Olivares, Inês Cozzo - Educação, o que estamos aprendendo? (Revista T&D # 167)

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Visão do PublisherPensando a gestão de talentosPor Marcos Baumgartner

EntrevistaPaixão pelo sucessoCom Paolo Perego

Conversando com KenNão há negócio sem amizadePor Ken Blanchard

Sustentabilidade(Co)operaçãoPor Vanessa Hasson de Oliveira

LiderançaA escolha de um presidente (II)Por Peter Barth

Gestão 2.0A arquitetura da colaboraçãoPor Isabel Geo

EducaçãoO que estamos aprendendo?Por Inês Cozzo Olivares

TreinamentoVocê tem um plano para treinar pessoas?Por Peter Harazim

AvaliaçãoMensurar resultados em treinamentoPor Sandra Santos

Ponto de FugaCuidar de pessoasPor Carlos Neves

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Seções

Artigos eideias

ÍNDICE

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TAI

EDUCAÇÃO

Q

| Inês Cozzo Olivares

Como o avanço da tecnologia educacional impacta os processos de ensino e aprendizagem?

uero começar este artigo te convidando para fazer um breve passeio por como está operando o que o mercado chama de ensino-aprendiza-gem hoje. Peço a você, leitor, que observe, por favor, os

Qtrechos de provas a seguir e pense por um mi-nuto no que elas têm em comum além, é claro, do fato de estarem erradas do ponto de vista da matéria à qual se aplicam:

O que estamos aprendendo?

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Se você acha que o que viu acima é um “pri-vilégio” brasileiro, pense de novo depois de ver estas outras duas, que são americanas:

Você enxerga nestas provas todas senso de humor, criatividade, coragem (de respon-der o que pensa ou deseja, ainda que de outro ponto de vista que não o solicitado), arrojo, iniciativa, sementes de capacidade de inovar, de pensar “fora da caixa”? Eu consigo. E, quando vejo, penso que, quando forem adultas, essas crianças farão muito melhor uso dessas qualidades e competências que do fato de terem, um dia, respondido corre-tamente a essas questões. Fico preocupada com uma outra coisa: o fato de que nenhuma dessas competências foi reconhecida pelos seus “mestres” e “orientadores.”

Não estou afirmando que os professores não devem buscar a excelência em suas áreas de conhecimento e em transmiti-las. Quero apenas alertar para o fato de que, tanto aqui no Brasil quanto fora, as broncas em vermelho apontam apenas o erro e ignoram solenemente todas as demais competências embutidas na atitude desses aprendizes.

Se pensarmos nesse ensino que fornece da-dos para algo que, talvez, venhamos a precisar um dia (todos os dados, inclusive), no melhor modelito just in case, e o compararmos ao que ocorre no mundo em termos de velocidade e acesso a informações, ficará fácil perceber como é importante trocá-lo, urgentemente, pelo modelo just in time: aquilo que precisamos, apenas o quê precisamos, e no momento em que precisamos.

E viva o Google! Apesar do medo que eu tenho dele achar mesmo que é Deus. Arnaldo Jabor diz que é. Ele diz que uma coisa que é onipontente, onisciente e onipresente tem que ser Deus… Ou um parente bem próximo.

Continuando o nosso passeio. Por favor, leia o conceito a seguir, uma única vez, depois feche os olhos e, em seguida, tente repeti-lo tal e qual está escrito:

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“Atribui-se o caráter de paradoxais às situa-ções em que os resultados não-antecipados das nossas ações negam frontalmente as intenções que as motivaram.”

Não conseguiu, não é mesmo? Sabe por quê? Além de extremamente hermético, isto é, muito distante de nossa forma habitual de falar e pensar, é a primeira vez, provavelmente, que você coloca seus olhos nisso. E sua consciência também, que é mais, muito mais, importante que seus olhos, diga-se de passagem.

No entanto, você não só sabe o que isso significa como vive isso dezenas de vezes por dia. Como protagonista ou como “vítima”. Cada vez que seu discurso difere de sua ação, você está agindo da forma descrita no princípio do paradoxo. Por exemplo, cada vez que sua intenção é ser objetivo e você é “lido(a)” como agressivo(a), porque na pressa exagerou no tom ou no volume da voz, ou em ambos, está agindo como descrito na premissa. Cada vez que alguém faz o mesmo com você, está sendo um exemplo

desse conceito. Para dizer o mesmo de forma simples, é curso diferente de discurso.

Pense nas organizações que querem promo-ver união entre os membros de um mesmo time e propõem uma gincana em que o melhor vence no final. Você acredita mesmo que o inconsciente consegue olhar para um adversário com olhos de parceiro? Esquece. Só esquizofrênico consegue fazer um lado do rosto sorrir e o outro chorar, sabe?

Vai daí que não ensinamos pelo que dizemos, mas pelo que fazemos. “O que você é fala tão alto que eu não consigo escutar o que você está dizendo”, disse o filósofo Ralph Valdo Emerson.

Infelizmente, nossas práticas educativas estão a anos luz de distância da realidade em que as pessoas vivem. E eu não me refiro apenas às gerações Y e Z, não. Falo das premissas da neuroaprendizagem, baseadas em neurologia (estudo do sistema nervoso), e da neuropsico-logia (estudo do comportamento com base na neurofisiologia; o fisicalismo).

Concluindo nosso passeio, a aprendizagem tem três elementos centrais: 1) o conteúdo (o assunto, o programa); 2) a estratégia (metodolo-gia, forma como vou transferir o conteúdo); e 3) o estado (clima propício para a aprendizagem). Em nossa cultura (ocidental e oriental), a estre-la do show é o conteúdo. Pense um pouco, se bastasse dizer para você algo ou fazer com que você lesse esse algo, ao fechar os olhos você não só repetiria o conceito de paradoxo como já teria meia dúzia de outras formas de dizer o mesmo e centenas de exemplos, certo? Mas não tinha. Nossos gestores já seriam todos os mais maravilhosos líderes depois de tanto workshop e palestra.

Estamos sendo bombardeados por informa-ções sem valor agregado por exemplos e expe-riências que lhes deem referência, por todos os lados, e, como diz a banda Capital Inicial na

É fácil perceber como é importante trocá-lo,

urgentemente, pelo modelo ‘just in time’:

aquilo que precisamos, apenas o quê precisamos

e no momento em que precisamos

“canção “Não olhe pra trás”, a “Inteligência ficou cega de tanta informação!”.

Em neuroaprendizagem, que é como o nosso sistema nervoso aprende de fato, o mais impor-tante não é o que é “ensinado” (dito), mas o que é aprendido. Aquilo que eu levo gravado nas minhas células, metabolizado. O saber que está fora de mim não me pertence. Precisamos nos apropriar desse saber. Ou você acha que vai con-sultar o Google, a apostila, o último best-seller ou os slides do último curso que você fez sobre gestão de conflitos, no meio de uma discussão com um cliente?

Vai daí que, se o mais importante é o conte-údo, o imprescindível passa a ser o estado que eu serei capaz de gerar nos aprendizes para que metabolizem esse conteúdo: curiosidade, inte-resse, abertura, desejo, e por aí vamos. Todos eles, estados que os games são especialistas em obter em questão de segundos!

E o futuro? O que nos oferece? Pensando, inclusive, no fato de que esse futuro já é presente em muitos casos!

A principal referência que temos atualmente no mercado, e que explica como a tecnologia pode acelerar a aprendizagem, está no “Horizon Report”, estudo que sempre traz as principais tendências e descobertas mundiais sobre o as-sunto. Trata-se de um relatório de acesso livre na internet, e que você pode acessar no endereço: www.nmc.org/horizon/.

Trata-se do registro da pesquisa qualitativa feita pelo New Media Consortium, a partir dos pontos de vista de 175 conselheiros nas áreas de negócios, indústria e educação sobre as tecno-logias emergentes que terão impacto em ensino, aprendizagem e expressão criativa.

Conteúdo��Principais tecnologias emergentes.��Desafios principais.

��Tendências significativas.��Depois de cinco anos? Ou metatendências?

Sobre o Projeto Horizon��Horizon Report 2010.��Computação móvel.��Conteúdo aberto.��Livros eletrônicos.��Realidade aumentada “simples”.��Computação baseada em gestos.��Análise visual de dados.��Smartphones, netbooks, laptops.��Conteúdo aberto.

Tempo de adoção: 1 ano ou menosOpen courseware ou disponibilidade de

conteúdo gratuito das mais variadas formas na internet. Exemplos:��Berkeley: http://webcast.berkeley.edu/��Instituto Tecnológico de Paris: http://gra-duateschool.paristech.org/��MIT: http://ocw.mit.edu/OcwWeb/web/home/home/index.htm��Stanford: http://stanfordocw.org��Yale: http://oyc.yale.edu/

Não ensinamos pelo que dizemos, mas pelo que fazemos. ‘O que você é fala tão alto que eu não consigo escutar o que você está dizendo’, disse o filósofo Ralph Valdo Emerson

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Realidade aumentada “simples”, e que de simples não tem nada. Pesquise vídeos no You-Tube e no TED.Tempo de Adoção: 2 a 3 anos.

Uso de recursos tecnológicos para ampliar a experiência da realidade.��Estratégias de ensino e aprendizagem.��Construção do conhecimento.��Ações presenciais.��Cursos de curta e média duração.��Workshops.��Seminários.��Palestras.��Estudos de casos.��Certificações.

Outras Alternativas��Ações / Projetos Aplicativos (On the Job).��Job rotation.��Benchmarking.��Pesquisas.��Coaching.

��Mentoring.��Counselling.

Fonte: Victor Mirshawka Jr.

http://victormijr.blog.uol.com.br/

Já deu para ficar maluquinho(a) da Silva com tantas possibilidades? Pelo menos, console-se sabendo que estão praticamente todas listadas aqui. Agora é correr atrás daquilo que você ainda não conhece ou domina ou com que mais se identifica, certo?

Conclusão: estamos ainda muito longe do melhor uso da tecnologia a favor de nossa missão de “ensinar”. Seja a tecnologia propriamente dita, seja a da neurociência, que é a mais or-gânica e funcional. Coloco ensinar entre aspas porque nada do que realmente vale a pena ser aprendido pode ser ensinado, mas podemos propiciar o acesso a esse saber criando estados, contextos, ambientes e condições favoráveis para que os aprendizes acessem esses saberes dentro deles mesmos.

Eu também fiz e ainda faço muito “estrago” achando que estou ensinando. Paz-ciência. Também não poderei desfazer os estragos que já fiz por falta de conhecimento/informação/sabedoria. Console-se, como eu, com a verdade contidas nestas palavras de Chico Xavier: “Em-bora nenhum de nós possa voltar atrás e fazer um novo começo, qualquer um pode começar agora e fazer um novo final”.

O saber que está fora de mim não me pertence.

Precisamos nos apropriar desse saber. Ou você

acha que vai consultar o Google no meio de

uma discussão com um cliente?

A autora, em suas palavras, “ama tecnologia e ciência; não ensina e não manda porque sabe que ensinando sai cópia e mandando sai escravo. Então, apenas procura transmitir seu espírito”.