A competição gerada entre energia e bens alimentares provocada pelo desenvolvimento da produção...
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A COMPETIÇÃO GERADA ENTRE ENERGIA E BENS ALIMENTARES PROVOCADA PELO
DESENVOLVIMENTO DA PRODUÇÃO DOS BIOCOMBUSTÍVEIS
Ana Margarida BATISTA
Email: [email protected]
PALAVRAS CHAVE
Biocombustíveis; Produção de alimentos; Uso do Solo; Brasil; EUA
RESUMO
Actualmente, a produção de biocombustíveis à escala global ainda é reduzida, no entanto
aumentou significativamente na primeira década de 2000. Este aumento é apoiado pelo facto
de muitos países estabelecerem metas no intuito de substituir uma parte dos combustíveis
fósseis pelos biocombustíveis. Um dos aspectos mais controversos relacionado com os
biocombustíveis, é que a maioria das matérias-primas utilizadas na produção de
biocombustíveis são directamente ou indiretamente utilizadas na produção de alimentos.
Neste sentido, o presente artigo pretende analisar o conflito existente entre a produção de
energia e a produção de alimentos, incidindo, sobretudo no panorama dos dois principais
produtores de biocombustíveis do mundo: os EUA e o Brasil.
ABSTRACT
Currently, the production of biofuels on a global scale is still small, but increased significantly
in the 2000s. This increase is supported by the fact that many countries set goals in order to
replace fossil fuels by biofuels. One of the most controversial aspects related to biofuels, is
that most of the feedstock used in the production of biofuels are directly or indirectly used in
food production. In this sense, this paper analyzes the conflict between energy production
and food production, focusing mainly on overview of the two major producers of biofuels in
the world: the U.S. and Brazil.
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1. INTRODUÇÃO
Os biocombustíveis designam-se por combustíveis líquidos, sólidos ou gasosos derivados da
biomassa. A biomassa refere-se ao “material orgânico proveniente das plantas e animais”
(BCSD, n.d.). Diversas fontes de biomassa podem ser aproveitadas na produção de
bioenergia, tais como, alimentos, culturas energéticas e resíduos provenientes do sector
agrícola e florestal. Estas fontes podem ser convertidas a fim de gerarem eletricidade, calor
ou mesmo a produção combinada de calor e eletricidade, entre outras. Os biocombustíveis
podem ser classificados em função da origem e do tipo. Provêm da agroindústria e da
indústria alimentar e podem ser sólidos, como a lenha e o carvão vegetal; líquidos, como o
bioetanol (geralmente abreviado para etanol) e o biodiesel; e gasosos, como o biogás (FAO,
2008).
Na maioria da literatura, faz-se a distinção entre os biocombustíveis de primeira e segunda
geração. A primeira geração de biocombustíveis diz respeito aos combustíveis derivados de
matérias primas, pela sua constituição em açúcar, amido e óleo, podendo estes ser
convertidos utilizando tecnologias de hidrólise/fermentação e de prensagem/esterificação. A
segunda geração de biocombustíveis refere-se aos que são produzidos através de biomassa
lenho-celulósica de plantas herbáceas e perenes, através de tecnologias de
hidrólise/fermentação, gaseificação ou pirólise. Ainda não existe a produção industrial de
biocombustíveis a partir deste tipo de biomassa, mas está a ser desenvolvida uma
investigação que foca a produção em larga escala em particular nos Estados Unidos e Brasil
(BCSD, n.d.).
Ao longo deste artigo vai ser apresentada, numa primeira parte, uma contextualização mais
ampla da produção dos biocombustíveis a uma escala global, como também uma visão mais
restrita da posição dos EUA e do Brasil na indústria dos biocombustíveis. Numa segunda
parte pretende-se analisar com maior profundidade o conflito gerado entre a produção de
energia e a produção de alimentos nestes dois países, como já tinha sido referido
anteriormente. Para tal, recorreu-se a uma revisão de fontes bibliográficas que apresentam
um maior contributo para esta análise.
2- EMERGÊNCIA DOS BIOCOMBUSTÍVEIS NO CONTEXTO ENERGÉTICO GLOBAL
Diferentes fatores contribuem para o crescente interesse pelos biocombustíveis dos quais se
destacam a procura de fontes de energia que sejam determinantes na redução das emissões
de gases de efeito de estufa e a diminuição da dependência externa do petróleo. Este último
tem tido um especial enfoque, sobretudo após os grandes choques petrolíferos na década de
1970, que incentivaram por sua vez, os países importadores de petróleo a procurarem
alternativas para o elevado consumo dos combustíveis fósseis. Alguns países começaram a
desenvolver programas nacionais para a produção de biocombustíveis. É de salientar a
posição do Brasil pela elevada participação nesta indústria, em particular na produção do
etanol. A União Europeia também teve um papel importante nesta indústria, nomeadamente
na investigação do biodiesel.
3
Devido aos períodos alternados de alto e baixo preço do petróleo, durante o século XX,
dificultou-se a definição de uma nova política energética que levasse ao aumento e
diversidade de produtos alternativos e a questionar a predominância do petróleo. Ao longo
dos últimos anos, o elevado preço do petróleo voltou a pôr em causa o modelo energético
que tem vindo a ser seguido desde o primeiro choque petrolífero, em 1973 (SILVA, 2010).
Neste contexto tornou-se possível uma procura de outras fontes de energia, nomeadamente
aquelas que são baseadas em recursos renováveis, que possam complementar ou mesmo
substituir o petróleo. O consumo de biocombustíveis tem vindo a acelerar desde 2000. Em
2007 estima-se que a produção total de biocombustíveis atingiu os 62 biliões de litros, o que
equivale a 1,8% do consumo global dos combustíveis para transportes em termos
energéticos. A maior percentagem de biocombustíveis na procura dos combustíveis
alternativos para transportes em 2007 chegou aos 20% no Brasil e aos 3% nos EUA (fig 1)
(AJANOVIC, 2010).
Atualmente há dois países, Brasil e EUA, que representam quase 80% da produção mundial
de biocombustíveis. Ambos produzem maioritariamente bioetanol, no Brasil a partir de cana
de açúcar e nos EUA a partir do milho (WEC, 2010). Em termos globais, a produção mundial
de biocombustíveis encontra-se altamente concentrada, a de etanol no Brasil e Estados
Unidos, e a de biodiesel1 na União Europeia (SILVA, 2010).
1 Proveniente de outras oleaginosas como a soja e a colza.
Fig 1 : Percentagem de biocombustíveis no consumo de combustíveis rodoviários, 2007
Fonte: AJANOVIC, 2008
4
3- A POSIÇÃO DOS BIOCOMBUSTÍVEIS NO BRASIL
O Brasil tornou-se um dos maiores produtores de biocombustíveis do mundo com o
lançamento do Programa Nacional do Álcool (Proálcool) em 1975, cujo principal propósito
seria o de estimular a produção de álcool tanto no mercado interno como no externo. O
programa Proálcool divide-se em cinco fases (fig 2).
A primeira fase entre 1975 e 1979 foi caracterizada pelo grande esforço no aumento da
produção de álcool anídrico, a partir de melaço, a fim de misturar com a gasolina. Uma
segunda fase entre 1980 e 1986, foi caracterizada pelo segundo choque produzido pela
indústria petrolífera, em que o preço do petróleo atingiu os US$36 por barril. Em 1980 as
importações chegaram aos 46%, o que significa que a produção de álcool atingiu os 12
biliões de litros no final desta fase, produzindo assim mais 15% do que tinha ficado
estabelecido anteriormente. Durante esta fase a proporção de carros à base de álcool
aumentou de 0,46% em 1979 para 76,1% em 1986. Na terceira fase, chamada o período de
estagnação, entre 1986 e 1995, o cenário mundial do petróleo mudou. Os preços do petróleo
baixaram de US$40 por barril para US$15 por barril, o que pôs profundamente em causa o
desenvolvimento de combustíveis alternativos. No final do ano de 1995, o governo brasileiro
reconsiderou o programa Proálcool. Este foi o primeiro passo da quarta fase do programa, o
período de redefinição, que durou até ao ano de 2000. A quinta e a presente fase foi afetada
por dois choques da indústria petrolífera, os ataques terroristas nos EUA2 em 2001, e a
interrupção da produção Venezuelana. O cenário económico global entre 2004 e 2005,
relativamente ao preço do petróleo também foi determinante na implementação do
programa (COSTA et al., 2010).
2 Os ataques terroristas contra Nova Iorque e Washington em Setembro de 2001.
Fig 2: Evolução histórica da produção de álcool no Brasil e sua relação com as fases do Programa Proálcool
Fonte: Costa et al.(2010)
5
Após a implantação da primeira fase do programa Proálcool, o Brasil começou uma nova
expansão da produção de cana de açúcar com o objectivo de alargar a oferta dos
combustíveis em grande escala. A participação do Brasil na produção mundial da cana de
açúcar aumentou de 16% para 34% nos últimos 43 anos (COSTA et al., 2010). Nos últimos
anos, o Brasil tem apostado na investigação dos biocombustíveis como possíveis substitutos
da gasolina e do diesel, direcionando muitas vezes a pesquisa apenas em termos de
produção e equivalência energética, pondo de lado, os aspectos ambientais relacionados ao
seu uso. O uso do biodiesel como fonte de energia surge como uma nova aposta na
substituição do diesel, uma vez que permitirá a redução da dependência do sector de
transportes no que diz respeito ao petróleo e por ser um combustível limpo e ecologicamente
correto (SCHIRMER, et al., 2012).
Com a implementação do Programa Nacional de Produção e Uso de Biodiesel lançado pelo
governo federal em 2004, o governo brasileiro pretende, como medida principal, aumentar a
segurança energética do país. Não obstante de que o Brasil recentemente tenha alcançado a
autossuficiência na produção petrolífera, como também possui uma grande variedade de
matérias primas disponíveis para a produção de biodiesel, o país continua dependente das
importações com elevados custos, devido à procura doméstica do gasóleo, chegando aos 40
biliões de litros por ano. Além do gasóleo doméstico não ser suficiente para assistir à
procura, a qualidade do combustível é vista como muito pobre, com impactos negativos a
nível ambiental, sobretudo na poluição de ar, principalmente devido ao seu elevado teor em
enxofre em comparação com as normas europeias. A grande disponibilidade de etanol no
Brasil tem vindo a estimular a pesquisa da rota etílica3 para a produção do biodiesel, tirando
o lugar ao metanol. Apesar dos esforços feitos até à data, a maior parte de produção de
biodiesel no mundo ainda recorre ao metanol (LA ROVERE et al., 2011).
O Brasil é rico em vastas extensões de terras cultiváveis e a cana de açúcar tem uma
densidade energética muito elevada, fazendo com que seja um dos líderes mundiais
produtores de etanol, sendo apenas ultrapassado pelos Estados Unidos.
4- A POSIÇÃO DOS BIOCOMBUSTÍVEIS NOS ESTADOS UNIDOS
O interesse pelos biocombustíveis nos Estados Unidos surgiu no final da década de 1970,
quando a OPEP4 reduziu o fornecimento de petróleo bruto no mercado mundial e os preços
dos combustíveis fósseis aumentaram significativamente. Até 2006, o Brasil era o líder global
na produção de etanol, em grande parte devido à elevada eficiência da conversão da cana de
açúcar para etanol. No entanto, como resultado das políticas governamentais e do elevado
preço do petróleo, a produção de etanol nos Estados Unidos apresenta um importante
aumento, e hoje em dia ultrapassa a produção no Brasil. A subsidiação do etanol nos Estados
Unidos começou com a Lei da Política Energética em 1978 (HERTEL et al., 2008).
Nesse mesmo ano, iniciou-se uma forte colaboração entre o departamento da agricultura e a
agência para a protecção do ambiente e para o fomento de energia. Em 2006 foi
desenvolvido o Plano de Acção Nacional para os Biocombustíveis, tendo em conta a
3 Método de produção de Biodiesel etílico utilizando diversas fontes de oleaginosas 4 Organização dos Países exportadores de petróleo
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investigação que já está a ser desenvolvida para a segunda geração de biocombustíveis, com
o objectivo de tornar o etanol celulósico competitivo em 2012. Também há uma crescente
preocupação em incentivar a produção das culturas energéticas em espaços marginais
evitando desde modo a desflorestação e a conversão de terrenos agrícolas. Também se
desenvolveram planos de acção inseridos na política energética dos Estados Unidos, tais
como: o Energy Independence and securtity Act (2007); o Energy policy Act incluindo o
Renewable Fuel Standard (2005) e o Farm Security and Rural Investment Act (2002); a
criação da Iniciativa para a I&D em Biomassa (de 2002 a 2015) e o Plano de Acção Nacional
para os Biocombustíveis em 2006, como já foi referido (Adaptado de ESCÁRIA, 2008).
Segundo o Banco Mundial (WORLD BANK, 2008), existem nos Estados Unidos mais de 200
medidas de apoio aos biocombustíveis, que custam de US$ 5,5 biliões a US$ 7,3 biliões por
ano nos Estados Unidos, representando US$ 0.38 a US$ 0.49 por litro do equivalente ao
petróleo para o etanol. É importante referir que a produção de etanol nos Estados Unidos
baseia-se principalmente em milho. Em 2008, outras fontes de matéria prima têm sido
usadas para apenas 3% da produção total de etanol. A produção de biodiesel baseia-se
principalmente no óleo de soja, 82% e óleo de canola, como se pode constatar na figura 3
(AJANOVIC, 2008).
5- CONFLITOS ENTRE A PRODUÇÃO DE ENERGIA E A PRODUÇÃO DE ALIMENTOS
Este temática remete para a questão de partida proposta logo no início do artigo. Dentro
desta questão surgem diversas controvérsias, entre as quais se pretende destacar, a
expansão dos biocombustíveis no que diz respeito à produção e ao preço dos alimentos e a
alteração do uso do solo. A competição do uso do solo para a produção de alimentos e
combustíveis tem vindo a ser objeto de estudo de diferentes autores. Segundo Rathmann et
al. (2010), a produção de biocombustíveis tem uma dinâmica diferente no que toca aos
combustíveis fósseis, baseando-se na produção agrícola e onde a terra é o elemento
principal. O autor constata que desde 2005, verificou-se uma significativa intensificação da
produção agrícola para este efeito, em especial no Brasil e Estados Unidos. Inicialmente a
área de cultivo foi expandida para o milho e cana de açúcar, a fim de produzir etanol, e mais
Fig 3: Matérias primas usadas para a produção de biocombustíveis nos Estados Unidos Fonte: AJANOVIC, 2008
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tarde para a soja, para a produção de biodiesel. A mudança da soja para a cana de açúcar
no Brasil, e do trigo para o milho nos Estados Unidos, no passado pode ser observada como
a causa para o aumento dos preços e diminuição do stock destes produtos de base agrícola
(AJANOVIC, 2011). Segundo a FAO (2008), não há efetivamente uma competição do uso do
solo entre os alimentos e os combustíveis. É referido que a maioria das terras utilizadas para
a produção de biocombustíveis são marginais e que a competição tem vindo a ser mitigada
pelo contínuo aumento da produtividade agrícola.
No entanto, alguns autores referem que no caso do Brasil, a grande expansão da produção
de etanol ocorre ao lado da expansão da produção de soja sem ocorrer uma maior contração
na produção de alimentos (PINGALI et al., 2008). O mesmo não acontece com os Estados
Unidos, devido à redução da oferta de milho derivado do seu uso para a produção de etanol,
os stocks de milho tenderão a diminuir e o preço a aumentar.
Baseando-se num estudo da OCDE, os autores SHELDON e ROBERTS (2008), referem que o
Brasil precisa apenas de 3% da sua área arável para produzir 10% do consumo de
combustíveis de transporte, enquanto que para alcançarem a mesma meta os Estados
Unidos precisam de pelo menos 30% da sua área arável.
O contínuo aumento dos preços agrícolas devido à procura para biocombustíveis passou para
a frente da discussão de um potencial conflito entre alimentos e combustíveis. A quantidade
de grãos necessária para encher um tanque de um utilitário desportivo com etanol (240
quilos de milho para 100 litros de etanol) poderia alimentar uma pessoa por um ano, o que
torna mais real, a competição entre alimento e combustível (WORLD BANK, 2008).
6- ALTERAÇÃO NO USO DO SOLO
Não obstante de que os biocombustíveis apresentem uma oportunidade para a produção de
energias renováveis, a significativa alteração de uso do solo em prol da produção dos
biocombustíveis, poderá trazer impactos negativos ambientais, económicos e sociais.
GURGEL (2011), afirma que a elevada procura e produção de biocombustíveis têm sido
acompanhadas pela redução da área plantada de culturas agrícolas tradicionais e pela
pressão para a expansão da fronteira agrícola pela desflorestação e conversão de áreas
florestais nativas, como por exemplo, o cerrado5 no caso do Brasil.
De acordo com Fonseca (2008), a prática da monocultura da cana de açúcar produz efeitos
tremendamente desastrosos para os solos. O sistema radicular da cana de açúcar é muito
eficiente na extração de água do solo. Consequentemente é extraída a maior parte da água
existente nos micro poros do solo, ressecando-o e deixando-o em vias de desertificação.
Outro ponto recentemente abordado pela comunidade científica é o ILUC (Indirect Land Use
Change) e o LUC (Land Use Change). Referem-se sobretudo a áreas anteriormente ocupadas
por pastagens, entretanto substituídas por outra produção, como por exemplo a cana de
açúcar, movendo as áreas de pastagens para áreas de florestas nativas.
5 O cerrado é o segundo maior bioma brasileiro, superado apenas pela Amazónia. Corresponde a 21% do território brasileiro.
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As alterações diretas ou indiretas de uso do solo poderão estar na origem da desflorestação,
o que pode resultar no aumento das emissões dos gases de efeito de estufa (Adaptado de
PIAU, 2012).
A alteração direta do uso do solo (LUC) pode ser observada e medida como a conhecida
alteração do uso do solo (por exemplo, a conversão de pastagens no Brasil para a cana de
açúcar, de modo a responder ao aumento da procura pela cana de açúcar). A alteração
indireta do uso do solo (ILUC) não pode ser diretamente observada ou medida, uma vez que
esta alteração é baseada no impacto de uma atividade num dado local que indiretamente
provoca a alteração do uso do solo noutro local. Por exemplo o aumento do uso da beterraba
na Europa desencadeia um aumento na procura pelo açúcar extraído da cana de açúcar no
Brasil (ERNEST & YOUNG, 2011).
7- CONSIDERAÇÕES FINAIS
Fazendo um balanço das perspectivas abordadas ao longo deste artigo, relativamente à
produção dos biocombustíveis, os Estados Unidos seriam a pior alternativa no que diz
respeito à produção de etanol a partir do milho. Já o Brasil acaba por ser uma melhor
alternativa, uma vez que a produção do etanol é a partir da cana de açúcar, o que não traz
grandes riscos a nível de custos e de terras aráveis disponíveis. Num futuro próximo a
segunda geração de biocombustíveis seria a melhor alternativa, uma vez que a produção
resulta do uso da celulose, a partir de matéria vegetal. Esta alternativa ainda se encontra em
desenvolvimento, e é preciso ter em conta que estas tecnologia futuras não serão viáveis por
vários anos (WORLD BANK, 2008).
De facto, um dos aspectos mais preocupantes em relação aos biocombustíveis, é que um
grande aumento do preço do petróleo levaria a uma rápida expansão em larga escala dos
biocombustíveis, com efeitos adversos no fornecimento e no preço dos alimentos, visto que
cada vez mais terras são disponibilizadas para a produção de matérias primas dos
biocombustíveis. Embora a quantidade de terra destinada à produção de biocombustíveis
possa desencadear a redução das áreas disponíveis para a produção de alimentos, no
presente momento acaba por não ser considerado um conflito à escala global. A longo prazo,
a biomassa lenho-celulósica tenderá a tornar-se a principal fonte para a produção de
biocombustíveis. Segundo um estudo publicado na National Geographic em 2007, a segunda
geração de biocombustíveis, apresenta balanços líquidos de emissão de carbono superiores
aos de primeira geração, assim como também utilizam resíduos de culturas. Como
aproveitam todas as partes das plantas, acabam por ser compatíveis com a produção de
alimentos, como também produzem uma quantidade de energia maior por área,
necessitando assim de áreas menores, reduzindo os impactos ambientais.
A produção global de etanol como combustível em 2006 foi de aproximadamente 40 biliões
de litros. Dessa quantidade, aproximadamente 90% foi produzido pelo Brasil e pelos Estados
Unidos. No entanto o Brasil é o produtor de etanol mais competitivo e tem a maior
experiência historica na produção. A produção de biocombustíveis aumentou o preço da
matéria prima utilizada neles. O exemplo mais claro é o milho, onde o preço subiu mais de
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60%, entre 2005 e 2007. Este facto deve-se essencialmente ao programa americano de
etanol e aos stocks reduzidos nos principais países exportadores. Atualmente, é provável que
os preços das matérias primas abrandem a longo prazo, supondo que não haja outro grande
aumento no preço da energia (WORLD BANK, 2008).
Conclui-se que o aumento do preço dos alimentos observado nos últimos anos, está
relacionado com a procura e a expansão da produção de biocombustíveis, sendo em uma
escala bastante reduzida atribuída a responsabilidade aos biocombustíveis. Os Estados
Unidos poderão apresentar alguns conflitos, devido à contração da oferta do milho, e à
menor disponibilidade de terras aráveis para a produção equilibrada de energia e alimentos.
Já o Brasil, uma vez que possui uma extensa área de terras aráveis, terá margem para
ampliar a produção de biocombustíveis sem compremeter no entanto, as florestas nativas e
outros biomas com uma grande diversidade biológica.
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