1.Introduçtfo; 2. Política tecnológica explícita e implícita - SciELO

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1.Introduçtfo; 2. Política tecnológica explícita e implícita; 3. Política econômica e política tecnológica; 4. A estrutura econômica e seus impactos tecnológicos; 5. Instrumentos de politica tecnológica; 6. Instrumentos da política tecnológica.e3eplícita; 7. Considerações finais. Henrique Rattner* . "Professor do Departamento de Fundamentos Sociais e Jurídicos da Administração, da EAESP/FGV~ 1. INTRODUÇÃO O presente estudo é parte integrante de um trabalho mais amplo, denominado Gestão tecnológica na indústria de alimentação na América Latina: um estudo compara- tívo,' baseado em pesquisa realizada nos anos 1976/77, simultaneamente, em quatro países da América Latina - Cofômbia, México, Peru e Brasil. Participaram do pro- jeto, sob a coordenação do A., sete Escolas de Adminis- tração desses países, num total de aproximadamente 30 pesquisadores. Dos quatro países escolhidos, dois - México e Brasil - apresentam-se num estágio relativamente avançado do processo de índustrialízação por substituição das impor- tações, enquanto Colômbia e Peru, seja pelo tamanho de seus respectivos mercados, seja pelas dimensões de seus estabelecimentos produtivos, representam uma categoria intermediária no ranking das nações em desenvolvi- mento. Definido o ramo da indústria alimentícia como locus do estudo sobre "gestão tecnológica", foram sele- cionados os sub-ramos - óleos vegetais, massas e bis- coitos, came e enlatados, etc. - de tal forma que os resultados da pesquisa permitissem comparações inter e intra-setoriais, tendo em conta diferenças de escala e do meio-ambiente em que as empresas desenvolvem suas ati- vidades. Entre as variáveis analisadas, consideradas rele- vantes para a compreendo do comportamento tecnoló- gico das empresas, figuram entre outras, como hipótese de trabalho, a política tecnológica dos respectivos gover- nos. Os resultados da pesquisa. todavia, evidenciaram, além de certas semelhanças estruturais, o papel subordi- nado dessa variável, superada em seu impacto nas deci- sões das empresas por fatores tais como: a estrutura da produção e do mercado dos respectivos ramos; a pre- sença de empresas oligopolísticas; e as decorrentes im- perfeições no regime de concorrência e, sobretudo, as políticas econômicas determinadas pelos governos, refe- rentes a de investimentos, preços, salário, exportações, etc. Situando a problemática da inovação tecnológica ao nível das estruturas de mercado, com as empresas su- jeitas às diretrizes mutantes das políticas econômica e' industrial dos governos, representava não somente um avanço teórico com relação à visão vigente nos anos 60, mas também prometeu esclarecer o enigma da aparente "irracionalidade" nas decisões tecnológicas dos empresá- rios latino-americanos. Assim, a análise do processo de industríalízação por substituição das importações, desta- cando suas características de concentrador de rendas, que determina um perfil de demanda por bens de con- . sumo sofisticados, permite inferir sobre as preferências dos produtores nacionais por marcas estrangeiras obtidas mediante contratos de licença e contra pagamentos de royalties, em vez de pesquisas em finanças o desenvolvi- mento de uma tecnologia própria. Nessas condições, o impacto da política tecnológica do Estado é limitado, dependendo; para sua maior eficácia, de uma série de diretrizes da política econômica, conforme tentamos in- ferir do estudo em pauta. 15 Rev. Adm, Emp., Rio de Janeiro, 21(3): 15-27, jul./set./1981 Aspectos da política tecnológica nos países da América Latina

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1.Introduçtfo;2. Política tecnológica

explícita e implícita;3. Política econômica e

política tecnológica;4. A estrutura econômica

e seus impactos tecnológicos;5. Instrumentos de politica tecnológica;

6. Instrumentos da políticatecnológica.e3eplícita;

7. Considerações finais.

Henrique Rattner* .

"Professor do Departamentode Fundamentos Sociais e

Jurídicos da Administração,da EAESP/FGV~

1. INTRODUÇÃO

O presente estudo é parte integrante de um trabalhomais amplo, denominado Gestão tecnológica na indústriade alimentação na América Latina: um estudo compara-tívo,' baseado em pesquisa realizada nos anos 1976/77,simultaneamente, em quatro países da América Latina -Cofômbia, México, Peru e Brasil. Participaram do pro-jeto, sob a coordenação do A., sete Escolas de Adminis-tração desses países, num total de aproximadamente 30pesquisadores.

Dos quatro países escolhidos, dois - México e Brasil- apresentam-se num estágio relativamente avançado doprocesso de índustrialízação por substituição das impor-tações, enquanto Colômbia e Peru, seja pelo tamanho deseus respectivos mercados, seja pelas dimensões de seusestabelecimentos produtivos, representam uma categoriaintermediária no ranking das nações em desenvolvi-mento. Definido o ramo da indústria alimentícia comolocus do estudo sobre "gestão tecnológica", foram sele-cionados os sub-ramos - óleos vegetais, massas e bis-coitos, came e enlatados, etc. - de tal forma que osresultados da pesquisa permitissem comparações inter eintra-setoriais, tendo em conta diferenças de escala e domeio-ambiente em que as empresas desenvolvem suas ati-vidades. Entre as variáveis analisadas, consideradas rele-vantes para a compreendo do comportamento tecnoló-gico das empresas, figuram entre outras, como hipótesede trabalho, a política tecnológica dos respectivos gover-nos. Os resultados da pesquisa. todavia, evidenciaram,além de certas semelhanças estruturais, o papel subordi-nado dessa variável, superada em seu impacto nas deci-sões das empresas por fatores tais como: a estrutura daprodução e do mercado dos respectivos ramos; a pre-sença de empresas oligopolísticas; e as decorrentes im-perfeições no regime de concorrência e, sobretudo, aspolíticas econômicas determinadas pelos governos, refe-rentes a de investimentos, preços, salário, exportações,etc. Situando a problemática da inovação tecnológica aonível das estruturas de mercado, com as empresas su-jeitas às diretrizes mutantes das políticas econômica e'industrial dos governos, representava não somente umavanço teórico com relação à visão vigente nos anos 60,mas também prometeu esclarecer o enigma da aparente"irracionalidade" nas decisões tecnológicas dos empresá-rios latino-americanos. Assim, a análise do processo deindustríalízação por substituição das importações, desta-cando suas características de concentrador de rendas,que determina um perfil de demanda por bens de con-

. sumo sofisticados, permite inferir sobre as preferênciasdos produtores nacionais por marcas estrangeiras obtidasmediante contratos de licença e contra pagamentos deroyalties, em vez de pesquisas em finanças o desenvolvi-mento de uma tecnologia própria. Nessas condições, oimpacto da política tecnológica do Estado é limitado,dependendo; para sua maior eficácia, de uma série dediretrizes da política econômica, conforme tentamos in-ferir do estudo em pauta.

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Rev. Adm, Emp., Rio de Janeiro, 21(3): 15-27, jul./set./1981

Aspectos da política tecnológica nos países da América Latina

2. POrtrICA TECNOLÓGICA EXPÚCITA EIMPLÍCITA

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Partindo da premissa segundo a qual o objetivo da polí-tica tecnológica dos países em désenvolvimento seria,por um lado, obter o mais eficaz controle sobre as ím-portações indiscriminadas de tecnologia, e por outro, ofortalecimento da capacidade de decisão autônoma sobreo technology mix, ou seja, a composíçao do mesmo emtermos de tecnologia doméstica e importada, somos leva-dos a. analisar alguns aspectos da política tecnológica eseus principais instrumentos elaborados e aplicados nasúltimas décadas. Para este objetivo, é conveniente ado-tar-se a distínção entre a política tecnológica explícita eimpltcita, sendo que a primeira abrange todas as medi-das, leis e diretrizes adotadas pelo governo com o intuitode exercer um impacto sobre a produção de conhecimen-tos científicos e tecnológicos no país. A segunda cate-goria refere-se àquelas medidas, planos e diretrizes, de-correntes da política de desenvolvimento econômico eindustrial, com efeitos profundos - positivos ou nega-tivos - sobre o desenvolvimento da capacidade tecnoló-gica autônoma do país.

Em cada etapa do crescimento econômico-industrialdas últimas décadas, é possível identificar necessidades edemandas tecnológicas diferentes, atendidas seja pela ím-portação de tecnologia, seja pela geração e difusão deconhecimento técnico de origem nacional.

Na prímeira etapa de índustrialízação, a demandapor tecnologia não é explícita, mas está implícita nademanda por bens de capital e pessoal técnico de certaqualifícação, prontamente atendida pela .ímportação debens de capital e pela incorporação de mão-de-obra imi-grante mais qualificada. Para empreendimentos de tecno-logia mais sofisticada, na falta de recursos internos parasua execução, recorre-se ao exterior, em busca de recur-sos financeiros, de bens de capital e de mão-de-obra qua-lificada. Posteriormente, para substituir os bens de capi-tal importados por nacionais, as empresas recorrem acontratos com firmas estrangeiras, procurando obter pro-jetos e serviços de engenharia, para solucionar problemasespecíficos e para proporcionar assistência técnica às uni-dades produtivas. Ademais, para utilizar produtos paten-teados, toma-se necessário conseguir os direitos de usocontratuais (licenças), ponto inicial para a formulaçãoposterior de uma demanda explícita.

Na segunda fase de índustríalízação, a política deresposta leva a incrementar o fluxo de tecnologia estran-geira, mediante contratos de todos os tipos com em-presas estrangeiras, contrariamente a urna política demaior autonomia, que exige a promoção da produçãodoméstica dos conhecimentos técnicos e sua incorpo-ração e assímílação ao sistema produtivo.

A hipótese levantada nesta parte do trabalho afirmaa ínconsistência entre a política tecnológica explícita e aimplícita, nos países latino-americanos. Ou, em outraspalavras, o poder e a influência dos grupos de interesse,que influem e decidem sobre os planos de política eco-nômica e industrial, teriam prevalecido sobre os esforços

Revista de Administraçt10 de Empresas

e aspirações daqueles que tentaram imprimir uma oríen-tação de maior autonomia, não somente à polltícá tecno-lógica, mas também ao processo de desenvolvimento em,geral.

Os motivos deste fracasso e desencontro de políticas.governamentais .nâo devem ser procurados em falhas de'planejamento (no sentido técnico) ou dos recursos hu-manos, mas são decorrentes de um conjunto de fatoresestruturais, que limitam e condicionam as alternativastecnológícas, tanto ao nível das empresas quanto ao dapolítica governamental.

A industrialização nos países latino-americanos reali-zou-se tardiamente, numa época de acumulação de ca-pital em escala mundial, com profundos impactos na di-vísão internacional de trabalho e na configuração internados respectivos mercados, de produção e de consumo,que se tomam predominantemente oligopólicos e olí-gopsônicos. Em conseqüência, a entrada nesses mercadosmediante inovações tecnológicas toma-se, além de em-preendimento de custos iniciais elevados, atividade degrande incerteza e de risco quanto aos objetivos preten-didos, ensejando aos seus protagonistas a adoção de umcomportamento tecnológico imitativo ou tradicional,não vconduzíndo à maior autonomia tecnológica na-cional.

Um dos problemas mais destacados em estudos edebates sobre política tecnológica refere-se ao fato de asempresas nos países latino-americanos - tanto as nacio-nais, privadas e estatais, quanto às estrangeiras - recorre-rem a soluções técnicas intensivas em capital, perpe-tuando e agravando destarte o problema-crônico de sub-emprego.

Entretanto, o argumento a ser desenvolvido a seguirprocura explicar essa/alha ou comportamento anti-socialdessas empresas, a partir de uma série de condições estru-turais dos respectivos mercados, determinantes das es-colhas tecnológicas contrárias ao que seria desejável deum ponto de vista de política social, ou seja, maxími-zação do nível de emprego, melhor dístribuíção da rendae maior bem-estar social.

Esses objetivos não serão conseguidos, obviamente,por apelos ou sermões dirigidos aos empresários e admi-nistradores, exigindo deles decisões tecnológicas mais ra-cionais. Dentro do marco jurídico-legal do sistema capi-talista, os empresários não têm a liberdade de optar porsoluções tecnológicas racionais, do ponto de vista social,porém irracionais, do ponto de vista econômico, por le-varem provavelmente à falência da empresa.

Para ter êxito, uma política tecnológica deve estarestreitamente vinculada e integrada à política eco-nômica, e somente à medida que esta assegure aos em-presários vantagens e benefícios compensadores, seriapossível induzi-los a optarem por um comportamentotecnológico mais racional, do ponto de vista da socieda-de.

Caberiam, aqui, algumas observações sumárias sobreo papel do Estado, neste processo específico, e no con-junto das controvérsias a respeito do desenvolvimento. Aluz da realidade histórica atual e no passado, seria in-

gênua ou mistificadora a definição do poder estatalcomo representante dos interesses coletivos da nação, Damesma forma, sua caracterização como comitê executivoda classe dominante peca pela símplíflcação excessiva. Asituação concreta é bem mais complexa, dado o fato demesmo entre as camadas dominantes haver vários gruposdisputandô o poder, cada um com sua visão peculiar dasituação e com projetos 'diferentes, que levam a atitudese ações políticas diferentes. Governar ou exercer opoder, nessas circunstâncias, significa estabelecer priori-dades, compor e distribuir vantagens e privilégios, conse-guindo, todavia, legitimar as decísões aos olhos damaioria. Dir-se-ia que o poder é legítimo quando seusdetentores forem capazes de mobilizar, em função deseus ideais e propostas, outros grupos e camadas sociais:Este tem sido aparentemente o caso da ideologia e dapolítica de desenvolvimento econômico, difurididasnessas últimas décadas nos países latino-americanos.

De fato, o sucesso da política desenvolvimentista,avaliado em função de parâmetros econométricos e esta-tísticos pouco fidedignos, constitui-se em critério básico,não somente para a organização da própria economia,como também para a subordinação das outras atividadese das esferas política e cultural àquela.

Ao discutir e analisar as políticas tecnológicas segui-das por alguns países da América Latina, faremos a dis-tinção entre:

a) política tecnológica explícita, tal como manifestaem documentos e pronunciamentos oficiais, implicandocerto grau de normalização do comportamento tecno-lógico das empresas e dos órgãos do poder público. Apolítica tecnológica explícita é manifesta pela criação deuma infra-estrutura visando à geração e/ou à adaptaçãode tecnologias. A nível institucional, surgem órgãoscomo o Conselho Nacional' de Ciência e Tecnologia, Mi-nistérios e Secretarias Estaduais, Centros de Pesquisa eDesenvolvimento, etc. Ademais, as atividades dessesórgãos são caracterizadas pela elaboração de planos eprogramas setoriais e regionais de desenvolvimento cien-tífico e tecnológico, acompanhados por esquemas elabo-rados de alocação e distribuição de recursos financeiros;b) a política tecnológica implícita refere-se aos efeitosproduzidos por planos, programas e diretrizes que nãopertencem às atividades e funções cíentífíco-tecnolô-gicas. São, geralmente, conseqüência de diretrizes e de-cisões tomadas em outras esferas da vida sócio-política(na economia, nas áreas de educação e cultura, relações e'comércio exteriores, etc.), porém, com profundo impac- 'to sobre o comportamento tecnológico das empresas.

3. POrnICA ECONÔMICA E POI1TICATECNOLÓGICA

A intervenção do Estado na orientação do processo dedesenvolvimento industrial, por um lado, e na formu-lação da política científico-tecnológica, por outro, nãose tem caracterizado pela coerência e convergência deobjetivos e de mecanismos operacionais.

Quanto à orientação do processo de Industrializaçãoe à formulação de diretrizes que influem na configuraçãoda estrutura industrial, no Brasil, México e Colômbia, oEstado proporcionou amplo apoio à indústria, sem defi-nir, todavia, a direção deste crescimento mediante o esta-belecimento de prioridades. A livre atuação dils forças domercado não foi permitida no Peru, sobretudo a partirde 1968, adotando este país um conjunto de leis e nor-mas, definindo claramente certas áreas prioritárias. NoBrasil e no México, em virtude do grau de complexidadee diversificação de suas indústrias, têm-se notado esfor-ços de estimular certos ramos, tais como o de bens decapital e o de petroquímica, nesta última década.

Uma outra dimensão da política-tecnológica doEstado se refere a medidas de promoção ou de controle'da atividade industrial, visando ao fortalecimento da ca-pacidade tecnológica autônoma. Nota-se que sobretudoBrasil e México empregam medidas promocionais, vi-sando a incentivar, de maneira indiscriminada, todas asempresas industriais, inclusive as estrangeiras, enquantono Peru e na Colômbia foram aplicadas, predominante-mente, medidas de controle e restrições, a fim de orien-tar e regulamentar o crescimento industrial. Nos quatropaíses, certas medidas de controle foram implantadas,embora com graus de rigor e formalismo variados, nasáreas de registro dos investimentos estrangeiros; de con-trole de remessa de divisas; e de registro: de contratospara a transferência de tecnologia. Entretanto, essas me-didas de controle tiveram pouco ou nenhum impacto,face à política de promoções e incentivos indiscrimina-dos, abrindo as portas ao capital estrangeiro, de formaampla e sem restrições.

Um terceiro aspecto refere-se à forma da inter-venção estatal na execução das políticas de industrializa-ção, variando desde uma atitude relativamente passiva,com orientação indicativa às empresas privadas (no casoda Colômbia), até a· participação direta do Estado ematividades produtivas em setores-chave, substituindo oucomplementando a iniciativa privada. No Brasil e noMéxico, o Estado assumia a produção de insumos indus- .triais básicos (aço, petróleo; energia, etc.) bem como deoutros serviços indispensáveis para o êxito dos programas 'de índustríalização. No Peru, esse tipo de intervençãoestatal tem sido mais destacado nos anos 70, quando oEstado se torna a fonte principal da formação do capital'bruto, em praticamente todos os ramos de atividade in-dustrial. Outra forma de intervenção é caracterizada porum certo grau de planejamento, geralmente mais indi-cativo de metas e intenções do que de caráter impositivo.Assim, por exemplo, os planos de desenvolvimento brasi-leiros representam mais a compilação de projetos de in-vestimentos dos diversos ministérios e empresas estataisdo que um plano integrado de desenvolvimento. Emborano Peru e, até certo ponto, no Brasil, o Estado inter-venha na regulamentação das atividades industriais, me- 'diante medidas legislativas e controles executados porórgãos governamentais, as principais iniciativas se ori-ginam nas empresas privadas, que gozam, além de incen-tivos fiscais-tributários, de fmanciamentos e créditos de,

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Polttica tecnológica

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uma rede de bancos dé desenvolvimento oficíaís.Todavia, a falta de critérios seletivos para determinarprioridades enfraquece a atuação dos organismos esta-tais, abrindo espaço inclusive para prática de corrupção edesperdício de recursos públicos. Finalmente, quanto àcoerência entre as políticas industriais e de ciência e tec-nologia, verifica-se nos países latino-americanos uma dis-crepância acentuada. A medida que se analisam os planosde desenvolvimento e a parte correspondente às políticascien tffíco- tecnológicas, verificam-se oscilações repetidasentre diretrizes de resposta às necessidades surgidas docrescimento industrial, e diretrizes de reorientaçao queprocuram introduzir modificações nos padrões de ex-pansão industrial, em consonância com os objetivos deum desenvolvimento social e político mais harmonioso.

A primeira orientação é caracterizada por medidas ediretrizes que visam a atender os requisitos tecnológicosda indústria, mediante a aceleração da incorporação e adifusão de tecnologias, sem preocupação maior com aorigem da mesma. A política de reorientaçao, por outrolado, abrange medidas que visam à redução do uso detecnologias importadas e o fomento e estímulos à ex-pansão da capacidade local, com objetivo de criar,adaptar e assimilar conhecimentos técnicos.

A falta de seletividade na aplícação de medidas pro-mocionais e os conseqüentes benefícios proporcionados,sobretudo às grandes empresas - inclusive estrangeiras -'-levam claramente à inferência de que as duas políticas,tanto na formulaçãoquanto na execução, foram íncoe-rentes e, aparentemente, incompatíveis.

Apresentamos, a seguir, num quadro sinótico, al-gumas das características da política tecnológica dequatro países - Brasil, Colômbia, México e Peru - lati-no-americanos.

4. A ESTRUTURA ECONOMICA ESEUS IMPACTOS TECNOLÓGICOS

Embora o planejamento econômico e, particularmente, oindustrial tenham se tornado institucionalizados, a par-tir do Plano de Metas do Governo J. K. (1956/60), ocrescimento da indústria foi guiado mais pelas vantagensde mercado protegidos do que pela ação planejadora doEstado.

No período de 1950-70 fortaleceu-se o argumentoda "proteção às indústrias nascentes", independente-mente do grau de desenvolvimento das empresas e 'dosprodutos, com profundas conseqüências, no sentido de:

a) reduzir ou eliminar os estímulos à atividade inova-dora, tanto na área de produtos quanto na de processosmais racionais de produção. Em mercados protegidos, oscustos mais elevados são transferidos ao consumidor eabsorvidos por ele;b) utilizarem-se tecnologias mais intensivas de capital,sobretudo nos ramos tecnicamente mais avançados;c) aumentar a dependência de tecnologias importadas.

Revista de Administração de Empresas

Pouca ou nenhuma demanda por tecnologias geradas in-ternamente;d) concentração econômica nos ramos onde a pro-dução em grande escala ou a complexidade tecnológica ,são fatores importantes.

Com o esgotamento do processo de substituição dasimportações de bens de consumo, no fim, da década de60, inicia-se, lentamente, o processo de substítuíçãode bens intermediários necessários à produção daqueles.

Os efeitos esperados dessa nova fase de industriali-zação, em termos de redução do desequilíbrio do ba-lanço de pagamentos e de aumento do nível de emprego,na estrutura industrial, mediante sua integração hori-zontal e vertical, não se concretizaram.

Os recursos necessários para os investimentos, emgrande parte vindos do exterior, e as importações deinsumos revelaram-se muito elevados, pesando excessiva-mente sobre o balanço de pagamentos. Ademais, dadasua característica capital-intensivo, o custo da criação deum novo emprego situou-se em níveis elevadíssimos, re-duzindo assim a possibilidade de absorção da mão-de-obra por parte do setor industrial, de maior dinamismo,nas economias latino-americanas.

Com o aumento da participação do capital estran-geiro na estrutura industrial e a conseqüente elevação deremessas de divisas, ao exterior, seja a título de lucros oude royalties, surgem, no início da década de 70, leis einstituições cuja função precípua é orientar e fiscalizaros investimentos estrangeiros e a transferência de tecno-logia. 2 .

Neste contexto, cabe também analisar criticamente,a política tecnológica do próprio Estado, quando atuacomo empresário em ramos dinâmicos da indústria detransformação. Ao proceder à escolha de tecnologia"apropriada", cria-se um conflito potencial entre osobjetivos da política econômica mais geral, visando aaltas taxas de crescimento do PNB, versus a maxímizaçãodo emprego; ou, ainda, a maxírnízação do retorno sobreo investimento versus a maxímízação do bem-estar so-cial. As empresas estatais nos .ramos de siderurugia, pe-troquímica, transporte, energia, telecomunicações, etc.,dificilmente escolherão uma tecnologia "ineficiente", ouseja, uma combinação de fatores que, por unidade decapital investido, leve a um nível de produção inferior,embora atenda a necessidade de criar mais empregos.Ademais, para as grandes unidades produtivas nos ramosdinâmicos, as escalas ótimas de produção s[o calcadasem experiências e situações de mercado de países desen-volvidos, pesquisadas e implantadas pelas empresas líde-'res. Da mesma forma pela qual no mercado interno asempresas menores são obrigadas a seguir os padrões tec-nológicos dos oligopólios líderes do ramo, assim tambémno mercado internacional os conglomerados transnacio-Dais dominam e controlam o progresso técnico de seusrespectivos ramos. Dentro dessa estrutura olígopôlíca dosmercados, reforçada pelos mecanismos de crédito e fi-nanciamento internacionais, e pelas normas de licitaçõese concorrências públicas impostas, toma-se praticamente

Quadro 1Característícas da política tecnolôgíca"

Brasil Colômbia México Peru

1. Papel do Estado naorientação do pro-cesso de industriali-zação

Proporciona apoio à in-dústria de maneira am-pla e g$lral

As prioridades indus-triais não estão clara-mente defínídas, sendodeterminadas pelas for-ças do mercado

Pouca orientação espe-cífica para a indústria, anão ser quando o Estadointervém como empre-sârío

Prioridade recentementeconcedida à indústria debens de capital

Proporciona apoio à in-dústria de maneira am-pla e geral

As prioridades indus-triais não estão clara-mente definidas, sendodeterminadas pelas for-ças do mercado

Não existe orientaçãoestatal específica para aindústria

Recentemente, conce-deu-se prioridade às in-dústrias capazes de com-petir nos mercados deexportação

Proporciona apoio à in-dústria de maneira am-pla e geral

As prioridades indus-triais não estão clara-mente definídas, sendodeterminadas pelas for-ças do mercado

Não 'existe orientaçãoestatal específica para aindústria

Prioridade recentementeconcedida à indústria debens de capital

Proporciona apoio seleti-vo à indústria com baseem um modelo predefí-nido de industrialização

Prioridades industriais de-finidas por uma legislaçãoespecífica

Intervenção estatal espe-cífica em indústrias bási-cas e estratégicas; regula-mentação de toda a in-dústria (pouca atenção àindústria privada)

Diminuição recente da in-tervenção estatal na in-dústria

2. Apoio por mecanis-mos de promoção(positivos) ou decontrole (negativos)

Apoio, sobretudo pormeio de medidas pro-mocionais e incentivospara manter o ritmo daindustrialização

Uso limitado de medi-das de controle, princi-palmente sob forma deregistros de investimen-tos estrangeiros, de con-tratos de licença e decontrole de câmbio

Apoio limitado por meiode medidas de promo-ção, de natureza credi-tícia e fiscal, para sus-tentar a industrialização

Apoio substantivo, pormedidas de controle,sobretudo de câmbio;regulamentação de in-vestimentos estrangei-ros e registros e nego-ciação de contratos delicença

Apoio, sobretudo pormeio de medidas pro-mocionais e incentivos,para manter o ritmo deindustria1izãção

Uso limitado de contro-les, principalmente naregulamentação dos in-vestimentos estrangeirose no registro de contra-tos de licença

Apoio, sobretudo pormeio de mecanismos com-pulsórios 'e de controle àindústria

Uso limitado de medidaspromocionais, e dentrodo marco de leis compul-sórias 19

3. Formas de interven-ção estatal

Fornecimento de serviçosbásicos à indústria

Fornecimento de servi-ços básicos à indústria

Empresas estatais encar-regadas dos insumos-chave para a indústria(aço, petróleo, energia)

Uso limitado de meca-nismos de planejamento

Regulamentação signifi-cativa da economia

Importância chave dofinanciamento estatalpara a indústria

Fornecimento limitadode serviços básicos à in-dústria

As empresas estatais nãotêm papel importante

Uso limitado de mece-nismos de planejamento

Escassa regulamentaçãoda economia

Financiamento estatalsignificativo para a írí-dústria

Fornecimento de servi-ços, facilidades e infra-estrutura básicos pàra aindústria

Empresas estatais encar-regadas dos insumos-chave para as indústrias(aço, petróleo)

Uso limitado de meca-nismos de planejamento

Escassa regulamentaçãoda indústria

Papel chave do financia-mento estatal para li- in-dústria

Papel chave das empresasestatais em muitos ramosindustriais (e limitado pa-pel da indústria privada)

Recurso a difusos meca-nismos de planejamento,utilizados por empresas eentidades estatais

Ampla regulamentação daeconomia

Papel chave do financia-mento estatal para a in-dústria

4. Caracterização dogrupo de instrumen-tos de política tee-nolÓgica

Formulação e utilizaçãopragmáticas dos instru-mentos de política, res-pondendo a estímulosde curto e médio prazo

Uso ambíguo dos ins-trumentos de política:ativos em medidas decontrole e passivos emmedidas promocionais

Redundância das medi-das promocionais paraa indústria

Caráter formal dos inves-timentos de política compouco efeito na orienta-ção da indústria privada

(continua)

Polftica tecnológica

Quadro 1 (continuação)

PeruBrasil Colômbia México

4. Caracterização dogrupo de instrumen-tos de política tec-nológica

Sofisticação e especifi-cidade crescentes dosinstrumentos de política

Fragmentação crescentedos investimentos depolítica, à medida quese tornam mais especí-ficos

Grande ênfase nos me-canismos financeiros

Adoção de uma posiçãorestritiva ou defensiva arespeito da tecnologiaestrangeira

Falta de seletividade eespecificidade dos ins-trumentos de política

Caráter não seletivo damaioria dos instrumen-tos de política

Passividade (as entida-des governamentais to-mam a iniciativa)

Falta de seletividade ede possibilidades de dis-criminar na aplicação deinstrumentos de política

Caráter discricionário degrande número de ins-trumentos de política

Poucos instrumentos(sobretudo os de con-trole) são empregadospara influir diretamenteno comportamento daindústria

Passividade das medidaspromocionais

Caráter altamente discri-minatório dos instrumen-tos de polÍtica

Adoção de uma posiçaorestritiva e defensiva a res-peito da tecnologia es-trangeira

A maioria dos instrumen-tos de política são de na-tureza legal e compulsó-ria

5. Coerência da políti-ca de C & T e graude integração comas políticas indus-triais

Concede-se apoio a C &T dentro de um contex-to pragmático de polí-ticas industriais

Entidades governamen-tais exercem um papelcoordenador nos esfor-çosdeC& T

Políticas de C & T deri-vadas de políticas de in-dustrialização

Alternação de uma po-lítica de C & T de "res-posta" e de uma reori-entação da demanda detecnologia para fonteslocais

Políticas de promoçãode C & T, porém semvinculação com as deindustrialização

Falta de coordenaçãodas atividades de C & Te das entidades governa-mentais engajadas napolítica de C & T

Marginalização das con-siderações tecnológicasna hora de estabelecerpolíticas de industriali-zação, e de avaliar ínves-timentos

Falta de correspondên-cia entre as políticas in-dustrial e de C & T

Políticas de C & T ori-entadas para -a promo-ção de pesquisa e desen-volvimento

Papel coordenador li-mitado de entidades go-vernamentais

Considerações tecnoló-gicas omissas na hora deestabelecer políticas deindustrialização

Falta de coerência entrepolíticas de industriali-zação e de C & T

Políticas de C & T inde-pendentes das de indus-trialização e relativamen-te sofisticadas

Tratamento integrado detodos os aspectos das po-líticas industrial e deC &T, em uma única entidade

Fragmentação dos esfor-ços de formulação de po-lÍticas de C & T, e faltade coerência e de coorde-nação com as políticas deindustrialização

6. Mudanças recentesda política de C & Tindustrial por partedos governos

Amplo crescimento deverbas para atividadesde C & T, nos setoresestratégicos

Planos ambiciosos paraa expansão da infra-estrutura de C & T

Liberalização do comér-cio internacional e daeconomia

Relativa abundância dedivisas, que modificouas condições contextuais

Natureza cíclica da açãogovernamental, determi-nada por fatores políti-cos

Abandono dos esforços Relativa liberalização dade planejamento do de- economiasenvolvimento de C & T

Mudança política recen-te (1977) implica mu--danças de política deC&T

Redução do papel do Es-tado na indústria

A crise financeira e eco-nômica relega a um segun-do plano as consideraçõestecnológicas

OI< Adaptado de Sagasti, F. Ciencia y tecnologia para el desarrollo: IDRC - 109s, Otawa, 1978.

impossível à empresa individual escolher tecnologianova, pouco ou não experimentada, portanto, de altorisco para os resultados econômico-financeiros e aprópria sobrevivência da empresa.

Seguem, a título de ilustração, algumas caracterís-ticas do sistema e das políticas econômicas nos paíseslatino-americanos, e seu provável impacto no sistemacíentfflco-tecnolôgíco."

Revista de Administração de Empresas

Características do sistema econômico Impacto implícito sobre o sistema C & T

Dualismo tecnológico (poucas empresas oligopólicas,tecnologicamente avançadas, coexistem com muitasPME atrasadas)

- Capacidade produtiva ociosa

- Mecanismos "perversos" de formação de preços (oli-gopólios, protecionismo, controle de preços, etc.

- Predomínio de investimentos estrangeiros (especial-mente nos setores-chave dinâmicos)

Grandes desigualdades na distribuição da renda

- Conservadorismo das empresas locais

- Altas taxas de inflação

Falta de alternativas tecnológicas viáveis

- Políticas de crédito favorecem a aquisição de bens decapital no exterior, especialmente quando há envolvi-mento de programas de ajuda e de crédito externos

- Incentivos fiscais atuam no sentido de promover in-vestimentos de capitais adicionais (isenção de tributos,taxas, créditos fiscais, etc.)

- Políticas trabalhistas e sociais oneram o custo demão-de-obra (previdência social, fundos de desemprego,seguro-doença, etc.

- Valorização excessiva da taxa de câmbio (barateandoas importações]

- Barreiras tarifãrias e medidas protecionistas, comoelementos de uma estratégia de índastríalízação porsubstituição de importações

Somente um pequeno número de empresas é capazde absorver tecnologia moderna, constituindo-se em con-sumidores potenciais do know-how gerado pelas ativi-dades de P & D. Essas empresas estão geralmente ligadasao capital estrangeiro

- Tornam-se desnecessãrias pesquisas visando a elevaro nível de produção - esta pode ser prontamente ex-pandida

- Empresários não têm incentivos reais para reduzircustos e operar mais eficientemente. Por isso, há poucademanda de P & D

- As necessidades de P & D são atendidas do exterior.Somente atividades de rotina sâo realizadas localmente

- As atividades industriais estão orientadas para a pro-dução dE!.bens de consumo para um pequeno segmentoda população com renda elevada. As tecnologias neces-sârias para produzir esses bens de consumo são impor-tadas

- Preferência por tecnologia (geralmente estrangeiras)conhecidas e experimentadas; desconfiança para com acapacidade tecnológica local. Escassez de capitais derisco para inovações 21

- Preferência por investimentos capital-intensivos, alongo prazo, sobretudo quando fínancíados por fundose recursos estatais

- Tecnologias inadequadas desenvolvidas no exteriorsfo importadas e utilizadas em contexto diferente

- Tecnologias capital-intensivo sãc preferidas a tecnolo-gias utllizadoras de mão-de-obra, em larga escala

- Investimentos em equipamentos tomam-se mais atra-tivos do que investimentos em capital de giro, a fim deampliar-se a força de trabalho

-'--Demanda de equipamentos, máquinas e mesmo bensintermediãrios é orientada para o exterior, sobretudopara os países ,desenvolvidos

- A Importação de máquinas e equipamentos.estran-geiros toma-se economicamente interessante

~ A proteção indiscriminada toma a ínefícíêncía lucra-tiva e reduza demanda efetiva de atividades de pesquisae deserivolvimento

Potttica tecnológica

5. INSTRUMENTOS DE POLITICA TECNOLÓGICA

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Na análise das políticas tecnológicas adotadas nos paísesda América Latina, distinguimos entre a explícita e aimplícita, sendo a primeira expressa por documentos,decretos, leis e pronunciamentos oficiais, que implicamcerto grau de normalização do comportamento tecnoló-gico dos empresários. A criação de organismos burocrá-ticos, secretarias ministeriais, conselhos, etc., e a elabo-ração de planos de desenvolvimento de C & T, bemcomo a constituição de órgãos específicos para o finan-ciamento de atividades de P & D (por exemplo: Fínep,Funtec, etc.), caracterizam o esforço de implantar umapolítica científico-tecnológica, embora de poucos resul-tados concretos, na maioria dos países latino-americanos.

O conceito de política tecnológica "ímplícíta" re-fere-se aos efeitos produzidos por medidas, diretrizese planos que não fazem parte das atividades de pesquisa edesenvolvimento tecnológicos, porém resultam de deciosões e políticas adotadas em outras esferas da vida social- a economia, a educação e cultura, as relações exte-riores, etc. Examinaremos a seguir, a título de ilustração,as políticas referentes a: a) regulamentação e registro dasimportações de tecnologia; b) controle das importações;c) regulamentação dos investimentos estrangeiros; d) po-lítica de desenvolvimento e fmanciamento industrial;e) compras de empresas estatais; f) promoção de expor-tações, sem contudo pretender esgotar o elenco de medi-das, de impacto tecnológico indireto.

a) Regulamentação e controle das importações de tec-nologia. O objetivo. precípuo das medidas de controlenão é a elíminação das importações de tecnologia - im-possível na configuração do sistema econômico atual - esim a regulamentação do fluxo de importações que de-terminam em boa parte a estrutura tecnológica da indús-tria e as possibilidades de desenvolvimento de umpoten-cial nacional de C & T. Como todas as medidas empolí-tica econômica também a aplicação dos instrumentos de

. controle sobre importações de tecnologia cria conflitos econtradições, com os objetivos e metas explícitos dosplanos de desenvolvimento. A curto e médio prazos, oscontroles estritos tendem a afetar a taxa de crescimentodo PNB (impedindo OU adiando a introdução de novosprocessos ef ou produtos). Os preços tenderão a au-mentar, dado que, no início, a produção local estaráprovavelmente menos eficiente e seus custos mais ele-vados que os similares produzidos com tecnologia estran-geira. O mesmo raciocínio pode ser aplicado à qualidadedos produtos, em conseqüência da falta de experiênciadas empresas manufatureíras nacionais.

Relativa escassez da oferta, por insuficiência da pro-dução local e desistência dos fornecedores estrangeirospor causa das restrições e controles impostos, constituioutro aspecto negativo de uma política de controle dasimportações de tecnologia, e que pode levar diferentesgrupos de pressão - empresários nacionais e empresasestrangeir~ - a protestar ou resistir às mesmas.

Revista de Administraç4'o de EmprellZll

Por outro lado, a regulamentação da importação detecnologia pode proteger as indústrias incipientes, esti-mulando seu desenvolvimento e expansão; conduziraum melhor equilíbrio do balanço de pagamentos; gerarmais empregos e promover o desenvolvimento do poten-cial científico-tecnológico nacional.

De fato, as novas indústrias podem aproveitar aoportunidade de tomarem-se mais eficientes antes de en-frentar . a concorrência dos produtos importados.Ademais, o aparecimento de problemas técnicos, semprepresentes, exigindo soluções por parte dos engenheiros e

'técnicos nacionais, resultará, quase inevitavelmente, emaumento da.capacidade científico-técnica nacional.

Dentro do elenco de medidas adotadas, com o obje-tivo de fiscalizar e regulamentar aimportação de tecno- 'logia, destaca-se o registro de contratos de licença, os:quais se referem principalmente às importações de ~cno-logias desincorporadas, assumindo estas a forma de co-nhecimentos, especificações, procedimentos fabris, de-senhos e planos, assistência técnica e experiência admi-nistrativa, proporcionados pelo proprietário da tecnolo-gia, mediante licença.

A tecnologia desincorporada resulta da realização.sístemãtíca de atividade de P -& D, bem como da expe-riência acumulada através do aperfeiçoamento e experi-mentação do processo manufatureíro. Em conseqüência,a ímportação de tecnologia mediante contratos de li- .cença constitui um canal importante para a aquisição detecnologia estrangeira.

Nos países da América Latina, as ínstítuíções para re-gistro de contratos de licença foram estabelecidas para'controlar a entrada de tecnologias estrangeiras, focali-zando inicialmente problemas de custos e procurandodiminuir a evasão de divisas, como pagamento deroyalties. Posteriormente, sua competência foi ampliadapara tratar de assuntos de natureza tecnológica e avaliaros contratos de licença por uma perspectiva mais ampla,de "interesses nacionais".

Dado que a concorrência entre as empresas locais serealiza com base em seu acesso diferencial à tecnologiaestrangeira, obtida mediante os contratos de licença;essas empresas se empenham a fundo para celebrai taisacordos, sem prestar muita atenção às suas cláusulas econdições. Isto tem permitido um sem-número de abusospor paite das licenciadoras, condicionando a concessão àcompra de bens de capital e/ou intermediários, restrin- ,gindo as vendas e exportações das empresas concessioná-rias, e estabelecendo uma série de outros controles quepermitirão a posterior aquísíção da empresa local.

A exigência de registro dos contratos encontra resis-tência, tanto das empresas locais quanto das estrangeirasque operam no país, bem como dos fornecedores detecnologia e dos seus advogados, especialistas em pro-priedade industrial, alegando todos que ao Estado nãocompetiria intervir no processo de negociação entre ven-dedores e compradores de tecnologia. Entretanto, umdos resultados mais importantes da criação de registrosde contratos foi a revelação de uma série de problemas

relacionados com a transferência de tecnologia, taiscomo:

- o volume e a base de cálculo dos royalties pagos emdiversas circunstâncias;- a seleção de fornecedores de tecnologia;- a preocupação do fornecedor de manter em dia eaperfeiçoar a tecnologia licenciada;- o problema das cláusulas restritivas ou condicionantesnos contratos;- a qualificação e experiência dos técnicos estrangeiros;- a proliferação dos contratos de licença para ummesmo tipo de produto.

Cada um desses pontos implica opções complexasnas esferas econômica, tecnológica e política, antes igno-radas ou pouco conhecidas. Essa revelação, através dosregistros de contratos .de licença, deve ser consideradacomo um resultado positivo dos mesmos, com profundasimplicações na política tecnológica.

b) Controle das importações. Todos os países emde-senvolvimento procuram empregar uma série de políticas.visando a controlar as importações de bens de outrospaíses, seja para proteger a indústria local, seja para equi-librar seu balanço de pagamentos. O elenco de instru-:mentos utilizados é amplo: taxas e/ou isenções alfande-gárias; listas, quotas, licenças de divisas; monopólios esta-tais de importação, etc., todos com o objetivo de desen-corajar ou restringir certos tipos de importações.

O controle das importações exerce efeitos indiretose implícitos sobre a estrutura tecnológica da indústria,ao determinar os tipos de bens de capital e produtosintermediários - ambos com tecnologia incorporada -que podem entrar no país, para serem incorporados emsuas atividades produtivas.

Ademais, a restrição de importação de certos produ-tos, enquanto se encoraja sua produção local, que exigiráaquisição de tecnologia para sua fabricação, pode influirsobre a confíguração da estrutura tecnológica do setorindustrial.

Os diversos instrumentos de controle das importa-.ções foram aplicados, via de regra, no contexto das polí-ticas de substituição das importações, adotadas nospaíses da América Latina, nestas últimas décadas. Suaaplicação se fez, sobretudo, no setor de bens de consumoe, em medida muito menor, no de bens de capital e deinsumos para a indústria de transformação. Esta política,embora criasse sérias distorções na estrutura industrial,não chegou a proporcionar incentivos suficientes para odesenvolvimento de indústrias de bens de capital,

O controle das importações parece constituir umafaca de dois gumes: enquanto estimula a industrializaçãoa curto prazo, introduz fatores de distorção da estruturaindustrial, em virtude de um protecionismo excessivo.

c) Regulamentação dos investimentos estrangeiros. Apolêmica a respeito do assunto é extensa e tem sido anali-sada em outro trabalho,". Mencionamos aqui apenas o

fato da concentração elevada dos investimentos, con-dições de causas diretamente sobre o potencial tecnoló-gico do país. As empresas maiores e mais avançadas emdiversos ramos da produção industrial são de pro-priedade estrangeira, e seu impacto sobre o perfil tecno-lógico da indústria é muito acentuado. Em geral, os in-vestimentos estrangeiros tendem a concentrar-se emramos tecnologicamente mais avançados da indústria detransformação (petroquímica, automobilística, eletroele-trônica, etc.), cujos efeitos indiretos sobre a estruturaindustrial, através das relações interindustriais "parafrente" e "para trás", sao mais intensos do que os dosramos mais "tradicionais".

Dado o fato de, em certos ramos, o investimentoinicial exigir recursos volumosos, fora do alcance das em-presas nacionais e, inclusive, dos governos, parece ineví-:tável recorrer-se a fontes de financiamento externas. Istonão implica, todavia, que a empresa estrangeira forneçatodos os recursos necessários para o empreendimento,sendo que estes são freqüentemente proporcionados porbancos comerciais, entidades fínanceíras internacionaise/ou mercado de capitais local.

Além disso, em certas áreas tecnológicas, as em-presas estrangeiras se recusam a fornecer recursos pro-dutivos e tecnologia, a menos que lhes seja dada a opor-tunidade' de investimento direto, com o controle totaldas operações.

A exigência de joint-venture formulada por diversosgovernos latino-americanos para setores-chave da eco-nomia (minicomputadores, equipamentos de telecomuni-cações, petroquímica, etc.) permite a participação acio-nária de empresas estrangeiras, em troca de suprimentoda tecnologia necessária.

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d) Polttica industrial. A programação do desenvolvi-mento industrial e o estabelecimento de projetos priori-tários, mediante medidas legais, administrativas e institu-cionais, constituem um instrumentário fundamental paradeterminar e orientar a estrutura da indústria. Na prá-tica, resultam em um sistema de incentivos, ou proi-bições e outros mecanismos intervencionistas, visando atraçar a trajetória da estrutura industrial.

Nos países latino-americanos, é possível identificarquatro tipos de instrumentos utilizados na programaçãoindustrial.

O primeiro compreende um sistema de incentivos,sem qualquer obrigação a eles vinculada, visando aorientar o comportamento das empresas em determinadadireção, especialmente em termos de investimentos.

O segundo instrumento combina um sistema de in-centivos com certos controles estatais, condicionando dealguma forma a concessão de incentivos e benefícios ao ,preenchimento de certos requisitos econômicos, locacio- .nais, etc.

A ineficiência dos controles governamentais leva fre-qüentemente ao afrouxamento das normas estabelecidas,assemelhando a política industrial à do primeiro tipodescrito anteriormente.

Polftica tecnológica

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o terceiro tipo de instrumento de programação in-dustrial consiste em um conjunto de normas e restriçõesde caráter compulsório, ao qual as empresas devem sujei-tar-se para poder operar. Embora possa incluir tambémalguns incentivos, seu peso relativo será menorv compa-rado às medidas compulsórias, pelas quais o Estado.pro-cura influenciar a estrutura industrial mais diretamente,sem contudo envolver-se, efetivamente, em atividadesprodutivas.

Finalmente, o Estado poderá aplicar medidas deprogramação industrial, através de intervenção direta nasatividades produtivas, reservando certos ramos da índüs- 'tría para. empresas estatais ou sociedade de economiamista.

Outro instrumento da política industrial, comimpacto potencial na estrutura e funcionamento das em-presas, é representado pelos mecanismos de fínancia-mento industrial.

Nos países da América Latina, dada a debilidaderelativa das empresas nacionais e as dificuldades que en-frentam para fínancíar sua própria expansão, as enti-dades financeiras estatais tomaram-se fonte principal derecursos para suprir capital a longo prazo e, geralmente,a taxas negativas para a indústria. Este fato poderia servirpara orientar o comportamento tecnológico das em-'presas mediante a formulação de normas e requisitos àseleção de tecnologia; importação de tecnologias me-diante contratos de licenças; e realização de atividades deP & D. As entidades financeiras estatais podem, também,criar linhas de crédito especiais para empresas de enge-nharia, para o desenvolvimento e experímentação denovos produtos e processos, bem como para financiardiretamente as atividades de pesquisa e de desenvolvi-mento tecnológico.

A variedade e amplitude de critérios tecnolôgícospossíveis de serem introduzidos no processo de avaliaçãode projetos, e seu fínancíamento indicam que os mecanis-mos de financiamento industrial podem converter-se emum dos instrumentos mais eficazes para a, promoção dademanda por conhecimento de C & T locais.

e) Compras estatais. O uso do poder de compra estatalpode ser considerado como um dos instrumentos màiseficazes - junto com a programação e o financiamentoindustrial - para a promoção de demanda por atividadesdde P & D 100000s.

Em todos os países latino-americanos, os orça-mentos públicos, da administração direta e das empresasestatais, constituem uma parcela muito significativa dóconsumo e dos ínvestímentos totais, mormente nosseto-res em que o Estado atua como agente-produtor, talCOlI\9 nas indústrias de base.

Em conseqüência, as políticas governamentaispodem estabelecer diretrizes que favoreçam o desenvolvi-mento do potencial nacional de C & T. Ao adquirirembens e serviços, as empresas e repartições públicas podemdar preferência a produtos que incorporem parcelasmaiores de tecnologia e de insumos locais,exigindo

Revista de Adminiltração de EmpreSlls

também o aperfeiçoamento contínuo da qualidade dosprodutos e serviços comprados no país.

Tal política implicaria que empresas e entidades es-tatais estivessem dispostas a incorrer, possivelmente, em

, custos mais elevados; a tolerar prazos mais longos deentrega e, eventualmente, níveis de qualidade maisbaixos, pelo menos na fase de "aprendizagem" dos for-necedores locais.

Embora tal orientação e conduta por parte das em-presas e entidades públicas sejam teoricamente possíveis,na prática do raros os casos de utilização do poder decompra estatal para o fomento de C & T nacionais.

t) Promoção de exportações. Alguns países da AméricaLatina, ao alcançarem certos graus de industrialização,por substituição das importações, enfrentaram pro-blemas causados pelas dimensões estreitas de seus res-pectivos mercados internos e procuraram superar estalímítação, incentivando e subsidiando as exportações.

Os instrumentos de promoção das exportações con-sistem em diversas medidas visando a proporcionar apoioe assistência àquelas empresas e indústrias, que têm me-Ihorescondíções de penetração no mercado mundial.Além de medidas de incentivo direto (isenção de impos-tos, etc.), é possível proporcionar apoio sob forma deassistência técnica, controle de qualidade, informaçõessobre os mercados, etc.

Entretanto, a longo prazo, as medidas de promoçãodas exportações serão eficazes somente se as empresas

,forem razoavelmente efícíentes, ou seja, produzirembens melhores e mais baratos, inclusive para o mercadolocal, que se, tomam competitivos com relação aos pro-dutos similares importados.

Os efeitos produzidos pela promoção das exporta-ções sobre o sísteme científico-tecnológico nacionalpodem assumir a forma de pressões para aumentar a pro-dutividade, melhorar a qualidade, ou reduzir os preços,com base nos incentivos concedidos às empresas exporta-doras, o que levaria, por sua vez, ao incremento da de-manda por P & D locais.

6. INSTRUMENTOS DA POUnCATECNOLóGICA EXPLfCITA

O conjunto de instrumentos da política tecnológica ex-plícita visa a induzir as empresas industriais à realízaçãode atividades de P & D, a fím de assegurar a absorçãoadequada de tecnologia, de origem nacional ou estran-geira, pelo setor industrial. Em última análise, as inova-ções na tecnologia industrial repercutem na economiamediante o aumento, da produtividade, ao nível das em-presas.

Entretanto, se a tecnologia estrangeira estiver facil-mente acessível, e as importações de tecnologia do-minando a oferta tecnológica, será pouco provável que asempresas locais imobilizem seus parcos recursos técnicose fínanceíros em atividades de P & D, a não ser aquelasde cartter rotineiro - manutenção, controle de quali-

dade, etc. Qualquer inovação que implique riscos econô-mico-financeiros será evitada ou postergada até oferecermaiores garantias de rentabilidade.

Nas fases iniciais da formação da estrutura índus-. trial, as. empresas locais não atribuem importância às ati-vidades de P & D, que não slo necessárias para perma-necerem no mercado e competirem efetivamente, !ia_dasas barreiras protecionistas criadas pela política econô-mica. Ademais, as filiais das companhias transnacionaisrecorrem à transferência de tecnologia de suas matrizes,tomando limitados e insignificantes seus esforços deP & D nos países em desenvolvimen!o ..

Entre as medidas adotadas pelo poder público parafomentar e estimular atividades de P & D, distinguimos,

.basicamente, duas categorias: a) criação de linhasde cré-dito especiais para atividades de P & D; b) emprego de'incentivos tributários para estimular as empresas a pes-quisarem e se desenvolverem.

Esses instrumentos 810 complementados por umasérie de medidas administrativas, facilitando a impor-tação de equipamentos e outros insumos para a reali-zação de atividades internas de P & D, pelas empresasindustriais. Via de regra, todavia, as linhas especiais decrédito para P & D não têm. sido muito efetivas. OFundo Nacional para o Desenvolvimento Científico eTecnológico (FNDCT), criado no Brasil, representa uminstrumento fmanceiro complexo, que proporciona re-cursos a universidades, laboratórios de pesquisa e,também, às empresas. O veículo principal para a canalí-zaçfo de fundos para as empresas industriais interessadasem desenvolver atividades de P & D é constituído peloPrograma de Desenvolvimento tecnológico-industrial,administrado pela Finep '(Financíadora de Estudos e Pro-jetos). Nlo existem, até o presente, ínformaçõessufícien-tes para avaliar os resultados dos esforços despendidospela Finep. As poucas evidências empíricas disponíveis,todavia, parecem revelar impactos de reduzida impor-tância na estrutura industrial.

Finalmente, em praticamente todos os países latino-americanos, foram criados, embora em grau e extensãodiferentes, diversos instrumentos de apoio às atividadescientífico-tecnológicas, tais como sistemas de normas epadrões técnicos, centros de ínformação e de documen-tação, organização de consultoria e engenhariade de-senho, centros de capacitação e treinamento de pessoal;'etc. Sua eficiência, porém, permanece muito abaixo deníveis desejáveis e possíveis, pelos motivos estruturaisapontados acima.

7. CONSIDERAÇOES FINAIS

Ao verificar-se a profunda dependência tecnológica dospaíses latino-amencanos, surgiram esforços e propostaspara reduzirem-na através de uma política de autonomiarelativa, cujos objetivos seriam: a) reduzir a dependênciadas fontes externas de oferta de tecnologia; b) imple-mentar medidas visando a aumentar a eapacidade na-

.cional de criação, adaptação ou.íncorporação de conheci-mentos técnicos.

Na realidade, foi posta em prática uma política de"resposta" às exigênciasdo aparelho de produção, a quallevou à aceleração da absorção e difusão de inovaçõestécnicas por parte do sistema produtivo, sem maiorespreocupações com a origem externa" ou interna dos co-nhecimentos técnicos. À medida que progrediu o pro-cesso de substituíção das importações, foram tambémredefmidos os padrões de transferência de tecnologia doexterior: .reduzíu-se a importância do aporte externo detecnologia incorporada, enquanto se intensificava ofluxo de tecnologia não incorporada, mediante os con-tratos de assistência técnica, de elaboração de projetosde engenharia, e de cessfo de direitos de uso de marcase de processos protegidos por patentes.

Estes contratos têm sido celebrados sobretudo comsubsidiárias ou associadas de empresas transnacionais,principais fontes de inovações tecnológicas surgidas nospaíses desenvolvidos. A presença e o contínuo aumentodos investimentos estrangeiros, mediante a partícípaçãodo capital transnacional no sistema produtivo, tiveramefeitos marcantes sobre o potencial tecnológico local. Sea ímplantação de empresas estrangeiras, por um lado,desencadeava uma demanda de bens de capital locais,por outro, gerava maior necessidade e dependência detecnologia mais complexa e sofístícada. As próprias em-presas estrangeiras iriam procurar o know-how necessárioem suas respectivas matrizes, constituindo-se sua entradaem obstáculo praticamente intransponível para a pes-quisa tecnológica nacional, dotada de recursos inferiores,e sofrendo de problemas organizacionais e ínstitucionaís,tais como a falta de apoio sistemático do poder público ea inexistência de uma infra-estrutura, de um sistema deinformações, etc., para o desenvolvimento tecnológiconacional.

A redução, de forma concreta, da dependência deoferta externa de tecnologia não chegou a constituir-se,em nenhum momento, em objetivo prioritário dos go-vernos do Brasil, México e Colômbia (o Peru representaurna linha de ação mais nacionalista, no curto período de1968- 77), que estavam e continuam empenhados na in-serção de suas respectivas economias no mercado inter-nacional.

Portanto, não é possível equacionar e discutir osproblemas de política tecnológica separadamente dos dedesenvolvimento econômico, social e político, dos paíseslatino-americanos.

Na realidade, ao analisarmos a evolução da política,tecnológica, no período recente, verificamos a existênciade discrepâncias e incompatibilidades muito sérias entreas diretrizes desta e aquelas das autoridades formula-doras e executadoras da política econômica geral.

Os ôrgãos encarregados da execução dos planose daaplicação das normas e regulamentos da política tecno-lógica 810 geralmente lotados em ministérios de poucopoder decisório-político, mas em momentos de tensão econtradição abertas prevalecem os ditames da políticaeconômica, representada e defendida pelos grupos de in-

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Pol(tica tecnológica

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teresses mais poderosos do sistema. Por outro lado, aconstrução de um sistema nacional de P & D exige inves-timentos a longo prazo, sem retomo imediato, enquantoa política econômica adotada, em virtude da situaçãointernacional, da dependência econômica externa e daínstabílídade política interna, se orienta para objetivosde curto-médio prazo.

A consecução de altas taxas de crescimento do PNB,de índustríalízaçâo e urbanização, apregoadas e enal-tecidas como evidências ou sinônimo de desenvolvi-mento, é pouco propícia ao desenvolvimento de umacapacidade tecnológica autônoma, condíção sine quanon da soberania nacional, porém irrealizável à medidaque se alarga a partícipação do capital estrangeiro naestrutura industrial.

O predomínio do capital estrangeiro, de forma olí- .gopolista, nos principais ramos e atividades da economianacional, leva a que os empresários das PME nacionaisencarem a "inovação tecnológica" não somente comoalgo caro e de resultado incerto! mas também disfuncio-nal, dada a estrutura de seus respectivos mercados. Nascondições de concorrência imperfeita dos mercados debens de consumo durável, por exemplo, é muito maisconveniente e seguro para os empresários nacionais ado-tarem uma estratégia "imitadora" ou. "oportunista"(Freeman, 1974), copiando produtos e processos vialicenciamento, ou comprando equipamentos, embora acompra possa implicar aquísíçâo de um pacote tecnoló-gico, do que arriscar seus parcos recursos na criação emanutenção de um centro de P & D.

Não é de admirar-se, portanto, que em todos os paí-ses latino-americanos, os parcos progressos realizados emmatéria de P & D, visando maior autonomia tecnológicanacional, foram-no com o apoio e o engajamento dopoder estatal, ou seja, com os recursos do tesouro nacio-nal, mediados pelas instituições fmanceiras oficiais.

Devem-se esclarecer, contudo, as limitações de umapolítica de maior autonomia tecnológica no contextoeconômico e político em que estio inseridas as econo-mias latino-americanas. Os programas de desenvolvi-mento oficiais não mencionam a busca de tecnologiasalternativas como objetivo específico da política demaior autonomia, deixando implícita a inferência de quebastaria as empresas nacionais, nos países latino-america- .nos, criarem sua ''própria'' tecnologia, similar ou idên-tica à das empresas transnacionais, para resolver osnossos problemas de dependência, balanço de pagamen-tos, etc. Ao persistir a diferença fundamental de condi-ções sócio-econômicas, nas quais são produzidas as res-pectivas tecnologias, poder-se-ía falar de "alternativas"somen te à medida que estas implicassem o aproveita-mento de fatores de produção e matérias-primas diferen-tes, a fím de atenderem às necessidades básicas da popu-lação, mediante bens de consumo, também diferentes.Este tipo de orientação da política científico-tecnol6gicasó pode ser concretizado com base no desenvolvimentointenso de P & D nacionais, em função das condições epossibilidades da economia e sociedade nacionais.

Revi'ta de AdministTtIÇão de EmprUllB

Todavia, a estratificação social vigente nos paíseslatíno-amerícanos, caracterizada por uma distribuição darenda extremamente desigual, condiciona a adoção depadrões de consumo conspícuo por parte das minoriasmais afluentes, copiados das classes de rendas altas nospaíses mais desenvolvidos. O consumo dos mesmos pro-dutos exigirá inicialmente a livre importação destes e,após o "sucesso" do processo de substituição das impor-tações, a sua reprodução, baseada em licenças e patentesalienígenas no país. Daí é fácil inferir que à substituiçãodas inÍportações não é condição suficiente para o êxito'de uma política de autonomia tecnológica, sobretudoquando aquela vem acompanhada de uma políticaprotecionista, procurando assegurar a "reserva de mer-cado", mediante elevadas tarifas alfandegárias, taxascambiais irreais, licenças de importação, etc. A estruturaoligopolística da maioria dos mercados no setor manufa-tureiro, controlados por empresas estrangeiras, filiais detransnacionais, supõe um comportamento tecnológicodiferente do que seria em mercados de concorrência per-feita, dos empresários nacionais, com reflexos profundosna política tecnológica dos governos.

Uma análise, mesmo sumária, das políticas tecnoló-gicas implantadas e executadas nos países da AméricaLatina, em conseqüência do nível de substituição deimportações, parece revelar não somente a escassez dereais inovações tecnológicas autônomas, produzidas AOS

diversos ramos do setor manufatureiro, e visando, entreoutros, ao emprego mais intensivo de mão-de-obra e/oude matérias-primas nacionais. Fica patente, também, aausência de uma política tecnológica explícita, comple-mentar e perfeitamente coordenada com a política eco-nômica geral, a qual poderia gerar e sustentar um amploesforço de pesquisa e desenvolvimento, objetivando acriação de uma capacidade tecnológica autônoma. Emconseqüência, sem querer negar os esforços persistentesdos respectivos governos latino-americanos em promovere operar políticas tecnológicas, mediante planos e pro-gramas, durante as últimas duas décadas, são escassos eprecários os resultados em termos de uma in tegraçãodinâmica entre as universidades, os institutos e os cen-tros de P & D e os setores produtivos, capazes de consti-tuir, com o apoio decidido e eficaz do governo, um sis-tema nacional de ciência e tecnologia. Por outro lado,uma análise, mesmo sUmária, dos planos de desenvolvi-mento revela a íncoerêncía entre as metas da políticaeconômica, com suas políticas tecnológicas implícitas, eas dos planos e programas de desenvolvimento cientí-fico-tecnológico explícitos.

Assim, a proposição formulada, em certo momentodo processo de desenvolvimento, de criar um mercadode consumo de massa, como causa e efeito da absorção demão-de-obra em larga escala, mediante processos produ-tivos (tecnologias) mais "apropriadas", não encontraapoio decidido em diretrizes concretas da política econô-mica.

No caso brasileiro, o 1.0 PBDCT (Primeiro PlanoBásico de DesenvolvimentoCientífico-Tecllológico) for-mula intenções de reduzir a dependência externa, me-

diante a criação e adaptação de tecnologias, ou seja, umaautonomia tecnológica relativa. Por outro lado, exigetambém o fortalecimento da capacidade competitiva daindústria nacional, a ser conseguida através de recursosexternos e da participação do capital estrangeiro. Emconseqüência, o fortalecimento de pequenas e médiasempresas nacionais, embora mencionado em todos osplanos de desenvolvimento, nunca chega a constituir-seem meta principal, por colidir com o objetivo prioritáriode maximização das taxas de crescimento do PNB, oqual enseja uma política de transferência de tecnologia ede "resposta" às necessidades criadas e persistentementeampliadas 'pela industrialização por substituição dasimportações. As escassas medidas criando incentivos eestímulos às pequenas e médias empresas, geralmentesustentadas por recursos insuficientes, foram mais doque contrabalançadas por um dinamismo maior das gran-des empresas estrangeiras, as quais, embora contandocom recursos ínfínítamen te maiores, também se benefi-ciaram dos subsídios e incentivos oferecidos às empresasnacionais.

Em suma, pode-se postular que a formulação emesmo a execução de uma política científico-tecnológicagovernamental sejam condições necessárias, porém nãosuficientes no marco de referência jurídico-legal do mo-delo de crescimento adotado, para permitir a consecuçãode uma autonomia tecnológica progressiva. As evidênciasparecem indicar que a atuação do governo nas áreas deciência e tecnologia em si não é decisiva. Sua eficáciadependerá do grau de convergência com a política eco-nômica em vigor, bem como do apoio recebido de outrasdiretrizes, programas e planos, nas diferentes esferas davida social e cultural da nação.

1 Relatório de Pesquisa apresentado ao IDRC - IntemationalDevelopment Research Center (IDRC), do Canadá, por HemiqueRattner, Carlos O. Bertero e Claude Machline, EAESP/FGV, SãoPaulo, 1980. mimeogr.

2 No Brasil, foi criado o Instituto Nacional de PropriedadeIndustrial (INPI) (Lei n.? 5.648, de 11.12.70), e, um ano depois,uma nova lei (n.o 5.772, de 21.12.71) instituiu o ~digo dePropriedade Industrial, ambos de profundos efeitos sobre a 1is-temática de registro de contratos de transfeIência de tecno-logia.

Na Colômbia e no Peru, na mesma época, entraram em vigor asdecisões n.0s 24, 37, 37.a e 70 da Comissão do Acordo deCartagena,instaurando um regime comum nos países do PactoAndino, quanto ao tratamento a ser conferido. ao capital es-trangeiro e aos contratos de marcas, patentes, ücenças e royal-ties, bem como estipulando normas sobre a propriedade indu.trial (Decisão n.o 85).

No México, foi promulgada a lei de 9.3.73, para promover osinvestimentos nacionais e regular os estrangeiros, precedida pejaLei do Registro Nacional de Transferência de Tecnologia e deuso e exploração de marcas e patentes (Di4rio OrrcÜll, 30. dez.1972).

3 Adaptado de Science and tecnology policy implementation inless developed countries - IDRC - 067e, Ottawa, 1976.

4 Veja Rattner, H. Comércio internacional e desenwlvimento.In: A Crise da ordem mundial. São Paulo, Símbolo, 1977.

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Polttica tecnológica