A Directiva Europeia “Retorno” (Directiva 2008/115/CE). Custos e benefícios para uma política...

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61 A Directiva Europeia “Retorno” (Directiva 2008/115/CE). Custos e benefícios para uma política comum de imigração Fátima Loureiro de Matos 1. INTRODUÇÃO Segundo os últimos dados da Organização Internacional das Migrações (OIM) existem mais de 200 milhões de migrantes espalhados pelos vários continentes, correspondendo a cerca de 3% da população mundial 55 . Só em remessas, estes migrantes movimentaram em 2007 cerca de 337 mil milhões de dólares, dos quais 226 dizem respeito a indivíduos oriundos de países em desenvolvimento, mais 11% do que em 2006 56 . Contudo as últimas estimativas do Banco Mundial apontam para um decréscimo entre 5% e 9%, em 2009, ou seja, valores entre os 280 e os 290 mil milhões de dólares 57 , na sequência da crise económica mundial. Segundo a mesma fonte se, a crise económica se intensificar e se prolongar no tempo, o declínio das remessas e dos fluxos migratórios serão maiores, podendo a reacção política dos países receptores perante o aumento do desemprego que a crise tem gerado, levar a atitudes mais restritivas e a um maior controlo da imigração, contribuindo para o seu declínio 58 . 55 OIM - World Migration 2008: Managing Labour Mobility in the Evolving Global Economy 56 World Bank's Migration and Development Brief 5 (July 10, 2008) - Revisions to Remittance Trends 2007 57 World Bank's Migration and Development Brief 9 (March 23, 2009) - Revised Outlook for Remittance Flows 2009-2011 58 Segundo uma sondagem, da FT/Harris, efectuada entre 25 de Fevereiro e 3 de Março de 2009, que entrevistou um total de 6.538 adultos online na Espanha, França, Alemanha, Grã-Bretanha, Itália e nos EUA, 78% dos italianos e 79% dos britânicos, a maioria dos entrevistados, na Espanha, França e Alemanha apoiaria que os seus governos pedissem aos imigrantes para sair do país se não tivessem trabalho. Publicado no Financial Time, 16 de Março de 2009.

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A Directiva Europeia “Retorno” (Directiva 2008/115/CE). Custos e benefícios para uma

política comum de imigração

Fátima Loureiro de Matos

1. INTRODUÇÃO

Segundo os últimos dados da Organização Internacional das Migrações (OIM) existem

mais de 200 milhões de migrantes espalhados pelos vários continentes, correspondendo

a cerca de 3% da população mundial55. Só em remessas, estes migrantes movimentaram

em 2007 cerca de 337 mil milhões de dólares, dos quais 226 dizem respeito a indivíduos

oriundos de países em desenvolvimento, mais 11% do que em 200656.

Contudo as últimas estimativas do Banco Mundial apontam para um decréscimo entre

5% e 9%, em 2009, ou seja, valores entre os 280 e os 290 mil milhões de dólares57, na

sequência da crise económica mundial.

Segundo a mesma fonte se, a crise económica se intensificar e se prolongar no tempo, o

declínio das remessas e dos fluxos migratórios serão maiores, podendo a reacção

política dos países receptores perante o aumento do desemprego que a crise tem gerado,

levar a atitudes mais restritivas e a um maior controlo da imigração, contribuindo para o

seu declínio58.

55 OIM - World Migration 2008: Managing Labour Mobility in the Evolving Global Economy 56 World Bank's Migration and Development Brief 5 (July 10, 2008) - Revisions to Remittance Trends 2007 57 World Bank's Migration and Development Brief 9 (March 23, 2009) - Revised Outlook for Remittance Flows 2009-2011 58 Segundo uma sondagem, da FT/Harris, efectuada entre 25 de Fevereiro e 3 de Março de 2009, que entrevistou um total de 6.538 adultos online na Espanha, França, Alemanha, Grã-Bretanha, Itália e nos EUA, 78% dos italianos e 79% dos britânicos, a maioria dos entrevistados, na Espanha, França e Alemanha apoiaria que os seus governos pedissem aos imigrantes para sair do país se não tivessem trabalho. Publicado no Financial Time, 16 de Março de 2009.

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Dos 200 milhões de migrantes a nível mundial, apenas 20 a 30 milhões de migrantes

são considerados irregulares, correspondendo a cerca de 10% a 15% do total de

imigrantes do mundo59.

Apesar de os números da OIM e de outras organizações registarem flutuações que

revelam, para os últimos anos, algum aumento do stock total de migrantes e dos fluxos

migratórios em geral, a grande mobilidade territorial da população mundial não é um

fenómeno recente.

Com efeito, “poucos fenómenos sociais na história da humanidade terão tido

consequências civilizacionais tão relevantes como as migrações. Na verdade, a história

está repleta de “eras das migrações” … Para além do mais, poucos outros fenómenos

sociais desta dimensão se relacionam de forma tão próxima com o progresso humano,

ou têm tido um papel tão fundamental na ascensão e declínio de entidades politicamente

organizadas quanto as migrações”60.

Contudo, a moderna era das migrações, que se deve situar no quadro da afirmação e

consolidação dos Estados-Nação, ocorre apenas nos séculos XIX e XX. Mas o contexto

que explica os actuais movimentos é totalmente diferente daquele que caracterizou os

grandes movimentos migratórios inter-continentais do século XIX e primeira metade do

século XX e que serviu de base à construção das teorias explicativas dos fenómenos

migratórios assentes no princípio do equilíbrio entre factores de repulsão e factores de

atracção, com destaque para níveis de rendimento e emprego.

Actualmente, o racionalismo dessas teorias não é suficiente para explicar a alteração dos

padrões de migração. Na decisão de migrar, pesam, também, factores psicológicos e

subjectivos, que concorrem para a construção de uma imagem do que será o destino da

migração. Adicionalmente, as redes sociais constituídas pelos próprios imigrantes

funcionam como mais um factor que incentiva as partidas, sugere destinos e facilita a

inserção nestes61.

59 OIM - World Migration 2008: Managing Labour Mobility in the Evolving Global Economy. 60 PAPADEMETRIOU, Demetrios G. – Gerir melhor as migrações internacionais: princípios e perspectivas para maximizar os

benefícios das migrações. In: PAPADEMETRIOU, Demetrios G, (coord.) - A Europa e os seus Imigrantes no século XXI, Fundação Luso-Americana, 2008, p. XV 61 Ver, por exemplo, KRITZ, M.M; LIM, L.L; ZLOTNIK, Hania (ed.) – International migration systems: a global approach. Oxford: Calendron Press, 1992.

A DIRECTIVA EUROPEIA “RETORNO” (DIRECTIVA 2008/115/CE). CUSTOS E BENEFÍCIOS PARA UMA POLÍTICA COMUM DE IMIGRAÇÃO

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As causas que explicam a imigração internacional, como comprovam várias

investigações, variam de um contexto para outro. Elas englobam factores económicos

como o nível dos salários e de empregos; a segmentação do mercado de trabalho; a

difusão da economia informal; os desequilíbrios demográficos; o comércio internacional

e o investimento estrangeiro; as redes sociais informais; o contrabando e as redes de

tráfico e sistemas activos de migração62. Em termos sintéticos, a falta de mão-de-obra

qualificada e a existência de nichos de emprego deixados vagos pela população local,

agravadas pelo envelhecimento e declínio demográfico, dos países de destino,

constituem razões fundamentais para que a imigração persista.

Ainda que, a grande maioria dos fluxos migratórios (cerca de 60%) continue a registar-

se entre países e regiões do hemisfério Sul, nas últimas décadas do século XX a Europa

afirmou-se como um dos principias destinos migratórios mundiais, passando a

“importar”, mais que a “exportar” migrantes, sendo, igualmente palco de fluxos

migratórios temporários, que têm vindo a ganhar um grande peso no total das

migrações. Estes são dados importantes, que contribuem para despertar preocupações

comunitárias quanto à regulação da imigração.

A imigração irregular é sem dúvida um dos assuntos mais discutidos, actualmente,

sobre a gestão das migrações, quer em debates políticos, quer em conferências sobre as

migrações, quer ainda, nos vários meios de informação e comunicação. Para a Europa

estima-se que o seu número é de 4,5 a 8 milhões oriundos de países terceiros.

Este tipo de fluxos resulta de uma complexa teia de factores, que incluem as

desigualdades de desenvolvimento, a dimensão da economia informal, a política de

gestão dos fluxos, o controlo, as restrições e a pressão migratórias63. Associado a estes

aspectos, “emerge uma dimensão política, porque a migração irregular está directamente

associada à política dos Estados em termos de controlo das fronteiras e soberania, ou

seja, cada Estado tem o direito político de decidir quem pode ou não atravessar as suas

fronteiras e quais as circunstâncias em que tal pode ser feito. Contudo, apertados

controlos fronteiriços, que são baseados frequentemente em suposições de natureza

62 Ver, por exemplo, MASSEY, D. et al. - Worlds in Motion – Understanding International Migration at the End of the Millennium, Oxford, Clarendon Press, 1998. 63 MALHEIROS, Jorge - Irregular Migration in OECD Member States – Nature, Profiles and Policies: An Overview, 2009 (a publicar).

MIGRAÇÔES E INTERCULTURALIDADE

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política - a capacidade “percepcionada” de integrar os estrangeiros; a opinião pública

relativamente aos estrangeiros, especialmente no mercado de trabalho e particularmente

em períodos de crise económica – têm provado pouca eficácia no controlo da migração

irregular, e não são, o elemento chave de um esquema de regularização migratória,

dominado por fluxos legais”64.

Vários autores65, têm também salientado um outro lado da dimensão politica das

migrações irregulares: a posição social dos migrantes irregulares nas sociedades de

acolhimento, que é marcada pela vulnerabilidade social e redução dos direitos de

cidadania, ainda que, na prática na maioria dos países sejam atribuídos aos migrantes

irregulares, alguns direitos sociais, como o acesso à justiça, à saúde e à escola para os

seus filhos.

Em termos tipológicos, as migrações irregulares assumem diversas formas, sendo de

salientar entre as mais comuns:

- Entradas indocumentadas/não autorizadas. Correspondem aos indivíduos de um

determinado Estado que entram de forma clandestina num outro país, a maioria fá-lo

através de fronteiras terrestres, mas a via marítima é cada vez mais utilizada, sobretudo

na Europa meridional. Em qualquer dos casos, o migrante consegue escapar ao controlo

e detecção, por parte das autoridades. Uma proporção cada vez maior destes imigrantes

é vítima de tráfico auxiliada por passadores;

- Indivíduos sujeitos a controlo na entrada mas que entram no país de destino através de

documentos fraudulentos;

- Indivíduos cuja permanência excede o período de validade dos vistos ou das

autorizações de residência. Corresponde aqueles que entram de forma legal num país,

mas deliberadamente excedem o período de permanência legal, caindo assim numa

situação de ilegalidade.

64 Id. Ibid.. 2009, p. 2 65 BAUBOCK, R., et al. – Migrant’s Citizenship: Legal Status, Rights and Political Participation. In: PENNINX, R.; BERGER, M.; KRAAL, K – The Dynamics of International Migration and Settlement in Europe – A State of the Art. Amsterdam University Press, 2006, p .65-98; FELDBLUM, M. – Managing Membership: New Trends in Citizenship and Nationality Policy. In: ALEINIKOFF. T.A.; KLUSMEYER, D. – From Migrants to Citizens – Membership in a Changing World, Washington DC, Carnegie Endowment for International Peace, 2000, p. 475-500; MARTINELLO, M.- Citizenship of the European Union. In: ALEINIKOFF, T.A.; KLUSMEYER, D. – From Migrants to Citizens – Membership in a Changing World, Washington DC, Carnegie Endowment for International Peace, 2000, p.32-81.

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Em 2007, as principais áreas da Europa afectadas pela migração irregular, de acordo

com o número de detecções e detenções de migrantes irregulares foram:

- as fronteiras terrestres do Sudeste da Europa, principalmente as fronteiras entre a

Grécia e a Albânia e entre a Grécia e a Turquia;

- as fronteiras aéreas no Norte e Oeste da Europa, em especial de França;

- as fronteiras marítimas no Sul e no Sudeste da Europa, principalmente a fronteira

marítima entre a Grécia e a Turquia e a costa italiana66.

O Norte de África, para além de uma região de origem, constitui, cada vez mais, uma

área de trânsito. A curta distância que a separa da Europa ou de algumas ilhas europeias

e a organização de redes de imigração irregular têm contribuído para o aumento de

entradas por mar, nos países do Sul da Europa67.

O envelhecimento demográfico, a escassez de mão-de-obra qualificada, o desequilibro

em volume de pedidos de asilo e admissão de refugiados, o crescente fluxo de

imigrantes irregulares e os problemas associados com uma comunidade imigrante mal

integrada num espaço europeu de mobilidade criam uma conjuntura social e económica

complexa. As autoridades europeias e nacionais visam, então, no espaço europeu, criar

uma estratégia para gerir a imigração, consubstanciada numa política comum, que

envolve as componentes de gestão dos fluxos e de integração social.

Trata-se, contudo, de uma área sensível para os Estados - Membros: gerir politicas de

asilo e de migração a nível comunitário implica ceder algum espaço de acção politica

em matérias que se relacionam intrinsecamente com questões de soberania e cidadania

nacionais, bem como de relações internacionais bilaterais.

Num contexto de modelos e realidades de imigração, integração e asilo extremamente

diferentes nos vários Estados-Membros, a cedência de autoridade nestas temáticas é

extremamente sensível. A abordagem europeia, abrangente das várias vertentes das

políticas de imigração (legal, irregular, integração, fronteiras, asilo e desenvolvimento)

baseia-se no objectivo de maximizar os benefícios da imigração para todos os

66 FFRONTEX - Relatório Geral, 2007, p.15. Segundo, este relatório foram detectadas em 2007, um total de 163 903 entradas ilegais, destas 50,2% por terra, 12,6% por meio aéreo e 29,7% por via marítima. 67Saliente-se, que na Itália as entradas ilegais por mar representam 42%, do total de entradas por esta via, na Grécia 19%, Espanha 24%,e Malta 3,5%. Os migrantes irregulares marroquinos, normalmente detectados nas fronteiras marítimas, mas também na fronteira terrestre entre Espanha e Marrocos, foram os terceiros mais detectados. Foram detectados nacionais do Afeganistão, do Egipto, da Argélia, da Eritreia e da Somália nas fronteiras marítimas. FRONTEX - Relatório Geral, 2007, p.16.

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implicados acreditando na ‘capacidade de absorção’ e na sua relação com as

necessidades laborais de cada Estado-Membro.

A Directiva 2008/115/CE (ou Directiva Retorno como ficou conhecida nos meios de

comunicação) insere-se nesta abordagem problemática, de construção de uma política

comum de imigração, em que os diferentes Estados-Membros tiveram que ceder para se

chegar a um consenso. Esta directiva surge da necessidade de regras comuns para o

repatriamento de imigrantes de países terceiros em situação irregular, como resultado do

desenvolvimento de uma Europa como espaço sem fronteiras internas e com uma

política de imigração comum. As negociações duraram 3 anos deste a apresentação da

primeira proposta68, do grupo de trabalho da Comissão Liberdades Cívicas, Justiça e

Assuntos Internos (LIBE).

O debate foi intenso quer dentro das instituições europeias, quer ao nível de consultas

aos vários países membros e outros organismos69.

Em várias comunicações adoptadas no domínio da imigração e asilo durante o período

de 2000 a 2007, e nomeadamente na comunicação relativa a uma política comunitária

de regresso dos residentes em situação irregular, de 14 de Outubro de 2002, a Comissão

sublinhou que o regresso constitui um elemento importante de combate à imigração

irregular, constituindo uma forma de dissuasão para os actuais e futuros migrantes. Por

esta razão, entre outras medidas, procurou estabelecer uma política comum e encorajar a

cooperação entre os Estados-Membros para a execução de medidas de retorno. O

“Programa Haia”, adoptado no Conselho Europeu de Bruxelas de 4 e 5 de Novembro de

2004, reafirmou este ponto de vista e solicitou expressamente o estabelecimento de

normas comuns para proceder aos repatriamentos em condições humanas e respeitando

os direitos humanos e a dignidade das pessoas. Foi precisamente este Conselho que

convidou a Comissão LIBE a apresentar uma proposta, a qual se consubstanciou na

referida COM (2005) 391 final.

68 COM (2005) 391 final, 1/09/2005 69 Ver, nomeadamente, Parecer do Comité das Regiões, de 27 de Abril de 2006, Cap. III, e os vários documentos apresentados ao Parlamento Europeu – European Parliament the legislative Observatory: http://www.europarl.europa.eu/oeil/FindByProcnum.do?lang=2&procnum=COD/2005/0167. Além do parecer do Alto Comissariado da ONU para os refugiados - UNHCR - Observations on the European Commission’s Proposal for a Directive on

common standards and procedures in Member States for returning illegally staying third-country nationals (COM(2005) 391 final, Dezembro de 2005.

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Esta proposta destinava-se a apresentar normas comuns claras, transparentes e

equitativas em matéria de regresso, afastamento, recurso a medidas coercivas, prisão

preventiva e readmissão de nacionais de países terceiros em situação irregular, tendo em

conta o respeito pelos direitos humanos e as liberdades fundamentais das pessoas em

causa.

O Parlamento Europeu e o Conselho chegaram finalmente a um acordo político em

Junho de 2008, tendo então, sido aprovada a directiva70, a qual foi publicada no Jornal

Oficial da União Europeia de 24 de Dezembro de 200871.

De acordo com a sua proposta inicial, a Comissão sempre procurou, ao longo das

negociações, conciliar o interesse legítimo dos Estados-Membros na existência de

procedimentos de regresso céleres e eficientes e o interesse de proteger os direitos

fundamentais, num texto que representa um valor acrescentado para a Europa e que se

integra na política global de imigração da União Europeia (UE).

Vários dos compromissos baseiam-se nos princípios directores do Conselho da Europa

relativos ao regresso forçado e remetem designadamente para as disposições aplicáveis

da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e de outros instrumentos jurídicos

internacionais pertinentes, nomeadamente, a Convenção das Nações Unidas sobre os

Direitos da Criança de 1989 e a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948.

Um dos aspectos fundamentais que a directiva introduz é o desaparecimento de “zonas

cinzentas”, quanto ao prazo de regresso voluntário, de interdição de reentradas e quanto

ao período de detenção.

Contudo, a UE não tem os recursos suficientes para receber com dignidade todos os

migrantes que a procuram, em busca de uma vida melhor. As migrações irregulares de

populações pobres e pouco qualificadas, podem por em causa a coesão social dos países

de destino. A gestão da imigração tem de ter em conta as capacidades da Europa em

70 A Directiva foi aprovada com 369 votos a favor, 197 contra e 106 abstenções. Entre os grupos parlamentares que votaram contra, contam-se aqueles, que desde o início das negociações sempre demonstraram uma oposição à directiva, afirmando que esta não assegurava o respeito pelos direitos fundamentais, caso do grupo dos Verdes/Aliança Livre Europeia; o grupo Confederal da Esquerda Unitária Europeia/Esquerda Nórdica Verde e o grupo Independência/ Democracia. 71 A Directiva é aplicável a todos os Estados – Membros da UE, excepto o Reino Unido, a Irlanda e a Dinamarca.

MIGRAÇÔES E INTERCULTURALIDADE

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termos de mercado de trabalho, habitação, saúde, educação, serviços sociais e protecção

dos imigrantes contra possíveis explorações por redes criminosas ou empregadores72.

Os Estados-Membros têm feito um esforço conjunto de harmonização das suas políticas

migratórias, no sentido da criação de uma política comum, nomeadamente, a abolição

dos controles fronteiriços internos, adopção de uma política comum de vistos,

harmonização do controlo das fronteiras externas, política de asilo, cooperação no

controlo da imigração irregular através da agência FRONTEX73. Toda a evolução das

políticas de imigração e asilo na União Europeia é marcada por uma orientação

comunitária que rejeita a cooperação minimalista em prol de uma política comum de

imigração.

Nesta comunicação abordamos dois aspectos principais, primeiro os antecedentes

políticos da directiva e em segundo fazemos uma análise da mesma, salientando os

custos e benefícios para uma política comum de imigração.

2- A DIRECTIVA E SUA INTEGRAÇÃO NUMA POLÍTICA COMUM DE

IMIGRAÇÃO, ANTECEDENTES

As iniciativas comunitárias no quadro da imigração e integração, foram geralmente

consideradas insuficientes e pouco actuantes, situadas mais ao nível da retórica politica

do que ao nível da política de acção. Em geral, a UE era acusada de não ter uma

verdadeira politica comum para a imigração, um assunto que seria demasiado sensível

de discutir entre os Estados-Membros e, certamente, pouco consensual.

A atenção concedida às questões relacionadas com a imigração na UE, a partir dos anos

90, coincidiu com uma maior preocupação quanto à segurança74, com a mobilidade

72 Refira-se a este propósito, que já foi discutida e aprovada, com 522 votos a favor, 105 contra e 34 abstenções, em 19 de Fevereiro de 2009, aguardando-se a sua publicação final uma Directiva sobre sanções contra os empregadores nacionais que empreguem nacionais de países terceiros em situação irregular COM (2007) 0249, a qual juntamente com a Directiva Regresso e com a Directiva “Cartão Azul”, relativa às condições de entrada e permanência de nacionais de países terceiros para efeitos de emprego altamente qualificado, também em discussão, constituem passos fundamentais de uma política comum quanto às migrações, nomeadamente, a questão do combate à imigração irregular. 73 A FRONTEX é a Agência Europeia para a Gestão da Cooperação Operacional nas Fronteiras Externas dos Estados Membros da União Europeia, foi criada em 2004 (Regulamento (CE) nº 2007/2004 do Conselho, de 26 de Outubro de 2004 (JOL 349 de 25.11.2004). 74 Após os ataques de 11 de Setembro de 2001, os atentados de Madrid em 2004 e em Londres em 2005 e 2007, a narrativa da imigração como uma ameaça à segurança da UE atinge o seu clímax.

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dentro do espaço europeu sem fronteiras e, em matéria de asilo, uma distribuição

desequilibrada de pedidos e admissão de refugiados.

Só a partir de 1992, com o Tratado de Maastricht, foi criado um quadro institucional

para lidar com as temáticas da imigração e asilo num contexto europeu, com base

estritamente intergovernamental. O Tratado de Amesterdão, em 1999, atribuiu à UE o

objectivo político de se manter e desenvolver como um espaço de liberdade, segurança e

justiça. Neste âmbito foi transferida para as instituições europeias a competência

legislativa em matérias de transposição de fronteiras, vistos, asilo e imigração75.

No entanto, foi no Conselho Europeu de Tampere em 1999 que foi acordada uma

estratégia política para a criação de uma política comum de imigração e asilo na UE.

Baseia-se numa abordagem global e abrangente, equilibrando migração económica e

humanitária, com direitos e obrigações para imigrantes semelhantes aos dos cidadãos

nacionais, para promover a coesão económica e social em toda a União. A estratégia de

gestão deve ser construída com base em parcerias com países de origem, incluindo

políticas de desenvolvimento.

O Programa Haia 2005-2010 definiu um conjunto de prioridades, como a prevenção do

terrorismo, o controlo de fronteiras, a imigração e o asilo. Os líderes da UE

concordaram usar votação de maioria qualificada e o método de co-decisão nas áreas de

asilo, imigração e controlo de fronteiras. Políticas de imigração legal continuam sujeitas

à regra de unanimidade. O Programa Haia propõe medidas chaves nas várias vertentes

da imigração e asilo, como a criação de um sistema comum de asilo na UE, com

procedimentos e estatutos comuns, até 2009; uma estratégia europeia para assegurar a

integração dos imigrantes nas sociedades europeias; medidas para que imigrantes legais

possam trabalhar na UE de acordo com necessidades laborais nacionais; um

enquadramento legal para expulsar imigrantes irregulares76; um maior esforço para criar

uma política comum de imigração em parceria com países de origem e trânsito,

promovendo o desenvolvimento de sistemas de asilo em países terceiros e procurando

aliados no combate à imigração irregular. Toda esta abordagem resume-se no conceito

de Migration Management, a gestão da imigração, com o objectivo de criar uma

75 Artigo 63º do Tratado. 76 Medida esta que se veio a consubstanciar na aprovação da Directiva 2008/115/CE.

MIGRAÇÔES E INTERCULTURALIDADE

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estratégia de gestão dos fluxos migratórios, para maximizar o impacto positivo na

sociedade e na economia.

A partir desta iniciativa, a Comissão Europeia criou, em 2005, o plano de “Abordagem

Global da Migração” para dar continuidade a estas propostas. Insiste numa abordagem

global e coerente da imigração na UE que engloba aspectos económicos, sociais,

humanitários, legais, de política externa e desenvolvimento. Toda a evolução das

políticas de imigração e asilo na UE passou a ser marcada por uma orientação

comunitária que rejeita a cooperação minimalista em prol de uma política comum de

imigração.

As falências dos modelos de integração de imigrantes em vários Estados-Membros

vieram, promover uma maior pró actividade por parte desses Estados no sentido de

estabelecer regras comunitárias mais concretas de controlo e gestão da imigração. O

caso francês foi, nesse aspecto, paradigmático. Os distúrbios violentos num bairro dos

arredores de Paris no final do ano de 2005 marcaram também o fim de um modelo de

integração que já não conseguia dar resposta às transformações dos padrões migratórios.

Os acontecimentos, transmitidos em directo por toda a Europa, vieram revelar uma

fragilidade e uma incapacidade em, de facto, absorver as vantagens sociais e

económicas da imigração.

O resultado das eleições presidenciais francesas em 2007, que deram a vitória a Nicolas

Sarkozy, permitia antever uma maior ênfase na questão da segurança e maior

proteccionismo na gestão dos fluxos migratórios, sobretudo a nível nacional, embora

fosse expectável que também a nível europeu os Estados-Membros viessem reclamar

uma maior harmonização das práticas nacionais.

Situação que acabou por acontecer quer, com a aprovação da Directiva Retorno em

Julho de 2008, que constituiu a primeira tomada de posição sobre imigração segundo o

processo de co-decisão, quer com a recente aprovação, em 19 de Fevereiro de 2009, da

Directiva sobre sanções contra os empregadores nacionais que empreguem nacionais de

países terceiros em situação irregular (COM (2007) 0249).

Em 2008, a Comissão Europeia numa comunicação ao Parlamento, ao Conselho, ao

Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões, intitulada “Uma política

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comum de imigração para a Europa: princípios, acções e instrumentos”77, afirma que “a

imigração é uma realidade que deve ser gerida com eficácia. Numa Europa aberta sem

fronteiras internas, nenhum Estado-Membro pode gerir a imigração de forma isolada”78.

Neste documento são definidos um conjunto de princípios, acções e instrumentos para

levar a cabo uma política comum de imigração.

Este documento, vem não só chamar a atenção para a importância da imigração em

termos económicos e sociais, na senda de outros documentos anteriores, como referimos

atrás, como ainda, a questão fundamental, da parceria com os países de origem para

uma eficaz gestão dos fluxos migratórios, reforçando, mais uma vez, a questão da

segurança, através da intensificação da luta contra a imigração irregular e politicas de

regresso.

A Presidência Francesa no segundo semestre de 2008, na senda da directiva aprovada

em Junho, insiste, novamente, na questão da relação entre imigração irregular e

segurança, com a aprovação no Conselho Europeu de 15 e 16 de Outubro de 2008, do

Pacto Europeu de Imigração e Asilo.

O Pacto é um documento de orientação política não vinculativo, que define as linhas

gerais de um futuro plano de acção na construção de uma política europeia de imigração

e asilo, o chamado Programa Haia II 2009-2015. A abordagem pretende ser global e

abranger os vários aspectos de uma política de imigração e asilo, semelhante à dos seus

antecessores, mas corrigindo erros do passado. Baseia-se, igualmente, nos conceitos de

solidariedade, particularmente em questões de asilo, e de migração gerida, em termos de

tirar o máximo partido dos benefícios da imigração. Apesar de ser um Pacto para a

criação de uma política europeia, não é uma proposta para uma política comum

harmonizada, mas sim para a coordenação de objectivos políticos e operacionais.

Situação que reflecte as dificuldades em implementar uma política comum em termos

de entradas legais e residência, assim como a relutância de alguns Estados-Membros em

delegar as suas competências nesta matéria. O texto define a orientação em cinco

77 COMISSÃO DAS COMUNIDADES EUROPEIAS - COM (2008) 359 final, Bruxelas, 17.6.2008 78 Id. Ibid., p. 2

MIGRAÇÔES E INTERCULTURALIDADE

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compromissos políticos que abrangem as cinco áreas definidas no Programa Haia -

imigração legal, imigração ilegal, controlo de fronteiras, asilo e desenvolvimento79.

O combate à imigração ilegal é uma vertente fundamental do Pacto Europeu e de toda a

evolução da estratégia europeia, e também a mais contestada. O Pacto propõe três

acções em concreto: o reforço de cooperação entre Estados-Membros e países de origem

e trânsito, a expulsão de imigrantes ilegais (o pacto continua a utilizar o termo “ilegal”

em vez do mais politicamente correcto “irregular”80), e a presunção de que todos os

países devem readmitir os seus cidadãos. Neste âmbito, o Pacto propõe a cooperação

com países terceiros para readmitirem imigrantes ilegais expulsos de países europeus,

reforçando as disposições da Directiva Retorno.

O pacto reforça, assim, a questão da segurança e expulsão, argumentando que “ A

União Europeia não tem os meios necessários para acolher decentemente todos os

migrantes que esperam encontrar uma vida melhor na UE”81.

Um dos pontos centrais da política europeia de migração, como referimos atrás, consiste

em gerir eficazmente a expulsão de imigrantes, quer daqueles, que entram de uma forma

irregular, quer aqueles cujas autorizações legais para residência na UE tenham expirado.

Para cumprir essa política, os Estados-Membros tentam celebrar novos acordos de

readmissão; harmonizar as leis sobre o regresso, afastamento, o uso de medidas

coercivas, a detenção temporária, a interdição de reentrada dos imigrantes nos diversos

países da UE e melhorar o uso dos voos comuns de retorno pelos Estados-Membros.

A Comissão afirmou que “o retorno continua a ser uma pedra angular da política de

migração”82. Por exemplo, números de 2004 apontam que os países da UE emitiram

650000 ordens de expulsão, 164000 foram repatriações forçadas83. Assim, ano após

ano, um número significativo de imigrantes são detidos, colocados sob custódia ou

expulsos do território europeu. Desde 2001, a UE estabeleceu que as políticas de retorno

e readmissão são uma parte crucial da luta contra a imigração irregular e que a eficácia

dessas políticas constitui uma técnica de persuasão, muito importante, para os migrantes

79 Conselho da Europa – Pacto Europeu para a Imigração e Asilo, 24 de Setembro de 2008, 1440/08, p.4 80 Aliás um retrocesso em relação à própria Directiva Retorno onde é utilizado o termo irregular. 81 Conselho da Europa – Pacto Europeu para a Imigração e Asilo, 24 de Setembro de 2008, 1440/08 p.3. 82 EUROPEAN COMMISSION - EU policy to fight illegal immigration. MEMO/06/296 Brussels, 19 July, 2006. 83 EUROPEAN MIGRATION NETWORK - Annual Report on Asylum and Migration Statistics 2004 and 2005, September 2008, Synthesis Report.

A DIRECTIVA EUROPEIA “RETORNO” (DIRECTIVA 2008/115/CE). CUSTOS E BENEFÍCIOS PARA UMA POLÍTICA COMUM DE IMIGRAÇÃO

73

actuais e futuros. Por esta razão, entre outras medidas, procurou estabelecer uma

política comum e incentivar a cooperação entre os Estados-Membros para executar

medidas de regresso. Situação que foi condensada na decisão do Conselho Europeu84

sobre a organização de voos comuns para expulsão de imigrantes e partilhar o custo de

repatriação85. Também, uma das funções da FRONTEX é apoiar os Estados-Membros,

aquando da organização conjunta de operações de retorno86.

Outra das medidas adoptadas pela Comissão, para facilitar a readmissão de imigrantes,

foi a celebração de acordos de readmissão conjuntos, desde 2000 a Comissão foi

mandatada para negociar acordos de readmissão com países terceiros, neste momento já

estão completados acordos com o Sri Lanka, a Albânia, Hong Kong, Macau, Federação

Russa, Ucrânia, Moldávia, Servia, Montenegro, Bósnia-Herzegovina e Macedónia.

Outros estão em processo de negociação: Marrocos, Paquistão desde 2002, China,

Turquia e Argélia desde 2002.

Estamos a assistir a uma situação paradoxal em que a supressão de fronteiras entre os

Estados-Membros – que deveria significar um aumento da liberdade de circulação – se

revelou como um espaço com vários obstáculos à circulação de imigrantes.

3- CUSTOS E BENEFÍCIOS DA DIRECTIVA PARA UMA POLÍTICA COMUM

DE IMIGRAÇÃO

O objectivo da directiva é o de estabelecer “normas e procedimentos comuns a aplicar

nos Estados-Membros para o regresso de nacionais de países terceiros em situação

irregular” (Artigo 1º). O conceito de regresso inclui o país de origem, um país de

trânsito, ou qualquer outro país para o qual o migrante em situação irregular decida

regressar voluntariamente e no qual seja aceite.

84 Decisão do Conselho de 29 de Abril de 2004, sobre organização de voos conjuntos para o retorno do território de dois ou mais Estados-Membros de nacionais de países terceiros que são sujeitos a ordens individuais de retorno. 85 Os voos conjuntos são também um instrumento efectivo do “reforço” da política Europeia do Tratado de Prüm, também conhecido como Schengen III. 86 Concretamente, entre 2006 e 2007 a FRONTEX colaborou na organização de 12 voos conjuntos., tendo sido expulsos 387 imigrantes irregulares, Relatório Geral da FRONTEX 2007, p. 38-40

MIGRAÇÔES E INTERCULTURALIDADE

74

A directiva, vem reforçar muitas das restrições referidas acima, permitindo a detenção e

expulsão de imigrantes em situação irregular, assim como, de menores não

acompanhados constituindo, aliás, estas disposições as mais polémicas. O período de

detenção é de seis meses (com possibilidade de ser prorrogada por um período de doze

meses, em circunstâncias específicas - assentes, por exemplo, na falta de cooperação do

cidadão nacional de país terceiro)87. A detenção será, de acordo com a directiva,

ordenada pelas autoridades administrativas ou judiciais. Quando a detenção tiver sido

ordenada por autoridades administrativas, os Estados-Membros preverão um controlo

jurisdicional célere da legalidade da detenção, a decidir o mais rapidamente possível a

contar do início da detenção.

A directiva, penaliza o incumprimento da decisão de regresso impondo uma interdição

de readmissão, válida em toda a UE, que não deverá, em princípio, exceder 5 anos, se

bem que casos de ameaça à ordem ou à segurança pública sejam pretexto para uma

interdição mais longa. As decisões de repatriamento têm de ser tomadas caso a caso e

devem assentar em critérios objectivos. A detenção só será permitida se outras medidas

menos coercivas não possam ser aplicadas ao caso e requer uma decisão escrita,

fundamentada factualmente e nos termos da lei e será sujeita a revisão por uma

autoridade judicial em intervalos razoáveis. O apoio jurídico aos imigrantes passa a ser

obrigatório e gratuito, estando também previsto serviços linguísticos.

Em termos positivos, a directiva dá prioridade à extensão do período de regresso

voluntário, de 7 até 30 dias, se bem que em alguns casos este período não seja

concedido. Do mesmo modo, a directiva obriga os Estados-Membros a emitir uma

decisão de regresso (Artigo 6º), existindo no entanto algumas excepções,

nomeadamente a possibilidade de conceder uma autorização de residência por razões

compassivas, humanitárias ou outras (Artigo 6º, cl. 4). Por último, a directiva estabelece

diversas garantias para o migrante em situação irregular durante todo o processo de

afastamento tais como, o respeito pelo princípio de não-repulsão (Artigo 5º), a

possibilidade de recurso contra uma decisão de regresso (Artigo 13º) ou determinadas

garantias no caso de detenção de menores ou famílias (Artigo 17º).

87 Em Portugal, a detenção de um cidadão estrangeiro em situação irregular não pode exceder 60 dias, de acordo com o artigo 146°, n°3 da Lei nº 23/2007, de 4 de Julho, (Lei da Imigração).

A DIRECTIVA EUROPEIA “RETORNO” (DIRECTIVA 2008/115/CE). CUSTOS E BENEFÍCIOS PARA UMA POLÍTICA COMUM DE IMIGRAÇÃO

75

Em relação aos imigrantes irregulares que tiverem requerido a renovação dos seus

títulos de residência ou outro visto que lhe conceda um direito de permanência no

território de um Estado-Membro, este “ponderará” a hipótese de se abster de emitir uma

decisão de regresso até que o processo esteja concluído (Artigo 6º, nº7). Este termo é

bastante perigoso, pois deixa à livre discricionariedade do Estado expulsar aqueles

imigrantes que deram entrada em um processo de renovação de vistos e aguardam o

resultado.

No caso português, a interdição de entrada é aplicável em caso de afastamento coercivo

(ao cidadão estrangeiro expulso é vedada a entrada em território nacional por "período

não inferior a cinco anos", de acordo com o artigo 144° da lei 23/2007). O imigrante em

situação irregular que se decida pelo regresso voluntário passa a estar numa situação

mais favorável do que a do expulsado, na medida em que pode voltar a imigrar

legalmente, embora quando o faça no período de três anos tenha a obrigação de

reembolsar o Estado pelas quantias gastas com o seu regresso.

Nos casos de regresso voluntário, os Estados-Membros podem optar por não aplicar

qualquer interdição de entrada, mas, esta é uma decisão que fica ao seu arbítrio. Um

ponto importante é o facto de os Estados-Membros manterem legislação nacional mais

favorável para os imigrantes, ficando impedidos de adoptar ou manter normas mais

restritivas do que as previstas na directiva.

Assim, entre os benefícios da directiva salienta-se a harmonização das disposições

quanto ao período de detenção, partida voluntária e interdição de readmissão, atendendo

que as diferenças actuais entre os países são significativas (quadro1). Constituindo,

ainda, a primeira de três directivas sobre uma política comum de imigração a ser

submetida à votação do plenário88.

Em Portugal, a lei 23/2007, já referida regula a entrada e residência de pessoas de

nacionalidade estrangeira. Esta lei prevê um período de detenção máximo de 60 dias.

Existe uma proibição de entrada durante 5 anos, e o prazo para a partida voluntária está

definido entre 10 e 20 dias. De acordo com fontes oficiais do Ministério da

88 As restantes são a já referida, Directiva sobre sanções contra os empregadores nacionais que empreguem nacionais de países terceiros em situação irregular COM (2007) 0249, já aprovada, a outra é a Directiva “Cartão Azul”, relativa às condições de entrada e permanência de nacionais de países terceiros para efeitos de emprego altamente qualificado, que se encontra em discussão.

MIGRAÇÔES E INTERCULTURALIDADE

76

Administração Interna a transposição da directiva para a lei nacional não irá trazer

qualquer alteração a estas disposições89. Deste modo, a implementação desta directiva

não produzirá efeitos ou alterações jurídicas na situação dos imigrantes que se

encontram em Portugal em situação irregular.

A Itália já implementou parcialmente a directiva, através da nova lei da segurança90.

Constituindo um claro exemplo que viola algumas disposições da directiva. Em

primeiro lugar, estabelece que qualquer entrada ou permanência em Itália sem

autorização constitui crime punível com uma coima de 5.000 a 10.000 euros. Em

segundo lugar, a nova lei não estabelece um prazo para a partida voluntária. Mais ainda,

a proibição de entrada pode ser aplicada por um período mínimo de 5 anos e máximo de

10 anos.

A directiva foi muito contestada, quer dentro do próprio parlamento europeu, quer a

nível internacional, sendo de destacar as críticas de vários governos da América Latina

(Bolívia, Equador91, Venezuela92, Chile, Uruguai, Brasil93, Peru e os Estados do

Mercosul94), da África, de organizações não governamentais, dos próprios imigrantes e

suas associações, de movimentos sociais da Europa e de vários países do Mundo.

As críticas por parte da América Latina constituíram uma reacção comum sem

precedentes a uma medida da UE. Isto torna-se extremamente importante, visto que a

América Latina é considerada um parceiro estratégico da UE. O papel da imigração

nessa parceria é crucial, como foi bem reflectido na declaração final da reunião da

cimeira América Latina, Caribe e União Europeia em Lima, em 2008.95

Entre as várias críticas que foram apontadas à directiva, destacam-se, a estreiteza do

prazo para o retorno voluntário; o prazo de readmissão; a prisão preventiva meramente,

89 MAGALHÃES, José - A nossa Opinião sobre a Directiva do Retorno, 14 de Junho de 2008. 90 Lei de 15 de Julho de 2009, nº 94 “Disposizioni in matéria di sicurezza publica”. 91 O Presidente do Equador intitulou a Directiva como a “Directiva da Vergonha”. 92 O presidente Hugo Chaves, ameaçou os países europeus que adoptassem a Directiva que não receberiam petróleo venezuelano. 93 O Presidente Lula da Silva, declarou que a legislação aprovada no Brasil para a regularização de imigrantes irregulares (Lei nº 11/961/2009, era uma lição par os países desenvolvidos). 94 Os estados do Mercosul redigiram uma nota conjunta de protesto. O secretario general da Organização de Estados Americanos (OEA), José Miguel Insulza, classificou de paradoxo o facto da UE negociar acordos de Associação e estabelecer alianças estratégicas ao mesmo tempo que adopta medidas de prisão, que tratam como delinquentes os imigrantes irregulares, sem sequer discutir ou negociar o tema com os governos latino americanos. CENTRO LATINOAMERICANO PARA AS RELACIONES CON EUROPA - Gobiernos latinoamericanos rechazaron de forma unánime la Directiva de Retorno de la UE, 20.06.2008. 95O ponto 27 da Declaração Final, é inteiramente dedicado à imigração. Entre outros aspectos realça ,“We call our regions to further develop a structured and comprehensive dialogue…(that) will also address the issues of regular and irregular migration”. A Declaração final da última Cimeira UE-ALC, realizada em Madrid em Maio de 2010, no seu ponto 28 torna a abordar a questão das migrações.

A DIRECTIVA EUROPEIA “RETORNO” (DIRECTIVA 2008/115/CE). CUSTOS E BENEFÍCIOS PARA UMA POLÍTICA COMUM DE IMIGRAÇÃO

77

por questões administrativas96; a detenção de menores não acompanhados, mesmo que

prevendo o seu alojamento em instituições dotadas de pessoal e instalações que tenham

em conta as pessoas da sua idade97, a questão da gratuidade da assistência jurídica e/ou

representação jurídica gratuita, nos termos da legislação nacional sobre esta matéria,

quando essa gratuitidade deveria decorrer directamente da legislação europeia que a

consagra98. A necessidade de existirem acordos de readmissão comunitários e bilaterais

com os países terceiros para facilitar o procedimento de regresso.

A directiva ao estabelecer um conjunto de garantias, como as enunciadas, ela faz

depender a sua execução das possibilidades dos Estados, o que pode criar

discricionariedade no cumprimento dessas garantias.

Quadro 1 - Prazos de detenção, partida voluntária e de interdição de readmissão nos

países da UE Prazos para Detenção Ilimitada - GB, DK, EE, FI, EL, IRL, MT, NL, SE

Mais de 18 meses - LV

Entre 6 e 12 meses - HU, LT, PL, BE

6 meses no máximo - AT, CZ, SI, SK

Entre 2 a 3 meses - LU, PT, IT

1 mês no máximo - FR, CY, ES ( 40 dias)

Partida Voluntária Partida rápida, as autoridades podem decidir a data de

execução - AT, CZ, DK, MT, GB

Sem prazo, SK, ou as autoridades podem fixar um prazo

entre 5 e 7 dias BE, LV

2 semanas no máximo - CY, EE, EL, PL, ES, SE

10 dias - LT

20 dias prorrogáveis –PT

4 semanas no máximo – FR, HU, IE, IT, NL, SK

Mais de 4 semanas – DE

3 meses em casos espaciais LU

96 Capítulo IV, artigo 15º ponto 1 da Directiva “a fim de preparar o regresso e/ou efectuar o processo de afastamento”,“ a detenção só será mantida enquanto o procedimento de afastamento estiver pendente”. 97 Capítulo IV, artigo 17º ponto 4 da Directiva 98 Capítulo III, artigo 13º da Directiva

MIGRAÇÔES E INTERCULTURALIDADE

78

Prazos para Interdição de Readmissão 5 a 10 anos – AT

10 anos – BE

Máximo 10 anos – CY, CZ

3, 5 e 10 anos – DK

5 ou mais – EE, FI

3, 5, 10, anos, ilimitada – FR

DE - Depende do Land, ilimitada

GR, HU 5 + 5 anos

IE- Nenhuma

IT - 10 anos

LV - Nenhuma, 1, 3, 5, anos, ilimitada

LT – 5 anos, ilimitada

LU, MT - Nenhuma, a menos que seja cometido um crime

NL, PL, PT– 5 anos

SK -1, 5, 10 anos

SI - de 1 a 5 anos (10, se for cometido crime)

ES - 3, 5, 10 anos

SE - em geral 2, 4 anos

GB - poder discricionário das autoridades

Fonte: Adaptado de, MAGALHÃES, José – Directiva Retorno a favor do Compromissos, em “A Nossa Opinião”, MAI, 19 de Junho de 2008.

Outra das disposições da directiva muito criticada, é o facto do imigrante poder

continuar detido por motivo que lhe não é imputável, nem ao Estado-Membro, como o é

o caso do atraso na obtenção da documentação necessária junto de países terceiros99.

A directiva ao prever a detenção de imigrantes irregulares, representa um

desproporcional e discriminatório atentado ao direito à liberdade. Desproporcional,

porque não está em causa uma conduta que, pela seu dano social ou perigosidade, possa

ser equiparada a um crime. A esmagadora maioria dos imigrantes irregulares,

desempenham actividades laborais que satisfazem necessidades económicas e sociais

dos países de acolhimento e, em muitos casos, a entrada ilegal ou o facto da sua

permanência exceder o período de validade dos vistos, não tem impedido a sua posterior

legalização. Não pode ignorar-se, também que, com frequência, os imigrantes

irregulares, não só não representam um perigo social, como são verdadeiras vítimas de

redes de imigração ilegal, quando não até vítimas de tráfico de pessoas (estas sim é que

devem ser severamente penalizadas).

99 Capitulo IV, artigo 15º, ponto 6 alínea a) da Directiva.

A DIRECTIVA EUROPEIA “RETORNO” (DIRECTIVA 2008/115/CE). CUSTOS E BENEFÍCIOS PARA UMA POLÍTICA COMUM DE IMIGRAÇÃO

79

É igualmente inaceitável (fora dos casos de prática de crimes ou perigos para a

segurança pública e a segurança nacional) a interdição de readmissão na UE de quem

antes tenha entrado ilegalmente, por período que pode ir até cinco anos. Esta sanção é,

também, desproporcional e, por outro lado, contraproducente na perspectiva do combate

à ilegalidade. Há, com frequência, casos em que o regresso ao país de origem se torna

particularmente penoso e perigoso para a pessoa em causa, que pode, até, ver em risco a

sua sobrevivência. Impedir a sua readmissão pela via legal pode, assim, contribuir para

que a ilegalidade se mantenha e tornar o imigrante em situação irregular uma “presa”

fácil de redes de auxílio à imigração ilegal ou tráfico de pessoas.

O facto da directiva privilegiar o regresso voluntário, este não é realista, pois os

imigrantes deverão ponderar entre os custos de permanecer numa situação irregular

(mesmo correndo o risco de serem detidos) e as possíveis incertezas de não terem como

sobreviver nos seus países de origem. Aliás, uma recente medida do governo

espanhol100 em apoiar financeiramente imigrantes legais que quisessem regressar aos

seus países, não surtiu grandes efeitos, o governo estimou que cerca de dezenas de

milhar de imigrantes optariam por retornar, mas de facto entre 2003-2008, só 5000 o

fizeram.

Em Portugal o Programa de Retorno Voluntário entre 1997 e 2005, apoiou 1700

pessoas. O Programa SuRRIA (Sustentação do Retorno – Rede de Informação e

Acolhimento), criado em Dezembro de 2006, para apoiar o regresso voluntário de

imigrantes irregulares, contemplou, em 2007 278 imigrante e em 2008, 347101. Ainda,

relativamente ao abandono voluntário, foram notificados, em Portugal 30837

imigrantes, entre 2003 e 2008102.

Perante estas evidências em termos práticos, o uso da directiva para expulsar ou deter

imigrantes irregulares, especialmente dentro de num sistema de caso a caso, irá,

provavelmente, ultrapassar as capacidades de resposta do sistema judicial e

100 O Chamado Retorno Assistido – que concede apoio aos imigrantes que se encontrem em situação económica difícil, nomeadamente, o bilhete de avião e uma ajuda monetária de 50 euros por cada membro da família até um máximo de 400 euros. Em 2008, o financiamento para este programa foi de 1,6 milhões de euros. Nos finais de 2008, em consequência do aumento do desemprego, o governo Espanhol criou um novo plano para os imigrantes legais que se encontrem desempregados, o governo estima que possam vir a beneficiar deste programa 87 000 imigrantes. Para consecução deste plano estão previstos 870 000 euros, para 2009 (Real Decreto 4/ 2008 de 19 de Setembro e Real Decreto 1800/2008 de 3 de Novembro). 101 SEF- Relatório de Imigração Fronteiras e Asilo 2008, Departamento de Planeamento e Formação, p. 67. 102 Id. Ibid., p. 63.

MIGRAÇÔES E INTERCULTURALIDADE

80

administrativo. Será que a FRONTEX, será capaz de coordenar as operações de

afastamento? Terão os países capacidade de resposta, para deter os imigrantes em

centros de detenção especializados? Terão os países recursos económicos para fazer

face às despesas implicadas em todo o processo de retorno, mesmo tendo em conta as

possibilidades de financiamento do Fundo Europeu de Regresso? Terão os países de

origem capacidade de receber os imigrantes em condições dignas, quando um dos

principais motivos que levaram os imigrantes a enfrentar todas as barreiras para vir para

a UE, foi precisamente os motivos económicos, a falta de perspectivas de emprego nos

seus países?

Os imigrantes que optarem por ficar, passam a enfrentar riscos maiores, não só a

constante incerteza de virem a ser presos, a impossibilidade de arranjarem emprego ou

permanecer nos que ocupam (situação que poderá agravar-se com a directiva sobre

sanções aos empregadores), como ainda, o acesso à habitação, à saúde, o que poderá

agravar a sua discriminação e marginalização, contrariamente ao facto da UE, como

referimos acima em vários documentos, insistir na questão da integração dos imigrantes.

Relativamente, à questão da criação de centros de detenção, vários países europeus

criaram estes centros ou aumentaram a sua capacidade. O número de centros de

detenção para imigrantes irregulares tem multiplicado nos países da UE nos últimos

anos.

Nas áreas de trânsito, também foram criados vários centros de detenção. Os novos

Estados-Membros, Bulgária e Roménia, também se equiparam, recentemente com

centros semelhantes. Vários centros de detenção temporários, também foram

implementados na periferia da UE, na Albânia, Croácia, Moldávia, Noruega, Sérvia,

Ucrânia, Bielorrússia, Bósnia-Herzegovina, Macedónia, Suíça, Marrocos, Azerbaijão,

Líbia, Turquia e Israel. Existem, também, os chamados “campos informais”, como os

existentes ao longo da costa atlântica marroquina adjacente das ilhas Canárias.

Na última década, os escândalos que surgiram nestes centros de detenção tem chocado a

opinião pública. São, particularmente, memoráveis os acontecimentos que envolveram

centros de detenção geridos por empresas de segurança privada, escândalos ocorridos

após a estratégia de outsourcing do British Home Office, por exemplo, no Centro de

A DIRECTIVA EUROPEIA “RETORNO” (DIRECTIVA 2008/115/CE). CUSTOS E BENEFÍCIOS PARA UMA POLÍTICA COMUM DE IMIGRAÇÃO

81

Detenção Yarl Wood próximo a Bedford, tendo sido apresentadas várias queixas de

abusos racistas aos detidos. O centro de detenção de Harmondsworth103, perto do

aeroporto de Heathrow de Londres, gerido pela Kalyx, foi objecto de um relatório, da

inspectora geral das prisões Anne Ower em 2006, onde criticou a forma como o centro

era administrado, os imigrantes queixaram-se que os guardas eram agressivos104,

intimidativos e pouco prestáveis.

Aliás, na sequência destes factos, muitos deles denunciados por Organizações Não

Governamentais, desencadeou uma visita da Comissão LIBE105 a alguns centros de

acolhimento de requerentes de asilo ou refugiados, onde foram feitas várias

observações, quanto à falta de assistência médica, más condições das instalações, falta

de apoio jurídico, entre outras.

Estas observações são pertinentes e mostram como os Estados-Membros, não terão,

provavelmente, capacidade para dar resposta, ou terão que despender mais recursos

económicos e humanos, para que a detenção dos imigrantes em situação irregular, seja

feita com dignidade, atendendo ao número de imigrantes irregulares existentes em cada

país.

Tendo em conta os custos de detenção despendidos em alguns países da UE, podemos

inferir que os custos com a detenção de imigrantes irregulares, mesmo que nem todos

venham a ser detidos, irão sobrecarregar os orçamentos dos diferentes países (quadro 2).

Privar de liberdade e expulsar uma pessoa unicamente por ser um indocumentado, é um

atentado ao paradigma inocente-culpado, sem o qual não é possível entender a

convivência numa sociedade moderna.

103 UOL - Centro de detenção de imigrantes britânico é palco de distúrbios. 29/11/2006. http://noticias.uol.com.br/ultnot/efe/2006/11/29/ult1807u32713.jhtm 104 Ver Comissão LIBE - Projecto de relatório da Comissão das Liberdades Cívicas, da Justiça e dos Assuntos Internos sobre a delegação para os centros de requerentes de asilo e imigrantes no Reino Unido Relator: Panayiotis Demetriou, visita efectuada entre 21 e 23 de Novembro de 2007. 105 PARLAMENTO EUROPEU – Resolução do Parlamento Europeu, de 5 de Fevereiro de 2009, sobre a aplicação na União

Europeia da Directiva 2003/9/CE que estabelece normas mínimas em matéria de acolhimento dos requerentes de asilo e dos

refugiados: visitas da Comissão LIBE de 2005 a 2008 (2008/2235(INI))

MIGRAÇÔES E INTERCULTURALIDADE

82

Quadro 2 - Custos de detenção em alguns países da UE

País Custos de detenção

Bélgica (2004) 38.10 euros/dia

Nº de detidos 8000 x 38.10 = 304 800 00

Período de detenção máximo segundo a directiva 6

meses (213 dias) 213x31.10= 8115.30 euros

8000 detidos x 8115.30 = 64922400 euros

Dinamarca (2006) Um único centro de detenção financiamento de

4560881.00 euros

Alemanha (2005) Custo de detenção 6.6 milhões de euros

Irlanda (2005) 219 euros/por dia/per capita

Período de detenção máximo segundo a directiva 6

meses (213 dias) 213x219 =46647euros

Holanda (2006) 13000 euros em média/ano/ per capita

Polónia (2006) 284 euros/dia

Eslovénia (2006) 15.83 euros/dia (só custos básicos, não inclui despesas

médicas)

Reino Unido (2006) 506,60 euros/per capita

Custo total de detenções 12900000 euros/ano

Itália (2006) Bolonha 89 euros/dia

Período de detenção máximo segundo a directiva 6

meses (213 dias) 213x89 =18957 euros

Fonte: The Jesuit Refugee Service Europe (JRS) - Financial cost of detention

http://www.detention-in-europe.org/index.php?option=com_content&task=view&id=176&Itemid=210

O desafio é enorme perante a institucionalização de uma cultura político-administrativa

que configura a imigração irregular como um delito e que não deixa de usar a detenção

e as expulsões como instrumentos de ameaça e controle dos estrangeiros. O

internamento em centros de detenção desempenha um papel simbólico importante

perante uma sociedade europeia que, preocupada com a sua segurança e bem-estar, faz

“vista grossa” perante a criação de novos “muros”. Esta política autoritária e excludente,

não parece vir a mudar, mas antes se consolida como o roteiro a seguir, ainda que mais

harmonizado, bem patente na Directiva Retorno.

A DIRECTIVA EUROPEIA “RETORNO” (DIRECTIVA 2008/115/CE). CUSTOS E BENEFÍCIOS PARA UMA POLÍTICA COMUM DE IMIGRAÇÃO

83

Uma sociedade democrática não pode permitir que o Estado deixe de actuar como o

responsável pelos direitos, liberdades e garantias de todas as pessoas, principalmente,

daquelas que se encontram em situação de extrema vulnerabilidade como é o caso dos

imigrantes irregulares. A convivência em sociedade depende do respeito que todos os

indivíduos, seja nacional ou estrangeiro, recebe de forma integra das instituições

públicas, enquanto um cidadão de pleno direito.

Para a implementação da directiva, como já referimos, foi criado um Fundo de

Regresso, com um valor de 676 milhões de euros para o período 2008-2013. Se

partirmos do valor que é normalmente apontado para os imigrantes irregulares já

instalados em países da UE entre 3,5 e 4 milhões, o montante disponível por imigrantes

expulsos corresponde a cerca de 180 euros. Mesmo se fundos nacionais forem

adicionados ao valor referido - que não serão utilizados exclusivamente nas expulsões -

são claramente insuficiente para expulsar todos os estrangeiros irregulares já

estabelecidos (a quem outros irão certamente se juntar anualmente), mesmo

considerando um valor médio baixo para expulsão per capita, os custos serão de cerca

de 15000 euros, segundo o quadro 3, este valor chega a 40000 euros nos Países Baixos.

Refira-se que, segundo Carine Fonteau, uma jornalista francesa, a França gasta cerca de

700 milhões de euros anualmente em detenções e expulsões106.

Perante estes valores, parece-nos que os esforços financeiros exigidos aos Estados-

Membros, numa época de crise económica cujo fim não se adivinha para breve, são

demasiadamente elevados e provavelmente os Estados, dificilmente, terão capacidade

de dar resposta.

A cada ano, cerca de 500 mil imigrantes conseguem entrar clandestinamente na UE.

Para uma comunidade com cerca de 400 milhões de habitantes, parece-nos que isso não

representa nenhuma ameaça, como alguns parecem querer fazer crer.

Com a presente directiva, a UE está a ficar perto de completar o projecto da Fortress

Europe (A Europa Fortaleza), que iniciou nos finais dos anos 80 para compensar os

106 Citado em, Vincennes detention centre: the restrictions of migratory policies, cafebabel.com. The European Magazine. 13.01.2009, http://www.cafebabel.com/eng/article/28134/paris-immigrants-protest-detention-centre-vincenne.html

MIGRAÇÔES E INTERCULTURALIDADE

84

efeitos das suas fronteiras internas abertas. A ideia é que não haverá “esconderijos” em

qualquer lugar na UE para as pessoas que entrem ou permaneçam irregularmente.

Quadro 3 - Custos de expulsão em alguns países da UE

Custos de expulsão Observações Fonte

Reino Unido

(2005)

4,7 bilhões de libras necessárias para deportar todos os imigrantes irregulares (aproximadamente 0,5 milhões) – 9400 libras (13686 euros) per capita

O Home Office

expulsou 25 milhões de

imigrantes irregulares

por ano e publicamente

admite não conseguir

recursos para remover

todos os irregulares

Institute for Public Policy Research (IPPR). Estimativas apontam para mil milhões de libras

(cerca de 1,5 milhões de euros) em impostos após

a regularização

Holanda

(2007)

Cada expulsão custa aproximadamente 40000 euros

DOOMERNIK, J.; JANDL, M. (eds.), Modes of

Migration Regulation and Control in Europe. Amesterdam, Amesterdam University Press, 2008

Alemanha

(2005)

5607. 48 euros/ per capita

The Jesuit Refugee Service (JRS) Europe -

Financial cost of detention

Fonte. Adaptado de MALHEIROS, J. - Irregular Migration in OECD Member States – Nature, Profiles

And Policies: An Overview, 2009, quadro 6, p.35 e informação sobre a Alemanha The Jesuit Refugee Service (JRS) Europe - Financial cost of detention.

O facto da directiva prever expulsar imigrantes numa altura em que a crise económica

global, tem tido repercussões no desemprego em quase todos os países, sobretudo, em

vários dos países de origem, pode por em risco a sua sobrevivência nesses países. Outro

factor, a não menosprezar é que com as expulsões, as remessas que os imigrantes

mandam para os seus países irão diminuir, o que terá consequências na sua economia,

sobretudo de alguns países que dependem muito desses recursos, como é o caso dos

países africanos, da América Latina, ou até da Europa de Leste.

Os esquemas acrescidos de segurança das fronteiras externas que foram desenvolvidos

em vários países e as disposições da directiva quanto a expulsões e detenção de

imigrantes, não nos parecem que possam vir a ser eficazes, para acabar ou limitar

severamente a migração irregular, dado que os resultados custo-benefício são limitados

A DIRECTIVA EUROPEIA “RETORNO” (DIRECTIVA 2008/115/CE). CUSTOS E BENEFÍCIOS PARA UMA POLÍTICA COMUM DE IMIGRAÇÃO

85

e acarretam despesas crescentes, para os Estados, para além de exporem mais ao risco

os próprios migrantes107.

A canalização de imigrantes irregulares para caminhos regulares, exigem outras

medidas, para além das preconizadas na Directiva Retorno, como, por exemplo as

medidas de regularização, podem constituir uma solução sociopolítica, mas também

económica mais válida, se for desenvolvida num quadro capaz de garantir várias rotas

de entrada, uma maior flexibilidade laboral e a simplificação dos procedimentos

burocráticos (em termos de custo e tempo). Com a regularização os imigrantes estão

mais protegidos contra a exploração, podem desfrutar de uma vasta gama de direitos de

cidadania, são obrigados a cumprir as obrigações fiscais estabelecidas e a receber

salários ajustados aos acordos efectuados pelas Uniões Sindicais dos países de

acolhimento, situação que contribui para impedir o dumping salarial108.

Os processos de construção de canais de migração eficiente, devem contemplar a

avaliação das necessidades económicas, para assegurar que a oferta interna não é capaz

de suprir cada oferta de mão-de-obra que supostamente “visa” um trabalhador

estrangeiro109. Outras estratégias a implementar são as quotas, os esquemas de trabalho

temporário ou sazonal, por exemplo, em épocas de maior procura, como no caso da

agricultura, em determinadas épocas do ano, ou da hotelaria e restauração, durante o

período das férias, sectores que são dos que mais empregam imigrantes irregulares.

As soluções possíveis, devem ter em consideração as especificidades de cada país em

termos de inserção geopolítica e características do mercado de trabalho e necessidades,

mas parecem ganhar em eficiência, se as possibilidades de entrada forem mais flexíveis

107 Estes argumentos são aliás referidos por vários investigadores, nomeadamente, VAN LIEMPT, I. - Inside Perspectives on the

Process of Human Smuggling. In: IMISCOE Policy Brief, nº3, August 2007 e DUVELL, F. (eds). - Illegal Immigration in Europe. Houndmills: Palgrave Macmillan, 2006. 108 MALHEIROS, J. - Irregular Migration in OECD Member States – Nature, Profiles And Policies: An Overview, 2009, p.34 109 Os empregadores que publiquem uma oferta de trabalho por um período mínimo, mas não recebam qualquer candidatura adequada no mercado de trabalho da UE, seriam autorizados a contratar um trabalhador de um país terceiro. Este sistema, estreitamente associado a um instrumento como a EURES para divulgar informações sobre as ofertas de trabalho no âmbito da UE, tornaria possível um relativo controlo sobre os contratos de forma a limitar os abusos (COMISSÃO DAS COMUNIDADES EUROPEIAS - Livro Verde Sobre uma abordagem da União Europeia em matéria de gestão da migração económica COM (2004) 811 final, Jan. 2005, p. 8). A EURES criou um portal europeu de mobilidade profissional (http://ec.europa.eu/eures/home.jsp) a partir do qual se pode aceder a todas as ofertas de emprego europeias registadas publicamente, por intermédio de uma única plataforma TI baseada na tecnologia de serviços Internet, a partir de 2005.

MIGRAÇÔES E INTERCULTURALIDADE

86

e diversificadas e envolverem consultas sistemáticas aos parceiros sociais, ou seja, os

empregadores e os sindicatos110.

O desenvolvimento de canais de migração diversificados e flexíveis para os migrantes

com qualificações baixas deve ser considerado nas políticas de recrutamento. Além

disso, se as restrições geográficas estabelecidas através da assinatura de acordos

bilaterais ou outros acordos (nomeadamente, os acordos comuns estabelecidos no

âmbito da UE) são uma estratégia positiva de controlo e recrutamento, esta pode ser

combinada com outras opções (possibilidades geograficamente mais abertas ou vistos

temporários para emprego em certos sectores onde exista falta de mão-de-obra, quer de

trabalhadores qualificados, quer menos qualificados) de forma a introduzir alguma

flexibilidade no sistema e alargar as possibilidades de entrada.

Uma outra questão diz respeito à eventual concessão a alguns países terceiros de um

tratamento preferencial para a admissão dos seus nacionais no quadro de acordos de

cooperação reforçados.

Outra das medidas, utilizadas para combater a imigração irregular, são as inspecções aos

locais de trabalho e as sanções sobre os empregadores, aliás estas serão reforçadas com

directiva sobre sanções contra os empregadores nacionais que empreguem nacionais de

países terceiros em situação irregular (COM (2007) 0249). O reforço das inspecções aos

locais de trabalho e um aumento do número das inspecções parece ser uma medida

adequada a juntar ao pacote destinado a combater a migração irregular e especialmente

a exploração dos trabalhadores imigrantes não declarados. No entanto, estas inspecções,

deverão ser mais numerosas, sobretudo, nos sectores onde a imigração irregular está

mais presente.

Como afirma Papademetriou “procurar canalizar e enquadrar a imigração é uma

estratégia mais eficaz e realista do que negar a sua existência ou estabelecer como

objectivos o controlo ou a exclusão totais – objectivos que tendem a criar expectativas

110 MALHEIROS, J. - Op. Cit. p. 33

A DIRECTIVA EUROPEIA “RETORNO” (DIRECTIVA 2008/115/CE). CUSTOS E BENEFÍCIOS PARA UMA POLÍTICA COMUM DE IMIGRAÇÃO

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irrealistas por parte da opinião pública e a agravar ainda mais o clima de

intolerância”111.

4 – CONCLUSÃO

A migração internacional é uma realidade que irá persistir, enquanto existirem

diferenças de riqueza e desenvolvimento entre as diversas regiões do mundo. Pode ser

uma oportunidade, porque é um factor de intercâmbio humano e económico e também

permite aos imigrantes alcançar uma melhor qualidade de vida.

A Europa, após a segunda guerra passou por períodos distintos de migrações

internacionais, um primeiro período em que os movimentos migratórios eram,

sobretudo, intra-europeus entre os países menos desenvolvidos da periferia e os países

ricos do centro. Contudo, progressivamente, a partir de 1974 a Europa se tornou um dos

principais focos de imigração do Mundo, com continuação de anteriores origens, novas

origens (Europa de Leste, América Latina, África e Ásia), novos destinos (Europa do

Sul), novas conjugações entre entradas e saídas, intensificam-se as migrações

irregulares, aumentam as migrações quer de trabalhadores pouco qualificados, quer

muito qualificados.

As migrações contribuem, decisivamente, para o desenvolvimento económico e

competitividade da União Europeia e dos Estados-Membros que continuam a precisar

de migrantes devido quer à dinâmica dos seus mercados de trabalho, quer às tendências

de regressão demografia. Por outro lado, as migrações, fornecem ainda recursos para os

migrantes e seus países de origem, contribuindo assim para o seu desenvolvimento.

As questões da migração são uma parte integrante das relações externas da UE, só

através de uma harmoniosa e eficaz gestão da migração, consubstanciada numa política

comum, que deve ser abrangente e, consequentemente, abordar a organização da

migração legal e o controlo da imigração irregular é possível promover a sinergia entre

migrações e desenvolvimento. A UE está convicta de que a abordagem global à

111 PAPADEMETRIOU, Demetrios G. – Gerir melhor as migrações internacionais: princípios e perspectivas para maximizar os

benefícios das migrações. In: PAPADEMETRIOU, Demetrios G, (coord.) - A Europa e os seus Imigrantes no século XXI, Fundação Luso-Americana, 2008, p. L

MIGRAÇÔES E INTERCULTURALIDADE

88

migração só faz sentido dentro de uma parceria estreita entre os países de origem,

trânsito e destino.

A UE no entanto, não tem recursos para receber condignamente todos os imigrantes que

esperam encontrar aqui uma vida melhor. Uma imigração mal gerida pode perturbar a

coesão social dos países de destino. A organização da imigração deve,

consequentemente, atender às capacidades de recepção da Europa em termos do seu

mercado de trabalho, habitação e saúde, educação e serviços sociais e proteger os

migrantes contra a possível exploração por redes criminosas.

Os Estados-Membros têm procurado, progressivamente, harmonizar as suas políticas

nesta área, tendo alcançado alguns progressos, nomeadamente, na abolição dos

controlos nas fronteiras internas na maior parte da Europa; na adopção de uma política

comum de vistos; na harmonização dos controlos das fronteiras externas e normas de

asilo; no alinhamento de determinadas condições de imigração legal; na cooperação em

controlar a imigração irregular através da criação da Agência FRONTEX; na criação do

Sistema de Informação Shengen; regras comuns para garantir a expulsão de requerentes

de asilo e imigrantes irregulares; na implementação de sistemas de vigilância e controlo

das fronteiras externas mais pressionadas pela entrada de imigrantes irregulares; na

criação de centros de detenção para refugiados, asilados e imigrantes irregulares; num

maior esforço na criação de programas e acções de integração dos imigrantes e de

informação junto dos países de origem e de trânsito, sobre imigração legal e

possibilidades de emprego, através da criação de Centros de Informação.

Contudo, uma questão central da política da UE, tem sido o combate à imigração

irregular, onde se insere a Directiva Retorno, esta vai implicar para muitos Estados-

Membros significativas alterações do quadro legal vigente, harmonizando a regulação

das diferentes políticas de imigração e de repatriamento de imigrantes em situação

irregular. Assegura uma aproximação mais harmoniosa e efectiva dos procedimentos de

retorno por parte dos Estados-Membros, respeitando ao mesmo tempo os direitos dos

nacionais de países terceiros em situação irregular, regula especificamente a situação de

pessoas vulneráveis, em particular menores não acompanhados e privilegia o retorno

voluntário.

A DIRECTIVA EUROPEIA “RETORNO” (DIRECTIVA 2008/115/CE). CUSTOS E BENEFÍCIOS PARA UMA POLÍTICA COMUM DE IMIGRAÇÃO

89

A directiva constitui um ponto importante para a definição de uma política comum de

imigração, contudo, não está isenta de algumas críticas que achamos relevantes, sendo

de realçar a criminalização de um acto, que não trás qualquer dano social nem

representa nenhuma ameaça para a sociedade. Dado que, por um lado, a esmagadora

maioria dos imigrantes irregulares, como referimos acima, desempenham actividades

laborais que satisfazem necessidades económicas e sociais dos países de acolhimento,

contribuindo, assim, com o seu trabalho para o desenvolvimento económico dos

mesmos. Por outro, os imigrantes irregulares, não representam um perigo social, pelo

contrário, eles são, em muitos casos, vítimas de redes de imigração ilegal, quando não

até vítimas de tráfico de pessoas ou de empregadores sem escrúpulos, que os exploram.

As redes de imigração, de tráfico e os empregadores são quem deverão ser

criminalizados.

Referimos, ainda, que as disposições da directiva irão acarretar custos financeiros

acrescidos para os Estados-Membros, com a detenções e repatriamento, podendo, ainda

agravar a capacidade de resposta dos sistemas administrativos e judiciais.

Outra questão que sublinhamos foi as condições existentes nos centros de detenção,

destacando que alguns deles não oferecerem os requisitos necessários para abrigar

condignamente, os imigrantes, situação que aliás tem sido denunciada quer por

organizações não governamentais, quer pelos organismos governamentais que os

administram, quer até mesmo pela comissão LIBE.

Os esquemas acrescidos de segurança das fronteiras externas que foram desenvolvidos

em vários países e as disposições da directiva quanto a expulsões e detenção de

imigrantes, não nos parecem que possam vir a ser eficazes, para acabar ou limitar

severamente a migração irregular, dado que os resultados custo-benefício são limitados

e acarretam despesas crescentes, para os Estados. O retorno pode por em causa a

sobrevivência dos próprios imigrantes, se estes não tiverem oportunidades de trabalho

nos seus países de origem, podendo não ter outra saída senão tentar retornar à UE,

mesmo que tal acarrete por em risco a sua vida, ou eventualmente serem presos e

novamente expulsos.

MIGRAÇÔES E INTERCULTURALIDADE

90

Saliente-se, ainda, que as medidas propostas na directiva vão exigir um esforço

acrescido por parte dos países de origem e de trânsito, num momento de crise

económica como o que vivemos, provavelmente, vários destes países não terão

possibilidades de absorver aqueles que são obrigados a retornar.

Por esta razão, a Europa tem de investir mais nos apoios ao desenvolvimento destes

países para que a directiva possa ter eficácia, para além de outras medidas que

privilegiem os canais legais de imigração, como referimos no ponto 3.

Tendo em conta todos estes aspectos, as políticas de controlo de fronteiras, segurança e

imigração, devem ser separadas. Efectivamente, a questão da imigração deve aparecer

associada sobretudo às políticas de emprego e às políticas sociais.

Como o Ratnesar Romesh afirmou: “abrir as fronteiras da Europa seria mais do que um

gesto de boa vontade – seria igualmente um acto de interesse pessoal. As economias da

Europa têm necessidades de mão-de-obra extra. Os imigrantes podem fornecer à Europa

recursos valiosos para tornar a Europa mais competitiva, preenchendo os postos de

trabalho de baixos salários que os europeus já não querem, e injectando os

conhecimentos técnicos que os europeus não possuem”112.

Num discurso proferido no Parlamento Europeu em 29 de Janeiro de 2004, o Secretário

Geral da ONU Kofi Annan enfatizou que, “embora os países tenham o direito de decidir

se admitem ou não imigrantes, os europeus seriam imprudentes em fechar as suas

portas. Isto não só prejudicaria as suas perspectivas económicas e sociais a longo prazo,

como levaria, também, cada vez mais pessoas a tentar entrar através de portas negras –

pedindo asilo político injustificado ou procurando a ajuda de traficantes. Uma Europa

fechada seria uma Europa insignificante, mais pobre, mais fraca, mais velha, uma

Europa aberta será uma Europa mais justa, mais rica, mais forte e mais jovem ”.

112 UNITED NATION.- Replacement Migration: Is it a Solution to declining and Ageing Populations?. New York: United Nations, 2001.

A DIRECTIVA EUROPEIA “RETORNO” (DIRECTIVA 2008/115/CE). CUSTOS E BENEFÍCIOS PARA UMA POLÍTICA COMUM DE IMIGRAÇÃO

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