A alma do cidadão: as abordagens de Max Weber e Michel Foucault sobre racionalidade e governo

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1 A alma do cidadão: as abordagens de Max Weber e Michel Foucault sobre racionalidade e governo 1 Colin Gordon 2 Tradução de Fabiana A. A. Jardim e Revisão técnica de Osvaldo López-Ruiz 3 São muitos os aspectos a partir dos quais se pode comparar os trabalhos de Michel Foucault e os de Max Weber: seus estudos sobre as formas de dominação e técnicas de disciplina, sua preocupação com o que Weber denominou “o poder da racionalidade sobre o homem”, seus escritos sobre metodologia e ética intelectual, o interesse de ambos por Nietzsche e os efeitos deste interesse na recepção crítica de seu pensamento. Na atual literatura sobre Foucault, frequentemente as referências a Weber ligam- se aos temas da racionalidade e da racionalização. Dessa maneira, Dreyfus e Rabinow escrevem que Foucault teria herdado de Weber “uma preocupação com a racionalização e objetificação como a tendência essencial de nossa cultura e o problema mais importante de nossos tempos” (1995, p.183). Por vezes, a comparação se liga a uma reprovação: Carlo Ginzburg vê no trabalho de Foucault uma visão “weberiana” da história, que reduziria tudo a “um mesmo processo de racionalização meta-histórico e meta-antropológico”. Repudiando tal caracterização, Foucault responde: Eu não acredito que podemos falar de “racionalização” em termos de algo dado, sem de um lado postular um valor inerente e absoluto à razão e de outro assumir o risco de aplicar o termo empiricamente de modo completamente arbitrário. Eu creio que devemos restringir o uso dessa palavra a um sentido instrumental e relativo (FOUCAULT, 1991: p.79). 1 Originalmente publicado em Sam Whimster and Scott Lasch (eds.) Max Weber, rationality and modernity. United Kingdom: Alen & Unwin, 1987, p.293-316. Com a permissão do autor. Há poucas diferenças em relação ao texto original, que se devem ao fato do autor nos ter enviado uma errata. Sempre que possível, fizemos as citações tendo como fonte a edição brasileira dos textos referidos. 2 Mestre em Filosofia pela Universidade de Oxford, responsável pela tradução e edição, em inglês, de pesquisas de Michel Foucault relacionadas ao poder e à cultura política no Ocidente. Notadamente, editou Power/Knowledge (1980), baseada na coletânea de textos que haviam aparecido na edição italiana da Microfísica do Poder, e coeditou, com Graham Burchell e Peter Miller, o volume The Foucault Effect: studies in governmentality (1991). 3 Fabiana Jardim é doutora em Sociologia (FFLCH-USP) e professora do Departamento de Filosofia da Educação e Ciências da Educação na Faculdade de Educação USP. Osvaldo López-Ruiz é doutor em Sociologia (IFCH-Unicamp) e pesquisador do Consejo Nacional de Investigaciones Cientificas y Técnicas (Conicet) Argentina. Ambos dividem a coordenação do Grupo de Pesquisadores sobre Governo, Ética e Subjetividade (GES).

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1

A alma do cidadão: as abordagens de Max Weber e Michel Foucault sobre

racionalidade e governo1

Colin Gordon2

Tradução de Fabiana A. A. Jardim e Revisão técnica de Osvaldo López-Ruiz3

São muitos os aspectos a partir dos quais se pode comparar os trabalhos de Michel

Foucault e os de Max Weber: seus estudos sobre as formas de dominação e técnicas de

disciplina, sua preocupação com o que Weber denominou “o poder da racionalidade

sobre o homem”, seus escritos sobre metodologia e ética intelectual, o interesse de

ambos por Nietzsche – e os efeitos deste interesse na recepção crítica de seu

pensamento.

Na atual literatura sobre Foucault, frequentemente as referências a Weber ligam-

se aos temas da racionalidade e da racionalização. Dessa maneira, Dreyfus e Rabinow

escrevem que Foucault teria herdado de Weber “uma preocupação com a racionalização

e objetificação como a tendência essencial de nossa cultura e o problema mais

importante de nossos tempos” (1995, p.183). Por vezes, a comparação se liga a uma

reprovação: Carlo Ginzburg vê no trabalho de Foucault uma visão “weberiana” da

história, que reduziria tudo a “um mesmo processo de racionalização meta-histórico e

meta-antropológico”. Repudiando tal caracterização, Foucault responde:

Eu não acredito que podemos falar de “racionalização” em termos de algo

dado, sem – de um lado – postular um valor inerente e absoluto à razão e –

de outro – assumir o risco de aplicar o termo empiricamente de modo

completamente arbitrário. Eu creio que devemos restringir o uso dessa

palavra a um sentido instrumental e relativo (FOUCAULT, 1991: p.79).

1 Originalmente publicado em Sam Whimster and Scott Lasch (eds.) Max Weber, rationality and

modernity. United Kingdom: Alen & Unwin, 1987, p.293-316. Com a permissão do autor. Há poucas

diferenças em relação ao texto original, que se devem ao fato do autor nos ter enviado uma errata. Sempre

que possível, fizemos as citações tendo como fonte a edição brasileira dos textos referidos. 2 Mestre em Filosofia pela Universidade de Oxford, responsável pela tradução e edição, em inglês, de

pesquisas de Michel Foucault relacionadas ao poder e à cultura política no Ocidente. Notadamente, editou

Power/Knowledge (1980), baseada na coletânea de textos que haviam aparecido na edição italiana da

Microfísica do Poder, e coeditou, com Graham Burchell e Peter Miller, o volume The Foucault Effect:

studies in governmentality (1991). 3 Fabiana Jardim é doutora em Sociologia (FFLCH-USP) e professora do Departamento de Filosofia da

Educação e Ciências da Educação na Faculdade de Educação – USP. Osvaldo López-Ruiz é doutor em

Sociologia (IFCH-Unicamp) e pesquisador do Consejo Nacional de Investigaciones Cientificas y

Técnicas (Conicet) – Argentina. Ambos dividem a coordenação do Grupo de Pesquisadores sobre

Governo, Ética e Subjetividade (GES).

2

Barry Smart (1983: p.138-9), a exemplo de Dreyfus e Rabinow, toma tal resposta

como deixa para realizar uma distinção aguda entre Weber e Foucault: Weber veria a

racionalização como um processo geral, global e inexorável no mundo moderno,

enquanto Foucault insistiria numa abordagem muito mais diferenciada, pluralista e

cética.

O fato, entretanto, é que Weber é tão inocente quanto Foucault do

“weberianismo” que adota uma concepção uniforme e monolítica do fenômeno histórico

da racionalização. Mas pode-se fazer justiça à Foucault sem necessidade de difamar

Weber; além disso, uma compreensão mais justa de Weber pode oferecer uma maneira

muito mais enriquecedora de considerar os problemas colocados por Foucault de forma

nova. O próprio Foucault se absteve de qualquer crítica direta a Weber; de fato, suas

observações citadas acima não poderiam estar mais próximas em espírito das repetidas,

proeminentes e enfáticas afirmações de Weber em relação ao mesmo assunto: “Temos

de lembrar-nos [...] que ‘racionalismo’ pode significar coisas bem diferentes” (1971b: p.

337);

[...] a história do racionalismo de modo algum acusa um

desenvolvimento com avanço paralelo nas várias esferas da vida. [...]

Pode-se mesmo [– e esta simples sentença, tantas vezes esquecida,

caberia figurar na epígrafe de todo estudo que trate do

“racionalismo”–] “racionalizar” a vida de pontos de vista últimos

extremamente diversos e nas mais diversas direções. O “racionalismo”

é um conceito histórico que encerra um mundo de contradições [...]”

(2004:p.68-9).

Muitos sociólogos e comentadores de Weber parecem imaginar que todas essas

distinções, no que toca a Weber, aplainaram-se com o avanço moderno da burocracia.

Ainda assim, é fácil verificar que Weber realmente atribui importância vital ao

reconhecimento das diferenças, duradouras e intrínsecas, entre o estilo de racionalidade

próprio do funcionário burocrático e aquele de empresários ou políticos.

Isso ainda deixa aberta a questão de como, e quanto, o problema da

racionalização determina globalmente os temas e intenções da obra incompleta de

Weber. Uma resposta laboriosamente argumentada foi oferecida por Wolfgang

Schluchter, que interpreta as várias comparações entre diferentes formas e instâncias de

racionalização empreendidas por Weber como episódios em direção a uma integrada

sociologia do desenvolvimento da história mundial. Talvez o maior entrave a tal

proposição seja sugerido pelas observações de Weber citadas acima, se as tomamos

como incitações não apenas a uma abordagem comparativa entre diferentes fenômenos

3

de racionalização, mas também como uma dúvida em relação a se os diferentes campos-

problemas históricos nos quais as questões sobre racionalização se colocam podem ser

fundidos, de modo produtivo, sob os auspícios de uma única teoria abrangente.

Nessa segunda possibilidade parece se encontrar a perspectiva de Foucault. Nela

também se encontra a visada tomada por Wilhelm Hennis em vigorosa crítica da versão

de Schluchter sobre o tema de Weber como um “processo histórico-universal de

racionalização”:

Conquanto o problema da racionalização pudesse ser central para

Weber, ele deve ser localizado em um contexto muito mais geral se

for tratado como chave para sua obra – um contexto em que o motivo

para que essa questão seja tão importante para Weber se tornará

evidente [...] Enxergar o processo de racionalização como tema

fundamental de Weber não é incorreto. Porém, como é óbvio no

estado da arte da pesquisa em Weber, é enganoso ler tudo nesses

termos e enxergá-lo em todos os lugares (HENNIS, 1983: p.138).

A leitura de Hennis sobre Weber é, a seu modo, não menos sistemática,

comprometida e focada que a de Schluchter. Ainda que sua perspectiva pareça estranha

a muitos sociólogos, seus artigos recentes sobre Weber devem certamente ser contados

entre as contribuições mais estimulantes para discussões sobre Weber em muitos anos.

A Lebensführung, a conduta de vida, e suas formas de racionalização representam para

Hennis o objeto mesmo da sociologia de Weber.

Tal alegação envolve três proposições sobre a obra de Weber, interligadas.

Primeiro, boa parte do trabalho de Weber – segundo Hennis, o quinhão mais importante

– toma a condução da vida como seu tema imediato e principal. Entre tais escritos,

Hennis está plenamente justificado em incluir o ensaio mais famoso de Weber, A ética

protestante e o “espírito” do capitalismo, no qual se trata da “condução metódica da

vida” instilada pelo Calvinismo4. De modo mais abrangente, Hennis cita o particular

interesse na “racionalização da Lebensführung”, que Weber declara na “Introdução” à

“Ética econômica das religiões mundiais”5. Em segundo lugar, Hennis vê a

Lebensführung como um princípio que inspira e ilumina a metodologia dos principais

trabalhos de Weber, particularmente Economia e Sociedade, onde a “arena” sociológica

“de poderes normativos e de facto” é vista e avaliada em termos das influências dessas

forças coletivas nas condutas de vida individuais. Em terceiro lugar, a Lebensführung é

o critério de valor ético fundamental nas reflexões de Weber sobre o futuro da

4 Weber (2004), (N.T.).

5 Weber (2006), (N.R.T.).

4

humanidade (Menschentum). Considerando o destino das sociedades modernas, a

preocupação principal de Weber reside na sobrevivência do “caráter” ou da

“personalidade” em cuja condução da vida reúnem-se racionalismo pragmático e

seriedade ética. Hennis argumenta apaixonadamente e com impressionante riqueza de

evidências documentais que o coração da sociologia de Weber consiste numa

antropologia moral que está profundamente em desacordo com as tendências

positivistas das ciências humanas no século atual.

Do final dos 1970 até sua morte, em 1984, o trabalho de Foucault se

movimentou em direções marcadamente consoantes com aquelas presentes nos

comentários de Hennis. Os últimos volumes da História da Sexualidade estão bastante

interessados na descrição da “Lebensführung metódica” praticada na Antiguidade tardia.

Paralelo às técnicas de saber e poder, Foucault agora propõe o estudo das “tecnologias

do eu”, das práticas culturais dedicadas à formação e transformação do eu pelo eu. Em

seus primeiros livros, a questão de “como os seres humanos se transformam em

sujeitos” havia sido explorada em termos dos efeitos heterônomos do poder. Naquele

momento, a subjetivação foi investigada como sujeição; agora, é investigada em

culturas em que a autonomia pessoal é pregada como condição de liberdade (embora a

liberdade de poucos – homens, privilegiados e dominantes). Provavelmente, não é

coincidência que, ao final de sua vida, Foucault tenha feito indicações no sentido da

crescente importância contemporânea de Weber, e que se diz que ele se interessou

particularmente pela sociologia da religião weberiana; o que o teria interessado aí é um

tema que poderia render um estudo mais detalhado.

Esse é apenas um dos aspectos dos últimos trabalhos de Foucault. Um outro é de

ainda maior relevância para nosso tema. Em seus cursos de 1978 e 1979, Foucault

começou a esboçar um deslocamento da prévia orientação “microfísica” – nos termos de

estudos de racionalidades e estruturas de poder individualizantes, particulares e

regionais – na direção de uma “macrofísica”, o estudo do exercício do poder na escala

de toda a sociedade e das populações6. A rubrica sob a qual Foucault propôs organizar

6 Foucault não chegou a transformar os documentos utilizados nesses cursos em uma versão estendida

para publicação. Alguns fragmentos apareceram (1979a; 1981; 1982; 1984) [Em 2004, ambos os cursos

completos foram publicados em francês, tendo aparecido em português em 2008: Segurança, Território,

População: São Paulo, Martins Fontes, 2008 e Nascimento da Biopolítica. São Paulo: Martins Fontes,

2008. N.T.]. Sobre o Cameralismo, ver também Pasquino (1978; 1982) e Tribe (1984). Esses últimos

contêm balanços da literatura; importante material complementar pode ser encontrado em Brunner (1968)

e Oestreich (1983). De modo mais amplo, Burchell et al. (1986) oferecem uma amostra e seleção de

trabalhos relacionados, de autoria de Foucault e de outros. Até bem perto de sua morte, Foucault esteve

5

essas novas análises foi a da “racionalidade governamental”. Ainda que essa pesquisa

lidasse principalmente com a Europa moderna desde o século XVI, ela guardava

importantes relações com as preocupações que orientavam seus estudos sobre a

sexualidade naqueles mesmos anos. Foucault nota que o crescimento da reflexão

explícita sobre a “arte de governar” nos primeiros tempos do período moderno foi

acompanhado por uma noção, conscientemente elaborada, da conexão interna entre, de

um lado, o governo de si, a condução da existência individual e, de outro lado, o

governo dos outros, a regulação das vidas de muitos. O interesse neo-estoico, no século

XVI, em uma nova cultura de si – do auto-conhecimento, do auto-domínio, da auto-

formação – torna-se, como já foi demonstrado por Gerhard Oestreich (1983), parte

importante constitutiva das pedagogias e técnicas políticas dos primórdios do Estado

moderno. A noção de governo ocupa um espaço nodal nos últimos trabalhos de

Foucault, por duas razões: porque ela designa uma continuidade entre os níveis micro e

macro da análise política, e porque ela abarca a interface entre o exercício de poder e o

exercício de liberdade.

Foucault define “governo” como la conduite de la conduite, (“a condução das

condutas”) – uma sentença que não poderia soar mais weberiana; ela provavelmente

seria melhor formulada em alemão como die Fürhrung der Lebensfürhrung. E ainda

assim, em nenhum lugar entre as incontáveis discussões de Weber sobre racionalismo e

racionalização (nem, tanto quanto pude averiguar, em nenhum autor anterior a Foucault)

pode-se encontrar o termo “racionalidade governamental”. Mesmo quando descontadas

as ilusões do olhar retrospectivo, [essa ausência] parece um fato surpreendente ou ao

menos intrigante. Talvez algo possa ser aprendido a partir de uma tentativa de explicá-

la.

Foucault: Racionalidade Governamental

A abordagem de Foucault em relação à racionalidade governamental ou, em seu

próprio neologismo, “governamentalidade” (um termo que poderíamos também

desdobrar, no vocabulário de Lucien Febvre, em “mentalidade de governo”) combina

um conjunto de inovações em vários níveis distintos. Ela compreende uma tese histórica

substantiva; uma perspectiva distinta para a pesquisa; uma exposição de trechos

relativamente não comuns de documentos históricos; um quadro novo e mais

engajado em planos para uma obra coletiva sobre racionalidades governamentais (Gandall e Kotkin,

1985).

6

abrangente para seus próprios estudos anteriores; e, por último, mas não menos

importante, um desafio a alguns hábitos contemporâneos de reflexão política e crítica.

Tentarei esboçar aqui as linhas gerais de cada uma dessas proposições.

(1) A tese histórica principal de Foucault é que seria um traço distintivo das

sociedades modernas e do Estado moderno a tentativa de integração de dois estilos

contrastantes de relação de poder coletivo: o modo da polis, estruturado de acordo com

os princípios da universalidade, lei, cidadania e vida pública, e o modo a que Foucault

nomeia “poder pastoral”, que – ao contrário [do anterior] – concede prioridade absoluta

à orientação exaustiva e individualizada das existências singulares. O Estado moderno

é, para Foucault, um mecanismo a um só tempo de individualização e de totalização.

Sua exploração do aspecto individualizante das racionalidades de governo dedica-se a

temas que são frequentemente evocados por Weber – embora geralmente de passagem;

ela aponta na direção de conexões sistemáticas entre racionalidade e a Lebensführung de

um modo que, em geral, permanece apenas implícito nos escritos de Weber.

(2) Como vimos, a maneira de Foucault abordar essas questões visa estender e

complementar a “microfísica do poder”, que foi posta em prática em Vigiar e Punir, por

meio da adição de uma análise “macrofísica” das práticas que têm como foco não a

administração de indivíduos, mas de populações. Práticas, mais que instituições,

continuam sendo o principal objeto de investigação. Para compreender o que é o Estado

moderno, é preciso olhar primeiro para as práticas de governo, assim como o

nascimento das prisões deve ser explicado por meio de uma história das práticas de

punição e disciplina. Outro traço comum é a atenção conferida à reconstrução de

estratégias e programas explícitos, refletidos, articulados. Em seus últimos livros,

Foucault reitera tal ponto descrevendo seu próprio trabalho como o estudo de

problematizações, isto é, dos modos a partir dos quais os seres humanos concebem e

dirigem-se a si mesmos e aos diferentes aspectos de sua existência individual e coletiva

como problemas. Neste caso, as reconstruções arqueológicas de Foucault pretendem

focar a atenção nos registros históricos da problematização do governo, das questões de

como e o que governar, de como o governo é possível, dos princípios essenciais da “arte

de governar”. Foucault não está dizendo nem aqui nem em lugar algum que não há

realidade senão aquela do discurso. Mas ele está, aqui como em outros lugares,

insistindo acerca da necessidade de um certo tipo de nominalismo histórico; economia e

sociedade, os objetos modernos do governo, são entidades cuja própria inteligibilidade

depende de modos de codificar e articular o real que precisaram ser inventados. Ele está

7

afirmando que esses objetos de governo têm pré-condições materiais e conceituais

particulares, que dependem de conhecimentos, técnicas e competências específicos para

existir e funcionar.

(3) O campo de dados históricos ao qual Foucault aplica esses princípios de

método para obter um efeito especialmente significativo raramente recebeu a apreciação

adequada e estratégica que lhe é devida, ainda que certamente não tenha sido

desconhecido a outros estudiosos. Este campo consiste na doutrina, pedagogia e práticas

administrativas conhecidas, pela parte germanófona da Europa nos inícios dos tempos

modernos7, como Cameralismo ou a “ciência da polícia” (Polizeiwissenschaft). Foucault

e seu colega de pesquisa, Pasquale Pasquino argumentam que as ideias Cameralistas

representam a primeira forma existente de um modo moderno de problematização

política cuja história frequentemente tem sido subestimada (pelas teorias de legitimação

política e métodos para a retenção do poder soberano). [O Cameralismo representa],

especialmente, [um modo de problematização política] de princípios coerentes de uma

prática de governo. O Cameralismo é, em outras palavras, a primeira racionalidade de

governo explícita e sistemática. Refletir sobre a razão de Estado foi, Foucault

argumenta, a primeira forma moderna de pensamento político a postular a racionalidade

de governo como algo específico, intrínseco e autonomamente próprio ao Estado; a

razão de Estado é par excellence uma razão diversa e distinta da ordenação geral e

divina do cosmos.

A ciência da polícia representa, por sua vez, a primeira tentativa de dotar de

conteúdo substancial e coerente essa forma de conhecimento postulada. Ela identifica o

Estado a “todo o corpo social” e liga seu objetivo, a “felicidade” do Estado, à

“felicidade” e bem-estar de seus sujeitos individuais – a felicidade de “todos e cada um”

(Foucault, 1981; Pasquino, 1982). A força do Estado repousa nas vidas de seus sujeitos

e em sua ordem, obediência e indústria. O Cameralismo tem sido comumente confinado

à pré-história da ciência econômica, suas ideias supostamente relegadas ao arcaísmo a

partir do triunfo do liberalismo, da economia política e do mercado. Porém o advento do

liberalismo não liquida o problema do governo. O liberalismo, em realidade transforma

as técnicas de segurança herdadas, em grande parte da Europa, do Estado policial. Mas

essa história, que abarca a genealogia do Estado de Bem-Estar, está atravessada por

continuidades e descontinuidades.

7 No original: “early modern German-speaking world” (N.T.).

8

(4) Essa concepção de uma história das racionalidades de governo tem

correlações e precedentes complexos nas histórias regionais das práticas de

normalização perseguidas por Foucault em seus primeiros livros. O hôpitaux généraux

examinado na História da Loucura, as instituições de internamento do ancien régime,

são instrumentos da arte de governo policial. O Panóptico de Bentham examinado em

Vigiar e Punir, é um teorema liberal de segurança política. Aqui a consagrada afirmação

marxista de que os estudos de Foucault evitam investigar o Estado cai por terra; o que,

ao contrário, torna-se mais evidente é o modo pelo qual um gênero monótono e

empobrecido do que é chamado de “teoria do Estado” obstruiu qualquer consideração

adequada do que o Estado faz, da verdadeira natureza e lógica da atividade

governamental. Um ponto de conexão particularmente importante conduz dessa

perspectiva de análises ao tema abordado e formulado como “biopolítica”, na História

da Sexualidade I. Biopolítica deveria ser entendido como o fenômeno por meio do qual

a vida coletiva e individual das populações humanas, ou até mesmo da espécie humana,

torna-se objeto explícito das práticas de governo. Leituras pejorativas e restritivas desse

último tema podem agora ser mais facilmente rejeitadas. O que está em questão aqui

não é somente o tema de um totalitarismo eugênico latente ou de um racismo de Estado.

Igualmente implicada está a direção das mutações das instituições de bem-estar

social que desenvolvem a ambição de um tipo de economia política que aspira a levar

em conta todos os aspectos da vida individual, e não apenas aquelas relacionadas à

atividade econômica em sentido estrito. A formação e o aumento do capital humano, o

custo e o valor das vidas para os indivíduos e o Estado tornam-se medidas de cálculo

político. Nessa perspectiva, é extremamente fácil compreender por que o ressurgimento

da discussão ética, e uma demanda pública e até mesmo institucional por conhecimentos

especializados a respeito da ética, tornou-se um aspecto notável do cenário

contemporâneo. É mais fácil, também, entender nesses termos por que alguns temas

weberianos estão atraindo atenção renovada.

(5) O desafio que finalmente emerge – de modo silencioso, mas crescentemente

notável – dessa parte do trabalho de Foucault é a tomada de consciência de que o que

tem aparecido como nova forma de política radical pode, em aspectos vitais, na verdade,

ser encontrado em relação de atraso aos nossos tempos. O próprio Foucault estava

celebrando essa nova política, como resposta à invasão moderna da “biopolítica”

governamental, quando escreveu no último capítulo de sua História da Sexualidade I:

“Pouco importa que se trate ou não de utopia; temos aí um processo bem real de luta; a

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vida como objeto político foi de algum modo tomada ao pé da letra e voltada contra o

sistema que tentava controlá-la” (FOUCAULT, 1988: p.136). Por que, então, as novas

forças que dão corpo a esta escolha foram de tão pouca utilidade à esquerda política ao

longo da última década? Parte da resposta pode estar no fato de que este tema radical do

que podemos chamar de autogoverno de si despontou em conjunto com a re-emergência

do tema do governo tout court. Este tema não foi introduzido pela Esquerda e encontrou

a Esquerda intelectualmente desarmada e despreparada. Os governos neoliberais de

Schmidt, Barre/Giscard e Thatcher, por sua vez, foram todos bem sucedidos em reverter

para sua própria vantagem a configuração do terreno político e capturar para si mesmos

uma poderosa iniciativa de polêmica. Eles foram bem sucedidos por meio de uma

estratégia que empurra a questão do governo para o centro da disputa eleitoral,

afirmando a seriedade e o realismo superiores de sua própria abordagem dessas

questões, e acoplando sua visão de um estilo de governo a um modelo correspondente

de cidadania socioeconômica. Aqui, certa ideia de empreendimento de governo

promove e capitaliza sobre uma concepção – amplamente difundida – da

individualidade como empresa, da pessoa como empreendedora de si mesma. O tema de

uma Lebensführung capitalista reaparece aqui não apenas como estratagema ideológico,

mas como correlato de modificações reais de instituições e práticas, existências e

mentalidades. Tais fenômenos são frequentemente referidos sob a rubrica de “crise do

Estado de Bem-Estar”, um termo que, convenientemente, possibilita que sejam

convertidos em material para o modo habitual das críticas de esquerda ao Estado. Mas

tal estilo de análise tende a reconhecer mal o que poderia ser mais adequadamente

compreendido como uma crise, ou pelo menos como um período de uma mais profunda

mutação na racionalidade governamental.

Weber: Razão de Estado Liberal

O que Weber teria pensado de tudo isso? Como vimos, a maneira com que

Foucault descreve a “racionalidade governamental” como objeto distinto de estudos

históricos está associada a uma perspectiva cronológica que relativiza o limiar entre as

épocas pré-liberais e liberais de governo, e concede uma nova proeminência às práticas

do Cameralismo. Das poucas referências que Weber, decepcionantemente, fez a este

último tópico, emerge uma atitude que se encontra muito mais próxima que a de

Foucault das visões convencionais da economia política e da historiografia, assim como

das visões liberais prevalecentes em sua época. Indubitavelmente, também é uma

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atitude marcada pela consciência de viver em uma sociedade que mantém muitos dos

traços do Polizei e Obrigkeitsstaat8 Cameralista. A perspectiva de Weber sobre este

assunto é uma área pouco desenvolvida e relativamente difusa no interior de seu

panorama sóciohistórico global. Isso se explica, em parte, por certa falta de coesão entre

as diversas maneiras com que Weber conceituou o fenômeno da racionalização e talvez,

também em parte, por sua dependência residual da formulação de certos aspectos dessa

questão na auto-imagem histórica oficial da economia política. É provável que não seja

coincidência que as duas ocasiões em que Weber faz menção direta ao Cameralismo se

encontram em seu estudo sobre a China – ou seja, num contexto em que Weber está

interessado em identificar variações de racionalização que diferem, em espécie,

daquelas [que ocorreram] no Ocidente moderno e que não são, de modo algum, menos

“racionais” que aquelas ocidentais, mas que, não obstante, são enfraquecidas por

limitações ou defeitos que as desqualificam para prover uma matriz de modernidade ao

modo ocidental. Assim, os escritos sobre o que Weber chama de “Cameralismo Chinês”

de apoio a práticas de laissez-faire, ou sobre a questão do balanço comercial, são

ilustrações de que o governo chinês “não possui política comercial no sentido moderno

do termo” (Weber, 1951: p.79, 136-8).

Tom semelhantemente ambivalente caracteriza a discussão do mercantilismo

(Europeu) na História Geral da Economia. O mercantilismo inglês (Weber credita esta

terminologia a Adam Smith) que emerge já no século XIV é identificado como “o

primeiro traço de uma política econômica racional por parte do príncipe”. Mas então se

segue uma dialética familiar por meio da qual o racionalismo econômico consciente do

Estado, “carregando o ponto de vista da indústria capitalista para a política”, torna-se o

adversário histórico do capitalismo apropriado, opondo um regime de monopólios e

privilégios às oportunidades de mercado. “Pela última vez, entraram em luta, neste caso,

o capitalismo irracional e o racional” (Weber, 1968: p.307). Sem dúvida que aqui

Weber acompanha fundamentalmente Adam Smith, mas há uma diferença nos pesos

dos argumentos de cada um. Smith sublinha a possibilidade e a necessidade de aliviar o

Estado de sua tarefa impossível de monitorar exaustivamente e antecipar os eventos

econômicos no mercado. Weber, por outro lado, denuncia a arbitrariedade e o capricho

inerente a uma política de Estado ativa de tipo mercantilista, que frustra o capitalismo

orientado pelo mercado ao criar condições de comércio imprevisíveis, e que desse modo

8 Isto é de um Estado Policial, conforme definição acima, e Autoritário, como o de Bismarck [N.T.].

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nega os próprios benefícios da previsibilidade conferida originalmente pelo

racionalismo legal dos primórdios do Estado (WEBER, 1999: p.65). A harmonização

[mercantilista] da “clareza” administrativa com a “certeza” comercial atenuou a

convergência entre os interesses do Estado e aqueles do capitalismo nascente.

Cameralismo e mercantilismo são, assim, aliados próximos. – a despeito de não

serem doutrinas idênticas. Podemos concluir que Weber teria questionado a mera

possibilidade de uma “racionalidade” de governo Cameralista? Nesse sentido – em

contraste ao teor da maior parte das observações de Weber sobre as formas de

racionalidade – deveríamos inferir que a irracionalidade da política

Cameralista/mercantilista é, em sua visão, o correlato de uma insuficiência intelectual,

que corresponde à tese aceita de que um limiar científico decisivo teria separado o

mercantilismo da economia política?

Um indicador indireto na direção dessa conclusão pode ser delineado a partir da

pesquisa sobre a China. Aqui, Weber chama a “razão ‘Confuciana’” de “um

racionalismo da ordem”. Ele comenta o significado Confuciano do conceito do Tao

como conotando “a ordem externa do universo e também o verdadeiro movimento do

universo”, acrescentando que “tal identificação é frequentemente encontrada em todos

os sistemas metafísicos cuja estrutura dialética não foi aperfeiçoada” (Weber, 1951:

p.169, 181-3). Veredito semelhante pode ser inferido em relação a uma concepção de

governo econômico que não faz distinção entre as regularidades que governam os

fenômenos econômicos e o estado de ordem mantido pelas políticas estatais. Tal é,

precisamente, a concepção Cameralista. Como Pasquale Pasquino formulou, o

Cameralismo reconhece a especificidade da economia como objeto de governo, mas não

sua autonomia em relação ao Estado ou à ação de governar. Podemos recordar aqui a

restrição de Weber nas páginas de abertura [do ensaio] “A cidade”, ao uso vulgarizado

do conceito histórico de “economia da cidade” (Stadtwirtschaft) de tal modo que

“categorias relevantes para a compreensão da política econômica se fundem a

categorias puramente econômicas”. Weber objeta isso [afirmando] que “[...] essa

política econômica não representa nenhuma etapa universal da economia” (WEBER,

1999: p.414). Os intensamente regulados regimes de guilda das cidades livres imperiais

na Alemanha do final da Idade Média, que ofereceram excepcional modelo histórico

para a “economia da cidade”, também foram identificados como precursores e

protótipos das políticas regulatórias Cameralistas elaboradas nos Estados principescos

alemães depois do fim da Guerra dos Trinta Anos; políticas nas quais a economia e sua

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regulação são de fato tratadas como uma única e mesma realidade (Oestrich, 1983:

p.161).

Assim como Marx, Weber prometeu um tratado sobre o Estado que não chegou

a viver para escrever; mas pode-se suspeitar, no entanto, que a omissão dificilmente é

fortuita. Weber pode, de fato, ter sutilmente dado conta dos pontos específicos de

convergência histórica entre os cursos do Estado moderno e do capitalismo moderno;

ele pode ter insistido na inevitável interdependência técnica, numa sociedade industrial

desenvolvida, entre estruturas capitalistas e burocráticas; ele pode ter identificado

analogias extensas entre tais estruturas de modo que “Sociologicamente falando, o

Estado moderno é uma ‘empresa’ (Betrieb) idêntica a uma fábrica [...]” (WEBER,1980:

p.17). Mas, não obstante, há uma discrepância pequena, mas crucial, entre o ponto de

vista geral de Weber e aquele [expresso] no ensaio no qual Otto Hintze propôs

responder ao estudo de Weber sobre as fontes calvinistas do espírito do capitalismo com

uma abordagem paralela do “espírito” do estado Prussiano no início dos tempos

modernos. Podemos pensar que Weber poderia quase ter escrito a afirmação de Hintze

que “raison d’état e capitalismo são, afinal, aliados sociologicamente próximos”

(Hintze, 1975: p.94). “O que mais é o capitalismo que não uma moderna raison

d’économie? Raison d’état e raison d’économie derivam da mesma raiz”. Poderíamos

quase supor que Weber poderia estar pronto para atribuir a intenção de “subjugar o

mundo sob domínio e controle ético e racional”, isto é, a objetividade racional do

progresso, não apenas ao empreendedor puritano, mas também ao Estado policial. Mas

nenhuma dessas suposições é realmente sustentável. Weber de fato, veemente e

repetidamente, afirma as reivindicações da “razão de Estado”, mas ele não reconhece

um espírito do Estado, nem chega a propor, à maneira de Alfred Müller-Armack (1944)

– para contrastar com outro acadêmico neo-weberiano da geração seguinte –, a

justaposição de uma tipologia dos diferentes “estilos econômicos” característicos dos

membros de cada uma das igrejas pós-reforma a um estudo de seus estilos

correspondentes de ‘práticas estatais’” (Staatspraxis).

Para esclarecer tais aspectos devemos ter em consideração o contexto, intenções

e antagonistas do pensamento weberiano na Alemanha de sua época. Uma razão pela

qual Weber pode não ter se sentido motivado a escrever um estudo explícito das práticas

estatais do Cameralismo pode ter sido a percepção de que tal genealogia poderia resultar

em um desvio redundante, em uma sociedade que mantinha em seus costumes e

condições cotidianas tantos traços do Polizeistaat. Outra razão, ao contrário, pode ter

13

sido o fato de que as implicações de tais traços, no mundo de Weber e em seu próprio

pensamento, de modo algum corriam em linhas paralelas.

O Weber que desaprova as consequências adversas do desenvolvimento

capitalista de políticas voluntaristas-estatais de tipo mercantilista é também, como

podemos lembrar, o economista que declara que “a ciência da economia política é uma

ciência política” e que “neste Estado nacional, o último parâmetro de valor para a

economia política é a ‘razão de Estado’” (Weber, 1980: p.438). O tom provocativo da

aula inaugural na qual tais afirmações foram feitas não deve obscurecer o

reconhecimento de que sua substância é pouco mais que uma declaração de fatos sobre

a variação de economia política alemã, no século XIX, de que Weber era um expoente

profissional – a Nationalökonomie. A opinião altamente explícita de Weber sobre as

relações entre teoria econômica e os interesses do poder estatal reflete a extensão

conhecida com que a clivagem intelectual entre Cameralismo e estilos liberais de

pensamento estava, muito especialmente no caso alemão, longe de ser totalmente

radical ou direta (Tribe, 1984). Sua escolha de terminologia aqui evoca a demonstração

subsequente de Meinecke, em Die Idee der Staatsräson (traduzida para o inglês em

1957), da continuidade das preocupações alemãs com a razão de Estado entre os séculos

XVII e XX. Foucault homenageia Meinecke no desenrolar de sua própria discussão das

estreitas conexões entre as doutrinas da razão de Estado e da ciência da Polícia; ele

parafraseia essas teorias do século XVII ao definir a razão de Estado – mais

particularmente em seus aspectos econômicos – como “governar de acordo com a força

do Estado”.

Weber é um herdeiro dessa tradição. Mas é necessário lembrar que ele também

é, junto com seu irmão Alfred, um oponente vigoroso e polêmico no interior da

disciplina da Nationalökonomie ao “estado metafísico de homens como Gustav von

Schmoller”, para usar a frase de Roth (1978: p. lix). Como formula Mommsen, “o que

Weber realmente desejava era colocar fim à mistura de ciência social e política

conservadora representada por Schmoller e sua escola, pois tal tipo de ciência social

tinha entre seus efeitos favorecer o tipo de governo semi-burocrático existente na

Alemanha” (1974: p.93). Não há quebra de continuidade entre a perspectiva do jovem

Weber, que vê a razão de Estado como o critério de valor pragmático da disciplina da

economia política e a advertência (muito mais tardia, bem menos citada), no ensaio

sobre neutralidade axiológica contra a deificação do Estado como valor eternamente

supremo e absoluto (Weber, 1992). A razão de Estado é um critério, não um ethos ou

14

uma essência. A adoção da razão de Estado combinada a uma atitude de

desmascaramento do “mito do Estado” em vigor na Alemanha Guilhermina poderia

parecer, por sua vez, uma perspectiva evidentemente conforme à insistência de Weber

em uma caracterização dos traços essenciais do Estado, inconfundivelmente minimalista

e nominalista.

Desde os cuidados do abastecimento de alimentos até a proteção das

artes não existe nenhum fim que as associações políticas não tenham

perseguido, em algum tempo, pelo menos ocasionalmente, e desde a

garantia da segurança pessoal até a jurisdição, nenhum que tenham

perseguido o provimento da subsistência até o patronato das artes,

não existe fim concebível que alguma associação política não tenha,

em algum momento, perseguido todas as associações. (Weber, 1991:

p. 34).

Quase ao mesmo tempo, Schumpeter defendia uma tese similar, de um ponto de

vista político e teórico semelhante, em seu ensaio “A crise do Estado cobrador de

impostos”. A própria suposição da existência de um “Estado” anterior ao início da era

moderna é tendenciosa e anacrônica.

Estamos acostumados a considerar certas funções sociais como

específicas ao Estado e outras como especificamente “privadas”. Mas

não existe fronteira clara ou permanente que define de modo

inequívoco quais assuntos dizem respeito ao Estado: isso seria

pressupor a existência do Estado (Schumpeter, 1954: p.11).

Foucault toma o mesmo tema em seu curso de 1978-1979, em uma chave um

pouco modificada; ele se declara culpado à acusação de ter negligenciado a “teoria do

Estado”, na medida em que tal atividade envolve a dedução de efeitos históricos a partir

de características consideradas essenciais ao Estado. Ele justifica sua abstenção por duas

razões. Primeiro, a história não é uma ciência dedutiva. Em segundo lugar, o Estado não

tem essência; em si mesmo, o Estado não é mais que “o efeito móvel de um regime de

governamentalidades múltiplas” (Foucault, 2008a: p.106).

Foucault segue para argumentar que os problemas políticos no que se refere ao

governo e ao Estado podem ser, na verdade, analisados mais adequadamente por meio

de uma abordagem que evita teorizações essencialistas do Estado. Mais à frente,

sugerimos que alegação correspondente, em sentido um pouco diverso, pode ser feita

em nome de Weber. Mas a postura de Foucault é, em sent1984ido importante, menos

minimalista do que aquela que Weber pode ter sido inclinado a admitir, uma vez que ela

inclui a tese positiva de que o Estado moderno é caracterizado peculiarmente por seu

15

modo de assumir o governo racionalizado de “todos e cada um”: uma prática que

sintetiza e torna simbióticas a “totalização” e a “individualização”.

Weber certamente estava familiarizado com tal ideia de Estado, e com suas

ligações com a herança do Polizeistaat e, de modo mais distante, com a tradição da

Pastoral cristã. Em seus próprios termos, mas ainda assim inequivocamente, ele a

rejeitava. Tal é a implicação, por exemplo, nas “Considerações Intermediárias”, de sua

recusa em aceitar a assimilação do “pragmatismo objetivo das razões de estado”, que

define “todo o curso das funções internas do Estado”, à perspectiva técnica de “todas as

‘políticas de bem-estar social’” no contexto moderno (Weber, 1971a: p.392). “Bem-

estar” implica, na perspectiva de Weber, o compromisso com um critério de

racionalidade substantiva – a consideração do significado substantivo de justiça (ou

“justiça social”) em relação a um único caso individual ou conjunto de casos. Isso

contradiz os princípios de racionalidade formal “sem consideração pela pessoa”, que

Weber tem como indispensáveis tanto à administração burocrática quanto ao

capitalismo. O contraste entre a racionalidade legal formal e a “justiça khadi” (a

avaliação individualizada, racionalista-substantiva, dos casos individuais) é, claramente,

um grande e recorrente elemento na explicação de Weber sobre as condições distintivas

do desenvolvimento econômico ocidental; sua percepção do recrudescimento da “justiça

khadi” na sociedade de seu tempo envolve, de forma correspondente, a premonição da

corrupção ou ossificação da dinâmica ocidental (ver Lash, 1987).

Essa mobilização por Weber de seu contraste entre racionalidade formal e

[racionalidade] substantiva mais dramatiza do que elucida as bases exatas de sua recusa

resoluta da ideia de uma racionalidade política individualizante. Tal recusa tem,

reconhecidamente, uma honrosa proveniência filosófica. A este respeito, Foucault

menciona a discussão de Platão n’O político sobre a concepção pastoral de monarquia,

ou de governo como o cuidado individual do governante em relação a cada sujeito

particular – uma discussão encerrada pela observação de que apenas um deus seria

capaz de governar desse modo. Poderíamos mencionar, no mesmo sentido, a afirmação

de Kant de que “Wohlfahrt hat kein Prinzip” (“o bem-estar não tem princípio”) – isto é,

não pode ser transformado formalmente em uma máxima válida para as tarefas do

Estado (1956, p.145).

As opiniões detalhadas de Weber sobre as controvérsias da política de bem-estar

são, na verdade, mais complicadas do que algumas críticas gerais poderiam sugerir. Ele

endossa os seguros estatais, contra acidentes e de saúde para trabalhadores, criticando

16

de fatos os cálculos mesquinhos que limitaram o escopo das providências de Bismarck

neste campo. Em sentido contrário, a fórmula que ele usa ao ceder ao caráter

essencialmente técnico e consensual de certos domínios de tal política (‘karitativ-

polizeilicher Wohlfahrts- und Wirtschaftspfledge’) quase poderia ter sido escolhida

expressamente para sugerir a possibilidade de profundas reservas implícitas (Weber,

1973: p.153). Sem dúvidas, a sensibilidade histórica de Weber estava agudamente alerta

para as afinidades de significados do “Estado de Bem-Estar” e “Estado policial” – e das

ligações deste último com os resíduos, no caráter nacional, dos traços de servidão –

dominação da Obrigkeit e Untertan. “Diesen Herren Steckt eben die Polizei im Leibe”

(“esses cavalheiros tem a polícia em seus próprios ossos”) é uma fórmula

caracteristicamente weberiana de investida contra algumas práticas autoritárias da

gestão industrial alemã (Weber, 1924: p.396).

Sugeri mais acima que a definição de Foucault de governo como “condução de

condutas” poderia ser vista como consonante ao tema weberiano da Lebensführung. Tal

noção, evidentemente, deve ser agora cuidadosamente qualificada, acrescentando-se que

Weber teria desconfiado fortemente da ideia de uma racionalidade concernente à

condução da conduta de outros. De fato, se ele não realizou um estudo específico do

Estado policial, pode ter sido – para além das outras considerações que já foram

perscrutadas aqui – porque, no máximo, isto teria valido a ele como uma ilustração

delimitada temporalmente de um tema absolutamente universal de sua visão histórico-

mundial; a saber, a perigosa justaposição de certas realizações ocidentais “que nos

satisfazemos em pensá-las como tendo valor universal” com o reiterado destino possível

tanto de uma “domesticação das mãos à instituição do Estado” (Weber, 1971b: p.326)

quanto da sujeição aos poderes seculares e pastorais de uma autoridade religiosa. Tal

dialética é vista em ação até mesmo na era dourada da ética protestante:

O controle eclesiástico-policial da vida do indivíduo, tal como foi

praticado nos territórios das igrejas estatais calvinistas, tocando as

raias da Inquisição, podia ao contrário contrapor-se, por assim dizer,

àquela liberação das forças individuais que era condicionada pela

busca ascética da apropriação metódica da salvação, e de fato assim

ocorreu em certas circunstâncias. E do mesmo modo que a

regulamentação estatal do mercantilismo podia evidentemente fazer

valer sua disciplina desenvolvendo indústrias, mas não, pelo menos

sozinha, o “espírito” capitalista – muito pelo contrário, pois onde

assumia um caráter policial e autoritário ela muitas vezes paralisou o

desenvolvimento deste –, assim também podia surtir o mesmo efeito a

regulamentação da ascese pela disciplina eclesiástica quando

desenvolvia modos excessivamente policialescos [...]” (Weber, 2004:

p.137-8).

17

Parte da explicação de Weber sobre as condições de possibilidade do capitalismo

ocidental envolve o impasse medieval entre os poderes separados e competidores da

igreja e do império ocidentais, que resultou em que nenhuma das duas instituições

alcançaram um poder “Cesaropapista” ou pastoral sobre a vida individual. Foucault

segue Weber ao assinalar a tensão e disjunção permanentes na tradição ocidental entre,

de um lado, a filosofia de governo incorporada no que Foucault chama de “poder

pastoral” e, de outro, no que ele chama de “jogo da cidade” da política democrática

ateniense, baseada na lei, cidadania e espaço público. Isto é contrastado com a cultura

oriental, ortodoxa, com sua fusão entre Estado e igreja e sua imagem do imperador

cristão. A diferença aqui, é claro, é que Foucault credita ao Estado moderno o projeto

“demoníaco” de combinar ou superpor, no interior de um regime secularizado global,

essas duas estruturas radicalmente distintas de dominação. Para Weber, poderíamos

dizer que o problema central das políticas sociais é a manutenção de condições coletivas

que alimentem uma Lebensführung individual ativa, resistindo à subsunção desta última

a uma supervisão e reglémentation da vida coletiva-pastoral rígida e pervasiva. A

abordagem de Foucault cruza a de Weber neste ponto, mas apenas parcialmente; ele

insiste em creditar as diferenças estruturais entre os estilos policial e liberal de governo,

mas insiste igualmente que essas duas epistemes políticas dividem um interesse

fundamental comum ao problematizarem a existência individual como assunto de

Estado. E se retornamos a Weber sob essa luz, talvez possamos reconhecer mais

claramente como todo o seu trabalho, de fato, está focado na condução e na

racionalidade de governo, mesmo que ele não se exprima nesses termos. Se Weber não

é um teórico notável deste assunto, talvez isso se deva ao fato de que ele é um de seus

expoentes mais apaixonado e pragmaticamente comprometido.

A “ciência lateral” da sociologia e a alma do cidadão

Um modo de afiar nossa compreensão acerca desta dimensão das preocupações

de Weber é utilizar algumas observações de Foucault a respeito das transformações

postas em prática pela economia política clássica no que tange à relação entre ciência e

governo. A “ciência da polícia” é um exemplo arquetípico do tipo de prática discursiva

que Foucault denominou como savoir, um conhecimento que é também, e

essencialmente, um “know-how”. Economia e regulação são aqui conhecimentos-

objetos inseparáveis; da perspectiva policial, o conhecimento da economia é idêntico ao

18

know-how da administração. A economia política fratura essa união. Ao mesmo tempo,

na medida em que demostra a finitude inelutável dos meios de conhecimento do Estado

no que se refere a processos econômicos, ela também quebra, em princípio, com a

noção de uma arte de governo que poderia deduzir suas ações particulares de uma

ciência da economia. Para si, a economia política assume a posição de um

“conhecimento lateral”, nos termos empregados por Foucault: um corpo de princípios

que o Estado deve levar em conta ao avaliar as consequências de suas ações, mas que

não é feito para servir como universal axiomático de políticas. Laissez-faire não é, no

fim das contas, um remédio anódino para todos os cuidados do Estado; ele pode

estabelecer limites aos deveres governamentais, mas também deixa uma incerteza

profunda e duradoura quanto aos critérios exatos que irão definir tais limites na prática.

Foucault sugere que um fator decisivo nessa reconfiguração epistemológica é

desempenhado pela introdução de um novo conceito de interesse. A economia política é

inspirada, particularmente em sua qualidade de reflexão sobre a história e a formação da

sociedade civil, por um novo entendimento. A saber: que a população a que a política

mercantilista até então se dirigia como objeto de seu poder e conhecimento era

composta por sujeitos individuais, cada um dos quais – para confusão da argumentação

mercantilista – é também um sujeito de interesses. Desse modo, os sujeitos individuais

são agentes governados por uma racionalidade autônoma de preferências que são

irredutíveis, intransferíveis e – vistas da perspectiva totalizante do conhecimento estatal

– inescrutáveis. De acordo com a hipótese de Foucault, é a heterogeneidade e a

incongruência dessa textura racional da individualidade econômica em relação à lógica

de totalização, bastante diferente, característica da jurisprudência política que doravante

torna insustentável uma soberania econômica total. Ao mesmo tempo, a “ciência

lateral” da economia presta importante contribuição aos recursos do governo liberal por

meio de sua exploração das necessidades e capacidades de uma forma de

individualidade civil, a saber, a do homo economicus, em relação a qual o Estado está

obrigado a abandonar qualquer reivindicação de domínio direto.

A concepção de individualidade econômica endossada por pensadores do

Iluminismo escocês não é de modo algum uma abstração redutiva, é claro, mas um tema

entrelaçado num extenso tecido de reflexões morais, históricas e políticas sobre a

natureza e o caráter humanos. Alguns comentadores contemporâneos lamentaram a

nossa perda subsequente dessa dimensão de conexão entre discursos econômicos,

sociológicos e filosóficos. Weber representa um contra-exemplo importante a tal

19

diagnóstico e, de fato, ele é representante de um traço estabelecido há muito tempo da

Nationalökonomie alemã. Em suas características mais gerais, esta última é uma

investigação das ações individuais socialmente orientadas, uma extensão do “ponto de

vista” econômico de modo a abranger o estudo das condições e dimensões extra-

econômicas das ações humanas. Sem dúvida, é também essa perspectiva especial que

mais claramente diferencia o projeto sociológico de Weber daquele de uma “ciência da

sociedade”9.

Artigos recentes de Wilhelm Hennis enfatizaram tal estrutura das

problematizações weberianas. Centrais aqui são as relações entre um sistema de

formação e condicionamento das forças coletivas sociais – a “arena dos poderes

normativos e de facto” – e um objeto focal, a “economia” (die Wirtschaft), que também

e ao mesmo tempo é percebida como das Wirtschaften, “ação econômica”. Como

Hennis aponta, este último termo, cujas conotações em alemão são apenas palidamente

representadas por sua tradução para o inglês, sintetiza o respeito que a

Nationalökonomie confere à antiga perspectiva de uma Ökonomik (œconomia), uma

doutrina “prático-filosófica” sobre a conduta do lar, da economia doméstica individual

(Hennis, 1984: p.34). Quando lemos as declarações de Weber sobre a razão de Estado

como critério de relevância para a economia política, pode valer a pena recordar ao

mesmo tempo as conexões entre a antiga Ökonomik e o Cameralismo. Como notou

Pasquino, por vezes, na literatura da Polizei, o príncipe é caracterizado como o Wirt, o

marido-dono da casa-empreendedor de seu Wirtschaft-state (Pasquino, 1982: p.88). Tal

noção reflete acuradamente tanto os limites embaçados entre a soberania pública e o

domínio privado (a posição do príncipe como proprietário literal de seu território e

povo) e a desconcertante transformação efetuada por esse novo governo econômico em

relação à tradição do poder pastoral, mais antiga e de matiz teológico: a passagem do

pastor para o criador de gado, de Hirt para Wirt.

Mas, finalmente, a devida apreciação da pertinência dessa herança para

compreender Weber precisa ser acompanhada de um claro reconhecimento do enfático

antagonismo de Weber aos mundos pastoral e policial. Seu tratamento do Wirtschaften e

9 A ideia de uma economia estendida, ou uma aplicação generalizada da “abordagem econômica” ao

comportamento humano pode ser perseguida em direções muito diferentes. Tais diferenças continuam a

estruturar o campo de debates no qual os temas weberianos são debatidos hoje em dia. Consideremos a

distância entre os projetos de Gary C. Becker, de um lado, e de Albert O. Hirschman ou de Amartya Sen,

de outro. Foucault aponta as diferenças marcantes entre o neoliberalismo alemão dos Ordoliberalen e o

neoliberalismo estadunidense da Escola de Chicago. Estes são conflitos que guardam alguma analogia

àqueles dos tempos de Weber entre Schmoller e a Escola Austríaca.

20

“das ordens e poderes da sociedade” – ou, seguindo o emparelhamento de expressões

igualmente expressivo citado por Hennis, da Persönlichkeit e Lebensordnungen,

personalidade e ordens da vida – não se apresenta ao campo público da ação

governamental e da raison d’état como um manual racional de Lebensführung coletiva.

Em vez disso, ele se apresenta como uma “ciência lateral”, como aquela dos

economistas políticos, uma doutrina das condições e consequências necessárias ou

prováveis que a razão de Estado deve levar em conta no curso de suas escolhas

pragmáticas de ação ou abstenção de ação.

Essa perspectiva da pertinência prática de uma sociologia molda a discussão de

Weber como um espaço de debate em vários níveis e direções. De um lado, como nos

estudos agrários sobre a Prússia oriental (cujas recomendações práticas, é claro, situam-

se o mais longe possível de qualquer versão simplista do laissez-faire), Weber se

interessa pelas transformações nas estruturas da agricultura, posse de terras e população

cujas consequências incontroláveis ele acredita serem prejudiciais à força política da

nação alemã, em termos de caráter coletivo e da Lebensführung. No outro extremo, mas

novamente com ênfase particular especificamente sobre as condições alemãs, estão suas

análises da formação e da deformação do caráter da classe dominante nacional (“O

caráter nacional e os ‘Junkers’” e “Parlamentarismo e governo numa Alemanha

reconstruída”10

). O que o próprio Weber chama, entre aspas, de uma “caracterologia”

ocupa um duplo papel no âmbito desses estudos, primeiro como uma dimensão de

apreciação dos efeitos da ação governamental, e em segundo lugar como um fator

(mediado por meio de uma elaborada dialética entre atitudes coletivas e dinâmicas

institucionais) na avaliação do nível existente de capacidade de governo no interior de

uma dada sociedade. Hennis tece aqui um comentário astuto sobre a inclinação

distintiva do pensamento liberal que Weber tem em comum com Tocqueville: “Eles não

estão tão interessados em “direitos” e “liberdades” quanto nas formas de constituição

moral (Seelenverfassung) que correspondem a eles” (1984, p.73).

Hennis dirige nossa atenção a outro indicador crucial do pensamento de Weber

ao notar suas observações sobre as diferentes atitudes de Jacob Burckhardt e Anton

Merger em relação aos problemas colocados pelo papel moderno da imprensa.

Burckhardt expressou inquietação liberal a respeito das influências sobre condutas

individuais envolvidas num modo de vida político público como o da polis grega, que

10

Weber, 1971c e 1980 [N.T.].

21

“condicionou toda a existência do cidadão ateniense até seus aspectos mais íntimos”.

[Tal posição] contrasta com a perspectiva de Menger, publicista socialista, que via a

imprensa numa sociedade futura “assumindo o antigo papel do censor, lidando em seu

fórum com assuntos que não se pode deixar aos tribunais”. Hennis relembra aqui “a

maneira pela qual a antiga instituição da censura – que tanto fascinou Maquiavel,

Rousseau e até mesmo Tocqueville - moldou, supervisionou, advertiu e disciplinou

publicamente a alma do cidadão” (1983, p.166-7). Por detrás da reticência científica de

Weber quanto à direção de sua própria preferência de valor-racional sobre este tópico,

Hennis aposta numa clara, ainda que atenuada, inclinação na direção da posição de

Menger.

Tal sugestão faz bastante sentido. Ela é de fato, a um só tempo, apropriada e útil

para reconhecer a filiação dos temas da “caracterologia” de Weber não apenas às fontes

pré-liberais do Nationalökonomie, mas também ao topos maquiavélico da virtude

cívico-republicana – como evidenciado pela evocação de Weber do “belo trecho” na

História de Florença que elogia “ os cidadãos que colocaram a grandeza de sua cidade

natal acima da salvação de suas almas” (Weber, 1971a: p.150). Sem dúvida é aqui que a

“ética da responsabilidade” se aproxima mais ao que poderia ser imprecisamente

chamado de um “espírito de Estado” weberiano, comparável ao “espírito do

capitalismo”. Tal analogia incipiente poderia ser estendida para recobrir o entendimento

de Weber sobre as ligações paradoxais entre as virtudes da condução da vida e

motivações substantivamente irracionais ou até mesmo quase niilistas; consideremos a

“impassível ‘razão de Estado’ divina” por trás da vocação organizadora do mundo do

Calvinista (Weber, 1999: p.398). Mas o dilema da “censura” também pode ser lido

como síntese da tensão dual [presente] na perspectiva sócio-política de Weber, [aquela]

que confere valor mais duradouramente sugestivo para as reflexões atuais sobre

governo.

Em primeiro lugar, indo ao ponto tão cruamente quanto possível, Weber

certamente se inclina na direção da busca de medidas ativas para o bem-estar da “alma

do cidadão”, como supõe Hennis. Mas [Weber] é igualmente insistente em que não se

pode permitir que tais medidas assumam a forma de um sistema hierocrático/de bem-

estar/policial de arregimentação totalizada. Tanto na forma e, em extensão considerável,

em seu conteúdo particular, tal problemática não é de modo algum peculiar a Weber; ao

contrário, ela condensa um problema liberal de governo que foi colocado durante a

maior parte do século XIX. Pode valer a pena rememorar que a evocação citada acima

22

sobre a censura romana conota, ao menos em sua referência histórica literal, uma

agência controladora específica, distinta em suas bases e em seus quadros de outros

departamentos de controle político. Weber, como muitos liberais antes dele, está a

procura de forças, medidas e processos localizados não no interior das instituições do

Estado, mas no estrato intermediário da coletividade, que serão capazes de modelar e

propagar o tipo de cidadania econômica e política adequada às condições da sociedade

industrial. E aqui, como muitos outros liberais, Weber encontra seu próprio caminho de

a um só tempo respeitar e transcender as restrições governamentais implícitas nos

princípios formais-racionais do Rechstaat11

administrativo.

Desencantamento e transições para a Modernidade

As páginas anteriores procuraram suscitar, por vezes talvez contra o grão

aparente do material, um padrão de contrastes e conexões entre a obra de Weber e o

interesse de Foucault na racionalidade governamental. Agora resta considerar aqui

algumas das conexões estabelecidas por meio do impacto subsequente das ideias de

Weber, que podem ter uma significação mais facilmente demonstrável. Mas primeiro

será necessário mobilizar o apoio de argumentos de Foucault para afastar um obstáculo

remanescente para a apreciação da relevância de Weber para o pensamento

governamental em nossos tempos. Este último problema afeta a compreensão adequada

do que podemos chamar a segunda maior linha de tensão na visão de mundo de Weber:

o tema sintetizado na formula “desencantamento do mundo”. Aqui, mais uma vez,

Wilhelm Hennis mostra sua intuição certeira ao enfatizar tal ponto, porém desta vez será

necessário discordar de suas conclusões.

Apesar de Hennis ser crítico de comentadores anteriores que sugeriam que

Entzauberung (desencantamento) seria o tema principal da obra de Weber, o papel que

ele mesmo atribui [ao tema] em sua discussão sobre a Lebensführung é apenas um

pouco menos crucial. Entzauberung corresponde aqui àquele umbral histórico da

modernidade definido pelas análises de Weber, além do qual os poderes e os valores

orientadores de tal análise devem exaurir sua pertinência explicativa. A sociedade da

burocracia e do mercado é caracterizada pela “inexplicabilidade ética das relações

sociais interpessoais”, “a impossibilidade de valorização ética” das relações humanas no

interior do processo de produção capitalista. A conclusão lógica desse desenvolvimento

11

Estado de Direito [N.T.].

23

é a liquidação das ideias de “vocação” e do “homem vocacionado” cujas definições

formam o coração ético da sociologia de Weber. Hennis imagina Weber,

consequentemente, encontrando-se reduzido ao silêncio no que concerne ao futuro e

limitado à composição de uma “sinfonia de adeus” mahleriana aos mundos perdidos da

Lebenführung (Hennis, 1984: p.26).

Hennis considera que o significado mesmo desse tema em Weber, e portanto o

significado essencial de todo seu trabalho, tornou-se inacessível ao público

contemporâneo (exceto por um esforço especial de reconstrução hermenêutica). Tal

inacessibilidade é creditada aos efeitos das catástrofes morais e culturais que nos

separam espiritualmente de Weber e da antiga civilização europeia cuja dissolução

Weber testemunhou, conscientemente. As conotações éticas do tema de Weber, a

possibilidade de uma esfera cultural de um discurso prático-filosófico e antropológico

(estritamente não-positivista), são inacessíveis ao filistinismo de base tecnocrática das

gerações seguintes de sociólogos.

Talvez Foucault estivesse inclinado a subscrever uma variante ligeiramente

alterada dessa conclusão, acrescentando a ressalva de que um “retorno” proveitoso a

Weber requer que busquemos em nosso próprio presente as formas irreconhecíveis

pelas quais as questões de Weber, não obstante toda crítica cultural desencantada,

retornaram e se renovaram, modificando, por sua vez, as questões que agora nos seria

mais útil propor a Weber.

Mas também podemos conjecturar que Foucault teria, com boas razões,

questionado a adequação das proposições de Hennis sobre os significados do

Entzauberung em Weber. Pois existem fortes bases para duvidar se Weber algum dia

adotou o postulado de uma ruptura histórico-mundial geral separando o universo

(tradicional) da ética de uma vida (moderna) sem ética ou significado ético. De forma

mais plausível, pode-se considerar que o tema mais constante em Weber, não tocado por

nenhum de seus enfrentamentos com as vicissitudes da modernidade, é a relação entre

os componentes eticamente significativos e não significativos da ação social. Isso pode

ser visto assim, por exemplo, no projeto de pesquisa sobre o trabalho industrial12

: até

mesmo fenômenos econômicos que Weber pode ter visto como desprovidos de

significado ético em si mesmos, estimularam seu intenso interesse em relação às suas

consequências éticas possíveis. Em outras ocasiões, e de modo mais evidente, pode-se

12

Weber, 2009 [N.T.].

24

notar que a suposta desaparição do homem vocacionado no mundo moderno admitia

exceções em ao menos duas vocações de enorme interesse para Weber, a saber, aquelas

da ciência e da política, sem mencionar seu esboço suplementar sobre a vocação do

jornalismo.

Muito tem sido falado sobre o sentimento empático e intenso de Weber pelas

angústias provocadas pela racionalização da vida, por vezes à custa de negligenciar suas

respostas ponderadas a tais desafios. Em geral, há poucas bases para atribuir a Weber a

crença de que o desencantamento do mundo teria sido um limiar de mudança que só

pode ser negociada ao preço de sacrifícios morais intoleráveis. Em vez disso, o que ele

parece ter querido transmitir foi que diferentes sociedades acercam-se de tal limiar

dotadas de níveis muito variados de capacidade para uma negociação bem sucedida –

por razões que sua sociologia procura elucidar. Pode ser mais dramaticamente

satisfatório ler o diagnóstico de Weber das condições alemãs como profecias culturais

universais – a cruel particularidade de suas observações sobre o caráter germânico

dificilmente sendo mais palatável hoje do que no tempo em que foram escritas; mas tal

leitura pode ter um alto custo em termos de mistificação. Os “últimos homens” de

Nietzsche, perdidos na tradução de [Talcott] Parsons para a Ética Protestante (“esse

Nada imagina ter chegado a um grau de humanidade nunca antes alcançado”13

) são,

como em Nietzsche, primeiro e antes de tudo alemães. O gume da crítica de Weber está

apontada não tanto contra o processo de Entzauberung como tal, mas contra as

compensações falsas e imaturas do Entzauberung adotadas por seus companheiros

alemães: a reprodução em massa da personalidade Junker do “novo-rico aristocrático”, a

epidemia eclética de buscas privadas por Erlebnis14

. Privar as prescrições e os

presságios mais imediatamente políticos de Weber de seu contexto específico, histórico

e nacional, não apenas os torna alvo fácil para distorções polêmicas, mas também não

faz justiça às potencialidades gerais e duradouras da sociologia de Weber como

ferramenta de diagnóstico. A catástrofe alemã certamente não sinaliza o fim da

expectativa de vida viável dessa sociologia. Em sentido mais amplo, toda a abordagem

de Weber, ao contrário, assume a continuada variação temporal e regional dos

problemas sociológicos.

Tal avaliação é complicada e, ironicamente, nuançada (mas não radicalmente

abalada) quando consideramos a intrigante história, talvez estudada inadequadamente

13

Cf. edição brasileira, Weber, 2004: p.166. [N.T.]. 14

Experiência, no sentido específico de vivência [N.R.T.].

25

desde os tempos de Weber, de termos vitais em seus escritos, como “estilo de vida”

(Lebensstil) e “modo de conduta de vida” (Lebensführung)15

. Sem dúvida o fenômeno

da banalização semântica funcionou aqui, com o qual um crítico teórico pode lidar por

meio de um sarcasmo melancólico e aristocrático. Mas também há o tipo de banalização

que atesta simplesmente o sucesso histórico de uma ideia, seu status alcançado como

uma “palavra-chave” – “modo de vida”: ocidental ou oriental, democrático ou

socialista, um lema no hino de todo aspirante ao poder mundial desde 1945; “estilo de

vida”: a rubrica para a auto-afirmação cultural e comercial de sociedades de consumo de

massa. Os críticos de esquerda a Weber percorreram por vezes distâncias brutais nos

anos 1950 e 1960 para construir pontes de cumplicidade entre a ética e a política de

Weber e o advento do Terceiro Reich. Não podemos senão nos perguntar se tal

iniciativa não foi uma espécie de substituto metonímico em relação ao reconhecimento

de uma continuidade muito mais plausível, a saber, aquela entre as ideias weberianas e o

ethos político coetâneo da República Federal no âmbito da qual tais críticos escreviam.

Talvez a culpabilidade hipotética de Weber frente ao fato do nazismo tenha sido

somente um tipo de sinal simbólico de uma consciência mais profunda – jamais

adequadamente refletida – de uma afiliação weberiana no coração da democracia alemã

no pós-guerra. De todo modo, é curioso quão pouca atenção foi dada até o momento, na

literatura secundária mais recente, à presença de uma demonstrável contribuição de

origens weberianas durante as etapas de fundação da República Federal.

Neoliberalismo weberiano

Foucault discute, em seu curso sobre o governo neoliberal, um grupo de juristas

e economistas alemães que, após 1945, ficaram conhecidos como Ordoliberalen, devido

à sua associação comum com o periódico Ordo: Wilhelm Röpke, Walter Eucken, Franz

Böhm, Alexander Rüstow, Alfred Müller-Armack16

. Alguns de seus membros foram

alunos de Alfred Weber; Müller-Armack, como vimos, engajou-se em uma tentativa

explícita de estender o trabalho de Max Weber. As ideias dos Ordoliberalen forneceram

15

Até aqui temos traduzido Lebensführung como “condução da vida. Alguns tradutores de Weber optam

por “modo de vida”, embora a “conduta de vida” seja o mais aceito na discussão recente. Ver, por

exemplo, a edição brasileira de Antonio Flávio Pierucci (Weber, 2004: p. 7) e a edição crítica de

Francisco G. Villegas, em espanhol, da Ética Protestante (México: Fondo de Cultura Económica, 2011:

p. 259-60). Por razões de precisão, optamos, apenas nessa passagem, pela forma “modo de conduta de

vida”, como meio termo entre a consistência do uso do conceito ao longo do texto e a coerência com a

locução que se segue, entre aspas, no original. [N.R.T.]. 16

Tais pontos são tomados das aulas que Foucault deu em 29 de março e em 4 de abril de 1979 [aulas

que, desde 2004, estão publicadas na edição do curso Nascimento da Biopolítica, cf. nota 4].

26

muitas das bases intelectuais para os princípios de mercado social da política da

Alemanha Ocidental no pós-guerra. O âmago de sua filosofia pode ser descrito como

uma reapresentação vigorosa do tema weberiano das Wirtschaften, em seu sentido

amplo tal como interpretado por Hennis. Nesse modelo, o esquema da empresa é

apresentado não apenas como um modelo para a conduta da atividade econômica, e sim

para a totalidade da ação humana. Cidadãos individuais deveriam ser empreendedores

de si mesmos e de suas vidas; a vida individual deveria ser estruturada como um

agrupamento de empreendimentos, econômicoa e não-econômicos. Rüstow descreve

seu programa para atingir tal meta como Vitalpolitik (“política vital”) e define o

principio interno da democracia liberal como eine menschenwürdige Lebensführung

(“uma conduta de vida digna de seres humanos”), (Rüstow, 1963: p.36, 82). O mercado

econômico, como espaço de liberdade para o jogo competitivo entre empresas, fornece

um argumento aceitável para a regeneração do Estado e é seu promotor e curador: um

motor de prosperidade que, ao mesmo tempo e ipso facto, recria a ordem política e a

legitimidade a partir do vácuo da destruição nacional.

Foucault tece dois comentários interessantes sobre os Ordoliberalen. Um deles

[consiste em] notar o teor construtivista, anti-naturalista de seu pensamento. O mercado

é visto como uma ordem autônoma, mas não autossuficiente. Políticas ativas e

inventivas são mobilizadas para preservá-lo, e tal tarefa deve constituir a racionalidade

básica da ação governamental. Seu segundo comentário se refere ao caráter anti-fatalista

desse neoliberalismo, uma versão do weberianismo notavelmente desprovida do

pessimismo cultural que tantos comentaristas têm notado no tema weberiano do

Entzauberung. Foucault apresenta os Ordoliberalen como veementes opositores da tese

que ele atribui fundamentalmente a Sombart, [qual seja], a de que o vazio moral e a

desorientação das sociedades de massa modernas são consequência direta do sistema

econômico liberal. Ao invés disso, eles sustentam [que] tais fenômenos são efeitos das

políticas anti-liberais praticadas sucessivamente por todos os regimes políticos da

Alemanha moderna.

Em seu livro A crise social do presente, escrito durante o exílio suíço e

publicado neste país em 1942, Wilhelm Röpke escreveu: “o autor sentiu-se impelido a

realizar um esforço desesperado de orientação espiritual”. Tais insinuações éticas e, por

vezes, religiosas [presentes] no neoliberalismo alemão não devem ser descartadas como

fachada filosófica de uma restauração anticomunista. De todo modo, há mais envolvido

em avaliar suas implicações do que uma avaliação do ambiente moral da república de

27

Adenauer, a partir de padrões weberianos ou quaisquer outros. O que a análise de

Foucault tende a confirmar é, primeiro, que há uma continuidade real de estilo e de

convicção entre o pensamento de Weber e o dos Ordoliberalen; em segundo lugar, que

ideias tais como as deles demonstraram uma capacidade inovadora real na era do pós-

guerra, o que se reflete, ao menos em alguma medida, na emergência de um novo

Lebensstil coletivo.

Tais influências são legíveis nos estilos governamentais que recentemente se

tornaram predominantes em várias sociedades ocidentais: a proposta de governos aos

seus cidadãos de um novo ethos de responsabilidade, e a promoção de um “cultura

empresarial” como novo modelo de cidadania econômica e social. As iniciativas

políticas envolvidas nesses desenvolvimentos se originam principalmente (mas não

exclusivamente) desde o centro e para a direita. Mas esse não é necessariamente o caso

no que se refere às forças subjacentes de mudança social. A politização de aspectos da

existência pessoal, a demanda por respeito ou apoio do Estado para exigências

crescentes de autonomia pessoal, tendências sem as quais as políticas neoliberais por si

mesmas teriam alcançado pouco impacto, inspiraram as principais iniciativas atuais nas

políticas de esquerda desde 1968. O próprio Foucault foi, de diversas maneiras, seu

pensador mais representativo. Mas Foucault também sugeriu em 1979 que tais

desenvolvimentos não haviam sido acompanhados por uma reflexão adequada sobre os

princípios de uma racionalidade de governo especificamente socialista, no interior da

esquerda, que – não obstante outras realizações intelectuais do socialismo – não há e

nunca houve tal racionalidade. Anos mais tarde, ele ofereceu algumas poucas sugestões

a respeito de como essa situação poderia ser modificada, buscando modos de renovação

do Estado de Bem-Estar que acrescentariam à provisão de formas básicas de segurança

material uma provisão equivalente de meios para autonomia individual (Burchell et. al.,

1986; Gordon, 1986).

Tanto esse diagnóstico e essa sugestão, dentro de suas possibilidades, podem

agora encontrar crescente consenso. Em sentido amplo, o interesse político das ideias de

Foucault a respeito do tema da racionalidade governamental é a contribuição que podem

oferecer, no contexto dos problemas atuais, na direção da satisfação da demanda de

Weber pela reconciliação de uma ética dos fins últimos e uma ética da responsabilidade.

Confrontar tais ideias com as de Weber pode, como esse [capítulo] procurou sugerir,

ensinar-nos algo novo sobre Weber e sobre nós mesmos.

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