Os jovens e a percepção da corrupção

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VI Congresso Latinoamericano da WAPOR Santiago, 18 a 20 de junho de 2014 Os jovens e a percepção da corrupção Resumo: Compreender o comportamento dos jovens em relação a política tem sido a inquietação de muitos pesquisadores. Também faz parte de diversas agendas de pesquisa, a busca por conceitos formas de mensuração da percepção da corrupção. Assim, nossa proposta é observar a percepção da corrupção pelos jovens brasileiros, a partir dos aspectos referentes à confiança nas instituições, interesse por política e as influências da mídia. Para tanto, serão utilizados os dados das pesquisas “Jovens Eleitores e Novas Tecnologias”, desenvolvida na Universidade Federal de Minas Gerais no grupo “Opinião Pública, Marketing Político e Comportamento Eleitoral” – coordenado pela professora Helcimara Telles – e da Pesquisa Nacional Sobre o Perfil e Opinião dos Jovens Brasileiros 2013, realizada pela Secretaria Nacional de Juventude do Governo Federal. Partimos das hipóteses de que os jovens têm uma visão negativa da política, são desinteressados e desconfiam dos atores e das instituições políticas. Palavras-chave: Juventude; Percepção da corrupção; Interesse por política; Participação política; Confiança nas instituições; Mídia.

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VI Congresso Latinoamericano da WAPOR Santiago, 18 a 20 de junho de 2014

Os jovens e a percepção da corrupção

Resumo: Compreender o comportamento dos jovens em relação a política tem sido a

inquietação de muitos pesquisadores. Também faz parte de diversas agendas de

pesquisa, a busca por conceitos formas de mensuração da percepção da corrupção.

Assim, nossa proposta é observar a percepção da corrupção pelos jovens brasileiros, a

partir dos aspectos referentes à confiança nas instituições, interesse por política e as

influências da mídia. Para tanto, serão utilizados os dados das pesquisas “Jovens

Eleitores e Novas Tecnologias”, desenvolvida na Universidade Federal de Minas Gerais

no grupo “Opinião Pública, Marketing Político e Comportamento Eleitoral” –

coordenado pela professora Helcimara Telles – e da Pesquisa Nacional Sobre o Perfil e

Opinião dos Jovens Brasileiros 2013, realizada pela Secretaria Nacional de Juventude

do Governo Federal. Partimos das hipóteses de que os jovens têm uma visão negativa da

política, são desinteressados e desconfiam dos atores e das instituições políticas.

Palavras-chave: Juventude; Percepção da corrupção; Interesse por política;

Participação política; Confiança nas instituições; Mídia.

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Introdução

Compreender o comportamento dos jovens na política tem sido a inquietação de muitos

pesquisadores. A juventude é uma categoria que vem sendo bastante explorada no

âmbito dos estudos e análises sobre comportamento, opinião publica e participação

política. Terá esta categoria características e percepções que são constitutivas de um

grupo sui generi que deve ser analisado como uma esfera a parte das demais ou são eles

(os jovens) o reflexo da opinião e assimilação política da população adulta?

Para fazer-se a análise proposta, é importante refletir a acerca da conceituação de

juventude. Utilizaremos uma abordagem sociológica com intuito de ampliar a

compreensão acerca da categoria analítica “juventude”. A concepção sociológica de

juventude é percebida enquanto uma noção social. Um momento de transição entre a

infância e a maturidade, em que o individuo é incorporado ao mundo das

responsabilidades, cristalização de valores e integração social, marcando sua fase

adulta.

Esta carga de vivência que marca e constitui suas crenças e valores lhes confere

particularidades. Tal constituição é reflexo das referencias que este consolida em suas

relações sociais. Assim, estar na categoria “juventude” confere aos seus integrantes

características próprias em relação a percepções, valores e opiniões. O jovem seria então

um protagonista social e político, marcando as diferenças geracionais e criando

condições de orientação dentro de seu contexto.

A centralidade da mídia nas sociedades contemporâneas, somada à profusa difusão de

tecnologias digitais de comunicação e informação são capazes de produzir um novo

espaço de interações, ações, reflexões e diálogo sobre os mais diversos temas. O debate

e a participação política também são fomentados, podendo produzir mecanismos de

crítica social, política entre outros.

Dentre as várias discussões que a política suscita, a corrupção aparece entre os jovens

como seu equivalente primário. O que demonstra uma visão pejorativa e negativa

podendo assim refletir em uma apatia e desinteresse político.

A partir dessas discussões, este artigo tem por objetivo investigar a percepção do jovens

em relação a corrupção, perpassando por questões como a confiança nas instituições

democráticas, interesse e participação política. Para tanto, serão utilizados dados

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secundários extraídos da pesquisa “Jovens Eleitores e Novas Tecnologias1”,

desenvolvida na Universidade Federal de Minas Gerais (grupo “Opinião Pública,

Marketing Político e Comportamento Eleitoral” – coordenado pela professora

Helcimara Telles), e da “Pesquisa Nacional Sobre o Perfil e Opinião dos Jovens

Brasileiros 20132”, realizada pela Secretaria Nacional de Juventude do Governo

Federal.

A partir da proposta lançamos algumas hipóteses de que os jovens são desinteressados

por política e percebem a corrupção sob a ótica midiática do escândalo político e que

essa percepção diminui a confiança nas instituições políticas. Compete esclarecer,

porém, que não objetivamos mensurar a percepção da corrupção, mas sim perceber sua

existência e a partir disso, as imagens às quais o tema é relacionado pelos jovens.

Juventude brasileira e a política

A caracterização da juventude implica em uma condição social e ao mesmo tempo em

uma representação (PERALVA, 1997). Segundo Dayrell (2003, p.42) a juventude

caracteriza-se:

Se há um caráter universal dado pelas transformações do individuo numa determinada faixa etária, nas quais completa o seu desenvolvimento físico e enfrenta mudanças psicológicas é muito variada a forma como cada sociedade, em tempo histórico determinado, e, no seu interior, cada grupo social vai lidar com esse momento e representá-lo. Essa diversidade se concretiza com base nas condições sociais (classes sociais), culturais (etnias, identidades religiosas, valore) e de gênero, e de também regiões, dentre outros aspectos.

A concepção sociológica de juventude é percebida enquanto uma noção social. Um

momento de transição entre a infância e a maturidade, em que o individuo é incorporado

ao mundo das responsabilidades, cristalização de valores e integração social, marcando

sua fase adulta.

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!1 Pesquisa realizada em Belo Horizonte (Minas Gerais), com 415 jovens do ensino médio das escolas da rede pública de ensino, entre 2010 e 2013. 2 Pesquisa Nacional – Amostra: 3.300 entrevistas, distribuídas em 187 municípios, estratificados por localização geográfica (capital e interior, áreas urbanas e rurais) e em tercis de porte (municípios pequenos, médios e grandes), contemplando as 27 Unidades da Federação.

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Quanto às referências sociais, é importante ressaltar que as vivências às quais os jovens

são expostos se referem também a construções que este faz entre seus iguais,

constituindo assim uma categoria própria com assimilação e construção de valores.

Para fins de análise política é necessário que se leve em conta a existência desse grupo

que ao longo das percepções sociais, e, por vezes acadêmicas, sugeriam classificações

tais como situa Abramo (1997), a juventude dos anos 1950 enquanto sinal de

transgressão e delinquência, os jovens das décadas de 1960 e 1970 com espírito de

inquietação, contestador e de agitação e politizados, que acreditavam na possibilidade

de novos mundos. Nas décadas de 1980 e 1990 os jovens apresentam características

conservadoras, individualistas e de apatia política, como aborda Abramo (1997).

Através do compilado dessas percepções e visões, a partir do ano 2000, criou-se uma

abordagem analítica da juventude enquanto corpo politicamente apático, desinteressado,

mas ao mesmo tempo constituindo um grupo com possível força motriz para realizar

revoluções, transformações e mudanças.

Valendo-se de tais fatores, a juventude é levada em consideração na construção da

opinião pública, na formação do voto, em processos decisórios, em políticas públicas

feitas especificamente para ela, construção de debates e agendas que a consideram

enquanto um extrato social relevante.

Um dos componentes que fortemente caracteriza a identidade deste segmento, diz

respeito à utilização das redes de informação e tecnologias digitais de comunicação e

informação. Esses elementos compõem uma nova teia de interação, entretenimento,

trocas simbólicas, construção de intersubjetividades, produção de novos axiomas,

ampliação da troca e construção de novos discursos, manifestação, canal de participação

política. Além disso, é importante ressaltar a condição de liberdade discursiva. Outra

característica identitária relevante é o forte hábito do acompanhamento das mídias

tradicionais (televisão, rádio, jornais impressos) e o forte impacto que estas têm na

concepção e criação de dimensões das esferas cotidianas públicas e privadas.

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Gráfico 1 - Meios em que os jovens se informam (%).

Fonte: Agenda Juventude Brasil, SNJ, 2013.

Analisando os meios pelos quais os jovens têm mais acesso e recorrem mais (Gráfico

1), foi possível afirmar a forte presença das mídias tradicionais que caracterizam ainda

hoje grande fonte de informação. A televisão aberta ainda é muito mais utilizada do que

as demais mídias.

Corrupção e percepção da corrupção

A corrupção atenta tanto contra a qualidade de vida dos cidadãos, como contra a

estabilidade do sistema político. Além disso, ela pode ser um entrave para diferentes

sistemas políticos na busca pela estabilidade e pela qualidade da democracia. De modo

mais abrangente, a corrupção diz respeito à apropriação indevida de bens ou ganhos e,

aqui, a compreendemos enquanto o uso inadequado da autoridade e do abuso ao poder

para benefício próprio em detrimento ao bem estar da maioria.

E sobre o conceito de corrupção, Filgueiras (2009, p.398) afirma que o fenômeno

precisa ser considerado a partir de aspectos morais e dos valores dos cidadãos e da

coletividade.

A corrupção, dessa forma, pode ser compreendida levando-se em consideração aspectos morais que estão pressupostos na prática social ordinária. É fundamental considerar os aspectos

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normativos envolvidos no tema da corrupção e o modo como a construção de sua significação social depende de valores que circulam no plano da sociedade.

Pode-se considerar a existência de duas vertentes de estudos sobre o tema da corrupção.

Na agenda denominada como “teoria da modernização”, que emergiu, nos EUA, no

contexto que sucede a Segunda Guerra Mundial, a proposta foi buscar no sistema

organizacional dos países industrializados as variáveis sociais que tiveram na mudança

a sua base para o desenvolvimento. Em uma perspectiva mais geral, tal vertente trata de

mudança social observada em grandes dicotomias, como subdesenvolvidas e

desenvolvidas, por exemplo. De acordo com a perspectiva da modernização, a

corrupção seria mais destacada nas sociedades pouco desenvolvidas.

Tem-se, ainda, uma corrente de estudos que tem ancoragem na teoria da escolha

racional e que se tornou hegemônica a partir da década de 1990. Para essa abordagem, a

ocorrência da corrupção é aproximada aos meandros dos setores públicos e privados, a

partir de um sistema de favorecimento dos agentes públicos por meio de suborno e

propina (ROSE-ACKERMAN, 1999); os agentes procuram maximizar seus lucros

privados. No âmbito deste trabalho, consideramos, a partir dessa perspectiva, que a

corrupção é percebida e associada aos agentes públicos.

Compete mencionar, ainda, que definir a corrupção enquanto prática é uma das grandes

dificuldades que se encontra no estudo da corrupção. Além disso, a falta de um

consenso teórico sobre o tema revela a complexidade em tratar dos aspectos conceituais

e das consequências do fenômeno.

Nesse mesmo sentido, também se observam os problemas em compreender como a

corrupção se apresenta, de acordo com o contexto, e com o posicionamento e

julgamento da opinião pública. Assim, mensurar a corrupção diretamente não é

possível.

Como tentativa de solucionar o problema das medidas diretas, utilizam-se as medidas

indiretas; considerando-se a existência de pontos positivos e negativos relativos à sua

utilização. Dentre os principais indicadores indiretos da corrupção, destaca-se: a

vitimização; a percepção; a tolerância; e os dados de agências governamentais de

controle da corrupção. As investigações mais recentes sobre a corrupção têm se valido

da medida indireta da percepção.

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A corrupção e a percepção da corrupção podem ser consideradas, de acordo com

Melgar, Rossi e Smith (2010), enquanto um problema cultural, na medida em que

dependem de como a sociedade compreende as regras e, ainda, do que constitui um

desvio.

No Brasil, o tema é está frequentemente presente na cobertura midiática e a percepção

que os cidadãos têm da corrupção tem sido mensurada periodicamente por instituições

internacionais, como a Transparência Internacional, e também em pesquisas nacionais:

Speck, 2000; Moisés, 2010; Avritzer, Filgueiras, 2011.

Acredita-se que em momentos eleitorais, os cidadãos podem assumir uma postura mais

crítica e avaliativa com relação à sua própria situação e, também, do país, seja do ponto

de vista econômico, social e político. E nesse sentido, vários aspectos podem ganhar

importância durante o período eleitoral e podem se tornar indicadores de voto. Nesse

sentido, a corrupção pode ser um tema ainda mais recorrente na mídia nesses períodos,

além de, consequentemente, ser parte das discussões cotidianas dos cidadãos

(BAPTISTA, 2013).

Nossa proposta é observar aspectos relacionados à percepção da corrupção entre os

jovens e, inicialmente, é relevante esclarecer que “corrupção” e “percepção da

corrupção” são concepções distintas, e a percepção da corrupção é fundamental, uma

vez que explica a sensação que os cidadãos têm na interpretação do seu entorno

(CASAS, ROJAS, 2008). É importante destacar que a percepção da corrupção em nível

global tem aumentado nos últimos anos, de acordo com a Transparência Internacional.

Os dados da organização não-governamental sugerem que tem havido, também, o

crescimento da desconfiança nos partidos políticos e uma forte associação entre a

corrupção e a coisa pública (CASAS, ROJAS, 2008).

Importante mencionar os esforços que vêm sendo empreendidos para compreender a

percepção da corrupção no Brasil. Cita-se o Centro de Referência do Interesse Público

(CRIP), sediado na Universidade Federal de Minas Gerais, que realizou uma pesquisa

sobre a corrupção em 2008, no Brasil, e um dos aspectos observados foi a percepção da

corrupção enfatizando os graus de gravidade do problema.

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Tabela 1 – Gravidade do problema da corrupção (%).

Muito grave 77%

Grave 20%

Pouco grave 2%

Nada grave -

NS/NR 1%

Total: 2.421 entrevistados

Fonte: Centro de Referência do Interesse Público, 2008. Pesquisa realizada entre os dias 10 e 16 de maio de 2008, com amostra nacional de 2.421 pessoas com idade igual ou superior a 16 anos.

De acordo com a tabela acima, observa-se que a corrupção é percebida enquanto um

problema grave na sociedade.

Ainda relacionado à percepção da corrupção, vale mencionar a pesquisa do Ibope

Inteligência de 2006 (CEVERLLINI, 2006) que buscou mensurar e qualificar a

percepção dos brasileiros sobre a corrupção. Os resultados, de modo amplo, indicam

uma crise de representatividade política, na medida em que os cidadãos não reconhece a

representação e projetam em seus representantes uma imagem mais negativa que a sua

própria.

Os representantes, além de serem identificados enquanto corruptos, são vistos como

distantes dos interesses da população e mais preocupados em obter benefícios próprios e

para seus pares. Os entrevistados repudiam atos ilícitos, porém, atribuem a existência de

tais atos apenas à classe política. Os “pequenos desvios” cometidos pela população em

geral, não são considerados pelos entrevistados como um comportamento desonesto

(CEVERLLINI, 2006). A partir desta constatação, é interessante retomar nossa proposta

de que a corrupção é mais percebida entre os agentes públicos, ainda que as explicações

de Rose-Ackerman (1999) destaquem que a corrupção está presente tanto entre agentes

públicos, quanto privados.

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Tabela 2 - Percepção da corrupção no cotidiano (%).

Pergunta Incidência Os brasileiros Pessoas conhecidas

O entrevistado

Quando tem oportunidade, tenta dar uma "caixinha ou gorjeta" para se livrar de uma multa.

Quase todos + / Sempre + 76 44 14

Maioria / Algumas vezes 17 26 4

Quase nenhum / nunca fez 5 25 82

Sonega impostos.

Quase todos + / Sempre + 66 26 7

Maioria / Algumas vezes 24 30 2

Quase nenhum / nunca fez 6 35 90

Recebe benefícios do governo, sabendo que não tem direito a eles.

Quase todos + / Sempre + 58 20 2

Maioria / Algumas vezes 32 27 1

Quase nenhum / nunca fez 6 44 96

Adquire documentos falsos ou falsifica documentos para obter algum tipo de vantagem (ex. identidade, carteira de motorista, carteirinha de estudante, diploma, etc.)

Quase todos + / Sempre + 43 11 1

Maioria / Algumas vezes 45 26 1

Quase nenhum / nunca fez 8 52 97

Quando tem uma oportunidade, pede mais de um recibo para

Quase todos + / Sempre + 42 16 2

Maioria / Algumas vezes 35 24 1

! 10!

um mesmo procedimento médico para obter mais reembolso do plano de saúde.

Quase nenhum / nunca fez 11 45 93

Compra produtos que copiam os originais de marcar famosas sabendo que são piratas ou falsificados.

Quase todos + / Sempre + 92 70 55

Maioria / Algumas vezes 5 15 5

Quase nenhum / nunca fez 2 11 40

Fonte: Dados da pesquisa “Corrupção na política: eleitor vítima ou cúmplice?”, Ibope Inteligência, 2006.

Observa-se, ainda, um comportamento dúbio em relação aos políticos, pois ao mesmo

tempo em que os entrevistados afirmam ter um sentimento de vergonha de seus

representantes pela forma como tratam a coisa pública, muitos admitem que votariam

em candidatos que lhes oferecessem determinadas vantagens pessoais.

Ceverllini (2006) levanta algumas hipóteses a partir da pesquisa, e uma delas é de que a

maioria dos eleitores brasileiros já transgrediu alguma lei ou descumpriu alguma regra

contratual, a fim de obter benefícios materiais, e esse ato foi realizado de forma

consciente e intencional. Outra hipótese, assume que a maioria dos eleitores brasileiros

admite e tolera algum tipo de corrupção por parte de seus representantes ou governantes

eleitos – “rouba, mas faz”. E uma terceira aposta assume que, assim como é atribuído às

classes políticas brasileiras, há entre os votantes uma gradação tanto na prática antiética

no dia a dia quanto na tolerância à corrupção política e essas duas variáveis estão

correlacionadas, e assim, quanto mais ético no dia a dia, menos tolerante o indivíduo

tenderá a ser com relação à corrupção.

Ainda sobre a percepção da corrupção, vale mencionar a relação entre a mídia e a

opinião pública. Nesse sentido, Abramo (2005, p.36) afirma que dentre todos os

problemas que dizem respeito aos índices de percepção da corrupção, “o principal

concerne ao que eles informam sobre a prática concreta do fenômeno que é objeto das

opiniões”. Sendo assim, a relação entre a frequência maior de notícias referentes à

! 11!

corrupção nem sempre tem relação direta ao real aumento do problema. No entanto, o

público pode considerar, a partir das informações da mídia, que a corrupção está, de

fato, aumentando.

Parte-se do pressuposto, aqui, portanto, que a corrupção é mais facilmente percebida

pelos cidadãos do ponto de vista do escândalo midiático. Dentro do campo político, o

escândalo envolve os agentes e as ações (BOURDIEU, 1998), e os reflexos afetam as

relações dentro do campo. No campo midiático, a apresentação dos casos de corrupção

enquanto escândalos políticos e a sua repercussão não são secundários, e sim partes

constitutivas dos próprios casos (LIMA, 2006). A partir disso, pode-se propor que a

repercussão dos casos de corrupção na mídia, sob o viés do escândalo, pode aumentar a

percepção dos cidadãos sobre o fenômeno; a despeito de qualquer julgamento positivo

ou negativo que se faça sobre as notícias, o que não está sendo considerado no âmbito

deste artigo.

O aumento da percepção da corrupção pode resultar em menor confiança nas

instituições democráticas, uma vez que pode gerar um descontentamento e um

sentimento de descrença nas instituições (CASAS, ROJAS, 2008; MELGAR, ROSSI,

SMITH, 2010).

A percepção da corrupção também pode ter relação com a economia. Nesse sentido,

acredita-se que as condições econômicas podem ser um fator de variação na percepção

da corrupção; quanto mais problemática a situação econômica, maior será a percepção

da corrupção.

Os jovens e a percepção da corrupção

Acreditamos ser relevante considerar o grau de interesse por política, que é um aspecto

observado desde os estudos de Lazarsfeld et al (1944), quando se considerou que o

interesse era relevante, sobretudo, no voto. Nossa hipótese, aqui, é de que um maior

interesse por política pode aumentar a busca por informações sobre política e, neste

caso, sobre o tema da corrupção e, assim, ser um componente importante interferir em

um maior ou menor grau de percepção da corrupção.

Nesse sentido, podemos observar os gráficos abaixo que tratam de assuntos que os

jovens consideram relevantes na sociedade e pertinentes em uma conversa com os

amigos.

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Gráfico 2 - Assuntos que você considera relevantes (%).

1"1"1"

12"12"13"15"

19"21"23"

26"29"30"31"

41"

Não sabe Nenhum/mais nenhum (espontânea)

Outros Política

Meio- ambiente e desenvolvimento Cidadania e direitos humanos

Religião Desigualdade social e pobreza

Artes (música, teatro, literatura etc.) Racismo

Relacionamentos amorosos Educação e futuro profissional

Violência Sexualidade

Drogas

Fonte: Pesquisa Nacional Sobre o Perfil e Opinião dos Jovens Brasileiros 2013. Elaborado pelas autoras.

A partir de outras pesquisas também é possível observar o desinteresse dos jovens em

relação ao tema da política.

Gráfico 3 – Grau de importância de temas para os jovens de Belo Horizonte (%).

Fonte: Pesquisa Juventude, participação e voto. DCP/UFMG/Fapemig/Ipespe.

Além do desinteresse, há o sentimento de descrença e desconfiança. Nesse sentido, é

importante resgatar os dados do Latinobarômetro de 2011, que indicavam os meios de

comunicação, juntamente com a igreja, como as instituições em que os cidadãos mais

confiam.

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Tabela 3 – Quais problemas que mais incomodam os jovens no Brasil (%)

Problemas (%)

A corrupção 36

O poder dos traficantes 13

A grande desigualdade entre ricos e pobres 20

O racismo e outras formas de discriminação 10

O despreparo e a violência da política 5

A destruição do meio ambiente 4

A lentidão e outros problemas da Justiça 4

O despreparo do povo 4

A falta de perspectiva profissional para os jovens 3

Fonte: Pesquisa Nacional Sobre o Perfil e Opinião dos Jovens Brasileiros 2013. Elaborado pelas autoras.

A descrença e a desconfiança em relação à política sé dá muito em função da imagem

negativa que se tem dessa instituição. Os jovens, por sua vez, demonstram

descontentamento com a política, na medida em que a relacionam, sobretudo, com a

corrupção.

Tabela 4 - Percepções sobre a política (%)

Temas %

Mídia 7,95%

Manipulação 12,00%

Participação 20,24%

Direitos 22,89%

Promessas 23,37%

Eleições 26,74%

Representação 34,93%

Democracia 44,57%

Voto 47,46%

Corrupção 54,93%

Fonte: Jovens Eleitores e Novas Tecnologias – UFMG, 2013.

! 14!

Observa-se que a associação mais frequente é à corrupção, ocasionando um sentimento

de pessimismo com relação a política. As menções a “voto” e “Eleição” sugerem que os

jovens compreendem a política pelo viés eleitoral, ou seja, parecem não entender sua

dimensão cotidiana e deslocada de cenários eleitorais.

A percepção da corrupção, em termos gerais e como demonstram diversas pesquisas,

tem contribuído para a instabilidade institucional e, ainda, com o enfraquecimento das

relações entre indivíduos, instituições e estados. Sobretudo, pelo sentimento de

desconfiança nas instituições democráticas e na política, de modo geral (CASAS,

ROJAS, 2008; MELGAR, ROSSI, SMITH, 2010).

Também é oportuno tratar da questão da participação política. E sobre isso, apresentam-

se os seguintes dados:

Tabela 5 - Participação Política (%).

Discussão política

Distintivo político

Comício ou

assembleia

Solicitar dinheiro ou contribuir

financeiramente para causas

políticas

Escrever blog

Greve

Nunca participou 80,2% 83,6% 79,4% 97% 95,4% 92%

Já participou, mas não participa

mais

14,6% 14% 18,4% 1,8% 2,2% 6,2%

Participa atualment

e 5,2% 2,4% 2,2% 1,2% 2,4% 1,8%

TOTAL 100% 100% 100% 100% 100% 100%

Fonte: Pesquisa Juventude, participação e voto. DCP/UFMG/Fapemig/Ipespe.

De acordo com a tabela 5, observa-se que que a maior parte dos jovens nunca participou

de uma discussão política ou de uma assembleia. Acreditamos que muitos jovens

! 15!

considerem essas formas de participação muito distantes de sua realidade, no entanto,

até para a participação que mais se aproximaria de seu dia a dia, considerando a

importância da internet em seu cotidiano, que seria escrever sobre política em um blog,

registra-se a ausência de experiência. Muitas atitudes tomadas na internet sinalizam para

um reflexo de um comportamento externo à rede, ou seja, se o indivíduo não possui

interesse pela política fora da internet, dificilmente esse comportamento será alterado na

rede (BAPTISTA, GAMA, VENTURA, 2013a).

Sobre esse aspecto, é valido retomar Manin (1997), quando propõe que o desenho

institucional das democracias modernas não dedicou um espaço que contribuísse na

participação efetiva dos cidadãos. E os períodos eleitorais talvez sejam a única

oportunidade nesse arranjo institucional.

O parecer de Bernard Manin (1997) e destes autores sobre o falho arranjo institucional das democracias modernas, que acaba por diminuir as chances de uma participação mais consistente da esfera civil, coaduna-se com o argumento defendido por outros estudiosos acerca dos principais estorvos a impedirem um maior envolvimento políticos dos cidadãos (MARQUES, 2007, p.3).

Ainda sobre a participação política, Delli Carpini (2000) salienta a importância de

algumas condições para sua ocorrência: 1) motivação; 2) habilidades; e 3)

oportunidades. E Marques (2007, p.3) completa:

[…] para se engajarem politicamente, os cidadãos precisam de (1) motivação (senso de responsabilidade, satisfação, identificação de um problema que afeta diretamente suas vidas, crença de que seu envolvimento será devidamente considerado e que fará a diferença), (2) habilidades (este aspecto se relaciona, sobretudo, à disponibilidade de tempo, dinheiro, informação e educação formal) e de (3) oportunidades, isto é, de mecanismos de input apropriados. O autor vai argumentar que o declínio na atitude cívica dos cidadãos pode ser relacionado às deficiências presentes no provimento de cada um deste conjunto de fatores.

É importante considerar, ainda, que para que se configure a participação política, é

necessário um acúmulo de experiências, como a vocalização de suas impressões sobre a

política e suas necessidades (BRITES, PONTE, 2012).

! 16!

Vale, ainda, destacar a menção à “mídia”, permitindo retomar as considerações em

relação à mídia enquanto ator político e como fonte de informação sobre política.

Sobre isso, é relevante mencionar o Latinobarômetro de 2011, que indica o alto índice

de confiança dos cidadãos nos meios de comunicação, que é superior ao de outras

instituições como os partidos políticos, e como eles figuram enquanto importante fonte

de informação.

Gráfico 4 – Confiança nas instituições (%).

Fonte: Informe Latinobarômetro, 2011. Essa informação permite que se façam apostas de que o enquadramento da mídia sobre

a corrupção, normalmente tratada de maneira negativa e sob o viés do escândalo

político, podem contribuir para uma visão negativa da política.

Desse modo, acreditamos que a percepção da corrupção, sobretudo, a associação entre a

política e a corrupção, enquanto equivalente, favorecem o sentimento de descrença na

política e a desconfiança nas instituições democráticas.

Considerações finais

A corrupção é um problema, entre muitos outros, que pode comprometer a estabilidade

do sistema político, e pode afetar a eficiência e a legitimidade do Estado, bem como a

! 17!

qualidade da democracia. São muitos os esforços para mensurar os graus de corrupção

nos países e, mais ainda, o quanto as pessoas percebem, discutem e toleram o problema.

Neste trabalho, buscou-se compreender a percepção da corrupção entre os jovens

brasileiros e, mais ainda, as associações que são feitas ao tema da corrupção. As

questões relativas à confiança nas instituições democráticas, interesse e participação

política foram trazidas para esta discussão. Para tanto, utilizou-se os dados das

pesquisas “Jovens Eleitores e Novas Tecnologias” e “Pesquisa Nacional Sobre o Perfil e

Opinião dos Jovens Brasileiros 2013”.

A partir desse esforço inicial em compreender a percepção da corrupção pelos jovens

brasileiros, foi possível observar que há uma forte associação entre a política e a

corrupção, marcando um descontentamento e um sentimento de descrença em relação à

política. Também percebeu-se o desinteresse por política, o que resulta, entre outros, a

baixa presença do tema das discussões dos jovens. A associação entre a política e a

corrupção também favorece a visão pessimista em relação à política.

Também é relevante destacar a mídia enquanto importante fonte de informação e

instituição crível para os cidadãos. Além disso, é interessante observar que os jovens

reconhecem a mídia enquanto ator político, na medida em que mencionam os meios de

comunicação enquanto imagem relacionada à política.

Ainda que não se tenha feito qualquer análise detalhada a esse respeito, sugerimos uma

relação entre a mídia, a corrupção e a percepção negativa que os jovens têm em relação

à política. Isso porque, a corrupção é mais facilmente percebida pelos cidadãos na

medida em que são compreendidos enquanto escândalos políticos midiáticos. Nesse

sentido, considerando que o enquadramento sobre o tema é, recorrentemente, negativo,

e retomando a informação fornecida pela análise de que há uma associação entre a

política e a corrupção, a mídia enquanto importante fonte de informação pode contribuir

com essa imagem negativa da política.

Também vale destacar que o interesse por política pode balizar o maior ou menor

conhecimento de casos de corrupção, uma vez que os cidadãos com mais interesse por

política naturalmente se informarão mais sobre os casos e escândalos de corrupção.

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Referências

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