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Centro de Estudos Gerais Curso de Mestrado em Matemática Coordenação de Pós Graduação em Matemática YELTSIN ACAHUANA CONJUNTOS DE ROTAÇÃO DE ENDOMORFISMOS DO CÍRCULO Orientador: Alejandro Kocsard NITERÓI AGOSTO/2018

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Centro de Estudos Gerais Curso de Mestrado em Matemática Coordenação de Pós Graduação em Matemática

YELTSIN ACAHUANA

CONJUNTOS DE ROTAÇÃO DE

ENDOMORFISMOS DO CÍRCULO

Orientador: Alejandro Kocsard

NITERÓI AGOSTO/2018

INSTITUTO DE MATEMÁTICA E ESTATÍSTICA

UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

YELTSIN ACAHUANA

CONJUNTOS DE ROTAÇÃO DE ENDOMORFISMOS DOCÍRCULO

Dissertação apresentada por YeltsinAcahuana ao Curso de Mestrado emMatemática - Universidade FederalFluminense, como requisito parcialpara a obtenção do Grau de Mestre.Linha de Pesquisa: Sistemas Dinâmi-cos.

Orientador: Alejandro Kocsard

Niterói2018

YELTSIN ACAHUANA

CONJUNTOS DE ROTAÇÃO DE ENDOMORFISMOS DO CÍRCULO

Dissertação apresentada por YELT-SIN ACAHUANA ao Curso de Mes-trado em Matemática - da Universi-dade Federal Fluminense, como re-quisito parcial para a obtenção doGrau de Mestre. Linha de Pesquisa:Sistemas Dinâmicos.

Aprovada em: 10/08/2018

Banca Examinadora

Prof. Alejandro Kocsard - OrientadorDoutor - Universidade Federal Fluminense

Prof. Samuel Anton Senti - MembroDoutor - Universidade Federal do Rio de Janeiro

Prof. Isabel Lugão Rios - MembroDoutora - Universidade Federal Fluminense

Niterói2018

Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca do Instituto de Matemática e Estatística da UFF

A168 Acahuana, Yeltsin

Conjuntos de rotação de endomorfismos do círculo / Yeltsin

Acahuana. – Niterói, RJ: [s.n.], 2018.

58 f.

Orientador: Prof. Dr. Alejandro Kocsard Dissertação ( Mestrado em Matemática) – Universidade Federal

Fluminense, 2018.

1.Círculo. 2. Homeomorfismo. 3. Endomorfismos. I. Título.

CDD 514

DEDICATÓRIA

Aos meus pais Vitalia e Serafin Acahuana,a meu pai Salomón.

I

AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus, por ter me dado força, saudade, coragem e determinaçãodiante de tantas dificuldades que a vida nos oferece.

Um agradecimento especial ao meu orientador, o professor Alejandro Kocsard,pela sua eficiente orientação, paciência, sabedoria e por ter aceitado me orien-tar.

A coordenação de Pós-Graduação pelo apoio nos momentos difíceis.

A minha família pelo apoio incondicional, pela força para não desistir.

A minha amiga Alejandra Postigo Rojas pela leitura deste trabalho, corrigindovários erros gramáticos.

Finalmente, agradeço a CAPES ( Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoalde Ensino Superior) pelo apoio financeiro.

II

RESUMO

O número de rotação introduzido por Henri Poincaré em [Poi85] é sem dúvidaalguma o invariante dinâmico fundamental no estudo dos homeomorfismosdo círculo (que preservam orientação).

Neste trabalho começamos lembrando os resultados centrais relativos aonúmero de rotação e os fundamentos da já clássica teoria de Poincaré.

A continuação, entramos no que é o cerne mesmo deste trabalho, o estudodinâmico dos endomorfismos do círculo, i.e. aplicações contínuas do círculonele mesmo de grau 1. Para isso introduziremos o conceito de conjunto derotação e apresentaremos diversos resultados devidos a Newhoue, Palis e Ta-kens [NPT83], Bamón, Malta, Pacífico e Takens [BMPF84] e Ito [Ito81] que vi-sam compreender as propriedades topológicas do conjunto de rotação, assimcomo as propriedades dinâmicas dos endomorfismos que podem ser extraídasdestes conjuntos.

palavras-chave: círculo, homeomorfismo, endomorfismo, conjunto de rotação .

III

ABSTRACT

The rotation number introduced by Henri Poincaré in [Poi85] is, undoubtedly,the fundamental dynamic invariant in the study of homeomorphisms of thecircle (which preserve orientation).

In this work we start by recalling the central results to the number of rota-tion and foundations of the classical theory of poincaré.

Coming up next, we enter into what is the very core of this work,the studydynamics of the circle endomorphisms, i.e. continuous applications of the circlein himself of degree 1. For this we will introduce the concept of rotation set andwe will present several results due to Newhoue, Palis e Takens [NPT83], Ba-món, Malta, Pacífico e Takens [BMPF84] e Ito [Ito81] which aim to understandthe topological properties of the rotation set, as well as dynamic properties ofthe endomorphisms that can be extracted of these sets.

key words: circle, homeomorphism, endomorphism, rotation set.

IV

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 1

1 PRELIMINARES 31.1 O círculo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31.2 Aplicações do círculo e levantamentos . . . . . . . . . . . . . . . 41.3 Homeomorfismos do círculo: número de rotação . . . . . . . . . 91.4 Número de rotação racional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 161.5 Número de rotação irracional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18

2 ENDOMORFISMOS DO CÍRCULO 232.1 Intervalos de rotação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 232.2 O intervalo de rotação como invariante dinâmico . . . . . . . . . 262.3 Realização de números de rotação . . . . . . . . . . . . . . . . . 30

3 CONJUNTOS DE ROTAÇÃO PONTUAL DE ENDOMORFISMOSDO CÍRCULO 373.1 Conjunto de rotação de um ponto . . . . . . . . . . . . . . . . . . 373.2 Itinerários, tempos de acompanhamento e salto . . . . . . . . . . 403.3 Teorema Principal . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43

4 REFERÊNCIAS 49

V

INTRODUÇÃO

Na presente dissertação apresentamos um estudo da dinâmica de endomor-fismos do círculo, i.e. aplicações contínuas de grau 1. Os resultados pionei-ros nesta área são devidos a Sheldon Newhouse, Jacob Palis e Floris Takens[NPT83]. Nesse trabalho é introduzido o conjunto de rotação, que acaba se tor-nando o invariante dinâmico fundamental para estudar estes sistemas e queestende e generaliza o já clássico número de rotação devido a Poincaré [Poi85],invariante dinâmico fundamental no estudo dinâmico do homeomorfismos docírculo.

No Capítulo 1 apresentamos os pré-requisitos fundamentais visando tornareste trabalho tão auto-contido quanto seja possível. Nesse capítulo apresenta-mos o círculo, que denotaremos por T e identificaremos com R{Z, e conside-raremos as suas diferentes estruturas. Além disso, introduzimos o grupo dehomeomorfismos do círculo que será notado por HomeopTq.

Por outro lado definiremos o número de rotação como sendo,

ρp f q � Π�

limn�8

Fnpxq � xn

para homeomorfismos de grau 1. Este número mede a rotação media da or-bita de um ponto no círculo por ação dum homeomorfismo. Resumiremos asprincipais propriedades do número de rotação racional, além disso, baixo cer-tas considerações de transitividade garantamos por conjugação topológica queos homeomorfismos de grau 1 se comportam como o modelo de uma rotaçãoirracional; isto é, o que anuncia o teorema clássico de Poincaré.

No Capítulo 2 , estendemos a noção de número de rotação definido porH. Poincaré para homeomorfismos do círculo a endomorfismos do círculo degrau 1. O número de rotação é generalizado para um conjunto de rotação, pelofato de que diferentes orbitas giram a velocidades diferentes. Denotamos porEndpTq ao conjunto de funções contínuas de grau 1 no círculo. Se f P EndpTqentão existe F levantamento de f ; tal que f �Π � Π � F onde Π : R Ñ T é aprojeção natural. Desde que f é de grau 1, temos:

Fpx� 1q � Fpxq � 1, @x P R

Definimos o intervalo de rotação como,

ρp f q � tρ�p f , zq : z P Tu,

onde

ρ�p f , zq � lim supnÑ�8

�Fnpxq � x

n

, para x P Π�1pzq.

1

Além disso, provaremos alguns resultados técnicos para endomorfismosdo círculo para mostrar que o conjunto de rotação é um ponto ou um intervalofechado e acotado, além disso não precisa tomar fecho, o que foi provado porIto [Ito81].

No capitulo 3 definimos o conjunto de rotação pontual ρp f , zq, onde z PT, como o conjunto de pontos limite da sequência ppFnpxq � xq{nqnPN, ondeΠpxq � z, observe que ρp f , zq � ρp f q. O propósito deste capitulo é dar umacompleta descrição de todos os conjuntos de rotação em términos do intervalode rotação ρp f q; para isso primeiro introduzimos a noção de variedade localinstável positiva para pontos periódicos de endomorfismos do circulo e os con-ceitos de domínio fundamental e itinerários que jogam um papel importante naprova do teorema principal deste trabalho.

2

Capítulo 1

PRELIMINARES

1.1 O círculo

Ao longo desta dissertação, Rd denotará o espaço euclideano munido da norma}x} :� px2

1 � . . .� xdq1{2, onde x � px1, . . . , xdq denota um elemento arbitrário

de Rd. Desta forma, define-se a esfera unitária por Sd�1 :� tx P Rd : }x} � 1u.Por outro lado, definimos a seguinte relação em R: dados x, y P R, denota-

mosx ∼ y ô x� y P Z.

É fácil verificar que ∼ é uma relação de equivalência em R. O espaço quocientecorrespondente R{ ∼ é o círculo e será denotado por T. A projeção canônicacorrespondente será denotada por Π : R Ñ T, i.e.

Π : R ÝÑ T

x ÝÑ x�Z

Consideraremos sempre ao círculo T munido da sua topologia quocientecorrespondente, i.e. a topologia mais forte que torna a aplicação Π contínua.

Por outro lado, podemos definir a função dT : T�T Ñ r0, 1{2s dada por

dTpx, yq :� min!|x� y| : x P Π�1pxq, y P Π�1pyq

). (1.1)

Pode-se verificar que a função dT é de fato uma distância em T e a topologiainduzida por ela coincide com a topologia quociente.

A continuação mostraremos o seguinte resultado clássico:

Proposição 1.1.1. O espaço T é homeomorfo a S1.

Demonstração. Consideremos a aplicação f : R Ñ S1 dada por

f pxq ��

cosp2πxq, sinp2πxq�, @x P R.

É fácil observar que f é contínua.Por outro lado, observemos que dados x, x1 P R temos que

f pxq � f px1q ðñ x ∼ x1. (1.2)

3

Isto nos permite afirmar que existe uma única aplicação g : T ÝÑ S1 tal que

g�Πpxq

�� f pxq, @x P R,

e onde Π denota a projeção quociente. Vamos mostrar que g é de fato umhomeomorfismo.

Primeiramente observemos que a aplicação g é contínua. De fato, seja pxnquma sequência arbitrária de pontos de T tal que xn Ñ x, quando n Ñ 8. Peladefinição (1.1), vemos que existe x P Π�1pxq e xn P Π�1pxnq, para cada n ¥ 1,tais que xn Ñ x em R, quando n Ñ8. Isto nos permite afirmar que

gpxnq � g�Πpxnq

�� f pxnq Ñ f pxq � g

�Πpxq

�� gpxq,

quando n Ñ8. Portanto a função g é contínua.Por outro lado, dado que f é sobrejetora, podemos concluir facilmente que

g também será sobrejetora.Para mostrar que g é injetiva, sejam x, y P T pontos tais que gpxq � gpyq e x

e y pontos arbitrários de Π�1pxq e Π�1pyq, respectivamente. Então teremos

f pxq � g�Πpxq

�� gpxq � gpyq � g

�Πpyq

�� f pyq.

Logo, por (1.2), concluímos que x ∼ y e portanto x � Πpxq � Πpyq � y, emostramos que g é injetora.

Finalmente, dado que S1 é compacto e g é contínua, injetiva e sobrejetiva,podemos concluir que g é de fato um homeomorfismo.

1.2 Aplicações do círculo e levantamentos

Nesta seção introduzimos a noção de levantamento de uma aplicação contínuado círculo nele mesmo e estudaremos suas propriedades fundamentais.

Observação 1.2.1. É importante observarmos que a aplicação Π : R Ñ T é cha-mado recobrimento fundamental do círculo. As propriedades que caracterizam aesta aplicação é que ela é contínua, o espaço R é simplesmente conexo e Π éuma aplicação de recobrimento, i.e. para cada x P T existe uma vizinhança U dex tal que Π�1pUq é a união disjunta de abertos Vn � R, com n P Z, tais queΠ��Vn

: Vn Ñ U é um homeomorfismo.

Definição 1. Dada uma aplicação contínua f : T ý, um levantamento de f éuma aplicação contínua F : R ý tal que Π � F � f �Π.

Proposição 1.2.2 (Existência de levantamentos). Seja f : T ý uma aplicação con-tínua, z0 um ponto arbitrário de T e w0 :� f pz0q. Então, dados quaisquer x0 PΠ�1pz0q e y0 P Π�1pw0q, existe um único mapa contínuo F : R ý tal que Fpx0q � y0e Π � F � f �Π.

Para provar a Proposição 1.2.2 primeiramente provaremos o seguinte.

Lema 1.2.3. Seja f : T ý contínua. Dados x0, y0 P R sujeitos a Πpx0q � z0,Πpy0q � f pzoq. Então existe C f ¡ 0 independente de x0, y0, e uma função F :rx0 � C f , x0 � C f s Ñ R contínua que cumpre Π � F � f �Π e Fpx0q � y0. Alémdisso se existe outra função contínua G : rx0 � C f , x0 � C f s tal que Π � G � f �Π eGpx0q � y0, então Fpxq � Gpxq na interseção de seus domínios.

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Demostração do Lema 1.2.3.

i. (Existência) Como T é compacto e f contínua, segue que f é uniforme-mente contínua. i.e. existe C f P p0, 1{4q tal que

f�

BC f pzq� B1{4

�f pzq

�, @z P T, (1.3)

onde Brpzq :� tw P T : dTpw, zq   ru e dT é a distância dada por (1.1). Poroutro lado, observe que Πprx0 � C f , x0 � C f sq � BC f pz0q e de (1.3) segueque

f �Π�rx0 � C f , x0 � C f s

�� Π

�ry0 �

14

, y0 �14s�.

Por outro lado, pela Observação 1.2.1 sabemos que existe inversa localΠ�1 : B1{4

�f pz0q

�Ñ ry0 � 1{4, y0 � 1{4s. Logo podemos definir

F : rx0 � C f , x0 � C f s ÝÑ R

x ÝÑ Fpxq � Π�1 � f �Πpxq

numa vizinhança de x0. Como f e Π�1 são contínuas, temos que F tambémserá contínua.

ii. (Unicidade) Seja G : rx0 � C f , x0 � C f s Ñ R contínua tal que Π �G � f �Πe Gpx0q � y0. Consideramos o conjunto

A � tx P rx0 � C, x0 � Cs : Fpxq � Gpxqu

Onde C � mintC f , C f u ¡ 0. É fácil ver que A � ∅. Além disso A éfechado, pois A � pF � Gq�1p0q e F � G é contínua. Assim basta provarque A é aberto, pois a conexidade de rx0 � C, x0 � Cs implica que Fpxq �Gpxq para todo x P rx0 � C, x0 � Cs. Seja a P A tal que pF � Gqpaq � 0.Escolha ε ¡ 0 tal que para x P pa� ε, a� εq tem-se |pF� Gqpxq|   1. ComoΠ � Fpxq � Π � Gpxq, para x P pa� ε, a� εq, então Fpxq � Gpxq � kx paraalgum kx P Z, obtemos

|Fpxq � Gpxq| � |kx|   1

Logo kx � 0, pois kx P Z. Por tanto Fpxq � Gpxq para todo x P pa� ε, a� εq.

Demonstração da Proposição 1.2.2. Fixe z0 P T; x0, y0 P R sujeitos a Πpx0q � z0,Πpy0q � f pz0q. Pelo lema 1.2.3 existe F : rx0 � C, x0 � Cs Ñ R contínua tal queΠ � F � f �Π e Fpx0q � y0. Se x1 � x0 � C e y1 � Fpx1q, definimos z1 � Πpx1q,para ter Π � Fpx1q � f � Πpx1q e Πpy1q � f pz1q. Porém podemos aplicar denovo o lema 1.2.3 e existirá

F : rx1 � C, x1 � Cs Ñ R

tal que Π � F1 � f �Π e F1px1q � y1. Logo como Fpxq � F1pxq, para x P rx0, x1s,uma função é definida em rx0�C, x1�Cs � rx0�C, x0� 2Cs. Novamente pro-jetando x2 � x0 � 2C nós seguimos o procedimento indutivamente. O mesmopara valores menores que x0 ( a esquerda de x0 ).

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O seguinte resultado caracteriza todos os possíveis levantamentos de umaaplicação:

Proposição 1.2.4 (Caracterização dos levantamentos). Sejam f : T ý um mapacontínuo e F : R ý um levantamento de f . Então o conjunto de todos os levantamen-tos de f é dado por

tF� n : n P Zu .

Demonstração. Basta mostrar que se F1, F2 são dois levantamentos de f , entãoexiste k P Z tal que

F1pxq � k� F2pxq, @x P R

Para mostrar isto, observemos que Π � F1pxq � f �Πpxq � Π � F2pxq. EntãoF1pxq, F2pxq estão na mesma classe de equivalência, e assim F1pxq � F2pxq P Z

para todo x P R. Dado que F1 e F2 são contínuas, então F1 � F2 também écontínua. Além disso R é conexo e portanto a imagem de F1� F2 é um conjuntoconexo em Z. Logo, F1 � F2 � k, com k P Z constante.

Exemplo 1.2.5. Definimos Rα : T ý tal queRαprxsq � rx � αs onde α P R.Então Fk : R ý dada por Fkpxq � x � α� k, k P Z é um levantamento poisverifica Rα � Πpxq � Π � Fkpxq. Além disso o conjunto dos levantamentos édado por

tF� k; k P Zu

onde F � IdR � α.

O seguinte resultado nos permite definir a noção de grau de uma aplicaçãodo círculo:

Proposição 1.2.6 (Grau de um mapa do círculo). Seja f : T ý um mapa contínuo.Então vale o seguinte:

a. Existe um número degp f q P Z, chamado grau de f , tal que

Fpx� 1q � Fpxq � degp f q, @x P R,

e para todo levantamento F : R ý de f .

b. Se F é um levantamento qualquer de f , então

Fpx� nq � Fpxq � n degp f q, @n P Z.

Demonstração. Seja f : T ý uma aplicação contínua e F : R ý um levanta-mento de f qualquer.

Para provar a primeira afirmação, observemos que dado um ponto x P R

qualquer, temos que

Π � Fpx� 1q � f �Πpx� 1q � f �Πpxq � Π � Fpxq

já que x � x� 1. Logo, Fpx� 1q� Fpxq P Z; dado que F é contínua, concluímosque este inteiro independe do ponto x e portanto existe n P Z tal que:

Fpx� 1q � Fpxq � n @x P R.

Este inteiro n será denotado por degp f q.

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Para ver que este número independe da escolha do levantamento, seja F1um outro levantamento de f . Pela Proposição 1.2.4, existe n1 P Z tal que

F1pxq � Fpxq � n1, @x P R.

Logo,F1px� 1q � F1pxq � Fpx� 1q � n1 �

�Fpxq � n1

�� degp f q,

o que prova a independência.A segunda afirmação será provada por indução. Observemos que pelo

ponto pa.q, esta afirmação é verdadeira para n � 1. Suponha agora que é validopara n � k; então temos:

Fpx� kq � Fpxq � k degp f q, @x P R.

Mostremos que a afirmação também é válida para n � k� 1:

Fpx� k� 1q � Fpx� kq � degp f q� Fpxq � k degp f q � degp f q� Fpxq � pk� 1qdegp f q

Finalmente, para mostrar que esta afirmação é verdadeira para os inteirosnegativos, basta observar que:

Fpxq � Fpx� n� nq � Fpx� nq � n degp f q ñ Fpx� nq � Fpxq � n degp f q.

Proposição 1.2.7. O grau da composição de dois mapas contínuos do círculo é igualao produto dos graus. Mais precisamente, se f , g : T ý são dois mapas contínuos,então vale

degp f � gq � degp f qdegpgq.

Demonstração. Sejam F, G : R ý levantamentos de f e g respectivamente. En-tão temos que

pΠ � Fq � G � f � pΠ � Gq � f � g �Π.

Portanto, temos que F � G é um levantamento de f � g.Por outro lado, pelo item pb.q da Proposição 1.2.6 temos que

F � Gpx� 1q � F�Gpxq � degpgq

�� F � Gpxq � degpgqdegp f q,

para todo x P R. Logo, degp f � gq � degp f qdegpgq.

O seguinte resultado caracteriza os mapas de R que são levantamentos demapas do círculo:

Proposição 1.2.8 (Função deslocamento). Sejam f : T ý um mapa contínuo eF : R ý um levantamento de f . Então a função contínua ∆F : R ý dada por

∆Fpxq :� Fpxq � degp f qx, @x P R,

é Z-periódica.

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Demonstração. Seja l um inteiro arbitrário. Então temos que

∆Fpx� lq � Fpx� lq � degp f qpx� lq� Fpxq � l degp f q � degp f qx� degp f ql� Fpxq � degp f qx � ∆Fpxq.

Logo, ∆Fpxq é Z-periódica.

O seguinte resultado estabelece os possíveis valores do grau de homeomor-fismos do círculo:

Proposição 1.2.9 (Grau de homeomorfismos). Se f : T ý é um homeomorfismo,então degp f q P t�1, 1u.

Demonstração. Inicialmente observemos que se IdT : T ý e IdR : R ý são asaplicações identidade do círculo e da reta respectivamente, então a segunda élevantamento da primeira e temos que

x� 1 � IdRpx� 1q � IdRpxq � degpIdRq, @x P R,

e portanto degpIdTq � 1. Logo, pela Proposição 1.2.7 segue que

1 � degpIdTq � degp f � f�1q � degp f qdegp f�1q.

e portanto degp f q � degp f�1q � �1.

Desta forma o grupo de homeomorfismos do círculo divide-se em doisconjuntos que coincidem com as componentes conexas dadas pela topologiacompacto-aberta:

HomeopTq � Homeo�pTq \Homeo�pTq,

onde Homeo�pTq :� t f P HomeopTq : degp f q � �1u.

Exemplo 1.2.10. As rotações Rα : T ý pertencem a Homeo�pTq, pois seulevantamento é dado por

Rαpxq � x� α� k; k P Z

satisfazRαpx� 1q � Rαpxq � px� α� k� 1q � px� α� kq � 1

A seguinte proposição estabelece uma relação entre a orientação do home-omorfismo e seu grau.

Proposição 1.2.11. Seja f : T ý homeomorfismo, então f preserva orientação se esomente se degp f q � 1.

Demonstração. Seja F : R ý levantamento, pela proposição 1.2.9 degp f q � �1.Suponha que degp f q � �1, i.e. Fpx � 1q � Fpxq � �1; como f preserva ori-entação, temos que F é crescente e por consequência, para x   x � 1 temosFpxq   Fpx � 1q, portanto 0   Fpx � 1q � Fpxq � �1 o que é uma contra-dição. Reciprocamente, dado F levantamento de f , logo F é crescente poisFpx� 1q � Fpxq � degp f q ¡ 0

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Exemplo 1.2.12. Os homeomorfismos fα : T ý definido por fαprxsq � r�x� αsinvertem orientação.

Podemos definir então as noções fundamentais de equivalência entre siste-mas dinâmicos do círculo:

Definição 2 (Conjugação e semi-conjugação topológica). Diremos que dois ma-pas contínuos f , g : T ý são conjugados quando existir h P Homeo�pTq tal queh � f � g � h.

Por outro lado, diremos que f e g são semi-conjugados, ou que f é umaextensão topológica de g, ou que g é um fator topológico de f , quando existeh P C0pT, Tq com degphq � 1 e tal que h � f � g � h.

Fechamos esta seção com o seguinte resultado sobre levantamentos de ho-meomorfismos do círculo que preservam orientação:

Proposição 1.2.13. Se f P Homeo�pTq e F : R ý é um levantamento de f , então Fé um homeomorfismo estritamente crescente.

Demonstração. Dado que f é injetiva e Π é uma aplicação de recobrimento, sa-bemos que F é localmente estritamente monótona, i.e. para todo x P R existeuma vizinhança de x onde F é estritamente crescente ou estritamente decres-cente.

Suponha então que F : R ý não é estritamente crescente. Pela observaçãoanterior podemos garantir que existem x0, x1 P R, com x0   x1 e tais queFpx0q ¡ Fpx1q.

Por outro lado, dado que degp f q � 1, temos que

Fpx� nq � Fpxq � n, @x P R, @n P Z.

Portanto, tomando n0 P N convenientemente, teremos que x0   x1   x0 � n0,com Fpx0 � n0q ¡ Fpx0q ¡ Fpx1q.

Desta forma, a função F restrita ao intervalo rx0, x0 � n0s terá seu ponto demínimo absoluto no interior do intervalo, o que contradiz o fato de que F élocalmente estritamente monótona.

1.3 Homeomorfismos do círculo: número de rotação

Nesta seção lembraremos vários resultados clássicos sobre a dinâmica de ho-meomorfismos do círculo. Para isso, introduziremos a noção de número de ro-tação devida a Henri Poincaré [Poi85].

Para começar observamos que Homeo�pTq é um sub-grupo de índice 2 emHomeopTq, e portanto, a quase totalidade das questões dinâmicas sobre oshomeomorfismos do círculo podem ser entendidas analisando a dinâmica doshomeomorfismos que preservam orientação, i.e. a dinâmica dos elementos deHomeo�pTq.

O invariante dinâmico mais importante para estes sistemas é o chamadonúmero de rotação, cuja definição se baseia no seguinte:

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Teorema 1.3.1 (Existência do número de rotação). Seja f P Homeo�pTq arbi-trário e F : R ý um levantamento de f . Então existe um número real ρ � ρpFq talque

ρpFq � limnÑ�8

�Fnpxq � x

n

, @x P R,

e onde a convergência é uniforme em x.

Para demostrar este resultado precisaremos o seguinte resultado elementar:

Lema 1.3.2. Seja panqnPN uma sequência de números reais e c P R uma constantereal tal que

|am�n � am � an| ¤ c @m, n P N.

Então o seguinte limite existe:lim

n�8

an

n.

Demonstração do Lema 1.3.2. Afirmamos que a sequência panqnPN verifica a se-guinte estimativa:

|amn �man| ¤ pm� 1qc, @m, n P N. (1.4)

Vamos mostrar esta desigualdade por indução em m e fixando n. Para m � 1, adesigualdade verifica-se trivialmente. Suponha que é válido para m � k P N,i.e. |akn � kan| ¤ pk� 1qc, e observe que∣∣∣apk�1qn � pk� 1qan

∣∣∣ � |akn � anm � anm � an � kan|¤ |akn � akn � an|� |akn � kan|¤ c� pk� 1qc � kc

isto conclui a proba de (1.4).Logo, dado ε ¡ 0 arbitrário, escolha N P N tal que 2c

N   ε. Para n, m ¥ N,invocamos (1.4) para afirmar que∣∣∣ amn

mn�

an

n

∣∣∣ ¤ pm� 1qcmn

 cn 

ε

2, (1.5)

e ∣∣∣ amn

mn�

an

n

∣∣∣ ¤ pn� 1qcmn

 cm 

ε

2. (1.6)

Desta forma, ∣∣∣ am

m�

an

n

∣∣∣ ¤ ∣∣∣ amn

mn�

an

n

∣∣∣� ∣∣∣ amn

mn�

am

m

∣∣∣   ε.

e portanto a sequência p ann qnPN é de Cauchy, e portanto convergente.

Demonstração do Teorema 1.3.1. Dividiremos a prova em três partes.

a. Primeiramente mostraremos que o limite

limn�8

�Fnpxq � x

n

existe para todo x P R.

10

Seja x P R um ponto arbitrário, e consideremos as sequências an :� pFnpxq � xqe αn :� tanu, para cada n P Z. Observemos que vale,

|am�n � am � an| �∣∣pFm�npxq � xq � pFmpxq � xq � pFnpxq � xq

∣∣� |pFmpFnpxqq � Fmpxqq � pFnpxq � xq| ,

para todo m, n P Z, e dado que αn ¤ an   αn � 1, para todo n, isto implicaque

αn ¤ Fnpxq � x   αn � 1. (1.7)

Logo, x� αn ¤ Fnpxq   x� αn � 1. Aplicando Fm a esta cadeia de desigual-dades, e levando em consideração a Proposição 1.2.13 que afirma que F éestritamente crescente, concluímos que

Fmpx� αnq ¤ FmpFnpxqq   Fmpx� αn � 1q, @m, n P Z, (1.8)

e portanto, dado que f tem grau 1 e αn é inteiro, concluímos que

Fmpxq � αn ¤ FmpFnpxqq   Fmpxq � αn � 1, @m, n P Z.

Segue dai que

αn ¤ FmpFnpxqq � Fmpxq   αn � 1, @m, n P Z,

e das equações (1.7) e (1.8) obtemos∣∣pFm�npxq � Fmpxqq � pFnpxq � xq∣∣   |αn � 1� αn| � 1, @m, n P Z. (1.9)

Desta forma vemos que se verifica |am�n � am � an|   1 e como consequên-cia do Lema 1.3.2, o limite existe.

b. Mostraremos a continuação que o limite é independente do valor de x.

Do ponto anterior sabemos que este limite existe para cada ponto de R.Dados x, y P R com x   y, existem m, k P Z tais que

m ¤ x   y ¤ m� k. (1.10)

Dado que Fn é crescente, temos que

Fnpmq ¤ Fnpxq   Fnpyq ¤ Fnpm� kq, @n P Z.

Desta forma,

|Fnpxq � Fnpyq|   |Fnpm� kq � Fnpmq| , @n P Z.

Além disso, dado que k é inteiro, sabemos que Fnpm � kq � Fnpmq � k, eportanto

|Fnpxq � Fnpyq| ¤ |k| , @n P Z. (1.11)

Logo, de (1.10) e (1.11) tem-se∣∣∣∣ Fnpxq � xn

�Fnpyq � y

n

∣∣∣∣ ¤ ∣∣∣∣ Fnpxq � Fnpyqn

∣∣∣∣� ∣∣∣∣ x� yn

∣∣∣∣ ¤ 2 |k|n

,

e tomando n Ñ �8, obtemos

limn�8

Fnpxq � xn

� limn�8

Fnpyq � yn

.

Portanto ρpFq é independente do ponto escolhido.

11

c. Mostremos agora que a convergência é uniforme. Para isso provaremosprimeiro o seguinte:

Lema 1.3.3. Seja f : Homeo�pTq, F : R ý um levantamento de f e ∆Fpxq :�Fpxq � x. Então tem-se

Oscp∆Fq � maxxPR

∆Fpxq �minxPR

∆Fpxq ¤ 1.

Demonstração. Dado que ∆F é Z-periódica, existem xM, xm P R tais que∆FpxMq � maxxPR ∆Fpxq, e ∆Fpxmq � minxPR ∆Fpxq. Podemos supor quexM ¤ xm   xM � 1. Então temos

FpxMq � xM � ∆FpxMq ¤ Fpxmq � xm � ∆Fpxmq,

pois F é monótona. Portanto, ∆FpxMq � ∆Fpxmq ¤ xm � xM ¤ 1.

Pelo Lema anterior temos que

maxxPR

pFnpxq � x� nρpFqq �minxPR

pFnpxq � x� nρpFqq ¤ 1.

Dai segue que |Fn � IdR � ρpFq|8 ¤ 1, onde |F|8 � maxxPR |Fpxq|. Assimtemos que ∣∣∣∣ Fn � IdR

n� ρpFq

∣∣∣∣8¤

1n

.

Portanto,Fn � IdR

nconverge uniformemente para ρpFq, quando n Ñ �8.

Observação 1.3.4.

i) Quando escolhemos an � Fnp0q em (1.6) com c � 1 as expressões (1.4) e(1.5) para n, m ¥ N implicam:∣∣∣∣ Fmp0q

m�

Fnp0qn

∣∣∣∣ ¤ 1m�

1n

,

de aqui que, pelo lema 1.3.2, p Fnp0qn qn é de Cauchy e converge a ρpFq, logo

temos que∣∣∣ Fmp0q

m � ρpFq∣∣∣ ¤ 1

m .

ii) Se F, G são levantamentos de f então ρpGq � ρpFq � k onde k P Z.

De fato, pela proposição 1.2.4 temos G � F� k para algum k P Z. Assimpara Gpxq � Fpxq � k com x P R,

G2pxq � GpFpxq � kq � FpFpxq � kq � k � F2pxq � 2k,

procedendo de maneira indutiva temos Gnpxq � Fnpxq � nk, dai que

ρpGq � limnÑ�8

�Gnpxq � x

n

� lim

n�8

�Fnpxq � nk� x

n

� limn�8

�Fnpxq � x

n� k

� ρpFq � k.

12

Isto nos permite definir o número de rotação de (um levantamento de) umhomeomorfismo do círculo:

Definição 3 (Número de rotação). Dado um f P Homeo�pTq e um levanta-mento F : R ý de f , o número ρpFq dado pelo Teorema 1.3.1 é chamado númerode rotação de F.

A classe de equivalência módulo Z de ρpFq independe da escolha do le-vantamento e portanto podemos definir o número de rotação de f como ρp f q :�ΠpρpFqq.

Exemplo 1.3.5. Seja Rα : T ý uma rotação; seja Rα : R ý dada por Rαpxq �x� α� k, para todo x P R e k P Z; como Rα

npxq � x� nα� k, então temos:

ρpRαq � limnÑ�8

Rαnpxq � xn

� limn�8

x� nα� k� xn

� α

i.e. o número de rotação coincide com o angulo α.

Observação 1.3.6. Para mapas contínuos f : T ý com degp f q � 1, o númerode rotação não necessariamente existe; por exemplo para Fpxq � 2x, e x0 P R

temos Fnpx0q � 2nx0 e assim:

ρpFq � limnÑ�8

Fnpx0q � x0

n� lim

n�8

2nx0 � x0

n

� x0

�lim

n�8

2n � 1n

� �8

O seguinte resultado estabelece algumas propriedades fundamentais donúmero de rotação:

Proposição 1.3.7. O número de rotação satisfaz as seguintes propriedades:

a. A função ρ : Homeo�pTq Ñ T é contínua quando o espaço dos homeomorfismos émunido da topologia C0 induzida pela norma } f }8 � supzPT | f pzq|.

b. Se f P Homeo�pTq e ρp f q � 0, então f tem um ponto fixo.

c. Se F e G são levantamentos de f e g respectivamente e F � G � G � F, entãoρpF � Gq � ρpFq � ρpGq.

Demonstração.

a. Provaremos a continuidade de numero de rotação, fixado f0 dado ε ¡ 0devemos provar que existe um δ ¡ 0 tal que se } f � f0}8   δ se cumpre|ρp f q � ρp f0q|   ε, onde f P Homeo�pTq.

Seja F0 levantamento de f0. Por outro lado temos que F0 é a suma de afunção identidade mais uma função contínua e periódica de período 1, logo

13

F0 e uniformemente contínua. Assim F0 admite uma função φ : R� ý comφp0q � 0, para a qual

|F0pxq � F0pyq| ¤ φp|x� y|q. (1.12)

De fato, suponha que F0 é uniformemente contínua então basta definir

φpδq � sup|x�y| δ

|F0pxq � F0pyq|

Por outro lado, para o levantamento F tem-se que a função ∆F :� F� IdR éperiódica e

supxPR|Fpxq � F0pxq| � sup

xPr0,1s|Fpxq � F0pxq|

Logo para cada inteiro k pela observação 1.3.4 tem-se∣∣∣∣∣ρpF0q �Fk

0 p0qk

∣∣∣∣∣ ¤ 1k

.

Assim, segue que

|ρpFq � ρpF0q|  ∣∣∣ρpFq � Fkp0q

k

∣∣∣� ∣∣∣∣ Fkp0qk �

Fk0 p0qk

∣∣∣∣� ∣∣∣∣ρpF0q �Fk

0 p0qk

∣∣∣∣  1

k �

∣∣∣∣ Fkp0qk �

Fk0 p0qk

∣∣∣∣� 1k . (1.13)

Agora para todo δ e todo levantamento F, para os quais cumpre-se

supxPR|F0pxq � Fpxq|   δ

procuramos um inteiro k, de tal maneira que em (1.13) o segundo terminoseja pequeno. Tendo (1.12), obtemos∣∣F2

0 p0q � F2p0q∣∣ � |F0pF0p0qq � F0pFp0qq � F0pFp0qq � FpFp0qq|

¤ |F0pF0p0qq � F0pFp0qq|� |F0pFp0qq � FpFp0q|¤ φp|F0p0q � Fp0q|q � δ¤ δ� φpδq

da mesma forma nós temos∣∣F30 p0q � F3p0q

∣∣ ¤∣∣F0pF2

0 p0qq � F0pF2p0qq∣∣� ∣∣F0pF2p0qq � FpF2p0q

∣∣¤ φp

∣∣F20 p0q � F2p0q

∣∣q � δ¤ δ� φpδ� φpδqq

.

.

.∣∣∣Fk0 p0q � Fkp0q

∣∣∣ ¤∣∣∣F0pFk�1

0 p0qq � F0pFk�1p0qq∣∣∣� ∣∣∣F0pFk�1p0qq � FpFk�1p0q

∣∣∣¤ φp

∣∣∣Fk�10 p0q � Fk�1p0q

∣∣∣q � δ

¤ δ� φpφp...pφpδ� φpδqqqq

14

Agora escolhamos um inteiro k para o qual k ¡ 4ε e a seguir δ ¡ 0 pelo qual

δ� φpφp...pφploooomoooonk

δ� φpδqqqq ¤kε

2(1.14)

escolha resolvida em a continuidade de φ e a condição φp0q � 0. Finalmente,pela escolha de k, ao substituir (1.14) em (1.13) temos

|ρpFq � ρpF0q|  ε

4�

2k�

ε

4� ε

o que conclui a prova do primeiro item.

b. Suponha que f não possui pontos fixos, o qual significa que f prxsq � rxspara todo x P R. Notemos que quando F é um levantamento de f temosΠpFpxqq � Πpxq se e somente se Fpxq � x R Z, assim podemos supor 0  Fpxq � x   1. Consideramos a função ψpxq � Fpxq � x. Já sabemos que ψé contínua e de período 1 pelo qual se tem ψpr0, 1sq � ψpRq � p0, 1q. Dadoque ψ está definida no compacto r0, 1s então ela atinge o valor máximo emínimo digamos x0, x1 P r0, 1s.

0   ψpx0q ¤ ψpx0q ¤ ψpx1q   1

para δ � min tψpx0q, 1� ψpx1qu ¡ 0, se tem

δ ¤ Fpxq � x ¤ 1� δ

é dizerx� δ ¤ Fpxq ¤ x� δ� 1 (1.15)

Dado que F é crescente, e pela relação (1.15) que é verdade para tudo x P R,se tem

δ ¤ Fp0q ¤ 1� δ2δ ¤ F2p0q ¤ Fp1� δq ¤ 1� δ� p1� δq

.

.

.nδ ¤ Fnp0q ¤ np1� δq

ao dividir entre n se tem

δ ¤Fnp0q

n¤ 1� δ

e quando n Ñ �8 obtemos finalmente

δ ¤ ρpFq ¤ 1� δ ñ 0   ρp f q   1.

o qual contradize o fato de que ρp f q � 0.

c. Como pF � Gqpxq � pG � Fqpxq ñ pF � Gqn � Gn � Fn � Fn � Gn para cadan P N; por um processo análogo a observação 1.3.4 temos∣∣∣∣ρpGq � Gnpxq � x

n

∣∣∣∣   1n

15

Trocando x por uma sequência pxmqmPN em R se obtém∣∣∣∣ρpGq � Gnpxmq � xm

n

∣∣∣∣   1n

fazendo n Ñ �8 segue que

ρpGq � limnÑ�8

�Gnpxmq � xm

n

Finalmente,

ρpF � Gq � ρpFq � limnÑ�8

�pF � Gqnpxq � x

n

� lim

n�8

�Fnpxq � x

n

� limn�8

�GnpFnpxqq � x

n

� lim

n�8

�Fnpxq � x

n

� limn�8

�GnpFnpxqq � Fnpxq

n

� ρpGq

Observação 1.3.8. Para f , g P Homeo�pTq com f � g � g � f valeρp f � gq � ρp f q � ρpgq.

1.4 Número de rotação racional

Como já foi mencionado anteriormente, o número de rotação é o invariante di-nâmico mais importante para o estudo dos homeomorfismos do círculo. Nestaseção estudaremos as consequências dinâmicas do fato de que este númeroseja racional. Mais precisamente, mostraremos que neste caso existem órbi-tas periódicas e tais órbitas são ordenadas igual que em uma rotação racional.Para isso vamos lembrar a definição de órbita, semi-órbita, ponto fixo e órbitaperiódica:

Definição 4. Seja f : T ý e z0 P T. Definimos a órbita de z0 como o conjunto

Opz0q � t f npz0q : n P Zu

Além disso, a semi-órbita positiva e negativa de z0 por f são os conjuntos

O�pz0q � t f npz0q : n P Z�u O�pz0q � t f npz0q : n P Z�u

Definição 5. Seja f : T ý contínua e z0 P T, dizemos que z0 é ponto fixo sef pz0q � z0. Por outro lado, o ponto z0 é dito ponto periódico de período q sef qpz0q � z0 e f jpz0q � z0 para todo 1 ¤ j ¤ q� 1. Além disso a órbita de umponto periódico é uma órbita periódica.

O conjunto e pontos periódicos de f será denotado por Perp f q.

O seguinte resultado estabelece a relação fundamental entre a propriedadearitmética do número de rotação e a existência de órbitas periódicas:

16

Teorema 1.4.1. Seja f P Homeo�pTq. Então ρp f q P QzZ se e somente se f possuialgum ponto periódico ( i.e. Perp f q � ∅).

Demonstração. Seja F : R ý um levantamento de f e lembremos que ρp f q �ΠpρpFqq.

pñq Suponha que ρp f q � p{q P Q. Raciocinando por contradição, suponha-mos que Fqpxq � x� p, @x P R. Então temos que Fqpxq ¡ x� p, @x PR, ou Fqpxq   x� p, @x P R.

Sem perda de generalidade podemos supor que Fqpxq ¡ x � p. Logo,dado que a função ∆Fqpxq � Fqpxq � x é Z-periódica, temos que existeε ¡ 0 tal que ∆Fqpxq ¡ p� ε, para todo x P R.

Logo, iterando obtemos

Fnqpxq ¡ x� npp� εq, @x P R, @n P Z.

Assim

ρpFq � limnÑ�8

�Fnqpxq � x

nq

¥

p� ε

pq

.

o que é uma contradição.

pðq Seja z um ponto periódico para f e x um ponto arbitrário de Π�1pzq.Então existem p P Z e q P N tais que Fqpxq � x� p. Iterando obtemos

Fnqpxq � x� np @n P Z,

e portanto,

ρpFq � limnÑ�8

�Fnqpxq � x

nq

� lim

n�8

�npnq

pq

.

Da demonstração do Teorema 1.4.1 podemos obter o seguinte:

Corolário 1.4.2. Seja f P Homeo�pTq, F : R ý um levantamento de f e suponhaque ρpFq � p{q, com p P Z e q P N co-primos. Então f possui pontos periódicos etodos eles têm período q.

Demonstração. Pelo Teorema 1.4.1 sabemos que existe z P Perp f q. Seja x umponto arbitrário de Π�1pzq. Então sabemos que existem q1 P N e p1 P Z taisque

Fq1pxq � x� p1. (1.16)

Iterando novamente obtemos:

pq� ρpFq � lim

n�8

Fnq1pxq � xnq1

�p1

q1.

Assim existe d P Z tal que p1 � pd e q1 � dq.

17

Afirmamos que Fqpxq � x� q. De fato, se esse não for o caso, então teríamosFqpxq ¡ x� p ou Fqpxq   x� p. Sem perdida de generalidade podemos suporque Fqpxq ¡ x� p. Desta forma temos

F2qpxq � FqpFqpxqq ¡ Fqpx� pq ¡ x� 2p,

e uma simples indução implica que

Fq1pxq � Fdqpxq ¡ x� dp � x� p1,

já que p1 � dp e q1 � dq, o que contradiz (1.16).Desta forma vemos que Perp f q � Fixp f qq � H, sempre que ρpFq � p{q, com

p e q co-primos.

Exemplo 1.4.3. Seja Rα : T ý uma rotação, α P Q � tpq ; p P Z, q P Nu então

cada Oprxsq é periódica. Em efeito, se α �pq com pp, qq � 1, para rxs P T com

Rαprxsq � rx� αs obtemos:

R2pqprxsq � R p

q

��x�

pq

��

�x�

2pq

�,

procedendo de maneira indutiva, tem-se

Rnpqprxsq �

�x�

npq

�, n P N

Em particular temos

Rqpqprxsq �

�x� q

pq

�� rx� ps � rxs

assim a órbita

O�prxsq �"rxs,R p

qprxsq, ...,Rq�1

pqprxsq

*

é q-periódica.

1.5 Número de rotação irracional

Nesta seção consideramos homeomorfismos com número de rotação irracional.Inicialmente mostraremos que as órbitas desses homeomorfismos são ordena-das como as órbitas da rotação Rρ, onde ρ e o número de rotação.

Para começar precisaremos do seguinte

Lema 1.5.1. Se f P Homeo�pTq e F : R ý é um levantamento de f com ρpFq PRzQ, então para cada z P T e n, m P Z tais que n   m, cada órbita interseca aointervalo I � r f mpzq, f npzqs.

18

Demonstração. Seja w P T um ponto arbitrário. Provaremos que existe ` P Z

tal que f `pwq P I. Para isso definimos o intervalo Ik :� f�kpn�mqpIq, para cadak P Z. É suficiente mostrar que

T �¤kPZ

Ik.

Para isso, notemos que se k P Z então Ik e Ik�1 têm um ponto final comum.Consequentemente, o conjunto

J :� Tz¤kPZ

Ik

é conexo. Por contradição, suponhamos que J é não vazio. Então ele é umponto ou um intervalo. Por outro lado, temos que f pJq � J. Isto significa queos extremos de J são pontos fixos de f 2, o que contradiz o fato de que f nãopossui pontos periódicos já que ρp f q P pRzQq{Z.

A seguinte proposição tem alguma semelhança com o resultado na seçãoanterior de que as órbitas periódicas são ordenadas, como as da rotação cor-respondente. É mais forte porque se aplica a todas as órbitas, e não a um sub-conjunto naturalmente distinto. isso nos ajuda em nosso estudo do comporta-mento assimétrico das órbitas para homeomorfismos sem pontos periódicos.

Lema 1.5.2. Seja f P Homeo�pTq, F : R ý um levantamento de f e suponha queρ � ρpFq P RzQ. Então para quaisquer x P R, m1, m2, n1, n2 P Z, temos quen1ρ�m1   n2ρ�m2 se e somente se Fn1pxq �m1   Fn2pxq �m2.

Demonstração.

pðq Dado que F é estritamente crescente e comuta com qualquer translaçãointeira, então temos que

Fn1pxq �m1   Fn2pxq �m2 ðñ Fn1�n2pxq �m1   x�m2.

Portanto temos,

F2pn1�n2qpxq   Fn1�n2pFn1�n2pxqq  Fn1�n2px�m1 �m2q� Fn1�n2pxq � pm2 �m1q  x�m1 �m2 � pm2 �m1q� x� 2pm2 �m1q.

Seguindo de maneira indutiva, temos que

Fkpn1�n2qpxq   x� kpm2 �m1q, @k P Z.

Logo

ρpFq � limkÑ�8

Fkpn1�n2qpxq � xkpn1 � n2q

¤m2 �m1

n1 � n2

assim ρ ¤ m2�m1n1�n2

. Dado que ρ P RzQ, então temos ρn1 �m1   ρn2 �m2.

19

pñq Agora provaremos que dados x P R, m1, m2, n1, n2 P Z, vale

Fn1pxq �m1 ¥ Fn2pxq �m2 ñ n1ρ�m1 ¥ n2ρ�m2.

De fato, temos que

Fn1pxq �m1 ¥ Fn2pxq �m2Fpn1�n2qpxq ¥ x�m2 �m1.

Por indução temos

Fkpn1�n2qpxq ¥ x� kpm2 �m1q.

Se pn1 � n2q ¥ 0, então

Fkpn1�n2qpxq�xkpn1�n2q

¥kpm2�m1qkpn1�n2q

ρ � limkÑ�8

Fkpn1�n2qpxq � xkpn1 � n2q

¥pm2�m1qpn1�n2q

ρn1 � ρn2 ¥ m2 �m1 ô ρn1 �m1 ¥ ρn2 �m2

Analogamente podem se mostrar o caso em que pn1 � n2q   0, com oqual obtemos o resultado.

Lembramos a continuação a noção de transitividade de sistemas dinâmicos:

Definição 6. Seja f : T ý uma aplicação contínua. Dizemos que f é topologi-camente transitiva se existe z P T tal que Opzq � T, ı.e. existe um ponto cujaórbita é densa em T.

Exemplo 1.5.3. Se ρpFq P RzQ então para todo z P T a órbitaOpzq � tRnρpzqunPZ

é densa em T; em efeito, suponhamos que para algum z0 P T a órbita Opz0q �

tRρpz0qunPZ não é densa. Em tal caso o conjunto TzOpz0q é não vazio, abertoe consiste de intervalos disjuntos.

Seja I � TzOpz0q o maior de tais intervalos, como Rρ preserva compri-mento temos que,RρpIq não se intersecam. Observe que os intervalos geradosnão podem coincidir (pois, se x P I é tal que x� kρ� l1 � x� l2 então kρ � l;para algum l P Z, i.e. ρ P Q).

Assim, os intervalos RnρpIq são de igual comprimento e disjuntos o qual é

impossível pois T tem comprimento finito.

O seguinte resultado devido a Poincaré [Poi85] estabelece que todo home-omorfismo do círculo com número de rotação irracional é uma extensão topo-lógica da rotação irracional correspondente:

Teorema 1.5.4. Seja f P Homeo�pTq tal que ρp f q P pRzQq{Z. Então temos

a. Existe uma função h : T ý contínua, monótona, sobrejetiva de grau 1 tal queh � f � Rρ � h.

20

b. Se f é topologicamente transitivo, então f é topologicamente conjugado à rotaçãoRρ.

Para provar este teorema, antes precisamos do seguinte

Lema 1.5.5. Se ρ P RzQ, então o conjunto B � tnρ�m : n, m P Zu é denso em R.

Demonstração do Lema 1.5.5. É fácil ver que y P B se e somente se y � m P Bpara algum m P Z. Portanto é suficiente mostrar que B X r0, 1s é denso emr0, 1s. Claramente, o conjunto BX r0, 1s é infinito. Em outro caso, existem parespn1, m1q � pn2, m2q em Z2 tais que

n1ρ�m1 � n2ρ�m2,

mas isso é impossível desde que ρ é irracional p se n1 � n2, então m1 � m2q.Seja pxnqnPN uma sequência em B X r0, 1s com infinitos valores. Desde quer0, 1s é compacto, podemos assumir que a sequência pxnq é convergente. Assimdado ε ¡ 0 existe m, n P N tal que 0   |xn � xm|   ε. Escrevendo

xn � n1ρ�m1 e xm � n2ρ�m2,

obtemosxn � xm � pn1 � n2qρ� pm1 �m2q P B.

Assim provamos que o conjunto B � tkpxn � xmq : k P Zu é ε-denso em R.Desde que ε é arbitrário concluímos que B é denso em R.

Demonstração do Teorema 1.5.4. Dividiremos a prova em duas partes.

a. Mostremos que existe uma função h : T ý contínua, não-decrescente esobrejetiva tal que h � f � Rρp f q � h.

Seja F levantamento de f e consideremos um x P R fixado. Definamos osconjuntos

A � tFnpxq �m; n, m P Zu e B � tnρ�m; n, m P Zu, (1.17)

onde ρ � ρpFq. Consideremos então a função H : R ý dada por

Hpyq :� suptnρ�m; Fnpxq �m ¤ yu. (1.18)

Do Lema 1.5.2 segue que H é não-decrescente. Mais ainda, H é constante emcada intervalo contido no complemento de A. De fato, se I � ra, bs � RzA,então

Fnpxq �m ¤ a ô Fnpxq �m ¤ b,

para cada n, m P Z, e desta forma Hpaq � Hpbq.

Dado que ρ é irracional, pelo Lema 1.5.2 temos que

HpFnpxq �mq � nρ�m. (1.19)

Isso implica que a função H não tem pulos. De fato, de (1.19) seque

HpRq � HpAq � B,

21

e pelo Lema 1.5.5, o conjunto B é denso em R. Disto segue que H também écontínua.

Agora consideremos o levantamento G : R ý de Rρ dado por Gpxq � x� ρ.Por (1.19) temos

pH � FqpFnpxq �mq � HpFn�1pxq �mq � pn� 1qρ�m,

e também

pG � HqpFnpxq �mq � Gpnρ�mq � pn� 1qρ�m.

Desta forma,H � F � G � H em A. (1.20)

Dado que os mapas H, F e G são contínuos, a identidade (1.20) continuaa valer em A e assim também em R (lembre que H é constante em cadaintervalo contido no complemento de A). Portanto, temos que

H � F � G � H em R. (1.21)

Por outro lado temos,

Hpy� 1q � suptnρ�m : Fnpxq �m ¤ y� 1u� suptnρ�m : Fnpxq �m� 1 ¤ yu� suptnρ�m� 1 : Fnpxq �m� 1 ¤ yu� Hpyq � 1.

Além disso, a função H é sobrejetiva. De fato, dado que H é contínua, temos

HpRq � Hpr0, 1sq � B � R.

Desta forma, a função h : T ý definida por

hpyq � ΠpHpyqq, @y P T, @y P Π�1pyq,

é contínua, não-decrescente e sobrejetiva. Mas ainda pela propriedade (1.21),tem-se que h � f � Rρ � h.

b. Mostremos agora que se f é topologicamente transitiva então existe h : T ýhomeomorfismo que conjuga f com Rρ, i.e. h � f � Rρ � h.

Seja z � Πpxq P T um ponto com órbita de f densa em T. Agora considera-mos a função h : T ý construída anteriormente no item pa.q, com este pontox.

Desta forma, o conjunto A dado por (1.17) é denso em R, e assim, a funçãoH dada por e (1.18) é bijectiva (lembre que H é constante em cada intervalocontido em RzA, que agora é este conjunto é vazio). Assim a função h ébijectiva. Resta mostrar que h é aberta. De fato, como h é contínua, mapeiaconjuntos compactos em conjuntos compactos. Assim, dado U um conjuntoaberto, a imagem hpTzUq � TzhpUq é compacto e portanto, hpUq é um con-junto aberto. Logo h é homeomorfismo.

22

Capítulo 2

ENDOMORFISMOS DOCÍRCULO

Neste capítulo começamos com material central desta dissertação, que visa es-tender a teoria de Poincaré do Capítulo 1 para aplicações contínuas do círculode grau 1.

Como veremos, neste caso diferentes pontos podem possuir diferentes nú-meros de rotação e portanto, o número de rotação definido para homeomorfis-mos do círculo será substituído por um conjunto ou intervalo de rotação.

2.1 Intervalos de rotação

Nesta seção vamos definir e estudar as propriedades fundamentais do intervalode rotação de um endomorfismo do círculo.

Definição 7. Diremos que f : T ý é um endomorfismo do círculo quando f écontínua e de grau 1. Denotamos por EndpTq o conjunto de todos os endomor-fismos do círculo, i.e.

EndpTq � t f : T ý tal que f é contínua e degp f q � 1u.

Em forma análoga ao feito no capítulo anterior, dado f P EndpTq, existeF : R ý levantamento tal que

Fpx� 1q � Fpxq � 1 e Π � F � f �Π

onde Π : R Ñ T é a projeção canônica.

Definição 8. Seja f : T ý um endomorfismo do círculo e seja F : R ý umlevantamento de f . Então para cada x P R definimos seu número de rotação por

ρ�pF, xq � lim supnÑ�8

�Fnpxq � x

n

,

e o conjunto de rotação ρpFq como o fecho de tρ�pF, xq : x P Ru, i.e.

ρpFq � tρ�pF, xq : x P Ru.

23

Veremos que este conjunto de rotação é de fato conexo, e portanto tambémserá chamado de intervalo de rotação.

Vamos provar que estas noções estão bem definidas:

Lema 2.1.1. Seja f P EndpTq e F : R ý um levantamento de f . Então, o número derotação ρpF, xq é um número real bem definido para todo x P R.

Além disso, o conjunto ρpFq é compacto.

Demonstração. Seja x P R um ponto arbitrário. Basta mostrar que a sequên-cia ppFnpxq � xq{nqnPN é uniformemente limitada. Como ∆F é contínua e Z-periódica temos que ∆F é limitada. De fato,

maxxPr0,1s

|∆Fpxq| � maxxPR|∆Fpxq| � L   8.

Daí segue que,

|Fnpxq � x| �∣∣Fnpxq � Fn�1pxq � Fn�1pxq � � � � � Fpxq � Fpxq � x

∣∣¤

∣∣Fnpxq � Fn�1pxq∣∣� � � � � |Fpxq � x|

�∣∣FpFn�1qpxq � Fn�1pxq

∣∣� � � � � |Fpxq � x|¤ L� � � � � L� nL.

Logo,�Ln ¤ Fnpxq � x ¤ Ln,

e portanto,

�L ¤ lim supnÑ�8

�Fnpxq � x

n

¤ L.

Desta forma, ρpFq P r�L, Ls.

Em seguida, vamos dar um exemplo que ilustra a definição anterior.

Exemplo 2.1.2. Seja f : T ý dada por f prxsq � rx � k sinp2πxqs com k P Z;é claro que f P EndpTq, logo Fpxq � x � k sinp2πxq é um levantamento poisverifica f �Πpxq � Π � Fpxq, logo podemos considerar,

∆Fpxq � Fpxq � x � k sinp2πxq

Então como,

|Fnpxq � x| �

∣∣∣∣∣ n

i�1

∆FpFi�1pxqq

∣∣∣∣∣¤

n

i�1

∣∣∣∆FpFi�1pxqq∣∣∣

¤ nk,

assim ρpFq � r�k, ks. Por outro lado,

F�

14

� 1

4 � k

F2�

14

� F

�14 � k

� 1

4 � k� k sin�

π2 � 2kπ

�� 1

4 � k� k

24

indutivamente temos que Fn�

14

� 1

4 � nk. Portanto,

ρ��

F,14

� lim

n�8

Fnp 14 q �

14

n� lim

n�8

14 � nk� 1

4n

� k

Analogamente ρ��F, 3

4

�� �k; deste modo ρpFq � r�k, ks.

Além disso, mostraremos que a classe módulo Z desses números de rotaçãoindependem do levantamento escolhido, e portanto, como já foi feito no casode homeomorfismos, podemos definir os números e o conjunto de rotação deum endomorfismo do círculo:

Proposição 2.1.3 (Dependência dos levantamentos). Seja f P EndpTq e F : R ýum levantamento de f . Então temos:

a. Se F1 : R ý é outro levantamento de f , então existe k P Z tal que

ρ�pF, xq � ρ�pF1, xq � k, @x P R,

e portanto, ρpFq � ρpF1q � k :� tρ� k : ρ P ρpF1qu.

b. Se x, x1 P R são dois pontos tais que Πpxq � Πpx1q, então ρ�pF, xq � ρ�pF, x1q.

Demonstração.

a. Pela Proposição 1.2.4 temos que existe k P Z tal que pF � F1qpxq � k, paratodo x P R. Daí segue, por indução, que

Fnpxq � Fn1 pxq � nk, @n P Z,@x P R.

Logo,

ρ�pF1, xq � lim supnÑ�8

�Fn

1 pxq � xn

� lim supn�8

�Fnpxq � x

n� k

� ρ�pF, xq � k

Disto segue imediatamente que ρpFq � ρpF1q � k.

b. Dado que Πpxq � Πpx1q, temos que k :� x1 � x P Z. Logo,

ρ�pF, x1q � lim supnÑ�8

�Fnpx1q � x1

n

� lim sup

n�8

�Fnpx� kq � px� kq

n

� lim supn�8

�Fnpxq � k� x� k

n

� lim sup

n�8

�Fnpxq � x

n

� ρ�pF, xq.

Desta forma vemos que, dados f P EndpTq e F : R ý um levantamentoarbitrário de f , pode-se definir o número de rotação de um ponto qualquer z P T

por:ρ�p f , zq :� Π

�ρ�pF, xq

�, @x P Π�1pzq,

eρp f q :�

ρ�p f , zq : z P T

(.

25

2.2 O intervalo de rotação como invariante dinâmico

Nesta seção mostraremos que o conjunto de rotação é de fato um intervalo, queele é um invariante dinâmico e que nele se concentra grande parte da informa-ção dinâmica do endomorfismo correspondente.

Proposição 2.2.1. Sejam f , g P EndpTq e suponha que eles são semi-conjugados, i.e.existe h : T ý homeomorfismo de grau 1 tal que h � g � f � h. Então vale que

ρ�p f , zq � ρ�pg, hpzqq, @z P T,

e portanto, ρp f q � ρpgq.

Demonstração. Sejam F, G : R ý levantamentos de f e g, respectivamente. En-tão existe um único levantamento H : R ý de h tal que H �G � F �H. Observeque ∆H :� H � IdR é uma função Z-periódica.

Dado um ponto arbitrário x P R, teremos

Fn � Hpxq � Hpxqn

�H � Gnpxq � Hpxq

n

�Gnpxq � ∆HpGnpxqq � x� ∆Hpxq

n

�Gnpxq � x

n�

∆HpGnpxqq � ∆Hpxqn

,

para todo n ¡ 0. Lembrando que ∆H é Z-periódica e portanto limitada, con-cluímos que o último termo da equação de acima tende a zero quando n Ñ �8e desta forma provamos que

ρ��F, Hpxq

�� ρ�pG, xq, @x P R,

e portanto, ρpFq � ρpGq, que é o que queríamos demonstrar.

No Lema 2.1.1 provamos que o número de rotação de um ponto dado sem-pre é bem definido, porém pontos diferentes podem ter número de rotaçãodiferente. A continuação mostraremos que o conjunto de rotação é sempre co-nexo, e portanto ele é um intervalo, ou talvez um ponto.

Para isso precisamos primeiramente do seguinte:

Lema 2.2.2. Sejam f P EndpTq, F : R ý um levantamento de f , e p{q um númeroracional escrito em forma irredutível. Então, se

ρpFq X��8,

pq

� H, e ρpFq X

� pq

,�8� H,

existe um ponto x0 P R tal que Fqpx0q � x0 � p, portanto Πpx0q P Perp f q.

Demonstração. Raciocinando por contradição, suponhamos que um tal pontox0 não exista. Nesse caso teremos que Fqpxq � x � p � 0, para todo x P R.Portanto teremos que,

Fqpxq � x   p @x P R, ou Fqpxq � x ¡ p, @x P R.

Observemos que,

Fqpx� 1q � px� 1q � Fqpxq � 1� x� 1 � Fqpxq � x, @x P R,

26

ou seja, a função ∆Fq :� Fq � IdR é periódica de período 1. Então existe ε ¡ 0tal que:

Fqpxq � x   p� ε,@x P R ou Fqpxq � x ¡ p� ε,@x P R

Daí segue que,

ρpFq �"

x P R{x ¤p� ε

q

*ou ρpFq �

"x P R{x ¥

p� ε

q

*,

o que contradiz a nossa hipótese.

O Lema 2.2.2 nos permite provar o seguinte resultado que mostra que oconjunto de rotação é sempre conexo:

Teorema 2.2.3. Se f P EndpTq e F : R ý é um levantamento de f , então o conjuntode rotação ρpFq é um ponto ou um intervalo fechado.

Demonstração. No Lema 2.1.1 mostramos que o conjunto de rotação ρpFq é defato limitado. Desta forma podemos definir

α :� inf ρpFq, e β :� sup ρpFq.

Se α � β então ρpFq � tαu é um único ponto. Se α   β então como con-sequência do Lema 2.2.2 temos que

V � tx P Q : x P pα, βqu � ρpFq.

Como o conjunto de rotação é, por definição, fechado, então claramente tere-mos ρpFq � rα, βs.

A continuação mostraremos que o intervalo de rotação varia continuamentecom o endomorfismo correspondente. Mais precisamente, se f P EndpTq,F : R ý é um levantamento de f e ρ1pFq, ρ2pFq P R são tais que ρpFq �rρ1pFq, ρ2pFqs, então os números ρ1pFq e ρ2pFq variam continuamente com F.

Proposição 2.2.4. Sejam f P EndpTq, F : R ý um levantamento de f e ε ¡ 0 umnúmero arbitrário. Então existe δ ¡ 0 tal que se G : R ý é um levantamento de umg P EndpTq tal que

|Gpxq � Fpxq| ¤ δ, @x P R,

então vale|ρipFq � ρipGq| ¤ ε, para i P t1, 2u.

Demonstração. Vamos começar mostrando que dado ε ¡ 0, existe um δ0 ¡ 0 talque se G : R ý é um levantamento de um g P EndpTq tal |Fpxq � Gpxq| ¤ δ0,para todo x P R, então temos que ρ1pFq � ρ1pGq   ε.

Para isso, seja p{q um número racional escrito em forma irredutível tal que,

ρ1pFq � ε  pq  ρ1pFq.

Dado que,

pq  ρ1pFq ¤ ρ�pF, xq � lim sup

n�8

Fnpxq � xn

, @x P R,

27

temos que,Fqpxq � x ¡ p, @x P R. (2.1)

De fato, se este não for o caso, é claro que a desigualdade contrária não podevaler para todo x P R, e portanto, deveria existir um ponto y P R com Fqpyq �p � y. Porém isto implicaria que Fnqpyq� y � np, para todo n P N e nesse casoteríamos que p{q P ρpFq, o que contradiz a nossa escolha de número p{q.

Portanto, dado que a propriedade (2.1) é aberta, segue que existe δ0 ¡0 tal que se G : R ý é um levantamento de um g P EndpTq satisfazendo|Fpxq � Gpxq| ¤ δ0, para todo x P R, então vale:

Gqpxq � p ¡ x, @x P R.

Disto segue que,

Gnqpxq � xnq

¡pq

, @n P N, @x P R,

e portanto ρ1pGq ¡ p{q. Logo,

ρ1pFq � ρ1pGq   ε. (2.2)

Em forma completamente análoga pode-se mostrar que existe δ1 ¡ 0 talque se |Fpxq � Gpxq| ¤ δ1, para todo x P R, então temos:

� ε   ρ2pFq � ρ2pGq. (2.3)

No caso particular de que ρ1pFq � ρ2pFq, ou seja, de que ρpFq se reduz a umponto, as estimativas (2.2) e (2.3) claramente implicam que

|ρipFq � ρipGq|   ε,

sempre que |Fpxq � Gpxq| ¤ mintδ0, δ1u, e o resultado estaria provado.Portanto resta considerar o caso em que ρ1pFq   ρ2pFq.Neste caso, sem perda de generalidade podemos supor que ρ1pFq   ρ1pFq�

ε   ρ2pFq. Então podemos achar um número racional p1{q1 P pρ1pFq� ε, ρ2pFqq �pρ1pFq, ρ2pFqq, com p1 e q1 co-primos e q1 ¡ 0.

Pelo Lema 2.2.2 sabemos que existe x0 P R tal que Fq1px0q � x0 � p1. Poroutro lado, dado que ρ1pFq   p1{q1   ρ2pFq, sabemos que existem x�, x� P R

tais que:Fq1px�q � x�   p1, e Fq1px�q � x� ¡ p1.

Neste caso, existe um δ2 ¡ 0 tal que se |Fpxq �Gpxq|   δ2, para todo x P R,então vale,

Gq1px�q � x�   p1, e Gq1px�q � x� ¡ p1.

Para um tal G claramente existe xG P R tal que Gq1pxGq � xG � p1, e portanto,p1{q1 P ρpGq. Logo,

ρ1pFq � ρ1pGq ¥ ρ1pFq �p1

q1¡ �ε. (2.4)

A outra estimativa necessária para ρ2pGq se prova em forma completamenteanáloga ao que acabamos de fazer.

Portanto, tomando δ :� mintδ0, δ1, δ2u provamos o resultado desejado.

28

A continuação introduzimos a noção variedade instável para um ponto pe-riódico de um endomorfismo. No caso de homeomorfismos, esta define-secomo o conjunto de pontos cujas semi-órbitas negativas convergem para a ór-bita periódica. É claro que esta definição precisa ser modificada no caso deendomorfismos já que a noção de semi-órbita negativa não faz sentido quandoo sistema não é invertível:

Definição 9 (Variedade instável). Seja f P EndpTq e z P T ponto periódico def . Então definimos a variedade instável de z como o conjunto

Wupzq �£U

� ¤iPN

f ipUq�

onde U dentoa uma vizinhança arbitrária de z.

O seguinte mostra que todo número racional contido no intervalo de ro-tação é realizado por um ponto periódico, e pode ser considerado como umaextensão do Teorema 1.4.1:

Lema 2.2.5. Seja f P EndpTq e F : R ý é um levantamento de f , então vale:

a. Se 0 P ρpFq, então F tem ponto fixo.

b. Se p{q P ρpFq, com p, q co-primos e q ¡ 0, então existe x P R tal que Fqpxq �x� p.

Demonstração.

a. Suponha por contradição que Fpxq � x para todo x P R. Como ∆F :�F � IdR é continua e periódica, segue que |∆Fpxq| ¥ δ, para todo x P R.Por continuidade, ou ∆Fpxq ¥ δ, @x P R; ou ∆Fpxq ¤ δ, @x P R. Desta

forma,1npFnpxq � xq ¥ δ, @x P R e por tanto, ρpFq � rδ,�8q, o que é

contradiz o fato de que 0 P ρpFq. Do modo análogo, se ∆Fpxq ¤ δ, temos queρpFq � p�8, δs. Logo, F tem ponto fixo.

b. Se p{q P ρpFq então pode se verificar facilmente que

ρpFq � pq � qρpFq � p � tqρ� p : ρ P ρpFqu.

Dai segue que se G :� Fq � p, então 0 P ρpGq. Pelo ponto anterior, temosque existe x P R tal que

x � Gpxq � Fqpxq � p.

O seguinte resultado estabelece uma propriedade fundamental sobre a va-riedade instável de certos pontos periódicos com número de rotação contidono interior do intervalo de rotação:

Proposição 2.2.6. Seja f P EndpTq, F : R ý um levantamento de f , e suponha quepq P pρ1pFq, ρ2pFqq. Então existe z P T ponto periódico de f com número de rotação p

qe tal que Wupzq � T.

29

Demonstração. Sem perda de generalidade podemos supor p{q � 0 (se este nãofor o caso, pode-se substituir f por f q e escolher um levantamento adequado).Pelo Lema 2.2.5 temos que f tem ponto fixo. Isto significa que o conjunto,

X :� tz P T : f pzq � z e ρp f , zq � 0u � H,

e ele é claramente um conjunto fechado. Por tanto TzX pode ser escrito comouma união disjunta de intervalos abertos. Além disso, dado que ρpFq é umintervalo não degenerado, sabemos que TzX é não-vazio.

Seja então U uma componente conexa de TzX e seja U � px1, x2q � R umacomponente conexa do conjunto Π�1pUq � R.

Desta forma teremos que então ∆F :� F� IdR é negativa ou positiva em U.De fato, suponha que Fpxq � x ¡ 0 e Fpyq � y   0 para algum x, y P U. Então,pela continuidade, existe x1 P U tal que Fpx1q � x1 � 0, e portanto Πpx1q P X, oque contradiz o fato de que U é uma componente conexa do complementar deX.

Agora observemos que, se ∆F é positivo em U, então temos U � WupΠpx1qq.De fato, se V é uma vizinhança qualquer de x1, então existirá x P V X U. Paraum tal x, o ponto Fpxq também pertencerá a U e Fpxq ¡ x. Por indução, te-mos que Fmpxq   Fnpxq, se 0 ¤ m   n, e portanto Fnpxq converge a um pontofixo de F, quando n Ñ �8. Dado que não F não possui pontos fixos em U,concluímos que Fnpxq Ñ x2, quando n Ñ �8, o que mostra que:

U �¤

nPN

FnpVq.

Dado que ΠpUq � U e V é uma vizinhança arbitrária de x1, concluímosque,

U � WupΠpx1qq.

A continuação suponha que,¤n¥0

f npUq � T.

Observando que U � FpUq, desta última suposição segue que FnpUq � px1 �1, x2 � 1q, para todo n P N, o qual implica que Fnpr0, 1sq � r�1, 2s, para todon ¥ 0. Isto claramente implica que ρpFq � t0u, o que contradiz a nossa hipótesede que 0 pertence ao interior do conjunto de rotação.

Portanto,�

n¥0 f npUq � T e WupΠpx1qq � T.Em forma semelhante, se ∆F for negativa em U, pode-se mostrar que U �

WupΠpx2qq, e nesse caso WupΠpx2qq � T.

2.3 Realização de números de rotação

Na seção 2.1 definimos o conjunto de rotação como o fecho da união dos núme-ros de rotação dos pontos diferentes pontos de T. Por outro lado, no Lema 2.2.2mostramos que todo número racional contido no interior do conjunto de rota-ção é realizado por uma órbita periódica.

O objetivo principal desta seção é mostrar um resultado devido a Ito [Ito81]que mostra que todo ponto do intervalo de rotação é de fato realizado poralgum ponto do círculo.

30

Teorema 2.3.1 (R. Ito). Seja f P EndpTq e F : R ý um levantamento de f . Seα P ρpFq, então existe um x P R tal que ρ�pF, xq � tαu, i.e.

ρpFq � tρ�pF, x1q : x1 P Ru � tρ�pF, x1q : x1 P Ru.

Demonstração. Seja α P tρ�pF, xq : x P Ru � tρ�pF, xq : x P r0, 1su um ponto ar-bitrário. Pelo Lema 2.2.2 podemos escolher uma sequência ppn{qnqnPN satisfa-zendo as seguintes condições:

(1) pn P Z, qn P N;

(2) qn�1 ¡ qn para todo n P N;

(3) limnÑ8

�pn

qn

� α;

(4) existem duas sequências pxnqnPN, pynqnPN tais que 0 ¤ xn   1; 0 ¤ yn   1 e

Fqnpxnq � pn � 1� xn, e Fqnpynq � pn � 1� yn.

Além disso, afirmamos que existe M P Z tal que:

max t maxxPr0,1s

|Fpxq| , 1u   M

De fato, como F : R ý é contínua e

maxxPr0,1s

|Fpxq � x| � L,

temos que||Fpxq|� |x|| ¤ | f pxq � x| ¤ L, @x P r0, 1s.

Assim|Fpxq| ¤ L� |x| , @x P r0, 1s.

Pela nossa escolha anterior, M � L� 1.Por outro lado, nos podemos escolher uma sequência pknqnPN de inteiros

positivos satisfazendo.

max"

kn pn � qn�1Mknqn

,kn pn � qn�1M

knqn � qn�1

pn � 1qn

p5q e

min"

kn pn � qn�1Mknqn

,kn pn � qn�1M

knqn � qn�1

pn � 1qn

,

para cada n P N.

i. Dado que,Fq1px1q � p1 � 1� x1Fq1py1q � p1 � 1� y1,

temos que, Fq1pr0, 1sq � rp1, p1 � 1s, pois como Fq1 : R ý é contínua ex1, y1 P r0, 1s, então Fq1px1q, Fq1py1q P Fq1pr0, 1sq. Portanto;

Fq1pr0, 1sq � rp1 � 1� x1, p1 � 1� y1s � rp1, p1 � 1s.

31

Seja Jp1, 1q � rp1, p1 � 1s. Então Jp1, 1q é uma translação à direita de r0, 1spor p1. De forma semelhante ao anterior temos,

Fq1pJp1, 1qq � rp1 � p1 � 1� x1, P1 � p11� y1s � r2p1, 2p1 � 1s.

Procedendo indutivamente denotamos por Jp1, j1q � rj1 p1, j1P1 � 1s e peloargumento feito acima temos o seguinte:

Fq1pJp1, j1qq � Jp1, j1 � 1q , j1 � 1, 2, ..., k1 � 1.

Além disso temos,

Fq1pr0, 1sq � Jp1, 1qF2q1pr0, 1sq � Fq1pJp1, 1qqq � Jp1, 2qF3q1pr0, 1sq � F2q1pJp1, 1q � Fq1pJp1, 2q � Jp1, 3q���

Fk1q1pr0, 1sq � ... � Jp1, k1q.

ii. Por outro lado temos;

Fq2px2q � p2 � 1� x1Fq2py2q � p2 � 1� y2

Como Fq2 : R ý é contínua, seguindo a ideia de pi.q acima temos que:

Fq2pr0, 1sq � rp2 � 1� x2, p2 � 1� y2s � rp2, p2 � 1s.

Nós queremos construir uma sequência encaixada, por isso fazendo umatranslação obtemos;

Fq2pJp1, k1qq � Fq2prk1 p1, k1 p1sq � rk1 p1 � p2, k1 p1 � p2 � 1s � Jp2, 1q.

Denotamos Jp2, j2q � rk1 p1 � j2 p2, k1 p1 � j2 p2 � 1s. Logo, de forma geraltemos;

Fq2pJp2, j2qq � Jp2, j2 � 1q, para j2 � 1, 2, ..., k2 � 1.

Além disso,

Fq2pr0, 1sq � Jp2, 1qF2q2pr0, 1sq � Fq2pJp2, 1qqq � Jp2, 2qF3q2pr0, 1sq � F2q2pJp2, 1q � Fq2pJp2, 2q � Jp2, 3q���

Fk2q2pr0, 1sq � ... � Jp2, k2q.

iii. Seguindo indutivamente, desde que,

Fqnpxnq � pn � 1� xnFqnpynq � pn � 1� yn,

32

e como Fqn : R ý é contínua, então temos;

FqnpJpn, jnqq � Jpn, jn�1q para jn � 1, 2, ..., kn � 1.e

Fqn�1pJpn, knqq � Jpn� 1, 1q,

onde,

Jpn, jnq �

�n�1

i�1

ki pi � jn pn,n�1

i�1

ki pi � jn pn � 1

�para 1 ¤ jn ¤ kn ; n P N.

Portanto, pela construção feita temos que:

F°n�1

i�1 kiqi�jnqnpr0, 1sq � Jpn, jnq

Daí segue que,

�F°n�1

i�1 kiqi�jnqn�1

pJpn, jnqq � r0, 1s

Afirmação 1. Seja

Ipn, jnq ��

F°n�1

i�1 kiqi�jnqn�1

pJpn, jnqq X r0, 1s.

Então Ipn, jnq; 1 ¤ jn ¤ kn é fechado em r0, 1s e, o conjunto tIpn, jnq : n PN , 1 ¤ jn ¤ knu tem a propriedade de interseção finita. De fato,

i. Como Jpn, jnq é fechado e F°n�1

i�1 kiqi�jnqn : R ý é contínua, então�F°n�1

i�1 kiqi�jnqn�1

pJpn, jnqq é fechado.

ii. Basta mostrar que, Ipn� 1, jn�1q � Ipn, jnq � � � �. De fato, seja z P Ipn�1, jn�1q. Então,

Fknqn�jn�1qn�1�

F°n�1

i�1 kiqi�jnqnpzq�

�F°n

i�1 kiqi�jn�1qn�1pzq P Jpn�1, jn�1q.

Desde que,

Fqn�1pJpn, knqq � Jpn� 1, 1qF2qn�1pJpn, knqq � Fqn�1pJpn� 1, 1qq � Jpn� 1, 2q���

Fjn�1qn�1pJpn, knqq � � � � � Jpn� 1, jn�1q.

Portanto, Jpn, knq ��Fjn�1qn�1

��1pJpn� 1, jn�1qq. Logo temos que,

Fknqn�

F°n�1

i�1 kiqi�jnqnpzqP Jpn, knq.

33

Então, F°n�1

i�1 kiqi�jnqnpzq P�

Fknqn�1

pJpjn, knqq � Jpn, jnq de onde segueque,

z P�

F°n�1

i�1 kiqi�jnqn�1

pJpn, jnqq � Ipn, jnq.

Assim temos una sequência de intervalos encaixados. Portanto,£nPN

£1¤jn¤kn

Ipn, jnq � ∅

O que prova a afirmação.

Agora vamos mostrar que; limmÑ�8 p1{mqpFmpxq � xq � α para algum x PX8n�1 X1¤jn¤kn Ipn, jnq. Um inteiro m satisfazendo,

n

i�1

kiqi ¤ m  n�1

i�1

kiqi

pode ser escrito de uma forma única como:

m �n

i�1

kiqi � jqn�1 � l,

com 0 ¤ j ¤ kn � 1, 0 ¤ l ¤ qn�1 � 1, e n Ñ �8 como m Ñ �8 nestarepresentação. Observe que se,

I. F°n

i�1 kiqi�jqn�1pxq P Jpn� 1, jq,

II. maxtmaxyPr0,1s |Fpyq| , 1u ¤ M,

então,

n

i�1

ki pi � jpn�1 � lM ¤ F°n

i�1 kiqi�jqn�1�lpxq ¤n

i�1

ki pi � jpn�1 � lM� 1. (2.5)

De fato, basta mostrar que:

Fl pJpn� 1, jqq �

�n

i�1

ki pi � jpn�1 � lM,n

i�1

ki pi � jpn�1 � lM� 1

�, (2.6)

onde Jpn� 1, jq ��°n

i�1 ki pi � jpn�1,°n

i�1 ki pi � jpn�1 � 1�.

Mostremos isso para l � 1. Seja z P Jpn� 1, jq então temos a seguinte formaz �

°ni�1 ki pi � jpn�1 � y, onde y P r0, 1s. Logo,

Fpzq �n

i�1

ki pi � jpn�1 � Fpyq ¥n

i�1

ki pi � jpn�1 � M ; @y P r0, 1s.

De forma similar se z �°n

i�1 ki pi � jpn�1 � 1� y temos,

Fpzq �n

i�1

ki pi � jpn�1 � 1� Fpyq ¤n

i�1

ki pi � jpn�1 � 1� M ; @y P r0, 1s

34

procedendo indutivamente obtemos (2.6).Por outro lado, como l P r0, qn�1 � 1s e j P r0, kn�1 � 1s , temos

que qn�1 ¥ l � p1{Mq, o que implica que qn�1M ¥ lM � x, pois x P r0, 1s.Dai segue que �qn�1M ¤ �lM� x. Logo somando

°ni�1 ki pi � jpn�1 a ambos

lados, temos uma desigualdade para o lado esquerdo de (2.5). Logo é fácil verque,

n

i�1

ki pi � jpn�1 � qn�1M ¤n

i�1

ki pi � jpn�1 � lM� x.

De forma similar, para o lado direito de (2.5) obtemos,

n

i�1

ki pi � jpn�1 � lM� 1� x ¤n

i�1

ki pi � jpn�1 � qn�1M

Portanto,

n

i�1

ki pi � jpn�1 � qn�1M ¤ Fmpxq � x ¤n

i�1

ki pi � jpn�1 � qn�1M. (2.7)

Desde que l P r0, qn�1s e M ¥ 1, de (2.7) segue que;

Fmpxq � xm

¤

°ni�1 ki pi � jpn�1 � qn�1M

m

¤ max"°n

i�1 ki pi � jpn�1 � qn�1M°ni�1 kiqi � jqn�1

,°n

i�1 ki pi � jpn�1 � qn�1M°ni�1 kiqi � pj� 1qqn�1

*e

Fmpxq � xm

¥

°ni�1 ki pi � jpn�1 � qn�1M

m

¥ min"°n

i�1 ki pi � jpn�1 � qn�1M°ni�1 kiqi � jqn�1

,°n

i�1 ki pi � jpn�1 � qn�1M°ni�1 kiqi � pj� 1qqn�1

*

Agora mostremos que os quatro termos convergem para α quando n Ñ �8.

Afirmação 2: Como pnqnÑ α, então

°n�1i�1 ki pi°n�1

i�1 kiqiÑ α, jpn�1

jqn�1Ñ α e kn pn�qn�1 M

knqnÑ

α. De fato,

i. Como pnqn¤

pn�1qn�1

então temos que,

p1

q2¤

p1 � p2

q1 � q2¤

p2

q2.

epmqm

� mint piqi

; i ¤ n� 1upMqM

� supt piqi

; i ¤ n� 1u.

Então, temos que;pn

qn¤

°n�1i�1 ki pi°n�1i�1 kiqi

¤pn�1

qn�1.

35

Logo, se n Ñ �8 então; °n�1i�1 ki pi°n�1i�1 kiqi

Ñ α,

pois pmqmÑ α e pM

qMÑ α.

ii. Temos que,

0 ¤ qnqn�1M ðñ knqn pn ¤ kn pnqn � qnqn�1Mðñ

pnqn

¤kn pn�qn�1 M

knqn

e pela condição (5) nós conseguimos,

pn

qn¤

kn pn � qn�1Mknqn

¤pn � 1

qn�

pn

qn�

1qn

.

Logo, tomando o limite quando n Ñ �8 obtemos;

kn pn � qn�1Mknqn

Ñ α.

iii. Que jpn�1jqn�1

Ñ α quando n Ñ �8, é evidente desde que pnqn

Ñ α. O queprova a afirmação 2.

Portanto temos,°ni�1 ki pi � jpn�1 � qn�1M°n

i�1 kiqi � jqn�1�

°n�1i�1 ki pi � jpn�1 � pkn pn � qn�1Mq°n�1

i�1 kiqi � jqn�1 � knqn.

Por um argumento semelhante ao feito para a afirmação 2 temos que;°n�1i�1 ki pi°n�1i�1 kiqi

¤pMqM

¤jpn�1

jqn�1.

Então, quando n Ñ �8, °n�1i�1 ki pi � jpn�1°n�1i�1 kiqi � jqn�1

Ñ α

Por outro lado, como°n�1

i�1 ki pi�jpn�1°n�1

i�1 kiqi�jqn�1¤

kn pn�qn�1 Mknqn

, temos

°n�1i�1 ki pi � jpn�1°n�1i�1 kiqi � jqn�1

¤

°n�1i�1 ki pi � jpn�1 � pkn pn � qn�1Mq°n�1

i�1 kiqi � jqn�1 � knqn¤

kn pn � qn�1Mknqn

Assim, quando n Ñ �8,°n�1

i�1 ki pi�jpn�1�pkn pn�qn�1 Mq°n�1

i�1 kiqi�jqn�1�knqnÑ α. Um argumento

similar mostra que os outros três termos convergem a α quando n Ñ �8, epor consequência,

limm�8

1mpFmpxq � xq � α.

36

Capítulo 3

CONJUNTOS DE ROTAÇÃOPONTUAL DEENDOMORFISMOS DOCÍRCULO

No Capítulo 2 definimos o número de rotação de um ponto como o limite su-perior dos deslocamentos médios, e o conjunto de rotação do endomorfismocomo o (fecho do) conjunto dos números de rotação dos pontos do círculo.

Neste capítulo introduziremos o conceito de conjunto de rotação de um pontopara um endomorfismo do círculo.

3.1 Conjunto de rotação de um ponto

Nesta seção introduzimos a noção de conjunto de rotação de um ponto para umendomorfismo do círculo.

Definição 10. Seja f P EndpTq e F : R ý um levantamento. Dado x P R,definimos o conjunto de rotação de x por

ρpF, xq :�

#ρ P R : Dnj Ò �8,

Fnjpxq � xnj

Ñ ρ, quando nj Ñ �8

+.

Em forma análoga ao feito anteriormente, dado z P T podemos definir oseu conjunto de rotação por ρp f , zq :� ΠpρpF, xqq, onde x é um ponto qualquer deΠ�1pzq.

Observação 3.1.1.

i. Note que na Definição (8) definimos o conjunto de rotação do (levanta-mento do) endomorfismo. Na Definição (10) temos definido o conjunto derotação de cada ponto.

37

ii. Observe que temos,

ρpF, xq � ρpFq � tρ�pF, yq : y P Ru, @x P R.

De fato, seja α P ρp f , zq um ponto arbitrário. Então existe uma subsequên-cia p Fnk pxq�x

nkqnk � ank tal que ankÝÝÝÝÑkÑ�8

α. Assim α P ρpFq.

A continuação introduzimos a noção de variedade local positiva instável deum ponto fixo. Para isso, seja f P EndpTq e F : R ý um levantamento de f .Seja x0 P R um ponto fixo de F e notemos z0 :� Πpx0q. Considere o seguinteconjunto:

A � � tz P T : Fpxq ¡ x, x P Π�1pzqu

Definição 11 (Variedade local positiva instável). Suponha que existe una com-ponente conexa U de A � � T e tal que o seu fecho U é igual ao intervalorz0, zs. Então definimos a variedade local positiva instável do ponto fixo z0 como

Wu�loc pz0q � U Y tz0u.

Em caso contrário, isto é que uma tal componente conexa não exista, defi-nimos simplesmente Wu�

loc pz0q � tz0u.

Definição 12 (Variedade instável positiva). Sejam f , F, z0 e x0 como acima.Então definimos a variedade instável positiva de z0 por

Wu�pz0q �¤iPN

f ipWu�loc pz0qq.

Observação 3.1.2.

i. Note que quando f expande e inverte orientação perto de z0 tem-se Wu�loc pz0q �

tz0u.

ii. Observe que as definições (9) e (12) são equivalentes quando a Wu�loc pz0q

não se reduz a um ponto.

Definição 13. Se f , F, z0 e x0 como acima, definimos Wu�loc px0q como o levanta-

mento da variedade local positiva instável Wu�loc pz0q que contem x0. i.e.

Wu�loc px0q � cc

�Π�1pWu�

loc pz0qq, x0�,

onde ccp�q denota componente conexa que contem esse ponto.

Suponha agora que z0 P T é tal que f qpz0q � z0, para algum q P N. Seja Fq PEndpRq o único levantamento de f q tal que Fqpxq � x, para todo x P Π�1pz0q.Consideramos o seguinte conjunto:

A �q � tz P T : Fqpxq ¡ x, x P Π�1pzqu.

Podemos então definir a variedade local positiva instável e variedade instávelpositiva para um ponto periódico de forma completamente análoga ao feitoacima.

Introduzimos agora a noção de domínio fundamental de uma variedade instável:

38

Definição 14 (Domínio fundamental em Wu�loc pz0q). Escolha uma sequência de

pontos pdiqiPN contida no conjunto Wu�loc pz0q tal que f pdi�1q � f pdiq, para

cada i P N. Um domínio fundamental é um intervalo Di � rdi, di�1s tal quef prz0, disq � Wu�

loc pz0q.

Observação 3.1.3.

i. Na Definição (11) temos que pdiq Ñ z0. De fato, seja z P Wu�loc pz0q então

d0 � zd1 � minaP f�1pd0q

!aXWu�

loc pz0q)

d2 � minaP f�1pd1q

!aXWu�

loc pz0q)

d3 � minaP f�1pd2q

!aXWu�

loc pz0q)

���

Desta forma, pela própria construção, ela converge a z0.

ii. Dado que f não é injetivo, então pode existir um z P Di�1 tal que f pzq R Di.

Se Wu�pz0q � T e se D � Wu�pz0q é um domínio fundamental, pode nãoseguir que, para alguns j, f jpDq � T. No entanto, vamos provar:

Proposição 3.1.4. Seja f P EndpTq e F : R ý um levantamento de f . Seja p{q PIntpρpFqq um ponto racional escrito em forma irredutível. Então existe z P Perp f q talque ρpF, xq � p{q para cada x P Π�1pzq, de período q e um domínio fundamentalD � Wu�pzq tal que f jpDq � T para algum j P N.

Demonstração. É suficiente provar para o caso p � 0 e q � 1. Defina

C � tz P T : f pzq � z e ρpF, xq � 0, @x P Π�1pzqu.

Afirmamos que existe z P C e x P Π�1pzq tais que,

Fi0pWu�loc pxqq � rx, x� 2s, (3.1)

para algum i0 ¥ 1. Suponhamos que a afirmação não é verdadeira. Neste casomostraremos que essa suposição implica que ρ�pF, wq ¤ 0 para todo w P R, oque é uma contradição. De fato, seja y P Wu�

loc pxq. Dado que Πpxq P C, temosque,

y ¥ x e Fnpyq   x� 2 ¤ y� 2.

Logo Fnpyq   y� 2, @n ¥ 1. Portanto,

ρ�pF, yq � lim supnÑ�8

Fnpyq � yn

¤ 0,

onde Πpyq P Wu�loc pzq e z P C.

Observe que Πpyq P Wu�loc pzq, com z P C, se e somente se Fpyq ¡ y para

cada y P Wu�loc pxq, onde Πpxq � z. Resta considerar o caso em que y é tal que

Fpyq   y. Neste caso há duas possibilidades:

39

i. Fnpyq   y, @n ¥ 0 ou,

ii. Dno P N tal que f n0pΠpyqq P Wu�loc pzq, para algum z P C.

De fato, suponha que para todo n P N e para todo z P C temos quef npΠpyqq P Wu�

loc pzq. Então ΠpFnpyqq P Wu�loc pzq, para todo n P N e para todo

z P C, o que implica que FpFnpyqq � Fn�1pyq ¡ y para todo n P N, o que éclaramente um absurdo.

Portanto se pi.q é satisfeito, então temos que

Fnpyq � yn

  0 @n ¥ 1.

Portanto, ρ�pF, yq ¤ 0. De forma semelhante, se pii.q é satisfeito, então temosque ρ�pF, yq ¤ 0.

Provamos que ρ�pF, yq ¤ 0 para todo y P R. Então ρpFq � p�8, 0s, o queimplica que 0 R IntpρpFqq e chegamos numa contradição.

Agora, se x0 P Π�1pz0q e i0 ¥ 1 é como na afirmação de acima, então pode-mos escolher y0 P Wu�

loc px0q tal que Fi0py0q � x0 � 2 e definir,

y1 � supx0¤y¤y0

ty : Fi0pyq � x0 � 1u.

Logo temos que Fi0pyq ¡ x0 � 1 para todo y P py1, y0s, pois se não existir y Ppy1, y0s tal que Fi0pyq ¤ x0 � 1, teremos os seguintes dois casos possíveis:

i. Fi0pyq � x0 � 1, e como y ¡ y1, então y1 não seria supremo, o qual éabsurdo.

ii. Fi0pyq   x0 � 1, podemos definir a função contínua g : ry, y0s Ñ R comosendo gpy1q � Fi0py1q � px0 � 1q. Como gpyq   0 e gpy0q � 1 ¡ 0, peloteorema do valor intermediário existe y2 P ry, y0s tal que gpy2q � 0 (i.e.existe y2 ¡ y1 tal que Fi0py2q � x0 � 1 ), o qual é um absurdo.

Assim se W é alguma vizinhança de w � Πpy1q, então teremos que f i0pWqcobre uma vizinhança de z0, pois basta observar que f i0pΠpy1qq � z0. Por-tanto, é possível escolher pdiqiPN � Wu�

loc pz0q com f pdi�1q � di e w P rd2, d1s.Claramente se i for suficientemente grande, Di � rdi�1, dis será um domíniofundamental.

3.2 Itinerários, tempos de acompanhamento e salto

Nesta seção introduzimos a noção de itinerário de um ponto periódico z P T

com respeito de uma sequência dada. Para isso, aplicaremos a Proposição 3.1.4para uma sequência de números racionais.Seja f P EndpTq, F : R ý um levan-tamento de f tal que ρpFq � ra, bs, com a   b.

Consideremos uma sequência pρi � pi{qiqiPN � Intpρp f qq de números raci-onais. Então, para cada i P N, existe zi P T ponto periódico com número derotação pi{qi e período qi tal que Wu�pziq � T. Seja Di um domínio fundamen-tal para Wu�pziq tal que f jipDiq � T para alguns ji P N.

40

Definição 15. Considere uma sequência pnqν � pn1, n2, ...q de inteiros positivos,finita ou infinita, tal que ni � riqi, com ri P N, para cada i. Definimos parai P r1, ν� 1q o tempo de acompanhamento como

Ni � n1 � ji � ...� ni�1 � ji�1 � ni

e o tempo de salto como sendo Ji � Ni � ji, onde J0 � 0.

Definição 16 (Itinerário). Continuando com a notação de cima, dizemos queum ponto z � Πpyq P Wu�

loc pz1q tem itinerário pnqν com respeito a pzi, jiq, se paracada i P r1, ν� 1q existe xi P Π�1pziq tal que:

a. F Ji�1�kqipyq � kpi P Wu�loc pxiq para k P r0, ris.

b. f Nipzq P Di.

Observação 3.2.1. i. A definição anterior não depende da escolha do levanta-mento y de z. De fato, seja y1 � y� α com α P Z, um outro levantado dez. Então Πpy1q P Wu�

loc pz1q tem itinerário pnqν com respeito a pzi, jiq se paracada i P r1, ν� 1q existe xi P Π�1pziq tal que:

a. F Ji�1�kqipy1q � kpi P Wu�loc pxiq � Π�1pWu�

loc pziqq

ô ΠpF Ji�1�kqipy1q � kpiq P Wu�loc pziq

ô FppF Ji�1�kqipyqq � α� kpi ¡ pF Ji�1�kqipyqq � α� kpiô pF Ji�1�kqipyqq � kpi P Wu�

loc pxiq

b. f NipΠpy1qq � f NipΠpy� αqq � ΠpFNipyq � αq ñ ΠpFNipyqq P Di.

ii. Se z satisfaz o itinerário pnqν, então a órbita de z é sucessivamente ni iteradaperto da órbita de zi.

Lema 3.2.2. Dada alguma sequência pnqν como acima, existe z P Wu�loc pz1q com itine-

rário pnqν.

Demonstração. Para cada 1 ¤ i ¤ ν definimos.

Ai �

"z P Wu�

loc pziq : f nipzq P Di e Dy P Π�1pzq, xi P Π�1pziq

tal que F Ji�1�kqipyq � kpi P Wu�loc pxiq para k P r0, ris

*.

Observemos que f nipAiq � Di, pois se w P f nipAiq então w � f nipaiq paraalgum ai P Ai, o que implica que ai P Wu�

loc pziq, para algum i P N. Assimf nipaiq P Di. Logo, Ai é fechado, e além disso, Ai � ∅ pois Wu�

loc pziq � ∅.

Seja Li � f�jipAi�1q X Di. Afirmamos que Li é compacto e não vazio. De fato,como f jipDiq � T e Ai�1 é fechado, segue que f�jipAi�1q é também fechadopois f ji é contínua. Por outro lado, como Di é compacto, segue então que Litambém é compacto. Agora, considerando um z P f�jipAi�1q, teríamos quef jipzq P Ai�1 pelo qual f jipzq P Wu�

loc pzi�1q � T, e como Di � f�jipTq, entãoz P Di e assim Li � ∅. Então definimos:

K1 � A1 e se i ¡ 1.

Ki � tz P A1 : f Nmpzq P Lm para 1 ¤ m   iu.

41

É fácil ver que Ki é compacto não vazio. Afirmamos que pKiqi¥1 é uma sequên-cia de intervalos encaixados. De fato, seja z P Ki�1 então z P A1 e f Nmpzq P Lmpara 1 ¤ m ¤ i � 1, logo f Nmpzq P Lm para 1 ¤ m ¤ i   i � 1, em particularpara 1 ¤ m   i temos que f Nmpzq P Lm e z P A1, então z P Ki.

Assim�8

i�1 Ki � ∅. Observe que se z P Ki, então pela construção de Ki,z têm itinerário pnqi � pn1, n2, ..., niq. Assim cada z P

�8i�1 Ki tem o itinerário

desejado.

Os seguintes resultados são de muita importância para nossos propósitos,eles dão estimativas para a sequência pFnpxq � xq{n para x P R.

Lema 3.2.3. Dado ε ¡ 0 e q P N, existe n0 ¥ 1 tal que para todo y P R e todo n ¥ n0∣∣∣∣∣ Fn�kpyq � yn� k

�Fnpyq � y

n

∣∣∣∣∣   ε para 0 ¤ k ¤ q.

Demonstração. Como ∆Fpxq :� Fpxq � x é Z-periódica então,

maxxPR

t∆Fpxqu � maxxPr0,1s

t∆Fpxqu � L   8

Logo,

∣∣∣Fkpyq � y∣∣∣ ¤

∣∣∣∣∣ k

i�1

pFipyq � Fi�1pyqq

∣∣∣∣∣¤

k

i�1

∣∣∣FpFi�1pyqq � Fi�1pyq∣∣∣

¤ kL

Podemos definir R � kL� 1 e S � L� 1, desta forma,∣∣∣Fkpyq � y

∣∣∣   R se

0 ¤ k ¤ q e∣∣∣ Fnpyq�y

n

∣∣∣   S para todo n P N. Logo temos

∣∣∣ Fn�kpyq�yn�k �

Fnpyq�yn

∣∣∣ �∣∣∣ npFn�kpyq�yq�pn�kqpFnpyq�yq

pn�kqn

∣∣∣� 1

npn�kq

∣∣∣npFkpFnpyqq � Fnpyqq � kpFnpyq � yq∣∣∣

¤ 1npn�kqt

∣∣∣npFkpFnpyqq � Fnpyqq∣∣∣� |kpFnpyq � yq|u

¤ 1npn�kq pnR� kSq � R�kS

n�k

Logo, é suficiente tomar n0 P N tal que R�kSn�k   ε, para todo n ¥ n0 e

0 ¤ k ¤ q.

Lema 3.2.4. Dado z P T ponto periódico com número de rotação p{q, m P N e ε ¡ 0,existe n0 ¥ 1 tal que @y P R e x P Π�1pzq. Se n ¥ n0 e∣∣pFn�mpyq � Fmpyqq � pFnpxq � xq

∣∣ ¤ 2,

então, ∣∣∣∣ Fn�mpyq � yn�m

�pq

∣∣∣∣   ε.

42

Demonstração. Pelo Lema 3.2.3, existe R ¡ 0 tal que |Fmpyq � y|   R,@y P R.Podemos escolher n0 ¥ 1 tal que, se 2�R

n0  ε

2 , então∣∣∣∣ Fnpxq � xm� n

�pq

∣∣∣∣   ε

2, (3.2)

para n ¥ n0. De fato, raciocinando por indução vemos que se m � 0 e z � Πpxqé ponto periódico, então segue que (3.2) é satisfeita. Agora suponha que istoseja válido para m � k. Então,∣∣∣∣ Fnpxq � x

n� k� 1�

pq

∣∣∣∣ ¡ ∣∣∣∣ Fnpxq � xk� n

�pq

∣∣∣∣ ,

o que implica que 1{pk � n � 1q ¡ 1{pk � nq e chegamos num absurdo. Logo(3.2) vale para m � k� 1 e assim para todo m P N a equação (3.2) é satisfeita.Além disso, n0 não depende dos levantamento x de z, pois se x1 � x� k, comok P Z for um outro levantamento de z, então teríamos∣∣∣ Fnpx1q�x1

m�n �pq

∣∣∣ �∣∣∣ Fnpx�kq�x�k

m�n �pq

∣∣∣�

∣∣∣ Fnpxq�xm�n �

pq

∣∣∣   ε2 ,

para n ¥ n0. Logo, se n ¥ n0 então temos∣∣∣ Fn�mpyq�yn�m �

pq

∣∣∣ �∣∣∣ Fn�mpyq�Fmpyq�pFnpxq�xq�Fmpyq�y�Fnpxq�x

m�n �pq

∣∣∣¤

∣∣∣ Fn�mpyq�Fmpyq�pFnpxq�xqm�n

∣∣∣� ∣∣∣ Fmpyq�ym�n

∣∣∣� ∣∣∣ Fnpxq�xm�n �

pq

∣∣∣¤ 2

m�n �R

m�n �ε2 �

2�Rn�m � ε

2   ε.

3.3 Teorema Principal

O teorema que enunciaremos e provaremos a continuação é a motivação prin-cipal deste trabalho. Este teorema dá uma descrição completa de todos os con-juntos de rotação pontuais ρp f , zq em função do intervalo de rotação ρp f q.

Teorema 3.3.1. Seja f P EndpTq e F : R ý um levantamento de f . Então temos:

a. ρpF, xq é um subintervalo fechado de ρpFq para todo x P R.

b. Dado rα, βs � ρpFq, α ¤ β então existe x P R tal que ρpF, xq � rα, βs.

Vamos então iniciar a demostração do Teorema 3.3.1. Isto será feito atravésde uma sequência de lemas.

Lema 3.3.2. Seja paiqiPN uma sequência de números reais limitada. Então o conjuntode pontos limite de a sequência p 1

n°n

i�1 aiqn¥1 é um intervalo fechado.

Demonstração. De fato, como o limite superior e inferior sempre existem, deno-temos por

α � lim supnÑ�8

1n

n

i�1

ai

β � lim infnÑ�8

1n

n

i�1

ai.

43

Logo, claramente o conjunto de pontos limite está contido no intervalorα, βs. Mais ainda, pela Observação 3.3.3, ele contem a α e β. Então temosprovado uma inclusão. Agora sem perdida de generalidade podemos escolherduas subsequências,

α � limjÑ�8

1nj

n j

i�1

ai e β � limjÑ�8

1nj�1

nj�1

i�1

ai.

Seja a P rα, βs e escolhemos naj tal que nj ¤ na

j ¤ nj�1. Afirmamos que a

sequência p 1na

j

°naj

i�1 aiq converge para a quando j Ñ �8. Para isso definimos

m1 � mintnaj P N : 1

naj

°naj

i�1 ai ¡ au

m2 � mintnaj ¡ m1 : 1

naj

°naj

i�1 ai   au

m3 � mintnaj ¡ m2 : 1

naj

°naj

i�1 ai ¡ au

���

Logo, basta provar que pmiqi¥1 é uma sequência de Cauchy. De fato, comopaiqiN é limitada, existe C ¡ 0 tal que |an| ¤ C,@n P N. Por outro lado temos∣∣∣ 1

mj�1

°mj�1i�1 ai �

1mj

°mji�1 ai

∣∣∣ �∣∣∣p 1

mj� 1

mj�1q°mj

i�1 ai �1

mj�1amj�1

∣∣∣¤

∣∣∣ 1mj� 1

mj�1

∣∣∣ ∣∣∣°mji�1 ai

∣∣∣� ∣∣∣ 1mj�1

amj�1

∣∣∣¤

∣∣∣ 1mjmj�1

∣∣∣ p|a1|� |a2|� ...�∣∣∣amj

∣∣∣q � ∣∣∣ 1mj�1

amj�1

∣∣∣¤ 1

mjmj�1mjC� 1

mj�1

∣∣∣amj�1

∣∣∣¤ C

mj�1� C

mj�1� 2C

mj�1Ñ 0 quando j Ñ �8.

Portanto temos que limj�81

naj

°naj

i�1 ai � a como nós queríamos.

Observação 3.3.3. SepanqnPN é uma sequência de números reais e α � lim supnÑ8panq,então existe uma subsequencia pankqk¥1 de panq tal que limkÑ8pankq � α.

Demostração do Teorema 3.3.1. A prova do teorema será feita em duas partes.

a. Desde queFnpxq � x

n�

°ni�1 Fipxq � Fi�1pxq

n,

denotemos por,

paiqiPN :� pFipxq � Fi�1pxqqiPN � p∆FpFi�1pxqqiPN

Provemos que ai é uniformemente acotada. De fato, como ∆Fpxq :� Fpxq� xé Z-periódica, segue que a imagem é compacta. Assim existe C ¡ 0 tal que

|∆Fpxq| ¤ C, @x P R

44

logo como Fi�1pxq P R temos que∣∣∣∆FpFi�1pxqq∣∣∣ ¤ C, @x P R.

Pelo tanto, por o lema 3.3.2 aplicado a ai temos que o conjunto de pontoslimite de p1{nq

°ni�1 ∆FpFi�1pxqq quando n Ñ �8, é um intervalo fechado.

Assim ρpF, xq é um intervalo fechado.

b. Se ρp f q � tpu então o resultado é trivial.Se ρp f q é um intervalo com comprimento positivo, então seja rα, βs � ρp f qum subintervalo, escolha uma sequência pρi � pi{qiqiPN tal que α   ρi   βcom limiÑ�8 ρ2i�1 � α, limiÑ�8 ρ2i � β. Pela proposição 3.1.4 para cadai ¥ 1 existem:

i. zi pontos periódicos de f com numero de rotação ρi e período qi.

ii. Di domínio fundamental para Wu�pziq tal que f jipDiq � T para ji P N.

Lema 3.3.4. Seja rα, βs � ρpFq um subintervalo. Escolhamos uma sequência pρi �pi{qiqiPN tal que α   ρi   β. Seja pεiqiPN sequência de números reais tal queα   ρi � εi e ρi � εi   β. Então para cada i ¥ 1 existe ki ¥ 1 tal que∣∣∣∣∣ Fkpyq � y

k� ρi

∣∣∣∣∣   εi

sempre que k ¥ ki ; y e Fk1qipyq � k1pi P Wu�loc pxiq para algum xi P Π�1pziq onde

k � k1qi � r com 0 ¤ r   qi.

Demonstração do lema 3.3.4. Observemos que zi P T é ponto periódico comnúmero de rotação ρi e xi P Π�1pziq então

Fk1qipxiq � xi � k1pi

para k1 P N, logo temos que∣∣∣pFk1qipyq � yq � pFk1qipxiq � xiq∣∣∣ �

∣∣∣Fk1qipyq � y� k1pi

∣∣∣¤ 2

.(3.3)

Pois y e Fk1qipyq � k1pi pertencem a Wu�loc pxiq. Assim pelo lemma 3.2.4 como

m � 0 e n � k1qi temos que, dado εi{2 ¡ 0 existe k1i ¥ 1 tal que y P R exi P Π�1pziq, se k1qi ¥ k1i e (3.3) vale, então∣∣∣∣∣ Fk1qipyq � y

k1qi� ρi

∣∣∣∣∣   εi2

(3.4)

Por outro lado, pelo lema 3.2.3 com n � k1qi e q � qi temos que dado εi{2existe k2i ¥ 1 tal que para y P R e para k1qi ¥ k2i temos∣∣∣∣∣ Fk1qi�kpyq � y

k1qi � k�

Fk1qipyq � yk1qi

∣∣∣∣∣   εi2

(3.5)

45

onde 0 ¤ k ¤ qi. Por tanto podemos escolher ki � maxtk1i, k2i u e por asequações (3.4) e (3.5) temos que:

∣∣∣∣∣ Fk1qi�rpyq � yk1qi � r

� ρi

∣∣∣∣∣ �

∣∣∣∣∣ Fk1qi�rpyq � yk1qi � r

�Fk1qipyq � y

k1qi�

Fk1qipyq � yk1qi

� ρi

∣∣∣∣∣¤

∣∣∣∣∣ Fk1qi�rpyq � yk1qi � r

�Fk1qipyq � y

k1qi

∣∣∣∣∣�∣∣∣∣∣ Fk1qipyq � y

k1qi� ρi

∣∣∣∣∣¤ εi

Agora por indução vamos construir um itinerário pnq8 tal que um pontoz P T com este itinerário respeito a pzi, jiq satisfaz ρp f , zq � rα, βs.

Lema 3.3.5. Existe uma sequência pnq8 � pn1, n2, ...q tal que se z � Πpyq temitinerário pnq8 com respeito a pzi, jiq. Então para i ¥ 1 se cumpre:∣∣∣∣∣ FNi�kpyq � y

Ni � k� ρi

∣∣∣∣∣   εi (3.6)

para 0 ¤ k ¤ ki � ji�1 onde j0 � 0.

Demonstração do lema 3.3.5. A prova será feita por indução, como z1 P T éponto periódico com número de rotação p1{q1 então existe r1 P Z tal quen1 � r1q1 e

Fr1q1px1q � x1 � p1r1

onde x1 P Π�1pz1q. Logo dado z � Πpyq precisamos que:

|pFn1pyq � yq � pFn1px1q � x1q| ¤ 2,

então basta escolher z � Πpyq P Wu�loc pz1q e Fk1q1pyq � k1 p1 P Wu�

loc px1q parak1 P r0, r1s, assim por o lema 3.2.4 como m � 0 temos,∣∣∣∣ Fn1pyq � y

n1�

p1

q1

∣∣∣∣   ε1

2(3.7)

Por outro lado, pelo lema 3.2.3 com q � k1. Dado ε1{2 ¡ 0 como no lema3.3.4, temos ∣∣∣∣∣ Fn1�kpyq � y

n1 � k�

Fn1pyq � yn1

∣∣∣∣∣   ε1

2(3.8)

onde 0 ¤ k ¤ k1.

Daí que, de (3.7) e (3.8) segue que,

46

∣∣∣∣∣ Fn1�kpyq � yn1 � k

�p1

q1

∣∣∣∣∣ �

∣∣∣∣∣ Fn1�kpyq � yn1 � k

�Fn1pyq � y

n1�

Fn1pyq � yn1

�p1

q1

∣∣∣∣∣¤

∣∣∣∣∣ Fn1�kpyq � yn1 � k

�Fn1pyq � y

n1

∣∣∣∣∣�∣∣∣∣ Fn1pyq � y

n1�

p1

q1

∣∣∣∣  ε1

Concluímos que para z � Πpyq P Wu�loc px1q temos que existe x1 P Π�1pz1q

tal que;

Fk1q1pyq � k1 p1 P Wu�loc px1q

para 0 ¤ k ¤ r1 ef n1pzq P D1.

Portanto a equação (3.6) é satisfeita com i � 1 para todo y P R tal quez � Πpyq tem itinerário pn1q � pnq1.

Suponhamos que temos pniq � pn1, n2, ..., niq; i ¥ 1, tal que todo z � Πpyqcom itinerário pnqi satisfaz a condição (3.6) para 1 ¤ l ¤ i.

Mostraremos agora que isso é verdade para i � 1. Como antes, dado quezi�1 P T é periódico com número de rotação pi�1{qi�1 temos que existeri�1 P Z tal que ni�1 � ri�1qi�1 e

Fri�1qi�1pxi�1q � xi�1 � ri�1 pi�1

onde xi�1 P Π�1pzi�1q e se,∣∣∣pFni�1�Jipyq � F Jipyq � pFni�1pxi�1q � xi�1q∣∣∣ ¤ 2 (3.9)

Então pelo lema 3.2.4 com n � ni�1, m � Ji e dado εi�1{2 ¡ 0 (como nolema 3.3.4) temos; ∣∣∣∣ Fni�1�Jipyq � y

ni�1 � Ji�

pi�1

qi�1

∣∣∣∣   εi�1

2(3.10)

Por outro lado, pelo lema 3.2.3 com n � ni�1 � Ji; q � ki�1 � ji, dadoεi�1{2 ¡ 0 como no lema anterior, obtemos;∣∣∣∣∣ Fni�1�Ji�kpyq � y

ni�1 � Ji � k�

Fni�1�Jipyq � yni�1 � Ji

∣∣∣∣∣   εi�1

2(3.11)

onde 0 ¤ k ¤ ki�1 � ji. Denotemos por,

B �

∣∣∣∣∣ Fni�1�Ji�kpyq � yni�1 � Ji � k

� ρi�1

∣∣∣∣∣

47

Logo de (3.10) e (3.11) segue que

B �

∣∣∣∣∣ Fni�1�Ji�kpyq � yni�1 � Ji � k

�Fni�1�Jipyq � y

ni�1 � Ji�

Fni�1�Jipyq � yni�1 � Ji

� ρi�1

∣∣∣∣∣¤

∣∣∣∣∣ Fni�1�Ji�kpyq � yni�1 � Ji � k

�Fni�1�Jipyq � y

ni�1 � Ji

∣∣∣∣∣�∣∣∣∣ Fni�1�Jipyq � y

ni�1 � Ji� ρi�1

∣∣∣∣ 

εi�1

2�

εi�1

2� εi�1

Observe que de (3.9) segue que F Ji�kqi�1pyq � kpi�1 P Wu�loc pxi�1q para k P

r0, ri�1s; por outro lado pela hipótese de indução temos que f Nipzq P Di ecomo f Ni�ji�ni�1pzq � f ji�ni�1p f Nipzqq então, desde que f jipDiq � T temosque f Ni�1pzq P Di�1. Logo como Ni�1 � ni�1 � Ji, é claro que se z � Πpyqtem itinerário pnqi�1 � pn1, ..., ni�1q então y satisfaz (3.6) para 1 ¤ l ¤ i� 1.

Assim se z � Πpyq tem itinerário pnq8 com respeito de pzi, jiq, então y satis-faz a condição (3.6) para todo i ¥ 1. Também temos,

limk�8

FN2k�1pyq � yN2k�1

� α e limkÑ�8

FN2kpyq � yN2k

� β

Finalmente, provemos que ρp f , zq � rα, βs. É suficiente provar que:

α ¤Fnpyq � y

n¤ β, @n ¥ n1

De fato; seja n ¡ n1, como Ni Ñ �8 quando i Ñ �8 e Ni�1 ¡ Ni entãoexiste i ¥ 1 e 0 ¤ k   ni � ji�1 tal que n � Ni�1 � k, pois é suficiente pegarNi�1   n   Ni; por outro lado como Ni�1   Ni então 0   ji�1 � ni e assimbasta escolher k ¤ ji�1 � ki com o que obtemos n � Ni�1 � k.

Se ki � ji�1   k   ni � ji�1 nós temos,

FNi�1�kpyq � yNi�1 � k

�FNi�1�ji�1pyq � y

Ni�1 � ji�1

� p1� tq

�Fk�ji�1pFNi�1�ji�1pyqq � FNi�i�ji�1pyq

k� ji�1

�� t

Uma combinação convexa de dois números, onde t � k�ji�1Ni�1�k P r0, 1s.

Claramente como ki�1 P N é suficientemente grande então pelo lema 3.3.5,com 0 ¤ k � ji�1 ¤ ki�1 � ji�2 em (3.6) temos;∣∣∣∣ FNi�1�ji�1pyq � y

Ni�1 � ji�1� ρi�1

∣∣∣∣   εi�1 (3.12)

Além disso observe que se k � ji�1 então t � 0. De (3.12) segue que,

48

∣∣∣∣ FNi�1�ji�1pyq � yNi�1 � ji�1

∣∣∣∣ ¤ εi�1 � |ρi�1|

logo temos dois casos;

(i)FNi�1�ji�1pyq � y

Ni�1 � ji�1  εi�1 � ρi�1 ¤ β

(ii)FNi�1�ji�1pyq � y

Ni�1 � ji�1¡ ρi�1 � εi�1 ¥ α

Portanto,FNi�1�ji�1pyq � y

Ni�1 � ji�1P rα, βs (3.13)

Por outro lado como ki   k� ji�1   ni então podemos aplicar o lemma 3.3.4e obtemos ∣∣∣∣∣ Fk�ji�1pFNi�1�ji�1pyqq � FNi�i�ji�1pyq

k� ji�1� ρi

∣∣∣∣∣   εi (3.14)

De forma similar a (3.12) obtemos para a desigualdade (3.14) o seguente:

Fk�ji�1pFNi�1�ji�1pyqq � FNi�1�ji�1pyqk� ji�1

P rα, βs (3.15)

Além disso observe que (3.15) também vale quando Ni�1� ji�1 � 0, e assimvale quando t � 1. Portanto de (3.13) e (3.15) segue que

FNi�1�kpyq � yNi�1 � k

P rα, βs

E assim se completa a prova.

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REFERÊNCIAS

[BMPF84] R. Bamon, I. P. Malta, M. J. Pacifico, and F.Taken, Rotation intervalsof endomorphisms of the circle, Ergodic theory and dynamical systems4 (1984), p. 493–498.

[BS02] M. Brin and G. Stuck, Introduction to dynamical systems, 2002.

[Ito81] R. Ito, Rotation sets are closed, Math. Proc. Camb. Phil. Soc. 89 (1981),p. 107–111.

[KH95] A. Katok and B. Hasselblat, Introduction to the modern theory of dyna-mical systems, vol. 54, 1995.

[NPT83] S. Newhouse, J. Palis, and F. Takens, Bifurcations and stability of fa-milies of diffeomorphisms, Publications mathématiques de l’I.H.É.S 57(1983), p. 5–71.

[Poi85] H. Poincaré, Sur les courbes définies par les équations différentielles (iii),Journal de mathématiques pures et appliquées 4ta série tomo 1(1885), p. 167–244.