GEDPU Subjetiva Rodada 2014.19

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1 GEDPU Subjetiva Rodada 2014.19 Prezado Participante, Você está recebendo a publicação das melhores respostas da rodada acompanhadas das notas explicativas dos mediadores deste grupo. Este material visa incentivar uma rotina semanal prática de estudo, mediante o auxílio dos mediadores que estão diariamente em contato com os temas abordados, trazendo ao participante a realidade do cargo que almeja e o colocando no centro dos debates da carreira e discussões jurídicas atuais. As opiniões manifestadas neste grupo de debates não refletem, necessariamente, o posicionamento dos mediadores e colaboradores do grupo. A transcrição das respostas se dá na íntegra, da forma como repassada pelos autores. Equipe Ebeji “Quer você acredite que consiga fazer uma coisa ou não, você está certo.” Henry Ford

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GEDPU Subjetiva Rodada 2014.19

Prezado Participante, Você está recebendo a publicação das melhores respostas da rodada acompanhadas das notas explicativas dos mediadores deste grupo. Este material visa incentivar uma rotina semanal prática de estudo, mediante o auxílio dos mediadores que estão diariamente em contato com os temas abordados, trazendo ao participante a realidade do cargo que almeja e o colocando no centro dos debates da carreira e discussões jurídicas atuais. As opiniões manifestadas neste grupo de debates não refletem, necessariamente, o posicionamento dos mediadores e colaboradores do grupo. A transcrição das respostas se dá na íntegra, da forma como repassada pelos autores.

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Questão 01 (elaborada pelo Juiz Federal Dr. Rafael Mol) Segundo entendimento do Superior Tribunal de Justiça, é correto afirmar que a configuração do dano moral prescinde da comprovação da dor e sofrimento, ou seja, o dano é considerado "in re ipsa"? Justifique, com exemplos.

Prezados (as), é certo que atualmente, em diversos casos, o Superior Tribunal

de Justiça vem entendendo que a configuração do dano moral prescinde da comprovação da dor e sofrimento, isto é, considerado como “in re ipsa”. Contudo, não é possível afirmar que todas as hipóteses de dano moral prescindem da comprovação do elemento subjetivo da dor e sofrimento, como bem pontuado pelos participantes. Não obstante, entendo que a tendência da jurisprudência é reconhecer a existência de dano moral independentemente da prova de tais elementos subjetivos. Nesse sentido, os seguintes julgados do STJ:

AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO ARTIGO 535 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. REEXAME DE PROVAS. SÚMULA 7/STJ. COMPROVAÇÃO DO DANO MORAL. (...) 3.- Já decidiu este Tribunal que, "quanto ao dano moral não há que se falar em prova, deve-se, sim, comprovar o fato que gerou a dor, o sofrimento, sentimentos íntimos que o ensejam. Provado o fato, impõe-se a condenação" (AGA 356447-RJ, DJ 11.6.2001). 4.- Agravo improvido. (AgRg no AREsp 485.677/MG, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 22/04/2014, DJe 13/05/2014) DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS. ACIDENTE EM OBRAS DO RODOANEL MÁRIO COVAS. NECESSIDADE DE DESOCUPAÇÃO TEMPORÁRIA DE RESIDÊNCIAS. DANO MORAL IN RE IPSA. 1. Dispensa-se a comprovação de dor e sofrimento, sempre que demonstrada a ocorrência de ofensa injusta à dignidade da pessoa humana. 2. A violação de direitos individuais relacionados à moradia, bem como da legítima expectativa de segurança dos recorrentes, caracteriza dano moral in re ipsa a ser compensado.

NOTA GEDPU:

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(...) (REsp 1292141/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 04/12/2012, DJe 12/12/2012) PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. DANO MORAL. INEXISTÊNCIA. DEVOLUÇÃO EM DOBRO. DESCABIMENTO. AUSÊNCIA DE MÁ-FÉ. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. OCORRÊNCIA. 1.- Para se presumir o dano moral pela simples comprovação do ato ilícito, esse ato deve ser objetivamente capaz de acarretar a dor, o sofrimento, a lesão aos sentimentos íntimos juridicamente protegidos, o que não ocorreu no caso. (...) (AgRg no REsp 1346581/SP, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 23/10/2012, DJe 12/11/2012) AGRAVO REGIMENTAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. DANOS DECORRENTES DA FALTA DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. DEMORA INJUSTIFICADA NO REPARO DE REDE DE ESGOTO. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INOCORRÊNCIA. PROVA DO DANO MORAL. INDENIZAÇÃO FIXADA EM R$ 5.000, 00. (...) 2.- Esta Corte já firmou entendimento que "o dano moral não depende de prova; acha-se in re ipsa" (REsp 296.634-RN, Rel. Min. BARROS MONTEIRO, DJ 26.8.2002), pois "não há falar em prova do dano moral, mas, sim, na prova do fato que gerou a dor, o sofrimento, sentimentos íntimos que o ensejam" (REsp 86.271/SP, Rel. Min. CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, DJU 9.12.97). (...) (AgRg no AREsp 9.990/RJ, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 28/02/2012, DJe 08/03/2012)

Eduardo Brusamolin Barcellos (Santa Rita do Sapucaí/MG) respondeu:

Primeiramente, cumpre asseverar que o dano moral é caracterizado quando há alguma ofensa à personalidade do agente, à sua moral ou dignidade humana, de difícil mensuração objetiva. Da mesma forma que o dano material, o moral também necessita, para sua concretização, além do dano, de uma conduta e o nexo causal entre eles. Entretanto, em algumas situações, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem admitido o dano moral presumido, conhecido como dano in re ipsa, quando independe da demonstração de dor ou sofrimento.

Desta forma, deve-se destacar que a regra para a configuração do dano

moral necessita demonstrar a existência de três elementos: o dano propriamente dito, cuja peculiaridade é causar um grande abalo psicológico na vítima; a conduta causadora desse dano; e o nexo de causalidade entre a conduta e o dano. Excepcionando essa regra,

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criou-se o instituto do dano moral in re ipsa, cuja dor e sofrimento são presumidos diante de determinadas situações. Nestes casos, basta ao agente provar que houve uma conduta ilícita, da qual resultou um dano, e o nexo de causalidade entre eles, dispensando-se a prova de sofrimento psicológico.

Dano moral "in re ipsa", portanto, é aquele que ocorre por força dos próprios

fatos, por decorrência lógica de uma situação concreta em que o dano à imagem é presumido, prescindindo-se de demonstração de efetiva ofensa moral à honra da vítima, como ocorre, por exemplo, em inscrição indevida em cadastros de inadimplentes. Neste caso, o STJ já pacificou entendimento de que o dano moral é presumido, aplicando-se mesmo quando a vítima seja pessoa jurídica.

Outra importante exceção à regra em que o dano moral é presumido se

refere ao atraso de voos, cuja responsabilidade da companhia aérea decorre logicamente do transtorno causado ao passageiro, que pagou por um serviço falho e defectivo. Nesta situação, a Corte Especial possui precedente de que “o dano moral decorrente de atraso de voo prescinde de prova, sendo que a responsabilidade de seu causador opera-se in re ipsa” (REsp 299.532).

Portanto, a regra é pela necessidade de se demonstrar a dor e o sofrimento

psicológicos suportados pela vítima, entretanto, há situações em que esse abalo psicológico é presumido pelos próprios fatos ocasionados, configurando o dano "in re ipsa".

Renata Costa de Aguiar (Curitiba/PR) respondeu:

A reparabilidade dos danos morais está prevista expressamente no artigo 5º,

V e X, da Constituição Federal, e é conceituado como lesão a direitos da personalidade. A jurisprudência do STJ e a doutrina exigem a existência de dano para a responsabilização civil, já que o dever de indenizar existe na medida da extensão do dano, que deve ser certo e determinado.

Diversamente disso, o enunciado n. 445, aprovado na V Jornada de Direito

Civil, informa que para a caracterização do dano moral indenizável não se exige expressamente a verificação de sentimentos humanos desagradáveis como dor ou sofrimento. Trata-se, nesse caso, do chamado dano moral objetivo ou presumido (in re ipsa), ou seja, aquele que prescinde da prova do sofrimento em si para a sua configuração, pois no próprio fato se subentende o dano.

Com efeito, o STJ em diversas ocasiões já deferiu pedidos de indenização

para compensar o dano moral diante da simples comprovação de conduta injusta, prescindindo prova do dano, em consequência in re ipsa, quando houver violação a direitos fundamentais; nos atrasos de voos; morte de familiares; lesão estética; uso indevido de imagem para fins lucrativos (súmula 403, STJ); inscrição indevida no cadastro

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de inadimplentes; entre outros. Isso porque, o dano está intrínseco na própria conduta injusta que atinja a dignidade humana.

Finalmente, em que pese o STJ tenha autorizado o dano moral presumido em

determinados casos, a regra ainda é pelo dano moral subjetivo, isto é, aquele que necessita ser comprovado pelo autor da demanda, ônus que lhe cabe, nos termos do art. 333, inciso I, do CPC. Assim, para este ultimo, o autor deve demonstrar a conduta, o dano e o nexo de causalidade entre eles.

Marco Aurélio Senko da Hora (Curitiba/PR) respondeu:

De acordo com a intelecção da Corte Cidadã o dano moral, em regra, deve

ser comprovado, demonstrando-se a conduta, o dano e o nexo causal. Frise-se que, em se tratando de dano moral, há, geralmente, ofensa à honra subjetiva, à imagem, ou seja, aos direitos de personalidade, sendo sua mensuração uma atividade difícil.

Assim, a jurisprudência para avaliar o dano moral perpetrado, para fins de

fixação da indenização, geralmente, verifica a dor e o sofrimento experimentados pelos sujeitos lesados, não considerados como tais meros dessabores cotidianos.

Sem embargo, em algumas situações, excepcionalmente, o STJ entende que o

dano moral é “in re ipsa”, ou seja, é presumido, independendo de comprovação de dor ou sofrimento, como se rende por exemplo quando há inscrição indevida no cadastro de proteção ao crédito, atrasos em vôos, não reconhecimento de diplomas, entre outros. Lívia Reis (Curitiba/PR) respondeu:

Não, pois não é todo o dano moral que pode ser presumido. A doutrina,

neste sentido, divide o dano moral em duas espécies: dano moral subjetivo, no qual deve ser provado o sofrimento ou dor do prejudicado e o dano moral in re ipsa, que prescinde deste tipo de prova. Como exemplo do primeiro pode ser citado a hipótese excepcional em que o STJ, mitigando entendimento por ele próprio sumulado, admitiu a configuração de dano moral em decorrência de descumprimento contratual, exigindo, contudo, que sejam demonstradas “consequências sérias de cunho psicológico, resultado de um inadimplemento culposo” (Resp 617077, Rel. Min. Luís Salomão). Quanto ao segundo, pode-se afirmar, em linhas gerais, que quando houver ofensa a algum direito fundamental, notadamente os previstos no art. 5º e 7º da CF, o dano moral prescindirá da demonstração de sofrimento. Deste modo, já decidiu o STJ que, por exemplo, a morte de um filho, gera para os seus pais o direito de serem indenizados pelo responsável, sendo presumido o seu sofrimento, enquadrando-se, portanto, na classificação de dano moral in re ipsa.

Carina Márcia Dahmer (Carazinho/RS) respondeu:

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Para o STJ, em algumas situações a condenação ao pagamento de indenização por dano moral prescinde da comprovação do efetivo abalo psíquico suportado pela vítima.

Podem-se citar como sendo casos em que o STJ entende configurado o dano

moral in re ipsa aqueles em que a vítima é indevidamente inscrita em cadastro de restrição ao crédito, ou quando ocorre atraso em voo (chamado de overbooking), ou, ainda, quando o serviço prestado por uma instituição bancária é defeitouso.

Com relação à inscrição indevida em cadastro de inadimplentes, o STJ

considera desnecessário comprovar o abalo moral, pois, em tal situação, ele é plenamente presumível, vinculado à própria existência do ato ilícito.

Nos demais casos antes citados, a desnecessidade de comprovação do dano

psíquico decorre da prestação defeituosa do serviço, pela aflição e desconforto que exsurgem do ato ilícito.

Outrossim, vale ressaltar o entendimento do STJ quanto à configuração do

dano moral in re ipsa nos casos de ofensa injusta à dignidade da pessoa humana. Assim, conforme tal Corte, há dano moral em caso de violação de direitos fundamentais, devendo a vítima ser indenizada sem necessidade de comprovação do efetivo abalo psíquico.

Leonardo Alves Guedes (Juiz de Fora/MG) respondeu:

O dano moral é aquele decorrente da dor, tristeza ou humilhação sofrida pela

vítima em razão de determinado fato praticado por outrem. Assim, diversamente do dano material, que se prova através de documentos, perícia e depoimentos, o dano moral é imaterial. Por esta razão, ele é ínsito à própria ofensa, ou seja, uma vez provado o fato ofensivo estar-se-ia provando o próprio dano, o que a doutrina e jurisprudência consideram como dano in re ipsa.

Nesta linha de entendimento segue a jurisprudência do Superior Tribunal de

Justiça (STJ), considerando que o dano moral prescinde de comprovação da dor e sofrimento, sendo decorrente de simples constatação de fato ilícito que possa causar sofrimento, objetivamente considerado.

Assim, em recente julgado, entendeu o STJ que há dano moral in re ipsa em

extravio de carta registrada, eis que o consumidor que contrata tal serviço tem provável interesse no monitoramento da entrega e sua efetiva comprovação, de sorte que o simples fato do extravio da correspondência por si só acarreta dano moral.

Em outro julgado, entendeu o STJ que a esposa infiel deveria reparar o

marido traído na hipótese de ocultação dele, até alguns anos após a separação, que a criança nascida durante o matrimônio e que tenha sido criada por ele como se filho fosse

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do casal também configura dano moral in re ipsa. Inegavelmente rompendo com o dever de fidelidade do matrimonio.

Igualmente considerado dano moral in re ipsa pelo STJ, o uso não autorizado da imagem de atleta em propaganda, ainda que sem fins lucrativos ou comercial, ensejaria a reparação por danos morais independentemente da comprovação de prejuízo.

Importa ressaltar que o dano moral in re ipsa, de acordo com o

entendimento jurisprudencial do STJ, está ligada a ofensa à dignidade da pessoa humana, parâmetro norteador da tutela dos direitos humanos consagrado na Constituição Federal e na Declaração Universal de Direitos Humanos e no Pacto de São José da Costa Rica.

Viviane Martins Ribeiro (Maringá/PR) respondeu:

Primeiramente, é preciso anotar que danos morais são conceituados como

lesão a direitos da personalidade, sendo essa a visão que prevalece na doutrina brasileira. Para a sua reparação não se requer a determinação de um preço para a dor

ou o sofrimento, mas sim um meio para atenuar, em parte, as consequências do prejuízo imaterial. Por essa razão, utiliza-se a expressão “reparação”, e não “ressarcimento” para os danos morais.

Além disso, quanto à necessidade, ou não, de prova, faz-se uma classificação

entre dano moral provado (ou subjetivo) e dano moral objetivo ou presumido (in re ipsa). Aquele – dano moral provado – constitui a regra. Vale dizer, segundo a nossa

jurisprudência, é o que necessita ser comprovado pelo autor da demanda. Trata-se do ônus que lhe cabe; enquanto este – dano moral presumido – não necessita de prova, como nos casos de morte de pessoa de família, lesão estética ou uso indevido de imagem para fins lucrativos.

Ademais, tanto doutrina quanto jurisprudência sustentam que os danos

morais suportados por alguém não se confundem com os meros transtornos ou aborrecimentos que a pessoa sofre no dia a dia. Nesse sentido, tem-se o Enunciado 159 do Conselho da Justiça Federal, pelo qual o dano moral não se confunde com os meros aborrecimentos decorrentes do prejuízo material.

Como exemplos de dano moral in re ipsa, assinale-se que o STJ tem

entendido que a negativa do pagamento de indenização por seguradora gera um dano moral presumível no caso concreto; igualmente, a recusa de custeio das despesas por parte de empresa de plano de saúde. Há, ainda, outras situações que estão previstas em suas súmulas, quais sejam: “A simples devolução indevida de cheque caracteriza dano moral” (Súm. 388); “Caracteriza dano moral a apresentação antecipada de cheque pré-datado” (Súm. 370); “Independe de prova do prejuízo a indenização pela publicação não autorizada de imagem de pessoa com fins econômicos ou comerciais” (Súm. 403).

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Dessa forma, segundo entendimento do Superior Tribunal de Justiça, é

correto, sim, afirmar que a configuração do dano moral prescinde da comprovação da dor e sofrimento, quando o dano é considerado in re ipsa.

Flávio Moreira dos Santos (Rio de Janeiro/RJ) respondeu:

Via de regra, para configuração do dano moral é necessário provar a conduta,

o dano e o nexo causal. Excepcionalmente o dano moral será presumido, ou seja, independerá da comprovação.

Como entende o STJ, sempre que demonstrada a ocorrência de ofensa

injusta à dignidade da pessoa humana tal comprovação será dispensada, não sendo correto afirmar que a configuração do dano moral sempre prescinde da comprovação da dor e sofrimento.

Um exemplo de dano moral in re ipsa é o decorrente da inscrição indevida

em cadastro de inadimplentes, pois esta presumidamente afeta a dignidade da pessoa humana, tanto em sua honra subjetiva, como perante a sociedade.

Em mesmo sentido, uma exposição de imagem, sem autorização, em âmbito

nacional, que trouxesse ao gerador da exposição lucro em fins econômicos e publicitários, ensejaria também o reconhecimento de dano in re ipsa para a vítima que, assim, sofreria violação do direito de imagem. Tal entendimento é, inclusive, o conteúdo da Súmula 403 do Superior Tribunal de Justiça.

Nesses casos, para o arbitramento do valor devido ao fim reparador do dano

causado, o julgados deve fazer uso de sua experiência e do bom senso, atento à realidade da vida e às peculiaridades da hipótese em discussão, bem como o aporte econômico do causador e o nível econômico da vítima.

Questão 02 (elaborada pelo Juiz Federal Dr. Rafael Mol) Em sede de processo penal, há distinção entre interceptação, escuta e gravação telefônicas? Estão sujeitas ao procedimento da Lei 9.296/96, em especial a necessidade de prévia autorização judicial, bem como são válidas como meio de prova? Responda de forma objetiva e fundamentada.

Prezados (as), a doutrina e a jurisprudência distinguem as três modalidades.

Sucede, contudo, que especificamente em relação à escuta, o STF, por vezes, não a

NOTA GEDPU:

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diferencia da interceptação, de forma que, assim, ambas estariam sujeitas à Lei 9.296/96, inclusive com a necessidade de autorização judicial, em razão de existir um terceiro alheio à conversa dos interlocutores. Nesse sentido, têm-se os seguintes julgados em que o STF, expressamente, admite a validade apenas da gravação telefônica, sem a necessidade de autorização judicial, salvo existência de cláusula de sigilo:

AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. GRAVAÇÃO AMBIENTAL FEITA POR UM INTERLOCUTOR SEM CONHECIMENTO DOS OUTROS: CONSTITUCIONALIDADE. AUSENTE CAUSA LEGAL DE SIGILO DO CONTEÚDO DO DIÁLOGO. PRECEDENTES. 1. A gravação ambiental meramente clandestina, realizada por um dos interlocutores, não se confunde com a interceptação, objeto cláusula constitucional de reserva de jurisdição. 2. É lícita a prova consistente em gravação de conversa telefônica realizada por um dos interlocutores, sem conhecimento do outro, se não há causa legal específica de sigilo nem de reserva da conversação. Precedentes. 3. Agravo regimental desprovido. (AI 560223 AgR, Relator(a): Min. JOAQUIM BARBOSA, Segunda Turma, julgado em 12/04/2011, DJe-079 DIVULG 28-04-2011 PUBLIC 29-04-2011 EMENT VOL-02511-01 PP-00097 LEXSTF v. 33, n. 388, 2011, p. 35-40)

HABEAS CORPUS. NULIDADES: (1) INÉPCIA DA DENÚNCIA; (2) ILICITUDE DA PROVA PRODUZIDA DURANTE O INQUÉRITO POLICIAL; VIOLAÇÃO DE REGISTROS TELEFÔNICOS DO CORRÉU, EXECUTOR DO CRIME, SEM AUTORIZAÇÃO JUDICIAL; (3) ILICITUDE DA PROVA DAS INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICAS DE CONVERSAS DOS ACUSADOS COM ADVOGADOS, PORQUANTO ESSAS GRAVAÇÕES OFENDERIAM O DISPOSTO NO ART. 7º, II, DA LEI 8.906/96, QUE GARANTE O SIGILO DESSAS CONVERSAS. VÍCIOS NÃO CARACTERIZADOS. ORDEM DENEGADA. (...) 3. Ilicitude da prova das interceptações telefônicas de conversas dos acusados com advogados, ao argumento de que essas gravações ofenderiam o disposto no art. 7º, II, da Lei n. 8.906/96, que garante o sigilo dessas conversas. 3.1 Nos termos do art. 7º, II, da Lei 8.906/94, o Estatuto da Advocacia garante ao advogado a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho, bem como de seus instrumentos de trabalho, de sua correspondência escrita, eletrônica, telefônica e telemática, desde que relativas ao exercício da advocacia. 3.2 Na hipótese, o magistrado de primeiro grau, por reputar necessária a realização da prova, determinou, de forma fundamentada, a interceptação telefônica direcionada às pessoas investigadas, não tendo, em momento algum, ordenado a devassa das linhas telefônicas dos advogados dos pacientes. Mitigação que pode, eventualmente, burlar a proteção jurídica. 3.3 Sucede que, no curso da execução da medida, os diálogos travados entre o paciente e o advogado do corréu acabaram, de maneira automática, interceptados, aliás, como qualquer outra conversa direcionada ao ramal do paciente. Inexistência, no caso, de relação jurídica cliente-advogado. 3.4 Não cabe aos policiais executores da

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medida proceder a uma espécie de filtragem das escutas interceptadas. A impossibilidade desse filtro atua, inclusive, como verdadeira garantia ao cidadão, porquanto retira da esfera de arbítrio da polícia escolher o que é ou não conveniente ser interceptado e gravado. Valoração, e eventual exclusão, que cabe ao magistrado a quem a prova é dirigida. 4. Ordem denegada. (HC 91867, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 24/04/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-185 DIVULG 19-09-2012 PUBLIC 20-09-2012)

O STJ, à sua vez, diferenciando claramente as três modalidades, tem

precedente admitindo a validade da escuta telefônica, independentemente do procedimento da Lei 9.296/96, conforme se observa da seguinte decisão noticiada no informativo de nº 510:

DIREITO PROCESSUAL PENAL. INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA SEM AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. VÍCIO INSANÁVEL. Não é válida a interceptação telefônica realizada sem prévia autorização judicial, ainda que haja posterior consentimento de um dos interlocutores para ser tratada como escuta telefônica e utilizada como prova em processo penal. A interceptação telefônica é a captação de conversa feita por um terceiro, sem o conhecimento dos interlocutores, que depende de ordem judicial, nos termos do inciso XII do artigo 5º da CF, regulamentado pela Lei n. 9.296/1996. A ausência de autorização judicial para captação da conversa macula a validade do material como prova para processo penal. A escuta telefônica é a captação de conversa feita por um terceiro, com o conhecimento de apenas um dos interlocutores. A gravação telefônica é feita por um dos interlocutores do diálogo, sem o consentimento ou a ciência do outro. A escuta e a gravação telefônicas, por não constituírem interceptação telefônica em sentido estrito, não estão sujeitas à Lei 9.296/1996, podendo ser utilizadas, a depender do caso concreto, como prova no processo. O fato de um dos interlocutores dos diálogos gravados de forma clandestina ter consentido posteriormente com a divulgação dos seus conteúdos não tem o condão de legitimar o ato, pois no momento da gravação não tinha ciência do artifício que foi implementado pelo responsável pela interceptação, não se podendo afirmar, portanto, que, caso soubesse, manteria tais conversas pelo telefone interceptado. Não existindo prévia autorização judicial, tampouco configurada a hipótese de gravação de comunicação telefônica, já que nenhum dos interlocutores tinha ciência de tal artifício no momento dos diálogos interceptados, se faz imperiosa a declaração de nulidade da prova, para que não surta efeitos na ação penal. Precedente citado: EDcl no HC 130.429-CE, DJe 17/5/2010. HC 161.053-SP, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 27/11/2012.

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Portanto, em que pese a existência de certa divergência no que tange à escuta, doutrina e jurisprudência majoritárias entendem que a interceptação está sujeita aos ditames da Lei 9.296/96, ao passo que tais procedimentos são absolutamente prescindíveis na gravação telefônica.

Ludmila Silva Luz (Salvador/BA) respondeu:

A doutrina realiza a distinção entre os institutos da interceptação telefônica, escuta telefônica e gravação telefônica.

A interceptação telefônica em sentido estrito, nada mais é que a captação de

comunicação alheia, ou seja, por um terceiro não integrante da conversa, SEM a ciência de qualquer uma das partes que se comunicam. Esta modalidade está obviamente abarcada pelo procedimento da Lei nº 9.296/96, havendo necessidade de prévia autorização judicial para a sua realização e servindo, desta forma, como meio de prova no processo penal.

Já a escuta telefônica, é realizada também por um terceiro alheio à conversa,

mas com a ciência e consentimento de um dos que figura na comunicação. No que se refere especificamente à esta modalidade de captação de comunicação telefônica, há divergência na doutrina quanto à sua sujeição à Lei de Interceptação Telefônica. Para parte majoritária da doutrina, há sim esta sujeição, devendo este tipo de captação ser previamente autorizada pelo juiz competente. Corrente minoritária entende que a escuta telefônica na está incluída na Lei 9.296/96, pois uma das partes abriu mão voluntariamente da proteção constitucional ao sigilo das comunicações.

De todo modo, independentemente da corrente doutrinária adotada, será

possível a determinação judicial da escuta telefônica sempre que estiver presente a justa causa, como por exemplo na hipótese de gravações de conversas entre sequestradores e familiares da vítima.

Diverso é o conceito de gravação telefônica, pois aqui não há um terceiro,

mas uma das partes realizando a captação da comunicação telefônica, sem a ciência da outra. Esta hipótese está fora do regime da Lei nº 9.296/96, pois não estaria abarcada a gravação telefônica na vedação expressa no incido XII, do art. 5º da CF, porquanto realizada pela própria parte que figura na comunicação. Portanto, não se faz necessária a prévia autorização judicial para tanto, podendo tal captação ser admitida como meio de prova lítico, desde que presente a justa causa para a sua efetivação.

Eduardo Brusamolin Barcellos (Santa Rita do Sapucaí/MG) respondeu:

Sim, há distinção e somente a interceptação telefônica está sujeita ao

procedimento da Lei 9.296/96, pois argumentam doutrina e jurisprudência que a escuta e a gravação telefônicas não estão subordinadas ao inciso XII do art. 5º da CRFB/88, mas sim ao inciso X, que diz respeito à intimidade e privacidade, senão vejamos.

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Na interceptação há três sujeitos, o interceptador e dois interlocutores.

Ocorre quando o interceptador, terceiro desconhecido e sem consentimento, capta a conversa realizada entre os dois interlocutores. Doutrina e jurisprudência sustentam que somente este caso está sujeito ao inciso XII do art. 5º da Carta Magna, de modo que para ser válida como meio de prova deve haver prévia autorização judicial e estar de acordo com o procedimento ditado pela Lei 9.296/96.

Na escuta telefônica também há três sujeitos, mas um dos interlocutores tem

conhecimento de que a conversa está sendo gravada por um terceiro. Já na gravação telefônica somente há os dois interlocutores e um deles grava a conversação com o conhecimento do outro ou não. Nestes casos não há interceptação, de modo que a proteção está inserida unicamente no inciso X do art. 5º, que garante a privacidade. Não necessitam, portanto, de prévia autorização judicial e nem estão subordinadas ao procedimento da Lei 9.296/96. Nestas hipóteses, o STJ já pacificou pela inexistência de interceptação telefônica em sentido estrito, podendo ser utilizadas, a depender do caso concreto, como prova no processo.

Neste sentido também tem se manifestado o STF, admitindo como válidas

tanto a escuta como a gravação telefônicas, principalmente para resguardar direitos particulares. Nestes casos, a Suprema Corte tem considerado lícitas as provas resultantes de escuta ou gravação, afastando a regra do inciso LVI do art. 5º da Constituição.

Feita a distinção, conclui-se, pois, que somente a interceptação telefônica

está sujeita à Lei 9.296/96 e ao inciso XII do art. 5º para ser lícita e válida como meio de prova. A escuta e a gravação estão sujeitas ao inciso X do art. 5º, cuja privacidade tem sido relativizada pelos tribunais a depender dos interesses conflitantes.

Leonardo Alves Guedes (Juiz de Fora/MG) respondeu:

Em se de processo penal há distinção entre interceptação, escuta e gravação

telefônicas. A primeira pressupõe a existência de dois interlocutores e um terceiro, sendo que este escuta e/ou grava a conversa dos interlocutores sem que eles saibam da existência do terceiro. A segunda pressupõe a existência de dois interlocutores e um terceiro, sendo que este escuta e/ou grava a conversa dos interlocutores com a ciência de um dos interlocutores. A terceira é a gravação da conversa realizada por um dos interlocutores sem que o outro saiba.

A Lei 9.296/96 regulamenta apenas o procedimento para a interceptação

telefônica, conforme definido no art. 1º da referida lei, sendo apenas este caso sujeita à necessidade de prévia autorização judicial para que possa ser realizada como meio lícito de prova, nos termos do art. 5º, XII da Constituição Federal.

No julgamento do EDcl no HC 130.429 manifestou o Superior Tribunal de

Justiça que apenas a interceptação telefônica se submete ao disposto na Lei 9.296/96, para

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que possa ser considerada prova materialmente válida a ser utilizada em processo penal. Já para a escuta e a gravação, entendeu que é possível o uso, a depender do caso concreto, como prova em processo penal, principalmente quando se trata de meio de prova para a defesa pessoal.

No caso apresentado, o STJ entendeu que a escuta telefônica, para ser

considerada válida, a gravação deve ser precedida da autorização de um dos interlocutores, sob pena de se caracterizar ilícita interceptação telefônica. Assim, não é possível que um dos interlocutores posteriormente consinta em utilizar a gravação, pois não se pode aferir objetivamente se a conversa gravada ocorreria caso o interlocutor soubesse da gravação.

Assim, na mesma linha de entendimento manifestada pelo Supremo Tribunal

Federal, segue a jurisprudência no sentido de considerar válida a escuta como prova para o âmbito processual penal, desde que não existe causa legal específica de sigilo da conversa, nem reserva da conversação, conforme manifestado no Ag. Reg. no AI 560.223.

Georgete Pimenta Farias (Rio de Janeiro/RJ) respondeu:

O Supremo Tribunal Federal trata a interceptação telefônica em sentido

amplo, abarcando a interceptação telefônica em sentido estrito e a escuta telefônica, assim apenas as duas estão sujeitas à Lei 9.296/96. A gravação telefônica, pois, não sofre a incidência de tal lei.

Conforme art. 5º, XII, da CRFB, é inviolável o sigilo da correspondência e das

comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal. A ressalva diz respeito à interceptação telefônica em sentido amplo.

A interceptação telefônica em sentido estrito consiste na captação, por um

terceiro, de uma conversa sem o conhecimento dos interlocutores, sendo exigida, para tanto, autorização judicial, sob pena de nulidade da prova, caso em que não produzirá efeitos no processo penal.

Já a escuta telefônica consiste na captação, por terceiro, de conversa, com o

conhecimento de apenas um dos interlocutores. Segundo a Suprema Corte, também se exige aqui a autorização judicial.

O art. 5º, X, da CRFB, por sua vez, dispõe que são invioláveis a intimidade, a

vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação. Nesse contexto, está a gravação telefônica.

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A gravação telefônica corresponde à captação da conversa por um dos interlocutores, sem o consentimento ou ciência do outro. Nesse último caso, não há necessidade de autorização judicial e é possível a sua utilização como prova no processo. Inclusive é possível a gravação telefônica feita pela autoridade policial ou judiciária ou pelo Ministério Público, desde que respeitados os direitos e garantias fundamentais constitucionais e processuais, caso contrário a prova será ilícita.

Ana (Juiz de Fora/MG) respondeu:

Existe sim distinção entre interceptação, escuta e gravações telefônicas. A interceptação telefônica ocorre quando um terceiro capta o diálogo

telefônico travado entre duas pessoas, sem que nenhum dos interlocutores saiba. Nesse caso, é pacífico o entendimento de que é indispensável a autorização judicial. A interceptação telefônica está regulamentada pela Lei 9.296/96.

Já a escuta telefônica se dá quando um terceiro alheio aos interlocutores

capta o diálogo telefônico entre estes, sendo que um dos interlocutores sabe que a conversa está sendo gravada. A maioria entende que a autorização judicial está dispensada nesse caso.

Por fim, a gravação telefônica, também conhecida como gravação

clandestina, ocorre quando duas pessoas têm o seu diálogo telefônico gravado por uma delas, sem o consentimento ou ciência do outro. Esse caso dispensa autorização judicial, salvo se a conversa for amparada por obrigação de sigilo.

No caso da escuta e da gravação telefônicas, por não constituírem formas de

interceptação telefônica não estão sujeitas à Lei 9.296/96, podendo ser utilizadas, a depender do caso concreto, como prova no processo.

Portanto, poderão tais intervenções serem utilizadas como prova, sendo que

no caso da interceptação necessariamente deverá haver autorização judicial, sob pena de nulidade da prova, mesmo que um dos interlocutores venha a consentir posteriormente com a divulgação dos conteúdos interceptados. Segundo o STJ, essa posterior autorização não possui o condão de legitimar o ato.

Marco Aurélio Senko da Hora (Curitiba/PR) respondeu:

Sobreleve-se que, no âmbito do processo penal, há diferença entre a

interceptação, a escuta e a gravação telefônica, estas duas últimas também chamadas de escuta e gravação clandestina, pois realizadas sem a ciência da outra parte, portanto, o vocábulo clandestino não é no sentido de ilicitude.

Registre-se que a gravação telefônica ocorre quando um dos interlocutores

grava a conversa, sem que a outra pessoa que participa da conversa esteja ciente. Já a

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escuta telefônica se rende quando terceiro grava conversa de dois ou mais interlocutores, sendo que apenas um dos interlocutores possui conhecimento desta escuta telefônica. Por fim, a interceptação telefônica se dá quando, mediante autorização judicial, terceiro, no caso, o Ministério Público ou a Polícia Investigativa grava conversa sem ciência dos interlocutores.

Neste ínterim, obtempere-se que apenas o procedimento da interceptação

telefônica está sujeito ao regramento conferido pela Lei nº 9.296/96, valendo somente como prova, no processo penal, caso obedeça o estabelecido em lei e haja autorização judicial, na forma do art. 5º, XII, da CF, sob pena da prova colhida ser tida como prova ilícita. Adite-se, no mais, que a colheita de provas mediante a interceptação telefônica é subsidiária aos outros meios de prova, não podendo ser instalada com supedâneo apenas em denúncia anônima.

De outra banda, sobreleve-se que a gravação telefônica não depende de

autorização judicial, sendo ainda considerada prova lícita para o STJ, pois é feita pelo próprio interlocutor. Já, no concernente à escuta telefônica há divergência doutrinária e jurisprudencial, quanto sua licitude, eis que é realizada por terceiro, considerando-se tal prova, de modo geral, como lícita apenas para inocentar o réu, de igual modo se dá com a interceptação telefônica, quando não existe permissão judicial.

Tania Maria Paim de Almeida (Curitiba/PR) respondeu:

O art. 5º, XII, da Constituição Federal estabeleceu a inviolabilidade das

comunicações telefônicas, alvo por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal. A lei 9.296/1996 regulamentou esse dispositivo constitucional.

Impende esclarecer que a lei supracitada refere-se expressamente à

interceptação das comunicações telefônicas, a qual é uma captação feita por pessoa diversa dos interlocutores.

Segundo o STJ, interceptação telefônica é a captação feita por um terceiro,

sem o conhecimento dos interlocutores, que depende de ordem judicial, nos termos do inc. XII do art. 5º da CF, regulamentado pela lei 9.296/96. No caso, a ausência de autorização judicial para a captação da conversa macula a validade do material como prova para processo penal.

Escuta telefônica é aquela na qual há o consentimento de um dos

interlocutores para a realização das interceptações, o que, no entanto, não desnatura a interceptação, uma vez que realizada por terceiro, ou seja, é a captação de conversa feita por um terceiro, com o conhecimento de apenas um dos interlocutores.

Na gravação, não há o elemento da terceira pessoa. Ela é praticada pelo

próprio interlocutor, que registra a conversa sem o conhecimento do outro.

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Vale registrar, por oportuno que a escuta e a gravação telefônicas, por não

constituírem interceptação telefônica em sentido estrito, não estão albergadas pela lei 9.296/90, podendo ser utilizadas, a depender do caso concreto, como prova em processo.

Questão 03 (elaborada pelo Defensor Público Federal Dr. Pedro Coelho) É possível o reconhecimento de tempo de serviço laborado quando menor de 14 anos por trabalhador rural para fins de benefício previdenciário, inclusive aposentadoria por idade?

Prevalece o entendimento nos Tribunais Superiores de que o impedimento do trabalho por menores de 14 anos é norma que intenta conferir maior e eficaz proteção ao direito da criança e do adolescente. Nesse sentido, entendimento quanto à impossibilidade de o trabalhador rural se beneficiar do tempo em que exerceu labor de maneira irregular seria corroborar com uma dupla punição ao vulnerável, já que, além de ter trabalhado em idade incompatível com a ordem jurídica e em desacordo com as regras protetivas da criança e adolescente, o segurado não poderia se valer do referido período para fins de benefício previdenciário. Dessa maneira, a proibição do trabalho às pessoas com menos de 14 anos de idade foi estabelecida em benefício dos menores e não deve ser arguida para prejudicá-los, podendo, pois, ser averbada (AR 3.877-SP, 3ª Seção do STJ - Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze e Súmula 05 da Turma Nacional de Uniformização).

Cristiane Cardoso Avolio Gomes (Angra dos Reis/RJ) respondeu:

A CRFB/88, em suas disposições referentes aos direitos sociais, permite o trabalho a partir dos 16 anos, exceto aqueles que se realizem em horário noturno ou em condições insalubres ou perigosas. Há também a previsão de trabalho a partir dos 14 anos, apenas na condição da aprendiz.

Em cosonância com tais dispositivos constitucionais, a legislação

previdenciária estabalece que a idade mínima para filiação como segurado facultativo é de 16 anos. Quanto ao aprendiz, este poderá ser filiado a partir dos 14 anos, mas na condição de segurado obrigatório.

Todas estas normas têm o objetivo de proteger a criança e o adolescente,

estando também em conformidade com os tratados internacionais firmados pelo Brasil

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que buscam coibir todas as formas de trabalho e exploração infantil, de modo a garantir à criança um crescimento saudável, praticando atividades condizentes com sua faixa etária e que contribuam para seu desenvolvimento físico e psicológico.

Tendo em vista o caráter eminentemente protetivo das citadas normas, o STJ

entende que essas disposições não podem ser uitlizadas em prejuízo à criança e ao adolescente. Em outras palavras, embora o trabalho infanto-juvenil seja probido (ressalvadas as hipóteses citadas, autorizadas em lei), caso se constate que o adolescente efetivamente trabalhou durante determinado período, de forma ilícita, esse tempo de serviço deverá ser considerado para fins trabalhistas e previdenciários. Segundo o STJ, a adoção de entendimento diverso siginificaria impor ao menor dupla punição (uma por já ter trabalhado durante período em que deveria estar se dedicando a outras atividades e outra por não ter nenhum reconhecimento legal quanto ao tempo trabalhado).

Entendimento semelhante também é adotado pela TNU em sua súmula 5,

autorizando a contagem do tempo de serviço do trabalhador rural entre 12 e 14 anos para fins previdenciários.

Carina Márcia Dahmer (Carazinho/RS) respondeu:

Consoante entendimento do STJ, é possível o reconhecimento do tempo de

serviço laborado por menor de 14 anos em serviço rural, para fins de aposentadoria, a partir dos 12 anos.

Outrossim, a Turma Nacional de Uniformização fixou entendimento de que é

possível esse reconhecimento, pois, afinal, embora o artigo 11, VII, da Lei nº 8.213/91 estabeleça a idade mínima de 16 anos (conforme alteração efetuada em 2008), a finalidade legal seria usurpada se utilizada para fins de negar o direito ao cômputo do período efetivamente trabalhado para fins previdenciários.

Afinal, a previsão constitucional de idade mínima para o trabalho visa a

proteção do menor, cuja mão de obra não deveria ser utilizada em tenra idade. Entretanto, não se pode olvidar a realidade fática de que há muitos trabalhadores rurais menores de 14 anos, quiçá até de 12 anos, cujos direitos não devem ser duplamente sacrificados, ao se negar tanto a vedação ao trabalho e a contagem do tempo de serviço.

Nesse sentido, a Lei nº 8.213/91 previa, originalmente, a idade mínima de 14

anos em razão da disposição constitucional quanto à vedação ao trabalho, a qual, também em seu texto original, era de 14 anos. A alteração do disposto no artigo 7º, XXXIII, efetuada por meio da EC nº 20/98, ensejou a posterior alteração da lei de benefícios, apenas para fins de compatibilização. No entanto, repisa-se, seria contrassenso impedir a contagem do tempo de serviço do trabalhador rural, para fins de aposentadoria, se ele efetivamente trabalhou antes dos 16 ou 14 anos de idade.

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É possível também para os casos de aposentadoria por idade, desde que preenchidos os requisitos previstos na Lei nº 8.213/91.

Renata Costa de Aguiar (Curitiba/PR) respondeu:

Sim, porque o artigo 7º, XXXIII, da CF/88, que proíbe o trabalho para o menor

de 16 anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de 14 anos, é norma constitucional protetiva, que não pode ser interpretada em seu desfavor. Além disso, a proteção do trabalho do menor também tem fundamento constitucional, nos termos do princípio da proteção integral, no artigo 227, da Carta Magna, que, além de ratificar o disposto no artigo 7º, XXXIII, lhe acrescentou outros direitos, dentre os quais, a garantia de direitos previdenciários e trabalhistas.

Assim, nota-se que a vedação ao trabalho do menor de 14 anos é norma

voltada ao Estado e ao empregador, possíveis violadores do direito à infância e ao desenvolvimento saudável, tanto no aspecto físico quanto psicológico, do menor, e não o inverso. Por isso, não configura prejuízo à criança que, embora indevidamente, tenha efetivamente trabalhado de usufruir dos benefícios gerados pelos efeitos desse trabalho. Nesse sentido, se posiciona o STJ, reconhecendo o tempo de serviço para fins previdenciários ao menor de 14 anos, quando comprovada a atividade rurícola ou o trabalho em regime de economia familiar.

Por fim, a Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados

Especiais Federais, editou súmula n. 5, determinado o reconhecimento para fins previdenciários em favor do menor de 12 a 14 anos, s que tenham prestado serviço rural antes do advento da Lei 8.213 de 24 de julho de 1991.

Werllen Lauton Andrade (Brasília/DF) respondeu:

Sim, é possível. Os tribunais superiores têm jurisprudência pacificada pelo

reconhecimento, para fins previdenciários, da atividade rural antes dos 14 anos de idade, em que pese o art. 11, VII, da Lei 8.213/91 estabelecer a idade mínima de 14 anos para que o trabalhador rural em regime de economia familiar possa ser considerado segurado especial, inclusive para fins de aposentadoria por idade.

O limite de idade estabelecido na lei 8.213/91 se deu em razão de que o art.

7º, XXXIII, da Constituição Federal, proibia em sua redação original, vigente à época da edição da lei, qualquer trabalho a menores de quatorze anos, salvo na condição de aprendiz, permitida a partir dos doze anos. Ressalte-se que, a partir da Emenda Constitucional nº 20 /1998, a Constituição passou a proibir o trabalho para menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos.

Contudo, os tribunais pátrios têm considerado que a limitação de idade

contida nas normas constitucionais e infraconstitucionais não pode prejudicar os direitos trabalhistas e previdenciários dos menores de idade que tenham exercido efetivamente a

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atividade laboral, ainda que com idade inferior à mínima prevista em lei, porquanto as normas que proíbem o trabalho do menor foram editadas para protegê-lo e não para prejudicá-lo.

Questão 04 (elaborada pelo Defensor Público Federal Dr. Pedro Coelho) Imagine a seguinte situação: O Estado Federativo X, no Brasil, editou lei estadual, em 1999, com o fito de obrigar empresas de transporte coletivo intermunicipal a adaptarem todos os seus veículos de modo a viabilizar o confortável acesso e utilização por parte de cidadãos deficientes físicos. Analisando o texto constitucional, mormente no que se refere às competências legislativas, é possível afirmar que tal lei é compatível com a Carta Magna?

A questão trata de um aparente conflito de normas constitucionais

referentes à competência legislativa, especificamente o artigo 24, XIV (Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: XIV - proteção e integração social das pessoas portadoras de deficiência) e o art. 22, XI (Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: XI - trânsito e transporte). Não obstante o conflito entre as normas, o STF entendeu, em situação análoga ao caso apresentado, que o texto constitucional dera densidade significativa ao direito à acessibilidade física das pessoas com deficiência de modo que tal previsão deveria prevalecer em detrimento à competência, diversas vezes reiteradas pela Corte, privativa da União para legislar sobre trânsito e transporte. Agora cuidado! A questão foi expressa ao indicar a data da edição da norma! Em sendo antes da edição da Lei nº 10.098/2000 (Federal), a qual dispõe sobre normas gerais e critérios básicos de promoção da acessibilidade das pessoas com deficiência, havia competência plena aos Estados Membros, razão pela qual não se poderia arguir qualquer limitação à época de sua edição. No caso, o Estado X poderia sim ocupar o vazio legislativo previsto nas competências concorrentes, fato esse que, após a referida legislação federal, não mais ocorre. Importante o conhecimento acerca do julgamento da ADI 903, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 22/05/2013). (EMENTA Ação direta de inconstitucionalidade. Lei nº 10.820/92 do Estado de Minas Gerais, que dispõe sobre adaptação dos veículos de transporte coletivo com a finalidade de assegurar seu acesso por pessoas com deficiência ou dificuldade de locomoção. Competência legislativa concorrente (art. 24., XIV, CF). Atendimento à determinação constitucional prevista nos arts. 227, § 2º, e 244 da Lei Fundamental. Improcedência. 1. A ordem constitucional brasileira, inaugurada em 1988, trouxe desde seus escritos originais a preocupação com a proteção das pessoas portadoras de necessidades especiais, construindo políticas e diretrizes de inserção nas diversas áreas sociais e econômicas da comunidade (trabalho privado, serviço público, previdência e assistência social).

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Estabeleceu, assim, nos arts. 227, § 2º, e 244, a necessidade de se conferir amplo acesso e plena capacidade de locomoção às pessoas com deficiência, no que concerne tanto aos logradouros públicos, quanto aos veículos de transporte coletivo, determinando ao legislador ordinário a edição de diplomas que estabeleçam as formas de construção e modificação desses espaços e desses meios de transporte. 2. Na mesma linha afirmativa, há poucos anos, incorporou-se ao ordenamento constitucional a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, primeiro tratado internacional aprovado pelo rito legislativo previsto no art. 5º, § 3º, da Constituição Federal, o qual foi internalizado por meio do Decreto Presidencial nº 6.949/2009. O art. 9º da convenção veio justamente reforçar o arcabouço de proteção do direito de acessibilidade das pessoas com deficiência. 3. Muito embora a jurisprudência da Corte seja rígida em afirmar a amplitude do conceito de trânsito e transporte para fazer valer a competência privativa da União (art. 22, XI, CF), prevalece, no caso, a densidade do direito à acessibilidade física das pessoas com deficiência (art. 24, XIV, CF), em atendimento, inclusive, à determinação prevista nos arts. 227, § 2º, e 244 da Lei Fundamental, sem preterir a homogeneidade no tratamento legislativo a ser dispensado a esse tema. Nesse sentido, há que se enquadrar a situação legislativa no rol de competências concorrentes dos entes federados. Como, à época da edição da legislação ora questionada, não havia lei geral nacional sobre o tema, a teor do § 3º do art. 24 da Constituição Federal, era deferido aos estados-membros o exercício da competência legislativa plena, podendo suprir o espaço normativo com suas legislações locais. 4. A preocupação manifesta no julgamento cautelar sobre a ausência de legislação federal protetiva hoje se encontra superada, na medida em que a União editou a Lei nº 10.098/2000, a qual dispõe sobre normas gerais e critérios básicos de promoção da acessibilidade das pessoas com deficiência. Por essa razão, diante da superveniência da lei federal, a legislação mineira, embora constitucional, perde a força normativa, na atualidade, naquilo que contrastar com a legislação geral de regência do tema (art. 24, § 4º, CF/88). 5. Ação direta que se julga improcedente).

Eduardo Brusamolin Barcellos (Santa Rita do Sapucaí/MG) respondeu:

O artigo 24, inciso XIV, da Constituição Federal dispõe que compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre proteção e integração social das pessoas portadoras de deficiência. Estabelece, ainda, em seu artigo 23, referente à competência comum de todos os entes federativos, o dever de cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência. É notável, portanto, que ao Estado compete, tanto na esfera legislativa como na administrativa, promover a proteção dos portadores de deficiência.

Destarte, a lei estadual editada em 1999 pelo Estado Federativo X está em

perfeita consonância com a Carta Magna que, em seu artigo 244, determina que lei deverá dispor sobre adaptações dos veículos de transporte coletivo já existentes para garantir acesso adequado aos portadores de deficiência (vide também art. 227, § 2º).

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Vale mencionar que o § 2º do art. 24 da CF/88 determina a competência suplementar dos Estados, haja vista que a competência da União limita-se a estabelecer normas gerais. Por outro lado, estabelece o § 3º que os Estados legislarão plenamente em não havendo lei federal dispondo sobre normas gerais. Assim, tendo em vista que lei federal disciplinando o assunto somente surgiu em novembro de 2000, com a Lei 10.048, tem-se que a lei estadual editada anteriormente tem plena aplicação até a promulgação da lei federal. Sobrevindo esta, estabelecendo normas gerais, as normas daquela que forem contrárias à lei federal ficarão com sua eficácia suspensa (art. 24, § 4º), permanecendo válidas as demais disposições.

Lívia Reis (Curitiba/PR) respondeu:

Sim. Trata-se de questão analisada pelo STF na ADI nº 903/MG. Na ocasião a

Corte Suprema ponderou que a resposta a uma suposta usurpação de competência deveria ter em vista qual a matéria que seria considerada como vinculada na lei e qual seria a finalidade mais importante do instrumento normativo. Isto porque a competência para legislar sobre trânsito e transportes é exclusiva da União (art. 22, XI da CF), mas, por outro lado, a competência para legislar sobre a proteção e integração social das pessoas portadoras de deficiência é concorrente entre a União, Estados e Distrito Federal (art. 24, XIV da CF).

Muito embora o governador do Estado de Minas Gerais argumentasse que a

lei era inconstitucional por ter invadido competência da União, já que versava sobre trânsito e transportes, o STF entendeu que o que prevalecia no instrumento normativo era a busca por resguardar maior proteção aos portadores de deficiência, daí porque não padeceria a lei de qualquer vício de competência ou inconstitucionalidade. Não havendo lei nacional estabelecendo normas para adequar o acesso e utilização do transporte público por deficientes físicos, o Estado poderia exercer competência plena acerca da matéria, como autorizaria o art. 24, §3º da CF. Tal entendimento, aliás, ressaltou o Pretório Excelso, é o que mais se compatibiliza com outro dispositivo da Constituição que prevê em seu art. 227, §2º da CF “A lei disporá sobre normas de construção dos logradouros e dos edifícios de uso público e de fabricação de veículos de transporte coletivo, a fim de garantir acesso adequado às pessoas portadoras de deficiência.”

Thiago Lira de Holanda Leite (Natal/RN) respondeu:

Preambularmente, descortina-se que o Supremo Tribunal Federal já ressaltou

que a competência legislativa em torno da enfocada matéria possui natureza concorrente, nos termos do inciso XIV do art. 24 da nossa Constituição da República, razão por que, durante o ano de 1999, quando a União ainda não havia legislado acerca das pertinentes normas gerais, o Estado X possuía prerrogativa legislativa plena para regulamentar, nos estritos limites do seu território, a adaptação dos veículos de transporte intermunicipais às necessidades das pessoas portadoras de deficiência.

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Frise-se, neste diapasão, que a nossa hodierna ordem jurídica reservou um especial tratamento normativo no que tange à acessibilidade espacial das pessoas deficientes, impondo, sob este ângulo, o poder-dever estatal em promover a adequação das edificações públicas, bem como dos automóveis de transporte coletivo, de forma a viabilizar/concretizar as peculiares condições de acesso merecidas pelos que se encontram fisicamente limitados, tudo em conformidade com as normas contidas tanto no parágrafo 2o do art. 227 quanto no caput do art. 244, ambos da nossa Constituição da República.

Reforçando, ainda mais, a densidade jurídica da tutela sob enfoque, tem-se

que o art. 9o da Convenção Internacional Sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, a qual foi incorporada in totum ao ordenamento jurídico nacional com o status de norma constitucional, nos termos da interpretação combinada entre o parágrafo 3o do art. 5o de nossa Lei Fundamental e o Decreto Presidencial no 6.949/2009, também assegura, dentre diversos outros pontos, a integral acessibilidade das pessoas deficientes aos respectivos meios de transporte.

Fixadas estas premissas, resta salientar que a superveniência da Lei no

10.098/2000, a qual foi editada pela União como forma de, enfim, fixar as diretrizes normativas gerais em face da presente problemática, induz à automática suspensão da eficácia da Lei editada pelo Estado X, exclusivamente, nos pontos que se revelarem incompatíveis com a sublinhada legislação federal.

Leonardo Alves Guedes (Juiz de Fora/MG) respondeu:

A princípio, a competência legislativa acerca da matéria de transporte está

entre as competências conferidas privativamente à União, conforme ditames do art. 22, XI da Constituição Federal. Neste sentido, inclusive, caminha a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) no sentido, via de regra, de restringir a amplitude do conceito de transporte e trânsito para afirmar a competência legislativa da União sobre a matéria.

Contudo, no julgamento da ADI 903, semelhante ao caso do enunciado, o

STF considerou lei estadual é constitucional, em razão da densidade do direito da acessibilidade física das pessoas com deficiência, cuja matéria é de competência concorrente entres a União, Estados e Distrito Federal de acordo com o art. 24, XIV da Carta Magna.

No julgado mencionado, o STF considerou que em matéria de acessibilidade

de pessoas com deficiência o conflito existente entre a competência privativa da União de legislar sobre o trânsito e transporte e a competência concorrente entre União, Estados ou Distrito Federal de legislarem sobre acessibilidade prevaleceria esta última quando se tratar de matéria pertinente ao transporte público interestadual.

Isso porque, a acessibilidade às pessoas portadoras de deficiência encontra

significativa densidade no ordenamento jurídico brasileiro, estando previstas no Art. 227, §2º da CF e Art. 244 da CF, cuja matéria o Poder Constituinte Originário conferiu

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competência concorrente a mais de um ente federado no sentido de concretizar o direito humano de acessibilidade aos portadores de deficiência, também previsto na Convenção Internacional sobre Direitos das Pessoas Portadoras de Deficiência, do qual o Brasil é signatário.

Sendo assim, não existindo norma no âmbito federal acerca do tema, a

competência legislativa estadual acerca da acessibilidade de pessoas com deficiência no transporte público intermunicipal é plena, de acordo com o art. 24, §3º da Constituição Federal.

Flávio Moreira dos Santos (Rio de Janeiro/RJ) respondeu:

Tal situação foi objeto de apreciação pelo STF via Ação Direta de

Inconstitucionalidade interposta pela Confederação Nacional do Transporte em face da Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais.

Na oportunidade, o Estado de Minas Gerais havia editado a Lei 10.820/1992,

que dispunha sobre adaptação dos veículos de transporte coletivo com a finalidade de assegurar seu acesso por pessoas com deficiência ou dificuldade de locomoção.

É ordem, constitucionalmente assegurada, a proteção das pessoas

portadoras de necessidades especiais, via construção de políticas e diretrizes de inserção nas diversas áreas sociais e econômicas da comunidade.

Tal comando encontra-se plasmado nos artigos 227, §2º, e 244, que

asseguram a necessidade de se conferir amplo acesso e plena capacidade de locomoção às pessoas com deficiência, no que concerne tanto aos logradouros públicos, quanto aos veículos de transporte coletivo, determinando ao legislador ordinário a edição de diplomas que estabeleçam as formas de construção e modificação desses espaços e desses meios de transporte.

Na mesma linha afirmativa, há poucos anos, incorporou-se ao ordenamento

constitucional a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, primeiro tratado internacional aprovado pelo rito legislativo previsto no art. 5º, § 3º, da Constituição Federal, o qual foi internalizado por meio do Decreto Presidencial nº 6.949/2009.

O art. 9º da citada Convenção veio justamente reforçar o arcabouço de

proteção do direito de acessibilidade das pessoas com deficiência. Muito embora a jurisprudência da Suprema Corte seja rígida em afirmar a

amplitude do conceito de trânsito e transporte para fazer valer a competência privativa da União (art. 22, XI, CRFB), prevalece, no caso, a densidade do direito à acessibilidade física das pessoas com deficiência (art. 24, XIV, CRFB), em atendimento, inclusive, à

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determinação prevista nos arts. 227, § 2º, e 244 da Lei Fundamental, sem preterir a homogeneidade no tratamento legislativo a ser dispensado a esse tema.

Nesse sentido, enquadrou o STF a situação legislativa no rol de competências

concorrentes dos entes federados. Como, à época da edição da legislação pela Assembleia Legislativa de Minas

Gerais não havia lei geral nacional sobre o tema, a teor do § 3º do art. 24 da Constituição Federal, era deferido aos estados-membros o exercício da competência legislativa plena, podendo suprir o espaço normativo com suas legislações locais.

A preocupação manifesta no julgamento cautelar sobre a ausência de

legislação federal protetiva hoje se encontra superada, na medida em que a União editou a Lei nº 10.098/2000, a qual dispõe sobre normas gerais e critérios básicos de promoção da acessibilidade das pessoas com deficiência.

Por essa razão, diante da superveniência da lei federal, a legislação mineira,

embora constitucional, perdeu a força normativa, na atualidade, naquilo que contrastar com a legislação geral de regência do tema (art. 24, § 4º, CF/88).

Assim, contemporaneamente, pode-se dizer que uma Lei editada em 1999

para tal fim, como dispõe o enunciado da questão proposta, deve receber idêntico tratamento dado à lei mineira objeto da julgada ADIN e, embora seja constitucional, não terá força normativa naquilo que contrastar com a legislação geral de regência do tema, Lei 10.098/2000. Questão 05 (elaborada pelo Defensor Público Federal Dr. Edson Filho) Discorra, suscintamente, sobre os processos tradicionais de interpretação do direito.

As escolas tradicionais de interpretação do direito se valiam

preponderantemente ou exclusivamente de um único processo interpretativo. A doutrina diverge bastante na enumeração e na denominação de tais processos de interpretação, destacando-se os seguintes métodos: gramatical (ou literal ou filológico), lógico (ou racional), sistemático (ou sistêmico ou orgânico), histórico (ou histórico-evolutivo) e teleológico (ou sociológico ou finalístico).

Vale mencionar que o método teleológico é a única modalidade de

interpretação obrigatória no direito brasileiro, haja vista o disposto no art. 5º da Lei de

NOTA GEDPU:

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Introdução às Normas do Direito Brasileiro (antiga LICC): “Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum”.

Os demais métodos, obviamente, não podem ser descartados, sendo

utilizados conjuntamente pelas escolas modernas de interpretação do direito. O Código Tributário Nacional, por exemplo, prevê expressamente a aplicação

do método gramatical (Art. 111 - Interpreta-se literalmente a legislação tributária que disponha sobre: I - suspensão ou exclusão do crédito tributário; II - outorga de isenção; III - dispensa do cumprimento de obrigações tributárias acessórias).

Viviane Martins Ribeiro (Maringá/PR) respondeu: De início, é preciso destacar que interpretar um texto normativo significa

captar sua essência, compreendê-lo, esclarecendo e fixando seu sentido e alcance. A interpretação é uma atividade que busca atribuir significado ao texto normativo, apresentando-se, ao mesmo tempo, como ato cognoscitivo e de criação.

Convém observar que a atividade interpretativa não pode ser desvinculada

do ordenamento jurídico e do contexto histórico-cultural e social em que se encontra imersa.

Para alcançar sua finalidade, a interpretação utiliza-se de vários métodos ou

processos, quais sejam: a) filológico (literal ou gramatical ou semântica) – o hermeneuta busca o

sentido literal do texto normativo, tendo por primeira tarefa estabelecer uma definição, ante a indeterminação semântica dos vocábulos normativos, que são, em regra, vagos ou ambíguos, quase nunca apresentando um sentido unívoco. Então, o primeiro passo na intepretação seria verificar o sentido dos vocábulos do texto, ou seja, sua correspondência com a realidade que eles designam.

b) lógico – o que se pretende é desvendar o sentido e alcance da norma,

estudando-a por meio de raciocínios lógicos, analisando os períodos da lei e combinando-os entre si, com o escopo de atingir perfeita compatibilidade.

c) sistemático – é o que considera o sistema em que se insere a norma,

relacionando-a com outras normas concernentes ao mesmo objeto. O sistema jurídico não se compõe de um único sistema normativo, mas de vários que constituem um conjunto harmônico e interdependente, embora cada qual esteja fixado em seu lugar próprio.

d) histórico – baseia-se na averiguação dos antecedentes da norma. Refere-

se ao histórico do processo legislativo, desde o projeto de lei, sua justificativa ou exposição de motivos, emendas, aprovação e promulgação, ou às circunstâncias fáticas que a

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precederam e que lhe deram origem, às causas ou necessidades que induziram o órgão a elaborá-la, ou seja, às condições culturais ou psicológicas sob as quais o preceito normativo surgiu.

e) sociológico ou teleológico – objetiva adaptar a finalidade da norma às

novas exigências sociais. Além disso, procura o fim, a ratio do preceito normativo, para a partir dele determinar o seu sentido. O sentido normativo requer a captação dos fins para os quais se elaborou a norma.

Toda interpretação jurídica é de natureza teleológica fundada na consistência

valorativa do direito, operando-se numa estrutura de significações e não isoladamente, de modo que cada preceito normativo significa algo situado no todo do ordenamento jurídico. A norma, portanto, deverá ser interpretada no conjunto da ordenação jurídica, implicando a apreciação dos fatos e valores que lhe deram origem, mas também a dos supervenientes.

Flávio Moreira dos Santos (Rio de Janeiro/RJ) respondeu:

É a hermenêutica que contém regras bem ordenadas que fixam os critérios e

princípios que deverão nortear a interpretação. Para orientar a tarefa interpretativa do aplicador várias técnicas existem,

dentre elas a gramatical, a lógica, a sistemática, a histórica e a sociológica ou teleológica. Pela técnica gramatical, que se funda em regras da linguística, examina o

aplicador do direito cada termo do texto normativo, isolada ou sintaticamente, atendendo à pontuação, colocação dos vocábulos, origem etimológica, etc. Tem sempre em vista as seguintes regras: caso as palavras tenham significado comum e técnico, sempre se dará preferência a este; sua localização no conjunto das leis do país, bem como a posição específica de sua localização inserida na lei, devem ser consideradas; na antinomia entre o sentido gramatical e o lógico, este deve prevalecer; o sentido da palavra deve ser tomado em conexão com o da lei; o termo deve ser interpretado em conexão com os demais e havendo palavras com sentido diverso, cumpre ao intérprete fixar-lhes o verdadeiro.

Na técnica lógica o que se pretende é desvendar o sentido e o alcance da

norma, mediante seu estudo, por meio de raciocínios lógicos, analisando os períodos da lei e combinando-os entre si, com o escopo de atingir perfeita compatibilidade.

Na técnica sistemática deve-se considerar o sistema em que se insere a

norma, relacionando-a com outras concernentes ao mesmo objeto, pois por uma norma pode-se desvendar o sentido de outra. Isto é assim porque o sistema jurídico não se compõe de um só sistema de normas, mas de vário, que constituem um conjunto harmônico e interdependente, embora cada qual esteja fixado em seu lugar próprio.

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A histórica, técnica oriunda de obras de Savigny e Puchta, cujas ideias foram compartilhadas por renomados autores, baseia-se na averiguação dos antencedentes da norma. Refere-se ao histórico do processo legislativo, desde o projeto de lei, sua justificativa ou exposição de motivos, emendas, aprovação e promulgação, ou às circunstâncias fáticas que a precederam e que lhe deram origem, às causas ou necessidades que induziram o órgão a elaborá-la, ou seja, às condições culturais ou psicológicas sob as quais o preceito normativo surgiu. Como a maior parte das normas constitui a continuidade ou modificação das disposições precedentes, é bastante útil que o aplicador investigue o desenvolvimento histórico das instituições jurídicas, a fim de captar o exato significado das normas, tendo sempre em vista a razão delas (ratio legis), ou seja, os resultados que visam atingir.

Por fim, a técnica sociológica ou teleológica objetiva, como desejou Ihering,

adaptar o sentido ou finalidade da norma às novas exigências sociais, adaptação esta prevista pelo art. 5º da Lei de Introdução às normas do direito brasileiro, que assim reza: "na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum". Os fins sociais e o bem comum são, portanto, sínteses éticas da vida em comunidade, por pressuporem uma unidade de objetivos do comportamento humano social. Os fins sociais são do direito; logo, é preciso encontrar no preceito normativo o seu fim. O bem comum postula uma exigência, que se faz à própria sociabilidade; portanto, não é um fim do direito, mas da vida social. O sentido normativo requer a captação dos fins para os quais se elaborou a norma.

Estas diversas técnicas interpretativas não operam isoladamente, não se

excluem reciprocamente, mas se completam. Na verdade não se deve vê-las como cinco espécies de interpretação, mas como operações distintas que devem sempre atuar conjuntamente, pois todas trazem sua contribuição para a descoberta do sentido e alcance da norma de direito.

A interpretação é una, não se fraciona; é, tão-somente, exercida por vários

processos que conduzem a um resultado final: a descoberta do alcance e sentido da disposição normativa.

Há hipóteses em que o jurista ou o juiz devem lançar mão da interpretação

extensiva para complementar uma norma, ao admitir que ela abrange certos fatos-tipos implicitamente.

Essa interpretação ultrapassa o sentido da norma, avançando até o sentido

literal possível desta, concluindo que o alcance da lei é mais amplo do que indicam seus termos.

Há, ainda, a necessidade de se reconduzir a norma ao campo de aplicação

que corresponde ao fim que pretende obter, para o caso de ter sido formulada de modo amplo. Nesses casos, valendo-se da interpretação restritiva, restringe-se o sentido normativo, com o escopo de dar àquela norma aplicação razoável e justa.

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Ter-se-á uma interpretação dita declarativa, ou especificadora, apenas

quando houver correspondência entre a expressão liguístico-legal e a voluntas legis, sem que haja necessidade de dar ao comando normativo um alcance ou sentido mais amplo ou mais restrito. Tal pode ocorrer porque o sentido da norma condiz com a sua letra, de modo que o intérprete e o aplicador tão-somente declaram que o enunciado normativo contém apenas aqueles parâmetros que se depreender de sua letra.

Assim, o intérprete, ao compreender a norma jurídica, descobrindo seu

alcance e significado, refaz o caminho compreendido entre o que se pode chamar a fórmula normativa e o ato normativo em si, com o fim de aplicar em toda sua plenitude o significado nela objetivado.

Walter Américo Soares da Silva Junior (Niterói/RJ) respondeu:

Os processos tradicionais de interpretação do direito são classicamente

denominados de: 1) método gramatical; 2) método sistemático; 3) método histórico; 4) método sociológico; 5) método teleológico. Pelo método gramatical, extrai-se o sentido normativo a partir da interpretação literal do enunciado, não se admitindo entendimentos flexíveis quanto a estrita consideração do texto literal. O método sistemático preconiza que o texto constitucional ou legal deve ser interpretado em conjunto com outras regras legais ou constitucionais, que possam influenciar a construção da norma, no caso concreto. Ou seja, se há dúvida interpretativa, esta deve ser solucionada considerando-se a influência de outras regras ou princípios, de modo que o sentido normativo não conflite com o arcabouço normativo como um todo, exemplificado na clássica imagem da pirâmide normativa de Kelsen, que hierarquiza as espécies normativas, com a Constituição no topo. Por sua vez, o método histórico é utilizado quando o contexto histórico da produção normativa for importante para a delimitação do seu sentido atual. O método sociológico coincide com o surgimento da sociologia e a preocupação com os reflexos sociológicos do Direito na realidade social, de modo que a consideração das consequências práticas da norma na vida das pessoas em sociedade passam a ter destaque. Por fim, o sentido teleológico diz respeito à apreciação da finalidade do legislador, ou seja, investiga-se qual foi a intenção imanente à elaboração daquele determinado texto normativo, de modo que esse fim intrínseco é que instrumentalizará a atividade interpretativa, quando a literalidade do texto normativo, por exemplo, não for suficiente para a regulação do caso concreto.

Carina Márcia Dahmer (Carazinho/RS) respondeu:

Os processos tradicionais de interpretação do direito são realizados mediante

a utilização dos métodos gramatical, sistemático, histórico, teleológico e sociológico. O método gramatical consiste na captação do significado e o alcance das

palavras do preceito legal, bem como de sua função sintática, a fim de delimitar qual pode

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ou deve ser o sentido de um dado dispositivo. Sem dúvida, é o primeiro processo para a interpretação da norma.

Já o método sistemático corresponde à comparação de um dado texto legal

com outros que tratem da mesma matéria, de forma a interpretá-lo como parte de um todo. Tal forma de interpretação é preciosa para identificar quando um preceito normativo é regra geral ou constitui exceção. Ademais, permite a interpretação harmoniosa e interdependente das normas componentes do ordenamento jurídico, interpretando o direito sob o prisma holístico.

No que diz com o método histórico, refere-se ao exame dos antecedentes do

preceito legal, seja de sua tramitação legislativa, seja de sua conjuntura política, econômica e social. Por tal forma de interpretação, é evidente que o direito é dinâmico e se modifica, no entanto, a partir da análise de sua exegese, é possível interpretar as causas das alterações legislativas.

No tocante ao método teleológico, diz-se que é o processo de descoberta do

fim a que a norma se dirige. Deste procedimento extraem-se máximas, tal como: não se pode extrair interpretação em desfavor de quem a lei pretende proteger, aplicável, de forma evidente, no âmbito do Código de Defesa do Consumidor.

Por fim, quanto ao método sociológico, é aquela em que o intérprete visa a

adaptar o sentido da lei às realidades e necessidades sociais. Um exemplo é o disposto no art. 5º da Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro, segundo a qual: na aplicação da lei o Juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.

Ludmila Silva Luz (Salvador/BA) respondeu:

Os processos tradicionais de interpretação do direito são a Gramatical ou

Literal (Filológica), Lógica ou Racional, Sistemática ou Orgânica, Histórica e Sociológica ou Teleológica.

A interpretação Gramatical ou Literal (Filológica) é parte da norma, baseando

o significado das palavras empregadas pelo legislador, não isoladamente, mas em conexão lógica e sintática com as demais. Ela dá prevalência ao sentido técnico das mesmas, sobre o usual. É a que estabelece o sentido objetivo da lei com base em sua letra, ou seja, realiza a interpretação por meio da literalidade do dispositivo normativo em face das regras gramaticais vigentes.

A interpretação Lógica ou Racional é a que se baseia na investigação do “ratio

legis” (razão, fato gerador do Direito), buscando o sentido e o alcance da lei, aplicando ao dispositivo um conjunto de regras tradicionais e precisas, tomadas de empréstimo da Lógica Formal (Silogística), ou seja, é a investigação do fim ou da razão da lei para fixar-lhe a seu real sentido.

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No processo racional, encontramos: a “mens legislatori” (a mensagem ou o espírito do legislador); a “mens legis” (o espírito da lei); a “ occasio legis”(tempo em que foi elaborada a lei); o argumento a “contrario sensu”(o significado da norma por exclusão); o argumento a “fortiori”(quem pode mais pode menos).

Já a interpretação Sistemática ou Orgânica é a que considera o caráter

estrutural do Direito, não interpretando isoladamente as normas, mas sim, adaptando o sentido da norma ou espírito do sistema.

A interpretação Histórica é a interpretação fundada em documentos

históricos do Direito (projetos de lei, debates do Legislativo, pareceres, emendas etc.) - (não tem força vinculativa para fixar o sentido real da “mens legis”).

Por fim, a interpretação Sociológica ou Teleológica é a investigação dos

motivos provocadores da lei e de seus efeitos sociais, e conferir se ele atende às necessidades econômicas, políticas e sociais da exegese (vê o sistema jurídico como um subsistema do sistema social, e não como um sistema autônomo).

Peça (elaborada pelo Defensor Público Federal Dr. Edson Filho) O Sr. JOÃO DA SILVA foi denunciado pelo Ministério Público Federal pela suposta prática do crime previsto no art. 334, § 1º, alínea “c”, do Código Penal (processo nº xxxxxxxxxxx). Segundo o MPF, o acusado, que responde ao processo em liberdade, teria mantido em depósito e exposto à venda mercadorias de origem estrangeira, introduzidas clandestinamente no território nacional. As mercadorias apreendidas (auto de apreensão lavrado em 24/01/2014) consistiriam em brinquedos eletrônicos produzidos na China e avaliados em R$ 32.000,00 (trinta e dois mil reais). Não se tem notícia da finalização do processo administrativo tributário, inexistindo nos autos informação sobre o valor dos tributos supostamente elididos. O Juízo da 1ª Vara Federal Criminal da Seção Judiciária de São Paulo recebeu a denúncia em 22/04/2014. A DPU apresentou resposta à acusação, alegando questões preliminares e de mérito e requerendo a absolvição sumária do acusado. Apreciando a acusação apresentada pela DPU, o Juízo Federal afirmou genericamente que as alegações da DPU deverão ser melhor analisadas na sentença, após o término da

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instrução processual. Em consequência, designou audiência una de instrução e julgamento para o dia 10/06/2014. Vieram os autos à DPU para ciência da supramencionada decisão. Na condição de Defensor Público Federal responsável pelo caso, ingresse com a medida judicial cabível.

Segue, abaixo, o espelho utilizado para fins de correção das peças

encaminhadas ao GEDPU, constando todos os aspectos que deveriam ter sido abordados pelos candidatos e um “texto-resposta-padrão” correspondente a cada aspecto, de forma que o próprio espelho já servirá como a peça. Além disso, foram acrescidas observações importantes sobre alguns dos tópicos cobrados.

Rodada [2014.19]

QUESTÕES INICIAIS

ENDEREÇAMENTO E INTRODUÇÃO (com identificação do

impetrante, paciente e autoridade impetrada)

EXMO SR DESEMBARGADOR FEDERAL PRESIDENTE DO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3° REGIÃO

Processo originário nº xxxxxxxxxxx

A DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO, por intermédio do Defensor

Público Federal que esta subscreve, vem respeitosamente

perante Vossa Excelência, com fundamento nos arts. 5º, LXVIII,

108, I, “d”, da Constituição Federal, e 648, I do Código de

Processo Penal, impetrar o presente

A peça adequada seria o

Habeas Corpus.

Vale mencionar que não

cabe recurso em sentido

estrito contra a decisão

que recebe a denúncia,

mas apenas contra

aquela que a rejeita (art.

581, inciso I, do CPP).

De outro lado, não se

mostra acertada a

apresentação de

reclamação

constitucional, visto

que, embora se possa

defender corretamente

a aplicação do

entendimento da 24ª

NOTA GEDPU:

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HABEAS CORPUS, com pedido liminar

em favor de JOÃO DA SILVA (qualificação), contra ato do Juiz

Federal da 1ª Vara Criminal Federal da Seção Judiciária de São

Paulo, nos autos do processo nº nº xxxxxxxxxxx, pelos motivos de

fato e de direito a seguir expostos.

Súmula vinculante do

STF ao crime de

descaminho, ante à sua

natureza tributária, não

se pode afirmar que

houve ofensa direta ao

referido enunciado, que

se limita ao crime

previsto art. 1º da Lei nº

8.137/90.

1. OBSERVÂNCIA DAS PRERROGATIVAS DA DEFENSORIA

PÚBLICA DA UNIÃO (artigo 44, I, LC 80/94)

Aos membros da Defensoria Pública são conferidas as

prerrogativas previstas no art. 44, I, da Lei Complementar nº

80/1994, que deverão ser observadas em qualquer processo

judicial ou administrativo, dentre as quais a intimação pessoal,

com remessa dos autos, e a contagem em dobro de todos os

prazos processuais.

Imperiosa, portanto, a observância das referidas prerrogativas

no presente feito, sob pena de nulidade.

Desnecessário pedir

justiça gratuita, uma vez

que no habeas corpus

inexiste pagamento de

custas processuais ou

condenação em

honorários de

sucumbência.

DOS FATOS

2. DA SÍNTESE FÁTICA

O PACIENTE foi denunciado pelo Ministério Público Federal (processo nº xxxxxxxxxxx) pela

suposta prática do crime previsto no art. 334, § 1º, alínea “c”, do Código Penal.

Segundo o MPF, o acusado teria mantido em depósito e exposto à venda mercadorias de

origem estrangeira, introduzidas clandestinamente no território nacional.

As mercadorias apreendidas (auto de apreensão lavrado em 24/01/2014) consistiriam em

brinquedos eletrônicos produzidos na China e avaliados em R$ 32.000,00 (trinta e dois mil

reais).

O processo administrativo tributário não foi finalizado, não tendo havido a prévia

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constituição do crédito tributário. Ademais, inexiste nos autos informação sobre o valor

dos tributos supostamente elididos.

Não obstante isso, a autoridade coatora recebeu a denúncia oferecida pelo MPF.

A DPU apresentou resposta à acusação, requerendo a absolvição sumária do acusado.

A autoridade impetrada deixou de absolver sumariamente o paciente, afirmando

genericamente que as alegações da DPU deverão ser melhor analisadas na sentença,

após o término da instrução processual. Em consequência, designou audiência una de

instrução e julgamento para o dia 10/06/2014.

Com a devida vênia, equivocado o posicionamento da autoridade coatora, motivo pelo

qual se impetra o presente Habeas Corpus, objetivando o trancamento da ação penal

instaurada em desfavor do paciente.

3. DA FUNDAMENTAÇÃO

(Sugere-se que a fundamentação seja subdividida em tópicos, para facilitar o

desenvolvimento do raciocínio do candidato e a sua compreensão pelo examinador)

Aspectos Avaliados Avaliaçã

o

Comentários

3.1. DA NÃO CONSTITUIÇÃO PRÉVIA DO TRIBUTO: ausência de condição para o

exercício da ação penal

De início, é preciso observar que a ação penal instaurada em desfavor do paciente carece

de uma condição objetiva de procedibilidade, qual seja, a prévia constituição do crédito

tributário na esfera administrativa.

Com efeito, o processo administrativo tributário não foi finalizado, não tendo havido a

constituição do crédito tributário, não havendo como se defender a configuração do delito

de descaminho, haja vista que tal espécie delitiva tem como elementar a ilusão do tributo.

Nesse sentido, inclusive, é a jurisprudência pacífica do STJ:

“PENAL – HABEAS CORPUS – DESCAMINHO – TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL –

AUSÊNCIA DE PRÉVIA CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO NA ESFERA

ADMINISTRATIVA – NATUREZA TRIBUTÁRIA DO DELITO – ORDEM CONCEDIDA. 1.

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Consoante recente orientação jurisprudencial do egrégio Supremo Tribunal Federal,

seguida por esta Corte, eventual crime contra a ordem tributária depende, para sua

caracterização, do lançamento definitivo do tributo devido pela autoridade

administrativa. 2. O crime de descaminho, por também possuir natureza tributária, eis

que tutela, dentre outros bens jurídicos, o erário público, deve seguir a mesma orientação,

já que pressupõe a existência de um tributo que o agente logrou êxito em reduzir ou

suprimir (iludir). Precedente. 3. Ordem concedida para trancar a ação penal ajuizada

contra os pacientes no que tange ao delito de descaminho, suspendendo-se, também, o

curso do prazo prescricional.” (HC 109205/PR, Rel. Ministra JANE SILVA

(DESEMBARGADORA CONVOCADA DO TJ/MG), SEXTA TURMA, julgado em 02/10/2008,

DJe 09/12/2008)

Vale mencionar que, sendo o descaminho um crime de natureza tributária, aplica-se ao

presente caso o teor da Súmula Vinculante nº 24 do STF, que assim dispõe:

“Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no artigo 1º incisos I a

IV da lei 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo”.

Dessa forma, impõe-se a anulação, ab ovo, da ação penal originária, absolvendo-se

sumariamente o paciente.

3.2. DA AUSÊNCIA DE QUANTIFICAÇÃO DO VALOR DOS TRIBUTOS SUPOSTAMENTE

ELIDIDOS: ofensa à ampla defesa – inépcia da inicial

Em homenagem ao princípio da eventualidade, na remota hipótese de se ver ultrapassada

a discussão anterior acerca da ausência de condição de procedibilidade desta ação penal,

cumpre observar que não consta dos autos sequer a quantificação do tributo que deveria

ser pago na hipótese de importação regular das mercadorias apreendidas.

Dessa forma, como a “ilusão do pagamento do tributo” é elementar do crime previsto no

art. 334, segunda parte, do Código Penal (descaminho), é certo que a ausência da

quantificação do tributo, pela autoridade tributária (ainda que de forma estimada),

impede o exercício da ampla defesa, pelo que a denúncia deve ser considerada inepta.

Perceba-se, nesse sentido, que o art. 65 da Lei nº 10.833/2003 estabelece que, para fins

de formalização do processo administrativo fiscal e de representação fiscal para fins

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penais, deve ser realizado o cálculo, ainda que estimado, do Imposto de Importação e do

Imposto sobre Produtos industrializados que seriam devidos para a importação.

O fato é que a não indicação do montante (ainda que estimado) dos tributos

supostamente elididos, tanto na denúncia quanto no procedimento administrativo fiscal,

à revelia da legislação tributária, impede efetivamente o exercício do direito de defesa,

haja vista que até mesmo a análise da tipicidade material do delito fica prejudicada pela

omissão deste dado essencial.

Pelo exposto, deve ser reconhecida a inépcia da denúncia, que deixou de trazer elemento

essencial ao tipo penal e ao exercício amplo do direito de defesa, absolvendo-se o

acusado.

3.3. DA ATIPICIDADE MATERIAL DA CONDUTA DO PACIENTE – PRINCÍPIO DA

INSIGNIFICÂNCIA

Muito embora não tenha sido esclarecido qual seria o valor dos tributos supostamente

elididos, conforme esclarecido no tópico anterior, é certo que o referido valor é inferior a

R$ 20.000,00 (vinte mil reais).

Isso porque, o art. 65 da Lei nº 10.833/2003 estabelece que, para fins de realização de

estimativa do montante dos tributos que seriam devidos, pode-se aplicar uma alíquota de

50% (cinquenta por cento), de forma que, tendo as mercadorias apreendidas sido

avaliadas em R$ 32.000,00 (trinta e dois mil reais), é certo que o valor dos tributos

supostamente elididos não ultrapassaria o montante de R$ 16.000,00 (dezesseis mil

reais).

Diante de tal conclusão, é evidente que a conduta imputada ao paciente é absolutamente

atípica sob o ponto de vista penal. Conforme cediço, o crime é muito mais do que a mera

subsunção do fato à norma, pois se necessita da produção de um resultado jurídico

relevante, o que não ocorre em hipóteses em que, como no caso presente, a lesão ao bem

jurídico é irrelevante.

Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal (STF) tem posicionamento pacífico no sentido

de que, para aplicação do princípio da insignificância, devem estar presentes os seguintes

requisitos: i) mínima ofensividade da conduta do agente; ii) mínima periculosidade social

da ação; iii) reduzido grau de periculosidade do agente; e iv) inexpressividade da lesão

jurídica provocada.

Especificamente quanto aos crimes tributários, entende o STF que é possível aferir–se

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objetivamente a significância penal das condutas supostamente criminosas, entendendo-

se que é irrelevante sob o ponto de vista penal a conduta que gerar um débito fiscal

inferior ao valor estabelecido pela Administração Fazendária para o não ajuizamento de

execuções fiscais, conforme previsto no art. 20 da Lei º 10.522/02 (alterada pela Lei nº

11.033/04) e nas Portarias 75 e 130/2012 do Ministério da Fazenda, ou sej: R$ 20.000,00.

De fato, como o bem jurídico tutelado nos crimes tributários (inclusive no descaminho) é o

erário público e a atividade arrecadatória do Estado, e considerando que, na esfera

administrativa, não há o interesse em movimentar o Poder Judiciário para a cobrança dos

valores dos tributos supostamente evadidos (R$ 16.000,00), seria um contrassenso

movimentar a máquina judiciária para punir o fato em discussão, haja vista o princípio da

fragmentariedade do direito penal.

Eis o entendimento do STF sobre o tema:

EMENTA HABEAS CORPUS. DIREITO PENAL. DESCAMINHO. VALOR INFERIOR AO

ESTIPULADO PELO ART. 20 DA LEI 10.522/2002. PORTARIAS 75 E 130/2012 DO

MINISTÉRIO DA FAZENDA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. APLICABILIDADE. ORDEM

CONCEDIDA. 1. A pertinência do princípio da insignificância deve ser avaliada

considerando-se todos os aspectos relevantes da conduta imputada. 2. Para crimes de

descaminho, considera-se, para a avaliação da insignificância, o patamar de R$

20.000,00, previsto no art 20 da Lei n.º 10.522/2002, atualizado pelas Portarias 75 e

130/2012 do Ministério da Fazenda. Precedentes. 3. Na espécie, aplica-se o princípio da

insignificância, pois o descaminho envolveu elisão de tributos federais que perfazem

quantia inferior ao previsto no referido diploma legal. 4. Ordem concedida.

(HC 120617, ROSA WEBER, STF.)

Assim, impõe-se o reconhecimento da ausência de tipicidade material, ante à

insignificância da conduta, devendo o paciente ser sumariamente absolvido.

3.4. DOS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DA MEDIDA LIMINAR

Cristalina é a presença dos pressupostos para a concessão liminar da ordem de habeas

corpus, quais sejam, o fumus boni juris e o periculum in mora.

Nesse sentido, o fumus boni juris está evidenciado nos argumentos trazidos no bojo deste

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writ, que tornam evidente a ausência de condição de procedibilidade da ação, a inépcia

da denúncia e a atipicidade material da conduta.

De outro lado, o periculum in mora consubstancia-se no prejuízo gerado ao paciente pela

própria tramitação de uma ação penal sem a presença de justa causa, donde consta

inclusive designação de audiência de instrução e julgamento para o dia 10/06/2014.

4. DOS PEDIDOS

a) processualmente, a intimação pessoal da Defensoria Pública da União de todos os atos

processuais e a contagem em dobro de todos os prazos, na forma do artigo 44, inciso I,

da Lei Complementar nº 80/94;

b) a concessão liminar da ordem de habeas corpus, determinando-se o sobrestamento da

ação penal instaurada contra o paciente na 1ª Vara da Seção Judiciária de São Paulo;

c) a notificação da autoridade coatora para apresentação das informações cabíveis, no

prazo legal, e, bem assim, a abertura de vistas ao MPF, para manifestação;

d) e, ao final, a ratificação da liminar concedida, determinando-se o trancamento em

definitivo da ação penal instaurada em desfavor do paciente.

Local, data e assinatura

Outras Observações:

NOTA GEAGU: O presente espelho foi elaborado pelos mediadores e colaboradores do

GEDPU para fins de preparação, podendo a eleição dos aspectos formais e materiais sob

análise diferir do adotado pelas bancas de concurso. A análise da redação considera

aspectos de estilo, coesão, coerência e estrita observância aos pontos elencados.