ANÁLISE DOS FRAGMENTOS CERÂMICOS DO SÍTIO ARQUEOLÓGICO DE CANAS, SÃO PAULO, BRASIL E TEORIA...
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ECCOM, v. 5, n. 9, jan./jun. 2014
Análise dos fragmentos cerâmicos do sítio arqueológico de
Canas, São Paulo, Brasil e teoria ator-rede: cultura e sociedade
Simone Taguchi Borges
Doutora na Universidade Federal do Espirito Santo.
Rosinei Batista Ribeiro
Doutor nas Faculdades Integradas Teresa D’Ávila.
Adilson da Silva Mello
Doutor na Universidade Federal de Itajubá.
Bianca Siqueira Martins Domingos
Mestrando na Universidade Federal de Itajubá.
Luiz Fernando Vargas Malerba Fernandes
Graduando em Arquitetura e Urbanismo; Faculdades Integradas Teresa D’Ávila.
Natalha Gabrieli Moreira Carvalho
Graduando em Design; Faculdades Integradas Teresa D’Ávila.
Resumo
O artigo teve como proposta analisar os fragmentos cerâmicos do sítio arqueológico Caninhas, Canas, São
Paulo, que possuem diversas formas e acabamentos de superfície. O estudo foi realizado nas superfícies
simples, corrugada, escovada e ungulada. O desenvolvimento deste trabalho iniciou-se com a coleta de dados
envolvendo diversos profissionais, visando identificar as características e o meio social dos habitantes do local.
Posteriormente, realizou-se o processo de inventário, caracterização microestrutural, detalhamento virtual dos
utensílios em formato 3D e a educação patrimonial. No campo social, este estudo perpassa pelo viés da Teoria
Ator-Rede (TAR), considerando a questão da simetria relacional dos arranjos sociais, em que materiais
cerâmicos e vida cotidiana não podem ser separados como elementos distintos de uma construção social. Os
resultados mostraram a importância na interação entre os profissionais de diversas áreas, fortalecendo a
transdisciplinaridade entre design, engenharia e arqueologia.
Palavras-Chave
Cultura; Análise da superfície; design; seleção dos materiais; arqueologia.
Abstract
The article propose to analyze the ceramic fragments of the site archaeological site of Canas of São Paulo, that
presents several forms and surface perfect. The study was accomplished in simple, corrugated, brushed and
finger surface. The development of this work start with the of data involving several professionals, to identify the
characteristics and social place of habitants of region. After that step, an inventory process, microestrutural
characterization, virtual detainment of utensils using 3D format and patrimonial education was done. In the
social area, this study moves through the Actor-Network Theory (ANT) bias, considering the issue of relational
symmetry of social arrangements in which ceramic materials and everyday life cannot be separated as discrete
elements of a social construction. The results showed the importance of the interaction among the professionals
of differents areas that strengthening the transdisciplinary among design, engineering and archaeology.
Keywords
Surface of analysis; design; materials of selection; archaeology.
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Introdução
Historicamente, a cultura dos povos indígenas é conhecida principalmente pelos
relatos de cronistas da época do descobrimento, dos primeiros tempos da colonização do
Brasil e através de vestígios arqueológicos, expressando os valores coletivos desses primeiros
habitantes do território brasileiro. Tais manifestações foram reunidas sob o nome “Tradição
Tupiguarani” e é dividida em dois domínios, prototupi que consta do Sudeste ao Nordeste da
América do Sul, e o protoguarani, localizado ao sul de acordo com Prous (2005).
A descoberta do sítio arqueológico, denominado Sítio Arqueológico Caninhas, abre
um considerável leque de possibilidades no que diz respeito a estudos relacionados à História
e conseqüentemente à memória vinculada ao patrimônio da região, segundo Bornal (2005).
O Sítio Caninhas é composto por estruturas funerárias, estruturas de combustão e
diversos objetos de uso cotidiano de populações indígenas que habitaram o local, que, pelas
suas características, possivelmente trata-se de uma população Tupiguarani1. Entre as
curiosidades encontradas no Sítio Caninhas, estão as peças com formas diferenciadas e as
urnas funerárias que, ao invés de vestígios de sepultamento, continham peças cerâmicas.
Em um contexto macro, pesquisadores discutem sobre os fragmentos cerâmicos
Tupiguaranis do Vale do Taquari, Rio Grande do Sul/RS, em que os fragmentos cerâmicos
ungulados da coleção apresentam o modelo simétrico e assimétrico e os pedaços lisos têm
suas faces interna e externa bem alisada.
Quanto aos fragmentos pintados, notam-se algumas variações com a cor
branca, preta e vermelha. O tratamento pode aparecer em toda a peça,
mas normalmente ocorre na parte superior interna ou externa.
Geralmente, os desenhos geométricos são delineados com a cor preta
sobre fundos brancos ou vermelhos e são frequentes faixas vermelhas
circundando a peça. Descrevem ainda que a cerâmica pintada relaciona-
se aos grupos Tupiguarani, e esta teria uma presente função em rituais
(MACHADO, 2008, p.103-109).
O estudo desenvolvido teve como propósito analisar os fragmentos cerâmicos
provenientes do sítio arqueológico Caninhas, que apresentam diversas formas e acabamentos
de superfície, realizando assim o levantamento e a descrição dos mesmos.
A importância deste estudo concentra-se em torno de duas esferas, primeiramente no
que diz respeito à educação patrimonial com a divulgação de informações e preservação da
história e riqueza cultural da região do Vale do Paraíba, interior de São Paulo, na segunda
esfera de estudo a interação entre os profissionais de diversas áreas, fortalecendo a
transdisciplinaridade entre design, engenharia e arqueologia.
Fundamentação teórica
Reagregando elementos humanos e não-humanos: sociedade.
1 Sob esta hipótese, serão realizados estudos antropológicos acerca da população em questão e o seu contexto
sociocultural, reforçando o caráter transdisciplinar da pesquisa.
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As teorias culturais apresentadas no escopo do pensamento moderno, não comportam
um quadro analítico que considere, dentro dos contornos da construção do social, os actantes2
não-humanos como componentes da estrutura social.
Desenvolvida em meados dos anos 80 por Bruno Latour, John Law, Michel Callon, entre
tantos outros, a TAR (Teoria Ator Rede) emerge da necessidade de uma nova teoria social
ajustada aos estudos no campo de Ciência e Tecnologia (Callon e Latour, 1981).
Por meio da Teoria Ator-Rede, entendemos que a sociedade e suas relações sociais são
permeadas por elementos heterogêneos conectados via mediações, sendo estas conduzidas
pelos atores3 humanos ou não-humanos inseridos nesta rede. Se antes os fatos eram reduzidos
somente ao social, agora os componentes mobilizados para tecê-lo são integrados à análise,
podendo a qualquer momento redefinir a sua construção identitária e suas relações, rompendo
com a hermética e compartimentada noção de modernidade (LATOUR, 1994).
Ao propor rastrear o não-humano e suas relações, Latour (1994) compreende que o
social está “povoado por objetos mobilizados para construí-lo”.
Como essas mediações modificam a realidade, surgem novas conexões que
reconstituem a tessitura das redes, seus posicionamentos e velhas coerções. Adotar a TAR
como preceito metodológico implica em um posicionamento “flexível” frente ao campo
estudado, em que as análises deem conta das constantes mudanças e movimento dos actantes.
Para John Law (1992, p. 2) a rede se assemelha à própria ciência, no instante em que esta
agrega “elementos do social, do técnico, do conceitual e do textual”, e “são acoplados e então
convertidos (ou “traduzidos”) em um conjunto de produtos científicos igualmente
heterogêneos”.
No campo dos estudos da TAR, podemos afirmar, a partir da ideia de simetria
relacional dos arranjos sociais, o processo de multiplicidade de configurações entre os
actantes que se tornam visíveis e podem ser estudadas, contadas e analisadas de um ponto de
vista que considera interações e cruzamentos. Materiais cerâmicos e vida cotidiana não podem
ser separados como elementos distintos de uma construção social. Toda ação é coletiva
(participação dos actantes na rede) e cada um desses elementos, a seu próprio modo, participa
na constituição e no curso da ação de um grupo, comunidade ou sociedade.
Civilizações se constituíram e se superaram mutuamente a partir dos agentes e
intenções criadas durante seu percurso histórico. Cada peça carrega em si elementos humanos
e cada humano tem, em si (“corpo” e “alma”), os objetos com os quais compõem e se
relaciona nas redes.
Estudos arqueológicos
De acordo com Prous (2005), no final do século 19, os amadores de antiguidades, que
eram brasileiros e eram os organizadores dos primeiros grandes museus, como Ladislau de
Souza Mello Netto (1828-1894), já tinham identificado como tupi os potes pintados
encontrados no litoral de Rio de Janeiro. Mas essas vasilhas estavam mal preservadas, e as
cerâmicas então recém-descobertas na ilha de Marajó, no Pará, que se supunham
influenciadas por imigrantes europeus supostamente chegados durante a Antiguidade,
atraíram toda a atenção dos pesquisadores.
2 Termo utilizado por Latour para dar significado ao que chama-se comumente de atores. 3 Para Latour, um ator ou actante se define como qualquer pessoa, instituição ou coisa que tenha agência, isto é,
produza efeitos no mundo e sobre ele. Um ator se caracteriza pela heterogeneidade de sua composição; ele é,
antes, uma dupla articulação entre humanos, e não-humanos e sua construção se faz em rede. (MORAES et. al.,
2004, p. 323)
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Até o final do segundo terço do século 20, apenas o historiador e folclorista Carlos Ott
publicou o desenho simplificado de algumas vasilhas encontradas na Bahia. No final dos anos
60, os pesquisadores do Programa Nacional de Pesquisas Arqueológicas (Pronapa), dirigido
pelos arqueólogos norte-americanos Betty Meggers e Clifford Evans (1920-1981),
encontraram numerosos sítios onde apareciam restos de cerâmica decorada, alguns com traços
vermelhos ou pretos. Tais manifestações foram reunidas sob o nome ‘Tradição Tupiguarani’
Tupiguarani em uma só palavra, indicando tratar-se de um conceito arqueológico que não
corresponde obrigatoriamente aos povos falantes das línguas tupi-guarani (com hífen),
embora se supusesse que os autores das peças fossem, ao menos em parte, ancestrais desses
povos, pintados sobre fundo branco.
Fragmentos cerâmicos tupi-guarani
Segundo Prous (2005), as vasilhas Tupiguarani apresentam geralmente borda
reforçada típica e a não ser no caso de bacias pouco profundas tendo fundo redondo. Quando
pintadas, recebem decoração linear e pontilhada de cor escura (vermelha, marrom ou preta)
aplicada com ‘pincel’ (qualquer tipo de objeto com essa função) sobre fundo branco. Apesar
do parentesco formal entre todas as ocorrências Tupiguarani, podemos distinguir dois grandes
conjuntos geográficos, um que denominamos ‘proto-tupi’, que se estende do litoral norte de
São Paulo até o Ceará, e outro, ‘proto-guarani’, situado entre o sul do litoral de São Paulo e o
norte da Argentina. Esses grupos distinguem-se tanto por formas específicas dos artefatos de
cerâmica no artigo, Figura 2 (a) e (b) quanto pelo estilo e pelos motivos de decoração plástica
ou pintada. Em cada conjunto seria possível estabelecer subdivisões estilísticas que
acreditamos refletirem a extensão de ‘parcialidades’ de cunho político ou étnico (MORAES,
2007).
Material e métodos
Este trabalho foi executado pelas Faculdades Integradas Teresa D’Ávila (FATEA) –
Rede Salesianas, por meio da cooperação e parceria técnica com a Escola de Engenharia de
Lorena (EEL/USP) e a Fundação Cultural de Jacarehy – Núcleo de Arqueologia.
O processo de inventário consistiu-se em quatro etapas, iniciando-se na limpeza dos
fragmentos, em que cada fragmento foi lavado em água, com auxílio de espátulas de madeira
e metal. Após lavado, o fragmento é repousado sobre papel absorvente para estar seco até a
próxima etapa, a numeração, que é feita com tinta nanquim sobre uma fina camada de esmalte
translúcido. A numeração indica o Sítio e sua localização e o número da peça (Exemplo: SP –
CA, 01 – 509). Numerados, os fragmentos foram separados por peças e estruturas e descritos
em fichas, de acordo com suas características, entre elas parte da peça, tipo de antiplástico,
queima, local em que foi retirado, grupo a que pertence e suas dimensões.
A caracterização da superfície das amostras foi realizada no DTM/FEG/UNESP,
utilizando o estereoscópio da marca Carl Zeiss com a magnificação de 20 vezes. As
micrografias mostram as morfologias e a qualidade da superfície de cada fragmento, obtendo
mais informações sobre o processo de produção das peças e sobre as características do meio
social de seus produtores.
Depois de realizados os trabalhos históricos e as análises das cerâmicas arqueológicas,
foram escolhidas duas peças do acervo para serem modeladas digitalmente, inicialmente por
meio de renderings manuais para observação das formas e cores e, posteriormente, renderings
digitais aplicando o Solid Works e o 3D Max Studio para finalização da imagem das peças.
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O “Método de Educação Patrimonial” é um conjunto de estratégias utilizadas para
levar às comunidades os conhecimentos produzidos nas pesquisas arqueológicas e nos
trabalhos realizados nas demais áreas (Design, Engenharia de Materiais e Educação Artística).
Este método vem sendo implantado desde as primeiras etapas de trabalho, na realização de
atividades de campo, visitas monitoradas aos laboratórios de Arqueologia e Engenharia de
Materiais, aulas expositivas e palestras.
Resultados e discussão
O sítio arqueológico Caninhas, objeto de estudo desse trabalho, foi identificado no
município de Canas, próximo do centro administrativo do município, em perímetro urbano,
nas coordenadas 23k0495194 UTM 7490041. Canas, município do Estado de São Paulo está a
198km distante da Capital, às margens da Rodovia Presidente Dutra.
A categoria do sítio arqueológico de Canas é unicomponencial, de natureza pré-
colonial, cuja tribo possivelmente é Tupi-guarani, devido características dos utensílios como:
conformação das cerâmicas por acordelamento, e pinturas geométricas na cor vermelha,
branca e preta. Existiam quatro possíveis unidades habitacionais, com vestígios de material
predominantemente cerâmico e lentes de carvão, aparecendo até 400 mm de profundidade. As
estruturas de sepultamento situavam-se fora das ocupações habitacionais indicando padrões
culturais de uso do espaço e em diferentes áreas, sugerindo uma diferenciação e
hierarquização do espaço. A pintura presente nos fragmentos encontrados e tigelas
recuperadas se encontram em bom estado de conservação, o que indica que a provável
ocupação da aldeia tenha acontecido entre os séculos XIV e XVI, mas são necessários
maiores investigações para determinar essa gama de possibilidades (BORNAL, 2005).
A Figura 1(a) mostra um fragmento ungulado após a higienização, na qual possibilita
melhor compreensão da textura e forma. Após a caracterização, duas peças foram montadas:
A primeira trata-se de uma tigela cerimonial de porte pequeno, Figura 1(b) e uma tigela de
grande porte, Figura 1(c), ambas com pintura comum à tradição Tupiguarani – Fundo branco,
com faixas vermelhas e grafismos em linhas pretas. Os demais fragmentos foram guardados.
(a) (b) (c)
Figura 1: (a) Fragmento ungulado; (b) Tigela indígena cerimonial pintada; (c) Tigela indígena pintada.
Na Figura 2(a) percebe-se a pintura de um fragmento de peça cerimonial, que segundo
Prous (2005), os grafismos feitos por linhas finas sobre fundo branco lembram as formas de
um intestino, ou cérebro e não são apenas decoração, mas parecem expressar valores e hábitos
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coletivos, crenças, mitologia e mesmo rituais presentes na cultura Tupiguarani. Foram
inventariadas treze peças cerimoniais no Sítio Caninhas, sendo possível observar a decoração
pintada que permite identificar cores e formas, representadas na Figura 2(b).
(a)
(b)
Figura 2: (a) Fragmentos com decoração pintada; (b) Rendering de tigela cerimonial pintada.
As Figuras 3 (a), (b), (c) e (d) mostram as micrografias obtidas via Microscopia óptica
dos fragmentos simples, corrugado, escovado e ungulado, respectivamente. A superfície
simples apresenta poros distribuídos em toda área, de maneira uniforme. No fragmento
corrugado apresenta-se material orgânico e cor escura (queima), na superfície escovada
observa-se vales, sulcos e relevos, resultado do entalhe feito na peça. No fragmento ungulado
percebe-se marcas da decoração, efetuada pela pressão das unhas contra a mistura.
O processo de inventário leva-nos a descobrir fatos sobre a produção das peças e,
conseqüentemente, sobre o meio social dos produtores. Os grãos de quartzo proporcionam
reflexos brilhantes na peça quando exposta à luz. Outro fato observado foi a presença de
pontos mais escuros na superfície fraturada dos fragmentos, que é uma característica da
produção de peças Tupiguaranis, que costumavam utilizar na matéria-prima restos moídos de
outras peças, o denominado “caco moído” (LA SALVIA, 1989).
As peças, em sua maioria, apresentam ondulações na parte interior, sinais que indicam
a utilização do método de “Acordelamento”4, processo mais empregado na tradição
Tupiguarani.
(a) (b)
4 Essa técnica consiste na sobreposição de roletes de argila.
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(c) (d)
Figura 3 (a), (b), (c) e (d): Microscopia Óptica dos fragmentos cerâmicos – Magnitude de 20X.
Previamente foi realizado renderings manuais, que partiram da escolha de duas peças:
A urna funerária, Figura 4(a) e uma tigela maior, Figura 4(b), supostamente utilizada no
preparo de alimentos.
Os renderings da tigela maior partiram de um fragmento de grande porte presente no
acervo, com decoração ungulada. A decoração ungulada é comum à tradição Tupiguarani. A
forma desta peça não é comum na tradição Tupiguarani, sugerindo a hipótese de convivência
entre os Tupiguarani e diferentes tribos na região.
(a) (b)
Figura 4: (a) Rendering de urna funerária; (b) Rendering de tigela indígena.
A Figura 5(a) revela a reconstituição virtual (3D) feita por meio do programa Solid
Works, em que se pode observar a espessura da parede da peça. As Figuras 5(b) e 5(c)
revelam a reconstituição virtual feita no programa 3D Max.
Na Figura 5(b) pode-se observar uma textura originária de processo de construção que
se enquadra como corrugada. Os relevos e os vales são oriundos da pressão exercida pelas
unhas sobre a mistura e são paralelos ao eixo do diâmetro da peça.
Na Figura 5(c) visualiza-se a presença da decoração simples na parte inferior, e
ungulada na parte superior da peça. O nível de cor na cerâmica varia conforme os
componentes das argilas, os processos e a temperatura de tratamento térmico (KINDLEIN,
2006).
(a) (b) (c)
Figura 5 (a), (b) e (c) - Renderings digitais da urna funerária e (c) tigela indígena Tupiguarani.
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Conclusões
O estudo dos fragmentos cerâmicos permitiu identificar a categoria do sítio
arqueológico de Canas como unicomponencial, de natureza pré-colonial, cuja tribo
possivelmente é Tupi-guarani, devido características dos utensílios como: conformação das
cerâmicas por acordelamento, e pinturas geométricas na cor vermelha, branca e preta.
Existiam quatro possíveis unidades habitacionais, com vestígios de material
predominantemente cerâmico e lentes de carvão, aparecendo até 40 cm de profundidade. As
estruturas de sepultamento situavam-se fora das ocupações habitacionais indicando padrões
culturais de uso do espaço e, em diferentes áreas, sugerindo uma diferenciação e
hierarquização do espaço. A pintura presente nos fragmentos encontrados e tigelas
recuperadas se encontram em bom estado de conservação, o que indica que a provável
ocupação da aldeia tenha acontecido entre os séculos XIV e XVI, mas são necessários
maiores investigações para determinar essa gama de possibilidades (BORNAL, 2005).
O desenvolvimento e o resultado deste artigo tornam-se um fator importante por meio
do envolvimento de pessoas de diversas áreas. Nota-se, assim, à conclusão que, a partir do
desenvolvimento deste projeto multidisciplinar, os alunos do ensino médio e graduação
aumentaram suas visões, integrados num processo importante que fortalecerá a difusão e a
socialização dos conhecimentos entre o Design, Engenharia e Arqueologia. Neste sentido, o
uso de ferramentas e aplicativos de Design como a modelagem virtual e o estudo das texturas
dos utensílios contribuíram para a visualização da geometria, das dimensões e do design
propriamente dito dos produtos indígenas.
Referências
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Cultural de Jacarehy – Museu Arqueológico do Vale do Paraíba, p. 36, 2005.
CALLON, M.; LATOUR, B. Unscrewing the big leviathans: how do actors macrostructure
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MORAES, C. A. Arqueologia Tupi no Nordeste de São Paulo: um estudo de
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PROUS. A. Arqueologia. Revista Ciência Hoje, Rio de Janeiro, v. 36, n. 213, p. 22-28, 2005.
Disponível em:
<http://cienciahoje.uol.com.br/controlPanel/materia/resource/download/41398>. Acesso em:
30 ago. 2009.
Agradecimentos
Os autores agradecem ao CNPq pela concessão das bolsas de pesquisa (PIBIC) para os alunos
da FATEA - Salesianas e EEL-USP. Este projeto contou com o Auxílio à Pesquisa do CNPq
– Projeto Universal – 2008 - Processo 481703/2008-0.
Ao Prof. Valdir Brandão, aluno Rafael Nunes e Sr. Ocílio Ferraz pelo apoio na realização
deste trabalho.