Entre o passado e o futuro: a não acabada transição no Brasil1
Katya Kozicki2 Bruno Meneses Lorenzetto3
Sumário: 1 – Introdução; 2 – A ditadura e exceção; 3 – A ditadura “aplicada” e prolongada; 3.1 – Direitos políticos; 3.2 – Direito administrativo; 4 – Entre o passado e o futuro: a não acabada transição no Brasil; 5 – Anistia e Perdão; 6 – Considerações Finais; 7 – Bibliografia.
Os futuros não realizados são apenas ramos do passado: ramos secos. – Você viaja para reviver o seu passado? – era, a esta altura, a pergunta do Khan, que também podia ser formulada da seguinte maneira: – Você viaja para reencontrar o futuro? E a resposta de Marco: – Os outros lugares são espelhos em negativo. O viajante reconhece o pouco que é seu descobrindo o muito que não teve e o que não terá.4
1 – Introdução A preocupação política em construir um bom governo, impedir a
superveniência da ditadura, do abuso de poder e a necessidade de
democratização das esferas sociais são grandes questionamentos que
obtiveram diferentes respostas na modernidade ocidental e, nem sempre,
seguiram um caminho lógico, racional ou norteado pelo “progresso”.
1 Artigo publicado em: PIOVESAN, Flávia; PRADO, Inês Virginia. (Org.). Direitos humanos atual. Rio de Janeiro: Elsevier, 2014. p. 128-143. 2 Mestre em Filosofia e Teoria do Direito, UFSC/1993. Doutora em Direito, Política e Sociedade, UFSC/2000. Professora titular da Pontifícia Universidade Católica do Paraná e professora associada da Universidade Federal do Paraná, programas de graduação e pós-graduação em Direito. 3 Professor da Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Doutorando em Direitos Humanos e Democracia pela UFPR. Mestre em Direito das Relações Sociais pela UFPR. 4 CALVINO, Italo. As cidades invisíveis. São Paulo: Companhia das Letras, 2003. p. 29.
Se o fim da Segunda Guerra Mundial é usado como um referencial para
a nova compreensão da construção dos direitos humanos 5 , também
observados a partir deste mesmo marco – ocidental e moderno –, sua recente
construção teórica (que está longe de ser tida como uma obra de arte acabada,
consensual e pronta para ser aplicada, pois demanda ainda o enfrentamento
de grandes aporias e questionamentos6) não foi o vetor que norteou as práticas
políticas subsequentes dos países ocidentais.
Em certos casos o fim da Segunda Guerra representou um momento de
esperança, reconstrução, tempo para repensar as instituições governamentais,
políticas. Configurou momentos “constituintes”, no sentido amplo da palavra.
Em outros lugares do mundo, esta “alvorada ocidental” não pôde ser
admirada7. Iniciava-se, neste encadeamento, uma segunda metade de século
em que a “humanidade” enfrentaria interrogações sem precedentes.
A “Guerra Fria” e a bipolarização do mundo, com a influência de dois
grandes discursos, não se limitou à teoria. Os escombros deixados por uma
primeira metade de século marcada por duas guerras devastadoras e a
mudança rápida dos meios de produção, com o crescimento da industrialização
em larga escala, criou um novo panorama, um novo “mundo”8, no sentido
arendtiano do termo.
5 PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional. 3ª ed. São Paulo: Max Limonad, 1997. 6 Opõe-se, neste ponto, ao posicionamento adotado por Noberto Bobbio. Sobre a questão ver: BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004. 7 Como afirma Costas Douzinas: “Os direitos humanos constroem seres humanos. Sou humano porque o Outro me reconhece como tal, o que, em termos institucionais, significa que sou reconhecido como detentor de direitos humanos. (...) As campanhas de extermínio e genocídio da segunda metade do século XX mostram que a admissão formal dos seres humanos à dignidade da humanidade não é irreversível. Os prisioneiros dos campos de concentração alemães, cambojanos, ruandeses ou sérvios foram construídos como parasitas não-humanos, como seres tão inferiores e perigosos para os integralmente humanos que o seu extermínio consistia uma necessidade natural. (...) Conforme tristemente verificamos após as atrocidades e os genocídios do último e pior século do segundo milênio, o reconhecimento de humanidade jamais é totalmente garantido a todos. Vale frisar que não é uma questão de seres humanos terem direitos, mas que os direitos constroem o humano.” (DOUZINAS, Costas. O fim dos direitos humanos. São Leopoldo: Unisinos, 2009. pp. 375-376). 8 “Este mundo, contudo, não é idêntico à terra ou à natureza como espaço limitado para o movimento dos homens e condição geral da vida orgânica. Antes, tem a ver com o artefato humano, com o produto de mãos humanas, com os negócios realizados entre os que, juntos, habitam o mundo feito pelo homem. Conviver no mundo significa essencialmente ter um mundo de coisas interposto entre os que nele habitam em comum, como uma mesa se interpõe entre os que se assentam ao seu redor; pois, como todo intermediário, o mundo ao mesmo tempo separa e estabelece uma relação entre os homens.” ARENDT, Hannah. A condição humana. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2008. p. 62.
O medo do “Outro” se aprofundou na forma de uma impossibilidade
hipotética – uma guerra entre a União Soviética e os Estados Unidos não seria
possível sem a destruição do mundo – porém, na prática, a produção de armas
capazes de abolir a existência de toda a humanidade – o medo atômico – era
uma realidade.
Sob este mundo bipolar a política internacional, dicotômica, repercutiu
nos países periféricos e, aquilo que restou observado foi o esfacelamento
interno de democracias e governos, com a participação ativa dos dois lados do
globo na “regência”, na composição do novo jogo político internacional.
A experiência das guerras ocorridas nos grandes centros
(principalmente em solo europeu), não foi a mesma das periferias. Por isso, se,
no norte do mundo, os direitos humanos estavam em (re)construção, a
importação destes importantes discursos tardou. Também em decorrência dos
interesses dos grandes polos, foram forjados regimes ditatoriais que viessem a
atender aos interesses de um dos lados do globo.
Assim, as ditaduras na América Latina, um triste ponto em comum que
se compartilha no hemisfério sul, iniciaram-se nas décadas de 1960-1970,
motivadas por interesses políticos e econômicos de um jogo estratégico de
controle do “mundo”. Da mesma forma, as aberturas democráticas foram
tardias, nas décadas de 1980-1990, e o processo de transição, de recuperação
e compreensão dos atos realizados durante este período continua apenas
parcialmente resolvido, incompleto.
Estas questões demandam, por conseguinte, teorias e práticas capazes
de realizar o movimento duplo de lembrar o passado, construir memórias,
narrativas sobre os acontecimentos, mas, também, de diagnosticar os traços,
as características autoritárias presentes nas instituições públicas
contemporâneas e quais soluções devem ser indicadas para o
aperfeiçoamento ou completa reforma das mesmas. Estes são os temas que
norteiam o presente artigo e que serão desenvolvidos na sequência.
2 – A ditadura e exceção Ao se pensar no tema do bom governo, é comum a lembrança da sua
face negativa, o mau governo, para que, em um jogo de opostos, sejam
traçadas as propriedades que não se almejam ver exercidas no plano político
governamental das sociedades.
Por isso, uma das características próprias de um governo ditatorial seria
o exercício de poderes extraordinários no âmbito do poder executivo, com o fim
de perpetuar e aumentar a abrangência do organismo estatal, além da
diminuição da participação dos outros poderes na administração pública.
Contemporaneamente, a ditadura se tornou sinônimo de um mau
governo, oposto principalmente aos valores democráticos, mas não
necessariamente aos preceitos liberais (econômicos). Contudo, esta noção
estritamente desprezível da ditadura não foi observada desde sempre e de
maneira linear na história.
Observe-se a distinção que Carl Schmitt entre dois tipos de ditadura, a
clássica, “comissária” – em que o ditador realizava sua função extraordinária
nos limites da comissão recebida – e a “soberana” – a ditadura moderna,
decorrente das revoluções, em que se buscava a criação de uma constituição
autêntica, nascida de um estado de necessidade.9
De tal modo, enquanto na ditadura comissária o ditador recebia o poder
da carta constitucional, no caso da ditadura soberana, o ditador recebia o poder
de uma auto-investidura ou de uma investidura simbolicamente popular, seria
um poder constituinte.10
Segundo Bobbio, há uma questão semântica latente no que tange à
ditadura:
“À diferença do uso hodierno, no qual ‘ditadura’ enquanto contraposta de ‘democracia’ assumiu, como já pude observar, uma conotação
9 SCHMITT, Carl. La Dictadura. Madrid: Ediciones Castilla, 1968. Ronaldo Porto Macedo Jr. explica que: “Schmitt aceita a definição de Bodin e acrescenta que o ditador comissário, diferentemente do ditador soberano, aceita um encargo para realizar uma guerra, combater uma insurreição, resolver, enfim, uma situação de crise. Uma determinada Constituição vigente pode ser suspensa até que volte a normalidade e a própria Constituição possa ser novamente posta em vigor. Por tal razão, o ditador republicano (na Roma Antiga) era nomeado para agir por apenas seis meses. Schmitt observa que durante a Revolução Francesa surge um novo tipo de ditadura, distinta da ditadura de César e Silla, i. e., a ditadura soberana. Conforme foi salientado, a ditadura comissária se funda num pouvoir constitué, por delegação. A ditadura soberana, ao contrário, caracteriza-se pelo seu pouvir constituant, advindo do povo. Ademais, a ditadura soberana seria duradoura e não provisória como a ditadura comissária. Exemplos de ditadura soberana serão a França, entre 1793 e 1795, e a União Soviética, a partir de 1917.” MACEDO JUNIOR, Ronaldo Porto. Carl Schmitt e a fundamentação do direito. São Paulo: Max Limonad, 2001. p. 60. 10 BOBBIO, Norberto. Estado, governo, sociedade: para uma teoria geral da política. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987. p. 162.
quase sempre negativa, o primeiro uso de ‘ditadura’ para designar a ditadura revolucionária (e de resto também a ditadura militar) ressente-se do favor de que gozou o magistrado romano chamado em situações excepcionais para salvar a república de guerras ou rebeliões, e o termo acabou por ser ainda usado com uma conotação geralmente positiva.”11.
Não é novidade que o termo ditadura é derivado da dictatura romana. A
ditadura romana, então, voltava-se para remediar situações de emergência,
com uma razão, um motivo circunscrito. Pode-se dizer que era uma suspensão
temporária e justificável da ordem com um fim determinado “salvar a república”.
Na história recente a ditadura não teve seus limiares (romanos)
respeitados. Passou a se revestir de conotação negativa, com a concentração
absoluta do poder, afastamento da tradição e a falta de aceitação da
população, não restando qualquer traço republicano que viesse a justificá-la,
como anota Lucia Elena Bastos: “Tanto é que, normalmente, a ditadura retrata
uma ruptura da tradição, pois ela se instala utilizando a mobilização política de
uma parte da sociedade, no mesmo momento em que subjuga com violência
outra parte.”12
No caso do Brasil, no século XX, dois foram os momentos em que o país
experienciou a ditadura do tipo “soberana”. Em 1937, sob o governo de Getúlio
Vargas com a instauração do “Estado Novo” e com o golpe militar, em 1964
com a deposição de João Goulart.
A ditadura militar se caracteriza, diversamente da política, pelo fato da
cúpula do poder golpista ser proveniente do exército, enquanto que na ditadura
política esta cúpula é formada por uma classe ou partido político. Em 1964, a
“justificativa” dos militares para o golpe e a tomada do poder no Brasil, decorria
de uma estratégia em um leque tripartido de confrontos e suas respectivas
missões.
Primeiro, no caso de um confronto nuclear ou de uma nova Guerra
Mundial, na Europa, pouco teria a ser feito pelos militares da periferia.
Segundo, no caso de conflitos regionais na América do Sul, que se limitavam
ao plano teórico, o Brasil defenderia suas fronteiras de ameaças externas
11 BOBBIO, Norberto. Estado, governo, sociedade. p. 164. 12 BASTOS, Lucia Elena Arantes Ferreira. Anistia: as leis internacionais e o caso brasileiro. Curitiba: Juruá, 2009. p. 179
vizinhas. No terceiro caso, restava a missão voltada para garantia da
“segurança interna”, como observa Lucia Elena Bastos:
“De acordo com esta doutrina, caberia aos militares combater os inimigos internos, combate esse que levou a uma série de implicações negativas em relação à proteção dos direitos humanos e da cidadania, a partir da adoção, não apenas do regime ditatorial como da manutenção de um estado de exceção”.13
Por sua vez, o conceito de estado de exceção se conforma em uma
zona cinzenta. O direito constitucional tem manifestos problemas em tratar do
estado de exceção, ainda que a constitucionalização da exceção seja uma
constante, pois, entende-se que a previsão constitucional da exceção é uma
afirmação da democracia. Contudo, aquilo que se observa, é a exceção
tornando-se a regra, como aponta Gilberto Bercovici:
“Quando os argumentos de emergência são utilizados para todo tipo de crise, os limites entre normalidade e exceção são ultrapassados e a emergência vira regra. Um governo constitucional não pode, segundo Negretto, sobreviver em um contexto de crise permanente. A política de exceção permanente destrói o regime constitucional. O estado de exceção não está mais a serviço da normalidade, mas a normalidade a serviço da exceção.”14.
Para Giorgio Agamben, nas sendas daquilo que já havia sido dito por
Walter Benjamin, de que o estado de exceção havia se tornado a regra, este
transparece sua natureza de “paradigma constitutivo da ordem jurídica”.15 Ou
seja, o estado de exceção moderno é uma tentativa de inclusão no
ordenamento jurídico da própria exceção, ao formar essa zona cinzenta, em
que fato e direito coincidem.
Desta forma, ao invés de responder a uma lacuna normativa, o estado
de exceção torna-se uma abertura (ainda que fictícia) no próprio ordenamento
cuja finalidade é resguardar a estabilidade, a normalidade, a existência do
próprio ordenamento: “É como se o direito contivesse uma fratura essencial
entre o estabelecimento da norma e sua aplicação e que, em caso extremo, só
pudesse ser preenchida pelo estado de exceção, ou seja, criando-se uma área
13 BASTOS, Lucia Elena Arantes Ferreira. Anistia. p. 181. 14 BERCOVICI, Gilberto. Soberania e Constituição: para uma crítica do constitucionalismo. São Paulo: Quartier Latin, 2008. p. 328. 15 AGAMBEN, Giorgio. Estado de exceção. São Paulo, 2004. p. 18.
onde esta aplicação é suspensa, mas onde a lei, enquanto tal, permanece em
vigor.”16.
3 – A ditadura “aplicada” e prolongada Naquilo que diz respeito à experiência brasileira da ditadura militar, esta
aporia, formada pela aplicação de uma norma que suspende o próprio
ordenamento para salvá-lo, foi observada em diversos campos. Tanto o plano
administrativo, como o eleitoral, são exemplos das transformações realizadas
no corpo institucional do país que, em considerável medida, preservaram
traços autoritários em seus institutos após a abertura democrática do país.
Sintoma desta permanência foi a duração da abertura militar, lenta e
gradual, que se estendeu ao longo da década de 1980, expõe sua relação com
o fato de que o regime militar possuía uma cúpula dentro da hierarquia política
nacional, que foi detentora de poder suficiente para pautar a forma de abertura,
de transição do país para a democracia.
Pois, mesmo com o movimento das “Diretas Já”, com a demanda por
eleições diretas pelas principais forças política e da sociedade civil do país, as
eleições de 1985, que vieram a formar o primeiro governo civil desde o golpe
militar em 1964, ocorreram de forma indireta.17
3.1 – Direitos políticos
Na seara política e eleitoral, o Ato Institucional n. 2 de 1965 extinguiu
todos os partidos políticos existentes, cancelando seus registros nos seguintes
termos: “Art. 18 - Ficam extintos os atuais Partidos Políticos e cancelados os
respectivos registros. Parágrafo único - Para a organização dos novos Partidos
16 AGAMBEN, Giorgio. Estado de exceção. pp. 48-49. No mesmo sentido, observa Christoph Menke que: “The motto of dictatorship is order against law, but in the name of law. If the order which allows for the law dissolves in the situation of emergency or exception, then the ‘guarantee-function’ of the state must temporarily become independent with respect to the ‘idea of law’: the dictator must suspend the validity of law in order to guarantee its presupposition”. MENKE, Christoph. Reflections of Equality. California: Stanford University Press, 2006. p. 188. 17 Algumas consequências do golpe militar foram as seguintes: “O constitucionalismo e o Estado de direito – que nunca foram forte na altamente desigual sociedade brasileira – enfraqueceram-se mais ainda. A longa crise econômica diminuiu a capacidade fiscal e moral do Estado para desempenhar um papel integrador na sociedade e para fornecer serviços básicos aos cidadãos. A autonomia e o valor conferidos às instituições da sociedade política tonaram-se cada vez mais tênues.” LINZ, Juan J.; STEPAN, Alfred. A transição e a consolidação da democracia – a experiência do sul da Europa e da América do Sul. São Paulo: Paz e Terra, 2009. p. 204.
são mantidas as exigências da Lei nº 4.740, de 15 de julho de 1965, e suas
modificações.”.
Na sequência, com o Ato Complementar n. 4 de 1965, a ditadura militar
impôs o sistema bipartidário, além de proibir o uso de signos referentes aos
partidos políticos:
“Art. 13. Os nomes, siglas, legendas e símbolos dos partidos extintos não poderão ser usados para designação das organizações de que trata êste Ato, nem utilizados para fins de propaganda escrita ou falada. Parágrafo único. É vedada a designação ou denominação partidária, bem como a solicitação de adeptos, com base em credos religiosos ou em sentimentos regionalistas de classe ou de raça.”.
Logo, observou-se certa peculiaridade na nova configuração política do
país, pois, se de uma parte o regime possibilitava a articulação de uma
oposição, de outra parte, com instrumentos como a candidatura nata,18 os
senadores biônicos, inviabilizava-se qualquer tentativa robusta de oposição
política.
Como observa Orides Mezzaroba: “Ou seja, o Regime Militar, ele
próprio, propiciou a organização partidária de sua oposição para que dessa
forma conseguisse controlá-la pelos artifícios legais que também criou por si
mesmo.”19. Mas seu interesse era o de garantir sua própria legitimação, o que
levou a moldar a forma da sua oposição, a qual deveria ser responsável e fazer
críticas construtivas ao governo. Em 1966 foram constituídos, portanto, a
ARENA (Aliança Renovadora Nacional), bloco do governo militar, e o MDB
(Movimento Democrático Brasileiro), enquanto bloco de oposição consentida.
Em 1969 a ditadura editou a Lei de Segurança Nacional, Decreto-Lei n.
898/1969, sob o argumento de combate ao “inimigo interno”, que possibilitou ao
Estado determinar livremente as condutas que viessem a ser consideradas
18 No caso da candidatura nata, os políticos que exerceram ou estivessem a exercer mandato parlamentar durante a legislatura em curso por ocasião da promulgação da lei possuiriam direito subjetivo ao registro da candidatura, para o mesmo cargo, e para a legislatura subsequente. Em 2002 o STF deferiu medida cautelar na ADI 2530, no sentido de suspender a eficácia do §1º, do art. 8º, da Lei 9.504/97 (“Aos detentores de mandato de Deputado Federal, Estadual ou Distrital, ou de Vereador, e aos que tenham exercido esses cargos em qualquer período da legislatura que estiver em curso, é assegurado o registro de candidatura para o mesmo cargo pelo partido a que estejam filiados”). A decisão cautelar sustentou-se na ofensa ao art. 5º, caput (princípio da igualdade) e ao art. 17 (violação da autonomia partidária) da CF. A ação aguarda julgamento final. 19 MEZZAROBA, Orides. Introdução ao Direito Partidário Brasileiro. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002. p. 214.
criminosas contra a Segurança Nacional. Um exemplo era a prática de
qualquer ato com o fim de reorganizar partidos políticos extintos – como o
Partido Comunista Brasileiro (PCB).
O mesmo espírito autoritário teve continuidade ao longo da ditadura
militar no Brasil. Deste modo, a Emenda Constitucional n. 1 de 1969 reverberou
os modelos dispostos no Ato Institucional n. 5 e na Lei de Segurança Nacional.
Em 1976 o Governo de Ernesto Geisel baixou o Decreto-Lei n. 6.639,
também conhecido como “Lei Falcão”, que restringia a possibilidade de
divulgação midiática dos candidatos. No rádio e na televisão estavam proibidas
a apresentação de propostas, programas ou críticas às políticas do governo, os
candidatos deveriam se limitar a apresentar seus currículos e dados eleitorais
(nome, número, fotografia). No ano subsequente foi editado o “Pacote de Abril”,
que impunha: i) o recesso do Congresso Nacional; ii) eleições indiretas para
Governadores; iii) sublegendas para as eleições de Senadores.
A abertura política para a criação de partidos foi lenta. A partir da
Resolução 10.785/1980 passou a ser obrigatório o uso do termo “Partido” antes
da sigla para designar a organização política. O ARENA se tornou PDS
(Partido Democrático Social) e enquanto o MDB se tornou PMDB (Partido do
Movimento Democrático Brasileiro). Em 1982, a Lei n. 6.978 estabeleceu ainda
diversos entraves no sistema eleitoral do país, além de criar a candidatura nata
para o legislativo, em que “(...) o Partido ficava obrigado a fornecer sua legenda
para o candidato nato, sem sequer poder questionar se no exercício do
mandato anterior teriam sido ou não cumpridas as diretrizes partidárias”.20
A abertura em definitivo teve como marco o movimento das “Diretas Já”
para a Presidência da República. Muito embora a proposta de Emenda
Constitucional n. 5 de 1983 não tenha sido aprovada, a formação da “Aliança
Democrática” e a eleição de Tancredo Neves deram início, simbolicamente, ao
fim do regime ditatorial no Brasil, coroado com a subsequente Assembléia
Constituinte, e a promulgação da Constituição Federal de 1988.
Observa-se que na história republicana brasileira, o temor da oposição
levou a edição de sucessivas leis de exceção, as quais conformaram a
20 MEZZAROBA, Orides. Introdução ao Direito Partidário Brasileiro. p. 225.
manifestação do terror estatal, com a busca por silenciar as vozes dissonantes,
em repudiar a crítica ao governo, o dissenso ou o protesto.
3.2 – Direito administrativo
No que tange ao Direito Administrativo, Bercovici lembra que, em muitos
casos, as estruturas burocrático-administrativas são mantidas em tempos de
transição de regimes políticos, embora seja comum uma posterior busca de
adaptação e reestruturação das instituições em torno das novas disposições
constitucionais: “No caso brasileiro, a Constituição democrática de 1988
recebeu o Estado estruturado sob a ditadura militar (1964-1985), ou seja, o
Estado reformado pelo PAEG (Plano de Ação Econômica do Governo),
elaborado por Roberto Campos e Octávio Gouvêa de Bulhões (1964-1967).”21
Em 1967, o modelo administrativo brasileiro foi reformado, eis que seu
antecessor era o resultado final de uma estrutura forjada em 1930, com
desenvolvimentos operados por Getúlio Vargas, através da criação de órgãos e
empresas estatais (Cofap, CNPq, BNDE, Capes, etc.) e continuados por
Juscelino Kubitschek, com a atenção voltada para a industrialização, mas
tangenciando os limites desta fórmula burocrática.
Explana Bercovici que:
“A reforma administrativa da ditadura militar foi elaborada a partir de uma comissão denominada Comestra (Comissão Especial de Estudos de Reforma Administrativa), criada pelo Decreto nº 54.501, de 9 de outubro de 1964. Esta comissão era presidida pelo ministro do Planejamento, Roberto Campos. No entanto, a reforma administrativa proposta não seria debatida no Congresso Nacional, mas, com base nos poderes de exceção do artigo 9º, §2º do Ato Institucional nº 4, de 7 de dezembro de 1966, foi promulgada diretamente pelo marechal Castello Branco, por um decreto-lei, o de nº 200/1967.”22
A reforma administrativa veio, portanto, na forma do Decreto-Lei n.
200/1967, que promoveu a descentralização administrativa, o esvaziamento da
concentração de poderes no governo, robustecendo órgãos da administração
indireta. Em compensação deste esvaziamento, foram criados órgãos
colegiados com importantes incumbências, além de poder normativo, as quais 21 BERCOVICI. “‘O direito constitucional passa, o direito administrativo permanece’; a persistência da estrutura administrativa de 1967”. In: TELES, Edson; SAFATLE, Vladimir (orgs.) O que resta da ditadura: a exceção brasileira. São Paulo: Boitempo, 2010. p. 78. 22 BERCOVICI. “‘O direito constitucional passa, o direito administrativo permanece’; a persistência da estrutura administrativa de 1967”. pp. 81-82.
perduraram ao longo do regime militar. Ainda assim, o referido Decreto-Lei n.
200/1967 sobreviveu ao novo Estado decorrente da promulgação da
Constituição de 1988.
De acordo com Bercovici, mesmo ante a Carta Magna democrática de
1988, o problema do controle democrático da intervenção econômica e social
do Estado continua em aberto, ante sua estrutura herdada da ditadura militar,
mesmo porque a chamada “Reforma do Estado”, realizada na década de 1990,
acabou por dar continuidade ao modelo administrativo público nacional,
conferindo-lhe ares de “modernidade”.23
Ademais, a cúpula militar que refreou a democratização institucional do
país, ao longo do governo de José Sarney, manteve-se ainda muito próxima do
governo civil, o qual “compartilhava a soberania com os militares”24.
Assim, durante o governo Sarney, foram mantidos ministros militares em
seu gabinete, os militares também agiram de forma unilateral no sentido de
combater greves, se mantiveram no controle do Serviço Nacional de
Inteligência, e também foram impostos limites à concretização da reforma
agrária.
Observa-se, então, que mesmo com as permanências legadas pelo
governo militar, vários esforços foram realizados para afastar as instituições
que perpetuaram o autoritarismo, como apontam Paulo Abrão e Marcelo D.
Torelly:
“(...) a extinção do SNI (Serviço Nacional de Informações); a criação do Ministério da Defesa submetendo os comandos militares ao poder civil; a criação do Ministério Público com missão constitucional que envolve a proteção do regime democrático (...); a criação da Defensoria Pública da União; (...) a extinção do DOI-CODI e DOPS; a revogação da lei de imprensa criada na ditadura; a extinção dos DSI (Divisões de Segurança Institucional) (...)”.25
Por isso, entende-se que, mesmo que diversas instituições legatárias do
traço autoritário do regime militar tenham sido desativadas, as reformas
23 BERCOVICI. “‘O direito constitucional passa, o direito administrativo permanece’; a persistência da estrutura administrativa de 1967”. p. 89. 24 LINZ, Juan J.; STEPAN, Alfred. A transição e a consolidação da democracia. p. 205. 25 ABRÃO, Paulo; TORELLY, Marcelo D. “Justiça de Transição no Brasil: a dimensão da reparação.”. In: SANTOS, Boaventura de Sousa; et. all. (orgs.) Repressão e Memória Política no Contexto Ibero-Brasileiro: estudos sobre Brasil, Guatemala, Moçambique, Peru e Portugal: Brasília: Ministério da Justiça; Portugal: Universidade de Coimbra, 2010. pp. 35-36.
institucionais realizadas no Brasil que buscam o aperfeiçoamento da máquina
pública devem prosseguir.26
Pois, faz-se importante lembrar que a história de suspensão de direitos,
de decretação de estados de exceção no Brasil foi muito prolongada no “breve”
século XX, com estados de sítio, atos institucionais, golpes de estado,
insurreições militares e dois regimes ditatoriais.
Por isso, o “espírito” daqueles que fundaram os pilares da Constituição
Federal de 1988 se voltava para impossibilitar o retorno das experiências anti-
democráticas, mas também para um olhar esperançoso, ante o retorno da
democracia e a possibilidade fundacional de novas instituições27.
Este “momento constituinte” que, no Brasil, só foi experienciado no final
da década de 1980, é acompanhado da importante indagação proposta por
Menelick de Carvalho Neto e Guilherme Scotti, “o que uma Constituição
constitui?”28. Esta questão é de suma importância se forem considerados os
valores que se colocam em discussão, a comunidade que será o projeto – não
apenas futuro, mas, presente – de pessoas livres e iguais em suas vidas
concretas, ou seja, um:
“(...) sujeito constitucional, capaz de reconstruir permanentemente de forma crítica e reflexiva a eticidade que recebe como legado das gerações ateriores, precisamente restritos àqueles usos, costumes e
26 “Permitam-nos concluir com um comentário a respeito da ‘sociedade civil’. O Brasil, ao longo de toda a sua história, teve um dos piores padrões de distribuição de renda de todo om undo, De 1980 a 1992, a distribuição de renda deteriorou-se ainda mais. Em um sentido fundamental, portanto, a crise econômica brasileira claramente não se deve a um excesso de reivindicações reais de resdistribuição de renda, por parte da população pobre. Aliás, há provas suficientes indicando que, para que a economia brasileira melhore, não apenas a classe política terá que agregar essas reivindicações de forma mais eficaz, mas também os mais pobres têm que se tornar capazes de expressar suas reivindicações de forma mais eficaz, para que eles tenham um maior acesso aos direitos da cidadania e para que seu peso potencialmente elevado seja rotineiramente incorporado aos cálculos decisórios da classe política.” LINZ, Juan J.; STEPAN, Alfred. A transição e a consolidação da democracia. p. 224. 27 “O clima na Constituinte era de satisfação pela volta da democracia. Nela estavam representados grupos novos, como os evangélicos, cujo número se multiplicara desde 1964, velhos políticos que haviam participado da revolução de 1964 e apoiado o governo militar, outros que tinham atuado na oposição, exilados que retornavam ao país e jovens que haviam crescido sob a ditadura e não conheciam nada melhor. O resultado foi uma Constituição que pretendia, entre outras coisas: impedir a volta de um regime autoritário, afirmar ampla gama de interesses, reforçar o poder do Judiciário, promover a democratização da sociedade, incorporar os excluídos, cujo número tinha aumentado nos últimos vinte anos, assegurar direitos adquiridos e ampliar seu rol.” COSTA, Emília Viotti da. O Supremo Tribunal Federal e a construção da cidadania. São Paulo: Editora UNESP, 2006. p. 15. 28 Cf. NETTO, Menelick de Carvalho. SCOTTI, Guilherme. Os direitos fundamentais e a (in)certeza do direito: a produtividade das tensões principiológicas e a superação do sistema de regras. Belo Horizonte: Fórum, 2011.
tradições que, naquele momento histórico constitucional, acredita possam passar pelo crivo do que se entende ser o conteúdo da exigência inegociável dos direitos fundamentais.”29.
Se um projeto de sujeito constitucional derivado de um momento
constituinte é o ponto central dos questionamentos contemporâneos no
constitucionalismo que vem se consolidando no cenário nacional, importa,
também, refletir sobre aquilo que “constituiu” a Constituição. As considerações
seguintes estão voltadas para este tema, ao versarem sobre a transição e a
anistia no Brasil.
4 – Entre o passado e o futuro: a não acabada transição no Brasil No campo da Teoria e da Filosofia do Direito há uma questão que se
tornou clássica, que se refere a aquilo que deve (ou não) ser feito com os
crimes cometidos durante regimes autoritários. A tensão entre as
compreensões de Direito e Justiça possuem, neste caso, um exemplo profícuo,
pois a resposta para esta questão envolve a admissão de posicionamentos
teóricos que, em um primeiro plano, se apresentam dicotômicos. Tanto é assim
que a discussão sobre a justiça de transição, por algum tempo, era sinônimo do
debate entre juspositivismo e jusnaturalismo, entre a proposta de um
esquecimento “legítimo” e a de uma punição exemplar sob auspícios
universais.
Virgílio Afonso da Silva aponta para indicadores que podem auxiliar na
formulação de respostas alternativas para a tensão entre juspositivismo e
jusnaturalismo, sendo necessário considerar o seguinte:
“(1) Elementos culturais, já que cada povo lida de forma diversa com seu passado; (2) Grau de injustiça dos atos cometidos; (3) Tempo decorrido entre as injustiças e o debate sobre como lidar com elas; (4) Efeitos do passado no presente e no futuro: esquecer gera harmonia ou tensão? Punir exemplarmente gera satisfação ou acirra os atritos?”.30
29 NETTO, Menelick de Carvalho. SCOTTI, Guilherme. Os direitos fundamentais e a (in)certeza do direito. p. 14. 30 SILVA, Virgílio Afonso da. “Transição e direito: culpa, punição e memória”. In: GALLE, Helmut; SCHMIDT, Rainer (orgs.). A memória e as ciências humanas. São Paulo: Humanitas, 2011. p. 100.
Além disso, aponta-se para a importância da atribuição legal da culpa
não apenas com fins punitivos – nem sempre a punição pode ser concretizada
por razões como a prescrição e decadência dos crimes – mas, no sentido da
construção da memória dos fatos ocorridos nos tempos de vigência do regime
autoritário.31 Mesmo porque, como afirma Paul Ricoeur, os conceitos de culpa
e punição são distintos32, havendo a possibilidade de atribuição de culpa legal
(através do devido processo legal) ou informal (pela comunidade), ambas com
o potencial para afastar o sentido de esquecimento que envolveria uma anistia
imposta verticalmente pelo Estado, como expõe este mesmo autor:
“Assim, ao contrário da anistia, que pretende apagar o passado e bloquear a construção de uma memória, ao confundir o não-estabelecimento de punições com a recusa a investigar a culpa, existem outras formas legais de construir o passado e a memória, para que se possa começara a encarar o futuro. Se estivermos abertos a esses caminhos alternativos entre a vingança e o esquecimento, talvez descubramos que, também no Brasil, o futuro não pode ser encarado sem memória e que há ainda muitos passados esperando por acontecer.”33
Aqui, a proposta alternativa procura delimitar que a semântica da justiça
é auferida através de uma responsabilização, que cumpre a função de
promover a lembrança. A justiça de transição expõe sua importância no sentido
da construção da memória pois, em períodos de mudança, faz-se possível
observar o peso do passado com as demandas presentes e futuras.
Ao se buscar instalar o processo de transição política, procura-se lidar
com as situações criadas pelos regimes autoritários, em especial com a
reconstrução de instituições democráticas e a formação de um sistema de
31 Contudo, é importante observar o seguinte: “Diferentemente da prescrição, a anistia não se limita à consagração dos efeitos do tempo, na maioria dos casos, ela representa um ato de vontade dos governantes. É por isso que a anistia é definida como uma das formas antigas de perdão penal. Por sua característica, visando ao crime e seu autor, a anistia, como a graça concedida depois da condenação pelo soberano, tem uma aparência de perdão.” BASTOS, Lucia Elena Arantes Ferreira. Anistia. p. 62. 32 De acordo com Paulo Ricoeur: “Continua em pé a questão de se saber até que ponto a idéia de culpa pode ser desvinculada da idéia de punição. Um dos caminhos consistiria em levar a investigar nos termos da sugestão feita, entre outros, por Antoine Garapon, (...), ou seja: o ato de proferir o direito numa situação determinada, pondo o acusado e vítima em seus devidos lugares e justa distância, equivale como tal a reparação moral para a vítima. Ora, proferir o direito só tem sentido se cada um é reconhecido em seu papel. Não estaremos assim no âmago da idéia de imputação, na qualidade de designação do autor ‘verdadeiro’ da ação?” RICOEUR, Paul. O justo 1: a justiça como regra moral e como instituição. São Paulo: Martins Fontes, 2008. p. 52. 33 SILVA, Virgílio Afonso da. “Transição e direito: culpa, punição e memória”. p. 104.
direitos e garantias que possam proteger os cidadãos, como ocorreu com a
Constituição Federal de 198834. Ademais, os fundamentos de uma justiça de
transição se colocam também no resgate da dignidade daqueles que sofreram
com os crimes cometidos pelo Estado, pensada a justiça de transição enquanto
reconhecimento.35
Parte essencial do processo de transição consiste no direito à memória
e à verdade. Este direito a verdade não deve ser resguardado às vítimas mas à
toda a sociedade, que merece ser conhecedora de sua história. O direito à
verdade e à memória possui um caráter dual e coletivo. Isto porque, por um
lado, diz respeito ao direito da sociedade a ter acesso às informações
necessárias para o desenvolvimento da democracia e, por outro, diz respeito
ao direito das vítimas e de seus familiares de saberem quem foram os
responsáveis pelas violações cometidas e uma possível reparação.
Em sentido oposto se colocam as políticas do esquecimento. De acordo
com Jeanne Marie Gagnebin, a imposição forçada do esquecimento como
gesto que leva ao apagar, ignorar, esquecer, fingir que o crime não foi
cometido leva, de maneira paradoxal, a cominação de uma forma única de
memória, uma “memória impedida”, que vai procurar ressurgir, voltar a
aparecer. 36 Deste modo, as políticas de anistia impostas verticalmente
34 “Um espírito constitucionalista requer mais do que o preceito do governo da maioria, implicando um consenso relativamente forte no que diz respeito à constituição e, em especial, ao compromisso com procedimentos ‘de auto-limitação de governo’, que exigem maiorias excepcionais para que mudanças sejam efetuadas. Ele requer também uma clara hierarquia das leis, interpretadas por um sistema judiciário independente e apoiada por uma forte cultura legal na sociedade civil.” LINZ, Juan J.; STEPAN, Alfred. A transição e a consolidação da democracia. p. 29. 35 Segundo Roberta Camineiro Baggio: “Em um contexto autoritário, as formas de negação do reconhecimento àqueles que se opõem a um regime de exceção passam a compor a estrutura institucional do Estado, limitando sobremodo as garantias de autorrealização e interação intersubjetiva não só de seus opositores, mas também de todo o conjunto da sociedade, já que banem de um convívio social de normalidade os preseguidos políticos, impedindo que seus modos de vida sejam compreendidos pelos demais membros da sociedade. Esses fatores dificultam a formação das livres convicções porque impõem a versão institucional do Estado como a única verdade possível na construção da dinâmica social. Essa são as características próprias da formação das patologias sociais porque afetam os injustiçados ou aqueles que sofreram diretamente as violações por parte do Estado, mas também causam prejuízos de ordem moral aos demais membros da sociedade.” BAGGIO, Roberta Camineiro. “Anistia e Reconhecimento: o processo de (des)integração social da transição política brasileira”. In: PAYNE, Leigh A. et. all. A anistia na era da responsabilização: o Brasil em perspectiva internacional e comparada. Brasil: Ministério da Justiça; Oxford: Oxford University, 2011. p. 257. 36 GAGNEBIN, Jeanne Marie. “O preço de uma reconciliação extorquida”. In: TELES, Edson; SAFATLE, Vladimir (orgs.) O que resta da ditadura: a exceção brasileira. São Paulo: Boitempo, 2010.
cumprem a função paliativa de permitir a continuidade imediata da comunidade
política, mas não garantem uma convivência futura e duradoura.
Por isso, no caso dos regimes opressores, a demanda coloca-se em
vetor oposto, procura-se a realização de comissões públicas que venham a
reconstruir o passado (ou aquilo que ainda pode ser lembrado dele), pois, no
caso, os crimes originaram-se no próprio Estado.37
Foram abusos cometidos em nome da “normalidade”, mas, que
prefiguram verdadeiras excepcionalidades, mesmo ante o organismo
constituído oficialmente. No movimento pendular entre a regra e a exceção,
forma-se esta zona de anomia política, em que as ações mais excepcionais
são executadas pelo próprio Estado.
Assim, uma das principais falhas das anistias está no uso das mesmas
como políticas do esquecimento. A substituição de uma injustiça cometida por
um órgão oficial, pelo nivelamento igualitário unilateral deixa abertas diversas
feridas de uma sociedade subjugada por uma política amnésica. A anistia como
instrumento oficial do esquecimento não serve para reabilitar, reconciliar,
realizar o luto e narrar as memórias da época de opressão.
Ao contrário, o resgate da memória e a publicidade dos fatos é condição
essencial da democracia. Neste sentido, como afirma Jacques Derrida: “A
democratização efetiva se mede sempre por este critério essencial: a
participação e o acesso ao arquivo, à sua constituição e à sua interpretação.”38
Como anota José Carlos Moreira da Silva Filho:
Com o esquecimento imposto pela anistia de 1979, a sociedade brasileira não teve acesso às narrativas, aos documentos e aos dados que poderiam ter aflorado através de investigações judiciais e da abertura dos arquivos. Impôs-se, outrossim, um silêncio temeroso e reverencial. A notícia dos assassinatos, sequestros, torturas,
37 Para José Carlos Moreira da Silva Filho, o século XX foi o século da memória: “As guerras, os totalitarismos, os genocídios, as ditaduras, os crimes contra a humanidade e os campos de concentração impuseram uma reflexão sobre a importância da memória, emblematicamente contida no famoso adágio adorniano de um novo imperativo categórico: o de lembrar para não repetir jamais. Ao longo do século passado, e especialmente em sua segunda metade, houve uma verdadeira profusão de obras, monumentos e espaços de memória.” SILVA FILHO, José Carlos Moreira da. “Dever de memória e a construção da história viva: a atuação da Comissão de Anistia no Brasil na concretização do direito à memória e à verdade”. In: SANTOS, Boaventura de Sousa; et. all. (orgs.) Repressão e Memória Política no Contexto Ibero-Brasileiro: estudos sobre Brasil, Guatemala, Moçambique, Peru e Portugal: Brasília: Ministério da Justiça; Portugal: Universidade de Coimbra, 2010. p. 188. 38 DERRIDA, Jacques. Mal de arquivo: uma impressão freudiana. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2001. p. 16.
desrespeito total por direitos fundamentais, ilegalidades, barbáries, ficaram restritas ao círculo menor dos familiares das vítimas, não obtiveram maior espaço na agenda pública e midiática. Não houve, assim, o reconhecimento do papel de resistência protagonizado pelos perseguidos políticos. Até a própria anistia, como foi sublinhado, apareceu como resultado de uma ‘dádiva’ do governo militar e não como o resultado das lutas sofridas das forças de oposição.39
O mesmo diagnóstico foi feito por Glenda Mezarobba, no sentido de que
apenas o âmbito da reparação foi trabalhado no país, enquanto que os deveres
de investigação, processo e punição dos violadores de direitos humanos, a
exposição da verdade para as vítimas, familiares e para a sociedade e o
afastamento dos criminosos de postos detentores de autoridade não foram
realizados40.
Ainda sobre a memória é oportuno lembrar Jeane Marie Gagnebin:
“A memória não se deixa controlar, somente se calar – as vezes manipular mas volta. Ela não se deixa controlar nem pelas ordens do eu consciente, nem pelo mando de um soberano, rei, padre ou militar. É essa independência de lembrar que sempre preocupou, certamente de diversas maneiras, tanto os filósofos, quanto os políticos e os psicanalistas”.41
A tensão entre a importância da memória, e da anistia, não em seu
sentido amnésico, além do papel do perdão na (re)construção da cidadania são
os pontos referidos na sequência.
5 – Anistia e Perdão
Direito. Memória. Verdade. Afinal, do que se fala quando o verbo anistiar
é utilizado? A definição mais simples e imediata associa este verbo aos
vocábulos “perdoar” e “desculpar”. Mas é possível (des)culpar? Ou seja, é
possível desfazer a culpa? Ou retirar a culpa? Em que campo do saber é
possível interrogar o sentido mais profundo do termo “anistia”? Busca-se o
sentido jurídico, político ou filosófico do termo?
39 SILVA FILHO, José Carlos Moreira da. “Dever de memória e a construção da história viva: a atuação da Comissão de Anistia no Brasil na concretização do direito à memória e à verdade”. pp. 203-204. 40 Cf. MEZAROBBA, Glenda. “O processo de acerto de contas e a lógica do arbítrio.” In: TELES, Edson; SAFATLE, Vladimir (orgs.) O que resta da ditadura: a exceção brasileira. São Paulo: Boitempo, 2010. 41 GAGNEBIN, Jeanne Marie. “O preço de uma reconciliação extorquida”. p. 183.
Problematizar a anistia significa (des)construirmos a história jurídico-
institucional em nome da construção histórica de uma memória que,
(cons)ciente da não-linearidade do tempo e de sua tradição – assume na
memória o compromisso com os seus sujeitos e busca, assim, fazer da história
o cenário vivo do mundo onde nos inserimos.
Neste sentido, compreender o sentido do verbo perdoar – presente em
quase todas as leituras do verbo anistiar – nos leva diretamente à
compreensão do significado da história e de como o homem, através da ação,
torna-se o seu sujeito. Analisando o conceito antigo e moderno de história,
Hannah Arendt recorda que: “Com Heródoto, as palavras, os feitos e os
eventos – isto é, as coisas que devem sua existência exclusivamente aos
homens – tornaram-se o conteúdo da História”42. E, para a autora, assim como
para Walter Benjamin, o tema da História é marcado por interrupções – o
extraordinário, o imprevisível43. Se queremos que a história nos forneça a
moldura do tempo presente e passado – apta a permitir o (re)conhecimento
comum – é necessária a disposição para nela resgatarmos o sentido pleno de
todas as suas interrupções – inclusive aquelas que – para alguns – podem
comprometer a estabilidade do tempo presente. Voltando ao momento histórico
em que vivemos, é no falso discurso da estabilidade do tempo presente que se
inserem as pretensões de “anistiar” situações que, na memória, na história e
também no campo jurídico, jamais se pretendeu perdoar ou anistiar.
Jacques Derrida44, ao referir-se ao perdão, o faz fundando-o em duas
lógicas distintas: a primeira delas diz respeito ao perdão puro, incondicional
(sentido que ele vai resgatar na ética kantiana da lei moral ou no sentido de
infinita responsabilidade para com o outro – como proposto por Lévinas).
Oponível a este perdão incondicional temos aquele que pode ser construído
tendo em vista circunstâncias históricas e particulares e, nesta lógica,
encontramos o sentido jurídico do termo – pois o direito, a ordem normativa,
pode perdoar o imperdoável. E, ao assim refletir sobre o imperdoável – sobre a 42 ARENDT, Hannah. Entre o passado e o futuro. São Paulo: Ed. Perspectiva, 2002. pp. 73-74. 43 Walter Benjamin afirma em sua Tese XIV: “A história é objeto de uma construção, cujo lugar não é formado pelo tempo homogêneo e vazio, mas por aquele saturado pelo tempo-de-agora (Jetztzeit). Assim, a antiga Roma era, para Robespierre, um passado carregado de tempo-de-agora, passado que ele fazia explodir do contínuo da história.”. BENJAMIN, Walter. “Tese XIV.”. In: LÖWY, Michel. Walter Benjamin: aviso de incêndio: uma leitura das teses “Sobre o conceito de história”. p. 119. 44 DERRIDA, Jacques. On Cosmopolitanism and Forgiveness. London and New York: Routledge, 2001.
aporia que envolve o perdão, em si mesmo preso à contradição entre o
universal e o particular, o secular e o religioso – Derrida afirma permanecer o
imperdoável no horizonte do julgamento final: uma lei além da lei, a história
além da história.
Marcado pelos acontecimentos do séc. XX, o mundo parece se curvar à
geopolítica do perdão – ao estabelecimento de textos normativos que o
concedem ou excepcionam a sua possibilidade. Mas o cálculo geopolítico ou
jurídico jamais é capaz de incluir o sentido ético-filosófico do termo. Pois, nesta
lógica, o perdão foge a qualquer cálculo ou medida e, mesmo a lógica da
estabilidade ou da reconciliação são insuficientes para caracterizá-lo.
Permanecendo nós no mundo dos negócios humanos, temos que
qualquer norma jurídica relativa à anistia pode, em determinadas
circunstâncias, tornar certas ações insuscetíveis de medidas jurídicas ou pena,
restringindo a possibilidade da persecução penal – como no caso da
declaração da prescrição. Mas prescrição e perdão não se confundem. A
norma, histórica e espacialmente situada, pode incluir no seu âmbito material
de validade atos que se considera melhor relegar ao esquecimento, mas
nenhum parlamento ou ordem estatal é capaz de conceder o perdão a atos –
crimes – que escapam, pela sua própria natureza, ao próprio poder que o
Estado tem de punir. Retornando a Arendt:
“A punição é a alternativa do perdão, mas de modo algum seu oposto; ambos têm em comum o fato de que tentam pôr fim a algo que, sem a sua interferência, poderia prosseguir indefinidamente. É, portanto, significativo – elemento estrutural na esfera dos negócios humanos – que os homens não possam perdoar aquilo que não podem punir, nem punir o que é imperdoável.”45
Aquilo que não pode ser perdoado transcende a esfera dos negócios
públicos. E aqui retiramos do próprio núcleo semântico do verbo anistiar
aqueles feitos humanos que são insuscetíveis de serem perdoados: crimes que
em última análise e na nomenclatura do direito internacional são chamados de
“crimes contra a humanidade” ou constituem graves violações aos direitos
humanos, desde que praticadas de forma sistemáticas.
45 ARENDT, Hannah. Entre o passado e o futuro. p. 253.
Podemos, desta maneira, separar dois núcleos significativos no
vocábulo anistia. O primeiro envolve o significado jurídico-institucional do termo
e, dentro da esfera dos negócios públicos, não pode exceder o campo das
ações puníveis pelo Estado. Este significado corresponde ao “esquecimento”, à
estipulação de prazos prescricionais ou ainda a uma espécie de perdão
jurídico. Mas se do senso comum retiramos a identificação entre anistiar e
perdoar, temos que aquela não pode alcançar o que se poderia considerar
imperdoável. Retornando à raiz grega do termo encontramos mnáomai –
pensar em, lembrar de. Em oposição, amnáomai remonta a esquecimento e daí
amnestia, anistia. Tal busca da raiz do termo nos permite compreender a
anistia em seu sentido mais usual – mas também não menos importante.
Porém, ainda que em sua raiz o termo anistia remeta à amnésia,
esquecimento, ela não pode impedir o lembrar ou a recuperação do passado.
Da mesma maneira, anistia e perdão, para além de seu sentido jurídico, não se
confundem. No livro O Justo, Paul Ricoeur afirma exatamente a antítese
existente entre a idéia de perdão e anistia:
“À proibição de toda e qualquer ação em juízo, portanto à proibição de todo e qualquer processo movido a criminosos, soma-se a proibição de mencionar os próprios fatos com sua qualificação criminal. Trata-se, pois, de uma verdadeira amnésia institucional que convida a agir como se o acontecimento não tivesse ocorrido. (...) Todos os delitos do esquecimento estão contidos nessa pretensão incrível a apagar os traços das discórdias públicas. É nesse sentido que anistia é o contrário do perdão, pois este, como ressaltaremos, exige memória”.46
Tanto em Ricoeur como em Derrida encontramos a noção de que o
perdão escapa ao direito e à própria noção de justiça, pertencendo à uma
espécie de economia da dádiva ou do dom. Nas palavras de Derrida: “É o
caso, primeiramente, de um dom sem restituição, sem cálculo, sem
contabilidade.”47 Para este autor tanto a justiça quanto o perdão mantém o
traço da dádiva, no sentido de que não pressupõem troca ou circularidade,
reciprocidade. Este perdão, incondicional, cabe somente à vítima, jamais
estando circunscrito à política e ao direito.
46 RICOEUR, Paul. O justo 1. p. 195. 47 DERRIDA, Jacques. Expectros de Marx. Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 1994. p. 44.
Desta maneira, ainda que o sentido do termo anistiar remeta ao
esquecimento e ao perdão, a anistia não tem o poder de fazer esquecer e
muito menos contém em si a dádiva do perdoar.
6 – Considerações Finais Ainda que não suficiente para alterar a dor das vitimas e/ou seus
familiares, contar a história do que aconteceu no passado é condição essencial
para que não apenas os que foram afetados pelos atos da ditadura militar
possam ter condições de lidar com estas mágoas como também para que a
sociedade brasileira possa, recuperando seu passado recente, estabelecer as
condições para que ele não venha a se repetir. A recuperação do passado, em
termos gerais, abre o caminho para duas frentes: o conhecimento de um
passado histórico inglório podendo transformar segredos de Estado em
vergonhas do Estado; e a cristalização legal ante um (dentre vários) dos
marcantes apelos e testemunhos daqueles que almejam um perene Nunca
Mais.
Além do mais, mesmo em seu sentido jurídico ou político, a anistia
também não se dissocia do compromisso com a verdade ou o resgate da
memória. E, mesmo se partirmos dos pressupostos adotados pelo STF no
julgamento da ADPF 153 (pressupostos que não compartilhamos), ainda assim
estamos obrigados – em um sentido jurídico, político e também moral – a trazer
a tona as graves violações de direitos humanos praticadas pelos agentes do
Estado no curso da ditadura militar.
A recente criação da Comissão Nacional da Verdade (Lei nº
12.528/2011), e a promulgação da Lei de Acesso a Informações Públicas (Lei
nº 12.527/2011) poderão, sem dúvida, contribuir para o alargamento dessa
dimensão, pois o bom funcionamento da Comissão Nacional da Verdade,
cumprindo com os objetivos para o qual foi proposta, bem como a abertura dos
arquivos militares, podem permitir que seja efetivado o direito à verdade,
revelando-se e conhecendo-se melhor esse período, ainda obscuro da recente
história brasileira, e permitindo a construção de uma memória coletiva.
Walter Benjamin observou que aqueles que sobreviveram à 1ª Guerra
Mundial voltavam mudos das trincheiras. Segundo o filósofo, o trauma, o
evento vivenciado não poderia mais ser traduzido em palavras, narrado48. A
experiência do choque e a sua consequente lembrança são demonstrativos
que a razão humana está sujeita a imprecisões, interrupções,
descontinuidades. O acesso às memórias nem sempre acontece como
desejamos, pois o trauma separa o sujeito do campo simbólico, em especial da
linguagem.
A proposta de Benjamin se coloca no sentido de tarefas, ao narrador e
ao historiador caberia a transmissão daquilo que a tradição oficial ou dominante
não lembra, não permite ser recordado, esconde. Há, então, uma fidelidade
aos mortos, aos anônimos, desconhecidos. Observa-se, com isso, um esforço,
uma demanda pela memória, como observa Gagnebin:
“Tal rememoração implica uma certa ascese da atividade historiadora que, em vez de repetir aquilo de que se lembra, abre-se aos brancos, aos buracos, ao esquecido e ao recalcado, para dizer, com hesitações, solavancos, incompletude, aquilo que ainda não teve direito nem à lembrança nem às palavras.”49
Esta rememoração não se limita ao passado, debruça-se sobre o
presente e sobre as continuidades, ressurgências do passado no presente. Eis
que o imperativo se coloca não apenas ante o esquecimento do passado, mas
a necessidade de uma ação sobre o presente.
Neste sentido, Gagnebin propõe não apenas a retomada reflexiva do
passado, para obstar sua repetição infinita, mas, também, a construção de uma
outra história, a (re)invenção do presente.
Em conjunto com Bethânia Assy lembramos da seguinte lição de Arendt:
“Os grandes perpetradores do mal são aqueles que não se lembram, porque
nunca se envolveram na atividade de pensar, nada pode retê-los, porque sem
recordação eles estão sem raízes”50. Assim, a partir das experiências ditatoriais
estaríamos confinados a viver na companhia de nós próprios, continuamente
condenados a examinar os eventos e acontecimentos nos quais participamos,
48 BENJAMIN, Walter. “O Narrador” In: BENJAMIN, Walter. Sobre Arte, Técnica, Linguagem e Política. Lisboa: Relógio D’Água, 1992. 49 GAGNEBIN, Jeanne Marie. Lembrar, escrever, esquecer. São Paulo: Editora 34, 2006. p. 55. 50 ARENDT, Hannah. Eichmann em Jerusalém. São Paulo: Companhia das Letras. 1999. p.152.
não apenas como atores, mas também como espectadores51. Talvez este seja
um dos problemas éticos contemporâneos que mais nos provoque
questionamentos e, possivelmente, o que demanda, com maior urgência,
reflexões, diálogos e, principalmente, narrativas.
7 – Bibliografia ABRÃO, Paulo; TORELLY, Marcelo D. “Justiça de Transição no Brasil: a
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