Análise e alternativas para a implementação de uma política de desenvolvimento regional em...
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Trabalho final apresentado como requisito para conclusão do
MPA – Mestrado em Políticas Públicas e Administração
Universidade Nova de Lisboa
Políticas de Desenvolvimento Regional
em Portugal
Análise e alternativas para a implementação de uma
política de desenvolvimento regional
Autor: Nuno Vaz da Silva
Orientador: Professor Dr. Álvaro Ferreira da Silva
Janeiro de 2008
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Resumo
Este trabalho estuda o problema das assimetrias regionais em Portugal e
apresenta um conjunto de opções de política para a resolução da matéria. O
relatório analisa as diversas origens possíveis para o problema, do ponto de vista
económico, e tem uma atenção particular para as soluções de cariz institucional,
nomeadamente a regionalização. Esta opção é criticada em prol de uma geometria
variável de medidas e instrumentos de intervenção, passíveis de serem adequados a
diversas necessidades de desenvolvimento regional. No entanto, o sucesso da
ultrapassagem das assimetrias regionais dependerá sempre do êxito da
implementação dessa mesma política.
Palavras-chave: Desenvolvimento Regional, Regionalização, Quadro
Institucional, Políticas Públicas
Abstract
This paper analyses the problem of regional asymmetries in Portugal and
presents a set of policy options for the resolution of the matter. The study examines
the various possible sources for the problem of economic point of view and has a
particular attention to the institutional solutions, namely the regionalization. This
option is criticized for a variable geometry of measures and instruments of
intervention, which can be tailored to different needs of regional development.
However, the success of overcoming the regional asymmetries always depend on the
success of the implementation of that policy.
Keywords: Regional Development, Regionalization, Institutional Framework,
Public Policies
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” Eu não pertenço a nenhuma das gerações revolucionárias. Eu
pertenço a uma geração construtiva.
(…)
Eu sou aquele que se espanta da própria personalidade e creio-me
portanto, como português, com o direito de exigir uma pátria que
me mereça. Isto quer dizer: eu sou português e quero portanto que
Portugal seja a minha pátria.
Eu não tenho culpa nenhuma de ser português, mas sinto a força
para não ter, como vós outros, a cobardia de deixar apodrecer a
pátria.
(…)
Vós, ó portugueses da minha geração, que, como eu, não tendes
culpa nenhuma de serdes portugueses.
Insultai o perigo.
Atirai-vos prà glória da aventura.
Desejai o record.
Dispensai as pacíficas e coxas recompensas da longevidade.
Divinizai o Orgulho.
Rezai a Luxúria.
Fazei predominar os sentimentos fortes sobre os agradáveis.
Tende a arrogância dos sãos e dos completos.
Fazei a apologia da Força e da Inteligência.
Fazei despertar o cérebro espontaneamente genial da Raça Latina.
Tentai vós mesmos o Homem Definitivo.
Abandonai os políticos de todas as opiniões: o patriotismo
condicional degenera e suja; o patriotismo desinteressado glorifica
e lava.
Fazei a apoteose dos Vencedores, seja qual for o sentido, basta que
sejam Vencedores. Ajudai a morrer os vencidos.
Gritai nas razões das vossas existências que tendes direito a uma
pátria civilizada.
Aproveitai sobretudo este momento único em que a guerra da
Europa vos convida a entrardes prà Civilização.
O povo completo será aquele que tiver reunido no seu máximo
todas as qualidades e todos os defeitos.
Coragem, Portugueses, só vos faltam as qualidades.
Lisboa, Dezembro de 1917.”
Almada Negreiros in “ULTIMATUM FUTURISTA- Às gerações
portuguesas do século XX “
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1. Introdução
Este projecto foi desenvolvido no âmbito do trabalho final de Mestrado em
Políticas Publicas e Administração, leccionado pela Universidade Nova de Lisboa, e
teve como orientador o Senhor Professor Doutor Álvaro Ferreira da Silva.
Este estudo parte da constatação da importância crescente do problema das
assimetrias regionais, analisa as suas origens, e procura identificar um conjunto de
alternativas políticas e técnicas, que podem contribuir para a resolução desta
problemática. Apesar de alguns autores defenderem que a solução para o caso
português reside apenas em aspectos institucionais, nomeadamente na
regionalização, este estudo pretende explorar também outras ferramentas que
podem ser aplicadas em contextos políticos diversos e consoante a dinâmica
socioeconómica das regiões, nomeadamente a constituição de agências de
desenvolvimento, a contratualização pública, os distritos industriais ou ainda um
conjunto de soluções técnicas que estão aos dispor dos decisores públicos.
Existem vários motivos para combater as assimetrias regionais. Para além
dos aspectos relacionados com o bem-estar social, o desenvolvimento das regiões
potencia a eficiência económico-social do território e das populações, principalmente
numa óptica de coesão.
Num Master in Public Policy, definido como um programa transversal a
várias áreas de actuação, parece-me fazer todo o sentido analisar este problema, as
suas causas e seus efeitos, bem como as alternativas político-técnicas que podem
contribuir para a sua resolução.
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O ponto de início deste trabalho é a apresentação e sistematização de
conceitos e a justificação para o crescente interesse pelo desenvolvimento regional.
De seguida, são identificados os motivos económicos e institucionais que fazem das
assimetrias regionais um problema. As questões relacionadas com os efeitos
adversos das políticas da União Europeia são também discutidas. Partindo para um
campo mais analítico, são exploradas as causas para a existência de assimetrias,
com uma tónica nos motivos institucionais, o que levou à avaliação do quadro
institucional português em comparação com outros países europeus. Após esta
análise comparativa, são identificadas algumas das alternativas políticas e técnicas
que podem contribuir para a resolução dos problemas das assimetrias regionais.
Por fim, é apresentada uma estratégia para a implementação de uma nova e
eventual política pública de desenvolvimento regional, mediante a utilização de um
modelo de acção genérico mas aplicado à realidade do país.
2. Região, Desenvolvimento Regional – Algumas notas conceptuais
A primeira grande dificuldade na análise das questões regionais é a definição
do conceito de Região. Para Simões Lopes (2001) é uma entidade real, objectiva e
concreta que facilmente pode ser identificada. Para outros é um conceito observável
(Bauchet, 1955), um artifício para classificação, uma ideia, um modelo que vai
facilitar a análise permitindo diferenciar espacialmente o objecto de estudo. O
conceito de Região não deve ser confundido ainda com o de Espaço (Boudeville,
1972). O espaço pode ser definido a partir de um conjunto de dados económicos
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localizados, podendo as localizações ser dispersas. O que dá unidade ao espaço são
as suas características e a natureza das relações de interdependência.
A região tem de ser definida de forma mais restrita, recorrendo a dois
critérios fundamentais: critério da homogeneidade e o critério da polarização (Lopes,
2002). Podemos ainda considerar o critério de política, de programação ou
planeamento, quando os objectivos estão associados ao controlo da evolução do
sistema, isto é, quando razões de intervenção determinem a formulação de políticas.
Se numa primeira fase houve intenção de criar regiões formais, hoje
caminha-se para a criação de regiões funcionais (Cabugueira, 2000) e adaptadas
aos processos, ao quadro institucional, e aos objectivos que se pretendem atingir. As
regiões formais representam áreas geográficas dotadas de uniformidade relativa ou
uniformidade face a determinado atributo variável. Este atributo, que começou por
ser predominantemente físico, passou depois a ser de ordem económica e, mais
tarde, de ordem social e política. A definição de regiões formais baseia-se sobretudo
em critérios de homogeneidade. Numa segunda fase, as preocupações dos
decisores públicos começaram a orientar-se para o funcionamento das regiões no
sistema, privilegiando a definição de regiões funcionais, entendidas como áreas
geográficas dotadas de coerência funcional, avaliadas a partir das relações de
interdependência. Na base da definição de regiões funcionais estão preocupações
associadas à natureza e intensidade das interacções de ordem económica, em
regra, identificadas no espaço por pólos (industriais), nós (de comunicação) ou
centros (de serviços). Em suma, “pontos” de elevada intensidade de relações. A
delimitação de regiões funcionais envolve o agrupamento de unidades geográficas
contíguas que revelem um grau de interdependência elevado. A uniformidade relativa
deixa de ser preocupação para passarem a interessar os fluxos e as relações de
interdependência.
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Em termos estatísticos existem também dificuldades de comparação entre
países, da informação desagregada ao nível da região. Por exemplo, a superfície da
menor região da OCDE (Concepcion de Buenos Aires, México) é inferior a 10 km²,
enquanto a da maior (Nunavut, Canadá) é superior a 2 000 km². Do mesmo modo, a
população das regiões da OCDE varia entre 400 habitantes no Balance ACT
(Austrália) e mais de 47 milhões em Janto (Japão) (OCDE, 2005). Estas diferenças
acabam por potenciar o enviesamento da leitura dos indicadores de comparação
inter-regiões (Mourão, 2004).
Desenvolvimento regional não implica necessariamente crescimento regional.
O crescimento regional é apenas um meio para se atingir o objectivo final do
desenvolvimento (Lopes, 2002). Desenvolvimento regional e desenvolvimento global
são também realidades distintas. A aposta no desenvolvimento global pode até
conduzir a uma maximização da capacidade produtiva, numa polarização que poderá
levar a maiores assimetrias regionais (Lopes, 2001).
Mas o que é afinal o desenvolvimento regional? Como se mede? Embora não
exista uma definição única, pode ser definido como o aumento do PIB per capita
associado à melhoria do padrão de vida da população (Sandroni, 1996) ou, um
aumento sustentado e irreversível do rendimento real por habitante (Polése, 1998).
No entanto, esta definição pode ser considerada falaciosa. Um aumento do
rendimento per capita absoluto numa determinada região, pode não implicar o
desenvolvimento dessa região. Ou seja, se existirem outras regiões com maiores
crescimentos do rendimento real per capita, em termos relativos, podemos até
estar perante uma situação de aumento das assimetrias e não de desenvolvimento.
Para analisar a política regional é fundamental discutir quais as intenções
dessa política. Embora possa ter um cariz misto, a política terá eventualmente uma
tendência para a eficiência económica ou para a equidade social (Alves e Moreira,
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2004). Estes objectivos de segunda linha (secundários face ao desenvolvimento
regional) acabam por ser fundamentais para a estruturação das políticas e para a
avaliação das mesmas. Diferentes políticas e diferentes objectivos têm formas
distintas de avaliação e comparação. Por exemplo, pode medir-se o desenvolvimento
regional através do PIB per capita, da taxa de desemprego, do investimento líquido,
do índice de desenvolvimento humano e, porque não, através da taxa de
alfabetização ou da taxa de natalidade.
Existem três grandes razões para combater as assimetrias regionais (Porto,
2002): razões de índole ético-social e política, razões de índole económica e razões
relacionadas com economias de escala e de rede. Dentro das razões de índole ético-
social e política consideram-se as preocupações com a injustiça social da qualidade
de vida das populações mais desfavorecidas, que vivem em condições abaixo do nível
considerado aceitável e/ou da média do espaço ou país. As razões de índole
económica têm em conta as deseconomias externas, resultantes das excessivas
concentrações verificadas nas regiões e áreas urbanas mais desenvolvidas, pondo
em causa não só o crescimento, como os níveis de satisfação social dos seus
habitantes. Existem aindas deseconomias externas associadas à excessiva
dispersão populacional, dado que os custos dos investimentos públicos em
infraestruturas, equipamentos e serviços não têm, nestas zonas, retorno eficiente.
Entre as razões relacionadas com economias de escala e de rede reconhece-se que
as facilidades proporcionadas pelas novas tecnologias de comunicação e
informática, ao nível regional, podem contribuir para o aumento do crescimento
global dos países, com um aproveitamento muito mais completo e eficiente dos
recursos disseminados pelo seu território. Ou seja, a preocupação com o
desenvolvimento vai além de meras políticas de solidariedade e de convergência.
Tem em conta o potencial de desenvolvimento estrutural dos espaços e regiões
contíguas. Daí, a necessidade da implementação sistémica de processos dinâmicos
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de planeamento como forma de aprendizagem e troca de informação inter-regiões
(Reigado, 2000).
O crescente interesse de áreas como a Economia nas questões do
desenvolvimento regional, deve-se sobretudo às amplas oportunidades que a
desagregação espacial permite em termos do estudo do comportamento social e da
variável espaço (Lopes, 2001). Outras teorias defendem que esta crescente
preocupação se deve ao interesse dos decisores de políticas públicas em entender
os factores que levam ao aumento do PIB per capita, nomeadamente no que diz
respeito às variáveis que influenciam a velocidade de convergência das regiões com
maior deficit de desenvolvimento, o que representa um certo revivalismo do modelo
de crescimento neoclássico (Amstrong e Taylor, 2000). O desenvolvimento regional
é cada vez mais fundamental como forma de orientar a globalização para o
aproveitamento dos recursos endógenos e uma mais valia para sua regulação
(Lopes, 2002).
Em suma, falar de desenvolvimento regional implica definir o conceito de
forma clara e concisa. A expressão pode ter múltiplas interpretações e referir-se a
políticas com cariz distinto. Neste trabalho não se pretende formular um novo
conceito de desenvolvimento, nem de região, mas sim definir opções de política que
podem ser articuladas, no sentido de um maior desenvolvimento em termos de
aumento de bem-estar relativo da população de uma determinada região ou espaço
geográfico. A secção seguinte pretende demonstrar a existência de assimetrias
regionais como um problema estrutural da Europa em geral, e de Portugal, em
particular.
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3. As assimetrias regionais como problema
Em seis dos 30 países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento
Económico (OCDE), tomando como base o ano de 2003, mais de um quinto da
população estava concentrada numa única região. Portugal, embora não estivesse
nesse grupo, estava em 7º lugar com 19% da população do país a viver na Grande
Lisboa.
Gráfico I: Percentagem da população nacional que vive na maior região urbana de
um país da OCDE, com mais de 1,5 milhões de habitantes (2003)
0%
5%
10%
15%
20%
25%
30%
35%
40%
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Berlin
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Regiões Urbanas
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Fonte: OCDE Regions at a Glance, OCDE 2007
Estes dados poderiam indiciar uma certa correlação entre a concentração
demográfica e a área dos países. No entanto, notemos que dentro dos seis
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primeiros países temos, por exemplo, a Austrália com uma área de 7.000.000 Km2
e uma população global de cerca de 21.000.000 habitantes e a Áustria com uma
área de 83.000 Km2 e uma população de 8.000.000 habitantes. Ou seja, embora
possa haver alguma correlação que depende ainda da percentagem do país que a
região urbana ocupa, este factor só por si, não é decisivo nem justificativo da
concentração populacional. Apesar desta questão geográfica já ser preocupante, as
perspectivas indicam que ainda se irá registar uma maior concentração num futuro
próximo. Os dados do estudo “Prospectivas de Urbanização do Mundo” (UN, 2005),
prevêem que em 2015, 27.7% da população portuguesa esteja concentrada na
grande Lisboa e que 13.3% da população esteja no grande Porto. A excessiva
concentração de pessoas e actividades – capazes de gerar inovação e investimento
– nas grandes metrópoles, contrasta assim, com a secundarização do papel das
cidades médias e a desertificação do interior rural.
As assimetrias não são apenas de efeitos demográficos. O produto interno
per capita apresenta também diferenças significativas.
Pelas estatísticas da União Europeia, uma extensão significativa do território
português continua com níveis de PIB per capita entre 50% e 75% (European
Comission, 2006) da média comunitária (UE 27), enquanto a região de Lisboa e Vale
do Tejo apresenta um PIB per capita de cerca de 100% da média comunitária.
Como este indicador se apoia num rácio entre o PIB e o número de habitantes,
conclui-se que em regiões como o Alentejo, a quebra é ainda mais expressiva, dado
que foi acompanhada também por uma diminuição da população. O PIB per capita
no Alentejo em 2000 era de 76.9% e em 2004, 70.3% da média EU27 (Eurostat,
2006). A média nacional, utilizando como referência a UE 27 é de 75% ou 73% se
considerarmos como referência a EU 25 (dados referentes a 2004) (CCDR-LTV,
2007).
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Mapa I: GDP per capita, em PPC, por NUTS 2, 2004
(Percentagem da média EU27=100)
Fonte: Eurostat Regional Yearbook, 2007
Comparando Portugal a países similares, constata-se que, no mesmo ano
(2004), a Irlanda registou um PIB per capita de cerca de 139% em relação à média
comunitária EU25, enquanto que a Bélgica apresentou uma percentagem de 119%
(EUROSTAT, 2005). Estes valores são indicativos da diferença entre os países mas
pouco nos dizem relativamente à amplitude das assimetrias regionais. No entanto,
comparando de novo Portugal à Irlanda (Eurostat, 2007), no ano de 2004, a região
GDP per capita, em PPC, por NUTS 2, 2004
(Percentagem da média EU27=100)
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menos desenvolvida (Centro) representava apenas 56% do produto per capita da
região mais desenvolvida (Lisboa). No caso irlandês, a região com mais assimetrias
(Border, Midland and Western) apresentava um produto per capita de 64% face à
região mais desenvolvida (Southern and Eastern). A Irlanda registou um aumento
das assimetrias entre regiões, uma vez que este indicador em 2000 era 68%.
Portugal reduziu ligeiramente a percentagem, pois o mesmo indicador era de 55%.
Dado que a média da Irlanda é superior à média comunitária esta amplitude tem um
impacto reduzido numa escala global. No caso português, apesar de estarmos
perante uma diminuição (ainda que diminuta) da amplitude entre a região mais e
menos desenvolvida, isso deveu-se sobretudo a uma diminuição do PIB per capita da
região mais desenvolvida (Eurostat, 2005 e 2007).
Como podemos ver no gráfico seguinte, o efeito “dimensão da população” é
determinante. Como seria expectável, a região de Lisboa influencia significativamente
o comportamento da média nacional, assim como a região do Algarve. Em contraste,
a região Norte mostra um menor vigor no crescimento do PIB, sendo dispersa a
localização relativa das respectivas NUTS III. O Alentejo revela, pelo seu lado, alguma
homogeneidade no comportamento das sub-regiões, encontrando-se no quadrante
menos favorável (com as taxas de crescimento em posições inferiores à média
nacional). Com um desempenho favorável em termos de crescimento do PIB, mas
apresentando redução em termos populacionais, encontram-se o Centro, os Açores
(muito próximos da média nacional em ambas as variáveis) e a Madeira (que
evidencia um forte crescimento do PIB e um decréscimo populacional ao longo do
período).
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Gráfico II: Variação da população e do PIB das regiões NUTS II e NUTS III no
período 1991-2003
Fonte: QREN 2007
O estudo “ A Competitividade Territorial e a Coesão Económica e Social das
Regiões Portuguesas” (Mateus, 2005) confirmou também a existência de
assimetrias significativas no nível de desenvolvimento económico e social em
Portugal e evidenciou uma clara preponderância de situações de vulnerabilidade
competitiva. O modelo concreto de desenvolvimento económico e social em acção,
revelou uma clara tendência para a colocação da “coesão à frente da
competitividade”, que pode ser mais “desejada” (opções de política pública, escolhas
Taxa de variação média anual da população 1991-2003 (%)
Taxa
de variação m
édia
anual do P
IB 1
991-2
003 (%
)
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dos eleitores, comportamentos dos cidadãos e dos agentes económicos) ou mais
“sofrida” (consequências da integração europeia e da globalização), e que
compromete, no longo prazo, o próprio ritmo de crescimento económico e de
melhoria do nível de vida da população. No entanto, esta análise pode ser colocada
em causa. Embora não saibamos qual seria a situação do país com outro tipo de
políticas, as disparidades entre as regiões levantam dúvidas acerca dos impactos do
modelo de desenvolvimento económico. Com a concentração da população em
determinados espaços e com as diferenças do PIB per capita ao nível de diferentes
regiões, fica a dúvida se o modelo que privilegiou a coesão à competitividade não teve
efeitos contrários. Os dados parecem paradoxais face aos objectivos das políticas
públicas dos últimos anos – corrigir as carências dos meios mais debilitados. O
desenvolvimento de infra-estruturas de transporte e grandes superfícies comerciais,
o papel das Universidades e Institutos Politécnicos e inúmeras iniciativas políticas
como as “Cidades e Regiões Digitais”, “Acções Inovadoras de Base Regional”,
“Agências de Desenvolvimento Regional” e "Pólos de Competitividade e Tecnologia"
são alguns exemplos de políticas tendentes a promover uma maior coesão regional.
Apesar da atribuição de subsídios comunitários, dos inúmeros planos estratégicos e
das análises económico-sociais que têm vindo a ser implementados, as assimetrias
subsistem.
Para dificultar a solução, constata-se que estamos perante um ciclo vicioso
(Samuelson e Nordhaus, 1998). Quanto mais desigualdades inter-regionais, mais
população se refugia nas áreas desenvolvidas do litoral. Quanto menos população,
menor o número de votos. Quanto menos votos, menor pressão política para quem
compete por cargos, rendas e poder – os responsáveis políticos. Quanto menos
pressão política das zonas desfavorecidas, maior o potencial de subdesenvolvimento.
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As questões do desenvolvimento regional são também objecto de políticas
comunitárias diversas. Embora a política regional europeia não tenha sido instituída
no Tratado de Roma nem nos actos que o alteraram, (Acto Único Europeu, Tratado
de Maastricht, Tratado de Amesterdão), e não tenha a coerência e estabilidade em
termos de objectivos e instrumentos de outras políticas comunitárias (Pires, 1998),
têm vindo a ser implementadas pela União Europeia, um conjunto de orientações e
actuações tendo em vista o desenvolvimento regional, enquanto pilar da coesão
económica e social. O principal elemento da política regional europeia surgiu em
1975 através do Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER). Através das
políticas de solidariedade, a União Europeia contribui para a recuperação das
regiões com atrasos de desenvolvimento, para a reconversão das zonas industriais
em dificuldades, para a diversificação das zonas rurais em declínio ou ainda para a
regeneração dos bairros desfavorecidos. Para demonstrar essa preocupação,
refira-se que as verbas atribuídas à política regional representam mais de 35% do
orçamento global da União Europeia, ou seja, cerca de 213.000 milhões de euros
(UE, 2001).
Apesar de alguns avanços nas últimas décadas, Portugal continua abaixo da
média comunitária na maioria dos indicadores económicos e do conhecimento
(Simões e Godinho, 2006). No entanto, no período 1986 a 2000, houve uma clara
tendência em termos de convergência global, se utilizarmos como indicador o PIB
per capita. Em 1986 Portugal tinha um PIB per capita que era apenas 55% da
média EU15, enquanto que em 2000, esse rácio foi 75.3% (Porto, 2002). Com a
entrada de 12 novos estados membros, em 1 de Maio de 2004, registou-se um
crescimento das disparidades regionais, pois acentuou-se a diferença entre regiões
ricas e pobres (EUROSTAT, 2007). De acordo com o Eurostat, a União Europeia
sofreu um aumento de 20% e a superfície aumentou em cerca de um quarto. Mas o
PIB comunitário apenas aumentou 5%. As disparidades regionais duplicaram. A
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riqueza média per capita numa União com 25 Estados-Membros diminuiu em cerca
de 12,5%. A proporção da população que vive nas regiões com atrasos de
desenvolvimento aumentou, passando de 20% para 25%. Pelos dados da Comissão
Europeia, em 2003, uma em quatro das 298 Regiões da União Europeia,
apresentava um GDP por habitante inferior a 75% da média comunitária (da Europa
a 27).
Estes indicadores permitem concluir que as políticas de coesão não
cumpriram o seu objectivo. Desconhecemos quais seriam os indicadores, caso as
políticas colocadas em prática não o tivessem sido. De qualquer forma, as
disparidades regionais não só subsistem como aumentaram. A população está cada
vez mais concentrada em zonas urbanas e tendencialmente numa única zona
urbana de um país, o que tem impacto directo no PIB e em termos de influência
política, face ao número de votos. Portugal, desde 2000, não só está em divergência
com a média do PIB per capita da Europa (em 2005, o PIB per capita português
representava apenas 71.3% da média UE 25) (QREN, 2007), como regista um
aumento das assimetrias regionais internas. No capítulo seguinte irá analisar-se as
causas estruturais que contribuem para a existência das assimetrias regionais e
que estão na base do problema abordado neste trabalho.
4. Motivos explicativos das assimetrias estruturais
As assimetrias regionais são um problema social e económico das
sociedades modernas. Algumas regiões têm níveis de rendimentos mais altos e
melhores ofertas de emprego do que outras. Porque é que isto sucede? Quais as
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causas das assimetrias? De que forma o quadro institucional pode influenciar a
implementação das políticas? Nesta secção vão ser identificados alguns factores
indicados na literatura como os mais prováveis para a existência de assimetrias,
nomeadamente factores económicos, institucionais e de selecção adversa
motivados pela adesão à União Europeia.
As causas para a existência de assimetrias regionais são várias. Mesmo
entre os economistas, e recorrendo ao estudo de modelos econométricos, não
existe consenso sobre as causas para as disparidades. Todavia, alguns aspectos são
referidos sistematicamente pelos investigadores, nomeadamente os recursos
naturais, o posicionamento geográfico, ou o quadro institucional. Numa perspectiva
económica, existem três grandes motivos: aspectos relacionados com a oferta, com
a procura, ou um misto de ambos (Amstrong e Taylor, 2000). Em suma, não existe
uma causa única para as assimetrias, como não existe uma receita única para as
solucionar. No entanto, todos os seguintes factores afectam positivamente ou
negativamente as assimetrias, dependendo da área em que ocorrem (Temple,
1994):
• A desindustrialização da economia, principalmente por provocar
redução das oportunidades de emprego no mercado económico tradicional;
• A expansão do sector terciário da economia;
• As mudanças tecnológicas, incluindo as inovações contínuas nas
tecnologias de informação, robotização e processos de produção;
• A mudança de estrutura da procura por factores de produção,
nomeadamente capital, trabalho e terra;
• O aumento da integração nacional, europeia e internacional dos
mercados de factores de produção, principalmente capital financeiro;
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• A alteração das influências para a localização da actividade económica
e produtiva inter-regional e intra-regional;
• O aumento da centralização política, acompanhada por uma perda de
controlo político aos níveis locais, regionais e, eventualmente nacional;
• A tendência para a formalização de parcerias público-privadas em prol
da busca de soluções para os problemas regionais e urbanos, por vezes criticada
como sendo a privatização da política regional;
• A reduzida eficácia das respostas políticas face aos problemas
regionais e as más condições para uma intervenção política efectiva;
Outros autores referem as questões institucionais como potenciadoras das
disparidades regionais. Como refere F. Reigado (2000), e no que diz respeito a
Portugal, a ausência de regionalização tem sido responsável pelo agravamento das
assimetrias entre o litoral e o interior do continente. Segundo este autor, só a
concentração do poder de decisão, e das suas delegações, no litoral podem justificar
que o interior tenha vindo a ser sistematicamente prejudicado em termos de
aplicação dos fundos estruturais, nomeadamente os do Fundo Social Europeu (FSE),
na formação profissional, em laboratórios e equipamentos de investigação e na
educação. L. Valente de Oliveira (2002) defende também que o facto de vivermos
num país tradicionalmente muito centralizado, obriga a administração central a
tomar decisões importantes com perda de energias propulsoras necessárias ao
desenvolvimento e com ausência de participação alargada. A. Fonseca Ferreira
(2007) indica que a actual situação do país se deve ao insustentável centralismo, à
segmentação sectorial da administração, à proliferação de legislação, à deficiente
organização dos serviços públicos e a carências de formação e profissionalização
dos quadros dirigentes. O desenvolvimento harmonioso do país passa pela
diminuição das assimetrias regionais, pelo repovoamento de algumas zonas em
� �
processo de desertificação e pelo descongestionamento de outras. No entanto, isso
só é possível através do aproveitamento dos recursos de cada região, sejam eles
naturais, científicos e tecnológicos, culturais ou humanos. Elemento comum a estes
autores é a crítica a um centralismo político-técnico característico da realidade
portuguesa. Em Portugal, cerca de 87% dos recursos orçamentais do país são
geridos pela administração central (Sampaio, 2007). Este factor não levou ao
aumento da rapidez, da transparência, nem da eficácia dos processos.
Dificilmente se conseguirá justificar as assimetrias regionais apenas pelas
questões institucionais. No entanto, parece evidente a existência de um centralismo
político que não é desejável, principalmente se estiver associado a um ciclo vicioso de
votos/políticas/recursos que fará aumentar a amplitude dessas mesmas
assimetrias.
As políticas da União Europeia podem também levar a um aumento das
assimetrias regionais, devido aos efeitos adversos que não são contabilizados
(Amstrong e Taylor, 2000). Entre eles será de ter especial atenção aos seguintes:
- A União Europeia obtém as receitas, impondo aos Estados Membros uma
percentagem sobre o IVA, impostos alfandegários, impostos indirectos e colectas.
Cada um destes impostos tem diferente incidência regional. O IVA, por exemplo, tem
efeitos regressivos, sendo que a carga é maior nas regiões com baixos rendimentos.
- A política da União Europeia para a agricultura apresenta um enviesamento
face às realidades regionais. É até discriminatória contra as regiões onde predomina
a pequena agricultura de cariz familiar e, cujos residentes, poderão até preferir
adquirir produtos provenientes de países que não pertencem à União Europeia, a
preços mais baixos. Devido a estas questões, e dado que as maiores propriedades
recebem maior assistência financeira do que as pequenas, as regiões já prósperas
� �
do Norte da Europa têm sido as principais beneficiárias, em contraste com as
propriedades mais pequenas e pobres, situadas na bacia do Mediterrâneo.
- A política de concorrência da União Europeia impõe um conjunto de
controlos e regras nas políticas regionais adoptadas pelos Estados-Membros,
individualmente. Estas restrições criam constrangimentos nos níveis de ajuda estatal
nas regiões desfavorecidas e em certos tipos de ajuda como os subsídios
continuados ao trabalho.
No entanto, para além dos efeitos negativos, a política regional europeia tem
também vantagens, nomeadamente uma maior capacidade de programação e
planeamento, dado que é efectuada a um nível global e tendo em consideração os
indicadores comparativos de todas as regiões da EU. Outros aspectos positivos são
a segmentação das áreas elegíveis para ajuda com a definição de objectivos por
escalões, permitindo uma focalização nas zonas mais carentes e a interligação entre
os Países, o que favorece a constituição de parcerias com os Estados ou as regiões.
A selecção adversa da política europeia provoca alguma incerteza acerca dos
impactos reais das políticas regionais, em prol do desenvolvimento. Os efeitos serão
correlacionados não apenas pelas ajudas, como pelos custos de oportunidade das
políticas devido ao quadro institucional e político em que o país se insere, o que
poderá levar a resultados positivos ou, eventualmente, negativos. Com estas
questões sobre os impactos da política regional europeia, coloca-se a dúvida da
centralização ou descentralização dessa mesma política. Se há argumentos nos dois
sentidos, parece ser aceitável que os Estados possam ter uma maior quota-parte de
intervenção e responsabilização. Uma maior descentralização e diversidade da
política regional poderá representar uma oportunidade e não uma fraqueza.
As assimetrias podem ter a sua origem em múltiplos factores, sejam eles
económicos, institucionais ou de tipos diversos. No entanto, o estudo destes factores
� �
permite compreender melhor esta problemática e potencia a obtenção de soluções
que possam combater estas desigualdades estruturais. Dado que tem havido um
enfoque em termos da análise do quadro institucional, nas secções seguintes
procurar-se-á comparar a realidade institucional portuguesa com outros países
europeus, procurando também compreender quais os seus efeitos potenciais em
termos de desenvolvimento regional.
5. Quadros institucionais para a promoção e desenvolvimento
Conforme podemos ver pelos diferentes quadros institucionais dos países da
UE 27 (UE, 2007), há uma panóplia alargada de possibilidades de conjugação de
poderes territoriais. Cada país tem a sua forma de organização institucional e
política. Na sua maioria, têm um governo nacional ou central e um conjunto de
governos subnacionais ou locais, que têm jurisdição sobre um determinado espaço
do território. Dentro destes, existem governos regionais, municipais ou outros
quaisquer níveis hierárquicos. Em Portugal existem dois níveis de governação
definidos no território continental – nível central e nível local. A nível local há dois
subníveis: municípios e freguesias. Nos arquipélagos dos Açores e Madeira, há ainda
o nível de administração regional. Assim sendo, o território português é composto
por um governo central, dois governos regionais, 308 municípios (desde 1999) e
4.254 freguesias. Para além desta realidade política, em termos estatísticos, e à
semelhança do restante território da União Europeia, o país está dividido por NUTS
(Nomenclaturas de Unidades Territoriais – para fins estatísticos). Esta sigla
pressupõe a existência de 3 níveis: em Portugal há 3 NUTS I, subdivididas em 7
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NUTS II, as quais, por sua vez se dividem em 28 NUTS III. O país está ainda
organizado em 5 Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR),
que têm como missão executar as políticas de ambiente, de ordenamento do
território e cidades, e de desenvolvimento regional ao nível da sua área geográfica de
influência, promover a actuação coordenada dos serviços desconcentrados de
âmbito regional e apoiar tecnicamente as autarquias locais e suas associações.
Paralelamente foram criadas as Agências de Desenvolvimento Regional (ADR) que
cobrem o território nacional.
Ainda assim, comparando a realidade portuguesa com a espanhola, constata-
se que em Espanha o esquema institucional é bem mais complexo (Baleiras, 2002).
Para além das 17 comunidades autónomas existem 41 Províncias, 49 Comarcas,
10 Conselhos Insulares, 3 Metrópoles, 2 Cidades Autónomas e 8.093 Municípios.
Poder-se-ia dizer que tal dispersão de poder é consequência de um espaço
indubitavelmente maior. No entanto, importa referir que a dimensão média dos
Municípios espanhóis é inferior à dos congéneres Portugueses. O regime
orçamental difere para cada unidade de governo.
Em França, nas últimas duas décadas, houve um esforço do governo central
para promover uma efectiva descentralização política, em dois períodos de tempo:
1980 e 2003 (OCDE, 2005). Este processo foi também acompanhado por uma
descentralização de competências. Neste país há três tipos de autoridades
subnacionais: Municípios ou Comunas (num total de 36.500 em que 89% tem
menos de 2.000 habitantes) que são o nível político mais “pulverizado”; os
Departamentos que representam o nível de autoridade “subnacional médio” (num
total de 100); e as Regiões que constituem o nível mais próximo do Governo Central
(26 Regiões, no total). Os três órgãos são eleitos pelos cidadãos. No entanto, tanto
os Departamentos como as Regiões têm um representante do Governo. Ao Governo
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Central estão reservadas matérias como a defesa, segurança, diplomacia,
actividades de controlo e regulação e a acção social e solidária, enquanto que os
restantes órgãos têm as incumbências sintetizadas no Quadro I.
Quadro I: Organização das políticas por níveis institucionais em França
Comunas Departamentos Regiões
Planeamento Urbano
Uso do solo
Policia Municipal
Estradas
Serviços Sociais
Transportes Escolares
Bombeiros
Assistência
Construções de Escolas (até
3º ciclo)
Planeamento Rural
Planeamento Regional
Desenvolvimento Económico
Ensino vocacional
Construção de Universidades
Fonte: Linking Government and Regions, OCDE 2005 (adaptado pelo autor)
A Itália está dividida em 8.104 Municípios, 103 Províncias e 20 Regiões.
Destas 20 Regiões, 5 têm um estatuto próprio com poder administrativo e
legislativo. Uma região estatutária está ainda dividida em duas Províncias
Autónomas. Para além destas divisões estão a ser também implementadas as
cidades metropolitanas. A legitimidade dos vários níveis, bem como os seus poderes,
estatutos e funções, está definida na constituição italiana. Algumas das tarefas
foram descentralizadas como a reforma da administração pública e a simplificação
de processos, a reforma fiscal, através da delegação de autonomia financeira e a
obtenção de receitas fiscais, a reforma orçamental e a clarificação da distribuição
dos rendimentos pelo país.
A Alemanha é caracterizada por uma forte interdependência entre os vários
subníveis. O país “federal” está dividido em 16 estados, 439 distritos e cerca de
14.000 municípios. O esquema de divisão de poderes é complexo. Apenas os
assuntos da exclusiva competência da Federação estão claramente definidos. Entre
eles estão os assuntos externos, a defesa, a cidadania, a liberdade de movimentos,
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emigração e imigração, assuntos monetários, unidade dos costumes, transportes
aéreos, caminhos-de-ferro e serviços postais. Relativamente às restantes matérias,
a federação pode deliberar a sua descentralização, acabando por existir uma forte
interdependência dos vários níveis institucionais.
A Irlanda é uma democracia parlamentar, dividida em 2 assembleias
regionais, 8 autarquias/autoridades regionais, 29 conselhos de condado, 5
conselhos municipais urbanos e 80 municípios. As autoridades regionais têm uma
função limitada à execução de estudos, recomendações e estatísticas. Os conselhos
de condado funcionam como os verdadeiros governos subnacionais para efeitos de
administração do território. O poder legislativo é exercido pelo Parlamento,
constituído pelo Presidente e duas câmaras: Câmara dos Deputados e o Senado.
Qualquer proposta de lei de revisão constitucional necessita do acordo das duas
câmaras e de ser ratificada por referendo.
Se esta complexidade de instituições pode ser elucidativa da descentralização
política, pouco nos diz relativamente à descentralização orçamental e aos impactos
do sistema na sociedade. Para além disso, os esquemas políticos divergem face à
cultura, aos valores históricos e até à participação efectiva dos cidadãos na política.
Ou seja, embora os factores institucionais tenham uma grande importância no
contexto da implementação de políticas de coesão podem não ser estes os
elementos decisivos que levam ao surgimento e aumento de assimetrias regionais.
Com a pluralidade de desenhos institucionais, dos quais foram apresentados apenas
alguns casos, e com as diferentes opções de participação política e de gestão
administrativa das regiões, podemos concluir que não existe um modelo institucional
óptimo para fomentar o desenvolvimento regional. Apesar de alguns argumentos
defenderem a importância da aproximação das decisões aos cidadãos e às regiões,
não é menos relevante a forma como essas decisões são efectuadas e quem é o
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decisor. O facto de haver uma tendência na opção pela constituição de regiões
administrativas a nível dos países da UE, não significa que este seja o melhor modelo.
Dentro da UE existem países regionalizados com múltiplas configurações e com
impactos distintos. Considera-se que, para além dos aspectos institucionais,
nomeadamente a regionalização, devem ser analisadas outras soluções para o
desenvolvimento das regiões. Essa identificação de cenários alternativos de
desenvolvimento será analisada no próximo capítulo. No entanto, por considerar que
os aspectos institucionais têm o seu peso, irá analisar-se também o conceito de
regionalização, como eventual solução para a resolução do problema em análise.
6. Soluções Alternativas
Que alternativas existem para fomentar o desenvolvimento regional? As
soluções para resolver as questões das assimetrias regionais não são apenas de
cariz político ou técnico. Existem um conjunto de alternativas que se podem conjugar,
dependendo da situação, dos processos e dos objectivos.
A Regionalização é uma das hipóteses. O conceito de Regionalização
representa a existência de pessoas colectivas territoriais, dotadas de autonomia
administrativa e financeira e de órgãos representativos, que visam a prossecução de
interesses próprios das populações da respectiva área. Esta forma de
descentralização prevista na Constituição da República Portuguesa e recusada em
referendo em 1998, tem sido defendida como uma das estratégias para promover
o desenvolvimento regional (Ferreira, 2007).
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Os defensores da Regionalização dispõem dos seguintes argumentos
(Reigado, 2000):
-Existem em Portugal regiões suficientemente diferenciadas, em termos de
geografia física e humana, bem como ao nível do desenvolvimento socioeconómico;
-Existem condições para a delimitação do espaço dessas mesmas regiões em
termos de demografia e taxas de urbanização.
- Essas regiões têm manifestações culturais e costumes diferenciados em
termos geográficos, que podem contribuir para ajudar a reforçar a identidade da
região.
- A forte concentração do poder político-económico nas regiões do litoral
contribui para o aumento das assimetrias e à desertificação do interior. Assim, a
Regionalização seria inevitavelmente acompanhada de uma autonomia política no
processo de decisão, e tenderia à localização no interior de alguns serviços e
empresas públicas, o que fomentaria à inversão da ocupação excessiva do litoral.
- A integração de Portugal em projectos de desenvolvimento supranacionais,
implica que haja uma delimitação das regiões pelas suas características
climatéricas e geoeconómicas, de forma a assumirem um papel de relevo nesses
projectos.
- A Regionalização assenta na polarização em núcleos ou eixos de
desenvolvimento, a partir dos quais se possa desenvolver e reestruturar a economia
da região. A ideia é a de criação de impulsos para dinamizar o desenvolvimento das
regiões em termos de infra-estruturas produtivas e sociais em prol da localização de
empresas.
- Com a evolução tecnológica, deixou de fazer sentido a justificação de que as
regiões só se desenvolviam devido à existência de matérias-primas, energia e
sujeitas à evolução dos custos de transporte. Com o progresso tecnológico, houve
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diminuição de barreiras e deixou ao homem uma grande capacidade de manobra e
imaginação, para fomentar a criação de valor. Este factor está correlacionado
também com a criação de centros educativos nos pólos que se pretendem
desenvolver.
Como argumentos contrários são referidos o aumento dos gastos com
titulares de órgãos políticos, a desagregação forçada do país, as dificuldades nas
delimitações das fronteiras das regiões e o aumento da burocracia administrativa.
Portugal, ao contrário de Espanha (por exemplo), não tem clivagens étnicas,
linguísticas, religiosas ou culturais mas sim disparidades económicas (Oliveira,
2002). Assim, e na linha dos argumentos contrários à regionalização, dado que o
objectivo último é desenvolver as regiões e não regionalizar, haverá outros caminhos
para alcançar o mesmo objectivo (Ferreira, 2007).
Caso se conclua que a regionalização não é um factor decisivo ou se esta não
entrar em vigor, que outros instrumentos têm os decisores públicos, que possam
contribuir para a resolução do problema das assimetrias regionais? Seguidamente
serão exploradas possíveis alternativas para a promoção do desenvolvimento
regional, mas que podem ser implementadas com quadros institucionais diversos,
seja o actual ou com uma potencial regionalização, nomeadamente a constituição de
distritos industriais, a implementação de agências de desenvolvimento regional, a
contratualização de serviços e medidas públicas como forma de descentralização.
Será ainda apresentado um conjunto diverso de políticas segmentadas, ao dispor
dos governantes e que permitem inúmeros policy-mix.
Uma das soluções possíveis é a constituição de Distritos Industriais (Farrel
e Knight, 2003). Este conceito teve a sua génese nas zonas desenvolvidas do norte
de Itália (Pyke e Sengenberger, 1992). Trata-se de um modelo de desenvolvimento
regional, fortemente apoiado numa organização que promove a interligação e
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cooperação entre as empresas (na sua maioria pequenas e médias), de vários
sectores de actividade (Bannock et al., 1998). Este modelo procura a obtenção de
ganhos de eficiência com a proximidade geográfica das empresas (efeito
externalidades) e um aumento de dinamismo regional que influencia positivamente o
desenvolvimento regional (quando este é efectuado sustentavelmente). Para além
dos aspectos económicos, este tipo de política estimula o papel da organização
social e reforça a confiança dos actores. Os distritos industriais não são apenas uma
característica do norte de Itália, embora nesta região tenham obtido um grande
impacto. No Reino Unido o conceito foi apelidado de “Industrial Estates”, na França
de “Zonnes Industrielles” e em Portugal de “Zonas Industriais”. A grande diferença
entre o modelo italiano e os outros referidos, é que em Itália os Distritos Industriais
não foram apenas uma concentração de empresas numa zona geográfica limitada
mas fomentaram também, e principalmente, a criação de um dinamismo
empresarial conjunto que levou ao sucesso de empresas que, de outra forma, não o
alcançariam.
Embora estejam implementadas em Portugal desde 2000, como se trata de
um conceito inovador para a realidade portuguesa, fortemente centralizada, optou-
se por incluir as Agências de Desenvolvimento Regional neste capítulo. Uma
Agência de Desenvolvimento Regional (ADR) é uma estrutura operativa que produz a
identificação de problemas de desenvolvimento global ou sectorial, escolhe um leque
de oportunidades ou metodologias e promove projectos que possam optimizar as
soluções, tendo sempre em atenção a especificidade própria de cada região
(PRIMUS, 2007). Estas entidades são o resultado de parcerias alargadas,
compostas por um conjunto de entidades públicas e privadas das mais diversas
áreas de actividade. Uma das principais tarefas é a cooperação com todos os
actores locais, promovendo iniciativas comuns e projectos conjuntos, no espírito de
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parceria que a anima e que considera constituir um elemento fundamental para
cumprir com êxito os objectivos a que se propõe.
Diagrama I – Modelo de actuação das Agências de Desenvolvimento
Fonte: www.primus-dr.pt
São estruturas onde participam parceiros/accionistas, públicos e privados,
com experiência relevante em todos os sectores de actividade económica,
empresarial, social, de investigação e desenvolvimento, espacialmente distribuídos e
profundos conhecedores da realidade regional. A experiência desde 2000 não
permite avaliar o seu impacto na sociedade (Syrret e Silva, 2001), mas o seu
contributo para o desenvolvimento regional vai depender da capacidade de
responder positivamente aos constrangimentos institucionais e administrativos das
regiões e do país. O grande risco destas agências é a possibilidade de se tornarem
num órgão sem capacidade financeira ou política, o que poderá limitar a sua
actuação.
Como forma de promover o desenvolvimento regional, outra das ferramentas
que tem sido desenvolvida está relacionada com a Teoria dos Contratos (OCDE,
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2007). Os contratos não são mais do que acordos nos quais são estabelecidos os
direitos e deveres dos governos, tendo como objectivo principal promover a
descentralização de matérias específicas para os governos subnacionais ou, a
cooperação, nos casos em que já existem mecanismos prévios de descentralização.
Estes acordos tanto podem ter durações de curto ou longo prazo, dependendo do
projecto ou do processo que se pretende implementar. Embora não sejam
alternativas às estruturas político-institucionais, os contratos têm a potencialidade
de poder maximizar o relacionamento, a partilha de risco das medidas e a redução
dos custos associados às assimetrias de informação, às dificuldades na verificação
do comportamento das partes, à falta de competências e aos acordos credíveis. O
surgimento destas novas formas de intervenção pública está directamente
relacionado com a tendência para promoção da competitividade das regiões como
estratégia de desenvolvimento regional (OCDE, 2005). Para além desse factor, estes
instrumentos permitem intervir com precisão e eficiência nas áreas afectadas,
diferenciar a intervenção, conforme as carências e responsabilizar todos os actores
quanto à estratégia, objectivos e performance dos resultados, representando uma
governança multi-nível.
Para além destas políticas, existe um conjunto de Instrumentos de Política
Regional (Amstrong e Taylor, 2000), que podem ser utilizados em casos específicos
e contribuir para a resolução das assimetrias. Dentro das ferramentas Micro, temos
as políticas de realocação de trabalho e de realocação do capital. Nas políticas de
redistribuição do trabalho in loco, podemos incluir a reciclagem de ocupações,
políticas educativas e os esquemas de mercado de trabalho intermediários. Depois
destas há ainda as políticas de realocação do trabalho em termos espaciais, como
as políticas de migração (através de esquemas de subsídios que cubram os custos
pecuniários e psicológicos da migração), as políticas de mobilidade (como os fluxos
melhorados de informação destinados a emigrantes potenciais, alojamentos de
� �
ajuda para migrantes ou mesmo políticas para facilitar a venda e compra de
habitações). Ainda dentro das políticas de realocação do trabalho temos as políticas
de aumento da eficiência do mercado de trabalho, nomeadamente em prol do
aumento da negociação de factores em termos locais.
Nas políticas de realocação do capital podemos considerar os impostos e
subsídios. Dentro destas, podemos incidir no mercado dos inputs, nos outputs (como
subsídios aos preços ou abatimentos nas exportações) e na tecnologia (subsídios à
investigação e desenvolvimento, e subsídios à disseminação da informação). No caso
dos inputs, podemos ainda conjugar a política fiscal no capital, nos terrenos rústicos
ou urbanos, a criação de subvenções, taxas de juros bonificadas, benefícios fiscais,
alugueres locais e regimes especiais para empresas localizadas em áreas
prósperas. Há ainda a possibilidade de imputar impostos e subsídios ao trabalho
como subsídios ao salário e esquemas para favorecer a migração de funcionários-
chave. Podemos também considerar outros inputs como os fretes ou mesmo
subsídios à energia. Para além dos inputs as políticas para aumento da eficiência
dos mercados de capital, como acordos de empréstimos, provisão de capital de
empreendimento, troca de garantias, uniões de crédito, esquemas de troca e
comércio locais, de micro-crédito ou mesmo políticas de capital social de risco. Há
ainda possibilidade de criar políticas de aumento da eficiência na operacionalidade
das empresas (como a criação de serviços de aconselhamento para micro- e
pequenas empresas e subsídios para consultadoria de gestão). Temos ainda as
políticas de controlo administrativo, nomeadamente em termos da localização das
empresas e indústrias privadas e públicas, relaxamento de planeamento e regulação
alfandegária, ou mesmo a redução da carga administrativa e burocrática na
instalação e na actividade das empresas. Para além destas e continuando nas
políticas de realocação do capital, podemos considerar também as políticas para
� �
desenvolvimento do capital social como a capacidade para construir esquemas
numa óptica de desenvolvimento económico comunitário.
Há ainda um conjunto de opções de macro-política que se podem utilizar. É o
caso da descentralização da política comercial, fiscal e monetária para regiões ou
outros órgãos. Existem também políticas de controlo central como a discriminação
regional positiva da política fiscal, da política de despesa, a introdução de
estabilizadores automáticos nos impostos sobre o rendimento e nas contribuições
para a segurança social, ou “discricionariedade” (esquemas de contratos do governo
que privilegiam ofertas de firmas instaladas em áreas deprimidas ou mesmo o
enviesamento deliberado nos gastos do governo na saúde ou em vias de
comunicação). Temos ainda ao dispor a discriminação regional da política monetária
(nomeadamente uma maior facilidade de crédito nas áreas de acção) ou a
discriminação regional de impostos e o controlo de outros termos de troca (como
funcionam por exemplo as tarifas e quotas da EU para importação de produtos
têxteis, de forma a favorecer a produção europeia que está concentrada em zonas
subdesenvolvidas).
Para além das políticas especificas de cariz micro ou macro, existem
políticas de opções de coordenação e que também podem ser conjugadas. Dentro
destas temos a coordenação com órgãos locais, como a coordenação entre
diferentes instrumentos de micro-política, como os incentivos à formação e ao
investimento, e a coordenação entre políticas micro e macro. É o caso dos incentivos
ao investimento e às despesas fiscais em projectos de infra-estruturas. Nas opções
de coordenação podemos também considerar as políticas de coordenação entre
jurisdições, como por exemplo a coordenação entre a União Europeia e as políticas
regionais do Estado Membro ou mesmo a coordenação entre o governo nacional e
as políticas regionais.
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Recorrendo à teoria política e económica, constata-se que existem vários
modelos e formulações teóricas que podem apoiar o desenvolvimento regional. Uma
nova metodologia de organização política ou técnica, deve ter em linha de conta o
quadro espacial endógeno do próprio país e deverá passar por uma maior
descentralização efectiva dos recursos.
Por outro lado, se uma das principais conclusões sobre as razões explicativas
para as assimetrias regionais consiste no seu carácter eminentemente multivariado
(cf. secção 4), então uma das possibilidades que se pode equacionar é o recurso a
uma “geometria variável” de instrumentos de promoção do desenvolvimento
regional, que não se compadeça com quadros homogéneos de intervenção,
institucionais ou outros. Dificilmente uma eventual regionalização pode contribuir
para que isso aconteça. Considera-se que será de privilegiar soluções mais
segmentadas e menos genéricas. Isto significa que, as soluções mais específicas,
dentro da aplicação dos instrumentos de política regional, eventualmente associados
à contratualização do governo central com os governos subnacionais, teriam uma
maior incidência nos problemas e nas suas causas. Teriam ainda a vantagem de
poderem ser disseminados pelo território mediante uma segmentação positiva.
Estas políticas poderiam ainda estar apoiadas numa rede de distritos ou cidades
industriais, numa polarização industrial do próprio território. As agências de
desenvolvimento regional funcionariam como plataforma de interligação do governo
central, governos subnacionais (autarquias), empresas e associações.
Uma das vantagens duma política deste cariz é a possibilidade de ser iniciada
rapidamente sem motivar eventuais fracturas sociais e económicas, que possam
ocorrer na sequência de um processo de regionalização. O conceito de
regionalização pode ser criticado como sendo uma solução institucional homogénea
para combater problemas regionais diversificados. A segmentação de políticas
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possibilita o enfoque das medidas e a análise dos resultados em comparação com
os objectivos definidos. Por estes factores considera-se não ser essencial a
implementação da regionalização para a resolução do problema indicado. Com isto,
não pretendo defender uma posição contrária à regionalização. No entanto, face à
multiplicidade de causas para o problema, à urgência em implementar políticas de
fomento ao desenvolvimento regional, e à existência de soluções que se podem
adaptar a casos distintos, não me parece que seja, neste momento, a política mais
adequada.
Dado que o processo de implementação da política está directamente
relacionado com impacto dessa mesma política, no capítulo 7 será sugerido
sumariamente um modelo de efectivação das medidas de desenvolvimento regional
e uma metodologia de avaliação. Irão analisar-se também os factores críticos de
sucesso para a implementação de uma política de desenvolvimento regional eficaz.
7. Contributo para uma nova política de desenvolvimento regional
Face à necessidade de promover processos eficientes, de forma a
desenvolver políticas eficazes, que passos devem ser seguidos na implementação de
uma política de desenvolvimento regional? Quais as especificidades de uma política
deste cariz? Existem factores que determinam o seu sucesso/insucesso? Esta
secção sugere uma metodologia de implementação através de etapas, e analisa a
importância dos aspectos chave para a eficiência do processo.
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Em primeiro lugar, para a existência de uma política eficiente de
desenvolvimento regional é fundamental existir uma análise da situação do país.
Posteriormente é necessário fixar metas e objectivos de curto e longo prazo,
estabelecendo critérios para avaliações periódicas. A organização do espaço é
essencial. A distribuição de zonas deverá ser efectuada pela sua homogeneidade ou
características específicas do território. Nestas zonas deverá haver pelo menos um
centro, ou se preferirmos uma polarização efectiva do território e que seja o motor
da zona em que se insere. Tudo isto tem de ser construído numa base de estratégia
e planeamento.
Considerando que o problema está identificado, e tendo os decisores
políticos conhecimento dos instrumentos técnicos potenciadores do
desenvolvimento regional ao dispor, os passos seguintes para a existência de uma
nova política de desenvolvimento regional seriam a análise das diferentes
alternativas, bem como a análise comparativa de casos similares de outros
países/regiões. A decisão sobre a política a implementar teria em consideração o
quadro institucional do país ou região de intervenção. Para uma maior eficiência do
processo de decisão, este deveria ter uma componente botom-up com a interacção
entre os agentes locais/regionais. Com a implementação da política, através de um
eventual quadro legislativo, teriam de existir métodos de avaliação e
acompanhamento da política, com a construção de cenários em caso de sucesso ou
insucesso e estabelecimento de objectivos, tendencialmente quantitativos e
comparativos.
A avaliação irá acompanhar a utilização correcta dos recursos, em
conformidade com as normas públicas, contribuirá para melhorar a eficiência e dará
resposta às necessidades informativas da população em geral, do poder legislativo e
dos centros de gestão. Terá um papel decisivo para analisar a coerência e a
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racionalidade do modelo político, e quantificar o impacto das medidas tomadas face
aos modelos seguidos pelos restantes países. O diagrama seguinte mostra-nos um
exemplo de um modelo passível de ser utilizado na avaliação de uma política regional,
com a esquematização das várias fases.
Diagrama II – Fluxo da Avaliação da Política
Fonte: Adaptado de Plante, 1991.
Uma política de desenvolvimento regional não pode ser implementada sem
assegurar a existência de cinco princípios base:
• Envolvimento dos actores regionais;
• Qualidade de governação/ governança;
• Capital social;
• Visão sistémica;
• Identidade regional / local;
NECESSIDADES
PROBLEMAS
IMPACTOS
OBJECTIVOS INSTRUMENTOS RESULTADOS
SOCIEDADE
ACÇÃO
PÚBLICA
AVALIAÇÃO
COERÊNCIA
AVALIAÇÃO DE IMPACTOS
RACIONALIDADE
EFICIÊNCIA
EFICÁCIA
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A participação é uma das questões mais importantes e decisivas dos
processos de planeamento estratégico (Ferreira, 2007). Este factor é o motor de
impulsionamento de uma política de natureza regional. O envolvimento dos agentes
com o desenvolvimento de mecanismos de confiança e cooperação, a criação de
coligações políticas e o desenvolvimento de relações inter-regionais favorecem o
impacto positivo das políticas de desenvolvimento regional. Uma vez que as políticas
se destinam aos agentes, é natural que o processo de desenvolvimento passe por
uma interligação com estes actores. A dinamização dos mercados, expectável com a
criação de distritos industriais ou com o apoio de agências de desenvolvimento, deve
ter em conta o potencial e limitações das zonas de intervenção. Estes factores
críticos, determinantes para o sucesso das políticas regionais dependem do
empenho e disponibilidade dos agentes públicos e privados.
A governança refere-se às normas, processos e condutas através dos quais
se articulam interesses, se gerem recursos e se exerce o poder na sociedade, ou
seja, significa a capacidade do Estado de servir os cidadãos. Este conceito implica a
existência de processos de decisão claros a nível das autoridades públicas,
instituições transparentes, responsáveis, eficazes e democráticas, diálogo aberto
com os intervenientes sociais e económicos e outras organizações da sociedade
civil, elaboração e aplicação de medidas para combater a corrupção, promover a
segurança do Estado e das pessoas assim como o cumprimento dos direitos
humanos, colaboração efectiva entre os sectores públicos e privados. Assim, a
governança permite a estabilidade do sistema apoiado na confiança e interligação
dos agentes privados com as entidades públicas. Nos meios regionais fortemente
dependentes da qualidade das relações entre os diversos actores, a boa governação
é o pilar que sustenta a credibilidade institucional e o dinamismo económico.
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O capital social representa a capacidade de cooperação e interligação entre
os agentes que potencia o fortalecimento das redes sociais de coesão em função de
um objectivo comum. O capital social é assim o valor acrescentado proveniente da
mais-valia obtida pelo relacionamento construtivo e activo dos actores de um
determinado local ou região. Este factor, geralmente utilizado para medir o
dinamismo dos agentes privados e públicos, é determinante para a solidificação de
políticas, nomeadamente de âmbito local ou regional. Usando como exemplo as
alternativas distritos industriais e agências de desenvolvimento regional, sem a
existência de um capital social dinâmico, estas duas políticas estariam fortemente
ameaçadas. A interligação construtiva e participativa dos agentes é condição
necessária para o sucesso do desenvolvimento regional.
A visão sistémica consiste na compreensão do todo a partir de uma análise
global das partes e da interacção entre estas, de modo a permitir a interferência no
sistema. Este conceito deverá estar presente na concepção e implementação de
qualquer política pública. A intervenção pública numa determinada região, deve
pressupor um conhecimento profundo e alargado dessa mesma região e das que
lhe são contíguas. Direccionar políticas para um único objectivo sem considerar os
impactos colaterais que possam ocorrer com essa decisão, pode ser até
contraproducente face aos objectivos globais. Daí a necessidade de avaliar
globalmente a região, como parte do sistema político e não isoladamente. Esta
questão pode ser considerada uma das vantagens em optar por uma política de
desenvolvimento que não necessite de ser apoiada na regionalização.
O último dos factores considerado imprescindível para o sucesso de uma
política de desenvolvimento regional é a identidade local/regional. As medidas a
serem implementadas para solucionar o problema em análise devem ter em
consideração o legado histórico, cultural e sócio-económico da região a que se
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aplicam. Este factor é essencial para a sustentabilidade das políticas e dos projectos.
Adequar as políticas à identidade regional é uma forma extremamente relevante de
mitigar o risco dessas medidas.
A defesa destes cinco “valores” é a base para o fomento e sustentabilidade
do desenvolvimento, independentemente das características que este conceito
possa adoptar. Face às características específicas do desenvolvimento regional e à
necessidade de estabelecer parcerias ou contratos com os diversos actores
envolvidos, toda e qualquer política deverá privilegiar o cumprimento efectivo dos
pressupostos mencionados. O sucesso da política será também dependente da
eficácia do processo de análise, decisão, implementação e acompanhamento.
8. Conclusão
O problema das assimetrias regionais não é exclusivo da realidade
portuguesa. Trata-se de um fenómeno em crescimento e globalizado que afecta a
distribuição demográfica e económica. No entanto, existem diversas alternativas
para a resolução deste problema.
A solução regionalização, apesar de também poder potenciar o
desenvolvimento, parece não ser a alternativa que melhor se adequa, neste
momento, ao caso português. Soluções mais segmentadas e específicas, desde que
correctamente implementadas, permitem uma maior facilidade de gestão e
incidência nos problemas e nas suas origens. Dado que existe uma multiplicidade de
causas que levam à existência de assimetrias regionais, será expectável que existam
também instrumentos distintos e variados de intervenção.
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Mas mais importante do que optar pela política regional mais adequada
neste momento, é conseguir despertar o interesse para o estudo desta realidade e
discutir as alternativas ao dispor dos agentes. Esta é a linha fundamental escolhida
por este trabalho, procurando contribuir para uma abordagem das soluções de
promoção do desenvolvimento regional, que se afastem de uma discussão
dicotómica – e por isso redutora – entre regionalização e anti-regionalização.
Por não ser esse o objectivo do trabalho, as opções aqui defendidas não
foram estudadas exaustivamente, numa óptica de custo-benefício político-económico.
Pretenderam apenas ser um contributo crítico e positivo para a reflexão desta
problemática e para a eventual, muito desejada e, sobretudo indispensável,
resolução das assimetrias regionais que o país apresenta. Porém, uma análise mais
aprofundada sob a óptica custo-benefício constituiria uma sequência necessária
para este trabalho.
Apesar deste estudo apresentar uma opção pela implementação de políticas
casuísticas, fica a dúvida se este será o melhor modelo de desenvolvimento regional.
Políticas casuísticas podem sofrer maior interferência dos grupos de interesse junto
dos decisores, como forma de obter maiores lucros e benefícios. Se a política fosse
genérica e com força de legislação, todos os agentes teriam iguais oportunidades e
possibilidades de intervir no sistema político. Para a existência de políticas
segmentadas e/ou casuísticas, a intervenção dos governos central e subnacionais
teria de ser acompanhada pela existência de estruturas de acompanhamento das
políticas, objectivos e resultados. Tanto a opção pela segmentação positiva de
políticas ou pela implementação genérica tem vantagens e desvantagens, o que será
eventualmente estudado noutra ocasião. No entanto, ambas podem e devem ser
acompanhadas por formas de mitigação dos riscos inerentes às suas
especificidades.
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