambios de manejo (reagrupamiento,

ambientes diferentes) y alimentación (dietas preparto, lactancia) propios del fin de la

gestación, parto e inicio de la lactancia. En esta situación la capacidad homeostática se ve

sobrepasada produciéndose en la vaca el estrés metabólico, definido como la “incapacidad

de adaptación fisiológica al rápido crecimiento fetal, parto y alta demanda de energía para

lactancia, con consecuente alteración en la utilización de nutrientes esenciales, favoreciendo

la presentación de trastornos metabólicos, procesos inflamatorios y el estrés oxidativo”

(Figura 1).

Figura 1. Causa y consecuencias del estrés metabólico en vacas en transición

(Adaptado de Sordillo y Mavangira, 2014)

81

El estrés metabólico genera significativas pérdidas económicas en la industria ganadera,

limitando la productividad de las vacas y originando enfermedades. Al respecto, se describe

que el 30 al 50% de las vacas cursan con una enfermedad durante el período de transición

(Figura 2), constituyendo con ello preocupación no solo productiva sino también asociada al

bienestar animal. De allí que la determinación de la concentración de analitos cuyas

concentraciones son influidas por el estatus metabólico de los nutrientes en el organismo, se

realiza frecuentemente en muestras de sangre, leche y orina de vacas lecheras. Su

determinación permite evaluar la condición o balance metabólico nutricional de los animales

e identificar tempranamente los trastornos metabólicos que afectan de forma clínica o

subclínica los rebaños.

Figura 2. Enfermedades asociadas al estrés metabólico de vacas lecheras en sistemas

confinado de USA y Europa (Sordillo y Mavangira, 2014) y pastoril de Chile

(Sepúlveda-Varas et al . 2015)

Perfil metabólico

Análisis bioquímicos clínicos para individuos se utilizan comúnmente en las prácticas

veterinarias, es así que exámenes de campo o al lado de la vaca, como las pruebas rápidas

para la cetosis, hipocalcemia puerperal, pH ruminal, inmunoglobulinas en terneros,

constituyen un apoyo del laboratorio al diagnóstico de enfermedades metabólicas y

0 5 10 15 20 25 30 35

Distocia

Paresia puerperal

Hipocalcemia

Cetosis

DAI

Ret. Placenta

Metritis

Quiste ovárico

Mastitis clínica

Cojera

Casos (%)

Sistema confinado Sistema pastoril

82

alteraciones de salud de los animales. Sin embargo, hoy en día la medicina individual en

animales de producción tiene un uso limitado, mientras que los procedimientos de

diagnóstico de rebaño constituyen una herramienta útil para monitorear, diagnosticar y

controlar enfermedades que afectan a grupos de individuos.

Los marcadores bioquímicos corresponden a analitos que pueden ser cuantificados en

muestras de tejidos como sangre o fluidos corporales como leche u orina de un animal o en

un grupo en el rebaño, y que definen el grado de equilibrio metabólico logrado mediante la

“homeorresis”, que corresponde al mecanismo que regula y coordina los cambios en los

procesos metabólicos de tejidos del animal que son requeridos para sostener una condición o

carga fisiológica, como sucede en el período de transición, especialmente al inicio de la

producción láctea. Basado en este concepto y la idea que “lo que nos es medido difícilmente

puede ser corregido”, en los años 1970 se comenzó a utilizar en Europa el "perfil metabólico"

(PM), técnica que se ha ido adaptado a diferentes sistemas y especies productivas,

incorporando nuevos marcadores o formas de aproximación, acorde con las realidades

locales y los avances científicos y tecnológicos.

Un PM es definido como un conjunto de análisis bioquímicos realizados en un momento

definido con el propósito de monitorear la salud metabólica del rebaño y contribuir a

establecer las alteraciones metabólicas y enfermedades que afectan la producción. Es un

examen complementario utilizado en la evaluación y diagnóstico de las “enfermedades de la

producción” que se analiza, en uno o más grupos de animales representativos del rebaño, en

los que se determinan bio-marcadores indicadores del balance metabólico nutricional y del

estrés metabólico. Los resultados obtenidos se comparan con intervalos de referencia

poblacionales (IR) o umbrales críticos (cut-off), indicando así el grado de adecuación de las

principales vías metabólicas relacionadas con energía, proteína y minerales, la funcionalidad

de órganos vitales para la producción como el hígado o el grado de salud o bienestar de los

animales. Su mayor utilidad se ha centrado en el estudio de los desbalances metabólicos

nutricionales que se presentan en las vacas lecheras durante el período de transición e inicio

de la lactancia. Su empleo se ha promovido bajo dos sistemas, a) evaluación a nivel de

individuos como indicador para estimar el riesgo de presentación de trastornos metabólicos

e inflamatorios en las vacas en transición y b) a nivel de rebaño para hacer una prospección

83

de los desbalances metabólicos asociados a una inadecuada alimentación o manejo en lotes

de vacas agrupadas acorde a su condición fisiológica, productiva o sanitaria.

Estimación de riesgo

Este sistema emplea la determinación de bio-marcadores o analitos muy definidos durante el

período de transición de vacas lecheras con el propósito de establecer el riesgo que individuos

de un rebaño cursen posteriormente con enfermedades específicas. Los primeros trabajos en

esta línea fueron realizados por Sommer en Alemania quien describió la metafilaxis como

parte de la medicina preventiva de rebaños al demostrar que un diagnóstico temprano basado

en las determinaciones séricas de colesterol y AST en vacas preparto, permite identificar

vacas en riesgo, las que al ser tratadas preventivamente disminuye en ellas la presentación de

enfermedades en el posparto (Cuadro 2). Bajo este enfoque, se determina en algunos animales

la concentración sanguínea de un analito en un período definido y sus resultados se comparan

con un umbral crítico predefinido. Las vacas con resultados sobre o bajo los puntos de corte

definen el mayor riesgo que cursen posteriormente con una patología definida. Considerando

que la mayor presentación de trastornos metabólicos, como cetosis y desvío del abomaso e

inflamatorios como mastitis y metritis es al final del período de transición e inicio de la

lactancia, la estrategia de muestreo se concentra previo a su presentación por ello la mayor

carga de muestras se ubica en el preparto o inmediatamente después del parto.

Cuadro 2. Efecto de una metafilaxis basada en la determinación de colesterol y AST

séricos (hipocolesterolemia o AST aumentado) en la presentación de enfermedades en el

posparto de vacas (adaptado de Sommer, 1975)

Enfermedad Tratadas (n=202) Control (n=283)

Retención de placenta 5% 9%

Enfermedad metabólica 2% 12%

Endometritis 8% 25%

Disfunción ovárica 11% 19%

Mastitis 1% 8%

Esta técnica se ha empleado mayormente para definir las vacas que cursan con balance

energético negativo, BEN, y su mayor riesgo de enfermar en el posparto; con dicho propósito

se utiliza la determinación de ácidos grasos no esterificados, NEFA y ßOH-butirato (BHB)

en sangre, de igual manera se ha utilizado las determinaciones de colesterol sérico preparto

84

y posparto y de calcio sérico. Todas ellas se asocian con incremento en las presentaciones de

metritis y otras enfermedades del posparto. (Cuadro 3).

Cuadro 3. Asociaciones entre concentraciones séricas de ácidos grasos libres, (NEFA); ß-hidroxi-butirato

(BHB) y calcio (Ca), de vacas en transición con el riesgo de presentación de enfermedades al posparto

Analito Punto de corte

(mmol/L)

Días en relación

al parto

Enfermedad Riesgo Referencia

NEFA 1,1 -21 a -3 K+DA+RP+M 2,1 Van Saun (2006)

NEFA 0,5 3 a 21 K+DA+RP+M 4,2 Van Saun (2006)

NEFA 0,3 -14 a -3 K+DA+RP+M 1,6 Ospina et al. (2013)

NEFA 0,6 3 a 14 K+DA+RP+M 1,9 Ospina et al. (2013)

BHB 1,0 3 a 14 K+DA+RP+M 3,1 Ospina et al. (2013)

BHB 1,2 1 a 7 DA 8,0 LeBlanc et al. (2005)

BHB 1,2 1 a 7 M 3,3 Duffield et al. (2009)

BHB 1,0 3 a 14 K 2,8 Ospina et al. (2010)

Calcio 2,0 21 a 21 K+DA+RP+M 4,0 Van Saun (2006) *K= cetosis; DA= desvío de abomaso; RP= retención de placenta; M= metritis

En esta línea destacan los trabajos realizados por Ospina en Cornell-USA valorando BEN, a

nivel de individuos, en base al aumento de las concentraciones séricas de NEFA pre y

posparto y BHB posparto y su relación con la presentación de enfermedades en el posparto

(cetosis subclínica y clínica, desvío de abomaso, retención de placenta y metritis) (Cuadro

4). Se ha señalado que vacas con concentraciones de NEFA preparto de >0,3 y posparto

>0,7 mmol/L o de BHB posparto >1,0 mmol/L tienen una menor probabilidad de preñez y

su producción de leche se verá disminuida

Cuadro 4. Concentraciones séricas pre y posparto de ácidos grasos libres (NEFA) y ß-hidroxi-butirato (BHB)

como predictores de riesgo de enfermedades en el período de transición en vacas lecheras (adaptado de

Ospina et al., 2010)

Enfermedad

NEFA (mmol/L)

Preparto (-14 a -2 días) Posparto (3 a 14 días)

Punto de corte Riesgo Punto de corte Riesgo

Desvío de abomaso 0,3 2,0 0,7 9,7

Cetosis 0,3 1,8 0,6 5,0

Retención de placenta 0,4 2,2 - -

Metritis - - 0,4 17,0

Otras 0,3 1,8 0,6 4,4

BHB (mmol/L) Posparto (3 a 21 días)

Desvío de abomaso 1,0 6,9

Cetosis 1,0 4,9

Metritis 0,7 2,3

Otras 1,0 4,4

85

Los últimos trabajos en esta línea buscan proyectar los resultados de individuos a la salud del

rebaño, definiendo la asociación entre el porcentaje de vacas que en el período de transición

presentan valores alterados de un analito, con trastornos en la salud, producción o fertilidad

en el período de lactancia posterior. De esta forma constituye una alarma de futuras pérdidas

esperables de mantenerse dicha condición (Cuadro 5).

Cuadro 5. Asociación entre el porcentaje de vacas con concentraciones séricas aumentadas de NEFA y BHB

en el período de transición de vacas lecheras con pérdidas productivas y de fertilidad posterior

Porcentaje

de vacas

sobre punto

de corte

Analito

(mmol/L)

Días de

muestreo

referido al parto

Alteración Magnitud

≥ 15* NEFA ≥0,3 -3 a -14 Cetosis o DA 3,6 veces

≥ 15* NEFA ≥0,3 -3 a -14 Prod leche 305 días -282 kg/vaca/rebaño

≥ 15* NEFA ≥ 0,6 +3 a +14 Prod leche 305 días -288 kg/vaca/rebaño

≥15* BHB ≥ 1,2 +3 a +14 Prod leche 305 días -534 kg/vaca/rebaño

≥15* NEFA ≥0,3 -3 a -14 % preñez 70 días -1,2 veces

≥15* NEFA ≥ 0,7 +3 a +14 % preñez 70 días -0,9 veces

≥30** NEFA≥ 0,5 -1 a -7 Prod leche 1º control -3 kg/d/vaca

≥15** BHB ≥0,8 -1 a -7 Prod leche 1º control -4,4 kg/d/vaca

≥30** NEFA ≥ 1,0 +1 a +7 Preñez 1º servicio 0,6 Odds Ratio Datos de: *Ospina et al. (2013); **Chapinal et al. (2012)

El número de animales a muestrear varía acorde la precisión y exactitud deseada y de la

técnica analítica usada, la prevalencia esperada y el número de animales en riesgo. Así para

NEFA y BHB en un rebaño de 1000 vacas con 3 a 4 partos diarios, que tendría ±35 vacas en

riesgo, se deberían muestrear 14 vacas (con IC de 75% y error de ±10). Actualmente

aconsejan usar esta técnica determinando cada 2 semanas BHB en 20 vacas de 3 a 14 días

posparto (ejemplo de rebaño de 1000 vacas) y en caso de haber 15% a 40 % de positivas

(BHB ≥1,2 mmol/L), controlar todas las vacas en riesgo dos veces a la semana y tratar las

positivas con propileno-glicol, si la prevalencia es >40% se deben tratar todas las vacas en

riesgo desde el día 3 de lactancia por 5 días y continuar el monitoreo bisemanal.

Investigadores italianos (Bertoni et al 2013) enfatizan la importancia de centrar el uso de los

marcadores sanguíneos al periodo de transición. Para ello describen la utilidad de evaluar los

procesos inflamatorios que se presentan alrededor del parto mediante índices compuestos

basados en varios marcadores que denominan “Índice de funcionalidad hepática (LFI)”. Este

86

índice se obtiene de establecer los cambios en las concentraciones séricas de albumina,

colesterol y bilirrubina entre los días 3 a 28 posparto, para luego compararlo con un estándar

definido, obteniendo con ello una herramienta que permite medir la magnitud de la

inflamación en el periparto y su efecto en la producción, fertilidad y salud posterior de la

vaca.

Prospección diagnóstica

Constituye el enfoque tradicional de los PM descrito por Payne en los 1970 en UK, siendo a

la fecha la forma más utilizada en la evaluación de la condición metabólica de los rebaños

lecheros en Chile. En este examen se determinan varios analitos en muestras de sangre

obtenidas de uno o más grupos de vacas seleccionadas del rebaño y cuyos resultados se

comparan con sus respectivos IR. Se emplea como examen de aproximación diagnóstica para

evaluar el balance metabólico-nutricional e identificar los potenciales factores responsables

por la presentación de enfermedades. Este enfoque permite mayor flexibilidad para los

períodos de muestreo, siendo su limitante solo el costo de los análisis, situación superada en

la actualidad con el empleo de equipos de química clínica automatizados para análisis de

multi-analitos en corto tiempo en lotes de muestras y con bajo consumo de reactivos y costo.

El PM evalúa el balance o equilibrio metabólico, así como los cambios que se producen

durante el período de transición en la vaca, o de otros períodos críticos en grupos de animales.

La prueba tiene un enfoque amplio que incluye analitos que reflejan el balance de energía

(NEFA y BHB, colesterol), proteínas (urea y albúmina) y macro y micro minerales (Ca, P,

Mg, Na, Cu, Zn, Se). El panel de análisis es flexible pudiendo reducirse o ampliarse según

las circunstancias. Habitualmente se incluyen analitos para evaluar la condición de salud

hepática (AST, GMD, GGT) y actualmente se está avanzando en la incluir analitos asociados

a inflamación y bienestar animal (haptoglobina, globulinas).

La realización de un PM en un rebaño involucra cinco pasos: a) definir el objetivo que motiva

realizar el examen; b) definir los exámenes a solicitar, el o los grupos a ser muestreados y

obtener las muestras de los animales seleccionados; c) ejecutar los análisis requeridos; d)

obtener los resultados individuales y del grupo y comparar con IR y e) interpretar los

resultados.

87

Objetivo

El perfil metabólico fue diseñado con el propósito de monitorear la salud metabólica del

rebaño, identificar vacas metabólicamente superiores y contribuir a determinar las

alteraciones metabólicas y en general las enfermedades que afectan la producción.

Actualmente se considera que su objetivo es “obtener lo antes posible la opinión de un grupo

de animales sobre su condición metabólica nutricional y sanitaria”. Basado en este concepto

teórico general un PM está indicado cuando se pretende: a) evaluar y controlar el balance

metabólico de un grupo de animales acorde a sus ingresos (nutrición), circulación (capacidad

de movilización y regulación interna) y egresos (producción); b) diagnosticar la presencia de

trastornos metabólicos en un rebaño; c) establecer la presencia o ausencia de un factor

asociado a la presentación de enfermedades en el rebaño y d) Servir de instrumento de

evaluación metabólica en grupos de animales.

El PM no es un examen de evaluación de una dieta, sino como su nombre lo indica, de

evaluación del estado metabólico de un grupo de animales de un rebaño en respuesta a su

dieta. Se debe considerar que su correcta aplicación está determinada por la adecuada

selección de los animales muestreados y que es esencial integrar los resultados del PM con

la información obtenida a partir del análisis de los registros prediales. Bajo estas condiciones

es factible evaluar el estado nutricional del rebaño, detectar en forma temprana alteraciones

en su salud, identificar riesgos potenciales para la presentación de enfermedades y analizar

sus posibles causas orientando al médico veterinario en sus decisiones.

Considerando que el PM ha sido más utilizado en rebaños lecheros bovinos, los antecedentes

entregados a continuación hacen referencia mayormente a este tipo de animales,

empleándose en:

• Control del balance metabólico nutricional sanitario del rebaño.

• Sospecha de la presencia de trastorno metabólico de energía/proteínas en un grupo de

animales.

• Diagnóstico o evaluación de carencias minerales.

• Investigación de problemas de fertilidad, volumen o calidad de la producción de leche,

ganancia de peso en animales de carne.

• Evaluación de respuesta a intervenciones nutricionales.

88

Muestra

La muestra debe ser obtenida de grupos e individuos “representativos” de la población de

animales del rebaño. Es fundamental agrupar a los individuos en base a los factores

fisiológicos que afectan la concentración de los analitos a ser medidos, minimizando al

máximo las causas de variación de origen no nutricional. La selección de los animales acorde

con su etapa productiva permite observar tendencias, al asociar las concentraciones de los

componentes sanguíneos con la producción y comparar entre grupos en distintos estados

fisiológicos. El momento más apropiado para obtener las muestras es cuando los mecanismos

homeostáticos se encuentran fisiológicamente desafiados e inefectivos, siendo este el período

de transición que es coincidente con la mayor incidencia de enfermedades de la producción.

Por ello los grupos más analizados en un rebaño lechero son: a) vacas en transición pre-parto:

3 a 21 días preparto, idealmente 3 a 14 días; b) vacas en transición pos-parto: 3 a 30 días en

lactancia, idealmente 7 a 21 días y c) vacas en inicio de lactancia: 45 a 80 días de lactancia,

idealmente 50 a 70 días. De ellos con mayor frecuencia los veterinarios remiten muestras de

los grupos 1 y/o 2.

De cada grupo, independiente del tamaño, se seleccionan 6 a 14 individuos, comúnmente 8

vacas, de las cuales se obtendrán las muestras a analizar. En lecherías de gran tamaño se

recomienda sub dividir los grupos o bien obtener un número mayor de muestras por grupo.

Por ejemplo, con un lote de 200 vacas en lactancia se puede dividir en dos sub grupos por

producción o edad. De cada animal seleccionado se obtienen las muestras requeridas acorde

con los exámenes a solicitar. Habitualmente corresponden a muestras de sangre (±5 mL con

heparina y 5 mL para suero), las que deben ser obtenidas idealmente posterior al ordeño de

la mañana ya que las concentraciones de algunos metabolitos como BHB, urea, Pi varían

durante el día (Figura 3). Cuando el objetivo del PM es diagnosticar una enfermedad

subclínica, los animales seleccionados deben ser aquellos que se encuentran en riesgo de

presentar la enfermedad y aún no presentan signos clínicos. Para el diagnóstico de

enfermedades en que se presentan individuos con signos clínicos se requiere seleccionar

individuos que estén cursando con la enfermedad, pudiendo en este caso ser sólo 2 o 3

animales.

Junto a las muestras se debe completar una solicitud de examen que debe contener

información general del rebaño, motivo del examen, grupos de animales incluidos,

89

información de las vacas (producción, días respecto a parto, condición corporal, su manejo y

alimentación) y los análisis requeridos.

Figura 3. Variación diaria de las concentraciones plasmáticas (x ± EE) de ß-hidroxi-butirato, urea,

fosfato inorgánico (Pi) y triglicéridos en vacas lecheras a pastoreo (o) y suplementadas con

concentrado energético (■). (Noro et al., 2011)

Análisis

Los análisis que se realizan en el laboratorio cuantifican en las muestras los valores de los

analitos preseleccionados. La selección de los marcadores bioquímicos dependerá de los

requerimientos diagnósticos, las posibilidades de laboratorio, las muestras obtenidas y los

costos involucrados. Los analitos mayormente utilizados se presentan a continuación:

Energía (BHB, NEFA, glucosa, colesterol)

El BHB es un buen marcador de respuesta rápida del grado de síntesis de cuerpos cetónicos

asociado a la movilización de lípidos producto del BEN; es un analito de alta sensibilidad,

90

especialmente en vacas en lactancia, pero con limitada especificidad por la absorción de

butirato ruminal. El NEFA también es un marcador de respuesta rápida y específico para

movilización lipídica, siendo más sensible en vacas preparto, pero de costo analítico alto. Sus

concentraciones aumentan notoriamente con la movilización grasa de inicio de lactancia por

lo que se debe tener IR para pre y posparto. La glucemia es un marcador rápido del balance

de energía, pero de baja sensibilidad limitando su uso.

Junto a la obtención de la muestra se recomienda obtener la condición corporal (CC) de los

animales, que es un buen indicador de respuesta lenta del balance de energía, por lo que su

inclusión como analito en los resultados del PM amplía su utilidad. La colesterolemia es un

indicador de consumo de la ración y de aporte de fibra en la dieta, por lo que su

disminución se asocia a baja ingesta. Su concentración aumenta notoriamente con el

aumento de consumo en el posparto requiriéndose IR para pre y posparto.

Proteínas (urea y albúmina)

La uremia es un marcador de respuesta rápida, sensible y específico de la sincronía de la

proteína degradable (RDP) con la energía disponibles en el rumen (RDP:Eº). Su mayor

utilidad es en el diagnóstico de asincronía ruminal producto de una ingesta elevada de RDP

o escasa en energía, situaciones en que incrementa su concentración en sangre y asociado a

ello en la leche.

La albuminemia es un marcador de respuesta lenta (2 semanas) frente a una disminución en

la síntesis hepática de albúmina producto de carencias en la dieta o un desgaste por sostener

altas producciones lácteas. Su sensibilidad es limitada y su especificidad baja ya que otras

alteraciones orgánicas como la disfunción hepática cursan con hipoalbuminemia.

Minerales (Ca, Pi, Mg, Na, Cu, Zn, Se)

La calcemia es un analito de utilidad sólo frente a cuadros clínicos o subclínicos de

hipocalcemia, su intenso control hormonal tiende a mantener estable su concentración

sanguínea por lo que su sensibilidad para detectar desbalances nutricionales es baja, si bien

últimamente se ha descrito la importancia de controlar las hipocalcemias (Ca <2,0 mmol/L)

en el periodo de transición por su asociación con procesos inflamatorios al inicio de lactancia.

La fosfatemia es un marcador sensible y de respuesta rápida frente a situaciones de

91

desbalances nutricionales de P, siendo su especificidad limitada; a su vez, en muestras

antiguas o mantenidas en altas temperaturas sus concentraciones plasmáticas incrementan.

La magnesemia es un marcador sensible, específico y de respuesta rápida del balance

metabólico nutricional de Mg. La natremia es un analito de utilidad frente a desbalances

severos del Na, su control hormonal regula su concentración sanguínea, siendo por ello baja

su sensibilidad para detectar carencias nutricionales. La cupremia y zinquemia son

marcadores de respuesta lenta y de sensibilidad media frente a carencias de Cu y Zn además

este último es de baja especificidad. La determinación de la actividad sanguínea de GPx es

un marcador sensible y de respuesta lenta (1 mes) del balance metabólico nutricional de Se.

Salud y bienestar animal (globulinas, AST, GDH, GGT, hemoglobina, haptoglobina)

La globulinemia es un indicador de la presencia de cuadros infecciosos en el rebaño,

encontrándose aumentada en animales con mastitis, metritis y pododermatitis, entre otras

causas. Las actividades sanguíneas de las enzimas aspartato transaminasa (AST), glutamato

deshidrogenasa (GDH) y gama-glutamil transferasa (GGT) son marcadores de sensibilidad

moderada de daño hepático en cuyo caso se encuentran aumentadas. La hemoglobinemia es

un indicador sensible del estado general de salud de los animales y por ende de su bienestar,

ya que cuadros de anemia se presentan en animales con carencias nutricionales crónica

(proteínas, Fe, Cu, Co), cuadros tóxicos (exceso de brassicas) o alteraciones orgánicas

(hepatopatías, infecciones crónicas). Actualmente se plantea la determinación de proteínas

de fase aguda como indicadores de bienestar animal, fundamentalmente la haptoglobina en

bovinos, ya que sus concentraciones aumentan fuertemente en respuesta a inflamación

independiente de su origen, infeccioso o traumático.

Informe de resultados

Para cada grupo de animales se construye un cuadro que incluye para cada uno de los analitos

evaluados los valores obtenidos de cada vaca seguido de los resultados del grupo que

corresponden a la media (X), desviación estándar (DE), valores de “H” y “CD” y los

porcentajes de animales sobre y bajo los IR. El valor “H” representa la diferencia entre el

valor promedio del grupo con el promedio de referencia, expresado en DE. Vale decir, indica

92

la diferencia entre la media del grupo en estudio con respecto a la media de referencia

expresado en desvíos estándar, de acuerdo a la siguiente fórmula:

H= ( x del grupo – x de referencia) / DE de referencia

Cuadro 5. Marcadores bioquímicos sanguíneos utilizados en perfiles metabólicos

Variable M Intervalo d referencia Valoración T

Energía

Condición corporal

(1 a 5)

- 2,5 a 4,0 puntos

Según estado fisiológico o = acumulación o movilización de

reservas grasas

C

ß-OH-butirato Su Preparto: < 0,5 mmol/L

Lactancia: < 1,0 mmol/L = mayor síntesis de cuerpos cetónicos por

carencia de energía

A

NEFA

Su Preparto <0,4 mmol/L

Lactancia < 0,6 mmol/L = movilización grasa por carencia de

energía

A

Colesterol

Su Preparto: 1,7 a 4,3 mmol/L

Lactancia: 2,7 a 5,3 mmol/L = carencia de energía – fibra

= exceso de grasa, alteración hepática.

C

Proteínas

Albúmina

Su 30 – 41 g/L = Ingesta o síntesis hepática disminuida C

Urea

Su 2,5 a 7,0 mmol/L = Ingesta limitada de RDP

= Asincronía ruminal de RDP/energía

(exceso RDP, falta de energía)

A

Mineral

Calcio

Su 2,0 – 2,6 mmol/L Paresia hipocalcémica

(sensibilidad baja)

A

Fosfato

Su 1,1 – 2,3 mmol/L Deficiencia de P

(especificidad baja)

C

Magnesio

Su 0,7 – 1,1 mmol/L Hipomagnesemia A

Sodio

Su 134 – 154 mmol/L Carencia de Na C

Cobre Pl 10 – 22 µmol/L Carencia de Cu C

Zinc Su 8 – 24 µmol/L Carencia de Zn C

Selenio (GPx) Sa >130 U/g Hb Carencia de Se C

Salud y bienestar animal

Hemoglobina Sa 90 -125 g/L = Anemia C

AST Su < 110 U/L = Daño hepatocelular o muscular A

GDH Su < 30 U/L = Daño hepato-celular A

GGT Su < 40 U/L = Daño hepato-canalicular C

Globulinas Su < 50 g/L = Infección (bienestar animal) C

Haptoglobina Su - = Inflamación (bienestar animal) A

M: muestra, Su= suero, Pl=plasma, Sa=sangre; T= tiempo de respuesta: A= agudo; C= crónico

93

El “CD” o coeficiente de dispersión, compara la magnitud de la varianza de los valores

individuales del grupo con relación a la varianza de la población de referencia. En el Cuadro

6 se presenta como ejemplo un informe de resultado de un PM realizado a un grupo de 8

vacas en el cual se entregan los resultados de 9 analitos, además de la información de su

producción lechera y la condición corporal (CC).

Cuadro 6. Perfil metabólico de un grupo de vacas Holstein, al inicio de lactancia

Una alternativa, destinada a reducir el costo de análisis, es mezclar en volúmenes iguales, las

muestras de suero o plasma de las vacas de cada grupo, comúnmente 1 mL de cada muestra,

obteniendo así solo “1 pool” de 8 o más mL en la cual se realizan los análisis

correspondientes. Su interpretación se realiza de forma similar empleando el valor del pool

en reemplazo de la media del grupo ya que equivale al valor de H. Se ha definido que se

pueden agrupar hasta 20 muestras en un “pool” logrado de este un valor equivalente a la

media del grupo. La probabilidad de tener individuos con valores alterados en el rebaño es <

a 10% si el valor de “H” así calculado es < 0,5. Con este sistema se simplifica el trabajo y se

reducen los costos, pero se pierde la información referida a la varianza entre los individuos

del grupo, además de haber una pérdida de sensibilidad diagnóstica con el riesgo de no

identificar rebaños en riesgo.

94

Interpretación

Evaluar la condición metabólica y sanitaria de un grupo de animales constituye uno de los

aspectos más importantes y difíciles de realizar en el PM, requiriendo para ello tener un

adecuado conocimiento de los mecanismos fisiológicos y nutricionales que afectan la

concentración sanguínea de cada metabolito. Para la correcta interpretación de un PM se

requiere considerar el objetivo por el cual fue solicitado y las posibles causas de variación de

un analito: a) fisiológicas (preñez, lactancia, ambiente); b) analíticas (errores de muestra y

metrológicos) y patológicas (desbalances metabólicos nutricionales y sanitarios). Si el PM

considera más de un grupo se debe analizar primeramente los resultados de cada grupo

ordenados acorde con su estado productivo, transición preparto – transición posparto - inicio

de lactancia, y luego relacionarlos entre ellos.

La interpretación se basa en comparar la media y la dispersión de los datos (DE) de cada

variable, las que deben ser similares a las de la población de referencia que generó los IR.

Basado en ello se considera que el grupo es diferente a la población de referencia, por ende,

presenta una alteración cuando:

• El valor de “H” es mayor a 2 (positivo o negativo), lo que indica que la media del analito

difiere en más de ±2 DE a la media poblacional, valor superior a 2 positivo cuando está

aumentado o negativo cuando está disminuido.

• El valor de “CD” es mayor a 1, indica que la varianza entre los individuos del grupo es

mayor que la varianza de la población de referencia. Este hecho se asocia a un factor,

comúnmente de manejo, que provoca una diferencia no deseada entre los individuos del

grupo. También se aprecia cuando el porcentaje de individuos del grupo con valores sobre

a bajo el IR es mayor al 25%.

Los cambios en la concentración sanguínea de un marcador bioquímico son provocados no

solo por su balance de ingreso – egreso, sino también por otros nutrientes, existiendo una

relación entre ellos. Por ejemplo, el colesterol se asocia a la ingesta de materia seca, el ßHB

al uso de reservas de grasa y la urea a la relación RDP/energía en el rumen; por ello los tres

están asociados al balance de energía y mantienen se asocian entre ellos.

Cualquier alteración en los resultados del perfil metabólico debe ser analizada considerando

la estación del año, grupo (s) de animales afectados y las posibles causas que pueden provocar

variaciones en la concentración sanguínea de un analito. Información sumaria de la

95

valoración diagnóstica de los analitos utilizados en el PM se presenta en el Cuadro 5. El PM

del grupo de 8 vacas Holstein, al inicio de lactancia presentado en el Cuadro 6 corresponde

a un rebaño a pastoreo de praderas naturalizadas y suplementadas con 4 kg/d de concentrado

y que presenta índices reproductivos bajo lo esperado. De su análisis se aprecia que es un

grupo homogéneo, con adecuada condición corporal, pero con un fuerte balance negativo de

energía, BEN, (BHB =1,0 mmol/L, H =4,3) y asincronía ruminal de proteínas:energía (urea

= 9,7 mmol/L, H= 4,4). El balance mineral es adecuado y la condición general de salud del

rebaño no evidencia alteraciones trascendentes, si bien hay 2 posibles casos de lipidosis

hepática (GMD > 30 U/L) asociados al BEN y una vaca cursa un cuadro infeccioso crónico

con anemia (globulinas >52 g/L y hemoglobina < 90 g/L) que explican sus elevados valores

del CD del grupo.

El veterinario a cargo del rebaño debe juzgar la trascendencia de las alteraciones detectadas

en función de la magnitud del cambio y los antecedentes del rebaño, fundamentalmente

sanitarios, nutricionales, de producción y manejo. El empleo de los PM en el sur de Chile ha

permitido en numerosas oportunidades que el ganadero o el nutricionista, asesorado por el

médico veterinario, adopte las medidas correctivas que han permitido prevenir o superar

problemas productivos, de fertilidad y sanitarios en muchos rebaños. Es así que entre los años

1986 y 2010 se realizaron un promedio de 129 PM anuales en grupos de vacas lecheras

preparto e inicios de lactancia, en los cuales las alteraciones mayormente diagnosticadas

fueron: BEN, asincronía ruminal de proteínas degradables/energía, hiperfosfatemia,

hiponatremia, y carencia de selenio (Figura 4), con excepción de esta última, que disminuyó

durante el último decenio, las restantes aumentaron fuertemente en dicho período.

96

Figura 4. Porcentaje de rebaños con alteraciones metabólicas diagnosticadas mediante

perfiles metabólicos realizados en el sur de Chile a 3.216 grupos de vacas preparto e inicio

de lactancia

(Weschenfelder et al., 2010*; Noro et al., 2011**; Wagemann et al., 2014**)

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0 5 10 15 20 25 30 35

Daño hepático ( ↑AST o GGT)*

Carencia Se (↓GPx)***

Hipomagnesemia***

Hiperfosfatemia***

Hipocalcemia***

BEN (↑ßOHB)*

Porcentaje de rebaños

Lactancia Preparto

97

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98

Variações na qualidade composicional do leite no Rio Grande do Sul

Carlos Bondan

A produção brasileira de lácteos cresceu 57,5% de 2005 a 2015 e mesmo assim, a balança

comercial encontra-se historicamente deficitária. A melhoria do poder aquisitivo da

população brasileira tem contribuído para o aumento do consumo e a manutenção de preços

atraentes ao produtor, o que estimula o crescimento do setor lácteo no Brasil (Montoya et al.,

2014). Segundo o IBGE (2013) o Rio Grande do Sul (RS) está na segunda posição na

produção de leite, depois de Minas Gerais, e ocupa a primeira posição na produtividade entre

os estados brasileiros. Em 2012, a média de produção no RS foi 2.670 L/vaca/ano, bem acima

da média brasileira (1.417 L/vaca/ano). Segundo Montoya et al (2014) no período de 2001 a

2012 a produção no Rio Grande do Sul cresceu 82,24%, o número de vacas ordenhadas

aumentou 25,9% e a produtividade aumentou 44,7%, sendo um indicador da

profissionalização da produção leiteira no estado. O leite é um dos alimentos mais ricos

encontrados na natureza, composto por mais de 100.000 moléculas que colaboram com a

nutrição e a imunidade dos mamíferos, servindo também como matéria prima para

industrialização, possibilitando a produção de inúmeros derivados que servem como

alimento para todas as faixas etárias dos humanos (Bachman, 1992).

A glândula mamária tem um incrível nível de organização e uma notável capacidade de

converter nutrientes presentes na circulação sanguínea em componentes do leite. Sua síntese

necessita de intenso trabalho metabólico e sua composição é influenciada pela espécie, raça,

alimentação, estágio de lactação e estado sanitário das fêmeas. Nos bovinos, espécie mais

utilizada na exploração leiteira devido ao volume de leite produzido, a síntese de 1 L de leite

demanda aproximadamente 450 L de sangue, que ao percorrerem o tecido mamário,

entregam nutrientes para a síntese láctea (González, 2001).

A composição química do leite pode ser dividida em constituintes principais e secundários.

Como constituintes principais têm a água, gordura, proteínas e lactose e os secundários os

minerais, vitaminas, enzimas, além de células de descamação do epitélio mamário e

leucócitos (Dürr et al., 2000). O acompanhamento da composição do leite é importante para

a avaliação da dieta e do metabolismo das vacas em lactação, classificação do leite pelo seu

99

valor como matéria prima para a indústria processadora e verificação da integridade do leite

quanto à adição ou retirada de componentes (Dürr et al., 2001).

Sólidos não gordurosos (SNG)

A nutrição da vaca tem efeito marcante sobre a composição do leite, principalmente, no teor

de gordura. O valor de SNG do leite é composto por proteínas, lactose e minerais, e pode

variar em função de mudanças na dieta, porém em menor intensidade do que a gordura.

Outros fatores que influenciam o valor de SNG são a genética, as doenças, estádios de

lactação e as estações do ano. Mudanças que ocorrem no valor de SNG do leite são

primariamente devidas às mudanças na proteína e ocasionalmente ao teor de lactose. O

fornecimento de proteína na dieta, além do requerido conforme o NRC (2001) parece não

exercer efeito sobre o teor de SNG. Entretanto, o fornecimento extra de energia para vacas

de alta produção pode aumentar o valor de SNG em torno de 0,2%. Por outro lado, a redução

no suprimento energético para níveis inferiores aos recomendados pode resultar em queda de

0,2 a 0,5%. Adição de fontes de gordura (animal-vegetal) na dieta tem apresentado resultados

variados no valor de SNG.

Proteína

Atualmente a proteína é o nutriente mais valorizado nos atuais sistemas de pagamento por

qualidade do leite, sendo a caseína seu principal componente. Depois da gordura, a proteína

é o componente que mais varia em função de fatores ambientais, incluídos os nutricionais.

Contudo, o potencial de alteração do teor de proteína no leite através da nutrição não é muito

grande (em torno de 0,5%). Entretanto, à medida que aumenta o teor de proteína no leite,

como a melhoria na energia da dieta, geralmente aumenta a produção total, o que não ocorre

com a gordura (Carvalho, 2002).

As proteínas do leite (caseínas e lactoglobulinas) são sintetizadas nas células secretoras da

glândula mamária a partir de aminoácidos provenientes do sangue ou transportados do

sangue. No entanto, alguns aminoácidos podem ser sintetizados na própria glândula mamária,

através da utilização de precursores como a glicose, acetato e outros aminoácidos. A estrutura

da proteína é determinada pela informação genética contida no DNA da célula, servindo de

molde para uma fita de RNA, que contém a informação sobre a sequência de aminoácidos

100

para síntese das proteínas (Bequete et al., 1998). A síntese das proteínas ocorre no retículo

endoplasmático rugoso, sendo posteriormente secretadas para o lúmen das células através de

vacúolos. A caseína constitui de 76 a 86% do total de proteína láctea, sendo o componente

determinante do rendimento industrial na produção de queijo. É sintetizada pelas células

secretoras, como resultado da expressão de quatro genes (dois genes para α-caseína, s1 e s2;

um para β-caseína e um para κ-caseína), sendo secretada na forma de micelas, que são

grupamentos de várias moléculas de caseína ligadas a íons como o fosfato e o cálcio, e se

encontram em suspensão no leite (De Peters & Cant, 1992).

Ao contrário das caseínas, as proteínas do soro do leite, são aquelas em solução, produzidas

na glândula mamária (α-lactalbumina e β-lactoglobulina) e uma pequena porcentagem de

proteínas que podem passar diretamente do sangue para a glândula mamária (albumina sérica

e imunoglobulinas). O leite possui ainda uma fração de nitrogênio-não-proteico (NNP),

constituindo cerca de 5% da proteína bruta do leite, composto principalmente de ureia, cerca

de 48%, e em menor quantidade de creatinina, amônia e outros compostos nitrogenados (De

Peters & Cant, 1992). Uma equação para predizer a porcentagem de proteína verdadeira no

leite foi proposta pelo NRC (2001), sendo 93% do valor de proteína bruta do leite.

De forma geral, as estratégias nutricionais que visam o aumento da proteína do leite devem

ter como princípio o maior suprimento de aminoácidos e energia (glicose) para a glândula

mamária. A utilização de aminoácidos pela glândula mamária é dependente de uma série de

fatores como, irrigação sanguínea da glândula mamária, concentração arterial de

aminoácidos, eficiência no transporte e regulação intracelular das vias metabólicas (Bequette

et al., 1998). Segundo Murphy & O’Mara (1993), a limitação da produção de proteína pela

glândula mamária é devida principalmente aos seguintes aminoácidos: metionina, lisina,

fenilalanina, histidina ou treonina. O aumento no fornecimento de aminoácidos para a

glândula mamária pode ser obtido através do aumento na quantidade de aminoácidos que

chegam ao intestino delgado (proteína microbiana e proteína não degradada no rúmen),

resultando em maior quantidade de aminoácidos absorvidos e disponíveis. Aminoácidos

resultantes da mobilização proteica (endógena) também colaboram para esse pool. De forma

geral, lisina e metionina são consideradas aminoácidos limitantes.

O teor de proteína bruta da dieta possui efeito muito pequeno sobre o teor proteico do leite.

No entanto, o fornecimento de dietas com deficiências de proteína pode reduzir a

101

concentração deste nutriente em 0,1 a 0,2 unidades percentuais (Sutton, 1989), além de

limitar a produção de leite. Pode-se dizer que a variação no teor proteico da dieta afeta muito

mais a produção de leite do que sua composição.

Lactose

A lactose é um dissacarídeo formado por glicose e galactose com união α 1-4 e sintetizada

exclusivamente na glândula mamária ativa. A síntese é realizada no aparelho de Golgi das

células do epitélio mamário. As moléculas precursoras, glicose e galactose, provêm

principalmente da glicose sanguínea ou de substâncias rapidamente conversíveis em glicose,

através da via gliconeogênica como o propionato, o piruvato, o oxalacetato e os aminoácidos.

Metade da glicose que chega à glândula mamária é direcionada para a síntese de lactose, e a

outra metade para a formação de glicerol, necessário para a síntese dos triglicerídeos do leite

(González & Silva, 2006).

No leite dos bovinos, a lactose apresenta concentração de 4,6% e é considerado o constituinte

mais constante. Sua função está relacionada com a manutenção da osmolaridade e com os

processos de produção e secreção do leite (Larson, 1995). A lactose corresponde por

aproximadamente 50% da capacidade de atração de água para o interior do alvéolo mamário,

sendo responsável por sustentar a produção de leite. Essa é, provavelmente, a razão de ser o

componente com a menor variação (González et al., 2011).

Embora se considere que a lactose é o componente lácteo que apresenta menor variação,

trabalhos anteriores realizados no Brasil revelam diferenças significativas em relação a

variáveis ambientais. Fatores que rompem o equilíbrio metabólico da glândula mamária tais

como a mastite, podem diminuir o conteúdo de lactose no leite (González et al., 2011).

Assim, deve se esperar que aumentos na CCS estejam relacionados com menor teor de

lactose.

Segundo Hurley (2004) a lactose é relativamente insensível às mudanças na dieta das vacas,

no entanto, vacas subnutridas apresentam redução na produção de leite e na percentagem de

lactose, sendo que estes sintomas são revertidos quando dietas adequadas são fornecidas. Em

situações de balanço energético negativo (cetose), principalmente no pré ou pós-parto

imediato, em que não há pico de lactação, há diminuição no teor de lactose. A sua produção

no úbere está relacionada à produção de propionato no rúmen e disponibilidade de produtos

102

gliconeogênicos. Quanto mais lactose for produzida, maior é o volume de água arrastado para

dentro do alvéolo, aumentando o volume de leite (Mühlbach, 2003).

Existem também relatos de que a baixa relação forragem:concentrado na dieta pode aumentar

a lactose do leite e que a elevada suplementação com gorduras pode causar diminuição

(Sutton, 1989). Embora estas mudanças sejam estatisticamente significativas, elas são tão

pequenas que a lactose do leite não pode ser usada como um valor prático indicador do

“status” nutricional do animal.

Gordura

O componente lipídico do leite é formado por uma complexa mistura, sendo os triglicerídeos

os mais importantes. Estes são compostos de três ácidos graxos em ligação covalente a uma

molécula de glicerol por pontes de éster. A gordura do leite é secretada das células mamárias

na forma de glóbulos graxos, principalmente compostos de triglicerídeos rodeados de uma

dupla camada lipídica similar à membrana apical da célula epitelial. A fração de gordura do

leite serve de veículo para as vitaminas lipossolúveis (A, D, E, K), colesterol e outras

substâncias solúveis em gordura, como os carotenoides (provitamina A), que dão ao leite sua

cor amarelo-creme. A quantidade e a composição dos triglicerídeos do leite variam muito

entre as espécies. Nos ruminantes, a proporção de ácidos graxos de cadeia curta e insaturados

é bem maior que nos monogástricos (González et al., 2001; González & Silva, 2006).

Os ácidos graxos do leite são oriundos de duas fontes, da síntese “do novo” na glândula

mamária e da captação direta na circulação sanguínea. Ácidos graxos de cadeia curta,

contendo entre 4 e 8 carbonos, e de cadeia média, com 10 a 14 carbonos, provêm quase que

exclusivamente da síntese “do novo”. Os ácidos graxos de cadeia longa, constituídos por

cadeias superiores a 16 carbonos, são derivados da captação direta dos lipídios da corrente

sanguínea pela glândula mamária. Os ácidos graxos com 16 carbonos podem ser obtidos

através das duas fontes. Cerca de metade dos ácidos graxos do leite são sintetizados pela

própria glândula mamária, a partir da síntese “de novo”. Esta via utiliza como principal fonte

de carbono o acetato produzido na fermentação ruminal. Outra fonte para a síntese “de novo”

é o β-hidroxibutirato produzido pelo epitélio ruminal, a partir do butirato. Os ácidos graxos

pré-formados captados pela glândula mamária e diretamente usados para a síntese de gordura

do leite são derivados das lipoproteínas circulantes provenientes da mobilização de reservas

103

corporais e dos ácidos graxos não esterificados originários da absorção dos lipídios no trato

gastrointestinal. Em condições normais, a lipólise é responsável por menos de 10% dos

ácidos graxos da gordura do leite, sendo a maior parte dos ácidos graxos de cadeia longa

(AGCL) do leite proveniente da absorção intestinal. No entanto, animais em balanço

energético negativo, com grande mobilização de gordura corporal, têm a lipólise como fonte

de uma maior contribuição de gordura do leite (Bauman & Griinari, 2003).

A gordura é o principal componente energético do leite, sendo também responsável pelas

propriedades físicas às características industriais, e as qualidades organolépticas do leite e

seus derivados, por isso, a gordura láctea possui um importante valor econômico (Bauman &

Griinari, 2003).

No Brasil, ainda persiste o pagamento do leite pela produção total e o teor de gordura. Nos

últimos anos, diversos países têm dado maior ênfase para o teor de proteína, utilizando este

critério nos sistemas de pagamento por qualidade. Esta tendência se explica porque, enquanto

a gordura tem tido seu valor reduzido pelos hábitos de consumo da população, a proteína tem

sido valorizada por ser determinante do rendimento industrial de derivados lácteos

(Monardes, 1998). No Brasil a IN 51/2002 estabelece que o limite mínimo para a gordura no

leite cru refrigerado deve ser de 3%.

Vários aspectos exercem efeito sobre a concentração de gordura no leite. O fator racial e a

seleção genética, o estágio de lactação, a temperatura ambiente e as condições de estresse do

animal, a perda de condição corporal, a estação do ano, a contagem de células somáticas, a

saúde geral do animal, a manifestação de cio, a frequência e a técnica de ordenha e,

principalmente, os fatores nutricionais têm sido implicados como fatores que contribuem

com a variação da constituição lipídica do leite (González & Campos, 2003; Noro et al.,

2006; Barbano, 1990; Carvalho, 2002; Ribas et al., 2001; Marques et al., 2002).

Em ruminantes, a composição dos ácidos graxos da dieta não reflete a composição dos ácidos

graxos da gordura do leite, devido a que os constituintes lipídicos da dieta são alterados pelo

metabolismo microbiano (Bauman & Griinari, 2003). Os fatores nutricionais são os que

podem alterar de forma mais direta e com resultados mais rápidos e evidentes a gordura do

leite. No entanto, a manipulação da dieta visando alterações na gordura do leite demanda

conhecimento aprofundado, uma vez que esta manipulação afeta não somente a fermentação

ruminal, como também o metabolismo geral do animal (Mühlbach, 2003).

104

A alimentação fornecida para as vacas leiteiras influencia o funcionamento normal do rúmen.

Para manter a ruminação e a consequente produção de saliva, a dieta deve apresentar uma

relação mínima de volumoso/concentrado de 50/50 para manutenção de um pH adequado,

acima de 6,0, quando a fermentação da fibra é favorecida, propiciando uma maior ingestão

de matéria seca e, consequentemente, maior produção de leite. A efetividade da fibra

utilizada também deve ser levada em conta, o que se reflete diretamente na condição ruminal

e na gordura do leite. A fibra efetiva atua estimulando a ruminação e a produção de saliva, o

que mantém o pH favorável para a digestão da fibra, resultando em maior disponibilidade de

ácido acético, o principal precursor da gordura no leite (Mühlbach, 2003).

O fornecimento de grandes quantidades de carboidratos prontamente fermentáveis e reduzida

quantidade de fibra, ou dietas com quantidade adequada de fibra, mas com fibra de pouca

efetividade, possuem pouca capacidade de manutenção do funcionamento normal do rúmen,

podendo assim, levar a depressão na gordura do leite (Bauman & Griinari, 2003). Quando o

consumo de concentrados ultrapassa 50% da matéria seca da dieta, ocorre depressão na

gordura do leite e mudanças também na composição dos ácidos graxos (Palmquist et al.,

1993).

A suplementação com óleos poli-insaturados, provenientes de fontes vegetais ou marinhas,

também reduzem a gordura do leite. O mesmo ocorre quando sementes de oleaginosas, ricas

em ácidos graxos poli-insaturados, são adicionadas em grande quantidade à dieta (Bauman

& Griinari, 2003). Griinari et al. (1998), confirmaram que dietas pobres em fibra e ricas em

ácidos graxos insaturados (óleo de milho) aumentam o conteúdo de C18:1 trans. Segundo

estes mesmos autores, este tipo de dieta está associado a uma diminuição significativa na

produção e conteúdo da gordura do leite.

A utilização de aditivos também interfere na síntese de gordura. É o caso dos tamponantes e

alcalinizantes que minimizam a queda do pH ruminal, favorecendo a digestão da fibra, e dos

manipuladores de fermentação (ionóforos) que alteram o perfil dos ácidos graxos voláteis

(AGV) no rúmen, reduzindo perdas com metano e gás carbônico e diminuindo a relação

acetato/propionato.

Em dietas com grandes quantidades de concentrados (acima de 50% da matéria seca), ou

grandes quantidades de alimentos fermentados, recomenda-se o uso de bicarbonato de sódio

ou suplementos minerais tamponantes para normalizar o ambiente ruminal e,

105

consequentemente, o teor de gordura do leite. Nestes casos, a ação dos tamponantes

alimentares compensa a menor ruminação, que por sua vez proporciona uma menor taxa de

salivação e tamponamento natural do rúmen. Como o bicarbonato de sódio é de curta ação

no rúmen, aditivos probióticos, como cepas específicas de leveduras vivas (Saccharomyces

cerevisiae) vêm sendo utilizadas como complemento aos sais tamponantes. Em face de sua

ação metabólica mais prolongada no rúmen, a levedura promove uma maior estabilidade do

rúmen, mantendo o ambiente ruminal mais favorável à digestão da celulose por elevar a

densidade populacional das bactérias celulolíticas e consumidoras de lactato (Mühlbach,

2003).

A adição de monensina à dieta de vacas leiteiras diminuiu a produção de metano e a ingestão

de matéria seca. A gordura total e a percentagem de gordura diminuíram temporariamente.

No entanto, a produção de leite e a quantidade de todos os ácidos graxos insaturados

aumentaram, incluindo o ácido linoleico conjugado (CLA), enquanto os saturados

diminuíram.

Várias teorias têm sido propostas na tentativa de se explicar a depressão da gordura do leite,

sendo a base para o desenvolvimento de todas as teorias os processos microbianos no rúmen

(Bauman & Griinari, 2003). Das diversas teorias propostas, três delas continuam tendo

suporte na literatura científica. A primeira delas sugere que o maior fornecimento de

concentrado na dieta, com elevação da proporção concentrado/volumoso, aumenta a

produção de ácidos no rúmen, o que promove a queda do pH ruminal. Em pH baixo, a

degradação da fibra é comprometida, promovendo alterações na fermentação ruminal,

resultando em inadequada produção de acetato e butirato, limitando sua utilização na síntese

da gordura do leite. Bauman & Griinari (2003) concluem que a variação na concentração de

gordura do leite é justificada pelas variações na proporção molar de AGV no rúmen. Em

outros estudos, observou-se que a produção de acetato não foi afetada significativamente, no

entanto, a relação molar de acetato/propionato do fluido ruminal apresentou forte queda. Essa

queda na relação acetato/propionato foi proporcionada, principalmente, pela elevação na

produção de propionato e não pela queda na produção de acetato (Bauman et al., 1971).

Apesar das evidencias de que em dietas com baixa fibra a produção de acetato e butirato não

são afetadas de forma apreciável, um déficit desses AGV é frequentemente considerada como

colaborador na redução da gordura do leite. Isto pode ser atribuído ao fato de que dietas com

106

baixa fibra normalmente reduzem o pH e isto afetará a taxa relativa de absorção individual

de ácidos graxos voláteis (Bauman & Griinari, 2003).

A segunda teoria ou teoria glicogênica-insulina é baseada na competição por nutrientes, entre

a glândula mamária e outros tecidos. Dietas com baixa fibra resultam em aumento da

produção de propionato no rúmen e elevação da taxa de gliconeogênese hepática. Além disto,

estas dietas resultam em melhor balanço energético devido a maior ingestão de energia e

redução na secreção da gordura do leite. Como consequência dessa combinação de fatores, a

concentração de insulina no sangue é aumentada, desviando nutrientes da glândula mamária.

Isto ocorre porque a insulina aumenta a utilização de acetato, β-hidroxibutirato e AGCL no

tecido adiposo, ou seja, há um aumento da lipogênese. Além disso, a insulina também reduz

a mobilização dos AGCL das reservas corporais. A teoria glicogênica tem sido avaliada por

meio de infusões exógenas de propionato e glicose. Os resultados encontrados de redução na

gordura do leite têm se mostrado altamente variáveis, entre 0 e 14% (Bauman & Griinari,

2003).

A terceira teoria é a que, na última década, tem recebido maior suporte dos pesquisadores.

Esta teoria sugere que certas dietas alteram a biohidrogenação dos ácidos graxos insaturados

no rúmen, produzindo ácido graxo intermediário denominado de ácido linoleico conjugado

(CLA) trans-10, cis-12. Estes AGCL teriam uma potente ação inibidora da síntese de gordura

no leite (Bauman & Griinari, 2003). O CLA trans-10, cis-12 diminui a capacidade lipogênica

da glândula mamária (taxas de incorporação de acetato em ácidos graxos) e a expressão de

genes de enzimas relacionadas ao transporte de ácidos graxos circulantes, diminui a síntese

“de novo” de ácidos graxos, a dessaturação de ácidos graxos e a formação de triglicerídeos.

Contagem de células somáticas (CCS)

Células somáticas são todas as células presentes no leite, que incluem as células originárias

da corrente sanguínea como leucócitos e células de descamação do epitélio glandular

secretor. Em casos de inflamação (mastite), há um aumento considerável na CCS,

principalmente por neutrófilos. É importante quantificar e qualificar os tipos celulares

presentes para conhecer o grau de inflamação e caracterizar se a doença é aguda ou crônica.

Além do aumento do número de células, a mastite provoca alterações nos três principais

componentes do leite, gordura, proteína e lactose. A extensão do aumento da CCS e as

107

mudanças na composição do leite estão diretamente relacionadas com a superfície do tecido

mamário atingido pela reação inflamatória. Portanto, há uma relação direta entre a CCS e a

concentração dos componentes do leite. Em relação às proteínas ocorre uma redução

naquelas sintetizadas na glândula mamária (α e β caseína, α-lactalbumina e β-lactoglobulina)

e aumento das proteínas de origem sanguínea (albumina sérica e imunoglobulinas), em

virtude do aumento de permeabilidade vascular secundário ao processo inflamatório. A

proteína total do leite tem pouca variação, mas a concentração de cada tipo de proteína varia

acentuadamente (Ribas, 1999).

A CCS no leite é uma ferramenta valiosa na avaliação e estimativa das perdas quantitativas

e qualitativas da produção do leite e derivados, como indicativo da quantidade do leite

produzido na propriedade e para estabelecer medidas de prevenção e controle da mastite.

Uma dessas medidas pode ser a implantação de protocolos de manejo de ordenha. Como

consequência de altos níveis de células somáticas, observam-se prejuízos tanto ao produtor

de leite quanto à indústria de laticínios. As maiores perdas causadas ao produtor estão

relacionadas à redução da produção. Consequentemente, esta redução gera problemas de

captação da matéria-prima para a indústria (Fonseca & Santos, 2000). As perdas sofridas pela

indústria são causadas pelas alterações químicas e microbiológicas do leite com alta CCS,

acarretando em diminuição do rendimento industrial e redução de sua qualidade final

(Fonseca & Santos, 2000).

Nas condições brasileiras, considera-se que, em animais sadios, a CCS individual no leite

deve ser menor de 300x103/mL (Fonseca & Santos, 2000), mas em países com maior

desenvolvimento esse limite chega a 200x103/mL (Philpot, 1998). A contagem de células

somáticas de tanque (CCST) possui limites legais maiores, sendo de 400x103/mL em países

da União Europeia e Austrália, de 500x103/mL no Canadá e de 750x103/mL nos EUA (Brito,

2003). No Brasil, a determinação legal para CCST (Instrução Normativa 62/2011) é de

500x103/mL, valor que deve diminuir para 400x103/mL a partir de primeiro de julho de 2016.

Variação da produção e composição do leite no Rio Grande do Sul

Para compreender os fatores que influenciam a produção e a composição do leite produzido

no Rio Grande do Sul foi realizado um estudo em 115 fazendas leiteiras que ordenhavam

vacas da raça Holandesa e realizavam controle leiteiro no período de janeiro de 2008 a

108

dezembro de 2013. Os efeitos do ano, das estações do ano, das etapas da lactação e do número

de lactações foram comparados com as variáveis: produção e composição do leite. A

produção média de leite no período foi de 25,54 ± 8,63 L/vaca/dia, superior às médias

brasileiras (4,64 L/vaca/dia), catarinenses (8,26 L/vaca/dia) e gaúchas (8,75 L/vaca/dia)

considerando lactações de 305 dias (Montoya et al., 2014) e superiores às produções das

vacas de raça Holandês descritas por Noro et al. (2006) no Rio Grande do Sul (19,36

L/vaca/dia), Nunes Jr et al. (2000) em Pernambuco (16,7 L/vaca/dia), Araújo et al. (2000)

em Minas Gerais (17,02 L/vaca/dia) e Bajaluk et al. (1999) no Paraná (24,77 L/vaca/dia).

Costa et al. (2013) estudaram a produção de leite em 24 rebanhos na região dos Campos

Gerais no estado do Paraná no período de janeiro de 2010 a dezembro de 2012 e encontraram

produção média de 30,9 ± 3,7 L/vaca/dia. Estas diferenças de produtividades estão

relacionadas com o balaço nutricional, características raciais e genéticas, assim como as

condições ambientais (Dürr et al., 2011). O efeito ano do ano sobre a produção e composição

láctea está apresentado na Tabela 1. Entre 2008 e 2010 ocorreu diminuição da produção

acompanhada pelo aumento do escore de células somáticas (ECS). Houve crescimento

progressivo da produção de leite de 2010 a 2013 em 8,20% enquanto e diminuição do ECS.

A gordura e os sólidos totais aumentaram progressivamente entre 2008 e 2013. Em 2010

foram observados os maiores níveis de gordura e sólidos totais, e nos anos de 2011 e 2012

não apresentaram diferenças entre si, sendo superiores aos anos anteriores. O maior

percentual de gordura e sólidos totais ocorreu em 2013. A proteína apresentou tendência de

aumento entre 2008 e 2013. O percentual de lactose foi maior em 2013. Nos anos de 2010,

2011 e 2012 não houve diferença nos percentuais de lactose e 2008 e 2009 apresentaram os

menores percentuais, respectivamente.

O aumento da produtividade e da composição química pode ser explicado pela relação preço

do leite e custo dos fatores de produção. O valor praticado na compra do leite cru no período

foi historicamente maior quando comparado ao custo de produção, tornando atrativos os

investimentos que melhoraram o desempenho produtivo das vacas (Montoya et al., 2014).

109

Tabela 1. Médias anuais (± desvio padrão) de produção, composição química e ECS entre o período de

janeiro de 2008 a dezembro de 2013 no Rio Grande do Sul

Ano Produção

(L/vaca/dia)

Gordura

(%)

Proteína

(%)

Lactose

(%)

Sólidos

totais (%) ECS#

2008 26,2 ± 9,08b 3,37 ± 0,65d 3,18 ± 0,38d 4,43 ± 0,25c 11,9 ± 0,94d 4,95 ± 2,01e

2009 25,2 ± 8,41d 3,38 ± 0,66d 3,17 ± 0,37e 4,41 ± 0,26d 11,9 ± 0,94d 5,26 ± 1,87b

2010 24,6 ± 8,14f 3,40 ± 0,68c 3,23 ± 0,35c 4,46 ± 0,25b 12,1 ± 1,02c 5,45 ± 1,61a

2011 25,0 ± 8,21e 3,50 ± 0,67b 3,26 ± 0,37b 4,46 ± 0,25b 12,2 ± 1,01b 5,30 ± 1,61b

2012 25,5 ± 8,53c 3,50 ± 0,69b 3,28 ± 0,39a 4,46 ± 0,25b 12,2 ± 0,99b 5,14 ± 1,70d

2013 26,8 ± 8,63a 3,52 ± 0,67a 3,24 ± 0,38c 4,49 ± 0,25a 12,2 ± 0,95a 5,19 ± 1,58c # Escore de células somáticas: logaritmo da contagem de células somáticas a, b, c, d, e indicam diferenças entre colunas

Comparando os achados de Noro et al. (2006) com as médias deste estudo, a produção de

leite apresentou crescimento de 24,07% e a constituição proteica 2,5%, enquanto a gordura

e lactose apresentaram queda de 3,38% e 0,66% respectivamente. Portanto, o aumento dos

componentes do leite não reflete melhorias contínuas nos últimos anos, pois os achados de

Noro et al. (2006) apresentam leite com qualidade composicional superior aos encontrados

neste estudo. O aumento na produtividade é consequências de um planejamento estratégico

onde o controle leiteiro é indispensável para a condução de manejos racionais nos rebanhos,

porém é necessário que o controle leiteiro também seja utilizado para melhorias na qualidade

do leite e não somente para aumento da produção e isto só será alcançado com a

conscientização de produtores e indústrias (Dürr et al. 2011). O comportamento estacional

da produção e composição do leite está apresentado na Tabela 2. A produção de leite foi

maior no inverno, decrescendo progressivamente na primavera, outono e verão. A gordura

foi maior no outono seguido pelo inverno, primavera e verão. A proteína foi maior no inverno

e outono, decrescendo no verão e primavera, respectivamente. O ECS foi maior no verão e

outono seguido pelo inverno, os menores ECS foram encontrados na primavera. A

concentração de lactose apresentou a mesma tendência que a produção de leite entre as

estações do ano, sendo maior no inverno, decrescendo progressivamente na primavera,

outono e verão.

110

Tabela 2. Médias (± desvio padrão) de produção, composição química e ECS nas diferentes estações do ano,

entre janeiro de 2008 a dezembro de 2013 no Rio Grande do Sul

Estação

do ano

Produção

(L/vaca/dia)

Gordura

(%)

Proteína

(%)

Lactose

(%)

Sólidos

totais (%) ECS#

Inverno 27,3 ± 9,16a 3,48 ± 0,69b 3,27 ± 0,36a 4,48 ± 0,25a 12,2 ± 0,98a 5,20 ± 1,71b

Primavera 25,8 ± 8,68b 3,40 ± 0,66c 3,17 ± 0,36c 4,46 ± 0,25b 12,0 ± 0,98b 5,16 ± 1,78c

Verão 24,2 ± 7,8d 3,37 ± 0,65d 3,18 ± 0,35b 4,42 ± 0,25d 11,9 ± 0,95c 5,27 ± 1,78a

Outono 24,4 ± 8,48c 3,53 ± 0,68a 3,28 ± 0,88a 4,43 ± 0,26c 12,2 ± 0,98a 5,26 ± 1,69a # Escore de Células Somáticas: logaritmo da contagem de células somáticas a ,b, c, d indicam diferenças entre colunas

O aumento da produção e da lactose durante o inverno seguido pela primavera corrobora com

os achados de Noro et al. (2006), quem atribuíram este aumento à melhor qualidade das

pastagens nestas estações do ano. Broderick (2003) observou que o aumento na porcentagem

de lactose do leite aumenta com maior valor energético da dieta. As forragens temperadas no

final do outono, inverno e início da primavera no Rio Grande do Sul, têm menor fibra em

detergente neutro (FDN) e maior concentração de carboidratos solúveis quando comparadas

as forrageiras tropicais, influenciando no desempenho produtivo dos animais (Fontaneli et

al., 2009). Os maiores percentuais de gordura e proteína ocorreram no outono e inverno.

Contudo, no outono, diferente do inverno, observou-se a menor produção de leite, embora os

níveis de sólidos não diferissem dos encontrados no inverno. Uma diminuição no volume de

leite pode trazer como consequência aumento nos teores de sólidos, principalmente gordura

e proteína, devido ao efeito concentrador do leite (Weiss et al., 2002). Não restam dúvidas

que as forrageiras temperadas, fornecem melhor equilíbrio nutricional o que explica em

partes a maior produção e as maiores proporções de gordura, proteína, lactose e sólidos totais

no inverno. Heck et al. (2009) estudaram as variações da composição do leite de vacas na

Holanda e atribuíram parte das variações dos componentes químicos a fatores sazonais.

Assim como no Rio Grande do Sul a gordura apresentou a maior variação seguida pela

proteína. A lactose foi o componente que apresentou menor variação. A explicação de Heck

et al. (2009) para a diminuição dos níveis de gordura está no pastejo de forragens frescas que

concentram ácidos graxos insaturados trans. Os ácidos graxos trans interfere na ação

enzimática da Δ9-desaturase, responsável pela síntese de ácidos graxos de cadeia curta e

média na glândula mamária que contribuem para a síntese do novo.

111

As condições de conforto térmico também interferem na produção e composição do leite.

Lambertz et al. (2013) concluíram que vacas no verão, com estresse térmico, diminuem

produção e composição de gordura e proteína e aumento no ECS, corroborando com os

resultados encontrados neste estudo onde o outono e verão apresentaram os maiores ECS.

A Tabela 3 apresenta as variações entre as etapas da lactação. As vacas em início da lactação

(6 a 60 DEL) apresentaram as maiores produções de leite, ocorrendo diminuição conforme o

avanço da lactação. O maior percentual de gordura foi observado em vacas com mais de 220

DEL, e o menor percentual foi observado no período de 6 a 60 e 61 a 120 DEL, sem

diferenças entre eles. O conteúdo de proteína láctea aumentou à medida que a lactação

avançou, com maiores valores nas vacas com mais de 200 DEL, e menores nas vacas entre

61 a 120 DEL.

Tabela 3. Médias (± desvio padrão) de produção, composição química, ECS e cociente entre G:P em

diferentes estádios de lactação ordenhadas entre janeiro de 2008 a dezembro de 2013 no Rio Grande do Sul

Etapa de

lactação

(dias)

Produção

(L/vaca/dia)

Gordura

(%)

Proteína

(%) G:P* Lactose (%)

Sólidos

totais (%)

ECS#

6 a 60 29,4 ± 8,72a 3,40 ± 0,65b 3,05 ± 0,36c 1,11 ± 0,22a 4,50 ± 0,23b 11,9 ± 0,93c 4,79 ± 1,90d

61 a 120 29,2 ± 8,66b 3,30 ± 0,66c 3,03 ± 0,31d 1,09 ± 0,21b 4,51 ± 0,23a 11,8 ± 0,92d 4,89 ± 1,90c

121 a 220 26,2 ± 8,01c 3,40 ± 0,66b 3,18 ± 0,32b 1,07 ± 0,19c 4,45 ± 0,24c 12,0 ± 0,94b 5,21 ± 1,75b

> a 220 22,0 ± 7,49d 3,55 ± 0,67a 3,41 ± 0,36a 1,04 ± 0,18d 4,40 ± 0,27d 12,4 ± 0,99a 5,53 ± 1,53a # Escore de células somáticas: logaritmo contagem de células somáticas

* G:P= cociente gordura:proteína a, b, c, d indicam diferenças entre colunas

O cociente G:P aumentou progressivamente com o avanço da lactação. O cociente

gordura:proteína (G:P) tem sido usada como indicador de lipomobilização em vacas com

balanço energético negativo (BEN). Considerando que o aumento de ácidos graxos livres,

originados do tecido adiposo, contribuem com o aumento do teor de gordura láctea é sugerido

que valores de G:P superiores a 1,25 em vacas de até 60 DEL sejam indicativos de BEN

moderado (DE ROOS et al., 2007). No presente trabalho, a G:P para vacas entre 6 a 60 DEL

foi de 1,11 ± 0,22, sendo que 25,72% apresentaram cociente ≥ 1,25. Cucunubo et al. (2013)

e Duffield et al (1997) encontraram baixa especificidade e sensibilidade na utilização dos

coeficientes de G:P de 1,25 como indicador de BEN e/ou cetose. Quando o cociente é

112

ajustado para ≥ 1,50, conferindo maior especificidade e sensibilidade, o percentual de vacas

com BEN e/ou cetose foi de 5,15% neste estudo.

O número de lactações influenciou a produção de leite (Tabela 4), de forma que vacas com

duas e três lactações tiveram as maiores produções, seguidas pelas vacas com quatro ou mais

lactações. A expressão máxima da produção leiteira de uma vaca ocorre quando ela atinge o

completo desenvolvimento da glândula mamária, o que ocorre na terceira lactação das vacas

Holandesas (Schutz et al., 1990). As vacas de primeira lactação apresentaram as menores

produções e as maiores concentrações de gordura, proteína, lactose e sólidos totais, resultados

semelhantes aos encontrados por Cunha et al. (2008). Este aumento pode ser atribuído ao

menor ECS nas vacas de primeira lactação e consequentemente menor dano as células

produtoras de leite e à menor produtividade quando comparado às multíparas, causando

efeito concentrador no leite (Auldist e Hubble, 1998; Weiss et al., 2002). A gordura, proteína,

lactose e sólidos totais diminuíram conforme aumentou o número de lactações. O ECS

também aumentou conforme aumentou o número de lactações. Schultz (1977) atribui o

aumento do ECS ao maior número de partos que como consequência causa perda de células

epiteliais secretoras, diminuído os componentes do leite. O cociente G:P foi maior em vacas

de primeira lactação seguido pelas vacas com mais de quatro lactações e duas e três lactações

respectivamente sugerindo que as vacas de primeira lactação estão mais predispostas a

ocorrência de transtornos metabólicos.

Tabela 4. Médias de produção (± desvio padrão), composição química, ECS e cociente entre G:P, distribuídas

conforme o número de lactações ordenhadas entre janeiro de 2008 a dezembro de 2013 no Rio Grande do Sul

Número

de

partos

Produção

(L/vaca/dia)

Gordura

(%)

Proteína

(%) G:P*

Lactose

(%)

Sólidos

totais (%) ECS#

1 23,9±7,72c 3,47±0,67a 3,24±0,37a 1,08±0,19a 4,54±0,23a 12,2±0,97a 4,83±1,73c

2-3 26,9±9,09a 3,43±0,68b 3,23±0,38b 1,07±0,20c 4,43±0,24b 12,1±0,98b 5,31±1,72b

≥ 4 26,1±8,86b 3,41±0,67c 3,19±0,37c 1,07±0,20b 4,32±0,26c 11,9±0,97c 5,84±1,62a # Escore de células somáticas: logaritmo da contagem de células somáticas

* G:P=cociente gordura:proteína a, b, c indicam diferenças entre colunas

A Tabela 5 apresenta resultados de correlação onde a produção de leite correlacionou-se

positivamente com os percentuais de lactose e o número de partos. Segundo Larson (1995),

a lactose aumenta a osmolaridade do leite e consequentemente a absorção de água para o

113

alvéolo, aumentando a produção. O aumento do ECS no leite teve impacto negativo sobre a

produção de leite, percentual de lactose e o cociente G:P. Hagnestam-Nielsen et al. (2009)

encontraram diminuição da produção de leite em vacas primíparas e multíparas com elevada

contagem de células somática (CCS). As perdas foram estimadas em 1,9 e 5,2% para vacas

primíparas e multíparas, respectivamente. Os mesmos autores encontraram as maiores perdas

de produção leiteira conforme avançou a lactação, sendo os coeficientes de regressão mais

negativos entre as semanas 33-44 independentemente do número de partos. Esses achados

estão de acordo com os resultados encontrados neste estudo, observando-se que à medida

que avança a lactação e o número de partos, maior é o valor de ECS e menor a produção de

leite.

Tabela 5. Correlações entre os dias em leite (DEL), número de partos, produção e composição láctea

DEL N° partos Produção

Gordura

(%)

Proteína

(%) G:P##

Lactose

(%)

Sólidos

(%)

Produção -0,341** 0,121** Gordura

(%) 0,125** -0,038** -0,226** Proteína

(%) 0,394** -0,041** -0,396** 0,400**

G:P -0,121** -0,013** 0,012** Lactose

(%) -0,164** -0,308** 0,200** -0,042** -0,085** 0,006* Sólidos

(%) 0,220** -0,131** -0,279** 0,879** 0,700** 0,486** 0,208**

ECS# 0,165** 0,214** -0,158** 0,076** 0,174** -0,028** -0,429** 0,016** ** Correlação significativa a nível de 0,01

*Correlação significativa a nível de 0,05

# Logaritmo da contagem de células somáticas

## G:P=cociente gordura:proteína

A diminuição dos níveis de lactose em vacas com elevado ECS também foi observado por

Prada e Silva et al. (2000), atribuindo 34% das perdas de lactose como sendo causadas pela

CCS. O ECS teve correlação positiva com os teores de gordura, proteína e sólidos, e com os

dias em lactação e número de partos, ao tempo que teve correlação negativa com a produção

de leite. Shutz et al. (1990) e Cunha et al. (2008) observaram correlações positivas entre o

ECS e os percentuais de gordura e proteína. Similarmente, Miller et al. (1983) analisando

leite individualizado por vaca e Mitchell et al. (1986) com leite de tanque de expansão,

verificaram um aumento da porcentagem de gordura no leite com alta CCS. Segundo Auldist

114

e Hubble (1998), não há consenso na literatura em relação ao aumento da porcentagem de

proteína total no leite de animais com alta CCS. Kitchen (1981) e Munro et al. (1984)

descrevem que o aumento da concentração de proteínas séricas no leite de vacas com mastite

subclínica pode ser atribuído ao aumento na permeabilidade vascular em consequência do

processo inflamatório. Em nosso estudo a correlação entre ECS e lactose foi de -0,429 (P<

0,01). Noro et al. (2006) no Rio Grande do Sul e Cunha et al. (2008) em Minas Gerais

encontraram as mesmas influencias do ECS sobre a produção e composição do leite,

indicando tratar-se de um problema persistente que afeta a produção e qualidade do leite.

Conclusão

A produtividade e composição do leite das fazendas que utilizam controle leiteiro no norte e

nordeste do Rio Grande do Sul têm melhorado nos últimos anos. É possível observar o efeito

da sazonalidade, onde no período de inverno ocorrem os maiores volumes de leite e de

sólidos totais. Vacas no início da lactação (6 a 60 DEL) e aquelas com dois e três partos

foram as mais produtivas. O maior desafio a ser vencido é a diminuição da contagem de

células somáticas que se correlacionaram negativamente com a produção e o percentual de

lactose.

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118

Acidose ruminal subaguda: monitoramento e prevenção nos rebanhos

leiteiros

Mirela Noro

Giovani Noro

O rúmen é o compartimento anatômico do trato gastrointestinal responsável pelo processo

digestivo fermentativo, nos ruminantes. Nele os processos bioquímicos fermentativos são

realizados por uma ampla variedade de microrganismos, como protozoários, fungos, e

especialmente as bactérias. As enzimas presentes na parede e citoplasma bacteriano, assim

como aquelas liberadas no fluido ruminal, são as principais responsáveis pelos processos

fermentativos, dos quais são originados substratos energéticos, nitrogenados e algumas

vitaminas, que serão utilizados como nutrientes pelo hospedeiro. Desta forma, os

microrganismos ruminais vivem em simbiose com a vaca leiteira, possibilitando a

degradação de substratos que não poderiam ser degradados por mamíferos não-ruminantes.

Dos processos fermentativos ruminais são produzidas substâncias que baixam o pH ruminal

(caráter ácido), como os ácidos graxos voláteis (acetato, butirato, propionato, entre outros) e

ácido láctico; e substâncias alcalinas como os compostos nitrogenados (ex. amônia [NH4]).

Quando o pH do rúmen se acidifica (pH< 5,8) ocorrem alterações nos processos

fermentativos, e quando os valores baixam de pH< 5,5 ocorrem alterações não somente no

ambiente intrarruminal, como também na sua parede, assim como alterações sistêmicas, que

culminam no quadro de acidose ruminal subaguda (SARA). Este transtorno afeta uma alta

porcentagem de vacas nos sistemas produtivos leiteiros e ocasiona perdas produtivas e de

saúde animal, motivo pelo qual abordaremos as generalidades deste transtorno, seu impacto

nos sistemas produtivos leiteiros, assim como o seu monitoramento e prevenção a nível

populacional.

O que é o pH ruminal e como ele varia ao longo do dia na vaca leiteira

O pH, denominado potencial de hidrogênio, é a expressão para determinar concentração de

hidrogênio [H+] numa solução. Seus valores variam entre 0 a 14, sendo o valor pH 7,0 o

ponto neutro. À medida que o pH fica com valores inferiores a 7,0 ele tende a acidificação e

com valores maiores a 7,0 tende a alcalinização.

119

O pH pode ser calculado pela fórmula: pH= −log [H+]. Como sua fórmula considera o

logaritmo negativo na base 10 (log10), os valores altos de pH indicam que na solução temos

poucas moléculas de H+ e com valores baixos pH temos muitas moléculas de H+. Como

exemplo, quando no rúmen o valor de pH diminui em 1,0 ponto (ex. pH 7,0 quando diminui

a pH 6,0), temos 10 vezes mais H+, e quando diminuímos 2,0 pontos (ex. pH 7,0 para pH 5,0)

temos um aumento de 100 vezes na concentração de H+. Assim podemos inferir que uma

leve mudança no pH ruminal está associada a aumentos consideráveis na concentração de H+

no rúmen.

Diversos estudos têm proposto valores considerados “fisiológicos” para o pH ruminal, porém

mais que um valor em si o mais relevante é a estabilidade do pH ruminal ao longo do tempo.

Um rúmen saudável deve ter um pH > 5,8 até 7,0. Valores maiores que 7,0 seriam de alcalose

ruminal e menores a 5,6 de acidose ruminal. Valores de pH menores ou iguais a 5,8 afetam

a fermentação das bactérias celulolíticas, as quais trabalham eficazmente entre pH 6,2 a 6,8.

Deste modo, mesmo com valores de pH sendo considerados fisiológicos teríamos perdas

produtivas nas vacas por uma redução na fermentação da fibra dietética. Por outro lado, o pH

ruminal varia ao longo do dia associado ao comportamento ingestivo dos ruminantes,

composição e manejo dietéticos; e nas vacas a pastoreio associado às variações diárias na

composição da pastagem. Nos sistemas de produção em base a ração totalmente misturada

(TMR) observa-se uma redução nos valores de pH ruminal entre 3 a 4 horas após a ingestão

da ração, entretanto devido a que as vacas apresentam um comportamento ingestivo diurno,

existe uma tendência a que os valores de pH ruminal descendam com o transcurso do dia.

Portanto, encontraremos valores tendendo a neutralidade (pH 6,5-7,0) durante a madrugada

e período matutino, associado ao maior tempo de ruminação noturna; e tendendo a

acidificação (pH< 6,2) durante o período vespertino e anoitecer, associado as maiores taxas

fermentativas pelo maior consumo de alimento (Figura 1).

O que é a acidose ruminal subaguda

A acidose ruminal subaguda (SARA) é um transtorno digestivo subclínico ou inaparente

associado ao consumo de concentrados energéticos, alimentos altamente fermentáveis, ou

com baixa capacidade tampão (buffer). Está caracterizada por pH ruminal ácido ( 5,5), que

impacta negativamente na produção e saúde das vacas. Apresenta uma alta prevalência nos

120

sistemas de produção leiteira onde as vacas são suplementadas com alta proporção de

concentrados e baixa fibra efetiva (eF). Afeta principalmente as vacas de alta produção no

início da lactação, onde as papilas ruminais não se desenvolveram completamente, e no pico

do consumo de alimento, associada às altas taxas fermentativas. Também afeta rebanhos

onde ocorreram mudanças de uma dieta com baixa densidade energética para uma com alta

densidade e baixa eF. Tradicionalmente a SARA era reconhecida por afetar a rebanhos

estabulados em sistema de dieta com alto concentrado. Porém, a SARA tem sido

diagnosticada com alta incidência em rebanhos pastoris de diversas partes do mundo,

associada ao consumo de pastagens com baixo conteúdo de eF e/ou alto conteúdo de

carboidratos solúveis, como observado em gramíneas temperadas. Por este motivo, nos

sistemas produtivos leiteiros do sul do Brasil, durante o período de inverno e primavera onde

aumenta o uso dos sistemas pastoris, a prevalência de SARA pode ser elevada, associada ao

uso de pastagens de aveia e azevém. Também tem sido observada grande incidência de

SARA em rebanhos em pastagens tropicais, quando há suplementação de grandes

quantidades de concentrado (acima de 0,5% PV por refeição), principalmente em período

onde os animais estão sob stress calórico.

Figura 1. Variação (X ± DP) do pH ruminal ao longo do dia em vacas a

pastoreio de azevém perene (PB: 18,3% MS, EM: 2,7 Mcal/kg MS).

Adaptado de Scandolo et al., 2007 (Contreras & Noro, 2010)

Ainda não existe um consenso respeito aos valores de pH ruminal para diagnosticar SARA.

Alguns pesquisadores diagnosticam SARA quando os valores de pH ruminal são < 5,5

durante 4 ou mais horas por dia. Outros diagnosticam SARA quando o pH ruminal está

121

abaixo de 5,6 pelo menos por 3 horas ao dia. Enquanto outros são mais extremistas e

consideram SARA quando os valores de pH ruminal se encontram menores a 6,0 por mais

de 4 horas ao longo do dia, situação que inclui os animais com média de pH ruminal ao longo

do dia maiores a 6,25. Tomando por base a maioria dos estudos no tema, consideraremos

SARA quando os valores de pH ruminal encontrarem-se entre 5,0 a 5,5. Valores de pH entre

> 5,5 a 5,8 serão considerados marginais, e o pH “fisiológico” será considerado > 5,8 até 7,0.

Valores > 7,0 são considerados alcalinos, e podem ser observados em animais em jejum ou

anorexia. Os valores de pH ruminal < 5,0 são observados nos quadros clínicos de acidose

aguda ou hiperaguda conhecida como acidose láctica ruminal. Por ser um quadro subclínico,

a SARA é subdiagnosticada. Em rebanhos afetados por SARA podem observar-se quadros

de acidose crônica, os quais estão associados ao excessivo consumo de carboidratos por um

longo período de tempo, normalmente com adequada quantidade de eF, sendo assim uma

forma de acidose subaguda persistente. Neste quadro a população de bactérias celulolíticas

diminui e grandes quantidades de microrganismos utilizadores e produtores de lactato são

encontrados. Na acidose crônica a grande quantidade de ácidos produzidos no rúmen

estimula a proliferação das papilas ruminais, podendo resultar em paraqueratose, hiporexia e

hipomotilidade ruminal. A sobrecarga ácida persistente pode reduzir a eficiência metabólica

e o desempenho geral do animal. Outros achados no rebanho são a alta prevalência de

laminite e eventualmente poliencefalomalacia. Os fatores de risco para SARA estão

associados a fatores que alteram o padrão de fermentação ruminal como a dieta (quantidade

e tipo de carboidratos não fibrosos; quantidade e tipo de fibra, tamanho de partícula, seleção

da dieta), manejo dietético (tipo e frequência de alimentação), o ambiente (conforto,

temperatura e umidade ambiental), assim como fatores que afetem a absorção dos ácidos

graxos voláteis (AGV). Alguns destes fatores de risco serão abordados no capítulo de

monitoramento para prevenção de SARA.

A acifidicação do rúmen resulta de três processos que podem ou não estar integrados: (1)

Efeito químico/microbiológico, pelo alto consumo de carboidratos altamente fermentáveis,

alta taxa fermentativa e aumento de AGV no rúmen; (2) Efeito físico/químico, pela baixa

ingestão de eF, com baixa taxa de ruminação, que baixa a capacidade tampão proveniente

dos fosfatos e bicarbonatos da saliva; e (3) Efeito físico pela baixa capacidade de absorção

dos AGV pelas papilas ruminais em vacas não adaptadas a dieta com alta densidade

122

energética. Na forma clássica a SARA ocorre quando no rúmen, o amido e os açúcares da

dieta sofrem uma rápida fermentação, sem uma adequada capacidade tampão, aumentando a

taxa de crescimento das bactérias amilolíticas em relação às celulolíticas. Consequentemente

aumenta a produção dos AGV, diminuindo o pH ruminal. Na fase inicial da fermentação,

aumenta a produção do ácido propiônico (de 20% para aproximadamente 40%), e diminui a

do ácido acético associado à redução da degradação da fibra quando o pH baixa de 5,8. Nos

quadros de SARA e de acidose crônica, as proporções dos ácidos propiônico e butírico

aumentam e as de acético diminuem. É assim que no rúmen saudável a relação

acetato:propionato é de aproximadamente 2,2:1. Quando os valores de pH ruminal seguem

baixando pela maior produção de ácidos e disponibilidade de carboidratos, o Streptococus

bovis cresce exponencialmente convertendo o amido e a glicose em ácido láctico e outros

ácidos orgânicos, como valérico, fórmico e succínico. Este aumento dos ácidos acidifica o

pH ruminal a aproximadamente 5,4 que por si leva a uma anorexia, diminui o crescimento e

ocasiona a morte das bactérias lactolíticas que transformam o ácido láctico em propiônico,

assim como de outras populações microbianas. Com a morte das bactérias ruminais, que na

sua maioria são Gram-negativas, ocorre liberação de uma grande quantidade de endotoxinas

lipopolissacarídicas da parede celular ao ambiente ruminal. Estas endotoxinas quando

absorvidas produzem alterações hemodinâmicas e inflamatórias sistêmicas no animal. A

progressiva acidificação do rúmen, especialmente associada ao aumento dos AGV, leva a

hipotonia ruminal, sendo o butirato o principal responsável por este efeito, e quando o pH

atinge valores próximos a 5,0 ocorre uma atonia ruminal. Quando o ácido láctico produzido

pelo S. bovis acumula-se no rúmen, ocorre uma redução do pH ruminal a valores inferiores

a 5,0, com substituição da população de S. bovis por Lactobacillus, que são mais resistentes

a pH ácidos, caracterizando uma acidose láctica ruminal, transtorno clínico que não será

discutido neste trabalho. A hipomotilidade ruminal leva a uma diminuição da ruminação, e

menor produção de saliva, impedindo o efeito tampão. Por outro lado, quando ocorre

dissociação dos ácidos produzidos no rúmen, incrementa a osmolaridade ruminal e intestinal

a valores maiores que a do sangue ( 300 mOsm), o que se traduz em efeito osmótico com

passagem de água do sangue para o rúmen e intestino, gerando fezes desde mais fluidas até

diarreicas.

123

Sinais e impacto da SARA no sistema produtivo

A SARA impacta negativamente no rebanho por afetar aspectos produtivos e de saúde. Em

nível de rebanho a visualização de alguns achados como: (1) taxa de descarte anual maior a

30% (> 8% nos 60 dias pós-parto); (2) incidência de deslocamento de abomaso maior a 3%;

(3) baixo consumo de matéria seca no pós-parto; (4) escore de fezes heterogêneo entre vacas;

e (5) gordura láctea menor a 3,5%, sugerem alta prevalência de SARA. A seguir citaremos

alguns dos impactos da SARA no sistema produtivo.

Degradação da dieta

A acidificação ruminal (< 5,8) diminui a digestão da fibra e da proteína ruminal, por

detrimento das bactérias celulolíticas e proteolíticas. Como resultado ocorre perda de fibra

nas fezes e aumento de aporte de proteína passante, que pode ser absorvida a nível intestinal,

porém em detrimento da síntese de proteína microbiana.

Síndrome da baixa gordura láctea

Ocorre associada à diminuição da biohidrogenação de ácidos graxos insaturados presentes

na digesta e da síntese de acetato ruminal. A redução da biohidrogenação aumenta

percentualmente os ácidos graxos trans no sangue, inibindo a síntese do gordura láctea.

Muito comum onde dieta contém adição de óleos, principalmente de soja, monensina e baixa

eF.

Rumenite e paraqueratose

A exposição prolongada do epitélio ruminal ao baixo pH provoca rumenite, atrofia e necrose

das papilas ruminais e eventualmente hiperparaqueratose, impactando negativamente na

absorção dos AGV. Além dos ácidos orgânicos produzidos no rúmen, vários outros fatores

tóxicos (histamina, tiramina, etanol e endotoxinas) podem contribuir para a apresentação

desta afecção. Por outro lado, a rumenite é uma via de ingresso de bactérias e fungos para a

corrente circulatória.

124

Abscessos sistêmicos

Quando a mucosa ruminal perde sua integridade, também perde sua capacidade de atuar

como barreira entre o ambiente ruminal e o sangue. Isto permite que bactérias patogênicas

como Fusobacterium necrophorum penetrem no epitélio ruminal e, através da veia porta,

colonizem outros órgãos. Estas bactérias podem causar abscessos hepáticos, e em alguns

casos provocar peritonite localizada. Posteriormente, os abscessos podem ocorrer em outros

órgãos como pulmões, coração, rins, pele ou articulações.

Laminite

Nos quadros de acidose ruminal as bactérias que normalmente utilizam a histidina, estão

inibidas ou morrem. Nestes casos a Allinella histaminiformans, bactéria resistente a pH

ácidos, utiliza a histidina e libera histamina, que poderia contribuir na apresentação de

laminite. Entretanto, a etiologia deste quadro ainda não está completamente elucidada.

Porém, em rebanho com SARA se observa uma alta prevalência de claudicações.

Síndrome da veia cava caudal

Associada aos abscessos hepáticos, alguns animais podem apresentar congestão crônica

passiva na veia cava caudal com formação de trombos que provocam hipertensão pulmonar,

edema periférico e ascite. A formação dos trombos na veia cava cranial pode causar distensão

da jugular e edema local, que pode culminar no desenvolvimento de aneurismas que

ocasionam rupturas, provocando hemoptise aguda e morte.

Outros impactos

Outro achado nos rebanhos com acidose ruminal é o aumento das taxas de reposição por

aumento das taxas de descarte, a ocorrência de poliencefalomalacia por produção de

tiaminase pelas bactérias ruminais, e alta prevalência de deslocamento de abomaso. Além

disso, podem ocorrer quadros de morte súbita nos animais que cursaram com quadros prévios

de acidose, devido a uma hipersensibilidade anafilática as endotoxinas absorvidas.

125

Monitoramento do rebanho: medidas para o diagnóstico e prevenção

O monitoramento do rebanho para diagnóstico e prevenção da SARA deve ser realizado de

forma integral no sistema produtivo e considerando os diferentes espectros da produção e da

saúde populacional. Consequentemente, as medidas a serem tomadas impactam positiva ou

negativamente na produção e incidência de outros transtornos da saúde do rebanho. Neste

texto, abordaremos os principais aspectos que afetam a incidência de SARA, visando a

manutenção da produção e saúde populacional de forma integral.

No monitoramento do rebanho devemos levar em conta os aspectos associados diretamente

às vacas, aspectos de manejo e ambientais, e dar especial atenção à nutrição. Seguindo esta

lógica, abordaremos primeiro os aspectos relacionados ao diagnóstico da SARA,

visualizando aspectos observacionais nos animais, e metodologia analíticas de pH ruminal,

e logo abordaremos aspectos de manejo e nutrição, que são medidas associadas não só ao

diagnóstico, como à prevenção da afecção. Aspectos de ambiente e conforto como parte do

monitoramento e prevenção da SARA não serão abordados neste texto.

Observação das vacas

Em propriedades com dietas ou manejos com alto risco de SARA podemos observar animais

com quadros clínicos de acidose láctica ruminal, manifestada de forma hiperaguda e/ou

aguda, que ocorre em um número reduzido de vacas não adaptadas à dieta ou que consomem

uma grande quantidade de alimento concentrado por erro na distribuição nos cochos ou

homogeneização no mixer. Porém, na sua forma clássica, em rebanhos com SARA observam-

se sinais que podem ser sutis, como diminuição e flutuação no consumo de matéria seca

durante o dia e entre dias, situação bastante difícil de registrar na rotina de um tambo, sem o

uso de monitores comportamentais. Ademais, algumas vacas podem estar mais letárgicas e

apresentar grau variável de diarreia intermitente. No rebanho também podemos observar uma

queda na condição corporal, e a produção de leite tende a aumentar num primeiro momento

e logo pode diminuir. A incidência de deslocamento de abomaso aumenta durante o período

onde a SARA é mais incidente (> 3%), e após algumas semanas podem observar-se abscessos

subcutâneos, ou visualizar-se abscessos hepáticos nas necropsias. Porém, antes de qualquer

observação é necessário contar com os registros da propriedade, para identificar os grupos

de risco, motivo pelo qual é importante formar lotes por categoria fisiológica e nível de

126

produção, para o adequado monitoramento e para formular estratégias de prevenção. A seguir

serão abordados alguns aspectos observacionais nas vacas que indicam alta incidência de

SARA.

Problemas podais

Nos rebanhos com SARA pode-se evidenciar presença de sulcos nos dígitos, alta prevalência

de laminite, e após algumas semanas do quadro de laminite é frequente a manifestação de

úlceras e hematomas de sola e doença da linha branca. Como medida de monitoramento, é

recomendado realizar periodicamente a avaliação do escore de locomoção do rebanho. Ele

permite reconhecer a ocorrência de vacas com claudicação, que poderiam ser decorrentes de

uma laminite crônica.

Comportamento alimentar

Vacas com SARA apresentam um consumo de matéria seca flutuante, com diminuição

transitória, associado á diminuição da motilidade ruminal por aumento da osmolaridade

ruminal. Ademais, quando na dieta existe fibra longa (> 7 cm) especialmente proveniente de

silagens, é possível observar a seleção e rejeição da fibra no cocho. Nestes casos as vacas

selecionam e consomem as partículas mais finas, diminuindo consequentemente as taxas de

ruminação. Porém, quando o feno de qualidade está disponível ad libitum os animais tendem

a consumi-lo. Nestes rebanhos também é frequente ver-se alguns animais consumindo solo

e camas, e em locais com cochos com livre disposição de bicarbonato de sódio, se observa

um alto consumo (> 50 g/ vaca/dia).

Escore de ruminação

Rebanhos com SARA diminuem o tempo de ruminação, que pode indicar uma inadequada

quantidade de fibra na dieta. Normalmente as vacas leiteiras ruminam enquanto descansam

totalizando 6,7 horas de ruminação por dia, tempo que varia entre 3,4–14h dependendo do

tipo e manejo dietético. Normalmente ruminam quando estão deitadas (5,5 h) e menor tempo

quando estão em estação (1 h). Como as vacas de um mesmo lote tendem a sincronizar suas

atividades, o monitoramento da ruminação pode ser feito observando diariamente o rebanho

após a alimentação (40 a 70 minutos da entrega da ração), ocasião em que 50% ou mais das

127

vacas que estão descansando deveriam estar ruminando. No caso das vacas deitadas, mais

que 60% delas deveriam estar ruminando. Deve-se considerar que as vacas ruminam

principalmente durante a noite, porém quando a temperatura sobrepassa os 24ºC as vacas

tendem a alimentar-se pela noite e descansar durante o dia, o que altera o comportamento de

ruminação.

Avaliação visual das fezes

A observação das fezes das vacas entrega informação referente à interação entre a vaca e sua

dieta. Desta forma a avaliação das fezes serve para monitorar a dieta e sua digestibilidade.

Entre os aspectos que devem ser avaliados estão: 1. Avaliação visual e a homogeneidades

das fezes entre as vacas; 2. Escore de fezes; 3. Tamanho de partículas não digeridas nas fezes.

1. Avaliação visual e homogeneidade das fezes entre as vacas. Num grupo de vacas em dias

de lactação e dieta similares, as fezes deveriam ser homogêneas. Quando um grupo de vacas

apresenta fezes heterogêneas pode indicar a ocorrência de SARA e auxilia na melhora da

formulação da dieta e do manejo. Entre os aspectos a ser avaliados estão os “3 Cs”: cor,

consistência e conteúdo. Num rebanho com SARA é possível observar uma alta porcentagem

de vacas com perda da consistência fecal pelo aumento da osmolaridade ruminal e intestinal

(ver avaliação do escore de fezes); aparição de muco e fibrina, associado a lesão intestinal; e

presença de borbulhas, associada a fermentação do grão não digerido na parte posterior do

intestino.

2. Escore de fezes. O escore de fezes avalia a consistência fecal, observando as fezes no solo.

Este parâmetro avalia a qualidade da dieta em termos de carboidratos, fibra, proteína e água,

e sua digestibilidade. O escore 1 está associado a fezes líquidas verdes resultados do

consumo de pastagens de alta qualidade; porém também pode ser observado em vacas com

SARA e em vacas doentes. No escore 2 as fezes são semilíquidas com uma forma definida,

observadas em vacas recém paridas, em pastoreio e com SARA. No escore 3 as fezes têm

forma concêntrica, tipo um vulcão, sendo considerado o escore ideal. No escore 4 as fezes

são cônicas, tendendo a ser secas, sendo observadas em vacas secas com dietas com baixa

proteína e alta fibra. No escore 5 as fezes se apresentam bastante ressecadas, sendo

observadas em vacas doentes desidratadas ou alimentadas com dietas em base a forragens

secos e com muito baixa digestibilidade.

128

3. Avaliação do tamanho das partículas fecais. Indica a digestibilidade da dieta. Pode ser

realizada manualmente, porém idealmente com o uso do analisador de digestão (Nasco). O

método manual pode ser realizado coletando-se amostras de fezes ao pé da vaca com um

copo plástico. Deve-se avaliar amostras de um grupo homogêneo, de ao menos 8 vacas. As

fezes, de cada vaca individualmente, devem ser colocadas numa peneira de cozinha (18 cm

de diâmetro e 10 cm de profundidade), e com um fluxo constante de água lava-se o conteúdo

fecal até que a água filtrada fique translúcida. Após, observa-se a presença de partículas

indigeridas nas fezes, estimando a quantidade de partículas pequenas, médias e grandes,

como grãos não digeridos. A presença de grãos de milho, provenientes de silagem, pode

indicar que foi pobremente picada ou ensilada tardiamente. Grãos de milho com menos de

0,6 cm quando observados em conjunto com presença de fibras vegetais indica rápida taxa

de passagem, que pode estar associada a silagem muito jovem ou insuficiente eF na dieta.

Como diagnosticar a SARA: mensuração do pH ruminal

O único método direto, preciso e sensível para avaliar o grau de acidose ruminal no rebanho

é a determinação do pH no líquido ruminal. Entretanto, a obtenção de uma amostra

representativa é fundamental para que os valores sejam reais. A este respeito se sabe que

amostras obtidas mediante sondagem buço-esofágica ruminal podem sofrer contaminação

por saliva (2-30%), reduzindo a sensibilidade da técnica que consequentemente pode

aumentar o pH do líquido ruminal entre pH 0,6 a 1,7, produzindo falsos negativos de SARA.

Por este motivo as amostragens realizadas mediante ruminocentese são as indicadas para

monitoramento de SARA no rebanho. O volume a ser obtido depende da técnica para a

determinação do pH. Preferencialmente deve-se usar o pHmetro portátil com eletrodo fino,

que permita mensurar o pH em amostras de 3 a 5 mL obtidas em seringas de 5 ou 10 mL.

Quando a placa de leitura do pHmetro é larga o volume de líquido ruminal deve ser maior

para ser colocado num copo e permitir que o eletrodo seja submerso no líquido, necessitando

de volumes entre 5 a 10 mL.

Quando obter as amostras de líquido ruminal?

Devido ao comportamento ingestivo das vacas e as características de fermentação ruminal

ao longo dia, as amostras de líquido ruminal deveriam ser obtidas à tarde, 2 a 4 horas após a

129

ração vespertina com concentrado, ou 4 a 6 horas após o TMR, idealmente após a ordenha

da tarde (após 16:00), ocasião onde os valores de pH estão baixando, e que seguirão

baixando até o anoitecer. Amostras obtidas pela manhã tendem a neutralidade e geram

resultados falsos negativos de SARA.

Quais e quantos animais amostrar?

As vacas a serem monitorados são as que têm maior risco de SARA. Entre elas estão as

vacas em período de transição pós-parto (5 a 21 dias pós-parto) e as vacas no pico de

produção láctea e ingestão de alimento (50 a 120 pós-parto). Para fins de validade

diagnóstica em rebanhos grandes e médios deveriam coletar-se ao menos 20 vacas por

grupo, e em rebanhos pequenos pelo menos 8 vacas de cada grupo. Quando no rebanho o

número de vacas de cada grupo é menor a 8, recomenda-se coletar todas as vacas do grupo.

É importante que as vacas selecionadas para amostragem sejam homogêneas, e

representativas do grupo ao qual pertencem.

Como interpretar os resultados de pH ruminal?

Para o adequado diagnóstico da ocorrência de SARA no rebanho, deve-se calcular a

porcentagem de vacas com SARA, ou com valores marginais, em cada grupo de risco.

Consideram-se o grupo como positivo a SARA quando 25% ou mais das vacas apresentam

valores pH< 5,5, e marginais quando 33% ou mais das vacas tem valores pH< 5,8. Grupos

negativos são aqueles nos quais menos de 33% das vacas apresentam valores pH< 5,8. Esta

classificação serve para diagnosticar um rebanho com SARA ou risco de SARA (valores

marginais), assim como auxilia na triagem dos fatores que estão associados na ocorrência

de SARA no rebanho (Tabela 1).

Outros parâmetros a ser observados

A composição láctea em propriedades que fazem uso do controle leiteiro permite avaliar a

nutrição e o estado de saúde ruminal das vacas. Em rebanhos com SARA a gordura láctea

tende a diminuir (< 3,5%), e pode ocorrer inversão entre a gordura e a proteína lácteas.

Nestes rebanhos, mais de 10% das vacas apresenta gordura láctea 0,4% abaixo do valor da

proteína láctea. Alguns autores consideram o cociente entre gordura:proteína lácteas < 1,0

130

como indicativo de SARA, porém este ponto de corte deve ser validado nos nossos

rebanhos, visto que o sistema de amostragens realizado a nível de propriedade pode gerar

erros metrológicos.

Monitoramento do manejo e da dieta para atuar preventivamente

O monitoramento e prevenção da SARA está associado diretamente a aspectos que auxiliam

na manutenção do pH ruminal dentro de valores ótimos. Entre eles o de maior impacto é a

dieta. Porém, como o valor nutricional da dieta não é estático, e a dieta formulada

normalmente é diferente da dieta consumida, é muito difícil predizer em quais intervalos de

valores o pH das vacas se mantêm. Por este motivo é importante mensurar o pH do líquido

ruminal, com a finalidade de diagnosticar e prevenir os quadros de acidificação. Os valores

ótimos para a adequada fermentação da fibra e saúde ruminal se encontra entre 6,0 a 7,0.

Como medidas para manter o pH ruminal entre valores ótimos, estão a adoção de uma série

de estratégias, em conjunto, visto que cada uma de forma isolada não atingirá o objetivo de

manutenção do pH dentro de valores adequados, e estáveis ao longo do dia. Todos os aspectos

associados à manutenção da saúde e produção devem ser tomados considerando o estado

fisiológico e a produção das vacas. Assim, é necessário agrupar as vacas por estado

fisiológico e produção para que possam receber a dieta de acordo com seus requerimentos.

A seguir abordaremos alguns aspectos a ser considerados no manejo, na dieta e ao uso de

aditivos para prevenir quadros de SARA.

Tabela 1. Interpretação de valores alterados de pH ruminal em grupos de vacas

Vacas 50 – 120 DEL

+ -

Vacas < 20 DEL

+ Problemas com a ração e

/ou periparto

Problema no periparto

- Problema da ração Rebanho normal DEL= dias em lactação. Grupo positivo quando 25% ou mais das vacas com pH< 5,5

Grupo negativo quando menos de 33% das vacas com pH< 5,8 (Nordlund et al., 1995)

Dieta no período de transição pré-parto

A prevenção da SARA inicia desde o período de transição pré-parto (-21 dias até o parto).

Neste período as vacas devem ser adaptadas à dieta do pós-parto com dois objetivos

131

principais no que diz respeito a SARA: 1. Estimular o crescimento das papilas ruminais; 2.

Adaptação a dieta do pós-parto. As dietas com alta densidade energética devem ser ofertadas

de forma gradual e progressiva, especialmente a animais manejados de forma extensiva,

assim como as vacas secas. A dieta das vacas no período seco é de baixa qualidade, com

baixas taxas fermentativas, o que culmina numa redução do tamanho das papilas ruminais

em 50%. Desta forma, é fundamental incluir na dieta das vacas no período de transição

alimentos energéticos que aumentem as taxas fermentativas, para estimular o

desenvolvimento das papilas. O tamanho ótimo das papilas é atingido em 4 a 6 semanas após

a inclusão de dietas energéticas, e à medida que as papilas crescem ocorre um aumento da

capacidade de absorção dos AGV. Deste modo, a adaptação a uma nova dieta, como ocorre

no pós-parto, deve ser feita pelo menos por 15 dias prévios ao parto.

Composição da dieta. Para avaliar os fatores de risco para SARA, assim como formular

dietas para prevenção de SARA, é necessário contar com a informação das propriedades

químicas (MS, digestibilidade, energia, CNF, FDN) e físicas (tamanho partícula, tipo e grau

de processamento dos alimentos energéticos) da dieta, cociente forragem: concentrado, e

manejo dietético.

Manejo dietético: adaptar faz diferença. A priori, qualquer mudança da dieta deve ser feita

com um período de adaptação gradual a nova dieta, idealmente por 14 a 21 dias com

aumentos gradativos a cada 5 a 7 dias.

Maior número de rações diárias minimiza picos de acificação. O fracionamento da dieta

várias vezes ao dia, mínimo 2 a 3 rações diárias, além de estimular o consumo (quando o

alimento está disponível por mais de 20 horas ao dia), minimiza os picos de acidificação

ruminal por fracionar o consumo.

TMR: forma eficaz para entregar uma dieta balanceada. O uso da dieta totalmente misturada

(TMR) favorece em dois aspectos principais a saúde e produção da vaca leiteira: 1. Aumenta

o consumo de matéria seca; 2. Permite a incorporação de volumosos fibrosos na dieta, por

diminuir a seleção do concentrado pelas vacas, estimulando consequentemente a salivação,

e por consequência a manutenção do pH ruminal. Neste sistema é necessário monitorar a

ocorrência de seleção da dieta quanto a presença de partículas grosseiras de alimento.

O cocho é importante! Dois aspectos a respeito do cocho impactam no risco de SARA: (1)

Altura do cocho, pois vacas que ingerem alimento com a cabeça baixa, além de diminuir a

132

perda de alimento, produzem 17% mais saliva. Por este motivo os cochos deveriam estar

entre 5 e 15 cm da linha da sola do casco. (2) Espaço linear de cocho por vaca: para minimizar

os efeitos da dominância, em sistemas estabulados com uso de TMR o espaço linear por vaca

deve ser de 75 cm (linha unilateral), e quando o acesso à ração é limitado (baixo número de

rações por dia), é necessário contar com 80-100 cm linear/vaca.

Como minimizar altas taxas fermentativas por excesso de carboidratos não fibrosos (CNF)

de rápida degradabilidade? A dieta das vacas leiteiras deve permitir a expressão do mérito

genético, tendo em conta os desafios que as altas exigências trazem consigo. Uma dieta

adequada otimiza o cociente entre forragem e concentrado em termos de quantidade e

sincronismo de degradação. O nível de CNF da dieta varia com o desafio a que o sistema

quer impor a vaca leiteira, assim como da fonte e digestibilidade do carboidrato.

Normalmente o CNF da dieta varia entre 30-40% MS, com uma taxa máxima de 45-50%.

Valores ótimos são entre 38-40%, aceitáveis entre 35- 38% e mínimo entre 25-30%, estes

últimos apesar de não ser acidogênicos, não são adequados para que as vacas expressem seus

méritos genéticos, e podem gerar risco de transtornos energéticos em vacas em início de

lactação. Também é importante limitar o conteúdo de concentrados amiláceos de rápida

degradabilidade, pois são altamente acidogênicos e de difícil sincronização com a

degradabilidade da fibra dietética. Ademais, o processamento dos grãos impacta nos

processos fermentativos. A degradação dos grãos é em forma decrescente maior nos grãos

úmidos, que finamente moídos, que esmagados, que triturados, que inteiros secos. Desta

forma, deve-se evitar o uso de grãos finamente moídos (milho e sorgo são exceção), por

apresentarem rápida degradabilidade. Da mesma forma, o tipo de carboidrato afeta a

degradabilidade, sendo maior em açúcares, que amido, que pectina, que celulose. E o tipo de

grão utilizado, sendo maior a degradabilidade da aveia, que trigo, que cevada, que milho, que

sorgo.

Como estimular a produção de saliva (efeito buffer) pelo uso de fibra efetiva e tamanho de

partículas? O principal estimulo para produção de saliva nos ruminantes é o consumo de eF,

que estimula a ruminação. Em torno de 60% das vacas ruminam 2 horas após a ingestão da

ração, e quando existe uma adequada quantidade de fibra na dieta a produção de saliva supera

180 L ao dia. Para garantir uma adequada ruminação, a ração deve conter fibra em detergente

neutro (FDN) maior a 28% (27-33% MS, NRC 2001), com um mínimo 15% FDN

133

proveniente de forragem (70–80% da FDN). Idealmente, no início da lactação deveria ter um

19% FDN proveniente da forragem, com no mínimo FDN efetivo de 21% MS, considerando

que a eF do concentrado é de aproximadamente 0,33 e a eF da forragem é de 1,0. Porém,

deve-se ter cuidado com a limitação física que o consumo de fibra representa quando se

atinge 1,1 a 1,2% do peso vivo em FDN de forragem no caso de multíparas, e a 0,78 % PV

na 1º semana da lactação no caso das primíparas. Como o FDN é um parâmetro químico e

não físico, também é fundamental considerar o tamanho das partículas de forragem. As

partículas longas têm 3 funções principais: 1. Estimular a ruminação e consequentemente a

manutenção do pH ruminal; 2. Formar uma camada flutuante que retêm as partículas menores

no rúmen, melhorando a degradabilidade ruminal; e 3. Aderir a parede ruminal estimulando

a absorção dos AGV pelas papilas ruminais. Para que a fibra estimule a ruminação deve

conter partículas longas entre 2 cm e 7 cm, e por regra, um 20% das partículas da forragem

deveriam ter mais de 3,75 cm. Partículas maiores a 7 cm, estimulam a seleção por parte da

vaca.

Uma forma de avaliar o tamanho das partículas de forragem é mediante a o uso do separador

de partículas (peneira) Penn State. O objetivo da peneira é avaliar a quantidade partículas

longas assim como a distribuição das partículas da ração por tamanho, permitindo verificar

a eficiência do sistema de mistura do vagão de alimentação em dietas frescas. A peneira

também pode ser utilizada na avaliação da seletividade dos animais, quando usada para

avaliar as sobras do cocho em amostras pareadas com a dieta ofertada. Para o monitoramento

da dieta do rebanho, a avaliação da dieta com a peneira deveria ser realizada semanalmente,

após a distribuição da ração nos cochos (prévio a alimentação). Para avaliar o comportamento

de seletividade das vacas devem-se aferir os resíduos da ração às 4, 8, 12 horas depois da

alimentação. As duas bandejas superiores da peneira (19 e 8 mm de orifício) permitem

estimar a porcentagem de eF da dieta (Tabela 2).

134

Tabela 2. Recomendações para o tamanho de partículas de forragem e TMR na peneira Penn State

(Hutiens, 2012)

Tamiz

Silagem de milho

(processada) 20

mm

Silagem de milho (não

processada) 10 mm

Silagem

pré-secada TMR

Peneira 19 mm > 10 < 5 > 20 > 10

Peneira 8 mm > 60 >50 40 a 50 40-50

Peneira 1,18 mm < 20 < 30 < 35 < 35

Fundo < 5 < 10 < 10 < 20

Quais aditivos nutricionais podem auxiliar na manutenção do pH ruminal? Em rebanhos

onde o uso de alimentos de alta densidade energética supera os 6 kg/vaca/dia, ou com

produções que superam os 20 L, faz-se necessário o uso de aditivos nutricionais que modulam

a fermentação e colaboram na manutenção do pH ruminal. Entre os aditivos nutricionais

temos os: 1. Químicos, como os buffers ruminais [NaHCO3] e alcalinizantes ruminais

[MgO]); 2. Antibióticos (ionóforos [monensina, lasalocida], virginamicina e tilosina); 3.

Microbianos, como os extratos de leveduras, leveduras vivas de Saccharomyces cerevisiae,

Aspergillus oryzae, probióticos (Selomonas ruminatium, Megasphera elsdenii, Enterococcus

faecium, Lactobacillus plantarum).

1. Químicos. Os tampões e alcalinizantes afetam a fermentação ruminal porque mantêm por

mais tempo ao longo do dia o pH ruminal a valores superiores a pH 6,0. Consequentemente

melhoram a degradação da fibra, especialmente em dietas com muita silagem (pH< 4,0),

dietas muito úmidas, forragens finamente picadas, alto uso de concentrado, grãos finamente

moídos, e concentrado fornecido em poucas refeições ao longo do dia. Normalmente tem-se

utilizado o bicarbonato de sódio associado ao óxido de magnésio, na proporção de 3:1, na

concentração de 2% no concentrado ou 1 % na dieta total. Recentemente têm surgido alguns

produtos tamponantes compostos por conchas marinhas.

2. Antibióticos. Entre eles temos os ionóforos (monensina, lasalocida) e a virginamicina. Eles

atuam modificando o transporte de íons na membrana celular das bactérias Gram-positivas,

como Streptococcus bovis e Lactobacillus sp, favorecendo as bactérias produtoras de

propionato. A ação deles permite melhorar a degradabilidade da fibra e auxiliam na

manutenção do pH ruminal, reduzindo o risco de acidose. Também favorecem o metabolismo

energético e nitrogenado, de modo que tendem a aumentar a produção láctea. Os resultados

dos antibióticos nas vacas dependem da dieta, e da forma da entrega deles na dieta, tendo

135

melhores resultados quando entregues não misturado no alimento (sobre o alimento) quando

comparado ao uso em TMR.

3. Probióticos. As leveduras vivas atuam mediante competição com a Streptococcus bovis

pela glicose, reduzindo a disponibilidade deste substrato, além consumir o O2 ruminal que é

tóxico para a flora fibrolíticas. Como efeito, diminuem a produção do ácido láctico,

auxiliando na manutenção do pH ruminal. Seus efeitos são observados especialmente quando

o conteúdo de carboidratos rapidamente fermentáveis da dieta é a alto.

Finalmente, apesar de na atualidade existir uma ampla gama de alternativas para modular a

fermentação ruminal, o uso delas depende do manejo, dieta e custo-benefício. Nenhuma

estratégia de prevenção é eficaz quando utilizada de forma isolada e sem monitoramento

constante e integral do sistema produtivo.

Referências

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feeding pattern and live yeast supplementation. Anim. Feed Sci. & Tech. 136, 146-153.

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ruminal en vacuno lechero. En: XXI Curso de Especialización FEDNA, Madrid, España.

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Krause KM, GR Oetzel. 2006. Understanding and preventing subacute ruminal acidosis in dairy herds: a

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819S-823S.

136

Manejo nutricional da vaca leiteira para otimizar a composição do leite

Jessica Karina Poncheki

Jorge Henrique Carneiro

Rodrigo de Almeida

Certamente a comercialização do leite é a principal fonte de renda da maioria das

propriedades leiteiras, sendo de suma importância o volume de leite produzido. Porém, assim

como já ocorreu em vários países de pecuária leiteira mais desenvolvida, há uma crescente

tendência pela remuneração por composição e qualidade do leite, e não apenas por volume

de leite produzido. Mesmo não sendo ainda uma realidade nacional, a remuneração com

bonificações e penalizações pelos teores de sólidos no leite (teores de gordura e proteína) e

sanidade (Contagem Bacteriana Total - CBT e Contagem de Células Somáticas - CCS) já é

uma realidade que ocorre, por exemplo, em vários laticínios e cooperativas progressistas nas

regiões Sul e Sudeste do Brasil. Atualmente, um bom produtor que entrega seu leite ao pool

ABC na região centro-oriental do Estado do Paraná, pode receber mais de R$0,30 de

bonificações por litro de leite sobre o preço base mensal (R$0,88 + R$0,30 = R$1,18/L).

Essas novas formas de remuneração seguem as demandas e exigências de mercado. O que se

tem observado em vários países, inclusive no Brasil, é um maior interesse dos consumidores

em adquirir produtos mais saudáveis. No que diz respeito à cadeia de lácteos, vem ocorrendo

a princípio uma crescente busca por produtos com menores teores de gordura e maiores teores

de proteína. Mesmo isto sendo verdade, é até curioso constatar que o consumidor de lácteos

(no mundo inteiro) é normalmente um pouco incoerente ou até hipócrita ao consumir leite e

derivados, pois se por um lado cada vez mais se consome leite fluido desnatado ou

semidesnatado, nunca se consumiu tanto queijo, sorvetes e outros lácteos com altos teores de

gordura. É por isso que muitos laticínios mantêm as premiações por gordura altas nos

sistemas vigentes de pagamento de leite por qualidade. Reconhecidamente, a gordura é o

sólido do leite que possui maior variabilidade, ou seja, é fortemente impactado pelas práticas

de alimentação e manejo do rebanho. As ocorrências de queda na gordura do leite, muito

comuns em todo o Brasil, particularmente em rebanhos de mediana ou alta produtividade

onde a inclusão de concentrado é mais alta, são tipicamente provocadas por falta de fibra

efetiva na dieta, excesso de amido, ou por ambos os fatores concomitantemente.

137

Tem-se observado uma crescente importância dos teores de proteína do leite, principalmente

em propriedades com sistemas de pagamento do leite por qualidade. Além da variabilidade

mediana, outra dificuldade de incrementar o teor de proteína do leite é a correlação negativa

com os teores de gordura do leite. Em outras palavras, práticas nutricionais e de manejo que

tipicamente aumentam os teores de proteína, diminuem os percentuais de gordura. Entre as

práticas mais relevantes neste incremento de proteína destacaremos o aumento nos teores de

amido da dieta. Outro fator de grande importância no monitoramento é a implantação de

análises rotineiras do leite, tanto amostras individuais de vacas, como amostras de tanque,

para o nitrogênio ureico do leite (NUL), popularmente conhecido como “ureia do leite”. Este

parâmetro nos dá uma ideia do sincronismo do metabolismo proteico e de carboidratos no

rúmen. O ideal são valores intermediários de ureia no leite, entre 10 a 14 mg/dL. Embora

alguns outros fatores ambientais possam afetar este parâmetro, tipicamente quando os valores

de NUL estão abaixo de 10 mg/dL, imediatamente pensamos numa dieta com carência de

proteína bruta (PB). Por outro lado, quando os valores de NUL estão acima de 14 mg/dL,

checamos se os níveis de proteína dietética não estão excessivos e/ou os níveis de amido da

dieta não estão baixos demais. Uma ferramenta adicional que pode auxiliar a identificação

de erros de manejo é a relação (%) gordura/proteína (G/P) do leite. Em toda a lactação,

quando a proporção de vacas com relação G/P invertida for alta (muitas vacas produzindo

menos gordura do que proteína), nos auxilia num provável diagnóstico de subacidose

ruminal. Por outro lado, principalmente nos primeiros 30 dias pós-parto, se a relação G/P for

muito alta (acima de 1,40 na raça Holandesa), isto é indicativo de cetose subclínica ou clínica,

pois neste caso, muito ácidos graxos oriundos da lipomobilização do tecido adiposo da vaca

recém parida são transferidos para o leite.

Genética, componentes e volume de leite

Mudanças na composição do leite através da genética são obtidas a longo prazo,

principalmente pelo longo intervalo de gerações na espécie bovina, se comparadas às

alterações produzidas por práticas de nutrição e de manejo, que geralmente ocorrem de forma

quase imediata. Por outro lado, as mudanças obtidas pela genética são permanentes, ao

contrário das alterações proporcionadas pelas práticas de nutrição, que são transitórias. Entre

os componentes do leite, a gordura apresenta a maior variabilidade, com mediana

138

variabilidade para a proteína e menor para a lactose. Segundo dezenas de publicações

científicas, as produções de gordura e de proteína apresentam medianas herdabilidades

(h2=0,25 a 0,30), enquanto que as porcentagens de gordura e de proteína apresentam altas h2

(0,45 a 0,50). Mas apesar das altas herdabilidades, selecionar para altas porcentagens de

gordura e de proteína pode causar problemas, em função das porcentagens serem

negativamente correlacionadas com o volume de leite.

Composição do leite e diferenças entre raças

A composição normal do leite bovino, usando como exemplo a típica composição do leite

da vaca Holandesa, contém cerca de 12,5% de sólidos (Tabela 1). A composição do leite

considerada normal para vacas leiteiras pode variar em função da raça dos animais. A raça

Holandesa apresenta menores percentuais de sólidos, mas maiores produções totais de

gordura e proteína. As raças Jersey e Pardo-Suíço, apesar dos altos percentuais de gordura e

proteína, apresentam produções totais destes componentes ligeiramente inferiores aos

encontrados na raça Holandesa. Além de características raciais e genéticas, as técnicas de

manejo, condições climáticas e principalmente a nutrição podem alterar a composição do

leite. Por se tratar de um fator econômico oneroso para produção de leite e causar grandes

impactos sob o volume de leite produzido e seus teores proteicos e lipídicos, a nutrição de

bovinos leiteiros é alvo de discussões já a longa data por pesquisadores, técnicos e

produtores.

Tabela 1. Composição normal do leite de vaca

Componentes % Subcomponentes

Água 87,5 Vitaminas hidrossolúveis

Lactose 4,7 Dissacarídeo não encontrado em outros

alimentos

Gordura 3,5 Mais de 400 ácidos graxos e vitaminas

lipossolúveis

Proteína 3,2 77% caseína, 17% proteínas do soro e 6%

NNP

Minerais 0,8 Macro e microminerais, com destaque para

o cálcio

Outros 0,2 Enzimas, hormônios e outros

139

Depressão da gordura do leite

Os principais sólidos do leite são proteína, lactose e gordura (Tabela 1), sendo que este último

é o mais suscetível a variações por meio de nutrição e práticas de manejo alimentar. Neste

caso, o problema mais frequentemente observado é a depressão da gordura do leite (DGL).

Existem dois grupos principais de dietas que podem causar DGL. O primeiro grupo envolve

dietas que fornecem grandes quantidades de carboidratos prontamente digestíveis e reduzidas

quantidades de componentes fibrosos, tais como dietas com alta proporção de grãos e baixa

proporção de forragem. Dietas onde o nível de fibra é adequado, mas a fonte de fibra é

peletizada ou está demasiadamente picada também são incluídas nesta categoria, já que estes

processos reduzem a capacidade da fibra de manter a atividade normal do rúmen (fibra

efetiva). Os teores adequados de fibra na dieta de bovinos são primordiais para um adequado

desempenho ruminal e manutenção de seu pH. Diferentes proporções entre forragem e

concentrado na dieta acarretam distintos teores de fibra em detergente neutro (FDN), fibra

em detergente ácido (FDA) e fibra bruta (FB), em respostas ruminais distintas e em

produções de ácidos graxos de cadeia curta em proporções variadas (Tabelas 2 e 3). Os teores

adequados de FDN e de FDN fisicamente efetivo (FDNfe) são responsáveis pela estimulação

dos movimentos ruminais e ruminação. Quanto mais o animal mastigar o alimento

(proporcionado pelo ato de ruminar), maior será a produção de saliva, que contém substâncias

tamponantes, auxiliando na manutenção do pH ruminal.

Tabela 2. Influência das diferentes proporções de forragem e concentrado nas

respostas do rúmen (Davis, 1967)

Proporção

forragem/concentrado

Ruminação

(min/dia)

Tampão na

saliva (kg/dia) pH do rúmen

100/0 960 2,4 7,0

80/20 940 2,3 6,6

60/40 900 2,2 6,2

40/60 820 2,1 5,8

20/80 660 1,9 5,4

0/100 340 1,5 5,0

140

Tabela 3. Influência das diferentes proporções de forragem e concentrado na

produção de ácidos graxos voláteis (Davis, 1967)

Proporção

forragem/concentrado

Acetato

(%)

Propionato

(%)

Relação

acetato/propionato

100/0 70 18 3,9

80/20 67 20 3,4

60/40 64 22 2,9

40/60 58 28 2,1

20/80 48 34 1,4

0/100 36 45 0,8

Por décadas acreditou-se que a queda nos teores de gordura do leite era devida à escassez do

acetato ruminal, principal precursor da síntese de gordura do leite na glândula mamária. De

fato, quando analisamos em valores relativos, observa-se uma redução na quantidade de

acetato. Entretanto, vários trabalhos publicados na década passada, como Bauman & Griinari

(2003), aboliram essa teoria. Os autores avaliaram o fornecimento de dietas contendo baixa

fibra e seus efeitos sobre a produção de leite, gordura e ácidos graxos voláteis comparados a

um grupo controle. Os resultados demonstraram que houve redução na produção (g/dia) e no

teor (%) de gordura no leite, mas que a produção diária de acetato não foi alterada, ao

contrário do propionato que foi produzido em quantidades bem acima (13,3 vs. 31,0

moles/dia) dos níveis encontrados na dieta controle (Tabela 4).

Tabela 4. Ácidos graxos voláteis no rúmen e depressão da gordura do leite em dietas

de baixa fibra

Variáveis Controle Baixa fibra

Produção leite (kg/dia) 19,1 20,9

Produção gordura (g/dia) 683 363*

Gordura (%) 3,6 1,7*

Acetato (%) 67 46*

Propionato (%) 21 46*

Acetato (moles/dia) 29,4 28,1

Propionato (moles/dia) 13,3 31,0*

* Diferenças significativas entre controle e baixa fibra

141

As características físicas dos alimentos volumosos e concentrados, o modo de fornecimento

do alimento, a frequência de alimentação, bem como a competição dentro do lote, afetam

diretamente o consumo e o ambiente ruminal, que por sua vez pode refletir em uma redução

do teor (%) e da secreção (kg/dia) de gordura do leite. A fibra dietética deve conter um

tamanho mínimo para estimular a ruminação e consequentemente a produção de tamponantes

pelo animal. Caso este tamanho mínimo não seja atendido e a efetividade física da fibra esteja

comprometida, podemos ter problemas de DGL. Devido à importância deste assunto,

discutiremos o tema mais adiante separadamente. Características físicas e de processamento

dos alimentos concentrados também são relevantes para a manutenção da gordura do leite.

Processos como moagem fina ou a ensilagem de certos materiais promovem um aumento

expressivo na digestibilidade destes ingredientes, disponibilizando para o ambiente ruminal

carboidratos mais prontamente disponíveis e rapidamente fermentáveis, como por exemplo,

grão de milho moído (fubá) e silagem de grão úmido de milho. Situações em que sementes

de oleaginosas são processadas em demasia ou simplesmente processadas, ocasionam a

liberação do óleo contido na semente (muitas vezes rico em ácidos graxos poli-insaturados,

como o linoleico) dentro do rúmen, sendo um fator predisponente a DGL. Esta situação pode

ser observada ao processar soja integral excessivamente tostada, ou simplesmente pela

quebra do caroço de algodão antes do fornecimento aos animais.

O segundo grupo de dietas que induzem a DGL são suplementos dietéticos contendo óleos

poli-insaturados, tais como óleos de origem vegetal e de origem marinha. Como a

suplementação de óleos de origem marinha é restrita pela proibição imposta pelo Ministério

de Agricultura (MAPA) por conta da encefalite espongiforme bovina (BSE), nossa

preocupação deve ser direcionada aos óleos de origem vegetal e em particular às gorduras

com altas proporções do ácido linolénico (C18:2), tais como o óleo de soja e produtos

derivados. Em ruminantes, os lipídios presentes na dieta são extensivamente alterados pelos

microrganismos do rúmen (Jenkins, 1993). Esta alteração é uma consequência da

biohidrogenação dos ácidos graxos poli-insaturados presentes na dieta, um processo que

tende a tornar a gordura do leite mais saturada, mas que também resulta na formação e

secreção de inúmeros ácidos graxos do tipo trans no leite, com destaque aos isômeros de

CLA (ácido linoleico conjugado) cis-9 trans-11 e trans-10 cis-12. Devido a estas e outras

142

transformações que ocorrem no rúmen, mais de 400 tipos de ácidos graxos já foram

identificados na gordura do leite de bovinos. Os ácidos graxos presentes em maior

concentração são o ácido palmítico (C16:0) e o ácido oleico (C18:1 cis-9), sendo que a soma

dos dois representa cerca de 50% do total. Os ácidos graxos secretados no leite podem ter

duas origens: síntese de novo nas células epiteliais mamárias ou circulação sanguínea. Ácidos

graxos de cadeia curta (4-8 carbonos) e média (10-16 carbonos) são sintetizados quase que

exclusivamente pela síntese de novo na glândula mamária, predominantemente a partir do

acetato (produto da degradação de carboidratos estruturais no rúmen). Em contrapartida, os

ácidos graxos de cadeia longa, com 18 ou mais carbonos, são oriundos exclusivamente da

circulação (dieta ou lipomobilização). Várias teorias têm sido propostas para explicar a DGL

induzida pela dieta, e alterações nos processos microbianos do rúmen são a base de todas

estas teorias. A concentração molar de acetato diminui, a de propionato aumenta e, por

consequência, a relação acetato:propionato cai drasticamente (Tabela 4). Entretanto, embora

a proporção molar de acetato seja reduzida, a produção de acetato (moles/dia) não é afetada.

Portanto, a redução na relação acetato:propionato é uma consequência da maior produção de

propionato. Uma vez que a produção de acetato não é reduzida em dietas com baixa fibra,

esta teoria foi abolida, pois ela não poderia explicar a DGL.

A teoria mais aceita atualmente para explicar a DGL é conhecida como teoria da

biohidrogenação ou teoria dos ácidos graxos trans. Esta teoria postula que a DGL não é

causada pela escassez de precursores lipogênicos para a glândula mamária. Ela afirma que a

síntese mamária da gordura do leite é inibida diretamente por tipos específicos de ácidos

graxos, produzidos a partir da biohidrogenação parcial dos lipídios da dieta sob certas

condições ruminais. A queda no pH ruminal (proporcionada pelo fornecimento de dietas de

baixa fibra fisicamente efetiva ou excesso de carboidratos rapidamente fermentáveis) altera

as rotas de biohidrogenação ruminal, produzindo um ácido graxo específico, chamado de

CLA trans-10 cis-12, cuja concentração aumenta significativamente no leite de vacas com

DGL. Estudos posteriores, onde este isômero de CLA foi sintetizado industrialmente e

suplementado a vacas em lactação, comprovaram sua grande capacidade de reduzir a

secreção de gordura do leite, mas também de potencialmente incrementar o desempenho

reprodutivo (Bernal-Santos et al., 2003, Castañeda-Gutierrez et al., 2007). De grande

relevância, estudos recentes demonstraram que a formação do CLA trans-10 cis-12 no rúmen

143

só ocorre quando duas condições estão presentes: baixo pH ruminal (ex.: dietas de baixa

fibra) e presença de lipídios poli-insaturados na dieta (ex.: dietas suplementadas com grãos

de oleaginosas, óleo de milho, sais cálcicos de ácidos graxos a partir do óleo de soja, entre

outros). A ausência de qualquer uma dessas condições não resultará em DGL. Muitas

pesquisas têm enfocado no aumento da quantidade de ácido linoleico conjugado (CLA) e de

ácido transvaccênico (trans-11 C18:1) na gordura do leite pelos benefícios relatados na saúde

humana. Segundo Whitlock et al. (2002) certos isômeros de CLA, especialmente o cis-9,

trans-11, têm sido relacionados a propriedades anti-carcinogênicas, além de

antiaterosclerose, antitrombótico, hipocolesterolêmico, prevenir a diabetes mellitus e

apresentar efeito imunoestimulatório. Outros isômeros de CLA, incluindo o trans-10, cis-12,

parecem ainda possuir propriedades antiobesidade.

Monitoramento do FDN e do FDNfe da dieta

Respeitar as recomendações e exigências de FDN e FDNfe de vacas leiteiras em suas diversas

fases produtivas, são essenciais para a manutenção do pH ruminal, favorecendo assim a

fermentação microbiana e a biohidrogenação adequada de ácidos graxos poli-insaturados, ou

seja, sem a formação de CLA trans-10, cis-12, evitando a DGL. As recomendações do

penúltimo NRC para bovinos leiteiros (1989) sugeriam que a dieta de bovinos leiteiros

deveria conter no mínimo 28% de FDN e 21% de FDA. Para vacas de alta produção a

recomendação era de no mínimo 25% de FDN e 19% de FDA, e que 75% da FDN total da

dieta deveria ser proveniente de forragem. Por conta do uso crescente de subprodutos fibrosos

nas dietas de vacas leiteiras, Mertens (1997) e o NRC (2001) estabeleceram que o valor

efetivo médio do FDN não forragem é de 50% do FDN forragem. Desta forma, as

recomendações seguem a seguinte regra: para cada redução de 1% no FDN forragem abaixo

de 19%, a concentração do FDN total da dieta deve aumentar em 2%, enquanto que a %CNF

(carboidratos não fibrosos) deve diminuir em 2% (Tabela 5). Segundo as recomendações do

NRC (2001), os valores para FDN, FDA e CNF sugeridos são válidos quando três condições

específicas são observadas: uso de dieta total misturada (TMR), tamanho de partícula

adequado e o milho moído como a fonte predominante de amido utilizado na dieta. Em outras

palavras, o NRC (2001) sugere que a concentração de FDN na dieta deve ser

conservadoramente mais alto quando se usa forragem excessivamente picada ou processada

144

e em dietas que contenham altas proporções de subprodutos ricos em FDN não forragem, tais

como casquinha de soja, refinazil ou polpa cítrica. As recomendações de FDN podem sofrer

ajustes em função de aspectos qualitativos da dieta, tais como fontes de amido disponíveis,

tamanho de partícula da forragem, fibra efetiva da dieta, suplementação de tampões e do

manejo alimentar adotado.

Tabela 5. Exigências de carboidratos estruturais segundo o NRC (2001)

Mínimo

FDN

Forragem

Mínimo

FDN Dieta

Máximo

CNF Dieta

Mínimo

FDA Dieta

19 25 44 17

18 27 42 18

17 29 40 19

16 31 38 20

15 33 36 21

Tratando-se de diversas fontes de amido, as exigências de FDN aumentam quando a

disponibilidade do amido no rúmen aumenta. Essa maior ou menor disponibilidade de amido

no rúmen é relevante quando se compara fontes diferentes desse nutriente, como por

exemplo: grãos moídos vs. grãos quebrados, grãos floculados vs. grãos secos, grãos de alta

umidade vs. grãos secos, grãos de cereais de inverno vs. milho, e assim por diante. O conceito

de FDNfe surgiu para atender a exigência mínima de fibra que mantém a porcentagem de

gordura no leite em níveis adequados. No ambiente ruminal sabe-se que nem todo FDN

presente na dieta tem atividade efetiva no rúmen e no metabolismo animal, ou seja, podem

não apresentar características físicas desejadas (tamanho e densidade de partículas), estímulo

a atividade de mastigação e produção de saliva, manutenção de pH e neutralização de ácidos

produzidos no rúmen. Mertens (1997) propôs um método para calcular o FDNfe, o qual

considera a %FDN na dieta e a quantidade de partículas retidas em uma peneira de 1,18 mm

(FDNfe = %FDN x fef). O fator de efetividade física varia de 0 a 1. Não é incomum a

existência de alimentos com quantidades de FDN muito semelhantes, mas que apresentem

valores completamente diferentes de efetividade física. As exigências de FDNfe para bovinos

145

leiteiros não foram definidas pelo NRC (2001). Mertens (1997) estimou que a exigência de

FDNfe para vacas leiteiras é de 22%MS para manter um pH ruminal de 6,0 e de 20%MS para

manter o teor de gordura no leite em 3,4%. Na nossa experiência, ao formular dietas em

rebanhos leiteiros paranaenses, tentamos respeitar o limite de 21% de FDNfe para dietas de

vacas leiteiras de alta produção, desde que os níveis de amido não sejam excessivos (até

27%MS). Em uma Invited Review muito citada e até premiada de Zebeli et al. (2012),

publicada no Journal of Dairy Science, estes autores questionaram o uso da peneira de 1,18

mm na estimativa do FDN fisicamente efetivo, e sugeriram a peneira anterior de 8 mm.

Perante esta nova recomendação, Zebeli et al. (2012) recomendaram FDNfe > 8mm entre

18,5 (para não reduzir o pH ruminal aquém de 6,2) e 14,9% (para não limitar a ingestão de

MS). Avaliar o tamanho de partícula na dieta é fundamental para garantir a efetividade da

fibra e evitar que os animais selecionem alimentos mais concentrados. Muitas vezes a

preocupação por parte do nutricionista e do produtor, ou ambos, é tão grande para atingir

níveis mínimos de partículas fisicamente efetivas que acabam pecando pelo excesso.

Diversos trabalhos demonstram que vacas têm capacidade de selecionar partículas de

forragem maiores que 5 cm de comprimento. Quando a dieta total está muito “grosseira”, ou

seja, com fibras excessivamente longas, damos a possibilidade de os animais selecionarem o

alimento. O mais comumente observado na literatura e no campo é o comportamento de

seleção contra a fibra e a favor do concentrado. Quando este fato ocorre, o fluxo de nutrientes

para o rúmen passa a ser distinto ao longo do dia, sendo que no momento logo após o

fornecimento da dieta os animais ingerem grandes quantidades de concentrado, e a fibra

passa a ser ingerida apenas em períodos mais distantes. Quanto mais acentuada for esta

seleção, mais intensa será a queda do pH ruminal e consequentemente maior o risco de DGL.

Para reduzir este processo seletivo, algumas medidas devem ser tomadas, como por exemplo,

a picagem da forragem entre 2,5 e 5 cm. Dietas muito secas, acima de 50-55% MS, também

facilitam a seleção, já que as partículas estão mais soltas na mistura. A adição de água na

mistura pode ser um recurso para reduzir este comportamento, incluindo a água como

ingrediente na formulação de modo que as dietas tenham entre 40-45% MS. Esta prática

agrega mais partículas finas oriundas de ingredientes concentrados às forragens, dificultando

a triagem. O fornecimento da dieta na forma de TMR (ração total misturada) é uma das únicas

práticas nutricionais que permite o aumento concomitante da produção de leite, da

146

porcentagem de gordura e da porcentagem de proteína. Porém a homogeneidade da TMR

também é determinante para reduzir a seleção. Claramente, dietas pouco homogêneas são

mais facilmente processadas pelos animais.

Diversos pontos de manejo durante o preparo da dieta devem ser monitorados para um bom

resultado:

Tempo de mistura: tempos de mistura entre 3 e 8 minutos são suficientes para a promoção de

uma boa homogeneidade sem prejudicar em demasia o tamanho da fibra;

Ordem de carregamento dos ingredientes no misturador: como recomendação geral, fenos e

silagens pré-secadas devem ser incluídas primeiramente no vagão misturador, seguido de

concentrados e minerais, posteriormente a silagem de milho e, se houver, a adição de

líquidos;

Sobrecarregamento do equipamento: os misturadores são projetados para trabalhar com certa

carga, ou seja, carga acima ou abaixo do recomendado pode comprometer a eficiência do

vagão. Entre 60 e 80% da carga máxima permitida pelo fabricante para aquele modelo

específico deve ser preenchida para a obtenção de uma boa mistura.

Para determinar se o rebanho contém problemas de seleção, a utilização do conjunto de

peneiras Penn State pode ser utilizada como ferramenta. Basicamente, a distribuição das

partículas no conjunto deve ser obtida logo após a distribuição do alimento no cocho, sem

que os animais tenham tido acesso, e minutos antes do próximo trato ou da retirada da sobra

diária. Como indicativo de ausência de seleção excessiva, a diferença entre as proporções

retidas na peneira de 19 mm da dieta oferecida e das sobras não deve ser superior a 10%.

Fatores relacionados ao manejo alimentar como espaçamento de cocho, número de tratos

diários e aproximação da dieta têm sido relatados na literatura como possíveis impactantes

no teor de gordura do leite. Diversos estudos têm demonstrado que a redução do espaço

individual no cocho modifica completamente o comportamento alimentar dos animais,

aumentando a seleção do alimento, reduzindo o tempo de alimentação diária, o número de

visitas no cocho e principalmente o consumo de matéria seca. Em vacas de alta produção

onde o consumo de MS é determinante para a produção de leite, a redução do consumo e,

consequentemente, do aporte de nutrientes é completamente indesejável. Sova et al. (2013)

observaram em seu estudo com fazendas comerciais que a cada 10 cm a mais de espaço linear

de cocho houve um incremento de 0,06 pontos na porcentagem de gordura do leite. Fornecer

147

um espaçamento na linha de cocho de mínimo de 70 cm por animal, utilizar canzis ou algum

outro tipo de contenção podem ser boas práticas para reduzir a competição. É comum

observar em rebanhos que existe superlotação e consequentemente competição entre os

animais, que os teores individuais de gordura do leite dentro do mesmo lote são

extremamente variáveis, com vacas de percentual de gordura muito baixos (animais

dominantes que chegam primeiramente no cocho e se alimentam de uma dieta pouco

selecionada, ainda rica em concentrados), e outros com valores muito elevados (animais

inferiores na hierarquia do lote e que se alimentam por último, quando a quantidade de fibra

da dieta já é mais alto devido a seleção prévia dos outros animais). O aumento na frequência

de fornecimento da dieta aos animais tende a incrementar os teores de gordura do leite,

devido a maior constância de alimentação ao longo do dia, reduzindo momentos de queda de

pH ruminal muito acentuados. Ganhos significativos em produção de leite não têm sido

relatados na literatura ao aumentar o número de tratos além de duas vezes ao dia, obviamente

em situações que não haja limitação do consumo de matéria seca. Economicamente,

aproximar a dieta mais frequentemente pode ser mais interessante que realizar diversos tratos,

uma vez que o custo operacional é muito menor e os ganhos em produção são pouco

expressivos.

O quadro de subacidose é caracterizado por pH ruminal abaixo de 5,8 e uma das prováveis

causas é a ingestão excessiva de carboidratos de rápida fermentação, decorrente de

desbalanceamento da dieta ou seleção do alimento por parte do animal. Alguns sinais podem

facilitar a identificação de acidose ruminal: consumos de MS e produções de leite variando

muito de um dia para outro, esterco com aspecto inconsistente, falta de ruminação, consumo

voluntário de bicarbonato, acidose sistêmica provocando laminite e depressão de modo geral

das vacas, além de obviamente queda nos teores de gordura do leite.

Outra forma de diagnosticar a ocorrência da DGL em um rebanho é monitorar a relação

gordura:proteína do leite. Os teores de gordura no leite apresentam maiores variações que os

teores de proteína, além de ser um componente que permite maior manipulação,

principalmente através da dieta. Portanto quando se diz que houve uma inversão entre a

relação G/P, o que provavelmente ocorreu foi uma redução nos teores de gordura no leite e

não um aumento nos teores de proteína. A relação G/P no leite considerada ideal para a raça

Holandesa é de 1,1, mas valores entre 1,0 e 1,2 são aceitáveis. Se em um rebanho mais de

148

10% das vacas em lactação apresentarem 0,2% de gordura abaixo do teor de proteína

(exemplo 2,8%G e 3,0%P) isso pode ser um indício de acidose no rebanho e/ou

desbalanceamento da dieta.

Impacto do aumento dos níveis de PB da dieta e nitrogênio ureico no leite

A proteína é um nutriente essencial para a produção de leite e influencia a ingestão de

alimentos pelo animal. No leite de vacas, a proteína verdadeira constitui cerca de 94% do

nitrogênio total e o restante é representado pelo nitrogênio não proteico (NNP). O

monitoramento dos teores de nitrogênio ureico no leite (NUL) é uma ferramenta que tem se

tornado cada vez mais utilizada, por estar diretamente relacionada ao teor proteico e

energético da dieta e a excreção de N pelo animal. Tem-se buscado valores de NUL que

representem um ponto de equilíbrio entre ingestão de proteína e produção de leite sem

grandes perdas de N, ou seja, maior eficiência na utilização de N (EUN). Na última década,

a maioria das publicações norte-americanas passou a sugerir metas para NUL valores entre

8 e 12 mg/dL (Kohn et al., 2002; Rajala-Schultz & Saville, 2003), com algumas publicações

mais recentes sugerindo valores ainda menores, entre 7 a 10 mg/dL. No Brasil, nossa sugestão

é mais conservadora: valores entre 10 e 14 mg/dL parecem ser ainda os mais indicados

(Almeida, 2012; Doska et al., 2012). Embora vários rebanhos norte-americanos estejam

tendo sucesso em conciliar baixos níveis dietéticos de PB (inferiores a 16,0%PB) e baixos

valores de NUL (inferiores a 10 mg/dL) com altas produções de leite, acreditamos que no

Brasil a redução muito exagerada dos teores de PB das dietas poderão comprometer a

produção de leite. Esta distinção ocorre pela impossibilidade de uso de suplementos proteicos

de origem animal (naturalmente ricos em PNDR), pela não disponibilidade de suplementos

proteicos de origem vegetal com baixa degradabilidade ruminal, bem como pela não

popularidade na suplementação de aminoácidos sintéticos (metionina e lisina) em dietas

brasileiras.

O monitoramento mensal do NUL pode ser uma importante ferramenta no manejo de

rebanhos leiteiros, porque (1) o excesso no consumo de proteína (N) pode comprometer a

eficiência reprodutiva; (2) suplementos proteicos são ingredientes caros; e (3) excessos na

excreção de N têm um impacto ambiental negativo (Jonker et al., 1998). Entre as práticas

nutricionais que podem favorecer o aumento do NUL, podemos destacar: redução exagerada

149

dos níveis dietéticos de amido pela inclusão de fontes de carboidratos não amiláceos, como

casca de soja e polpa cítrica; o uso de silagem de milho “nova” (menos de três meses de

ensilagem); pastagens novas e muito adubadas, principalmente de inverno; pré-secado úmido

e com alto %PB; e fornecimento do grão de milho mais grosseiro (quebrado ao invés de

moído).

Impacto do estresse calórico na composição do leite

Animais da raça Holandesa são menos tolerantes a temperaturas mais elevadas que outras

raças leiteiras europeias, como Jersey e Pardo-Suíço, e muito menos tolerantes que

grupamentos raciais com sangue zebuíno, como Girolando e Gir Leiteiro. Vacas Holandesas

submetidas a estresse calórico reduzem sua produtividade de forma expressiva. Num

levantamento preliminar conduzido pelo nosso grupo de pesquisa (dados não publicados),

realizado em 26 rebanhos paranaenses em controle leiteiro oficial na região de Arapoti,

Paraná, a diferença entre o mês de maior produtividade média (setembro) e o mês de menor

produtividade média (fevereiro) alcançou 8 litros diários. O estresse calórico impacta

negativamente vários parâmetros na atividade leiteira, tais como produção de leite, qualidade

e composição do leite, saúde ruminal, crescimento e reprodução. St. Pierre et al. (2003)

estimaram as perdas da indústria leiteira norte-americana devido ao estresse calórico em 900

milhões de dólares anuais. Avanços no manejo com a adoção de práticas de resfriamento e

estratégias nutricionais podem amenizar alguns dos impactos negativos do estresse calórico

em bovinos leiteiros, mas as produções continuam a declinar nos meses mais quentes.

O mecanismo biológico pelo qual o estresse calórico impacta a produção e a reprodução é

parcialmente explicado pela depressão no consumo alimentar, mas também inclui outros

fatores tais como mudança no status endócrino, reduções na ruminação e na absorção de

nutrientes e aumento nas exigências de mantença. As reduções tanto nos teores de gordura

como nos de proteína verdadeira relatadas nas épocas mais quentes do ano pela indústria

leiteira norte-americana se situa entre 0,2 e 0,3%. Infelizmente desconhecemos a existência

de levantamentos similares pela indústria leiteira nacional. De acordo com Nayeri et al.

(2011) existem algumas estratégias que podem ser adotadas para minimizar o impacto do

estresse calórico na produção e composição do leite. Uma das mais tradicionais é aumentar

a densidade energética da dieta, seja pela redução de fibra, pelo aumento do concentrado ou

150

ainda pela suplementação de gorduras. Estas práticas devem ser adotadas com cuidado, pois

se aumenta a predisposição das vacas em estresse calórico à acidose ruminal. A manipulação

da Diferença Catiônica-Aniônica da Dieta (DCAD), buscando valores francamente positivos

durante a lactação (+20 a +30 meq/100 g MS), bem como o aumento nos níveis dietéticos do

mineral potássio no verão (1,4 a 1,6%MS) também têm sido sugeridos. Outras práticas

nutricionais e de manejo comumente recomendadas são o fornecimento preferencial de

alimento (60-70% da dieta) nas horas mais frescas do dia, a limpeza mais frequente dos

cochos com maior número de tratos diários, o fornecimento de concentrado mais parcelado

ao longo do dia e a inclusão de 2 a 2,5 kg de caroço de algodão.

Impacto de alguns aditivos nutricionais na composição do leite

Monensina

A monensina, assim como outros ionóforos, é um antibiótico produzido por fungos do gênero

Streptomyces cinnamonensis, com reconhecida eficácia nas explorações pecuárias. Os dados

de literatura são abundantes e extremamente consistentes para o efeito dos ionóforos, tanto

em bovinos de corte como em bovinos leiteiros. A maior parte dos experimentos foi

conduzida com monensina sódica. O efeito mais notório dos ionóforos é o aumento da

retenção de energia fermentada no rúmen devido a uma alteração no padrão de fermentação,

com maior produção de propionato (C3) em relação a acetato (C2) e decorrente diminuição

das perdas através do metano. Os ionóforos também parecem diminuir a degradação da

proteína ruminal e, portanto, reduzindo a degradação de peptídeos e aminoácidos e resultando

em menor produção de amônia. Por último, os ionóforos (particularmente a monensina)

diminuem a ocorrência de distúrbios metabólicos, como acidose e timpanismo, pela menor

concentração de ácido láctico e menor produção de mucopolissacarídeos que dão estabilidade

à espuma. Os efeitos nas produções de gordura e de proteína são heterogêneos e dependem

de fatores dietéticos. Em uma meta-análise que reuniu 36 artigos ou 77 experimentos

envolvendo monensina e dados de produção (Duffield et al., 2008), a suplementação com

monensina aumentou a produção de proteína e não apresentou efeito na produção de gordura.

Durante muito tempo atribuiu-se à menor produção de acetato no rúmen o efeito de redução

na gordura no leite, já que de fato o acetato é o principal precursor da gordura do leite. Mas

151

hoje se sabe que na realidade o efeito depressor da monensina na gordura do leite é explicado

pela diminuição das taxas de biohidrogenação dos ácidos graxos insaturados no rúmen, o que

contribui no aumento das concentrações do ácido linoleico conjugado trans-10 cis-12,

potente inibidor da síntese de gordura do leite na glândula mamária (Bauman & Griinari,

2003). Duffield et al. (2008) confirmaram que a suplementação com monensina aumenta a

proporção de ácido linoleico conjugado (CLA) no leite. Maiores consumos de fontes lipídicas

insaturadas na dieta e altas inclusões de monensina (ao redor de 400 ppm) exacerbam a

diminuição da gordura do leite com o tratamento com monensina. Dosagens recomendadas

de monensina para vacas em lactação estão entre 11-22 mg/kg de MS consumida, ou 250-

400 mg/vaca/dia (Hutjens, 2010). No Brasil, devido ao impacto negativo da monensina sobre

a gordura do leite e ao potencial decréscimo no consumo de ração, dosagens mais próximas

do limite inferior são sugeridas (11-15 mg/kg).

Leveduras

Leveduras vêm sendo fornecidas aos animais há mais de cem anos. Embora existam

aproximadamente 500 diferentes espécies de leveduras, a mais comum na suplementação dos

bovinos é a Saccharomyces cerevisiae. Segundo Santos & Greco (2012), de modo geral, o

efeito das leveduras vivas e cultura de leveduras se dá por alterações no ambiente ruminal,

com mudanças na população microbiana que favorecem o crescimento de microrganismos

celulolíticos e daqueles utilizadores do ácido láctico. De maneira geral, a adição de leveduras

a dieta de bovinos leiteiros resulta em aumento na ingestão de MS, estabilidade do pH

ruminal (utilização do ácido láctico), melhora a digestão de fibra no rúmen, aumenta a

produção de leite (entre 1 a 1,2 kg/dia), aumenta a concentração de gordura no leite e a

produção de componentes do leite (Santos & Greco, 2012). De acordo com os autores citados

anteriormente, a dose típica recomendada para bovinos leiteiros é de 1 a 2x1010 unidades

formadoras de colônias por dia para bovinos adultos. A conversão desses valores em

g/dia/animal depende da concentração de leveduras presentes no produto comercial, mas os

valores podem variar de 5 a 120 g/dia.

152

Aminoácidos metionina e lisina

A alimentação de vacas leiteiras especializadas baseia-se na oferta dos nutrientes exigidos

pelo animal de forma a atender suas necessidades adequadamente, sem que ocorra a falta ou

o excesso de algum nutriente. A proteína, quando em excesso na dieta, além de promover a

maior produção de fezes, também é responsável pela ineficiência de utilização do nitrogênio

para a produção de leite (Jonker et al., 2002). Com isso, torna-se imprescindível a utilização

de dietas adequadamente formuladas, principalmente quanto aos teores de proteína e seus

aminoácidos limitantes (metionina e lisina), que atendam às necessidades da vaca leiteira

especializada, resultando potencialmente em maior quantidade e qualidade de leite, redução

dos impactos negativos ao ambiente e diminuição dos custos com a alimentação (NRC,

2001). Robinson (2010) numa revisão de literatura que reuniu 54 experimentos comparando

a suplementação de lisina e/ou metionina com dietas controle, concluiu que a manipulação

das proporções de lisina e metionina da proteína duodenal pela suplementação de metionina

protegida, ou lisina combinada a metionina, apresentou efeitos positivos, mas modestos, na

melhoria do desempenho produtivo, bem como na redução do impacto ambiental de vacas

leiteiras. Robinson (2010) justificou os resultados argumentando que a contribuição da

proteína microbiana na proteína metabolizável é tão grande, e que o perfil de aminoácidos

desta proteína é tão similar com o perfil de aminoácidos das proteínas do leite, que mesmo

suplementando um aminoácido específico, o benefício gerado em resposta animal é

geralmente pequeno. Ainda assim, na meta-análise conduzida, o autor concluiu que a

suplementação com metionina aumentou em 1,3% a secreção de energia no leite, bem como

os teores de gordura (+1,1%) e de proteína (+2,3%) no leite, além de aumentar em 2,1% a

proporção de N dietético capturado como N no leite (eficiência de utilização do nitrogênio).

Em nossa opinião, há pelo menos três razões que limitam a inclusão de metionina análoga

em dietas de rebanhos leiteiros brasileiros: (1) a ainda restrita adoção de sistemas de

pagamento de leite por qualidade, (2) a falta de dados nacionais mostrando os benefícios da

inclusão dietética de metionina e (3) o pouco número de rebanhos de boa produtividade que

justificam a suplementação. Por outro lado, há no mínimo três razões que justificam a

inclusão da metionina análoga em rebanhos nacionais: (1) o fato de o farelo de soja (pobre

em metionina) ser o principal suplemento proteico em dietas de vacas leiteiras, (2) a proibição

(até exagerada) de suplementos proteicos de origem animal em dietas de ruminantes no Brasil

153

e (3) a limitada disponibilidade no mercado brasileiro de alimentos proteicos de origem

vegetal com baixa degradabilidade ruminal. Por conta da pequena disponibilidade de

suplementos proteicos com maiores valores de proteína não degradável no rúmen e da não

popularidade da suplementação de aminoácidos protegidos (metionina em particular), há no

Brasil uma cultura entre os nutricionistas de bovinos leiteiros que rebanhos ou lotes de vacas

de alta produção devem ser suplementados com altos teores de proteína bruta (ao redor de 17

a 18%PB). Não concordamos com esta excessiva margem de segurança, e acreditamos que

é possível trabalhar com valores menores (16 a 16,5%PB).

Bicarbonato de sódio e óxido de magnésio

Segundo o NRC (2001) compostos tais como bicarbonato de sódio e óxido de magnésio são

incorporados às dietas a fim de reduzir transtornos digestivos e manter o teor de gordura no

leite, principalmente quando as dietas são ricas em grãos (carboidratos de alta

fermentabilidade) e/ou pobres em ingredientes volumosos, fontes de fibra efetiva. Quando

corretamente suplementados, estes tampões estabilizam o pH ruminal em torno de 6,2

permitindo um máximo crescimento das bactérias celulolíticas. O óxido de magnésio, além

de ser fonte do macromineral magnésio, é um alcalinizante e parece atuar também na captura

de metabólitos sanguíneos pela glândula mamária, aumentando o teor de gordura no leite

produzido. A recomendação de inclusão do óxido de magnésio é de 1 parte deste alcalinizante

para cada 2-3 partes de bicarbonato de sódio. Assim, quando há suplementação de óxido de

magnésio, não se recomenda a exclusão do bicarbonato de sódio, mas sim a adição de ambos.

As recomendações de bicarbonato de sódio então entre 0,75-1,0% MS/dia, e de óxido de

magnésio em 0,25% MS/dia. Segundo Almeida & Ostrensky (2011), em rebanhos confinados

de mediana e alta produtividade, outra forma de suplementar bicarbonato de sódio às vacas

é fornecê-lo ad libitum, em cochos exclusivos, além do bicarbonato já fornecido às dietas.

Neste caso a função do bicarbonato ofertado nos cochos é de monitorar possíveis ocorrências

de acidose ruminal subaguda. Como animais sem acidose não consomem voluntariamente o

bicarbonato, quando isto acontece de maneira ávida por muitos animais, pode chamar a

atenção do produtor que a dieta está desequilibrada e que o nutricionista do rebanho precisa

reformular as dietas.

154

Gordura protegida

Gordura protegida ou gordura inerte ruminal é um sal cálcico de um ácido graxo (AG), ou

seja, um produto onde se combinam moléculas de AG com cálcio, para que o produto passe

pelo rúmen sem sofrer dano extensivo pela ação da flora ruminal e sem interferir com esta.

A ligação entre o cálcio e o AG não é quebrada por ação de enzimas microbianas e sim pelo

pH do meio. Segundo Almeida & Ostrensky (2011) para a produção deste sal cálcico de AG

podem ser utilizadas fontes de lipídios predominantemente saturados (como a gordura de

palma) ou insaturados (como os demais de origem vegetal, mas principalmente o de soja). O

efeito da suplementação de gordura protegida (na verdade, sais cálcicos de ácidos graxos)

para bovinos leiteiros demonstra resultados variáveis sobre a composição do leite,

dependendo da composição e da quantidade de gordura oferecida. A suplementação de

gorduras a base de ácidos graxos (AG) saturados é mais segura, pois estes são mais estáveis

no rúmen, portanto contribuem para a manutenção do teor de gordura no leite. As fontes ricas

em AG poli-insaturados são mais dependentes do pH ruminal para sua não dissociação e

consequente manutenção dos teores de gordura no leite. A explicação pela moderada

depressão da gordura do leite nos animais suplementados com sais cálcicos de AG de óleo

de soja é que os AG insaturados encontrados nesta fonte de gordura supostamente inerte não

são tão eficientemente protegidos contra a biohidrogenação parcial no rúmen, fato já

demonstrado por Chouinard et al. (1998). Mudanças na biohidrogenação destes AG

insaturados devem ter contribuído para a síntese do ácido linoleico conjugado trans-10 cis-

12, potente inibidor da síntese de gordura do leite na glândula mamária (Bauman & Griinari,

2003). Praticamente a totalidade dos experimentos consultados com suplementação de

gorduras resultou em redução na porcentagem de proteína (Rabiee et al., 2012),

principalmente da caseína. Esta redução pode ter impacto negativo nos atuais sistemas de

pagamento do leite por qualidade. Práticas para amenizar esta redução nos teores proteicos

do leite seria a suplementação com niacina, formulação de dietas com maiores níveis de

PNDR (proteína não degradável no rúmen) e suplementação de aminoácidos protegidos ou

análogos.

155

Somatotropina bovina

A condição nutricional das vacas tanto antes quanto durante a suplementação de

somatotropina bovina (bST) determina o efeito deste hormônio sobre as concentrações de

gordura e proteína no leite (NRC, 2001). Quando se faz uso de somatotropina bovina

associada a uma alimentação e manejo adequados e em balanço energético positivo, as

porcentagens de gordura, proteína, lactose, vitaminas e minerais não variam em animais

suplementados (St-Pierre et al., 2014). Porém, quando tais requerimentos não são atendidos

e o balanço energético negativo é prolongado, a porcentagem de gordura aumenta, a

porcentagem de proteína diminui e a composição das gorduras do leite é alterada, com maior

proporção de ácidos graxos de cadeia longa, oriundos da mobilização mais intensa das

reservas corporais (Bauman et al., 1989).

Relação gordura:proteína no leite e indicadores de cetose subclínica

Para Heuer et al. (1999) a relação gordura:proteína deve ser analisada a nível de rebanho; se

mais de 40% dos animais apresentarem valores abaixo de 1,0 ou acima de 1,4 o rebanho tem

grandes riscos de apresentar casos de acidose ou cetose, respectivamente. Nosso grupo de

pesquisa conduziu um estudo realizado em rebanhos paranaenses entre os anos de 2000 e

2013 (Poncheki, 2015). Foram avaliados 257.847 primeiros controles leiteiros mensais de

vacas que estavam em controle oficial. Este trabalho indicou que 63,5% das vacas no

primeiro controle leiteiro após o parto estavam com a relação gordura:proteína dentro dos

valores ideais. Valores abaixo de 1,0 sugerem uma depressão da gordura do leite, sendo que

neste banco de dados representaram 20,6% das avaliações. Quando nos deparamos com

valores acima de 1,4 refere-se a um aumento na proporção de gordura do leite, que pode ter

relação com quadros de cetose (clínica ou subclínica) e neste estudo representaram 15,9%

dos primeiros controles leiteiros após o parto avaliados. Estes quadros de relação

gordura:proteína acima de 1,4 podem ser mais evidenciados em situação de balanço

energético negativo (BEN), onde animais com BEN muito acentuado ou muito prolongado

mobilizam mais reservas corporais para manter a produção de leite. A gordura que é

mobilizada se direciona para a glândula mamária, onde irá compor a gordura do leite,

particularmente ácidos graxos de cadeia longa. Van Haelst et al. (2008) avaliaram se alguns

ácidos graxos específicos da gordura do leite podem ser usados na detecção precoce de cetose

156

subclínica. Vacas leiteiras recém paridas, diagnosticadas com cetose subclínica (BHB > 1,2

mmol/L), apresentaram elevadas proporções de C18:1 cis-9 na gordura do leite, conhecido

como ácido oleico. Ainda mais recentemente alguns serviços de controle leiteiro ao redor do

mundo, estão mensurando as concentrações de beta-hidroxibutirato (BHB) diretamente no

leite, em amostras de leite de vacas recém paridas (Van der Drift et al., 2012).

Resumo das práticas nutricionais e de manejo que afetam a composição do leite

Na Tabela 6 estão resumidas importantes práticas de nutrição e de manejo que podem afetar

tanto a produção de leite, como os teores de gordura e proteína.

Tabela 6. Práticas de nutrição e de manejo que podem afetar a produção de leite e seus principais

componentes (adaptado de Hutjens & Shanks, 1993)

Prática adotada kg leite % proteína % gordura

Maior consumo de MS ++ 0? 0?

Forragem, grãos - - +

Forragem, grãos + + -

Silagem de milho, pré-

secado + + -

Carboidratos não estruturais + + -

FDN/FDA - - +

Suplementos de gordura + - 0

Grãos mais frequentemente + + +

Proteína bruta mais alta + + 0

Proteína não degradável + + 0

Aminoácidos limitantes + + 0

Dieta total misturada (TMR) ++ + +

Grão úmido de milho + + -

Milho finamente moído + + -

Uso de tampões + 0 +

Conclusões

Nutrição, manejo e melhoramento genético são os principais meios de se alterar a

composição do leite. Mudanças na composição do leite através da genética são obtidas a

longo prazo quando comparadas às mudanças produzidas por práticas de nutrição e de

157

manejo, que geralmente ocorrem de forma quase imediata. Por outro lado, as mudanças

obtidas pela genética são permanentes, ao contrário das alterações proporcionadas pelas

práticas de nutrição, que são transitórias. Nutricionalmente, os teores de gordura e proteína

no leite são antagônicos. Assim, práticas nutricionais e de manejo que aumentam a produção

de leite também aumentam os teores de proteína do leite, mas por outro lado estas mesmas

práticas diminuem os teores de gordura do leite.

Considerações finais

O processo de valorização da qualidade do leite não pode ser negligenciado para uma data

futura. Se o sistema de pagamento aos produtores não for compatível com as exigências do

mercado consumidor, a sobrevivência de toda a cadeia produtiva do leite nacional estará

seriamente comprometida. A indústria de lácteos brasileira somente poderá competir com

outras bebidas (refrigerantes, sucos, água, cerveja, bebida de soja, etc.) se colocar à

disposição do mercado consumidor um produto seguro, nutritivo e saboroso.

Por fim, acreditamos piamente que os sistemas de pagamento de leite por qualidade vieram

para ficar. Cada vez mais, produtores que entregam leite com altos teores de gordura e de

proteína e baixas CCS e CBT, receberão premiações cada vez mais altas pelo seu leite. De

maneira oposta, produtores com leite de altas CCS e CBT e baixos teores de gordura e

proteína serão crescentemente penalizados. Por mais “cruel” que esta relação de mercado

pode parecer a alguns, esta tendência será positiva para o setor e principalmente para o

consumidor de lácteos brasileiro, pois neste momento “leite de qualidade” no Brasil passará

a ser a regra, e não mais a exceção.

Referências

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160

Fundamentos y aplicaciones para la alimentación proteica de vacas

lecheras

Cecilia Cajarville

La vaca lechera, y de manera más general, los rumiantes, poseen características digestivas

que hacen que el aprovechamiento de las proteínas de la dieta sea sustancialmente distinto

que en la mayoría de los animales. Los animales monogástricos y los humanos digieren la

proteína que consumen mediante enzimas presentes en el estómago y en el intestino delgado.

De esta forma, convierten la cadena proteica en subunidades más simples, los aminoácidos,

que son absorbidos en el intestino y son las unidades básicas que contribuyen a formar la

nueva proteína, que el animal utilizará para distintas funciones. Las enzimas presentes en el

tubo digestivo de los rumiantes son básicamente las mismas que en los monogástricos. El

rumiante también absorbe aminoácidos provenientes de la proteína digerida en el intestino,

y éstos son las unidades básicas para la formación de su propia proteína. Sin embargo, el

rumen, compartimento que retiene el flujo de los alimentos y que determina que todo lo que

ingresa al aparato digestivo sea sometido, en primer lugar, a un proceso de fermentación,

determina que las características de la digestión proteica sean radicalmente diferentes en los

rumiantes. En el compartimento ruminal se desarrolla una población microbiana (microbiota)

que mantiene con el rumiante una relación simbiótica y que le proporciona la oportunidad de

digerir la fibra de los alimentos. La microbiota ruminal es, en sí misma, la principal fuente

de proteína de alta calidad para los rumiantes. Una de sus características es la diversidad, y

está representada por bacterias (alrededor de 1010 UFC/ml) con más de 50 géneros, arqueas

(107-109 UFC/mL), protozoos (104-106/mL), hongos (103-105 zoosporas/mL) y bacteriófagos

(108-109/mL) (Kamra, 2005). El pasaje de las proteínas ingeridas por el rumen hace que éstas

sean sometidas a la acción de la microbiota, modificando sustancialmente su estructura y

determinando que la alimentación proteica de los rumiantes se realice sobre bases singulares

(Figura 1). La digestión de las proteínas en los rumiantes, incluye no sólo procesos de

degradación, sino también de formación de compuestos nuevos y síntesis. Conocer estos

procesos es útil para manipular la alimentación proteica de los rumiantes, por lo que a

continuación nos centraremos con más detalle en cada uno de ellos.

161

Figura 1. Esquema de la digestión de las proteínas por los rumiantes

Degradación de las proteínas en el rumen

Gran parte de la proteína que ingiere el rumiante se degrada a péptidos por acción de las

proteasas microbianas. La porción de proteína que no sufrió el ataque de los

microorganismos, seguirá su trayecto hasta el intestino delgado, donde será atacada por las

enzimas del animal, desdoblada hasta aminoácidos que serán absorbidos y utilizados para

formar las proteínas del animal y de los productos como la leche. Esta proteína es

denominada proteína de pasaje (by-pass). La cantidad de proteína de pasaje que proporciona

un alimento depende del tipo de proteína. Hay proteínas naturalmente más resistentes a la

degradación como las del maíz (zeína) y también la degradación depende de los tratamientos

a los que haya sido sometida esa proteína (Van Soest, 1994). En general, los tratamientos

térmicos (calor) que se realizan sobre los alimentos tienden a disminuir su degradación en el

rumen. A modo de ejemplo, las harinas animales, como la harina de pescado, tienen baja

degradabilidad ruminal, debido al tratamiento térmico recibido durante su elaboración

(FEDNA, 2010), por lo que se las considera una buena fuente de proteína de pasaje para los

rumiantes. La proteína que se degrada, lo hace primeramente a péptidos, que a su vez se

catabolizan formando aminoácidos libres. Esta degradación continúa y los microorganismos

desagregan los aminoácidos hasta amoníaco, ácidos grasos y CO2. El amoníaco formado es

utilizado por la población microbiana para sintetizar sus propias proteínas, aunque como se

verá luego, para que esta síntesis se produzca debe existir suficiente energía (carbonos), que

en general es aportada por carbohidratos. El amoníaco que no es captado por los

162

microorganismos se absorbe por las paredes del rumen, va al hígado y ahí es transformado

en urea. A su vez, parte de esa urea volverá al rumen a través principalmente de la saliva y

la que no se recicla se elimina por la orina y la leche. En nuestras latitudes, gran parte de la

producción lechera se realiza sobre pastoreo de praderas de gramíneas y leguminosas de

clima templado. Cuando son consumidas en el momento óptimo, tienen una composición

química caracterizada por niveles altos de proteína cruda (15-20%) y de fibras digestibles

(alrededor de 40 % de FND), pero que son de degradación relativamente lenta, y niveles de

carbohidratos de degradación rápida (azúcares) no muy altos (de 3-10%) (Sauvant et al.,

1995; Cajarville et al., 2007; Cajarville et al., 2015). A su vez, la proteína de estos forrajes,

es altamente soluble y de muy rápida degradación (Sauvant et al., 1995; Cohen, 2001;

Repetto et al., 2005), dando como resultado altas concentraciones instantáneas de amonio en

el rumen (Figura 2), que en buena parte son desaprovechadas y se excretan por orina y leche.

Debido a este desperdicio, actualmente se trabaja en la disminución de la degradación de los

componentes nitrogenados de las pasturas de alta calidad mediante el uso de compuestos

como los taninos (Kozloski et al., 2012). La alta degradación en rumen de los compuestos

nitrogenados de las pasturas hace que, en los sistemas pastoriles, o con altas ingestas de

forrajes de buena calidad, sea muy habitual observar altas concentraciones de urea en la leche

de las vacas, sin que ello implique la necesidad de ajustar las dietas.

Debido a este proceso de degradación hasta amoníaco, y la posibilidad de utilización de los

microorganismos de este compuesto, es que es conocida la habilidad de los rumiantes para

aprovechar como fuentes para la síntesis proteica materias nitrogenadas (MN) que no sean

proteínas verdaderas, es decir, fuentes de nitrógeno no proteico (NNP). El ejemplo más

conocido en este sentido es el uso de urea en las dietas como suplemento “proteico”. En el

rumen, la molécula de urea se desdobla muy rápidamente hasta amoníaco, y si no está

acompañada por carbohidratos de rápida fermentación (que aporten las cadenas carbonadas

para la síntesis microbiana) o es suministrada en exceso, la rápida absorción del amoníaco a

través de las paredes del rumen representa un potencial peligro de intoxicación para el animal.

163

Figura 2. Evolución del pH (A) y del amoníaco ruminal (B) a lo largo del día en vacas en

praderas templadas, suplementadas con trigo (cuadrados abiertos) o maíz (triángulos

negros) (medias ± error estándar). Las áreas en negro representan la proporción de vacas

pastoreando luego del período de confinamiento (suplementación). Las flechas indican el

momento de la suplementación; las líneas bajo las flechas indican los períodos de

confinamiento (Cajarville et al., 2006a)

Transformación de los compuestos nitrogenados en proteína microbiana

La masa microbiana que pasa junto con el bolo alimenticio a los tramos posteriores del

aparato digestivo, constituye el principal aporte de proteínas para el rumiante. Esta masa

microbiana contiene aproximadamente 50% de MN de las cuales el 80% se encuentra bajo

forma de proteína. La optimización en el crecimiento de la masa microbiana es uno de los

factores que deben preocupar al nutricionista. El término optimización de la masa microbiana

formada en el rumen implica dos conceptos:

1. Producción microbiana. Indica la generación de microorganismos en términos de

cantidades diarias. Se refiere a kg de masa microbiana (N microbiano) formado en el

rumen por día. Es variable con el tipo de animal, tamaño del rumen, cantidad de alimento

consumido, etc.

164

2. Eficiencia de producción de proteína microbiana. Se refiere a la cantidad de

microorganismos generados por unidad de alimento. Se expresa de diferentes formas:

masa microbiana (N microbiano) en función de la materia seca ingerida, de la materia

orgánica (MO) ingerida, o de la MO digerida o fermentada en el rumen (MODR o MOF,

respectivamente).

Ambos conceptos son importantes, pero si se trata de evaluar la efectividad de un alimento o

una dieta para proveer proteína microbiana, consideramos indicado trabajar en base a la

eficiencia de producción de proteína microbiana. Stern et al. (1994) calcularon la

contribución teórica de la proteína microbiana al total de la proteína que llega al duodeno

según la eficacia de síntesis. Cuando la eficacia de síntesis es baja, del orden de 20 g de N/kg

de materia orgánica verdaderamente fermentada en rumen (MOVF), la proteína microbiana

puede cubrir cerca del 50% de las necesidades proteicas de una vaca de 600 kg produciendo

25 litros de leche con 4% de grasa. Sin embargo, si la eficacia de síntesis fuera elevada (40

g N/kg MOVF) la proteína microbiana podría llegar a cubrir un 98% de las necesidades

proteicas del mismo animal. Por esta razón, las estrategias de alimentación en rumiantes

actualmente tienden a optimizar la producción microbiana a nivel ruminal (Shingoethe,

1996a; NRC, 2001). Para lograr la máxima eficiencia, el aporte de nutrientes para los

microorganismos, especialmente materias nitrogenadas y carbohidratos (o más

genéricamente materia orgánica fermentable en el rumen), debe ser el necesario (Russell et

al., 1992; Clark et al., 1992). Además, y aunque algunos autores ponen en duda la posibilidad

de manejar este concepto en las dietas (Valkeners et al., 2006; Hall y Huntington, 2008),

carbohidratos y materias nitrogenadas deberían estar disponibles en el rumen en forma

sincrónica, es decir, a la vez. Teóricamente, proporcionando a la microbiota ruminal las

fuentes de proteína y energía en forma simultánea y en las cantidades requeridas, se lograría

el máximo crecimiento microbiano y por lo tanto, el mayor aporte de nutrientes para el

animal.

Las materias nitrogenadas para los microorganismos ruminales provienen de la proteína y

del NNP de los alimentos que son degradados en el rumen, además de la urea recirculante

que ingresa por vía sanguínea o por la saliva. No aportan al crecimiento microbiano la

proteína indigestible (como la unida a la lignina o a algunos tipos de taninos) ni tampoco la

proteína de pasaje (Van Soest, 1994). Es necesario puntualizar, que no todos los compuestos

165

que tienen valor nutricional para el rumiante, son igualmente útiles para los

microorganismos. La materia orgánica utilizable por estos últimos, es la que tiene capacidad

de ser fermentada en el rumen (materia orgánica fermentable o fermentescible: MOF). Las

paredes celulares, el almidón y la proteína degradable en el rumen, junto con los azúcares,

son fuente de energía fermentescible formando MOF. Otros compuestos, a pesar de ser muy

energéticos para el animal, como los lípidos, ácidos orgánicos o el almidón no degradable en

rumen, así como la proteína no degradable, no forman parte de la MOF. Debido a su baja

fermentación ruminal, poco aportan para el crecimiento microbiano. Como se desprende de

lo anterior, la síntesis de proteína microbiana depende mucho de las cantidades de MOF en

el rumen. Ello hace que el nutricionista deba moverse en el difícil equilibrio entre salud y

enfermedad, considerando que altos niveles de MOF en el rumen siempre implican riesgo de

aparición de acidosis. De hecho, revisiones de trabajos publicados, reportan que las mayores

síntesis de proteína microbiana se observan a niveles de pH ruminal relativamente bajos,

incluso menores a 6,0 (Bach et al., 2005). Por otra parte, la fuente de carbohidrato y la cinética

de su disponibilidad en el rumen, son factores determinantes en el logro de la sincronización

de nutrientes (Lee et al., 2003). En este sentido, la disponibilidad de energía a nivel ruminal

puede ser muy distinta según la fuente de carbohidrato de que se trate, debido a las diferentes

velocidades de fermentación. La velocidad es muy rápida para los solubles como los azúcares

y muy lenta para los estructurales como la celulosa. En general, se acepta que una rápida

disponibilidad de energía a partir de carbohidratos es clave para lograr el crecimiento de la

masa microbiana (Henning et al., 1991). Sin embargo, hasta el momento, los modelos de

predicción de respuestas que se utilizan para la formulación de dietas (NRC, 2001) son

relativamente insensibles a cambios en las cinéticas de degradación de los carbohidratos

(Hall, 2004). De todas formas, más allá de las cinéticas de degradación per se de los

carbohidratos, existen otros factores como el pH ruminal, la cantidad de concentrado

suministrado, o la combinación de compuestos que modifican la cinética de degradación del

almidón y de los carbohidratos no amiláceos (Huntington, 1997). Todos estos aspectos deben

ser considerados ya que muchas veces son los que hacen los resultados no sean los previstos

cuando se formula una dieta. Las cantidades de energía y N disponible en el rumen son los

dos factores principales, pero no los únicos. Otros factores, como la disponibilidad de

minerales, sobre todo azufre, de oligoelementos y de vitaminas intervienen también.

166

Adicionalmente, en la actualidad se le da especial importancia a alimentación con fuentes de

proteína verdadera, dado que se ha demostrado que los microorganismos necesitan de

algunos aminoácidos y péptidos preformados para un mejor desarrollo (Broderick y Reynal,

2009).

Digestión y absorción intestinal de la proteína

La proteína que llega al duodeno de un rumiante es principalmente la suma de la proteína

microbiana y la proteína de origen alimenticio que no ha sufrido degradación a nivel ruminal.

La digestión en el abomaso y en el intestino delgado, es muy similar a la de los

monogástricos. Las proteínas son hidrolizadas por enzimas pancreáticas en péptidos, y

posteriormente en oligopéptidos y aminoácidos. La absorción se realiza bajo forma de

aminoácidos en el intestino delgado. Esta digestión no es total, y una parte de las proteínas

alimenticias y microbianas que escapa a la misma pasa directamente a las heces. En el

intestino grueso las proteínas se degradan poco, ya que las bacterias del intestino grueso

utilizan principalmente la urea endógena para la síntesis de sus proteínas. En este paso es que

surge el concepto de Proteína Metabolizable, que emplean varios sistemas de alimentación

de los rumiantes. De acuerdo con el NRC (2001), la proteína metabolizable es la proteína

digerida luego del rumen, cuyos aminoácidos son absorbidos en el intestino. Está compuesta

por la sumatoria de la proteína microbiana digestible (más abundante), la proteína de pasaje

digestible, y una porción minoritaria compuesta por proteína endógena, proveniente de

proteínas de descamación y enzimas. Un aspecto a destacar, es que mientras que el valor

biológico de la proteína de origen alimenticio que llega al duodeno es muy variable, la

composición en aminoácidos de la proteína de origen microbiano es muy estable y de muy

alta calidad (Schingoethe, 1996b). Así, el contenido en lisina y metionina de los cuerpos

microbianos es casi tan alto como el de la carne o el pescado, por lo que la proteína

microbiana se encuentra dentro de las proteínas de mejor calidad (Verité y Peyraud, 1990).

Esta alta digestibilidad y excelente perfil aminoacídico es otra razón por la que el

nutricionista debe intentar, mediante el manejo de la alimentación, maximizar el aporte de

proteína microbiana al duodeno. La herramienta principal para ello será el logro de un buen

funcionamiento del rumen, considerando todos los aspectos que tiendan a mejorar la síntesis

de proteína microbiana.

167

Para concluir

A modo de resumen, es conveniente recordar que la síntesis de proteína microbiana en el

rumen es el mecanismo que permite la generación de proteína de alta calidad y la

optimización en el uso de los recursos nitrogenados por la vaca lechera, y por los rumiantes

en general. Por esta razón es que como nutricionistas nos interesa lograr altos niveles y

eficiencias de síntesis. Lo anterior se logrará manteniendo el ecosistema ruminal funcionando

al máximo, especialmente en lo que refiere al mantenimiento de niveles adecuados de

nitrógeno y de materia orgánica fermentable.

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Cetose clínica e subclínica: manejo, diagnóstico e efeitos no leite

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Camila Pizoni

Joabel Tonellotto dos Santos

Patrícia Mattei

Rafael da Fonseca Prietsch

Uriel Secco Londero

Durante os últimos anos a produção de leite por vaca apresentou um aumento substancial,

resultado do aprimoramento das técnicas de seleção genética, melhora da nutrição e práticas

de manejo (Espósito et al., 2014). Entretanto, esse aumento trouxe também como

consequência uma maior ocorrência de transtornos metabólicos, que são mais frequentes

durante o período de transição, compreendido entre as três semanas pré e as três semanas

pós-parto (Drackley, 1999; Chapinal et al., 2011). Dentre os transtornos metabólicos destaca-

se a cetose, podendo se apresentar na forma subclínica ou clínica principalmente entre a

segunda e a sétima semana de lactação (Gonzalez et al., 2014). Essa enfermidade pode ser

definida como um desequilíbrio entre demanda energética e mobilização de gordura, levando

a um aumento da concentração de corpos cetônicos a níveis tóxicos nos fluidos corporais

(Garro et al., 2014). Sua incidência pode variar de 26 a 60% para a forma subclínica

(Simensen et al.,1990; Duffield et al., 1998; McArt et al., 2012a) e de 2 a 34% para a clínica

(Duffield, 2000; Gonzalez et al., 2014), pois sua ocorrência depende de diversos fatores,

como nível de produção, manejo, número de lactações e escore de condição corporal (ECC)

ao parto (Nielen et al., 1994; Duffield et al., 2009). As altas taxas de incidência, aliadas ao

período de maior ocorrência da cetose fazem com que a enfermidade apresente um

considerável interesse econômico, não apenas pelos gastos decorrentes do tratamento, mas

por perdas na produção leiteira e pela predisposição a outros transtornos (Duffield et al.,

2009; Ospina et al., 2010). Vacas que desenvolvem a doença na forma subclínica na primeira

semana de lactação apresentam um risco 6 vezes maior de desenvolver deslocamento de

abomaso, 4,5 vezes mais chance de serem descartadas do rebanho e produzem 2,2 kg de leite

a menos por dia nos primeiros trinta dias em lactação (DEL) (McArt et al., 2012a). Vacas

com quatro lactações ou mais são as mais atingidas pelo transtorno, com perdas na produção

170

leiteira que chegam a 353,4 kg de leite por lactação (Rajala-Schultz et al., 1999). A

manutenção da saúde e da produtividade de vacas leiteiras no período de transição é uma

tarefa desafiadora. Para cumprir com esse objetivo é necessário compreender os eventos

metabólicos que caracterizam esta fase e suas implicações. Diante desta problemática, serão

abordados alguns tópicos relacionados ao metabolismo da cetose, métodos diagnósticos e

implicações no leite, a fim de disponibilizar informações que possam ser utilizadas para uma

melhor compreensão, prevenção e o tratamento do transtorno.

Metabolismo energético durante o período de transição e sua relação com a cetose

A transição do final da gestação ao início da lactação é um período extremamente dinâmico

para a vaca leiteira (McArt al., 2013). As três semanas que antecedem o parto são marcadas

por um decréscimo de até 30% da ingestão de matéria seca (IMS), limitando a ingesta de

energia (Hayirli et al., 2002). Com o início da lactação e rápido aumento da produção de leite

após o parto, os requerimentos de proteínas, ácidos graxos e aminoácidos aumentam cerca

de 2 a 5 vezes (Bell, 1995; Bertoni et al., 2009), devido ao direcionamento desses nutrientes

para a glândula mamária, em detrimento de outros tecidos (Loor et al., 2013). Entretanto, o

organismo da vaca não é capaz de suprir essa alta demanda o que conduz a um desequilíbrio

energético denominado balanço energético negativo (BEN) (Drackley, 1999). O déficit

energético leva à mobilização de reservas corporais induzindo a lipólise, que ocasiona a

liberação de ácidos graxos não esterificados (AGNE) no sangue (Chapinal et al., 2012). Cerca

de 15 a 20% desses AGNE são removidos pelo fígado (Drackley & Andersen, 2006), onde

poderão seguir três destinos: (1) oxidação completa para fornecer energia ao próprio fígado,

(2) oxidação incompleta para produção de corpos cetônicos, que serão liberados no sangue

para prover energia a outros tecidos e (3) reconversão a triglicerídeos (TAG) para

armazenamento no tecido adiposo (Loor et al., 2013; McArt et al., 2013). Assim, vacas que

apresentam um BEN intenso, com uma alta taxa de lipomobilização experimentam uma

excessiva produção de AGNE e corpos cetônicos, predispondo o animal a quadros de

esteatose hepática e cetose (Loor et al., 2013).

Numa condição de hipoglicemia, como ocorre durante o periparto, a carência de propionato

(principal precursor gliconeogênico) induz a uma alta taxa de lipomobilização e uma alta

produção de acetil coenzima A (acetil-CoA), metabólito final da oxidação completa dos

171

AGNE. Essa produção excessiva do acetil-CoA supera a capacidade de sua utilização pelo

Ciclo de Krebs para a produção de energia, aumentando também a demanda de oxalacetato,

que deve ser condensado ao acetil-CoA para poder entrar no ciclo (Andrew et al., 2012). O

resultado deste acúmulo é o desvio do acetil-CoA para a produção de corpos cetônicos, do

qual os principais são acetoacetato, acetona e beta-hidroxibutirato (BHB) (Gonzalez & Silva,

2006). O acetoacetato é primeiro corpo cetônico, que apresenta elevada instabilidade reativa

(Duffield, 2000) e é então reduzido pela β-hidroxibutirato desidrogenase a BHB (Andrew et

al., 2012). A acetona é produzida em menores quantidades, e por ser volátil e tóxica para o

organismo, é excretada (Gonzalez et al., 2014). Assim, o papel principal dos corpos cetônicos

é a transferência da energia derivada dos lipídios do fígado para tecidos periféricos, para

suprirem as demandas energéticas não atendidas pela falta da glicose (Andrew et al., 2012).

Contudo, quando os níveis de corpos cetônicos no sangue ultrapassam a capacidade de

utilização por esses tecidos ocorre acúmulo, que é tóxico em determinados níveis,

ocasionando um quadro de cetose clínica ou subclínica (Risco, 1992; Duffield et al., 2009).

Em relação à etiologia, se reconhece a incidência da cetose como três diferentes síndromes.

A cetose tipo I ou espontânea ocorre quando a demanda de glicose supera a capacidade de

síntese pelo fígado através da gliconeogênese, mesmo quando esse mecanismo está ativado

ao máximo, e acomete vacas de alta produção. O quadro é caracterizado por hipoglicemia

seguida de lipólise, ocasionando um aumento nos níveis séricos de corpos cetônicos, mas

sem ocasionar a deposição lipídica no fígado (Herdt, 2000). A cetose tipo II ocorre quando

grandes quantidades de AGNE são depositadas no fígado, interferindo na capacidade máxima

da neoglicogênese hepática. Neste quadro, a glicemia não é tão baixa quanto na cetose tipo I

e está também associada à elevação das cetonas sanguíneas (Holtenius & Holtenius, 1996).

Por fim, a cetose alimentar ou toxicose butírica ocorre pela ingestão de silagem de má

qualidade, com excesso de butirato ou pelo feno mal conservado e em decomposição, pela

proliferação de fungos (Radostits et al. 2007).

Diagnóstico de cetose

Em rebanhos leiteiros a cetose é um dos principais transtornos metabólicos do pós-parto

recente, podendo ser dividida na forma clínica e subclínica, sendo a última a que ocasiona as

maiores perdas econômicas. Diante disso, seu diagnóstico se torna crucial para minimizar os

172

impactos negativos nos sistemas de produção. Para um diagnóstico satisfatório de cetose

clínica é essencial saber identificar seus sinais, que podem ser visualizados nos estágios

digestivo e nervoso. A forma digestiva é a mais comum entre os casos clínicos e apresenta

sinais inespecíficos, além de sinais envolvendo o sistema digestório como diarreia e redução

nos movimentos ruminais. Quando o quadro não é tratado rapidamente, torna-se perceptível

odor cetônico na respiração, urina e leite além de depressão e letargia seguida de decúbito.

O estágio nervoso é de menor ocorrência, porém de suma importância, pois faz parte da

evolução da enfermidade. Nesse estágio o animal demonstra mudanças no comportamento

como movimentos circulares, empurrar e lamber objetos, alteração da visão, além de

hiperestesia, tremores e incoordenação motora (Baird, 1982; Gordon et al., 2013). A forma

subclínica da doença é a mais incidente, porém de difícil diagnóstico por apresentar sinais

inespecíficos como inapetência, dorso arqueado, pele ressecada, redução da produção leiteira

e perda de condição corporal (Gonzalez et al., 2014). O diagnóstico é baseado no histórico

do animal, aliado ao exame clínico completo e confirmado através de exames

complementares realizados no sangue, urina, leite e líquido ruminal, que buscam elucidar o

estado metabólico do animal através da avaliação dos níveis de corpos cetônicos (Sato &

Shiogama, 2010; Gordon et al., 2013). Essa avaliação pode ser realizada principalmente

através de métodos cinéticos e colorimétricos. Dentre os métodos cinéticos

(predominantemente laboratoriais), a avaliação sérica de BHB tem se mostrado a mais

confiável forma de identificar o transtorno. Os níveis fisiológicos do metabólito para vacas

leiteiras estão abaixo de 1,0 mmol/L, entre 1,2 e 1,4 mmol/L para forma subclínica e acima

de 1,4 mmol/L para forma clínica (Leblanc, 2010). Também é possível detectar alterações no

metabolismo energético do animal através da presença de cetonas no leite (Wood et al.,

2004). Níveis superiores a 10 mg/dL (1,75 mmol/L) no leite indicam cetose.

A identificação dos casos a campo pode ser realizada através de métodos colorimétricos (fitas

reativas) para mensurar corpos cetônicos tanto na urina quanto no leite. O Keto-Test (Elanco

Animal Health, Sanwa Kagaku Kenkyusho) validado por Oetzel (2004), corresponde a uma

fita que altera sua coloração na presença de anormalidades na concentração de corpos

cetônicos no leite. Do mesmo modo, o Ketostix (Bayer Healthcare LLC), validado por

Carrier et al. (2004), também avalia as concentrações de corpos cetônicos, porém esta análise

é realizada na urina. Outro equipamento que pode ser utilizado a campo para identificação

173

do transtorno é o FreeStyle Optium (Abbott Laboratories) (McArt et al., 2013; Krempasky

et al., 2014; Weng et al., 2015), um equipamento de análise rápida (5 segundos) que avalia

os níveis séricos de BHB, apresentando alta sensibilidade e especificidade tanto para ovinos

quanto para bovinos (Voyvoda & Erdogan, 2010; Panousis et al., 2012). A utilização desses

métodos facilita a rápida detecção e consequente tratamento e/ou prevenção das formas de

cetose.

Efeitos da cetose no leite

O Brasil é o quarto maior produtor mundial de leite com produção anual de 34,2 bilhões de

litros (IBGE, 2014), tendo esta atividade uma significativa importância socioeconômica;

apesar disso a qualidade da matéria-prima ainda é um grande entrave ao desenvolvimento da

cadeia produtiva do leite (Borges, 2009). A qualidade do leite é determinada tanto pelo

processo de produção quanto pela sua composição (Rangel et al., 2009; Galvão et al., 2010).

A redução da IMS no pós-parto recente associada à produção de leite intensificam o BEN,

aumentando a lipomobilização e os níveis séricos de corpos cetônicos. Essa limitação

energética tende a aumentar o teor de gordura e reduzir a proteína no leite, sendo a razão

entre a porcentagem de gordura e proteína usada para monitorar a prevalência de cetose

subclínica no rebanho (Duffield, 2000; Gantner et al., 2009). A relação gordura:proteína

superior a 1,5 na primeira ordenha do dia aponta déficit energético, indicando um quadro de

cetose (Robinson et al., 2003). A associação que existe entre o aumento da gordura no leite

e a hipercetonemia deve-se presumivelmente ao aumento na disponibilidade do BHB e ácidos

graxos para a síntese da gordura do leite (Duffield, 2006; Gonzalez, 2009) provenientes da

β-oxidação do tecido adiposo (Reist et al., 2002). Quanto mais intensa a lipomobilização,

maior será o valor de gordura no leite e maior o risco de distúrbios metabólicos severos no

animal (cetose clínica) (Gonzalez, 2004).

O aumento de corpos cetônicos está diretamente ligado a uma redução da produção de leite,

que atinge valores de 1 a 1,5 litros por dia em animais com cetose subclínica (Duffield, 2000).

As perdas seguem aumentando à medida que os valores de BHB aumentam, havendo perdas

de até 4 kg de leite por dia (Duffield, 1998). A cetose subclínica também diminui o

desempenho reprodutivo (Walsh et al., 2007), que é decorrente do retardo na reativação da

174

função ovariana com aumento no intervalo do primeiro serviço pós-parto, aumento do

número de serviços e maior intervalo parto-concepção (Ingvartsen et al., 2004).

Prevenção, formas de controle e tratamento da doença

A detecção precoce de alterações na saúde da vaca leiteira permite que seja realizada

intervenção antes que os níveis de produção dos animais, ou até mesmo sua sobrevivência

esteja ameaçada (Weng et al., 2015). A prevenção da cetose está relacionada ao manejo do

periparto, mais especificamente com a nutrição adequada (Dann et al., 2006). A verificação

do ECC para monitorar a eficácia do programa nutricional tem efeito significativo sobre o

equilíbrio energético no início da lactação (Wathes et al., 2007) e é uma medida bastante

simples, mas que pode auxiliar muito na prevenção da doença, já que a ocorrência de cetose

tem sido associada à maior lipomobilização no pós-parto (Loor et al., 2013). Vacas com ECC

elevado (> 3,5) no pós-parto recente apresentam um BEN mais exacerbado do que vacas com

ECC adequado (2,5 a 3,5), predispondo o animal a desenvolver cetose (Allbrahim et al.,

2010; Shin et al., 2015). Outra estratégia de reduzir o risco da doença é disponibilizar mais

energia para as vacas no pós-parto recente através do uso de propilenoglicol e gordura

protegida. O propilenoglicol dá origem a grandes quantidades de propionato e glicerol no

rúmen, aumentando os níveis de glicose e insulina e reduzindo AGNE e BHB séricos nesses

animais (Gordon et al., 2013). O uso de gordura protegida com sais de cálcio eleva a

densidade energética da dieta (Ganjkhanlou et al., 2009) sem aumentar a ingestão de

carboidratos ou comprometer a ingestão de fibras, favorecendo um maior aporte de energia

para a síntese do leite e de seus componentes (Desnoyers, 2009). Além disso, a gordura

protegida pode contribuir para a redução da queda abrupta da IMS estabilizando os níveis de

cetonas sanguíneas (Schein, 2012).

A diminuição da IMS reduz a síntese de proteína microbiana limitando a oferta de

aminoácidos essenciais, responsáveis pela formação de precursores gliconeogênicos e

proteínas do leite (Drackley et al., 1999). O uso de aminoácidos protegidos também tem sido

utilizado como estratégia para prevenir a cetose. O aminoácido essencial metionina tem um

papel importante, pois reduz a metanogênese ruminal, desviando átomos de C e H+ do

metano. Esse desvio faz com que haja maior produção de propionato, aumentando a

eficiência energética da dieta em até 4% e reduzindo a cetogênese (Gonzalez et al., 2014).

175

Outros dois aminoácidos importantes são a niacina e a colina, sintetizados pelos

microrganismos ruminais. A niacina é necessária para síntese de compostos NAD+ e NADP+,

coenzimas essenciais no metabolismo de carboidratos, lipídios e proteínas. Sua utilização

ocasiona a redução da lipidose e redução do fluxo de AGNE no sangue (Yuanet al., 2012).

A colina tem uma importante ação na formação de fosfolipídios que estruturam lipoproteínas,

essenciais para o transporte dos TAG (Zom et al., 2011). Sua suplementação na forma

protegida tem se mostrado eficaz na redução da cetogênese, através da diminuição da

esterificação de ácidos graxos e do aumento na secreção de lipoproteínas (Piepenbrink &

Overton, 2003), além da redução de esteatose hepática (Cooke et al., 2007).

Como alternativa preventiva e/ou de tratamento o uso de butafosfan, um composto a base de

fósforo orgânico associado à cianocobalamina tem se mostrado eficiente (Fürll et al., 2010;

Rollin et al., 2010; Nuber et al., 2015), visto que age no ciclo de Krebs disponibilizando mais

energia e reduzindo a expressão de genes relacionados à cetogênese e oxidação de ácidos

graxos (Kreipe et al., 2011). Além disso, ele reduz a intensidade do BEN, através da

diminuição das concentrações plasmáticas de AGNE e BHB, aumentando a produção de leite

(Pereira et al., 2013). A utilização de cápsulas de liberação controlada de monensina também

são eficientes na prevenção de cetose clínica e subclínica, aumentando a produção ruminal

de ácido propiônico e reduzindo as concentrações de ácido acético e butírico, reduzindo a

formação de corpos cetônicos (Melendez et al., 2006).

Existem diferentes terapias associadas ao tratamento da cetose que se baseiam em aumentar

a glicose sanguínea, disponibilizando precursores gliconeogênicos e reduzindo a formação

de corpos cetônicos (Andrews et al., 2004). O tratamento mais comumente utilizado é a

administração endovenosa de glicose 50% com uma dosagem que varia de acordo com a

lactose eliminada no leite (Radostits et al., 2007); entretanto, o incremento energético dessa

estratégia é transitório (duas a três horas) (Gordon et al., 2013) e se não forem tomadas outras

medidas o quadro clínico pode retornar. Para tanto, utiliza-se a associação de glicose 50% ao

uso de glicocorticoides para manter a glicemia elevada por mais tempo (oito a dez horas)

(Schein, 2012). A insulina também pode ser utilizada juntamente com a glicose 50%, tendo

efeito anabólico que irá aumentar a síntese de gordura e o uso dos corpos cetônicos como

fonte energética. Seu uso pode ser importante em casos em que o animal não responde ao

tratamento com glicose ou glicocorticoides (Hayirli, 2006; Smith, 2008). No entanto, o início

176

da lactação, que é o período de maior ocorrência da doença, é marcado por uma resistência à

insulina transitória, que pode afetar negativamente esse protocolo de tratamento, além de ele

ser pouco explorado pelo elevado custo do produto (Gordon et al., 2013).

Outra estratégia comumente utilizada é a administração via oral de drench, que tem como

base o propilenoglicol. Ao chegar ao rúmen esse composto é diretamente absorvido, sendo

utilizado no ciclo de Krebs para aumentar a oxidação de acetil-CoA e estimular a

gliconeogênese ou é convertido em propionato, que também pode ser direcionado para esta

via e ainda estimula a liberação de insulina (Gordon et al., 2013). Este composto, utilizado

em vacas com cetose subclínica pode reduzir os casos de deslocamento de abomaso,

aumentar a taxa de concepção ao primeiro serviço (McArt et al., 2012b), aumentar a produção

de leite (Nielsen & Ingvartsen, 2004) e prevenir a cetose clínica (McArt et al., 2011). Além

disso, seu uso pode ser associado a glicocorticoides, que aumentam indiretamente a glicemia

através do bloqueio dos efeitos da insulina, sem influenciar a lipólise e diminuindo as

concentrações de BHB (Drift et al., 2015).

Considerações finais

Vacas que apresentam BEN mais acentuado são mais susceptíveis a desenvolverem cetose.

A prevenção, diagnóstico e controle desse transtorno são essenciais para evitar ou minimizar

os efeitos negativos na produção e qualidade do leite, reduzindo as perdas econômicas e

possibilitando ao animal expressar sua maior capacidade produtiva.

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181

Hipocalcemia e hipomagnesemia en vacas lecheras: diagnóstico y control

Luis Barros Vidal

(In memoriam)

La hipocalcemia y la hipomagnesemia son enfermedades tradicionales de las vacas lecheras,

ya consideradas metabólicas desde el siglo XIX. La hipocalcemia es una enfermedad

metabólica en el sentido que existe un mecanismo de regulación para su homeostasis, y

aunque no sucede lo mismo con la hipomagnesemia continúa siendo clasificada como tal. La

intensificación de la producción lechera en los últimos decenios y en particular la selección

genética para el incremento de la producción láctea por vaca individual, provoca un efecto

negativo sobre la estabilidad metabólica de los animales. Se comprueba en diferentes países

una prevalencia relativamente elevada de casos clínicos por hipocalcemia y particularmente

alta por hipocalcemia subclínica. La prevalencia de la hipomagnesemia es mayormente

dependiente del aporte proveniente de las pasturas mejoradas y de su control. La

intensificación de la producción láctea con altos rendimientos viene acompañada por

elevados costos para el mantenimiento de la homeostasis de esos animales, que son sometidos

a unas enormes y estresantes demandas metabólicas durante el período de lactancia. Esas

demandas se acrecientan con la edad del animal considerando que la producción por lactancia

se incrementa en cada año sucesivo, mientras que la habilidad de respuesta de las vacas tiende

a disminuir de la misma manera que sus reservas corporales, particularmente si la dieta no es

lo suficientemente balanceada para cubrir las necesidades en los diferentes momentos del

ciclo reproductivo-productivo. La capacidad de movilización mineral también disminuye con

la edad: un animal joven puede intercambiar un 17 a 20% de su calcio (Ca) óseo, mientras

que una vaca mayor a 10 años lo hará en un 2 a 5%.

De manera general, los períodos de producción deben contemplar las pérdidas minerales por

producción de leche, así como los períodos de recuperación metabólica, principalmente en el

período seco, con la finalidad de prevenir el desbalance del inicio de lactación, período donde

ocurre la mayor frecuencia de alteraciones metabólicas de hipocalcemia clínica y de otras

enfermedades asociadas a la hipocalcemia subclínica. La hipomagnesemia puede acompañar

este período, pero su prevalencia está mayormente vinculada con el pico de lactación y con

los ciclos de las pasturas.

182

En el desbalance mineral intervienen varios eventos metabólicos concurrentes, tales como la

disminución del apetito en los períodos de mayores demandas; la distensión ruminal; la

frecuencia y volumen de la materia seca consumida determinando la saciedad y el

comportamiento alimentario; la influencia del propio estrés del período parto-inicio de

lactancia; los factores ambientales de confort en el establecimiento; el comportamiento social

por dominancia, agrupamiento y atestamiento de los animales; las enfermedades

inflamatorias del periparto asociadas a la disminución de las defensas del aparato inmunitario

provocado por el estrés, además del estricto balance nutricional aportado por la dieta.

Durante el período de transición, léase de las tres o cuatro semanas anteriores y posteriores

al parto, el momento del periparto es aquel de mayores riesgos en la salud de las vacas

lecheras y es donde ocurre la mayor frecuencia de enfermedades del año productivo. La

adaptación metabólica de la vaca al crecimiento fetal al final de la gestación; a las

necesidades obligatorias de la glándula mamaria para la calostrogénesis; al inicio y

mantenimiento de la lactancia; a las exigencias hormonales de recuperación uterina; a las

demandas energéticas y proteicas para la producción de leche; al desbalance entre

necesidades alimentarias y la capacidad volumétrica del rumen; a la adaptación hormonal al

desbalance energético obligatorio del inicio de lactancia u homeorresis; son algunos de los

factores que tienen más relevancia por sus efectos en el metabolismo general y en la

estabilidad del sistema inmunitario. El estrés metabólico y los factores ambientales y sociales

de los animales están relacionados con una significativa incidencia de enfermedades

inflamatorias e infecciosas que afectan principalmente al aparato reproductivo, tales como:

el retraso en la involución uterina, las metritis o endometritis, las retenciones de placenta o

las mastitis por coliformes. El incremento de los procesos inflamatorios está relacionado con

la disminución de la respuesta inmune por cambios en los patrones de respuesta de las

proteínas de fase aguda, que provocan una inefectiva acción de los leucocitos,

particularmente los neutrófilos y los monocitos sobre los agentes patógenos. Los procesos

inflamatorios inducidos por las proteínas de fase aguda: citoquinas (tumor necrosis factor a

(TNF-a), interleucina 1 (IL-1), e interleucina 6 (IL-6) y eicosanoides son acompañados de

procesos inflamatorios agudos con hipertermia, taquicardia y anorexia o disorexia (Sordillo,

2013).

183

Las exigencias energéticas de esos períodos se manifiestan por una elevada lipomovilización

y una cetosis subclínica que inducen a modificaciones histopatológicas del parénquima

hepático con esteatosis, la que puede presentarse de discreta a severa, provocando una

consecuente disfuncionalidad del sistema digestivo y hormonal que agrega un efecto

negativo a la funcionalidad metabólica que ya se encuentra comprometida por los factores

mencionados anteriormente. Así, la condición corporal sufre las consecuencias producto del

catabolismo energético y proteico con disminución del estado corporal por pérdida de la masa

muscular y de la reserva grasa. Las consecuencias hormonales en el metabolismo de la

glucosa están relacionadas con la secreción de la insulina por el páncreas y su sensibilidad

en el músculo esquelético, en el tejido adiposo y en el hígado afectando la salud metabólica

del animal. Esas modificaciones se revelan como variaciones de la concentración de los

ácidos grasos libres y del beta-hidroxibutirato (BHB) induciendo una respuesta de insulino-

resistencia en esos órganos durante la preñez y la lactancia. A su vez, también existe una

relación entre el metabolismo energético y el metabolismo mineral (Lean, 2006). Los tenores

en minerales: calcio, magnesio, fósforo, la diferencia iónica y los niveles de potasio tienen

influencia en el balance del metabolismo mineral y en la fisiopatología del síndrome de vaca

caída y particularmente en el cuadro clínico y subclínico de la hipocalcemia y de la

hipomagnesemia de la vaca lechera. La importancia de estas enfermedades metabólicas está

en el efecto directo sobre la vida productiva de las vacas, pero aún más en su salud por las

alteraciones y afecciones asociadas que ocurren en el periparto y el puerperio como las

mastitis, las distocias, las retenciones de placenta, las infecciones uterinas, y los

desplazamientos de abomaso, entre otras.

Hipocalcemia en vacas lecheras

Antecedentes

La demanda por aumentar la producción de leche para consumo humano trajo aparejado la

selección genética y la mejora en la alimentación de la vaca lechera, resultando en un

significativo incremento de la secreción láctea por animal y por lactancia. Ese incremento de

la producción fue acompañado por una mayor exigencia metabólica, cuyo natural equilibrio

en la evolución de la especie no ha sido compensado por la ganancia genética, inducida por

184

el hombre en la última centuria. Es así que una enfermedad como la hipocalcemia, con una

prevalencia muy poco común, comienza a incrementarse. Hutrya et al. (1947) en su libro

sobre “Patologías especiales y terapéuticas de los animales domésticos” indican que un

primer caso de hipocalcemia se registró en 1793, coincidiendo con la introducción en Europa

de la selección genética orientada a buscar animales de alta producción bajo un limitado nivel

de intensificación agrícola. Diversas hipótesis sobre la etiología surgieron para esa

enfermedad que se presentaba en las horas próximas al parto, comprendiendo la apoplejía, la

trombosis, la infección del útero o de las mamas. Señala Jack Payne (1981) que un aporte

importante al conocimiento fue la teoría del danés Jurgens Schmidt que en 1897 sugirió que

la enfermedad era debida a una infección de la ubre y que la infusión intramamaria de ioduro

de potasio constituía un buen tratamiento, terapia que generó buenos resultados con una

reducción de la mortalidad desde un 15% a un 70%. Luego se observó que la infusión de

agua intramamaria era igualmente efectiva y que el insuflado de la ubre era incluso más

efectivo (Greig, 1930 in Payne, 1981). El segundo gran avance en el diagnóstico llega en

1925 cuando Dryerre y Greig enunciaron una teoría asociando la enfermedad con la

disminución del Ca en sangre, argumentando que tenía su génesis en el pasaje del mineral a

la mama en animales con deficiencia de hormonas paratiroideas. La confirmación de la teoría

que la hipocalcemia era la etiología de la paresia puerperal, fue dada por los mismos Dryerre

y Greig en 1930 de Edinburgo, empleando gluconato de Ca por vía parenteral para remitir

los síntomas clínicos. Es interesante notar que desde 1934, cuando Hayden sintetizó el

borogluconato de calcio para el tratamiento endovenoso, hoy en día continúa siendo el

tratamiento empleado y efectivo. Los mayores avances científicos y técnicos en la resolución

del problema clínico ha sido la prevención, con cambios en la alimentación y en el manejo

de las vacas pre-parturientas. Se han tomado en cuenta los cambios metabólicos del período

de transición y del posparto para controlar el metabolismo mineral que hace eclosión en el

periparto. Desde el punto de vista clínico, la hipocalcemia es un caso individual, pero las

medidas preventivas se toman para el manejo colectivo de la enfermedad, considerando su

importancia económica a nivel del establecimiento lechero y que más del 80% de esas vacas

se encuentra en hipocalcemia subclínica. Históricamente, la enfermedad clínica se describió

con diferentes sinonimias: hipocalcemia puerperal, paresia puerperal, fiebre vitular,

185

eclampsia posparto, fiebre de la leche, paresia posparto, paresia de la parturienta e

hipocalcemia de la vaca lechera.

Descripción

La hipocalcemia es una enfermedad metabólica que se presenta principalmente en la vaca

lechera durante el período periparto, manifestándose por una sintomatología nerviosa, de tipo

depresivo, con paresia y cuyo curso agudo evoluciona a la muerte si el animal no es tratado.

La etiopatogenia está determinada por una alteración del balance diario de Ca y por la

incapacidad de los mecanismos de regulación para mantener la homeostasis frente a pérdidas

enormes y súbitas, inducidas por el pasaje masivo del Ca plasmático hacia la glándula

mamaria en el inicio de lactancia. Las pérdidas de Ca pueden ser de 25 g o más para una

producción de al menos 10 L de calostro. La leche contiene 1,2 g de Ca por L, lo que permite

calcular una pérdida de 30 g para una vaca buena productora con necesidades para

mantenimiento sólo de 12 g por día.

La estabilidad de la calcemia es vital para la normal homeostasis de la mayoría de los órganos

y funciones del organismo. El pool de Ca es calculado en 14 g/kg PV en el bovino, estando

distribuido en un 99% en el esqueleto y el resto en otros órganos. Se destaca el espacio

extracelular dividido en extravascular e intersticial con 5 a 6 g, donde ocurren funciones de

intercambio iónico, siendo el mineral disponible para cubrir exigencias metabólicas

inmediatas. El Ca es transportado por el espacio intravascular como calcemia en sus dos

fases: el Ca no difusible, ligado y transportado por proteínas y el libre o iónico (40 a 50% del

Ca sanguíneo) necesario para las funciones celulares como: la permeabilidad de membrana,

la coagulación sanguínea, la excitabilidad neuromuscular, la contracción muscular y también

la acción como cofactor enzimático u hormonal, dependiendo su disponibilidad del pH

sanguíneo. El balance del mineral debe estar equilibrado entre la absorción intestinal

(alrededor del 68%), la eliminación endógena por recambio óseo y las necesidades para

gestación y para lactación con el Ca aportado por la dieta.

Los lentos mecanismos homeostáticos de la acción de la parathormona (PTH), la vitamina D3

(1,25 di-hidroxicolecalciferol) y la calcitonina, no permiten la adaptación del intestino, el

hueso y el riñón a las obligatorias y fuertes demandas de la calostrogénesis y la lactancia.

Particularmente, las dietas alcalinas en base a pasturas son un factor coadyuvante de la mayor

186

importancia, ya que afectan el equilibrio ácido-básico sanguíneo. El desequilibrio hacia la

dieta alcalina induce cambios en la receptividad de los receptores a la PTH bloqueando la

acción hormonal y, por lo tanto: disminuye la movilización del Ca proveniente de la resorción

osteoclástica de la hidroxiapatita de los huesos; disminuye la síntesis del 1,25 di-

hidroxicolecalciferol por el riñón y el hígado, resultando con una disminución en la respuesta

para mantener la homeostasis de la calcemia. Un factor muy destacado en la literatura

científica, como importante en el desequilibrio del mineral, es el alto contenido de potasio en

los forrajes provenientes de una intensa fertilización del suelo para mejorar los rendimientos

en materia seca. Este elemento fue reconocido en la patogenia de la hipomagnesemia por

Kemp y 't Hart en 1957, y ahora se le reconoce ampliamente en su papel de factor de riesgo

para la hipocalcemia al relacionarlo con el balance iónico de la dieta y en particular con la

modificación del equilibrio ácido-base sanguíneo. El potasio propende a la alcalinización

sanguínea que actúa reduciendo la movilización del Ca óseo y la disminución del Ca iónico

en sangre, factor principal para desencadenar el cuadro clínico.

El desbalance en la homeostasis cálcica desemboca con la presentación de la enfermedad,

cuya sintomatología se caracteriza por un cuadro neurológico que cursa con tres etapas: una

primera, fase breve de excitación; una segunda de postración con decúbito esternal y una final

con decúbito lateral, previo a la muerte. El caso clínico se presenta como una hipocalcemia

aguda posparto entre las 24 horas preparto y las 72 horas después. Desde el punto de vista

bioquímico se caracteriza por un descenso brusco del Ca iónico sérico y desde el punto de

vista clínico por un cuadro nervioso depresivo con persistencia del decúbito sin posibilidades

de recuperar la estación. Esta patología se manifiesta en vacas lecheras de mediana y elevada

producción, con mayor incidencia en animales que están entre su tercera y cuarta lactación,

siendo las vacas multíparas más susceptibles y las primíparas prácticamente no se enferman.

La susceptibilidad individual es un importante factor. Las vacas que han tenido hipocalcemia

clínica en un año y se recuperaron, tienen altas probabilidades que en el siguiente parto se

manifieste nuevamente la enfermedad. El cuadro clínico puede presentarse en todas las

épocas del año en que se produzcan los partos. Las razas tienen influencia en la prevalencia,

siendo las Jersey más susceptibles que las Holstein y éstas más que las razas de carne donde

la fiebre de la leche ocurre en forma muy poco frecuente. El diagnóstico se establece en base

a la sintomatología, en particular por el cuadro nervioso depresivo en el periparto, a los

187

exámenes colaterales y a la respuesta terapéutica al Ca. En la patología clínica se comprueban

valores de calcemia muy por debajo de los normales (referencia: 9 a 11 mg/dL), entre 3,0 y

4,8 mg/dL (0,75-1,2 mmol/L), que dan nombre a la afección. La anatomía patológica no

revela signos de relevancia para el diagnóstico.

Diagnóstico clínico

Clásicamente se definen tres fases o etapas de la hipocalcemia, una inicial con sintomatología

leve, otra denominada de decúbito esternal con auto-auscultación y otra final con decúbito

lateral con coma y muerte. La primera fase puede ser detectada por el tambero, ya que es

práctica de manejo común que las vacas en el período preparto final sean aproximadas hacia

el lugar donde serán ordeñadas para acostumbrarlas a la futura rutina del ordeño; en otras

ocasiones son alojadas en lugares o galpones cercanos. En la etapa inicial, en los dos o tres

días antes del parto, puede observarse a la inspección algunos espasmos musculares en la

región de los hombros, pero preferentemente la masa muscular del tren posterior es la que

presenta contracciones de tipo fasciculares en grupos de fibras musculares que son bien

visibles y que se evidencian claramente por la palpación colocando la mano sobre la piel de

la masa muscular. Estas contracciones pueden presentarse como mioclonias, particularmente

en los músculos estriados semimembranoso y semitendinoso. Se evidencian como temblores

en la estación y por una ligera dismetría en la marcha, pudiendo presentarse cierto grado de

rigidez de los miembros posteriores en movimiento, como consecuencia de la alteración de

la transmisión del impulso neuronal por un aumento de la irritabilidad neuromuscular. Puede

haber una ligera hiperexcitabilidad e hiperreflexia, con leves temblores en cabeza y dorso

pudiendo sufrir el animal grados leves de parestesia. La vaca procura no moverse, y en esta

etapa de corta duración puede caer con facilidad al caminar sobre un piso duro resbaladizo o

mojado, pero no es frecuente que el animal se mantenga en decúbito. La lengua puede

presentar cierto grado de protrusión y haber rechinamiento de dientes. En la musculatura lisa

se manifiestan síntomas digestivos de constipación con heces secas y duras, el apetito es

normal o puede comenzar una disorexia por la disminución en las contracciones ruminales

que más cerca del parto se profundizan. Puede presentarse cierto grado de distensión del

rumen con ligera deformación del perfil abdominal, principalmente del lado izquierdo. La

frecuencia de la rumia puede también estar disminuida. En la glándula mamaria hay

188

relajación del esfínter del pezón que permite la salida de calostro en goteo, a veces en forma

continua, mostrando una glándula muy distendida. El sensorio es normal y el animal responde

a los estímulos visuales y externos demostrando una expresión alerta. La temperatura en este

período es normal, así como la frecuencia respiratoria y el pulso. Por paraclínica se puede

constatar una discreta hipocalcemia con valores que pueden oscilar entre 7,5 y 8,5 mg/dL

(1,87 a 2,12 mmol/L). Hay que hacer notar que existe una hipocalcemia fisiológica del parto,

pero ésta no tiene manifestaciones clínicas, como en este caso.

En la segunda fase, los síntomas son claramente visibles, el cuadro predominante es un

cuadro de sensorio deprimido, con posición de decúbito esternal o ventral. El animal tiende

a no desplazarse y quedar en decúbito esternal con una posición de la columna vertebral

ligeramente encorvada en forma de S, apoyándose principalmente sobre las articulaciones

radio-cubitales de las patas delanteras, colocando la cabeza hacia adelante y abajo con

aspecto somnoliento, con los párpados semicerrados y dando respuesta a estímulos visuales

en forma lenta o ausente. Evoluciona hacia una paresia del tren posterior con tendencia a la

flaccidez, síntomas que se conocen como paresia puerperal dentro del síndrome de vaca

caída. En esta etapa de parálisis fláccida muscular, particularmente de los miembros

posteriores, pueden presentarse algunas contracciones musculares pasajeras de tipo

tetaniforme. La cabeza se vuelca hacia el flanco, en la llamada “posición de auto-

auscultación”, con el cuello en extensión hacia atrás y debajo como manifestación de la

disminución del sensorio, mostrando una ausencia o disminución muy marcada de respuesta

a los estímulos externos. Las acciones de tracción sobre la cabeza y el cuerpo, las vivas voces

o ligeros golpes pueden obligar al animal a incorporarse, aunque lo hará con dificultad o no

podrá hacerlo. La permanencia en la estación tiende a ser breve, aunque a veces permanece

de pie a pesar de la debilidad de los miembros posteriores que pueden presentar temblores

por el intento de mantener el aplomo y el equilibrio posterior, estirando su cabeza y el cuello

para equilibrar el peso corporal. Los reflejos de sensibilidad superficial en las extremidades

están disminuidos, particularmente en miembros posteriores, que responden lentamente al

pellizcamiento o punción de la piel o en el espacio interdigital. Igualmente ocurre con los

reflejos de sensibilidad profunda en tendones. Las pupilas están dilatadas y es lento el reflejo

pupilar a la luz; las córneas están secas y puede aparecer cierto grado de enoftalmia. Puede

percibirse el reflejo anal disminuido, con semidilatación del esfínter anal y la aparición de

189

materia fecal en escasa cantidad de color oscuro y seco al lado del animal. El esfínter del

pezón también está semidilatado permitiendo la salida de poca cantidad de calostro por efecto

del rebozamiento del canal del pezón. La temperatura corporal disminuye, con una

hipotermia discreta (36 a 38°C), pudiendo percibirse por palpación las orejas frías en su base,

así como las extremidades y la piel en general. Las mucosas están ligeramente pálidas y el

morro seco. La frecuencia del pulso aumenta por encima de 70 a 80 por minuto con

pulsaciones débiles al tacto. La frecuencia cardíaca aumenta y pueden auscultarse

alteraciones del ritmo, con arritmias de tipo bloqueo aurículo-ventricular como consecuencia

de la alteración en la conducción del impulso eléctrico a través del miocardio, con

alargamiento del intervalo Q-T del proceso de conducción y repolarización en la carga

eléctrica del corazón después de cada latido, que puede evidenciarse mediante un ECG. Este

cambio eléctrico está asociado al efecto de la hipocalcemia y particularmente al bajo Ca

ionizado. En las grandes funciones se comprueba que hay anorexia, la glándula mamaria está

plena y muy distendida ya que la hipocalcemia se presenta principalmente en vacas muy

buenas productoras y con más de tres o cuatro partos, en el período de mayor producción de

las lecheras. La bioquímica clínica indica valores subnormales de la calcemia (< 7,5 mg/dL

o < 1,87 mmol/L), así como del valor del Ca ionizado (Ca2+ por debajo del 40%). Puede

haber hipoalbuminemia (< 30 g/L) que contribuye con el déficit de transporte del Ca ligado

y los valores de fósforo y magnesio pueden estar disminuidos para el primero (< 4,5 mg/dL)

y aumentados para el segundo (> 2,7 mg/dL).

A partir de esta fase, se pasa gradualmente a la tercera, caracterizada por la depresión

profunda del sensorio, el decúbito lateral y la muerte en coma en el 80 % de los casos sin

tratamiento. En esta etapa el animal permanece en decúbito, primero ventral y luego se coloca

de lado con el cuello y la cabeza extendidos. No realiza movimientos y la flaccidez muscular

es particularmente evidente. Es interesante mencionar que la parálisis en los bovinos es

fláccida, probablemente porque la baja concentración extracelular de Ca reduce la liberación

de acetilcolina en la placa neuromuscular, disminuyendo el trofismo o fuerza de contracción,

cuando en otras especies (cerdo, perro, caballo) es mayormente espástica o tetaniforme, en

la llamada eclampsia. En el humano la espasticidad es similar y aparecen el signo de

Trousseau -espasmo visible y doloroso del carpo y mano al comprimirse el brazo-, y el de

Chvöstek -espasmo facial y de la comisura labial al percutir por delante de la oreja en la rama

190

del nervio facial-. En la vaca hay flaccidez de la musculatura estriada e hiporreflexia

generalizada con pérdida del reflejo pupilar, del palpebral, con protrusión del tercer párpado,

abolición del reflejo anal y del patelar, con ausencia de respuesta a las pruebas de sensibilidad

superficial y profunda. La depresión del sensorio es severa con pérdida de la conciencia y

con ausencia de respuesta a los estímulos externos manifestando gran somnolencia, sopor y

coma. El decúbito lateral induce a un meteorismo gaseoso por falta de eructación y debido a

la posición del cuerpo, que se recupera en parte si es posible colocar la vaca en posición

ventral, la administración de Ca endovenoso induce inmediatamente al inicio de la

eructación, abolida en esta etapa. Las contracciones ruminales están ausentes, puede haber

defecación con heces secas y duras por relajación del esfínter anal. No orina y si lo hace es

por rebosamiento, la orina es escasa y de color oscuro. La temperatura es francamente

hipotérmica con valores cercanos a 35-36°C, las extremidades, orejas y la piel están frías. La

respiración es superficial pudiendo auscultarse u oírse cerca de las narinas un ronquido

producido por parálisis de velo del paladar.

En la fase terminal hay taquicardia con una frecuencia cardíaca superior a 100-120

pulsaciones por minuto, puede auscultarse arritmia, el pulso es débil y filiforme pudiendo no

percibirse a la palpación, puede haber ingurgitación de las venas yugulares, las mucosas están

congestivas y el cuadro termina en colapso circulatorio. El análisis de laboratorio indica

valores de calcemia que pueden bordear los 5-6 mg/dL (< 1.25 a 1,5 mmol/L) y el valor del

Ca2+ por debajo del 30%, de un valor normal entre 42 y 47% de la calcemia. La fosfatemia

puede alcanzar valores disminuidos de 3 a 4 mg/dL y la magnesemia aumentada puede estar

con valores superiores a 3.2 mg/dL. La muerte del animal sobreviene en pocas horas sin

tratamiento, con una mortalidad superior al 80% en vacas multíparas de alta producción. La

recuperación en fases tempranas luego de la perfusión de Ca es superior al 90%, debiendo

preverse posibles recaídas en las 12 a 18 horas posteriores. En la etapa terminal, la

recuperación clínica puede ser del 50-60%.

Hipocalcemia subclínica

Cuando se estudia la hipocalcemia de la vaca lechera, debe ser tenido en cuenta un capítulo

especial, que es la hipocalcemia clínica, porque la casuística indica que tiene una incidencia

mayor cada vez que años precedentes. Esto es debido a la mayor tecnificación agrícola con

191

incremento de la producción de leche por animal y por el mayor control de otras

enfermedades intercurrentes. El empleo de medidas de vigilancia más eficaces a nivel

colectivo ha permitido controlar la prevalencia de la enfermedad clínica, pero aún la baja

frecuencia de casos individuales continúa siendo de importancia, particularmente por el valor

económico de estas vacas de alta producción y por la merma en la producción que provoca

la muerte de esos animales.

A pesar que los casos clínicos de vacas individuales están más fiscalizados, la hipocalcemia

continúa siendo un problema sanitario y productivo como consecuencia de la prevalencia de

la hipocalcemia subclínica que continúa aumentando y que a la vista del productor no siempre

es bien percibida. La importancia radica no solamente en los animales directamente

afectados, sino por las alteraciones concomitantes por la disfunción de los diferentes sistemas

del organismo dependientes de la homeostasis del Ca. Como producto de las alteraciones en

la musculatura lisa aumenta la susceptibilidad a otras patologías, como el menor tono del

esfínter del pezón, la mastitis a coliformes -con una tasa de riesgo 8 a 9 veces mayor en vacas

que sufrieron hipocalcemia previa-, la menor contractilidad uterina, las distocias, la retención

de placenta, el retraso de la involución uterina, las metritis o endometritis -con retraso en el

reinicio de la actividad reproductiva-, los desplazamientos de abomaso, la disminución de la

funcionalidad ruminal, la reducción del consumo voluntario, la cetosis por balance energético

negativo, la disminución de la producción láctea, la menor tasa de remodelación ósea, las

enfermedades podales y la disminución de la respuesta inmune entre otros trastornos

conocidos que tienen un alto impacto sobre la economía del establecimiento lechero.

La importancia de la hipocalcemia subclínica es que el período no se limita al periparto, sino

que abarca el preparto temprano y puede ir bastante más lejos en el tiempo que del pico de

lactancia cuando comienza a equilibrarse la pérdida mineral por la leche con el aporte por la

dieta. Los costos agregados en un establecimiento con alta prevalencia de hipocalcemia

subclínica son mucho mayores que los provocados por un bajo porcentaje de vacas con curso

clínico agudo.

Formas combinadas de hipocalcemia

La hipocalcemia clásica y más frecuente es la descrita con valores en sangre bajos en

calcemia, bajos en fosfatemia y altos en magnesemia, pero pueden existir otras

192

combinaciones patológicas. Una de ellas es la hipocalcemia con hipomagnesemia que tiene

un cuadro clínico similar en cuanto al cuadro de vaca caída pero la sintomatología nerviosa

tiene manifestaciones musculares con mayor espasticidad, con contracciones tónico-clónicas,

pudiendo haber hipertermia y muerte súbita. El tratamiento clásico no es tan efectivo a menos

que se agregue magnesio en la fórmula endovenosa. Otra manifestación de vaca caída en el

periparto es por la hipofosfatemia que presenta un cuadro también de posición de decúbito

con parálisis en miembros posteriores, permaneciendo en estado de alerta y que no responde

al tratamiento con Ca, el aporte de fósforo endovenoso es medianamente eficaz. Estos dos

últimos casos pueden cursar con hipercalemia.

Tratamiento

El tratamiento de la hipocalcemia clínica aguda con la infusión endovenosa de borogluconato

de Ca ya es un clásico, como fue mencionado anteriormente practicado desde Dryerre y Greig

en 1930 (in Payne, 1981). La opción para el tratamiento clínico de la fiebre de la leche debe

incluir inevitablemente el tratamiento IV con soluciones de Ca y considerar la propuesta más

actual de incluir en el momento del periparto la administración de un gel oral de Ca para

prevenir las recaídas del cuadro clínico que puede rondar el 25 al 40% luego de la

administración de borogluconato de Ca (Queen, 1993). Algunos veterinarios administran

simultáneamente a la infusión endovenosa alguna dosis subcutánea de soluciones cálcicas,

pero esta práctica tiene los inconvenientes de que la absorción no puede asegurarse, que la

dosis no es lo precisa que puede pretenderse, que depende de una buena perfusión y que

puede ocasionar reacciones subcutáneas adversas. Las dosis de borogluconato de Ca IV en

solución al 23% aportan 8 a 14 g de Ca en 500 mL, con recomendación de dosis única y

suministrada en forma lenta evitando el riesgo de paro cardíaco durante la infusión. La dosis

recomendada es hasta 20 g por vez. Cada dosis suple el equivalente de 4 g en la sangre.

Algunas vacas hipocalcémicas en recuperación requieren dos o más dosis intravenosas, ya

que la deficiencia se estima en 10 a 20 g de Ca. Un signo del efecto favorable durante o al

final de la perfusión es la respuesta de eructación indicando el reinicio de las contracciones

ruminales.

Las vacas caídas en la fase 2 generalmente tienen una recuperación inmediata luego de la

infusión de Ca, pero en la fase 3 puede ser necesario una segunda dosis en un volumen de

193

200 mL y algunas ya en coma no responden a tiempo. En casos extremos de debilidad con

alteración cardíaca por arritmia puede administrarse sulfato de atropina al 1% vía

endovenosa.

Los geles, en presentaciones como cloruro de Ca, o como propionato, se administran vía oral

en geles de dosis única, generalmente en 300-400 mL. La absorción es rápida, el AUC

máximo es a los 30 minutos y el efecto puede durar unas 6 horas. La recomendación es

proporcionar un gel de Ca (un frasco) vía oral en el día del parto, que cumple una función

preventiva y curativa. Se puede repetir la administración una segunda dosis a las 12 o 24

horas posparto (Oetzel, 2013). La administración de sales de Ca de buena biodisponibilidad

como carbonato de Ca en la ración puede ser un coadyuvante, aunque no se manifiesta en la

calcemia. Los animales en ese período se encuentran con disorexia o anorexia, y además

estas sales tienen baja palatabilidad, por lo que el consumo no será muy elevado. Su

administración es más conveniente para los períodos de recuperación mineral durante la

lactancia. Hubo en el pasado diferentes combinaciones para compensar las variaciones de la

calcemia, tales como el uso de vitamina D3 o de otros metabolitos como 1-calciferol, o el

empleo de la hormona paratiroidea (PTH), pero su eficacia, su disponibilidad en el mercado

o el precio no resultan de conveniencia al momento actual.

El animal caído y en alerta debe colocarse en un ambiente limpio, con sombra, con agua y

comida, previniendo que, si permanece mucho tiempo en decúbito esternal, hay que ayudarlo

a moverse de lugar varias veces al día, al menos 4 a 6 veces, porque el decúbito persistente

entumece y provoca lesiones severas en sus músculos, por lo que ponerse de pie es una

dificultad que a veces la vaca no puede superar por la debilidad del tren trasero. Ayudarlo a

ponerse de pie en forma mecánica con un aparato levanta-vacas y una cincha ancha con la

que pueda ser colgada desde arriba, inclusive con un engranaje palanca que pueda tener un

anclaje posterior y otro anterior (lo que parecería un exceso), ayuda al animal a levantarse y

estar de pie un tiempo entre 30 y 60 minutos cada vez, que puede ser la diferencia entre

recuperarse o ser sacrificado. Es recomendable masajear los miembros posteriores. La

complicación es mayor si la hipocalcemia ocurre en el preparto inmediato lo que es muy

frecuente.

194

Prevención

La prevención de las enfermedades del período de transición de la vaca lechera incluye en

particular la hipocalcemia debido a la importancia económica y productiva en el

establecimiento, así como en el mantenimiento de la salud y de la sobrevida de los animales

sometidos a un continuo estrés para cumplir con las demandas productivas. El enfoque de la

prevención del período de transición es importante para disminuir la incidencia de casos

clínicos y de los efectos secundarios de la hipocalcemia subclínica, pero debe tenerse

presente que la recuperación mineral y metabólica de las vacas lecheras incluye el período

de lactancia tardío donde las demandas para producción disminuyen y donde el balance

energético y mineral es positivo y el animal recupera su peso vivo, su masa ósea y su

equilibrio metabólico, previo al fin de la gestación y del nuevo período de lactancia.

La alimentación y la nutrición son los elementos clave en el período de recuperación y

preparación para la nueva lactancia. La estrategia más aceptada para la prevención de la

hipocalcemia se refiere: al balance catión-anión, a dietas limitadas en Ca en el período seco,

a la administración de Ca oral al parto y al aporte balanceado de Ca durante la lactancia.

Dietas bajas en Ca durante las últimas semanas de gestación (menos de 20 g Ca/día en el

período seco) seguida de una dieta alta en Ca durante el período de lactación, reducen

manifiestamente la incidencia de la fiebre puerperal. Se propone utilizar dietas preparto bajas

en Ca para crear un balance negativo de manera de estimular los mecanismos de regulación

mediante la secreción de PTH que estimula la resorción ósea por los osteoclastos y la

producción renal de 1,25-(OH)2D3 incrementando su absorción intestinal para prevenir el

momento de máximas necesidades de Ca en el periparto. Se ha demostrado que la

hipocalcemia es principalmente causada por una alcalosis metabólica inducida por dietas de

pasturas altas en potasio. Si los niveles de potasio exceden el 2% debe considerarse

suplementar las vacas secas con sales aniónicas. El Ca ingerido durante el período seco puede

restringirse reemplazando total o parcialmente la alfalfa, conteniendo un 2% de Ca por henos

o silajes de forraje o de maíz con contenidos entre 0,4% y 0,8% del mineral.

Con respecto a las sales aniónicas, existe un acuerdo general basado en extensos trabajos

científicos que las dietas elevadas en Na+ y K+ y bajas en Cl- y SO42- tienen una influencia

negativa sobre la calcemia, mientras que proporciones inversas resultan favorables como

prevención. Los cationes monovalentes Na+ y K+, los bivalentes Ca2+ y Mg2+ y los aniones

195

SO42- y NaHCO3

tienen una influencia negativa sobre la hipocalcemia. Se han desarrollado

múltiples fórmulas para establecer la dieta con el mejor equilibrio en la homeostasis de los

minerales, calculadas sobre la base [Na+ + K+] - [Cl- + S2-]. La diferencia en la dieta de

cationes-aniones (DCAD) para prevenir la fiebre de la leche está basada en un modelo de

iones fuertes del balance ácido-base sanguíneo en el cual el pH plasmático está determinado

por cuatro factores independientes: pCO2; solubilidad del CO2 en el plasma; la diferencia de

iones y la concentración total de moléculas buffer débiles no volátiles del plasma,

principalmente albúmina, globulinas y fosfato. La base para establecer estos equilibrios

desde el punto de vista práctico es el empleo en la dieta de sales con los cationes: cloruro de

Ca (CaCl2), sulfato de Ca (CaSO4), cloruro de magnesio (MgCl2), sulfato de magnesio

(MgSO4), cloruro de amonio (NH4Cl), sulfato de amonio [(NH4)2SO4] o también los ácidos

clorhídrico (HCl) o sulfúrico (H2SO4). La absorción en el tracto digestivo del diferencial a

favor de cloruros y sulfatos con relación a los iones Ca, magnesio y amonio disminuyen el

pH plasmático. Esa inducción a la acidosis metabólica reduce el riesgo a la hipocalcemia

clínica basado en el metabolismo del Ca y la mayor disponibilidad y concentración del Ca

ionizado. Se han encontrado efectos favorables a las dietas de DCAD por: menor sensibilidad

a la PTH, aumento de síntesis de vitamina D3 por el riñón, mayor absorción de Ca en el

intestino e incremento de la resorción ósea. Como comprobación de la efectividad de las sales

para la acidificación sanguínea se recomienda su control con la medida del pH urinario,

debido a sus altos grado de correlación, donde los valores de pH 5,5–6,2 indican una correcta

acción acidificante aumentando la concentración sanguínea de Ca2+.

Finalmente, una dieta baja en Ca debe aportar mucho menos del requerimiento de la vaca

para ser capaz de preparar los mecanismos de regulación. Por ejemplo, una vaca de 600 kg

PV consumiendo 13 kg de materia seca debe ingerir una dieta que provea menos de 1,5 g/kg

de Ca, o sea menos de 20 g de Ca disponible por día. Es importante tener en cuenta que luego

del parto el animal debe ser cambiado a una dieta alta en Ca para cubrir los requerimientos

de mantenimiento y lactación, sabiendo que cada litro de leche contiene 1,2 g de Ca total y

que una vaca Holstein con 500 kg PV, con una producción de leche de 30 L/d, tiene

necesidades de al menos 52,5 g Ca/d (NRC, 2001).

En conclusión, la hipocalcemia clínica de la vaca lechera debe enfocarse con el tratamiento

medicamentoso en el caso individual, pero que es más importante el control de todo el rodeo,

196

comenzando desde el período de lactación, siguiendo por el período seco y por el período de

transición, con el manejo de la alimentación y el empleo de sales aniónicas, considerando

que todas las vacas del tambo estarán sometidas a las mismas condiciones ambientales y que

fisiológicamente esos animales presentarán un alto porcentaje de hipocalcemia subclínica,

antesala de trastornos de la salud que influirán negativamente en la producción y en la

economía del productor.

Hipomagnesemia

Antecedentes

La hipomagnesemia es una enfermedad metabólica clásica de los rumiantes, reconocida

desde 1929 por Sjollema y Seekles (in Payne, 1981), ocasionada por el descenso del

magnesio (Mg) en la sangre y caracterizada por un cuadro nervioso agudo con muerte en

tetania. Se le conoce también como tetania de los pastos, tetania de los avenales y tetania del

transporte. La alteración está determinada en primer lugar por el aporte deficiente del

mineral, y existen un par de teorías que explicarían su patogenia. Una de ellas, la más antigua,

está relacionada con la ingesta de vacas pastoreando por dos o tres semanas en gramíneas

jóvenes de rápido crecimiento o verdeos de cereales (avena) de invierno conteniendo bajos

tenores en Mg (< 0,20% MS). También es característica de las plantas jóvenes el contenido

de baja materia seca o sea de altos contenidos de agua, alto tenor en proteínas solubles y en

potasio que ingresadas al tubo digestivo aumentarían el tránsito intestinal, modificando las

fermentaciones ruminales y provocando diarreas que inducirían a una baja digestibilidad,

disminuyendo la absorción de un contenido ya de por sí bajo en Mg. Esta situación se da en

primavera u otoño que corresponde con la puesta en pasturas de las vacas para cubrir los

momentos de mayores requerimientos para mantener el pico de producción lechera. Otra

patogenia propuesta explicaría situaciones de estrés que desencadenan el cuadro clínico en

bovinos y en ovinos como ocurre en el ayuno, en adversidades atmosféricas con frío, viento

y lluvia y con el transporte. Esta respuesta está relacionada con la movilización grasa de los

adipocitos del tejido de reserva por efecto de la adrenalina, que prepara a las células para una

demanda energética incrementada para responder con el músculo esquelético a las exigencias

para la lucha o la huida, ante ese estrés. El adipocito utiliza Mg a través de su membrana para

197

realizar la lipólisis intracelular provocando una redistribución obligatoria del mineral. El

potasio podría utilizar ese mismo mecanismo, ya que es sabido que tenores elevados de

potasio son factores predisponentes que interfieren la absorción del mineral provocando la

deficiencia del balance y desarrollando la hipomagnesemia. Se han señalado como causas de

la hipomagnesemia las pérdidas del mineral por la leche particularmente durante el pico de

lactancia; el poco aporte del mineral en la ración o las pasturas; el aporte excesivo en el suelo

y las pasturas del ion K+ y la movilización de grasas que provoca la redistribución del Mg en

el organismo. Hay que señalar que contribuye con las situaciones deficitarias que las sales de

Mg de la dieta tienen un coeficiente de absorción intestinal más bajo que otros minerales con

valores de 29% del aporte. El balance nutricional de Mg y su concentración en el líquido

extracelular (2–3 g de Mg) dependen de la absorción activa y pasiva del Mg desde el rumen

y el intestino; de los requerimientos del animal para mantenimiento y producción; de la

excreción endógena del organismo y de las pérdidas por leche.

El Mg es un mineral mayor que comprende el 0,05% del peso corporal y que en una vaca de

500 kg PV hay unos 170 g de Mg en el tejido óseo, 70 g en el espacio intracelular, 2,5 g en

fluidos extracelulares y 0,7 g en sangre (Mayland, 1987, in NRC, 2001). Su forma química

se encuentra en forma libre o ionizada en el 55% o unido a proteínas en el 32% o formando

complejos con citratos y fosfatos en un 13% del total (Mayland, 1988), o expresado de otra

manera: 60% en hueso, 39% en tejidos blandos y 1% en el líquido extracelular (Contreras,

2003). El Mg participa en múltiples funciones del organismo, como activador o cofactor de

reacciones enzimáticas; en la síntesis de proteínas; en la regulación de la permeabilidad de

membranas celulares; en la movilización del Ca; en el tono y la contracción muscular y en la

regulación de la bomba de Ca2+ en el sarcoplasma; en la regulación de acetilcolina en la placa

motora; en la regulación de la estructura de RNA y DNA ribosomal, y por ello regula el

crecimiento celular en la síntesis de anticuerpos y linfocitos (Kaneko et al., 1997). Las

necesidades para una vaca de 500 kg PV con una producción de 20 L/d son: pérdidas por

leche (0,13 g/L) 2,6 g; pérdida fecal (3 mg/kg/d) 1,5 g y pérdida urinaria de 1,0 g. Por tanto,

sus necesidades de absorción son de 5,1 g/d. Ha sido propuesto que la relación K+/Ca2++Mg2+

sea < 2,2-2,5 (Kemp y 't Hart, 1957). Esos requerimientos mantendrían los valores de Mg en

sangre de 2,2 mg/dL (0,92 mmol/L). Hay varios factores de la dieta y fisiológicos que

influyen en la absorción del Mg: fundamentalmente la relación K/Mg; la relación Ca/Mg; la

198

proporción del Mg en el rumen; la relación Na+/K+ en el rumen (el aumento de K+ altera el

diferencial de potencial transmural celular y la actividad de la Na/K-ATPasa); las altas

concentraciones de amonio ruminal que actúa como quelante; la deficiencia de energía por

la microflora ruminal; el exceso de fosfatos (relación Mg/PO4) en la ración formando sales

insolubles y la edad de los animales y el pH intestinal.

Diagnóstico clínico

La hipomagnesemia se puede presentar bajo una forma subclínica y otra clínica con cuadro

nervioso de hiperexcitabilidad, tetania y muerte. La forma subclínica con ausencia de

síntomas clínicos presenta algunas manifestaciones como la disminución de la producción

láctea, la disminución de la conversión de los alimentos que puede pasar totalmente

inaparente y descubrirse solamente por la bioquímica o por la respuesta a la adición de Mg

en la dieta. La forma clínica se presenta como consecuencia de la disminución del Mg en

sangre, en el compartimento extracelular y en el líquido cefalorraquídeo afectando la

conductividad eléctrica de las terminaciones nerviosas y musculares, controlando la

excitabilidad neuronal y la transmisión de los impulsos nerviosos en las uniones

neuromusculares. Su acción actúa estabilizando las membranas biológicas en el transporte

de energía comportándose como agente de relajación muscular por ese motivo su

disminución se manifiesta por sintomatología nerviosa de excitación y parálisis espástica.

En el cuadro inicial hay disminución del apetito, disminución de la producción láctea

(Kronfeld, 1980), pero luego rápidamente aparecen cambios en el comportamiento,

volviéndose agresivo, pudiendo atacar a las personas u otros bovinos (Hicks y Pauli, 1976).

Continúan los signos de hiperexcitabilidad con respuesta exagerada a los estímulos externos

como los sonidos, hay hiperreflexia e hiperestesia, con temblores musculares en las grandes

masas musculares y cuello. La cabeza puede estar estirada y la boca abierta por dificultad

respiratoria con movimientos superficiales de mayor frecuencia, por la contractura de los

músculos intercostales. En esta etapa hay hipertermia, anorexia e intranquilidad con

defecaciones frecuentes con heces muy líquidas. Las micciones son frecuentes con orina de

color normal. Las orejas están erguidas y el reflejo anal y el palpebral aumentados, los

párpados se abren y se cierran, mostrando un nistagmus. Los síntomas neuromusculares

aumentan de intensidad presentándose astasia en la estación con rigidez en extensión de los

199

miembros, evolucionando a una incoordinación motora con ataxia que lleva a la caída del

animal en paresia espástica, instaurándose convulsiones tónico-clónicas para finalizar con un

cuadro de opistótonos, movimientos de pedaleo, rechinar de dientes, tetania y coma. Pueden

ocurrir algunos episodios de convulsiones tónico-clónicas con períodos cortos de

recuperación que se reiteran desencadenados por sonidos o simples movimientos externos,

pero finalmente se desencadena el cuadro final de tetania y muerte. Puede ocurrir que la única

manifestación visible sea la muerte súbita. A la forma clínica crónica, con desmedro del

animal, con baja producción láctea y con alteraciones óseas es difícil de reconocer como

hipomagnesemia, salvo por exámenes rutinarios del tipo de los perfiles metabólicos.

La bioquímica clínica es concluyente para confirmar el diagnóstico, con el descenso del Mg

en el suero (<1,2 mg/dL), en el líquido cefalorraquídeo (<1,45 mg/dL) y en el cadáver por la

concentración de Mg en el humor vítreo (< 1,8 mg/dL) y en la orina (< 2,5 mg/dL). Los

valores de referencia son 2,0 a 3,0 mg/dL (0,82 a 1;23 mmol/l) en suero y 2,0 mg/dL en

líquido cefalorraquídeo (Hunt, 1996). La anatomía patológica no presenta signos relevantes.

El diagnóstico se establece en base a la sintomatología clínica por el cuadro nervioso con

hiperexcitabilidad y tetania, a la patología clínica y a la respuesta al tratamiento.

Tratamiento

El tratamiento y el control se enfocan a elevar los niveles del Mg en el organismo. Para el

tratamiento se pueden usar soluciones de sulfato de Mg al 20% en dosis de 250-300 mL por

vía intravenosa lenta, teniendo en cuenta que la magnesemia no dura estable más de 24 a 48

horas ya que el bovino no tiene capacidad de almacenar el mineral y el exceso lo excretará

por vía urinaria. La formulación de Mg para administrar vía parenteral puede ser

glutamato/aspartato de Mg (Cseh, 2012). Es aconsejable aportar también óxido de Mg en

forma oral en una mezcla mineral a razón de 60 g/animal/día, mezclado con concentrado,

con melaza, disperso sobre el heno humedecido o como aditivo en ensilaje (1 kg/ton) o

mezclado con sal 20:80 (Contreras, 2009).

Prevención

Se puede recomendar para la prevención y control suministrar mezclas minerales con niveles

adecuado de Mg. En establecimientos con problemas se puede suministrar oralmente óxido

200

de Mg a dosis de 28-56 g/animal/día. Se puede fertilizar con óxido de Mg (85 kg/ha/año) o

esparcirlo sobre la pastura (28-32 kg/ha) y promover el desarrollo de leguminosas en la

pastura. Evitar desbalance de exceso de potasio en el forraje (> 2,0% MS) y el exceso de

proteína degradable o nitrógeno en la ración. Una forma práctica de administración es el

suministro de bloques para lamer o, mejor aún, de sales en bateas de libre disponibilidad.

Otra forma es suministrar fardos o rollos de forraje espolvoreados con óxido de Mg. También

puede ser práctico y aconsejable mezclar con maíz molido, afrechillo o melaza para mejorar

el gusto amargo del Mg. Otra alternativa es agregar 1,5 g de cloruro de Mg por L de agua en

los bebederos (Cseh, 2012). El Mg puede ser suministrado como bolos de Mg intrarruminales

o en sales como sulfato de Mg o cloruro de Mg; se debe tener precaución con la forma de

cloruro, porque éste es poco palatable o desagradable para los animales y no lo consumirán.

Las leguminosas tienden a acumular una mayor concentración de Mg por lo que es

recomendable el uso de asociaciones gramíneas-leguminosas para incrementar el consumo

diario del mineral contribuyendo en la prevención de la hipomagnesemia (Goff, 1998; NRC,

2001). En suma, se debería cubrir nutricionalmente las necesidades para mantenimiento y

producción, realizando análisis preventivos de suelo, alimento y animales en los períodos de

riesgo, con la precaución de manejar alternativas de control y prevención en los

establecimientos con alto riesgo de hipomagnesemia clínica.

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203

Deslocamento de abomaso em vacas leiteiras: ocorrência, manejo e

indicadores diagnósticos

Angélica Petersen Dias

Anne Rosi Guadagnin

Felipe Cardoso

A ocorrência do deslocamento de abomaso à esquerda ou à direita é comumente observada

em bovinos de grande porte e de alta produção leiteira após o parto, sendo que

aproximadamente 90% dos casos ocorrem até seis semanas após o parto (Radostits et al.,

2000). A prevalência desta doença varia de rebanho para rebanho dependendo da localização

geográfica, práticas de manejo e clima, dentre outros fatores. Nos EUA a incidência da

afecção está associada aos meses de inverno, provavelmente devido à maior inatividade dos

animais e à maior concentração de partos (Radostits et al., 2000). Detilleux et al. (1997)

relacionaram que as perdas econômicas relacionadas a esta doença estão na queda da

produção de leite durante o período de convalescença e o alto custo do tratamento. Estes

autores relataram que desde o parto até 60 dias após o diagnóstico, as vacas leiteiras com este

transtorno produziram 557 kg de leite a menos do que animais sadios, sendo que 30% das

perdas ocorreram antes do diagnóstico em estudo realizado com 12.572 vacas da raça

Holandesa. Raizman e Santos (2002) afirmam que a perda de produção de leite ocorre nos

primeiros 4 meses de lactação. Afirmam, também, que vacas acometidas por deslocamento

de abomaso à esquerda apresentam maior intervalo do parto até primeira inseminação

artificial e são duas vezes mais suscetíveis a outras doenças que os animais sem problemas

de saúde.

No estado do Rio Grande do Sul (sul do Brasil), este distúrbio é encontrado em bacias

leiteiras de alta produção. Inexiste, entretanto, um estudo de prevalência da doença no Brasil.

O avanço do conhecimento técnico para o diagnóstico do deslocamento de abomaso

provavelmente foi o responsável pelo aumento do número de casos observados no Estado.

Segundo relato de médicos veterinários, com experiência nesta afecção, a ocorrência é maior

no período inicial de inverno e final de primavera. Uma das possíveis explicações para esta

observação é que nestes períodos as pastagens de inverno e verão, respectivamente, ainda

não estão estabelecidas gerando um déficit de fibra na dieta destes animais. Nesse contexto,

204

é necessário o conhecimento dos eventos metabólicos que ocorrem antes e depois da

apresentação do transtorno, principalmente em sua relação com o manejo alimentar dos

animais e o envolvimento de patologias associadas, para que se possam diminuir as perdas

econômicas através de um diagnóstico eficaz e um monitoramento adequado do tratamento.

Os objetivos deste artigo são revisar as causas de deslocamento de abomaso, sua patogenia e

o impacto em distúrbios metabólicos associados e avaliar como diferentes estratégias

nutricionais antes e depois do parto podem afetar esta patogenia através da adequação dos

nutrientes. O tema central do artigo é o manejo nutricional para promover maior ingestão de

matéria seca (IMS) após o parto, e menor redução de IMS no pré-parto, que são um fator

unificador para o sucesso no período de transição e a prevenção do deslocamento de

abomaso.

Etiologia e epidemiologia

O deslocamento de abomaso (DA) é uma doença multifatorial relacionada com o manejo

alimentar que afeta vacas leiteiras de alta produção, principalmente durante o início da

lactação. A atonia abomasal é um pré-requisito para a sua ocorrência. O deslocamento de

abomaso para esquerda (DAE) é predominante em 85 a 96% das ocorrências (Trent, 1990).

O fornecimento de altos níveis de concentrado (grãos) na dieta aumenta a taxa de passagem

do alimento pelo rúmen, causando um aumento na concentração de ácidos graxos voláteis

(AGV) que pode inibir a motilidade do abomaso. O grande volume de metano e dióxido de

carbono encontrado no abomaso após a ingestão de grãos pode ser responsável pela sua

distensão e deslocamento (Van Winden et al., 2002). Em uma vaca saudável, a produção, a

difusão e o transporte de gás estão em equilíbrio, portanto não ocorre o acúmulo (Figura 1).

Uma concentração de fibra bruta menor que 16% é considerado um fator predisponente para

o DA. O fornecimento de uma dieta experimental completamente peletizada resultou em um

aumento na incidência de DA em 17%, enquanto uma dieta contendo feno de alfafa, silagem

de sorgo e concentrado com 18% de proteína bruta causou uma incidência de 1,6% (Dawson

et al., 1992).

Sugere-se que no estágio avançado de gestação, o volume uterino aumentado ocupa uma

porção do espaço do rúmen, e a retração uterina logo após o parto leva a uma predisposição

anatômica de deslocamento do abomaso (Goff & Horst, 1997). O DAE ocorre principalmente

205

no período de duas a oito semanas pós-parto. Wolf et al. (2001) verificaram que mais de 75%

dos casos de DA ocorrem nos primeiros 30 dias pós-parto. Tabeleao et al. (2005), em estudo

realizado no Paraná, encontraram maior ocorrência desse transtorno nos 10 dias após o parto.

Shaver (1997) relatou que 80 a 90% dos casos de DAE são diagnosticados no primeiro mês

pós-parto.

Figura 1. A) Vista lateral esquerda do aparelho digestório de um bovino normal. B) Vista lateral esquerda do

aparelho digestório do bovino com DAE (Turner & Mcllwrath, 1985)

Segundo Cardoso et al. (2008), o deslocamento de abomaso à esquerda é uma afecção com

distribuição mundial, com comprovada incidência na Região do Planalto do Rio Grande do

Sul. Em animais com DAE, a produção de leite, o peso e o escore de condição corporal

encontram-se diminuídos. A fita reagente indicativa de pH é uma boa ferramenta a campo

para a determinação do pH ruminal. O tempo de redução do azul de metileno (TRAM) é

significativamente menor no DAE, indicando que um dos fatores a ser corrigido no

tratamento pós-cirúrgico é a reposição do equilíbrio ruminal. Os valores séricos de lactato,

β-hidroxibutirato (BHB) e AST estão aumentados nos animais com DAE, sendo indicativos

para o diagnóstico auxiliar desta afecção. Dentro dos parâmetros utilizados, TRAM,

produção de leite, hematócrito, ureia, escore de condição corporal e BHB mostraram-se como

os mais eficazes na caracterização desta afecção.

206

Importância econômica

Detilleux et al. (1997) concluíram que as perdas econômicas relacionadas com essa doença

estão na queda na produção de leite durante o período de convalescência e o alto custo do

tratamento. Segundo esses autores, as vacas leiteiras com esse transtorno produziram 557 kg

de leite a menos em comparação a animais sadios, desde o parto até 60 dias após o

diagnóstico. Segundo Raizman e Santos (2002), a perda de produção de leite acontece nos

primeiros 4 meses de lactação e as vacas acometidas por DAE apresentam maior intervalo

do parto até a primeira inseminação artificial. Outros custos eventuais resultantes são o custo

referente à perda do animal, caso venha a óbito, e custos referentes às doenças secundárias

ao DAE. Segundo Bartlett et al. (1995), as despesas com cada caso de DAE variam entre

US$200 e US$400 (Bartlett et al., 1995) envolvendo custos cirúrgicos, desempenho da

lactação, custo de reposição da vaca e valor de abate do animal. Baseado nos valores descritos

por Bartlett et al. (1995), Andrade (2005) estimou os custos de dois casos de DAE que

ocorreram na região do Planalto Riograndense. Para tal, estimou gráficos de produção

esperada de leite para cada animal e calculou as despesas com medicamentos e custos

cirúrgicos. Os animais analisados encontravam-se na 1ª e 3ª lactação quando da ocorrência

de DAE, de modo que a produção esperada de leite foi calculada através da média de

produção de animais em 1ª e 3ª lactação no rebanho, respectivamente (Figura 2). Observa-

se que a queda na produção de leite de animais acometidos por DAE pode perdurar entre 3 a

6 meses, sendo um prejuízo considerável em termos financeiros. Os animais foram

submetidos à correção cirúrgica do deslocamento de abomaso, de modo que somado ao custo

decorrente da queda na produção leiteira está o custo do procedimento cirúrgico e os

medicamentos utilizados (Tabela 1). As perdas totais decorrentes da doença foram de US$

496,63. Desta forma os valores encontrados ultrapassaram os descritos por Bartlett et al.

(1995), demonstrando a importância da prevenção dessa doença. Convém ressaltar que não

estão incluídos nestes cálculos os custos referentes à eventual perda de animais decorrentes

da doença ou custos com doenças secundárias ao DAE, bem como os custos referentes ao

deslocamento do médico veterinário até a propriedade. Fleischer (2001) cita que o

deslocamento de abomaso está relacionado com a produção de leite: quanto maior a

produção, maior o risco de desenvolver DA. Geralmente, as vacas que desenvolvem

207

deslocamento de abomaso são animais de alta produção, mas devido ao DA o animal

apresenta um baixo desempenho em produção leiteira na lactação corrente.

Patogenia

Existem doenças associadas que predispõem o DA, como aquelas que resultam em anorexia

e inapetência, devido a uma diminuição do volume ruminal. Uma menor ingestão de matéria

seca (IMS), especialmente no período de transição, é um dos principais fatores de risco para

o desenvolvimento do DA, devido ao menor volume ruminal. Radostits et al. (2006) relatam

que dietas pré-parto com alta densidade energética como preparação para o início da lactação,

aumentam os fatores de risco para o DA. Logo, o consumo de fibra efetiva é importante para

o ruminante e não deve ser menosprezado no momento das formulações da dieta. A cetose

comumente diagnosticada antes do DA está fortemente associada com o problema, uma vez

que reduz o consumo de matéria seca e o preenchimento ruminal, diminuindo a motilidade

dos demais estômagos e, potencialmente, a motilidade do abomaso (Van Winden et al.,

2003b). Cardoso et al. (2008) encontraram valores de BHB de 1,14 ± 1,1 mmol/L para

animais com DA e de 0,69 ± 0,28 mmol/L no grupo controle, relacionando os valores

aumentados de BHB ao maior risco de DA, e confirmando os dados encontrados por Van

Winden et al (2002). Um estudo desenvolvido com 528 vacas de leite indicou que vacas com

valores de BHB >1,6 mmol/L durante as primeiras duas semanas pós-parto tem 6,9 vezes

mais chance de desenvolver DA quando comparadas com vacas que possuem menores

concentrações de BHB sanguíneo (Suthar et al., 2013).

A hipocalcemia também é uma patologia predisponente ao DA. Os níveis sanguíneos de

cálcio afetam diretamente a motilidade do abomaso, de forma que em concentrações abaixo

de 4,8 mg/dL não há motilidade. Massey et al. (1993) conduziram um estudo com 510 vacas

leiteiras e concluíram que todos os animais diagnosticados com hipocalcemia antes do parto

(< 7,9 mg/dL) tiveram 4,8 vezes mais chances de desenvolver DA. Com o intuito de prevenir

a hipocalcemia e consequentemente o DA, a diferença cátion-aniônica da dieta (DCAD) pode

ser utilizada durante as três últimas semanas pré-parto. Em alguns casos, a porção

deslocada do abomaso fica presa entre o retículo e o diafragma, o que resulta em um estado

de inanição severa e compromete a digestão e o movimento da ingesta. Uma alcalose

metabólica leve com hipocloremia e hipocalemia são comuns, devido provavelmente à atonia

208

abomasal e contínua secreção de ácido clorídrico com prejuízo no fluxo de alimento para o

duodeno (Howard & Smith, 1999).

Figura 2. O gráfico acima compara a produção de leite de uma vaca com DAE em 1ª lactação em

comparação com a produção esperada. O gráfico embaixo compara a produção de leite de uma vaca

com DAE em 3ª lactação com a produção esperada (Andrade, 2005)

Tabela 1. Estimativa de despesas totais decorrentes

de DAE em bovinos leiteiros (Andrade, 2005)

Item US$

Perdas em produção de leite 265,75

Terapia medicamentosa 35,58

Tratamento cirúrgico 196,30

Total 496,63

Nos casos de DA à direita, pode haver um comprometimento maior do abomaso devido à

possibilidade de ocorrência de vólvulo em diferentes graus, podendo chegar até 360°. Este

loop ocorre no sentido anti-horário tendo como ponto de visão o posterior do animal ou o

209

lado direito. A ingestão diminuída de líquido e o sequestro de grandes volumes de ácido

clorídrico no abomaso levam à desidratação e volemia (Gesihauser & Schemann, 1998). O

vólvulo pode provocar uma obstrução do fluxo sanguíneo através do abomaso. Este fato pode

levar a congestão, edema, e, eventualmente, necrose da parede do abomaso (Habel et al.,

1981).

Cardoso et al. (2008) realizaram um estudo sobre as variações do hemograma e perfil

bioquímico sanguíneo em vacas com DAE. Concluíram que em vacas acometidas por esse

transtorno a produção de leite, o peso e o escore de condição corporal diminuem. O tempo

de redução do azul de metileno (TRAM) é significativamente menor em animais com DAE.

Os valores séricos de lactato, BHB, ácidos graxos livres, ureia e AST apresentam-se

aumentados, enquanto os de proteína total, albumina e colesterol diminuem nos animais com

DAE. Portanto, esses metabólitos são indicativos para o prognóstico e tratamento desta

afecção.

Diagnóstico

Rosemberger (1990) descreveu os sinais observados no DA. Frequentemente os animais

apresentam uma queda brusca no consumo de grãos enquanto ainda continuam consumindo

forragens. As fezes apresentam-se moles e reduzidas sendo que períodos de diarreia quase

sempre ocorrem. A temperatura retal e as frequências cardíaca e respiratória encontram-se

normais na maioria dos casos. Os movimentos ruminais apresentam-se diminuídos na sua

frequência e intensidade. Animais com um quadro agudo de vólvulo ficam deitados 24 horas

após o episódio e podem vir a óbito dentro de 48 a 96 horas devido ao choque e desidratação.

Nos casos de DAE, o diagnóstico pode ser realizado através da auscultação e percussão do

flanco esquerdo localizando-se o som metálico característico de “ping” (Rosenberger, 1990).

A maioria dos deslocamentos pode ser encontrada no meio de uma linha imaginária

estabelecida entre a tuberosidade coxal esquerda e o cotovelo esquerdo. O “ping” pode estar

localizado desde a nona costela até a fossa paralombar esquerda. Caso exista dúvida na

origem do “ping” entre rúmen ou abomaso, pode-se realizar uma aspiração do líquido

presente na região de gás e aferir o pH, que deve diferenciar entre rúmen (pH 6-7) e abomaso

(pH 2-3) (Rosenberger, 1990). Nos casos de DA à direita as técnicas de diagnóstico são as

mesmas do DAE. Deve-se ter o cuidado de diferenciar quaisquer outras patologias que

210

possam provocar o “ping” no flanco direito. A mais comum é a dilatação e/ou torção de ceco

que pode ser diferenciada através de palpação retal (Howard & Smith, 1999).

Fatores genéticos

Fatores genéticos têm sido aceitos como um dos fatores predisponentes para a ocorrência de

DA. A herdabilidade (h2) foi estimada entre 0,15 a 0,3 para DA em geral (Uribe et al., 1995;

Zwald et al., 2004) e até 0,53 para DAE (Hamann et al., 2004). Vários loci de características

quantitativas (QTL) para DA têm sido identificados em vacas Holandesas (Mömke et al.,

2008), entre eles, o locus proximal no cromossomo 23 (BTA23). Uma vez que o DA é

precedido por uma diminuição da motilidade do abomaso, o gene motilina (MLN) localizado

proximalmente no BTA23, que codifica um pequeno hormônio regulador da contração

gastrointestinal, é um dos genes importantes e necessita ser estudado. Mömke et al. (2012)

identificaram um polimorfismo de nucleotídeo único (SNP) que afeta o sítio de ligação

NKX2-5 dentro do gene bovino MLN. Esse polimorfismo mostrou estar correlacionado com

uma diminuição significativa na expressão do MLN e com um significante aumento da

incidência de DAE em vacas Holandesas. Esse é o primeiro polimorfismo demonstrando uma

associação com o DAE e pode ser utilizado como teste de suscetibilidade nessa raça. Zwald

et al. (2004) encontraram uma correlação genética moderada entre DA e cetose (0,45 ± 0.16)

na primeira lactação de vacas Holandesas nos Estados Unidos. Neuenschwander et al. (2012)

encontraram uma alta correlação genética (0,58 ± 0.13) entre DAE e cetose com vacas

Holandesas no Canadá.

Tratamento

Os principais objetivos do tratamento do DA para esquerda ou para a direita ou vólvulo são

de recolocar o abomaso em sua posição original ou aproximada, criar uma ligação

permanente nesta posição, corrigir o balanço eletrolítico e a desidratação do animal e

providenciar tratamento apropriado para doenças associadas. Nenhuma das técnicas permite

a identificação exata do local de fixação do abomaso e existe a possibilidade de vazamento

de líquido abomasal no abdômen, ocasionando peritonite. Podem ocorrer complicações,

como a fixação de outras estruturas (como o rúmen e o intestino) ou fixar o abomaso em uma

posição equivocada (Fubini & Ducharme, 2004). A escolha da técnica deve ser aquela em

211

que o cirurgião esteja mais habituado e em que se sinta mais confortável realizando, uma vez

que todas elas apresentam resultados e períodos de recuperação semelhantes.

A abomasopexia pelo flanco esquerdo é utilizada para visualizar uma porção do abomaso

com o animal em pé. A colocação das suturas na região paramediana ventral direita deve ser

feita cuidadosamente para evitar a fixação de outras estruturas ao mesmo tempo na sutura

(Howard & Smith, 1999). A omentopexia pelo flanco direito é uma técnica muito bem aceita,

mas deve-se ter cuidado, pois muita força é disposta sobre o omento no momento da sutura

(Fubini & Ducharme, 2004). Todos os animais com DA ou vólvulo apresentam algum

distúrbio eletrolítico. A composição do fluido administrado pode ser ajustada conforme o

perfil bioquímico destes animais. Soluções isotônicas salinas e Ringer são comumente

utilizadas e apresentam bons resultados (Huhn & Nelson, 1995). O volume de líquido a ser

administrado depende do grau de desidratação do animal. A hidratação oral pode ser

utilizada, mas não é substituível à administração endovenosa, quando o animal apresenta um

grau de desidratação igual ou maior que 8%. A utilização de antimicrobiano fica a critério

do médico veterinário que deve levar em consideração o tempo do procedimento, assepsia

do tratamento cirúrgico e a manipulação que foi realizada no procedimento (Howard &

Smith, 1999).

Controle

Por se tratar de uma doença multifatorial, a identificação dos fatores predisponentes é a

melhor forma de prevenção. A diminuição na ingestão de matéria seca no pré-parto e o

gradual aumento na ingestão no pós-parto são fatores de risco, pois causam menor

preenchimento ruminal e aumento na incidência de doenças relacionadas ao período pós-

parto. Retenção de membranas fetais, metrite, cetose clínica ou subclínica e hipocalcemia

são fatores de risco prováveis ao desencadeamento de DAE. Da mesma forma, quantidades

excessivas de concentrado ou aumento repentino na quantidade de concentrado fornecido

durante o período pós-parto aumentam o risco de ocorrer DAE, pois a maior concentração de

AGV no conteúdo abomasal leva à diminuição da motilidade abomasal e do seu

esvaziamento, com consequente excesso de gás no abomaso (Radostits et al., 2006). A

alimentação e o manejo adequados impedem distúrbios no período pré e pós-parto, reduzindo

o risco de DA. Alguns princípios são importantes na prevenção da doença, como o ajuste da

212

dieta durante o período seco para evitar que as vacas estejam obesas no momento do parto,

facilitar o processo de adaptação das vacas em início de lactação (tanto nutricional quanto

socialmente), otimizar a IMS nos períodos pré e pós-parto imediato, garantir água e

alimentação palatável à vontade para as vacas em período periparturiente e não exceder de

1,65 Mcal EL/Kg de MS em densidade energética da dieta no período próximo ao parto. A

utilização de feno como fonte de fibra durante o período seco é essencial para o enchimento

do rúmen, fermentação ruminal e motilidade do trato gastrointestinal (Goff & Horst, 1997).

Uma dieta rica em fibras causa uma expansão física do rúmen, promovendo uma barreira

contra a migração do abomaso. Uma característica importante é que a fonte de fibra fornecida

durante o período seco deve ser a mesma fornecida durante o período inicial da lactação, pois

isso permite uma adaptação mais rápida da fermentação ruminal (Curtis et al., 1985).

Fornecer uma dieta rica em forragens é uma das mais comuns e mais eficazes formas de

manejo estratégico para minimizar a ocorrência de DAE durante o período periparturiente.

Isto implica em garantir no mínimo um teor de 17% de fibra na dieta (Radostitis, 2007).

O fornecimento de propilenoglicol resulta numa menor incidência de DA quando utilizada

como tratamento metafilático no pós-parto imediato. Esse fato se deve às propriedades

gliconeogênicas que incrementam as concentrações plasmáticas de glicose e insulina e

diminuem as concentrações de ácidos graxos não esterificados e de BHB (Studer et al., 1993).

Uma alternativa é utilizar monensina na forma de cápsulas de liberação controlada, visto que

a monensina é um antibiótico ionôforo que altera a produção de AGV em favor da produção

de propionato, o maior precursor de glicose no ruminante. Desta forma, os efeitos da

monensina são mediados por melhora no balanço energético e consequente diminuição na

incidência de cetose subclínica, DAE e outras doenças metabólicas. A administração de

monensina CRC (controlled-release capsule) 3 semanas antes do parto diminui as

concentrações de ácidos graxos não esterificados e BHB e aumenta a concentração de

colesterol e ureia sérico na semana imediatamente após o parto (Duffield et al., 2005). Isto

indica um metabolismo energético mais efetivo em vacas que recebem monensina CRC, o

que é importante para a prevenção de retenção de placenta e cetose clínica, além da prevenção

de DAE. Pode-se esperar por uma redução de 40% na ocorrência de DAE e cetose clínica

com a administração pré-parto de monensina CRC e 25% menos ocorrências de retenção de

placenta (Radostitis et al., 2006).

213

Conclusão

Pelas perdas e incidência apresentadas por esta patologia, fica claro que é um problema

extremamente importante na atividade leiteira, e que deve receber especial atenção no que

diz respeito à prevenção. Cerca de 30% destas perdas ocorrem antes do diagnóstico e, além

das perdas em produção leiteira, terapêutica medicamentosa e procedimento cirúrgico,

devem-se considerar as eventuais perdas de animais, sejam decorrentes ou secundárias desta

patologia, e o fato que estes animais ficam mais susceptíveis a outras enfermidades. Entre

as diversas causas da inapetência, algumas devem receber atenção especial, tais como, a

nutrição [relação energia x fibra (FDN e FDA)], o estresse ambiental (calor, confinamento,

etc.), e todas as situações que possam desencadear a febre (doenças, parto, lesões de cascos,

etc.). A cetose é um destes prognósticos mais comuns, devido ao balanço energético negativo

que se instala, justamente pela inapetência neste período. Manter a ingestão normal durante

o período de transição, não só evita a mobilização de gordura como fonte energética, como

também, preserva a barreira ruminal ao DAE, pelo consumo de matéria seca.

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215

Alimentação e manejo de bezerras leiteiras

Carla Maris Machado Bittar

O manejo e a alimentação de bezerras são determinantes das taxas de morbidade e

mortalidade, assim como do desempenho animal durante esta fase e a fase subsequente, tendo

forte impacto na planilha de custo de animais de reposição. Os sistemas criação são bastante

variados e parte do rebanho nacional ainda cria bezerros ao pé da vaca, com aleitamento

natural; enquanto outra fração realiza o aleitamento artificial e utiliza tecnologias que

aumentam a eficiência do sistema (Santos & Bittar, 2015). O manejo alimentar de bezerras

tem início no fornecimento de colostro e culmina com o processo de desaleitamento dos

animais, importante para a manutenção do desempenho de animais recém desaleitados.

Cuidados com a recém-nascida

Os cuidados com as bezerras recém-nascidas começam ainda antes de seu nascimento,

quando vacas pré-parto são vacinadas contra patógenos que acometem animais jovens.

Devido ao tipo de placenta dos bovinos, os bezerros recém-nascidos são desprovidos de

imunoglobulinas (Ig) circulantes, dependendo do consumo de colostro para aquisição da

chamada imunidade passiva (Davis & Drackley, 2002). Dessa forma, dos cuidados com o

bezerro recém-nascido, o fornecimento de colostro é o mais importante para a redução nas

taxas de mortalidade e morbidade (Besser and Gay, 1994), assim como o desempenho

durante sua vida (Faber et al., 2005).

O sucesso da colostragem depende basicamente de três fatores: 1) tempo para fornecimento;

2) qualidade do colostro (concentração de Ig); e 3) volume de fornecimento (Quigley, 1996).

A concentração de imunoglobulinas no colostro tem sido tradicionalmente utilizada como

sinônimo de qualidade, no entanto, a carga bacteriana e a presença de patógenos como

também devem ser consideradas (Stewart et al., 2005). O colostro tem composição um pouco

diferente do leite, apresentando menores teores de lactose, mas maiores teores de gordura,

sólidos totais, minerais e vitaminas, e principalmente proteína (Tabela 1). O maior teor de

proteína do colostro se deve principalmente ao maior teor de Ig. Conforme as ordenhas, a

composição do colostro vai sendo alterada até a secreção ser considerada como leite.

216

Tabela 1. Alteração na composição de colostro conforme as ordenhas (adaptado de Foley & Otterby, 1978)

Parâmetro Colostro (ordenha pós-parto)

1 2 3 Leite

Gravidade especifica 1,056 1,040 1,035 1,032

Sólidos, % 23,9 17,9 14,1 12,9

Proteína, % 14,0 8,4 5,1 3,1

Caseína, % 4,8 4,3 3,8 2,5

IgG, mg/mL 48,0 25,0 15,0 0,6

Gordura, % 6,7 5,4 3,9 3,7

Lactose, % 2,7 3,9 4,4 5,0

A relação linear entre gravidade específica do colostro e concentração de anticorpos permite

o uso de um densímetro, chamado de colostrômetro, para o monitoramento da qualidade de

colostro (Figura 1). Entretanto, como a gravidade específica é dependente da temperatura, as

leituras devem seguir as recomendações do fabricante, de modo a não super ou subestimar a

qualidade. O colostro pode ser classificado em três faixas, de acordo com a concentração de

Ig: 1) Baixa qualidade: < 22 mg/mL; 2) Média qualidade: 22-50 mg/mL; e 3) Alta qualidade:

> 50 mg/mL. Outra ferramenta que pode ser utilizada para avaliação da qualidade do colostro

é o refratômetro de Brix (Figura 1), o qual tem uma menor dependência da temperatura para

avaliação. Quando utilizamos o refratômetro, consideramos o colostro como de alta

qualidade quando o mesmo apresenta leituras superiores a 22% (Quigley et al., 2013).

Para se garantir uma adequada transferência de imunidade, o colostro de alta qualidade deve

ser fornecido logo após o nascimento ou o mais rápido possível, uma vez que a absorção de

Ig é reduzida com o passar do tempo, não ocorrendo após 24h de nascimento (Godden, 2008).

Assim, a transferência de imunidade passiva é dependente da capacidade de absorção de Ig

(fator tempo) e da quantidade de Ig ingerida (fator qualidade). A adequada transferência de

imunidade passiva adequada ocorre quando o animal apresenta às 48 horas de vida,

concentração maior ou igual a 10 mg/mL, sendo 15 mg/mL o ideal, o que é garantido pelo

fornecimento de colostro de boa qualidade (> 50 mg/mL) nas primeiras horas de vida.

Quando estes valores não são alcançados, as taxas de mortalidade são significativamente

aumentadas.

217

Figura 1. Colostrômetro e refratômetro utilizados na avaliação de qualidade de colostro

A recomendação é que os animais recebam 10% de seu peso ao nascer nas primeiras 6 h após

o nascimento, sendo importante que a primeira refeição ocorra o mais cedo possível.

Considerando que os animais devem apresentar concentração sérica de IgG> 10 mg/mL, que

o volume de plasma de bezerros (~6,5% PV) e a que a eficiência aparente de absorção de

IgG é de 25%, obtém-se uma massa de IgG de 104 g, sendo esta a dose necessária no

fornecimento fornecida (Davis & Drackley, 1998). Assim, de acordo com a qualidade do

colostro, o volume fornecido deve ser alterado para que o consumo final seja de

aproximadamente 100 g de IgG. Para garantir este consumo, quando o animal não mama

voluntariamente o colostro, o uso de sonda esofágica é recomendado.

A aquisição de imunidade passiva pelos animais pode ser monitorada através de leituras com

refratômetro de proteína ou de Brix do soro destes animais até por volta das 48 h de vida.

Existe alta correlação de proteína sérica e de Brix com a concentração de Ig no soro de

bezerros (Deelen et al., 2014), o que permite inferir sobre o sucesso da colostragem. Quando

se utiliza o refratômetro de proteína os seguintes valores de leitura são considerados: 1)

transferência passiva adequada: > 5,5 g/ dL; transferência passiva moderada: 5,0-5,4 g/dL;

transferência passiva insuficiente: < 5,0 g/dL (Quigley, 2001). Quando o refratômetro de Brix

é utilizado, considera-se adequada transferência quando se obtém leituras > 8,4% (Deelen et

al., 2014).

A formação de um banco de colostro na propriedade garante a disponibilidade de colostro de

boa qualidade e em quantidade suficiente para todos os recém-nascidos. Alguns trabalhos

mostram que a conservação em geladeira pode ser feita durante até uma semana, enquanto a

conservação em freezer, mais utilizada em fazendas leiteiras, pode ser feita por até um ano

sem redução na qualidade (Davis & Drackley, 1998). O colostro deve ser congelado em

218

porções que facilitem seu descongelamento, que deve ser em banho-maria com temperatura

de até 50C (Elizondo-Salazar et al., 2010), para que não tenha sua qualidade reduzida.

Além de prover anticorpos aos animais até que estes tenham seu sistema imune ativo, o

consumo de colostro tem impacto na vida futura. Faber et al. (2005) mostraram que animais

colostrados com maiores volumes de colostro de alta qualidade apresentaram maior taxa de

crescimento e maiores produções de leite na primeira e segunda lactação. Embora a

colostragem seja a atividade mais importante a ser realizada com a recém-nascida, outras

práticas de manejo também são necessárias no primeiro dia de vida. A cura do umbigo deve

ser realizada ao nascer, e repetida pelo menos duas vezes ao dia, utilizando-se solução de

iodo 5-7%. A cura deve ser feita por imersão do cordão, de preferência com o animal em pé,

de forma que partículas e sujidades sejam lavadas com o excesso de iodo. Em torno de 3-4

dias o cordão já deve estar completamente mumificado e ter se destacado do animal. A cura

inadequada do umbigo é uma das causas de morte de animais jovens em decorrência da

formação de abscessos e de entrada de patógenos na circulação do animal.

A identificação e a pesagem do animal ao nascer são importantes para o acompanhamento

da vida produtiva do animal. Através da identificação e da anotação de data de nascimento e

peso, uma agenda pode ser elaborada para cada animal contendo as datas de desaleitamento,

vacinação, vermifugação, etc. Além disso, a pesagem do animal ao nascer permitirá a

avaliação do manejo alimentar durante o aleitamento.

Manejo alimentar

Os sistemas de aleitamento podem ser divididos em natural e artificial. O aleitamento natural

ainda ocorre em propriedades leiteiras, geralmente quando animais não especializados para

a produção de leite são utilizados, não havendo possibilidade de se ordenhar as vacas sem a

presença do bezerro. Um levantamento nacional mostra que ainda em torno de 35% das

propriedades leiteiras (Paraná, São Paulo e Minas Gerais) ainda tem bezerros mamando

diretamente de suas mães (Santos & Bittar, 2015). O sistema natural de aleitamento não é o

mais adequado do ponto de vista de manejo de bezerros, pois não permite o conhecimento

do volume de leite consumido. Este sistema resulta em grande variação no desempenho de

animais contemporâneos em resposta a variação na produção de leite de suas mães, maior ou

menor volume disponibilizado ao animal, e a consequente variação no consumo de

219

concentrado, como mostrou o trabalho de Campos et al. (1993). Já no sistema de aleitamento

artificial, os animais recebem volumes conhecidos e controlados de dieta líquida através de

mamadeiras, bibeirões, baldes, containers ou até mesmo aleitadores automáticos. Os

utensílios utilizados para o fornecimento são igualmente eficientes e resultam em mesmo

desempenho animal (Otterby & Linn, 1981), desde que a higiene dos mesmos seja adequada.

Caso isso não ocorra, maior frequência de diarreia e redução no desempenho pode ocorrer,

principalmente com o uso de utensílios com bicos. Enquanto o balde tem a vantagem de ser

de simples higienização, reduzindo os problemas com diarreias, tem a necessidade de

treinamento dos animais. Já as mamadeiras, não exigem treinamento, atendem parte da

necessidade comportamental de mamar e resultam em maior secreção de saliva e enzimas

digestivas. No entanto, estão normalmente associadas a maior ocorrência de diarreias devido

a resíduos da dieta líquida. Outra desvantagem das mamadeiras é maior tempo para

alimentação. No entanto, como frisado por Davis & Drackley (1998) as mamadeiras com

capacidade para 2 L fazem com que o produtor muitas vezes entenda que este volume é

suficiente para os animais, independentemente do sistema de aleitamento.

Independentemente do tipo de utensílio utilizado para o aleitamento, fornecer dieta líquida

para um grande número de animais é uma tarefa laboriosa e demorada. O aleitador

automático, que pode ou não ter o fornecimento de concentrado acoplado, é provido de um

único bico, sendo a dieta liberada após a identificação do bezerro por sistema eletrônico. O

uso do aleitador automático permite que animais em programas de alimentação intensiva

realizem um maior número de refeições, reproduzindo o comportamento natural de

alimentação como mostrou o trabalho de Jensen (2009). No caso do uso de baldes para

aleitamento intensivo, o maior número de alimentações aumenta o custo com mão de obra.

O aleitamento coletivo, sem alimentador automático, mas com contêineres com bicos de

mamadeira também tem sido empregado por alguns produtores, sendo mais indicado quando

o fornecimento é à vontade. Embora este sistema reduza de forma marcante o tempo gasto

com o aleitamento, reduzindo custos com mão de obra, requer atenção especial para a

formação de lotes homogêneos do ponto de vista de peso e tamanho dos animais, reduzindo

problemas de dominância. Da mesma forma, é importante que o número de bezerros no lote

seja menor que o número de bicos disponíveis, reduzindo problemas de dominância.

220

A temperatura da dieta líquida a ser fornecido deve ser próxima à temperatura corporal do

animal, sendo isso ainda mais importante para regiões de clima frio. Quando a dieta é

fornecida fria pode haver recusa e também menor desempenho animal devido a menor

secreção de enzimas. Já a frequência de alimentação deve ser de pelo menos duas vezes ao

dia, considerando-se o volume fornecido. Em situações naturais estes animais realizam várias

mamadas, consumindo até 12 L por dia.

O leite é um dos componentes que mais onera o custo de criação de bezerras leiteiras. Dessa

forma, o desaleitamento precoce ou a adoção de dieta líquida de menor custo, pode reduzir o

custo final da novilha de reposição. No Brasil, a maior parte das fazendas fornece leite ou

leite descarte, proveniente de vacas com mastite e/ou resíduo de antibióticos e menos de 15%

dos produtores adotam sucedâneos como dieta líquida (Santos & Bittar, 2015).

A oferta de leite descarte nas propriedades tem sido um obstáculo para o fornecimento de

dieta líquida de melhor qualidade para bezerros leiteiros. Muitos produtores não consideram

as taxas aceitáveis de vacas com mastite no rebanho (1,0%, Santos & Fonseca, 2007) e nem

que estes animais reduzem sua produção em torno de 10%, pelo fato de que este leite tem um

destino: o bezerreiro. Assim, transferem o problema da sala de ordenha para o bezerreiro

quando fornecem este leite com alta carga bacteriana, resíduo de antibióticos e composição

nutricional variada aos bezerros em aleitamento. Além de perderem com a venda deste leite

e com a queda na produção das vacas, tem perdas econômicas relacionadas ao menor

desempenho dos bezerros, normalmente devido ao aumento na ocorrência de diarreias, e

consequentemente com maior gasto com medicamentos e tempo de mão de obra para o

atendimento de animais doentes.

Entre as vantagens do uso de sucedâneos no aleitamento de bezerros estão, além da

economia, devido ao menor preço quando comparado com o leite integral, a possibilidade de

aumento na quantidade de leite a ser comercializada pelo produtor, o fornecimento de dieta

líquida com composição sempre constante e a independência do aleitamento com relação aos

horários de ordenha. Entretanto, a qualidade do sucedâneo, principalmente a fonte proteica,

é o fator determinante para a obtenção de resultados semelhantes aos observados com o

fornecimento de leite integral (NCR, 2001).

Durante as primeiras semanas de vida, o fornecimento de dieta líquida de qualidade é

essencial para garantir desempenho satisfatório dos animais. Durante a fase de aleitamento,

221

70% do custo total com alimentação e manejo estão relacionados ao fornecimento de leite

(Bittar, 2007), o que faz com que produtores busquem alternativas de dieta líquida de menor

custo. De acordo com Heinrichs et al. (1995), diversos sistemas e práticas de manejo de

animais em aleitamento vêm sendo adotados com o objetivo de reduzir o custo com a criação

destes animais. A decisão no uso de sucedâneo deve se basear em seu custo por litro diluído,

comparado ao preço do leite vendido à indústria, mas principalmente em sua composição.

O mercado tem uma grande variedade de produtos disponíveis para o aleitamento de

bezerros, sendo importante o entendimento de que estes produtos não são igualmente

recomendados para bezerros de todas as idades e sistemas de aleitamento. Uma vez que

bezerros jovens não tem aparato enzimático para digestão de fontes de proteína ou

carboidrato de origem vegetal até por volta da terceira semana de vida, é importante que o

sucedâneo tenha basicamente ingredientes de origem láctea. Os teores de proteína vão variar

conforme o sistema de aleitamento (de 20 até 28% na MS), enquanto os teores de gordura

são menos variáveis (entre 16 e 18% na MS). Muito embora as fontes lácteas sejam mais

recomendadas, proteína isolada de soja pode também ser utilizada com algum sucesso. A

quantidade de fibra de uma formulação é um bom indicativo da inclusão de fontes de proteína

de origem vegetal. Quanto maior a inclusão destas fontes, maior será o teor de fibra da

fórmula. Os sucedâneos para bezerros com menos de 3 semanas de idade não devem

apresentar mais que 0,15% de fibra bruta em sua composição. Embora os altos teores de fibra

bruta indiquem a inclusão de proteína de origem vegetal, valores menores que 0,15% não

garantem sua ausência. Isso ocorre devido às tecnologias para retirada de carboidratos

solúveis e também fibras da proteína da soja, por exemplo. Outro aspecto interessante com o

fornecimento de sucedâneos é a possibilidade de inclusão de aditivos que tenham ação

profilática contra diarreias, como os probióticos, prebióticos e acidificantes, resultando em

melhor aproveitamento da dieta líquida.

Em relação ao volume de dieta fornecida, podemos ter dois sistemas de aleitamento:

convencional e intensivo. O sistema de aleitamento convencional consiste no fornecimento

de dieta líquida no volume de 10% do peso vivo (PV) da bezerra (Jasper & Weary, 2002), o

que normalmente representa 4 L diários. Quando a dieta líquida é o sucedâneo, este deve

conter 20-22% de PB e 15-20% de gordura, sendo reconstituído a 12,5% de sólidos (Cowles

et al., 2006). Este sistema tem como objetivo estimular o consumo de concentrado para

222

favorecer o desenvolvimento das papilas do rúmen permitindo o desaleitamento precoce,

reduzir o risco de enfermidades e os gastos de alimentação e manejo. Entretanto, esta

quantidade padronizada de dieta líquida fornecida aos animais geralmente atende pouco mais

que as exigências de mantença, inviabilizando altas taxas de crescimento (Flower & Weary,

2001). Ainda assim, este sistema de aleitamento é adequado para alguns sistemas de

produção, com taxas de crescimento em torno de 400 g/d, sendo o mais utilizado no Brasil

(Santos & Bittar, 2015). Já o aleitamento intensivo tenta imitar o comportamento alimentar

natural do bezerro, preconizando o fornecimento de dieta líquida em volumes acima de 20%

do PV do bezerro, normalmente representando 8 L/d. No entanto, o número de refeições nem

sempre é maior do que dois, o que não representa o comportamento de mamada dos animais

quando estão com suas mães. Este tipo de sistema em geral utiliza sucedâneos com um

conteúdo de proteína bruta igual ou superior a 25%, gordura em quantidades semelhantes ao

sistema convencional (15-20%), e sólidos totais entre 12,5-17,5% (Cowles et al., 2006).

Aumentando as quantidades de dieta líquida fornecidas para os bezerros, aumenta-se a taxa

de crescimento (Jasper & Weary, 2002; Borderas et al., 2009), e o potencial de produção

futura destes animais (Soberon et al., 2012). Dentro do conceito de aleitamento intensivo

podemos aleitar bezerros de três diferentes formas. No sistema ad libitum os animais tem

acesso ilimitado a dieta líquida, a qual deverá estar acidificada ou ser fornecida através de

aleitadores que preparem o sucedâneo no momento da manada. Neste sistema, embora haja

um programa de alimentação fixando volumes máximos liberados em um determinado

período de tempo, o animal decide em que momento deseja mamar, fazendo com que o

aleitamento seja mais próximo do que ocorreria naturalmente. No sistema intensivo

propriamente, o animal recebe entre 15 e 20% do seu PV em dieta líquida, em duas ou mais

refeições. Já no sistema programado (step-up/step-down), o volume de dieta líquida e

variável, sendo normalmente reduzido (step-down) no final do período de aleitamento como

estratégia para o aumento no consumo de concentrado. Embora o custo de produção possa

ser reduzido com o fornecimento de menor quantidade de dieta líquida, volumes inferiores a

4 L não fornecem nutrientes suficientes para desempenho adequado devido ao baixo

consumo de energia e proteína (Tabela 2).

Além de resultar em maiores taxas de crescimento e, portanto, bezerras mais pesadas ao

desaleitamento, o fornecimento de maiores volumes de dieta líquida pode aumentar o

223

potencial de produção de leite futuro destes animais. Vários estudos mostram que o potencial

de produção de leite pode estar relacionado a efeitos do consumo controlado ou alimentação

ad libitum do nascimento até os 42 ou 56 dias de vida (Foldager & Krohn, 1994; BarPeled et

al., 1997; Foldager et al., 1997).

Tabela 2. Potencial de ganho de acordo à quantidade de leite fornecida e ao consumo

de energia metabólica e proteína bruta, baseado em equações do NRC (2001)

Leite

fornecido

(L/dia)

Consumo

MS (g)

Consumo

de EM

(Mcal)

Ganho

permitido

pela EM (g)

Consumo

de PB (g)

Ganho

permitido

pela PB (g)

2 250 1,34 -- 65,5 139

4 500 2,68 354 127 380

6 750 4,03 756 190 627

8 1000 5,37 1050 254 868 MS: matéria seca, EM: energia metabólica, PB: proteína bruta

De acordo com estes estudos, o aumento no consumo de nutrientes antes dos 56 dias de vida

resultou em aumento da produção de leite durante a primeira lactação, que variaram de 450

a 1400 kg a mais, quando comparados com bezerras alimentadas com dieta mais restrita

durante o mesmo período (Tabela 3). O estudo de Soberon et al. (2012) mostra a consistência

do efeito do fornecimento de maiores volumes de dieta líquida no potencial de produção de

leite futuro dos animais. Avaliando quase 1900 dados de um rebanho comercial e do rebanho

da Universidade de Cornell, estes autores mostraram que para cada 1 kg de ganho de peso

diário a mais, houve aumento de 970 kg de produção na primeira lactação. No entanto, estes

resultados foram observados em animais aleitados com sucedâneos contendo 28% de PB e

15 ou 20% de gordura. Os dados corroboram as sugestões de Van Amburgh & Drackley

(2005) para alterações nas recomendações para a nova edição do NRC, com maiores

exigências de proteína para animais em maiores taxas de crescimento.

Da mesma forma que ocorre para animais pré-púberes, quando em crescimento acelerado,

bezerras leiteiras devem receber dieta com maior relação proteína:energia de forma que a

composição do ganho não seja afetada de forma negativa (Blome et al., 2003). Assim,

sucedâneos com maiores teores de PB devem ser fornecidos em sistemas de aleitamento

intensivo para que o potencial de produção de leite destes animais seja aumentado. Soberon

et al. (2012) concluem que a taxa de crescimento de bezerras responde por 22% da variação

224

na produção de leite na 1ª lactação. No entanto, Van Amburgh e Drackley (2005) já haviam

sugerido que 20% da variação na produção de leite na primeira lactação poderiam ser

explicados pela taxa de crescimento até ao desaleitamento. De acordo com estes autores, as

bezerras devem duplicar o seu peso ao nascer ou crescer a uma taxa que lhes permita duplicar

o seu peso ao nascer até o desaleitamento. Assim, vários resultados de pesquisa comprovam

que o aleitamento intensivo pode ter efeitos em longo prazo sobre o desempenho dos animais,

podendo ser uma boa estratégia de alimentação e grande oportunidade de aumentar o

potencial de produção dos animais, contrapondo o sistema de desaleitamento precoce

tradicionalmente utilizado.

Tabela 3. Produção de leite de vacas com consumo de nutrientes 50% superior que

o recomendado durante o período de aleitamento

Estudo Diferença em relação ao

controle (kg)

Foldager & Krohn, 1991 1405s

Foldager et al., 1997 519t

BarPeled et al., 1998 453t

Ballard et al., 2005 700s

Drackley et al., 2007 835s

Raeth-Knight et al., 2009 718ns

Terre et al., 2009 624ns

Morrison et al., 2009 0ns

Rincker et al., 2011 416ns

Soberon et al., 2012 552s s Significativo; t tendência; ns não significativo

Por outro lado, pesquisas mostram que o aleitamento intensivo pode reduzir o consumo de

concentrado, e consequentemente retardar o desenvolvimento ruminal, uma vez que o

consumo de concentrado está negativamente relacionado ao volume de leite fornecido. O

desaleitamento no momento em que animal apresenta o rúmen parcialmente desenvolvido é

essencial para que o desempenho após o desaleitamento não seja prejudicado.

Um dos objetivos na fase de aleitamento é estimular o consumo de concentrado. Durante esta

fase o animal desenvolverá o sistema de digestão próprio de ruminantes e, ao final, deverá

225

estar apto a sobreviver e crescer apenas se alimentando de dieta sólida composta de

concentrado e volumoso. A fase de transição de pré-ruminante para ruminante está

relacionada ao desenvolvimento do rúmen, onde se estabelecerão bactérias amilolíticas num

primeiro momento, e depois celulolíticas e metanogênicas. Além do estabelecimento de

bactérias, que cumprirão o papel de fermentadores, o animal deve ter estruturas capazes de

absorver e metabolizar os produtos finais dessa fermentação, ou seja, um rúmen funcional,

com papilas desenvolvidas. Na fase pré-ruminante, a dieta é basicamente líquida, o principal

órgão digestivo é o abomaso, a fonte de energia é principalmente glicose e a proteica

totalmente proveniente da dieta. No ruminante, a dieta está na forma sólida, as fontes de

energia utilizadas pelo animal são os ácidos graxos de cadeia curta (AGCC) e glicose

proveniente de digestão intestinal, e a fonte proteica é composta de proteína microbiana e

proteína sobrepassante. Durante a fase de transição estas duas situações se misturam e o

manejo alimentar será determinante de uma transição mais lenta ou mais precoce.

A colonização microbiana, disponibilidade de água de bebida, além do desenvolvimento da

capacidade absortiva são fatores importantes e sinais de ocorrência de desenvolvimento

ruminal. Entretanto, o fator determinante para que isto ocorra é o consumo de alimento sólido

o mais cedo possível. Devido à alta taxa de fermentação de grãos, com grande quantidade de

carboidratos fermentáveis até ácidos propiônico e butírico, estes são os principais promotores

do desenvolvimento ruminal precoce. Por outro lado, diversos trabalhos mostram que

carboidratos estruturais originados de forragens são fermentados até ácido acético,

contribuindo pouco para o desenvolvimento de papilas ruminais.

O crescimento normal e desenvolvimento do trato digestório do ruminante podem ser

alterados pelo consumo de alimentos concentrados ou volumosos, níveis de inclusão, sua

forma física, entre outros fatores (Tabela 4). Porém, a composição química e os produtos

finais resultantes da fermentação é que tem mostrado maior influência no desenvolvimento

do epitélio ruminal (Nocek et al., 1984; Khan et al., 2016). Assim, o concentrado será

fornecido desde os primeiros dias de vida e deverá ser formulado com teores de FDN que

permitam manutenção de pH adequados.

Segundo o NRC (2001), o concentrado deve apresentar teores aproximados de 18% de

proteína bruta (PB) na matéria original, 80% de nutrientes digestíveis totais (NDT), e níveis

de FDA entre 6 e 20% e FDN entre 15 e 25%.

226

O teor de proteína no concentrado de bezerros leiteiros recomendado pelo NRC vem sendo

questionado por pesquisadores. Segundo Drackley (2003), bezerros consumindo concentrado

com 22% de PB apresentaram maior eficiência. No entanto, vários trabalhos mostram que o

teor de 18% de PB no concentrado é adequado para bezerros em aleitamento (Luchini et al.,

1991; Akayezu et al., 1994; Hill et al., 2001). Desta forma, tem sido sugerido que

concentrados para bezerros contenham 18% de PB na matéria original, utilizando-se de

preferência farelo de soja como fonte principal.

Tabela 4. Efeito de alimentos concentrados ou de forragem em parâmetros de desenvolvimento

ruminal (adaptado de Khan et al., 2016)

Parâmetro Concentrado Forragem

Peso do rúmen + ++

Volume do rúmen + ++

Diferenciação/crescimento de papilas ++ +

Cetogênese/concentração de BHB + +

Motilidade ruminal/taxa de passagem + ++

Microrganismos ruminais

Bactérias Amilolíticos Celulolíticos

Protozoários - +

Ácidos orgânicos (lactato, C2, C3, C4) ++ +

Acetato:propionato - +

Butirato ++ +

Lactato + -

pH ruminal - +

Capacidade tampão/ruminação - +

Saúde ruminal/paraqueratose - +

Os teores da fração fibra recomendados pelo NRC (2001) devem ser respeitados. Valores

superiores às recomendações indicam a inclusão de ingredientes de menor digestibilidade

para animais com o rúmen em desenvolvimento. Por outro lado, teores de FDN ou FDA

abaixo da recomendação podem resultar em problemas como acidose ruminal e

paraqueratose.

A forma física do concentrado inicial pode afetar o consumo, sendo de interesse econômico

o fornecimento de concentrados sob formas físicas que estimulem o consumo precocemente.

Segundo Coverdale et al. (2004), o tamanho de partícula da ração também pode afetar o

ambiente ruminal, a produção de AGCC, além da estrutura e a função das papilas ruminais.

Rações finamente moídas reduzem o pH ruminal, principalmente devido a menor ruminação

227

e menor fluxo de saliva (Santini et al., 1983), reduzindo consequentemente a população de

bactérias celulolíticas (Beharka et al., 1998). Assim, Warner et al. (1973) sugerem que pelo

menos 50% das partículas que compõem o concentrado inicial sejam maiores que 1,19 cm.

Os maiores efeitos do tamanho de partícula no desempenho animal são observados no

consumo de concentrado, no ganho de peso e no desenvolvimento ruminal. Alguns trabalhos

recentes avaliaram o efeito da forma física do concentrado inicial e não foram observadas

diferenças no consumo ou no ganho de peso quando compararam concentrados peletizados

com farelados para bezerros em aleitamento (Franklin et al., 2003; Ziegler et al., 2006; Bittar

et al., 2009).

Independentemente do fornecimento de leite, o animal deve receber água de boa qualidade

já na primeira semana de vida. O fornecimento de água no mesmo horário do fornecimento

do leite pode levar ao consumo descontrolado de água, afetando a formação do coágulo no

abomaso. A disponibilidade de água está diretamente relacionada ao consumo de

concentrado e à recuperação de quadros de diarreia. A falta de acesso à água pode levar a

reduções no consumo de concentrado e ganho de peso da ordem de 30% (Jenny et al., 1978).

Desaleitamento

O desaleitamento precoce é uma ferramenta de manejo muito importante do ponto de vista

econômico na produção de fêmeas de reposição. O custo de alimentação dos animais é

reduzido com a interrupção no fornecimento da dieta líquida, a manutenção de misturas

concentradas como dieta principal e a introdução de volumosos. Adicionalmente, o menor

tempo demandado para a alimentação desses animais reduz o custo com mão-de-obra.

Segundo Quigley (1996), o animal está pronto, do ponto de vista fisiológico, quando atinge

o consumo de 700 g/d de concentrado durante três dias consecutivos. Produtores tem

utilizado três diferentes critérios, ou uma combinação destes para desaleitamento: 1)

consumo de concentrado; 2) idade do animal; e/ou 3) peso do animal. Tradicionalmente o

desaleitamento vinha sendo realizado aos 60 dias, idade que os animais alcançam consumo

adequado para que o desaleitamento possa ser realizado sem prejuízos no ganho de peso.

Entretanto, este consumo é alcançado por animais em aleitamento convencional nesta idade.

No caso de aleitamento intensivo, menor consumo será observado de acordo com o volume

de dieta líquida fornecida. Assim, a idade não é o critério mais adequado quando utilizado

228

sem considerar o consumo. Por outro lado, uma vez que existem diferenças de peso ao nascer,

utilizar um consumo fixo como critério para o desaleitamento implica em bezerros mais leves

devendo ter um consumo maior em porcentagem de peso vivo. Assim, Greenwood et al.

(1997) sugerem que o consumo adequado para o aleitamento deva ser de 1,5% do peso ao

nascer dos animais. Dessa forma, o ideal é que o produtor utilize uma combinação de critérios

e realize o desaleitamento quando o animal apresentar maturidade anatômica e metabólica,

mantendo suas taxas de ganho de peso na fase subsequente.

A adaptação do animal ao alimento sólido é fundamental para que o desaleitamento ocorra

com sucesso. O desaleitamento é um fator de estresse para o bezerro o qual é forçado a várias

mudanças: 1) sua principal fonte de nutrientes muda da forma liquida para a forma sólida; 2)

a quantidade de matéria seca que o animal recebe é diminuída com o não fornecimento do

leite; 3) o bezerro deve se adaptar ao tipo de digestão e fermentação própria de ruminantes;

4) mudanças de manejo e instalações geralmente ocorrem juntamente com o desaleitamento

(Quigley, 1996). A adaptação do animal à fermentação é essencial para que a taxa de

crescimento do animal não seja afetada. Para isso, o animal deve ter o rúmen parcialmente

desenvolvido e capaz de absorver e metabolizar produtos finais da fermentação antes do

desaleitamento.

Com base em resultados da literatura, diversos autores recomendam o desaleitamento dos

animais de forma abrupta em relação ao sistema de desaleitamento gradual realizado por

alguns produtores (Otterby & Linn, 1981; Davis & Drackley, 1998). O desaleitamento

gradual é dificultado, devido à falta de operacionalidade do processo, principalmente em

grandes rebanhos. Por outro lado, o desaleitamento de forma gradual reduz o estresse dos

animais e ainda estimula o consumo de concentrado.

Instalações e conforto

Durante o período de aleitamento as bezerras são constantemente desafiadas pelo ambiente.

Muitos fatores contribuem para o bem-estar de bezerros em fazendas leiteiras, incluindo:

instalações e ambiente, manejo nutricional e sanitário, manipulação e interação com o

tratador, dinâmica de rebanho, além de práticas comuns como transporte, descorna, remoção

de tetos.

229

Os objetivos gerais das instalações para bezerros são a proteção dos extremos térmicos e

climáticos, acesso adequado ao alimento, garantir a segurança no que diz respeito a

ferimentos e controlar a saúde e bem-estar dos bezerros. Tanto os sistemas de instalação

individual quanto em grupo podem ser projetados para atender a todas estas necessidades.

No entanto, muitos tipos de instalação podem atender todas estas premissas em relação ao

bem-estar, mas o sucesso ainda depende de gestão adequada. Assim, quando se pensa em um

abrigo para melhor alojar bezerras, existem quatro requisitos fundamentais que devem ser

considerados: 1) ventilação; 2) isolamento; 3) conforto; 4) economia.

No mundo todo existem variadas formas de criação de bezerras em aleitamento –criação em

abrigos individuais, baias coletivas ou individuais, construções fechadas ou abertas–

variando de acordo com o local da exploração, o sistema de produção e, principalmente, o

custo para sua construção. Ambientes satisfatórios para bezerros recém-nascidos e em

crescimento devem proporcionar conforto físico, térmico, psicológico e comportamental.

Cada uma dessas áreas pode ser uma fonte de estresse para os bezerros, que posteriormente

podem predispor os animais a comprometimento de sua resposta imunitária, das taxas de

crescimento, e finalmente do bem-estar propriamente dito. Embora o conforto térmico e

físico do ambiente para bezerros tenha sido amplamente avaliado, apenas recomendações

gerais foram desenvolvidas para satisfazer as necessidades comportamentais específicas de

bezerros leiteiros. As necessidades comportamentais em um ambiente incluem a ausência de

frustração, o sentimento de segurança e ausência de possibilidade de lesão, comportamento

social de rebanho e interações com o tratador adequadas.

A individualização tem como objetivo principal a redução na disseminação de doenças, muito

embora existam desvantagens do ponto de vista comportamental. Em um levantamento sobre

os sistemas de criação brasileiros, as diarreias foram apontadas como o principal problema

de saúde de bezerras, seguidas pelos problemas respiratórios (Santos & Bittar, 2015). Embora

estas duas doenças tenham forte relação com falhas no programa de colostragem, estão

também fortemente relacionadas com as instalações e o manejo das mesmas. Como a

transmissão dos principais patógenos que causam doenças em bezerros é do tipo oral-fecal,

seja através do contato entre animais ou uso de utensílios (baldes, cochos) com limpeza

inadequada, a individualização entre os animais é considerada um dos princípios

fundamentais de um bom sistema de criação. A individualização dos animais também facilita

230

a alimentação, evitando problemas com dominância, e permite um controle mais rígido do

consumo individual, tanto de concentrado quanto de água, e da saúde do animal. Em

levantamento nacional, 45% das propriedades cria bezerras leiteiras de forma

individualizada, mas este percentual cresce para 64% quando se avalia somente propriedades

com produção acima de 700 L/d (Santos & Bittar, 2015). Existem diferentes sistemas

individualizados como o sistema tie-stall, o sistema de baias individuais, mas o mais

comumente utilizado são os abrigos. Nestes sistemas, os animais normalmente têm acesso

individualizado a água e ao concentrado em baldes ou cochos, o que permite controle de

consumo. Ainda, o aleitamento é realizado de forma individual sendo utilizados baldes,

mamadeiras ou ainda bibeirões (baldes com bico). Assim, o controle da nutrição é também

individualizado, de forma que se pode avaliar o manejo alimentar de acordo com os ganhos

obtidos. Já a criação de bezerras em sistemas coletivos se baseia no princípio de que os

bezerros leiteiros são animais de rebanho (gregários) e o alojamento em grupo permite o

desenvolvimento de comportamento social. O alojamento coletivo permite a manifestação de

comportamentos lúdicos, ou seja, o exercício e o jogo entre bezerros dentro do grupo. Assim,

a criação de animais em lotes tem sido considerada como mais adequada do ponto de vista

de bem-estar e comportamento animal por alguns pesquisadores. No entanto, é sabido que

este sistema resulta em maior disseminação de doenças, além dos problemas associados à

mamada-cruzada e falta de controle de consumo individual de dieta líquida ou sólida,

dependendo do sistema de alimentação. Os animais podem ser criados em piquetes, em

galpões abertos com pisos ripados ou não e ainda em galpões fechados. Independentemente

do tipo de alojamento, é importante que o ambiente seja ventilado e com áreas de sombra

disponível. Quando os animais são criados em piquetes, a área deve ser bem drenada

impedindo a formação de barro na época das chuvas e a sombra pode ser natural ou artificial.

Uma desvantagem deste tipo de alojamento é a possibilidade de desenvolvimento de mamada

cruzada, associado ou não ao hábito de beber urina, comportamentos considerados

problemáticos. Além de problemas como traumas e inflamações de úbere, podem ocorrer

problemas no umbigo ou na orelha dos animais, regiões com preferência de mamada.

Os sistemas de criação coletiva podem ser manejados para aleitamento também coletivo,

quando se usam containers. Neste sistema é de extrema importância a homogeneidade do

tamanho do lote, de forma a reduzir problemas de competição e variado volume de dieta

231

líquida consumida. A grande desvantagem desse sistema é o fato de que não se tem controle

algum sobre o consumo de dieta líquida ou sólida, parâmetros importantes para a tomada de

decisão do desaleitamento, por exemplo. Este problema pode ser resolvido com sistemas de

aleitamento individual para animais criados em lotes, com a utilização de containers com

divisões internas, que separe o volume de dieta líquida para cada animal. A adoção de canzil

para contenção dos animais no horário de alimentação também é uma alternativa. Este

sistema tem a vantagem de permitir que os animais sejam mantidos por um período de tempo

após o consumo da dieta líquida, até que percam o estímulo da mamada, reduzindo a

ocorrência de mamada cruzada. Já com uso de aleitador automático existe a possibilidade

fornecimento de dieta líquida ad libitum ou com quantidade programada e controlada por

computador de acordo com a idade do animal e manejo nutricional. Embora muitos trabalhos

venham mostrando benefício deste tipo de alimentação por ser semelhante à maneira como

o animal se alimentaria normalmente, estes sistemas podem ter várias desvantagens.

Diarreias e doenças respiratórias podem se espalhar mais rapidamente quando este tipo de

alojamento e de alimentação é adotado.

Assim como nos sistemas individualizados, nos sistemas coletivos o treinamento do tratador

é decisivo para o sucesso da criação de bezerros, com altas taxas de crescimento e baixas

taxas de morbidade e mortalidade. Ainda mais importante que nos sistemas individualizados,

tratadores com atitudes positivas trazem grandes benefícios ao sistema de criação. A

manifestação de comportamentos lúdicos depende do atendimento de necessidades básicas

como alimentação adequada, acesso a sombra e água, conforto e sensação de segurança.

Animais assistidos por tratadores positivos são menos reativos e mais ativos na expressão de

comportamentos lúdicos, o que acaba refletindo também no melhor desempenho e menor

frequência de enfermidades (Schuetz et al., 2012). Abordar e manipular o animal para

práticas de manejo como pesagem, aplicação de vacinas, diagnóstico de doenças ou uma

simples medida de temperatura é mais difícil em sistemas coletivos onde o animal está solto

e misturado a outros animais. Métodos rápidos para diagnóstico de doenças têm sido

estudados no que se refere a alterações no comportamento ou no consumo da dieta líquida.

232

Considerações finais

A criação de bezerras é ainda um dos gargalos nos sistemas de produção de leite,

principalmente devido às taxas de mortalidade e o impacto que estas têm nas planilhas de

custo. Além disso, reduzidas taxas de crescimento devido a falhas na colostragem, associada

a manejo alimentar e alojamento inadequados também trazem prejuízos ao sistema de

produção. O manejo alimentar é determinante do desempenho dos animais durante a fase de

crescimento e pode ainda afetar a produção futura de bezerras leiteiras, sendo uma boa

oportunidade de aumentar a produtividade do rebanho.

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235

Alimentação e manejo da novilha leiteira

Julio Viégas

Em boa parte das propriedades leiteiras do Brasil o manejo de novilhas é a atividade que mais

tem comprometido a viabilidade da atividade, contribuindo para o aumento dos custos de

produção e queda na eficiência produtiva. Isso decorre da falta de atenção por parte do

produtor a essa categoria animal tão importante em todo o processo produtivo. A origem da

pouca relevância é devida ao fato de ser uma categoria não produtiva e que, aparentemente,

não traz benefícios diretos ao produtor. Este erro grosseiro compromete a possibilidade do

melhoramento contínuo do rebanho e igualmente a possibilidade de incrementar a produção

leiteira, visto que as novilhas serão os animais de reposição.

Propriedades que não cuidam de maneira adequada de seus animais jovens acabam

apresentando índices zootécnicos, como por exemplo, a idade ao primeiro parto (IPP), muito

aquém do ideal. Como consequência o produtor irá pagar um preço elevado por este descuido

devido ao aumento no tempo de permanência de animais não produtivos no rebanho e

também devido à diminuição do número de animais para a comercialização, visto que nestas

propriedades a mortalidade, morbidade e o descarte involuntário são também muito elevados.

A desatenção inicia, frequentemente, a partir do desaleitamento ficando mais visível a partir

dos seis meses de idade, quando ocorre a interrupção do fornecimento do alimento

concentrado e a novilha passa a ser alimentada preferencialmente com volumosos. Apesar da

alimentação e manejo de novilhas ser uma das atividades mais fáceis de ser realizada,

considerando as demais categorias, é necessário redobrar os cuidados com a velocidade de

crescimento dos animais e avaliar se essa alimentação está de acordo com a raça em criação.

Somente um crescimento adequado irá permitir que as novilhas alcancem aos quinze meses

de idade o peso ideal para a concepção e que aos vinte e quatro meses de idade tenham o seu

primeiro bezerro. Ter como meta destes dois momentos na vida da novilha é sinônimo de

eficiência técnica e de maior rentabilidade na atividade.

A primeira parição aos 24 meses é viável, pois apresenta uma série de vantagens, sendo que

o manejo de novilhas, na maioria das situações, é uma questão de vigilância e bom senso de

técnicos e produtores.

236

Todo o planejamento de gestão e manejo alimentar do rebanho jovem da propriedade leiteira

deve partir do estabelecimento de metas bem claras como a idade pretendida para o primeiro

parto. O produtor deve ter em mente que ao optar por 24, 30 ou 36 meses como idade ao

primeiro parto (IPP) para as suas novilhas estará optando por níveis diferentes de

investimento e, consequentemente, por benefícios distintos.

Na medida em que a propriedade leiteira se aproxima de um índice de 24 meses para a IPP

estará alcançando o máximo de eficiência técnica, sem descuidar, na sequência, que o

intervalo entre partos (IEP) se aproxime de 12 meses. Não existe nenhum impedimento

biológico que determine que uma fêmea não possa parir com 24 meses de idade tendo

alcançado um peso adequado, e que mantenha uma vida produtiva e saudável.

Novilhas que parem mais precocemente também são mais rentáveis para a propriedade, não

somente devido ao número de bezerras produzidas e à produção de leite que aumentam, mas

igualmente pela possibilidade de ganho genético entre gerações. É esperado que com a

diminuição do intervalo entre gerações ocorra um ganho genético expresso por maior

produção de leite e de seus componentes. Se isto não está ocorrendo o programa de

melhoramento genético da propriedade deve ser revisado com urgência. Na medida em que

diminui a IPP o ganho genético será acelerado, desde que a escolha dos touros melhoradores

esteja sendo feita de maneira correta, ao mesmo tempo, esta mudança deverá estar em

consonância com a taxa de descarte e reposição das vacas leiteiras.

São exatamente os rebanhos em que as primíparas parem precocemente os que apresentam a

produção total de leite e de seus componentes mais elevada, independente de considerar

somente o lote de primíparas ou de todo o rebanho (Lefebvre et al., 2002). A lógica é a mesma

em relação aos animais que apresentam maior peso ao primeiro parto. A questão da

longevidade de animais que parem precocemente poderia ser questionada, entretanto, as

primíparas que parem tardiamente são aquelas que apresentam maior risco de serem

descartadas antes do tempo. Para que os objetivos da criação de novilhas sejam atingidos

basta um manejo apropriado e um programa alimentar bem equilibrado para manter uma taxa

de desenvolvimento corporal aceitável.

A redução da IPP acarreta em redução dos custos fixos e variáveis na medida em que as

novilhas passam a produzir leite mais cedo, amortizando mais rapidamente os gastos com as

fases de cria e recria. Uma novilha que venha a parir pela primeira vez com 36 meses de

237

idade permanece mais um ano dentro da propriedade se alimentando sem trazer retorno

econômico imediato. Caso isto ocorra com uma novilha de alto padrão genético, devido a

algum problema sanitário, metabólico ou de manejo, a propriedade até poderá absorver este

custo, entretanto, se esta é a situação real, e a propriedade possui um lote significativo de

animais entre 24 e 36 meses sem produzir, o prejuízo será muito maior.

À medida que ocorre atraso na IPP estão sendo geradas novas categorias de novilhas que não

produzem leite. Isto é antieconômico, pois aumenta os custos de produção e diminui a renda

do produtor. Na medida em que o produtor consegue reduzir a idade ao primeiro parto de

suas novilhas de 36 para 24 meses os custos fixos diminuem em torno de 40%. Assim, é

possível concluir que o ponto mais positivo da redução da IPP é exatamente a redução do

número de novilhas na propriedade. Como consequência mais atenção e espaço é

proporcionado para as demais novilhas permitindo maior aporte de alimento com a finalidade

de manter uma taxa de crescimento adequada, necessária para atingir a meta de peso para a

cobertura aos 15 meses de idade.

Para facilitar a gestão da atividade o produtor rural deve estabelecer, juntamente com o

técnico que lhe dá suporte metas claras e factíveis conforme a saúde financeira da

propriedade. Os indicadores que devem ser visualizados como metas para a categoria de

novilhas são os que seguem: idade a cobertura de 13 a 15 meses; idade ao primeiro parto de

22 a 24 meses; peso vivo após o parto próximo a 550 kg; altura ao parto de 143 cm; escore

de condição corporal ao 1º cio de 3,0 a 3,5; escore de condição corporal ao parto de 3,0 a 3,5;

ganho de peso de 3 a 12 meses de idade, preferencialmente entre 0,750 e 0,850 kg/dia (não

superior a 0,900 kg/d).

Para que se consiga manter as metas previamente estabelecidas é fundamental que os animais

mantem um ritmo de crescimento constante. Evidente que o ritmo de crescimento dos

bovinos jovens é determinado pelo padrão genético da raça e/ou linhagem escolhida, ou seja,

cada animal tem o seu potencial de crescimento que é delimitado pela sua herança genética,

mas que pode ser limitado fortemente pelo ambiente onde se encontra. De nada adianta o

produtor investir em animais de alto mérito genético se o sistema alimentar não atende as

exigências mínimas para mantença e crescimento. Importância similar tem as instalações e o

manejo reprodutivo e sanitário que também influenciam o crescimento das novilhas. A

exploração do potencial genético, a partir do fornecimento de um ambiente adequado que

238

permita a expressão deste potencial, é de fundamental importância para a obtenção de bons

rendimentos na atividade leiteira.

Considerando que a novilha tenha passado por uma fase de cria adequada, recebendo o

colostro em quantidade adequada logo nas primeiras horas de vida, o que lhe confere a

imunidade passiva, e que tenha apresentado crescimento adequado, ou seja, o mais próximo

possível de 0,500 kg/dia, seguramente será obtido um animal saudável para prosseguir a

recria. É fundamental que nos primeiros quatro meses da recria a bezerra ainda continue

recebendo alimento concentrado, a fim de garantir um bom aporte de matéria seca e

consequentemente suportar uma taxa de crescimento aceitável, (0,600 a 0,650 kg/dia) mesmo

após o estresse do desaleitamento.

A produção de leite da futura vaca é função do número de células secretoras que compõem

o parênquima das glândulas mamárias, da taxa de secreção de cada célula secretora e ou

alvéolo (aqui entendido, como a unidade fundamental de secreção) e do aporte de nutrientes

para os alvéolos. Qualquer situação que venha a restringir a máxima expressão de um destes

fatores trará como consequência um impacto negativo na produção, neste sentido o ambiente

tem um papel fundamental. Toda e qualquer condição ambiental que represente uma fonte

de estresse para a novilha irá determinar, igualmente uma redução na máxima expressão de

um dos fatores acima citados.

A literatura é farta em informações relacionadas à necessidade de limitação do ganho médio

diário de peso vivo (GMD) das novilhas até o estabelecimento da puberdade (Van Ambrurgh

et al., 1998; Radcliff et al., 2000). Como a puberdade não ocorre em um momento fixo da

vida da novilha estipulou-se que entre os três e doze meses de idade o GMD deve ser mantido

em no máximo 0,750 kg/dia, momento no qual o tecido mamário apresenta crescimento

alométrico. Esta limitação visa evitar o excesso de deposição de gordura na glândula

mamária, o qual ocorreria em detrimento da adequada formação do tecido secretor de leite,

ocasionando redução na produção de leite ao longo da vida produtiva da futura vaca. Assim,

ganhos superiores a estes, proporcionados por dietas com maior densidade energética, seriam

possíveis somente após a novilha ter atingido a puberdade.

Se o bezerro nascer com um bom peso ao parto (próximo de 40 kg, considerando raças

pesadas) e apresentar um bom GMD (mínimo 0,500 kg/dia) nos primeiros três meses, não há

efetiva necessidade de ganhos superiores a 0,750 kg/dia. A novilha terá capacidade de chegar

239

aos 15 meses de idade pesando 360 kg de PV, estando apta para a reprodução. Por outro lado,

estudos têm demonstrado que ganhos de peso superiores a 0,750 kg/dia não induzem,

necessariamente, a redução na quantidade de tecido parenquimático e consequente menor

produção de leite (Silva et al., 2002a; Silva et al., 2002b). Novilhas que apresentam

crescimento mais rápido em um determinado grupo de animais são aquelas com menor

deposição de gordura corporal e, portanto, menor quantidade de gordura corporal nas

glândulas mamárias. Desta maneira entre distintas novilhas, aquela que apresenta rápido

crescimento e destina a energia para ganho muscular, não apresentando ganho excessivo de

condição corporal, certamente será uma vaca com maior produção leiteira.

Uma boa forma de verificar esta situação é por meio da avaliação da altura em conjunto com

a condição corporal, ou seja, serão animais com menor escore de condição corporal e,

portanto, mais altos. Assim, a novilha atingir os 140 cm de altura se reveste de importância.

Esta velocidade de crescimento certamente está associada a maior produção natural de

somatotropina, com efeito benéfico sobre a repartição de nutrientes e no crescimento do

tecido mamário.

Aparentemente, a leptina tem um papel fundamental no crescimento mamário. A leptina é

um hormônio produzido pelo tecido adiposo, em condições de dietas ricas em energia.

Conforme Silva et al. (2002b), animais obesos, apresentam níveis de leptina mais elevados,

e quando o hormônio foi adicionado em meio de cultura com células epiteliais em

proliferação a síntese de DNA foi reduzida em 25%.

Em várias propriedades no Brasil, mais notadamente na Região Sul é ainda comum observar

a preferência por animais jovens com condição corporal mais elevada. Neste sentido, o

produtor deveria evitar realizar a avaliação de condição corporal do seu próprio rebanho,

devido à tendência de subestimar o escore de seus animais. Observam-se em algumas

propriedades animais jovens atingindo 400 kg de PV já aos 10 meses de idade, o que

configura uma situação de custo de alimentação elevado e prejuízo certo no futuro. Esse peso

é excessivo até mesmo para animais com 15 meses de idade. Entretanto, mesmo que

determinadas novilhas tenham um metabolismo para rápido crescimento e maior deposição

de tecido muscular, muitos outros fatores ambientais podem determinar o acúmulo excessivo

de gordura e a consequente redução na produção de leite da futura vaca. Dietas como as

baseadas em silagem de milho, tipicamente utilizadas, na fase de recria, favorecem maior

240

deposição de gordura e consequentemente limitações de ganho de peso devem ser impostas.

Como ainda não existe alguma forma prática de avaliação do crescimento do tecido mamário,

passível de ser utilizado em nível de propriedade, ganhos de peso mais conservadores ainda

são recomendados, evitando-se ganhos próximos ou acima de 0,900 kg/dia.

Neste sentido a Figura 1 ilustra bem a relação entre GMD de novilhas leiteiras e a produção

estimada de leite na primeira lactação. A máxima produção é obtida quando o GMD está

próximo de 0,800 kg/dia, com uma amplitude aceitável de GMD entre 0,700 e 0,900 kg/dia.

Importante verificar que não somente ganhos elevados, como ganhos reduzidos acabam por

promover perdas na produção de leite da futura vaca.

Figura 1. Relação entre ganho de peso vivo em novilhas pré-puberes e a

produção média de leite na primeira lactação, estudo de meta-análise (Fonte:

Zanton & Heinrichs, 2005)

Na Figura 2 são apresentadas diferentes simulações do desenvolvimento ponderal de

novilhas leiteiras. A novilha um é a que está mais próxima do “ideal” para o desenvolvimento

de um bom animal leiteiro de raças de grande porte, com a cobertura sendo realizada aos 15

meses (357 kg de peso vivo) e o parto ocorrendo aos 24 meses de idade (500 kg de peso

vivo). Esta novilha nasceu com 45 kg de peso vivo e apresentou os seguintes ganhos de peso

conforme cada etapa de vida: 0,450 kg/dia do nascimento ao desaleitamento; 0,650 kg/dia do

desaleitamento aos 6 meses de vida; 0,750 kg/dia dos 6 aos 12 meses de vida; 0,750 kg/dia

dos 12 aos 15 meses (cobertura); 0,522 kg/dia desde a cobertura até os 24 meses (parto).

241

Nas duas últimas fases poderiam ser adotados ganhos de pesos superiores caso as vacas da

propriedade sejam mais pesadas, o que é típico de animais em condições de confinamento.

Foi realizada uma simulação para a novilha um partindo dos 357 kg de peso vivo na cobertura

para 550 kg de peso vivo no parto o que corresponderia a um ganho médio diário de 0,704

kg/dia. Nesta situação a média de ganho de peso de todo o período seria de 0,691 kg/dia, o

que está longe de ser um ganho de peso extraordinário.

As novilhas dois e três representam animais que tiveram um crescimento inicial mais lento,

mas que em períodos de crescimento isométrico da glândula mamária é possível lhes fornecer

uma dieta com maior densidade energética, permitindo ganhos de peso mais elevado. Por

outro lado, o produtor também pode decidir por partos mais tardios se o nível de investimento

for muito elevado.

Figura 2. Simulação de diferentes ritmos de desenvolvimento ponderal de

novilhas leiteiras de raças grandes (Fonte: Viégas, 2010)

A tomada de decisão por parte do produtor se faz necessária principalmente se o IPP do

rebanho já estiver próximo dos 24 meses. Em um primeiro momento deverá ser decidido se

é válido manter uma fêmea como a novilha três no plantel ou se o melhor seria descartá-la e

evitar problemas futuros. Deve ser considerado que o crescimento restrito nos meses iniciais

de vida poderá ter reflexos no desempenho futuro da novilha. Tal medida dependerá da

perspectiva do produtor em relação à recuperação do animal e ao elevado custo de criação,

0

100

200

300

400

500

600

0 6 12 18 24 30

Idade (meses)

Pe

so

viv

o (

kg

)

novilha 1

novilha 2

novilha 3

Parto

Cobertura

Puberdade

Nascimento

242

já que será necessário maior aporte de proteína e energia, ou seja, de alimentos de alta

qualidade. Em um segundo momento, sendo a decisão de manter a novilha, deve ser definida

a taxa de crescimento futuro, ou seja, entre um ganho de mais de 1,0 kg/dia com elevado

custo ou um ganho de peso mais modesto, mesmo comprometendo a IPP. O problema de

ganhos de peso muito elevados e repentinos após a cobertura, apesar de plenamente possíveis,

é a probabilidade de um acúmulo importante de gordura no aparelho reprodutivo da novilha

levando a complicações no momento do parto.

Conforme a Figura 3 é possível observar que taxas de crescimento muito baixas levam ao

atraso da maturidade sexual, ou seja, a puberdade é alcançada acima dos 18 meses quando as

novilhas já deveriam estar gestando. Consequentemente, um crescimento lento afeta não

somente a idade à puberdade, mas também a IPP. Ao contrário, novilhas que apresentam

crescimento muito acelerado poderão atingir a puberdade antes dos nove meses de idade, o

que também não é adequado.

Figura 3. Taxa de crescimento de novilhas e performance reprodutiva (Fonte: Wattiaux, 2004)

O limite mínimo de 13 meses de idade deve ser estabelecido para a realização da primeira

cobertura, o que está próximo da idade normalmente recomendada para raças de pequeno

porte, as quais são mais precoces. Desta forma preservamos a integridade da novilha e

conferimos um bom crescimento, sem comprometer a gestação. Novilhas que ganham muito

243

peso sem crescerem rapidamente além de apresentarem maior deposição de gordura na

glândula mamária certamente apresentarão menor porte. Isto por que, novilhas que atingem

a puberdade muito cedo (antes dos nove meses) e são cobertas somente próximo aos 15 meses

de idade passarão por vários ciclos estrais sofrendo por longo tempo o efeito dos hormônios

da reprodução, o que impede um crescimento mais adequado. Com altos níveis nutricionais,

principalmente energia, a puberdade é alcançada com peso vivo menor do que com um nível

nutricional mais baixo ou adequado.

O que determina o exato momento da cobertura é o desenvolvimento corporal da novilha e

não a idade. A novilha deve atingir a puberdade quando apresentar de 40 a 50% do peso

corporal adulto, o que é esperado, se o crescimento for adequado, que ocorra entre os 9 a 10

meses de idade. A primeira cobertura, ou inseminação, deve ocorrer quando a novilha atingir

de 50 a 60% do peso adulto, devendo ocorrer entre os 13 e 16 meses de idade. A cobertura

somente será realizada a partir do terceiro cio, permitindo assim, melhor desenvolvimento do

trato reprodutivo da fêmea. Por fim, a novilha deverá apresentar entre 80 a 85% do peso

corporal adulto no momento do primeiro parto, devendo ocorrer, preferencialmente, aos 24

meses. Na Tabela 1 são apresentados os pesos esperados ao nascimento, puberdade, cobertura

e parto para as diferentes raças.

O desenvolvimento das novilhas deve ser medido não somente pelo peso do animal, mas

também pela sua estatura. Estimar somente o peso da fêmea pode ser um erro grave na recria

das fêmeas jovens, pois não permite a distinção entre o desenvolvimento do esqueleto e de

depósitos de gordura. O tamanho da novilha tem grande importância em sua morfologia e

pode afetar práticas de manejo e a futura capacidade de produção de leite. Vacas mais altas

e longilíneas apresentam normalmente maior profundidade de corpo o que é desejável pelo

reflexo sobre as capacidades de ingestão, respiratória e circulatória. Igualmente, o úbere e

tetos ficam mais afastados do solo permitindo uma ordenha mais confortável um úbere mais

limpo e menor probabilidade de lesões.

Na Figura 4 é apresentada a expectativa em relação à evolução da condição corporal para

novilhas leiteiras. A condição corporal de novilhas não segue os mesmos princípios que as

vacas adultas e em produção, pois estas já possuem uma estrutura corporal bem formada. As

novilhas na etapa inicial do seu desenvolvimento têm por prioridade o crescimento da

estrutura de sustentação, ou seja, a formação do tecido ósseo. Somente a partir dos 9 meses,

244

quando a novilha deve estar atingindo a puberdade, é que é observada uma aceleração no

acúmulo de reservas corporais que é, exatamente, o que pode ser medido via a utilização de

um escore de condição corporal.

Tabela 1. Peso vivo de novilhas leiteiras de diferentes raças ao nascimento, puberdade, cobertura e parto

Raça Peso vivo (kg)

Nascimento Puberdade Cobertura Parto

Holandesa 38-45 270-280 350-380 (400) 500-550 (625)

Ayrshire 35-40 240-245 275-310 450-500

Guernsey 35-40 240-245 275-310 450-500

Jersey 20-25 180-210 230-260 380-420

Girolando 33-38 280-300 320-350 400-450

Pardo-Suíço 38-45 270-280 350-380 (400) 500-550 (625)

Valores entre parênteses representam animais em condições de confinamento

A novilha no momento do primeiro parto deverá apresentar um escore de condição corporal

semelhante ao de vacas adultas em início de lactação, ou seja, uma pontuação de 3,5 (Figura

4). Alguns técnicos consideram que esta pontuação é ainda muito elevada para novilhas, as

quais ainda não teriam terminado o seu crescimento, e desta forma propõem um escore de no

máximo 3,0. Outros técnicos preferem as novilhas com um escore superior entre 3,75 e 4,0.

Independentemente do valor pretendido a avaliação da condição corporal é um instrumento

prático e expedito que deve ser utilizado por todos os produtores para a avaliação do status

energético de seus animais e, igualmente, para avaliar a qualidade e adequação da dieta

fornecida às novilhas.

Várias são as alternativas de espécies forrageiras que podem garantir ganhos de peso da

ordem de 0,750 kg/dia desde que o comprometimento entre quantidade e qualidade seja

respeitado, o que depende do entendimento da fisiologia das plantas forrageiras. Espécies

temperadas como a aveia, o azevém e outros cereais de inverno além dos trevos e suas

consorciações são exemplos de excelentes espécies forrageiras. Algumas espécies tropicais

como as cultivares de panicum, capim elefante, principalmente o capim elefante anão cv.

Mott e com mais destaque para as diferentes cultivares de capim bermuda e quicuio, também

representam excelente opção forrageira. Somente nos momentos de menor disponibilidade

245

de forragem (na época da seca no Sudeste ou no vazio forrageiro de outono-inverno na

Região Sul) ou de baixa qualidade (final de crescimento) poderá haver a necessidade de

alguma suplementação proteica e/ou energética. Cabe salientar que, mesmo o campo nativo

do sul do país, em seu pico de crescimento na primavera tem condições de suportar ganhos

de peso próximos a 500 g/dia, o que pode ser adequado para as novilhas em determinada fase

do crescimento.

Figura 4. Evolução recomendada da condição corporal para novilhas leiteiras de

raças grandes em diferentes idades (adaptado de Hoffman, 1997)

A taxa de crescimento adequada para as novilhas dependerá do estabelecimento de um plano

de forrageamento detalhado e criterioso que leve em conta a sucessão de culturas e a

indisponibilidade, em quantidade e/ou qualidade, momentânea de forragem no campo

(Viégas, 2010).

Deve ser aceito que na maioria dos casos em que ocorrem falhas no processo contínuo de

crescimento das novilhas, essas falhas estão intimamente relacionadas com o manejo das

pastagens como fonte de alimento. Pastagens de qualidade e abundantes são a fonte mais

econômica de nutrientes para uma novilha em crescimento, entretanto, tal situação pode ser

esquecida pelos produtores e o resultado é o insucesso no ritmo de crescimento dos animais.

Neste contexto, o sistema de pastejo é o que apresenta o menor impacto sobre o sucesso ou

não do manejo desta fonte natural de nutrientes. Para a atividade leiteira o sistema de pastejo

rotativo tem a vantagem de manter os animais sobre uma vigilância mais restrita, permitindo,

0

0,5

1

1,5

2

2,5

3

3,5

4

3 6 9 12 15 18 21 24

Idade (meses)

Co

nd

içã

o c

orp

ora

l

246

de maneira mais rápida e eficaz a detecção do cio e de qualquer problema de ordem sanitária

ou comportamental. Tal situação também permite uma maior interação entre o tratador e os

animais o que é importante para a redução do estresse no manejo diário.

O uso de pastagens será sempre a forma mais econômica de fornecer os nutrientes necessários

ao crescimento das novilhas, até por que estes animais não estão produzindo leite. Contudo,

em situações limitantes ao crescimento das pastagens (secas, geadas) ou à sua qualidade

(final da estação de crescimento) é obrigatório o uso de forragem conservada para manter o

ritmo de crescimento das novilhas. O problema reside muitas vezes na igualmente baixa

qualidade do alimento conservado, ou na coincidência com um período de elevada demanda

por parte dos animais. Neste caso, o uso de um concentrado energético e/ou proteico é

imprescindível. Maior será a necessidade de concentrado quanto menor for a qualidade e/ou

quantidade da forragem utilizada, entretanto, a quantidade utilizada deverá ser limitada a, no

máximo, 5 kg/dia em situações extremas.

Para que a forragem proveniente de áreas de pastagem atenda as exigências das novilhas para

crescimento, deverá ter os seguintes teores: 60 a 75% de nutrientes digestíveis totais (NDT);

> 13% de proteína bruta (PB); 0,3 a 0,65% de cálcio (Ca); 0,22 a 0,35 de fósforo (P). Com a

finalidade de verificar os níveis destes nutrientes, a realização de análises bromatológicas de

todos os alimentos utilizados na propriedade deve ser uma regra para todo o produtor que

quiser bem balancear a dieta de seus animais. Os valores que se encontram em tabelas servem

como referência, mas como foram obtidos de plantas forrageiras e ingredientes de lugares

distintos à propriedade, sofreram influência de condições edafoclimáticas e de manejo

completamente diferentes.

Com relação ao manejo, as novilhas devem ser agrupadas em lotes de 6 a 8 animais com peso

razoavelmente idêntico, o que facilita a observação diária e rotineira e também o

fornecimento de alimento mais próximo das exigências individuais para crescimento.

Estudos sobre o comportamento de bovinos jovens têm demonstrado que novilhas que são

reagrupadas de maneira mais sistemática apresentam relações mais estáveis, competindo

menos pelo espaço relacionado à alimentação além de estabelecerem relações de dominância

mais rapidamente do que outras novilhas que não passaram por esta experiência. Esta prática

poderá ser importante no momento de agregar as novilhas ao lote de vacas secas.

247

A observação constante do comportamento das novilhas é ponto chave para o bom manejo

desta categoria. Esta observação auxilia, não somente na detecção de cio, bem como na busca

do bem-estar animal. Os animais estão em comunicação frequente com o tratador, basta

somente saber escutá-los. Observar é sempre o melhor remédio e pode prever uma série de

problemas. O bom observador conseguirá identificar rapidamente o animal que está apático

e que apresenta desconforto. Estas situações acarretam em diminuição da ingestão do

alimento e consequentemente a perda de peso e retardo na IPP. Em boa parte das situações o

desconforto é causado pela falta de uma prática simples na propriedade: disponibilizar para

qualquer categoria sombra e água fresca nas áreas de pastagem e de descanso dos animais.

(Viégas, 2010).

Na situação de oferta de alimento no cocho, quando, por exemplo, é utilizada forragem

conservada e alimento concentrado, ou em situações de confinamento quando a ração total

misturada (RTM) é comumente utilizada, o produtor deve estar sempre atento às informações

que está recebendo dos animais. Entre elas, por exemplo: está havendo muita sobra de

alimento? quanto tempo ao longo do dia o cocho fica vazio? os alimentos estão com aspecto

e cheiro normal? a sobra é idêntica ao que foi ofertado? quanto tempo os animais

permanecem no cocho? a água está sendo realmente consumida? O entendimento destes

sinais auxilia ao produtor a compreender se os alimentos usados e o regime alimentar estão

adequados, evitando que haja excesso de seleção do alimento ofertado o que poderá causar

um desbalanço no aporte de nutrientes. O escore de cocho na pecuária leiteira é instrumento

válido e fornece uma informação consistente.

O uso de RTM em situações de confinamento total em várias refeições ao longo do dia é

positivo ao permitir um bom balanceamento de nutrientes, que serão fornecidos todos no

mesmo momento. Esta prática evita tanto grandes alterações do pH ruminal quanto a

diminuição da digestibilidade dos alimentos e por consequência melhora o desempenho

animal.

Em termos da condução do rebanho, recomenda-se que a partir de 4 meses antes da data

provável de parto as novilhas passem a integrar o lote de vacas secas com a finalidade de

interagir com vacas mais velhas e estabelecer novas relações de dominância. Colocar as

novilhas junto com as vacas secas somente dois meses antes do parto não é recomendável,

pois, este período coincide com o maior desenvolvimento do feto e estresse sofridos pela

248

agressividade de outras vacas poderão ter efeito importante, principalmente, pela redução do

consumo voluntário de alimento no final da gestação.

A passagem da novilha, 2 a 3 semanas antes do parto, pela sala de ordenha é manejo

fundamental, para evitar que passe pela primeira vez por este estresse logo após o parto. Este

estresse pode ocasionar quedas no consumo de alimento e, consequentemente, na produção

de leite no início da primeira lactação. A novilha deve entrar juntamente com as vacas em

ordenha para se acostumar previamente com o ambiente (luzes, ruídos, cheiros) e com o

tratador, o qual deverá também realizar o processo de limpeza dos tetos, sem realizar,

evidentemente, a ordenha para que não haja perda de colostro. Após a passagem pela sala de

ordenha as novilhas devem receber alimento concentrado na quantidade de 3 a até 5 kg/dia,

fornecimento este que tem várias finalidades, como o de estabelecer a rotina do “prêmio”

pela ordenha realizada.

O aporte de alimento concentrado no final da gestação irá garantir um bom desenvolvimento

do feto bem como o crescimento da própria novilha. No final da gestação o feto está

ocupando um espaço muito grande da cavidade abdominal e, portanto o consumo voluntário

de alimento diminui podendo levar ao início do balanço energético ou proteico negativo,

desencadeando um quadro de cetose, antes do início da lactação o que é danoso para a saúde

da novilha. O início gradativo do fornecimento do concentrado no pré-parto, por modular a

microflora do rúmen à nova dieta rica em carboidratos, previne o aparecimento de quadros

de acidose ruminal.

A adição de sais aniônicos como o cloreto de amônia e o sulfato de amônia na dieta pré-

parto diminuem os riscos de desordens metabólicas no pós-parto como a febre do leite, pouco

comum em primíparas, e do edema de úbere, que causa bastante desconforto para as novilhas

resultando em diminuição na ingestão de alimento. As dietas aniônicas estão baseadas no

balanço entre íons de carga positiva, ou cátions, no caso o sódio e o potássio e íons de carga

negativa, ou ânions, sendo de interesse o cloro e o enxofre. O objetivo é fazer com que o pH

do sangue se torne levemente mais ácido e com isto ter uma resposta do organismo com o

aumento, ou ativação, da ressorção de cálcio dos ossos na busca de reestabelecer este

equilíbrio. A principal dificuldade no uso dos sais aniônicos é a sua baixa palatabilidade, o

que torna obrigatório o uso de palatabilizantes no concentrado como, por exemplo, o melaço.

249

São vários os relatos de diminuição dos casos de retenção de placenta nas propriedades que

utilizam as dietas aniônicas. Vários são os fatores que podem levar a retenção de placenta,

entre eles: parto prematuro ou gestações prolongadas; infecções; doenças metabólicas, como

a hipocalcemia; desequilíbrio hormonal; mastites. Uma das causas possíveis é a deficiência

em vitamina E e selênio. Para que o produtor se assegure da situação de seus animais é

recomendável que ele proceda à análise dos alimentos utilizados para verificar a carência de

um destes dois nutrientes. A recomendação sem análise ou baseada em tabelas é temerária,

visto a toxicidade do selênio, que pode causar abortos e até a morte do animal.

É fundamental reagir rapidamente a problemas de ordem metabólica ou reprodutiva, pois

quanto mais tempo durar o início do tratamento maiores serão os prejuízos, os quais são

devidos não somente pelo maior tempo necessário para a recuperação, mas, também, em

termos de redução na produção de leite e no aumento dos dias em aberto, o que acarreta em

aumento do IEP e consequentemente uma diminuição na rentabilidade da atividade. O

produtor deve ter em mente que o animal que está bem nutrido, o que não é sinônimo de

animal com excesso de reservas corporais (supercondicionado), dificilmente apresentará

problemas de ordem sanitária ou metabólica.

A importância do alimento concentrado está não somente no aporte de energia e/ou proteína,

mas também em fornecer parte das exigências de vitaminas e minerais. Os minerais são,

geralmente, negligenciados pelos produtores que acabam pagando um preço elevado pelos

problemas reprodutivos causados, principalmente pelas deficiências bastante comuns de

cobre e cobalto.

Por outro lado, o aporte de proteína na dieta de novilhas leiteiras deve ser observado com

muito cuidado, principalmente se é utilizada a ureia para o complemento proteico. Nas

regiões Sudeste e Centro-Oeste do Brasil é bastante comum o uso de cana-de-açúcar

associada à ureia para os períodos de escassez de alimento. Até mesmo na Região Sul tal

prática tem sido difundida. Existem muitos relatos sobre novilhas que, mesmo ingerindo os

níveis recomendados de ureia, acabam apresentando problemas reprodutivos.

Observando a Tabela 2 é possível constatar que efetivamente o excesso de proteína

prontamente degradável no rúmen leva à redução da fertilidade das novilhas e reduz de

maneira expressiva a composição iônica do fluído uterino. Quando é realizada a divisão dos

animais por níveis de ureia plasmática, é marcante a sua influência sobre a fertilidade.

250

Contudo, não há alteração no desempenho dos animais quanto ao ganho de peso, mas, apesar

das fêmeas atingirem peso adequado aos 15 meses, devido aos problemas de fertilidade

haverá um aumento considerável da IPP. O nível de ureia tanto antes quanto após a refeição

é mais elevado para os animais que receberam maior aporte de proteína degradável no rúmen.

Os animais com elevada ingestão de proteína apresentaram ciclo estral mais prolongado após

a inseminação e também possuíam a concentração de progesterona elevada. As informações

indicam que o excesso de proteína degradável no rúmen ao alterar o pH intrauterino

ocasionam alterações na atividade secretória do útero, entretanto, o mecanismo ainda não

está suficientemente esclarecido. Para evitar tais problemas deve sempre ser verificado o

balanço entre proteína e energia e também utilizar alguma fonte de proteína não degradável

no rúmen.

Tabela 2. Taxa de concepção ao primeiro serviço, duração do ciclo estral e ureia plasmática

para novilhas leiteiras alimentadas com níveis normais ou elevados de proteína (adaptado de

Elrod & Butler (1993)

Variável Proteína normal

(15,5%)

Proteína elevada

(21,8%)

Taxa concepção (%) 82 61

Duração ciclo estral antes

da inseminação (dias) 20,1

20,4

Duração ciclo estral após a

inseminação (dias) 21,9

24,4

Ganho médio diário de

peso (g) 623

Ureia plasmática antes da

alimentação (mg/dL) 10,2

14,8

Ureia plasmática após

alimentação (mg/dL) 17,5

23,6

Grupos por nível de ureia

plasmática (mg/dL) < 9,9 9,9-16 > 16

Taxa de concepção (%) 87,5 72,5 42,8

Evidente que o descarte de uma vaca é decisão única e exclusiva do produtor que deve se

basear nos controles zootécnicos realizados desde o nascimento da fêmea para decidir qual o

melhor momento para a venda do animal. Vacas de grande mérito produtivo e morfológico

permanecem mais tempo em produção com a finalidade de obter maior número de crias com

elevado potencial genético.

251

Em resumo, cuidados simples, e que não representam custos adicionais, permitem a melhoria

dos índices reprodutivos (IPP e IEP) e queda na mortalidade de animais jovens maximizando

o retorno financeiro, pelo maior número de animais obtidos para a reposição. Assim, não

somente será possível realizar uma seleção adequada das fêmeas que irão substituir as vacas

de descarte, garantindo ganho em produção de leite futuro, mas também a obtenção de mais

novilhas excedentes para a comercialização.

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253

Monitoramento de bem-estar e saúde em rebanhos leiteiros

Marcelo Cecim

A discussão sobre o bem-estar de animais de produção está presente nos mais variados

círculos da sociedade mundial. Desde os grupos de fanáticos que se julgam protetores de

animais, mas nunca desenvolveram intimidade alguma com eles, até os cientistas de

formação produtivista que são tidos como autoridades, mas na maior parte das vezes nunca

trabalharam em um sistema produtivo ao lado dos animais e não viveram a experiência de

passar "um dia de vaca". No meio destes dois grupos está a população consumidora que

houve suas opiniões extremadas. Existe, no entanto, outro grande grupo de pessoas que

trabalham diretamente com animais de produção para os quais a mídia não dá tanta atenção.

Estes vão desde tratadores, ordenhadores, proprietários e técnicos que entendem que a

lucratividade de um sistema leiteiro está intimamente ligada à saúde e bem-estar de suas

vacas. Bem-estar é condição sine qua non para a saúde, assim como esta o é para

lucratividade. Esta filosofia evolucionista de produção animal, desafia o dogma produtivista

que assume que o homem define o que é melhor para um animal simplesmente avaliando sua

performance produtiva em um determinado momento. No evolucionismo, assumimos que as

vacas têm todas as respostas sobre o que é melhor para elas, e o esforço está no sentido de

entendê-las.

Animais são indiscutivelmente seres sencientes, mas não são, pelo menos até onde

entendemos, seres conscientes. Uma vaca não sabe o que ela representa no mundo ou o

porquê que é criada. É exatamente esta falta de consciência delas que nos impõe a

responsabilidade moral de seus cuidados, de dar-lhes uma vida digna e de buscar entender

seus desejos e sentimentos. O objetivo do presente texto é resumir o que reconhecemos hoje

como a linguagem das vacas. A forma com que elas todos os dias nos dizem como se sentem,

e de que forma esta informação pode ser usada para garantir respeito e um melhor conforto

e saúde para estes animais.

Da domesticação à vaca leiteira moderna

Os fósseis mais antigos de bovinos datam de 2 milhões de anos. Os bovinos modernos

apareceram em torno de 500.000 anos atrás (Albright & Arave, 1997). Estes animais eram

254

vistos inicialmente como presas, e por vezes como predadores. Somente por volta de 6000

AC iniciou a domesticação dos bovinos na região onde hoje é a Turquia. Todo o processo

de domesticação foi direcionado a produzir animais de tração, pois a humanidade iniciava a

produção de grãos e o uso destes animais tornava mais eficiente o preparo da terra. Não fazia

sentido criar um animal para carne, pois estes podiam ser simplesmente abatidos na natureza.

Isto tem uma implicação enorme no comportamento dos bovinos modernos, que são oriundos

destes ancestrais. A mansidão e a resistência são características essenciais para um animal de

tração, ou seja, capacidade de suportar sofrimento e dor sem maior reação. Toda seleção

iniciada mais tarde para produção de carne ou leite teve como base este pool genético pré-

selecionado para complacência, resistência e baixa reação a estímulos adversos.

Com isso, acabamos por criar animais que muito pouco expressam dor, descontentamento,

angústia, medo, frustração e tédio. Mas com certeza os sentem, como qualquer um de nós.

A International Dairy Federation (2008) listou os quatro estádios de domesticação de gado

leiteiro e como estes afetaram seu bem-estar:

1- Em um estado natural apesar de plena liberdade, o bem-estar dos animais era

comprometido por predadores, fome, doenças e clima.

2- À medida que foram domesticados, seu bem-estar melhorou, pois as necessidades básicas

de saúde, proteção e alimentação passaram a ser atendidas pelos humanos. É provável, que

esta época foi quando os bovinos tiveram a melhor qualidade de vida.

3- A partir deste ponto, a seleção genética criou animais mais exigentes por serem mais

produtivos, e o desconhecimento e não atendimento destas necessidades acabou por diminuir

sua qualidade de vida.

4- Hoje estamos em um ponto onde a demanda produtiva é tamanha que o bem-estar da vaca

leiteira é seriamente comprometido, externando-se como reduzida fertilidade e reduzida

expectativa de vida produtiva.

Vale ressaltar, que na natureza, espécies que têm menor fecundidade e menor tempo de vida

reprodutiva estão invariavelmente fadadas à extinção. Infelizmente, há quem diga que estas

duas características em gado leiteiro são resultado de um "melhoramento genético".

Acredita-se que o Bos taurus teve sua origem no leste do Mediterrâneo e rapidamente ocupou

regiões da Ásia formando o Bos taurus indicus e da Europa formando o Bos taurus taurus.

Na Europa se distribuíram buscando regiões de transição entre floresta e campo, visto que

255

este ambiente permite um consumo rápido de forragem e um local abrigado para deitar e

ruminar. Na natureza, o dia de uma vaca é distribuído em três períodos de 8 horas, dedicados

ao consumo, atividades e ruminação.

A principal característica comportamental da intensificação da produção leiteira é a perda de

liberdade pelo confinamento. Neste, os animais perdem em parte a possibilidade de escolher

onde se posicionar em relação ao grupo ou ao ambiente. Por exemplo, não poder procurar

um lugar mais fresco no calor, ser obrigado a comer ou beber próximo a animais dominantes,

caminhar e ficar em contato próximo a outras como na sala de espera. Muito embora entre

vacas não ocorram disputas físicas maiores para estabelecimento da Ordem de Dominância

Social, a imposição hierárquica ocorre a todo momento. A postura e o olhar ameaçador de

uma vaca dominante sobre uma subordinada é bastante sutil, mas o suficiente para levar a

segunda a uma ação evasiva. Por menor que seja, a ativação de mecanismos de proteção e

medo sempre irá refletir negativamente sobre saúde e produção. A habilidade do tratador de

assumir a posição de "animal alfa" no grupo leva os animais a segui-lo. Existe evidência que

uma pessoa com autoconfiança e atitudes consistentes torna o manejo dos animais mais fácil.

Muito daquele conhecimento e intimidade com seu rebanho, característico dos pastores da

antiguidade se perdeu na produção moderna. No entanto, quanto mais automatizado for o

sistema de produção, menor será contato direto entre pessoa-vaca e, portanto, se faz

necessária uma sensibilidade mais aguçada em entender as necessidades das vacas. Este é

um trabalho em que o homem jamais será substituído por uma máquina.

Etologia bovina

Todo e qualquer comportamento exibido por um bovino é resultado de 3 fatores ou de suas

interações. O instinto, como levantar e mamar ao nascer, ou ainda sentar-se e resistir sempre

que for puxado para frente. Os fatores sensoriais como cheiro, som e visão que levam o

animal a aproximar-se ou afastar-se do estímulo. O condicionamento ou experiência são

coisas que o animal aprende, como beber leite em um balde, comer concentrados, entrar na

ordenha e "baixar o leite". Um exemplo de interação destes fatores é a cópula onde

inicialmente o touro tem o instinto de montar, mas sua capacidade de monta melhora com

experiência.

256

Alguns vícios comportamentais ou estereótipos surgem como uma alternativa do animal em

conviver com um estímulo negativo. Um exemplo é o enrolar ou brincar com a língua que

algumas terneiras aprendem a fazer como forma de amenizar sua frustração pelo isolamento,

falta de contato direto com outras ou simplesmente tédio.

Bovinos são animais sociais e gregários, seu isolamento é sempre estressante. Sempre terão

medo de algo novo, mas, se o estímulo não parecer ameaçador, o medo é substituído por

curiosidade até que o estímulo se torne rotina e deixe de provocar reação. Vacas têm

excelente memória, o tom de voz de um tratador que as maltrata leva a reação de fuga ou

desconforto; se existe uma experiência positiva com o tratador elas naturalmente se

aproximam. Vacas leiteiras são animais de comportamento plácido, mas quando forçadas a

fazer o que não querem apresentam reações de fuga, confusão e desorientação, criando perigo

para si e para pessoas. O tratador precisa prever a reação e a solução, sempre evitando

enfrentamento direto. Quase todos os confrontos diretos entre vaca e homem são vencidos

pela vaca. Os confrontos entre animais são sempre resultado de alguma disputa, seja por

espaço de cocho, de cama, de sombra, etc. Confrontos são sempre disputados em pé, animais

deitados ou ruminando não estão participando naquele momento de questões hierárquicas ou

estressantes. Quanto maior o número de animais ruminando deitados em um determinado

momento, maior a estabilidade e menor o desafio hierárquico e comportamental do lote. Hoje

entendemos que a ruminação em grupo representa um momento de satisfação e bem-estar

onde os fatores estressantes impostos pelo sistema produtivo estão minimizados. A

importância do monitoramento das variações individuais da ruminação como parâmetro

precoce de detecção de desafios e quebra de bem-estar será discutida no final deste capítulo.

Indicadores de desconforto

Animais mantidos em liberdade a campo sempre têm menores problemas comportamentais

que animais em sistemas confinados, provavelmente pelo tédio e pela impossibilidade de

satisfazer desejos comportamentais. Esta quebra de bem-estar é um fator de grande

importância na produção leiteira intensificada, porque a reação natural do animal é estimular

mecanismos de proteção que sempre são contraproducentes.

A sensibilidade à dor é similar entre humanos e bovinos, no entanto, a expressão de dor em

todo o animal presa é diminuída, pois esta fraqueza é facilmente reconhecida por predadores.

257

A expressão da dor é maior em um animal isolado que em um animal dentro de seu grupo.

Esta pode aparecer na forma de vocalizações, coices ou sacudir a cola para estímulos

dolorosos agudos ou ainda na ausência de ruminação, ranger de dentes ou deitar em posições

incomuns. Dorso arqueado e passo encurtado são característicos de dores crônicas.

Em animais presa, medo é sempre a reação inicial ao desconhecido como forma de proteção.

Rotina e consistência de manejo são as melhores estratégias para evitar esta reação. Sempre

que expostos a uma cerca, tronco ou piso novo deve-se dar tempo para o medo ser substituído

pela curiosidade, que é o início da construção da rotina. Vacas que defecam ou urinam na

sala de ordenha estão expressando medo. Uma vocalização de dor faz todo um grupo desviar

atenção. Sons altos e agudos causam reação de fuga, que, por sua vez quando em piso de

concreto pode causar acidentes. A ordenha deve ser um momento de relaxamento para a vaca.

De uma maneira geral, espera-se que pelo menos 40% das vacas ruminem em pé durante a

ordenha, indicando que o procedimento não é estressante. Ordenhadores calmos "fazem"

vacas calmas, vacas calmas produzem mais leite.

A demonstração de comportamentos estereotipados (atitudes repetidas, sem nenhum

propósito ou benefício aparente) é aceita como resposta animal à frustração de repetidas

vezes ser exposto a um problema ou estímulo negativo. Quanto maior a intensificação do

sistema, maior o aparecimento de estereótipos. Estereótipos orais como morder ou lamber

barras de ferro, expor e enrolar a língua (linguateio) lamber e beber urina são oriundos da

necessidade de pastar em animais que recebem dieta total. Entrar na cama do free-stall e não

deitar é uma atitude de fuga em animais que têm medo, ou de dor em animais com dificuldade

de deitar. Entrar na cama com os membros anteriores e parar com as pernas no corredor

(perching) também é um estereótipo associado a acidose ruminal.

Qualquer situação de isolamento leva a reações, em manejos como aplicação de

medicamentos, inseminação, etc. A vaca alvo deve ser contida junto ou próximo a mais

animais do mesmo grupo. A comunicação visual é a mais comum entre bovinos, postura da

cabeça é usada como forma de desafio e imposição social e a fuga como resposta, expressões

faciais não são importantes. A posição elevada da cola está presente nos confrontos, cio,

curiosidade. A cola caída representa calma e relaxamento, enquanto o posicionamento desta

por entre as pernas indica medo ou frio.

258

A introdução de uma vaca diferente no grupo leva a uma redefinição de ordem de dominância

social caracterizada por enfrentamentos que duram até 24 h, a mistura de lotes mantém esta

agitação por até 72 h, podendo afetar produção leiteira. Em grupos maiores que 100 animais,

os confrontos são mais comuns, pois as vacas têm dificuldade em lembrar sobre quem são

dominantes ou a quem são submissas. Na natureza, os rebanhos tendem a se dividir quando

ultrapassam o número de 150 vacas, sugerindo que este é a sua capacidade de memória social.

A relação entre tratador/ordenhador e suas vacas tem sido objeto de vários estudos.

Aparentemente, vacas respondem melhor a pessoas introvertidas, mas autoconfiantes.

Pessoas com tolerância, paciência, dificuldade de relacionamento e convívio interpessoal

pessoal, desconfiadas, e de poucas palavras são indivíduos que estabelecem melhores

relações com vacas leiteiras. Esta facilidade de relacionamento é estabelecida pela distância

mínima de fuga e pode ir desde zero (quando a vaca deixa ser tocada) até 6 m, e isto pode

afetar a produção leiteira em até 20%. Vacas têm plena capacidade de diferenciar pessoas

familiares e estranhos, pessoas com atitude positiva ou não.

O termo "cowpersonship" tem sido usado para definir o conjunto de habilidades que permite

a uma pessoa reconhecer mudanças no comportamento de cada uma de suas vacas, ser

sensível às condições ambientais em que vivem os animais, conduzir a movimentação de

animais sob o ponto de vista das vacas, não o seu; e, se reconhecem algo que incomoda os

animais, procurar corrigir.

Com a intensificação dos sistemas produtivos ocorrida nos últimos 50 anos, uma série de

novos comportamentos e problemas têm sido identificados em animais confinados que até

então eram praticamente desconhecidos em animais livres. Baixa expressão de cio, ou cio

silencioso é uma situação onde vacas em cio não são montadas e, portanto, não identificadas.

Uma série de fatores contribui para tal, desde estresse térmico, umidade excessiva, pisos de

concreto, vacas maiores e com problemas podais, vacas dominantes que não são montadas

por submissas, etc. Também a incidência de cistos foliculares e por vezes ninfomania é maior

em animais confinados. Recém-nascidos, principalmente filhos de novilhas, que não querem

mamar o colostro são comuns e vacas que se negam a usar as camas e deitam no corredor.

Outros comportamentos anormais incluem atirar comida para cima, ou jogar para o chão de

um cocho elevado; bater com a língua e lamber a água, ao invés de introduzir o focinho e

sugar; aumento na defecação; diminuição de ócio deitado e aumento de ócio em pé; hesitação

259

com movimentos de vai e vem na hora de deitar ou levantar; fazer posição de cão sentado. O

aparecimento, mesmo que esporádico, destes comportamentos são primeiros indicativos de

falta de conforto no sistema. Muitas vezes os sinais comportamentais precedem o

aparecimento de doenças ou queda de produção.

Observando conforto

É indiscutível que as vacas leiteiras em sistemas intensivos estão constantemente enviando

sinais que são sua "opinião" em relação ao ambiente em que vivem e como são tratadas. Estes

sinais devem ser analisados dentro de um todo e suas inter-relações estabelecidas para buscar-

se soluções factíveis. Hulsen (2011, 2013) desenvolveu manuais práticos que auxiliam no

treinamento de pessoal para entender um sistema sob o ponto de vista das vacas. São 3

perguntas básicas: 1) O que eu vejo? A resposta deve conter observações objetivas e precisas;

2) Como e por que isto acontece e qual sua causa? 3) O que isto significa, e o que devo fazer?

Resumindo, olhe, pense e faça.

Para continuar competitiva e sustentar-se no mercado, toda fazenda leiteira deve dar maior

importância aos desafios de saúde das vacas. As altas taxas anuais de descarte não apenas

representam queda de lucratividade do sistema, mas também colocam um questionamento

ético e moral sobre o direito de explorar a produção animal se isso tem um impacto negativo

tão grande na vida das vacas. Manutenção de saúde e aumento da expectativa de vida

produtiva das vacas só pode ser atingida com monitoramento constante de alterações de

conforto e bem-estar, que são os primeiros sinais da vaca que algo não está bem. Muito antes

do aparecimento de quadros clínicos. É muito triste ver proprietários que desenvolvem uma

espécie de "cegueira leiteira", oriunda do fato de ver diariamente animais sem conforto e sem

qualidade de vida e passar a considerar esta como uma situação normal.

Seguindo as orientações de Hulsen (2011): não olhe, apenas observe. Observe de todo até o

detalhe, de longe até bem próximo, do grupo até a vaca! Existe uniformidade de tamanho das

vacas? De higiene? De aspecto do pelo? De condição corporal? De escores de rúmen e

abdômen? Como os animais ocupam a área onde estão? Sua distribuição é homogênea? Das

vacas que não estão comendo ou bebendo, quantas estão deitadas nas camas? Menos que

85%? Por quê? Quantas vacas caminham com postura anormal? Isto é um problema? Qual a

causa? Estabeleça uma rotina de observação 2 ou 3 vezes ao dia, mantenha dados através do

260

tempo. Diferenças podem surgir entre categorias ou entre animais. Em relação à condição

corporal, quando mais que 10% das vacas estão muito magras ou muito gordas, uma revisão

no programa nutricional, escores de cocho e de locomoção deve ser feita. Escores de rúmen

e de abdômen indicam consumo nas últimas 24 e 48 h respectivamente.

Quantificando conforto-manejo-bem-estar

Uma série de diferentes escores relacionados à vaca e seu ambiente foram propostos, alguns

aceitos e utilizados no dia a dia da gestão de saúde de um rebanho. O que indicam os escores?

Eles são uma forma de expressão da vaca sobre elas próprias e o sistema onde vivem.

Classicamente, a filosofia produtivista prega que em se garantindo sanidade, nutrição e

genética, todas as necessidades do animal estarão satisfeitas. Esta cultura tem formado nas

últimas décadas exércitos de especialistas em suas áreas, mas completamente ignorantes

sobre o todo que envolve a vida de uma vaca leiteira. Infelizmente, vemos a assistência

técnica sendo feita com se existissem grupos de úteros que devem gestar, lotes de rúmen que

devem encher e fermentar, rebanhos de patas que devem andar e uma população de úberes

que devem produzir leite. O fato de que existe uma vaca ao redor destes e que estes são

apenas parte da vaca, acaba por ser negligenciado na tomada de decisões, principalmente nos

sistemas familiares sul-brasileiros que não contam com um técnico residente. A ilusão de que

apenas a implantação de tecnologias pontuais é a solução de todos os problemas tem levado

ao desequilíbrio e a falência de muitos sistemas. Um bom exemplo disto é a ideia de que

aumento de produção se faz através de melhoramento genético. Nos sistemas leiteiros

comerciais no sul do Brasil, tanto familiares como empresariais, existe de uma forma geral

um excesso de genética. Esta genética mais agressiva acaba por impor aos animais uma

exigência sobre nutrição, conforto térmico e de cama, capacidade de pessoal etc. que a nossa

realidade ambiental, agrícola e sociocultural não consegue prover. O resultado disto é uma

baixa expectativa de vida das vacas em relação a sua produção, e uma baixa fertilidade. É

fundamental entender que isto só se torna realidade através de muito sofrimento das vacas,

que acabam descartadas por 3 principais causas: mastite, infertilidade e problemas de casco.

Na filosofia evolucionista de produção animal devemos reconhecer o que não podemos

mudar como relevo, clima, capacidade produtiva máxima da terra e fatores financeiros de

mercado e de escolha da genética, recursos humanos, instalações, etc. que venham a criar um

261

sistema equilibrado e coerente com a interação dos fatores anteriores. O modelo gráfico

criado pelo autor para treinamento de pessoal é o de uma roda de carreta onde cada um dos

raios representam as subáreas: manejo, genética, sanidade, reprodução, nutrição, recursos

humanos e financeiros. No centro da roda está a vaca e sua satisfação com o sistema expressa

pelos escores. O tamanho da roda e sua capacidade de percorrer espaço na estrada representa

a produtividade do sistema. A queixa do produtor, ainda o principal motivo para buscar

assistência técnica, normalmente é o raio mais curto da roda. E a ideia, bastante arrogante da

ciência produtivista, é que o técnico deve "melhorar" este raio que está causando

desequilíbrio ao sistema. Analisando de uma forma holística, vemos que a queixa do

produtor, por exemplo, alto retorno ao cio nada mais é uma forma da vaca expressar seu

descontentamento com outra coisa. Ou seja, o problema está em outro raio que pode estar

mais longo, como genética, ou mais curto como conforto térmico. Na realidade ambos devem

existir, porque a qualidade de vida e desempenho da vaca é sempre resultado de uma

interação de todos os raios. Entendo que o técnico de sucesso hoje é aquele que tem como

meta equilibrar um sistema. Equilíbrio é atingido de uma forma mais viável economicamente

diminuindo raios longos, como genética, do que tentando aumentar raios curtos como

reprodução. Há que se ter a humildade de aceitar que as tecnologias conhecidas não servem

para todos os sistemas, e que todo erro de adoção tecnológica leva a queda de lucratividade

que é resultado da queda de qualidade de vida das vacas. É através dos escores que

quantificamos a qualidade e uniformidade de todos os raios. Os escores são o alfabeto da

linguagem da vaca, para entendê-la, não basta apenas conhecer os escores (as letras), mas

reconhecer suas inter-relações (as palavras) e definir soluções práticas para seu uso (as

frases).

Uma variedade de escores existe e outros podem ser criados para se quantificar a importância

de determinado problema ou resposta a uma mudança de manejo. A maioria dos escores tem

5 níveis, representando: muito baixo, baixo, médio, alto e muito alto. Em alguns se busca o

meio termo, como condição corporal, em outros como higiene o máximo, ou ainda o mínimo,

como em frequência respiratória. Neste capítulo vamos abordar 9 escores, utilizáveis em

todos os sistemas produtivos.

262

1) Escore de condição corporal

Em gado leiteiro o sistema mais utilizado é o de Edmonson (1989) que usa 5 níveis e estes

subdivididos em quartos. Não será discutida a avaliação dos escores, visto que existe vasta

literatura no tema, mas sim a necessidade do técnico em definir metas para cada rebanho, ou

ainda para cada vaca, visto a tremenda variabilidade de tamanho das vacas e tipo leiteiro nos

rebanhos sul-brasileiros. Como base deve-se considerar que animais que se aproximam do

"true-type" canadense, vacas grandes, angulosas, de alto volume, pico precoce e baixo sólido,

necessitam chegar ao parto com um escore entre 3 e 3,25 (diminuiu dos 3,75 de 20 anos

atrás). Como terá pouca reserva corporal para lactação, esta vaca necessitará de um altíssimo

aporte energético no início da lactação. A manutenção da exigência nutricional destas vacas

força as altas produtoras a um estado ruminal mais ácido com aparecimento de fezes tipo 2.

Esta exigência dificilmente será alcançada a pasto. Por outro lado, vacas de linhagem

Friesian, europeias, neozelandesas ou argentinas com maior musculosidade e deposição de

gordura, menor angulosidade, menor volume e alto teor de sólidos podem chegar ao parto

com uma maior reserva corporal para garantir a demanda para formação da gordura do leite.

Nestes animais, é possível exploração a pasto visando fermentação ruminal acética com

suplementação de concentrados, permitindo um escore fecal 3 durante o pico de lactação. O

escore de condição corporal deve ser aplicado pelo menos 5 vezes durante o ciclo produtivo:

na secagem, no pré-parto, no pico de lactação, no início da reprodução e no meio da lactação.

Reconhecer o "ponto de virada" de cada vaca é um segredo para o sucesso reprodutivo. Este

é o momento em que a vaca deixa de perder peso. Com o desencontro entre a demanda por

nutrientes e a baixa qualidade da dieta, a curva de perda de peso tem-se prolongado. Como

remédio, tem-se optado por um período de espera voluntário menor e início da reprodução

antes que a vaca perca muito peso. O resultado, além de não ser muito bom, acaba por exigir

a secagem de vacas com produção maior que 23 L, que representa seu pico de lucratividade.

O escore é a garantia de reservas para o desafio futuro, portanto deve ser avaliado dentro da

capacidade produtiva da vaca e da capacidade da fazenda em prover uma dieta que atenda

estas necessidades.

263

2) Escore de locomoção

Também descrito em 5 níveis que vão desde o caminhar normal (1) até séria claudicação (5).

O escore de locomoção é a opinião da vaca sobre a interação genética-ambiente-dieta. O

primeiro é parte dela, os demais são forçados a ela. A literatura sobre a avaliação dos escores

de locomoção é ampla (Sprechter et al., 1997). Em um primeiro momento, a vinda para a sala

de ordenha é quando se tem uma visão geral de conforto de locomoção. Olhando o grupo,

atente para as linhas de dorso. Que percentagem de vacas se desloca com o dorso arqueado?

Isto é compatível com a idade e nível de produção do grupo? Se existe um número pequeno

de vacas caminhando com desconforto (dorso arqueado), não há por que fazer análise

individual. Dedique sua hora técnica para outra coisa. É fundamental reconhecer que o escore

de locomoção é uma opinião real, mas tardia sobre o problema. Por exemplo, uma dieta com

baixa fibra efetiva, ou um ambiente com estresse térmico irão ambos diminuir tempo de

ruminação, produção de saliva e tamponamento ruminal. O desconforto no andar (escore 2),

pode levar de 10 a 20 dias para aparecer, causado pela laminite. A úlcera de sola (escore 3),

consequência da laminite leva de 20 a 60 dias para ser diagnosticada. Às vezes, o fator

estressante não existe mais, apenas o resultado. No exemplo, com ambas possíveis causas

haveria escore de consistência de fezes 2, e a causa (baixa FDN ou estresse térmico) seria

identificada pelo escore de composição de fezes ainda durante o desafio. Problemas podais

levam a queda de consumo: quando se monitora tempo de ruminação, nota-se uma grande

variabilidade na ruminação por longo tempo nestes animais. Como se a vaca comesse pouco

um dia porque tem dor, mas no próximo dia a fome é tanta que se obriga a comer com dor, e

o ciclo continua. Problemas de casco tem um impacto negativo enorme sobre a qualidade de

vida de vacas tanto confinadas como mantidas extensivamente.

3) Escore de casco

Utilizado como um exame complementar ao escore de locomoção (Hulsen, 2011). São 3

categorias que podem estar relacionadas aos escores de locomoção 1, 3, 4 e 5.

Resumidamente, escore 1 representa um casco (estojo córneo, sola, talão e espaço

interdigital) normal, escore 2 representa um único problema de grau moderado (úlcera de

sola) e escore 3 representa um problema de quadro grave ou uma combinação de alterações

(dermatite interdigital e necrose de sola).

264

4) Escore de pernas e de jarrete

O escore de pernas é uma medida do desvio de angulação dos membros posteriores em

relação à coluna. Representa uma medida do esforço da vaca em compensar o desconforto e

dor de apoio. Está divido em 3 níveis:

Escore 1: Quando as pinças apontam para a frente, paralelas à coluna com 0o de desvio até

um desvio lateral de até 17o.

Escore 2: Quando as pinças de uma ou ambas as pernas apontam entre 17o e 24o. Neste caso,

o ponto pivotante é o tarso. Este escore representa o alívio de peso sobre o dígito lateral,

colocando mais peso sobre o dígito medial. Pode ser uma tentativa de compensação de dor

solar na unha lateral, ou resultado de falta de casqueamento preventivo, visto que a taxa de

crescimento da unha lateral é maior que o da unha medial nos posteriores.

Escore 3: Quando o desvio lateral das pinças é maior que 24o, neste caso o ponto pivotante é

a articulação coxofemoral resultando em abdução de todo membro posterior.

O escore de pernas pode ser usado para avaliar a eficiência e frequência do programa de

casqueamento. Ainda dentro do escore de pernas, existe o escore de jarrete, também dividido

em 3 níveis que avaliam a condição da pele e anexos na região lateral do tarso. É usado para

avaliar qualidade das camas em sistemas de free-stall. Resumidamente, os graus são:

Grau 1: Pele e cobertura pilosa íntegra.

Grau 2: Pele engrossada, mas íntegra, perda de pelos, edema subcutâneo.

Grau 3: Áreas sem pelos, pele lesionada, extensa reação inflamatória subcutânea.

5) Escore de higiene

A quantidade de terra em sistemas abertos, ou de esterco seco ou fresco em ambos os

sistemas, aberto e fechado, aderidos ao corpo da vaca representa o nível de higiene oferecido

aos animais pelo proprietário. A higiene de úbere tem íntima relação com o aumento de

células somáticas nas amostras de tanque. A análise é feita em 3 regiões do corpo que são

ranqueadas em 4 níveis dependendo da quantidade de sujidades aderidas à pele e pelos. Às

regiões do úbere, coxas e abdômen, e pernas e cascos são atribuídos os graus 1 para região

limpa, até grau 4 para forte deposição de matéria orgânica aderia à pele. O escore de higiene

de úbere faz parte da gestão de higiene de ordenha, e serve para definir seus protocolos. O

265

escore de higiene de coxas e abdômen é uma avaliação da qualidade da cama em sistemas

fechados e da higiene dos locais de descanso em sistemas abertos. O escore de higiene de

pernas e cascos representa o grau de limpeza nos corredores, caminhos, praça de alimentação,

curral de espera, etc.

Como o escore avalia ambiente, deve-se fazer uma análise de grupo, não de animais

individuais. No entanto, é comum notar-se que os animais com coxas e abdômen mais sujos

ocupam uma posição inferior na ordem de dominância social do grupo, e lhes são permitidos

apenas os piores locais para deitar. Isto é indicativo que a qualidade do ambiente é marginal,

existe superlotação, ou ambos.

6) Escore de rúmen e abdômen

Assim como escore de condição corporal avalia reservas, ou deposição de gordura, os escores

de rúmen e abdômen avaliam consumo. Estes normalmente são paralelos aos níveis de

colesterol sérico por exemplo. O escore de rúmen representa consumo nas últimas 24 horas

e pode ser avaliado em qualquer hora do dia em sistemas fechados. Em sistemas abertos com

suplementação, após a alimentação da tarde é o melhor momento. A avaliação é feita

observando-se a aparência da fossa paralombar esquerda e pontuando-se da seguinte forma:

Escore 1: A fossa é côncava e profunda, as 3 linhas (última costela, apófises transversas

lombares e musculatura da coxa) são evidentes. Forçando-se com o punho no centro da fossa

existe a impressão de um vazio no abdômen. Uma vaca assim não comeu nada, ou pelo menos

muito pouco no último dia. Se o quadro for geral para o grupo, estão passando fome. Se

houver muita heterogeneidade, observar por competição e espaço de cocho. Se apenas um ou

poucos animais apresentarem o quadro, busque a causa primária que lhes está diminuindo

consumo.

Escore 2: A fossa ainda é côncava, mas apenas 2 das 3 linhas são evidentes. Em se fazendo

pressão, nota-se o rúmen semivazio. Este quadro é típico de animais recebendo dietas de alta

digestibilidade, alta proteína, baixa FDN e rápido tempo de passagem. Neste tipo de dieta, o

animal usa entre 50 e 60% da capacidade ruminal, rumina pouco, produz fezes grau 2 e está

em risco de desenvolver SARA (acidose ruminal subaguda). Este escore aparece

normalmente no pré-parto com a diminuição do consumo, e deve desaparecer até a terceira

266

semana de lactação em transições normais. A velocidade de evolução do escore 2 para 3

representa o desempenho da vaca naquela transição.

Escore 3: A fossa paralombar apresenta-se levemente côncava, apenas a linha formada pelas

apófises transversas lombares é visível. A pressão com o punho mostra resistência, indicando

um rúmen com conteúdo pastoso. Este representa o consumo de uma dieta equilibrada em

digestibilidade e fibra, entre 60 e 70% do volume ruminal sendo preenchido. Este quadro

normalmente resulta em fezes tipo 3, sendo o escore desejado desde os 15 até os 150 dias de

lactação para prevenir distúrbios digestivo-metabólicos.

Escore 4: A fossa paralombar apresenta-se plana, com volume abdominal visível. Apenas a

linha das apófises transversas aparece, mas pouco evidente. Neste caso, o volume ruminal

tem em torno de 85% de preenchimento, causado por uma dieta mais fibrosa, com menor

teor de concentrados e fermentação predominantemente acética. Este escore pode ser

buscado a partir da confirmação da prenhez ou meio da recuperação do peso perdido, ou seja,

a partir do dia 150 até a secagem e durante o período seco em animais que se visa manutenção

de peso. Deve passar para escore 3 quando iniciar a dieta pré-parto. Hoje entende-se que,

embora o meio e o fim da lactação com este escore, não represente o período mais produtivo

da vaca, acaba por ser o período mais lucrativo da lactação, pois tem-se uma vaca com dieta

mais barata, prenhe, ganhando peso e com raros problemas de saúde.

Escore 5: É aquele em que a fossa paralombar apresenta-se convexa e o rúmen tem conteúdo

semissólido (não confundir com timpanismo). O rúmen tem 100% de sua capacidade

preenchida, mas nunca por alto consumo, e sim por baixa digestibilidade do alimento que

tem alto tempo de passagem. Apesar de parecer bem alimentada, uma vaca assim acaba

ingerindo pouca quantidade de uma dieta de baixa qualidade. Este escore não é compatível

com produção leiteira.

O escore de abdômen representa o escore de rúmen de dois dias atrás, ou seja, o quanto a

vaca ingeriu nas últimas 72 horas. É classificado em 3 níveis observando a curvatura da

região baixa do ventre:

Escore 1: Linha do ventre bastante convexa, indicando consumo normal e satisfatório.

Escore 2: Linha do ventre entre reta e pouco convexa. Indica um animal com depressão de

consumo, e que deve ser pesquisada causa primária.

267

Escore 3: Linha de ventre de côncava, até reta. Indica um animal doente, que tem comido

pouco ou nada nos últimos 3 dias.

7) Escore de fezes

O aspecto, consistência e composição das fezes devem ser entendidos como a fase final do

processo digestivo e, portanto, a opinião da vaca sobre a dieta que lhe é oferecida. Existem

várias formas de classificação, tradicionalmente em relação à consistência:

Escore 1: Consistência líquida, diarreica. Pode ter como causa adaptação a uma nova dieta,

consumo exagerado de sal (após privação), enterites, acidose ruminal. A cor está sempre

relacionada ao tipo de dieta. Nunca pode ser considerado normal.

Escore 2: Consistência de iogurte. Aparece em dietas de alta digestibilidade, alta PB e NDT,

mas baixa FDN. Acaba sendo uma consequência do adensamento de dieta de altas produtoras

próximo ao pico de lactação. É o escore característico de rebanhos com SARA e,

frequentemente, acompanhado de escore de locomoção 2 e infertilidade. O escore 2 também

pode aparecer em sistemas semi-intensivos onde parte da dieta provém de pastejo no verão.

Nestes casos, as vacas comem concentrado e silagem, mas têm consumo de pasto e tempo de

ruminação diminuídos pelo estresse térmico. A composição da dieta parece certa, mas o que

a vaca realmente come e como processa não está certa. A forma prática de diferenciar entre

estes dois tipos de escore 2 é o exame de composição de fezes. Toma-se um copo (200 mL)

de material fecal fresca, coloca-se em uma peneira de cozinha e lava-se completamente com

água corrente. Se o material retido na peneira consistir de muco e grão inteiros ou quebrados,

trata-se de baixo consumo (não oferta) de fibra. Se na peneira restarem partículas de forragem

grandes (< 7 mm), indica falha na ruminação, característica de estresse térmico.

Escore 3: Este bolo fecal tem a forma de um pudim, mais espalhado que alto e com uma

depressão no centro. É característico de dietas com um equilíbrio entre fibra e concentrados,

com um ambiente ruminal de fermentação mista, propiônica e acética. Representa uma dieta

segura para prevenir queda de consumo e alterações digestórias. Busca-se escore fecal 3 no

início do último mês de gestação, depois a partir do dia em lactação (DEL) 15 até quando for

a opção de desadensar a dieta ao redor do dia 150. Normalmente acompanha escore de rúmen

3.

268

Escore 4: As fezes tem aspecto de bolo, mais alto que espalhado, com círculos marcados que

representam a passagem da ingesta pela válvula ileocecal. São típicos de pastos maduros, ou

dieta entre 10 e 12% de PB com elevado teor de fibra, ambiente ruminal com pH sempre

maior que 6,0. É a consistência ideal para vacas do meio para o fim da lactação e início do

período seco e normalmente acompanha o escore de rúmen 4.

Escore 5: São fezes com aspecto de biscoito, que lembram fezes de equinos ou terneiras que

pastam. Têm cor marrom escuro com muco por fora e tornam-se enegrecidas com o sol.

Escore típico de um animal doente e com baixíssimo consumo. Em nenhum momento pode

ser considerado normal em vacas adultas.

8) Escore de esfíncter (Escore de tetas)

Este escore classifica de forma quantitativa o impacto do sistema de ordenha sobre a saúde

do esfíncter do teto. Deve ser avaliado imediatamente após a retirada do conjunto de ordenha.

O escore é composto por 4 graus:

Escore 1: Não existe espessamento e o esfíncter está totalmente internalizado.

Escore2: Formação de um anel não rugoso, resultado de um prolapso inicial da musculatura

do esfíncter, mas sem queratinização.

Escore 3: Anel externo e bastante aparente no esfíncter, com alguma queratinização.

Escore 4: Esfíncter prolapsado, espessado na forma de um anel duro e com evidente

queratinização.

Sempre que houver mais de 20% de tetas com escores 3 e 4, ou quando os escores piorarem

em comparação com a última análise, deve-se fazer uma checagem completa no sistema de

ordenha: vácuo, pulsador, ciclo e borrachas. A queratinização de esfíncteres coloca a vaca

sempre em um grupo de risco mastite ambiental.

9) Escore de conforto térmico

Apesar de existirem curvas de ITU (índice temperatura umidade) onde seus pontos de corte

estão sendo permanentemente revistos, é indiscutível que a frequência respiratória da vaca

não recentemente alimentada representa sua opinião sobre quanto calor está sentindo.

Podemos classificar em 5 níveis, sendo os piores resultados obtidos antes da ordenha da tarde.

269

Escore 1: Dentro do intervalo fisiológico de 24 a 44 movimentos respiratórios por minuto.

Quase não se vê movimento de tórax.

Escore 2: De 44 a 70 movimentos por minuto, ofegante, mas com boca fechada e pouca

salivação. Movimentos de tórax facilmente vistos.

Escore 3: De 70 a 120 movimentos por minuto, ofegante, salivação com a boca por vezes

aberta, mas sem exposição da língua.

Escore 4: De 120 a 160 movimentos por minuto, pescoço estendido, cabeça elevada, muita

salivação com a boca aberta e a língua por vezes exposta.

Escore 5: Mais de 160 movimentos por minuto, inicia a exaustão, língua sempre exposta,

cabeça baixa, respiração abdominal.

O estresse térmico é o maior desafio ambiental na produção de leite durante o verão no sul

do Brasil. A combinação de dias e noites quentes com alta umidade impede que a vaca tenha

momentos no dia para esfriar. Esta situação é pior que a criação em clima desértico onde

apesar de atingir 48oC durante o dia, o ar é seco e durante a noite a temperatura chega aos

10oC.

O conjunto de escores de monitoramento aqui apresentado constitui uma ferramenta de fácil

aplicabilidade por qualquer pessoa que trabalhe na atividade leiteira. Para o técnico que pela

primeira vez veja um rebanho permite ter uma ideia bastante precisa sobre o dia a dia das

vacas antes de abordar o problema específico para o qual foi chamado. Quando a assessoria

é continuada, é a forma de acompanhar a evolução do resultado das alterações de manejo

implementadas. Ao contrário do que se pensa em um primeiro momento, este processo não

toma tempo, pois uma vez incorporado no modo de se ver uma vaca, torna-se automático

para o técnico cada vez que olha uma vaca, classificar seus escores.

Monitoramento de ruminação

É reconhecida desde muito tempo a alta correlação entre tempo de ruminação, saúde e

produção. Também se sabe que qualquer fator estressante acaba por diminuir o tempo ou a

distribuição diária da ruminação. Durante a ruminação, a vaca mantém os olhos semiabertos

em uma atitude que representa um alto estado de relaxamento. Isto representa para ela

segurança, conforto e ausência de dor. A redução na ruminação sempre foi um achado clínico

presente nas mais diversas doenças em bovinos, mesmo extra-digestórias. No entanto, a

270

quantificação do tempo diário de ruminação só era feita em pesquisa, observando-se animais

individuais em blocos de 10 minutos dentro de cada hora do dia. Foi em 2008, que a Empresa

Israelense SCR lançou no mercado uma coleira dotada de um microfone que gravava o ranger

de dentes durante a ruminação. O dispositivo então computava o tempo dedicado à ruminação

em blocos de 2 horas, e estes dados poderiam ser descarregados automaticamente para o

software assim que a vaca entrasse na ordenha. Como a coleira também possui um dispositivo

de nível, onde o deslocamento da bolha de ar também é detectado, a variação na atividade

diária do animal também era analisada. O objetivo inicial do sistema era produzir um detector

de cio mais confiável que os pedômetros, já em uso desde a década de 1970. A combinação

na flutuação das duas variáveis durante o ciclo elevou as taxas de detecção de estro de 62 a

68% com os pedômetros para 86% em sistemas fechados. Logo apareceram os primeiros

resultados da variabilidade em ruminação em diversos eventos como: parto, mastite,

problemas de casco, metrite, cetose, deslocamento de abomaso e é claro, cio.

Calamari et al. (2014) descreveram de forma inédita que a rapidez na recuperação nos níveis

de ruminação na primeira semana pós-parto está associada ao aparecimento ou não de

doenças de transição até o DEL 40. Resumidamente, o tempo de ruminação cai até 50% no

dia do parto, e retorna aos níveis pré-parto dentro de 5 dias. Vacas que atingem esta meta

terão um primeiro mês de lactação sem problemas. O brasileiro Ricardo Chebel foi o primeiro

a demonstrar que a variabilidade no tempo diário de ruminação na última semana de gestação

tem correlação elevada com eventos como cetose subclínica, retenção de placenta,

hipocalcemia subclínica e metrite. Estes resultados reforçam achados anteriores (Huzzey et

al., 2007) que demonstraram uma queda crescente no consumo voluntário pré-parto em vacas

que viriam a desenvolver metrite na segunda semana pós-parto. Também ficou claro que uma

queda em consumo voluntário é precedida por uma queda em ruminação nas últimas 12

horas, ou seja, não é o consumo que determina ruminação, mas a ruminação que leva ao

esvaziamento ruminal e permite consumo.

Entende-se que o período de stress que precede a instalação clínica de uma doença é

particularmente longo em bovinos. Essa tentativa de compensação à agressão pode iniciar 10

dias antes do aparecimento do quadro clínico. Infelizmente, os sinais de que uma vaca não

está bem são muito sutis, podendo aparecer como um leve aumento de temperatura à tarde,

posição das orelhas um pouco mais baixa, passada mais curta, e arrastar a pinça ao caminhar.

271

Todos eles são sinais que apenas são perceptíveis àquelas pessoas de observação aguçada e

que conhecem a fundo o comportamento de suas vacas. A queda de ruminação e aumento de

ócio, parecem ser os parâmetros mensuráveis automaticamente mais precoces a sofrer

alteração frente à tentativa de compensação de um desafio de saúde.

Em 2011, a startup brasileira Chipinside iniciou o desenvolvimento de uma coleira para

detecção de ruminação atividade e ócio através de um único sensor, um acelerômetro triaxial.

Em 2013, quando do lançamento do produto, outras duas empresas europeias lançavam

produtos similares. De uma forma geral, estes sistemas comparam o perfil de ruminação e a

atividade do dia em questão de uma determinada vaca com a sua média nos 5 ou 7 dias

anteriores. Cada vez que existe um período de queda de ruminação e aumento de atividade,

o sistema reconhece como cio. O indicativo é mostrado na tela do computador, mas hoje

também com acesso via celular. Apesar da importância amplamente reconhecida pelos

produtores e um preço competitivo, a coleira brasileira C-Tech não teve a penetração de

mercado inicialmente esperada. O sucesso no uso destes sistemas depende do

desenvolvimento de uma rotina diária de acompanhamento do comportamento das vacas

como forma de antever problemas futuros e instituir uma ação rápida. Um estudo europeu

mostrou que os produtores levavam em torno de um ano para familiarizar-se com os sistemas

e passar a fazer o melhor uso das informações fornecidas. O produtor de leite no Brasil

explora de uma forma bastante lenta a tecnologia de informação disponível para o

agronegócio. Um bom exemplo é a quantidade de produtores que já compraram um software

de gestão leiteira, mas o usam em parte ou esporadicamente. Parece que a rotina de inclusão

de dados, e o hábito de sentar-se ao computador serão bastante comuns na próxima geração

leiteira, mas não tanto na atual. Foi a análise desta realidade e a resposta de produtores em

um estudo piloto, que o equipamento deixou de ser vendido e passou a fazer parte de um

serviço de monitoramento. Foi então criado o "CowMed Assistant" onde, o produtor contrata

o serviço de acompanhamento que consiste na instalação do sistema e coleiras na propriedade

e os dados não só aparecem na fazenda, mas são enviados via internet e analisados na sede

da empresa no campus da UFSM. Desta forma, inicialmente por Whatsapp, agora iniciando

com um aplicativo próprio, o produtor recebe duas vezes por dia alertas de cio e de alterações

de saúde, e proximidade de parto. No grupo de cada propriedade participam produtor,

veterinário, inseminador, nutricionista, etc. Desta forma, informação sobre vacas em cio e

272

horário do início do cio são recebidas por todos simultaneamente. Quando são feitas

alterações na dieta, é informado o grau de adaptação de cada animal. A estratégia tem

mantido produtores em sua zona de conforto recebendo alertas sem a necessidade de analisar

gráficos. Por outro lado, tem facilitado a vida e qualificado a hora técnica dos clínicos que

acabam sendo chamados mais precocemente para o atendimento, aumentando a taxa de

sucesso dos tratamentos e a velocidade de recuperação. Correção de dietas e reconhecimento

de animais que não estão adaptados podem ser feitos antes que resulte em uma queda na

produção. E, por fim, a empresa recentemente lançou a nova coleira C-Tech plus que envia

dados para uma antena a cada hora, sem a necessidade de a vaca passar por um portal,

monitorando animais desde a entrada no pré-parto, e durante toda lactação.

Hoje, pode-se dizer que é impossível uma vaca desenvolver uma doença sem que antes exista

um aumento no tempo de ócio e diminuição na ruminação. Todo este corpo de informações

faz parte da construção de uma biblioteca de comportamentos que precedem doenças, assim

como perfis comportamentais no pré-parto que colocam o animal em um grupo de transição

de risco. No futuro, a produção leiteira com garantia de qualidade de vida para as vacas, não

será possível sem o uso de sistemas de monitoramento remoto. Nos próximos anos, uma série

de novos produtos apresentados na forma de tecnologias vestíveis e não invasivas já em

desenvolvimento chegarão ao mercado ao redor do mundo. O reconhecimento de variações

de temperatura corporal, de pH ruminal, do tempo do animal em pé e deitado, das variações

na deambulação será feito constantemente no animal livre, e de forma automática. Poderemos

chegar ao diagnóstico super-precoce, tão buscado na medicina humana. O veterinário terá a

oportunidade de trabalhar mais com a cabeça e de forma estratégica, visto que a necessidade

do trabalho braçal será diminuída. Ao mesmo tempo em que esta é uma oportunidade

fantástica de qualificar o trabalho daqueles que escolheram dedicar a vida "ao leite", também

abre uma série de necessidade em relação a outros conhecimentos que deverão ser adquiridos

ou aperfeiçoados por aqueles que buscam o sucesso na especialidade.

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274

Pontos críticos da qualidade do leite

André Thaler Neto

Adriana Hauser

Marciel França

Veridiane Orsolin

A cadeia produtiva do leite passa atualmente por um período de busca por melhoria na

qualidade do leite in natura e consequentemente dos produtos finais destinados ao

consumidor. A necessidade de atendimento de parâmetros mínimos para os indicadores de

qualidade do leite se mostra em diversos pontos da cadeia, como na fazenda, onde a contagem

de células somáticas (CCS) pode ser usada como indicador de saúde da glândula mamária

das vacas, enquanto a composição e os atributos físicos do leite refletem principalmente

aspectos de alimentação, manejo e ambiência, enquanto a contagem bacteriana total reflete

principalmente aspectos de higiene e armazenamento do leite. Na indústria, o atendimento

desses requisitos permite melhoria na produção seja por um menor desafio tecnológico, maior

rendimento ou maior vida do produto final (Murphy et al., 2016).

Em geral, os diferentes indicadores de qualidade do leite se inter-relacionam em maior ou

menor magnitude, de modo que dificilmente podem ser solucionados de modo independente.

Assim sendo, alguns pontos são críticos em termos de atendimento aos critérios estabelecidos

pelas normas em vigor no país. Neste sentido, deve-se considerar que até a década de 1990

o Brasil não possuía uma normatização abrangente sobre atributos mínimos de qualidade em

nível de propriedade leiteira, tema que passou a ser fundamental para a cadeia produtiva

especialmente a partir do início do novo século.

Este novo panorama tem seu principal ponto de partida em 1996, quando o Ministério da

Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) passou a trabalhar efetivamente no Plano

Nacional de Melhoria da Qualidade do Leite (PNMQL), com o objetivo de estabelecer

indicadores quantitativos de referência para a qualidade do leite cru e diminuir as perdas

qualitativas da matéria-prima decorrentes da temperatura inadequada de armazenamento e

de falhas durante o transporte até o estabelecimento beneficiador (Oliveira et al., 2000).

Como consequência ao PNMQL, em 2002, publicou-se a Instrução Normativa nº37/2002

(Brasil, 2002a), que instituiu a Rede Brasileira de Laboratórios de Controle da Qualidade do

Leite (RBQL), a qual foi incumbida de realizar análises laboratoriais oficiais e de cunho

275

fiscalizatório de amostras de leite cru das propriedades rurais e laticínios, dando o suporte

necessário às demandas geradas pela Instrução Normativa nº 51/2002, publicada no mesmo

ano, a qual estabeleceu os padrões de identidade e qualidade do leite cru refrigerado e o

Regulamento Técnico da Coleta e Transporte do Leite (Brasil, 2002b), estabelecendo os

requisitos físico-químicos, microbiológicos e de resíduos químicos do leite nas propriedades

rurais, os quais devem ser avaliados em análise compulsória mensal de uma amostra de leite,

a ser implantados a partir de 2005. A IN51/2002 estabeleceu limiares estanques para o leite

cru refrigerado, tais como no mínimo 3% de gordura, 8,4% de extrato seco desengordurado

e 2,9% de proteína, acidez titulável entre 14 e 18ºD, densidade entre 1,028 a 1,034 g/mL e

índice crioscópico variando entre -0,530ºH e -0,550ºH (Brasil, 2011). Além das IN do

MAPA, alguns parâmetros para indicadores de composição e de propriedades físicas do leite

também são regulamentados pelo Decreto 9.013/2017 (Brasil, 2017), o qual tem como

objetivos, além de estabelecer critérios mínimos de qualidade, identificar e evitar fraudes na

matéria-prima que chega às indústrias. Nesse documento, além dos critérios já mencionados,

estabelece-se um teor mínimo de lactose em 4,3%.

Por outro lado, os indicadores de qualidade microbiológica (contagem padrão em placas,

CPP, ou contagem bacteriana total, CBT) e de saúde da glândula mamária (contagem de

células somáticas, CCS) foram estabelecidos prazos para adequação dos produtores. Devido

ao fato de que parcela substancial dos produtores não conseguiram se adaptar aos critérios

mínimos para CBT e CCS nas datas limites estabelecidas, os prazos foram prorrogados em

dois momentos, pela Instrução Normativa nº 62/2011 (Brasil, 2011) e pela Instrução

Normativa nº 07/2016 (Brasil, 2016). Atualmente, as regiões Sul, Sudeste e Centro-oeste têm

como limites o valor de 3,0x105 UFC/mL para CPP e de 5,0x105 células/mL de leite para

CCS (Brasil, 2016). Deve-se considerar que estes valores fixos nos componentes sólidos e

nas propriedades físicas, com períodos de adaptação para CCS e CBT, na nossa opinião não

consideram as inter-relações entre estas variáveis.

As concentrações dos componentes sólidos do leite devem ser avaliadas no mínimo uma vez

ao mês em amostras de tanque de propriedades leiteiras, em equipamentos automatizados por

metodologia de infravermelho. A CBT e a CCS são analisadas através de técnicas de

citometria de fluxo, técnica em que é adicionado brometo de etídio ao leite, corando o DNA,

sendo o leite injetado num capilar acoplado a um sistema óptico que recebe um feixe de laser,

276

capaz de captar a fluorescência emitida. No caso da contagem bacteriana os equipamentos

automatizados estimam a contagem individual de bactérias (CIB), sendo que a partir de

amostras pareadas com análise de CPP em placas com meio de cultura e incubada a 36°C por

48 horas, são estimadas curvas de regressão da CPP em função da CIB, expressando o

resultado em UFC/mL (Brasil, 2011).

Os resultados destas análises mensais têm sido utilizados como referência em programas de

pagamento por qualidade, caracterização e fiscalização para identificação de não

conformidades causadas por adição de contaminantes, adulterantes ou leite obtido sob

condições não adequadas. Os programas de remuneração pela qualidade ainda são bastante

heterogêneos nas diferentes indústrias de laticínios do país. Estes programas são estratégias

fundamentais para a melhoria da qualidade do leite, sendo a falta de valorização da qualidade

do leite por parcela das indústrias de laticínios um ponto extremamente crítico para a

promoção da melhoria da qualidade do leite de forma sustentável em nível de propriedade

leiteira. Winck (2012) em um estudo sobre pagamento por qualidade em cooperativas do

Oeste de santa Catarina concluiu que o pagamento por qualidade impactou positivamente em

diversos aspectos sociais, econômicos e técnicos na cadeia produtiva, melhorando a

qualidade do leite e incentivando cooperativas e produtores a investirem na produção.

Objetiva-se neste texto apresentar os principais indicadores de qualidade do leite e mencionar

alguns aspectos que consideramos críticos para a melhoria da qualidade do leite e

atendimento dos critérios mínimos estabelecidos, nas condições atuais de produção do país,

considerando a heterogeneidade de sistemas de produção e níveis de adoção de tecnologia

no país.

Qualidade microbiológica do leite

Os principais microrganismos que contaminam o leite podem ser divididos segundo sua faixa

de temperatura de crescimento e multiplicação em psicrotróficos, mesófilos e termodúricos.

Os microrganismos mesófilos são o principal grupo identificado pela CBT, sendo capazes de

se multiplicar em temperaturas entre 5 e 50°C. Incluem em sua maioria bactérias Gram-

positivas dos gêneros Lactococcus, Streptococcus, Leuconostoc e Enterococcus, acidificando

o leite pela produção de ácido lático devido à fermentação da lactose (Santos e Fonseca,

2007). Este fato faz com que a elevada CBT muitas vezes esteja associada à redução nos

277

teores de lactose e, consequentemente do ESD. As bactérias termodúricas são bactérias

capazes de resistir a temperatura de pasteurização (63°C por 30 minutos, lenta; 71-75°C por

15-20 segundos, rápida), sendo que altas contagens podem estar relacionadas a falhas de

limpeza dos equipamentos de ordenha, rachaduras nas borrachas, biofilmes com depósitos

de minerais (pedras de leite) nas tubulações ou tetos muito sujos, podendo sobreviver por

anos por produzirem esporo em condições adversas (Bava et al., 2011), podendo causar

problemas na vida de prateleira do leite, como gelatinização do leite longa vida. São

exemplos de microrganismos termorresistentes: Micrococcus, Microbacterium,

Lactobacillus e Streptococcus. Gêneros como Clostridium e Bacillus são os formadores de

esporos (Santos e Fonseca, 2007). Geralmente os microrganismos mesófilos e termodúricos

apresentam baixa capacidade de se desenvolver sob condições de refrigeração na qual o leite

é armazenado, sendo consequência principalmente da contaminação inicial, quando o leite é

adequadamente armazenado.

Por outro lado, os microrganismos psicrotróficos apresentam capacidade de multiplicação a

temperaturas de refrigeração, menores que 7°C (mesmo sua temperatura ótima de

crescimento sendo maior) e podem ser responsáveis pela deterioração do leite cru refrigerado

e de seus derivados. Nesse grupo se incluem principalmente bactérias Gram-negativas dos

gêneros Pseudomonas, Achromobacter, Aeromonas e Alcaligenes, com habilidade de

produzir enzimas hidrolíticas termorresistentes as quais retêm de 30 a 100% de sua atividade

enzimática após tratamento térmico do leite, responsáveis pela redução no rendimento de

queijos, limitação da vida de prateleira, alteração de sabores, odores e aparência, bem como

perdas de proteína e gordura do leite (Murphy et al., 2016). Água não tratada, solo e vegetais

são as principais fontes, geralmente contaminando o leite em decorrência de falhas nos

procedimentos de limpeza e sanitização durante a produção. Temperatura de refrigeração do

leite inadequada ou período longo de estocagem do leite refrigerado (superior a 48 horas)

também estão associadas a altas contagens desses microrganismos (Sanvido, 2007). Apesar

de ainda não haver limites máximos de contaminação do leite por microrganismos

psicrotróficos, a baixa contagem destes constitui-se em um grande desafio no futuro, visando

melhorar a qualidade dos derivados lácteos brasileiros, visto que a refrigeração não é um

método eficiente de controle, dependendo principalmente da contaminação inicial, ou seja

das condições de higiene dos animais, dos equipamentos, do ambiente, incluindo a água, do

278

uso eficiente de detergentes e desinfetantes e das condições higiênicas do processo de

ordenha.

A análise dos dados de CBT do leite auxilia na avaliação dos procedimentos de limpeza e

desinfecção dos equipamentos de ordenha e tanques de refrigeração, higiene de ordenha,

ambiente que o animal está alojado, a temperatura e o tempo de armazenagem do leite, dentre

outros fatores. Altas contagens bacterianas podem impactar negativamente o rendimento

industrial, segurança do alimento, e na qualidade do leite e dos produtos lácteos. Apesar das

exigências atuais serem de valores menores que 300.000 UFC/mL, valores inferiores a

20.000 UFC/mL são esperados quando boas práticas de higiene são adotadas (Ribeiro Neto

et al., 2012). Além de aspectos higiênicos e de conservação, fatores ambientais também

podem afetar a CBT. Bueno et al. (2008) constataram que a CBT foi significativamente

influenciada pela umidade ambiente e precipitação pluviométrica, sendo significativamente

maior no período das chuvas, com maior contaminação ambiental, acúmulo de lama e maior

ocorrência de tetos sujos no momento da ordenha. A qualidade da água utilizada nas

atividades de ordenha pode constituir expressiva fonte de bactérias contaminantes do leite,

causando a elevação da CBT (Felipus, 2017; João et al., 2011). Entretanto, os diversos fatores

envolvidos atuam de forma conjunta, sendo difícil dimensionar seu efeito isoladamente. Por

exemplo, em um trabalho com cloração de água, observamos que nos períodos em que a água

utilizada na sala de ordenha em propriedades leiteiras da região serrana de Santa Catarina era

clorada, havia uma melhoria altamente significativa na qualidade da água, tanto em termos

de bactérias psicrotróficas como mesófilas, assim como de coliformes, em relação aos

períodos em que não havia cloradores nas mesmas propriedades. Entretanto, esta melhoria

não se refletiu em melhoria na qualidade do leite, provavelmente pela interação com outros

fatores, como uso adequado de detergentes e desinfetantes (Silva et al., 2017).

A redução da CBT é uma das mais importantes tarefas visando oferecer ao consumidor um

produto higiênico e seguro. A maioria das ações para redução da CBT estão ligadas ao

manejo e higiene na propriedade, por isso se torna fundamental o treinamento das pessoas

envolvidas, pois boas práticas de ordenha são ações simples, eficientes, mas que exigem

mudanças e adaptações na rotina do produtor. Além da limpeza dos animais que chegam para

serem ordenhados, do correto pré-dipping e da secagem dos tetos, a higiene pessoal dos

ordenhadores também é importante. As propriedades que apresentam infraestrutura mais

279

adequada para a produção, maior adoção das práticas recomendadas de manejo de ordenha

produzem leite com melhor qualidade (Werncke et al., 2016). É importante manter os

equipamentos de ordenha em bom estado de conservação, ter cuidados com procedimentos

de limpeza e sanitização, detergentes, concentração, frequência de limpeza, temperatura da

água (Bava et al., 2011). Em um trabalho no Vale do Itajaí (SC) observamos que as condições

de higiene da sala do leite e dos resfriadores também esteve altamente relacionado à

qualidade microbiológica do leite coletado pelos caminhões nas propriedades leiteiras

(Felipus, 2017). Como as ações de higiene para reduzir a CBT são tecnicamente simples em

sua maioria, as propriedades leiteiras mais profissionalizadas têm obtido resultados bastante

expressivos. Entretanto, quando analisamos grandes bancos de dados de indústrias de

laticínios e propriedades leiteiras, observamos na nossa prática que ainda estamos longe de

atingir as metas estabelecidas em termos globais. Isto se deve a diversos fatores, mas a cultura

geral da nossa população deve ser mencionada, de modo que muitas vezes práticas de baixa

qualidade higiênica do leite podem estar associadas às práticas de higiene pessoal dos

produtores rurais, sendo necessários programas voltados à saúde no campo e não somente

aos produtos comercializados.

Outro desafio é o armazenamento do leite na propriedade, o qual pode ser realizado por meio

de tanques de imersão ou expansão. O tanque de imersão deve ter capacidade para resfriar

ao leite a 7°C em no máximo três horas após a ordenha e os resfriadores por expansão direta

para 4ºC em até três horas após a ordenha, independentemente de sua capacidade (Brasil,

2011), estando a manutenção dessa temperatura diretamente ligada com a multiplicação de

microrganismo no leite e a CBT. Em um trabalho avaliando o ciclo de armazenamento do

leite em propriedades leiteiras com coleta de leite a cada 48 horas observamos que em

amostras de leite com contaminação inicial aceitável (CBT de aproximadamente 100.000

UFC/mL), quando respeitadas as especificações quanto ao volume de leite a ser resfriado, os

tanques de expansão permitem a manutenção da qualidade microbiológica do leite em termos

de CBT e contagem de microrganismos psicrotróficos, ao longo do tempo (Reche et al.,

2015).

Assim como na produção e no armazenamento, o transporte do leite até as indústrias de

laticínios constitui um ponto crítico a ser considerado. Em um trabalho realizado em uma

indústria de laticínio verificamos que a implementação de práticas que reduzam a

280

contaminação e perda de qualidade da matéria prima durante o transporte, manutenção do

leite em baixas temperaturas e redução do tempo decorrido nas rotas de coleta da matéria

prima e o seu descarregamento no estabelecimento processador apresentam importante

relação com a contagem de microrganismos psicrotróficos e a CBT (Felipus, 2017), sendo

que o transporte do leite cru a granel piorou consideravelmente a qualidade microbiológica

do leite, com valores muito superiores aos esperados pela média ponderada a partir do volume

nas propriedades de leite, porém, não demonstrou influência nos resultados físico-químicos

e de composição do leite recebido na indústria (Tabela 1). Isto demonstra que se o transporte

do leite não for feito de modo muito criterioso, a indústria que remunera o produtor por

qualidade estará pagando por um produto de determinada qualidade, a partir das análises de

amostras dos tanques nas propriedades e recebendo um produto muito inferior na sua

plataforma de descarregamento.

Tabela 1. Médias dos indicadores de qualidade do leite para os resultados ponderados das

propriedades rurais e nos tanques isotérmicos dos caminhões de transporte (Felipus, 2017)

Saúde da glândula mamária

A CCS, como indicador de saúde da glândula mamária, possui papel central na qualidade do

leite. Este fato advém não só da indicação da saúde da glândula mamária, bem como da

relação da CCS com diversos outros indicadores de qualidade do leite, em especial os teores

de lactose e, consequentemente, do extrato seco desengordurado (ESD), do teor de cloretos

do leite e de atributos físicos do leite, como a acidez titulável.

281

Para o produtor a elevada CCS é um importante indicador de perdas econômicas, visto que a

mastite subclínica reduz consideravelmente a produção de leite. Na Suécia, Hagnestam-

Nielsen et al. (2009), observaram que vacas com 500.000 células/mL já apresentavam perdas

na produção de leite, variando de 0,7 a 2,0 kg (3 a 9%) em vacas primíparas e de 1,1 a 3,7 kg

(4 a 18%) em multíparas, dependendo do estágio de lactação. Além destas perdas o aumento

de quadros clínicos de mastite, o aumento da taxa de descarte, com consequentes custos de

reposição, a diminuição do valor de mercado dos animais, o aumento do risco de

contaminação do leite com antibióticos são alguns dos demais fatores de perdas relacionadas

à mastite na propriedade.

Para a indústria o leite com elevada CCS representa prejuízos consideráveis, com destaque

para a redução do rendimento na fabricação do queijo, visto que durante a mastite, a síntese

de caseína é diminuída (Mazal et al., 2007), o que pode ser explicado possivelmente pela

redução na capacidade de síntese e secreção da caseína pelo epitélio glandular que está

lesionado pelas toxinas bacterianas (Oliver e Calvinho, 1995). Apesar dos níveis de proteína

total serem mantidos, isto ocorre às custas do aumento dos teores de nitrogênio não-

caseinoso, devido ao aumento da concentração de proteínas séricas no leite (Auldist, 1996),

diminuindo consequentemente o rendimento na fabricação do queijo. Em um experimento

com produção de queijo colonial com leite pasteurizado em escala industrial, observamos

uma piora de 5,3% no rendimento do queijo quando comparamos partidas de queijo feitas a

partir de leite com mais de 500.000 células/mL (652.000 células/mL) em relação àqueles

abaixo deste limiar (média de 373.000 células/mL), com consequente aumento no teor de

caseína no soro do queijo (Mattiello, 2015).

Outro problema decorrente da elevada CCS é a redução dos teores de lactose em função do

aumento da CCS, demonstrada em um trabalho que realizamos com dados de controle leiteiro

em Santa Catarina (Alessio et al., 2016). A redução do teor de lactose em função da mastite

subclínica, indicada pela elevada CCS, deve-se a fatores tais como mudanças na homeostase

da glândula mamária (Pessoa et al., 2012) e aumento na concentração plasmática de lactose

(Ben Chedly et al., 2009). A redução nos teores de lactose vai se refletir no ESD, podendo

levar a não conformidades no leite ao chegar à plataforma de recepção das indústrias,

resultando em prejuízos para toda a cadeia produtiva do leite.

282

Não iremos abordar neste texto todos os aspectos relacionados à prevenção da mastite

subclínica e a consequente redução de células somáticas, por tratar-se de tema complexo que

demanda abordagem separada. Em termos de pontos críticos para a redução devemos

considerar que eles podem ser similares à boa parte da temática abordada para CBT, quando

os pontos críticos da propriedade leiteira se encontram na higiene da ordenha. Entretanto,

muitas propriedades sem problemas com CBT apresentam resultados muito ruins para CCS

por estarem relacionados a fatores ligados aos animais, aos equipamentos de ordenha ou a

técnicas específicas relacionadas à prevenção e/ou tratamento das mastites. Podemos ilustrar

este aspecto multifatorial com o resultado de uma pesquisa que realizamos em propriedades

com controle leiteiro em Santa Catarina (Cardoso et al., 2015), onde foram identificados

como principais fatores relacionados ao aparecimento de novas infecções intramamárias

fatores ligados aos animais (ordem de parto e a profundidade de úbere), ao ambiente (escore

de limpeza dos úberes), ao animal e ao sistema de ordenha (presença de hiperqueratose em

ponta de teta e adoção de linha de ordenha), enquanto para a cronificação da mastite

subclínica o estágio de lactação, a profundidade do úbere e a manutenção dos equipamentos

de ordenha foram fundamentais. A redução da CCS continua sendo um desafio à pecuária

leiteira em quase todo o mundo e é um ponto crítico para a melhoria da qualidade do leite no

seu sentido mais amplo.

Composição do leite

Teor de gordura

O teor de gordura ainda não representa um grande desafio para a cadeia produtiva como um

todo, visto que parcela considerável das propriedades de leite do país ainda não possuem

animais com elevada produção de leite e, consequentemente com teores de gordura

relativamente altos, de modo que o pool de leite recebido pelas indústrias apresenta teores

relativamente elevados de gordura. Além disto, o fato de que os teores de gordura são

manipuláveis pelas dietas e pelo manejo alimentar adotado pelos animais, os produtores

podem adotar estratégias de produção voltadas ao mercado, de acordo com as tabelas de

remuneração por sólidos do leite adotados pelas indústrias.

283

Por outro lado, nas regiões em que são utilizados sistemas de produção com elevada produção

por vaca, muitas vezes associada à elevada suplementação com carboidratos rapidamente

fermentáveis, a manutenção de adequados teores de gordura no leite torna-se um dos grandes

desafios da produção eficiente de leite.

Por entendermos o teor de gordura como um dos principais indicadores de saúde ruminal de

vacas leiteiras e, consequentemente um tema central na nutrição de vacas leiteiras, não

abordaremos este tema neste texto, visto que sua complexidade exige uma abordagem

profunda. Mas, pelo menos dois aspectos não nutricionais fundamentais para o teor de

gordura precisam ser considerados. O melhoramento genético para produção de sólidos do

leite é fundamental para garantir bons teores de sólidos do leite em longo prazo e uma

adequada ambiência, especialmente em termos de redução do estresse térmico e,

consequentemente à capacidade de consumo de alimentos pelas vacas leiteiras. Sem haver

reocupação com estes fatores dificilmente os resultados dos programas de alimentação de

vacas leiteiras terão bons resultados em termos de teores de gordura no leite.

Extrato seco desengordurado (ESD)

O ESD é composto por todos os componentes do leite, excetuando-se a gordura, sendo a

lactose e a proteína seus principais componentes. A lactose é importante para as propriedades

coligativas do leite: pressão osmótica, abaixamento do ponto crioscópico e elevação do ponto

de ebulição, sendo responsável por cerca de 50% na pressão osmótica do leite. Variações nos

teores de lactose estão associadas com variações recíprocas de constituintes solúveis em

água, especialmente sódio e cloretos (Varnam e Sutherland, 2001). Em situações de

inflamação da glândula mamária, ocorrem lesões nas junções das células secretoras de leite,

acarretando em alteração na permeabilidade. Essa alteração permite a passagem de lactose

para a corrente sanguínea e de íons da corrente sanguínea para o leite, especialmente o

cloreto, gerando alterações na composição do leite. Outro fator que reduz o teor de lactose é

o déficit energético. Em um experimento em Santa Catarina observamos reduções

importantes nos teores de lactose no outono podendo ser atribuído à deficiência nutricional

que ocorre nesta época do ano, especialmente devido à deficiência quali-quantitativa de

volumosos, com aumento na primavera, época com maior disponibilidade de pastagens, em

quantidade e qualidade no sul do Brasil, sobretudo de aveia (Avena spp.) e azevém (Lolium

284

multiflorum) (Alessio et al., 2016). Neste mesmo estudo foram identificadas reduções severas

nos teores de lactose em função do aumento da CCS. De modo diferente dos teores de

gordura, pouca variação nos teores de lactose é observada em função da raça ou estágio de

lactação. Outro fator que afeta consideravelmente os teores de lactose é o estresse térmico.

Wheelock et al. (2010) observaram redução de 200 a 400 g diárias na produção de lactose

em vacas leiteiras sob estresse térmico, sendo a glicose consumida em maior velocidade nas

vacas sob estresse térmico. Há um aumento da glicólise e da respiração anaeróbia para manter

o equilíbrio energético durante situações de estresse térmico (Tian et al., 2015), sendo que a

diminuição da glicemia pode explicar a redução do teor de lactose (Schwartz et al., 2009).

A proteína do leite sofre influência racial e do nível de produção de leite, porém menos

marcante que a gordura (CSIRO, 2007), sendo o melhoramento genético fundamental para

manutenção de bons teores de proteína a longo prazo. Outro fator determinante no teor de

proteína do leite é a dieta, sendo que vacas alimentadas com dietas ricas em carboidratos não

fibrosos produzem leite com mais proteína (Ishler et al., 1996). O aumento na CCS não

determina grandes alterações no teor total de proteína do leite (Tomazi et al., 2015), devido

à redução na síntese de caseína, acompanhada por aumento na passagem de proteínas

plasmáticas para o leite (Urech et al., 1999), trazendo prejuízos na produção de derivados,

como queijos (Mattiello, 2015; Urech et al., 1999), porém não é significativa na redução do

ESD, especialmente a ponto de gerar inconformidade. O estresse térmico também pode

determinar redução no teor de proteína do leite, visto que o catabolismo muscular aumenta

durante o estresse térmico, ocorrendo maior concentração no nitrogênio ureico plasmático,

favorecendo uma maior redistribuição do nitrogênio proteico para ureia (Wheelock et al.,

2010) e diminuindo a habilidade da síntese proteica das células mamárias, reduzindo-se o

teor de caseína (Bernabucci et al., 2002). Além disto, também ocorre redução no consumo

de alimento pelas vacas leiteiras em estresse térmico (Rhoads et al., 2009), podendo reduzir

os teores de lactose e proteína.

Como resposta às variações nos teores de lactose e proteínas observa-se considerável

variação no teor de ESD. Em um estudo no sul do Rio Grande do Sul, foram encontradas

inconformidades nos meses de fevereiro, março e abril, com ESD abaixo dos 8,4%

preconizados. Essa variação foi explicada por teores de proteína menores, porém

principalmente por uma queda no teor de lactose, o que pode ser explicado pela queda na

285

qualidade da alimentação durante o outono (Gonzalez et al., 2004). Em um estudo com mais

de cem mil amostras de tanques de propriedades leiteiras em 2015 (em andamento) também

observamos baixos teores de ESD no outono, com elevado percentual de amostras abaixo de

8,4% (não conformes), além do verão (Figura 1).

Durante o outono, os baixos teores de ESD e, consequente aumento de não conformidade,

devem-se principalmente à redução no teor de lactose, sendo parcialmente compensados pelo

aumento nos teores de proteína, o que pode estar relacionado à menor produção de

leite/vaca/dia nas condições de menor oferta alimentar. No verão a diminuição do ESD deve-

se aos teores menores de proteína e lactose, o que pode ser atribuído apo estresse térmico.

Neste estudo também se observa que os demais fatores que deprimem os teores de ESD são

a elevada CCS, pelo seu impacto sobre o teor de lactose e pelo tamanho das propriedades,

sendo que os produtores que comercializam pequenas quantidades de leite são mais

vulneráveis a apresentar não conformidades, especialmente no outono, visto que estas

propriedades apresentam menor capacidade de manter uma condição adequada de

alimentação ao longo de todo o ano, dados entre outras peculiaridades, pela menor

capacidade de conservação de forragem e pelo nível de tecnificação predominantemente

menor.

Figura 1. Percentagem de não conformidade para extrato seco desengordurado (ESD) e

médias de proteína, lactose e ESD

286

Gabbi et al. (2013) analisando dados de rebanhos leiteiros dos estados do Rio Grande do Sul

e de Santa Catarina, observaram que a maior diferenciação entre as propriedades leiteiras se

dá pelas estratégias de alimentação das vacas leiteiras. Estes resultados demonstram que a

redução das não conformidades em ESD passa pela melhoria da estrutura das propriedades,

da alimentação das vacas leiteiras e da saúde da glândula mamária.

Propriedades físicas do leite

Uma série de alterações nas propriedades físicas do leite tem causado prejuízos a toda a

cadeia produtiva do leite, seja pelas dificuldades que impõem ao processamento industrial do

leite, em especial ao tratamento térmico, assim como a dificuldade em distinguir as situações

de fraudes. Salienta-se que a maioria destas alterações são mais frequentes no verão, sob

condições de estresse térmico. Vamos descrever algumas destas alterações que podem ser

encontradas em condições reais de produção.

Leite instável não ácido (LINA)

O leite que precipita ao teste do álcool e não apresenta acidez titulável acima de 18° Dornic

é denominado leite instável não ácido (LINA) (Fischer et al., 2012). Como há perda da

estabilidade da caseína, ocorrem perdas no processo térmico, do leite, especialmente no

processo UHT (ultra high temperature) (Marques et al., 2007). A prova do álcool é realizada

na propriedade antes do carregamento do leite, como teste de rejeição ou aceitação do leite

pela indústria, sendo pouco seletivo e específico. A prova avalia a estabilidade das proteínas

lácteas submetidas a desidratação provocada pelo álcool, sendo usada para estimar a

estabilidade do leite quando submetido ao tratamento térmico (Marques et al., 2007; Horne,

2016). A adição de álcool ao leite modifica a constante dielétrica do meio e modifica o

equilíbrio que envolve a coagulação das proteínas do leite (Horne, 2016). A coagulação do

leite induzida pelo calor resulta da redução da estabilidade coloidal das micelas de caseína,

as quais são associações hidratadas de coloides estabilizados por eletrólitos. O núcleo das

micelas consiste em uma matriz de proteína amorfa e nanoclusters amorfos de fosfato de

cálcio, também chamado de fosfato de cálcio coloidal (CCP) e água, enquanto a kappa-

caseína localiza-se na superfície das micelas. Para manter a estabilidade micelar, interações

entre fosfato de cálcio e proteínas são necessárias, na forma de interações hidrofóbicas e

287

eletrostáticas, ligações de dissulfeto, ligações de hidrogênio e interações de van de Waals.

Por outro lado, a estabilidade coloidal das micelas de caseína é governada principalmente

pela extremidade C-terminal da κ-caseína, que se projeta da superfície da micela, sendo

predominantemente de natureza estérica. (Huppertz, 2016). Muitos processos, incluindo

tratamento UHT, esterilização e produção de leite em pó, em que a formação de géis ou a

sedimentação devem ser evitados, são favorecidos pelo leite com alta estabilidade. Em outros

processos, como produção de queijos e iogurte, em que a coagulação e a formação de géis

são necessárias, uma menor estabilidade do leite pode ser até benéfica, já que pode suportar

calor suave (Tsioulpas et al., 2007).

A estabilidade depende de diversos outros fatores, tais como o pH. Em seu pH natural, o

leite é estável ao tratamento térmico e suporta temperaturas de até 140°C por períodos

maiores que 15 minutos, sem sinais visíveis de instabilidade. No entanto, mesmo pequenas

mudanças no pH, com variações de 0,1 unidade de pH, podem resultar em mudanças na

estabilidade do leite ao calor (Huppertz, 2016). Alterações relativamente pequenas nas

concentrações de sais de leite, especialmente de cálcio, fósforo inorgânico e citrato, também

podem ter efeitos importantes sobre as características tecnológicas do leite, podendo estar

relacionado à alimentação das vacas (Fox e Sweeney, 1998). Fagnani et al. (2014) no Paraná

observaram que quando comparado ao leite normal, o leite LINA apresentou maior

concentração de potássio (43,42 versus 38,50 mmol/L; P< 0,05), menor concentração de

cálcio total (90,87 versus 104,54 mmol/L; P< 0,05) e menor concentração de fosfatos (58,48

versus 73,67 mg/dL; P< 0,05).

O balanço ácido-básico é fundamental para a manutenção do pH sanguíneo e a saúde

animal. Em vacas de leite, alterações no equilíbrio ácido-básico podem ser acompanhados de

distúrbios eletrolíticos e consequentemente, podem influenciar na composição e no balanço

iônico do leite, além da produção de leite (Marques, 2011; Fischer et al., 2012). Fagnani et

al. (2014), ao pesquisarem a relação entre distúrbios metabólicos e leite LINA, encontraram

que a alcalose metabólica compensada foi o distúrbio metabólico mais prevalente associado

ao LINA. Werncke (2017) observou redução da estabilidade do leite ao teste do álcool pela

indução de acidose em vacas leiteiras.

O melhoramento genético para desempenho produtivo aumenta as exigências nutricionais

das vacas leiteiras e a susceptibilidade destas a fatores estressantes, com destaque para o

288

estresse térmico, em função do incremento calórico a partir da maior ingestão de alimentos.

Deste modo, as deficiências nutricionais e o estresse térmico, de modo isolado ou em

conjunto, exercem papel preponderante no desencadeamento de casos de LINA em condições

de campo. Diversos trabalhos têm demonstrado o aumento do aparecimento de quadros de

LINA em épocas de menor oferta de alimentos, em especial o outono, assim como em

propriedades menos estruturadas (Werncke et al., 2016), sob condições de restrição alimentar

(Gabbi et al., 2016). A restrição, provocada pela redução de 40 a 50% da quantidade de

alimento oferecida, por um determinado período de tempo, reduz a produção de leite e

aumentou a frequência da ocorrência do LINA (Zanela et al., 2006) e produz lesões nas

junções fortes entre as células secretoras de leite nos alvéolos mamários, indicadas pelo

aumento na concentração de lactose no plasma sanguíneo (Stumpf, 2013). Schmidt (2014),

em um experimento de indução de leite LINA pela restrição de 50% das exigências de

proteína e energia de vacas de raça Holandesa e Holandesa x Jersey em Lages (SC), observou

uma recuperação mais rápida do quadro de instabilidade do leite ao teste do álcool, no

tratamento em que as vacas receberam uma dieta atendendo 100% das exigências de energia

e proteína. Observou também aumento na produção de leite e na concentração de lactose.

Houve alguma recuperação nos quadros de LINA com suplementação energética, porém o

agravamento do quadro de LINA, juntamente com severa redução na produção de leite e

condição corporal das vacas quando era realizada suplementação proteica, porém com déficit

energético (Figura 2).

Os relatos de quadros de LINA durante o verão são bastante frequentes, sendo que Abreu

(2008) demonstrou este problema experimentalmente. Enquanto a restrição de sombra em

vacas em pastejo sob condições de estresse térmico intenso em Itapiranga (SC) provocou

uma redução severa na resistência do leite ao teste do álcool, em um experimento similar sob

condições de estresse moderado, o mesmo autor não observou redução na resistência ao teste

do álcool.

289

Figura 2. Concentração média de álcool em que ocorreu a coagulação do leite em função dietas

visando suprir as exigências de energia (100E+50P), proteína (50E+100P) ou ambas

(100E+100P). Fonte: Schmidt (2014)

Baixa acidez titulável

A acidez titulável serve como um indicador de leite ácido, sendo que a IN 62 estabelece como

requisitos de acidez titulável do leite cru refrigerado 0,14 a 0,18 g de ácido láctico por 100

mL ou 14 a 18oD (Brasil, 2011a). O leite recém ordenhado apresenta-se ligeiramente ácido,

denominada acidez natural, tendo como origem seus componentes normais, como albumina,

citratos, dióxido de carbono, caseínas e fosfatos (Brasil, 2013). A lactose pode ser fermentada

por ação de microrganismos com formação de ácidos orgânicos, em especial o ácido láctico,

resultando na chamada acidez adquirida, a qual em conjunto com a acidez natural, forma a

acidez real do leite. Quando o leite é obtido em condições inadequadas de higiene e

refrigeração deficiente, a acidez aumenta, podendo tornar o leite impróprio para o consumo

humano (Brasil, 2013). A variação do teor de proteína e das frações proteicas também afeta

a acidez titulável do leite cru (Töpel, 2016), sendo que o leite produzido por vacas sob

estresse térmico apresenta menores teores de proteína e lactose, além de um pH mais elevado

e menor acidez titulável. No estresse térmico também ocorre uma alteração nas frações

proteicas do leite e o teor de αs e β caseína diminui, proteínas ricas em grupos fosfato, sendo

290

os constituintes ácidos das micelas de caseína. Assim, seu menor teor no leite pode explicar

o menor conteúdo de fósforo no leite, com maior pH do leite e menor acidez titulável,

comumente registrada durante os meses de verão. A fosforilação das αs e β-caseínas necessita

da presença do fosfato de ATP, sendo que essa fosforilação é significativamente prejudicada

em condições de déficit de energia, de modo que se supõe que o menor teor de αs e β-caseína

no leite de verão podem ser pelo menos parcialmente devido à redução do aporte de energia

e proteína via alimentação (Bernabucci et al., 2013).

Trabalhos em desenvolvimento pelo nosso grupo de pesquisa demonstram o grande aumento

no percentual de propriedades leiteiras com acidez titulável abaixo de 14oD no verão,

inclusive em amostras conjuntas de tanques de caminhão, resultando em considerável

preocupação para as indústrias de laticínios devido às inconformidades em relação aos

regulamentos de qualidade do leite. Os resultados parciais destes trabalhos também

demonstram o potencial de redução da acidez titulável e do teor de lactose pelo aumento da

CCS, tanto em amostras de tanque de resfriamento (Arruda Júnior et al., 2016), como em

amostras individuais de vacas (Arruda Júnior et al., 2015).

Alterações no índice crioscópico

O índice crioscópico (IC), medida do ponto de congelamento do leite é uma prova utilizada

principalmente para detectar fraude por adição de água ao leite devendo estar entre -0,530oH

a -0,550oH, o que corresponde em graus Celsius a -0,512oC a -0,531oC (Brasil, 2011a), sendo

que valores mais altos (próximos de zero) podem indicar adição de água e valores mais baixos

(mais afastados de zero) podem indicar maior quantidade de solutos no leite. Porém, em

algumas situações, o leite apresenta distúrbios nesses valores, sem que haja fraude proposital,

podendo resultar na aplicação de penalidades ao produtor.

A lactose e íons dissolvidos respondem por cerca de 80% da diminuição do índice

crioscópico e o nitrogênio não proteico, principalmente ureia, ácidos graxos de cadeia curta

e CO2 são responsáveis por cerca de 20% (Töpel, 2016), sendo que estes componentes não

são independentes entre si, podendo a variação de um componente ser compensada por outros

componentes. A influência da composição é responsável também pela variação do IC ao

longo da lactação, em que animais com lactação mais avançada tem menor chance de ter um

IC alto, similar ao encontrado em casos de fraude por adição de água (Botaro e Santos, 2008;

291

Santos, 2012). Essa variação ao longo da lactação pode gerar ocasiões de inconformidade em

rebanhos que apresentam parições estacionais (Henno et al., 2008). Em um estudo no Canadá

foram observadas variações estacionais no ponto de congelamento do leite com maior IC no

verão e valores menores no inverno (Schukken et al., 1992). Esse comportamento também

foi relatado na Europa, em rebanhos recebendo dieta balanceada associada a pastagem. Este

fato pode estar relacionado ao maior consumo de água pelos animais (Henno et al., 2008),

uma vez que a osmolaridade do leite e do sangue estão intimamente relacionadas (Shipe,

1959). Pagno et al. (2013) observaram aumento do IC em vacas com restrição hídrica na

pastagem e que recebiam água antes da ordenha, em Castro (PR), sendo que após a supressão

da oferta de água antes da ordenha o IC retornou a valores normais. A alimentação das vacas

também tem impacto sobre o IC, porém apenas em casos extremos (fome) há possibilidade

de este fator, isoladamente, elevar o IC acima do limite regulamentado (Bowman et al.,

2005). Porém, dietas desequilibradas, com baixa energia, deficiência de minerais ou excesso

de proteína podem levar a um aumento do índice crioscópico (Töpel, 2016; Bowman et al.,

2005).

Outras causas de aumento no IC não relacionados a fraude intencional podem ocorrer. Um

deles é a água residual de lavagem automática em sistemas de ordenha, condução e

resfriamento de leite, assim como a condensação de água nas tubulações de condução do

leite, onde a água se acumula e mistura ao leite. Por outro lado, o aumento da acidez do leite

pela fermentação da lactose em ácido láctico, causa diminuição do índice crioscópico do

leite, assim como vacas privadas de água podem produzir leite com baixo IC, devido à

desidratação (Botaro e Santos, 2008; Santos, 2012; Shipe, 1959).

Aumento nos teores de cloretos no leite

O teste de cloretos no leite é feito com o objetivo de identificar fraudes, visto que a adição

de cloretos pode ser utilizada com a finalidade de “mascarar” uma adulteração no leite pela

adição de água, permitindo a correção da densidade e a crioscopia do leite. Esta análise,

quando empregada paralelamente às outras provas de controle de qualidade, constitui uma

ferramenta importante para confirmar suspeitas de fraudes por adição de água e sal ao leite

(Brasil, 2014).

292

A pesquisa de cloretos em leite fluído fundamenta-se na reação do nitrato de prata com

cloretos em presença de cromato de potássio como indicador. O teste é considerado positivo

se a solução resultante apresentar coloração amarela e é considerado negativo com

aparecimento de precipitado marrom. Devido a coloração natural do leite o precipitado

marrom é visualizado como alaranjado (Brasil, 2014). Um resultado positivo não significa

necessariamente fraude por adição de cloretos à amostra. Significa que a concentração de

cloretos na amostra é superior à quantidade encontrada em animais sadios (0,08 a 0,1%).

Alguns fatores podem influenciar no teor de cloretos presente no leite, tais como diferenças

individuais, alimentação, estado de hidratação, raça, espécie, número de lactações, variações

diurnas, estágio de lactação, sazonalidade, além de alterações patológicas. O teor pode

aumentar com o avanço do período de lactação ou na fase precoce da lactação, ou em

condições de transtornos da secreção, especialmente nos casos de mastite. A não

consideração desses fatores pode resultar em testes com resultados falsos positivos, com

graves consequências econômicas, representadas principalmente pelo descarte do leite

(Brasil, 2014)

Variações na concentração de cloretos no leite em função do estágio da lactação foram

observadas por Raimondo et al. (2009) ao avaliarem leite de vacas Jersey a partir de 12 horas

após o parto até 30 dias de lactação, encontrando concentrações máximas de cloretos no

período colostral (154,1 ± 29,3 mg/dL) em amostras coletadas até 12 horas após o parto. A

partir do segundo dia de lactação, houve uma diminuição significativa de cloretos que se

estendeu até 30 dias de lactação. Estes autores consideram valores de referência para cloretos

em leite de vacas Jersey, valores entre 137,7 e 173,4 mg/dL.

Alterações na permeabilidade vascular da glândula mamária podem afetar a concentração de

determinados íons no leite e os mais afetados são sódio, potássio, cálcio e cloro. Infecções

bacterianas na glândula mamária causam destruição do epitélio secretor, abertura das tight

junctions entre as células e aumento da permeabilidade capilar (Kitchen, 1981). Ocorre um

aumento de sódio e potássio no leite em casos de lesões. Por outro lado, a concentração de

potássio e cálcio diminui no leite pois estes, devido às mudanças de permeabilidade, escapam

para o sangue (Ogola et al., 2007). Essas alterações também se refletem em um aumento no

pH e na condutividade elétrica (CE) do leite pelo aumento da concentração de sódio e cloretos

no leite. A CE também é usada como um indicador da ocorrência de mastite, especialmente

293

para diagnóstico em sistemas de ordenha (Córdova, 2016; Della Libera et al., 2001). O teor

de cloretos também pode aumentar quando a temperatura ambiental aumenta, sendo que

aumentos de 30 a 100% na concentração de cloretos podem ocorrer quando vacas são

mantidas em temperaturas variando entre 29 a 32oC. A concentração de cloretos aumenta

para compensar a diminuição de lactose, sendo a variação na proporção cloretos/lactose um

mecanismo fisiológico para manter a pressão osmótica das células da glândula mamária

(Bernabucci e Calamari, 1998). Assim sendo, a reação de amostras de leite positivas para

cloreto, especialmente no verão, tem sido uma preocupação em diversas indústrias de

laticínio.

Conclusões

Os diversos indicadores de qualidade do leite estão inter-relacionados, de modo que

dificilmente serão obtidos resultados positivos para um indicador sem considerar o conjunto

de indicadores. Dentre os pontos críticos da qualidade do leite destaca-se a contagem de

células somáticas, a qual, indica, de forma isolada, a saúde da glândula mamária, com

elevados impactos na rentabilidade da propriedade leiteira e no rendimento industrial. Além

disso, elevadas contagens de células somáticas podem determinar reduções consideráveis nos

teores de lactose e caseína, com consequências sobre o ESD, além de aumentar a

probabilidade de ocorrência de não conformidades por baixa acidez titulável ou provas

positivas para cloretos.

Outro ponto crítico é a alimentação animal que pode afetar os teores de praticamente todos

os componentes do leite, aumentar consideravelmente o risco de ocorrência de LINA além

de alterações em outros aspectos físicos do leite. Merece destaque também o estresse térmico,

visto estar relacionado de forma isolado ou em conjunto com outros fatores tais como erros

de alimentação animal, com as mais importantes alterações nas propriedades físicas do leite.

Assim sendo, não podemos esperar resultados excelentes na qualidade do leite sem melhoria

na ambiência das vacas.

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2012.

298

Relação entre metabolismo e reprodução em vacas leiteiras

Álan Maia Borges

Telma da Mata Martins

Ana Carolina Leite

Philipe Pimenta Nunes

Nos últimos anos, verifica-se elevado crescimento da produtividade e do tamanho dos

rebanhos leiteiros, visando atender a crescente demanda mundial de leite e seus derivados.

Em paralelo, nota-se redução da eficiência reprodutiva, o que compromete o desempenho

atual dos laticínios, uma vez que a produção de leite depende da capacidade da vaca se tornar

gestante. As adaptações metabólicas para a alta produção de leite e a elevada ocorrência de

doenças puerperais estão diretamente relacionadas com a redução da fertilidade (LUCY,

2001). O objetivo dessa revisão é descrever os mecanismos pelos quais o metabolismo pode

estar relacionado com problemas reprodutivos de vacas de alta produção.

Alterações metabólicas e reprodutivas em vacas leiteiras

Durante as últimas semanas que antecedem o parto pode-se verificar alterações metabólicas

e hormonais que visam adaptar o organismo para o início da lactação. À medida que o parto

se aproxima as concentrações de glicocorticoides, somatotropina e prolactina e estrógeno

aumentam e, por outro lado, a concentração de progesterona diminui (Figura 1; BELL, 1995).

Este período de periparto das vacas leiteiras é caracterizado por diminuição da ingestão de

alimentos e aumento súbito na demanda energética, imposta pelo início de lactação. Vacas

de alta produção recém-paridas, geralmente, apresentam redução mais acentuada da ingestão

de alimentos e depressão do sistema imunológico, tornando-se altamente suscetíveis ao

estabelecimento de doenças após o parto (Butler, 2006; Sordillo, 2009). A adoção de

programas de controle, a identificação precoce do animal doente e a adoção de cuidados para

promover a sua recuperação são primordiais para minimizar as consequências na reprodução

e na produção (Van Saun, 2000; Smith e Risco, 2005).

A maior produtividade dos rebanhos leiteiros tem aumentado significativamente a demanda

de nutrientes para a síntese de leite. Quando o animal não apresenta aumento da ingestão de

alimentos para atender essa demanda, é necessário mobilizar reservas corporais (Grummer,

1995). Esse mecanismo compensatório pode gerar distúrbios metabólicos devido à redução

299

drástica da ingestão de alimentos ocorrida no periparto de vacas de alta produção (Figura 2;

Bertics et al., 1992).

Figura 1. Mudanças na concentração sérica de hormônios envolvidos na

homeorrese de vacas leiteiras no periparto (adaptado de Bell, 1995)

Figura 2. Consumo de matéria seca (CMS) no periparto de vacas leiteiras

(adaptado de Bertics et al., 1992)

300

Muitas evidências confirmam que os hormônios metabólicos, como a somatotropina (GH), a

insulina, os fatores de crescimento semelhantes à insulina (IGFs I e II), a leptina, dentre

outros, exercem importantes papéis no controle da função reprodutiva dos mamíferos, agindo

como mediadores ou sinalizadores dos efeitos da ingestão de alimentos e do balanço

energético sobre a fertilidade de bovinos (GIL, 2003). Seguem abaixo algumas considerações

sobre a influência de alterações metabólicas na reprodução das vacas leiteiras.

O aumento da produção de leite está relacionado com a elevação da concentração de GH,

hormônio catabólico. Por meio dos seus efeitos lipolíticos e diabetogênicos, o GH favorece

a disponibilidade de precursores para a síntese do leite, pois aumenta a mobilização de ácidos

graxos do tecido adiposo e reduz a utilização de glicose pelos tecidos periféricos ao diminuir

a sensibilidade dos mesmos à ação da insulina (Peel e Bauman, 1987; Bell, 1995). A redução

da sensibilidade pancreática à glicose implica queda na secreção de insulina (Riis, 1983).

Quando a mobilização de tecido adiposo é elevada, a taxa de lipólise pode sobrepassar a de

lipogênese, liberando maior quantidade de ácidos graxos não esterificados (AGNE) para a

circulação. A concentração plasmática de AGNE começa a aumentar na última semana da

gestação, podendo ser utilizado como fonte de energia pela glândula mamária e outros

órgãos. No fígado, os AGNE podem ser oxidados para produção de energia, podem originar

corpos cetônicos (principalmente beta-hidroxibutirato, -OHB), ou podem ser esterificados

com gliceróis e exportados como triglicerídeos. O fígado dos ruminantes possui capacidade

limitada para exportar triglicerídeos, sendo que a maior mobilização em relação à baixa

exportação leva ao acúmulo hepático de gordura, predispondo o animal a doenças

metabólicas (Bell e Bauman, 1996; Head e Gulay, 2001). Vacas obesas tendem a apresentar

redução mais acentuada na ingestão de alimentos e maior mobilização de tecido adiposo no

pós-parto, portanto, são mais suscetíveis às ocorrências de esteatose hepática e cetose (Reid

et al., 1986).

A queda na ingestão de matéria seca com consequente redução das concentrações séricas de

glicose e insulina, aliados à intensa mobilização de AGNE no período pós-parto em vacas de

alta produção, são responsáveis pela conformação de quadro de estresse metabólico,

resultando em processo inflamatório sistêmico denominado inflamação metabólica (Leblanc,

2014). A mobilização de AGNE do tecido adiposo, por meio da ação do GH, também é

acompanhada pela liberação das citocinas pró-inflamatórias, de fator de necrose tumoral α

301

(TNFα) e interleucina 6 (IL-6) (Ingvartsen e Moyes, 2013). Além disso, os próprios AGNE

são capazes de se ligarem a receptores celulares de reconhecimento de padrões microbianos,

principalmente ao receptor tipo-toll 4 (TLR4), distribuídos em diversas células e tecidos do

organismo tais como fígado, hipotálamo, ovários, útero, dentre outros. Ao se ligar a tais

receptores, os AGNE deflagram resposta inflamatória por meio da indução da síntese de

citocinas como TNFα, IL-1β, IL-6 (Hotamisligil e Erbay, 2008). TNFα e IL-1β são

responsáveis por bloquear a via de sinalização intracelular da insulina, bloqueando assim sua

ação sobre as células do organismo e exacerbando o quadro de resistência periférica a esse

hormônio. IL-6 e IL-1β são responsáveis por induzir a produção de proteínas de fase aguda

pelo fígado, amplificando o quadro sistêmico de inflamação metabólica (Bertoni et al., 2006;

Trevisi et al., 2012). O estresse metabólico, associado ao desenvolvimento de resistência

periférica à insulina, é um fator que contribuem para a redução da imunidade no período de

transição de vacas de alta produção, predispondo-as à diversas afecções no período pós-parto,

prolongando a duração do período do parto à nova concepção (Leblanc, 2014).

As alterações metabólicas decorrentes da intensa mobilização de reservas corporais e o

prolongamento do período de balanço energético negativo podem atrasar a ocorrência da

primeira ovulação após o parto. A influência do balanço energético negativo no retorno da

atividade ovariana luteal cíclica é devida ao atraso no aumento da frequência e amplitude dos

pulsos de gonadotropinas (FSH e LH) na presença de altas concentrações de GH, AGNE e

corpos cetônicos, e baixas concentrações de insulina, glicose e IGF-I (Figura 3; Bell e

Bauman, 1996). O GH regula a síntese e a secreção hepática de IGF-I (Gong, 2002). Apesar

da elevada concentração de GH circulante no início da lactação, o fígado encontra-se

refratário à ação desse hormônio, implicando redução da concentração plasmática de IGF-I

(Figura 4; Spicer et al., 1990). O desacoplamento do eixo somatotrópico ocorrido durante o

período de balanço energético negativo está relacionado com a condição de hipoinsulinemia

(Spicer et al., 1990; Lucy, 2003).

302

Figura 3. Concentrações plasmáticas de somatotropina, insulina, ácidos graxos não

esterificados (AGNE) e fator de crescimento semelhante à insulina tipo I (IGF-I), durante

o período de transição de vacas leiteiras (adaptado de Bell e Bauman, 1996)

Figura 4. Concentração plasmática de IGF-I em vacas leiteiras em balanço

energético negativo ou positivo no período pós-parto (adaptado de Spicer et

al., 1990).

O IGF-I aumenta a sensibilidade dos folículos à ação das gonadotropinas, promovendo o

crescimento, a proliferação, a diferenciação e a maturação das células foliculares (Beam e

Butler, 1997; Scaramuzzi et al., 1999). As vacas que ciclam rapidamente apresentam

303

aumento precoce da concentração plasmática de IGF-I, enquanto as vacas em anestro

prolongado não exibem aumento da concentração de IGF-I até a sétima semana após o parto

(Figura 5; Beam e Butler, 1997).

Figura 5. Concentração plasmática média de IGF-I em vacas leiteiras

ovulando ou não no período pós-parto (adaptado de Beam e Butler, 1997).

De maneira semelhante ao IGF-I, a insulina exerce importante papel na resposta ovariana à

ação das gonadotropinas, controlando o desenvolvimento folicular. A insulina atua por meio

da ligação a receptores específicos localizados nas células da teca e da granulosa. Dentre

outros efeitos metabólicos, o estímulo do transporte de glicose para o interior das células é

um dos mais importantes, pois esse metabólito é a principal fonte energética para os folículos

(Rabiee et al., 1997). O período de balanço energético negativo é caracterizado pela redução

na concentração circulante de insulina (Sinclair et al., 2002). A baixa concentração

plasmática de insulina pode implicar redução na produção de androstenediona e estradiol,

comprometendo a capacidade dos folículos adquirirem receptores de LH e impedindo a

ocorrência da ovulação (Stewart et al., 1995). Além de agir diretamente nos ovários, a

insulina influencia na liberação do LH (Monget e Martin, 1997). Vacas leiteiras alimentadas

com dietas que promovem aumento da concentração de insulina no pós-parto apresentam

menor período de serviço (Gong, 2002).

Mudanças nutricionais agudas e crônicas e redução da condição corporal implicam em

diminuição da síntese e secreção de leptina, hormônio peptídico produzido pelos adipócitos,

304

que age diretamente sobre o hipotálamo, regulando a ingestão de alimentos, o balanço

energético, a termogênese e a fertilidade. Em vacas leiteiras, a concentração de leptina

encontra-se positivamente correlacionada com as concentrações de insulina e glicose, e

negativamente correlacionada com as concentrações de GH e AGNE. Durante o período de

balanço energético negativo, ocorre diminuição na síntese e na secreção de leptina, o que

contribui para a inibição da secreção de GnRH. Após a recuperação da condição corporal, o

aumento da concentração de leptina circulante estimula a secreção de GnRH e auxilia no

retorno da atividade ovariana luteal cíclica (Williams et al., 1999; Williams, 2001).

Relação dos distúrbios metabólicos e reprodutivos em vacas leiteiras de alta produção

A partir da década de 1990, os estudos sobre a redução da fertilidade das vacas leiteiras de

alta produção começaram a relacionar as alterações ocorridas no desenvolvimento folicular

durante o período de balanço energético negativo, com a menor qualidade dos oócitos e

embriões, e, consequentemente, com a diminuição das taxas de concepção (Britt, 1992;

O’Callanghan e Boland, 1999). A menor qualidade dos oócitos e embriões é resultante das

condições adversas às quais os folículos foram expostos durante o balanço energético

negativo, já que a foliculogênese pode durar até 60 dias. A produção de progesterona pelo

corpo lúteo formado a partir do folículo ovulatório exposto a condições adversas também se

encontra comprometida (Figura 6; Britt, 1992).

O período de balanço energético negativo é caracterizado pelos baixos níveis de glicose,

insulina e IGF-I e pela menor frequência dos pulsos de LH. Em conjunto, estes fatores

limitam a produção de estrógeno pelo folículo dominante, diminuindo a qualidade dos

oócitos, a capacidade de desenvolvimento do embrião e a concentração plasmática de

progesterona (Butler, 2003). Os estudos de Sartori (2002) e Sartori et al. (2002)

demonstraram que os embriões de novilhas e vacas secas são de melhor qualidade que os

embriões de vacas em lactação, o que pode justificar, pelo menos em parte, a subfertilidade,

as menores taxas de concepção e a alta mortalidade embrionária precoce em animais

lactantes.

305

Figura 6. Os folículos ovulatórios no pós-parto foram numerados de 1 a 6 e cada um

originou um corpo lúteo. O primeiro e o segundo folículos ovulatórios começaram seu

desenvolvimento durante a lactação anterior ou no período seco, quando as condições

metabólicas eram desejáveis. Ao contrário, o terceiro, o quarto e o quinto folículos

desenvolveram durante o período de balanço energético negativo e, consequentemente,

foram expostos aos efeitos prejudiciais das alterações metabólicas ocorridas no pós-

parto (adaptado de Britt, 1992).

Existem correlações significativas entre a constituição plasmática e o fluido intrafolicular,

quanto à presença de glicose, AGNE, -OHB, dentre outros. As alterações metabólicas

ocorridas durante o período de balanço energético negativo modificam a composição do

fluido intrafolicular, afetando a qualidade das células da granulosa. As células da granulosa

são de extrema importância para a esteroidogênese e o controle dos processos reprodutivos.

As alterações metabólicas também são prejudiciais para as células do cumulus oophorus e

para o oócito (Leroy, 2005, Vanholder et al., 2005). A menor qualidade dos oócitos e o

comprometimento ao desenvolvimento embrionário podem ser resultados de alterações no

desenvolvimento folicular, no ambiente uterino e nas tubas. Os embriões de vacas leiteiras

de alta produção contêm 45% a mais de lipídeos que os de vacas secas. O maior conteúdo

lipídico está associado com a alta sensibilidade embrionária ao estresse oxidativo, menor

função mitocondrial e menor capacidade de sobreviver após o congelamento (Figura 7;

Leroy, 2005).

306

Figura 7. Esquema dos possíveis mecanismos pelas quais a qualidade do embrião pode

ser prejudicada em vacas leiteiras de alta produção (adaptado de Leroy, 2005)

NEFA = ácidos graxos não esterificados; β-OHB = beta-hidroxibutirato

Nos últimos anos, outros pesquisadores também têm buscado estudar o impacto dessas

alterações metabólicas relacionadas ao balanço energético negativo e a fertilidade de vacas

de alta produção, deixando de se concentrarem apenas no ambiente ovariano e/ou uterino e

tentando investigar outras porções da genitália tubular feminina. Assim, as concentrações de

AGNE no sangue são conhecidas por alterarem o desenvolvimento folicular e, atualmente,

verifica-se que também podem, muito provavelmente, modificar o microambiente das tubas

uterinas. O oócito no final do período de maturação dentro do folículo pré-ovulatório e o

embrião nos primeiros dias de clivagem celular são bastante sensíveis às mudanças

metabólicas e, por isso o estresse metabólico pode comprometer a fertilidade pela atuação

nos microambientes foliculares e tubáricas. A exposição a AGNE reduz a proliferação

celular, a migração celular e a capacidade de ligação ao espermatozóide, porém, as células

da tuba uterina parecem desempenhar papel ativo na regulação das concentrações luminais

de AGNE por meio da maior permeabilidade, acúmulo de lipídeos intracelulares e no

metabolismo de ácidos graxos, o que poderia minimizar os efeitos negativos dos AGNE sobre

o embrião (Jordens et al., 2017; Leroy, 2017). As mudanças ocorridas na fisiologia

reprodutiva das vacas leiteiras de alta produção também podem estar relacionadas com a

maior intensidade do metabolismo dos hormônios esteroides no fígado (Wiltbank et al.,

307

2006). A maior quantidade de matéria seca ingerida e a alta densidade energética da dieta

aumentam o fluxo sanguíneo intestinal e hepático das vacas em lactação (1.561 57 L/hora)

quando comparadas com as vacas secas de porte semelhante (747 47 L/hora, Sangsritavong

et al., 2002). O aumento do metabolismo hepático dos esteroides nas vacas leiteiras de alta

produção pode estar relacionado com a redução da duração do estro (Figura 8), o aumento

na taxa de ovulações múltiplas (Figura 9), a maior incidência de animais que não manifestam

o estro, o aumento no tamanho do folículo ovulatório e a menor sobrevivência embrionária

inicial (Sangsritavong et al., 2002; Sartori, 2002; Wiltbank et al., 2006).

Figura 8. Relação entre o nível de produção de leite e a duração do estro

de vacas leiteiras (adaptado de Wiltbank et al., 2006).

Considerações finais

A compreensão das alterações que ocorrem no metabolismo das vacas leiteiras no final da

gestação e no início da lactação é primordial para estabelecer mudanças no manejo com o

objetivo de minimizar interferências negativas na reprodução e na produção. As adaptações

metabólicas ocorrem em todos os animais, inclusive naqueles com boa condição corporal.

No entanto, essas alterações são mais intensas nos casos de deficiências nutricionais. Vacas

magras e vacas obesas recém-paridas apresentam balanço energético negativo prolongado e

mais intenso, portanto, são mais suscetíveis às ocorrências de distúrbios metabólicos e

reprodutivos. Alterações nas concentrações de somatotropina, ácidos graxos não

308

esterificados, insulina, glicose, fator de crescimento semelhante à insulina tipo I, leptina,

dentre outros hormônios e metabólitos, estão relacionadas com as ocorrências de distúrbios

reprodutivos, principalmente em vacas de alta produção, devido às interferências no eixo

hipotalâmico-hipofisário-ovariano e no eixo somatotrópico. A redução da fertilidade desses

animais é decorrente das influências na qualidade dos folículos, dos oócitos, do corpo lúteo

e do ambiente uterino, que resultam em baixas taxas de concepção e menor sobrevivência

embrionária. É necessário realizar mais estudos com vacas mestiças leiteiras, pois esses

animais apresentam particularidades ainda não esclarecidas em relação às ocorrências de

distúrbios metabólicos e reprodutivos.

Figura 9. Relação entre o nível de produção de leite e a incidência de

ovulações múltiplas em vacas leiteiras (adaptado de Wiltbank et al., 2006).

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311

Prevenção das acidoses ruminais em rebanhos leiteiros: novos

conceitos

Enrico Lippi Ortolani

A produtividade leiteira teve um incrível aumento graças aos avanços em genética,

nutrição, manejo e controle de enfermidades. Isso foi acompanhado por aumento na

ingestão de matéria seca (MS), com destaque à energia, na forma de carboidratos

solúveis. Essa mudança favoreceu o surgimento de quadros de acidose ruminal devido à

ingestão excessiva ou anormal de carboidratos solúveis.

Para entendermos melhor essa enfermidade é necessário revisar brevemente conceitos de

pH, acidez e os mecanismos de controle de pH ruminal. O pH é uma escala logarítmica

(0 a 14) que mede o grau de acidez (concentração de íons H+) e da alcalinidade

(concentração de íons OH-) dos compostos. Se considera pH 7,0 como neutro e os valores

inferiores e superiores ácidos ou alcalinos, respectivamente. Por ser logarítmico a cada

grau de pH que diminui ou aumenta ocorre uma alteração de concentração de íons H+ ou

de OH- na ordem de 10 vezes. Assim, se o pH diminui de 7,0 para 4,0 existe um

incremento de 1.000 vezes na concentração de H+. A força de um ácido se mede pelo seu

pK, ou seja, o pH ao qual a metade do H+ está associado ou não ao ácido. Quanto menor

o pK mais forte será o ácido.

O pH ruminal depende do balanço de produção de ácidos e de bases em seu meio. Os

principais ácidos graxos de cadeia curta (AGCC), antigamente denominados de ácidos

graxos voláteis, produzidos no rúmen são o acético (pK 5,0), o propiônico (pK 4,8) e o

butírico (pK 4,7). A principal base é o bicarbonato proveniente da saliva deglutida e em

menor grau a amônia (NH3), produzida a partir da hidrólise ruminal de proteína ou ureia.

A absorção dos ácidos ocorre pelas papilas da parede do rúmen e do omaso. Ácidos

associados com íon H+ são mais absorvidos que não-associados. O pH normal do fluido

do rúmen está entre 5,9 a 7,1 com produção total de ácidos não superior a 90 mmol/L de

conteúdo (Ortolani et al., 1982).

312

Tipos de acidose ruminal e suas patogenias

Existem dois tipos de acidoses ruminais: a mais branda e a mais intensa. A primeira é

gerada por aumento anormal de AGCC, em especial de propiônico e butírico, denominada

de acidose ruminal por AGCC (ARAGCC) produzindo um pH ruminal entre 5,2 a 5,8

por no mínimo 5 h de duração e com produção de ácidos superior a 90 mmol/L. A segunda

forma decorre da produção anormal de ácido láctico (pK 3,7) provocando a acidose

láctica ruminal (ALR), gerando um pH ruminal inferior a 5,2 com qualquer duração e

com produção total de ácidos superior a 200 mmol/L.

A produção de excesso de ácidos está intimamente relacionada com o tipo e a quantidade

de concentrado ingerido. A geração de ácidos ruminais é maior quanto menor for a cadeia

dos carboidratos solúveis na dieta. Assim, os monossacarídeos (por exemplo, glicose e

frutose presentes nas frutas) são mais acidogênicos que os dissacarídeos (lactose -no soro

lácteo- e sacarose -presente no melaço-) e estes mais acidogênicos que os polissacarídeos

(principalmente o amido). A ordem de disponibilidade do amido para a fermentação é

decrescente nos seguintes grãos: trigo, aveia, arroz, milho e sorgo. A mesma ordem ocorre

por processamento dos grãos de milho: floculação, silagem de milho úmido, fubá, quirera

e grãos inteiros (Owens et al., 1999; Krauze & Oetzel, 2006).

Outro ponto importante no controle da acidose é a salivação. O pH da saliva é alcalino

pela presença de bicarbonato, fundamental para o tamponamento ruminal. As glândulas

salivares recebem influência positiva do nervo vago, o qual é muito estimulado pelo atrito

das fibras dietéticas na parede ruminal como se fossem uma “escova de dente”. Quanto

maior o tamanho das fibras mais abundante será a salivação. Assim, uma partícula da

forragem de 1 cm tem um efeito 80x no estímulo da salivação, o caroço de algodão 70x,

a polpa cítrica 30x, o grão inteiro de milho 5,4x, quirera 2,4x, fubá 1,8x e milho floculado

1x.

A fermentação dos alimentos é feita pelos microrganismos ruminais. Na alimentação rica

em forragens predominam as bactérias Gram negativas (celulolíticas). Quanto mais

aumentam os concentrados energéticos, mais proliferam bactérias Gram positivas

(amilolíticas). Na ARAGCC se multiplicam outras bactérias Gram positivas, inicialmente

o Streptoccocus bovis (pH 5,1 a 5,8) que produz ácido propiônico e butírico e uma

pequena quantidade de láctico, e depois o Lactobaccilus spp. (menor que pH 5,2) que

313

origina apenas ácido láctico. São fundamentais no controle da acidose o estímulo ao

crescimento de bactérias lactilíticas (Megasphera elsdeni, Selenomonas ruminantium)

que transformam ácido láctico em propiônico, menos forte. Essas bactérias têm uma ação

maior no pH 5,8 porém morrem em pH inferior a 5,3. Suas populações crescem

lentamente, assim a adaptação às dietas ricas em concentrados energéticos deve ser

gradual (Owens et al., 1998).

A quantidade de concentrados para provocar acidose é muito variável. É possível gerar

ARAGCC em vacas sem prévia adaptação quando de repente se oferece mais de 35% de

matéria seca de concentrados ou ALR com mais de 50%. Quanto mais pesadas forem as

vacas, menores serão as quantidades de concentrados ingeridas para causar acidose

(Ortolani, 1995).

A morbidade da ARAGCC é muito variável no rebanho, sendo mais frequente ao redor

de 80 a 140 dias de lactação, momento em que a ingestão de matéria seca é máxima.

Porém, em primíparas, a morbidade é maior no terço médio da lactação. Essa situação

provavelmente ocorra, pois, as novilhas parecem ter um menor controle na ingestão de

concentrados energéticos e quando são mantidas em conjunto com multíparas, as

primeiras reduzem o número de visitas ao cocho, o que as faz comer em maior quantidade

em cada visita. Algumas vacas multíparas têm um risco maior de apresentarem acidose

que outras. As mais resistentes controlam mais a ingestão de concentrados após um

quadro prévio de acidose que as susceptíveis. Nas susceptíveis desenvolvem-se mais as

rumenites promovendo menor absorção de AGCC, tornando as recorrências do quadro

mais frequente, de maior intensidade e com recuperação mais lenta (Krauze & Oetzel,

2006; Beauchemin et al., 2014).

Na ALR a alta produção de ácidos e a grande dissociação destes poderá aumentar a

osmolaridade ruminal acima da sanguínea (300 mOsm/L) promovendo a migração de

fluidos e eletrólitos para o rúmen, gerando assim desidratação. A diarreia é discreta na

ARAGCC e exuberante na ALR, ambas com duração de até três dias. O pH das fezes

diminui de 6,0-7,0 para menos de 6,0 na ALR. A absorção do ácido láctico pode gerar

um estado variado de acidose metabólica acompanhado de acidúria temporária. A

laminite asséptica ocorre em muitas vacas dentro de dois a três dias na ALR, ou semanas

e meses depois de episódios de ARAGCC, causando claudicação e presença de linhas de

314

estresse nos cascos (Sousa, 2017). Algumas vacas podem contrair quadros pneumônicos

e polioencefalomalacia depois da acidose ruminal (Owens et al., 1998; Ortolani et al.,

2010; Danscher et al., 2015).

Devido às dificuldades de evidenciação de sintomas clínicos na ARAGCC têm sido

estudadas alterações no comportamento das vacas. Assim, Ortolani (2018) verificou que

existe uma diminuição em 63% na ingestão de matéria seca no primeiro dia da

enfermidade, sendo restabelecido apenas no 3º dia posterior. O tempo devotado às

atividades básicas também se alteram com diminuição de cerca 50% na ruminação, 35 %

na ingestão de alimentos, e aumento de 35% no tempo de ócio e de posição em decúbito

esternal.

Diagnóstico da acidose ruminal

O diagnóstico é feito por meio do exame físico e laboratorial. A enfermidade provoca

depressão no estado geral, diminuições do apetite, da produção leiteira, da frequência

ruminal e da ruminação, causa diarreia e desidratação entre outros sintomas supracitados.

Na ALR ocorre uma diminuição no pH fecal e da urina. No exame do fluido ruminal se

encontram alterações de cor (mais amarelado), odor (mais ácido) e diminuição do pH

entre outras mudanças.

Manejo preventivo da acidose ruminal

A prevenção é a chave do manejo da acidose ruminal. A primeira medida é a identificação

contínua da presença dos casos clínicos. Outros indicadores indiretos devem ser tomados

em conta na adoção de medidas preventivas. Um deles é o índice de ruminação do

rebanho que deve ser superior a 40% em vacas que não estejam comendo, se deslocando

ou dormindo. O índice de laminite deve ser inferior a 10%. A acidose interfere

negativamente na produção de gordura no leite. Vacas Holandesas e Jersey devem ter um

porcentual de gordura no leite superior a 3,4% e 4,3% e uma relação gordura: proteína

(G:P) maior que 1,1 e 1,2, respectivamente. Valores de G:P inferiores a 1,0 das vacas são

fortes indicadores de alta frequência de ARAGCC no rebanho (Enemark, 2008; Krauze

& Oetzel, 2008).

315

A segunda medida é a adaptação gradual aos concentrados, principalmente no período do

pré-parto. Essa providência tem dois motivos: aumentar adequadamente a população de

microrganismos lactilíticos e promover o crescimento das papilas ruminais. Vacas que

vão receber na dieta pós-parto até 50% a 60% MS de concentrados devem ter incluídos

gradualmente na ração 3 a 4 kg desses alimentos no último mês de gestação (Krauze &

Oetzel, 2008).

A terceira medida é evitar que as vacas fiquem demasiado tempo sem receber alimento

no decorrer do dia. Vacas famintas, por exemplo por 18 horas, comem cerca de 20% a

mais da mesma dieta quando realimentadas provocando uma queda drástica no pH

ruminal, por muitas horas. Assim deve-se distribuir a dieta e acompanhar sua sobra no

comedouro por no mínimo duas vezes ao dia. Sobras de alimento inferior a 5% é

indicativo que as vacas estão famintas. A sobra de alimentos ideal antes de uma nova

oferta deve ser entre 5% a 10 % do oferecido (Beuachemin & Penner, 2014).

A quarta medida é estimular a salivação. Como já mencionado, o tamanho da partícula

da forragem estimula mais ou menos a salivação. Para o tanto mensure o tamanho da

partícula de forragem oferecida por meio de peneiras sequenciais (Penn State Separator)

com malhas de diferentes diâmetros (longa > 1,9 cm; média 0,8 a 1,9 cm e curta < 0,8

cm). Porém, é um erro pensar que o excesso de fibra longa é benéfico para a vaca. Em

dietas com alto concentrado, o excesso de fibra longa favorecerá o surgimento de acidose.

Isso se deve à eleição do consumo de fibras curtas em detrimento das longas, deixando

estas no comedouro. Para evitar isso, algumas medidas são propostas. Estudo recente

indica que, em dietas muito energéticas, a melhor distribuição de fibra é algo como 8%

de longa, 40% de média e 52 % de curta. Para garantir um bom consumo de fibra longa

podem-se adicionar na dieta “colantes” como a glicerina (10% MS) ou melaço de cana

ou soja líquido que aderem todas as fibras aumentando seu consumo como um todo. É

fundamental também, para evitar a seleção de alimentos pela vaca, o oferecimento de

uma dieta completa totalmente misturada (TMR), distribuída por um vagão forrageiro.

Manter sempre ajustado o triturador de forragem para não fornecer volumosos picados

em demasia. Não deixar o feno ser misturado por muito tempo no vagão, pois isso

aumenta sua fragmentação. Oferecer, sempre que possível, forragem fresca, pois o

consumo de fibra longa aumenta (Krauze & Oetzel, 2008; Beauchemin & Penner, 2014).

316

No caso de todas estas medidas não funcionarem, principalmente em dietas muito ricas

em concentrados com alto risco de acidose, devem se adicionar tampões na dieta. Os

melhores resultados na prevenção são obtidos com bicarbonato de sódio (1,25% MS).

A quinta medida é a regularização do apetite e o acesso ao comedouro. Como já

mencionado, a dieta deve ser oferecida duas vezes ao dia, o que regulariza o pH e aumenta

o índice de ruminação. Deve-se evitar a superpopulação de vacas para não congestionar

o comedouro, sendo o ideal um espaço de 80 a 100 cm/vaca em lactação, principalmente

quando se misturam primíparas e multíparas. É essencial manter o bem-estar dos animais,

em especial no tocante ao estresse térmico.

Finalmente, sugere-se empregar aditivos para prevenir a acidose, os quais podem ser

naturais ou artificiais. O principal aditivo natural é a base de probiótico contendo

leveduras secas (Sacharomyces cerevisae 4 g/vaca/dia) que tem um papel preventivo

somente em ARAGCC, ajudando manter o pH ruminal acima de 5,6 e por aumentar as

bactérias lactilíticas. Os aditivos artificiais são a base de ionóforos e certos antibióticos.

Os ionóforos (monensina, lasalocida e salinomicina) são antimicrobianos que inibem o

crescimento de bactérias ruminais Gram positivas, em especial Streptoccocus bovis,

atuando no fluxo de cátions monovalentes ou divalentes interferindo no metabolismo

energético. Os antibióticos mais empregados são a virginiamicina e a tilosina com ação

bacteriostática sobre as bactérias Gram positivas produtoras de ácido láctico.

Recentemente um experimento conduzido pela nossa equipe demonstrou que a adição de

monensina (30 ppm) e virginiamicina (25 ppm) mitiga quadros de ALR muito intensos.

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318

Hipocalcemia puerperal bovina

Luis Albornoz

J. P. Albornoz

M. Morales

L. E. Fidalgo

Transtornos metabólicos

A necessidade de satisfazer os requerimentos de alimentos de origem animal da

população e de aumentar a rentabilidade das empresas pecuárias, tem motivado a seleção

das espécies animais para obter o máximo de otimização. Entre estas, o bovino ocupa um

lugar relevante e para aumentar sua capacidade produtiva têm sido utilizados diversos

procedimentos tais como seleção genética, novos sistemas de alimentação,

procedimentos de manejo e utilização de biotecnologias (Contreras, 1998). Com estas

medidas têm se conseguido maiores produções, porém com aumento do risco de sofrer

alterações da saúde e, agravado pela escassez de alimentos e problemas de manejo, a

saúde se compromete ainda mais em rebanhos que tenham níveis produtivos

relativamente baixos (Contreras, 1998).

Quando aumenta a produção por vaca, se trabalha com indivíduos selecionados, cuja

adequação orgânica permite ter bom rendimento, porém são animais mais suscetíveis de

sofrer enfermidades provocadas por uma alteração do metabolismo devido à sobrecarga da

atividade metabólica que exigem os maiores níveis produtivos. Nessas vacas, o metabolismo

energético, proteico e mineral frequentemente está alterado (Corbellini, 2000; Overton et al.,

2017). Esse aumento da produção induz una maior frequência e intensidade de apresentação

das enfermidades metabólicas o da produção, provocadas por um desequilíbrio entre os

nutrientes que ingressam no organismo, seu metabolismo e os egressos através das fezes,

urina, leite, feto, etc. Lamentavelmente, a maioria destas enfermidades são de difícil

percepção limitando a produção de forma persistente e diminuindo a rentabilidade (Payne,

1981; Overton et al., 2017).

Tanto uma deficiente como uma excessiva alimentação, seja de minerais, energia ou

proteína pode causar problemas, e muitas vezes esses desequilíbrios têm efeitos aditivos

ou se potencializam criando um transtorno maior do que considerado isoladamente. A

319

fertilidade e os problemas metabólicos estão relacionados e não podem ser separados

(Lotthamer, 1992). Caso típico destas situações são os eventos de crescimento, gestação

e lactação. Este efeito distribuidor da energia é conhecido como homeorresis (Baumam

& Currie, 1980), do vocábulo grego que significa "fluxo uniforme", ou como teleorresis

("fluxo dirigido"). Isto implica conseguir a uniformidade do fluxo de nutrientes para

sustentar um estado fisiológico, como por exemplo, a lactação. Para a manutenção da

gestação e o preparo da lactação são necessárias adaptações metabólicas nos tecidos de

uma forma coordenada (Bauman & Currie, 1980; Van Saun, 1997). Os tecidos primários

de adaptação são homeorréticos e, neste grupo, estão os tecidos adiposo,

musculoesquelético e hepático. As mudanças metabólicas associadas com a transição

desde a gestação até a lactação ocorrem em todos os animais, incluídos aqueles bem

alimentados. Entretanto, estas mudanças metabólicas podem ser exageradas quando o

fornecimento dietético de energia, proteínas ou minerais são insuficientes, o que leva à

manifestação de transtornos metabólicos (Van Saun, 1997).

As perdas econômicas associadas às enfermidades do periparto têm elevado custo,

representado pela perda de produção de leite, diminuição da eficiência reprodutiva,

despesas veterinárias, aumento de mão de obra, tratamentos, substituição de animais, etc.

(Corbellini, 2000; Van Saun, 2010). Em torno de 50% de todas as lactações são afetadas

por pelo menos uma enfermidade no periparto, o que sugere perdas econômicas

importantes (Corbellini, 2000; Dyk et al., 1995). Estudos epidemiológicos mostram que

doenças durante o período de transição não são eventos produzidos independentemente,

mas são um complexo de transtornos relacionados entre si (Van Saun, 1997). Por

exemplo, se uma vaca sofrer hipocalcemia puerperal (HP) tem 4 vezes mais probabilidade

de ter retenção de placenta e 2 a 3 vezes más de ter deslocamento de abomaso. A retenção

de placenta aumenta 16,4 vezes a probabilidade de sofrer cetose, e as vacas com

deslocamento de abomaso são 1,8 vezes mais propensas de sofrer HP, retenção de

placenta ou cetose (Curtis et al., 1983). É, portanto, evidente que se uma vaca está sadia

durante o período de transição, cabe esperar um período de lactação produtivo e com

grandes expectativas de uma boa eficiência reprodutiva (Van Saun, 1997).

Dentre os distúrbios metabólicos que podem sofrer as vacas no período do periparto,

existem os desequilíbrios minerais, mas também estão os desequilíbrios energéticos e

320

proteicos. Por exemplo, a síndrome de mobilização adiposa é a principal consequência

de uma pobre adaptação do animal ao balanço energético negativo (BEN) e causa de

outras patologias do periparto (cetose, deslocamento de abomaso, retenção de placenta,

mastite, redução da produção, problemas reprodutivos e aumento da susceptibilidade a

doenças infecciosas (Fernández, 2009; Roberts et al., 2012; Santschi et al., 2011).

Hipocalcemia puerperal

O final do período de gestação e início da lactação representam situações fisiológicas de

estresse e de mudanças dramáticas na demanda de nutrientes, que requer uma perfeita

coordenação do metabolismo para satisfazer o aumento significativo dos requerimentos

logo após o parto. O metabolismo dos minerais não escapa a essas grandes mudanças,

especialmente o do cálcio. Todas as vacas sofrem diminuição do cálcio do sangue desde

um dia antes do parto até dois ou três dias após o parto (Albornoz, 2006), esperando que

os mecanismos homeostáticos que regulam o metabolismo do cálcio se adaptem à grande

demanda deste mineral (Holmes, 2003).

A HP é um distúrbio metabólico que ocorre no periparto especialmente em vacas leiteiras

de alta produção. O transtorno se caracteriza por um quadro clínico que inclui inapetência,

tetania, paralisia flácida, inibição da micção e da defecação, decúbito, coma e

eventualmente morte. Do ponto de vista bioquímico nota-se uma rápida diminuição da

concentração de cálcio y fósforo no sangue, relacionada com a formação de colostro

(Albornoz, 2006; Contreras, 2002b; Horst et al.,1997; Horst et al., 1998; Houe et al.,

2001). Os níveis sanguíneos de referência de cálcio em vacas leiteiras variam entre 8,6 e

9,6 mg/dL (Blood & Radostitis 1992; Goff, 2008). Quando o cálcio plasmático está

abaixo desses limites, funções como a neurotransmissão, contração muscular e regulação

hormonal podem ser afetadas (Blood & Radostits, 1992; Corbellini, 2000; Radostits,

2001). A forma clínica do transtorno (paresia puerperal hipocalcêmica) apresenta-se

principalmente em granjas leiteiras intensivas. A incidência média pode estimar-se entre

5 a 10%. É observada mais frequentemente em vacas de alta produção e de mais idade

(Radostits, 2001; Stöber, 2005).

321

O cálcio no organismo

O cálcio é um cátion multivalente muito importante no organismo. Este mineral mantém

a integridade da estrutura de ossos e dentes, sendo fundamental para controlar uma grande

quantidade de processos bioquímicos. No organismo, aproximadamente 98% do cálcio

encontra-se nos ossos, 1% nas células e 0,3% no líquido extracelular. Do total de cálcio

no plasma, 55% encontra-se em forma ionizada como Ca2+ ativo, 35% unido a proteínas,

principalmente albumina e 10% constitui complexos em formas não iónicas como o

bicarbonato de cálcio. O equilíbrio entre o Ca ionizado e o Ca unido a proteínas depende

do pH sanguíneo. A alcalose diminui a concentração de Ca total, enquanto a acidose tem

o efeito contrário (Holmes, 2003; Rosol et al., 2000; Stöber, 2005).

Fisiopatologia da hipocalcemia

No periparto, o cálcio sofre uma rápida depleção passando do plasma à glândula mamária

sem dar tempo de uma compensação por parte dos mecanismos endócrinos (Alonso,

1997; Dhiman & Sasidharan, 1998; Horst et al., 1998). Durante o parto ou logo após, a

hipocalcemia é inevitável e caracterizada por concentrações de Ca sanguíneo < 8 mg/dL

(Risco, 2001a; Risco, 2001b). O feto necessita 5,3 g de Ca por dia, enquanto são

requeridos entre 13 e 18 g para a secreção de colostro (Alonso, 1997; Corbellini, 2000).

Ao redor do 1º dia pós-parto as vacas que produzem em torno de 10 L de colostro utilizam

como mínimo 23 g de Ca, aproximadamente 6 a 9 vezes mais do Ca contido no líquido

extracelular. Portanto, as necessidades totais de Ca aumentam radicalmente após o parto

passando de 10 a 15 g/dia para 30 a 50 g/dia (Alonso, 1997; Corbellini, 1998; Horst et

al., 1998; Risco, 2001b). Durante o período seco, quando os requerimentos de cálcio são

mínimos (a drenagem fetal é de 10 a 12 g/dia), os mecanismos homeostáticos encontram-

se relativamente inativos (Horst, 1997). No momento do parto, as necessidades de Ca

crescem subitamente e quase todas as vacas sofrem um momentâneo desequilíbrio na

regulação do Ca sanguíneo, sem chegar a ser uma verdadeira deficiência de Ca

(Corbellini, 2000; De Garis & Lean, 2009).

Os mecanismos de homeostase que regulam a calcemia interveem rapidamente

restituindo o Ca por três vias (Holmes, 2003): (a) absorção intestinal de cálcio, (b)

liberação de cálcio dos ossos para o sangue e (c) reabsorção cálcio em nível renal. O

322

atraso no início dos mecanismos de homeostase é a causa mais importante da HP (Alonso,

1997). Existem três fatores que afetam a homeostase do Ca e as variações de um ou mais

deles parecem ter importância decisiva no desencadeamento do transtorno: (1) Perda

excessiva de Ca para o colostro (Alonso, 1997): um alto potencial genético e boa

alimentação energética e proteica no pré-parto, principalmente quando há ganho da

condição corporal de 20 a 30 dias antes do parto, predispõem ao transtorno porque a

secreção inicial de colostro é abundante (Corbellini 2000; Roche, 2003). (2) Diminuição

na absorção de Ca no intestino: na absorção intestinal de Ca participam dois mecanismos

de transporte -ativo e passivo- através das células epiteliais do intestino delgado. O

transporte ativo, que é o mais importante, realiza-se com mediação do hormônio da

paratireoide (PTH) e da vitamina D3, enquanto transporte passivo ocorre por diferença de

gradientes de concentração (Alonso, 1997). (3) A mobilização de Ca a partir dos

depósitos de Ca ósseo pode não ser suficientemente rápida para manter a calcemia

(Alonso, 1997): durante períodos de baixa ingesta de Ca, o osso é a maior fonte deste

mineral (Horst et al.,1997). O Ca existe no osso em dois estados, uma pequena quantidade

está facilmente disponível em solução ao redor das células trabeculares ósseas e os

canalículos ósseos (Horst et al.,1997). O Ca solúvel que se encontra nos fluidos do osso

é separado dos fluidos extracelulares pelas células ósseas sinciciais sob estimulação do

PTH. Estas células rapidamente transferem os fluidos cálcicos do osso à corrente

sanguínea (Goff et al., 2004; Horst et al.,1997). A quantidade de Ca proveniente dos

fluidos ósseos em vacas leiteiras adultas alimentadas com dietas de alto conteúdo de

forragens pode ser estimado entre 6 a 10 g de Ca por dia (Goff & Horst, 1997).

Regulação endócrina da calcemia

Vários hormônios estão envolvidos no metabolismo do cálcio e do fósforo. Dois desses

hormônios, o PTH e a calcitonina (CT), têm efeito na atividade do Ca extracelular e o

osso (Goff et al., 2008; De Garis & Lean, 2009; Holmes, 2004). A glândula paratireoide

secreta PTH em resposta a uma queda da calcemia ou a um aumento da fosfatemia e tem

uma ação hipercalcemiante (Goff et al., 2008; Thiede, 1994). A CT é secretada em

resposta a uma hipercalcemia (Payne, 1981; Underwood, 1983). Um 3º hormônio, o 1,25-

dihidroxi-colecalciferol (DHCC) é derivado da vitamina D e sintetizado em pele, fígado

323

e rim. Esses três hormônios atuam juntos para manter constante o nível de cálcio e fósforo

no líquido extracelular e regular o metabolismo ósseo (Holmes, 2004; Horst et al., 1997).

Outros hormônios como os estrógenos, andrógenos, hormônio do crescimento e cortisol

também afetam o metabolismo do cálcio (Holmes, 2004).

PTH

O PTH é secretado em resposta a hipocalcemia e tem como efeito aumentar a

concentração do Ca mediante um efeito lento, porém prolongado (Payne, 1981). Para

regular a calcemia o PTH tem cinco ações distintas (Holmes 2004): (a) aumenta a

liberação de Ca dos ossos ao plasma; (b) aumenta a reabsorção de Ca dos túbulos renais;

(c) aumenta a atividade da enzima renal 1-α-hidroxilase; (d) diminui a reabsorção de

fósforo inorgânico nos túbulos renais; (e) aumenta a absorção intestinal de Ca, de forma

indireta mediada pela vitamina D3. Diante de qualquer diminuição de Ca sanguíneo, o

PTH é secretado atuando em poucos minutos aumentando a reabsorção renal no filtrado

glomerular. Se as necessidades de Ca são pequenas, a calcemia retorna à normalidade e

a secreção de PTH volta aos valores basais. Entretanto, se as necessidades de Ca são

grandes, a secreção de PTH estimula também a liberação de Ca do sistema ósseo (Horst

et al., 1997; Oetzel, 2002; Underwood 1983).

Calcitonina

A calcitonina atua, principalmente, em dois órgãos: osso e rim, induzindo um aumento

da saída de cálcio e fósforo desde o líquido extracelular e diminuindo a taxa de entrada

de estes íons ao líquido extracelular ou ambas simultaneamente. A magnitude da

diminuição plasmática de Ca é diretamente proporcional à taxa basal de recâmbio ósseo.

Portanto, os animais jovens em fase de crescimento são mais afetados pela CT, enquanto

os animais adultos com esqueletos mais estáveis respondem minimamente à CT. A ação

hipocalcemiante da CT se deve à inibição da osteólise osteocítica e da liberação óssea

osteoclástica, especialmente quando se encontram estimuladas pelo PTH. Apesar de ter

um efeito menos importante do que nos ossos, a CT reduz a reabsorção renal de cálcio e

fósforo, causando aumento na liberação renal destes íons que levam a hipocalcemia e

324

hipofosfatemia (Venjakob et al., 2017). A CT também atua para reduzir a reabsorção de

sódio, magnésio e potássio no túbulo proximal do rim (Holmes, 2004).

Vitamina D₃

A vitamina D₃ atua como um hormônio. Embora possa ser sintetizada no organismo,

também é uma vitamina uma vez que, se não for sintetizada em quantidades suficientes,

deve ser ingerida (Holmes, 2004). Atua sinergicamente com PTH aumentando o Ca

sanguíneo por estimular a liberação óssea e aumentar a reabsorção renal de Ca (Horst et

al.,1997). A vitamina D₃ (DHCC) é importante por estimular o transporte do cálcio

ingerido na dieta através do epitélio intestinal (Horst et al.,1997). O Ca pode ser absorvido

através do intestino por mecanismos dependente e independente do DHCC. No caso do

mecanismo independente, a absorção de Ca é primariamente por difusão passiva (Oetzel,

2002) enquanto no mecanismo dependente de DHCC a absorção ocorre por transporte

ativo através das células do epitélio intestinal, o que ocorre quando a dieta é baixa ou

quando a demanda é alta em Ca (Horst et al.,1997; Hove & Hilde, 1984; Oetzel, 2002).

Este processo requer DHCC, o qual estimula a síntese de uma proteína que transporta o

Ca através das células do epitélio intestinal (Horst et al.,1997).

Nas vacas leiteiras de alta produção, as demandas de Ca antes do parto estão em seu

menor nível. As demandas de Ca pelo feto são relativamente baixas, similares às

quantidades que se necessitam para enfrentar a última etapa da lactação. Assim, os

mecanismos de liberação óssea permanecem imóveis e a absorção de Ca intestinal se

encontra em sua forma passiva nesse momento (Oetzel, 2002). As dietas típicas usadas

para alimentar as vacas nessa etapa da vida reprodutiva excedem os requerimentos de Ca,

de modo que as demandas de Ca para a manutenção dos tecidos corporais e o

desenvolvimento do feto podem ser cobertas totalmente sem a absorção dependente da

vitamina D (Oetzel, 2002). Durante os primeiros dias de lactação, a homeostase do Ca é

restaurada pelo PTH, que reduz as perdas urinárias de Ca, estimula a liberação de Ca dos

ossos e aumenta a síntese de DHCC, melhorando o transporte intestinal ativo de Ca

(Oetzel, 2002).

A capacidade de adaptação à hipocalcemia é influenciada por numerosos fatores. As

restrições de Ca melhoram a capacidade para responder à hipocalcemia, mas têm

325

relativamente efeitos pequenos na incidência de hipocalcemia clínica (Oetzel, 2002). O

risco mais importante na apresentação de hipocalcemia é o equilíbrio ácido-básico do

animal no momento do parto. Existe atualmente uma tendência a considerar a

hipocalcemia como uma “intoxicação nutricional subclínica” causada por excesso de

potássio (K), principal indutor de alcalose metabólica (Corbellini, 2000).

O Ca é requerido para o normal funcionamento de uma extensa variedade de tecidos e

processos fisiológicos. É necessário para a formação óssea, para a contração muscular, a

transmissão nervosa, a coagulação do sangue e na regulação de alguns hormônios (Goff

et al., 2008; Horst et al.,1994; Radostits, 2001). Em geral, os vertebrados mantêm a

calcemia com eficiência, com exceção das vacas parturientes adultas leiteiras, as quais

desenvolvem hipocalcemia (Horst et al., 1994). Os processos de absorção intestinal

(Hove & Hilde, 1984) e de liberação óssea de Ca estão sob a influência da regulação

endócrina do Ca, o PTH e o DHCC. Algumas desordens endócrinas resultantes de

deficiência ou excesso de PTH ou vitamina D foram hipotetizados como defeitos

primários em vacas com HP, porém essas hipóteses foram rejeitadas quando

pesquisadores acharam níveis elevados de PTH e DHCC no sangue de animais que

sofriam paresia puerperal hipocalcêmica (Corbellini, 1998; Horst et al., 1994). As lesões

celulares envolvidas ainda permanecem sem serem identificadas (Horst et al., 1994), mas

a etiologia da paresia puerperal hipocalcêmica ainda é motivo de estudo, pois não se

conhece a forma detalhada de todos os mecanismos metabólicos envolvidos. Uma falta

de resposta do tecido ósseo à ação mobilizadora de Ca e P por parte do PTH e o DHCC,

devido a um estado de alcalose metabólica, parece ser a causa mais provável (Contreras,

2002b; Corbellini, 1998; Corbellini, 2000; Goff et al., 2008).

Fatores que influem na homeostase de cálcio

Alcalose metabólica

A alcalose metabólica predispõe as vacas à HP clínica e subclínica. Nesse caso, a

conformação dos receptores do PTH sofre alteração fazendo menos sensíveis os tecidos

ósseo e renal ao PTH. A alcalose metabólica decorre, em grande medida, de uma dieta

326

com predomínio catiônico (K+, Na+, Ca2+ e Mg2+) sobre os ânions (cloretos, fosfatos e

sulfatos) no sangue (Goff, 2008).

Hipomagnesemia

A hipomagnesemia provoca uma diminuição na capacidade de mobilização de Ca em

resposta a um estímulo hipocalcêmico (Bednarek et al., 2000). Isto explica a maior

suscetibilidade à hipocalcemia nas vacas hipomagnesêmicas do que nas

normomagnesêmicas, o que se conhece como hipocalcemia Mg-dependente. Nesse caso,

ocorreria uma menor produção de PTH, reduzindo o tecido sensível ao hormônio e uma

menor resposta aos tecidos “alvo” para a mobilização de Ca (Corbellini, 1998; Goff et

al., 2004; Goff, 2008; Mulligan & Doherty, 2008; Roche, 2003) ou também uma

interferência do metabolismo da vitamina D, pois o Mg é necessário para a hidroxilação

no fígado do 25-OH-colecalciferol, intermediário na síntese de DHCC (Contreras,

2002b). O excesso de K (> 2% MS) altera o metabolismo do Mg, interferindo sua

absorção em nível ruminal, muito embora na porção pós-ruminal haja uma compensação

na absorção de Mg. Um aumento da concentração de K na dieta entre 2,6 a 4,3% reduz a

absorção de Mg em aproximadamente 82% (Roche, 2003). Também o excesso de amônio

ruminal, produzido por excesso de proteína degradável ou deficiência de energia na dieta,

provocam interferência na absorção de Mg (Contreras, 2002a). Foi observado que 70%

das vacas em sistemas de pastoreio eram hipomagnesêmicas no dia do parto (Roche,

2003). Albornoz (2006) observou uma tendência a incremento de Mg no dia do parto,

embora os valores possam ser considerados hipomagnesêmicos. As vacas nesse estudo

mostraram hipomagnesemia com valores que se elevaram no dia do parto (1,78 ± 0,26

mg/dL; n= 35) aproximando-se aos limites inferiores de referência (1,8 mg/dL).

Venjakob et al. (2017) encontraram uma correlação negativa entre Ca e Mg indicando a

importância de estudos mais aprofundados sobre a regulação fisiológica desses minerais

ao redor do parto.

Desenvolvimento da hipocalcemia

As concentrações sanguíneas de cálcio e fósforo no bovino são de 8,0-10,6 mg/dL e 3,2-

7,1 mg/dL, respectivamente. Em vacas sadias no momento do parto, as concentrações de

327

cálcio e fósforo diminuem levemente (Albornoz, 2006) e depois se restabelecem, o que

se conhece como hipocalcemia fisiológica. Porém, quando o descenso é intenso, por

insuficiente capacidade de mobilização de Ca, se apresenta o transtorno metabólico

conhecido como paresia puerperal hipocalcêmica ou febre do leite). As causas de uma

mobilização insuficiente de cálcio são: (1) Síntese ou secreção insuficiente de PTH,

hormônio responsável pela extração de Ca e P do osso para aumentar suas concentrações

no sangue. (2) Síntese insuficiente do precursor da vitamina D, a qual promove a absorção

de Ca no intestino. (3) Insuficiente resposta dos tecidos (rim, osso, intestino) aos

estímulos de PTH e/ou DHCC. (4) Diminuição do apetite por doenças concomitantes. (5)

Hipomagnesemia, que altera a secreção de PTH e o metabolismo da vitamina D. (6)

Estresse, que favorece a secreção da calcitonina, hormônio hipocalcemiante.

Fatores predisponentes da hipocalcemia

Raça

Inúmeras pesquisas sugerem que algumas raças de vacas leiteiras são mais suscetíveis à

HP, tais como Channel Island, Swedish Red and White e Jersey (Horst et al., 1997; Lean

et al., 2006; Roche, 2003; Lean et al., 2006). A exata razão desta maior suscetibilidade

não está clara, mas tem sido demonstrado que os receptores intestinais para DHCC são

menores em vacas Jersey que em Holandesas ajustados por idade (Horst et al., 1997). O

baixo número de receptores pode resultar de uma perda de tecido sensível ao DHCC

(Horst et al.., 1997; Houe et al., 2001).

Idade

À medida que aumenta a idade das vacas, também aumenta a incidência de HP (Alonso,

1997; Horst et al., 1997; Houe et al., 2001), sendo muito rara a ocorrência em vacas de

primeira lactação e aumentando a partir da terceira lactação (Horst et al., 1997). Inúmeros

fatores contribuem para que a idade avançada seja um importante fator predisponente da

HP, tais como a maior produção de leite das vacas adultas, as quais têm maior demanda

de Ca, a queda na capacidade de mobilizar Ca ósseo, a diminuição do transporte ativo de

328

Ca no intestino e a menor produção de DHCC. Coletivamente todos esses problemas

produzem una falta de resposta às necessidades agudas de Ca (Horst et al., 1997).

Dieta e condição corporal

Quando as vacas são alimentadas com níveis baixos de Ca ou quando se ajusta a relação

Ca/P para 2:1 tem sido notada uma menor incidência de HP (Horst et al., 1997).

Um alto score na condição corporal aumenta os riscos de HP (Houe et al., 2001). A

condição corporal pode ser medida em uma escala que vai de 1 a 5 com frações de 0,25

na qual score 1 significa um animal extremamente magro e score 5 um animal

extremamente obeso (Ferguson et al., 1994; Houe et al., 2001). Foi observado que vacas

com condição corporal maior que 4 tinham um risco de HP maior (odds ratio de 4,3)

(Houe et al., 2001).

Nível de produção

A incidência de HP está associada positivamente com o nível de produção de leite. Foi

observado um aumento de 0,05% na incidência de HP por cada kg de produção de gordura

produzida na lactação anterior. Outro estudo demonstrou que o risco para HP teve um

OR de 1,5 para vacas que produziram 7 kg de leite corrigidos por gordura comparadas

com vacas que produziram 4 kg de leite nas mesmas condições (Houe et al., 2001).

Distúrbios relacionados com a hipocalcemia

Pela ação coordenada de órgãos como fígado, rim, intestino delgado e osso e através da

ação homeostática dos hormônios calciotrópicos, aumenta a capacidade intestinal de

absorção intestinal de Ca, sua mobilização (ressorção) óssea e sua reabsorção renal de

Ca. Uma falha nesses mecanismos geralmente causada por erros de manejo no pré-parto,

pode levar não somente a uma alta incidência de HP clínica, mas também HP subclínica,

responsável por transtornos como partos demorados e retenção de placenta (Corbellini,

1997). A paresia puerperal ou febre do leite é a manifestação clínica da HP, sendo um

dos distúrbios metabólicos mais comuns do periparto na vaca leiteira multípara (Risco,

2001b). Embora não esteja totalmente esclarecida a relação entre hipocalcemia e paralisia

muscular flácida, os íons de Ca têm importância na condução do estímulo nervoso e nas

329

células musculares, bem como na transmissão do estímulo da placa motora terminal e na

contração muscular (Stöber, 2005). Os sinais clínicos ocorrem por mudanças no tono

neuromuscular, paralisia flácida e, eventualmente, coma. A maioria dos casos não

tratados morrem entre 1 a 2 dias (Houe et al., 2001; Risco, 2001b). Foi observado que a

paresia ou paralisia esteve associada com níveis de Ca plasmático inferiores a 4,0 ou 5,0

mg/dL (Oetzel, 1996; Risco, 2001a). Nem todas as vacas que sofrem HP desenvolvem os

sinais clínicos.

A HP causa um aumento significativo na incidência de outras enfermidades, tais como

mastite, retenção de placenta, deslocamento de abomaso, distocias e cetose, as quais

evidentemente agravam o BEN e atentam contra a vida produtiva da vaca (Corbellini,

2000). Além do mais, reduzem a capacidade das células do sistema imunitário em

resposta a estímulos contribuindo ao aumento de doenças infecciosas como mastite e

metrite (Reinhardt, 2011). A diminuição de Ca no sangue reduz a contratilidade muscular,

começando pela musculatura lisa (Corbellini, 2000), diminuindo consequentemente a

motilidade do rúmen e do abomaso, aumentando a incidência de deslocamento de

abomaso e reduzindo o consumo. A redução da contratilidade muscular também impede

o eficiente fechamento do mamilo, o que leva a aumentar a frequência de mastite

(Reinhardt, 2011).

Foram encontradas associações significativas calculadas pelo índice de OR (odd ratio)

entre HP e distocia de 6,5; retenção de placenta de 3,2; deslocamento de abomaso à

esquerda de 3,4; e metrite e cetose clínicas de 1,7 (Curtis et al., 1983; Oetzel, 1996; Risco,

2001a). Também se encontraram associações significativas entre HP e prolapso uterino,

cios silenciosos, cistos ovarianos e infertilidade (Houe et al., 2001; Risco, 2001a).

A produção de leite também se vê afetada. Assim, se encontrou que vacas com HP tiveram

uma redução na produção de leite entre 1,1 a 2,9 kg/dia (Houe et al., 2001), considerando

apenas o efeito direto, pois se fossem considerados os efeitos indiretos, a perda de leite

seria maior, por exemplo, efeitos por infecção do trato reprodutivo e alongamento do

período parto-concepção. O peso corporal também é afetado notando perdas de peso

consideráveis (Houe et al., 2001)

330

Prevenção da hipocalcemia

Muitos princípios de controle da HP têm sido descritos pela literatura nos últimos 50

anos, mas somente alguns têm sido aplicados a rebanhos comerciais (Thilsing et al.,

2002). Dentro deles podem ser mencionados: (a) Restrição da ingesta de Ca durante as

últimas semanas de gestação ou diminuição relativa por incremento do P (Contreras,

2002b; Thilsing et al., 2002). (b) Suplementação com sais aniônicos de forma a acidificar

a dieta durante as últimas semanas de gestação (Contreras, 2002b; Dishington, 1975;

Goff, 2008; Thilsing et al., 2002;). (c) Suplementação de Ca via oral ao redor do parto

(Bostedt & Bless, 1993; Dhiman & Sasidharan, 1998; Goff, 2008; Jonsson & Pehrson,

1970; Queen, 1993). (d) Combinação de tratamentos com dietas acidogênicas durante o

pré-parto e administração de CaCl2 pós-parto, obtendo maiores níveis séricos de Ca logo

após o parto (Afshar et al., 2018). (e) Administração de vitamina D ou metabolitos

análogos 2 a 5 dias antes do parto, tratamento que aumenta efetivamente a absorção de

Ca no intestino. Este tratamento não tem efeito se a vaca pare antes. Como nem sempre

é possível predizer o momento exato do parto, se deve desaconselhar a repetição do

tratamento pois implica o perigo de calcinose por hipervitaminose D₃ (Bostedt & Bless,

1993; Goff, 1989; Goff, 2008; Stöber, 2005).

Existem outras medidas de controle menos específicas e comuns para a prevenção da HP

que incluem algumas das seguintes práticas de manejo (Thilsing et al., 2002; Roche,

2003; Goff et al., 1989): controlar os níveis de Mg, K e Na durante o pré-parto, controlar

a condição corporal, controlar a ingesta de glicídeos durante o pré-parto, encurtar o

período seco, ordenhar durante o pré-parto, reduzir a ordenha no início da lactação e

administrar PTH.

Ingesta de magnésio

Rebanhos leiteiros com alta incidência de HP com frequência têm concentrações de Mg

sanguíneo abaixo do valor de referência durante o periparto (Venjakob 2017; De Garis &

Lean, 2009; Contreras 2002a; Bednarek et al., 2000; Wang et al., 1994). Existe

concorrência entre o Mg e o Ca para sua absorção no intestino e sua reabsorção nos

túbulos renais (Contreras, 2002a; Wang et al., 1994). Mais importante é que deficiência

de Mg pode diminuir a mobilização de Ca ósseo (Corbellini, 1998; Roche, 2003). Foi

331

observado que quando se alimentam vacas com 71 g de Mg/dia durante o período seco

existe maior mobilização de Ca ósseo que quando se alimentam com 17 g de Mg/dia

(Wang et al., 1994). À medida que se aprofunda no conhecimento da etiopatogenia da

HP, se desenvolvem métodos preventivos, geralmente encaminhados a aumentar de

forma mais rápida a disponibilidade de Ca sanguíneo, seja pelo incremento na taxa de

absorção intestinal ou seja pela mobilização óssea (Alonso, 1997).

Medidas profiláticas

Nas medidas preventivas tem que distinguir entre as farmacológicas (destinadas ao

indivíduo) e a adaptação à alimentação das vacas durante o pré-parto, a qual é efetiva

depois de um tempo prolongado, mas tem a vantagem de atuar sobre todas as vacas em

risco de sofrer HP (Stöber, 2005).

Algumas medidas profilácticas que podem ser mencionadas incluem as seguintes:

- Dietas com baixo conteúdo de Ca: As recomendações dietárias prévias ao parto têm por

objetivo preparar a vaca para que a homeostase do Ca funcione de forma ótima no início

da lactação. Com baixo fornecimento de Ca no pré-parto favorece-se a absorção ativa

intestinal e rápida liberação óssea (Contreras, 2002b; Goff & Horst, 1997; Goff et al.,

2004). Para isto, é necessário que a vaca consuma menos de 20 g de Ca/dia, o que com a

alimentação habitual é difícil (Stöber, 2005). A ingesta de Ca durante o pré-parto pode

ser restrita substituindo em parte ou totalmente a forragem de leguminosas na dieta por

forragem seca de gramíneas, silagem de milho e/ou concentrados, porém é difícil atingir

menos de 50 g/dia, o que não resulta efetivo para prevenir a HP (Oetzel, 1993).

- Dietas com baixa relação Ca/P: Em alguns países é comum a administração parenteral

de fósforo entre 60 a 45 dias antes do parto. A hipótese é que a HP pode ser prevenida

com a suplementação de fósforo e rações pobres em Ca no final da gestação (Manston,

1967). Isto estimularia a atividade da glândula paratireoide no período seco e prepararia

as vacas para a demanda de Ca após o parto. Inversamente, dietas ricas em Ca (entre 100

a 125 g/dia) no mesmo período, aumentam a incidência de HP, provavelmente por

diminuir a atividade da paratireoide. Deve enfatizar-se a importância da relação Ca/P

como preventivo do transtorno, menos do que as quantidades absolutas de cada mineral

separadamente (Rajaratne et al., 1994; Alonso, 1997). Contreras et al. (1996) e Roche et

332

al. (2013) estudaram perfis metabólicos em sistemas de pastoreio, encontrando que a

relação Ca/P é menor em vacas gestantes do que em vacas em lactação. Albornoz (2014)

observa que a relação Ca/P é variável conforme a estação do ano encontrando que, no

outono, a relação é menor em vacas gestantes (1,66 ± 0,31) do que em lactantes (1,92 ±

0,44) enquanto na primavera, a relação é maior em vacas gestantes (1,89 ± 0,45) do que

em lactantes (1,75 ± 0,42). Alguns autores opinam que a hipofosfatemia é a maior causa

de recidivas e pobres respostas na rotina de terapia para a HP clínica (Kojouri &

Karimzadeh, 2002). Recomenda-se para rebanhos leiteiros 0,42% de P na matéria seca

(MS) ingerida e uma relação Ca/P de 1,4 (Call et al., 1987; Gerloff et al., 1996). Também

é recomendado o fornecimento de 0,25% de Mg na MS ingerida (Albornoz, 2006).

- Uso do balanço iônico: Os organismos vivos devem manter a eletroneutralidade do

plasma, ou seja, que a soma dos cátions (carregados positivamente) devem equilibrar-se

com a de ânions (carregados negativamente). Este é o conceito básico do chamado

balanço cátion-ânion da dieta (BCAD), balanço eletrolítico da dieta, diferença cátion-

ânion da dieta (DCAD) ou diferença iônica (García, 1997). Os cátions Na+ e K+ e os

ânions Cl- e S= são os principais a levar em consideração ao avaliar o BCAD (García

1997; Goff et al., 2004). Uma dieta predominante em ânions é considerada acidogênica,

enquanto uma dieta predominante em cátiones é alcalogênica. Em uma dieta rica em Cl

e S, a redução do BCAD pode causar as seguintes mudanças fisiológicas: aumento na

concentração de H+ no sangue, diminuição na concentração de bicarbonato sanguíneo,

descenso do pH sanguíneo, redução do bicarbonato urinário, redução do pH urinário e

redução da ingesta de matéria seca (Charbonneau et al., 2006; Oetzel, 2000). Esses efeitos

são importantes na vaca seca, pois permitem a manipulação fisiológica da vaca através

de modificações dietéticas. O descenso do pH sanguíneo mobiliza Ca ósseo para

neutralizar a acidez (sai como carbonato de Ca), ao tempo que incrementa a absorção

intestinal de Ca, reduzindo a incidência do transtorno (García 1997; Oetzel 2002).

Trabalhos sugerem que o uso do BCAD resulta em: (a) diminuição dos casos clínicos de

HP (Chan et al., 2005; Charbonneau et al., 2006; Oetzel, 1993; Oetzel, 2002); (b)

incremento na produção de leite (Oetzel, 1993; Risco, 2001a); e (c) melhora no

desempenho reprodutivo (Oetzel, 1993a; Risco, 2001a). Outros trabalhos sugerem que

um BCAD menos positivo reduziria os níveis de K, o que aumentaria a absorção de Mg,

333

melhorando a capacidade das vacas para manter a homeostase do Ca (Roche, 2003). A

acidificação artificial da ração só é possível de forma limitada porque sua palatabilidade

diminui se o BCAD reduz mais de 300 mEq/kg MS de alimento. Deve evitar-se uma

diminuição da ingesta nesta fase crítica porque aumenta o risco de aumentar o BEN

(Stöber, 2005).

- Administração de géis de cálcio: Tem por objetivo normalizar a calcemia ao parto e

reduzir a concentração de ácidos graxos não esterificados e de beta-hidroxibutirato no

pós-parto (Corbellini, 2000). O cloreto de Ca (ClCa2) fornecido vários dias antes do parto

e por 1 a 2 dias após o parto deu resultados efetivos para diminuir a incidência de HP

clínica (Oetzel, 1993; Horst et al., 1997; Dhiman & Sasidharan, 1998; Stöber, 2005).

Também é usada uma pasta comercial de ClCa2 (54 g de Ca) fornecida antes do parto e

12 e 24 horas após o parto (Goff & Horst, 1994; Hernández, 1999). A incidência de HP

clínica e deslocamento de abomaso diminuíram significativamente (Oetzel, 1993). A

solução de ClCa2 e preparações de gel oferecem um produto muito solúvel com 36% de

Ca rapidamente absorbido (Horst et al.,1997). Entretanto, soluções e géis de ClCa2

possuem desvantagens, pois podem ser cáusticas e causar ulceração em boca, esófago e

mucosa digestiva (Goff & Horst, 1994; Goff et al., 2004; Oetzel, 1993; Thilsing et al.,

2002). O ClCa2 reduz o pH sanguíneo, o que pode ser benéfico no período do periparto

da vaca porque há um efeito aditivo de ânions na dieta pré-parto e, consequentemente,

preventivo da hipocalcemia, aumentando a sensibilidade dos tecidos ao PTH (Horst et

al., 1997). Contudo, doses orais excessivas de ClCa2 podem induzir acidose metabólica e

causar inapetência em um momento em que a ingesta de alimento já está comprometida

(Goff & Horst, 1993; Goff & Horst, 1994). Uma alternativa aos sais de Ca, é o propionato

de Ca, que é fornecido em um preparado de pasta espesso e pode aumentar o Ca

sanguíneo. Os efeitos de aumento da calcemia não são tão rápidos como com o ClCa2

mas a atividade do propionato de Ca é mais prolongada (Goff & Horst, 1994), não tem

efeito acidificante do pH sanguíneo (Goff & Horst, 1994) e serve como precursor

gliconeogénico diminuindo o BEN (Alonso, 1997; Corbellini, 2000; Goff, 2004). A

desvantagem é que tem apenas 21% de Ca, pelo que requer o fornecimento de grande

volume de preparado oral.

334

Perdas econômicas causadas pela hipocalcemia

Em países como Argentina e Chile, estima-se uma prevalência de HP em vacas de alta

produção entre 6 a 16% (Corbellini, 2000; Contreras, 2002b). Na Suécia, estima-se um

risco de incidência de 5 a 10% (Houe et al., 2001) enquanto nos EUA consideram-se

valores entre 5 a 9% do total de vacas leiteiras (Goff et al., 1989; Mulligan & Doherty,

2008; Wang et al., 1994). Estudos norte-americanos (Horst et al., 1997) concluem que a

HP é um transtorno que causa graves perdas econômicas fundamentalmente por causa de

custos de tratamento, mortes (15 a 30% dos animais são refratários a uma ou duas

aplicações parenterais de borogliconato de Ca) e complicações secundárias, como atonia

ruminal, perda de apetite, mastite clínica, retenção de placenta, metrite, degeneração e

necrose de células musculares (principalmente membros posteriores), e pneumonia por

aspiração (Corbellini, 1998), podendo reduzir a vida produtiva da vaca em 3,4 anos

(Alonso, 1997; Horst et al., 1997).

O custo médio por casos de HP foi estimado em U$334/vaca (Corbellini, 1998; Goff et

al., 2004; Horst et al., 1997). Este valor está baseado nos custos diretos associados com

tratamento de casos clínicos e com perda de produção. A presença de HP aumenta a

incidência de cetose, mastite, metrite, partos distócicos, deslocamento de abomaso,

prolapso uterino e retenção de placenta (Hernández et al., 1999; Horst et al., 1997; Risco,

1984). Pode-se afirmar que vacas afetadas de HP têm entre 3 a 9 vezes mais

possibilidades de sofrer outros distúrbios no periparto (Wang et al., 1994). O custo direto

por tratamentos da HP clínica em EUA tem sido estimado em U$15 milhões, enquanto

problemas secundários causados pela HP podem incrementar o custo anual da doença em

mais de U$120 milhões (Goff et al., 1989; Wang et al., 1994). A prevenção desta

enfermidade pode sem dúvida aumentar de grande maneira a rentabilidade da produção

leiteira (Wang et al., 1994).

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339

Impacto da nutrição na composição e qualidade do leite

Leopoldo Braz Los

O leite tem uma participação indispensável a alimentação humana, principalmente nos

primeiros anos de vida, fornecendo um balanço perfeito de macro e micronutrientes, como

proteínas de alta qualidade, carboidratos, gordura e sais minerais indispensáveis para o

crescimento, desenvolvimento e manutenção da saúde. A qualidade do leite como matéria

prima é um dos maiores requisitos para a consolidação da indústria de lácteos. O controle de

qualidade nas últimas décadas vem restringindo as adulterações do leite in natura como a

determinação de acidez, índice crioscópico e densidade. Segundo Chapaval (1999), um leite

de boa qualidade tem as seguintes características:

• Livre de microrganismos

• Baixa contagem de células somáticas

• Livre de sedimentos e materiais estranhos

• Sabor levemente adocicado e levemente aromático

• Livre de odores e aromas estranhos

• Estar de acordo com os padrões legais para os componentes.

Nos últimos anos os laticínios em vários países têm aplicado programas de melhorias de

qualidade nas fazendas, com medidas que asseguram a segurança da utilização do leite para

produtos lácteos. Essas práticas de produção devem assegurar que o leite seja produzido de

animais saudáveis, livre de resíduos e com sustentabilidade. Os pilares de um programa de

boas práticas de produção são: saúde animal, higiene de ordenha, alimentação animal, bem-

estar animal e ambiente.

Algumas indústrias de leite no Brasil já têm feito um sistema de pagamento pelo leite de

acordo com a qualidade, tanto em contagem de células somáticas e qualidade microbiológica,

quanto em sólidos do leite, como gordura e proteína que impactam diretamente no

rendimento industrial para a produção dos derivados do leite. Com isso a qualidade do leite,

340

não só o volume de leite tem sido o foco de trabalho pelo produtor porque influencia

diretamente na rentabilidade da atividade.

A quantidade e qualidade do leite produzido pela vaca depende de vários fatores como a

nutrição, raça, estágio de lactação, condição ambiental, saúde, técnica e frequência de

ordenha e seleção genética.

Os fatores nutricionais são os que podem ser controlados mais diretamente e que tem

respostas de prazo mais curto, mas que demandam de um conhecimento mais aprofundado

em manejo dos animais, metabolismo, fermentação ruminal e secreção do leite.

O programa nutricional adequado, o qual possui uma formulação e um manejo alimentar

adequado, proporciona além de um alto volume de leite produzido, um leite com qualidade

com altos níveis de sólidos de acordo com cada raça, os animais saudáveis sem problemas

metabólicos, permitindo que a vaca reproduza e persista no rebanho e tenha alta eficiência

de conversão dos alimentos em leite o que torna a atividade rentável ao produtor de leite.

Os principais componentes do leite são a gordura, a proteína e a lactose, que são sintetizadas

por células que estão nos alvéolos da glândula mamárias através de nutrientes que são

transportados pelo sangue.

Gordura do leite

A gordura do leite é componente que mais sofre variação, podendo variar de 2 a 3 pontos

percentuais. Em geral, é o componente com maior facilidade de manipulação pelo

nutricionista, mas multifatorial, onde a composição da dieta, manejo alimentar, conforto

animal, raças e caraterísticas individuais tem impacto relevante no conteúdo.

Os ácidos graxos de cadeia curta são produzidos no úbere a partir de ácidos graxos voláteis

de cadeia curta (VFA), principalmente acetato e butirato, produzidos a partir da fermentação

da fibra no rúmen. Além disso, alguns ácidos graxos de cadeia curta no leite são feitos de

beta-hidroxibutirato circulando na corrente sanguínea. Ácidos graxos de cadeia longa não

são produzidos no úbere, mas vêm dos ácidos graxos da dieta, dos microrganismos do rúmen

e da gordura corporal da vaca. Os ácidos graxos de cadeia mais longa no leite são extraídos

diretamente dos ácidos graxos circulantes no sangue. Os ácidos graxos de cadeia curta e

cadeia longa são combinados (cerca de 50/50) para formar a gordura do leite.

341

No rúmen cerca de 60 a 90% das ligações insaturadas de ácidos graxos das gorduras que

entram no rúmen via alimentação os microrganismos ruminais conseguem saturar. Ácidos

graxos totalmente saturados ou ácidos graxos monoinsaturados com configuração trans

(átomos de hidrogênio em ambos os lados da ligação dupla e não no mesmo lado da ligação

dupla, como na configuração cis) podem escapar do rúmen. Quantidades aumentadas desses

ácidos graxos trans no intestino estão correlacionadas com a baixa síndrome da gordura do

leite. A síntese mamária de gordura a partir de AGV de cadeia curta é inibida pelos ácidos

graxos trans que chegam à glândula mamária.

A quantidade de ácidos graxos trans que chegam ao intestino da vaca é influenciada por

vários fatores. Quando as vacas são alimentadas com dietas contendo grandes quantidades

de ácidos graxos insaturados disponíveis no rúmen, mais ácidos graxos trans escapam do

rúmen e chegam ao intestino. Vacas com acidose ruminal aumentam também a passagem de

ácidos graxos trans do rúmen. A diminuição na relação ruminal acetato: propionato

observada com a acidose ruminal é um sinal de alteração na fermentação ruminal, que

também aumenta a passagem ruminal de ácidos graxos trans e diminui a concentração de

gordura no leite.

A gordura do leite é totalmente dependente dos ácidos graxos de cadeia curta, ao redor da

metade da gordura do leite é feita a partir de ácidos graxos de cadeia curta, especificamente

acetato e butirato. Estes são feitos no rúmen a partir da fermentação das frações de fibra da

dieta. Uma boa fermentação da fibra se faz com alimentação forrageiras de alta

digestibilidade e subprodutos, controlando o pH do rúmen, controlando os níveis de gordura

disponível na dieta (< 5%) e fornecendo quantidades adequadas de nitrogênio e aminoácidos

no rúmen. Quando as gorduras alimentares são suplementadas para atender às necessidades

gerais de energia da vaca, sem extrapolar os limites, aumentam a síntese da gordura do leite,

aumentam a produção de leite, sem causar alterações no teor de gordura do leite.

Ácidos graxos insaturados disponíveis no rúmen vêm de fontes vegetais. Gorduras em

sementes inteiras, como soja integral e sementes de algodão inteiras, estão lentamente

disponíveis no rúmen. Esses ácidos graxos insaturados lentamente disponíveis geralmente

serão completamente alterados para ácidos graxos saturados antes de deixarem o rúmen. Mas

se o ambiente ruminal estiver comprometido ou se grandes quantidades de sementes forem

alimentadas, as gorduras podem sair do rúmen como ácidos graxos trans parcialmente

342

saturados que podem levar à depressão da gordura do leite. Se alimentar com óleos vegetais,

pode se esperar que alguns deles deixem o rúmen como ácidos graxos trans e potencialmente

causem impacto na síntese da gordura do leite.

Proteína do leite

A proteína do leite é um componente que sofre menor variação quando comparada à gordura,

também é multifatorial, e de difícil manipulação pelo nutricionista. A proteína do leite na

glândula mamária é sintetizada principalmente a partir de aminoácidos no sangue e são os

precursores primários usados para sintetizar a proteína do leite. Do nitrogênio total do leite,

aproximadamente 76% corresponde a caseína, 18% a proteínas do soro do leite e 6% de

nitrogênio não proteico. A produção de proteína é geralmente limitada pelo aminoácido que

tem o menor suprimento em relação à exigência da vaca. Esse aminoácido é chamado de

“primeiro aminoácido limitante”. É o elo perdido da cadeia de proteínas e, quando é usado,

a produção de proteínas é interrompida. A vaca recebe aminoácidos no intestino de duas

fontes primárias. Os microrganismos do rúmen fornecem 50 a 75% dos aminoácidos. Por

isso a energia contida na dieta pode limitar a síntese de proteína do leite, já que limita a

síntese de proteína microbiana, e a proteína não degradável no rúmen (proteína bypass)

fornece o restante. A eficiência da conversão do nitrogênio da dieta em proteína do leite pela

vaca é bastante baixa (25 a 30%).

A vaca usa muitos aminoácidos para a manutenção de seus sistemas vitais, como o

funcionamento do intestino, fígado e outros tecidos. Isso faz com que a proteína do leite seja

difícil de mudar nutricionalmente. Fazer o balanceamento de aminoácidos, em vez de

simplesmente utilizar as quantidades de aminoácidos individuais disponíveis para a produção

de proteínas na glândula mamária, é mais efetivo para o aumento da proteína do leite a

produção de proteína do leite.

O entendimento do uso de aminoácidos pelo nutricionista permite que se trabalhe com

precisão no equilíbrio das dietas para a melhora de proteína do leite. São necessárias mais

pesquisas para ajudar os nutricionistas a prever quanto de cada aminoácido será produzido

pelos microrganismos do rúmen, quanto que cada aminoácido passa pelo rúmen e é absorvido

no intestino delgado, e análises laboratoriais acessíveis para determinar o conteúdo de

aminoácido de cada ingrediente da dieta.

343

Estratégias para aumentar a proteína do leite

A fermentação em ruminantes é resultado de um processo evolutivo de características

anatômicas e simbióticas a qual permite que se utilize carboidratos estruturais como fontes

de energia e compostos nitrogenados não proteicos como fonte de proteína. O resultado da

fermentação são os ácidos graxos de cadeia curta, proteína microbiana, metano, dióxido de

carbono, vitaminas do complexo B e K, etc.

Maximizar a produção de proteína microbiana é fundamental numa estratégia de aumento de

proteína, o perfil de aminoácidos dos microrganismos é muito semelhante ao da proteína do

leite, fazendo com que sua proteína tenha alto potencial de conversão em proteína do leite.

Com isso o fornecimento de forragens de alta digestibilidade, maximizando o consumo de

matéria seca, evitando a acidose subclínica, fornecendo quantidades adequadas de proteína

solúvel e degradável, e sincronizando os carboidratos e proteínas disponíveis no rúmen de

hora em hora no rúmen é a principal estratégia de aumento de proteína no leite.

O pool de aminoácidos da proteína que é não degradável no rúmen também afetará a

produção de proteína do leite, mas este tem dependência de ingredientes que são utilizados

na dieta, já que cada um tem uma composição de aminoácidos específica e uma quantidade

de proteína que não é degradada no rúmen. O milho e seus subprodutos, tais como grãos de

destilaria e farelo de glúten de milho, são conhecidos por serem baixos em lisina. A soja é

conhecida por ser baixa em metionina. Há também aminoácidos de bypass (protegidos da

degradação ruminal) individuais que agora estão sendo incorporados nonas dietas. Os

aminoácidos que passam da degradação ruminal, devem fornecer um perfil de aminoácidos

que complemente a proteína microbiana produzida no rúmen. O objetivo é combinar as duas

fontes de aminoácidos para fazer um suprimento de aminoácidos intestinais semelhante ao

necessário para a produção de proteína do leite. Nas dietas características do Brasil, a

metionina é o aminoácido mais limitante devido ao perfil de concentrado utilizado para a

suplementação de proteína na dieta, o farelo de soja. Muitas vezes quando se trabalha com

outra fonte de concentrado para fazer o equilíbrio de aminoácidos, ao exemplo da utilização

de subprodutos de milho para suprir a deficiência de metionina na dietas com farelo de soja,

a redução de farelo de soja para a entrada destes na dieta causa uma deficiência de outro

aminoácido como neste caso a lisina, sendo desta forma na maioria das vezes necessário a

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correção com uma fonte de aminoácido bypass específico para o aminoácido limitante, para

não causar a deficiência. A maioria dos estudos com aminoácidos suplementares de bypass

aumenta o rendimento e proteína do leite.

O conteúdo energético da dieta energia é necessária para manter a produção e proteína do

leite. No início da lactação, o aumento da energia estimula a produção de leite e quantidade

proteína do leite produzida, com pouco efeito sobre a porcentagem de proteína no leite. Mais

tarde na lactação, a energia aumenta a concentração de proteína no leite até certo ponto. Parte

dessa resposta na proteína do leite pode ser devida à glicose e acetato extra disponíveis no

úbere, mas a energia adicionada pode causar mais um aumento na síntese de proteína

microbiana que aumenta a oferta de aminoácidos no úbere.

A alimentação de mais carboidratos disponíveis no rúmen pode aumentar a produção de

proteína do leite. A combinação da fermentação da energia ruminal combinada com as

frações proteicas também pode ser eficaz na melhoria da eficiência do nitrogênio. Existem

diferenças substanciais entre as fontes de amido e dentro dos grãos, devido ao processamento

nas taxas de liberação de energia no rúmen. Como exemplo, a digestibilidade ruminal do

amido diminui de 70% com o milho moído para 54% com o milho moído grosseiramente.

Além disso, tem sido demonstrado que a substituição de alguns dos amidos da dieta por

açúcares de fermentação rápida pode melhorar a captura ruminal de N para a produção de

proteína microbiana influenciando no teor de proteína do leite

A gordura na dieta em excesso diminui a produção de proteína do leite, mas a razão para isso

ainda não está clara. A substituição de gorduras por carboidratos no rúmen pode deprimir a

síntese de proteína microbiana e, assim, diminuir a quantidade de aminoácidos disponíveis

para a síntese. A gordura também pode inibir o crescimento de alguns microrganismos

diretamente. Alguns nutricionistas recomendam a adição de 1% a mais de proteína não

degradável no rúmen para cada 3% de gordura adicionada em uma dieta.

Ingestão de matéria seca

Promover o adequado consumo de matéria está relacionada à minimização do balanço

proteico e energético negativo durante o início da lactação, o qual aumenta a proporção de

gordura no leite. À medida que as vacas leiteiras passam para um balanço energético positivo,

345

o peso corporal é recuperado, a perda da condição corporal é minimizada e as vacas produzem

leite com composição normal de gordura e proteína.

As vacas leiteiras de alta produção devem ingerir de 3,6 a 4,0% do seu peso corporal

diariamente como matéria seca. Se um rebanho leiteiro está consumindo menos matéria seca

do que 3,6 a 4,0% do peso corporal, a produção de gordura do leite e componentes proteicos

pode ser limitada. O aumento da frequência de alimentação aumenta a gordura do leite e o

componente proteico, especialmente com dietas ricas em fibras e com alto teor de grãos, uma

maior resposta é observada em dietas com menos de 45% de forragem e quando o

concentrado é alimentado separadamente, como na alimentação de sala de ordenha. Quando

as dietas são alimentadas em dietas totais, a frequência de alimentação não é tão importante,

desde que a ração permaneça palatável e seja alimentada pelo menos uma vez ao dia.

Gerenciamento de alimentação

Qualquer manejo em que as vacas comam anormalmente ou limite a ingestão de alimentos,

pode afetar os componentes do leite. Os exemplos incluem: falta de espaço nos cochos, lote

de novilhas com vacas mais velhas ou acima da capacidade total das camas. As dietas que

favorecem a seleção de alimentos e alimentação com pouca frequência em um sistema

convencional (não dieta total misturada TMR) tem potencial de alterar a qualidade do leite,

assim como a alimentação de dieta total se não tiver o tamanho adequado de partículas, se

não tiver suficientes diminui a ruminação e com isso reduz o tamponamento via saliva e baixa

o pH ruminal diminuindo atividade de microrganismos que degradam a fibra dietética, e se

tiver partículas com tamanho maior que o recomendado podem favorecer a seleção de

ingredientes e o animais consumam mais concentrado que volumoso e favorecer a alteração

nos componentes do leite pela falta de ruminação e queda do pH ruminal. Alimentando-as

com ingredientes proteicos antes do fornecimento de enérgicos e alimentando os

concentrados antes da forragem em sistemas não TMR, todas essas práticas de manejo da

alimentação alteram os componentes do leite de vacas leiteiras. Outras condições que podem

alterar é a limitação no número de refeições por dia (uma ou duas refeições por dia versus 10

a 15) ou permitir que as vacas comam refeições de alto concentrado em parte do tempo e

altas refeições de forragem no resto do dia. Deve se assegurar de que a dieta fresca esteja

disponível 20 horas por dia, e que a ração estragada seja removida dos cochos. Conforto,

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sombra ou o resfriamento devem ser fornecidos durante os dias em estresse térmico para

ajudar a manter a ingestão normal e os padrões normais das refeições.

A dieta provavelmente é o fator que mais influência nos produtos finas da fermentação, no

número e proporção relativa das diferentes espécies ruminais, fazer as mudanças abruptas de

dietas fazem com que os microrganismos alterem seu balanço de fermentação, com isso abre

porta para microrganismos facultativos oportunistas dominarem a fermentação e como

exemplo através da produção de diferentes ácidos o abaixamento do pH ruminal causando

distúrbios metabólicos. Fazer a mudança gradualmente para permitir que o tempo dos

microrganismos do rúmen se adaptem e não ocorra distúrbios metabólicos e não diminua

produção de proteína microbiana no rúmen que pode reduzir a proteína do leite, e também

menor população microbiana para digerir a dieta, limita a produção de ácidos graxos de

cadeia curta no rúmen, diminuindo a produção de leite.

Um dos problemas mais comuns na mudança abrupta de dieta, é a acidose que ocorre quando

se muda de uma dieta rica em fibras para alta concentrado que é rica em carboidratos

fermentáveis (amido e açúcares). Grandes quantidades de amido e açúcar estimulam as

bactérias que produzem ácido láctico. Nesse caso, as bactérias que normalmente usam ácido

láctico não conseguem acompanhar a produção. A quantidade de acidez no rúmen é medida

por leituras de pH. Quando o pH do rúmen cai, a digestão de fibras é deprimida porque o

grupo de microrganismos que degradam a fibra são sensíveis a pH. Como os produtos da

digestão de fibras são usados para a síntese da gordura do leite, uma queda no teste da gordura

do leite é um indicio de acidose. Além disso, o acúmulo de ácido provoca um influxo de água

dos tecidos para o intestino e, portanto, um sinal comum de acidose é a diarreia. Se o pH do

rúmen diminuir e cair abaixo de 5,5 muitas outras bactérias ruminais também começam a ser

afetadas. À medida que o ácido láctico se acumula, é absorvido e diminui o pH do sangue.

Altos níveis de ácido também podem causar úlceras no rúmen resultando em infiltração de

bactérias no sangue que podem causar abscessos no fígado. A acidose subaguda também é

caracterizada por ingestão de cíclica porque os animais comem menos durante períodos de

sofrimento; então, se o rúmen se adaptar, seu apetite retorna.

Outros problemas comuns de acidose ocorrem em dietas em que a ingestão de fibra efetiva é

muito baixa, dietas formuladas com muito concentrado e pouca fibra efetiva, tamanho de

partícula abaixo do recomendado e dietas com problema de manejo alimentar onde os

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animais conseguem selecionar os ingredientes da dieta. Quando os animais não ruminam

normalmente, a falta de saliva, que contém um tampão natural, contribui para o baixo pH

ruminal. O tamanho adequado da partícula na dieta parece necessário para evitar a da gordura

do leite baixa. As vacas necessitam de fibra e forragem para estimular a atividade

mastigatória e a produção de saliva, sendo ambas necessárias para manter um pH ruminal

adequado e um rúmen sadio.

O uso de aditivos como o tamponante bicarbonato de sódio minimizam a queda de pH quando

é utilizado dietas com grandes quantidades de concentrados rapidamente fermentáveis que

produz excesso ácidos e os sistemas tamponantes, principalmente o fluxo salivar não são

suficientes. Isso permite manter ativas as bactérias que digerem a fibra não reduzindo assim

a quantidade de ácido acético produzido que faz com que não reduza a porcentagem de

gordura.

Recomendações

− Controle de carboidratos fermentáveis; amido< 28% (%dieta total)

− Relação concentrado:forragem< 55%

− Adaptação na mudança de dieta alta forragem para alta concentração

− Evitar teor de fibra na dieta; <30% FDN e <19% forragem NDF (% dieta total)

− Tempo de mistura de dieta total em excesso, redução excessiva de tamanho de partícula;

− Seleção de alimentos pela vaca; avaliar tamanho de partícula do fornecido: sobra;

− Uso de subprodutos fibrosos em substituição aos grãos;

− Aumento na frequência de alimentação;

− Uso de dieta total mistura;

− Utilização de tamponantes na dieta;

− Baixo teor de gordura insaturada na dieta;

Observar no rebanho sintomas de acidose:

• Teste de baixo teor de gordura no leite; <3,0 a 3,3%;

• Proteína baixa do leite;

• Consumo irregular;

• Diarreia;

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• Baixa ruminação (<50% das vacas deitadas não mastigando sua ruminação);

• Oscilação na produção de leite;

• Fezes inconsistentes no mesmo grupo de alimentação;

• Fezes espumosas, contém bolhas de gás;

• Aparência de mucina / fibrina nas fezes;

• Aumento do tamanho de partícula de fibra (> 1,0 cm) nas fezes;

• Aparência de grão não digerido, moído (≤ 0,4 cm) nas fezes;

• Eficiência de alimentação reduzida;

Conclusão

O planejamento nutricional de um rebanho pode otimizar a produção tanto de leite, mas como

componentes, mas o foco deve ser rotineiramente na produção de forragens, manejo

alimentar e nutrição. O aumento da produção de sólidos do leite são um indicado de melhor

saúde para os animais, além de aumentar o faturamento ao produtor com a venda do leite.

Referência

CHAPAVAL, L. Detecção de enterotoxinas produzidas por Staphylococcus aureus no leite bovino por

eletroforese capilar e identificação dos isolados enterotoxigênicos via PCR. 1999. 25f. Tese doutorado –

Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, Universidade de São Paulo, Piracicaba, 1999.