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TÍTULO subtítulo Roberta Gaio Tamiris Lima Patrício organizadoras

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Roberta GaioTamiris Lima Patrícioorganizadoras

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)Bibliotecária responsável: Aline Graziele Benitez CRB-1/3129

D175 Dança na escola: reflexões e ações pedagógicas [livro eletrônico] /1.ed. organização Roberta Gaio, Tamiris Lima Patrício. – 1.ed. – Curitiba-PR: Editora Bagai, 2021. E-Book.

Bibliografia. ISBN: 978-65-89499-62-6

1. Cultura. 2. Dança. 3. Escola. I. Gaio, Roberta. II. Patrício, Tamiris Lima.

05-2021/05 CDD 370.1

Índice para catálogo sistemático:1. Dança: Educação 370.1

https://doi.org/10.37008/978-65-89499-62-6.04.05.21

Este livro foi composto pela Editora Bagai.

www.editorabagai.com.br /editorabagai

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ISBN 978-65-89499-62-6

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ROBERTA GAIOTAMIRIS LIMA PATRÍCIO

organizadoras

DANÇA NA ESCOLA:REFLEXÕES E AÇÕES PEDAGÓGICAS

1.ª Edição - Copyright© 2021 dos autoresDireitos de Edição Reservados à Editora Bagai.

O conteúdo de cada capítulo é de inteira e exclusiva responsabilidade do(s) seu(s) respectivo(s) autor(es). As normas ortográficas, questões gramaticais, sistema de citações e referencial bibliográfico são prerrogativas de cada autor(es).

Editor-Chefe Cleber Bianchessi

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SUMÁRIO

UM PREFÁCIO PARA MUITAS DANÇAS... ...............................7

APRESENTAÇÃO ................................................................................13

A PRESENTE AÇÃO A PRESENTEAR UM PRESENTE ............13

APRESENTAÇÃO ................................................................................15

A DANÇA NA HISTÓRIA E A HISTÓRIA DA DANÇA: POSSIBILIDADES PEDAGÓGICAS NA ESCOLA ..............17Roberta Gaio | Regina Penachione

A DANÇA NA EDUCAÇÃO DA INFÂNCIA E A CONSTRUÇÃO COREOGRÁFICA: ENTRE O LÚDICO E A EXPRESSÃO CORPORAL ...........................................................56Ida Carneiro Martins | Vivian Iwamoto

DANÇA COMO LINGUAGEM E EXPRESSÃO NA ESCOLA: AÇÕES CRÍTICAS E CRIATIVAS ............................75Roberta Gaio | Paloma T. F. Rocha

A DANÇA NA EDUCAÇÃO INFANTIL: UMA PROPOSTA DE PRÁTICA EDUCATIVA PARA O TRABALHO COM CRIANÇAS .............................................................................................99Karina Paula da Conceição | Roberto Gimenez | Ida Carneiro Martins

DE ESCOLA PARA ESCOLA: O CARNAVAL COMO ESPAÇO DE APRENDIZAGEM SOBRE DANÇA ............... 110Roberta Gaio | Paloma T. F. Rocha | Natalia Maesky Batista | Jaqueline Souza da Costa

CONTEXTO FOLCLÓRICO NA ESCOLA: DESCOBRINDO, PRESERVANDO E DANÇANDO POR MEIO DAS METODOLOGIAS ATIVAS.................................. 138Palmira Lira | Gina Guimarães

DANÇA CRIATIVA: CONTRIBUIÇÕES DO LÚDICO PARA O DESENVOLVIMENTO DA EXPRESSÃO CORPORAL NA ESCOLA .............................................................. 165Cristiane Camargo | Camila Panontim

O BALÉ: DO PALCO À ESCOLA ................................................. 189José Ivo Justino Junior | Iana Pereira Leão

UM RELATO SOBRE CRIAÇÃO EM DANÇA COM CONTOS AFRICANOS NA ESCOLA PÚBLICA ................. 214Jussara da Silva Rosa Tavares | Sidney Leandro de Oliveira

AS BATALHAS DE HIP-HOP: CONTRIBUIÇÕES PARA A MANIFESTAÇÃO CRIATIVA DE ALUNOS E ALUNAS .. 230Marília Camargo Araújo

RESISTÊNCIA OU APROPRIAÇÃO? O FUNK BRASILEIRO CONTEMPORÂNEO NAS AULAS DE ARTE E SUA RELAÇÃO COM JOVENS QUE VIVEM A PÓS-MODERNIDADE .............................................................................. 257Maria Carolina Macari

MÉTODO DANÇA EDUCAÇÃO CONTEMPORÂNEA (MDEC): LABAN E A ARTE DO MOVIMENTO NA FORMAÇÃO DOS PROFESSORES .......................................... 274Antônio Sérgio Milani | Mariana Mafra Vicentini | Victor Tchiya Soares

FESTIVAIS ARTÍSTICOS: UMA PROPOSTA PEDAGÓGICA ................................................................................... 300Tamiris Lima Patrício | Michele Viviene Carbinatto

ORGANIZADORAS ......................................................................... 320

AUTORES/AUTORAS ..................................................................... 321

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UM PREFÁCIO PARA MUITAS DANÇAS...

O livro Dança na escola: reflexões e ações pedagógicas, organizado por Roberta Gaio e Tamiris Patrício, oferece-nos a possibilidade de nos movimentarmos pela polissemia da dança, configurada nos diferentes capítulos que o compõem. O enfoque é, de fato, uma compreensão da dança que não se separa da Arte, da Educação Física e da Pedagogia como áreas de conhecimento que acolhem essa expressão da cultura humana. Conforme vamos lendo, percebemos esse movimento sensível que nos faz sentir e que evoca sensações, sentimentos e sentidos. Entramos na dança e dançamos ao ler cada capítulo. Em cada texto, podemos perceber espaços, tempos, desenhos coreográficos que são capazes de amplificar nossa corporeidade e de projetar possibilidades para a educação, para o ensino e para a formação de professores e professoras.

Os diferentes autores e autoras figuram como dançarinos/as, mestres de dança que compartilham suas paixões e experiências em dança. Assim, os textos expressam essa ligação com a experiência vivida, o que, do ponto de vista fenomenológico, enriquece o livro e sua variação temática, abrangendo refle-xões e ações em torno de questões de gênero, inclusão, cultura popular, aspectos históricos, estéticos e pedagógicos da dança, bem como colocam em cena hori-zontes para que a educação e o campo educativo, em geral, possam dançar. Sim, dançar: possibilitar a expressão de crianças e jovens, incentivando-os a criarem novas maneiras de ser e de estar no mundo de forma consciente, autônoma e criadora. As propostas apresentadas acolhem diferenças, trajetórias e compar-tilham possibilidades de sentir, de fazer, de pensar, de ser capaz, de unir razão e sensibilidade em um só gesto.

Envolvi-me com a leitura de cada um dos Treze Capítulos que compõe esse livro que considero um investimento na dança, no corpo e na educação. À guisa de Prefácio, um prefácio para muitas danças, trago minhas impressões de leitura, sendo também uma espécie de chamada ou abertura para convidar leitores e leitoras, em geral, a dançarem esta obra, a dançarem com esta obra. Roberta Gaio e Regina Penachione, no Capítulo de abertura, situam a dança no tempo e no espaço da cultura, alargando os horizontes de nossa visão, ao unir o passado e o presente de nossos gestos expressivos e, portanto, de nossa

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existência humana que não se contenta só como movimento utilitário, por isso dança e inventa maneiras de celebrar a vida: Dançar a vida (Roger Garaudy). Este Primeiro capítulo também fundamenta o livro em sua integralidade, eu diria, posto que tece articulações entre a história da dança como expressão de educação, ao longo do tempo e em diferentes culturas, sendo essa a originalidade do capítulo e a aposta do livro Dança na escola: reflexões e ações pedagógicas. Essa e outras qualidades da obra contribuem para que este livro venha a se tronar uma referência para estudiosos, pesquisadores, professoras e professores de Arte, Educação Física e Pedagogia.

No Segundo Capítulo, assinado por Ida Carneiro Martins e Vivian Iwa-moto, traz a dança em um contexto lúdico e expressivo, enfocando a coreografia na educação de crianças. As autoras ampliam a compreensão da dança no cená-rio das festas escolares, transformando esse espaço, ao delinearem o processo de construção da obra coreográfica desde a construção da história, cenários, figurinos, músicas e movimentos para experimentarem a dança e a festa como espaço de celebração e apropriação dos saberes e fazeres no espaço da educação.

Na vertigem dançante deste livro, no Capítulo Três, Roberta Gaio e Paloma Rocha vêm nos envolver nos rodopios da musa Terpsícore, para compreendermos a dança na escola de forma ampla: como fenômeno da cultura. Tal tema, em sua grandeza, convoca as disciplinas de Arte, Educação Física e muitas outras para uma proposta interdisciplinar, baseada também nos estudos da complexidade de Edgar Morin. Fica claro que uma proposta disciplinar não poderia abranger este fenômeno, por isso o olhar da complexidade se faz urgente e necessário, sendo ético e estético a um só tempo. Neste capítulo, as autoras abordam a dança na escola como patrimônio cultural, portanto como possibilidade de criação de sentidos para nossa humanidade por meio da descoberta de nós mesmos, do outro e do mundo. Elas apresentam “sugestões pedagógicas” que envolvem a criação na dança por meio da experimentação do corpo no espaço, com o ritmo, com o peso do corpo e com o fluxo do movimento inspiradas também por Rudolf Von Laban.

O Capítulo Quarto, de autoria de Karine Paula, Roberto Gimenez e Ida Carneiro Martins, apresenta uma proposta de dança na educação a partir de experiências com crianças. Neste percebemos o diálogo entre referências dos

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campos da Arte e da Educação Física. A proposta considera aspectos tais como a musicalidade, a expressão corporal, a curiosidade, a cooperação entre outros elementos que podem orientar essa prática.

Roberta Gaio e suas colaboradoras Paloma Rocha, Natália Batista e Jaqueline da Costa assinam o Capítulo Cinco: De Escola para escola, o carnaval como espaço de aprendizagem sobre dança. O texto carnavaliza a dança e a educação no melhor sentido, abrindo alas para a alegria do corpo em uma expressão tão cara a nossa cultura brasileira.

Seguimos a leitura e, no Capítulo Seis, escrito por Palmira Lira e Gina Guimarães, entramos no espaço-tempo encantado das danças chamadas fol-clóricas, populares, tradicionais. Que beleza! Esse universo me emociona em sua poética expressiva, lírica, sentimental no sentido sublime do termo. No capítulo, as autoras atualizam esses conteúdos por meio de metodologias ati-vas, promovendo um diálogo entre a tradição e os suportes tecnológicos para explorar plataformas, vídeos e instrumentos pedagógicos como possibilidades dançantes. Eu não poderia deixar de citar aqui o livro Uma educação tecida no corpo, escrito por Rosie Marie Nascimento de Medeiros, que faz eco a esse universo simbólico das danças brasileiras. Essas danças em seus repertórios gestuais e simbólicos nos fazem perceber quem somos e expressam nossa capacidade de criar e recriar o passado e o presente de nossas histórias pessoais e coletivas necessárias à educação.

No Capítulo Sete, Cristiane Camargo e Camila Penatin apresentam a dança criativa, seu aspecto lúdico e expressivo como possibilidade para a dança na escola. As autoras trazem exemplos preciosos de aulas no Ensino Fundamental I e II com base na improvisação e ludicidade dos movimentos que fazem vibrar o corpo e a educação, vivificando a escola de forma sensível, estética, criativa e criadora.

Um livro sobre dança não poderia deixar de abordar a técnica clássica. Então, o Balé vai do palco à escola com José Ivo e Iana Leão, no Capítulo Oito, aponta possibilidades de ensino, enfocando a legislação brasileira e a obriga-toriedade deste ensino que envolve diferenças entre a escola formal e a escola específica de dança. Os autores mostram a riqueza dos Balés de Repertório (O Lago dos Cisnes, Dom Quixote e outros), as habilidades motoras, as especificidades

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da técnica clássica na construção dos movimentos estéticos do Balé, entre outras nuances na experiência com crianças de 3 a 6 anos de idade que podem inspirar outras pessoas. Penso aqui em uma possibilidade de cogitar o Balé, a técnica clássica, por meio dos estudos da corporeidade que, a meu ver, enriquecem e dão outro tom à percepção do Balé e dos balés.

O Capítulo Nove é assinado por Jussara Tavares e Sidney Oliveira, que relatam a experiência de um projeto colaborativo entre alunos da Universidade Federal de Sergipe e de uma escola da rede pública em torno da criação de dança, tendo por matéria-prima contos africanos e danças de Orixás. Ao ler este capítulo, percebem-se “os rodopios pelo chão da escola” - e também pelo chão da Universidade - na busca de dar sentido ao fazer pedagógico e ao artístico da dança por meio de diferentes laboratórios, apreciação de vídeos, construções coreográficas, composições individuais e coletivas que realçam experiências diversas como “lugares de escutas e visibilidades táteis, projetadas em uma complexa sensibilidade do imaginário”.

As Batalhas de Hip Hop são trazidas no Capítulo Dez, por Marília Camargo Araújo, como manifestação criativa para que os alunos e as alunas possam conhecer e reconhecer essa expressão da cultura jovem por meio do grafite, da música e da dança em um universo poético e estético que faz vibrar potenciali-dades educativas e artísticas. No contexto da Escola e das Batalhas, o professor, a professora intermediam, no convívio com os jovens e em meio às suas reivin-dicações, expressões de singularidades, identidades e pertencimentos.

O Funk marca presença no Capítulo Onze, escrito por Maria Carolina Macari, fazendo eco ao capítulo anterior. Maria Carolina reflete sobre esta expres-são cultural e suas possibilidades para o ensino da dança na escola. Ambos os capítulos atualizam e criam horizontes para a dança na escola e para a expressão de uma cultura juvenil, fundamental e desafiadora em tempos contemporâneos.

No Capítulo Doze, Antônio Milane, Mariana Vicentini e Victor Soares trazem o Método Dança Educação Contemporânea (MDEC), baseado nos estu-dos de Laban, como possibilidade para pensar a formação de professores/as de dança. A leitura deste capítulo me trouxe a presença de Edson Claro e do Método Dança Educação Física (MDEF), criado nos anos 1980, que considero pioneiro no Brasil, ao construir a ligação entre dança e educação física, abran-

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gendo ainda sua expressão como consciência corporal, uma abertura prática incrível para os estudos da corporeidade, da Dança e da Educação Física que precisam ser estudadas, vivenciadas e compartilhadas. Penso que um diálogo se faz necessário entre as abordagens para que possamos valorizar e aprender com nossa dança e com nossos pioneiros.

O Capítulo Treze, assinado por Tamiris Patricio e Michele Carbinatto, encerra esta bela obra. Não se trata de um fim, pois temos aqui uma nova abertura com a perspectiva dos Festivais Artísticos. As autoras apresentam, em detalhes, a proposta pedagógica de um festival desta natureza, enfocando a encenação de práticas corporais e a gestualidade poética do movimento como potencialidades de uma educação estética. Com base na fenomenologia, nuançam a experiência estética e o potencial expressivo do corpo como experiência cultural que educa todos os envolvidos no processo. Desde a idealização, construção e execução, o festival apresenta-se como uma extraordinária possibilidade de experiência educativa por meio de sentidos estéticos.

Eis aqui uma mostra do livro Dança na escola: reflexões e ações pedagógi-cas, em capítulos, que podem ser lidos, em conjunto ou separadamente, posto que muito bem articulados em seu propósito. Ao ler este livro, também pude rememorar minha própria trajetória na dança, na educação física e na filosofia. Mergulhei em um tempo dançante. Este tempo me acolhe e, nesta imersão, a memória inscrita no corpo evoca, cria e recria sentimentos, desejos e pensa-mentos que, por sua vez, tomam posse do espaço, tornando-se palavras-danças ou palavras que podem ser dançadas. Palavras dançantes que são também um convite para entrar na dança, para sentir com as pessoas que assinam este livro diferentes possibilidades que o movimento da dança é capaz! Este prefácio, escrito para muitas danças, é uma forma de agradecimento e um convite para que os/as leitores/as se ponham a dançar...

A dança é uma forma de tempo, afirma Paul Valéry, portanto propicia uma forma de êxtase, sendo não apenas expressão artística ou divertimento – o que já é excepcional – mas, sobremaneira, uma forma de celebração da vida e de nossa sensibilidade. Gosto dessa compreensão que conecta a temporalidade da dança com aquela do corpo e de nossa existência, preenchendo o espaço de nossas ações, desenhando fluxos para nossa percepção e criando sentidos que

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atravessam e constituem nossa temporalidade. Assim, a dança é maior que a coreografia, que tem seu lugar como escrita dessa mesma dança, e, quem sabe, uma tentativa de prolongar o êxtase, o elã vital que a dança é capaz de criar, de reverberar e de projetar. Por essas e por outras razões, esse livro é muito bem--vindo em um momento em que precisamos nos apoiar na pulsão de vida. Nesse sentido, a dança e a leitura têm essa possibilidade de abrir mundos imaginários, possibilitando ações e reflexões generosas, éticas e estéticas como as que são apresentadas neste volume.

Petrucia Nóbrega

Natal, março de 2021

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APRESENTAÇÃO

A PRESENTE AÇÃOA PRESENTEARUM PRESENTE

A partir da Filosofia Apresentação é um termo utilizado por Husserl para designar a experiência indireta que o eu tem dos outros eus, “nos dá o que, nos outros, nos é inacessível no original; por ela, “uma outra mônada constitui-se em minha”. É uma apercepção por analogia. (Abbagnamo)

Nesse sentido, aproprio do meu eu para apresentar em um caminho complexo de a presentar ação um eu que inspira e transpira por meio de seu valioso SER um presente constante para todos nós: Roberta Gaio e suas Obras.

É com muita alegria e honradez que apresento mais uma Obra de extrema importância para área de Dança, Cultura, Ginástica, Educação Física e Educação de forma geral, evidenciando a grande relevância dos diversos olhares acerca das particularidades, trabalhos, estudos e seus autores realizados nos diferentes cantos e encantos do Brasil.

Aceitar o convite para apresentar esse Livro me responsabiliza em demons-trar e valorizar a amplitude de relações encontradas nos textos apresentados pelos/as autores/as, bem como, afirmar o compromisso de cada um/a com suas pesquisas, ações, experiências e realizações ao longo de um cotidiano de com-promisso com o ensino, pesquisa e extensão nas áreas em questão.

Para tanto, desejo inicialmente expor e mostrar um pouco do tanto que é a Roberta Gaio, mulher, professora, pesquisadora e autora de inúmeros trabalhos ao logo da sua Vida. É necessário ressaltar a diversidade de conhecimentos, saberes e fazeres e aprofundamento em que ela se compromete na ação de agregar tantos eus em sua cultura de estudar, pesquisar e publicar para seus/suas leitores/as.

Doutora Roberta Gaio tem em seu percurso histórico uma relação íntima com a práxis em áreas rítmicas e que foram se ampliando, conforme sua rotina de estudos e trabalhos produzindo, dessa forma, uma vasta comunicação de obras importantes com especiais profissionais em áreas expressivas da Ciência Brasileira.

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O Presente que aqui nessas páginas apresento, vai além do tempo e se transforma num valioso meio de transformar o nosso eu e o próprio tempo de aprender, reaprender e transcender as nossas reflexões em ações de elo e cumplicidade com aquilo que cada um de nós acreditamos para uma coletiva construção de sentido e significado para atuação profissional.

Conhecer Roberta Gaio é um Presente para todos/as que possuem essa privilegiada oportunidade. Sua intensidade e amor por tudo que se aproxima traz motivos de celebração, já que uma das suas características é se aproximar de pessoas que desejam produzir, incansavelmente, nas suas CRIAÇÕES E EXPRESSÕES.

Compartilho da Poesia tão Viva de Machado de Assis para esse Pre-sentear da Dra. Roberta Gaio, Ms. Tamiris Patricio e seus/suas Convidados/as com cuidadosos textos e seu abrangente alcance:

Você é aquilo que ninguém vê. Uma coleção de histórias, estórias, memórias, dores, delícias, pecados, bondades, tragédias, sucessos, sentimentos e pensamentos. Se definir é se limitar. Você é um eterno parênteses em aberto, enquanto sua eternidade durar. (Machado de Assis)

Parabenizo vocês pela Dança de Vida em que cada um/a apresentou nesse livro, sem dúvidas vocês contribuem e enriquecem essa ARTE que precisa ser conhecida, reconhecida, dançada e transformada nesse PALCO tão crítico, criativo, reflexivo e artístico: ESCOLA.

Dançar na Vida com vocês é significativo para que nós, coletivamente, construamos ARTE, DANÇA com mais fluidez para seu repertório transbordar e envolver um novo ritmo de pensar, sentir e agir na nossa Escola.

DANÇA NA ESCOLA: REFLEXÕES E AÇÕES PEDAGÓGICAS nos brindará com visões da Dança em sua contextualização plural de atuação na vida dos Seres Humanos. Os diversos temas abordados pelos/as autores/as são possibilidades de uma compreensão mais ampla do trato da Dança desde sua História a sua presença no lócus ESCOLAR, ampliando assim, as possibi-lidades e limitações encontradas nesse Processo da ARTE DE APRENDER E ENSINAR na Educação Escolar.

Ana Angélica Freitas Gois

Aracaju/Verão de 2021

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APRESENTAÇÃO

Sempre considero um desafio quando solicitam algo para eu escrever. Isso porque quando as pessoas depositam em mim credibilidade e confiança, busco sempre o meu melhor.

Entretanto ao receber o convite para apresentar ao/a leitor/a esse livro, senti-me mais agradecida do que desafiada, isso porque o recheio desse livro trará enormes saberes a uma área do conhecimento por mim percorrida e sempre em busca de informações em bibliotecas e experiências vividas.

A dança é uma arte que diverte e integra além de proporcionar uma grande possibilidade em unificar pessoas. Nas crianças os movimentos espon-tâneos emergem da sua imaginação dando sustentação a movimentos mágicos, por vezes jamais por nós construídos ou tão bem elaborados.

Ensinar dança as crianças é muito mais aprender dança com elas, pois seus movimentos são diversificados e garantem expressões corporais inimagi-náveis por nós. O que realmente podemos fazer nesses momentos é incentivar movimentos livres e reforçar os mais variados ritmos. Através do sentir, perceber e conscientizar ritmicamente os movimentos conseguimos extrair dessas crianças as oportunidades e potencialidades nas grandes harmonias dos seus movimentos. A evolução do seu domínio corporal vai depender da nossa ação pedagógica que, quando aplicada com sabedoria, não irá engessar as suas criatividades.

A dança propõe um instrumento também de comunicação que acontece de diversas maneiras de expressões e movimentos.

Assim sendo, nós profissionais da dança, temos o dever de fornecer con-dições, ao alcance de todos, desde a percepção, o entendimento e a interação para a participação e igualdade de oportunidades no exercício do prazer da dança.

Se oferecermos a vivencia da arte da dança a todos, ampliaremos a sua abrangência, sobretudo norteando experiências significativas motivadas por interesses e intencionalidades.

Sabemos que o desenvolvimento integral do ser humano pressupõe a sua participação na sociedade como ser criativo respeitando suas habilidades motoras

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e intelectuais, e a dança poderá ser a grande motivação na busca inspiradora dessa formação para a sua libertação de escolha, diversão e prazer.

Esse livro aborda todas essas garantias mostrando ao/a leitor/a a impor-tância de ser feliz quando se dança.

Mari Gandara

Ex-diretora e professora de dança da FAEFI PUC

Campinas - Verão/2021

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A DANÇA NA HISTÓRIA E A HISTÓRIA DA DANÇA: POSSIBILIDADES PEDAGÓGICAS NA ESCOLA

Roberta GaioRegina Penachione

O tempo e o espaço estão sempre presentes no desenvolvimento da Civilização e da Cultura. (RAMOS, 1982, p. 15)

INTRODUÇÃO

É de nosso interesse que este texto possa ser um referencial para os/as docentes interessados/as no trabalho pedagógico de arte na educação básica, com foco nos acontecimentos que marcaram as ações humanas, desde os tem-pos primitivos até os dias atuais, no surgimento das linguagens artísticas, em especial, da dança.

É intuito, também, propor ações pedagógicas interdisciplinares entre diversas áreas de conhecimento, especificamente, entre a Arte e a Educação Física, que possam auxiliar na construção de projetos em que os/as alunos/as possam ser os/as protagonistas na construção do conhecimento por meio de processos artísticos e estéticos.

Assim, num primeiro momento, o olhar se volta para o passado, no anseio de se estruturar um panorama da evolução histórica do fazer artístico, dos sentidos e as possíveis conexões com a sociedade em cada período. É evidente o quanto a arte sempre esteve presente e ainda está na vida do ser humano, como uma característica da sua existencialidade cultural, porém os fatos, muitas vezes, mostram detalhes que evidenciam a não linearidade da evolução histórica, das manifestações artísticas e fica claro, nas palavras de Brandão (1997, p. 13), que, muitas vezes, “tudo está mudando, mas nada mudou; a não ser um novo olhar sobre o mesmo fenômeno”.

A arte é uma construção humana e como tal se efetiva no corpo, pelo corpo e a partir da realidade do corpo, no percorrer da história da humanidade. Essa relação arte e corpo, como um hibridismo, fruto da subjetividade do ser e

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Roberta Gaio | Tamiris Lima Patrício (org.)

estar no mundo, percebe-se, nas palavras de Merleau-Ponty (2009, p. 132), “Meu corpo é o único meio que possuo para chegar ao âmago das coisas, fazendo-me mundo e fazendo-as carne”.

Sobre esse hibridismo humano Tucherman (1999, p. 29) nos leva a pensar na dança como um elemento cultural fundamental quando diz que

Daí a importância da dança, como manifestação da cumplicidade entre o mundo físico, biológico e humano, de certa forma responsável pela ‘recriação do universo’ e pela captura do que ele tem de fluxos, rupturas e medi-das. A dança recolhe os fragmentos caóticos do cosmo e do corpo e dá-lhes um sentido originário imanente à própria dança, que, produzindo este sentido, o fará ser rememorado pelo mito (...).

Acredita-se que a dança tenha surgido desde os primórdios da humani-dade, que antes mesmo de falar, o ser humano tenha se comunicado por meio de gestos e expressões. Antes de se exprimir por meio de uma linguagem oral, o ser humano dançou. A dança foi uma das formas de arte mais viva e uma representação da linguagem gestual como forma de comunicação.

O ser humano sempre se expressou por meio dos movimentos corporais, pela dança, manifestou-se e se comunicou consigo mesmo, com o outro e com o mundo. Esse rico universo cultural produziu história, que se estruturou como um campo de pesquisa em que se constata o estudo das narrativas históricas e a memória dessa linguagem artística nas mais diferentes civilizações desde a pré-história, época de seu surgimento, até os dias atuais.

Nos estudos sobre a história da dança, no tempo e espaço, encontram-se várias influências culturais de diversos países onde ocorreu e ainda ocorre a dança e sua importância como forma de expressão e comunicação, compreendida por todos os povos, por mais distantes que estejam uns dos outros, ou como nos coloca Porpino (2006, p. 28)

Dançar... essa arrebatadora forma de expressão que nos faz entrar em contato com nossa realidade humana imperfeita, inexplicável e tão maravilhosamente plástica. Pensar na dança é pensar nos muitos momentos em que a comunicação escrita ou falada não foi suficiente para expressar as angústias ou o desejo de poetizar.

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Dança na Escola

A dança é uma manifestação que promove o descolamento cultural, em função do seu conteúdo, que representa as sociedades através dos tempos, ora como forma de expressão artística, ora como objeto de culto aos deuses, ou como simples entretenimento.

A dança se encontra em diversos espaços e, muitas vezes, é reinventada, recriada, refeita e ressignificada.

O homem primitivo dançava por alegria, pela dor, por amor, pelo temor. Dançava ao amanhecer, ao anoitecer, para a chuva, para a semeadura e para a colheita, para as estações do ano. Dançava para o nascimento, para a puberdade, para o casamento, para a guerra, para a vitória, para a caça, para a morte. Dançava para qualquer acontecimento repentino, inexplicável e atemorizante para a comunidade, buscando a proteção. (WOSIEN, 1996 apud ALMEIDA, 2005, p. 67)

É o corpo que dança, espalha cultura aos ventos e se refaz a partir de novos sentidos e significados. Assim a dança é uma manifestação cultural dinâ-mica, viva e, com certeza, eterna, pois, como diz Faro (1986, p. 10), “a dança, em suas diversas manifestações, está de tal modo ligada à raça humana que só se extinguirá quando esta deixar de existir”.

Desde o início da civilização até os dias atuais, a dança tem sido uma grande possiblidade de representação dos desejos, das paixões, das angústias, das emoções, dos sentimentos e dos pensamentos humanos.

Segundo Tavares (2005, p. 93),

Existem indícios de que o homem dança desde os tem-pos mais remotos. Todos os povos, em todas as épocas e lugares dançaram. Dançaram para expressar revolta ou amor, reverenciar ou afastar deuses, mostrar força ou arrependimento, rezar, conquistar, distrair, enfim, viver!

A dança apresenta funções e sentidos ligados aos diversos acontecimentos sociais, políticos, econômicos, culturais e outros e, assim, quando inserida no contexto educacional, oferece aos/as discentes possibilidades de se conhecerem, de criarem, de apreciarem e se desenvolverem, expandindo as possibilidades pessoais do corpo, entre afetos e emoções, muitas vezes, não manifestos.

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Roberta Gaio | Tamiris Lima Patrício (org.)

A arte, em especial a dança, contribui para a formação do ser humano. Como diz Charlot (2013, p. 44), “Educação e Arte são duas formas de construir o ser humano. Não é de se admirar, portanto, que, a cada época, suas lógicas profundas condigam”.

Então vamos viajar pelos períodos históricos e refletir sobre eles, trazendo à baila “quando o corpo se põe a dançar” (NÓBREGA, 2015, p. 39), pois

(...) as sensações, a memória, a palavra, os gestos do corpo instauram um logos estético fundado na poièsis, na criação e na prosa do mundo. Essa ontologia sensível da criação inaugura mundos: o mundo da pintura, da palavra, dos gestos, da expressão que se torna obra. Obra de linguagem, de palavras com a literatura e a filosofia; obra de movimento, como a dança, o teatro, a pintura. (NÓBREGA, 2015, p. 39, grifo nosso)

DANÇAS PRIMITIVAS

O ser humano, nos primórdios do seu primitivismo, segundo Ramos (1982), tinha duas grandes preocupações, entre tantas outras tarefas cotidianas: atacar e defender. Foi um grande período de descobertas e todo o universo cultural, incluindo a arte em geral, e a dança, em especial, era fruto da busca constante pela sobrevivência.

Aterrorizado por tudo que o cercava, o homem primitivo considerava sua sobrevivência como favor dos deuses, dando à sua vida, por conseguinte, sentido ritual. De várias formas, não somente empregando a dança, mani-festava seu misticismo. (RAMOS, 1982, p. 16)

As danças primitivas datam de 9.000 a 8.000 a.C., no denominado Período Paleolítico, no qual os seres humanos eram nômades, e se acentuam no Período Neolítico, de 8.000 a.C. a 5.000 a.C., em que os seres humanos se tornaram sedentários com a agricultura, a domesticação de animais e a produção de cerâmica, entre outros fatores. São consideradas uma das formas de comu-nicação mais antigas existentes, porque há indícios de que o ser humano, antes de falar, já realizava movimentos de dança para se expressar, quando batiam os pés no chão e conjugavam os passos com as mãos por meio de palmas.

Para o homem primitivo, com os olhos sempre voltados para o céu, o mundo e as forças naturais formavam uma

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Dança na Escola

unidade. Ele devia subsistir mediante duros esforços, con-siderando sua sobrevivência como um favor dos deuses, por conseguinte, tendo um sentido ritual. A dança, desde o paleolítico superior, tornou-se atividade física derivada, mística e lúdica, indicando um estado de alma menos cruel, um despontar de sentimentos do homem primitivo. Por ela lhe é comunicado o poder dos deuses e agrade-cidas às mercês deles recebidas. (RAMOS, 1982, p. 54)

Essas danças e seus movimentos, executados pelos seres humanos pri-mitivos, ficaram registrados na arte rupestre, ou seja, em desenhos gravados em rochas, nas paredes das cavernas e galerias subterrâneas, representando cenas diversas, entre elas de caça, pois, pela representação pictórica, acreditavam alcançar determinados objetivos como abater um animal, por exemplo. Assim,

Na sua manifestação mais elementar, a dança pode aparecer como produto duma descarga emocional no indivíduo, mas, imediatamente, socializada. (...) A mais elementar em todas as artes consiste na simples repetição. Uma repetição dos gestos próprios da descarga sentimental é já uma forma de dança, individual neste caso, e que, em progressiva estilização, pode ser comunicada ao coro, a um grupo mais ou menos abundante de pessoas que repetem em soma aritmética o gesto estilizado. Semelhantes gestos são miméticos da dor, dos trabalhos do homem – ceifeiros, remadores – do oferecer o sexo, do ferir com lança, disparar setas a uma vítima na luta ou na caça, tudo gestos que se transmitem à dança por simples processo elementar de magia imitativa e sua estruturação tem um aspecto de dança simbólica. O tempo passa, o significado mágico perde-se, mas o gesto estilizado fica. (SALAZAR, 1949, 14)

É fato que o ser humano primitivo dançava para se comunicar e repre-sentar todas as formas de acontecimentos, celebrando a natureza, as lutas, como forma de cultuar o físico, os rituais religiosos, a fecundidade, a vida, a morte, a felicidade e a saúde.

Nessas eras, a dança estava ligada diretamente à sobrevivência porque, os seres viviam em tribos isoladas e se alimentavam da caça, da pesca, de vegetais e frutos colhidos da natureza e, assim, criavam rituais de dança para impedir qualquer evento natural que prejudicasse essas atividades.

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As pinturas rupestres encontradas em cavernas, como as de Altamira na Espanha, a de Lascaux na França e até mesmo na Serra da Capivara, no Piauí, demonstram que o ser humano primitivo imitava os movimentos dos animais e saudava a natureza. Essas pinturas rupestres, muitas vezes, representavam cenas de pessoas em roda, dançando em volta de animais e vestidas com suas peles; pareciam figuras correndo e saltando, imitando os movimentos e posturas desses animais. (RAMOS, 1982)

Como nas palavras de Portinari (1989, p. 11),

De todas as artes, a dança é a única que dispensa mate-riais e ferramentas, dependendo só do corpo. Por isso dizem-na a mais antiga, aquela que o ser humano carrega dentro de si desde tempos imemoriais. Antes de polir a pedra, construir abrigo, produzir utensílios, instrumentos e armas, o homem batia os pés e as mãos ritmicamente para aquecer e se comunicar.

Pode-se dizer que a dança auxiliou o ser humano primitivo no seu desen-volvimento (até certo ponto social), como forma de participação em grupo, e intelectualmente, despertando nele outros sentimentos, como o prazer, revelando ainda mais o caráter artístico na adoração por algum elemento ou pelo medo de tudo o que não tinha explicação. Assim o ser humano “criou com o próprio corpo padrões rítmicos de movimentos”, desenvolvendo também um “sentido plástico do espaço”. (MENDES, 1987, p. 6)

O ser humano, a partir do Período Neolítico, torna-se sedentário, fixa residência em lugar determinado, começa a plantar para se alimentar, criar e domesticar animais para sua sobrevivência.

Pode-se dizer que, com base nisso, surgiram a agricultura e a pecuária que foram se aprimorando ao longo da evolução humana. Agora a organização do trabalho se refere à caça, à trituração de raízes, sementes e folhas para a sobrevivência comum. Muitos desses trabalhos eram efetuados por marcações rítmicas, tais como, pancadas e gritos.

As danças, então, representavam os festejos do ser humano primitivo à terra, ao preparo do plantio, as celebrações das colheitas e da fertilidade dos rebanhos. Os movimentos dançantes para essas festividades representavam uma

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Dança na Escola

forma de o ser humano estar em sintonia com a natureza, para dela receber o que por ele havia sido programado.

Como afirmam Rengel e Van Langendonck (2006, p. 9), “Imaginamos que as danças dessas épocas eram a expressão do que o homem sentia em relação a seu mundo”.

Até mesmo nas palavras de Franco e Ferreira (2016, p. 266),

(..) como todas as artes a dança é fruto da necessidade de expressão do homem, representando, naquele período, todas as formas de acontecimentos sociais: o nascimento, o casamento, a colheita, a caça, festa do sol, da lua. Dessa forma, a dança, para o homem primitivo, estaria total-mente ligada à magia.

Com o passar do tempo, o ser humano evoluiu com suas descobertas sobre as possibilidades que o mundo lhe oferecia e com suas novas habilidades, o que lhe proporcionou, de certa forma, o domínio do mundo; organizou-se socialmente e tatuou na sua história outro período.

A escrita lhe introduziu ao período denominado Antiguidade com novas formas de se expressar e dançar.

Dessa forma, percebe-se que a dança, como linguagem e comunicação, sempre existiu, “desde os povos pré-letrados, cuja vida costuma ser pautada por estreitas ligações com sua mitologia, até os diversos modismos da civilização contemporânea”. (PELLEGRINI FILHO, 1986, p. 9)

DANÇA NA ANTIGUIDADE

Em se tratando de movimento, em especial da dança, embora muitos estudos nos levem para a antiguidade clássica greco-romana, que também será foco deste texto, não podemos deixar de olhar para além e trazer os fatos da civilização oriental, que muito contribuiu com o desenvolvimento da dança enquanto manifestação expressiva, estética e cultural, pois, para Ramos (1982, p. 17), “não é exagero afirmar que a civilização ocidental, no seu passado esca-lonado no tempo, mais recebeu da oriental do que a ela deu”.

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No Oriente

A. Egito

As manifestações da dança para a civilização egípcia tinham razões diversas, desde caráter sagrado ou divino, executadas em homenagem aos deuses, celebrações à natureza, rituais fúnebres e casamentos, dentre outros, danças pro-fanas, que aconteciam em homenagem aos vivos até danças civis, que ocorriam com pessoas comuns. (RENGEL; VAN LANGENDONCK, 2006)

No decorrer de sua longa história, da época neolítica até o ano 30 antes de nossa era, o Egito praticou ampla-mente a dança, na forma de dança sagrada, depois de dança litúrgica – principalmente litúrgica funerária – e, enfim, de dança de recreação. (BOURCIER, 2006, p. 14)

Para os egípcios a dança representava a melhor manifestação de seus sentimentos, principalmente, para homenagear os deuses. Os registros encon-trados, como pinturas em paredes e vasos egípcios, evidenciam que as danças apresentavam movimentos fortes, angulosos e com pouquíssima utilização dos saltos. (RENGEL; VAN LANGENDONCK, 2006)

De acordo com Ramos (1982, p. 77), “conheciam os egípcios as danças expressionistas, ginastas, de imitação, guerreiras, sátiras, dramáticas, líricas, diti-râmbicas, fúnebres e religiosas, realizadas individualmente, por pares ou grupos”.

As danças também eram apresentadas em festas religiosas e em funerais. Nos funerais, havia os ditos “Muu”, personagens que, de repente, surgiam e vinham ao encontro do enterro, dançando em duplas. Os egípcios acreditavam que os movimentos desses dançarinos asseguravam ao morto a ascensão a uma nova vida. (BOURCIER, 2006)

Existiam também as danças profanas, que aconteciam nos banquetes em honra aos vivos ou aos mortos, e as para entregar recompensas a funcionários ou por ocasião de elevação de cargo. Sobre isso Bourcier (2006, p. 15) questiona: “Os numerosos documentos iconográficos em que figuram, com leves modi-ficações indumentárias através dos tempos, evocariam demônios infernais ou funcionários sacerdotais especializados?”

Diversos registros mostram a dança egípcia como severa, angulosa, com movimentos acrobáticos e jogo do corpo para trás, como ponte: pés e mãos

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Dança na Escola

apoiados no solo, sustentando o corpo arqueado. “Um belo exemplo deste movimento é dado pelo célebre ‘fragmento da dançarina’, conservado no museu egípcio de Turin”. (BOURCIER, 2006, p. 16)

B. Índia

“A civilização indiana não separava o sagrado do profano, nem o espírito da matéria e mantinha uma relação divina com a natureza.” (TADRA et al, 2012, p. 19)

Segundo a tradição hindu, a dança foi uma criação divina e não humana. De acordo com os Vedas, textos sagrados do hinduísmo, a humanidade aprendeu a dançar por meio da relação com o divino. Essa característica faz o tempo e o espaço se tornarem eternos, quando o assunto é a dança, pois

(...) podemos imaginar uma grande ponte ligando tem-pos e espaços distantes e diversos. É interessante notar que, em pleno século XXI, em países como a Índia, por exemplo, dependendo da região, a tradição de danças que foram passadas de geração a geração se conserva e elas são praticamente imutáveis. (RENGEL; VAN LANGENDONCK, 2006, p. 14)

Como os deuses eram excelentes dançarinos, e a sua arte marcava todos os momentos da existência, era quase impossível dissociar a dança de valores eternos advindos da religião. “Na milenar civilização da Índia, os conceitos de energia, sabedoria e arte brotam de uma mesma raiz divina que produz e coordena a vida”. (PORTINARI, 1989, p. 41)

Na Índia, “as danças aparecem como atributo à Shiva que, junto com Brahma e Vishnu, formam a trindade básica do hinduísmo. (...) também é chamado de Nataraja, ou seja, ‘senhor da dança, que cria, destrói e recria o uni-verso”. (PORTINARI, 1989, p. 41). Assim, há inúmeros exemplos de dança, pois os hindus procuravam sempre uma união com a natureza por meio de suas danças e músicas.

As danças indianas são de extremo requinte quanto à expressão corporal e tinham o princípio de que “o corpo inteiro deve dançar” (PORTINARI, 1989, p. 42), por isso apresentam movimentos muito elaborados de pescoço, olhos, boca, mãos, ombros e pés (diferente do que acontece no ocidente).

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Cada gesto tem um significado místico, afetivo e espiritual. Os gestos das mãos são chamados de mudras e alguns registros apontam 24 movimentos de cabeça, 4 para pescoço, 6 para sobrancelhas, 44 para os olhos, 57 para as mãos, 9 para as pálpebras, 6 para o nariz, 6 para os lábios, 7 para o queixo, entre outros, cuja representatividade se verifica na dança indiana Bharatanatyam. (RENGEL; VAN LANGENDONCK, 2006)

O objetivo da dança indiana é o visual, pois os gestos são muito artísti-cos e agradáveis, e os trajes e ornamentos complementam sua beleza. Ela não separa a vida material da vida espiritual, pois corpo e alma não estão separados.

As danças são passadas de geração a geração, até hoje, a dança indiana é ligada ao misticismo e à religião, por isso as escolas de dança funcionam junto aos santuários.

Uma das danças mais importantes mantidas até hoje é a de Shiva (deus da dança), que representa a criação do universo e o cuidado com o mundo para que ele esteja sempre em harmonia. Algumas danças indianas são chamadas de ragas. Cada raga tem suas cores e representa certos poemas que se referem a lendas que falam das estações do ano ou das horas do dia. Essas lendas e seus perso-nagens são representados em algumas pinturas hindus. (RENGEL; VAN LANGENDONCK, 2006, p. 14)

Vale destacar, ainda que fora do tempo, mas necessário neste espaço, que, apesar do processo de globalização ter unido lugares e costumes e tenha resultado na adoção de inúmeros costumes europeus, a Índia manteve-se alheia ao ballet ocidental, ao contrário do que ocorreu na China e no Japão. Sua dança permanece vinculada a tradições milenares tanto nos temas que aborda quanto nas formas de execução. (PORTINARI, 1989, p. 43)

No Ocidente

A. Grécia

Na Grécia, assim como no Egito e na Índia, a dança também apresentava um caráter divino, mas se tornou mais acessível a todos na vida cotidiana e na

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Dança na Escola

comunicação entre os homens, contribuindo para as primeiras formas de dança como arte cênica, fazendo parte das manifestações teatrais.

Quando começaram a perder o costume religioso, as danças passaram a fazer parte das comemorações dos Jogos Olímpicos (até hoje presentes nesses eventos, em especial nas aberturas), da educação e da vida diária da civili-zação grega.

De seu nascimento à morte, a civilização grega é com-pletamente impregnada pela dança. Ritos religiosos, pan-helênicos ou locais, cerimônias cívicas, festas, edu-cação das crianças, treinamento militar, vida cotidiana, a dança está presente por toda a parte. Comprovam-na milhares de documentos em figuras e textos. É possível acompanhar com uma precisão bastante satisfatória a evolução das ideias orquésticas através da cultura grega. (BOURCIER, 2006, p. 19)

Segundo os grandes filósofos gregos, a dança ocupava um lugar de destaque na civilização grega, porque auxiliava na construção de corpos torneados e esbel-tos que inspiravam artistas e preparavam fisicamente os soldados para a guerra.

A opinião de filósofos e poetas era muito respeitada nessa cultura. Segundo o filósofo Sócrates (470 – 399 a.C.), a dança formava um cidadão completo e nunca era tarde para se aprender a dançar. Ele, já adulto, aprendeu a dançar a menphis, ou a dança Mefítica, dedicada a Atena, deusa da Justiça. (RENGEL; VAN LANGENDONCK, 2006, p. 12)

Conforme nos informa Portinari (1989, p. 33):

O corpo esbelto e bem torneado do adolescente sim-bolizava a própria beleza para os gregos e constituiu permanente fonte de inspiração para os artistas. Para se ter um corpo assim era preciso exercitá-lo no esporte e na arte da dança. Ambos integravam, pois a formação do soldado-cidadão desde a infância. (...) Os filósofos se manifestaram a favor da dança na educação, fosse como complemento artístico, fosse como exercício saudável para se obter uma boa musculatura.

Os cidadãos gregos acreditavam no poder das danças mágicas, por isso usavam máscaras e dançavam para seus inúmeros deuses que eram cultuados de

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diferentes maneiras. Uma das divindades gregas mais conhecidas é Dionísio, Deus da fertilidade e do vinho, da embriaguez, do êxtase, do impulso inconsciente.

Várias festividades aconteciam em homenagem a este Deus múltiplo, como por exemplo, o banquete que acontecia no Monte Parnaso, na cidade de Delfos, paralelamente, aos Jogos Píticos, em que somente homens participavam; naquela ocasião, a dança dionísica era executada por mulheres e ocorria de forma bastante livre e improvisada, significando alegria e diversão ou em homenagem aos mortos, entre outras formas. (HAAS; DIAS; LEAL, 2017)

Em outros momentos, havia espaços específicos de homens, e a dança dionísica se transformava, como diz Tucherman (1999, p. 26):

Vale a pena ressaltar que a civilização grega não incluía as mulheres na sua concepção de corpo perfeito, que era pensado e produzido nos rapazes aos quais se aplicava uma dietética e uma erótica, e que elas eram proibidas de participar dos cultos dionisíacos e beber o sangue do touro sagrado que conferia VIR (força) e, portanto, excluídas de uma das experiências de transe, o permi-tido, sendo aquele experimentado pelas pitonisas como mediadoras do oráculo.

Encontram-se também registros de rituais com a participação de homens e mulheres, como o culto a Dionísio como uma liturgia agrária, de três dias de muita festa e bebidas.

Acredita-se que o início da orquestra grega nasceu com os agricultores, que traziam a uva para uma praça, no centro de Atenas, e as maceravam com os pés em movimentos coordenados.

Os pisadores deslocavam-se em forma de roda e cantavam para dar ritmo, enquanto pisavam a uva para fazer o vinho. “Dançarinos de ambos os sexos uniam-se pelos pulsos ou pelas mãos e, dessa maneira, pareciam um grande ramo de folhagens. Ligavam-se uns aos outros também pelos ombros ou por um pedaço de suas roupas”. (RENGEL; VAN LANGENDONCK, 2006, p. 12)

Como essa cerimônia durava dias, quando estavam cansados, eram substituídos por outros, que ficavam sentados em volta da praça, nos bancos de pedra. Em torno deles, a população de cidadãos formava fileiras, sentada em

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Dança na Escola

degraus. Acredita-se que essa disposição deu origem ao famoso teatro grego no século V a.C.

O século V é o dos grandes ágonos, espécie de concursos festivais que eram sujeitos a um ritual minucioso em honra de Zeus, Apolo ou Poseidón. Celebravam-se em diversas localidades e em diferentes épocas do ano. Os Jogos Olímpicos, de quatro em quatro anos; os Pythios, em cada terceiro ano da olímpiada, uns e outros no mês de Agosto; e ainda mais festivais, em Julho e Abril. (...) Uma procissão solene rematava os festivais e, partia da planície de Crixa, onde se realizavam os jogos, para o templo de Delfos, na região mantanhosa. (SALAZAR, 1949, p. 37)

Na educação grega, a dança era disciplina obrigatória à formação do cidadão, por isso era inserida desde a formação militar até a educação escolar. Em Atenas, considerava-se um indivíduo educado aquele que, além conhecer a política, filosofia e música, sabia dançar porque o ideal de perfeição era a harmonia entre o corpo e a alma. Essa harmonia deveria aparecer em um corpo bem moldado, adquirido graças ao esporte e à dança.

As crianças eram educadas para a guerra e acreditavam que a dança con-tribuía para o equilíbrio da mente e aprimoramento do espírito, como também lhes daria a agilidade necessária para a vida militar. Desde os 5 anos, as crianças aprendiam a pírrica, uma dança guerreira e competitiva usada na educação e na preparação militar. O aprendizado da pírrica consistia em exercícios preparatórios de flexibilidade em que os participantes jogam o corpo para trás até alcançarem os tornozelos com as mãos. Em seguida, vinham os exercícios de quironomia nos quais aprendiam o porte dos braços e das mãos para simular os gestos de combate. Segundo alguns estudos, podem-se encontrar representações da pírrica no flanco da Acrópole e no friso do Partenon. (BOURCIER, 2006)

Tadra et al (2012, p. 17) mencionam que

Platão (428-347 a.C.), outro filósofo, e o poeta Homero, que teria vivido no século VII a.C., também consideravam a dança como parte da educação dos cidadãos. Diziam que ela servia para santificar e curar os corpos, além de trazer mais agilidade, beleza e sabedoria.

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Van Langendonck (2020, p. 15) acrescenta que “Platão (428-347 a.C.) e Aristóteles (384-322 a.C.) consideravam a dança e a ginástica como uma iniciação para a luta e para a educação dos cidadãos”.

Os filósofos concordavam que a dança, além de fazer parte da educação das crianças, trazendo agilidade, beleza e sabedoria, servia para santificar e curar os corpos. Platão, autor das obras Diálogos e A República (essa última escrita em forma de diálogo com seu mestre Sócrates), apresenta o seguinte conceito: “Todo ser vivo tem necessidade de saltar e brincar, e é portador de um ritmo que produz a dança e o canto”. (RAMOS, 1982, p. 88)

Com o passar dos tempos, a dança fica acessível a todos os cidadãos, mas, com o declínio da cultura grega, passa apenas à esfera do entretenimento.

As danças do cotidiano grego eram livres, em rodas e filas espontâneas sem passos preestabelecidos.

A dança intervinha em todos os momentos da vida dos gregos, do nascimento à morte. Encontramos portanto: danças de nascimento e pós-parto (...); danças que cele-bram a passagem dos efebos à categoria de cidadãos (..); danças nupciais celebradas em dois tempos, na noite de núpcias e no dia seguinte pela manhã (...); danças de banquetes, executadas com maior frequência por uma dançarina profissional, acompanhada por uma tocadora de aulos (...). (BOURCIER, 2006, p. 37)

A técnica da dança grega, segundo Bourcier (2006), traduz algumas certezas, como o costume de dançar na meia ponta e buscar sempre a simetria dos membros.

O surgimento do gênero teatral comédia, que se originou de cortejos populares e bailes de máscaras, era muito apreciado pela civilização grega.

As danças, que eram apresentadas nessas comédias, possuíam gestos leves e ligeiros, com muitos saltos, piruetas e movimentos de rotação dos quadris. Essa característica sensual foi levada para o Ocidente, mas, na Idade Média, foi proibida pelos cristãos, que pretendiam a purificação dos costumes.

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Dança na Escola

B. Roma

De acordo com Bourcier (2006), quando olhamos para a história da dança entre os romanos, três períodos merecem atenção: Reis, República e Império.

No período dos Reis, predominavam as danças de origem agrária, entre elas, o rito dos salianos, que consistia em danças guerreiras.

Já na República, era forte a influência helenística, no que se refere à orquéstica, porém as origens religiosas das danças foram esquecidas e se tor-naram recreativas.

No período do Império, era grande a moda da dança e até as mulheres de classes altas passaram a praticá-las, “mas triunfou realmente nos jogos de circo. (...) A pantomima dançada era muito apreciada. Logo as pantomimas tornaram-se grosseiras, a mímica assumindo maior importância do que o movi-mento da dança. Da mesma forma, as danças de banquete deram mais dadas à indecência do que à orquéstica. (BOURCIER, 2006, p. 43)

No Império Romano, tanto a dança como as demais linguagens da arte foram desprezadas, pois diversões de todos os tipos marcaram a vida romana. O povo se motivava a assistir aos grandes espetáculos sangrentos, lutas com os gladiadores e animais ferozes, no Coliseu e no Circus Maximus. (PORTI-NARI, 1989)

“(...) na Roma cosmopolita da época, onde não mais podia se representar o drama falado por causa da diversidade de línguas, e onde os espetáculos refletiam a decadência da história, as artes tornaram cada vez mais grosseiras, sendo representadas pela violência sádica do circo e a obscenidade da pantomima. A Dança foi, assim, envol-vida na corrupção do modo de vida romano. (DINIZ; SANTOS, 2008, p. 06)

Nas palavras de Ellmerich (1987, p. 17),

Em Roma, a princípio desprezava-se a dança, consi-derando-a incompatível com o espírito de um povo conquistador. A grande massa afluía às enormes “arenas” (por exemplo, o Coliseu e o Circus Maximus) para ver gladiadores, lutas com animais ferozes, etc. A Rômulo, juntamente com Remo, fundador de Roma, atribui-se a bellicrepa, dança bélica que simboliza o rapto das sabi-

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nas. Com a penetração da cultura grega (a partir de 146 a.C.) apareceram também os bailarinos profissionais. (...) esses profissionais faziam ponto nas lojas, onde davam aulas de dança e de canto. (...) Com o afrouxamento dos costumes, a partir do imperador Nero (54 a 68 da era cristã), as danças se tornaram cada vez mais imorais, o que provoca as palavras de Cícero: “Nemo fere saltata sobrius” (O homem sóbrio não dança).

Assim, foi-se a dança, a arte e o próprio Império Romano, como se observa nas afirmações de Ramos (1982, p. 151),

Desde os últimos Césares, os romanos foram perdendo as suas características guerreiras, adotando o luxo oriental e os prazeres do circo, onde imperavam o espetáculo sangrento e a morte. Grandes banquetes, transformados em orgias, eram acompanhados de danças sensuais. As legiões perdem a disciplina e já não sabem suportar o sofrimento. O povo vê desaparecer sua força vital e seu poder criador. O Cristianismo lança desconfiança sobre as antigas instituições. Finalmente, numerosas tribos germânicas, pertencentes a povos denominados bárbaros pelos romanos, arrasam o antigo e poderoso Império, destruindo sua força e seu orgulho. O ano de 476 d.C. (...) marca a queda do Império Romano.

“Com a expansão do cristianismo soou a última hora do teatro romano dos mimos” (SALAZAR, 1949, p. 49) e, era também, o fim de muitas outras formas de comemoração, de festas, de danças, de celebração e o início do período que trazia o obscurantismo religioso.

DANÇA NA IDADE MÉDIA

Na Idade Média (476 a 1453), a dança, como todos os outros movimentos artísticos, sofreu um retrocesso.

A dança foi proibida pela Igreja, porque toda manifestação corporal como expressão, segundo o Cristianismo, era pecado, assim como seus registros, mas os camponeses, de forma oculta, continuaram executando suas danças que saudavam suas crenças e manifestações populares.

No ano de 774, o papa Zacarias elaborou um decreto contra a dança carola, praticada por um grupo de dançarinos de mãos dadas e em círculos, por

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Dança na Escola

apresentar movimentos indecentes; o concílio de Avignon, em 1209, também fez um decreto que, quando houvesse a vigília dos Santos, não poderia haver espetáculos de danças ou carolas nas Igrejas. (BOURCIER, 2006)

A Idade Média, chamada de “Idade das Trevas” pelos humanistas do Renascimento, foi um período contraditório para a dança porque, com a auto-ridade da Igreja, todas as manifestações corporais foram proibidas e os teatros fechados e usados apenas para festas religiosas.

Como nos afirma Bourcier (2006, p. 51),

(...) apesar de algumas exceções, as condenações eclesiás-ticas atingiram seu objetivo; a dança não foi integrada à liturgia católica. Esta recusa é ainda mais notável pelo fato de, em muitos casos, os trajes e até os lugares de culto pagão terem sido assimilados sem dificuldade. Sem dúvida, o recurso obrigatório ao corpo e a seus poderes pouco controláveis é o motivo do ostracismo especial que se abateu sobre a dança.

Como os camponeses continuaram a fazer suas festas nas épocas de semeadura e colheita e no início da primavera, para não afrontarem a Igreja, camuflavam as danças com a introdução de personagens como anjos e santos para que a Santa Inquisição não as visse como práticas contraditórias aos preceitos divinos. (PORTINARI, 1989)

Em relação à dança, a atitude da Igreja foi dúbia: con-denação por um lado, tolerância por outro. São Basí-lio de Cesaréia considerou-a a mais nobre atividade dos anjos, enquanto Santo Agostinho qualificou-a de pecado grave. Entre esses dois extremos, a autoridade clerical variou, levando em conta o momento e o local. No púlpito, os pregadores narravam o martírio de São João Batista decorrente da sedutora dança de Salomé. Os fiéis se horrorizavam, mas continuavam dançando. (PORTINARI, 1989, p. 51)

As pessoas dançavam a carola (dança de roda, fechada ou aberta, na qual os participantes davam as mãos ou seguravam-se pelo antebraço) e o tripudium (dança em três tempos em que os participantes não se tocavam). Essas danças eram executadas ao som de cantos gregorianos e ritmadas com tambores e tamborins.

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A carola e o tripudium eram dançados por qualquer pessoa em ocasiões não religiosas, representando uma dança popular e livre que significava comu-nhão porque era dançada em grupos, rodas ou fileiras. (BOURCIER, 2006)

As camadas mais privilegiadas, para se diferenciarem da carola e do tripudium, inventaram uma dança mais rica, em que o corpo acompanhava uma métrica musical que mudava a todo instante, a beleza das formas era ressaltada e a estética vista como organização dos movimentos. “A dança é um bom indicador do nível de civilização”. (BOURCIER, 2006, p. 52)

Após inúmeras tentativas de proibição, a Igreja sentiu a necessidade de tolerar as danças populares e dos camponeses, considerando-as como manifes-tações pagãs, uma vez que não conseguiu extingui-las.

Depois de um tempo, a dança reapareceu dentro dos palácios com intuito de pura diversão, dando origem à dança erudita, provendo o distanciamento da dança popular, ou, nas palavras de Bourcier (2006, p. 54),

Cabe à dança popular manifestar sentimentos confusos, fortes – a alegria, a inquietude – e manter ritos, cujo sentido original foi perdido, através de movimentos não sujeitos a regras. É o domínio do rondel, da carola e de seus derivados, das danças em fileira de qualquer natu-reza, cujo tempo e cujos passos, escorregados, corridos ou saltados, são livres. São danças de grupo em que os participantes confirmam sua comunhão segurando-se pelas mãos ou antebraços. Ao contrário, no contexto fixo da música e da poesia, as danças ‘metrificadas’ serão exercícios em que se exige, antes de mais nada, a beleza das formas; serão as danças das classes desenvolvidas culturalmente, das classes dominantes.

Séculos XI e XII

Nessa época, a Europa foi marcada pela peste negra (1346) e outras doenças epidêmicas, causando a morte de muitas pessoas, além da guerra dos 100 anos, que teve início em 1337 e seu fim em 1453.

Em função desse acontecimento, a dança era desenvolvida com movi-mentos intensos e frenéticos como uma tentativa de espantar a morte, por isso foi rotulada como a dança macabra ou dança da morte. (BOURCIER, 2006)

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Dança na Escola

A carola, dança da alegria, tornou-se uma dança macabra, muitas vezes, dançada em cemitérios para mostrar que a vida é uma carola conduzida pela morte, transformando a morte em um motivo para se viver de acordo com os dogmas e regras católicos. (BOURCIER, 2006)

As manifestações teatrais moralistas abordavam o Antigo e o Novo Testamento como a vida dos santos, aparições e milagres e eram feitas pela Igreja sempre com base em flagelos de Deus pela peste enviada, castigos e remissões de pecados.

A Igreja considerava todos iguais mediante à morte e utilizava-se das danças macabras para submissão do ser humano e preservação de seus preceitos cristãos.

Surge um novo gênero de dança, o momo, espécie de carola burlesca, em que os participantes dançavam mascarados e disfarçados. Esse gênero de dança serviu como base do futuro ballet-teatro e também foi incorporada às cristãs inclusive dentro das igrejas. (BOURCIER, 2006)

A Idade Média também teve o seu lado luminoso e requintado, refletindo importantes transformações polí-ticas e sociais que ocorrem sobretudo a partir do século XII. Esse requinte se expressa na arquitetura gótica, em suntuosas tapeçarias, na pintura de um Cimbaue, de um Giotto, em obras literárias como o Roman de la Rose e a Divina Comédia. (PORTINARI, 1989, p. 53)

Séculos XIII e XIV

Nesse período, a arte ainda reflete uma forte inspiração religiosa vista na pintura, tapeçarias, arquitetura gótica e literatura como a Divina Comédia de Dante Alighieri (1265-1321).

Por outro lado, a arte dos trovadores, menestréis e jograis, que acontecia nas ruas, entra nos castelos medievais para alegrar as festas.

Esses artistas ensinam à nobreza uma dança lenta e solene, a basse dance, assim denominada por causa dos pés que eram mantidos no chão e dos trajes pesados usados pelas castelãs, diferentes das roupas usadas pelas camponesas, que lhes possibilitavam mais mobilidade nos movimentos como pular, rodopiar e dan-çar a haute dance, em que os pés eram levantados do chão. (PORTINARI, 1989)

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A partir da dança basse dance, cuja origem vem dos camponeses, surgem as primeiras bases para o balé, difundidas pelos artistas nos castelos medievais.

Entre as diversas danças executadas pela corte na Idade Média está a polonaise, originada das danças de camponeses poloneses, que aconteciam, muitas vezes, na frente das igrejas.

É uma dança lenta, dançada por casais que andam pelo salão, como se estivessem em uma procissão, ao som de uma música que é sempre em compasso ternário e lento. O caráter nobre dessa dança ocorre com a postura dos casais que mantém a posição da cabeça erguida, demostrando dignidade e orgulho. Mais tarde, no século XIX, essa dança foi inserida em alguns balés. (PORTINARI, 1989)

Estudos comprovam que a rigorosa divisão de classes presente na Idade Média, bem como a gerência das atividades corporais fez nascer quatro distintas categorias de dança: “campestres (geralmente de roda cantada ou de saltos); de artesãos; burguesas e eróticas e da corte e da nobreza (lentas e disciplinadas)”. (ELLMERICH, 1987, p. 20)

Com o fim do obscurantismo religioso, fruto da pulverização das dou-trinas religiosas, a sociedade se transforma e faz ressurgir o interesse pela Arte, pela Ciência e pelo ser humano como o centro do universo (Antropocentrismo).

DANÇA NA IDADE MODERNA

A. Renascimento

O Renascimento foi um movimento que surgiu na Itália, mais espe-cificamente em Florença, em meados do século XV, e se espalhou por toda a Europa Ocidental, aproximadamente, a partir de 1400.

Refletiu uma sociedade que buscava retomar as formas clássicas de artes greco-romanas (classicismo), de ideal humanista (racionalismo, cientificismo e individualismo) e com alicerce no Antropocentrismo (o homem como o centro da existência) em oposição ao Teocentrismo (doutrina que defendia a ideia de que Deus era o centro de tudo o que existe), presente na Idade Média.

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Dança na Escola

Considerando o desenvolvimento dos aspectos artísticos, essa fase foi dividida em três períodos: Trecento (século XIV), Quatroccento (século XV) e Cinquecento (século XIV).

Com o Renascimento, a dança passa a ser codificada por mestres a serviço das cortes. Tal como as outras artes, ela recebe regras conforme o gosto reinante. O culto aos valo-res da Antiguidade e as ideias dos humanistas expressam um conceito de beleza em que o corpo e espírito devem formar um todo harmonioso. Ao contrário do que ocorria na Idade Média, o homem já não se vê como mero objeto dos desígnios divinos. Sente-se parte da natureza sobre a qual pode agir. Tudo deve ser repensado e o próprio jogo do poder que é a política passa a ser encarda como uma arte. (PORTINARI, 1989, p. 56)

Percebe-se que, ao longo do século XV até o século XVII, o desenvol-vimento do balé da corte por toda a Europa, em especial na Itália, na França e depois no leste europeu, é exponencial. Consta que “as fontes do Renascimento manifestam-se desde meados do século XIV, irradiando-se da Itália para o resto da Europa ao longo de duzentos anos”. (PORTINARI, 1989, p. 56)

Segundo Ellmerich (1987, p. 125),

a primeira notícia existente sobre a apresentação de um balé é de 1489; tratava-se de um bailado organizado por Bergonzo de Botta para as festas de casamento do duque Galeazzo Sforza, de Milão, com Isabel de Aragón, em Tortona.

A palavra balé é de origem latina, pois vem de ballator, e a primeira definição que se tem é baseada nas contribuições de Baldassarino Belgiojoso (violinista piomontês) que chega à França, em 1555, com um grupo de artistas para diversas apresentações. Ele assim disse: “um arranjo geométrico de muitas pessoas juntas sob a variada harmonia de diversos instrumentos”. (ELLME-RICH, 1987, p. 126)

A definição mais clara de balé é do maestro Bastiano di Rossi, quando disse, em 1585: “Entende-se por balé uma ação pantomímica com música e dança”. (ELLMERICH, 1987, p. 126)

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Muitos foram os espetáculos de balé, que aconteceram em vários festejos das sociedades nobres da época, pois “o objetivo fundamental desses balés da corte é o de deslumbrar amigos e inimigos; o fausto e o exagerado custo devem demonstrar o alto nível artístico e a solidez do erário público”. (ELLMERICH, 1987, p. 126)

Havia, nesse formato de dança, um contexto amplo de passos, música, versos e representações e “no tocante à técnica propriamente dita, havia uma mistura do virtuosismo italiano com a finesse francesa”. (PORTINARI, 1989, p. 62). Na França, é que esse estilo de dança conseguiu seu apogeu.

Destaque para Luís XIV, que reinou de 1643 a 1715 na França, e parti-cipou de vários balés, sendo conhecido por Rei Sol, pela sua personificação do Sol, com traje magnífico, com plumas brancas, no bailado Le ballet de la nuit.

Ele foi um defensor e patrocinador da arte, em especial do balé, criando, em 1661, a Académie Royale de la Danse e, em 1669, a Académie Royale de Musique, dotada de escola de dança (o que se tornaria no futuro a Ópera de Paris). (PORTINARI, 1989)

Mesmo com seus modos autoritários, de regras rígidas, costumes e etiquetas codificadas, como expressões faciais e sorrisos determinados, Luís XIV aglomerou ao seu redor figuras ilustres da dança e da música, como Pierre Beauchamp, “cujo papel foi fundamental para estabelecer as regras do ballet. (...) Entre 1669 1700, fixa as cinco posições do ballet tal como são seguidas até hoje. (...) Nesse ambiente artificial, o ballet floresceu. Após sua morte, em 1715, o gênero entrou em declínio”. (PORTINARI, 1989, pp. 67-68-69)

Com a narrativa dessa evolução da dança, em especial do balé da corte, nosso olhar se volta para além do renascimento, movimento renovador específico, destacando o período completo denominado Idade Moderna, quando diz que

A idade Moderna se iniciara em 1453 e se encerra em 1789 com a Revolução Francesa, marcou a transição da dança de diversão aristocrática para uma forma teatral. Dos trionfi renascentistas ao apogeu do ballet de corte com Luís XIV, ela se diversifica e recebe normas. Os mestres já não se limitam a ensinar à nobreza. Lecionam em academias abertas a alunos das mais diferentes origens sociais. O apuro técnico que lhes é exigido assinala a alvorada do profissionalismo. (PORTINARI, 1989, p. 69)

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Dança na Escola

Séculos XVI ao XVIII

Em todo o período da Idade Moderna, o que imperou no ballet foi a figura masculina. Mesmo quando Luís XIV oficializa a criação de uma com-panhia de dança permanente (o que denota o profissionalismo na dança), com dez homens e dez mulheres (o que já foi um ganho muito grande), ficou estipulado que os homens deviam ganhar mais que as mulheres (o que ainda acontece, atualmente, em muitos casos). “Embora a supremacia técnica ainda fosse masculina, a concorrência feminina já se manifesta, sobretudo a partir de 1720. Surgem diversas bailarinas capazes de se aventurar por proezas que até então eram monopólio dos seus parceiros”. (PORTINARI, 1989, p. 71)

Entre tantas figuras femininas nesse universo de rivalidade, que se insta-lou no ballet profissional, duas merecem destaques: La Camargo e Marie Sallé, pois até “Voltaire iria registrar o talento de ambas, bem como a rivalidade, num pequeno poema: (PORTINARI. 1989, p. 710, tradução das autoras)

Ah, Camargo, como você é brilhante! Mas aquela Sallé, grandes deuses, está revivendo! Que seus passos são leves e os dela suaves; Ela é inimitável e você é nova: As ninfas saltam como você. Mas as Graças dançam como ela.

As grandes transformações ocorridas na sociedade no século XVIII, tais como, liberdade de expressão, luta por igualdade de direitos, entre outros, também se refletiram nas linguagens da arte e não foi diferente com a dança.

Um expoente dessa luta foi Jean Georges Noverre (1727–1810), que sempre se colocou contra o formalismo acadêmico que predominava no balé profissional da época (utilização de máscara, escondendo a expressão facial; trajes pesados que limitavam os movimentos, entre outros aspectos). Ele acreditava numa dança expressiva, que traduzisse o que o ser humano tinha no seu interior e não uma dança mecanizada, robótica e artificial. E assim, “por lutar constan-temente contra as concepções do seu meio profissional provocou ao seu redor uma reação negativa, que não permitiu fluir a grandeza de suas contribuições: a alma é a expressão na dança”. (GAIO, 2007, p. 35)

Mesmo não sendo valorizado como merecia, suas contribuições e novas ideias (dança de ação) vão provocar transformações na dança (introdução do realismo na dança), lentamente, à medida que novas formas de fazer dança são

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incorporadas, como sapatos mais baixos (até chegarem as sapatilhas), roupas leves e curtas (até chegar o tutu) e a exploração das expressões faciais, uma vez que as máscaras e as perucas foram abolidas. Ele criou uma verdadeira “doutrina de contestação”. (BOURCIER, 2006, p. 170)

A dança evolui, após tantas denúncias, e “pouco a pouco começava-se buscar a expressividade, a poesia do corpo, a fluidez dos gestos, por exemplo, no porte de braços”. (BOUCIER, 2006, p. 201)

O ser humano se transforma e transforma a dança e, assim, o romantismo surge, no balé, em 1832, mais tarde do que em outras linguagens da arte. “Uma grande novidade caracteriza a técnica romântica: as pontas”. (BOURCIER, 2006, p.201)

Dança nos séculos XIX e XX

No final do século XVIII e início do século XIX, após a Revolução Francesa (1789-1795) que provocou mudanças profundas na forma de ser e estar dos povos europeus, imbuídos dos ideias de liberdade, o ballet romântico entra em cena (como abandono de regras rígidas e comportamentos codificados, advindos do classicismo).

A valsa reinou nos salões e bailes populares do século XIX. Altezas e midinettes entregaram-se ao seu ritmo inebriante com rodopios vertiginosos. (...) Na socie-dade e no palco, a vitória da valsa deveu-se a profundas transformações de comportamento. A rígida etiqueta da corte de Luís XIV impediria que um homem enlaçasse uma mulher pela cintura e saísse rodopiando com ela no salão. Mas o tempo era outro. (PORTINARI, 1989, p. 83)

Os estudiosos salientam que, apesar de o romantismo ter uma fecunda raiz germânica e se expandido fortemente na Inglaterra, a França foi o lugar de maior destaque. No romantismo, a palavra de ordem era comoção, e os/as autores/as e bailarinos/as faziam aflorar os sentimentos.

O que se inaugura nesse período são os balés de repertório (obras român-ticas e neorromânticas), porém há uma constatação que não pode ficar sem reflexão: a participação diferenciada de homens e mulheres na dança nesse período de grande significado artístico e expressivo.

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Dança na Escola

Consta que “a consequência negativa do período romântico, centrado em divas, foi colocar o homem como figura secundária no ballet. Assim, o bailarino, relegado a suporte da parceira, precisará esperar o apogeu da escola russa para recuperar seu lugar no sol”. (PORTINARI, 1989, p. 95)

Entre os bailados mais famosos está Giselle, apresentado, pela primeira vez, em Paris, no ano de 1841, tendo Carlota Grisi, como protagonista. A repre-sentação se passa às margens do Reno e conta a história de um amor proibido, da camponesa pelo rico fazendeiro, que, por inocência e desconhecimento, repele o amor sincero e verdadeiro do caçador. Gisele morre de decepção após uma dança frenética. Essa estreia marcou o apogeu do romantismo na dança e muitas evoluções puderam ser vistas e sentidas: imaginação e engenhosidades inauguradas no cenário sublinhavam o clima irreal; no segundo ato, a sapatilha de ponta passa ser comum para o conjunto, pois todas as bailarinas dançaram no segundo ato sobre as pontas (antes somente a solista fizera essa proeza); a alta qualidade da música contribuiu para que Giselle se tornasse imortal; entre outros aspectos. Giselle permaneceu, como repertório, na Ópera de Paris até 1968. (PORTINARI, 1989)

Vários acontecimentos levam à decadência o balé na França, mas, em contrapartida, há o fortalecimento da Escola Russa, que, no início, desenvolveu-se a partir da ocidentalização, porém se estabeleceu com características próprias no início do século XIX até os dias atuais. Consta que o magnífico Bolshoi se originou por meio de um trabalho com 64 crianças de um orfanato e, após três anos, esses humildes bailarinos já se apresentavam com maestria e com muita técnica. (PORTINARI, 1989)

Já no século XX, após revolução de 1917, com o retorno da capital para Moscou, o Bolshoi adquire projeção mundial, que perdura até os dias de hoje. (PORTINARI, 1989)

A matéria-prima do ballet, com seus passos e posições, é a mesma em qualquer parte do mundo. No entanto, não resta dúvida de que os russos souberam injetar-lhe um novo vigor desde meados do século XIX. (PORTI-NARI, 1989, p. 102)

O século XX foi um período de muitos acontecimentos, grandes transfor-mações, incertezas, imensos avanços, turbilhão de novas ideias e conhecimentos

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científicos. Há um expoente desenvolvimento tecnológico, duas guerras mundiais e, com isso, grandes mudanças planetárias.

A dança evolui pari passo com a evolução humana, em meio a tantos acontecimentos que marcaram, definitivamente, a humanidade. Assim, nasce a dança moderna, pela contestação e rejeição ao academicismo artificial do balé clássico.

Nas palavras de Portinari (1989, p. 133), temos:

tomando por base a liberdade expressiva do corpo, a dança moderna reflete o contexto histórico que a gerou: a de um mundo governado por máquinas, no qual o ser humano se debate em busca de novas relações consigo mesmo e com a sociedade.

Vários são os precursores da dança moderna, entre eles, o francês François Delsarte (1811-1871), as norte-americanas Geneviéve Stebbins (1857-1914), Isadora Duncan (1878-1929) e Martha Graham (1894-1991), o suíço Émile Jacques Dalcroze (1865-1950), o alemão Rudolf Von Laban (1879-1958) e a alemã Mary Wigman (1886-1973), entre outros/as.

François Delsarte teve uma infância comprometida, primeiramente, pela morte precoce do seu pai quando tinha somente 6 anos e, depois, quando, em Paris, falecem sua mãe e seu irmão, ficando ele sozinho, sem recursos, morando na rua, subsistindo de restos de comida encontrados no lixo. Quando já tinha mais idade e trabalhava como aprendiz de pintor de porcelana, o padre italiano Bambini contribui com sua formação, matriculando-o num conservatório para canto, mas, em função de um problema de saúde, especificamente com a voz, ele vai se encontrar no teatro, pois negava a dança, apesar do seu trabalho ser a grande inspiração da dança moderna. (BOURCIER, 2006)

A situação negativa em que Delsarte se encontrou o motivou a investigar a relação entre voz, gesto e emoção na cena, movido pelo pensamento de que a linguagem gestual corporal, em sua capacidade de expressar o âmago do homem, seria suprema dentre todas as linguagens artísticas. Desejoso de combater o direcionamento que o Conservatório de Paris tomava no ensino de jovens artistas, o qual considerava idiossincrático e prejudicial, passou a encarar como missão de vida a tarefa de desvelar

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Dança na Escola

as grandes leis universais da expressividade dos corpos, bem como os princípios gerais de aplicação dessas leis na expressividade das obras em diversas linguagens artísticas (SHAWN, 1963 apud SOUZA, 2012, p. 430).

Nas palavras de Souza (2012, p. 446),

Apesar de ter sido um grande investigador da linguagem gestual, Delsarte não se interessou pela dança. Conside-rava-a uma arte menor, a qual, corporalmente mecani-zada, se constituía de artifícios meramente técnicos e de maneirismos da forma. Tal repugnância pode ser mais bem compreendida quando se tem o esclarecimento de que Delsarte se referia ao balé clássico e às danças acrobáticas dos shows de variedades que, em sua época, eram as manifestações cênicas na linguagem da dança que estavam em voga. Identificando uma ausência de expressão genuína nesses gêneros de dança, ele negava essa arte. Considerava intolerável a reprodução tecnicista de procedimentos. (...). Acontece que, mesmo tendo negado a dança, Delsarte foi a grande inspiração da dança moderna, pois suas ideias e leis do movimento possibilitaram aos precursores da dança moderna um instrumental rico para a exploração de novas expressi-vidades corporais.

Como Delsarte não se interessava pela dança, foram seus discípulos que, na verdade, criaram ou recriaram seu método voltado para essa linguagem da arte. Uma delas foi a norte-americana Geneviève Stebbins que se destacou no delsartismo, inclusive tendo criado uma escola por onde passaram muitos/as alunos/as. “A maior inovação que coube a ela foi a exploração e estilização de movimentos articulares sucessivos em trajetórias espiraladas, podendo ser considerada, de acordo com Ruyter, a verdadeira precursora da dança moderna. (SOUZA, 2012, p. 447) Entre os/as diversos/as alunos/as, Isadora Duncan ficou conhecida como a bailarina dos pés descalços, apesar de ter sido uma prática já realizada por Stebbins.

O estudo que Stebbins empreendeu das esculturas clás-sicas do Louvre a fim de compreender a manifestação das leis delsarteanas no gestual expressivo humano – que era algo tomado como meta pelos autênticos delsartis-tas – foi também realizado por Duncan e muitas outras

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dançarinas contemporâneas a ela. Stebbins costumava dançar descalça e desenvolveu sequências de movimentos que bem poderiam ser considerados passos de dança criados a partir de uma adaptação da prática delsarteana. (RUYTER, 1996 apud SOUZA, 2012).

A partir das recomendações de Geneviève Stebbins, Isadora Duncan buscava nas imagens presentes nos vasos gregos ou nas estátuas suas inspira-ções. Era estimulada também pelos fenômenos da natureza, como as ondas, as nuvens, o vento, entre outros, tinha, como referencial para seus pensamentos, Shopenhauer e Nietzsche e considerava a dança como o resultado de uma movimentação interna. E assim, dançava Geneviève Stebbins: “Túnica, ‘a antiga’, descalça, dança diante de uma cortina de fundo para tornar seus gestos mais legíveis”. (BOURCIER, 2006, 248)

Isadora Duncan ficou a maior parte da sua vida na Europa, retornando algumas vezes aos Estados Unidos e viajando para outros lugares, como sua mais notável viagem que foi para a União Soviética em 1921.

Alguns acontecimentos trágicos marcam sua existência, para além da arte, como a morte dos seus dois filhos, afogados no Sena, em 1923, e o suicídio do poeta Serge Essenine, com quem foi casada, quando esteve em Moscou, mas não conseguiu visto para que voltasse com ela aos Estados Unidos. “A própria Isadora morrerá tragicamente, em 1927, estrangulada pela sua echarpe que ficara presa na roda do automóvel Bugatti em que passeava. Antes da sua morte, escrevera suas memórias, My life”. (BOURCIER, 2006, p. 250)

Já Martha Graham traz outro referencial para a dança moderna, pois, como ela mesma dizia: “não aguento mais dançar divindades hindus ou ritos astecas. Quero tratar dos problemas atuais”. (BOURCIER, 2006, p. 274)

Graham rejeitava a dança de Isadora Duncan, pois não tinha interesse em ver os corpos em imitações de gestos do cotidiano ou seres de outro mundo, mas entendia que “o homem é a finalidade da ação coreográfica, o homem confrontado com os problemas da sociedade atual, com os grandes problemas permanentes da humanidade”. (BOURCIER, 2006, p. 274)

O austríaco por nascimento e suíço por naturalidade, Émile Jacques Dalcroze, foi um investigador da música e do movimento, criou seu método denominado Euritimia (coordenação musical com os movimentos corporais) e

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Dança na Escola

contribuiu com a evolução tanto da dança como da ginástica. Seu método nasceu de observações realizadas em suas aulas de música, tais como, os/as alunos/as não conseguiam manter o andamento rítmico; não há educação rítmica somente a partir do desenvolvimento auditivo, há a necessidade do trabalho corporal, entre outras. (LANGLADE; LANGALDE, 1970)

Sua maior contribuição está na constatação de que “a música suscita no cérebro uma imagem que, por sua vez, impulsiona o movimento, que se torna expres-sivo caso a música tenha sido captada corretamente”. (BOURCIER, 2006, p. 291)

O propósito da Rítmica é colocar seus seguidores, ao final dos estudos, na situação de poderem dizer: ‘Eu sinto’ ao invés de ‘Eu sei’; e, principalmente, despertar neles o desejo urgente de se expressar, após terem desenvolvido suas faculdades emocionais e sua imaginação criadora. (DALCROZE apud COMPAGNON; THOMET, 1966, p.0, tradução das autoras)

O alemão Rudolf Von Laban, filho de oficial, deixou o exército para estu-dar na escola de Belas-Artes de Paris e se tornou um dos maiores pesquisadores do movimento, em especial, na dança. Criou um método de notação de dança (sistema de símbolos e abreviações), denominado Labonotation (Labanotação), em 1926. Segundo Bourcier, 2001, p. 294) os princípios básicos desse método são: “dividir o espaço em três níveis (vertical, horizontal e axial) sobre os quais se inscrevem doze direções de movimentos. Em resumo, uma esfera com pontos de tangência: um icosaedro”.

Em relação a Laban, é importante observar que ele, assim como Jaques-Dalcroze e Delsarte, tinha um perfil de investigador e fora também influenciado pelo cientifi-cismo da época, que contagiava os estudiosos artísticos e os orientava na elaboração de sistemas teóricos complexos e métodos inovadores. Delsarte foi altamente científico em seus procedimentos investigativos; Jaques-Dalcroze também; Laban também. O senso de observação, assim como em Delsarte e em Dalcroze, também era aguçado em Laban, de modo que suas observações relacionadas ao modo de andar das pessoas, de se portar e de se movi-mentar durante o trabalho ofereceu a ele uma base sobre a qual pôde começar a desenvolver perguntas e problemas relacionados ao movimento. (SOUZA, 2012, p. 450)

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Mary Wigman estudou literatura e canto, antes de se interessar pela dança. Viveu tempos difíceis, como as duas guerras mundiais, sendo que, na segunda, teve sua escola, em Dresden, fechada, em 1940, pois os nazistas consideravam seu trabalho como arte degenerada. Nesse período, ficou longe da dança e tra-balhou com música, porém, com o fim da guerra, em 1945, abriu outra escola, na Berlim Ocidental, e retomou sua atividade de coreógrafa e professora de dança.

Sua arte foi considerada degenerada em função dos “dois polos de sua arte: o desespero e a revolta. Sua visão trágica de uma existência efêmera é mostrada por um expressionismo violento”. (BOURCIER, 2006, p. 296)

Seu trabalho, até certo ponto, tem influências de Dalcroze e Laban, pois do primeiro foi aluna e do segundo foi aluna e assistente, porém não se limitou a propagar métodos aprendidos; como criadora, rompeu com as ideias já absorvidas e produziu seu próprio trabalho. Para ela, a dança não tinha o intuito de contar uma história, por isso não apresentava narrativas em suas coreografias, como outros pioneiros da dança moderna, o que levou os nazistas a considerarem uma arte perigosa. (PORTINARI, 1989)

Como exemplo de um trabalho diferente, daqueles que a influenciaram, Portinari (1989, p. 144) nos apresenta:

(...) rejeitava a utilização interpretativa da música, jul-gando-a outro modo de sujeição. Dizia que a música não podia preexistir à dança e que por isso o trabalho do compositor e do coreógrafo devia realizar-se ao mesmo tempo. Sendo tal colaboração rara e complicada, ela frequentemente coreografou sem música, servindo-se do ritmo marcado por pés descalços ou por pequenos conjuntos de percussão. Tal despojamento enfatizava ainda mais o caráter trágico da arte.

Dança no século XXI

Há hoje em dia, há um leque muito grande de movimentos expressivos, formas diversas de os corpos dançarem, comunicarem-se e expressarem ideias, emoções, sentidos e sentimentos.

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Dança na Escola

O ser humano se modificou, ao mesmo tempo, que continuou o mesmo. Assim, existem danças de características primitivas e clássicas, como também, modernas e pós-modernas.

O diagrama abaixo, elaborado por Jacqueline Robinson (1978), traz a pluralidade da dança no mundo contemporâneo.

Os troncos traduzem os sentidos que foram dando origem aos diversos tipos de dança, apresentadas como fruto de desejos e emoções humanas ao longo dos anos de existência.

Fonte: Robison (1978)

Atualmente, as possibilidades foram ampliadas, porque o ser humano sempre se reinventa e outras formas de danças aparecem, como nos fala Stra-zzacappa (2001, p. 73),

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Numa tentativa de atualizar esta árvore, poderíamos acrescentar muitas outras danças: Algumas danças populares brasileiras, como o forró, o samba, a lambada e recentemente o axé, que também conquistaram os espaços dos cursos de dança de salão ao lado das imortais valsa, tango e bolero. As danças provenientes de regiões e países específicos, como a dança do ventre, a dança flamenca, o sapateado americano e irlandês (tão em voga atualmente) e as danças de rua (ou street dance), poderiam ser introduzidas como um galho que se inicia nas expressões culturais (folclóricas) e se ramifica tanto para o campo profissional do espetáculo, quanto para a área de recreação (amadora). Um bom exemplo são as danças de rua. Elas tiveram origem nos guetos negros norte-americanos, como forma de protesto, e ganharam adeptos no mundo todo. Como o rap, o funk e o break, muitas dessas danças já saíram das ruas e invadiram as academias e palcos teatrais.

Portanto, o/a professor/a tem muito a apresentar para os/as alunos/as, lembrando que o conhecimento não deve ser uma exposição linear, mas o rele-vante é desenvolver o conteúdo, a partir de uma metodologia ativa (incentivar o protagonismo no ensino-aprendizagem da dança), na qual a problematização ou a indicação de tarefas pode sugerir caminhos, com o intuito de, não só descobrir, mas se ver na história, tendo a dança como referencial de análise.

DICAS PARA UM TRABALHO COM A HISTÓRIA DA DANÇA NA ESCOLA

O que queremos, neste espaço do texto, é apresentar algumas propos-tas pedagógicas, como exemplos, dicas e não como uma receita fechada a ser seguida na íntegra.

São sugestões que nasceram do nosso cotidiano universitário no traba-lho como componentes curriculares de Educação e linguagem: arte, corpo e movimento, no curso de Pedagogia, e de Dança, no curso de Educação Física.

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Dança na Escola

Dança na Educação Infantil

A Base Nacional Comum Curricular, a conhecida BNCC, destaca que o período da Educação Infantil atente as crianças de 0 a 5 anos de idade, a partir das concepções de educar e de cuidar, como ações indissociáveis.

Para que as crianças possam aprender, o documento apresenta seis direi-tos de aprendizagem e desenvolvimento (conviver, brincar, participar, explorar, expressar e conhecer-se) e a organização curricular para esse período está estru-turada em cinco campos de experiências: o eu, o outro e o nós; corpo, gestos e movimentos; traços, sons, cores e formas; escuta, fala, pensamento e imaginação e espaços, tempos, quantidades, relações e transformações. (BRASIL, 2017)

A dança pode ser inserida em diversos campos de experiências, entre eles, corpo, gestos e movimentos, e a história da dança pode aparecer como questões e não como respostas, como estímulo às descobertas e não respostas prontas, determinadas em narrativas lineares, inclusive pode-se solicitar às crianças para verificarem como seus pais, avós, tios, tias e até conhecidos/as gostam de dançar, como, quando e o quanto dançam. Depois em um ambiente lúdico, em que a brincadeira pode ser “dançando como” – as crianças possam contar e imitar as danças que descobriram existir na sua casa e arredores.

Dança no Ensino Fundamental

Nesse período escolar, os componentes curriculares de Arte e de Educação Física estão inseridos na área de conhecimento das Linguagens, juntamente com Língua Portuguesa e Inglesa.

Em relação às séries iniciais, temos:

participar de práticas de linguagem diversificadas, que lhes permitam ampliar suas capacidades expressivas em manifestações artísticas, corporais e linguísticas, como também seus conhecimentos sobre essas linguagens, em continuidade às experiências vividas na Educação Infantil. (BRASIL, 2017, p. 59)

Já para as séries finais solicita-se um aprofundamento dos conteúdos aprendidos, inicialmente, considerando que “a diversificação dos contextos

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permite o aprofundamento de práticas de linguagem artísticas, corporais e lin-guísticas que se constituem e constituem a vida social”. (BRASIL, 2017, p. 59)

Nossa sugestão é a elaboração e efetivação de um projeto interdisciplinar com a temática “Viajando pela história da dança”, envolvendo diversos compo-nentes curriculares, além de Arte e Educação Física, como conhecimentos das Ciências Humanas, História e Geografia.

Pode-se dividir por período histórico, por localização geográfica ou estilos de dança. Trazer o Brasil como referencial, sua cultura mestiça e as diversas danças aqui existentes e que também chegaram, sejam de influências europeias, norte-americanas ou outras.

O importante é trazer o universo da dança para a escola e mostrar para os/as alunos/as que o corpo fala, para além das palavras, expressa sentimentos, características e necessidades, que se modificam de acordo com o tempo, espaço e realidades social, econômica, política, cultural e outras.

Dança é comunicação direta. Dispensa o jogo tantas vezes dúbio da palavra. Por isso também entra agora nos métodos mais modernos de terapia. (...) Hoje a dança em todas as suas formas atrai multidões. (...) Além disso, todos querem dançar. A proliferação das academias é fenômeno mundial. Dança-se por prazer, para emagrecer, corrigir postura, aliviar tensão, sacudir recalques. O Brasil entrou em cheio na dançomania desde a década de 70. Sociólogos e psicólogos interpretam o fato segundo instrumental das teorias. Já se disse que a dança contesta a ditadura, canaliza a agressividade, traduz a conscien-tização do corpo, incrementa o descompromisso sexual, anestesia o pessimismo provocado pela inflação. Seja pelo que for, ela integra a nossa sociedade. Gosta-se cada vez mais de dançar e consome-se dança cada vez mais. (PORTINARI, 1985, pp. 11-12)

Dança no Ensino Médio

Esse período escolar é o mais preocupante, quando se refere à discussão sobre a relevância da arte na escola, porém os documentos não mostram a mesma preocupação. Sabemos do interesse do governo atual de um ensino mais técnico, o que discordamos, pois é fundamental para os adolescentes os momentos de

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Dança na Escola

reflexão sobre a realidade social, e esse é um dos papéis do trabalho com as linguagens artísticas.

Em função disso, nossa sugestão é um trabalho com o Movimento Hip Hop, que aconteceu no século XX, mais especificamente, na década de 70, no Bronx, um agitado bairro e em outros subúrbios de Nova York, como Brooklyn e Harlem. Envolvidos com esse movimento estavam os/as professores/as, artistas, cantores/as e outros/as, que lutavam pela valorização e respeito pela cultura afro-americana.

O hip-hop nasceu das festas organizadas por Kool-Herc e Grand Master Flash, mas não foram os DJs os respon-sáveis pelo seu surgimento e sim o afro-estadunidense Kevin Donovan. Frequentador das festas organizadas pelos DJs, Donovan trocou sua gangue pela arte de rua e seu nome por Afrika Bambaataa. (POSTALI, 2011, p. 8)

Quando se estuda esse movimento cultural, percebe-se a existência de vários elementos artísticos, pois

tem muito mais que apenas dança, ele é composto por elementos como no rap o MC (Mestre de Cerimônias), o DJ (disc-jockey – operador de discos), o Break (dança) e o Graffiti (artes plásticas), mas tem sua importância baseada na possibilidade de unir arte, cidadania e dar voz aos subalternos. (OLIVEIRA, 2015, p. 2)

Temática relevante para o desenvolvimento crítico de jovens, pois esse movimento também presente no Brasil, desde a década de 80, do século XX, tem sua origem na cidade de São Paulo e depois se alastra para outros espaços nacionais com temas críticos sociais, em especial, falando e cantando a violên-cia urbana.

Como nos coloca Oliveira (2015, p. 2), o movimento mantém a essência, mas se apodera dos problemas cotidianos nacionais e, assim,

letras sobre pobreza, racismo e injustiças sociais foram produzidas a partir apenas do final da mesma década. Hoje o movimento tem várias vertentes, como Gospel, Feminino, Radical, Social, Gangsta, e, mais recentemente, misturas como a Indígena, Nordestina e LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros).

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Considerações Finais

A dança esteve nas ruas, nas praças públicas, em espaços de requinte, nos palácios, nos palcos, em diversos lugares, mas não podia ter sido diferente, pois os seres humanos são muitos e diversas são as formas de ser e estar no mundo.

Ainda hoje é assim e muito mais, pois o ser humano se reinventa a cada minuto e descobre novas formas de se fazer dança, traduzindo o ser, o estar, o viver e o conviver. Assim, a dança acompanha pari passu a diversidade da con-dição humana, ora prestigiada, ora menosprezada; ora valorizada, ora ignorada, mas sempre presente.

Na escola, a dança tem um papel cultural e artístico, porque por meio dela se aprende sobre si, sobre o outro e sobre o mundo, numa relação corpo, movimento, ritmo, expressão e comunicação. Dança, como uma das linguagens da arte, é educação, “como possibilidade de educar que não se limite à instrução ou aquisição de conhecimentos já prontos, mas que permita a vivência fascinante da criação de sentidos personalizados”. (PORPINO, 2006, p. 18)

A dança, seja como conteúdo das disciplinas de Arte e ou de Educação Física, ou em propostas interdisciplinares (diversas disciplinas interagindo entre si, tendo o mesmo assunto como foco) ou multidisciplinares (diversas disciplinas sem conexões diretas, mas preocupadas com o mesmo assunto), deve ser um conhecimento pertinente para os/as alunos/as, fazer sentido enquanto cultura e trazer a possibilidade de aflorar sentimentos, desejos e emoções.

Conhecer a história da dança e também contribuir com sua evolução por meio de vivências, criações, apresentações e apreciações é uma das possibilida-des que se deve propiciar na escola, pois “pensar a dança implica refletir sobre um campo que é sobretudo cultural, mas é também estético, técnico, religioso, terapêutico, lúdico e linguístico”. (SIQUEIRA, 2006, p. 71)

Nas palavras de Tolocka (2006, p. 37), concebe-se a amplitude da dança enquanto conhecimento histórico, que nos traz a grandeza humana, e o quanto isso é fundamental ser trabalhado na escola, pois é a possibilidade de aprendi-zagem para além de movimentos definidos e repetitivos, que ocorre no sentir, descobrir, expressar, criar, apreciar e fruir:

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Dança na Escola

Dançar é uma atividade motora muito antiga, um meio de expressão religiosa, política, emocional; uma lingua-gem que permite contraposição de ideias, simbiose de sentimentos, cumplicidade de olhar. São tão diferentes as maneiras de dançar quanto são os grãos de areia em uma praia. A dança, como a flora marinha, traduz uma diversidade magnifica e permite desde a execução de gestos altamente complexos até coreografias feitas apenas com os olhos, mas que podem igualmente transmitir o que muitas vezes não pode ser dito por palavras.

A dança se materializa no ser humano que se expressa, mas “como um fenômeno que ultrapassa o simplório ato de movimentar-se sob o ritmo de uma música”. (FRANCO; FERREIRA, 2016, p. 271) São tantos estilos, fruto de formas antigas de dançar ou até mesmo novas formas e novos sentidos e, assim, a história da dança revela a própria história do ser humano, pois danças e corpos estão acoplados, a existência de um depende da existência do outro, a transformação de um é fruto da transformação do outro.

É fundamental que os/as professores/as apresentem a dança para os/as alunos/as, pois como conhecimento esta arte pode, não só aflorar emoções, sentimentos e afetividade a partir de vivências, mas traduzir a existência humana ao longo da sua história. A frase de Bourcier (2006, p. 52) é atemporal e nos confirma a relevância da dança, em especial, num trabalho pedagógico: “a dança é um bom indicador do nível de civilização”.

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A DANÇA NA EDUCAÇÃO DA INFÂNCIA E A CONSTRUÇÃO COREOGRÁFICA: ENTRE O LÚDICO E A EXPRESSÃO CORPORAL

Ida Carneiro MartinsVivian Iwamoto

INTRODUÇÃO

As festas de final de ano presentes nas práticas educativas das escolas de Educação Infantil, são momentos especiais de interação escola-família. Todavia, o que deveria ser uma ocasião de celebração do que se conquistou no trabalho anual, acaba por se determinar como um momento de “prestar contas” à família do serviço proporcionado pela instituição. Esse processo nem sempre é tranquilo, traz tensionamento, pois envolve o atendimento às expectativas das duas partes e diferentes pontos de vista. Tal condição influencia a estruturação do evento já que a escola tem como objetivo fazer o melhor possível aos olhos da família e isso nem sempre está de acordo com as necessidades e os desejos das crianças. (MARANHÃO e SARTI, 2008)

Para atender tal finalidade, uma das estratégias escolhidas são as coreo-grafias de dança, que podem observar diferentes modelos: a representação da letra da música com gestos propostos pelo/a professor/a; o treinamento da coreografia até que se alcance uma perfeita execução; a utilização de uma criança que sabe “dançar melhor” como modelo na frente do grupo; dentre outras. Estes modelos não são significativos às crianças por se tratar de simples reprodução de gestos que lhes são impostos.

Na verdade, como diz Piorski (2020), se

Prepara a criança toda, veste, enfeita, bota uma música, ensina uma dança. Dança, dança, dança, ensaia, ensaia e obriga a criança a entrar num sistema expressivo que não é próprio do corpo, que o corpo não maturou para as complexidades daquelas expressões. [...] põe as crianças para dançar e os pais ficam todos contentes [...] e a gente acha que contribuiu para a vida daquelas crianças [...]. (PIORSKI, 2020, 10’30”)

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Dança na Escola

Assim o processo é encaminhado, a festa acontece, agrada a escola, professores/as pais, mães, mas nem sempre satisfaz o desejo das crianças. A potência que possui o trabalho com o ritmo, com a expressão corporal e com a dança, não é explorada em toda a dimensão educativa.

Trabalhar com a dança na Educação Infantil requer que se respeite, se agencie o desejo e as necessidades das crianças e, em especial, que se compreenda os princípios que devem nortear as práticas educativas para a infância. O presente estudo visa, então, contribuir para tal discussão por meio da proposta de uma prática educativa na inter-relação com a teoria que lhe dá base. Para que isso se dê, passamos a apresentar os princípios teóricos que norteiam a discussão.

DANÇA E O SENTIDO DO MOVIMENTO

Por vezes a vemos na televisão, por outras na rua ao som de um samba, em outros momentos em anúncios de espetáculos, poucas vezes em casa com os avós abraçadinhos e, ainda, timidamente apresentada nos passos improvisados em festas com amigos. Todas essas expressões podem ser chamadas de dança? Podemos dizer que é um estranhamento pessoal que permeia o nosso cotidiano e quase não percebemos a sua importância nos agenciamentos possíveis em nosso corpo. Dançar se faz possível no experimentar. Muitos autores afirmam que ela acompanha a humanidade desde os primórdios da sua existência, uma vez que a “dança realiza da maneira mais pura a vocação de agenciar do desejo” (GIL, 2002, p. 56). Esse desejo de algo, que não se sabe bem, vai permitindo o movimento dançado.

Esse impulso interior que origina o movimento e seus gestos introdu-zem nele o infinito. Para Mary Wigman (1986), esse infinito se formaliza como um espaço da atividade real daquele que dança, não tangível e nem limitado, mas que apaga as fronteiras da corporeidade e completa a identidade no ima-ginário do gesto dançado. Nesse sentido é que consideramos que a dança nasce na colaboração entre o equilíbrio físico de um sistema mecânico e o equilíbrio da consciência de movimento introduzidos no corpo. O movimento dançado, enquanto arte possível e dimensão propriamente humana, faz-se necessário no enobrecimento da faculdade de sentir e na condução ao exercício pleno da liberdade.

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O infinito não acontece no passado ou no futuro, mas permanentemente busca na vontade do agora e se perfaz na concretude do existir, conforme Geraldi (1997), p. 28-29):

Do mesmo modo que na pintura, a concretude da imagem é uma marca de todas as artes que lidam com imagens, seja de uma forma ou de outra – como é o caso da Dança. Mas, enquanto que na pintura o produto final perma-nece, seja numa tela, num mural ou em qualquer outro objeto, dando a oportunidade de retornar a ele sempre que se tem vontade, o produto da Dança é momentâneo e passageiro e, para retornar a ele, é necessário fazê-lo novamente, recuperando-o num novo tempo-espaço [...] Em Dança não existe o antes nem o depois: só o durante. (GERALDI, 1997, p. 28-29)

A impermanência do movimento e a efemeridade do presente permite a dança se tornar perspicaz em sua prática ao decompor as possibilidades de expressões de uma linguagem cultural as que os grupos sociais se vinculam. O gesto dançado que se distingue de qualquer outro, seja funcional, seja ginástico, ou teatral, caracteriza-se por regressar si e se prolongar ao seguinte, sem limites de contorno, mas numa grafia que o corpo desenha na coreografia. “A dança compõe-se de sucessões de micro-acontecimentos que transformam sem cessar o sentido do movimento” (GIL, 2002. p. 51). Essa é a imanência da dança, entre ciência e arte, precisa ser vivida para ser compreendida.

A dança se abrange em diferentes formas de manifestação entre elas no mundo do espetáculo (teatro, cinema, televisão, shows), em seu aspecto terapêutico (programas de apoio a menores infratores, ex-farmacodependentes, vítimas de violência em geral), nas possibilidades do lazer (formas recreativas do divertimento), em manifestações culturais (ritos, cerimônias, festas popula-res, religiões) e em sua configuração pedagógica no espaço educativo do corpo expressivo (escolas, universidades, academias).

Essa vivência está carregada em nossa história, a interpretação do movi-mento dançado dialoga no tempo e espaço de seus atores. Nos anos 1930 acon-teceu a reviravolta da dança moderna contra os padrões acadêmicos universais, mais adiante no tempo, entre os anos 1960 e 1970, aconteceu a desconstrução do experimentalismo corporal e cênico. Considerando esse processo histórico,

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Dança na Escola

podemos afirmar que a ação educativa na atualidade poderia estar mais voltada à participação, compreensão, desfrute e reconstrução da dança.

No entanto, o tradicionalismo continua invadindo as escolas num passo de conservadorismo, avesso às transformações das últimas décadas. Quem sabe o tecnicismo ou a filosofia educacional que considerava o aluno como tábula rasa ainda permeie as contribuições históricas e culturais contidas nos trabalhos de arte - dança. Apesar disso, a “arte como conhecimento vem sendo, assim, o slogan das décadas de 1980 e 1990 que de certa forma veio a substituir, sem excluir, as crenças anteriores de arte como técnica e/ou arte como expressão”. (MARQUES, 2011, p. 38-39, grifos da autora)

Na concepção de Laban (1978), por meio da compreensão das quali-dades de movimento, imbricadas das distintas formas de expressão humana, o/a aluno/a poderia ser educado/a por meio do movimento/dança, de modo que esta integrasse o conhecimento intelectual com suas habilidades criativas e fazendo com que ele/a percebesse as sensações das possibilidades dramáticas da dança na educação.

Porém, a dança ao ser didaticamente sistematizada, na maioria das vezes, perde seu caráter “inovador”, imprevisível e dinâmico. Por um lado, grandes companhias de dança revolucionaram os espetáculos artísticos e, pelo outro, as escolas/estúdios cristalizaram métodos e técnicas por meio de um conser-vadorismo do ensino. Nas escolas as propostas didáticas lineares norteavam as práticas educativas que, muitas vezes, se convertiam numa mecanicidade técnica e padronização coreográfica. Contrapondo-se a isto outra vertente se justificava nas práticas “espontâneas”, sem fundamentação teórica e vazia no mediar dançante, que se dizia “livre” em seus movimentos.

Nesse sentido a atividade artística e educativa merece ser repensada no contexto escolar. A dança, a escola, a sociedade seriam fontes vivas para experi-mentação dessas relações, pois “dançar é experimentar, trabalhar os agenciamentos possíveis do corpo. Ora, este trabalho consiste precisamente em agenciar. Dançar é, portanto, agenciar os agenciamentos do corpo”. (GIL, 2002, p. 55)

As redes de relações humanas interdependentes entre si como esco-la-alunos, professores/as-alunos/as, alunos/as-alunos/as, pais/mães-filhos/as, individual-grupal, local-global, dentre outras, atravessadas pela balança de poder,

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que preconizou a educação das vontades no controle e autocontrole, imprime nos corpos a padronização e a automação dos gestos. Ao contrário, a dança, conforme Marques (2011), possibilita a efetiva educação em/através da dança numa relação não hierárquica entre texto (improvisação, composição, repertórios), subtexto (elementos estruturais e sócio-afetivo-culturais) e contextos (história, música, antropologia, cinesiologia, estética) da dança.

Na educação infantil o cuidado deve ser, ainda, mais enfático. A dança na escola não tem a intenção de formar dançarinos, mas possibilitar o contato com a linguagem artística oportunizando a expressão daquilo que a criança não consegue comunicar pela fala ou de outras maneiras. A dança incentivada pelas atividades lúdicas promove mais do que uma simples atividade física, pois não está interessada só no resultado das ações, mas sim contemplar a todos/as, ao incitar formas e sequências criativas.

VAMOS BRINCAR DE CRIAR?

Será que toda vez que a criança brinca ela está criando algo de novo? Será que ela está empregando todo o seu potencial criativo? Essa não é uma questão simples de se responder, pois para entender esse processo é preciso aprofundar a discussão sobre o jogo e, para compreender o jogo é preciso deixar-se tomar pelo seu espírito (FREIRE, 1989). Ainda mais, para que se compreenda melhor tal questão é importante discutir o jogo de faz de conta, observando o período de vida em que se encontram as crianças da educação infantil, porque este tipo de jogo é a linguagem própria deste ciclo de ensino.

Segundo Elkonin (1998) a criança da educação infantil tem como ativi-dade principal os jogos e as brincadeiras. Ser a atividade principal não indica que ela é a única atividade, mas sim, a mais importante, a que está mais presente na vida cotidiana da criança. O brincar é caracterizado enquanto uma prática social, pois é pela ação dos outros, pessoas mais velhas ou crianças mais experientes, que se é envolvido nesta ação, ou seja, ele não é um processo que se desenvolve naturalmente na infância, por isso é que se afirma que “base do jogo é social devido precisamente a que também o são sua natureza e sua origem, ou seja, a que o jogo nasce das condições de vida da criança em sociedade”. (ELKONIN, 1998, p. 36-37)

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Dança na Escola

No “brincar, as crianças orquestram uma rede de relações e de personagens que refletem e reelaboram a experiência cultural”, não como uma cópia interna do que é vivenciado, mas sim uma ressignificação de suas vivências (GÓES, 2000, p. 126). Sendo ressignificação, o brincar vem, também, acompanhado de contradições, de oposições, ou seja, aspectos que nem sempre são prazerosos de se vivenciar. Assim, o prazer não pode ser estabelecido como característica que define o brincar, para Vigotski (2003) o que o determina são a situação imaginária e as regras. A evolução do jogo se dá, justamente, de uma situação em que a situação imaginária é explícita e a regra é implícita para uma situação contrária, na qual a representação é subentendida e as regras são claras.

É preciso considerar que o jogo de faz de conta só começa, verdadei-ramente, quando a criança já tem consolidada uma base sensório-motora que lhe permita representar as ações que observa em seu grupo social, manipulando os objetos que lhes são apresentados pelos adultos. Anteriormente, quando a criança tem idade inferior aos dois ou três, ela quer satisfazer imediatamente as suas necessidades e os brinquedos são inventados com esse objetivo, porque neste período de vida a percepção que a criança tem do objeto é o que motiva a sua ação e não as ideias

Mais adiante, na medida em que se desenvolve, a criança passa a se interessar e querer agir numa esfera mais ampla, o que nem sempre é possível. Assim, para resolver tal tensão ela brinca de faz de conta, adentrando a um espaço imaginário e fazendo o esforço para agir como um adulto. (FONTANA; CRUZ, 1997). A ação, que é regida por normas sociais, começa a ser determinada pelas ideias e não pelos objetos. “Isso representa uma tamanha inversão da relação da criança com a situação concreta real e imediata, que é difícil subestimar seu pleno significado”. (VIGOTSKI, 2003, p. 128)

Se antes o objeto era o que determinava a ação infantil, agora o signifi-cado da ação é que impulsiona a brincadeira. Inicialmente, a criança age mais do que compreende o que realiza e, gradativamente, é que passa a compreender e ampliar o enredo do jogo. “Assim como operar com significado de coisas leva ao pensamento abstrato, observamos que o desenvolvimento da vontade, a capacidade de fazer escolhas conscientes, ocorre quando a criança opera com significado de ações. (ibid., p. 132)

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Por esta razão é que se diz que o jogo de faz de conta tem “o mesmo conteúdo, ou seja, a atividade do homem e as relações sociais entre as pessoas”, já o enredo é variado e “refletem as condições concretas da vida da criança, as quais mudam conforme as condições de vida em geral e à medida que a criança vai ingressando num meio mais vasto a cada novo dia de sua vida, com o que se ampliam seus horizontes”. (ELKONIN, 1998, p. 35)

Pelo jogo de faz de conta é que a criança vai se apropriando dos modos de agir de seu grupo social, por meio da representação dos papéis que nele se apresentam, pois o agir é o meio que ela tem para compreender a realidade. Por isso que, para Vigotski (2003) a brincadeira cria uma zona de desenvolvimento proximal, já que a criança age de maneira superior ao que está habituada, na tentativa de reproduzir as situações reais.

O jogo de faz de conta se inicia pela representação de pequenas ações domésticas, sem que a criança assuma qualquer papel. Aos poucos as relações sociais são enfocadas e, gradativamente, os contextos sociais vão se ampliando e a criança vai se adaptando às regras do jogo, às normativas sociais que estão sendo representadas, ou seja, o cumprir as regras torna-se seu propósito e, sendo assim, “o controle de seus impulsos, as aquisições que a criança faz neste processo, tornam-se a base de sua moralidade”. (VIGOTSKI, 2003, p. 131)

Inicialmente, “o brinquedo é muito mais a lembrança de alguma coisa que realmente aconteceu, do que imaginação. É mais memória em ação, do que uma situação imaginária nova”. (VIGOTSKI, 2003, p. 135)

Na verdade, a criança reconstitui ou reproduz aquilo que viveu, é um processo imaginativo, mas não necessariamente uma atividade de criação. Para ser uma atividade criadora é necessário que se crie algo novo, é um processo de combinação que gera algo que não existia. A imaginação é, sem dúvida, a base de toda atividade criadora e se manifesta “em todos os campos da vida cultural”. Todavia, no jogo de faz de conta a criança não representa simplesmente o que ela vivenciou, mas sim há um processo de reelaboração daquilo que foi vivenciado, é “imaginação em atividade”. (VIGOTSKI, 2009, p. 17)

Daí vem a especial importância de considerarmos o jogo de faz de conta na educação infantil, pois este é uma forma independente de comunicação das crianças e por meio dele que ela se relaciona no coletivo infantil. Ainda, quanto

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Dança na Escola

mais enriquecedora for a experiência, mais material tem a criança para a sua imaginação. Neste processo, o/a professor/a tem papel fundamental, tanto na organização da brincadeira como na mediação da atividade, de modo que ele/a contribua e potencialize o desenvolvimento das crianças. (MARTINS, 2009)

Tais pressupostos foram fundantes para o encaminhamento da proposta que ora se apresenta e determinam seus princípios norteadores, os quais pas-saremos a apresentar:

a) O respeito à linguagem própria das crianças da educação infantil – como já apontado anteriormente, o jogo de faz de conta é a linguagem que as crianças deste ciclo de ensino se utilizam para estabelecer as suas relações com o mundo e, sendo assim, não deve ser desconsiderado nas práticas educativas da educação infantil, pois

[...] a atividade pré-escolar dominante é o brincar, em sua forma mais expandida (jogo de papéis). O significado do brincar no desenvolvimento mental da criança nessa idade tem muitos aspectos. Seu significado primário repousa no fato de que no brincar a criança está mode-lando relações humanas devido a artifícios especiais do brincar; por exemplo, ela assume o papel do adulto, as funções e o trabalho do adulto na sociedade, reproduz ações objetais generalizando-as em pensamento repre-sentacional; transfere significado de um objeto para outro etc. (ELKONIN, 2012, p. 164)

Ao representar diferentes papéis e práticas sociais a criança expressa aquilo que internalizou das vivências com seu grupo social e as traz para a brincadeira de modo ressignificado, num enredo que encaminha a sua ação. Daí a relevância da festa ter uma história, assim como no jogo, para que seja proporcionado que a criança assuma um papel que encaminhará a sua ação e que dê o motivo para a realização do movimento.

Ainda mais, uma festa de fim de ano em que as crianças se apresentem para os pais, mães e família que não possuir algo que ela planejou, preparou e produziu, dificilmente terá significado para elas, o que de fato não colabora ao seu pleno desenvolvimento.

b) O motivo para a realização do movimento – brincar para a criança não é um processo natural, mas sim cultural. Já a motricidade infantil, apesar dos

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elementos biológicos terem relevância, se não tiverem as condições adequadas não alcançará o seu melhor desenvolvimento. Assim, a “correlação adequada entre a assimilação de novos movimentos em exercícios especiais e seus desenvolvimento nos jogos de movimentos e criativos constitui um dos objetivos principais da na organização da educação física na idade pré-escolar.” (ZAPORÓZHETS, 1987, p. 82 - tradução nossa)

Tal inter-relação entre jogo e movimento, pelo motivo que a brincadeira impõe ã ação, permite o desenvolvimento de melhor qualidade e complexidade ao movimento, pois “alguns movimentos que se formam na idade pré-escolar, como seu cumprimento e desenvolvimento dependem do caráter da tarefa exposta para a criança e dos movimentos da atividade infantil”. (ZAPORÓZHETS, 1987, p. 73 - tradução nossa)

Assim, não se deve impor às crianças a realização de movimentos que não apresentem significados para elas e o jogo de faz de conta é promissor enquanto estratégia, pois representa “a primeira forma de atividade, acessível à criança pré-escolar, que supõem a reprodução e o aperfeiçoamento conscientes dos novos movimentos”. (ZAPORÓZHETS, 1987, p. 82 - tradução nossa)

c) O desenvolvimento da autonomia pela apropriação do processo – quando a criança tem a oportunidade de fazer parte na construção de qualquer projeto educativo, desde o seu começo até a sua finalização, ela pode compreen-der o encadeamento de todos os processos que dele fazem parte. Ela expõe os seus pensamentos, ouve as ideias de seus/as parceiros/as e na medida em que ela participa desse processo de comunicação vai se apropriando dos modos de agir e pensar de seu grupo e para eles dá significado. Assim, criar tempos para as discussões sobre o que se vai desenvolver tem fundamental importância. Construir a festa em conjunto com os/as professores/as, fazer isso por meio de brincadeiras é fundamental, pois

A oportunização do tempo, para que as crianças possam contar aos professores e até para as outras crianças sobre a sua brincadeira, também é algo a ser destacado. A exposição de suas razões pela linguagem permite, pelo processo da internalização, que estas tomem consciência da sua intencionalidade, ou seja, daquilo que as movem nas brincadeiras, mas também, dos modos de agir de seu grupo e, em especial, da maneira superior de pensamento,

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Dança na Escola

em que se colocou durante esse processo. (MARTINS, 2009, p. 31)

Desse modo a criança vai se apropriando da festa e passa a ser produtora dela e não reprodutora de movimentos e ações impostas pelos adultos. Na medida em que internaliza as vivências e a ela dá os seus significados e se apropria delas, o processo se torna seu e de seu grupo e, assim, pode opinar, sugerir, construir a festa em conjunto.

d) O trabalho interdisciplinar – a condição para uma festa de encerramento de um ciclo, só possuirá sentido se tiver a participação de todas as pessoas que fizeram da vida acadêmica do/a aluno/a. Desse modo, deixar a organização da festa para um/a professor/a de um determinado componente curricular como artes, música ou educação física (como acontece com frequência na escola) não seria adequado.

Ainda mais, o trabalho em equipe permite potencializar o resultado do processo, pois

Nas questões da interdisciplinaridade é tão necessário e possível planejar-se quanto se imaginar, isto impede que possamos prever o que será produzido, em que quanti-dade ou intensidade. O processo de interação permite a geração de entidades novas e mais fortes, poderes novos, energias diferentes. (FAZENDA, 2011, p. 16)

Deste modo, o trabalho interdisciplinar potencializa a construção de qualquer processo que envolva práticas educativas.

Todavia, ressaltamos que para o bom encaminhamento de um trabalho interdisciplinar são necessárias reuniões entre os membros da equipe, para que o processo possa ser “costurado” e para que haja adesão dos membros do grupo.

Tais pressupostos é que regem a proposta de trabalho que passamos a apresentar. Ela é resultante de diferentes trabalhos realizados em diversas ins-tituições, de modo mais sistemático em um colégio particular de ensino de um município do interior do estado de São Paulo. A ela agregamos as experiências das autoras em outras instituições de ensino formal e não formal, pois o mesmo tipo de processo foi desenvolvido em outras instituições e, apesar das variações de contextos, da natureza das instituições, o processo de apropriação pela criança foi similar e resultou numa construção coletiva do enredo e da coreografia.

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AS ETAPAS DA PROPOSTA

Observando os princípios anteriormente discutidos passamos a apresentar as etapas de nossa proposta com destaques para: os objetivos de cada etapa, o seu desenvolvimento, a discussão do processo relacionada aos princípios teóricos e os materiais ou equipamentos necessários.

A. A construção da história

Objetivos da EtapaO objetivo desta etapa é possibilitar às crianças a participação na constru-ção da história, do enredo a ser desenvolvido, para que elas se apropriem do processo e se tornem autoras na produção coletiva.

Desenvolvimento

A construção da história deve ser iniciada a partir de uma frase, de um começo de história, de modo que as crianças possam dar continuidade. Dependendo da/a turma/s esse início, também, pode ser sugerido pelas crianças. Numa das turmas que ministramos aula, por exemplo, começa-mos da seguinte forma: - Era uma vez um barco em que as crianças saíram para passear e..., assim, as crianças deram continuidade para a história.A proposta pode ser desenvolvida por uma turma ou mais e, se for este o caso, sugerimos que cada uma construa a sua história. Depois, em assembleia, todas as histórias são apresentadas para que, num processo de aclamação ou outro tipo de votação, possa se escolher a parte que mais lhes agrade, até que se construa o enredo final.

Discussão

Num processo de escolha coletivo é permitido a manifestação das crian-ças ao expressarem sua predileção por alguma parte da história, que discutam a melhor composição e que se façam autoras. Nas experiências realizadas pudemos, também, perceber a expressão de alegria quando o fragmento da história escolhido era o mais votado ou de insatisfação quando acontecia ao contrário.Tal processo coletivo é essencial ao desenvolvimento das crianças já que nascemos inseridos em relações sociais e nelas nos desenvolvemos, o que gradativamente define a nossa especificidade quando internalizamos os modos de agir de nosso grupo social e a ele damos os nossos significa-dos, num constante movimento de ir e vir e tal condição se efetiva na construção do enredo da festa. (MARTINS, 2009)

Materiais Necessários

Para facilitar a leitura da história, e atender às crianças que já aprenderam a ler sugerimos que se escreva a história em papel kraft com canetas hidrográficas coloridas, em letra bastão.

Fonte: Construído pelas autoras.

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Dança na Escola

B. A divisão da história em etapas e a distribuição em grupos

Objetivos da EtapaEsta etapa tem como objetivo a divisão da história em partes e a sua distribuição, a partir da escolha das crianças, num processo de constante diálogo.

Desenvolvimento

Após a história ser finalizada, os/as professores/as a dividiriam a em partes, para ser encenada por meio de uma coreografia ou de várias, dependendo do caso. Tais partes comporiam o enredo total a ser apresentado no evento.Após esta divisão e em assembleia, novamente, cada grupo/turma escolhe o fragmento que gostaria de retratar. No caso da escolha ser coincidente por dois grupos/turmas acreditamos que se deve tentar um acordo e, se não for possível, se resolva por sorteio.

Discussão

A possibilidade de realizar escolhas propicia às crianças perceberem seus desejos, suas necessidades, aquilo que lhes agrada, o que lhes desagrada e permite que elas desenvolvam maior conhecimento sobre si mesmas. Ao mesmo tempo, requer que tenham maior autocon-trole, que se disciplinem para uma adequada inserção ao seu grupo. Tais condições são favoráveis ao desenvolvimento das crianças, em especial, ao social porque implica em aceitar o resultado em favor de outros. (USOVA, 1979)

Materiais Necessários Neste momento, somente é necessário o material para se fazer o sorteio, no caso de coincidência de escolhas.

Fonte: Construído pelas autoras.

C. A escolha da música

Objetivos da Etapa

Temos como objetivo nesta etapa que as crianças escolham as músicas que serão utilizadas para compor a coreografia.

Desenvolvimento

Após definidas as partes da história é hora de escolher a música para cada uma das partes. Antes disso é importante que se aprofunde a discussão do enredo de modo que cada criança possa internalizar o seu significado para a selecionar.Tal processo, em geral, envolve os pais, mães ou outras pessoas responsáveis pelas crianças, pois este não é fácil para elas já que, muitas vezes, a crianças não escolhem a música pelo significado de suas letras, mas sim pelo ritmo e melodia. No entanto, essa é mais uma possibilidade de discussão coletiva, inclusive envolvendo os familiares.Após as crianças trazerem ou enviarem as músicas é o momento de ouvi-las em grupo, observando o estilo, o ritmo, a letra, as possibilidades de movi-mento, enfim sua pertinência com o contexto a ser representado e, depois, encaminhar a escolha daquela que será coreografada.Em nossas experiências esse foi um momento bastante interessante, pois as crianças já se sentiam apropriadas do processo, já que tinham feito a escolha da história e, assim, participaram ativamente da discussão, levantando e demonstrando o movimento, opinando sobre a melhor música e, talvez por ser uma discussão num grupo pequeno, de sua própria turma, as crianças aceitaram a decisão com tranquilidade.

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Discussão

As observações feitas nas etapas anteriores também servem para referendar este momento, no entanto, a oportunidade de participação da criança é potencializada já que as discussões são desenvolvidas em grupos menores.Ouvir várias músicas, identificar o seu ritmo, pensar na possibilidade de realizar movimentos pertinentes a elas, exigem da criança percepção do ritmo e imaginar o movimento a ser representado.A criança participa deste processo com aquilo que a constitui culturalmente, e isso só é “possível porque, enquanto seres humanos, temos a capacidade de simbolizar, de representar e, por esta qualidade, permitir a modificação do meio do qual fazemos parte, agindo sobre ele, o transformando e, ao transformá-lo, transformamos a nós mesmos”. (MARTINS, 2009, p. 34)Tal participação permite uma transformação significativa no modo das crianças atuarem, gradativamente participarem, se apropriarem do processo, com maior engajamento.

Materiais Necessários

São necessários caixas ou aparelhos de som que permitam a reprodução das músicas.

Fonte: Construído pelas autoras.

D. A vivência do ritmo

Objetivos da Etapa

Com o intuito de preparar as crianças para a construção da coreo-grafia, depois da escolha da música pelo grupo, o próximo passo será a vivência do ritmo para que as crianças possam se apropriar dele, internalizando não só da melodia da música, como também os componentes do ritmo, ou seja, os sons e os silêncios, as batidas fortes ou leves, os intervalos, a velocidade e a divisão das frases musicais.

Desenvolvimento

A vivência do ritmo passa, inicialmente, pelo processo da escuta da música em grupo que já deveria acontecer na etapa anterior. Em seguida, é importante a trabalhar com as crianças a apreciação de dife-rentes sons que as rodeavam, buscando potencializar a sua percepção, tais como: os piar dos passarinhos do pátio, dos cachorros de casas vizinhas, das cozinheiras preparando as merendas, de outros professores ministrando aulas, ou quaisquer outros que façam parte do contexto.O trabalho de percepção dos sons pode ser feito de várias formas: caminhando pela escola, parados em lugares fechados e também abertos, com as crianças deitadas e olhos fechados apreciando o som da respiração e, também, do próprio coração, dentre outras possibilidades.Após esta etapa passa-se a vivenciar a música com movimentos corporais, com objetos tais como bola, aros, cordas e, até um objeto diferente que a criança selecionaria em casa e que permitisse movi-mentos diferenciados. Só depois que as crianças estiverem apropriadas do ritmo da música, vivenciando-o de diferentes formas, é que se deve iniciar a construção da coreografia.

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Dança na Escola

Discussão

Na tentativa de compreender o ritmo-espaço (direções, planos, níveis, formas), ritmo-tempo (movimentos rápidos, moderados e lentos) e ritmo-peso-fluxo (durações longas ou breve com intenções for-tes ou fracas, contínuas ou interrompidas) que a dança propiciou o entendimento da melodia e harmonia imbricadas no movimento. Ao trabalharmos com as crianças o ritmo musical é importante observar-mos que elas não se apropriam dele num processo progressivo, assim como acontece em outros campos do desenvolvimento humano, elas progridem e regridem com a mesma facilidade.Para que elas possam se apropriar da música que escolheram é impor-tante o desenvolvimento de várias práticas educativas que contribuam à percepção de sons e ao ritmo da própria música (SCHROEDER; SCHROEDER, 2011). Nos processos educativos é importante que os/as professoras/es percebam as necessidades que a criança tem, seu nível de compreensão e autonomia, para que por meio de sua mediação sensível e observando a plasticidade do que ali se desenvolve, propiciar às crianças alcançar níveis superiores de desenvolvimento. (VIGOTSKI, 2003)

Materiais NecessáriosSão necessários caixas ou aparelhos de som que permitam a reprodução das músicas. Ainda, bolas, aros, cordas e um objeto diferente que a criança selecione em casa

Fonte: Construído pelas autoras.

E. A construção coreográfica e os movimentos das crianças

Objetivos da Etapa

Essa etapa tem como objetivo possibilitar que as crianças construam a coreografia inter-relacionando os movimentos que já conhecem com o ritmo da música que experienciaram, de diferentes formas, na etapa anterior.

Desenvolvimento

Nessa etapa o foco é a construção da coreografia pelas crianças e o que propomos foi que, a partir da música - a qual escolheram e vivenciaram - e com enfoque no enredo que elas construíram, criem os movimentos. A dinâmica para tal pode partir da experiência pessoal e depois em pequenos grupos, nos quais as crianças podem mostrar as suas criações e outas com-plementam, quando o movimento estiver a contento podem levar para o grupo maior. No grupo maior novamente as crianças demonstram, até que se escolha aquele que as que gostaram mais.A mediação do/a professor/a neste momento deve ser um processo constante e delicado, para que todos possam, efetivamente, contribuir para a construção coreográfica e serem valorizadas em suas opiniões. As discussões devem ser pautadas em duas vertentes: a adequação do ritmo e a pertinência do enredoEm nossas experiências esse foi um momento de intensa participação das crianças e de manifestações lúdicas que demonstravam a alegria em participar. Com o tempo os passos receberam os nomes das crianças: - Dois passos de Érica, mais três passos Gabriel e Otávio, por exemplo.Mas há uma situação em especial que queremos relatar é a de uma criança, uma menina, que se aproximou de uma das professoras, estando muito extasiada e disse: - É muito lindo o que a gente faz aqui, né? Eu fiquei arrepiada, você não ficou? Foi um momento de muita emoção e a fala da criança retrata a beleza do que ali se construiu.

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Discussão teórica

A construção da coreografia pode acontecer durante diversas aulas para desembocar numa produção coletiva, criativa e com muito significado para as crianças. Os movimentos propostos devem estar relacionados às habili-dades que possuem as crianças, o que facilita a aprendizagem e propicia o impulso de criação e a expressão da criança, poisO corpo humano permite uma variedade infinita de movimentos, que brotam de impulsos interiores e exteriorizam-se pelo gesto, compondo uma relação íntima com o ritmo, o espaço, o desenho das emoções, dos sentimentos e das intenções. Mas, se a dança é um modo de existir, cada um de nós possui a sua dança e o seu movimento, original, singular e diferenciado, e é a partir daí que essa dança e esse movimento evoluem para uma forma de expressão em que a busca da individualidade possa ser entendida pela coletividade humana (KLAUSS, 2018, p. 105).A tarefa de imaginar a ação, pelo jogo de faz-de-conta, situações de movi-mento em ambientes inusitados, floresta escura, palácio, mar, dentre outras, onde as crianças, em sua inventividade experienciada no contexto cultural em que se inserem, traz o seu repertório de movimentos nesse diálogo mímico, expressando os sentimentos imanentes de cada cena peculiar. As sequências coreográficas foram surgindo numa composição de frases dançantes que cada uma colaborava na construção coletiva. Conforme Laban (1978, p. 208), “há a expressividade do caminho do movimento”, tal caminho no chão, no ar, no rastro do braço ou desenrolar da perna, direto ou curvo, simétrico ou assimétrico, vai se configurando no agenciar dos agenciamentos do corpo, no encontro com a dança.

Materiais Necessários

São necessários caixas ou aparelhos de som que permitam a reprodução das músicas e outros foram acrescentados de acordo com o encaminhamento da coreografia.

Fonte: Construído pelas autoras.

F. A escolha das fantasias

Objetivos da EtapaEsta etapa tem como objetivo a discussão para a escolha da fantasia que venham a representar os papéis ou personagens que estão presentes no enredo, o que poderia potencializar o processo de representação infantil.

Desenvolvimento

Pensamos ser importante ressaltar que, de todas as etapas, essa é a que têm custo financeiro mais significativo e, se levarmos em conta tal condição, há de se verificar a sua real necessidade no encaminha-mento do processo, pois é preciso lembrar que existem famílias de crianças para as quais, mesmo que seja com o menor gasto possível, ainda assim, pode ser além daquilo que dispõe. Desse modo, antes de qualquer encaminhamento, é necessário que se tome a decisão de que tipo de fantasia, adereços, dentre outras se vai utilizar.Tomada essa decisão a primeira proposta que se pode fazer é pedir para que as crianças desenhem como seria a fantasia a ser utilizada, depois de divulgado cada desenho, se construiria em conjunto a fan-tasia do grupo podendo-se acrescentar, combinar ou retirar elementos.Feito isso, a confecção depende do contexto e das decisões que se tomou, todavia, a construção de adereços pelas crianças é um projeto que deveria ser encaminhado.

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Dança na Escola

Discussão teórica

Uma questão que se deve observar na construção da fantasia é que ela pode ser completa, por assim dizer, ou pode ser representada por objetos significativos aos personagens ou aos papéis. Todavia, para as crianças, ao contrário do que se apregoa não é qualquer fantasia que vai se referenciar ao papel. Tanto a fantasia como o objeto que se vai representear tem que comportar a ação que se desenvolve. (VIGOTSKI, 2003)Neste sentido construir com as crianças essas possibilidades e as necessidades da fantasia é um recurso promissor para soluções pos-síveis e que sejam significativas.Como exemplo, em uma das coreografias que retratava os piratas cavando o tesouro, fizemos uma pá de papelão, pintada com tinta esmalte, que resultou em um instrumento barato e que permitiu a execução de um movimento mais sofisticado.

Materiais Necessários Vai depender das discussões e decisões que se tomem.

Fonte: Construído pelas autoras.

G. O ensaio geral como momento de encontro das belezas construídas

Objetivos da Etapa

Esta etapa tem como objetivo o ensaio geral no qual todas as coreografias serão apresentadas para todas as crianças, de modo que elas possam com-preender o processo como um todo.

Desenvolvimento

Antes da apresentação final, com a presença dos pais, mães e outros convi-dados é importante que, mais do que ser um momento somente de treino e de memorização dos passos, as crianças compreendem o processo como um todo e para tal o encontro de todas as turmas ou grupos é importante. Neste momento as crianças podem ajustar os detalhes de cada etapa desenvolvida e se apropriar das “belezas” construídas por todos, contemplando o resultado das coreografias que compõe o enredo.

Discussão teórica

Este momento tem fundamental importância para a que as crianças possam se apropriar do processo como um todo, já que no início elas construíram a história, compuseram o enredo, mas no desenvolvimento do trabalho só enfocaram uma parte da história, sem ter noção como um todo.Este é o momento de as crianças perceberem como trabalharam os outros grupos, incorporando ao trabalho de todos aquele que seu grupo desenvolveu.No jogo de faz de conta a criança vai sofisticando gradativamente o enredo, parte de pequenas ações cotidianas, vai introduzindo elementos e papéis, coordenando ações entre os elementos do grupo de modo a reproduzir de modo cada vez mais aproximada a realidade que a cerca. (CRUZ, 2015)Assim, este momento é importante, pois permite que a criança se aproprie do enredo de modo mais sofisticado, compreendo as partes que comporiam o todo.

Materiais Necessários

São necessários caixas ou aparelhos de som que permitam a reprodução das músicas e espaço apropriado para as apresentações.

Fonte: Construído pelas autoras.

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H. A festa como espaço para brincar e celebrar

Objetivos da EtapaO objetivo desta etapa é a celebração, o momento de apresentar para a família e amigos/as todo o processo que vivenciaram, um momento para brincar e celebrar.

Desenvolvimento

Ensaio geral realizado, tudo pronto para a festa final. Coreografias construídas e ensaiadas, passos guardados (afinal era de Fulano ou Ciclano), hora de apresentar para a família. Momento importante para criança mostrar o trabalho materializado e contar para os seus, de diversos modos, sobre a sua participação na construção do processo.

Discussão teórica

Baseadas em nossas experiências anteriores, pudemos observar que nas festas em que havia a participação efetiva da criança, seguindo os passos anteriormente expostos, a apresentação se dava de modo bastante descontraído e nos trazia a impressão que elas se divertiam com a festa em si, que brincavam com o enredo e com a coreografia.Tal condição faz sentido, já que neste período de desenvolvimento, ao final do ciclo da educação infantil, a criança está justamente no período de transição no qual a atividade de principal vai deixando de ser o jogo de faz de conta e passa a ser o estudo. Todavia, na medida em que a criança se desenvolve, o jogo de faz de conta estabelece um enredo cada vez mais elaborado em conformidade aos papéis que as crianças representam e, também, há maior elaboração nas inter-relações que estabelecem entre estes papéis. (CRUZ, 2015)Na verdade, a celebração não acontece somente pela reunião da escola em si, mas pelo processo interdependente vivenciado na dança, proporcionado em cada etapa de sua construção, o enredo, a música, o figurino, o movimento, o gesto dançado, todos desdobrados em afetos de vitalidade. Nesse espaço-tempo não há fronteiras, cons-trói-se a identidade, a faculdade de sentir e o exercício da liberdade. Não há espectadores, coreógrafos, dançarinos, há corpos exprimindo seu próprio potencial. É a efemeridade do presente, é a expressão cultural, é a imanência da dança. Enfim, ao mesmo tempo que é o resultado final de uma apresentação de dança, é o enobrecimento da construção contínua do processo, o constante “sendo”.

Materiais NecessáriosSão necessários caixas ou aparelhos de som que permitam a reprodu-ção das músicas. A constituição de um cenário. Figurinos se houver. Iluminação adequada. Crianças e muita envolvimento!

Fonte: Construído pelas autoras.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A problemática inicial colocada em voga foi a de que as danças, ainda, são trabalhadas nas escolas e, especificamente na educação infantil, de maneira ora mecanicista, imposta pelo gesto motor do próprio orientador da dança, ora espontaneísta, no deixar as crianças livres para fazer o que quiserem, o que nem

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Dança na Escola

sempre se configura enquanto dança e bastante observado em apresentações de final de ano nas festividades das instituições.

Compreendemos que mais do que essas situações comuns, a dança no contexto da educação possibilita o sentido do movimento e a expressão corporal, facilitada pelo jogo de faz de conta e sua representação na ação. As ferramentas dançantes que a criança utiliza, baseada no contexto cultural a que se insere, se traduzem como linguagem facilitadora dessa comunicação com o mundo que a cerca. Gera autonomia nas escolhas e apropriação desse universo imanente em sua aprendizagem. A riqueza da interdisciplinaridade nas práticas educativas oferece a construção desse potencial da dança, como vimos nas sugestões de cada etapa da proposta apresentada.

Assim sendo, as situações de jogos e brincadeiras facilitam o faz de conta, nas quais as crianças representam com o corpo histórias contadas e cantadas, explorando o movimento com diferentes ritmos, níveis espaciais, planos, eixos, fluências, pesos que oferecem recursos de experimentação de sentimentos, ideias e conhecimento. Outros elementos passam a compor essa miscelânea de descobertas: músicas com instrumentos diversos, figurinos coloridos personificando os papéis, objetos cênicos com texturas, espessuras e formatos inusitados, espaços com cenários provocativos e histórias que alimentam o todo da imaginação da exploração da potência corporal.

Operação permanentemente dialógica que inclui todos os envolvidos no processo educativo, a dança e o jogo de faz de conta, em sua diversidade de manifestações, provoca uma possibilidade lúdica de uma linguagem artística pro-vocada pela reflexão e criação corporal, pelos papéis que as crianças representam, pelas interações entre pares, pela mediação dos/as professores a qual as crianças se apropriam se fazendo produtoras do enredo, tal qual o são quando brincam.

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Roberta Gaio | Tamiris Lima Patrício (org.)

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WIGMAN, Mary. La language de la danse. Paris: Papiers, 1986.

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DANÇA COMO LINGUAGEM E EXPRESSÃO NA ESCOLA: AÇÕES CRÍTICAS E CRIATIVAS

Roberta Gaio Paloma T. F. Rocha

Ninguém escapa da educação. Em casa, na rua, na igreja, ou na escola, de um modo ou de muitos todos nós envolvemos pedaços da

vida com ela: para aprender, para ensinar, para aprender – e – ensinar. Para saber, para fazer, para ser ou para conviver, todos os

dias misturamos a vida com a educação. (BRANDÃO, 2007, p. 7).

INTRODUÇÃO

No desenvolvimento humano podemos considerar a escola como o espaço que possibilita trocas e aprendizados que constroem e fortalecem os conhecimen-tos que fazem parte da sociedade, na qual o sujeito se insere. É nesse espaço que culturas e significados são reafirmados e novos saberes são produzidos, criando e recriando novos comportamentos, hábitos e práticas. Na escola o ser humano amplia suas habilidades, ensina sobre seus conhecimentos, consolida princípios e acrescenta diariamente novas informações que dão alicerce a sua cultura.

Neste capítulo, apresentamos a escola como espaço de formação, que além de ensinar e consolidar novas aprendizagens, também retrata atuais e tra-dicionais culturas que permeiam a comunidade. Será utilizado como referencial abordagens críticas de Educação e Educação Física, articulando com o conjunto de conhecimento disposto em Legislações (Lei de Diretrizes e Bases da Edu-cação Nacional – 9394/96, História e Cultura Afro-Brasileira, Lei 10.639/03) e na Base Nacional Comum Curricular proposta para Ensino Fundamental.

Ao percorrer pelo entendimento de escola como espaço crítico abordamos o conceito de Projeto Político Pedagógico, formação docente e perspectivas práticas de atuação profissional. Adentrando no trabalho docente apresentamos a Dança como manifestação corporal, culturalmente, construída e ressignificada.

Na escola além dos/as professores/as, os/as alunos constroem saberes e apresentam seus conhecimentos a partir de comportamentos, movimentos

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e gestos que analisaremos a partir da perspectiva da dança. Nesse sentido, utilizamos como referencial a obra Os sete saberes necessários à educação do futuro de Edgar Morin.

Atenção à complexidade e um olhar detalhado para temas fundamentais que norteiam a educação brasileira são indispensáveis para um encaminhamento crítico e reflexivo do projeto pedagógico de uma escola e das práticas educativas dos professores no trabalho de qualquer conteúdo, inclusive no ensino da Dança.

Apresentamos possibilidades práticas aos/as docentes que se permitirem ampliar o olhar e refletir sobre o ensino da dança considerando-a uma linguagem e expressão de sentimentos, desejos, conhecimentos, entre outros. Apesar de indi-carmos possibilidades, ressaltamos a autonomia docente como princípio básico na prática educativa. Analisar, avaliar e propor ações pedagógicas adequadas aos/as alunos exigem conhecimentos que reforçam a importância do/a professor/a.

ESCOLA: QUE ESPAÇO É ESSE?

Falar sobre escola é abordar um assunto no qual todos e todas podem expressar uma opinião. A vivência nesse espaço é parte da memória de homens e mulheres, de pais e mães, de avós e avôs. Considerando a diversidade de interesses, análises, desejos e objetivos, trataremos de assunto na mesma lógica, a partir de um olhar complexo.

E neste caminho de construções e desconstruções encontramos diferentes possibilidades para o papel que deve ser assumido por uma escola. Começando pelo olhar daquele que ensina, do docente que promove aprendizagem, que articula conhecimentos, que estipula regras pedagógicas e disciplinares e que inevitavelmente estará envolvido, por vezes vulnerável, outras vezes fortalecido, nas concepções pedagógicas que norteiam as práticas da gestão, das famílias, dos alunos... enfim, de toda comunidade escolar.

O/A professor/a, com papel fundamental na concepção de escola, poderá ser quem direciona ou indica os caminhos e entendimentos que serão construí-dos e ressignificados na sociedade. Sua percepção e atuação poderá impactar diretamente na leitura sobre o espaço escolar. Poderíamos associar, sem receio de equivocar-se, a imagem do/a professor/a a definição de escola concebida pelos jovens alunos/as que frequentam o espaço e usufruem de suas possibilidades.

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Sua imagem construída entre discentes fortalece a compreensão e abre espaço para um olhar positivo ou negativo sobre o que a instituição representa na vida desses discentes do “lado” de fora de seus muros. Nesse sentido alertamos para a importância da figura docente na construção de um imaginário e concreto cenário que fará parte do entendimento do papel da escola e suas contribuições.

Os/As alunos/as que frequentam, diariamente, absorvem novos hábitos e incorporam à escola novos sabores, novas texturas, novos recheios e principal-mente, novas receitas! São eles que dão a vida necessária aos projetos, intenções, objetivos que são planejados e organizados. Eles/elas que movimentam o ensino e a aprendizagem, tornando-o um processo no qual detalhes são importantes e cada peça é fundamental para que o sucesso seja atingido. A escola seria uma grande engrenagem e o/a aluno/a, o movimento que a faz funcionar e gerar potência.

A cultura é fator fundamental no desenvolvimento de cada instituição escolar, ela impacta criando e recriando novo imprinting cultural em todos que fazem parte e nela se relacionam. Morin (2013, p. 31) explica: “O imprinting cultural marca os seres humanos desde o nascimento, primeiro com o selo da cultura familiar, da escolar em seguida, depois prossegue na universidade ou na vida profissional”. Sua marca é estabelecida no convívio e na imposição de comportamentos que são sistematicamente organizados e cultivados.

Essa cultura também se manifesta em conhecimentos e a escola é local que impõe em sua concepção a ideia de ensino e aprendizagem. Moreira; Silva Junior (2017, p. 490) alertam que o conhecimento é meio pelo qual o sujeito se constrói cidadão, engajado e “livre para o trânsito social”.

A cultura proposta pode ser aquela que oprime e limita o sujeito a ampliar seu olhar e suas possibilidades no mundo real, fora da escola. E o conhecimento será a mola propulsora que mobilizará o sujeito de forma a ampliar suas condi-ções, construindo e reconstruindo sua história e a vida de pessoas ao seu redor.

Em Moreira; Silva Junior (2017, p. 490) temos:

Para transitar no mundo social, tornando-se cidadão engajado e interagindo com diversos sujeitos em dife-rentes espaços, esse aluno precisa dominar determinados conhecimentos que atuem como passaporte para o livre trânsito social.

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Na escola o conhecimento científico é orientado por currículos que estabelecem ideias, conceitos e objetivos de formação, tendo em vista um tipo de sujeito e um tipo de sociedade. Nela, inevitavelmente, estará presente dife-rentes orientações que concebem o ser humano de forma múltipla e que busca a torná-lo compatível com as necessidades atuais no mundo em que vivemos.

O conhecimento escolar ocupa um papel central nas teo-rias de currículo. É por meio dele que se pode transmitir, interrogar e repensar o legado construído para as futuras gerações. Pretende-se favorecer às novas gerações o acesso crítico ao conhecimento acumulado pelas gerações ante-riores, bem como habilitá-las a construir novos conhe-cimentos. (MOREIRA; SILVA JUNIOR, 2017, p. 490).

Alunos/as, professores/as, famílias, comunidade, gestão e todos os/as funcionários/as integram um sistema que cria culturas e que também fortalece as práticas multiculturais que fazem parte do cotidiano escolar.

Além de agentes influenciadores, os/as alunos/as a partir de seus inte-resses pessoais e pertinentes a faixa etária, auxiliam na construção dos objetivos escolares e dos papéis que poderão ser atribuídos a escola. Uma instituição de Educação Infantil não tem a mesma função, objetivo e organização que uma escola de Ensino Médio. Essa diferença se manifesta prioritariamente em virtude de existir uma busca em adequar o “espaço” escolar as expectativas e interesses dos discentes. A procura por tornar-se um local interessante e motivante pode ser detectado em documentos curriculares que orientam o ensino de instituições públicas e privadas em âmbito nacional ao apresentar a Educação Básica com preocupações em acolher e reconhecer singularidades e diversidades:

Reconhece, assim, que a Educação Básica deve visar à formação e ao desenvolvimento humano global, o que implica compreender a complexidade e a não linearidade desse desenvolvimento, rompendo com visões reducionis-tas que privilegiam ou a dimensão intelectual (cognitiva) ou a dimensão afetiva. Significa, ainda, assumir uma visão plural, singular e integral da criança, do adolescente, do jovem e do adulto – considerando-os como sujeitos de aprendizagem – e promover uma educação voltada ao seu acolhimento, reconhecimento e desenvolvimento pleno, nas suas singularidades e diversidades. Além disso, a escola, como espaço de aprendizagem e de democracia

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inclusiva, deve se fortalecer na prática coercitiva de não discriminação, não preconceito e respeito às diferenças e diversidades. (BRASIL, 2018, p. 14)

No sentido do que é proposto pela Base Nacional Comum Curricular, é preciso pensar em uma escola que atenda diferentes públicos e que compreenda que seu papel está em oferecer subsídios que favoreçam o desenvolvimento do ser humano em diferentes perspectivas, tais como emocional, social, cultural, psicológica e cognitiva. Em uma visão tradicional de ensino a instituição escolar se dedicava a ampliar o acervo de conhecimento conceitual, disciplinando os corpos a partir de uma estrutura educacional em que hierarquicamente o conhecimento era transmitido. Moura; Silva Junior (2017) ressaltam mudanças que ocorreram na contemporanei-dade que geraram novas identidades sociais, antes despercebidas, agora com pulsão latente exigindo novos posicionamentos. Os autores apresentam como uma:

(...) explosão de novas identidades políticas, centradas na ascensão do feminismo, nas identidades gays e lésbicas, na valorização da identidade negra, na migração de habitan-tes de regiões pobres para outras ricas, provocando grande impacto nas visões de mundo tradicionais.”(MOURA, SILVA JÚNIOR, 2017, p. 493)

Considerando uma educação libertadora e emancipatória é preciso pensar no sujeito com suas singularidades. E, ainda mais, pensar na ampliação das possibilidades de aplicação do conhecimento trabalhado, proporcionando não só o acesso, mas espaço para uso e ressignificação de práticas concebidas socialmente. Para se reescrever histórias e futuros é preciso que a escola assuma uma posição de alavanca, projetando nos alunos a criticidade esperada para uma verdadeira transformação social.

Morin (2013) nos alerta para um fator fundamental na construção de conhecimento e de novas ideias. Interagir com o conhecimento e/ou teoria não é aceitá-la e reproduzi-la somente. “Uma ideia ou teoria não deveria ser simplesmente instrumentalizada, nem impor um veredicto de modo autoritário; deveria ser relativizada e domesticada.” (MORIN, 2013, p. 32)

Nesse sentido, atribuímos a escola o papel de instrumento para proble-matizar conhecimentos já adquiridos e novas aprendizagens com as necessidades reais e cotidianas de cada sujeito. A luta contra ideias que domesticam e não libertam deve ser permanente.

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Morin (2013) indica a necessidade de perseguir as interrogações durante a prática do conhecer, pois ela representa o “respiro” necessário para a absorção desintoxicante de um conhecimento chamado por ele de complexo. Ele é incerto e determinado pelas diferentes condições a que o ser humano é submetido, considerado por Morin (2013, p. 35) “problema-chave: instaurar o convívio tanto com nossas ideias quanto com nossos mitos”. Com isso, o erro e a ilusão podem ser variados e permanentes, por isso a necessidade de uma escola que permita o conhecimento de forma ampla e complexa.

O pensamento complexo integra os modos de pensar, opondo-se aos mecanismos reducionistas. Considera todas as influências recebidas, internas e externas, e ainda enfrenta a incerteza e a contradição, sem deixar de conviver com a solidariedade dos fenômenos existentes. Enfatiza o problema, não a solução. (PETRAGLIA, 2001, p. 23).

A complexidade de uma escola se apresenta no emaranhado de dife-renças que a constitui. Não há padrão, não há ordem. Há multiplicidade e diversidade. As instituições escolares possuem diferenças significativas entre elas. Diferentes espaços físicos, diferentes mobiliários, diferentes localidades, diferentes comunidades, diferentes orientações educacionais (educação pública / educação privada), diferentes currículos, diferentes gestores, diferentes famílias, diferentes alunos. Em um espaço construído diante de tantas particularidades não é possível construir uma única forma de definição de escola, trata-se de um espaço que é definido por todos aqueles que participam e integram o local.

Nesse sentido, podemos considerar a escola um espaço múltiplo e flexível. Que se molda e se constrói diariamente, seja nas práticas pedagógicas, seja nas relações estabelecidas em seu cotidiano. Por isso, torna-se fundamental a atenção na escolha dos hábitos e das práticas que serão fomentadas e disseminadas no espaço, valorizando a multiplicidade de formas, desejos, vontades que são devem ser absorvidas por aqueles que compõe a comunidade escolar.

Lembramos que é importante destacar que apesar das diferenças inevitá-veis que vão existir entre todas as escolas, ela ocupa espaço indispensável na vida de todos os indivíduos. O ensino e a aprendizagem que lá ocorrem são valiosos e necessários para a formação intelectual, social e emocional de todos os alunos que lá depositam suas esperanças – “.. a educação deve promover a “inteligência

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geral” apta a referir-se ao complexo, ao contexto, de modo multidimensional e dentro da concepção global.” (MORIN, 2013, p. 38).

PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO: INDICATIVOS PARA AÇÃO PEDAGÓGICA

Apresentamos uma concepção de escola que traz elementos importantes para compreendermos que o Projeto Político Pedagógico é fundamental para atender as necessidades particulares da equipe educacional que gerencia e pro-move práticas educativas que visam o desenvolvimento de crianças e jovens. Nele, deverá estar presente as intenções, objetivos e interesses de formação que envolverá toda a equipe escolar. Sua construção deve levar em consideração as demandas da comunidade escolar e adequar-se as condições e estrutura local.

Todo Projeto Político Pedagógico deve ser único e exclusivo. A originali-dade se dá na medida que se propõe algo que seja pertinente aquele determinado público. Desde equipe pedagógica até aos alunos e suas famílias. Sua organização deve atender as indicações presentes nas legislações que organizam o Sistema Educacional Brasileiro, bem como as orientações curriculares que direcionam e explicitam formas de se pensar a educação em nível federal, estadual e municipal.

O planejamento e conhecimento sobre cada etapa presente neste docu-mento deve ser parte do trabalho realizado pela equipe gestora, fortalecendo a conexão dos docentes com o material que deve direcionar o trabalho realizado. Devem estar atentos as mudanças que ocorrem na equipe, apresentando e orientando para que a articulação seja mantida entre todos os participantes.

Docentes, funcionários/as, alunos/as e famílias devem participar da sua elaboração e atualização, buscando incorporar uma identidade que atenda as necessidades identificadas e a formação desejada. Essa participação deve ser organizada de forma que o conhecimento sobre o projeto atenda as legislações vigentes e aos conhecimentos atualizadas sobre as diversas práticas escolares.

Mesmo que considerada a necessidade de atuação de toda a comunidade escolar, o conhecimento específico de cada área deverá ser escolhido e sistema-tizado por especialistas que compreendam as exigências para uma formação crítica e emancipada dos alunos. Nesse sentido, as escolhas deverão levar em

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consideração estratégias adequadas as peculiaridades dos alunos, estando sensível as necessidades de alterações e mudanças durante o processo.

Ao projetar ações que sejam pertinentes a formação de forma individualizada é possível que recaia a um ensino reducionista, pois a análise poderá estar sendo da parte e não do todo. Morin (2013) chama atenção aos prejuízos da hiperespecialização que fragmenta e prejudica a visão global e essencial. Na organização de conteúdos e objetivos educacionais é preciso considerar que o conhecimento não é isolado e sim parte de um complexo sistema que auxiliará o indivíduo em seu cotidiano se sua compreensão atender demandas da múltipla sociedade em que vive – “Não se trata de abandonar o conhecimento das partes pelo conhecimento das totalidades, nem da análise pela síntese; é preciso conjugá-las.” (MORIN, 2013, p. 44)

Um dos grandes desafios no planejamento realizado no interior de cada escola está na articulação das áreas de conhecimento com as necessidades cotidia-nas dos/as alunos/as. Essa junção deve levar em consideração que há significados atribuídos em cada saber trabalhado, que não foi produzido de forma isolada e que poderá ser satisfatoriamente utilizado se sua fundamentação ocorrer de forma conectada. E, considerando que cada profissional tem formação, histó-rico e uma análise de mundo diferente, essa passa ser uma grande dificuldade enfrentada por todas as instituições de ensino.

Para absorver a proposta pedagógica da instituição e pensar no ensino con-siderando o todo é necessário que os docentes e gestores mantenham-se em um processo formativo constante, adequando-se sempre que necessário a novas exigências. A sensibilidade e a criatividade no processo de ensino e de aprendizagem devem ser parte da formação docente, que deverá tem em vista a complexidade de saberes que uma instituição escolar está envolvida, bem com sua magnitude na sociedade.

DANÇA: UM CONTEÚDO DA ARTE E DA EDUCAÇÃO FÍSICA

A dança é uma linguagem artística, que na escola se insere como con-teúdo das áreas de Educação Física e Arte. Apesar disso, sempre foi renegada a segundo plano e até mesmo desvalorizada, quando se trata de pensar em conteúdos fundamentais para formação profissional de crianças e jovens. Mas como já se refletiu neste texto, a escola é um espaço de ser, de viver e de conviver,

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portanto não está em foco, somente, a formação para o trabalho, dos sujeitos que nela vivem, mas também, a formação pessoal, isto é, o desenvolvimento das melhores qualidades humanas, da educação infantil até o ensino médio. Strazzacappa (2001, p. 69) refletindo sobre a dança na escola diz:

O indivíduo age no mundo através de seu corpo, mais especificamente através do movimento. É o movimento corporal que possibilita às pessoas se comunicarem, traba-lharem, aprenderem, sentirem o mundo e serem sentidos. No entanto, há um preconceito contra o movimento. (...)A noção de disciplina na escola sempre foi entendida como “não movimento”. As crianças educadas e comporta-das eram aquelas que simplesmente não se moviam. (...) Atualmente, são raros os estabelecimentos escolares que mantêm este tipo de atitude, encontrado ainda apenas em escolas de cunho religioso e em algumas escolas públicas de cidades pequenas do interior do estado. Nas escolas da rede pública das grandes cidades, esta reali-dade já não existe. Apesar da ausência destas atitudes disciplinares, a ideia do não-movimento como conceito de bom comportamento prevalece. Muitas escolas aboliram as filas e os demais símbolos de respeito a diretores e professores; no entanto, foram criadas outras maneiras de se limitar o corpo.

Há uma grande relação entre educação e arte, pois ambas fazem parte da cultura, e a escola é um espaço de aprendizagem cultural e como nos coloca Charlot (2013, p. 23): “esses campos pertencem a uma mesma sociedade e, por conseguinte, deve-se considerar que ambos expressam essa sociedade, ainda que seja de modo específico”.

Na escola, todos os conteúdos que suscitam vivências práticas pedagógicas, como é o caso da dança, devem promover reflexão, criação, apreciação, recriação e entendimento, para além do fazer somente movimentos rítmicos, repetitivos e sem significados. Se a arte está inserida na sociedade e como manifestação cultural espelha essa mesma sociedade, a cada tempo histórico, fruto dos aconte-cimentos sociais, políticos, econômicos, culturais, entre outros aspectos, a dança se modifica, ocupa outros espaços, se esconde, luta por sentidos e assim, segue pari passo a estruturação da humanidade.

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A dança se materializa na existência corpórea humana e por meio dela se faz presente nas sociedades, de diversas culturas e infinitas formas. O ser humano fala por meio do corpo que dança!

Dançar...essa arrebatadora forma de expressão que nos faz entrar em contato com nossa realidade humana imperfeita, inexplicável e tão maravilhosamente plástica. Pensar a dança é pensar nos muitos momentos em que a comunicação escrita ou falada não foi suficiente para expressar as angústias ou o desejo de poetizar. (POR-PINO, 2006, 28)

Dançar é muito mais do que simplesmente se movimentar, é se expressar, é trazer à baila o que crianças e jovens, sentem, pensam, vivem, se incomodam, desejam, entre outros anseios que denotam o lugar da fala ou até da escrita, de quem pensa a dança como uma forma de linguagem.

A dança no espaço escolar busca o desenvolvimento não apenas das capacidades motoras das crianças e adolescen-tes, como de suas capacidades imaginativas e criativas. Ao contrário, o corpo expressa suas emoções e estas podem ser compartilhadas com outras crianças que participam de uma coreografia de grupo. (STRAZZACAPPA, 2001, p. 71)

É muito importante que os/as professores possam, primeiramente, enten-der o lugar da dança na educação, entender a dança como arte e não como um exercício físico apenas e, se preparar para dar vozes aos/as alunos/as, se colocando como mediador/a no processo de improvisação, criação, construção e outros aspectos da dança na escola, pois “a dança faz sentido e cria novos sentidos, tanto para aquele que dança quanto para aquele que aprecia.” (PORPINO, 2006, p. 28)

Como disse a autora, a dança precisa fazer sentido para os/as alunos/as, não pode ser um produto acabado, pronto, como as coreografias que chegam já elaboradas para serem somente digeridas em aulas de educação física ou de arte na escola. A dança precisa nascer de um processo dialógico, entre alunos/as e professor/a, pensada, construída e vivenciada em sala de aula, como arte, para além de movimentos mecanizados, robotizados e vazios.

A arte encontra-se além do espaço escolar, mas deve ser compreendida e inserida de forma efetiva na Edu-cação escolar, participando, enquanto possibilidade de

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desenvolvimento, na contínua construção do conheci-mento e da transformação dos educandos e educadores nas diferentes regiões do Brasil. (GOIS; QUEIROZ; GAIO, 2013, p. 48)

Apesar de não constar, especificamente, a dança como arte na Educa-ção Infantil, os campos de experiências presentes na Base Nacional Comum Curricular (BNCC) propiciam a vivência do ritmo, do corpo em movimentos diversos, o lúdico como forma de ser e estar no mundo. Nesse período, a criança está o tempo todo a dançar, a representar personagens fruto da sua imaginação, a cantar, encantar e a viver ritmicamente pelos espaços dos brinquedos e das brincadeiras. Há, com certeza, uma forma muito especial de trabalhar a dança com esses seres pequenos, criativos e rítmicos. A ideia central é brincar de dançar e dançar brincando e assim aprender a ser, a conviver e a conhecer, como forma de se apoderar de conhecimento.

Brincar é, sem dúvida, uma forma de aprender, mas muito mais que isso. Brincar é experimentar-se, relacionar-se, imaginar-se, expressar-se, compreender-se, confrontar-se, negociar, transformar-se, ser. Na escola, a despeito dos objetivos do professor e de seu controle, a brincadeira não envolve apenas a atividade cognitiva da criança. Envolve a criança toda. É prática social, atividade simbólica, forma de interação com o outro. Acontece no âmago das disputas sociais, implica a constituição do sentido. É criação, desejo, emoção, ação voluntária. (FONTANA; CRUZ, 1997, p. 139)

A BNCC apresenta seis direitos de aprendizagem e desenvolvimento para as crianças na educação infantil, para assegurar “as condições para que as crianças aprendam em situações nas quais possam desempenhar um papel ativo em ambientes que as convidem a vivenciar desafios e a sentirem-se provocadas a resolvê-los, nas quais possam construir significados sobre si, os outros e o mundo social e natural” (BRASIL, 2018, p. 33) São eles: conviver, brincar, participar, explorar, expressar e conhecer-se.

Já os campos de experiências são cinco e “constituem um arranjo curri-cular que acolhe as situações e as experiências concretas da vida cotidiana das crianças e seus saberes, entrelaçando-os aos conhecimentos que fazem parte do patrimônio cultural.” (BRASIL, 2018, p. 36) São eles:

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1. O eu, o outro e o nós - primeiras relações sociais, descobre a si, entende os outros enquanto diversidade e se harmonizam coletivamente;

2. Corpo, gestos e movimentos - enquanto corpo, produzem e aprendem conhecimentos, se expressam e se comunicam;

3. Traços, sons, cores e formas – “Conviver com diferentes mani-festações artísticas, culturais e científicas, locais e universais, (...) vivenciar diversas formas de expressão e linguagens, como as artes visuais (pintura, modelagem, colagem, fotografia etc.), a música, o teatro, a dança e o audiovisual, entre outras. (BRASIL, 2018, p. 37, grifo nosso);

4. Escuta, fala, pensamento e imaginação – potencialização da fala e da escuta, valorizando a participação na cultura oral;

5. Espaços, tempos, quantidades, relações e transformações – apren-dizagem da sua existência no espaço (rua, casa, entre outros) e no tempo (dia, noite, semana, datas, entre outros), na sua relação com o mundo nos diversos aspectos físico, sociocultural, entre outros.

Mas é somente no Ensino Fundamental I, que a BNCC (BRASIL, 2018) traz a Arte como componente curricular, centrada nas seguintes lingua-gens: artes visuais, dança, música e teatro. No referido documento encontra-se assim descrito:

Essas linguagens articulam saberes referentes a produtos e fenômenos artísticos e envolvem as práticas de criar, ler, produzir, construir, exteriorizar e refletir sobre formas artísticas. A sensibilidade, a intuição, o pensamento, as emoções e as subjetividades se manifestam como formas de expressão no processo de aprendizagem em Arte. O componente curricular contribui, ainda, para a interação crítica dos alunos com a complexidade do mundo, além de favorecer o respeito às diferenças e o diálogo intercultural, pluriétnico e plurilíngue, importantes para o exercício da cidadania. (BRASIL, 2018, p. 193)

Em outro momento o documento se preocupa em afirmar que o ensi-no-aprendizagem das linguagens da Arte não pode estar condicionado à cultura midiática somente e, tampouco focada em técnicas e estilos, unicamente. Fala de uma aprendizagem cultural crítica, criativa, reflexiva, diversificada. E podemos

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acrescentar, “significativa centrada na corporeidade, sendo esta existencial. A existência se consagra na razão, na sensibilidade, na motricidade, na relação consigo mesmo, com os outros e com o mundo”. (GAIO et al, 2010, p. 44)

Já na Educação Física, que também é um componente curricular da área do conhecimento das linguagens, a dança aparece como uma das seis unidades temáticas.

(...) a unidade temática Danças explora o conjunto das práticas corporais caracterizadas por movimentos rítmi-cos, organizados em passos e evoluções específicas, muitas vezes também integradas a coreografias. As danças podem ser realizadas de forma individual, em duplas ou em grupos, sendo essas duas últimas as formas mais comuns. Diferentes de outras práticas corporais rítmico-expres-sivas, elas se desenvolvem em codificações particulares, historicamente constituídas, que permitem identificar movimentos e ritmos musicais peculiares associados a cada uma delas. (BRASIL, 2018, p. 218)

Isso nos remete a Morin (2001, p. 14) e seus sete saberes da educação do futuro, quando reforça a necessidade de pensarmos os princípios do conhe-cimento pertinente, quando diz:

A supremacia do conhecimento fragmentado de acordo com as disciplinas impede frequentemente de operar o vínculo entre as partes e a totalidade, e deve ser substituída por um modo de conhecimento capaz de apreender os objetos em seu contexto, sua complexidade, seu conjunto. (...) É preciso ensinar os métodos que permitam estabe-lecer as relações mútuas e as influências recíprocas entre as partes e o todo em um mundo complexo.

A dança é, ao mesmo tempo, uma linguagem da Arte e uma unidade temática da Educação Física, o que possibilita trabalhos interdisciplinaridades, com troca e reciprocidade entre as disciplinas ou até mesmo Multidisciplina-ridades e/ou Transdisciplinaridade, com interligações de várias áreas na cons-trução do conhecimento. Interessante seria a organização de um evento, como por exemplo, um Festival de Dança, como um espaço de ensino-aprendizagem, com participação de outros componentes curriculares da área de conhecimento das linguagens ou outras áreas, entre elas as Ciências Humanas, no intuito de

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superar a fragmentação do saber e propiciar a apropriação do conhecimento na sua totalidade.

Estudiosos comprovam a relevância dos Festivais para crianças, jovens e adultos, no que se refere ao aspecto formativo-educativo, como espaço de conhecimento cultural, como socialização e intercâmbio de linguagens artísticas, entre outros aspectos. Muitos são os festivais, nacionais e internacionais, em especial de Ginástica Para Todos (modalidade que inclui a dança) que mostram o quanto vivenciar, apresentar, apreciar e fruir contribui para o desenvolvimento humano. Patrício et al (2016, p. 200) destacam que os

(...) Festivais que, sobretudo na Europa, se destacaram em diferentes países, como o festival Deutches Turnfest (Alemanha desde 1860), Landsstaevne (Dinamarca desde 1862) e Slets (República Tcheca desde 1882). Em cada país, os festivais elucidam situações do contexto sócio--político e permitem a compreensão das singularidades de cada um deles.

Entretanto, um trabalho interdisciplinar pede conhecimento da dinâmica a ser utilizada, para que as conexões entre os saberes possam acontecer. Fazenda (2015, p. 12) nos sinaliza para a diferença existente entre interdisciplinaridade escolar e científica, fundamental para o trabalho do professor/a na escola, pois na “interdisciplinaridade escolar a perspectiva é educativa, assim os saberes escolares procedem de uma estruturação diferente dos pertencentes aos saberes constitutivos das ciências. Na interdisciplinaridade escolar as noções, finalidades, habilidades e técnicas visam favorecer, sobretudo, o processo de aprendizagem respeitando os saberes dos alunos e sua integração”.

Assim, percebe-se que dança tem lugar garantido na escola por direito, precisa ser trabalhada de fato, e isso envolve conhecimento, estudo e preparação.

REFLEXÕES PARA UMA AÇÃO CRÍTICA E CRIATIVA EM DANÇA

A arte propicia ao ser humano uma perturbação do pensamento acerca do seu existir, do mundo e dos diversos aspectos que envolvem o ser e estar no mundo, tais como cultural, social, econômico, político, biológico entre outros. Fazer arte requer uma reflexão sobre o que e como produzir, além de porquê e

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para quem você está produzindo. É um amplo processo que deve ser valorizado na escola, quando se trata de aprender, estudar e experimentar dança, seja na disciplina de Educação Física, de Arte ou em propostas interdisciplinares, o que seria o mais adequado e enriquecedor.

O corpo fala na dança, expressa sentimentos, desejos, conflitos, para além da escrita e da comunicação verbal, e isso deve ser valorizado na escola. Não é o/a professor/a que define o que os/as alunos/as devem falar, desejar ou sentir, pois ele/ela é apenas um mediador/a de um processo de reflexão, construção, criação e interpretação. A criatividade na escola, em momentos de dança, deve nascer de um processo coletivo, fruto de diálogos, nos quais o mais importante não deve ser um estilo específico de dança e nem técnicas (não que isso não possa também ser perseguido), mas o fundamental é que os movimentos expressivos possam se transformar em vozes reais a buscar realizações e transformações.

Na dança, percebemos o desejo de movimento desper-tado, tornar-se realidade. O sentir se faz pensamento, o pensamento se faz ação, não a partir de uma hierarquia, talvez imersos numa continuidade descontínua ou numa descontinuidade contínua, porém não separados. O movi-mento é pensante e sensível simultaneamente. Sentir, pensar e agir se imbricam, são recursivos, dialogam e se resignificam mutuamente e constantemente no dançar. (PORPINO, 2006, p. 68)

Abaixo ousamos oferecer algumas sugestões, não como propostas fechadas, pois cada trabalho pedagógico deve considerar o espaço (sua escola, enquanto realidade concreta de determinado lugar), o tempo e os seres humanos (seus/suas alunos/as e a fase que se encontram na educação básica) e o plano de ação, que deve emergir em sala de aula, a partir das orientações e do retorno que emana do diálogo entre o/a professor/a e os/as alunos/as.

Para pensar no trabalho com dança na escola, partimos das dimensões a serem trabalhadas, a partir da vivência da dança como componente curricular de Arte na escola (que vale, também, para Educação Física), segundo a Base Nacional Comum Curricular (BRASIL, 2018) que são: criação, crítica, estesia, expressão, fruição e reflexão.

A primeira sugestão pedagógica é a criação como componente que estimula o pensar, sentir e agir e faz a dança acontecer. A sugestão é que o/a

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professor/a possa se apoderar dos conhecimentos sobre o domínio do movi-mento proposto por Rudolf Laban, tais como objetivos tangíveis e intangíveis (concreto e abstrato); fatores do movimento (peso, espaço, tempo e fluência); níveis de movimento (alto, médio e baixo), entre outros.

Estimule a improvisação a partir tarefas individuais e coletivas, que levem os/as alunos/as a se movimentarem em busca de:

1. Objetivos tangíveis (como por exemplo, dançar com livro, porque se vai na escola para adquirir conhecimento) e intangíveis (como por exemplo dançar para mostrar que o conhecimento traz a pos-sibilidade de transformar o mundo);

2. Movimentos que enfatize o espaço (amplo, restrito, em diversas direções, em duplas, trios, pequenos e grandes grupos em círculo e figuras geométricas diversas, );

3. Movimentos com variações rítmicas no tempo, acento e subdivisão do tempo ou variando os estilos de músicas, para que movimentos diferentes surjam. Brinque de seu/sua mestre/a mandou, em grupo de 4 ou 5 ou 6 e numerando os/as participantes, de tal forma que se pode chamar o número que será o/a mestre/a e criará o movimento para os/as demais do seu grupo;

4. Movimentos com variações de fluência – ações contínuas, interrom-pidas, indo e voltando, posições estáticas e em movimento;

5. Movimentos com variações de peso: posições diversas de equilíbrios, saltos e transferências do peso do corpo.

A segunda sugestão pedagógica está relacionada a expressão corporal, fundamental para a dança se transformar em arte, para além de movimentos mecânicos, imitativos e repetitivos. Segundo Laban o ser humano se diferen-cia dos demais animais na intencionalidade do movimento, pois enquanto os diversos animais têm seus movimentos por instinto, definidos por necessidades cotidianas, relacionados a estímulos externos; o ser humano se movimenta a partir de qualidades próprias, advindas da sua condição humana e esses movimentos comunicam e expressão o seu interior. (LABAN, 1978)

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A dança é uma linguagem artística que se materializa a partir dos sen-timentos e emoções que cada criança e jovem traz no seu interior. Não faz sentido solicitar que as crianças mostrem alegria se isso é um pedido e não uma movimentação genuína. Proponha uma tarefa coletiva, na qual cada grupo deve escolher uma música, definir as emoções que emanam do ritmo escolhido e demostre isso por meio de movimentos para a classe. Está em jogo a criação coletiva, a expressão de cada grupo e a apreciação dos trabalhos realizados.

A terceira atividade está relacionada ao fator crítica que é fundamen-tal num trabalho em dança na perspectiva da arte-educação, pois a dança na escola precisa ser um instrumento para transformação e crescimento humano. A sugestão é a construção de um projeto transdisciplinar, no qual o trabalho com a dança proporcione a religação de conhecimentos, sem destruir as disci-plinas, trazendo temas contemporâneos fundamentais para o ensinamento da condição humana, como nos propõe Morin (2001) como um dos sete saberes para educação do futuro. Como exemplo pode-se trazer as danças folclóricas nacionais, danças afro-brasileiras e até mesmo as danças do Movimento Hip Hop, que tanto influenciou nossa cultura do Funk, com intuito de promover o entendimento das manifestações nacionais e grandes contribuições de outros povos na construção da nossa cultura. Conhecer sua realidade criticamente e entender as possibilidades de transformações e crescimento.

A reflexão como a dinâmica de perturbar os pensamentos é uma tarefa presente nas diversas propostas pedagógicas apresentadas para o trabalho com dança. Ela antecede a criação, a expressão e até mesmo a crítica. A ideia é trazer temas contemporâneos que possam instigar trabalhos práticos-pedagógicos de dança ou trabalhos sobre dança. Indicamos alguns temas, entre tantos, tais como:

1. A dança é coisa de meninos ou de meninas? Pode ser para os dois? A temática de gênero deve estar presente em aulas de dança, para quebrar o paradigma sexista muito forte em espaços de movimentos, em especial nas aulas de Educação Física;

2. A contribuição étnica dos africanos nas construções culturais brasi-leiras, valorizando assim a cultura afro-brasileira presente em danças típicas do Brasil, como o frevo, o samba, o jongo, entre outras. Não

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basta constatar a diversidade da condição humana, em especial, do povo brasileiro. Há que se ensinar o amor a essa diversidade;

3. Danças de diversos lugares do planeta, trazendo um conhecimento amplo sobre tempo (história), espaço (geografia), sentido (literatura, poesia) e movimentos (cultura corporal) nas vivências dessas mani-festações. Conhecer o mundo dançando, eis o foco desta sugestão pedagógica;

4. Trabalhar as danças de salão e abordar as técnicas, em especial, a condução com uma outra roupagem, na perspectiva da condução compartilhada, a partir do entendimento da dança de salão como um diálogo. Discutir as relações de poder presente na sociedade patriarcal e a realidade atual que traz uma nova visão de sociedade;

5. Apresente a temática do Meio Ambiente para as crianças e para os jovens e lute pelo planeta por meio das danças. Pense sobre o tema, crie, apresente e deixe que espectadores/as possam aprender com o conhecimento construindo em sala de aula.

Muitas temáticas podem se transformarem em estímulos à espaços férteis para reflexões e criações, traduzidos em conhecimentos por meio da dança ou de dança.

Chegou o momento de pensar nas dimensões de fruição e estesia, tão importantes para a construção cultural e artística das crianças e jovens. Essas dimensões são, de certa forma, responsáveis pelo adulto consciente da relevância da Arte na sua vida, como um conhecimento sensível, que promove o compar-tilhamento de ideias.

Considerando a arte uma ferramenta essencial para a fruição do cotidiano, apreender a enxergá-la nas minucias, na vida em seus prazeres e enfrentamentos, exige uma educação do olhar que emerja dentre os movimentos, e que nesta percepção seja possível desfrutar da virtude da criação, nas mais diversas atividades. A arte na con-temporaneidade tem extravasado seus limites em busca da ampliação de seus códigos, encontrando na cultura a possibilidade de pactos sensíveis, fazendo com que desejos por transformações à altura de um devir poético, seja

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promovido na medida que se relaciona com o mundo, ansiando a liberdade. (CHECCHI et al, 2017, p. 534)

Eis a amplitude da dança enquanto arte na vida do ser humano, e o/a professor/a precisa ser mediador/a no ensino-aprendizagem das linguagens, pois só consegue ultrapassar o mero conhecimento do mundo na perspectiva do senso comum quem tem o privilégio de ter uma formação crítica, artística e humana, para além de possíveis conhecimentos técnicos relevantes. Nas pala-vras de Checchi et al (2017, p. 535) o potencial do trabalho com a arte para construção do ser humano:

Ao criarmos objetos artísticos, como um texto em que contamos uma história ou um movimento que faz do corpo poesia, nos deparamos com a intuição que em nós desponta como um traço de interioridade, e de impres-sões sobre o mundo e da vida que possuímos, ato que emana de um olhar sobre a vida, que através da arte se potencializa para admiração de si mesmo.

Assim a arte-educação na escola deve estimular uma educação dos sentidos, sensível o bastante para que crianças e jovens possam experimentar a existência corpórea por meio da dança, explorando mais que a visão, indo além, deixando fluir os movimentos por percepções diversas, pela audição, pelo tato e até mesmo pelas sensações advindas do olfato. Pura estesia, como nos coloca Duarte Junior (2003, p. 184), pois “(...) a relação sensível, estésica, com a nossa realidade, deve constituir o solo a partir do qual podem crescer e melhor se desenvolver as plantas da percepção artística (ou estética) da vida.

Ou ainda como acrescenta o mesmo autor, quando aborda o saber sensível como estesia da estética artística, dizendo:

“Quando a cabeça não pensa o corpo padece”, preceitua o antigo ditado. Entretanto, parece não ser menos ver-dadeiro o fato de que quando só a cabeça pensa o corpo fenece. (...)uma ação também pode acarretar sofrimentos se antecipada e tomada apenas e tão-somente no modo de sua representação abstrata, desconsiderando-se os apelos e avisos provenientes dessa sabedoria difusa detida por nossa carne. Sabedoria que às vezes é dita sentimento, às vezes intuição e às vezes até mesmo treino corporal puro e simples. Tais denominações, contudo, são costumeira-mente empregadas para denotar uma atividade de nosso

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corpo sempre tosca e primitiva, com qualidade inferior a qualquer conhecimento racional produzido pela ação de um cérebro que abstrai, ou seja, que se distancia de uma situação concreta e a representa simbolicamente. Assim, ao saber detido pelo corpo o homem moderno não cos-tuma emprestar prestígio, sequer lhe dando, no mais das vezes, a devida atenção e reconhecimento. No entanto, grande parte de nosso agir cotidiano fundamenta-se nesse saber corporal básico, primitivo em sua origem, mas com enorme potencial para ser desenvolvido e lapidado, ou seja, educado. (DUARTE JÚNIOR, 2003, p. 131)

Há uma diferença muito grande em relação aos/as alunos/as que expe-rimentam o trabalho de arte na escola, em especial de dança, numa perspectiva crítica e criativa, no qual as dimensões aqui abordadas estão presentes; daqueles/as que vivem a arte num ambiente essencialmente procedimental, sem reflexão, onde a dança sai como apenas sendo coreografias prontas para serem apresentadas em eventos, para agradar pais, que acreditam no espetáculo, sem perceberem sua característica alienante. Há que propor a dança mais do que apresentações em eventos comemorativos, pois como dizem Checchi et al (2017, 539):

Em ambientes escolares, dialogar com a cultura local e popular, exige o contato com as pessoas que dinamizam as experiências em pauta, para que não se abarque o vivido apenas pela superficialidade da expressividade artística, mas sim sua integralidade, ou seja, a manifestação da própria estesia como meio e suporte de aspectos que amparam um modo de viver e falar da vida.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Há sempre uma preocupação na hora de encerrar um texto, pois a ideia de fim, em especial, quando se trata de um assunto tão amplo, nos apavora. Mas se tem hora de iniciar a conversa, há, portanto que se finalizar, pelo menos momen-taneamente. Muitas pesquisas abordam a arte-educação na escola, mostram as limitações e alguns problemas, mas, também, apontam avanços e conquistas.

Em se tratando de dança, é certo afirmar que esse conteúdo é parte da disciplina de arte, como também, da Educação Física, pois ambas as áreas são componentes curriculares.

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Dança na Escola

Nossa preocupação está focada na ação pedagógica, com intuito de reafirmar a necessidade de um trabalho crítico (reflexivo) e criativo (voltado a autolibertação e a auto-expressão) e, para isso os/as professores/as precisam estar preparados/as.

Então nosso olhar se volta, nesse momento, para formação profissional, seja nos cursos de Pedagogia, Arte ou de Educação Física (licenciatura). A educação da estética, dos sentidos e artística deve ser repensada nesses cursos, ter um maior espaço, trazer leituras que possam ampliar a visão dos/das alunos/as no que diz respeito as linguagens da arte, em especial da dança, como uma manifestação da cultura, com um grande apelo sentimental, que nasce do interior humano e não somente do exterior, que busca a comunicação, enquanto divulgação de ideias e que, para além de técnicas e estilos (que são aspectos fundamentais), na escola deve ser um conhecimento que proporcione o encontro consigo mesmo, com o outro e com o mundo, enquanto realidade de uma sociedade que se estrutura a partir dos aspectos econômico, político e outros.

Dança como parte da cultura e essa “como um sistema de conheci-mentos, sentidos e significados, capaz de resgatar para as escolas no processo educacional, toda riqueza, experiência de diferentes formas de compreender e interpretar o real e a vida, despertando o interesse dos alunos por um objeto de estudo, a arte. (SILVA, 2011, p. 2091)

Dança como arte e cultura corporal de movimento na escola. O lugar dela já existe nos documentos que regem a educação básica no país, que possa-mos cada vez mais nos preparar para realização de um trabalho pedagógico que possibilite o desenvolvimento das melhores qualidades humanas de educandos/as. Um trabalho pedagógico em dança que promova uma educação do sensível, para além do inteligível, que promova encontros e comunicação entre corpos, com sentido e significados, pois a

A linguagem sensível configura possibilidades de outro arranjo para o conhecimento, expresso na dimensão estética. O logos estético exprime o universo da corpo-reidade, da sensibilidade, dos afetos, do ser humano em movimento no mundo, imerso na cultura e na história, criando e recriando, comunicando-se e expressando-se. A comunicação exige a consideração do mundo sensível,

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tratando-se de um novo arranjo para o conhecimento, o logos estético. (NÓBREGA, 2008, p. 143)

Sem ter o objetivo de discutir, neste texto, de que área é o/a professor/a que possui competências e habilidades para ministrar dança na escola, como educação do sensível, pois acreditamos que é um assunto polêmico e complexo (necessário, mais em outro tempo e num espaço maior), o que nos toma nesse momento é fato de ainda observamos, muitas vezes, a ausência da dança, enquanto arte, movimento, ritmo, linguagem e cultura na escola, pois é:

Difícil saber quem somos se não aprendemos na escola o valor cultural e artístico de nossa formação que reuniu, e continua reunindo, vários jeitos, conhecimentos e modos de fazer; e que esta mistura de gentes pode ser nosso grande potencial, potencial criativo que cria formas de comunicações e arte, formas de cultura. (GABRIEL, 2008, p. 76)

Que o compromisso assumido junto a educação, logo após o curso de licenciatura, seja de Arte ou Educação Física, possa estimular o/a professor/a a entender a contribuição da dança para formação pessoal de crianças e jovens e, assim, se preparar para um trabalho crítico e criativo na escola. Não há mais espaço para aquele/a professor/a que fica apavorado para copiar passos prontos de alguma coreografia divulgada na internet, para poder passar para seus/suas alunos/as, porque datas comemorativas estão por vir ou precisa aprender alguma dança folclórica, porque precisa dar dança na escola e qualquer movimento é valido.

Muitos são os tipos de dança e qualquer tipo é possível de ser desenvol-vido na escola, mas o que importa é saber por que, como e quando ou: “o que importa não é a linha escolhida, mas como através dela pode-se trabalhar os elementos que consideramos importantes para o desenvolvimento integral do indivíduo na escola”. (STRAZZACAPPA, 2001, p. 73)

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STRAZZACAPPA, Márcia. A Educação e a fábrica de corpos: a dança na escola In Cadernos Cedes, ano XXI, no 53, abril/200.

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A DANÇA NA EDUCAÇÃO INFANTIL: UMA PROPOSTA DE PRÁTICA EDUCATIVA PARA O TRABALHO COM CRIANÇAS 

Karina Paula da ConceiçãoRoberto Gimenez

Ida Carneiro Martins

INTRODUÇÃO

A Educação Infantil é um ciclo de ensino promissor ao desenvolvimento das crianças, pois este período de vida se caracteriza pela intensidade motora e a capacidade que de representar o que vivem, por meio do jogo de faz de conta. (FREIRE, 1989; ELKONIN, 2012)

Durante este tipo de jogo a criança é obrigada a se comportar de maneira superior ao que ela está acostumada, de modo a representar o papel que ela escolhe, ou lhe é atribuído, para cumprir o enredo que encaminha a brincadeira. Sendo assim, tal atividade tende a impulsionar a criança para alcançar níveis superiores de pensamento e ação. (VIGOTSKI, 2007)

Considerando que o jogo nasce das condições sociais e culturais em que vive a criança, que a Educação Infantil é um período fundamental para a ampliação de seu repertório cultural, a atividade lúdica infantil deve ser relevada na apropriação dos conteúdos culturais socialmente constituídos e, dentre tais conteúdos, está a dança.

Outra questão que é fundamental ao desenvolvimento das crianças desta faixa etária é o aperfeiçoamento das habilidades motoras fundamentais, pois estas propiciam o domínio corporal e o controle de seus movimentos (GAL-LAHUE e OZMUN, 2005).

No ciclo de ensino da Educação Infantil, o trabalho com a dança pode permitir a vivência de diversificados movimentos, os quais nem sempre estão presentes em outros conteúdos culturais, pois a dança é uma atividade eminen-temente expressiva e criativa. (MENDONÇA, 2020)

Todavia, dançar não é só a expressão do movimento, dançar é expres-são humana. Trabalhar com o ensino da dança permite o desenvolvimento de

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diferentes aspectos da vida infantil, tais como a sociabilidade, a representação, os gestos afetivos, dentre outros.

Observando tais questões, no presente capítulo abordaremos o ensino da dança na Educação Infantil, por meio de uma proposta educativa, com vistas a proporcionar a aprendizagem e ampliação do repertório da criança, na busca de trazer a dança representativa como o “motivo” para a realização do movimento, pois

En el niño la formación de los movimientos depende del carácter de la tarea que tiene planteada. Sin embargo, su actitud hacia ésta, el que la acepte o no depende, a su vez, de los motivos de la actividad infantil. Para que la tarea sea aceptada y provoque en el niño la disposición a resolverla deben surgir motivos que lo impulsen a actuar. (ZAPOROZHETS, 1987, p. 76)

Observando o que nos diz o autor, tais práticas educativas serão enca-minhadas por meio de estratégias lúdicas, de modo a dar às crianças o “motivo” para a realização do movimento.

A DANÇA NA ESCOLA

Podemos dizer que a dança é uma atividade plural, é um desporto, pois engloba mais que o movimento de nosso corpo a partir de um ritmo musical.

Segundo Bento (2006)

O desporto é um construto que se alicerça num entendi-mento plural e num conceito representativo, agregador, sintetizador e unificador de dimensões biológicas, físicas motoras, lúdicas, corporais, técnicas e táticas, culturais, men-tais, psicológicas, sociais e afetivas”. (BENTO, 2006, p. 3)

Assim, a palavra desporto se refere à atividade física, aos esportes, às lutas, aos jogos, às danças e tudo o que os envolve, sendo um termo que abrangente todos os aspectos da Educação Física. Observando a sua conceituação podemos afirmar que dança é plural.

Vista assim, na educação da infância, o ensino da dança pode proporcionar experiências significativas à constituição da criança, porque a arte enriquece o desenvolvimento de nossas melhores qualidades humanas.

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Dança na Escola

A arte acompanha o homem nas mais diversas fases de vida, despertando, neste, a sensibilidade necessária para a compreensão do ser humano em sua totalidade, na busca interior de culto ao belo, ao movimento e à evolução do pensamento. (COSTA et al., 2004, p. 43).

Ela nos torna pessoas mais sensíveis e criativas e estimularmos tais manifestações artísticas desde a infância colabora, efetivamente, para a melhor formação de nossas crianças e da capacidade de apreciação estética.

Tal questão é reconhecida nos currículos escolares e de acordo com a Base Nacional Curricular Comum – BNCC:

A Dança se constitui como prática artística pelo pensa-mento e sentimento do corpo, mediante a articulação dos processos cognitivos e das experiências sensíveis implicadas no movimento dançado. Os processos de investigação e produção artística da dança centram-se naquilo que ocorre no e pelo corpo, discutindo e significando relações entre corporeidade e produção estética. (BRASIL, 2017, p. 195)

Neste sentido, o ensino da dança no início da vivência escolar das crianças permitirá que elas tenham seu desenvolvimento de suas qualidades corporais, de sua corporeidade.

Desde que foi alterada a lei número 13.278 (LDB) em 2016, foi incluído o ensino da dança como obrigatoriedade no currículo escolar. Mas será que sua implantação tem acontecido de modo adequado? Segundo Marques (2012), a maioria dos/as professores/as nem sequer sabem exatamente o porquê de se ensinar dança na escola e, muitas vezes, não possuem uma formação adequada para tal. Ela cita: “A atuação de professores que atuam na área da dança é, sem dúvida, um dos pontos mais críticos no que diz respeito ao ensino dessa arte em nosso sistema escolar. (MARQUES, 2012, p. 24-25)

Sendo assim, é preciso ampliar os conhecimentos sobre a dança e, também, pesquisar os meios e caminhos para que o seu ensino em ambientes educacionais seja cada vez mais aprimorado, contando com profissionais preparados. É neces-sário trabalhar um olhar crítico e consciente sobre a importância da dança no ambiente escolar, indo além da associação que se faz às atividades extracurriculares, tais como festas juninas, apresentações de fim de ano, de dia das mães e dos pais,

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dentre outras. Compreender a dança como parte fundamental do processo de aprendizagem e desenvolvimento da criança e não apenas como resultado final.

Para que tudo isso aconteça é necessário um tempo de preparação, com um espaço significativo de aprendizagem, trabalhando a percepção de seu corpo, a socialização e a confiança.

Mas,

Tanto o corpo quanto a dança ainda são cobertos por um mistério, um buraco negro que a grande maioria da população escolar ainda não conseguiu investigar, explorar, perceber, sentir, entender, criticar! Ou seja, embora não se aceite mais o preconceito em relação ao diálogo com o corpo e com a arte, as gerações que não tiveram dança na escola muitas vezes não conseguem entender seu significado e sentido em contexto educa-cional. (MARQUES, 2012, p. 23)

Observando tais discussões, o objetivo do presente texto é apresentar propostas que permitam um trabalho para que as crianças vivenciem o corpo dançante infantil. “O ensino da dança na escola não deve se concentrar na formação de futuros bailarinos, deve ajudar no desenvolvimento de suas expres-sões e suas possibilidades de comunicação e desenvolvimento”. (BARRILLI & CINTRA, 2013, p. 26088). É importante que a criança experimente e vivencie a arte de dançar no contexto educacional, porque essas vivências podem propiciar a ampliação do seu repertório de movimentos.

Já o “professor deve desenvolver o seu planejamento de uma aula de dança que faça com que os alunos sintam os movimentos, refletindo de maneira simples sobre o seu corpo e o corpo do outro”. (BARRILLI e CINTRA, 2013, p. 26092) O professor irá se deparar com diversos corpos, diversas histórias, diversas vivências e terá que considerar o desenvolvimento dos alunos como um todo.

POSSIBILIDADES DE TRABALHO COM A DANÇA NA EDUCAÇÃO INFANTIL

A partir de nossas experiências relativas ao ensino da dança sistematizamos quatro elementos a serem observados no trabalho com a crianças, assim, antes de apresentarmos as atividades em si é importante destacarmos os objetivos

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de cada um desses elementos que compõem a nossa proposta. Ressaltamos que o desenvolvimento da atividade deve ser planejado pelos professores, os mediadores do processo.

As atividades propostas têm diferentes objetivos, de modo a propiciar às crianças a vivência e aprendizagem de movimentos relativos à dança:

• Respiração – Propiciar à criança o autoconhecimento e o autocontrole que contribui ao desenvolvimento da atenção e da concentração, aspectos relevantes para a participação nas atividades propostas. Pode ser utilizado no início das aulas, durante o seu processo e, também, ao seu final com objetivos a preparar a criança para as atividades que serão realizadas, pois tomar consciência da própria respiração é permitir a concentração no presente momento, pois

A dança necessita que as trocas de materiais gasosos (respiração) sejam tranqüilas e conscientes, pois a res-piração lenta fará o oxigênio ser transportado para todas as partes do organismo, deixando o bailarino oxigenado para executar os movimentos com mais serenidade, con-seqüentemente com mais qualidade de movimentação. (ROMANO; BANKOFF, 2009, p. 205)

• Musicalidade – Desenvolver a sensibilidade, senso rítmico, memória, concentração, atenção e consciência corporal. Trabalhar a musicalidade é explorar os sentidos, principalmente a audição, estimulando diversos aspectos referentes à resposta ao ritmo.

A música está presente nas várias etapas da vida do ser humano. Desde pequenas, as crianças se interessam por produções sonoras. Experiências com essa finalidade, planejadas na educação infantil possibilitam o exercí-cio criativo de situações musicais e o desenvolvimento cognitivo. (SANTOS et al., 2019, p. 52)

Por meio do exercício criativo de situações músicas, as crianças se expres-sam corporalmente.

• Expressão corporal – Desenvolver o repertório corporal da criança, per-mitindo que ela experimente diversas possibilidades de se movimentar e de se expressar. Trabalhar expressões corporais é proporcionar à criança o experimento de sensações, sentimentos e imitações, permitindo pesquisa

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daquilo que a criança já vivenciou em seus ambientes de convívio, pois ao “ensinar o aluno favoreceremos sua aprendizagem oferecendo oportunidades de movimentação e expressão, e não ensinaremos como ele deve dançar, não existirá o certo e o errado”. (BARRILLI & CINTRA 2013, p. 26092)

• Deslocamentos – Propiciar a exploração da lateralidade e estímulos das habilidades motoras básicas, tais como: correr, saltar, chutar, equilibrar, dentre outras, pois

Como um meio de comunicação e expressão, a dança se torna uma possibilidade para o estabelecimento e desenvolvimento, tanto das habilidades motoras básicas, em movimentos com qualidades estéticas e artísticas especializadas, quanto de sentimentos e ideias, por meio da linguagem corporal. (TREVISAN; SCHWARTZ, 2012, p. 98)

Após explicitarmos os elementos corporais que compõem a proposta e, também, os seus objetivos passamos apresentar aspectos complementares para o encaminhamento das aulas, pois é importante que se incentive alguns aspectos que possam contribuir a outros domínios do desenvolvimento das crianças, são eles:

- Curiosidade: Despertar na criança possibilidades para ser curioso por meio de seu repertório corporal. A curiosidade vem pelo interesse em descobrir novas possibilidades e quando lhe são lançados novos desafios a sua curiosidade é despertada.

- Desenvolvimento Interpessoal: Fazer com que o aluno se permita a se relacionar com os seus colegas de forma produtiva e colaborativa, criando possíveis laços de amizade.

- Realização: Desenvolver a auto realização de alcançar os desafios das atividades promovidas em aula, tanto o aluno quanto o professor. Quanto mais a criança se sentir realizada ao executar a tarefa, mais motivada ela estará para aula, pois ela terá a auto percepção de que conseguiu realizar a tarefa com sucesso.

- Cooperação: Fazer com que o aluno desenvolva o respeito ao pró-ximo, empatia e cooperação, desenvolvendo o senso de trabalho em equipe. A cooperação é um fator essencial durante as aulas, tanto de aluno para com o professor, quanto para aluno com o outro aluno, pois a aula irá fluir com mais aproveitamento.

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- Participação de Grupo: Desenvolver nos alunos mais a percepção do trabalho coletivo do que da individualidade, promovendo interações conjuntas entre eles. Através de atividades que façam com que o grupo de alunos trabalhem juntos as crianças criam a consciência de trabalhos em equipe.

- Percepção das Finalidades: Desenvolver a capacidade de compreender as atividades, e assim poder realizá-las da melhor forma possível. Perceber e reproduzir os objetivos das atividades propostas durante a aula, pois a criança chegará aos objetivos propostos pelo professor se eles forem significativos para elas.

A proposta dessas atividades tem o intuito de compreender a relevância de permitir que a criança tome consciência de sua ação expressada corporalmente. Se o processo de ensino acontecer de forma prazerosa, o desenvolvimento dos processos educacionais tende a envolver a dança como um dos meios do processo de aprendizagem e desenvolvimento infantil.

PROPOSTAS DE ATIVIDADES

As seguintes propostas foram desenvolvidas através das experiências vividas na escola e aprimoradas durante os anos de trabalho envolvidos com o ensino da dança. Essas propostas podem auxiliar aos professores por meio de possíveis sugestões para uma aula de dança na Educação Infantil, com o intuito de alcançar os objetivos elencados anteriormente.

• Respiração

Atividade 1 – Florzinha e Velinha: cheirar a florzinha (inspirar), assoprar a velinha (expirar). Utilizar músicas instrumentais, em ritmo moderado, para se iniciar a aula.

Atividade 2 – Escalada: a partir da posição agachada, ir subindo grada-tivamente como se estivesse escalando algo, enquanto inspira. Depois, voltar à posição inicial expirando. Utilizar-se de uma música que remete a ação de escalar como, por exemplo, “Dona Aranha”.

Atividade 3 – Massagem: a atividade é realizada aos finais das aulas como forma de relaxamento e pode ser realizada de duas formas: a) deitado no chão em posição de bolinha, movimentando as articulações enquanto respira; b) trenzinho da massagem – uma criança atrás de outra, fazer a massagem na que

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está à frente, depois dar meio giro e fazer na que está atrás, sempre orientando a criança a respirar naturalmente.

• Musicalidade

Atividade 1 – Estátua: com uma música tocando, as crianças dançando livremente, o/a professor/a pausa a música para que elas adotem uma posição de estátua, ficando paradas. Para a atividade ficar mais dinâmica, pode-se indi-car algumas variações como indicar posições para fingirem-se de estátuas, por exemplo: com um pé só, nas pontas dos pés, agachadas, dentre outras.

Atividade 2 – Sons do Corpo: Utilizando músicas de percussão de instrumentos ou corporal, essa atividade é para estimular a criança a fazer sons com diversas partes do corpo como: palmas, cabeça, barriga, joelhos. E assim a criança também explora o próprio corpo, aumentando o seu repertório corporal.

Atividade 3 – Chocalho: nessa atividade será utilizado materiais, que sejam ou remetam ao chocalho. Com a música tocando, estimula-se a criança a movimentar-se e também a manipular o chocalho, fazendo com que ela crie o ritmo dela. Utiliza-se músicas que lembrem o som de algo chacoalhando ou só o som do instrumento. Uma variação é incentivar as crianças a descobrirem um ritmo do grupo.

• Expressão corporal

Atividade 1 – Floresta: utilizando a imaginação das crianças, transfor-mamos a sala de aula numa floresta imaginária, onde caminhamos (com alguns passos de dança) e a cada pausa o professor direciona para um animal que é encontrado na floresta e solicita que a criança o imite. Deve-se utilizar músicas que lembrem a floresta e sons de animais.

Atividade 2 – Formas Geométricas: aqui é considerado o que a criança compreende sobre formas geométricas. O/a professor/a escolhe uma das formas e pede que a criança realize o movimento. O ideal é o professor associar essas formas geométricas a algo que seja da vivência da criança.

Atividade 3 – Dança Livre: como já diz o nome, essa atividade é para as crianças dançarem livremente, expressando o seu repertório corporal. Essa atividade também pode variar sendo direcionada como por exemplo: dançar fazendo giros, dançar com os braços elevados, dançar agachado, entre outros

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Dança na Escola

estímulos. Nesse momento o ideal é utilizar músicas em que a criança já esteja familiarizada.

• Deslocamentos

Atividade 1 – Vai e Vem: a atividade se inicia sentado e são realizados movimentos para frente e para trás e em algum momento há uma pausa. Para deixar mais dinâmico a atividade vai aumentando a velocidade da execução de acordo com o ritmo da música. Nessa atividade utiliza-se músicas que tenham, variações nos ritmos, do lento ao mais rápido.

Atividade 2 – Vivo ou Morto Dançante: essa atividade é uma variação da brincadeira, porém ela é feita dançada. Quando o/a professor/a falar “vivo” a criança faz um movimento no plano alto, quando falar “morto” a criança faz o movimento no plano baixo. A música utilizada normalmente é uma música de ritmo acelerado para trazer a animação para a atividade.

Atividade 3 – Batata Quente Dançante: a atividade é também uma variação da brincadeira tradicional, porém dançada. Será necessário um elemento (bola, bexiga, bichinho de pelúcia) para passar de um para outra criança. Antes de passar o objeto, a criança que o recebe, deverá realizar um movimento de dança que o professor pode ou não direcionar. Quando a música for pausada então a Batata Quente “queimou” quem estiver com o elemento nas mãos. Nessa atividade também são utilizadas músicas de ritmo acelerado para animação da atividade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As atividades propostas podem ser variadas de acordo com os objeti-vos que o professor queira abordar dentro da sala de aula, porém é necessário criar-se uma rotina para todas as aulas, para que a criança esteja familiarizada com o conteúdo e, gradativamente, propor desafios diferenciados. Por isso o/a professor/a deve ter um planejamento que seja uma base para todas as aulas e, também, quando for inserido novos elementos, que seja de uma forma gradativa como, por exemplo, o aumento da intensidade da atividade e do movimento.

O professor não deve se limitar na hora de planejar sua aula, não apenas escolher uma música qualquer e deixar com que as crianças dancem. É neces-sário aprimorar-se no ensino da dança, buscar os reais objetivos que se quer alcançar com as crianças.

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A ideia dessas propostas de atividades é mostrar que se pode ensinar dança no contexto escolar, como um dos elementos que possa colaborar nos processos de aprendizagem da criança, pois ela é um elemento que apresenta muitas possibilidades para a potencialização doe seu desenvolvimento.

O ensino da dança não deve ser apenas para uma “apresentação especial”, porque isso deslegitima todo potencial educativo que a dança possui, é restringi-la a reproduções de movimento que nem sempre tem significado para a criança.

Em síntese, devemos nos atentar sempre nos processos de ensino, apri-morando sempre os nossos conteúdos e, enquanto professores, oferecermos as melhores condições de aula aos/as nossos/as alunos/as, de modo que se possibilite a ampliação do repertório de movimentos, propiciando à criança o alcance de seu melhor desenvolvimento.

REFERÊNCIAS

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DE ESCOLA PARA ESCOLA: O CARNAVAL COMO ESPAÇO DE APRENDIZAGEM SOBRE DANÇA

Roberta GaioPaloma T. F. Rocha

Natalia Maesky BatistaJaqueline Souza da Costa

PARA COMEÇO DE CONVERSA

Este texto nasce da vontade de apresentar experiências exitosas em grupos de estudos, com pesquisas de iniciação científica. O carnaval foi por muito tempo interesse de algumas docentes que promoveram encontros com discentes, na cidade de São Paulo, para refletir sobre a existência desta imensa manifestação cultural, não só em tamanho, pois acontece em todo território brasileiro, mas em dias e formas de vivenciar esta folia e, também, pela complexidade que existe em torno da sua origem, efetivação e transformações.

É uma manifestação muito presente na vida dos brasileiros, pois desde muito cedo, inúmeras crianças são inseridas nas festas carnavalescas, assistem desfiles pela televisão e respiram o ar pitoresco desta festança, com muito con-fete, serpentinas, máscaras, fantasias, música, dança e guerra com bisnaga de água, numa divertida brincadeira de rua. Sempre foi e continua sendo muito divertido, alegre e extasiante, mas também, excêntrico, exótico, extravagante, singular, extraordinário, enigmático, inexplicável e misterioso.

Qual o sentido do carnaval? Como surgiu esta grande festa popular? Qual o seu papel na vida de crianças, jovens, adultos e idosos? Atualmente, esta manifestação acontece nos mesmos moldes de quando ela surgiu? É verdade que o Brasil é o país do carnaval?

Sem ter a pretensão de responder a todas essas questões, o que se quer com este capítulo é mostrar que, uma festa que acontece todos os anos, de forma tão popular, no sentido de ser democrática, pois há sempre espaço para a participação de todos e de todas, deve, com certeza, ter uma relevância ampla para a sociedade, na qual está inserida.

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As manifestações culturais são, entre outros eventos, festas populares que, se originam de várias formas, podendo ter um cunho sagrado, social, político, econômico, entre outros, passando por transformações constantes, inseridas em um sistema aberto, pois ocorrem transmissões de conhecimentos de geração a geração. As manifestações caracterizam um povo, dando a eles uma identidade cultural. Assim, é fato “a importância da cultura popular para o desenvolvimento local, considerando as manifestações e expressões populares detentoras do contexto regional como fator de identidade cultural”. (LÓSSIO; PEREIRA, 2007, p. 01)

O foco é o carnaval, em especial, as festas populares promovidas pelas escolas de samba, mas sem desconsiderar os diversos blocos de ruas, os trios elétricos e outros, como espaço de educação informal sobre dança, que deve ser possibilidade de reflexões na educação formal, se caracterizando numa parceria, por nós intitulada de escola para escola, pois

(...) ninguém escapa da educação. Em casa, na rua, na igreja, ou na escola, de um modo ou de muitos todos nós envolvemos pedaços da vida com ela: para aprender, para ensinar, para aprender – e – ensinar. Para saber, para fazer, para ser ou para conviver, todos os dias misturamos a vida com a educação. Com uma ou com várias: educação? Educações. (BRANDÃO, 2007, p. 7).

A educação é algo constante em nossas vidas e a escola não é o único lugar em que crianças e jovens aprendem, pois “por toda parte podem haver redes e estruturas sociais de transferência de saber de uma geração a outra.” (BRANDÃO, 2007, p. 11)

E é com um olhar crítico em relação ao carnaval, em especial, as escolas de samba, que acreditamos que há muito que aprender, da perspectiva não formal para a formal, não só sobre ritmos, dança e arte em geral, mas sobre vida, convivência, existência e solidariedade, no sentido de não estar só, mas se colocar em movimento ao encontro do outro ou de outros.

ABRAM ALAS PARA O CARNAVAL

Percebe-se que existiam nas antigas civilizações, festividades com objetivos diversos, nas quais eram comuns as máscaras, fantasias, muita música, danças,

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brincadeiras e bebedeira. Nota-se imprecisões em relação a origem do carnaval, pois seu surgimento, está atrelado, ao profano, quando se encontra relatos de festas pagãs, ao mesmo tempo em que o sagrado é referencial, quando o olhar se volta para as festividades em homenagens postas pela doutrina da Igreja Católica.

A origem da festa carnavalesca está coberta de mistérios e controvérsias. Alguns afirmam que ela teria surgido nos ritos agrários das primeiras sociedades de classes, outros preferem considerar que a primeira folia aconteceu no Antigo Egito ou na civilização greco-romana. O certo é que só existem referências ao terno ‘Carnaval’ a partir do século XI, quando a Igreja decide instituir o período da Quarentena. Daí em diante, a festa vai tomar várias formas até que, no século XIX, a burguesia parisiense ‘inventa’ o Carnaval tal como o concebemos atualmente. (FERRREIRA, 2004, p. 15)

Nem todas as manifestações culturais, em forma de festas populares podem ser denominadas como carnaval, até porque o que fica claro, é que estas festas deram origem a muitos outros eventos que existem nos dias atuais, como as festas juninas e até mesmo o natal.

A origem do carnaval, bem como outras festas popu-lares, advém de uma mesma premissa: a celebração de algo, alguém ou um acontecimento. Porém, nem todas as festas populares conhecidas podem ser consideradas carnaval, principalmente, como este é concebido hoje. (COSTA, 2011, p. 16)

Ou como nos coloca Ferreira (2004, p. 17):

(...) a festa carnavalesca é a maior celebração de felicidade do planeta. Resta também pouca dúvida com relação à ligação entre as celebrações festivas das antigas civiliza-ções e as loucuras da folia contemporânea. Apesar disso não dá para afirmar que já existia Carnaval no Antigo Egito ou nas civilizações greco-romanas. (...) muitas dessas festas possuem uma origem em comum, mas não são necessariamente Carnavais. Assim, quando procu-ramos estabelecer as origens do Carnaval é preciso não confundir as festas e celebrações das antigas civilizações com aquilo que atualmente entendemos por Carnaval. Uma está na raiz da outra, mas não são a mesma coisa.

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O que se entende é que o carnaval, firmado como uma comemoração do povo e com raízes profundas no ideário do “adeus a carne”, vai se tornar a própria identidade brasileira, e assim, enquanto festa organizada pela comunidade deu um grande passo em sua expansão, sendo criadas as primeiras escolas de samba, em 1920, no Rio de Janeiro, graças à evolução dos grupos de amigos que saiam pra cantar e beber nas ruas cariocas.

Cavalcanti (1994, p. 23) denuncia a democratização do carnaval no Brasil, quando diz que:

(...) as grandes sociedades, nascidas na segunda metade do século XIX, desfilavam com enredos de crítica social e política apresentados ao som de óperas, com luxuosas fantasias e carros alegóricos e eram organizadas pela camada social mais rica. Os ranchos, surgidos em fins do século XIX, desfilavam também com um enredo, fantasias e carros alegóricos ao som de sua marcha característica e eram organizados pela pequena burguesia urbana. Os blocos, forma menos estruturada, abrigavam grupos cujas bases situavam-se nas áreas de moradia das camadas mais pobre da população, os morros e subúrbios cariocas. O surgimento das escolas de samba veio desorganizar essas distinções.

Se “na verdade quem ‘inventou’ o Carnaval foi a Igreja Católica, por mais estranho e irônico que possa parecer.” (FERREIRA, 2004, p. 15), são as comunidades, juntamente, com as diversas camadas da sociedade que fazem o carnaval perdurar, remanescer e renascer a cada ano.

Somente a título de ilustração, sem nos aprofundar no assunto, há indí-cios que a história da igreja com o carnaval tenha começado “no ano de 604, quando papa Gregório I deliberou que, num determinado período do ano, os fiéis deveriam deixar de lado a vida cotidiana para, durante um certo número de dias, dedicarem-se exclusivamente às questões espirituais”. (FERREIRA, 2004, p. 15)

Esse fato específico estava relacionado ao período de quarenta dias que Jesus havia passado no deserto, em jejum, lutando contra aprovações do mal, antes do mistério pascal. Por isso ficou sendo conhecido como quaresma.

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Assim, após uma reunião do papa Urbano II, em 1091, com os represen-tantes da igreja, chamada de Sínodo de Benevento, decidiu-se que a quaresma seria o período que compreenderia a quarta-feira de cinzas (costume que perdura até os dias de hoje e, consiste em marcar a testa em cruz dos fiéis, com cinzas, num ritual de penitência) até o domingo de Páscoa (que marca a ressureição de Cristo) e “deveria reinar a temperança, o comedimento, a caridade e a austeri-dade, tudo isso acompanhado de um rigoroso jejum”. (FERREIRA, 2004, p. 26)

Com o passar do tempo, começaram a surgir as grandes festas no período anterior a esse longo tempo de abstinência. “Esses últimos dias de fartura antes dos quarenta dias de penúria, começaram então a ser chamados de dias do ‘adeus a carne’, que em italiano, fala-se dias da ‘carne vale’ ou do ‘carnevale’. (FERREIRA, 2004, p. 26)

Como bem nos coloca Ferreira (2004, p. 26):

Surge assim, a palavra para se definir o período do ano onde a comilança e a esbórnia corriam soltas, e que acabaria por se tornar uma espécie de antônimo da Qua-resma: Carnaval. Ou seja, se não fosse pela invenção da Quaresma não haveria Carnaval.

Na área acadêmica quando se relaciona educação, carnaval e dança é possível notar a escassez de trabalhos científicos que norteiam esses campos. Assim, o nosso objetivo é contribuir para que os/as professores/as da educação básica possam ter um olhar mais atento e cuidadoso para com as manifestações culturais, que são presenças constantes na vida de crianças e jovens, que constituem espaços de aprendizagens informais e devem ser valorizadas e refletidas na escola.

O texto, além de inter-relacionar os temas já apontados acima, indica que, o conhecimento cultural adquirido, pelas crianças e jovens no carnaval, nas escolas de samba nas cidades do Rio de Janeiro e São Paulo, nos blocos de rua e no Maracatu em Olinda, atrás do Trio Elétrico, seguindo o Axé folia das ruas de Salvador, entre outros, devem ser estudados na escola de educação básica, com o intuito de valorizar a cultura popular, em especial, as danças.

O Carnaval está tão fortemente ligado à gente brasi-leira que podemos afirmar ser ele um dos nossos mais marcantes traços de identificação. Não é que tenha se originado aqui, mas, sem dúvida, foi por nós reinventado

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e de maneira plural. São muitos os carnavais do Brasil, múltiplas as formas de expressão que revelam, exemplar-mente, a nossa diversidade cultural. (GOES, 2013, p. 63)

A diversidade cultural de ritmos, movimentos, rituais, celebrações, festas, desfiles, músicas e muitas danças, presente nos carnavais brasileiros são, atual-mente, patrimônios que como forma de expressão cultural trazem a manifestação do sentir, pensar e se remetem a um determinado tempo ou combinação de vários tempos.

As manifestações culturais são determinadas pelo povo, ao mesmo tempo, que definem as singularidades de quem a determinou. No carnaval, temos o ritmo e a dança como características marcantes dessa manifestação. A dança aparece como um modo de expressão, que se traduz no corpo como uma forma de ser e representar a cultura. Assim, para Siqueira (2006, p. 4) a dança é

(...) manifestação social, a dança é, ainda, fenômeno esté-tico, cultural e simbólico que expressa e constrói sentidos através dos movimentos corporais. Como expressão de uma cultura, está inserida em uma rede de relações sociais complexas, interligadas por diversos âmbitos da vida.

O ritmo aparece com um elemento que traz movimento, em seu significado ele é o que mais se associa à percepção de duração no tempo, de periodicidade, pois é algo que flui, que se move. Assim, unindo o ritmo a dança, pode-se per-ceber uma relação de fluidez, pois há uma conexão existencial, na medida em que um precisa do outro. O carnaval de rua, em especial, os desfiles das escolas de samba e os blocos, mostram-se como um espaço que traduz essas conexões.

São ricas as manifestações culturais expressas pelas festas populares, nesse imenso país de cultura mestiça. Há diferentes formas de carnavais no Brasil, desde o tradicional, como em Olinda/PE, com os grandes bonecos e sua música característica que é o frevo, em conexão com as danças dos passos; Ouro Preto/MG, que possuem os blocos carnavalescos organizados pelos estudantes que ali residem e até mesmo escolas de samba tradicionais da cidade; em Salvador/BA temos os trios elétricos que trazem o axé e outros ritmos da atualidade, conhecidos pela população brasileira, mas, também, possuem os blocos afros, que mantêm os ritmos e vestimentas típicas. No Rio de Janeiro/RJ e em São

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Paulo/RJ são os grandes desfiles das escolas de samba que fazem sucesso, além dos blocos de rua que arrastam multidões.

Nota-se que o Carnaval possui uma aceitação enorme pela sociedade, é sem dúvida a festividade mais esperada do ano. Destacando-se assim sua representatividade:

é período de desapego, instante de desligamento, momento de relaxamento; relaxamento das normas morais e sociais, repouso do cotidiano; é tempo de inversão, inversão de papéis, onde o rico se veste de pobre e o pobre se veste de rico; é tempo de diversão, confusão, socialização; o carnaval é a festa da paixão, festa do trabalho e festa do samba; o carnaval, mais do que o samba, é escola de samba. (COSTA, 2011, p. 11)

Diante de quase cem anos após o surgimento das escolas de samba, vemos que essa manifestação cultural tomou proporções gigantescas, que geram impactos sociais, culturais, políticos e econômicos, produzindo lucros enormes aos cofres públicos e privados, além de seduzir e arrastar multidões as ruas e nos sambódromos para celebrar, durante dias, a alegria, o ócio e o desprendimento, numa confraternização entre os diversos, numa integração coletiva.

Vários são os ritmos presentes nos dias em que os brasileiros saem às ruas para brincarem, dançarem e se divertirem nas manifestações populares, denominadas de Carnaval. De norte a sul do Brasil, ritmos variados dão o tom ao movimento e ao entretenimento. Como exemplos, temos as marchinhas, o axé, o frevo e o samba, em especial, o samba enredo das escolas de samba, de certa forma o foco principal do estudo.

ESCOLAS E AS POSSIBILIDADES DE EDUCAÇÃO

Neste texto apresentamos aos/as docentes que atuam em escolas de Educação Básica a possibilidade de refletir sobre o carnaval e sobre sua inter-ferência na construção de identidade e cultura de alunos e de alunas. Para tal, inicialmente é preciso considerar que espaço ocupa o carnaval e a escola na formação, principalmente considerando as contribuições e mudanças que eles podem produzir e incentivar no desenvolvimento e na educação de crianças.

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Nesse sentido, compreender o espaço da escola de samba como um local que educa e interfere no modo ser e agir das pessoas é fundamental, assim como sua relação com nosso objeto de estudo que é a escola de educação básica, que se faz “obrigatoriamente” presente no cotidiano das pessoas. Nessa carateriza-ção, vale ressaltar as duas categorias de educação a qual nos referimos: formal e não-formal. Compará-las e confrontá-las é corriqueiro e necessário, pois através dessa análise é possível compreender o papel atribuído a cada uma e seu impacto na vida e no dia-a-dia das pessoas.

A princípio podemos demarcar seus campos de desen-volvimento: a educação formal é aquela desenvolvida nas escolas, com conteúdos previamente demarcados; a informal como aquela que os indivíduos aprendem durante seu processo de socialização - na família, bairro, clube, amigos etc., carregada de valores e culturas próprias, de pertencimento e sentimentos herdados: e a educação não-formal é aquela que se aprende “no mundo da vida”, via os processos de compartilhamento de experiências, principalmente em espaços e ações coletivos cotidianas. (GOHN, 2006, p. 28)

A compreensão de uma educação formal na qual se pré-determina conceitos, conteúdos e objetivos de desenvolvimento torna a educação básica um espaço em que competências e habilidades serão trabalhadas, de forma sequencial e organizada previamente. A organização do seu espaço e de suas práticas consideram essas necessidades e proporcionam ao indivíduo a opor-tunidade de acessar conhecimentos que fazem parte da cultura brasileira e que foram estabelecidos por organizações educacionais do país. O currículo e o projeto pedagógico são instrumentos de ordenação e gerenciamento das dife-rentes aprendizagens. Entende-se que as ações são coletivas e sistematizadas considerando as diferentes características populacionais, mas, com a ênfase em fundamentos acordados antecipadamente.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional estabelece regras e os alicerces da estrutura de ensino das escolas brasileiras, o que não significa que não temos diferenças, desigualdades, diversidades ou defasagens. Elas existem e se distribuem nas diferentes camadas sociais, nas diferentes comunidades e nos diferentes locais em que se inserem essas instituições de ensino. Mas, suas

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especificidades promovem de forma coordenada o desenvolvimento dos alunos e alunas que convivem nesse espaço, além de atender as expectativas que surgem e são construídas de forma concreta e simbólica no pensamento e imaginário da sociedade em geral.

Outro ponto que diferencia essas duas formas de ensino que Gohn (2006) traz é o “sujeito” que educa. A autora apresenta o/a professor/a como aquele/a que instrui e ensina na educação formal, enquanto na não-formal temos um indivíduo indefinido e não necessariamente conhecido – “Na educação informal, os agentes educadores são os pais, a família em geral, os amigos, os vizinhos, colegas de escola, a igreja paroquial, os meios de comunicação de massa, etc.” (GOHN, 2006, p. 29)

A educação não-formal acontece de forma de espontânea e em espaços diversos e aleatórios, porque ela se desenvolve a partir da socialização dos indi-víduos e em tempos e espaços diversos. Não há uma característica prévia a ser seguida, e sim pessoas, interesses, trocas e relações que constroem e desenvolvem novas habilidades, competências e formas de ser e pensar o mundo.

A não formal ocorre em ambientes e situações inte-rativos construídos coletivamente, segundo diretrizes de dados grupos, usualmente a participação dos indivíduos é optativa, mas ela também poderá ocorrer por forças de certas circunstâncias da vivência histórica de cada um. Há na educação não-formal uma intencionalidade na ação, no ato de participar, de aprender e de transmitir ou trocar saberes. A informal opera em ambientes espontâneos, onde as relações sociais se desenvolvem segundo gostos, preferên-cias, ou pertencimentos herdados. (GOHN, 2006, p. 29).

Considerando essas informações gerais atribuímos ao carnaval e as escolas de samba um papel importante na sociedade e nas práticas educativas não-formais. Seus componentes, diretores e consumidores são os agentes que educam e transformam as características daqueles que participam e vivenciam novas experiências no espaço. Gohn (2006) ressalta que os espaços utilizados na educação não-formal são demarcados pelas características regionais, de etnia, de sexo, entre outras. E no que tange as escolas de samba, encontramos diversidade e profunda riqueza de hábitos, valores e identidades que se apresentam e se transformam no contato com essa realidade.

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Mas, qual é de fato a relação existente entre as escolas de samba e as ins-tituições escolares? É possível estreitar esse laço e aproximar suas contribuições?

Esses questionamentos, muitas vezes, se fazem presente no pensamento daqueles que não identificam a educação não-formal, ou seja, o próprio carnaval, como prática que interfere e auxilia na construção de novos conhecimentos e de identidades. O que não nos parece possível.

Como não compreender o entretenimento popular como forma de edu-cação? Como não conceber as aprendizagens construídas nas escolas de samba e/ou ao usufruir da cultura veiculada a partir das festas de carnaval? Como negar as contribuições que esses espaços podem trazer nas transformações sociais e individuais daqueles que frequentam? Como não vincular as ideias de mundo estabelecidas nas instituições de ensino formal com o que ocorre fora desses muros?

Questões como essas nos fazem refletir sobre o papel das instituições escolares que possuem a oportunidade de acesso a ampla sociedade e que, por vezes, não assumem o dever de analisar, refletir, questionar e aprender sobre outros espaços que interferem no desenvolvimento de seus alunos e de suas alunas, contribuindo para diferentes mudanças de identidades e leituras de mundo. Articular essas propostas poderá representar impacto significativo nas relações sociais e nas produções das diferentes comunidades. Essa estreita relação entre esses dois “tipos” de escola traz como meio de aproximação os indivíduos que participam e absorvem as interferências de ambos.

Considerando a pluralidade cultural que envolve o país, haja visto que o carnaval se encontra nos diferentes estados, culturas e comunidades, pode-se compreender como uma festa tradicional é importante para a população bra-sileira, pois se manifesta de forma impactante na vida de todos e todas, já que seu alcance é inerente a presença física dos sujeitos, como também, os diferen-tes meios de comunicação promovem o acesso e distribuição de suas práticas, ampliando e fortalecendo esse contato.

No que diz respeito ao “encaixe” pertinente dessa temática no ensino promovido pelas Instituições escolares (educação formal), percebe-se notória aproximação com os componentes curriculares educação física e artes, pois ambos têm, entre suas atribuições, o papel de refletir e analisar as diferentes manifestações artísticas e corporais que fazem parte da cultura regional (até

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nacional). E o carnaval e as escolas de samba nos trazem abundantes virtudes de práticas artísticas e corporais.

A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) estabelece as aprendiza-gens que devem ser desenvolvidas ao longo da educação básica, seguindo como orientação as Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica publicada em 2013 e a Lei 9394 de 1996 que estabelece Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Neste documento orientador há a divisão de áreas, e a educação física e artes, compõe uma área denominada de linguagens. Ambas, possuem entre seus conteúdos a temática dança, que envolve diferentes manifestações artísticas e corporais. Neste caminho percorrido pelo documento para encaminhar aos docentes os saberes importantes no desenvolvimento das práticas educativas, ressalta-se a importante contribuição da dança e suas diversas peculiaridades. Esse destaque nos leva a notar como essa área de estudo é fundamental para a compreensão de mundo e progresso de habilidades que serão utilizadas no cotidiano.

Outro aspecto importante desse documento curricular é a valorização da diversidade cultural existente no país e suas contribuições para a construção de uma sociedade igualitária. Essa preocupação fica expressa com clareza na primeira competência geral vinculada a educação básica que é apresentada no documento:

Valorizar e utilizar os conhecimentos historicamente construídos sobre o mundo físico, social, cultural e digital para entender e explicar a realidade, continuar apren-dendo e colaborar para a construção de uma sociedade justa, democrática e inclusiva. (BRASIL, 2018, p. 11).

Historicamente, como mencionado na competência, se construiu na cultura brasileira práticas de lazer e de socialização durante o carnaval. A disse-minação dessa manifestação cultural é parte integrante da cultura e colabora para construção de novos saberes, e no que toca a escola, pode proporcionar intensa riqueza de valores e identidades para a criação de novas formas de ser e de agir. No desenvolvimento dessas novas habilidades e competências temos na BNCC de educação física a orientação de oito dimensões do conhecimento, tais como: experimentação, uso e apropriação, fruição, reflexão sobre a ação, construção de valores, análise, compreensão e protagonismo comunitário. Salienta-se que:

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(...) não há nenhuma hierarquia entre essas dimensões, tampouco uma ordem necessária para o desenvolvimento do trabalho no âmbito didático. Cada uma delas exige diferentes abordagens e graus de complexidade para que se tornem relevantes e significativas.” (BRASIL, 2018, p. 224)

Na distribuição dessas dimensões percebemos que há uma preocupação com a reflexão, valores, análise e com a própria comunidade. Nesse destaque há uma intencionalidade que não se pode negligenciar, que se trata da importância da compreensão e leitura da realidade na qual os alunos se inserem, bem como a capacidade de refletir sobre as práticas que se manifestam culturalmente na comunidade na qual fazem parte. Nessa perspectiva o professor tem legitimado o trabalho com as escolas de samba, bem como, com o próprio carnaval e sua cultura.

No que diz respeito à educação física há como objeto de conhecimento as danças do contexto comunitário e regional, que segundo a BNCC envolvem as danças do Brasil e do Mundo, apresentando o seguinte conjunto de habilidades para o ensino fundamental de 3º ao 5º ano:

(EF12EF11) Experimentar e fruir diferentes danças do contexto comunitário e regional (rodas cantadas, brin-cadeiras rítmicas e expressivas), e recriá-las, respeitando as diferenças individuais e de desempenho corporal. (EF12EF12) Identificar os elementos constitutivos (ritmo, espaço, gestos) das danças do contexto comunitá-rio e regional, valorizando e respeitando as manifestações de diferentes culturas. (BRASIL, 2018, p. 229)

Nestas e em outras habilidades mencionadas no documento, é detectável a possibilidade de trabalho do carnaval e das escolas de samba, visto que elas representam parte da cultura nacional. Também há a necessidade de analisar o contexto de inserção da escola, verificando a importância e envolvimento da comunidade escolar com essa festa popular, de modo a identificar possíveis inserções e participações ativas no cotidiano das escolas de samba. Apesar das comemorações carnavalescas ocorrerem em determinado período do ano, há grupos de pessoas que possuem um envolvimento mais estreito e esse relacio-namento ocorre durante todo o ano, trabalhando na construção dessa festa, que requer dedicação durante diferentes períodos do ano.

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A realização de avaliações diagnósticas trata-se de uma iniciativa rele-vante para detectar o envolvimento e o espaço que o carnaval ocupa na vida das crianças e jovens, visando inserir essa temática de acordo com a necessidade da comunidade escolar. Essa análise inicial deve compor o trabalho educacional mesmo que já existam conhecimentos pré-determinados e direcionamento do ensino, pois os saberes devem estar conectados com a realidade do mundo em que vivemos para estabelecer relação significativa com o que de fato o aluno utilizará em seu cotidiano.

Considerando a inserção de temáticas variadas no ensino e na apren-dizagem trabalhada por professores/as de educação física, artes e/ou outros, é necessário considerar uma apropriação e estudo de diferentes manifestações artísticas e corporais, pois esse trabalho exige um amplo conhecimento. O que nos alerta para a necessidade dos/das professores/as estarem em constante aprimoramento conceitual, procedimental e atitudinal. As diferentes áreas de conhecimento possuem particularidades que exigem o trabalho de diversas dimensões do conhecimento.

O estudo do carnaval e das escolas de samba no contexto escolar evidencia um trabalho articulado com o conhecer, fazer e ser. No qual, o indivíduo além de experimentar e vivenciar movimentos, também deve conhecer as informações históricas e conceituais que envolvem essa temática a fim de oportunizar uma nova leitura da realidade, analisando e refletindo sobre o impacto dessa festa na população de forma geral e, com isso, ser agente participante e transformador na sociedade, produzindo e impactando diretamente na construção dessa e de outras novas culturas populares que constituem a identidade do nosso país.

Ao conceber o trabalho pedagógico com essa estrutura de ensino (conhe-cer, fazer e ser) nota-se uma atenção a ampla condição do ser humano e de suas atividades diárias. A escola como instituição de ensino formal, que além de ser componente ativo na vida das pessoas é parte integrante das experiências e dos conhecimentos que todos vão acessar ao longo da infância e adolescência. Dada essa importância, faz-se necessário atender as necessidades de formação dos alunos e alunas que estão imersos em uma realidade que se transforma diaria-mente diante das inúmeras informações que são acessadas e divulgadas em todo

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Dança na Escola

o mundo. A globalização torna o processo educacional aspecto primordial para a compreensão das diferentes mutações que a realidade mundial está imersa.

Nos fundamentos pedagógicos da BNCC (2018), destaca-se a preocu-pação da superação de modelos de ensino tradicionais, em que o conhecimento era compartimentado e organizado de forma disciplinar. Dada a necessidade de associar o ensino oferecido nas escolas de Educação Básica à realidade e sua aplicabilidade na vida dos estudantes.

Assim, a BNCC propõe a superação da fragmentação radicalmente disciplinar do conhecimento, o estímulo à sua aplicação na vida real, a importância do contexto para dar sentido ao que se aprende e o protagonismo do estudante em sua aprendizagem e na construção de seu projeto de vida. (BRASIL, 2018, p. 15)

Nessa perspectiva, entendemos o ensino de forma interdisciplinar, mul-tidisciplinar e até transdisciplinar. Isso porque o conhecimento utilizado no cotidiano da vida real, fora da escola, se dá de forma articulada. Não se separa. Pelo contrário, o saber é complexo e se dispõe de diferentes formas, exigindo uma capacidade de compreensão ampla. O trabalho da educação física articulado com o de artes, que combina com o de história e assim por diante. Essa é a real preparação para a vida em que as instituições escolares devem se dispor a oferecer.

Para esse trabalho, a formação continuada dos/das profissionais da educação deve ser frequente preocupação. Diariamente novos conhecimentos são construí-dos, novos saberes articulados e novas realidades sociais e comunitárias invadem a sociedade reconfigurando e modificando as necessidades e urgências que surgem. As condições do mundo em que vivemos e as práticas cotidianas das pessoas são parte dos princípios que levam os estudantes as escolas, buscando encontrar um local que lhe ofereça situações de aprendizagem significativa e relevante.

AS DANÇAS NO CARNAVAL: UM RICO UNIVERSO

Quando o olhar se volta para as danças que acontecem no período do carnaval, a sensação é de estar contemplando uma praia, na qual cada grão de areia é um movimento dançante a surgir de um ritmo que ecoou em algum lugar desse imenso país.

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Algumas expressões corporais são espontâneas, sem grandes elaborações, sem ensaios e predefinições de coreografias. Porém, outras nascem de temáticas pré-estabelecidas, de um enredo estudado e artisticamente organizado. Vários são os estilos de dança que estão à disposição de profissionais de diversas áreas e que podem fazer parte de desfiles das agremiações carnavalescas.

Robinson (1978) apresenta uma árvore, numa tentativa de clarear o entendimento do universo da dança, enfatizando as ramificações e possibilidades de movimentos rítmicos e artísticos, com características próprias e ao mesmo tempo com interfaces, mostrando semelhanças e diferenças. Ela nos mostra que o tronco que sustenta a dança é o da magia e a partir dele se ramificam outros, não de menor valor, mas de diferentes características. Em cada galho aparece um tipo de dança, a brotar como flores dos jardins das emoções, dos sentidos e significados.

No carnaval, em especial nos desfiles das grandes escolas de samba, podemos visualizar a árvore de Jacqueline Robinson (1978), pois os sambas enredos, muitas vezes, trazem histórias de povos distantes e próximos, focando suas origens e contribuições atuais; de personagens emblemáticos e suas ações revolucionárias na vida de ontem e de hoje; entre tantas histórias e estórias. Há magia, espetáculo, ludicidade (recreação) e muitos estilos de dança. Se pensarmos para além das escolas de samba, vamos encontrar pelo Brasil afora outros ritmos e, consequentemente, outras formas de movimentos, de expressão e diversos corpos dançantes.

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Dança na Escola

Figura nº1 – Diagrama da dança

Fonte: (ROBINSON, 1978)

Strazzacappa (2001) num artigo sobre dança na escola faz algumas reflexões a partir do diagrama de Robison (1978) e confirma o fato da dança se avolumar na medida em que o ser humano se desenvolve e cria novas formas de se expressar corporalmente. Atualmente, há um rico universo de movimen-tos e ritmos diferentes, ao mesmo tempo em que, as formas iniciais de fazer e vivenciar dança perduram. Como diz a autora, já citada:

Numa tentativa de atualizar esta arvore, poderíamos acrescentar muitas outras danças: algumas danças popu-lares brasileiras, como o forró, o samba, a lambada e recentemente o axé, que também conquistaram os espaços dos cursos de dança de salão ao lado das imortais valsa, tango e bolero. As danças provenientes de regiões de países específicos, como a dança do ventre, a dança fla-menca, o sapateado americano e irlandês (tão em voga atualmente) e as danças de rua (street dance), poderiam ser

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introduzidas como um galho que se inicia nas expressões culturais (folclóricas) e se ramifica tanto para o campo profissional do espetáculo, quanto para área de recreação (amadora). Um bom exemplo são as danças de rua. Elas tiveram origem nos guetos negros norte-americanos, como forma de protesto, e ganharam adeptos no mundo todo. Como o rap, o funk e o break, muitas dessas danças já saíram das ruas e invadiram as academias e palcos teatrais. (STRAZZACAPPA, 2001, p. 73)

Não há um único tipo de dança que prevalece no período do carnaval, são formas espontâneas (improvisadas) de movimentos expressivos, rítmicos e dançantes; há, também, coreografias elaboradas, quanto se trata de determi-nadas alas dos desfiles das escolas de samba, como a comissão de frente, por exemplo; existem danças específicas em determinados lugares do nosso país, como é o caso do frevo (dança dos passos), nas cidades de Pernambuco, entre tantas outras manifestações culturais, com a presença das danças, do teatro, muita música e brincadeiras.

É muito fácil entender esse imenso mapa de ritmos e movimentos que ostenta o carnaval brasileiro, pois sua origem se deu quando os primeiros colo-nizadores portugueses que aqui chegaram, trouxeram nas malas seus pertences e seus costumes e tradições. Aqui aterraram e encontram os nativos indígenas, com modos peculiares de ser e viver, abastados de cantos e danças primitivas. Encontraram, também, os africanos que, em função da maior diáspora exis-tente, vou trazidos ao Brasil com opulenta cultura religiosa, músicas, danças, instrumentos, movimentos e ritmos.

O artigo científico de Lacince; Nóbrega (2010) sobre corpo, dança e criação, traz a visão da artística Mathilde Monnier sobre sua dança e o quanto o corpo deve ser livre para fugir dos padrões acadêmicos impostos, para criar e recriar. Nesse artigo Mathilde diz que “a dança é um espaço de liberação, incons-ciente no início e depois assumida” (LACINCE; NÓBREGA, 2010, p. 244)

Em outro momento, do mesmo artigo, a artista, por meio das vozes de Lacince; Nobréga (2010), nos mostra parte do seu trabalho, relacionando corpo, movimento, sensações e significados e nos remete a esse caldeirão cultural cha-mado Brasil, quando da origem do carnaval no período colonial:

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Dança na Escola

Em sua trajetória, a coreógrafa experimenta quebra de padrões na dança ao considerar as nuances étnicas, assim os corpos dos bailarinos africanos conhecidos pela coreógrafa não são os mesmos corpos dos europeus. Eles não têm o código da dança européia, eles vibram de modo diferente e apresentam um estado do corpo que abre outras possibilidades cênicas para a composição coreográfica. ‘Eu descobri dançarinos lá que sabiam tudo, não tínhamos nada a ensiná-los. Eles me ensinaram muito. Todo mundo dança na África, a rua dança e eu desejaria que eles pudessem se organizar e enviar essa concepção de dança para nós ocidentais. Os corpos não são os mesmos, não buscamos as mesmas coisas, eles não têm código, eles vibram, eles têm um gestual mais profundo’. (LACINCE; NÓBREGA, 2010, p. 246)

Como já afirmamos outras vezes, as danças são presentes, estão e fazem parte dos eventos carnavalescos, ao mesmo tempo, que é regalo que se oferece por agradecimento ou retribuição. Não importa o lugar, nem o olhar que se tem relação a elas, relevante é entender o quanto as danças podem contribuir para o desenvolvimento das melhores qualidades humanas das crianças e jovens, num trabalho escolar, além de ser conhecimento e cultura.

Assim, contando com as experiências adquiridas no grupo de estudos sobre o carnaval, abaixo descrevemos propostas pedagógicas, que podem ser geradoras de trabalhos específicos de algum componente curricular (educação física ou arte) na escola, ou até mesmo de ações interdisciplinares ou multidis-ciplinares, envolvendo vários componentes curriculares, com foco na educação por meio das danças.

PROPOSTAS PEDAGÓGICAS: REFLEXÕES SOBRE O CARNAVAL E VIVÊNCIAS DE DANÇAS

Nesse momento, imbuídas de eternas lembranças, de memórias ímpares de velhos carnavais, de belíssimo desfiles das escolas de samba, dos imensos bonecos dos blocos de Olinda, dos ritmos frenéticos que embalam os trios elétricos da Bahia, entre tantos outros ritmos e danças, certas que as experiências adquiridas em escolas de educação não formal podem e devem ser levadas para escolas de educação formal, atrevemo-nos sugerir propostas pedagógicas para professores/

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as da educação infantil ao ensino médio, não como receitas a serem seguidas na íntegra, mas como sugestões que, com criatividade e criticidade merecem ser adaptadas para o universo ao qual se destina.

PROPOSTAS PARA A EDUCAÇÃO INFANTIL

A Base Nacional Curricular Comum quando aborda a educação infantil, nos contempla com os direitos de aprendizagem e desenvolvimento (conviver, brincar, participar, explorar, expressar e conhecer-se) e com os campos de expe-riências (o eu, o outro e o nós; corpo, gestos e movimentos; traços, sons, cores e formas; escuta, fala, pensamento e imaginação e espaços, tempos, quantidades, relações e transformações). A dica é não perder de vista as orientações desse documento e planejar a aula sobre carnaval e dança e, para isso lhe damos uma mãozinha, com ideias e sugestões. Apesar no documento constar a educação infantil de zero (com a creche) a 5 anos e 11 meses, nossas sugestões são indi-cadas para as crianças a partir de 3 anos. O desafio está lançado!

1- Tema da Atividade: O Conta das Festas

Primeira etapa: conversas para que as crianças compartilhem suas ideias sobre o que elas sabem do tema - festas. Expor os diferentes tipos de festas e manifestações culturais, explicando suas diferenciações. Explicar o que são as Manifestações culturais no Brasil e no Mundo, mostrando como essas manifes-tações são comemoradas através de fotos. Como essas manifestações acontecem no Brasil, quais os benefícios culturais e as discussões que cada uma pode trazer.

Segunda etapa: roda de conversa, incentivando as crianças a expor suas ideias do que eles entendem sobre festas. Atividade prática pedagógica - teatro de Fantoches onde cada personagem representará uma Manifestação Cultural diferente e esses fantoches explicarão quais são os seus significados, o que eles comemoram e como. Exemplo de Manifestações Culturais que podem ser utilizadas: Carnaval Das Escolas de Samba, Bumba Meu Boi, Carnaval de Pernambuco- Frevo, Folia de Reis e Capoeira. Utilizar músicas especificas de cada Manifestação Cultural. Por meio dos Fantoches, criar movimentos carac-terísticos de cada manifestação Cultural para que os alunos reproduzam durante o teatro. Deixar um tempo livre para que os alunos exponham movimentos que conheçam ou que criarão de cada Manifestação Cultural para que os outros

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Dança na Escola

alunos reproduzam esses movimentos, assim ocorrerá um compartilhamento de conhecimento entre eles.

2- Tema da Atividade: As Danças das Festas

Primeira etapa: relembrar o que foi ensinado na aula passada. Acres-centando detalhes históricos, assim poderemos ampliar o conhecimento das Manifestações Culturais no Brasil.

Segunda etapa: escolher duas Manifestações Culturais que foram apre-sentadas na aula passada no teatro de fantoches. Criar uma coreografia para cada uma delas e repassar aos alunos. Mostrar músicas dessas Manifestações Culturais e explorar o ritmo dos alunos, por meio da criação dos movimentos deles. Pedir para que os alunos façam desenhos sobre as Manifestações Culturais. Em uma roda de conversa pedir para que os alunos expliquem os seus desenhos, onde serão questionadas para saber se mudaram as suas ideias sobre as festas.

3- Tema da Atividade: A hora da Festa

Primeira Etapa: Nesse momento os alunos irão explorar a criatividade a partir de uma dança com movimentos livres, além de ampliar os conhecimentos das Manifestações

Segunda Etapa: Criar fantasias que lembrem as Manifestações Culturais brasileiras vistas nas últimas aulas. Preparar uma lista de músicas típicas dessas Manifestações Culturais. Deixar os alunos dançarem livremente, relembrando os passos vistos e recriando-os. Pode ser explorado brincadeiras regionais.

PROPOSTAS PARA O ENSINO FUNDAMENTAL I

O ensino fundamental, com nove anos de duração é a fase mais longa da educação básica, sendo cinco anos para o fundamental I e mais quatro anos para o fundamental II. A educação física e a arte são componentes curriculares da área de conhecimento das linguagens, juntamente com português e inglês. A dança é um conteúdo relevante para o trabalho nesse grande período escolar, pois ela é uma das linguagens da arte (juntamente com música, teatro e artes visuais), além de fazer parte da cultura corporal de movimento, aparecendo com conteúdo da educação física. Nos cinco anos iniciais, que compõem fundamen-tal I, o importante é fazer uma transição da educação infantil para esse novo

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ciclo, de forma adequada, mantendo o lúdico como metodologia e aos poucos ampliando as responsabilidades. Seguem dicas para o trabalho com o carnaval e a dança, tendo essa alusão.

1. Tema da Atividade: Descobrindo o Brasil

Primeira Etapa: Identificar a origem de danças típicas, mostrando quando e como ocorreu o seu surgimento. Vivenciar diferentes danças típicas das regiões brasileiras.

Segunda Etapa: Os alunos e as alunas terão que pesquisar o que são essas Danças dentro da cultura em que estão inseridas. Descobrindo as roupas típicas, quando acontecem as festividades, o porquê acontece, entre outras curiosidades. Vivências de brincadeiras regionais, onde acontecerá breves introduções dos jogos indicando qual a sua origem.

2. Tema da Aula: Jogando Capoeira

Primeira Etapa: atividade envolvendo a educação física e a arte. Criar um instrumento utilizado na capoeira, o caxixi. Fazer uma introdução sobre a origem da Capoeira, seus instrumentos e a importância história.

Segunda Etapa: na roda de conversa, perguntar o que os alunos sabem sobre a capoeira, realizar uma troca de informações. Trabalhar ritmo e ensinar como utilizar o Caxixi. Utilizar o Caxixi e cantar músicas da Capoeira. Ensinar alguns movimentos da Capoeira, aproveitando o ritmo das músicas e do Caxixi. Explorar a criatividade dos alunos através do ritmo e da dança.

3. Tema da Aula: Roda de Samba

Primeira Etapa: se valer dos sambas para contar a história do Brasil, escravização dos Negros, contar fatos históricos sobre a capoeira e o samba. Gerar uma discussão em cima da História do Brasil.

Segunda Etapa: escolher músicas com histórias importantes para o Brasil. Ensinar como dançar o samba de roda e explicar como ele surgiu. Explorar a criatividade dos alunos através da criação de novos passos para as músicas tocadas. Deixar os alunos recriarem os passos e se divertirem com suas criações.

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Dança na Escola

PROPOSTAS PARA O ENSINO FUNDAMENTAL II

Esse período é uma continuação do fundamental I e compreender os quatro últimos anos, entretanto nesse período “o adolescente/jovem participa com maior criticidade de situações comunicativas diversificadas, interagindo com um número de interlocutores cada vez mais amplo”. (BRASIL, 2018, p. 136)

É o momento de desafiar esses jovens, ampliar a cultura corporal de movimento e promover um entendimento crítico sobre os carnavais, seus ritmos e suas danças. Esses jovens precisam ser instigados a descobrirem o país e suas histórias por meio das manifestações culturais.

1. Tema da aula: As Marchinhas da Escola

Primeira Etapa: explorar as Marchinhas para contar a sua origem, os principais cantores, seus fatores sociais e históricos. Explicar como as Marchi-nhas deram origens aos sambas-enredos e gerar discussões sobre os assuntos.

Segunda Etapa: selecionar as Marchinhas mais famosas, mostrar aos alunos trabalhando o ritmo característicos presentes nas Marchinhas. Promo-ver a disputa das Marchinhas da Escola. Dividir a turma em grupos, e cada grupo ficará com um tema diferente. Possíveis temas: Costumes típicos, críticas sociais, humor, entre outros. Os grupos terão que postar em suas redes sociais suas marchinhas. O grupo que alcançar mais curtidas, ganhará a disputa das Marchinhas da Escola.

2. Tema da Atividade: O bloco das Marchinhas

Primeira Etapa: os blocos de rua são característicos do Carnaval de rua, contar a história dos blocos de rua. Promover discussões sobre os conhecimen-tos prévios dos alunos sobre o carnaval. Promover pesquisas sobre os blocos de rua. E suas colaborações sociais para as Manifestações Culturais presentes atualmente. Atividade Interdisciplinaridade: Na aula de artes criar fantasias com materiais recicláveis. A sustentabilidade será citada a fim de promover uma conscientização dos alunos.

Segunda Etapa: com as pesquisas em mãos, promover uma recriação de alguns blocos de rua famosos na história do Brasil. Terão que criar blocos com temas da atualidade que gerem discussões. Dividir a sala em grupos, promover

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um desfile dos blocos criados e cada bloco terá que ter uma marchinha específica e fantasias criadas pelos alunos.

3. Tema da Atividade: Sambando na Escola

Primeira Etapa: atividade envolvendo os componentes curriculares história, educação física e arte. Na aula de história conhecer os fatos históricos do samba. Suas origens e suas manifestações na cultura brasileira. Ligar as marchinhas e os blocos de rua ao samba. Explicar o que é o samba-enredo e sua relevância para os desfiles de escolas de samba. Promover pesquisas em grupos e apresentações em sala sobre como os desfiles das escolas de samba criaram corpo ao longo dos anos, se tornando a maior Manifestação Cultural brasileira. Gerar discussões sobre a relevância dessa Manifestação na atualidade.

Segunda Etapa: assistir Desfiles das Escolas de Samba; escutar os sambas--enredos mais famosos; ensinar os movimentos de dança presentes nos Desfiles; criar uma escola de samba da escola, onde eles irão criar o nome, dividir em alas e fazer pequenas apresentações de cada ala; criar um samba-enredo para cantarem durante o seu desfile e criar passos para cada ala.

PROPOSTAS PARA O ENSINO MÉDIO

O ensino médio é um período muito importante na vida dos jovens (não os outros períodos não sejam), mas em função das várias mudanças que ocorrem no ciclo vital do ser humano, em diversos aspectos, desde fisiológico, psicológico, social e outros. Alguns alunos e algumas alunas estão preocupados/as com o vestibular, outros já pensam em encontrar um emprego. Sem nos aprofundar nessa discussão, queremos registrar a importância de refletir sobre as manifestações culturais e trazer um pouco de leveza para a vida desses jovens, além de estimular à criatividade, a criticidade, a ética (valorizando a cultura como patrimônio da sociedade civil) e estimular os mesmos a entenderem seu lugar no mundo e as diversas possibilidades de transformar a realidade, sem perder suas raízes, pois “cultura é o legado comum de toda a humanidade”. (SANTOS, 1994, p. 86)

1- Tema da Aula: Pernambuco para todos

Primeira Etapa: pesquisas sobre as histórias do frevo e do maracatu. - Conversas e discussões sobre os temas.

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Dança na Escola

Segunda Etapa: dividir a sala em 2 grupos, um deles pesquisará sobre o frevo e outro grupo sobre o maracatu. A intenção é que reúnam o maior número de informações sobre essas manifestações e socializem depois. Mostrar vídeos dessas manifestações em faixas etárias variadas e em diferentes épocas, para que os alunos e as alunas possam encontrar pontos incomuns entre elas. Entendendo melhor como essas festividades acontecem.

2- Tema da Aula: Festando com o Frevo e o Maracatu

Primeira Etapa: experimentar o ritmo e os passos do Frevo e do Mara-catu. - Enfatizar os fatos históricos que essas manifestações culturais possuem. - Aprender letras de músicas referentes a essas festividades.

Segunda Etapa: vivências de passos característicos do frevo (se possível com sombrinhas); propiciar vivências de passos característicos do maracatu. Dividir a sala em grupos, introduzir o carnaval de rua de Pernambuco e solicitar que recriem o Galo da Madrugada, relembrando sua origem nas ruas do centro da cidade de Recife.

3 - Tema da Aula: Blocos de ruas de Olinda

Primeira Etapa: enfatizar os fatos históricos dos blocos de ruas da cidade histórica de Olinda. Conhecer uma das mais famosas manifestações culturais do Brasil, os blocos, suas origens e mensagens. Trabalhar a criatividade por meio de customizações de máscaras, acessórios, roupas e criação de bonecos gigantes. Tra-balhar o ritmo, improvisar os passos de dança e recriar a dinâmica dessa festividade.

Segunda Etapa: Vivenciar a festa de Olinda, trazendo veracidade para o ambiente, caprichando na decoração, com o auxílio dos/as professores/as de educação física, arte, geografia e história. Deixar os/as alunos/as livres para que possam aprender se divertindo. Podem combinar a inclusão de pratos típicos para um lanche coletivo (promovendo a socialização). Que tal convidar outras classes? Tudo é possível se for combinado antes.

ENCERRANDO O DESFILE: A EDUCAÇÃO SEMPRE ACONTECE NAS ESCOLAS

A quarta-feira de cinza chegou, de manhã no alto da Sé em Olinda/PE, o bloco “Bacalhau do Batata” já está formado, para encerrar o carnaval;

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as escolas de samba dos grupos especiais e de acessos, das cidades do Rio de Janeiro e de São Paulo, já aguardam os resultados, para saber quem se desloca para outros grupos (quem chora e quem comemora); os trios elétricos já estão nas garagens e as fantasias serão guardadas junto com as máscaras. Tudo se iniciará somente no próximo ano.

Se não fosse às influências do filosofo francês Edgar Morin, poderíamos afirmar que o carnaval sempre acontece, mas “há sete saberes fundamentais que a educação do futuro deveria tratar em toda sociedade e em toda cultura, sem exclusividade nem rejeição, segundo modelos e regras próprias de cada sociedade e a cada cultura”. (MORIN, 2001, p. 13)

Entre esses saberes está “enfrentar as incertezas”, isto é, nos preparar para o inesperado, pois “o futuro permanece aberto e imprevisível”. (MORIN, 2001, p. 79)

O carnaval não aconteceu em 2021, fruto do isolamento social imposto pela crise sanitária, em função da pandemia do COVID19, que acometeu a humanidade. A esperança é que possamos, nos próximos anos, não somente vivenciar as festividades, mas também, discutir esse acontecimento e crescer com situações que nos provocam perturbações e propiciam novas atitudes éticas e morais (pensamento na coletividade e, também, com foco na individualidade)

O valor do carnaval como espaço de aprendizagem de diversos estilos de dança segue como uma proposta, que enaltece a educação do sensível, promove um olhar crítico sobre estética e a apropriação das manifestações culturais.

A escola como espaço de educação formal, que influência e participa diariamente da vida de crianças e jovens e de suas famílias, deve considerar não só a dimensão intelectual do ser humano, mas também a motricidade, a afetividade e a socialização que se estabelece no diálogo com o conhecimento.

Como nos indica Daolio (2004, p. 70) “ser cultural não nega, mas abarca os aspectos motor, psicológico e social presentes no comportamento humano”.

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Dança na Escola

Figura nº2 – Espiral humana

Fonte: Daólio (2004)

A escola precisa superar a concepção tradicional de educação, na qual o ensino só acontece no interior das suas dependências físicas. Os/As docentes precisam ponderar que a escola não é mais um ambiente pedagógico somente de aprendizagem de conteúdos desconectados da realidade social. A escola é um lugar de ser, de conviver e de aprender. A escola “tem que ser lugar de fascinação e inventividade. Não inibir, mas propiciar, aquela dose de alucinação consensual entusiástica requerida para que o processo de aprender aconteça como mixagem de todos os sentidos” (ASSMANN, 1998, p. 29)

REFERÊNCIAS

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BARSALINI, Leandro. As sínteses de Edison Machado: um estudo sobre o desenvol-vimento de padrões de samba na bateria. Dissertação (Mestrado) - Curso de Música,

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Dança na Escola

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STRAZZACAPPA, Márcia. A Educação e a fábrica de corpos: a dança na escola In Cadernos Cedes, ano XXI, no 53, abril/2001.

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CONTEXTO FOLCLÓRICO NA ESCOLA: DESCOBRINDO, PRESERVANDO E DANÇANDO POR MEIO DAS METODOLOGIAS ATIVAS

Palmira LiraGina Guimarães

1 INTRODUÇÃO

Estamos vivendo um ano atípico. Futuramente, os historiadores terão muito a contar, pois a pandemia da Covid-19 abalou a estrutura das famílias, do trabalho e da escola. Os professores foram obrigados a se reinventar transformando sua casa em sala de aula. Os profissionais da Educação, entre eles os de Educação Física, acostumados com suas aulas na quadra e nas salas de aula, tiveram de usar a imaginação para poderem ministrar as aulas de maneira ativa, criativa e eficaz. O que antes era aula de dança com a turma reunida, com músicas, com passos, histórias, brincadeiras, passou para a tela de um computador ou celular. Assim, os professores vêm utilizando diversas ferramentas tecnológicas mediante games, videoaulas, consultas em diversos sites de busca (Google, Yahoo) entre outras ferramentas para ministrar as aulas. Nesse “novo normal” não há mais lugar para metodologias tradicionais; agora o uso das ferramentas tecnológicas é uma realidade sem volta. A maneira de ensinar, como fazer e também o uso das Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC) estão presentes em quase todas as metodologias.

Como o universo de informações vem sendo ampliado de forma acelerada nas últimas décadas, a práxis peda-gógica inovadora, na sua ação docente, precisa passar do ensinar para enfocar na mediação de aprender a aprender. Por sua vez, a produção do saber, fazer e ser de forma contínua contempla o aprender a aprender, mas para isso, o professor necessita ser desafiado a buscar novas metodologias para atender as exigências da sociedade atual. (SANTOS; FRANÇA, 2011, p. 227).

Nesse contexto, instalou-se uma crise e, com ela, a necessidade do conhe-cimento tecnológico por parte de muitos professores para poder trabalhar, somada

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à busca por metodologias que modifiquem a condição de apenas ouvinte para participante e atuante.

No campo da Educação Física e de suas práticas corporais, talvez tenha sido mais complicada esta necessidade de mudanças metodológicas no trato de seus conteúdos; novas competências e habilidades precisaram ser mobilizadas pelos professores, porque:

A Educação Física é o componente curricular que tematiza as práticas corporais em suas diversas formas de codificação e significação social, entendidas como manifestações das possibilidades expressivas dos sujeitos, produzidas por diversos grupos sociais no decorrer da história. Nessa concepção, o movimento humano está sempre inserido no âmbito da cultura e não se limita a um deslocamento espaço-temporal de um segmento corporal ou de um corpo todo. (BRASIL, 2018, p. 213).

Dentre os conteúdos da Educação Física propostos pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC), estão brincadeiras e jogos, esportes, ginástica, lutas, práticas corporais de aventura e as danças; e dentro desse tema-conteúdo, as Danças Folclóricas, que têm como um dos princípios básicos a experimenta-ção, a qual “refere-se à dimensão do conhecimento que se origina pela vivência das práticas corporais, pelo envolvimento corporal na realização das mesmas” (BRASIL, 2018, p. 220). Porém, como ministrar uma aula de Dança sem ter de demonstrar para os estudantes copiarem? Como levar ao estudante conhecimento das tradições populares uma vez que estamos na 4.ª Revolução Industrial?

Nosso desafio é contribuir, diante desse contexto, no que diz respeito à articulação de saberes referentes às práticas corporais no campo das danças folclóricas, com as metodologias ativas, tão presentes atualmente na prática pedagógica dos professores como forma auxiliar neste processo de transformação.

PASSEIO CULTURAL

Iremos fazer um breve trajeto por conceitos e historicidade das Danças Folclóricas, no sentido de aborda-las como conteúdo da cultura corporal nas práticas pedagógicas nas aulas de Educação física.

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A Dança

A Dança pode ser compreendida como forma de expressividade humana a partir de sua realidade cultural e tempo histórico. Segundo Marques (2003), a dança deve ser entendida como arte, e não apenas como exposição de movimentos, trazendo consigo todo um conjunto de conteúdos que podem ser trabalhados pelos professores, configurando-se também como área de conhecimento, ou seja, conteúdos. Assim, afirma que os conteúdos da Dança podem ser os:

[...] aspectos e estruturas do aprendizado do movimento (aspectos da coreologia, educação somática e técnica); disciplinas que contextualizam a dança (história, estética, apreciação e crítica, sociologia, antropologia, música, assim como saberes de anatomia, fisiologia e cinesiologia) e possibilidades de vivenciar a dança em si (repertórios, improvisação e composição coreográfica). (MARQUES, 2003, p. 31).

Segundo o Coletivo de Autores:

Considera-se a dança uma expressão representativa de diversos aspectos da vida do homem. Pode ser considerada como linguagem social que permite a transmissão de sentimentos, emoções da afetividade vivida nas esferas da religiosidade, do trabalho, dos costumes, hábitos, da saúde, da guerra etc. (SOARES et al., 1992, p. 58).

Adriana Gehres (1996, p. 28), define a dança como “arte do movimento”, e a escola como um ambiente de ensino formal “com a função de sistematizar, socializar e universalizar o conhecimento acerca do real, onde a Dança popular faz parte deste conhecimento real”. Concluindo, ela afirma que a dança é um “tema-conteúdo” a ser tratado nas escolas.

Percebe-se que, em vários lugares do Brasil, a dança, independentemente de sua classificação, sofre preconceito ao ser trabalhada em sala de aula, como o de gênero nas aulas de Educação Física, em que alguns estudantes do sexo masculino se sentem constrangidos, incentivados pela educação machista de que a dança “foi feita para mulheres”; enfrentamos também discriminação por algumas religiões, que não permitem a espontaneidade da dança. Ainda nesse meio, existem muitos professores que alegam não saber dançar como argumento para não intervir com o conteúdo Dança, negando ao estudante um

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conhecimento tão rico de habilidades como ritmo, coordenação, conhecimento corporal, cultura, entre outros, que se adquirem nas aulas (GAIO et al., 2010; GUIMARÃES, 2003).

No entanto, o trato com o conteúdo Dança, e entre este, a dança folclórica, remete a história coletiva, de onde os estudantes vieram e como chegaram ao que são agora. O trato pedagógico com esses temas dialoga com experiências do que Elias (1994, p. 182) chama de “identidade-nós” e da “imagem-do-nós”, pois “dá a cada indivíduo um passado que se estende muito além de seu passado pessoal e permite que alguma coisa das pessoas de outrora continue a viver no presente”, entre outros valores culturais, adquirindo, assim, a função de memória coletiva.

O Brasil é um país extremamente diversificado culturalmente, com uma grande diversidade de ritmos encontrados em cada canto do território nacional, que diferem bastante de um espaço para o outro, expressando as identidades que compõem nosso vasto país, onde é possível verificar raízes africanas, indígenas, europeias, entre outras influências. Nesse sentido, quando estudamos danças folclóricas, concordamos com Oliveira (1991), que diz ser necessário conhecer-mos nossa arte, para saber cuidar bem dela e assim podermos dar algum tipo de contribuição relevante à humanidade no plano artístico-cultural.

A dança é uma das práticas corporais apresentadas na BNCC. Nesse documento o texto orienta o trabalho pedagógico desse conteúdo desde as danças do contexto comunitário e regional, como também danças do Brasil e do mundo, assim como danças de matriz indígena e africana, desde os primeiros anos do ensino fundamental (BRASIL, 2018).

Ampliando os estudos em Dança, Laban (1978; 1984), citado por Lacava (2006), apresenta-nos os princípios básicos do movimento, presentes em toda e qualquer atividade corporal, inclusive nas danças folclóricas, seja ela consciente, seja inconsciente: o que se move: o corpo – em partes, como uma só unidade –, sua coordenação e formas assumidas durante o movimento; como nos movemos: a qualidade do movimento, as dinâmicas ou esforços que expressam as nos-sas sensações, transformando-as em ações do movimento; onde nos movemos: o espaço, o que está imediatamente ao nosso redor (espaço parcial) e o espaço/lugar onde nos encontramos (uma sala, um teatro, um parque, uma rua); com

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quem nos movemos: o relacionamento, as pessoas que encontramos/com as quais convivemos/ estabelecemos contato e ligação.

Na “Corêutica”, Rudolf Laban elabora o sistema de análise do movimento a partir de seu pensamento sobre o espaço. Na “Eucinética”, onde está integrada a teoria dos esforços, Laban elabora seu pensamento sobre as qualidades do movimento, ou qualidade dos esforços, baseado nos quatro fatores – peso, tempo, espaço e fluência. Tanto a corêutica como a eucinética são imprescindíveis ao estudo do movimento expressivo, entre estes, nos estudos sobre as danças em geral e sobre as danças folclóricas.

Nesse vasto campo de estudos e expressividades, encontramos uma gama de classificações de dança que podem ser abordadas nas aulas. Segundo Sotero (2014, p. 139), “as danças podem ser dramáticas, folclórica, de salão, moderna, contemporânea e clássica”. No momento, nosso interesse adentra as danças folclóricas.

Danças folclóricas

Partindo do princípio da historicidade, bem como da linguagem social, encontramos na dança folclórica uma enorme bagagem de herança cultural.

Muitos autores definem de maneira diferente o conceito de Dança Folclórica. Há quem chame de Danças Representativas (SBORQUIA; GAL-LARDO 2006); Mário de Andrade (1982) chamou de Danças Dramáticas.

Faro (2011) nos faz compreender que as danças folclóricas nos remetem a formas de expressões populares que avançaram no tempo e no espaço por conta de uma soma de circunstâncias sociológicas, que, assim como a dança étnica, se relaciona com expressividade de manifestações coreográficas de diferentes povos, mas com o passar do tempo, algumas caminharam para as manifestações de dança étnico-religiosas e outras para o cunho profano e popular-folclórico. Para esse autor, o folclore brasileiro pode-se dividir em urbano e rural (relacionados com áreas de pesca, agricultura, mineração, pastoreio, região Amazônica), originário de diversas influências, tanto em seus temas como em suas coreografias e/ou nome de personagens.

Outros autores abordam o fenômeno, denominando-o danças populares. Assim, segundo Oliveira (1991):

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[...] são aquelas que persistem no tempo e continuam preservando os mesmos elementos dentro de uma mesma estrutura – apesar de estarem sendo constantemente recriadas pela iniciativa criadora dos seus praticantes ou por necessidade de adaptação a novos contextos. São danças que, normalmente se aprende a dançar por imitação direta, na própria vida, longe de situações for-mais e eruditas de transmissão de saber. Danças popu-lares ou folclóricas são as danças típicas, particulares de cada região ou país, que, diferentemente das danças eruditas, por razões históricas não se universalizaram. (OLIVEIRA, 1991 citada por GEHRES, 1996, p. 27).

Em Laban (1978, p. 43), encontramos também observações desse pes-quisador da dança a respeito das “danças regionais”. Ele diz:

As danças regionais e nacionais são criadas pela repetição destas configurações de esforços, na medida em que são características da comunidade. Essas danças mostram a gama de esforços cultivada pelos grupos sociais que vivem num meio ambiente definido. A lânguida e onírica dança de uma oriental, a orgulhosa e apaixonada dança de uma espanhola, a dança temperamental de uma italiana do sul, a bem-sucedida dança em círculo dos anglo-saxões são exemplos das manifestações de esforço selecionadas e aprimoradas durante largos períodos da história até que finalmente se tornaram expressivas da mentalidade de grupos sociais particulares [...] Em tempos bem antigos, essas danças eram um dos meios principais de ensinar ao jovem como adaptar-se aos hábitos e costumes de seus antepassados. Neste sentido, estão em íntima conexão tanto com a educação quanto com o culto e religião ancestrais. (LABAN, 1978, p. 43).

Destaca-se, também, que é necessário ao professor e à professora dominar a forma e o conteúdo da dança para que não apresente a produção cultural, a visão de mundo, o saber de determinada camada da população de forma distorcida

Porém, todos concordam que são expressões culturais transmitidas por várias gerações, permanecendo com sua essência, mesmo que tenham sido incluídas novas músicas e passos para acompanhar a evolução do homem.

Segundo Roberto Benjamin (2002, p. 1), o termo folk-lore foi empregado pela primeira vez em 22 de agosto de 1846 por William John Thoms, quando

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publicou um artigo intitulado Folk-lore, ficando estabelecida no Brasil essa data, como “Dia do Folclore”, pelo Decreto-Lei n.º 56.747, de 17 de agosto de 1965. “[...] grafada inicialmente folk-lore fora formada a partir das velhas raízes saxônicas em que folk significa povo e lore saber. Assim, segundo o seu criador, a nova palavra significaria sabedoria do povo.” (BENJAMIN, 2002, p. 1).

Ainda segundo Benjamin, no VIII Congresso Brasileiro de Folclore, reunido em Salvador, Bahia, em dezembro de 1995, procedeu-se à releitura da Carta do Folclore Brasileiro, aprovada durante o I Congresso Brasileiro de Folclore, realizado de 22 a 31 de agosto de 1951 no Rio de Janeiro, ocasião em que se apresentou este conceito de Folclore:

[...] é o conjunto das criações culturais de uma comuni-dade, baseado nas suas tradições expressas individual ou coletivamente, representativo de sua identidade social. Constituem-se fatores de identificação da manifestação folclórica: aceitação coletiva, tradicionalidade, dinamici-dade, funcionalidade. (COMISSÃO NACIONAL DE FOLCLORE, 1995).

Nesse debate, várias características que haviam sido atribuídas ao folclore desaparecem e outras são relativizadas, entre elas: anonimato, aceitação coletiva, transmissão oral, antiguidade, tradicionalidade e dinamicidade, espontaneidade, funcionalidade, regionalidade.

Durante um grande espaço de tempo, reconheciam-se as danças folclóricas por meio de algumas destas características: serem transmitidas de boca em boca; ser social, praticada por muitos; serem espontâneas, livres; serem anônimas na sua criação; e ser funcional, ter vindo de uma razão, um destino. Precisa-se ter cuidado para que tais características não tornem a dança como imutável, indo de encontro à dinâmica da sociedade, que é inovadora e transformadora. Assim, as danças como arte seguem as diversas mudanças de que o mercado necessita, novos passos, vestimentas, músicas, adereços, coreografias, sem perder a essência da dança. “Afinal, o que o povo produz ou reproduz, naturalmente, varia em alguns de seus elementos, porque também sofre influência, seja do próprio cotidiano, seja de agentes externos.” (D’AMORIM; ARAÚJO, 2003, p. 16).

Supõe-se que as danças folclóricas surgiram após o aumento das civiliza-ções e urbanização dos povos (FARO, 2011). Era comum agradecer a colheita,

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dançar nas celebrações como casamento, nascimento, e até morte. Com o passar do tempo, foram perdendo essas características e passaram a ser executadas sem a presença do clero. Cada uma foi adquirindo coreografia própria e se tornando típicas do lugar.

Segundo Sotero (2014), as danças folclóricas se subdividem em danças religiosas, as quais fazem parte das crenças religiosas da comunidade em ceri-monias, cultos; e danças profanas são as que fazem parte do cotidiano pagão da comunidade em comemorações diversas.

Hoje temos danças folclóricas específicas que caracterizam o País. Pode-mos citar a tarantela (típica da Itália), o tango (Argentina) e o samba (no Brasil); cada uma com seus passos, músicas, vestimentas e, às vezes, adereços que carregam consigo uma história. Cada país tem grupos folclóricos que as representam em espetáculos de grande beleza.

Folclore brasileiro

O folclore brasileiro forma-se a partir da colonização europeia pela miscigenação entre os povos indígenas, brancos e negros. Essa união de cultura faz de nosso país um palco de diversidade, caracterizando cada região e cada Estado, com danças típicas.

Segundo Cortês (2000), uma das principais características do Brasil é a sua heterogeneidade cultural; em suas cinco regiões, eclodem danças de caráter profano, sagrado, dramático, guerreiro ou teatral. Tais danças, festas ou folguedos são divididos em ciclos ou autos, como o ciclo carnavalesco, ciclo junino, o ciclo natalino, a Festa do Divino, e o Auto do Boi. Cada região do Brasil tem sua dança popular e o ciclo em que ela é dançada. As manifestações da cultura popular se modificam com as mudanças da sociedade em que estão inseridas, sendo parte fundamental dos diversos modos de pensar, sentir e agir de um povo, presentes em seu contexto sociocultural historicamente construído.

Na Região Norte, as características de suas danças populares são o ritmo quente, a sensualidade e o entrelaçamento que ocorre entre os pares nas danças. O instrumento mais típico da região é o carimbó, o qual deu o nome à principal dança da região, onde também encontramos o siriá, o marabaixo, o lundu, a famosa Festa do Boi entre outras.

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Na Região Nordeste, destaca-se o frevo, coco, maracatu, guerreiro, ciranda, caboclinhos, e os ritmos de forró, que abrilhantam a rica região.

A Região Centro-Oeste apresenta-se com a miscigenação de várias cul-turas, presentes principalmente no folguedo da cavalhada, com características e culturas vindas de todas as regiões do país. As festas e danças típicas da região são envolvidas pelo som melódico das violas de cocho. Encontramos também a catira, o siriri, e o cururu.

Na Região Sudeste, as homenagens prestadas aos santos de devoção, em grandes celebrações religiosas como as festas do Divino e as peregrinações dos grupos de reis, além do jongo, da congada, são características. Entretanto, o lado profano também está presente na região, com a comemoração da maior festa pagã, o carnaval, principalmente nas cidades mais populosas do Brasil, Rio de Janeiro e São Paulo.

Por fim, a Região Sul conta com danças românticas e respeitosas, especial-mente encontradas no Rio Grande do Sul. Colonizada de forma diferenciada do país, o Sul incorpora a modernidade de tempos atuais à tradição de sua cultura imigrada da Europa (principalmente Itália e Alemanha). Podemos encontrar, entre outras danças e festas, a rancheira, o pau-de-fitas, a chula, e o pezinho.

Para incorporar as danças folclóricas nas aulas de Educação Física, é importante verificar a complexidade dos aspectos que as compõem, mas cor-respondendo com a maturidade dos alunos, assim terão acesso a um acervo rico de cultura e conhecimento corporal. Também ao privilegiar o início do traba-lho com a dança que é típica do local, para turmas de menor idade, podemos tratar, além da valorização cultural local, o reconhecimento de sua identidade, estética-cultural, e ainda por promover o acesso ao conhecimento das músicas, passos e especifidades, as quais caracterizam a formação social do indivíduo.

Podemos citar como exemplo na Região Nordeste, o frevo pernambucano. Segundo Fonte Filho (1999), dança folclórica típica da cidade do Recife, que surgiu por intermédio dos negros libertos, no início do século XX, e em 2012, foi incorporado à Lista Representativa do Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade da Unesco. É uma dança que possui uma gama variada de passos, desde níveis mais fáceis a alguns com muita complexidade na execução, totali-zando cerca de 120. Porém, ao tocar o som da música tradicional “Vassourinha

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- Marcha n.º 1 do Clube Vassourinhas”, não há recifense que não a reconheça ou não saiba executar um passo do frevo.

As escolas do ensino infantil e fundamental estão sempre revivendo as festas e atividades culturais, porém é importante que a Dança na escola não seja representada apenas nos períodos de festejo, mas sim, abordada como uma área de conhecimento. Para cada nível de ensino, deverá ter uma unidade de ensino do conteúdo Dança de forma a abordarmos conhecimentos da história e local de origem, período de celebração, músicas, vestimentas, adereços, passos característicos de cada dança, seus sentidos e significados sociais. Entretanto, a todo esse conjunto, necessita-se de uma pesquisa mais aprofundada.

No entanto, como afirmado anteriormente, muitos professores de Edu-cação Física sentem dificuldades em ministrar as aulas do conteúdo Dança por se colocarem na posição de não saber dançar, ou por dizerem que estudantes não têm interesse, e ainda mencionam a falta de estrutura e material adequado para realização da atividade. Enfim, existem vários “impedimentos” com relação ao ensino dessa temática.

Várias são as razões apresentadas e todas podem ser contestadas a partir de argumentação bem simples [...]. Outra razão apresentada para ausência desse conheci-mento está na justificativa de que a escola não apresenta infraestrutura para a dança, como por exemplo, apare-lhagem de som. (GAIO et al., 2010, p. 42).

Não pretendemos generalizar, porém, em uma curta pesquisa com cole-gas da área, bem como nas reuniões e capacitações da rede pública, é possível verificar tais argumentos. Partindo desse ponto, percebemos que não necessaria-mente há a necessidade de o professor escolher apenas a estratégia de ensino da demonstração; nos dias atuais, a utilização de ferramentas tecnológicas diversas podem ser aplicadas para auxiliar nas vivências, sejam de dança, ginástica, sejam de outras práticas corporais.

DANÇAS FOLCLÓRICAS E METODOLOGIAS ATIVAS

Levando em consideração nossa experiência de vários anos no chão da escola, pretendemos contribuir com o profissional de Educação Física apre-

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sentando práticas de forma a inovar as aulas, quebrando paradigmas, em que o professor deixa de ser o centralizador do conhecimento e transforma-se em mediador/orientador/mentor.

Segundo Lira (2018), a sociedade tecnológica, com a utilização das Tecnologias da informação e comunicação (TIC) e seus desafios, demanda do professor ação-reflexão constante. Para adotar as metodologias ativas, a trans-formação precisa ser na postura, sabendo ouvir, deixar o estudante expressar suas opiniões, compreender as necessidades desse estudante, além da valorização dos conhecimentos prévios e a proposição problematizadora. O estudante, por sua vez, deixa de ser passivo no processo de ensino-aprendizagem para se transformar em protagonista, aprendendo a aprender; assim, ele passa a ser estudante, aquele que aprende de forma participativa. Nesse sentido, as metodologias ativas estão presentes para auxiliar nesse processo de transformação.

Como ministrar uma aula de Dança sem ter de demonstrar para que os estudantes possam reproduzir? Como levar ao estudante conhecimentos e reflexões sobre um passado, por vezes muito remoto, uma vez que estamos na 4.ª Revolução Industrial?

Por sermos apaixonadas por danças folclóricas e por termos sentido a necessidade de ruptura com o tradicional, necessitamos reinventar-nos utilizando as metodologias ativas. Estas partem também das exigências da BNCC, quando nos diz que a Educação Física sistematiza as práticas corporais em suas diversas formas de codificação e significação social, entendidas como manifestações das possibilidades expressivas do sujeito, produzidas por diversos grupos sociais no decorrer da história (BRASIL, 2018).

Estamos vivendo em uma era conhecida como a 4.ª Revolução Industrial, marcada pela fusão do real e virtual. O cenário mundial faz perspectivas para cinco anos e, em 2015, as tendências antigas foram ressignificadas, não havendo mais tanto espaço para as metodologias tradicionais, onde o estudante era apenas um ouvinte, aceitando todo conteúdo explicado pelo professor.

Segundo Lira (2018 p. 50): “Nessa visão, o ensino transforma-se em mero repassar de conhecimentos, em que o educador tem o papel principal no processo, as disciplinas são vistas de forma estanque, sem ligação e sem significa-ção com a vida.” Consoante a metodologia chamada de Educação Bancária por

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Freire (1996), o professor tinha obrigação de transmitir e o estudante obrigação de absorver, no entanto, apesar de obsoleta, essa situação ainda é considerada adequada por muitos professores.

Não é de hoje que estudiosos da Educação vêm contribuindo com uma literatura na tentativa de transformar a forma de pensar e agir na sala de aula, ou quadra de aula. “Essas ideias de construção do conhecimento estão presentes nas obras de vários autores, como, Piaget, Vygotsky e Paulo Freire, e dependendo de qual deles seja o referencial eleito, configura-se como uma proposta pedagógica diferenciada e inovadora.” (LIRA, 2018, p. 27).

Diante desse cenário é que atrelamos o uso das metodologias ativas nas aulas de danças folclóricas; mas o que vem a ser “Metodologias Ativas”? “Metodologias Ativas de aprendizagem são mecanismos didáticos que colocam o aluno direta e ativamente no centro do processo de aquisição do conhecimento, pois concentram o ensino e a aprendizagem no ‘fazer para aprofundar o saber’.” (NEVES, 2018, p. 13).

Trata-se de uma metodologia em que o aluno deixa de ser passivo, rece-bedor de conhecimentos para ser estudante, aquele que estuda, que gerencia sua aprendizagem, de maneira individual, grupal e tutorial. O estudante sai da condição de ouvinte para a condição de construtor ativo da sua aprendizagem. O professor deixa de ser o foco principal e assume a condição de mediador/orientador/mentor na construção do conhecimento. “Metodologias ativas são estratégias de ensino centradas na participação efetiva dos estudantes na cons-trução do processo de aprendizagem, de forma flexível, interligada e híbrida.” (MORAN, 2018, p. 41).

O estudante fica predisposto a aprender, passa a ser protagonista no processo de construção do conhecimento; ele cria, modifica e compartilha o conhecimento por meio de situações concretas, de desafios, jogos, experiências, vivências, problemas, projetos desenvolvidos. A escola, quando adota as TIC, passa a ter uma nova concepção de espaço e tempo, ao criar grupos diversos para se comunicarem (por exemplo: via WhatsApp, Facebook, Instagram, e-mail ou Youtube), passam assim a adotar uma comunicação interativa, de forma que eleva o potencial cultural e moderniza a escola tradicional ao trazê-la para o tempo real em espaço virtual. “Os educadores do século XXI não podem des-

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considerar a plasticidade do cérebro de uma geração que passa boa parte do dia na internet vivenciando deslocamentos e interações inusitadas em múltiplos espaços virtuais.” (LIMA, 2018, p. 21).

A contemporaneidade não comporta mais as metodologias tradicionais. Para o estudante, é necessário ter sentido e significado para haver interesse em aprender. “Uma aprendizagem calcada apenas no fazer, desprovida do ‘por quê’ e do ‘para que fazer’, não pode ser consagrada como significativa, como neces-sária para a vida, correndo o risco portanto, de não ser permanente.” (GAIO et al., 2010, p. 44).

Baseados na pirâmide da aprendizagem de Willian Glasser, os estudantes consolidam sua aprendizagem quando estão prontos para ensinar. “10% quando lemos; 20% quando ouvimos; 30% quando observamos; 50% quando vemos e ouvimos; 70% quando discutimos com outros; 80% quando fazemos; 95% quando ensinamos aos outros.” (GOMES; OSÓRIO; VALENTE, 2017, p. 29).

A proposta principal dessa metodologia significa elaborar atividades nas quais os estudantes sejam ativos e protagonistas. Consequentemente, pode-mos promover não só a melhoria do aprendizado, mas também ajudá-los a ser autônomos, pesquisadores, descobridores, realizadores na busca de novos saberes. Desse modo várias estratégias metodológicas de ensino foram criadas para dinamizar a aprendizagem. Não se trata de dizer que a partir de agora as aulas expositivas caíram em desuso, elas podem ser de grande valia para apoiar os estudantes nas pesquisas; porém a sala de aula pode e deve tomar um novo papel como espaço privilegiado, onde os estudantes se reúnem e passam a ter gosto no aprender.

A aprendizagem significativa ocorre quando o estudante consegue em seus estudos reunir competências e habilidades cognitivas (conhecimento necessário para o nível de dimensão da mente), práticas (saberes para uso do corpo), emocionais (saber com o coração, habilidade emocional). O resultado é um estudante que argumenta, transforma, define, compreende e percebe. As contribuições dessa metodologia estão na maior retenção de informações, o estudante potencializa a compreensão e o uso do conhecimento e do raciocí-nio crítico e analítico. Ela capacita o estudante para intervir em contextos de incertezas e complexidades ajudando para o melhor entendimento.

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Algumas das propostas de metodologias ativas podem ser: sala de aula interativa, sala de aula compartilhada, a contextualização da aprendizagem, pro-gramação, ensino híbrido, design thinking, desenvolvimento do currículo steam, criação de jogos, ensinando com jogos, aprendizagem baseada em problemas, proposta de aprendizagem baseada em projetos (metodologia da problema-tização), mapa mental, e sala de aula invertida (BACICH; MORAN, 2018; NEVES; MERCANTI; LIMA, 2018).

Com tudo isso, não significa que, em nosso contexto, as aulas de danças folclóricas passarão a ser teóricas, ou apenas demonstrativas. O estudante deverá ir para a escola aprender dança, e não simplesmente fazer a aula prática. Cabe ao professor de Educação Física conhecer o assunto para poder mediar a construção do conhecimento; esta é uma questão de ressignificar papéis, pois o professor também conhece novas formas de ensinar ao adotar práticas educacionais que promovem colaboração e envolvimento do estudante.

Metodologias ativas para danças folclóricas

Citaremos algumas metodologias de aprendizagem na sua realização com dança folclórica, com base em experiências comprovadas por nós, em que houve satisfação dos estudantes e o desempenho no processo de aprendizagem tornou-se dinâmico, criativo e estimulante.

A) Sala de aula invertida

A aula invertida traz em sua essência a ideia de inverter a lógica das atividades realizadas pelos estudantes e demandadas pelos professores. A ideia central é fazer do espaço da sala de aula um aprofundamento dos estudos já realizados pelos estudantes, ou seja, anteriormente os professores disponibilizam um material sobre tema (textos, slides, vídeos, entre outros) relacionado com a atividade proposta. Os estudantes vão ler e se apropriarem do assunto. Na aula seguinte, os estudantes devem vir conscientes do tópico proposto e com possíveis dificuldades/dúvidas para a sala de aula, para que então o professor possa potencializar o momento da aula em si, focando em auxiliar o melhor caminho para a aprendizagem.

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O professor de Educação Física pode elaborar um material sobre a dança folclórica a ser estudada. O material pode ser um texto, um capítulo de livro, um filme, um artigo, um podcast.1 Esse material pode estar também disponibilizado em uma rede de interatividade de confiança e qualidade.2

Um exemplo como adotado em nossas aulas

A dança escolhida foi o frevo para estudantes do 8.º ano do Ensino Fundamental – Anos Finais. Os estudantes foram reunidos na quadra. Caso não tenha quadra na sua escola, pode ser em um local com sombra, na própria sala de aula, no pátio; é importante que estejam sentados para apreciação da introdução do assunto. Os passos para cada aula com a utilização das metodologias utilizadas seguidas incluem: (i) contação de história; (ii) leitura do material sobre a dança folclórica enviado pelo professor e pesquisa sobre o tema/passos dessa dança como exercício para casa; (iii) discussão do texto, o papel histórico e social dessa dança conteúdo e a prática de alguns passos; (iv) prática dos passos de dança aprendidos pelos estudantes por meio da realização de pesquisas prévias; (v) introdução aos métodos de dança, unindo os conhecimentos prévios dos passos da dança com o ensino da montagem coreográfica.

Utilizamos a contação de história

Foi contada a história de como surgiu o frevo. Uma dança típica do Recife, que surgiu logo após a abolição da escravatura. Nessa época não havia rádio nem televisão. Eram comuns as bandas de fanfarra saírem pelas ruas tocando músicas como marchinhas, polcas e maxixe ao ritmo do dobrado das bandas. (FONTE FILHO, 1999).

Pelas ruas de Recife iam os negros libertos alegres e saltitantes defendendo a banda de sua preferência. Era comum a rivalidade quando se defrontavam com outra banda, pois havia a disputa pela melhor. Porém o resultado nem sempre era 1 “Podcast é um material entregue na forma de áudio, muito semelhante a um rádio. A diferença é que fica disponível para que o consumidor escute quando quiser, não é um programa ao vivo. Além disso, o conteúdo é criado sob demanda.” (BOSCARIOL, 2019).2 Canais de Youtube, perfis de Instagram, sites de Grupos de Estudos específicos, relacionados com a temática. Hoje muitos grupos de estudos renomados utilizam essas ferramentas, para dis-ponibilizarem suas pesquisas, realizarem estudos coletivos, sugerirem outras ações, partilharem experiências exitosas. No fim deste texto, sugerimos alguns.

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dos melhores. Nas brigas, alguns usavam a capoeira para atacar e se defender, alguns ficavam feridos e a polícia da época levavam vários para delegacia. Era comum usar sombrinhas para esconder os porretes de madeira e para furar o bombo da banda rival. No momento da alegria, a multidão fervia com o sol quente das ruas e saltitavam em passos criando sua maneira particular de se divertir. No dia 09 de fevereiro de 1907, saiu à primeira reportagem num jornal fazendo alusão a nova dança. Ficando marcado como o ‘Dia do frevo’. (AMORIM, 2008).

Procedimentos

Os alunos escutavam e riam com a dramatização feita nessa contação de história. Todas as turmas já possuem grupos na internet (i.e. e-mail), e foi nessa ferramenta que o texto foi enviado, com mais aprofundamento da história como vestimenta, música, sobre tipos de frevo, nomeando alguns passos, e falando um pouco da questão social.

Abaixo do texto, havia perguntas a serem respondidas na aula seguinte, a exemplo de: (i) Qual a função da sombrinha? (ii) Como se vestiam as pessoas para dançarem frevo? Como se vestem hoje? (iii) Por que os negros que iam à frente das bandas brigavam com os outros da outra banda? Nosso foco era instigar os estudantes para uma conversa sobre o frevo e sobre a condição social em que o negro se encontrava após a abolição.

Incluímos, ainda, nas questões enviadas para os estudantes realizarem em casa, pesquisa com familiares, vizinhos, amigos sobre um passo de frevo para trazer e executar na aula prática.

Na aula seguinte, conversamos sobre o texto, a questão social com relação à abolição, que simplesmente deixou os negros na rua sem trabalho, sem estudo, sem casa, sem estrutura psicológica e mínimas condições de sobrevivência. Tam-bém abordamos um pouco sobre a capoeira, em seguida, foram apresentados vários passos por eles pesquisados.

Para a experimentação Prática, foram utilizados os passos trazidos pelos estudantes; cada um apresentava o passo e todos executavam, foram apresentados cerca de 10 passos diferentes, entre eles: Saci, Barquinho, Tesoura, Na ponta do pé e no calcanhar, Pontilhado, Girassol, Faz que vai e não vai, Ferrolho, Pisando em brasa. A cada apresentação do passo, os estudantes puderam experimentar

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e praticar, e para incrementar a atividade, também houve música mantendo os estudantes entretidos e ao mesmo tempo aprendendo sobre o frevo.

Na aula seguinte, utilizamos os passos com deslocamento, com formação de desenhos coreográficos, e como apoio, trouxemos o frevo-canção e formamos uma pequena coreografia.

B) Teatralização

É uma metodologia que estimula o lado artístico, criativo e de improvisação do estudante que interpretará temas diversos com gestos, falas, Danças e/ou cantos sobre os personagens que deverão ser pesquisados de acordo com a solicitação do professor. Na teatralização, foram seguidos os seguintes passos: (i) apresentação do tema em sala de aula utilizando-se das metodologias ativas; (ii) divisão da turma em grupos, em que deverão pesquisar sobre o tema folclórico em plataformas digitais, para então reunir informações de forma a desenvolver uma teatralização deste tópico; (iii) ensaio das peças criadas pelos estudantes com a participação do professor como mediador/orientador; (iv) apresentação das peças pelos estudantes, das quais devem incluir passos da dança folclórica escolhida pelo grupo.

Um exemplo como adotado em nossas aulas

Este método foi utilizado com estudantes do 9.º ano do Ensino Fun-damental – Anos Finais, os quais receberam orientação em sala de aula. Foi utilizada a apresentação no quadro, exposição do conteúdo, porém poderia ser por slide ou filme. O assunto selecionado foi o estudo sobre os ciclos carnavalesco, junino e natalino. Explicamos de maneira simples do que se tratava e quais as danças que representavam cada ciclo.

Procedimentos

A turma foi dividida em três grupos. Para cada grupo, foi sorteado um ciclo. O grupo deveria escolher uma dança folclórica do ciclo sorteado. As apresentações seguiam de acordo com o calendário festivo social, iniciado pelo carnavalesco, em seguida o junino e, por último, o natalino. Os grupos deve-riam apresentar de forma teatral, fatos históricos, vestimenta, adereços (caso tenha), músicas antigas e atuais. Foram sugeridas as plataformas digitais para

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Dança na Escola

pesquisa, como Youtube e sites que tratavam sobre o tema, sendo o professor um importante mediador para indicar os caminhos de uma boa pesquisa. Com a participação do professor na orientação junto dos grupos, na elaboração da tarefa, foram reservadas duas aulas para os ensaios dos três grupos. Após a apresentação teatral, deveriam demonstrar no mínimo três passos para a turma, podendo ser uma pequena coreografia, em seguida ensinar para todos da sala.

Todos do grupo deveriam ter participação efetiva, entretanto para os estudantes mais introvertidos, o professor terá o papel de reservar atividades para avaliá-los. De qualquer forma, é importante estimular a participação desses estudantes durante os ensaios, buscando incluí-lo na construção da peça, fazendo o papel de locutor, maquiador, roteirista, camareiro, ou responsável pela música. Assim, é importante que os estudantes mostrem sua participação e estejam pre-sentes nos ensaios acompanhados pelo professor nas aulas de Educação Física.

C) Jogos (games)

Atualmente existem vários jogos criados pelas TIC que podem ser aces-sados via internet, porém tal prática ainda não faz parte da realidade de muitas escolas. Assim, é imprescindível a criatividade do professor no desenvolvimento de uma metodologia que utilize materiais acessíveis para a criação de um jogo, por exemplo, materiais recicláveis. Nesse caso, os estudantes participarão da criação ou recriação de algum jogo já existente que pode ser utilizado na sala ou na quadra, utilizando as danças folclóricas como assunto. O sentido de competição é inerente ao ser humano; com utilização de jogos, esse lado é aflorado no estudante, o qual buscará compreender sobre o assunto para evoluir no jogo, tornando a aula sobre o tema mais dinâmica e divertida. Assim, pode-se seguir a seguinte metodologia para o desenvolvimento de jogos com temas folclóricos: (i) explicação sobre danças folclóricas, além da divisão dos estudantes em grupos, os quais deverão escolher um tipo de jogo para aplicar o tema visto em sala; (ii) escolhidos os jogos, partiram para a criação, regulamento, confecção e sobre o material a ser usado.

Um exemplo como adotado em nossas aulas

Em sala, o professor faz uma explicação teórica sobre várias danças folclóricas internacionais. Explicou também como seria a dinâmica dos games. Essa aula foi

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ministrada para estudantes do Ensino Médio. Ainda em sala, dividimos os estudantes em três grupos para discutirem quais as danças que iriam pesquisar, e quais jogos gostariam de utilizar na apresentação.

Os estudantes utilizaram as TIC para suas pesquisas, e o professor orien-tará os estudantes sobre a necessidade de descobrirem fatos interessantes na história da dança folclórica escolhida, na vestimenta, nos passos, nas músicas, para construírem as estratégias de seus jogos. Para a construção dos jogos, é impor-tante que se coloquem as sutilezas para tornarem as disputas mais interessantes.

Procedimentos

Um grupo fez o “Jogo da memória”. Pegaram figuras na internet referentes aos passos, elaboraram dois jogos iguais para que os outros grupos pudessem jogar ao mesmo tempo.

Um segundo grupo utilizou o jogo “Advinha que dança é essa”, utilizaram a estratégia da demonstração. Cada integrante do grupo executou um passo de uma dança folclórica internacional diferente, e os colegas dos outros dois grupos deveriam acertar a dança.

O terceiro grupo utilizou o “jogo com dados”, havia um tabuleiro em que poderia seguir, pular casa, voltar duas casas e dançar salsa, em outra casa dançar tango, em outra dançar cancan. Foram construídos dois jogos para que todos os grupos participassem ao mesmo tempo.

Duas aulas ficaram disponíveis para a construção dos games, elaboração dos regulamentos, participantes, material usado na construção (exigência do professor o uso de material de reciclagem), escolha dos passos, músicas, etc.

Todas as danças utilizadas nos games deveriam ser trabalhadas nas aulas seguintes. Todos os componentes do grupo ficariam responsáveis em ensinar os passos aos demais estudantes da sala.

D) Estudos baseados em pesquisa

Na perspectiva de se trabalhar com pesquisa, encontramos os trabalhos com projetos. Deriva do latim projectus – algo lançado para a frente! Implicam desenvolvimento de atividades práticas; de estratégias de pesquisa; busca e uso de

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Dança na Escola

diferentes fontes de informação, saberes, conhecimentos. Partem de um problema interessante a ser resolvido, por uma área ou diferentes áreas de conhecimento, relacionado com o cotidiano dos alunos. Necessitam de ordenação, análise, interpretação, representação. Podem ser de curta duração ou mais complexos e longos, abordando temas transversais e integradores (PERNAMBUCO, 2020), com colaboração interdisciplinar.

São bons para o desenvolvimento de competências cognitivas, socioe-mocionais, e mobilizam diferentes habilidades ao mesmo tempo que promove possibilidades de uso da criatividade e pensamento crítico, propondo reflexão, feedbacks, autoavaliação, avaliação em pares e/ou em grupos diversos. Nesse processo, podem-se desenvolver atividades de motivação, contextualização, brainstorming (tempestade de ideias), organização (como formulação de obje-tivos, elaborarem coletivamente as ações e desenvolvê-las), registros e reflexões sobre os estudos, melhoramento das ideias. Nesta proposta faz-se necessária, à produção de um produto final, uma apresentação do que foi gerado durante o desenrolar do projeto, assim como as avaliações e autoavaliações (GANDIN, 2001; HERNANDEZ; VENTURA, 1999; MORAN, 2018).

Um exemplo como adotado em nossas aulas

A unidade didática tratava do conteúdo Dança, mais especificamente das Danças Folclóricas no ciclo junino, foi desenvolvida de forma presencial. Como produto final, as coreografias para serem apreciadas no Festival de Dança da instituição de ensino, realizado no fim da unidade. Como o produto final envolvia a construção de um enredo para o desenvolvimento e as articulações das cenas e coreografias, após a exposição e os esclarecimentos das atividades da unidade para os estudantes em sala de aula, partimos para a sensibilização quanto às sugestões e construções do enredo.

Procedimentos

Realizada a tempestade de ideias, organizaram-se grupos com tarefas distintas (pesquisas históricas, montagem de coreografias, figurinos, cenários, adereços).

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Em continuidade às ações, determinada aluna encontrou um cordel sobre um fato curioso da história de um artista da região e, com o conhecimento e estudo desse cordel, desenvolveram-se as aulas, pois ficou acordado que abor-daríamos determinada situação curiosa na história de vida desse artista popular. Construído o enredo, as danças do ciclo foram escolhidas também coletivamente – o xaxado, o coco, a ciranda; estudadas suas origens e possíveis variações, as mudanças ao longo do tempo, buscando fazer-pensar seus sentidos e significados, por exemplo, relações de poder, a dimensão tradicionalidade e dinamicidade da cultura; vivenciamos, em forma de oficinas e experimentações, seus gestos, passos, expressões mais características, assim como a organização coreográfica. Na dinâmica das próprias aulas, nem sempre livre de tensões, o produto final foi gestado, apresentado à comunidade e apreciado. Por fim, acordamos o momento da avaliação final e da autoavaliação do projeto. Neste processo pudemos trabalhar e desenvolver diferentes habilidades, articular diferentes saberes sobre a dança folclórica escolhida, assim como o desenvolvimento e aplicação de um enredo.

Um exemplo como adotado em nossas aulas

A construção deste projeto surgiu na observação na fila da merenda. Na escola, estavam matriculados no turno manhã cerca de 350 estudantes, e no lanche feito todos os dias, baseado em um cardápio feito por nutricionistas da Secretaria de Educação, apenas 50 a 60 estudantes consumiam a merenda escolar. Grande parte dos estudantes preferia comprar o lanche, que era baseado em fritura como coxinhas, enroladinhos, batata frita, cachorro quente, com muita maionese e ketchup.

Esse assunto foi levado para a sala dos professores e surgiu a ideia do projeto como forma de conscientização para uma alimentação saudável aliada à prática de exercícios.

Construímos um projeto na escola com professores de Matemática, Biologia, Artes e Educação Física. No projeto, seriam utilizadas as turmas do ensino médio, três turmas do 1.º ano (A, B e C), três do 2.º ano (A, B e C) e do 3.º ano (A, B e C). O principal objetivo da pesquisa era apresentar os benefícios da prática da dança, no caso a folclórica, além da construção de um gráfico das turmas do 1.º ano sobre o índice de massa corporal (IMC) de cada

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Dança na Escola

turma. Assim, chamando a atenção para os prejuízos referentes à ingestão de frituras e refrigerantes em excesso, mostrando a necessidade de uma reeducação alimentar e a prática de atividade física.

Em reunião com os professores de tais disciplinas e a direção da escola, explicamos a ideia inicial do projeto e todos puderam opinar e sugerir os pro-cedimentos. Depois de tudo acertado, elaboraram-se os projetos que tinham os seguintes itens: título, apresentação, justificativa, objetivos gerais e especí-ficos, metodologia, parceria, equipe técnica e recursos. Tais projetos deveriam ser apresentados em formas de banner para a apreciação de todo o colégio e avaliação final dos professores.

Procedimentos

Os estudantes do 1.º ano estavam na unidade temática de Danças e com abordagem em danças folclóricas, então, para alinhar a ideia de atividade física para condicionamento e prevenção de doenças causadas pela ingestão exagerada de alimentos com muita gordura e massas, levamos aos estudantes a discussão sobre qual dança folclórica seria indicada como prática para esse fim.

Os estudantes pesquisaram sobre uma dança que produzisse gasto calórico e, na aula seguinte, trouxeram o frevo e o caboclinho, por se tratar de uma dança cujos passos são construídos com muitos saltitos, muitas flexões das pernas, e em um ritmo bastante acelerado.

Dando continuidade à unidade temática de Dança, eles deviam pesqui-sar: fatos históricos, adereços e sua utilização, vestimentas, músicas e os ritmos variados utilizados no frevo e no caboclinho, fazendo alusão à questão da perda calórica, da motivação em praticar uma dança local (nesse caso, do estado de Pernambuco) e da sugestão da prática de uma atividade física, que seria a dança, falando dos benefícios que ela proporciona. Os estudantes se dividiram e for-maram os grupos para elaboração dos banners e das coreografias.

Para todas as turmas do ensino médio, explicou-se o objetivo do projeto e a justificativa, sempre chamando a atenção para a prevenção de doenças, a alimentação saudável e a prática de atividades físicas sugeridas pelos alunos do 1.º ano, que foi a dança folclórica frevo e caboclinhos.

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Para os estudantes do 2.º ano, explicou-se que o consumo exagerado de frituras, gorduras e massas pode concorrer para o aumento de peso, o que eles iriam comprovar com a tabela do IMC. Embora não seja uma tabela fidedigna, ela auxiliou em nosso propósito interdisciplinar. Assim, os estudantes do 1.º ano participaram como sujeito da pesquisa do 2.º ano, sendo aferidos o peso e a altura desses estudantes nas aulas de Educação Física. Os professores de Matemática auxiliariam na construção dos cálculos do índice de massa corpórea baseado na tabela do IMC.

Para os estudantes do 3.º ano, também se explicou o objetivo do projeto. Eles deveriam pesquisar com os professores de Biologia sobre a importância dos nutrientes, os benefícios e os prejuízos da ingestão dos alimentos, apon-tando sempre para uma alimentação saudável e a prática da atividade física na prevenção de doenças e na qualidade de vida.

As pesquisas realizadas pelos estudantes foram trazidas para as aulas de Educação Física e Artes. Os professores e as professoras responsáveis mediaram as apresentações e a formação das coreografias apresentadas no Festival, além da apresentação dos banners de todas as turmas do 1.º ano, 2.º ano e do 3.º ano.

Este projeto teve um grande alcance na região e satisfação entre os estudantes e professores. Houve a participação dos pais, dos professores de outras escolas e da técnica da Gerência Regional visto que o projeto foi executado em uma escola pública. Foi um dia memorável na escola, com uma atmosfera interativa e saudável, aliada aos ensinamentos das Danças Folclóricas e práticas para uma vida saudável.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Vimos que o trabalho com a dança na escola é um desafio prazeroso. Nossa conjuntura atual trouxe muitas outras necessidades de reinvenção na 4.ª Revolução Industrial. A articulação de um tema tão rico culturalmente como as Danças Folclóricas com as metodologias ativas serve para que, neste processo de reinvenção das práticas pedagógicas, nossos planejamentos possam ressignificar os papéis em que o professor sai da condição principal e passa a ser mediador/orientador no processo de ensino-aprendizagem, e os estudantes podem assumir um papel de protagonista, buscando aprender a aprender.

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Dança na Escola

Não podemos esquecer que temas sobre metodologias ativas fazem parte de temáticas mais amplas como o ensino híbrido, os quais propõem dois modos de ensino, on-line e presencial. Nesse processo as TIC estão presentes para auxiliar o professor nesta nova era de fusão do real e virtual, sem perder de vista a participação ativa dos estudantes no processo. Embora saibamos que, na realidade de vários lugares no Brasil, em determinadas escolas, ainda há escassez de material básico, como carteiras, cadernos, às vezes até o teto, buscamos con-tribuir no sentido de novas formas de ensinar, de tratar nosso estudante como ser pensante e com criticidade para crescer e transformar a sociedade em um espaço melhor para todos.

Pode ser até que, ao ler todo este material, possamos passar por uma autoavaliação, quanto a nossa própria prática pedagógica, no sentido de nos vermos pedagogizando, organizando nossas ações nessa lógica de pensamento metodológico e/ou com o tema das Danças Populares há algum tempo. É impor-tante lembrar que, para este processo de inclusão das metodologias ativas, cabe ao professor entender que, no momento em que o estudante vira questionador, não é todo professor que aceita, e essa mentalidade deve ser mudada, pois cada vez mais os jovens estão tomando consciência de que o professor não é esse ser intocável. Os jovens têm sim opiniões e gostam de expressá-las, principalmente porque eles estão a toda hora conectados, com acesso rápido às informações via internet. O papel do professor para essa nova geração é ouvir e orientar os jovens para o melhor caminho possível em relação ao que eles estão consumindo, e como utilizar essas informações de forma que venham contribuir na vida de cada um nos diferentes aspectos e dimensões.

Nossa intenção, ao nos debruçarmos na reflexão de romper com uma prática docente que em seu processo metodológico tolhia a produção livre, criativa, crítica e humanizadora, foi apontar alguns caminhos inovadores no que tange a vivências, que, para alguns, não são novos, mas precisam ser introduzidos, pensados, planejados até por quem não se considerava atualizado. Nesse “novo normal” em que estamos vivendo será um marco dominante a utilização das novas TIC nas salas aulas. É importante ressaltar que neste contexto não se quer dizer que as aulas de Danças Folclóricas não serão cunhadas só com teorias; muito pelo contrário, a teoria e a prática andam juntas, mas o conteúdo precisa ser trazido para a sala de aula, ou “quadra de aula”, com sentido e significado

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para que nossos estudantes tenham interesse em aprender, apropriem-se das danças folclóricas, em especial as de sua região, para reconhecerem sua identidade cultural também na dança, com a dança e pela dança.

As metodologias ativas estão no auge dos estudos, em práticas pedagógicas de diversas áreas de conhecimento, sendo abordadas em congressos, tratadas em diferentes falas, e principalmente na nova BNCC.

Por fim, reconhecemos que, mesmo nesse estágio, nossos estudantes necessitam viver em grupo, ser ético, desenvolverem o sentido de amizade e companheirismo, aprender a aprender, ir em busca do seu conhecimento, e aprender a fazer, fazendo, dançando. Em nosso caso, praticar as danças folclóricas, sejam elas locais, regionais, nacionais, sejam internacionais, além de propiciar ao praticante momentos prazerosos, de liberdade, promove o bem-estar físico e psicológico, dentre outras questões que perpassam pelo corpo que se movimenta, e, ao se movimentar, ao dançar, se reconhece como pessoa, como gente, porque Dança é cultura, é arte viva. É celebração, que conta história, nossa história, e, reconstrói no presente lembranças relevantes. Assim desejamos!

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DANÇA CRIATIVA: CONTRIBUIÇÕES DO LÚDICO PARA O DESENVOLVIMENTO DA EXPRESSÃO CORPORAL NA ESCOLA

Cristiane CamargoCamila Panontim

PARA INÍCIO DE CONVERSA...

Este capítulo apresenta a dança criativa como instrumento de construção da auto percepção de si enquanto corpo em constante movimento e comunica-ção, tanto com outros corpos quanto com o ambiente em que vive. Buscamos oferecer alternativas que visem incentivar o potencial criativo de forma livre, lúdica e crítica, envolvendo as experiências advindas da cultura corporal dos alunos, levando-os à novas descobertas de movimentos livres e expressivos e conduzindo-os a uma maior autonomia na exploração de suas ações.

Nesse sentido, nossa intenção é, por meio da teoria pregressa e da prática presente, imaginar um novo cenário no contexto da aprendizagem. Cenário este, facilitador de descobertas individuais, onde cada qual possa se expressar e compartilhar sua experiência. Criar, recriar, significar e ressignificar são ações positivas que devem fazer parte de um ambiente que pretende ser incentivador da expressão corporal pura, das emoções em movimento.

Dança criativa pressupõe, improvisar, inovar, surpreender no processo de criação. É a descoberta e a exteriorização de sentimentos, transformados em expressão criativa para o corpo que dança e, dessa forma, valoriza não só o processo criativo como também lhes acrescenta alma.

Na reflexão sobre esta proposta é a história contada nas mais variadas manifestações da cultura popular e corporal, mas, também a influência do ambiente social e econômico ao qual o educando está inserido. Podemos afirmar que a dança criativa se apresenta como um resultado de expressão corporal que se manifesta a partir de suas, histórias, fantasias e anseios.

Como conteúdo da disciplina Educação Física, a dança abre um grande número de possibilidades para ser trabalhada no contexto escolar, utilizando-se da enorme diversidade de ritmos e estilos de danças existentes no Brasil, que

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expressam a cultura de cada região com suas características peculiares, que podem e devem ser trabalhadas no contexto escolar.

Tal é a riqueza da miscigenada cultura brasileira, que proporciona liberdade e oportunidade ímpar para que os alunos deem “asas à imaginação” e criem seu próprio repertório de movimentos a partir das suas influências. É importante vislumbrar as diferentes perspectivas do ensino da dança, como inovações didático-pedagógicas e com abordagens originais nesse processo.

Nesse sentido, a dança criativa propicia um trabalho renovado, produtivo, saudável e prazeroso, na medida em que exsurge das emoções, da interação com o grupo e seu entorno, culminando em movimentos carregados por emoção e liberdade com o propósito de criarem sua própria, livre e personalíssima forma de expressão.

No âmbito educacional, cabe ressaltar, sua relevância não apenas na aquisição e aprimoramento das habilidades motoras, bem como, no desenvolvi-mento das potencialidades humanas e na relação com o mundo, especialmente com crianças e adolescentes.

DANÇA CRIATIVA, MAS ENFIM... COMO É ESSA DANÇA?

Diante de tantos estilos e técnicas existentes no universo da dança, a dança criativa se apresenta como uma proposta que não exige técnica rebuscada, disciplina rigorosa ou vigor físico, possibilitando ao próprio executante criar e explorar todos seus movimentos de forma livre e espontânea.

Se formos analisar a terminologia, ora utilizada, ouso dizer que é até redundante, haja vista que todos os estilos de dança são criativos. Strazzacapa (2010) questiona o porquê classificar determinada maneira de se elaborar ou ensinar a dança. Ressalta que esse tipo de classificação, vai além de estabelecer um simples estilo, é utilizada para diferenciar linhas, escolas e metodologias de como ensinar dança.

Para melhor entender este estilo, vamos revisitar um período da história da dança, em que no início do século XX o coreógrafo e dançarino Rudolf Laban, um dos precursores da dança moderna e figura relevante na criação e disse-minação dos discursos e práticas da dança criativa, se rebela contra a histórica

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Dança na Escola

rigidez técnica do balé clássico e defende uma forma subjetiva de expressão, que possibilitava aos alunos explorar os gestos, experimentar movimentos, criar suas danças por meio da expressão corporal livre e de exteriorização das suas emoções. Para ele, as pessoas deveriam ser livres para se expressar enquanto dançavam. (CZELUSNIAK, 2013; MARQUES, 2003)

A proposta apresentada por Laban, era também consequência de um passado conturbado social e economicamente, com duas guerras mundiais, crise da bolsa dos Estados Unidos da América (EUA), Declaração Internacional dos Direitos Humanos, dentre outros fatos históricos relevantes. (STRAZ-ZACAPA, 2010)

A autora acrescenta ainda, que nos EUA pós depressão, muitas Com-panhias de balé, assim como bailarinos clássicos, tiveram que procurar outras formas de sobreviver, encontrando na dança moderna um porto seguro e com crescentes oportunidades junto às recém criadas escolas e companhias de dança, movimentando e profissionalizando o setor.

Conforme Marques (2003), o discurso de Laban estava amparado na filosofia da dança moderna, cujos ideais de expressão interior e emoção humana eram entendidos como a essência da criação artística. A dança criativa nasce do anseio pela liberdade de ser e de se expressar em todos os sentidos.

As ideias de Laban foram bem recebidas tendo conquistado muitos seguidores ilustres ao redor do mundo, que ajudaram não só a difundir a dança moderna e criativa, como participaram na elaboração dos primeiros métodos e metodologias de ensino da dança criativa. Embora sua proposta evidenciasse a liberdade de expressão, não se desfez da essência advinda do balé clássico, seu trabalho era desenvolvido de forma sistematizada e alicerçado em um bom planejamento.

Nessa concepção, buscou relacionar o movimento corporal ao espaço circundante, envolvendo alguns fatores básicos como: força, tempo, espaço e fluência dos movimentos, os quais deveriam ser executados a partir da utilização dos diferentes níveis: alto, médio e baixo. (LANGENDONCK, 2010)

O ensino da dança preconizado por ele, sugere que tais práticas peda-gógicas favoreçam o desenvolvimento natural da criança e seu aprendizado executando seus movimentos de forma natural e espontânea. (MARQUES, 2003)

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Nessa perspectiva vale ressaltar, mais uma vez, a visão de Laban (1978. p.19), o qual aborda o movimento corporal de forma abrangente.

O homem se movimenta a fim de satisfazer uma neces-sidade. Com sua movimentação, tem por objeto atingir algo que é valioso. É fácil perceber objetivo do movimento tangível. Entretanto, há também valores intangíveis que inspiram movimentos.

Em sua concepção, um gesto habitual com qualquer parte do corpo, pode revelar um aspecto da vida interior, o que nos leva a afirmar que o movimento humano ocorre como consequência das experiências e informações armazenadas no cérebro, relacionadas às sensações e emoções, considerados como um dos alicerces da dança criativa. (CAMPEIZ; VOLP, 2004).

Em contraponto, Marques (2003), por sua vez, afirma que a dança criativa possibilita que os alunos a experimentem, explorem e coloquem o “seu próprio eu” no processo de criação dos movimentos. É uma forma para se ensinar a dança com ampla possibilidade de aplicação no contexto educativo.

A capacidade criativa e a dança

Inventar é imaginar o que ninguém pensou; é acreditar no que ninguém jurou; é arriscar o que ninguém ousou; é realizar o que ninguém tentou. Inventar é transcender. (Alberto Santos Dumont)

Ao discorrer sobre a criatividade, buscamos antes de tudo, apresentar a etimologia da palavra e entender seu significado. Esse termo é utilizado em diferentes áreas do conhecimento e com diversas significações, não se podendo afirmar com exatidão o que quer dizer criatividade.

A palavra criatividade vem do latim creatus, que significa criar, do verbo infinitivo creare. De acordo com Houaiss; Villar (2001, p. 868) criatividade pode ser definida como “a qualidade ou característica de quem […] é criativo; inventividade; inteligência e talento, natos ou adquiridos, para criar, inventar, inovar”. Ferreira (2010, p. 578) por sua vez, define criatividade como “capacidade criadora, engenho, inventividade; capacidade que tem um falante nativo de criar e compreender um número ilimitado de sentenças em sua língua.”

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Dança na Escola

Logo, a palavra traz em sua raiz a dimensão de surgimento, inovação e transformação. A criatividade é inerente ao ser humano e permite ao indivíduo uma ação produtiva para realização de algo desejado ou necessário em que, por meio da experiência acumulada, exsurgem novas possibilidades de interagir consigo mesmo e com o mundo, e, com isso, ser perspicaz, reconstruindo e transformando uma realidade de forma útil e adequada. (TREVISAN e SCH-WARTZ, 2018; CAVALCANTI, 2006)

Com riqueza em seus argumentos Freire (2013, 87-88) afirma,

Experiências e práticas não se transplantam: se reinven-tam, se recriam. (…) Tu terás que reinventar, e não só tu como sujeito da reinvenção, mas o outro com quem tu te encontras. No fundo, viver é recriar. E por isso que a recriação já não é mais nem viver, já é a existência. Nesse sentido é que existir é mais do que viver.

Nessa perspectiva, o estímulo ao desenvolvimento da capacidade criativa na vivência com a dança, pode resultar em um diferencial no desempenho apre-sentado pelos alunos. No aspecto educacional, a criatividade se destaca como forma de possibilitar novas descobertas e aprendizagens, além de promover diferentes experiências corporais, ampliando não só a própria percepção cor-poral, mas desenvolvendo a sensibilidade, a qual em uma linha tênue, precede a percepção e representa a expressão materializada dos sentimentos presentes naquele momento.

Para que essas vivências sejam bem aproveitadas, Cavalcanti (2006, p. 90) ressalta que “os processos de criação demandam uma postura de ousadia por parte do indivíduo, pois o ato criativo pressupõe o desconhecido, o novo que quase sempre tem origem num estado caótico de organização das emoções e informações”.

No que diz respeito a relação criatividade e a dança, é interessante notar que quando a pessoa se utiliza da sua capacidade criativa para se expres-sar, aos poucos sente-se capaz e confiante consigo mesma, para enfrentar os desafios do mundo que a cerca, explorar novas ideias e modificar suas práticas. (TROMM, 2011)

Essa discussão é ampliada na medida em que a criatividade é usual e frequentemente utilizada nos conteúdos artísticos. O conteúdo a ser desenvolvido

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pelos professores junto aos alunos, são impactados pelas suas próprias experiências passadas que “lapidaram”, não só seu físico e intelectual, mas o transformaram no que são e esta bagagem vivencial influenciará na forma como será transmitida essa ideia de expressão, libertando-se de tudo quanto é pré definido para tentar inventar o inimaginável e criar o impossível.

Nesse sentido, Marques (2016) afirma que o comportamento criativo pode ser modificado por meio da prática individualizada e de treinos. Ressalta ainda que, quanto mais a criatividade for exercitada maior será a capacidade criativa.

Por outro lado, a limitação criatividade pode ocasionar uma repetição de movimentos padronizados. Sendo assim, o desenvolvimento do potencial criativo no contexto educativo, pode proporcionar maior domínio das habilidades artísticas. (TREVISAN et al. 2016; TROMM, 2011)

É importante salientar que, no processo pedagógico da dança nas escolas, as características e perfil do professor podem tanto incentivar quanto intimidar a criatividade dos alunos e interferir no seu desempenho, considerando que a capacidade criativa difere de pessoa para pessoa e tem relação com o ambiente, com a história de vida e com as emoções.

Segundo Laban (1978), nas escolas a preocupação deve estar centrada no efeito benéfico da criatividade para a personalidade de cada aluno e não na busca da execução perfeita de danças espetaculares, por outro lado, estimular a dançar é um aspecto importante, pois, além de trabalhar a expressividade e a criatividade, amplia o repertório motor.

Diante dessas colocações, é possível afirmar que,

Com orientações precisas com vista ao desenvolvimento do seu potencial criativo, as artes podem propagar os significados da imaginação e criatividade em prol do desenvolvimento do ser humano num processo dinâmico entre o sentir e o experienciar. E, neste sentido, a arte deve ser tida em conta quando se abordam questões relativas ao desenvolvimento do ser humano, no sentido em que são as atividades de expressão artística que incitam a imaginação e criatividade. (MARQUES, 2012, p. 60)

A criatividade é inerente ao ser humano desde o seu surgimento. Somos testemunhas das incontáveis transformações, ocorridas, muito rapidamente,

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Dança na Escola

onde todos os paradigmas socioculturais, educacionais, ambientais, econômicos e tecnológicos, estão sendo quebrados.

Nesse sentido, a criatividade humana também está sendo redirecionada, pois um mundo com possibilidades até então, inimagináveis está acontecendo. É difícil, apenas tentar imaginar, onde a dança e a expressão corporal poderão chegar com a ajuda das inovações tecnológicas atuais.

Para esta escritora e seus pares nascidos em um mundo analógico, é extremamente gratificante e surpreendente, a criatividade neste mundo digital onde nada é impossível e inatingível. A criatividade atual associada a tecnologia digital assim entendida, como instrumento facilitador na realização de anseios e objetivos, é simplesmente sem fim e sem limites.

Vivência da dança criativa na educação física escolar

A dança exerce um papel relevante no contexto educacional, para o desen-volvimento integral dos alunos nos diferentes aspectos físico, afetivo e cognitivo. As suas práticas devem assegurar diferentes possibilidades para ampliação do repertório motor, a partir da vivência e assimilação de novos gestos estimulando a criatividade e a expressão.

Nas palavras de Gaio; Gois (2013, p. 254),

Dançar torna-se uma experiência significativa na Edu-cação Física na escola, considerando a relação e o enten-dimento estabelecido a partir dos diferentes saberes, construídos e reconstruídos durante o processo de desen-volvimento desta atividade humana em seus diferentes âmbitos de realização.

Neste texto, pretendemos explorar o potencial da dança na aprendiza-gem, com a utilização de uma metodologia mais livre e inovadora, neste caso, a dança criativa, com o intuito de promover uma experiência pessoal relevante, concreta e prazerosa.

Durante muito tempo, essa área do conhecimento esteve preocupada com movimentos estereotipados e com excelente desempenho. Hoje já observamos uma mudança de paradigma na atuação dos profissionais, os quais demonstram

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maior preocupação com a vivência do movimento a partir da cultura corporal dos alunos. (SBORQUIA; GALLARDO, 2006).

Se no passado a perfeição pela repetição se impunha, hoje os movimentos são transformados em emoções libertas em gestos de dança e nessa linguagem corporal, as práticas pedagógicas devem garantir um ambiente saudável para participação e troca de experiências que facilitem o envolvimento e autoconhe-cimento dos alunos.

Logo, sugerimos que a dança criativa, enquanto conteúdo significativo nas aulas de Educação Física, torne-se um caminho facilitador para que os alunos sejam desafiados a criar e recriar diferentes formas de manifestações corporais, ampliando suas competências, melhorando suas relações sociais, respeitando as diferenças, entendendo e ultrapassando seus limites e valorizando suas capaci-dades. (CZELUSNIAK, 2016)

Fica perceptível a relevância dessa proposta na Educação Física escolar, levando em consideração as palavras de Saraiva et al., (2005, p. 131),

No caso da Educação Física, parece fundamental oferecer alternativas de práticas corporais na busca de englobar o ser humano de forma mais ampla, permitindo aos envolvidos que sejam participantes ativos no processo de aprender e fazer em dança.

Cabe ressaltar que, por meio de uma participação construtiva e demo-crática nas dinâmicas e conteúdos inerentes à sua formação, o protagonismo dos alunos apresenta-se como comportamento positivo, tendo em vista que contribui para o desenvolvimento da liberdade, engajamento na produção do conhecimento, no trabalho em grupo, na iniciativa e criatividade que são aspectos fundamentais para o exercício da cidadania.

A dança criativa pode constituir-se como boa alternativa para intervenção no contexto escolar, pois oportuniza maior envolvimento dos alunos, explora os movimentos que consigam realizar, além de levá-los à uma reflexão sobre a sua experiência corporal, e com isso, modificar conceitos e atitudes enquanto cidadãos. (SMOUTER; COUTINHO, 2016)

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Dança na Escola

Nessa lógica, Freire, (2013, p. 189) afirma que “ensinar significa provo-car a curiosidade do educando a tal ponto que ele se transforme em sujeito da produção do conhecimento que lhe é ensinado”.

Strazzacappa (2009, p. 44) corrobora tal afirmação e complementa, tra-zendo a baila sua visão acerca dos benefícios educacionais por meio da dança;

Toda dança promove transformação, logo, toda dança é educação. É por esta razão que termos como ‘dança edu-cativa ‘, ‘dança expressiva’, ‘dança criativa’ e tantas outras nomenclaturas para nomear a dança trabalhada na escola devem ser evitadas. A dança em si já educativa, expressiva e criativa, dispensando adjetivos. Se não é constituída desses três fatores, então, simplesmente não é dança.

Na visão de Freire (1981, 20) “a educação, qualquer que seja o nível em que se dê, se fará tão mais verdadeira quanto mais estimule o desenvolvimento desta necessidade radical dos seres humanos, a de sua expressividade.”

Contudo, seguimos o pressuposto de que a da dança criativa nas aulas de Educação Física escolar, promove novos olhares e discussões sobre uma possibilidade de intervenção pedagógica, na qual os alunos possam desenvolver autonomia no processo de criação e expressão corporal, além de propiciar o intercâmbio de técnicas e ideias.

Brincar... expressar... e dançar: vivências lúdicas na dança criativa

“Brincando” e cantando e seguindo a canção,

Somos todos iguais braços dados ou não,

Nas escolas, nas ruas, campos, construções,

Caminhando e cantando e seguindo a canção.

(Adaptado de Geraldo Vandré)

Gostaria de iniciar esse texto, fazendo uma analogia sobre esse tre-cho adaptado da canção de Geraldo Vandré, o qual nos leva a refletir sobre a brincadeira, a música e o movimento em todas as esferas e nos mais variados contextos socioculturais.

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Podemos neste tópico nos aprofundar sobre a ludicidade, sobre a dança, ou ainda, sobre a música e o movimento com suas diferentes formas de expressão, mas, o que pretendemos discorrer nesse momento é sobre sensação de alegria, de liberdade, de sentimentos e emoções que, a ludicidade inerente à dança criativa, produz às crianças e jovens que a praticam.

Diversos são os interesses que levam o indivíduo a dançar, mas o que com certeza podemos afirmar é que a dança e a brincadeira são formas de expressão que sempre estiveram presentes em nossas vidas, seja em um momento de lazer, familiar, profissional ou no espaço escolar.

Nessa ótica, a dança transcende, é muito mais do que uma simples diversão ou entretenimento, é uma atividade a qual, quando os educandos têm a possibilidade de vivenciar, são beneficiados em seu desenvolvimento global. Alves (2010, p. 189) corrobora quando relaciona a dança à ludicidade;

Penso que o brinquedo pode ser utilizado nas aulas de dança como recurso pedagógico que auxilia no apren-dizado, uma vez que as atividades lúdicas e que envol-vem a imaginação criativa são muito atraentes para as crianças de maneira geral. A dança pode ter um caráter mais lúdico, sem perder suas características próprias, aproximando-se assim do universo infantil. Brincando, a criança vai se apropriando do conhecimento de maneira prazerosa. Pode e deve usar sua imaginação uma vez que não tem comprometimento maior com a realidade.

Trago a interpretação de Amaro (2018) a qual descreve que lúdico aprimora a imaginação e proporciona a criança viver a sua realidade por meio ludicidade, elemento presente na proposta da dança criativa. Salienta ainda, que a prática pedagógica deve direcionar um espaço especial e bem estruturado para atividade lúdica para que alunos aprendam de maneiras diversificadas e com alegria.

Ainda no que tange ao contexto educacional, envolvendo a ludicidade como meio facilitador da aprendizagem, Santos (2007, p. 12) descreve que;

A ludicidade é uma necessidade do ser humano em qualquer idade e não pode ser vista apenas como diversão. O desenvolvimento do aspecto lúdico facilita a apren-dizagem, o desenvolvimento pessoal, social e cultural,

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Dança na Escola

colabora para uma boa saúde mental, prepara para um estado interior fértil, facilita os processos de socialização, comunicação, expressão e construção do conhecimento.

Nessa linha de pensamento, alguns autores nos estimulam a pensar sobre a concepção lúdica na vida humana e sobre questões que permeiam os primórdios das manifestações artísticas. Couto (2013, p. 39) por exemplo indaga: “[...] Será mesmo que esse ímpeto lúdico poderia ter criado a dança, e daí o canto, o teatro, a religião, a política e a formação de todas as atitudes humanas? O ser humano teria começado a atitude lúdica pelo jogo, pela dança e/ou pela brincadeira?”

Seguindo essa reflexão Marques (2012, p. 35) aborda a relação no con-texto educacional quando descreve que “é primordial pensarmos a dança na escola também como uma dança lúdica, que brinca, que permite e incentiva relações - e não imposições”.

Diante do exposto posso afirmar que a dança criativa é uma forma natural e valiosa de expressão corporal, que pode ser trabalhada nas aulas de Educação Física escolar de diversas maneiras, a fim de integrar os alunos à esse conheci-mento, para que possam criar seus próprios movimentos e ter a oportunidade de se expressar de forma alegre, livre e espontânea.

Contudo, ainda fazendo referência a analogia da canção de Geraldo Van-dré, cito o trecho em que fala “vem vamos embora que esperar não é saber, quem sabe faz a hora não espera acontecer”. Queremos desafiar com essas palavras, a ação pedagógica com a dança criativa no contexto escolar, a qual podemos e devemos nos arriscar a trabalhar com essa temática, e ainda, ter um olhar mais amplo e ousado na ação pedagógica nas aulas de Educação Física escolar,

CONCEPÇÕES METODOLÓGICAS PARA O ENSINO DA DANÇA CRIATIVA NA ESCOLA

Sabe-se que a dança criativa em sua prática oferece estímulo ao desenvol-vimento criativo e espontâneo, agindo na educação psicomotora. Traz aspectos como a identificação da estrutura física corporal (consciência corporal) com a utilização de movimentos como: grande/pequeno, forte/fraco, alto/baixo e aumento da expressividade. (ARCE; DÁCIO, 2007)

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Ao explorar uma forma para trabalhar a dança criativa no âmbito esco-lar, analisamos um modelo francês citado por Strazzacapa, et al. (2009), que é dividido em duas fases interessantes. Para a primeira infância inserindo atividades para aprender noção espacial, ritmos variados e autoconhecimento corporal (consciência corporal), no formato dirigido com jogos e brincadeiras, chamando essa etapa de “despertar para a dança”. A segunda etapa entende-se como “iniciação à dança”, já com caráter rítmico e mais coreografado.

Baseando-se nesse formato, buscamos apresentar sugestões de atividades divididas de acordo com os níveis de escolaridade, que serão: Ensino Fundamental I (6 a 10 anos) e Ensino Fundamental II (11 a 14 anos).

Iremos propor como um ‘despertar para a dança’ para as idades de 6 e 7 anos, já para a faixa etária entre 8 a 10 anos e de 11 a 14 anos, iremos englobar o ‘despertar para a dança’ de forma mais leve nas primeiras aulas e a ‘iniciação à dança’ como principal desenvolvimento, pois como as classes são heterogê-neas, nem todas as crianças tiveram ou tem contato com a dança, sendo assim, tivemos a intenção de elaborar processos progressivos aula por aula, para que todos possam aproveitar o conteúdo e compreender a conexão dos movimentos corporais com as variadas expressões.

Abaixo serão elencadas propostas para trabalhar a dança criativa na infância e adolescência, de acordo com a faixa etária e níveis de escolaridade. Muitas vezes sentimos falta de materiais que nos guiem para aplicar o conteúdo de dança na escola, sendo assim, procuramos estruturar um modelo prático e pedagógico, com algumas sugestões para desenvolver nas aulas de Educação Física escolar, no Ensino fundamental I e II.

As propostas serão apresentadas de forma progressiva, em uma sequên-cia pedagógica para cada aula, voltada para os elementos presentes na dança, para assim, favorecer o domínio corporal e, a partir daí, atingir a liberdade de expressão e a criatividade, que são algumas das características da dança criativa.

As propostas a seguir são constituídas de movimentos simples, naturais, com músicas variadas, as quais o professor pode alterar, de acordo com sua realidade e intuito, permitindo-o criar variadas sequências de atividades dentro de um ou mais elementos principais escolhidos para a aula em si.

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Dança na Escola

Propostas de atividades

Aula Rítmica com fluência controlada: Elaborar uma ou mais aulas com atividades para estimular o ritmo com controle da atividade. Existem várias maneiras de se fazer essa estimulação, assobios, estalo dos dedos, bater as mãos no chão, nas pernas, bater os pés, bater palmas, sendo o professor o percussor que vai inserir o ritmo nas músicas e nos movimentos (CARBONERA; CAR-BONERA, 2004).

A seguir faremos algumas sugestões de atividades para desenvolver alguns dos aspectos fundamentais do trabalho com a dança criativa. Embora exista uma infinidade de possibilidades para se trabalhar a dança no contexto das aulas de Educação Física escolar, trazemos propostas que podem ser adaptadas, seguindo os princípios a serem desenvolvidos, como: a fluência controlada; a lateralidade, envolvendo as noções de direção; os movimentos expressionistas, criatividade e a noção espacial e a fluência e expressividade.

Atividade 1 - Aula Rítmica com fluência controlada: Ensino Fundamental I.

Faixa Etária 6 e 7 anos.

Objetivo Desenvolver o ritmo utilizando as sensações do movi-mento (forte, fraco, lento, rápido) dentro da música

Disposição Sentados (Para obter foco na música e na parte do corpo)

Desenvolvimento da Atividade

Bater palma no ritmo da música – exemplo: ‘O sapo’ (palma fraca) ‘não lava’ (palma fraca) ‘o pé’ (palma forte), e assim sucessivamente. (Adendo: a música é apenas um exemplo para poder explicar a proposta de atividade rítmica)

Variações

Bater palma com objetivo de trabalhar a velocidade.Exemplo: ‘O sapo’ (palma lenta) ‘não lava’ (palma lenta) ‘o pé’ (rápida). (Adendo: a música é apenas um exemplo para poder explicar a proposta de atividade rítmica)

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Para trabalhar o ritmo nessa faixa etária, é necessário buscar músicas com batidas evidentes ou letras chamativas, para que as crianças consigam ouvir e reproduzi-lo com seus movimentos corporais. Nesse exemplo estabelecemos palmas fracas e fortes, dessa forma, já trabalharemos também, a intensidade de acordo com a letra da música. Como variação, sugerimos bater palmas uti-lizando a velocidade.

Essa mesma atividade pode ser utilizada inicialmente para o despertar para a dança, para alunos com idade entre 8 a 14 anos, inserindo mais movi-mentos simultaneamente e variando as músicas, e como consequência, já irá trabalhar a coordenação motora.

Pode-se aliar junto às palmas, variados tipos de propostas com batidas rítmicas, como por exemplo, bater as mãos nas pernas, bater os pés, estalar os dedos, entre outros. Sugerimos que façam sempre uma progressão, inicie apenas com as palmas (fraca e forte, lenta e rápida, entre outas) e vá adicionando uma batida de um pé, depois os dois e assim por diante, utilizando a criatividade.

Conduzir a atividade, por uma ou duas vezes, inserindo suas dicas e em seguida deixe-os livres para explorarem livremente os ritmos. Nessas propostas, é interessante que exista um momento para que eles criem a sua sequência, e assim, tenham liberdade para explorar o corpo e o ritmo.

Na atividade em sequência, apresentaremos uma sugestão de variação que podem compor uma aula rítmica para alunos do Ensino Fundamental I e II.

Atividade 2 - Aula Rítmica com fluência controlada: Ensino Fundamental I e II.

Faixa Etária Idade entre 8 e 14 anos

Objetivo Desenvolver o ritmo e a coordenação motora

Sugestão de Música ‘We Will Rock You – Queen’

Disposição Sentados

Desenvolvimento da Atividade

Nessa atividade, vamos inserir bastante gestos para compor o ritmo. Exemplo – ‘Primeira batida’ (estalo de dedos), ‘segunda batida’ (palma), ‘terceira batida’ (bate as mãos nas pernas).

Variações

Em seguida alterne as sequências e gestos, assim já inserindo a coordenação motora com o ritmo. Mais uma variação, na sequência, pode-se trabalhar a veloci-dade, lento e rápido.

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Dança na Escola

É importante lembrar que, para a dança criativa, não é necessário enfatizar o ritmo, pois o objetivo dessa proposta é justamente, dar liberdade de expressão e de sentimentos por meio dos movimentos. Para iniciar as aulas e despertar o corpo para o ritmo e o movimento, podemos direcionar os alunos com um elemento introdutório presente na dança em geral, que poderá auxiliar os alunos liberarem sua expressão.

Aula de Lateralidade (direção): Elaborar atividades para estimular a lateralidade, e consequentemente, a noção espacial. A lateralidade está inter-ligada à consciência corporal, com noção de direção e localização. A criança se situa no ambiente mediante a noção de lateralidade, externalizando a partir de suas experiências ao longo de seu desenvolvimento. A lateralidade corporal refere-se ao esquema do espaço interno do indivíduo, que o capacita a utilizar um lado do corpo com melhor desenvoltura do que o outro, em atividades que requeiram habilidade. (RONCONI, 2015).

Abaixo faremos uma sugestão de atividade, com algumas variações, que podem compor uma aula de lateralidade.

Atividade nº 3 – Aula de Lateralidade (direção): Ensino Fundamental I e IIFaixa Etária 6 e 7 anos.

Objetivo Desenvolver a lateralidade.

Disposição Em pé.

Desenvolvimento da Atividade

Utilizando alguma música, irá montar passos simples para direita e esquerda, mantendo o ritmo trabalhado na primeira e/ou segunda aula. Utilizando o exemplo da música da atividade anterior: Dar três passos para a direita e em cada passo bater palma, e no último som dar duas palmas e uma batida na perna, depois voltando para a esquerda da mesma forma.Exemplo: passo para direita (pesado), passo para a direita (leve), passo para a direita (feliz)

Variações

Uma nova atividade para continuar com esse trabalhado de alteridade, é fazer uma fila ao lado da linha da quadra ou uma linha feita no chão e colocar nomes na direita e esquerda, pedindo para que eles pulem para uma das direções indicadas e façam movimentos de dança livresExemplo: A direita vai ser o SOL e a esquerda será a LUA, então ao comando do professor o aluno irá pular e fazer a dança livre.Depois mescle os nomes SOL/LUA com DIREITA/ESQUERDAUtilize músicas com ritmos variados para as crianças liberarem seus sentimentos e expressão.

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Para essa faixa etária é legal usar passos mais simples para nortear direita e esquerda. Para a faixa etária 8 a 10 anos, pode-se usar dois passos ou mais andando para os lados, passos cruzados, combinações de passos, movimentar os membros alternadamente ou em conjunto, entre outros. É interessante, em um primeiro momento, ir conduzindo quais passos e de que forma poderão ser utilizados, depois poderá dar a liberdade para seus alunos se movimentarem de acordo com o tema da aula (lateralidade).

No Ensino Fundamental II, os passos já serão mais elaborados, tendo em vista que os alunos já possuem maior conhecimento corporal e um repertório de movimentos mais amplo, o que nos permite, dar mais liberdade logo de início da aula, sem a condução dos movimentos, apenas direcionando-os paro tipo de elemento. Como recurso pedagógico, podemos mostrar algumas figuras e/ou vídeos, em seguida passar a atividade que eles deverão realizar, proporcionado liberdade para que se expressem e criem os movimentos.

Aula de iniciação aos movimentos expressivos, criatividade e a noção espacial:

Elaborar aulas com atividades para estimular a noção espacial, utilizando os espaço circundante e a exploração dos diversos níveis - baixo, médio e alto – por meio de movimentos expressivos, de modo que permita aos alunos, a experiência de exteriorizar suas sensações.

Existem diversas maneiras de se fazer essa estimulação, é possível propor variadas combinações e solicitar que deem “asas a sua imaginação” e deixem fluir a sua criatividade. Logo, faremos algumas sugestões de atividades e variações que podem compor uma aula de noção espacial.

Atividade nº 4 – Aula de iniciação aos movimentos expressivos, criatividade e noção espacial: Ensino Fundamental I.

Faixa Etária 6 e 7 anos.

Objetivo Desenvolver a noção espacial utilizando os níveis

Disposição Em pé, espalhados pelo ambiente.

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Dança na Escola

Desenvolvimento da Atividade

Ao som de alguma música de sua escolha, insira comandos de voz dos movimentos que os alunos devem realizar, colocando situações dentro da proposta que são os níveis e expressão, sempre de forma lúdica.Exemplo: Todos os alunos irão se movimentar na quadra de forma aleatória e livre, dançando alguma música de sua escolha, então surgirá o comando de voz: Dançar como um pássaro, deixa por volta de 30 segundos ocorrer a movimentação, depois outro comando: Dançar igual um caranguejo... Dançar como um macaco bem pesado, Dançar como um gigante cansado em círculos, assim sucessivamente, dá para utilizar muita cria-tividade e unir vários movimentos corporais expressivos com os espaciais.

Variações

Movimentação do quadrado. Essa é uma atividade muito bacana para noção espacial.Exemplo: Em dupla, os alunos irão se movimentar, criando um quadrado. Uma pessoa começa no fundo para a esquerda e a outra começa na frente para a direita, então elas vão dar um passo em sentido horário ou anti-horário, assim: a do fundo vai para a frente e a da frente irá para trás, depois vão dar um passo ao lado, depois frente e trás novamente... formando o quadrado.Quando aprenderem bem a movimentação, iremos incluir gestos expressivos com o ritmo.Exemplo: Andou os quatro lados e chegou ao lugar, faça movi-mentos dançados com tristeza... Repetiu o sentido anti-horário, faça movimentos dançados com alegria... Andar no sentido horário e fazer movimentos pesados, leves, cansado, calmos e assim sucessivamente.

Tendo em vista que existem inúmeras possibilidades para a exploração do movimento, podemos variar com músicas, as quais a própria letra já incite o movimento, assim, esses estímulos possibilitarão que os alunos explorem no máximo, sua capacidade criativa, e traga o seu repertório motor para essa vivência.

Para a faixa etária entre 8 a 10 anos, também podemos propor essas atividades com comando para um aquecimento inicial, como ‘O mestre man-dou’, e assim, introduzir o tema da aula, para a partir daí, utilizar músicas com ritmos variados e trabalhar os planos e direções como: caminhar para frente, para trás, abaixar, levantar, andar com joelhos flexionados, girar, saltar, leves, pesados, fortes, fracos, lentos, rápidos, passos em duplas, trio, grupos.

No ensino fundamental II, podemos utilizar exemplos com vídeos, expli-cando o tema a ser trabalhado na aula, conforme sugestão apresentada abaixo.

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Atividade nº 5 – Aula de iniciação aos movimentos expressivos, criatividade e a noção espacial: Ensino Fundamental II.

Faixa Etária 10 a 14 anos.

Objetivo Criatividade e noção espacial.

Disposição Em grupos (de 3 a 5 pessoas).

Desenvolvimento da Atividade

Depois de oferecer uma música, pedir para os alunos mon-tarem alguns passos em grupo no plano baixo com alguns aspectos expressivos.Exemplo: Movimentos próximos ao chão de uma pessoa cansada e triste.

Variações

2. Montar os passos no plano médio, depois no alto e também apresentar cada etapa. 3. Unir todos planos e tempos de 08, mesclados numa coreografia só e fazer a apresentação.(Adendo: não precisa estar no ritmo, pois não é objetivo e sim a expressão)

Ressaltamos ainda que nesse momento é importante deixar que os alunos se expressem livremente, sem a interferência do professor. Considerando que um dos objetivos da dança criativa, é estimular e dar liberdade para os alunos criarem e se expressarem livremente a partir dos seus sentimentos e emoções. No entanto, devemos criar um ambiente propício para que eles/as adentrem ao tema da aula.

Aula de fluência e expressividade: Estimular a espontaneidade dos movimentos diante uma música, sem a condução e demonstração do professor, deixando os alunos livres ouvindo e se expressando, dando sequência às aulas anteriores, pois já possuem um maior conhecimento corporal e repertório motor, podendo assim, ter mais controle sobre os seus gestos e expressar mais livremente suas emoções.

Com o intuito dar margem à imaginação e proporcionar liberdade de expressão, sugerimos a música ‘O trenzinho do capira – Egberto Gismonti’, para alunos do Ensino Fundamental I e II, uma vez que, essa música apresenta diversos efeitos sonoros que despertam os mais variados sentimentos, o que favorece as mais diversas expressões, por parte dos alunos, que trazem consigo as mais variadas histórias de vida e emoções.

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Atividade nº 6 – Aula de fluência e expressividade: Ensino Fundamental I e II.

Faixa Etária Idade entre 6 a 14 anos

Objetivo Liberdade de expressão.

Sugestão de Música ‘O trenzinho do Caipira – Egberto Gismonti’

Disposição Em pé, espalhados pelo ambiente.

Desenvolvimento da Atividade

Faça uma breve explicação do objetivo dessa aula, no qual irá colocar uma música e quer que os alunos sejam livres para fazer o que sentirem de movimentos de dança ao ouvirem essa música.

Variações

Coloque a música novamente para que eles possam repetir mais uma vez.Escolha outra música associando com alguns temas. Exemplo: Músicas de Circo, músicas de desenho animado, fundo musical para histórias, todas sem letras para enfatizar o efeito sonoro.

Deixe-os livres para ouvir e se expressarem, sem nenhuma condução e/ou interferência, o foco nessa proposta e deixá-los expressar seus sentimentos e emoções, para a partir desse laboratório, consigam criar suas próprias com-posições coreográficas.

Diante do exposto, acredita-se que os alunos consigam associar os con-ceitos trabalhados e expor durante essas vivências práticas, tudo que vivenciaram individualmente e coletivamente.

A condução dos estilos musicais podem incitar sentimentos e sensa-ções, desta forma, escolha estilos variados, com efeitos sonoros que remetam a tristeza, ao cansaço, a felicidade, a leveza, a fraqueza, a liberdade, entre outros. Porém, a forma que vão se expressar pode não corresponder exatamente às suas expectativas, lembrando que cada um tem sua experiência de vida e ao ouvir determinada música irão se manifestar de forma única.

Estruturação das aulas na Dança Criativa.

A propostas de atividades aqui apresentadas, buscaram seguir uma sequên-cia pedagógica para dar suporte aos que almejem trabalhar com a dança criativa no contexto escolar, tenham um norte, e a partir dessas sugestões, também criem e recriem as suas próprias formas de desenvolvê-las no Ensino Fundamental I e II.

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Nos empenhamos em apresentar alguns exemplos de exercícios práticos utilizando os elementos constitutivos da dança, para tentar guiar o planejamento das aulas, com as variadas faixas etárias, para assim, poder oferecer um bom repertório de atividades e facilitar o aprofundamento prático para trabalhar com os alunos.

A sequência pedagógica apresentada evidenciou o trabalho rítmico, o conhecimento corporal, a coordenação motora, a noção espaço-temporal, entre outros, que estão interligados, e que propiciam aos alunos o conhecimento e domínio corporal e um repertório motor amplo para se expressem com liberdade na toada do estilo musical que estão ouvindo.

Sugerimos apenas algumas atividades e variações que podem vir a com-por uma aula, não tivemos a intensão de vincular o seu formato, mas tentamos mostrar dinâmicas que podem ser atrativas para crianças e adolescentes, desde o aquecimento até a volta à calma.

Atividade nº 7 – Estruturação das aulas na Dança Criativa.Aquecimento(10 minutos)

Iniciar com uma ou mais brincadeiras relacionadas ao tema da aula

Parte Principal(30 minutos)

Trabalhar o elemento das mais variadas formas e com muita dinâmica, para manter o foco, principalmente das idades de 6 a 8 anos.

Volta à calma(10 minutos)

- Roda de conversa sobre os pontos da aula, contando qual momento da aula chamou mais atenção- Música com efeitos sonoros tranquilos, fazendo relaxamento, sentados ou deitados.- Brincadeira que envolva relaxamento (indicado mais para 6 e 7 anos)

O aquecimento pode ser composto por utilizar brincadeiras populares, enaltecendo a cultura corporal do grupo envolvido, como por exemplo: escravos de jó; dança das cadeiras; o mestre mandou; entre outras, que podem ser modificadas de acordo com o objetivo da aula, as quais não precisam ser, necessariamente, sobre um aspecto específico da dança como ritmo, lateralidade, expressividade... vai depender do nível dos alunos e de como o professor pretende desenvolver a sua sequência pedagógica.

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Dança na Escola

Uma dica... Procure sempre deixar, durante as aulas, os alunos bem confortáveis e abertos ao aprendizado. Proponha uma aula divertida e diferente, despertando a curiosidade e deixando a vergonha de lado, para que assim. eles consigam liberar essas emoções e se expressar livremente.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este capítulo buscou trazer informações desde o histórico da dança criativa, das propostas de desenvolvimento cognitivo-motor e algumas sugestões para trabalhá-la no contexto escolar.

A ideia não foi trazer um modelo pronto e engessado, mas sim, propostas de como inseri-la estabelecendo objetivos de forma progressiva durante as aulas, oferecendo total liberdade ao professor para criar suas próprias dinâmicas e exercícios para elaborar suas aulas, de acordo com o desenvolvimento e estágio de desenvolvimento de seus alunos.

Em conclusão, temos que a dança criativa, por sua essência, desvinculada de rigorismos de toda ordem, é ferramenta preciosa a ser utilizada não só no contexto escolar, mas também, em todas as idades, como forma de libertação, de amadurecimento e de congraçamento entre seus praticantes. A liberdade de expressão, de movimentos e emoções, alivia os sentimentos, torna essa prática mais leve e feliz.

A utilização da dança criativa na infância e adolescência, no contexto escolar, colabora decisivamente para o desenvolvimento físico, motor e para construir relações e concretizar as ações desses alunos, tendo em vista o fato de nela estarem contidas emoções emanadas do seu interior e, cujas performances exalam a mais pura forma de expressão.

Em face a riqueza cultural brasileira, a utilização da dança como instru-mento pedagógico para o desenvolvimento integral de seus praticantes é, sem sombra de dúvidas, uma atividade relevante e imprescindível tanto na educação básica quanto como forma lúdica para adultos e terceira idade.

O processo ensino-aprendizagem na dança acompanha a evolução da ciência e dos avanços tecnológicos, os quais retratam uma nova forma de indicar caminhos na ação pedagógica, que passa por uma mudança e transcendência nos desafios apresentados para ensinar e aprender.

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Roberta Gaio | Tamiris Lima Patrício (org.)

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O BALÉ: DO PALCO À ESCOLA

José Ivo Justino JuniorIana Pereira Leão

INTRODUÇÃO

Conhecer a história e os conceitos do balé é de extrema importância, para que se justifiquem alguns fundamentos básicos da técnica da dança clássica, criando uma relação de encantamento com o educando e estabelecendo uma diferença no trabalho realizado nas aulas de educação física. Neste capítulo, discutimos formas de abordagem para se ministrar aulas relevantes dentro da escola de ensino formal.

Gohn (2006) ao abordar, nos seus estudos, a educação na perspectiva não informal, reforça as premissas da educação formal e salienta que, nessa última educação (a qual é o foco do texto) os “espaços são os do território das escolas, são instituições regulamentadas por lei, certificadoras, organizadas segundo diretrizes nacionais”. (GOHN, 2006, p. 29)

Na educação formal, entre outros objetivos destacam-se os relativos ao ensino e aprendizagem de conteúdos his-toricamente sistematizados, normatizados por leis, dentre os quais destacam-se o de formar o indivíduo como um cidadão ativo, desenvolver habilidades e competências várias, desenvolver a criatividade, percepção, motricidade etc. (GOHN, 2006, p. 29)

Por isso ao longo do nosso estudo, vamos nos reportar aos documen-tos referentes às diretrizes nacionais, tais como: Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBs) e Base Nacional Comum Curricular, a conhecida BNCC. Mas vamos ao ponto fundamental da nossa reflexão, o balé.

O balé é uma arte que vem se desenvolvendo com o passar dos séculos, permanecendo sempre atual, com a “beleza de sua organização em passos pre-cisos, regrados, em constante desafio aos efeitos da força gravitacional” (FARO, 1986 p.44). A partir de danças populares, mestres de dança dos séculos XVI e XVII, da Itália e da França, domesticaram seus passos e codificaram todos eles, permitindo que o balé clássico atravessasse mais de 400 anos ainda sendo

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praticado. Inicialmente, os grandes bailes aristocráticos continham espetáculos compostos de músicas, poesias e danças variadas. Daí surgiram os grandes mestres do balé, pessoas muito cultas. Isso fez com que o balé fosse composto de várias expressões artísticas em seus espetáculos. É uma dança teatral, que não prescinde da interpretação e da pantomima.

O balé se desenvolveu na Itália a partir do século XV, particularmente em Florença, onde aconteciam grandes festas – que duravam vários dias -, no palácio dos Médicis. Essas festividades simbolizavam riqueza e poder. (...) Quando a rainha italiana Catarina de Médicis casou--se com o Duque de Orléans, futuro rei Henrique II da França, levou para lá a ideia de espetáculo, com a finalidade de divertir a corte. (RENGEL; VAN LAN-GENDONCK, 2006, p. 16)

Mas foi com Luís XIV (1638-1715) que o balé deve grande desenvolvi-mento na França, além de bailarino, ele foi incentivador da profissionalização do balé. Segundo Faro (1986) estudos foram conduzidos pela “Académie Royale de Danse“, primeira escola de ballet, fundada pelo rei Luís XIV, da França, em 1661. Já em 1669 foi fundada a “Académie Royale de Musique”, companhia de ópera e ballet, que resiste até os dias atuais, sob o nome de Ópera Nacional de Paris.

Resumindo, nas palavras de Portinari (1985, p. 10) se consegue enten-der o caminho percorrido pelo balé, da sua origem, em relação aos demais estilos de dança:

O cristianismo, desprezando o corpo, condenou-a como invenção do diabo. Mas sem conseguir que os camponeses medievais a rejeitassem. Catarina de Medicis e Luís XIV trataram de revesti-la com etiqueta de corte. O balé teve padrinhos de sangue azul. A dança seguiu, assim, dois caminhos distintos: um vinculado à própria origem do homem, como manifestação espontânea; outro codificado segundo a aristocracia.

O Balé, tal qual se originou, perdura até os dias atuais, porém as reformas que aconteceram na área da dança apenas o libertaram do “maneirismo exagerado, do excesso mímico, do gesto gratuito. Mas os passos, as cinco posições básicas, o preparo técnico permanecem os mesmos”. (PORTINARI, 1989, p. 133)

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Dança na Escola

Caminada (1999) nos informa que foi a partir da terceira década do século XX que se pode dizer que o balé chegou ao Brasil, por meio da bailarina russa Maria Olenewa, que fundou a Escola de Danças Clássicas do Teatro Municipal do Rio de Janeiro. Em menos de um século, o balé se popularizou, grandemente, no Brasil, capilarizado em várias regiões e cidades, um pouco mais acessível às pessoas, organizado em diferentes métodos e metodologias, muitas companhias amadoras e profissionais, espetáculos variados e tradicionais.

Além de ser a principal estilo dentro de várias escolas de dança, o balé também começou a ocupar as escolas regulares de ensino infantil. Nestas, era oferecido como um curso livre, voltado para crianças entre 3 e 8 anos e sem compromisso com a graduação do bailarino. Muitas vezes, seguindo a meto-dologia de aulas simples para adultos, com exercícios no solo, não exatamente voltados para crianças, com sequências repetitivas e não muito dançantes. Pois o balé foi desenvolvido por e para dançarinos adultos, cujas habilidades básicas de movimento e de coordenação estavam desenvolvidas. Somente crianças acima de 8 anos de idade podiam ingressar no balé, momento em que suas habilidades começavam a estar prontas para o treinamento da técnica clássica.

A partir do final do século XX e começo do século XXI, cresceu bastante o interesse das crianças mais novas pelo balé, no Brasil. A ponto das turmas infantis, chamadas em muitos lugares de baby class, serem as mais procuradas, dentro de uma escola de dança. Ao mesmo tempo, estas aulas passaram a ser mais lúdicas e voltadas para o desenvolvimento motor destas crianças, trabalhando seus movimentos fundamentais, isto é, suas habilidades motoras básicas e a capacidade de coordenação, assim como uma familiarização da técnica clássica, facilitando o aprendizado futuro do balé tradicional, que requer alguns anos de desenvolvimento dessa coordenação. Esta mudança acompanhou a transformação de costumes da sociedade, em que as crianças passaram a ser mais valorizadas e entendidas, não mais como pequenos adultos, mas como seres em formação, cheios de potencialidades e em desenvolvimento.

A legislação brasileira, em sua Lei nº 12.796/2013, (Impressa Nacional) passou a exigir que crianças a partir de 4 anos de idade frequentem a escola de ensino formal. Com isso, também cresce a demanda pelo balé infantil dentro das escolas. Sendo assim, as atenções ao ensino do balé infantil têm crescido,

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diante da grande responsabilidade, com o desenvolvimento motor, artístico, emocional, criativo das crianças.

Para a dança, muitas vezes, o balé infantil é a sua porta de entrada, se se tratar de uma boa experiência para a criança. Da mesma forma, a criança que pratica o balé infantil tem boas chances de ingressar na formação clássica do balé, a partir dos 8 anos de idade, por ter adquirido maior destreza em suas habilidades motoras e cognitivas.

DESENVOLVIMENTO DO BALÉ NA ESCOLA DE ENSINO FORMAL

As artes em geral são de grande valor para sociedade e possuem grande influência sobre o indivíduo, uma vez que por meio delas é possível conhecer a nossa própria história, promovendo formação e transformação.

Em se tratando de escola fica evidente a contribuição da arte na formação de crianças e jovens, pois se indica

(...) a arte no processo de formação humana para dar sentido ao sentir e a percepção de mundo do ser, utili-zando-se das emoções e referências simbólicas (cultura, memória, criatividade) do indivíduo. Com isto pretende educar respeitando a cultura herdada e acrescentando conhecimento a fim de dar instrumentos ao aluno para que ele venha desenvolver uma capacidade intelectual para saber ser crítico dentro desta mesma cultura”. (RODRIGUES; SOUZA; TREVISO, 2017, p. 117)

Assim, a Lei 9.394 de 1996, que estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Brasileira, definiu a arte como disciplina curricular obrigatória no ensino formal. Os estudos das artes devem ser ministrados separadamente, para que se garanta o aprofundamento necessário nos fundamentos básicos da dança, da música, do teatro e das artes visuais. Por possuírem elementos específicos, o professor com apenas uma formação em uma dessas áreas não se mostra pre-parado para atuar nas outras, pois deixaria sérias lacunas de aprendizado nos outros segmentos da arte. No dia 03/05/16, foi publicada a lei 13.278/2016 que passou a contemplar a dança, a música, o teatro e as artes plásticas como partes

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Dança na Escola

da grade curricular nos níveis de educação básica, alterando a lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB - lei 9.394/1996. (BRASIL, 1996)

Entende-se que o ensino da arte na educação básica, especialmente com vivências regionais, seja componente curricular obrigatório a fim de promover o desenvolvimento cultural dos educandos. Sendo assim, conhecer a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB, atualizada no que se refere ao segmento artístico, é o ponto de partida para compreender a estrutura de ensino.

Com a Lei 13.278/2016, o balé nas escolas ganha mais notoriedade e, com isso, estabelece novos sentidos e possibilidades, uma vez que se ganha mais abrangência, se tem a necessidade de sair do método convencional para dar espaço à abordagem que desenvolva com ênfase a capacidade criativa das crianças. A atuação do profissional do Balé que atende nas escolas de ensino formal precisa estar voltada a facilitar o processo pedagógico em diferentes formas. Para isso, o professor precisa ser aberto às novas didáticas dentro do balé. Apesar de estar na escola, podemos dizer que há uma grande relação entre a educação formal e a não formal, pois o balé deve estar nas salas de aulas, como conteúdo dos componentes curriculares de arte e ou educação física, mas, também, em propostas extracurriculares.

Assim, o balé não precisa ser isso que conhecemos, acadêmico, rígido, com barras e movimentos definidos. Podemos e devemos ir além, estimular a improvisação, a criação, a apreciação e, assim, o conhecimento artístico, pois

(..) não há educação quando a criança deve memorizar saberes que não têm sentido para ela. Mas tampouco há educação quando o nível qualitativo da atividade não muda entre o início e o fim, sendo a qualidade defi-nida por normas específicas a cada tipo de atividade”. (CHARLOT, 2011, p. 22)

O balé nas escolas de ensino formal não se resume, necessariamente, ao balé infantil. Há escolas que fornecem uma boa infraestrutura para as aulas de balé, além de disponibilidade de horários. Portanto, havendo meios, o ensino do balé nas escolas de ensino formal pode se desenvolver plenamente, incluindo a formação clássica do bailarino, a partir dos 8 anos de idade. Contudo, a realidade mais observada em aulas de balé dentro das escolas de ensino formal é o ama-

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dorismo e a acomodação improvisada; tanto na proposta de alguns professores de balé quanto na receptividade de algumas escolas ao estilo.

É comum ver o ensino do balé infantil nas escolas de ensino formal como um passatempo para as crianças, não necessariamente como um aprendizado, que influenciará enormemente o desenvolvimento emocional, cognitivo e motor dos educandos. Por vezes, os profissionais mais inexperientes são convocados para ministrarem as aulas de balé infantil, sem sequer serem, devidamente, orientados para tanto. E, muitas vezes, essas aulas ocorrem em espaços improvisados, pouco adequados para a prática, dificultando um trabalho bem feito, de e com qualidade.

Entretanto, tanto de um lado quanto de outro, são conquistas que estão sendo feitas conforme as mudanças culturais acontecem em nossa sociedade. Se o balé não é a atividade principal de uma escola de ensino formal, bem desenvolvido e com uma proposta pedagógica bem estruturada, pode ser um grande aliado desta.

Se as tendências sociais, cada vez mais, elevam as escolas de ensino for-mal como espaços socializantes e de práticas educativas corporais e em grupo, deslocando parte das aulas teóricas para o ambiente virtual, o balé nas escolas, assim como a dança escolar em geral, inclina-se progressivamente para ser mais valorizado num futuro próximo.

Para isto, necessitamos de profissionais bem preparados, comprometidos, com a clara visão de que o balé nas escolas não existe apenas para formar baila-rinos, mas principalmente para trabalhar pedagogicamente, o desenvolvimento cognitivo, motor, emocional e cultural dos educandos.

Outra questão a ser trabalhada é a pouca adesão dos meninos às aulas de balé. É um tabu maior ainda dentro das escolas de ensino formal, pois ali convivem colegas que podem discriminar o menino que faz balé, tornando seu dia a dia na escola bem difícil e triste. Superar isso exige engajamento de todos os envolvidos: profissionais do balé, escola, famílias e sociedade. O balé clássico trabalha com movimentos delicados e vestimenta que não condizem mais com os modismos atuais, reservados ao sexo masculino. Se na Corte do rei francês Luís XIV, origem do balé codificado, a calça justa, sapatos de salto e perucas compridas eram símbolos de masculinidade, hoje representam o feminino.

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Dança na Escola

Os movimentos delicados, mesmo os que exigem grande força dos bailarinos, são próprios do balé clássico. Isso nos remete a delicadeza dos prín-cipes de contos de fadas. Já a vestimenta, em se tratando de crianças, não tem a necessidade de ser a tradicional calça justa do balé. Os meninos podem muito bem participar das aulas com o próprio uniforme escolar ou roupa semelhante, sem precisarem passar por qualquer constrangimento que os estigmatizem, perante os colegas e que, dificultam sua adoção às aulas de balé.

Quanto às aulas historiadas de balé infantil, é comum se trabalhar com figuras admiradas por meninas, como fadas, princesas, borboletas. O que não engaja os meninos, nem meninas mais aventureiras, que costumam preferir personagens diferentes. Portanto, o repertório de histórias e imagens a ser tra-balhado em aulas de balé deve ser bem eclético, plural e acolhedor.

METODOLOGIA DO BALÉ NAS ESCOLAS REGULARES DE ENSINO FORMAL

Quais seriam as diferenças do ensino do balé clássico nas escolas de ensino formal à instrução das escolas de dança? Talvez o processo de ensino, seu alcance e sua finalidade. Nas escolas de ensino formal, dificilmente, o balé fará uma pré-seleção de alunos, como acontece em algumas escolas de dança, que selecionam alunos segundo critérios de uma conformidade física específica. Tal diferença pode ocorrer por finalidades distintas de cada escola.

As escolas de dança podem ter por intuito a formação profissional de bailarinos, como meta principal. Já o balé, dentro das escolas de ensino formal, deve ter o propósito de um desenvolvimento mais global do bailarino, soman-do-se à escola no objetivo pedagógico proposto ao educando.

A partir desta finalidade, o balé dentro das escolas de ensino formal pode adotar um processo de ensino mais inovador, buscando excelência em suas atividades, porém sem superestimar o valor estético do resultado final de uma apresentação, por exemplo, uma vez que esta poderá fazer parte das experimentações e construções dos alunos. Ainda que possa, também, trabalhar outras apresentações em que o objetivo estético final esteja presente.

No tocante ao alcance, o balé dentro das escolas de ensino formal pode ser um aliado na educação escolar, abordando conteúdos que estejam sendo

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estudados pelos educandos e reforçando o aprendizado por um ponto de vista artístico. E, a depender da metodologia aplicada, o ensino do balé pode desen-volver diversas habilidades importantes ao futuro profissional do aluno, seja em que profissão for.

O balé clássico exige alunos esforçados, interessados, dedicados, dispostos a alguns sacrifícios de tempo e de lazer. Isso levou a uma tradição de ensino do balé com uma disciplina semelhante à de militares. Inclusive, soldados franceses estudavam balé clássico para melhorarem sua performance, no reinado de Luís XIV (FARO, 1986).

No entanto, novos conhecimentos adquiridos nos atuais tempos, tanto na anatomia da dança como na biomecânica do movimento, e tecnologias aplicadas na prevenção e no tratamento de lesões mostraram que o balé não precisa de sofrimento ou estar ligado à dor. Podemos atingir altos níveis de competência na execução dos passos sem que, para isso, precisemos machucar ou sobrecarregar nosso corpo.

Outro fator que também tem contribuído para a alteração de ensino do balé clássico é a mudança de costumes. Foi-se o tempo em que a pedagogia, ou a falta dela, baseavam-se em humilhações, punições, hierarquias severas, falta de diálogo. Hoje em dia, o professor não é mais o detentor exclusivo de toda sabedoria ou conhecimento. Informações em vídeos, áudios e em textos estão disponíveis a quem quiser, na internet ou fora dela. Sendo assim, o papel do professor está muito mais focalizado no de mediador ou facilitador. Ele deve ajudar a conduzir o aluno em seu processo de aprendizado. O destaque está na relação professor/aluno, em que o processo pedagógico é construído conjunta-mente por ambos, que se influenciam mutuamente, num movimento dinâmico e aberto ao novo.

Uma modificação de costumes também ocorreu no tempo e disponibi-lidade dos alunos. O mundo da tecnologia tem ofertado inúmeros estímulos e facilidades para a vida das pessoas. O resultado parece ser uma vida muito mais corrida, concorrida, preenchida por diversos interesses e possibilidades, levando a uma menor disponibilidade de tempo e de foco do aluno para o balé.

Sendo assim, como conquistar este aluno para uma arte que exige dedi-cação e perseverança, tempo e disponibilidade, que se prolonga no tempo?

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Dança na Escola

Certamente, a metodologia não pode ser a mesma de décadas passadas, quando o aluno também era outro e em um mundo com costumes diferentes de hoje.

Primeiramente, é preciso considerar quais os objetivos do ensino do balé. Além de arte, dança, passos, o balé abrange lições de humanidade, propiciando empatia, força e paciência. (BRINKERHOFF, 1978). Logo, a metodologia deve levar em consideração tudo isso.

Quanto à técnica, o professor que apresenta os passos, os quais os alunos copiam, precisa pensar em outras metodologias de ensino, pois não basta para serem atingidos os propósitos a que se destina o balé. A demonstração dos exer-cícios ainda é importante, contudo, não é suficiente. Numa pedagogia relacional, além da afetividade entre professor e aluno, é necessária a compreensão e a construção do conhecimento por este. Ele precisa compreender e experimen-tar que músculos são requisitados para o movimento específico, assim como a respiração adequada, a dinâmica, o sentir a música, ritmo, cadência, intensidade, sua anatomia e potencialidades. E um dos possíveis jeitos de se aprender tudo isso é experimentando e ensinando!

Após o início de cada ciclo de ensino-aprendizagem, que pode durar um bimestre, por exemplo, e o professor se certificar de haver um elo afetivo entre a turma, deve abrir a possibilidade de cada aluno ensinar ou revisar algum passo específico, corrigir e fazer alguma sequência coreográfica. Isso pode ser feito também por meio de jogos criativos. Os novos costumes impelem os alunos a também serem protagonistas no processo de conhecimento. E nessa relação de aluno ensinando aluno, com trocas constantes de papéis, vai ocorrendo a empatia, tanto entre colegas como entre aluno/professor.

No ensino do movimento, há três estágios de aprendizagem: o cognitivo, o associativo e o autônomo. No estágio cognitivo, o aluno tem que entender o que fazer, precisa receber um conhecimento prévio sobre a habilidade que vai aprender, seja através de um estímulo visual ou verbal. No estágio associativo, o aluno experimenta em seu corpo o estímulo que recebeu, faz ajustes e junta pequenas habilidades de movimento, é a fase motora, onde aprende a executar a habilidade, transforma o que fazer em como fazer. Por último, há o estágio autônomo, etapa final da aquisição motora. Geralmente, são necessários anos de treinamento para se chegar a este estágio.

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Spessato e Valentini (2013, p. 475) abordam as estratégias de ensino nas aulas de dança e contribuem com nossas reflexões, auxiliando o entendimento e o alcance em relação aos estágios de aprendizagem do balé, quando dizem:

Três estratégias são frequentemente utilizadas no ensino da dança, as quais são facilitadoras do processo de apren-dizagem: a demonstração, que fornece informação visual através da aprendizagem observacional; dicas verbais, que guiam a performance por meio de informações verbais curtas; e imagem mental, que permite o ensaio mental do movimento. Essas estratégias, ao serem adotadas de forma sistemática, repercutem positivamente na aprendizagem.

Outro processo interessante, que pode ser introduzido ao final de algumas aulas ou em aulas inteiras específicas após um ciclo de ensino-aprendizagem, é um jogo dramático em que o professor encoraja os alunos a criarem persona-gens e histórias curtas, ao mesmo tempo em que se movimentam pelo espaço. A partir daí, estimulados pelo professor, identificam o ritmo da movimentação e escolhem uma música adaptada a ele. Finalmente, os alunos transformam a movimentação em uma sequência coreográfica clássica. Uma metodologia adaptada pelos presentes autores sobre o Jogo Dramático Infantil, de Peter Slade, para o balé.

Estas metodologias promovem o desenvolvimento de habilidades impor-tantes não somente para ser bailarino, mas para ser alguém com competências ampliadas para tornar-se um bom profissional do futuro. Criar uma história, representá-la e dançá-la junto a colegas e ensinar envolvem situações que ajudarão no desenvolvimento de flexibilidade cognitiva, negociação, julgamento e tomada de decisões, inteligência emocional, coordenação com os outros, criatividade, pensamento crítico, gestão de conflitos, agilidade, adaptabilidade, iniciativa, comunicação, liderança, gestão do tempo, capacitação.

Além disso, o ensino do balé no ambiente da escola de ensino formal pode trabalhar em sintonia com os conteúdos escolares desenvolvidos. Ense-jando uma maior familiarização dos alunos com os temas estudados. Isto pode ser tratado como enredo de uma apresentação ou mesmo como assunto de um jogo dramático. O objeto do estudo escolar sendo compreendido por uma visão artística e expressiva.

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Dança na Escola

Outras possibilidades surgem analisando os repertórios de balés clássicos, como O Lago dos Cisnes, Dom Quixote e outros dançados até os dias atuais. Em sua grande maioria, têm suas histórias inspiradas em contos europeus. Nas escolas de ensino formal, temos a possibilidade de apresentar os contos de balé já existentes, usando-os de inspiração para criar repertórios que retratem a realidade e a cultura regionais, fazendo com que a criança se sinta representada dentro daquele universo do balé em todo o processo.

Assim como o coreógrafo tcheco, radicado no Brasil, Vaslav Veltchek, que elaborou várias coreografias baseadas no folclore brasileiro, como Uirapuru, de Villa-Lobos, e Festa da Roça, com música de José Siqueira, estreadas no Rio de Janeiro em 1943. E também é viável se pensar em coreografar situa-ções cotidianas da vida das crianças, alunas do balé, e que possam envolver até histórias passadas na escola. Como dizia Paulo Freire (1996), a educação deve estar ligada ao cotidiano das pessoas. Há que se valorizar a cultura do aluno, pois ele não chega vazio na escola. O aluno precisa partir da sua realidade social para se conhecer e conhecer o mundo. Isso é fundamental para o processo de conscientização e transformação, tanto abordado por Paulo Freire. Assim, nas palavras de Scharam e Carvalho (s/d, p. 03)

A partir das releituras de Paulo Freire, acreditamos no professor capaz de coordenar a ação educativa; no edu-cando como agente sujeito participante; na escola como currículo de cultura; e na sala de aula como espaço de diálogo. É em função desses pressupostos que queremos participar das reflexões para a construção da escola que oferece uma educação em que as pessoas vão se com-pletando ao longo da vida, uma educação capaz de ouvir as pessoas, participando dessa realidade, discutindo-a, e colocando como perspectiva a possibilidade de mudar essa realidade.

O balé é uma atividade completa. Trabalha o físico, mas também o imaginativo, a expressividade, o artístico. É importante frisar a relevância do desenvolvimento dos sentidos da criança. Sentir primeiro, aprender depois, como dizia a educadora Maria Montessori. Sendo assim, o trabalho de afetividade nas aulas de balé é indispensável. 

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Os adultos admiram seu meio ambiente; são capazes de se lembrar dele e pensar nele; mas a criança o absorve. As coisas que ela vê não são apenas lembranças; elas formam parte da sua alma. Elas incorporam todo o mundo que seu olhos vêem e que seus ouvidos escutam. Em nós, as mesmas coisas não produzem mudanças, mas a criança é transformada por ela. (CLOUDER; NICOL, 2009, p. 7)

Indispensável, também, que o ensino do balé infantil, para crianças de 3 a 10 anos de idade, seja lúdico. E que o ensino para adolescentes, a partir de 11 anos de idade, seja desafiante dentro das possibilidades de cada aluno.

Entre 3 e 5 anos de idade, a criança sente uma grande afinidade com o ritmo, a dança e a música. Pede repetição de histórias, brincadeiras, cantigas. É a fase dos contos de fadas. Einstein também recomendava os contos de fadas para estimular a sabedoria das crianças. O balé pode trabalhar tudo isso com abundância. No jogo dramático, pode-se estimulá-las com um ritmo e sugestões sobre o que fazer, mas deixar que elas mostrem o como fazer.

Dos 5 aos 7 anos de idade, há um aumento da habilidade física e a criança sente prazer em exercitá-la e mostrá-la. Já divide papéis na brincadeira imitativa, podendo assumir determinado personagem e levando a brincadeira do começo até o fim, mas a história ainda tem que ser curta. As lendas e fábulas com moral da história assentam bem nesta fase.

Dos 7 aos 11 anos de idade, a criança já tem mais percepção do eu, é muito sentimental com elogios e críticas, consegue ser empática, sua estrutura física já está desenvolvida, pronta para crescer. No jogo dramático, podem ser escaladas para pequenos papéis, em histórias mais longas e o estímulo para elas pode vir não mais do ritmo, mas do jogo das ideias. Entre 9 e 11 anos de idade, o professor pode sugerir um tema sobre o qual as crianças desenvolverão a história.

A partir dos 11 anos de idade, o adolescente está mais apto a se con-centrar numa aula tradicional de balé, a ter momentos de desafio nas aulas, trabalho com balés de repertório, assim como aulas sobre a história e anatomia da dança, a terminologia dos passos, estudo do figurino, cenário, objetos cênicos etc. Lembrando que o melhor jeito de aprender é ensinando. O aluno deve ser desafiado a isso em vários momentos.

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DIÁLOGO DO DESENVOLVIMENTO COM BALÉ

A abordagem do balé na escola de ensino formal deve ser embasada e aliada ao desenvolvimento motor da criança. Os exercícios do balé devem ter uma relação clara com as fases do desenvolvimento, criando um estímulo para os movimentos básicos funcionais, inerentes ao corpo humano.

Gallahue e Ozmun (2005) dividem em quatro fases do desenvolvimento motor infantil, são elas: fase reflexiva, fase rudimentar, fase fundamental e fase especializada.

Vale a pena relembrar que uma fase depende da outra para o desenvol-vimento das habilidades motoras. Por esse motivo, devemos inserir as crianças em um contexto artístico-educativo que possibilite o desenvolvimento motor de qualidade para cada faixa etária, e o balé nas escolas é uma delas. Sobre essa ideia, Gallahue e Ozmun (2005, p. 22) afirmam que a “compreensão do processo de desenvolvimento motor ajuda explicar como o aprendizado de habilidades motoras ocorre, o qual é crucial para o ensino desenvolvimentista apropriado”.

É de extrema importância deixar claro que a divisão das fases motoras por idade é feita para que se tenha melhor entendimento didático, facilitando a compreensão sobre o desenvolvimento humano. Não significa que aos 7 anos de idade a criança deixe de pertencer à fase motora fundamental e passe automaticamente para a especializada. Essa transição ocorre gradativamente, de acordo com a desenvolvimento de cada aluno, no seu devido tempo.

Para Gallahue e Ozmun (2005), a dança é uma modalidade de habilidade motora especializada, no entanto, os estágios motores anteriores, pelos quais a criança passa, devem ser respeitados e vivenciados para proporcionar um vasto vocabulário motor, ajudando no desenvolvimento das crianças em idade escolar.

Partindo do pressuposto de que temos o Balé como ferramenta para o desenvolvimento motor de qualidade, espera-se que a prática também dê sub-sídios aos conhecimentos técnicos, estéticos, criativos e expressivos. Isso será possível se a técnica não for mais importante que o caminho. A criança não deve ser vista apenas como um corpo que fará reprodução de movimentos, mas sim como o conteúdo mais importante durante o processo.

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Papalia (2006) nos informa que a segunda infância acontece entre 3 a 6 anos de idade, e nesse período ocorrem muitas mudanças. Dentre elas, as mudanças corporais ficam evidentes, como a barriga arredondada se comprime à medida que os músculos abdominais se desenvolvem, pernas e braços tendem a ficar mais compridos. Essas mudanças físicas acontecem graças ao amadureci-mento do cérebro e do sistema nervoso central, e promovem o desenvolvimento, possibilitando assim o aprendizado de habilidades motoras.

Também é na segunda infância que as crianças têm grandes avanços nas habilidades motoras que envolvem grandes músculos, no correr e saltitar. Com o desenvolvimento das áreas sensoriais e motoras, a criança tem uma melhor percepção do que querem fazer e do que sabem fazer. A estrutura corporal fica mais forte, aumentando a capacidade cardiorrespiratória, tornando a criança mais resistente, aumentando a agilidade nas brincadeiras inerentes à infância, como correr, saltar, entre outras. Sentimento como vergonha e orgulho, começam a ser desenvolvidos. (PAPALIA, 2006)

As atividades devem estar organizadas de acordo com as possibilidades das crianças, respeitando as fases motoras, acreditamos que assim se tenha um melhor aproveitamento das aulas de balé e menor índice de frustração ́ por não realizarem certos movimentos da técnica clássica.

A dança é linguagem, mas a linguagem é só um pedaço da dança. Dançar desenvolve habilidades de todo o cérebro. A dança vai muito além de expressar, ver, ouvir e conectar tudo isso com memória. Ela também desenvolve habilidades como percepção de espaço, que requer conexões visuais, vestibulares (região de equilíbrio do ouvido, que dá a posição da nossa cabeça em relação ao mundo) e sinestésicas (o como percebo meu corpo dentro do espaço). Isso atinge, pelo menos, três áreas distintas do cérebro.

Dançar também atinge a memória, que não tem um lugar especial no cérebro, pois não está só no hipocampo. A memória também é motora, coreo-gráfica e emocional. Dançar uma história, uma narrativa, inclusive, é bem mais salutar para a memória.

E dançar também tem a ver com cronometragem, ou ritmo, que é um estímulo dado em intervalos de tempo. Não existe somente ritmo sonoro. Ritmo é sobrevivência, a natureza é rítmica. Temos o dia e a noite, as estações do ano,

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chuva e sol. Gostamos de sincronizar com o ritmo porque ele é sobrevivência. Se não nos adequamos ao ritmo, morremos.

Nossa percepção rítmica depende de ativação de áreas de memória e de áreas motoras do cérebro.

A dança também desenvolve a propriocepção, que é o sentido de si mesmo. Além de ser equilíbrio, expressão emocional e padronização motora. Dançar é tão complexo que há uma coreografia neural por trás da coreografia da dança. Ou como nos coloca Cazé (2009, p. 3), se reportando a Damásio (2000):

(...) percebe cognição e emoção como ações de um mesmo corpo com uma única entrada, a percepção sensório--motora. Ele aponta a tomada de decisão como um evento associado a fatos e mecanismos ligados à regulação corporal; que os sentimentos e emoções são percepções diretas dos estados corporais e constituem um elo entre corpo e consciência.

A dança pode deixar o indivíduo saudável, porque inibe o hormônio cortisol, que é bom para casos de inflamação ou doença em nosso corpo, mas que, fora disso, pode ser prejudicial à nossa saúde.

PRINCÍPIOS E MOVIMENTOS FUNDAMENTAIS DO BALÉ CLÁSSICO

Associados ao conhecimento de desenvolvimento socioemocional e psicológico da criança e seu desenvolvimento motor, os professores de balé precisam ter clareza sobre os princípios e movimentos fundamentais do balé clássico, de forma a desenvolver aulas com exercícios que respeitem a fase de desenvolvimento da criança e o ensino progressivo dos passos. Deste modo, trabalhando com coerência e eficácia.

Entre as idades de 3 a 7 anos, o balé infantil trabalhará a coordenação natural com a familiarização da técnica clássica, de maneira a facilitar e poten-cializar o desenvolvimento desta técnica clássica a partir dos 8 anos de idade.

Importante, então, conhecer os sete princípios fundamentais da técnica de balé clássico: postura ereta; en dehors ou rotação externa do quadril; harmonia dos movimentos; equilíbrio; técnica clássica; transferência de peso; coordenação.

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Já quanto aos movimentos fundamentais do balé, os chamados verbos destes movimentos, podemos citar os seguintes: plier (dobrar), étendre (esticar), glisser (deslizar), jeter (lançar, arremessar), relever (subir), chasser (caçar), tour-ner (girar), sautter (saltar), fondre (derreter), frapper (bater), elancer (impulso, mexer-se rapidamente).

PROPOSTA DE ATIVIDADES (PARA CRIANÇAS DE 3 A 6 ANOS)

Atividade nº 1Nome Sequência de ações

Objetivo Coordenação Motora e Ritmo

Materiais Música com tempos bem marcados

Disposição Crianças em pé espalhadas pela sala de aula

Desenvolvimento da Atividade Com os pés paralelos, em 6º posição, as crianças batem 3 palmas e pausam 1 tempo. 2 vezes. Em seguida, batem 3 palmas e viram a cabeça para a direita no quarto tempo. Repetem para a esquerda.

Variações Conforme progredirem no exercício, mais sequências podem ser propostas. Como baterem 3 palmas e fazerem um plié. Ou 2 palmas e fazerem um plié e uma virada de cabeça. Ou 1 palma, um plié, uma virada de cabeça e outra palma.

Atividade nº 2Nome Atravessando a ponte suspensa

Objetivo Equilíbrio

Materiais Espaguete ou macarrão flutuador de piscina. Música que inspire encorajamento

Disposição Espaguete no chão, em linha reta, cortado na metade de maneira longitudinal

Desenvolvimento da Atividade Para as crianças menores, dispor a metade longitudinal do espa-guete com a parte achatada virada para o chão e pedir que as crianças caminhem sobre ele, equilibrando-se, podendo dar a mão à professora, se for preciso. É a travessia da ponte sobre o rio.

Variações Para as crianças maiores, inverter o lado, deixando a parte curva para baixo, proporcionando maior instabilidade. A travessia da ponte sobre um rio cheio de jacarés.

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Atividade nº 3Nome Um ratinho bonitinho

Objetivo Flexibilidade

Disposição Crianças sentadas no chão

Desenvolvimento da Atividade Com pernas dobradas, joelhos juntos e para cima, criança pega nos dedos dos pés e estica as pernas, tanto à frente quanto aos lados, procurando manter a pegada nos dedos e voltando a flexionar e esticar os joelhos algumas vezes, cantando a música “Um ratinho bonitinho”

Variações Para crianças maiores, procurar manter as pernas esticadas e segurando os dedos dos pés por mais tempo, procurando aproximar mais a parte baixa do abdômen sobre as coxas das pernas, cantando outras músicas.

Atividade nº 4Nome Safári

Objetivo Agilidade e Resistência Cardiorrespiratória

Materiais Música de aventura e vídeo mostrando a movimentação dos animais na natureza

Disposição Deslocamento pelo espaço da sala de aula

Desenvolvimento da Atividade As crianças imitam a movimentação de animais num safári, numa sequência dinâmica de movimentos, ao comando da professora. Caminhando com passadas pesadas como de um elefante. Depois andando na meia ponta dos pés, ficando tão altas como as girafas. Imitando garras com as mãos, incli-nando tronco à frente e andando sorrateiramente como leões. Rastejando no chão como jacarés. Caminhando e equilibran-do-se num pé só, com o outro joelho para cima (retiré passé), como garças ou flamingos. Correndo e pulando como macacos. Trotando como uma zebra.

Variações Os temas podem variar, assim como os exercícios, mas sempre dando sequência a movimentos diferentes entre si, com coman-dos que exijam mudança rápida de um movimento para o outro.

Atividade nº 5Nome Borboleta esforçada

Objetivo Força e Resistência

Materiais Música animada

Disposição Crianças deitadas no chão, em decúbito dorsal, no centro da sala de aula

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Desenvolvimento da Atividade Crianças deitadas no chão, em decúbito dorsal, joelhos fle-xionados e abertos para as laterais, em “borboleta”. Fazem abdominal cruzado, levantando ombros do chão e tocando com as mãos o joelho oposto. Borboleta dando toquinhos em suas asas, se esforçando para voar melhor.

Variações Abdominal reto, com mãos apontando para o centro das pernas em borboleta.

Atividade nº 6Nome Coelho procurando cenoura

Objetivo Impulso

Materiais marcações no chão com fita crepe ou várias pequenas cordas de uns 80 cm cada. Música com tempos bem marcados.

Disposição As cordas ficam entendidas no chão, lado a lado, com pequenos espaços entre elas.

Desenvolvimento da Atividade A criança salta sobre cada corda por vez, de pés juntos, paralelos, e mãos na cintura, sempre flexionando os joelhos (plié) antes e depois dos saltos e encostando os calcanhares no chão. Após passar por todos os obstáculos (cordas), criança se agacha e dá um último salto bem alto, com mãos para cima. Coelhinho achou a cenoura.

Variações As crianças maiores podem variar os saltos. Alguns de pés juntos, outros pousando com pernas abertas (echappé sauté) ou num pé só (petit jeté), como na amarelinha.

Atividade nº 7Nome A bexiga furada

Objetivo Respiração

Materiais Uma bexiga. Música com contrastes de lento e rápido.

Disposição Crianças em pé, espalhadas pela sala de aula

Desenvolvimento da Atividade Professora enche uma bexiga de ar e, sem dar nó, solta a bexiga, que gira pelo espaço soltando o ar até cair. Crianças serão a bexiga. Inspiram o ar e vão soltar o ar pela boca, sibilando devagar e girando como uma bexiga, até acabar o ar expirado.

Variações Experimentar movimentações ao inspirar o ar e ficar parada ao expirar. E o contrário. Perceber as diferenças entre uma e outra experiência e qual a mais fácil. Procurar chamar atenção para o movimento do diafragma na respiração.

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Atividade nº 8Nome Boas Vindas

Objetivo Orientação Espacial e afetividade

Materiais Fita crepe e música alegre

Disposição Crianças em fila num canto da sala de aula

Desenvolvimento da Atividade

No início da aula, crianças formam uma fila num canto da sala e uma delas é escolhida a anfitriã do dia, sendo a primeira a se posicionar no centro da sala e a receber as demais, uma por uma, anunciando a próxima da fila pelo nome. A anfitriã fica com uma mão na cintura e a outra estendendo em direção à amiga que vai se aproximar. Esta se aproximará fazendo um caminho proposto pela professora, seja em linha reta, em ziguezague, em diagonal reta, em círculo, quadrado, triângulo ou passando por todos os cantos da sala até chegar na anfitriã, fazendo uma reverência com plié em 6ª posição e inclinação da cabeça. E irá se posicionar no centro da sala, ao lado da anfitriã, tomando um distanciamento mínimo para poder se movimentar. Normalmente, equivale a ter 2 braços abertos lateralmente, o dela e o da anfitriã. A professora poderá fazer marcações no piso da sala, inicialmente, com fita crepe, para ajudar na movimentação.

Variações Pode-se variar a forma como a criança se desloca, seja na meia-ponta, somente sobre os calcanhares, correndo, fazendo movimentos criativos com os braços, entrando de 2 em 2.

Atividade nº 9Nome Saltar no circo

Objetivo Potência

Materiais Um banco tipo um pufe ou cubo. Música inspiradora.

Disposição O cubo fica entre a professora e a criança

Desenvolvimento da Atividade Criança se aproxima do cubo, dá as mãos para a professora, flexiona os joelhos e dá impulsão para saltar para cima do cubo. E depois salta para o chão.

Variações Mais velha, a criança pode fazer isso sem dar as mãos para a professora. Mas esta deve estar por perto, para evitar algum acidente.

Atividade nº 10Nome Direita e Esquerda

Objetivo Lateralidade

Materiais Fita crepe. Música com tempos bem marcados.

Disposição Em pé, no centro da sala de aula

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Desenvolvimento da Atividade 4 passos para a direita, balançando a mão direita nessa direção e falando “direita” 4 vezes. 4 passos para a frente batendo 4 palmas. 4 passos para a esquerda, balançando a mão esquerda nessa direção e falando “esquerda” 4 vezes. 4 passos para trás, batendo 4 palmas. Para crianças de 5 e 6 anos em diante.

Variações Formar um triângulo no chão, com fita crepe. Pedir que as crianças acima de 5 anos andem sobre o triângulo da direita para a esquerda delas ou do ponto de vista de quem as assiste. Como se elas estivessem subindo e descendo uma montanha.

Atividade nº 11Nome Onde o corpo dobra, marionete

Objetivo Consciência Corporal

Materiais Várias fitas de cetim de 50 cm cada, aproximadamente. Músicas que falem de bonecas.

Disposição Duplas de crianças

Desenvolvimento da Atividade Amarrar fitas de cetim nas articulações dos cotovelos, pulsos, joelhos, tornozelos e pontas de alguns dedos das mãos e dos pés de uma criança. A que faz dupla com ela manipulará a criança marionete, através das fitas de cetim, levando à consciência de onde o corpo dobra e como dobra.

Variações Sem precisar das fitas de cetim, uma criança será como uma massinha da outra, sendo tocada e tendo posições possíveis com o corpo sendo descobertas.

Atividade nº 12Nome Faz de conta com balão

Objetivo Dramatização

Materiais Bexigas cheias

Disposição Crianças em pé, segurando suas bexigas

Desenvolvimento da Atividade Professora pede que crianças se desloquem pela sala segurando seus balões. E dá comandos como: seu balão é uma barata, seu balão é um ursinho de pelúcia, seu balão é uma chama de fogo, seu balão é seu melhor amigo, seu balão é um hipopótamo. E assim por diante. Cada comando gerará uma reação diferente da criança, que demonstrará seus sentimentos e interpretação.

Variações O mesmo exercício, pedindo que agora cada criança dê um comando por vez.

As propostas de atividades são exemplificativas e não abrangem a tota-lidade de habilidades trabalhadas, apenas ilustram alguns trabalhos de aulas de

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balé infantil. Os professores de balé devem fazer um planejamento anual de aulas com os objetivos gerais e específicos para cada turma, além do planejamento de cada aula, como norteadores da ação pedagógica.

Estes planejamentos devem ser flexíveis, pois a dinâmica de ensino-apren-dizagem depende de muitos fatores do cotidiano, como o interesse das crianças, o que elas trazem para a sala de aula, os acontecimentos inesperados do dia a dia, as necessidades da turma e assim por diante.

Adotamos uma sequência de aula de balé infantil, para crianças de 3 a 6 anos de idade, da seguinte forma: iniciamos com uma reverência inicial aliada a exercícios de afetividade. Seguimos com exercícios de aquecimento. Continuamos com as atividades principais da aula com exercícios para 3 habilidades diferentes a serem trabalhadas, podendo ser uma só habilidade a depender dos objetivos para a turma. Emendamos com um exercício de desafio, em que propomos alguma atividade um degrau acima do nível da turma, para avaliarmos aquelas crianças que já estão aptas a realizarem, assim como incentivamos o interesse daquelas que já estão achando os demais exercícios muito fáceis. Prosseguimos com um momento de dança livre, em que colocamos uma música bem dançante para as crianças dançarem como quiserem. E encerramos com algum exercício de alongamento dinâmico e reverência final, em que trabalhamos um pouco de port de bras (exercícios de braços), com uma música bem calma e trabalhando a delicadeza.

No balé, sempre procuramos trabalhar uma postura para iniciar cada exercício e outra para terminar os mesmos. Mostrando um ritual necessário a uma arte tão precisa e organizada, lembrando de um pacote de presente, que precisa de um laço como arremate final, caprichando e valorizando o conteúdo.

As avaliações são constantes, aula por aula, sempre buscando analisar o interesse da criança e seus aspectos socioafetivos, psicomotores e de dramatiza-ção. Mas convém entregar uma avaliação por escrito aos familiares responsáveis pela criança, que pode seguir o mesmo padrão adotado pela escola de ensino formal em que as aulas de balé estejam acontecendo, inclusive coincidindo com as datas de entrega.

As músicas trabalhadas no balé infantil são ecléticas, ora músicas populares brasileiras, ora músicas instrumentais, ora músicas de balés de repertório. Uma

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vez ou outra, podemos tocar alguma música específica de que as crianças gostem. Importante que mantenhamos um diálogo com as crianças, inserindo um pouco daquilo que elas gostam nas aulas. Porém, é função educativa apresentarmos músi-cas, histórias, materiais e contextos de boa qualidade artística e cultural em nossas aulas, porque cabe ao professor ampliar o repertório cultural e de conhecimento das crianças, pois só se aprecia aquilo que se conhece. A indústria cultural limita muito o acesso à vastidão do que é produzido no mundo da arte. Portanto, não podemos nos acomodar a ela. É nosso dever buscar e apresentar um leque muito maior de cultura e de conhecimento.

As aulas de balé infantil de 3 a 6 anos de idade costumam ter uma duração de 45 minutos, até duas vezes por semana. Optamos, neste capítulo, não propor-mos atividades para crianças mais velhas, tendo em vista que a familiarização com a técnica do balé clássico vai ficando cada vez mais intensa conforme a idade avança, tornando as atividades muito mais específicas e diferenciadas, o que acarretaria um capítulo muito extenso.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

No decorrer desse capítulo, foi abordado o ensino do balé nas escolas de ensino formal, seu contexto histórico, realidade, objetivos, metodologia conforme desenvolvimento motor, psicológico e socioafetivo dos alunos, propostas de atividades e organização de aulas.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional requisitaram a criação da Base Nacional Comum Curricular – BNCC (BRASIL, 2018) que regulamenta os direitos de aprendizagem e desenvolvimento dos alunos. A metodologia proposta aqui pretende atender a estes direitos da educação infantil, quais sejam: conviver, brincar, participar, explorar, expressar e conhecer-se. E consideramos que são atendidos.

Acreditamos que o balé nas escolas tende a crescer e a ser valorizado cada vez mais, como aliado fundamental ao desenvolvimento dos alunos, pois a dança como conteúdo, dos componentes curriculares arte e educação física deve ser trabalhada como um conhecimento artístico amplo, com possibilidades de propiciar espaços de experiências diversas para os alunos, inclusive o balé.

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O balé pode e deve ocupar os espaços da escola, sejam eles formal ou não formal, como conteúdos dos componentes curriculares ou em atividades extras, COMO “uma atividade de expressão não constrangida por normas e, por isso, considerada espontânea e criativa”. (CHARLOT, 2011, p. 38)

Portanto, não há educação artística se a criança não faz arte: essa é a verdade. (...) Mas, tampouco há educação se o educando não encontra um patrimônio, isto é, obras, práticas, normas da atividade, que foram criadas pleas gerações anteriores. Portanto, não há educação artística se o aluno fica trancado na sua própria atividade, sem contato com as obras de arte e com as normas específicas que as possibilitaram.

Indicamos que essas reflexões possam estar presentes, quando os profes-sores se sentirem motivados a desenvolverem o balé na escola e que, os alunos possam se beneficiar com a educação sensível advinda do ensino-aprendizagem das linguagens da arte. Que a escola possa contribuir com o desenvolvimento das melhores qualidades humanas de crianças e jovens por meio do balé.

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UM RELATO SOBRE CRIAÇÃO EM DANÇA COM CONTOS AFRICANOS NA ESCOLA PÚBLICA

Jussara da Silva Rosa TavaresSidney Leandro de Oliveira

ABRINDO OS CAMINHOS

A escola como um dos espaços existentes para o compartilhamento e produção do saber, recebe diariamente uma diversidade de pessoas e, portanto, com as mais diversas culturas, mesmo reconhecendo um predomínio hegemô-nico de uma cultura de massa. Assim, a escola é um espaço onde coletivamente estudantes podem se desenvolver através do compartilhamento de experiências pessoais, através das múltiplas maneiras de se perceberem, e de revisitarem os próprios saberes e diferenças na vida.

A dança no Colégio Estadual Professor João Costa, na cidade de Ara-caju-SE, com o subprojeto PIBID/DANÇA/UFS, proveu experiências que abarcaram subjetividades e objetividades, com propostas de repertórios de nossas culturas e de laboratórios por meio da pesquisa de movimento em diálogo com a contemporaneidade. Assim, com estruturas de movimentos e contextos consolidados ao longo do tempo das experiências humanas, e também as construídas na emergência do presente, em meio a diversos entrelaçamentos de aspectos moventes, errantes, e até mesmo efêmeros, nos espaços temporais e atemporais das presenças em salas de aulas, como ateliês de aprendizados por meio da criação. Esses repertórios podem ser assim compreendidos em Isabel Marques, no sentido que:

Cada repertório de dança – cada ‘texto’ de dança – é um recorte de uma época em relação a um dado contexto sociopolítico e cultural, cada ‘texto’ de dança é um modo de ver e entender o mundo. Assim, ao dançá-los, temos também a oportunidade de compreender em nossos corpos essas épocas, espaços, pessoas, relações (MAR-QUES, 2012, p. 17).

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Dança na Escola

Nessas palavras, também fomos provocados a pensar que os repertórios criados pelas pessoas estudantes estariam atravessados por esses modos de operação, mas, entretanto, encontrando-se na cena com seus modos subjetivos, que clivados34 aos textos-contextos de dança, nesse lugar poético, expressaram novos sentidos aos repertórios estudados.

Entre acolhimentos, rejeições e estranhamentos por parte das pessoas estudantes do ensino médio e da professora/supervisora5, as pessoas discentes bolsistas/Pibid da licenciatura em Dança, somando um total de 15 bolsistas de iniciação à docência, pisaram no chão dessa escola pública da rede estadual em Sergipe cheios de medo e apreensivos com o que iriam ensinar, e como iriam ensinar. Apesar da preparação anteriormente, por meio de leituras e debates de textos que versavam sobre educação, dança e educação e artes. Bem como de situações de experimentações de práticas corporais em dança, as pessoas discentes bolsistas ainda assim não se sentiam seguros para a docência e, melhor dizendo, para a docência em artes da cena.

As realizações das ações do subprojeto/Dança, foram se organizando a partir das memórias das práticas e dos métodos/teorias apreendidos durante as diferentes aulas/componentes curriculares do curso de Licenciatura em Dança na Universidade Federal de Sergipe.

Nos colocamos na perspectiva de parceria entre universidade e escola, por tanto não chegamos com predeterminações e nem tão pouco com verdades a serem seguidas. Pois entendemos que entre essas instituições há uma encruzi-lhada de saberes a serem apreendidos e negociados. Por essa razão nos colocamos abertos a colaborar com os projetos já desenvolvidos pela escola.

Assim fomos convidados a desenvolver um trabalho para a semana de Consciência Negra. Para colaborar com o evento partimos de uma ação artístico-pedagógica que teve por objetivo um fazer de ensino em dança com traduções/criações de Contos Africanos dos Orixás. Encaminhou-se em um

3 As ideias centrais desse texto fazem parte da pesquisa de doutorado em Artes Cênicas na USP, desenvolvida pela autora Jussara da Silva Rosa Tavares. 4 O termo clivado aqui utilizado, está relacionado a experiência do cruzamento e atravessamento dos modos de ler, sentir e estar no mundo com tensões próprias do encontro entre as diferentes culturas (MARTINS, 2002).5 Supervisora é a professora da escola que acompanha as pessoas discentes bolsistas do PIBID na condição co-formadora desses, mediando as situações de ensino.

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processo de criação com o conto de Omolu e suas tramas de relações, afetos, movimentos, gesto e dança com Iemanjá e Iansã, a partir de olhares para as realidades contemporâneas.

Nesse artigo trazemos descrições e discussões focados nessa experiência, onde realizamos um trajeto com a dança, por meio de um ensino focado na criação compartilhada e com alvo na tomada de autonomia, como bem nos elucidam os escritos de Paulo Freire (1996), a respeitos dos nossos modos de percepção e atuação com as pessoas estudantes.

Tínhamos a consciências de que as pessoas estudantes não eram corpos objetos das nossas criações artísticas, assim, pensando a partir da perspectiva de que a pessoa estudante não é objeto de manipulação no processo de criação, mediado por um/uma Professor/Professora/Professore de Dança, nos colocamos a partir do reconhecimento e busca de uma postura ética, que do contrário, faremos o que Freire (1996) exorta, quando em seus escritos aponta que “[...] O professor que desrespeita a curiosidade do educando, o seu gosto estético, a sua inquietude, a sua linguagem, mais precisamente a sua sintaxe e a sua prosódia; o professor que ironiza o aluno, que o minimiza [...] transgride os princípios fundamentalmente éticos [...]” (FREIRE, 1996, p. 66).

Tínhamos dificuldades em selecionar conteúdos de dança, porém tínhamos conhecimento do que não fazer. Recusávamos os modos de operações pedagó-gicas com a dança que delimitavam um imaginário e postura específica como a ideal através de modelos pré-estabelecidos e estereotipados, e que se apartam dos próprios processos das pessoas estudantes, de seus desejos, seus tempos de aprendizado, estruturas corporais e etc.

Por esse motivo aprendemos mais sobre a escuta, e continuamos assim, após esse processo a vislumbrar em nossas proposições essas pessoas estudantes, com suas danças, na referida escola pública - e das demais que tivemos a opor-tunidade de estar-, em caminhos dialógicos. Podendo cada uma expressar, com seus modos de organização e sentidos dos movimentos, as ideias elencadas no ensino e processo de criação com a dança.

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Dança na Escola

RODOPIOS PELO CHÃO DA ESCOLA

Na ação que será descrita a seguir, trabalhamos com o caráter educativo de observação participante (INGOLD, 2016), que se constituiu em um convite a manter-se atento ao seu redor e:

[...] acompanhar os demais aonde quer que eles vão. Não importando o que isso implique e para onde o leve [...] É como lançar o barco na direção de um mundo ainda não formado – um mundo no qual as coisas ainda não estão prontas, são sempre insipientes no limiar da emergência contínua. Comandados não pelo dado, mas pelo que está a caminho de sê-lo. [...] (INGOLD, p. 408, 2016).

Uma ação-escuta que certamente nos oportunizou, a não corrermos o risco do absolutismo, e intentarmos direcionar nossas atividades docentes com furor doutrinador, a abolir as próprias organizações sensíveis das pessoas estu-dantes. Atravessamo-nos nesses espaços de ensino-aprendizado e criação com nossos preconceitos e saberes inconclusos, estranhamos a novidade, a chacota, mas na continuidade, conseguimos chegar a outras instâncias de educar e ser educado. Educamo-nos coletivamente em um processo que não se encerrou ali na sala de aula, pois a experiência da docência vem reverberando em nossas ações até os dias de hoje.

Atravessamos encruzilhadas (SIMAS; RUFINO, 2018; MARTINS, 2002) de percepção-ação-criação que foram situadas através de emaranhamentos processuais, os quais proveram subsídios reflexivos no pensar-movimentar em perspectiva de “cruzo”, que, por sua vez, possui estratégias que: “[...] operam esculhambando as normatizações [...]”, e promovem o “[...] tom inacabado, ambivalente, diverso dos conhecimentos existentes [...]”, e como “[...] perspectiva teórico-metodológica assentada nos complexos saberes das macumbas brasileiras [...]” que “[...] busca tencionar as problematizações acerca das justiças cognitivas e sociais.” (SIMAS; RUFINO, 2018, p. 22 a 27).

Cada participante, de discente bolsista do pibid a pessoa estudante do Ensino Médio, posicionou-se, dialogou com suas falas, caminhos, estranha-mentos e modos de movimento, provocando a emergência de outras realidades criativas e incompletas. Estranhamos e nos encontramos criadores em meio às trocas coletivas realizadas.

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Como base para a ação artística e educativa foram consultadas referências de três autoras que propuseram refletir os procedimentos e conteúdos de dança. São elas: Isabel Marques (2012), ao evidenciar a experiência em dança como linguagem, e que esta não deve se limitar apenas ao ensino de repertórios, mas ressalta como é importante desenvolver atividades que provoquem leituras críticas e criações de novas possibilidades nas expressões do dançar; Mara Guerreiro (2008), quando a mesma escreve sobre as formas de improvisação na dança, nos situou a promover um processo demarcado a partir de acordos prévios; e Maria Corvalán (2012), que por sua vez nos ajudou a refletir acerca de nós, pessoas contemporâneas, que em nossa história tivemos/temos relações com a coloni-zação, e de como podemos estar nos espaços de criação com as culturas negras.

Corvalán propôs pensar uma prática pedagógica em dança contra hege-mônica na experiência, assim frente às imposições centralizadas em tom de monocultura aos saberes e subjetividades no corpo, nos conduzindo a pensar uma experiência de tradução a partir das diversidades de conhecimentos possíveis a serem compartilhados. E, em uma criação que esborre também a busca de um lugar comum entre as pessoas estudantes sobre os sentidos expressos, em alte-ridade e sem imposições doutrinais no vivenciar as danças e contos dos orixás.

Nestas feitas, levamos propostas de aulas com a prática de repertórios técnicos de dança afro, laboratórios de experimentação e improvisação com acordos prévios e espaços para discussões com vídeos.

Iniciamos com uma mostra e debate a partir de dois vídeos. O primeiro continha um conto de Omolu, que se passava em uma festa com os demais orixás, e na ocasião Ogum havia preparado uma roupa de palha com fim a esconder as manchas de feridas do corpo de Omolu, podendo, dessa forma, estar presente no festejo. Iansã, com seus ventos, foi a única a dançar com ele, provocando transformações no seu estado físico, bem como na percepção dos demais orixás.

O segundo vídeo mostrava seu Jorge expressando o rapper Negro Drama de Mc Racionais, dramatizando dores e preconceitos lançados às populações negras. Com esses vídeos, procuramos refletir sobre as expressões no corpo marginalizadas pela cultura hegemônica e higienista. Discutimos olhando como a questão do preconceito estrutural em relação às populações negras vem se manifestando no Brasil.

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Dança na Escola

Os espaços para aprendizado dos repertórios foram situados a partir dos arquétipos expressados nas danças de Iemanjá e Iansã, em tons característicos de suas relações com o Orixá Omolu. As expressões seguiram materializadas no ensino e aprendizado, na observância dos movimentos do corpo em metáforas de relações, aproximações e contato com elementos da natureza: a água do mar, a terra e o vento.

Para os momentos recortados do fazer dança com a improvisação, os temas propostos no conto de Omolu foram apresentados a partir do sentido vida e morte, metaforizado nos movimentos de pronação e supinação dos punhos e mãos, provocando relações de imagens com o interior da terra e do sol, visto que estas simbologias se fazem presentes no arquétipo deste Orixá.

O pensar-ser-movimentar em polirritmia corporal também foi outra metáfora (RANGEL, 2015) situada onde as articulações tenderiam a expressar-se em vários tons e texturas de movimento. A relação do corpo ao dançar, com os níveis alto, médio, baixo, e direções do espaço foram lançados nos entremeios dos direcionamentos dos acordos prévios para a improvisação no decorrer do processo.

Conforme as aulas iam sendo realizadas, os repertórios foram sendo repetidos, solicitados em espaço de criação e estruturados em sequências maiores. Assim, as composições foram se organizando a partir de sequências dadas e de células elaboradas pelas próprias pessoas estudantes, com base nas provocações e ignições oriundas da improvisação.

Os laboratórios com a improvisação encaminharam-se para composi-ções individuais, que foram solicitadas e reajustadas no decorrer do processo a partir de compartilhamentos conjuntos entre as pessoas estudantes. Para tal realização, foi solicitado que cada pessoa do grupo escolhesse estruturas de sua própria composição. Em acordo mútuo fariam os ligamentos das expressões, gestualidades e movimentos, tendo as pessoas discentes bolsistas como media-doras e facilitadoras das trocas e desentendimentos emergidos sobre a proposta.

Este processo compositivo passou a ter mais direcionamentos (FOTO 01) por parte dos mediadores (pessoas discentes bolsistas do PIBID e supervisora) presentes nesse atelier criativo. Deste modo, cenas maiores passaram a serem

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estruturadas com base nos temas desenvolvidos e as pessoas estudantes sendo encaradas como intérpretes/criadoras.

FOTO 01 – Criação e direção das composições individuais e coletivas.

FOTO: Genilza dos Santos.

PROJEÇÕES SENTIDAS/PENSADAS A PARTIR DA CRIAÇÃO/EXPERIÊNCIA ARTÍSTICA/PEDAGÓGICA

As pessoas discentes bolsistas passaram a visualizar com mais afeto e proximidade a experiência de ensinar dança na escola e a assumir este ensino fora de determinações higienistas, hegemônicas, doutrinais e castradoras dos aspectos sensíveis das próprias ações culturais das danças das pessoas estudantes.

Os estudos nas obras de Isabel Marques despertaram o entendimento e a necessidade de encaminhar propostas de aulas que possibilitassem a experiência de movimentos objetivos, fixos em repertórios já conhecidos ou não, para além de sua cristalização, levando-os a problematizar criticamente, desestabilizando as formas cristalizadas, comuns e tornadas clichês no fazer dança, somente no

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Dança na Escola

aparato da coreografia pronta e entregue as pessoas estudantes, para os mesmos se apresentarem em datas específicas do calendário escolar (MARQUES, 2012), alimentando fetiches folcloristas.

Desta forma, passaram a compreender que “Os diferentes repertórios de dança são como livros: necessitamos deles para a fruição da arte, para o aprendi-zado, para a produção pessoal e/ou coletiva de novos textos. [...]” (MARQUES, 2012, p. 17). Todavia, propondo processos de leituras e rasuras, trazidos também ao gosto de diferentes estranhamentos, dúvidas e reconhecimento dos elementos da linguagem da dança, para que as pessoas estudantes, ao dançarem, consigam articular fluentemente os deslizes das estruturas repertoriais no espaço, até mesmo além das particularidades de cada dança conhecida, pois ao encontrar a sua maneira de escrita dançante por entre os contornos, ritmos e espaços das temporalidades da presentidade de suas experiências sensíveis, o aluno cria sua dança e cria sentido no dançar (idem).

Nos primeiros momentos de contato, as pessoas estudantes da escola através das nossas solicitações de experiência/criação com temáticas que per-passaram por mitologia afro-brasileira através do mito Omolu, que refletiam sobre pertencer a uma população negra no estado de Sergipe, exclusão social, econômica e cultural, frente a ações euro centradas. Nesse entrelaçamento houve muita tensão, estranhamentos, recusa, medo, olhares vagando pelo espaço da sala, risos, cochichos, expressões corporais de não compreensão e também falas que projetavam reclamações de que não conheciam as lendas dos orixás, de que não gostavam e não sabiam criar e de que aula de dança era dançar e não ficar debatendo assuntos chatos que a sociologia já fazia.

As pessoas bolsistas pibidianas também sentiram medo do como fazer e de como reverter a situação. Algumas acharam a temática perigosa e não apro-priada para o espaço escolar, uns por conta de seus credos religiosos, outros por medo de como a comunidade escolar como um todo receberia tal trabalho, pois a entendiam como um lugar normativo, de ideologia conservadora, moralizadora.

Frente às tensões e dificuldades, enquanto coordenadora do subprojeto Dança/PIBID, senti a necessidade de proporcionar mais leituras sobre processos de criação em dança, a partir das danças e manifestações populares brasileiras, para isso dialogamos com os textos de Graziela Rodrigues (1997), Lara Rodri-

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gues (2007) e Inaicyra Falcão (2206), bem como intensivamos os laboratórios de pesquisa de movimento e criação, orientados por estas autoras, assim como também os textos de Isabel Marques.

À medida que as pessoas discentes bolsistas iam lendo e experimen-tando os textos da dança, elas passavam a criar proposições de aulas com mais segurança, mesmo reconhecendo que o roteiro muitas vezes era reajustado de acordo com os acontecimentos por vezes não pensado.

Por meio de muitos diálogos e estratégias diferenciadas para convidar as pessoas estudantes a se aventurarem em uma experiência artística, logo uma experiência estética diferente do que eles já haviam vivenciado, e acima de tudo uma experiência ética, visto que a todo instante era dito que estávamos desen-volvendo um trabalho de arte e não uma doutrinação religiosa, respeitando o tempo deles e o desejo de participarem ou não, as pessoas bolsistas aos poucos foram adentrando a bolha de experiências diárias das pessoas estudantes com a dança, como desbravadores, corpos estranhos que propunham fazeres no dançar além da premissa de repertórios dados, prontos. Pois comumente as experiências dançadas de muitos deles eram recorrentes de vídeos produzidos e lançados nos diversos canais do youtube. Foi dito por outros professores da casa que a experiência de montagem de coreografias desenvolvidas na escola partia quase sempre da cópia de movimentos destas mídias virtuais.

Não estamos querendo dizer que esse modo de aproximação com a experiência artística seja errado ou inválido, mas acreditamos que, se o mesmo for conduzido de uma maneira que não situe o lugar de invenção, acabaremos por criar possivelmente clichês e prisões a uma forma única, perfeita e digna de ser dançada, podendo ser tomada como referência para o fazer artístico no cotidiano escolar.

Posto isto, é importante dizer que a empreitada foi desafiadora e arris-cada para as pessoas discentes bolsistas, que estavam iniciando no exercício da docência e, junto a isso, no exercício da arte, da criação artística, o que tornou duplamente desafiador, dando aos mesmos uma certa insegurança, pois tinham a ideia de onde partiriam, mas não sabiam no que esta ação poderia resultar, ou seja, onde chegariam. Outro agravante era o fato de alguns bolsistas terem

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Dança na Escola

apenas a experiência da dança a partir de repertórios prontos e coreografias dadas, assim, a experiência era a do comando e a de reproduzir padrões engessados.

Desafiadora para as pessoas estudantes, visto que os mesmos precisaram se permitir, se arriscar por caminhos incertos, onde várias vezes foram solicitados a compor suas próprias partituras.

Temos refletido que estas projeções, quando não utilizadas para ampliar o repertório e a capacidade de engenhosidade no acontecimento, estabelecer-se-ão certamente uma verdade de movimento, único, acabado, o correto, certo a se fazer, a ser organizado para ser bonito ao dançar, esbarrando no que é considerado como subalternização de outros, como estranhos, vulgares, feios e baixos, em um ideal circunscrito de polos binários.

Dialogamos nesse aspecto com Vilene Moehlecke e Tânia Fonseca, no texto em que propõem conhecimento sobre o corpo que dança, indicando duas “imagens do tempo”, estabelecendo pensar coexistência entre as duas: “imagem-tempo” e “imagem-movimento”, e propõe perceber e subsidiar na experiência do ensino a quebra linear da segunda, entendendo-a como início e multiplicidade de uma experiência de movimentar que cresce aberta a tempo-ralidades de sentidos outros. Assim:

[...] se quebrar para deixar surgir outro tipo de imagem, uma imagem ótico-sonora, que faz surgir ‘a coisa’, em seu excesso de horror ou de beleza, nem boa, nem má – a imagem-tempo – que produz uma quebra da imagem--clichê. Assim, a imagem não é mais somente sensório motora, mas também ótica e sonora, investida pelos sentidos. (MOEHLECKE; FONSECA, 2005, p. 51)

A experiência do movimento nessa perspectiva transborda maneiras de perceber-nos e de estruturar-nos na experiência de movimentos já consolida-dos em uma textura expressiva e estética, no caso específico do evento ao qual situamos neste texto, a respeito das danças e mitos dos orixás.

Partimos do fazer que exprimia a realidade consolidada desses reper-tórios e espalhamo-nos por outras possibilidades que os mesmos poderiam ter de organização/desorganização para outras estruturas expressivas no espaço/tempo das composições. Lugares de escutas e visualidades táteis, projetadas em uma complexa sensibilidade do imaginário corporal. Para além de uma criação/

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representação perfeita da realidade, buscamos no simbolismo a intenção de ir além da realidade posta, a intenção era provocar para além do que estava dado.

O próprio viver dessa dança (FOTO 02), acreditamos que tenha se con-figurado no entendimento das pessoas estudantes, como um lugar de experiência desorganizada, perante as percepções sobre o belo, sobre o certo e ajustado, causando certos incômodos por se tratar de fragmentos de um contexto das crenças afro-diaspórica. Cientes de que praticamente todo esse repertório da cultura negra tornou-se invisível, demonizado, até mesmo apagado das ações/pensamentos/maneiras de nos percebermos nos trajetos organizativos socio-culturais nas estradas de nossas vidas como brasileiros.

FOTO 02 – Apresentação de Omolu no pátio da escola.

FOTO: Jussara Tavares.

Esse fator também pôde refletir a condição projetada para o nosso corpo e caminhos da sensibilidade, em nossas diferenças, constantemente sufocadas em detrimentos de verdades hegemônicas que nos higienizam, dizendo o que pode e deve ser realizado, usando o crivo do certo, bom e bonito, simétrico.

É preciso em caráter:

[...] urgente, ante todo, reconhecer nossa condição de ine-xistentes, e entender que essa invisibilidade é produzida pela cultura hegemônica ocidental, a qual só legitima as monoculturas que cabem no seu raciocínio. É a partir de

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Dança na Escola

reconhecermo-nos colonizados, de registrar o sentimento de incompletude que nos incomoda e da vontade de transformá-lo, que podemos estabelecer um diálogo de reciprocidade com uma outra cultura não hegemônica. (CORVALÁN, 2012, p. 12)

Boaventura Souza Santos (2002) propõe pensar uma emergência para o alargamento das experiências presentes e ampliar as possibilidades de existências, tornando a emergir outros modos organizativos e descentralizados dos sentidos unilaterais, do quê e de como pode existir, o que ele vai chamar de “tradução cosmopolita”, entendendo-a como um procedimento que expressa no seu desenrolar a juntura de diferentes saberes, recriando possibilidades no percurso.

Para Souza Santos (2002), a razão cosmopolita propõe construir zonas de contacto, que se definem como campos sociais onde se encontram, chocam e interagem diferentes práticas e conhecimentos.

Zonas de contacto são campos sociais onde diferentes mundos- da-vida normativos, práticas e conhecimentos se encontram, chocam e interagem. As duas zonas constitu-tivas da modernidade ocidental são a zona epistemológica, onde se confrontam a ciência moderna e o saber ordinário, e a zona colonial, onde se defronta o colonizador e o colonizado (SOUZA SANTOS, 2002, p. 268).

Nesse sentido, a dança vem a se configurar como esta zona de con-tato recortado para a ocasião, pois o processo veio em cruzamento (SIMAS e RUFINO, 2018) com os fatores vividos em nossos tempos contemporâneos, trazendo para o chão da sala dessa escola os gostos, cheiros e memórias do corpo, dos próprios saberes assumidos, reconhecidos ou não, como mediadores. Lá também adentramos repletos de preconceitos, estranhando os temas, as recepções do vivido no processo.

Mas devemos estar cientes de nossas potencialidades pulsantes, de ser-mos possíveis a existirmos em multiplicidades com nossos modos de dançar e se organizar na vida. E tendo a sala de aula como lugar de relações cruzadas pelo encontro, percebemos então a encruzilhada, pois, como travessia que são incertas, mas existem na emergência do encontro e fricção dos seus caminhos, assim lugares reconhecidos com “potência de mundo” (SIMAS; RUFINO, 2018, p. 18-24) em que a vida continua, e se recria a medida das tensões e colisões.

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E também como frisa Leda Maria Martins, como o “[...] lugar sagrado das intermediações entre sistemas e instâncias de conhecimentos diversos [...]” (MARTINS, 2002, p. 73). Permitindo entendermos como processos que ocorrem espiralados entre as “linhas” que se cruzam, nesse caso nosso, traduzindo para as respectivas subjetividades que se friccionaram nos processos de criação do Pibid Dança/UFS.

Encantemos, pois nossos trajetos com os ventos, mares e terras, Iemanjá e Iansã se aproximaram de Omolu (FOTO 03) e o viu com validez, como possibilidade de existência, com sua condição de corpo, que até então vivia sub-jugado, escondido e condenado por outros olhares, o percebiam como inválido, tornando-o inseguro e desamparado. Quantas possibilidades corporais de ser, estar e de se organizar em nós têm sido sufocadas por conta das alastradas pri-sões cognitivas históricas dos interditos morais causados pelo universalismo do pensamento ocidental inteligível? Seria neste caso, Iemanjá e Iansã, educadoras que encontraram naquele que estava condenado à exclusão por não ser um igual às potencializadoras de descoberta de um ser outro?

FOTO 03 – Tronco de árvore, raízes e terra. Omolu – Encerramento da dança.

FOTO: Jussara Tavares.

Aprendemos, pois, nesse percurso, sobre a necessidade de escutar as nossas diferenças, que não são estanques, mas sempre emergentes com o viver/dançar. Iniciamos o aprendizado de encantar (SIMAS e RUFINO, 2018) nossos

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Dança na Escola

saberes como novas possibilidades a partir do encontro, abrindo-nos a valores plurais dos movimentos expressados.

Instruirmo-nos a descentrar o olhar para o saber que diz que devemos apenas estruturar as relações dançadas da verdade de quem conduz a criação. Ao nos lançarmos no cruzamento das tensões e ao dito como erro no percurso desses caminhos, houve um olhar de reconhecimento, e o que se apresentou a priori como erro passa a se configurar como possibilidades de existir paradoxalmente, deslocando os sentidos binários do dançar/existir em bom/mau, certo/errado.

CONCLUSÃO (AMARRANDO PARA DESATAR)

Que deixemos as possibilidades sensíveis tocar os (des)limites de nossas peles, mobilizando-nos a outras passadas circulares, desejantes de movimentos, fecundos de vida, memórias dançadas, cruzando-as com os ideais postulados como inacabados, errantes, e após, na realidade de cada singularidade vivida, podermos ou não estar aproximados de pertencimentos a tantas outras texturas possíveis de organização.

Estejamos transbordantes de afetos ao entrarmos nas escolas, para que no percurso da docência encaremos a multiplicidade de experiências dançadas como prioridade. Trazendo diversas culturas de movimentos dos diferentes tipos de danças e costumes, pois não queremos anular nenhuma outra possibilidade de existência já consolidada e, desse modo, também não queremos nossas liber-dades prejudicadas por juízos alheios que atormentam nossos gritos subjetivos.

Que no exercício da vida e da profissão, como lugares interconecta-dos, nós, pessoas estudantes do ensino médio, discentes bolsistas do pibid e docentes supervisores, aprendamos no encontro não só com os nossos iguais e conhecidos saberes, mas também com os diferentes e desconhecidos de nossas relações. A vida é uma travessia muito grande, de muitos caminhos e histórias de vida cruzadas, e mesmo com todos os nossos choques e atritos na experiência, acreditamos que é possível não nos subjugarmos ao crivo de experiência total, acabada. Reconheçamos por gentileza as nossas subjetividades, que inconclusas e inacabadas, possamos viver a vida e nossas relações dançadas.

Concluímos dizendo que pensar as criações nas próprias sutilezas do ato de criar das pessoas estudantes se fazem necessárias, e nesse processo pro-

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curamos a sensibilidade como mola propulsora na aproximação de elementos da natureza e dos mitos dos Orixás, com objetivo de criar proximidade com o cotidiano. Por fim, a experiência suscitou um melhor entendimento de como tratar as diferenças socioculturais através da dança e de como pensar os espaços de criação nas escolas públicas.

REFERÊNCIA

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FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

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FALCÃO, Inaicyra. Corpo e Ancestralidade: uma proposta pluricultural de dança arte-educação. São Paulo: Terceira Margem, 2006.

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MARTINS, Leda Maria. Performances do Tempo Espiralar. In: G. Ravetti e M. Arbex (Org.) Performance, exílio, fronteiras: errâncias territoriais e textuais. Belo Horizonte: Faculdade de Letras da UFMG, 2002. p. 69-91.

MARQUES, Isabel. Linguagem da dança: arte e ensino. Salto para o Futuro, Ano XXII, Boletim 2, abril, 2012.

PRANDI, Reginaldo. Mitologia dos orixás. São Paulo: Cia. das Letras, 2000

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RODRIGUES, Graziela. Bailarino-Pesquisador-Intéprete: processo de criação. Rio de Janeiro: Funarte, 1997.

RODRIGUES, Lara. O Jogo da Construção Poética: processo criativo em dança. 2007. Tese (Doutorado em Artes) – Instituto de Artes, Universidade Estadual de Campinas, São Paulo.

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Dança na Escola

SANTOS, Boaventura. de Souza. Para uma Sociologia das ausências e uma sociologia das emergências. Revista Crítica de Ciências Sociais, n. 63, outubro, 2002. p. 237-238.

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PEREIRA, Luiz Carlos. Lenda de Omulu/Obaluayê. 2017. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=WDGcdk9vTnw> Acesso em 10/01/201

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AS BATALHAS DE HIP-HOP: CONTRIBUIÇÕES PARA A MANIFESTAÇÃO CRIATIVA DE ALUNOS E ALUNAS

Marília Camargo Araújo

PALAVRAS INICIAIS

Este texto tem como tema central a dança dentro da cultura hip-hop, compreendendo seu papel nessa cultura urbana e refletindo as possibilidades criativas que ela nos oferece.

A expressão HIP-HOP foi criada entre os anos 1960 e 1970 pelo DJ Afrika Bambaataa para representar os encontros dos jovens no bairro do Bronx em Nova Iorque. Em uma tradução literal, significa movimentar os quadris (to hip) e saltar (to hop).

É comum, ao se falar em hip-hop, a formação de variados discursos relacionando essa manifestação exclusivamente com a periferia, visto que his-toricamente o hip-hop nasce como uma cultura de rua.

No entanto, é preciso compreender o hip-hop como um conjunto de manifestações culturais presentes em todas as esferas da sociedade. Manifestações essas que têm um estilo musical próprio – o rap – e são formadas por quatro elementos: o DJ (operador dos discos que faz as bases das músicas sobre as quais os outros elementos interagem); o MC, o porta-voz das festas, aquele que canta as músicas, em geral marcadas por muitas rimas, que relatam os problemas, as carências e experiências da sociedade; o Grafite, uma expressão plástica; e o Break, elemento das manifestações de dança.

No Brasil, a cultura hip-hop foi adotada inicialmente pelos jovens negros e pobres de grandes cidades, com predomínio inicial em São Paulo. Espalhou-se pelo país com forte influência da mídia e das academias de dança, e hoje representa boa parte da cultura dos jovens brasileiros.

O modo de vestir, de falar, de dançar e de se expressar representa boa parte da cultura jovem, rompendo com a barreira exclusiva da periferia. Em

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Dança na Escola

nossas experiências como professora, é possível perceber um grande interesse pelas danças da cultura hip-hop e grande aceitação desta temática pelos alunos.

Nas aulas de Educação Física, a dança tem como característica a manifestação da cultura corporal, tematizando, refletindo e ampliando a comunicação corporal, para além dos movimentos reproduzidos pela mídia. É nesse contexto que o trabalho com a criatividade e a liberdade de expressão emerge, tendo as batalhas de hip-hop como alicerce para as aulas.

A ideia das batalhas de hip-hop surge como uma alternativa para a expressão dos alunos, sem a rigorosidade e padronização de movimentos. O foco está na improvisação, permitindo que aluno e aluna explorem suas possibilidades, respeitando suas experiências, assim, dando lugar à criatividade.

Neste momento, algumas questões impulsionaram para o início deste trabalho e serviram como delineadores do estudo: Quais os caminhos do hip--hop até sua presença na cultura nacional? Como trabalhar com as danças da cultura hip-hop? Quais as características dessas danças? Como contribuem para a criatividade?

A partir dessas indagações, nas seções seguintes, esses questionamentos serão esclarecidos com fundamentação, porque este estudo tem como objetivo principal apresentar as batalhas de hip-hop como possibilidade de manifes-tação criativa e expressiva do alunado. Objetiva-se esclarecer a relação entre o hip-hop e a cultura dos jovens brasileiros, apresentar alguns dos estilos de dança na cultura hip-hop e apresentar sugestões para a ação pedagógica com esta temática na escola.

CONHECENDO O HIP-HOP E SUAS CONTRIBUIÇÕES

A história do hip-hop: de Nova Iorque para o currículo nacional brasileiro

A definição conceitual do hip-hop, sua história e suas características não são unanimidade entre os autores. Encontramos na literatura divergência de datas e de linhas de pensamento, mas possuem como eixo comum a ideia de movimento social e de cultura.

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Nascido no bairro do Bronx, no fim da década de 1960, o hip-hop representava o encontro dos jovens negros nas ruas dos subúrbios americanos.

Chamados de guetos, esses subúrbios conviviam com diversos problemas de ordem social, com grande destaque para a violência, a pobreza, o tráfico de drogas e o racismo, e como consequência, havia uma grande carência de educação. A rua representava o único espaço de lazer e cultura para os jovens. Muitas gangues começaram a aparecer nesse período, e acabavam confrontan-do-se pela disputa do território em um sistema violento e opressor dentro da própria periferia.

Nesse contexto, o hip-hop, em seu surgimento, tinha como iniciativa o protesto contra a pobreza, o preconceito e a violência, refletindo sobre a realidade imposta e criando meios de transformá-la.

Esse movimento social seria conduzido por uma ideologia (ou pelo menos por certos parâmetros ideológicos) de autovalorização da juventude de ascendência negra, por meio da recusa consciente de certos estigmas (violência, marginalidade) associados a essa juventude, imersa em uma situação de exclusão econômica, educacional e racial. (ROCHA; DOMENICH; CASSEANO, 2001, p. 18).

Diversas festas, chamadas de block party (arrasa-quarteirão), com potentes caixas de som espalhadas pelo bairro, e com grande destaque para a música, eram realizadas a fim de suprir a carência de diversão, negligenciada a essa população pelo poder público (YOSHINAGA, 2014). O improviso das músicas faz surgir uma nova linguagem musical, um novo estilo de dança e novos personagens.

[...] originalmente, o hip-hop é um conjunto de manifes-tações culturais: um estilo musical, o rap; uma maneira de apresentar essa música em shows e bailes que envolve um DJ e um MC; uma dança, o break; e uma forma de expressão plástica, o grafite. (ROCHA; DOMENICH; CASSEANO, 2001, p. 19).

A união dessas manifestações representa a cultura hip-hop – cujo termo foi criado pelo DJ Afrika Bambaataa, conforme salientado, significando mexer os quadris (to hip) e saltar (to hop), que era uma alusão aos movimentos de dança da época – a fim de marcar o que eram as festas no Bronx. Não há unanimidade

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Dança na Escola

na literatura quanto ao ano de criação dessa expressão, que flutua entre os anos 1960 e 1970.

Atualmente, essas manifestações são chamadas de elementos, que inte-ragem e formam a cultura hip-hop. Há duas versões sobre os elementos que constituem o hip-hop, sendo a mais difundida entre os autores, a que divide o hip-hop em quatro (ÁVILA, OLIVEIRA; PEREIRA, 2005; COSTA, 2005; LAKKA, 2013; OLIVEIRA, 2006; VIEIRA, 2015), baseando-se nos praticantes dessa cultura: DJ, MC, Grafite e Break.

O primeiro elemento é o responsável por comandar a música das festas. O DJ, que em uma tradução literal significa disc jockey, é o responsável pela operação manual nos discos como se eles fossem instrumentos musicais.

Um dos primeiros DJ de destaque foi Kool Herc, entre as décadas de 1960 e 1970, que não se limitava a reproduzir as músicas nos toca-discos; começou a usar aparelhos de mixagem para construir arranjos. Ele foi o precursor de várias técnicas de discotecagem conhecidas atualmente (VIANNA JÚNIOR, 1987; YOSHINAGA, 2014).

Também era missão do DJ animar e entreter o público, interagindo com as pessoas de maneira descontraída, e paulatinamente surgiu a ideia de fazer rimas sobre as músicas que eram tocadas (OLIVEIRA, 2006; YOSHINAGA, 2014).

Com o crescimento das festas e do número de participantes, os DJ come-çaram a entregar o microfone na mão de outras pessoas, para que elas pudessem ficar o tempo todo animando as pessoas na festa. Surge, então, o segundo ele-mento da cultura hip-hop, o MC (master of ceremonies, mestre de cerimônias).

O MC é o porta-voz do hip-hop, e mais do que fazer rimas e entreter o público, há de se salientar que sua missão é apresentar a realidade (princi-palmente da periferia, composta por miséria e violência), contar a história das lutas de classes e estabelecer uma crítica social.

Grandmaster Flash, Kool Herc e Bambaataa faziam o papel de apresentadores ou de mestres-de-cerimônias nas festas, entregando o microfone aos dançarinos para que esses pudessem improvisar letras no ritmo do break. Nasciam, assim, os primeiros MCs. Além das técnicas de discotecagem, composição, vocais e dança, iam sur-gindo nas letras as temáticas e as idéias do hip-hop: o

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estímulo à auto-estima da juventude negra, a denúncia de sua exclusão cultural e econômica do mundo branco, a necessidade de transformar sua própria realidade por meio da conscientização coletiva. (ROCHA; DOME-NICH; CASSEANO, 2001, p. 128).

Com o passar dos anos, muitos MC foram surgindo, e as letras de improviso começaram a ser decoradas, ensaiadas e gravadas em discos e juntos. DJ e MC representam a música Rap (ritmy and poetry – ritmo e poesia), que, aos poucos, se tornou o gênero musical mais rentável da indústria fonográfica norte-americana (YOSHINAGA, 2014).

O grafite representa o elemento ligado às artes plásticas e surge como mais uma maneira de os jovens da periferia se expressarem. “Os Grafites cons-tituíram-se em demarcações de territórios dos membros de gangues rivais, em formas, primeiramente, de Tags (assinaturas) que aos poucos foram se transformando em uma forma de expressão artística.” (VALDERRAMAS; HUNGER, 2009, p. 518).

Nas batidas das músicas “discotecadas”, surgiu um estilo de dança em que se misturavam elementos do soul e do funk (ritmos populares da época) com elementos das ginásticas e das artes marciais (forte influência do kung fu), em que os dançarinos pareciam “quebrar” o corpo, contorcendo-se, saltando e se movimentando ao ritmo que era produzido. Surge, assim, a dança breaking: “O nome da nova dança faz menção às batidas quebradas (‘breakbeats’) que eram manipuladas pelos primeiros DJs da emergente cultura hip-hop nos EUA.” (YOSHINAGA, 2014, p. 167).

Simultâneo à breaking, outras danças começaram a surgir, incorporando passos para representar, por meio da dança, uma crítica à hegemonia de uma cultura branca excludente, como hause dance, krumping, locking, popping entre outras. Todas essas danças são chamadas estilos do elemento break e atualmente constituem o rol das danças urbanas.

Não se confunda o elemento BREAK (elemento da dança do hip-hop) com a dança breaking (detalharemos sobre essa dança na seção 2.2).

É preciso ter conhecimento dos elementos do hip-hop para não cometer o equívoco de associar essa cultura a uma determinada dança ou música. O hip-hop não é só uma dança, não é só uma música e não é só uma forma de se

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Dança na Escola

vestir. Nós não dizemos vamos dançar hip-hop, mas sim vamos dançar breaking, ou popping, etc. Não dizemos vamos ouvir hip-hop, mas sim ouvir rap.

Em pouco tempo, os elementos começaram a se expandir nos Estados Unidos. A música rap começou a conquistar novos admiradores e espaços de divulgação na mídia, assim como a dança começou a ter destaque em videoclipes e alguns filmes: o cantor Michael Jackson (com o disco Thriller, 1982) e os filmes Wild style (1982), Flashdance (1983), Breakdance (1984) e Beat Street (1984) são tidos como clássicos precursores de sua cultura pelo mundo.

Com forte influência da mídia, rapidamente essa cultura se espalhou por todos os continentes. Aquele hip-hop que surge como um movimento cultural para a emancipação do negro americano na sociedade faz-se presente, hoje, em todos os lugares do mundo, incluindo o Brasil.

O hip-hop chega ao Brasil por meio da dança, e o b-boy (nome dado ao dançarino de breaking) Nelson Triunfo é um dos responsáveis por difundi-lo no país. “Ele inventava passos, girava e se contorcia todo, como alguns anos mais tarde, no começo dos anos 80, quando levou às ruas do Brasil – mais precisa-mente para São Paulo – o break.” (ROCHA; DOMENICH; CASSEANO, 2001, p. 46).

Segundo Rocha, Domenich e Casseano (2001), o hip-hop no Brasil não se desenvolveu com facilidade, em especial na cidade de São Paulo. No seu livro intitulado Hip hop: a periferia grita, podemos ler vários relatos de dançarinos, cantores e artistas que afirmam que o hip-hop foi marginalizado, os praticantes eram perseguidos por policiais e o break foi proibido de ser dançado em algumas festas e bailes da época.

Nelson Triunfo, com outros garotos, começou a dançar nas ruas do centro de São Paulo movido exclusivamente pelo prazer da dança. Aos poucos, a roda de dança começou a crescer, e os outros elementos da cultura hip-hop começaram a ser incorporados.

Na Estação São Bento, eram encontrados os melhores dançarinos de breaking, e àquela altura, em meados da década de 1980, os dançarinos e cantores já tinham conseguido a atenção da mídia brasileira.

No Rio de Janeiro, no fim da década de 1980, o hip-hop já era tão popular a ponto de os programas de rádio destinados às músicas dessa cultura ficarem

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em primeiro lugar em audiência (VIANNA JÚNIOR, 1987). No Brasil, hoje, o hip-hop é uma manifestação cultural presente em todas as cidades, não pode mais ser ignorada.

O hip-hop nasce como uma cultura de rua e continua presente na cena urbana. Atualmente, o modo de vida dos jovens, nas metrópoles, evidencia essa presença, pois se produz música, dança, gíria e gestualidade (OLIVEIRA, BATISTA; MEDEIROS, 2014; SILVA, 2011).

Para Alves e Dias (2004, p. 6): “Nos esbarramos com seus signos, em nossa própria família, nas esquinas das ruas e nas mídias e de uma forma ou de outra entramos em contato com esta manifestação juvenil.”

Correia, Silva e Ferreira (2017) afirmam que o modo de vida dos jovens hoje, nas metrópoles, evidencia a presença de danças da cultura urbana, onde o hip-hop desponta. Chultz (2016, p. 79) identificou nos alunos traços da cultura hip-hop “pelo gosto musical, pela forma de vestir, de andar e, até mesmo, pela apropriação do ato de grafitar muros e paredes da escola”.

Também observamos características desse movimento em filmes, repor-tagens e comerciais. Nessa evolução os jovens do hip-hop começaram a dançar não mais em espaços da periferia, em guetos, mas nos centros urbanos de lazer e cultura.

A partir desse ponto, a dança foi assumindo uma estrutura coreografada, chegando às academias e escolas profissionais de dança.

Este movimento ficou conhecido, por muitos, como Street Dance, uma referência aos estilos e gestos rítmicos advindos dos Estados Unidos. O estilo Hip-Hop de dançar passou a ser também um produto de mercado funcionando aos modos da clientela fitness. É preciso reconhecer que o Street Dance alcança um âmbito muito grande no espaço urbano. Jovens de toda a cidade, de todas as faixas etárias e de todas as classes sociais, experimentam a rebeldia da dança Break através do Street Dance. A via de acesso da cidade a esta arte é o ambiente particular das academias. Portanto, a cidade foi se apropriando da cultura Hip-Hop tornando-a um bem de consumo. (ALVES; DIAS, 2004, p. 6).

A expressão Dança de rua ficou muito popular no país. “Como o Street Dance é uma variação do Break adaptada para fins de comercialização, este cria

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Dança na Escola

suas próprias técnicas, diferenciando-se cada vez mais de seu ‘irmão mais velho’; isso ajuda a criar duas modalidades distintas de dança.” (COSTA, 2005, p. 93). O autor acredita que o termo está ligado à vinculação midiática.

Não há muita bibliografia sobre isso, mas segundo Torres (2015) – ao entrevistar grandes nomes da dança do hip-hop no Brasil – e Lauxen e Isse (2009), o termo street dance foi criado para reunir em um só nome os variados estilos de dança vindos dessa cultura urbana, porém, ao traduzir para “Dança de rua”, houve uma conotação pejorativa (preconceituosa) com relação à cultura hip-hop em decorrência da palavra “rua”.

Distorcendo seus significados, à rua eram atribuídas ações do homem ligadas à marginalidade, violência, mediocridade e miséria. Sendo assim, o termo hoje aceito é DANÇAS URBANAS, pois representa as danças que são originárias do meio urbano, das grandes cidades (TORRES, 2015).

O termo Danças Urbanas é um nome dado a um conjunto de danças oriundas dos grandes centros urbanos, assim como usamos a expressão “Dança de salão” para nos referir a um conjunto de outras danças (VALDERRAMAS; HUNGER, 2009). Esse é um termo criado para diferenciar essas danças das danças clássicas e engloba vários estilos, incluindo todas as danças originárias da cultura hip-hop.

Encontramos na Base Nacional Comum Curricular (BNCC) o objeto do conhecimento Danças Urbanas nas aulas de Educação Física para alunos do 6.º e 7.º ano do ensino fundamental, consolidando então as danças da cultura hip-hop como parte da cultura nacional, visto dentre as competências gerais da BNCC encontrarmos: 1. “Valorizar e utilizar os conhecimentos historicamente construídos sobre o mundo físico, social, cultural [...]. 3. Valorizar e fruir as diversas manifestações artísticas e culturais [...]. 6. Valorizar a diversidade de saberes e vivências culturais.” (BRASIL, 2018, p. 9).

Possibilidades para o hip-hop na escola: explorando as diversas danças

Dançar é uma das mais antigas manifestações humanas: é forma de comunicação (a linguagem corporal) e é linguagem social que possibilita a expressão dos sentimentos, das emoções e dos hábitos e costumes dos povos. A

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dança manifesta a cultura corporal e as danças da cultura hip-hop representam os diversos aspectos da vida da sociedade.

A primeira dança a surgir foi o breaking, como destacamos no item anterior, no entanto, hoje encontramos muitos outros estilos na cultura hip--hop. Nesta seção discorreremos com mais detalhes sobre o breaking e sobre os outros estilos mais famosos (o freestyle, o locking e o popping) as características e peculiaridades dessas danças, iniciando sugestões para a ação pedagógica.

A palavra break, em uma tradução literal, significa “quebrar”, é o ele-mento correspondente à dança do hip-hop e faz alusão ao estilo de dança mais antigo: o breaking.

Segundo Alves (2007): “O termo ‘breaker’ é muito usado neste mesmo sentido para designar o dançarino da Break Dance que, em última análise, é o dançarino da cultura Hip-Hop.” (ALVES, 2007, p. 25). Contudo, a nomencla-tura mais utilizada para se referir ao dançarino é bboy (breaking boy) ou bgirl (breaking girl), visto que são dançarinos que dançam na “quebrada” (break) ou batida da música.

A dança break é a dança mais tradicional do hip-hop e tem como grande característica os movimentos no plano baixo (no chão). Alguns dos seus movi-mentos são: top rock, up rock e foot work, freeze, boogaloo (giro de costas ou back spin), e power movies (movimentos ginásticos como: flair, moinho de vento, giro de cabeça).

Com grande influência das artes marciais, os movimentos acima descri-tos formam três fundamentos básicos: 1- Top Rock (preparação); 2- Foot Work (trançado de pés, girando o corpo no chão e apoiado nos braços); 3- Freeze (congelamento, finalização).

O breaker inicia sua dança com o estilo top rock, saltitando de pé em todas as direções, em seguida, mantendo o mesmo estilo, o b. boy vai se agachando (passando pelo up rock) até transferir o estilo para o foot work que é um sapateado feito em quadrupedia, com os joelhos e quadril flexionado, variando intensamente as posições de frente e de costas para o chão, girando o corpo no apoio alter-nado de braços e pernas no chão. (ALVES, 2007, p. 28).

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Dança na Escola

O freeze é um movimento estático, normalmente é a finalização da série de movimentos, em que o dançarino congela a sua dança em uma pose, como se fosse tirar uma foto.

Os freezes podem ocorrer em todos os níveis (alto, médio e baixo), mas geralmente em nível baixo, muito próximo ao chão, e associado a algum funda-mento ginástico, como vela, parada de mão, parada de cabeça e ponte.

Convém lembrar que é preciso observar a fluência da música para realizar os movimentos. Ao seguir a pulsação da música, em determinados momentos, a dança será contínua e em outros, a dança será mais travada.

Sobre o popping, Alves (2007, p. 30) explica que é “uma maneira de dançar, na qual o dançarino, também conhecido como poper, vai dando ‘trancos’ no corpo como se estivesse endurecendo todos os nervos e articulações”. Ela também pode ser chamada de boogie.

O popping, que surgiu no início dos anos 1970, é uma evolução da dança robô (ou robot, que era a cópia dos movimentos mecânicos de um robô), porém esse estilo se tornou mais completo, na qual o dançarino pode-se utilizar de movimentos de ilusão, slow (lentos), clown (palhaços) e outros mais.

No entanto é sempre importante manter a característica de trancos com o corpo, como se estivesse imitando um robô. O dançarino também utiliza waves (ondas) e slides (deslizes) para compor a sua apresentação, sendo esses os movimentos mais populares. “A onda é como se fosse um impulso elétrico percorrendo o corpo de articulação em articulação. Os trancos são os cortes bruscos nesta onda elétrica em curso.” (ALVES, 2007, p. 30).

Do popping, surgiu o passo moonwalk, nomeado assim por Michael Jackson, mas, na verdade, esse passo originalmente se chama back-slide (deslizar para trás), porque o moonwalk significa deslizar para a frente. Nesse passo o dançarino desliza para trás enquanto simula caminhar para a frente. Michael Jackson contribuiu para popularizar o movimento, o que ajudou a desenvolver esse estilo de dança.

Outra dança característica do hip-hop é o locking, que surgiu no fim dos anos 1960, sendo um dos estilos pioneiros na cultura hip-hop.

A dança lockin’g é a dança do locker. Surgiu em Los Angeles por uma equipe chamada ‘The Lockers’, que

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influenciou o estilo de vários artistas norte-americanos, entre eles, Madona e Michel Jackson. O lockin’g permite uma série de seqüências de movimentos coreografados, geralmente dançados em duplas ou grupos maiores. Esta dança é caracterizada pela intensa ação dos braços, mãos e dedos que trabalham em vários planos num gesto de apontar. (ALVES, 2007, p. 30).

Os movimentos característicos do locking são os giros de punho, antebraço e braço, em várias direções. Em geral, as danças são bastante cômicas. Mímicas, apontar para direções diversas sem nenhum motivo e movimentos engraçados compõem o locking. É uma dança muito divertida, como representa um de seus movimentos, denominado Funk chicken (funk da galinha).

Juntas, breaking, locking e popping, são consideradas as danças mais tradicionais da cultura hip-hop. Cada estilo de dança tem sua qualidade e características, e a união de todos os estilos oferecendo liberdade na mistura de movimentos chamamos de freestyle. Sobre tal, Vieira (2015) afirma que a origem desse estilo de dança está na mistura de passos que os dançarinos faziam para performar em festas e eventos.

Em uma tradução literal, Free style significa estilo livre. Nele é possível criar e misturar todos os estilos do hip-hop em uma sequência coreográfica; é o estilo responsável pela maior liberdade de expressão, podendo ter inspirações nos mais diversos estilos de dança, pois todo movimento é válido. Além disso, no Free style, não é necessário se limitar a dançar na batida (ou quebrada) da música, mas sim utilizar os vocais e instrumentais das canções.

Este se caracteriza como um momento de criação em que cada participante entra na roda para apresentar a sua dança mediante a diversidade de gestos constituída no universo do Hip-hop, uma oportunidade de re-sig-nificar os gestos que vivenciaram nos desafios. Vão se constituindo novos desafios nas relações que estabelecem, um desafia o outro com repertórios motores próprios, um momento de participação livre e espontânea. (OLI-VEIRA; BATISTA; MEDEIROS, 2014, p. 184)

O Freestyle também apresenta características: os passos sociais. Passos sociais podem ser conceituados como gestos básicos que definem um ritmo. Por esses passos, as pessoas conseguem visualizar claramente o ritmo que se

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Dança na Escola

dança. Em uma situação de cotidiano, ausente de uma apresentação ensaiada em grupo, por exemplo, em uma festa, os dançarinos utilizam-se desses passos para se expressarem.

Em grande maioria, esses passos constroem‐se a par-tir de bases motoras cotidianas – correr, saltar, pisar. Outros, com inspiração e nomenclatura lúdica, ainda homenageiam símbolos da música norteamericana, do cinema ou de desenhos animados. Tais características estão presentes em passos como Running Man, Happy Feet, Cake Walk, Chicken, RoboCop, Jerry Lewis, Chaplin, Charlie Brown (CHULTZ, 2016, p. 80).

Os passos sociais do hip-hop permitem ao dançarino expressar movi-mentos rítmicos ao som de qualquer música, e no freestyle, o dançarino usa todos os recursos para enriquecer a sua dança.

No freestyle, o aluno tem a possibilidade de misturar outras linguagens das danças, criando formas de se movimentar, que partem das suas experiências e também da vivência de movimentos nas aulas de Educação Física.

Chultz (2016) afirma que os passos sociais em união com nossas refe-rências cotidianas formam a base para o improviso e para a construção de uma coreografia. À medida que o aluno vai tomando para si os dados dessa cultura hip-hop, ele pode criar seu estilo de dança. Consideramos o freestyle esse estilo de dança mais autoral.

Pelo free style a atuação ganha qualidade cênica e subje-tiva. O corpo veste um personagem que atua num limiar entre a mera representação e o drama real do atuante. A expressão free style é também conhecida como ‘charme’ ou ‘ginga estilosa’. Cada dançarino tem o seu charme, a sua ginga, o seu jeito de se expressar. Através do free style o breaker faz uso de um estilo – que pode ser o break boyin´g, o popin´g ou o lockin´g – para comunicar através deste repertório motor, algo de si mesmo. (ALVES, 2007, p. 25).

Todos esses estilos de dança do hip-hop (breaking, freestyle, locking e popping) têm como característica a liberdade de expressão, levando cada dan-çarino a adotar um estilo pessoal em seus movimentos. Esse estilo é de grande

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importância em qualquer apresentação, uma vez que as características individuais possibilitam inovação e criação de movimentos dentro das danças.

Sobre o estilo pessoal, vejamos as palavras de Chultz (2016, p. 80):

Outra qualidade da Hip Hop Dance e dos passos sociais que destacamos é a incorporação de maneiras de fazer, o que abre espaço para que cada dançarino tenha a sua maneira de dançar. Na Hip Hop Dance, um passo como o Running Man possui sua técnica, mas cada indivíduo irá fazêlo de uma maneira (engajando mais ou menos os braços, com maior ou menor amplitude de movimento de pernas). Essa pequena liberdade ocorre devido ao fato de esses passos serem extremamente sociais, praticados em festas, nos centros urbanos.

Ao olhar para as danças do hip-hop, vemos que cada pessoa desenvolve sua maneira de realizar os passos, da mesma forma como muitos têm um estilo próprio ao caminhar.

Outra característica dessas danças é o diálogo constante entre seus praticantes. Abordaremos sobre essas possibilidades criativas e de comunicação na seção 2.3.

As batalhas de hip-hop como manifestação criativa dos alunos e das alunas

Compreendendo a dança como manifestação da cultura corporal, na escola, o professor é o mediador que leva o aluno a tomar consciência de suas potencia-lidades, aumentando a capacidade de resposta e a habilidade para se comunicar, contribuindo para o conhecimento do corpo e da vivência dos movimentos. De acordo com Fiamoncini e Saraiva (2018), é necessário partir dessa compreensão de dança como expressão da vida do homem e como linguagem social.

Toda cultura tem alguma atividade rítmica característica, sendo funda-mental o trabalho com dança, nas aulas de Educação Física, que partam daquilo que motiva o aluno a dançar e de suas danças do contexto social.

Oliveira, Batista e Medeiros (2014) ressaltam a importância das aulas de Educação Física em reconhecer as experiências corporais dos alunos (seu acervo de movimentos), pois resultam de um diálogo com sua realidade social.

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Dança na Escola

Neste universo cultural cheio de significados, estão inseridos os estilos de dança do hip-hop, possibilitando ao dançarino (nossos alunos) expressar o que sente e o que pensa em um diálogo constante. Esse diálogo é encontrado com mais intensidade nas BATALHAS (criada pelo DJ Afrika Bambaataa, ainda no início da cultura hip-hop para diminuir a violência entre os grupos rivais), que são pequenas sequências de movimentos visando a um embate artístico, um combate dançado.

O convívio com os jovens durante o período de reivindicações e protestos nas ruas do Bronx levou Afrika Bambaataa a criar as batalhas de dança, cujo objetivo principal era “tentar diminuir as brigas ‘sangrentas’ entre as gangues de rua, transformando esta forma de violência urbana em um ritual de desafio através da performance corporal” (OLIVEIRA, 2006, p. 68).

As equipes começaram, então, a trocar as disputas e brigas físicas por essas batalhas, em um ato constante de comunicação, uma vez que era neces-sário dizer, por meio dos movimentos, que sua equipe era melhor que a outra. Anexados aos movimentos de dança, começaram a surgir movimentos com provocação e ironia.

Desse modo a improvisação e o humor foram elementos que se consolidaram nesse estilo das danças urbanas. O desafio e a provocação também eram utilizados pelos praticantes da dança como uma forma de duelo, uma batalha de movimentos. Nem sempre havia um vencedor ou a preocupação com que houvesse. O interessante era o jogo entre os dançarinos, um jogo de pergunta e resposta em que o movimento é o vocabulário utilizado. (PAPOLO COLOMBERO, 2011, p. 4).

No Brasil, também encontramos o nome RACHA para representar as batalhas (ALVES; DIAS, 2004; CORREIA; SILVA; FERREIRA, 2017), e podem ser praticadas com todos os estilos de dança do hip-hop.

Atualmente, há uma apropriação delas pela mídia, que organiza eventos e cria marcas para comercialização em cima da cultura hip-hop.

[...] neste processo de institucionalização do racha de rua em forma de evento, percebe-se uma tendência a eliminar o caráter fortuito e transitório do elemento ‘rua’. Isto se manifesta com mais ênfase nos encontros

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de grande porte, incluindo aí campeonatos que contam com patrocínio de grandes marcas. Neste cenário, o duelo deixa de ser um racha cujo vencedor é aclamado pelos pares no calor do encontro na roda, passando a ser competição, regida por regras rígidas (CORREIA; SILVA; FERREIRA, 2017, p. 218).

Ressaltamos que na escola nosso foco não está na competição entre os participantes da batalha, mas sim na possibilidade de compreender as batalhas como possibilidade para a comunicação corporal, expressão, criatividade e improviso dos alunos, como um jogo de perguntas e respostas, deixando-os que se expressem, construindo suas danças.

Como funciona uma batalha?

- As batalhas de hip-hop podem ser realizadas por apresentações individuais, duplas, trios ou grupos e todas se organizam da seguinte forma:

- A estrutura das batalhas segue como sua forma original: um DJ ao centro, para colocar as músicas, e um MC organizando as entradas e o público (esses dois papéis podem ser desempenhados pelo professor ou combinado entre os alunos).

- Os grupos que vão participar da batalha devem localizar-se em lados opostos, cada um em uma extremidade do local selecionado para a batalha.

- Um sorteio é estabelecido para selecionar o grupo que iniciará a batalha. Tal grupo inicia indo até o centro do espaço para apresentar seu movimento; ao fim da sequên-cia, voltam-se ao lugar de início (correspondendo a uma “entrada”), o que indica que o próximo grupo está autorizado a realizar os seus movimentos. No entanto, não é necessário todos do grupo sempre se apresentarem juntos.

- De maneira repetitiva, os grupos se alternam no centro do espaço.

- Pode ser estabelecido um número fixo de entradas (número de vezes a ir ao centro executar os movimentos) ou estabelecido um tempo para a batalha.

- Não é permitido tocar no adversário, porém, pode-se dançar à sua frente.

- O adversário deve esperar o outro grupo terminar para iniciar sua entrada.

- Os jurados (em geral, 3 pessoas) se posicionam no centro do espaço e, ao fim da batalha, devem estender o braço em direção ao grupo que consideram vencedor. No caso de haver a possibilidade de empate, devem cruzar os braços na frente da região torácica (esse item é apenas um exemplo de como se constitui uma batalha oficial. Nesta publicação não entra em nosso objetivo).

É preciso a compreensão de que as batalhas de hip-hop se diferenciam de uma apresentação coreográfica, pois o foco está na comunicação, em passar uma mensagem para o outro, e não em apenas mostrar movimentos ensaiados. Batalhar é um exercício que envolve a estruturação de um diálogo. Para isso,

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Dança na Escola

um fator fundamental é a criatividade, pois quando buscamos uma prática pedagógica mais coerente como essa, nós possibilitamos ao aluno expressar-se com criatividade e sem a exclusão de ninguém.

A dança possibilita o desenvolvimento do aluno como ser criativo (FIA-MONCINI, SARAIVA, 2018; KLEINUBING; SARAIVA, 2009), e para o desenvolvimento de ações pedagógicas que levem os alunos à criatividade mediante as batalhas de hip-hop, devemos usar como estratégia metodológica a improvisação.

Na dança, há o improviso quando conseguimos realizar uma sequência coreográfica que tenha liberdade de inspiração, gerada por meio de uma ação do momento, em que se utiliza muito a criatividade (VIEIRA, 2015). Ainda sobre a improvisação:

[...] ela implica um processo que permite a todas as pessoas dançarem – ou movimentarem-se expressiva-mente – dentro de suas possibilidades individuais. Na improvisação, evita-se confrontar o movimento com a formalidade da técnica para a sua execução, para não esvaziar o aspecto expressivo do mesmo. (FIAMON-CINI; SARAIVA, 2018, p. 94).

Na improvisação, todos os alunos podem manifestar-se conforme sua vivência, seus sentimentos, sua relação com o outro, e a não estereotipação do movimento. Ela emerge como possibilidade para a criação imediata de passos e sequências não determinados, que vai além de aprender uma coreografia.

O movimento vem de uma maneira espontânea, sem que seja exigida técnica de movimentos ou exercícios prefixados, e na improvisação, todos os alunos são protagonistas, em uma possibilidade múltipla e dinâmica de aula, o que faz de cada aula única: o improviso vem do momento em que o aluno coloca a si mesmo em experimentação constante.

A proposta da improvisação permite ao aluno criar gestos que manifes-tam sua maneira de agir – que estão pautados nas suas experiências e atividades cotidianas – e manifestam seus pensamentos e sentimentos.

O trabalho com improvisação vai: “No momento em que o/a aluno/a cria e expressa um movimento, ou até mesmo, um ‘não movimento’, precisa- se

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Roberta Gaio | Tamiris Lima Patrício (org.)

estar atento a ele, sua história, pois suas marcas estão ali, presentes, se fazendo num sujeito concreto.” (KLEINUBING; SARAIVA, 2009, p. 208).

O improviso nas batalhas de hip-hop abre espaço para que a cultura familiar, práticas rotineiras e raízes de cada indivíduo tenha um espaço nas suas performances, sem deixar de ser hip-hop.

Ao usar a estratégia didática da improvisação, Fiamoncini e Saraiva (2018) a dividem em dois momentos: experimentação e representação.

Na experimentação livre e criativa do movimento, mas norteada por uma temática/conteúdo que é determinada pelos objetivos da aprendizagem, o aluno vivencia em movimentos um relacionamento com fatos que o esti-mulam (o próprio corpo, o colega, os objetos, o espaço, a força, a música, etc.) num processo que vai da percepção do mundo exterior para a conscientização do movimento. (FIAMONCINI; SARAIVA, 2018, p. 96).

Ampliando a conceituação sobre a experimentação, Raquel de Gouvêa complementa:

Em uma improvisação quase tudo é experimentação. Há movimentos, gestos, ações que o improvisador já viveu em seu corpo e que se reapresentam como fragmentos de dança que ele retoma por semelhança; mas também há tudo o que nele ainda não se atualizou. Podemos dizer que o primeiro grupo é dominante à medida que nos tornamos hábeis e que, portanto, os movimentos que se relacionam ao vivido são mais prováveis do que os do segundo grupo. (GOUVÊA, 2009, p. 344).

Ao olhar para a Base Nacional Comum Curricular, encontramos a experimentação, uma das oito dimensões do conhecimento que embasam o trabalho do professor.

Experimentação: refere-se à dimensão do conhecimento que se origina pela vivência das práticas corporais, pelo envolvimento corporal na realização das mesmas. São conhecimentos que não podem ser acessados sem pas-sar pela vivência corporal, sem que sejam efetivamente experimentados. (BRASIL, 2020, p. 220).

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Dança na Escola

É na fase de experimentação que os alunos terão a oportunidade de vivenciar os diversos estilos de dança do hip-hop, transformando os gestos e as ações de cada dança no seu estilo pessoal.

Já na representação (ou expressão do conteúdo), a criação emerge como diferencial: “[...] e ela se dá a partir das impressões percebidas e armazenadas na experimentação, com o que a forma elaborada e determinada no movimento se expressa para o mundo exterior como um novo conteúdo.” (FIAMONCINI; SARAIVA, 2018, p. 96).

Nessa união de experimentação e representação, nessa relação entre o vivido e os gestos improváveis (GOUVÊA, 2009), a improvisação em dança é criada e se efetiva na construção de movimentos e na ressignificação deles; ou seja, os movi-mentos que apresentamos em uma improvisação fazem parte do repertório que já temos vivenciado – a nossa bagagem anterior –, associado à percepção momentânea: a sensação do momento.

É na união entre as duas fases que os alunos criarão e recriarão os movi-mentos das danças do hip-hop (caminhando ao contrário dos movimentos mecânicos, decorados e padronizados), contribuindo, assim, para a manifestação criativa deles.

Para a concretização das batalhas de hip-hop, os alunos iniciam com uma experimentação dos estilos de dança, confrontam os passos com suas experiências rítmicas – abrindo espaço para que a cultura familiar, práticas rotineiras e raízes de cada indivíduo tenham um espaço na sua performance – e criam movimentos.

São vários os autores que destacam a importância de não padronizar os movimentos e não exigir uma técnica de execução, permitindo a exploração e vivência; e dentro dessas características, as batalhas possibilitam abolir a rigidez e os estereótipos das danças com passos coreografados, predeterminados e des-contextualizados da realidade dos alunos.

Na opinião de Alves e Dias (2004), a dança break possibilita ao indivíduo o rompimento de uma organização estética formal, como há na dança clássica, e permite a produção de uma estética própria; e para que a batalha tenha seu efeito criativo, é necessário quebrar o paradigma de que a dança é feita de passos mecânicos, padronizados e repetitivos.

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No hip-hop, todo movimento é válido, e a batalha permite a contação de uma história, vira dramaturgia por meio dos diálogos corporais, pois esse tipo de dança “tem como característica marcante a liberdade de movimento, liberdade de expressão e comunicação, havendo espaço para a criatividade de quem dança” (LAUXEN; ISSE, 2009, p. 70).

Os alunos se mostraram extremamente envolvidos na aplicação das batalhas. Em nossa experiência prática, é possível observar uma criatividade excelente. É possível utilizar movimentos ginásticos, mímica, passos das danças do hip-hop, movimentos vistos em clipes e filmes, etc.

A expressão corporal por meio da criação, da criatividade, é linguagem viva. Os gestos efetuam significados e sentidos. Para embasar essas e todas as discussões propostas neste capítulo, na parte que segue, traremos algumas dicas e sugestões para a ação pedagógica com as batalhas de hip-hop.

SUGESTÕES PARA A AÇÃO PEDAGÓGICA

O hip-hop, por ser uma cultura que reúne diversos elementos, pode propiciar o trabalho interdisciplinar. Experimente tratar dessas manifestações com as demais áreas do conhecimento.

Neste trabalho faremos o recorte das batalhas como possibilidade peda-gógica para a manifestação criativa dos alunos e abaixo descreveremos algumas possibilidades de ações, com atividades individuais e em grupos.

Vale salientar que, apesar das atividades estarem numeradas de forma sequencial e crescente, as atividades a seguir não representam uma sequência didática rígida, dando total liberdade ao professor quanto ao percurso.

RODAS DE CONVERSA

Tematização da aula. Criar espaços para o diálogo. Levantamento dos conhecimentos prévios dos alunos sobre o hip-hop. Observação de como se desenvolve o hip-hop nos locais onde ele ocorre, próximos da escola, e como ele reflete na unidade escolar e entre os alunos.

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Dança na Escola

- Reúna os alunos em roda e converse com eles sobre como o hip-hop se faz presente na comunidade. Faça um levantamento das linguagens e os códigos do hip-hop presentes no entorno da escola (região, bairro ou cidade).

- Perguntas geradoras: alguém sabe explicar o que é hip-hop? O hip-hop faz parte da cultura de vocês? Qual dos elementos do hip-hop se faz mais pre-sente em nossa sociedade? Que passos de dança vocês conhecem?

Atividade n.º 1Nome História do hip-hop (adaptado de Oliveira, Batista e Medeiros, 2014)

Objetivo Apresentar a história e os quatro elementos do hip-hop

Material CD, cartazes, recortes de revista, folhas de sulfite, fotos

Disposição Preparar, antes da aula, um acervo de matérias referentes à cultura hip-hop, que pode ser: imagens de clipes e filmes, CD de artistas nacionais e internacionais, imagens de grafites, frases ou letras de músicas, matérias de revistas ou da internet sobre a temática, etc. Espalhe todo o material que você conseguir sobre o hip-hop pela quadra, todos virados para baixo

Desenvolvimento da atividade

Chamar um aluno por vez para escolher qual material ele quer pegar e mostrar à turma. Ao virar, conversar com os alunos sobre o sentido que aquilo faz ou não para eles.

Variações Fazer a leitura de um texto com o Histórico do hip-hop ou construir com os alunos uma narrativa sobre a história do hip-hop com base nos objetos virados (fotos, recortes, CD, etc.).

Vivências (experimentação e criação)

É preciso pensar que, quando um aluno não tem familiaridade com uma dança e seus movimentos, a repetição e a simples imitação de gestualidades podem levar ao desinteresse da turma. Pensando nisso, procure refletir, problematizar, apreciar e ressignificar as danças da cultura hip-hop. O foco está na criatividade

Atividade n.º 2Nome Eu e o hip-hop

Objetivo Observar a relação dos alunos com o hip-hop

Material Músicas e vídeos

Disposição Solicitar aos alunos que tragam para a aula músicas e vídeos (clipes ou filmes) da cultura hip-hop

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Desenvolvimento da atividade

Com as músicas, fazer uma playlist para ser usada na aula. Por meio dos vídeos, observar os passos de dança característicos, os que se repetem entre as gravações e os alunos que conhecem

Observações Refletir sobre a influência midiática. Observar a letra das músicas e palavras de baixo calão. Conversar sobre os movimentos de dança presentes nos vídeos.

No caso de uma música, ou outro estímulo sonoro escolhido como referência, não é necessário conhecer os passos e movimentos específicos da mesma. Neste primeiro momento buscamos estabelecer uma linguagem cor-poral comum ao grupo. Este seria o momento de exteriorizar o que sentimos em relação à música, transformando a linguagem musical em linguagem do movimento. Explorar os movimentos em diversos planos e eixos, ora sozinhos, ora em duplas, ou pequenos grupos, reconhecer a si mesmo e interagir com os outros construindo diferentes maneiras de se locomover além de elaborar formações que variem no espaço pré-estabelecido, fazem parte desse processo inicial. (EHRENBERG; PÉREZ GALLARDO, 2005, p. 115).

Atividade n.º 3Nome Desafio em roda (batalha individual)

Objetivo Verificar o conhecimento dos alunos sobre as danças do hip-hop e iniciar a proposta de batalhas 1x1

Material Aparelho de som e diversas músicas (a playlist criada pelos alunos)

Disposição Alunos dispostos em roda, todos com o corpo voltado para o centro do círculo

D e s e nvo l v i m e n t o d a atividade

Ao som de determinada música, que pode ser escolhida pelo professor ou pelos alunos, um aluno por vez irá até o centro da roda dançar livremente. No fim de sua apresentação, volta ao seu lugar e outro aluno continua a atividade

Variações No fim de uma apresentação, ao invés de retornar a seu lugar de origem, o aluno deve fazer uma pose, bater palmas e apontar em direção a um amigo da roda, desafiando-o para a batalha de dança, e este dará sequência à atividade

Observação Levar o aluno a sentir a música.

Atividade n.º 4Nome Batalha em duplas

Objetivo Verificar o conhecimento dos alunos sobre as danças do hip-hop; ampliar a batalha inicial

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Dança na Escola

Material giz e lousa (ou cartaz e canetinha), aparelho de som e diversas músicas (a playlist criada pelos alunos)

Disposição Fazer um levantamento de todos os passos de dança (dos estilos do hip-hop) que os alunos conhecem e escrever o nome na lousa, criando, assim, um repertório de movimentos. Se não souberem o nome verda-deiro do passo, podem ser criados nomes que fazem referência à ação

Desenvolvimento da atividade

Promover um momento de troca de experiências, em que cada aula vai ensinar os demais os passos que conhece.No fim, separar os alunos em dupla. Duas duplas por vez participarão da batalha. A dupla que iniciar a batalha escolherá um dos movimentos anotados para fazer e desafiar a outra dupla a fazer o mesmo movi-mento. Esta, por sua vez, ao terminar a ação, faz outro movimento, continuando o desafio

Variações Fazer o movimento e terminar com uma pose (freeze) antes de voltar para seu lugar de origem

Observação O professor pode estipular um tempo para a batalha ou um número máximo de movimentos.

No período das vivências, é interessante que o professor promova a vivência dos movimentos do hip-hop, para que os alunos possam ampliar os conhecimentos e ampliar seu repertório corporal.

Uma sugestão é o uso de fotografias, em que os alunos tentam adivinhar como é o movimento – e todos o representam corporalmente. No fim, o professor mostra o mesmo movimento em vídeo, para que façam as comparações. Esse jogo de adivinha também pode ser feito com o nome dos passos.

Outras sugestões são:

-> BREAKING: criação de poses (freezes); tentar equilibrar sob várias partes do corpo (cabeça, mão, joelho, costas, etc.)

-> POPPING: imitar um robô; deslizar para várias direções; fazer ondas com o corpo;

-> LOCKING: apontar em várias direções.

Atividade n.º 5Nome Batalha de popping

Objetivo Explorar as possibilidades de movimentos corporais da dança popping

Material Aparelho de som e diversas músicas (a playlist criada pelos alunos)

Disposição Dividir os alunos em dois grupos, cada grupo de um lado do local da batalha

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Desenvolvimento da atividade

Os grupos podem organizar-se sobre o número de dançarinos em cada ato da batalha: 1, 2, 3, 4, etc.A batalha deve ter como foco a dança robô, com os alunos realizando movimentos com o corpo enrijecido, os movimentos de waves (ondas com o corpo) e os movimentos de slides (deslizar)

Observação O professor pode combinar com os alunos o número de entradas de cada grupo.

Conversar com os alunos sobre o estilo próprio dentro do hip-hop, sobre as qualidades do movimento: que queremos dizer quando realizamos um movimento com muita força?

- estimular a variação de velocidade: movimentos lentos e rápidos;

- estimular os variados níveis: movimentos no alto e no chão;

- estimular as transições entre um movimento e outro.

No hip-hop, chamamos de drop os movimentos que fazem a transição de um passo para o outro, que são: ondular, girar, cair, dobrar, encolher, esticar, saltar, deslizar, entre outros.

Atividade n.º 6Nome Batalha em grupo

Objetivo Explorar as possibilidades de movimentos corporais no freestyle

Material Aparelho de som e diversas músicas (a playlist criada pelos alunos)

Disposição Dividir os alunos em dois grupos, cada grupo de um lado do local da batalha

Desenvolvimento da atividade

Antes de iniciar a batalha, cada grupo terá um tempo para organizar os movimentos para a sua apresentação. O estilo da batalha é livre. Deverá ser realizado um sorteio para saber qual grupo iniciará a disputa.

Observação A cada entrada, os integrantes dos grupos podem vibrar, gritar e estimular seus companheiros. Atentar-se para o excesso e exagero nas provocações.Lembre-se de incentivar o diálogo corporal. Por mais que os alunos organizem os movimentos, é importante o jogo de pergunta e resposta.

Ampliando a pesquisa

- Faça um registro fotográfico ou filmagem de todo o percurso das aulas. Grave depoimentos e solicite narrativas aos alunos. Esses materiais podem com-por um livro sobre a cultura hip-hop na escola ou se tornar um documentário.

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Dança na Escola

- Verifique se na escola ou na comunidade há algum grupo que pratique algumas das danças do hip-hop e convide para uma troca de experiências e vivência dos movimentos.

Material de apoio

- Filme ENTRE NESTA DANÇA: HIP-HOP NO PEDAÇO

Este filme retrata a realidade de dois grupos de dança rivais, que deci-dem aperfeiçoar sua dança para vencer as batalhas. Logo na primeira dança, introdução do filme, é possível ver a possibilidade expressiva, de comunicação e de criação que a batalha possibilita.

- Filme ELA DANÇA, EU DANÇO 3

Este filme também retrata o universo das batalhas, desde o simples duelo individual, na rua, até a disputa em grupo em um grande campeonato, explorando os diversos estilos de danças do hip-hop.

Palavras Finais

Composto por diferentes linguagens (dança, música e artes plásticas), o hip-hop é uma cultura rica, que permite a abordagem escolar de uma variedade de temas. Neste vasto universo, as danças da cultura hip-hop se inserem cheias de possibilidades e ressignificações, e possibilitam ao aluno expressar o que sente e o que pensa.

Com o objetivo de apresentar as batalhas de hip-hop como possibilidade de manifestação criativa e expressiva dos alunos, este trabalho também reuniu produções que contextualizam o hip-hop como manifestação cultural presente no Brasil.

Ao olhar para a dança na escola, é necessário partir da compreensão de dança na qualidade de expressão da vida do homem e como linguagem social. Precisamos ver a dança como sensibilização e aproximação do aluno com o próprio corpo, com seus sentimentos e emoções, e não como reprodutora de movimentos.

As batalhas de hip-hop reconhecem as experiências corporais dos alunos (seu acervo de movimento, sua cultura) e contribuem para ampliar a capaci-

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dade expressiva e de comunicação em um fenômeno que permite o estímulo à criatividade.

Nas batalhas de hip-hop, reunimos os alunos em grupos, e as particula-ridades de cada um vão constituindo a produção da equipe, valorizando, assim, a criação individual, reconhecendo a potencialidade e os limites de cada aluno. A criatividade parte da vivência, da improvisação e da criação.

O intuito deste trabalho não foi fazer uma tradução da dança hip-hop, mas sim falar do hip-hop e usar as batalhas como ponto de partida (ou mola propulsora) para o trabalho com criatividade na dança. Propomos um diálogo e ideias/sugestões que possam ampliar a relação didática com esta temática na escola – um novo olhar – sem a pretensão de esgotá-lo.

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Dança na Escola

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RESISTÊNCIA OU APROPRIAÇÃO? O FUNK BRASILEIRO CONTEMPORÂNEO NAS AULAS DE ARTE E SUA RELAÇÃO COM JOVENS QUE VIVEM A PÓS-MODERNIDADE

Maria Carolina Macari

A DANÇA NAS AULAS DE ARTE

A dança é um saber pouco explorado nas escolas, seja por falta de profes-sores que conheçam a linguagem, ou porque os cursos que habilitam professores para essa atuação são recentes, quando comparado as licenciaturas em artes visuais, teatro ou música (ANDRADE e GODOY, 2018).

Esse panorama, que pouco a pouco se modifica, foi estudado largamente por autores como Godoy (2003), Marques (1991) e Rengel (2010), que con-cordam ao mencionar que as escolas públicas brasileiras ainda carecem de uma educação através da dança.

Estudantes, diretores, coordenação e pais, associam as aulas chamadas de Educação Artística, que atualmente são nomeadas de arte, ao ensino e apren-dizado da linguagem das artes visuais (pintura, desenho, escultura, xilogravura, fotografia, artes plásticas e visuais em geral). Há dificuldade em relacionar e, sobretudo, concretizar o ensino e aprendizado da dança com as aulas de arte no espaço escolar. Aqui no Brasil, essa conexão entre a disciplina arte e as artes visuais, tem origens históricas.

De acordo com Guimarães (1996) o ensino de arte foi implementado nas escolas do Brasil em fins do século XIX. Nasceu a partir da geometria e, posteriormente, o desenho livre como eixo principal.

Somente no ano de 1971 com a promulgação Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) é que o ensino da arte (entendida como artes visuais) se torna obrigatório enquanto atividade escolar (desenho livre e geo-metria eram praticados nas escolas, mas ainda não considerados elementos de uma disciplina).

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Roberta Gaio | Tamiris Lima Patrício (org.)

No ano de 1996 a LDB (lei das Diretrizes e bases da Educação nacional, lei 9.394/96) estabelece o ensino obrigatório de Arte, dando ênfase às quatro linguagens artísticas: música, artes visuais, teatro e dança. A dança finalmente constitui componente curricular obrigatório nos diversos níveis de educa-ção básica.

[...] a década entre 1996 e 2006, isto é, após a implanta-ção da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB 9394 de 20 de dezembro de 1996). A aludida lei indicava, entre outros, o ensino de arte como conteúdo obrigatório na Educação Básica e especificava o prazo de dez anos para seu cumprimento. Acompanhando a LDB, por sua vez, os Parâmetros Curriculares Nacio-nais da área de arte indicavam que a dança deveria ser contemplada ao lado das demais linguagens artísticas como o teatro, a música e as artes visuais. Esta mesma legislação especificava que todo (a) professor (a) de escola deveria ter diploma de licenciatura, o que poderia nos conduzir à crença de que apenas este estaria habilitado para ensinar dança nas escolas da educação formal, seja como conteúdo das aulas de arte, seja como disciplina específica extracurricular, como encontrado em escolas particulares (STRAZZACAPA, 2014, p. 8).

Guimarães (1996, p. 27) também afirma que “no ano de 1996 a dança é, pela primeira vez, sugerida nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) como mais uma linguagem a ser trabalhada nas aulas de arte”.

De acordo com os PCNS (Parâmetros Curriculares Nacionais) as ins-tituições teriam dez anos (de 1996 a 2006) para implementarem a dança em seus currículos.

A linguagem da dança é privilegiada ao se olhar para a possibilidade de estudar corpos que se movimentam tendo em vista que refletem a cultura de povos, suas identidades e informação. A dança vista nessa perspectiva, deixa de ser encarada como “apêndice”, “lazer” e passa a ser considerada mais um saber a ser explorado dentro da disciplina arte.

A dança na escola não deve priorizar a execução de movi-mentos corretos e perfeitos dentro de um padrão técnico imposto, gerando a competitividade entre os alunos. Deve partir do pressuposto de que o movimento é uma

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forma de expressão e comunicação do aluno objetivando torná-lo um cidadão crítico, participativo e responsável, capaz de expressar-se em várias linguagens, desenvol-vendo a auto expressão e aprendendo a pensar em termos de movimento. (MORANDI, 2005, p. 7)

A introdução da dança nas aulas de arte é algo bastante recente na história da Educação brasileira. Em 2016 no Diário Oficial da União - Seção 1 de 03/05/2016:

Art.26. § 6º As artes visuais, a dança, a música e o tea-tro são as linguagens que constituirão o componente curricular de que trata o § 2º deste artigo..” (NR) - Art. 2º O prazo para que os sistemas de ensino implantem as mudanças decorrentes desta Lei, incluída a neces-sária e adequada formação dos respectivos professores em número suficiente para atuar na educação básica, é de cinco anos. Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. Brasília, 2 de maio de 2016; 195º da Independência e 128º DILMA ROUSSEFF, Aloizio Mercadante, João Luís Silva Ferreira. (BRASIL, Lei 13.278, 2016)

Será que as escolas públicas e mesmo as escolas particulares estão cum-prindo essa lei?

Após quatro anos da publicação desse artigo 26 do Diário Oficial da União, as escolas estão preparadas fisicamente para as aulas de dança? Os espa-ços físicos das escolas se adequaram para isso? Os professores de arte possuem formação em dança? Ou será que a dança nas escolas continua tendo um caráter de lazer, trabalhadas apenas nas festas escolares para “apresentação aos pais”? O conhecimento intrínseco à linguagem da dança é valorizado?

Essas são questões que cabem um olhar mais cuidadoso, seja do ponto de vista das políticas públicas para a Educação no que se refere a amplitude de ações que precisam ser desenvolvidas e ajustadas, desde o destino de verbas para adequação física do espaço escolar para práticas não só da dança, mas de outras atividades, mas também em relação a formação de professores. Godoy e Andrade (2018) dedicam-se a discutir a formação de professores de dança, que desde 2012 tem se modificado substancialmente com a criação de cursos de licenciatura em dança em todo o país. Com esse movimento de ampliação

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de cursos e o tipo de formação oferecida, existe uma transformação em relação aos saberes que os professores podem desenvolver no ambiente escolar e aos poucos a dança vai sendo evidenciada com uma área de conhecimento que promove mudanças.

Mas é preciso dizer que o maior problema não é esse, e sim, o fato de que os professores pedagogos do ensino infantil e fundamental (anos iniciais) são os responsáveis por trabalhar com essas linguagens, inclusive a dança, na maioria das redes de ensino do país. E os estados que abrem concursos para o professor de arte, exigem do mesmo, que trabalhe com as quatro linguagens, o que também é inadequado. Temos poucos municípios que abrem concursos específicos para linguagens (artes visuais, teatro, dança e música), de maneira que existem âmbitos diversos para tal discussão. O que não exclui olhar para esses problemas e pedir à sociedade, professores, famílias e estudantes, auxiliarem com propostas e reivindicarem seus direitos.

Ser um professor, qualquer que seja a disciplina ministrada, significa ter compromisso com o ensino de conteúdos curriculares, mas também considerar um engajamento ético e político consigo e com os aprendizes. É importante tomar partido, unir-se à sociedade civil e ás famílias a fim de defender ideias e atitudes que façam cumprir a Constituição Federal de 1988 em seu artigo 25:

A educação, direito de todos e dever do Estado, da socie-dade e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvi-mento da pessoa, seu preparo para exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. (BRASIL, 1988, in BNCC, 2017, p. 10)

MAS AFINAL, QUAL ESTILO DE DANÇA ENSINAR NAS AULAS DE ARTE?

São inúmeros os estilos de dança: Danças populares tradicionais, Balé, Jazz Dance, Danças Urbanas, Danças de Salão, Pole dance, Estileto, Dança do Ventre, Kuduro, Carimbó, Frevo, dentre outras.

Para ensinar todos esses estilos de dança, um professor de Educação Básica teria que ser um verdadeiro profissional da dança, talvez um dançarino

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Dança na Escola

que estudou a vida toda. Mas esse não é o caso das escolas públicas brasileiras e nem mesmo a realidade dos alunos nesse ano de 2021.

Cada professor reúne em si percursos exclusivos de vida. São diferentes estudos, interesses, repertórios, posturas, metodologias e modos de se relacionar com o mundo. As escolas abarcam docentes que tiveram sua formação inicial em períodos mais distantes e outros que acaba-ram de concluir licenciatura. Essas diferenças conferem colorido às aulas de artes da rede municipal de ensino, tão autêntica quanto seus professores. Respeitando esse colorido, propomos dar aos docentes a possibilidade de criar percursos de aprendizagem com ênfase em sua linguagem de formação específica, focalizando conceitos e práticas gerais da área de artes. Assim, procuramos res-saltar o que é específico de cada linguagem, mas também pensar o que as atrelam, o que é comum a todas (SÃO PAULO, 2017, p. 64).

A Base Nacional Comum Curricular (BNCC, 2017) preconiza o desen-volvimento global dos estudantes, enfatizando a importância de trabalhar um ensino e aprendizado que façam sentido à realidade dos estudantes.

(..) se romper com as percepções reducionistas de proces-sos educativos que priorizam as dimensões cognitivas ou afetivas em detrimento dos demais saberes que emergem dos tempos, espaços e comunidades nos quais os estudan-tes se inserem. Segundo a BNCC (2017), independente do tempo de permanência do estudante na escola, o fator primordial a ser considerado é a intencionalidade dos processos e práticas educativas fundamentadas por uma concepção de educação Integral. (São Paulo, SME, 2017, p. 21)

Isto significa que os processos de ensino e aprendizado devem levar em consideração o contexto histórico, social, político e econômico que os estudan-tes estão inseridos. Aliar os interesses deles no momento da aprendizagem, oferecendo conteúdos que fazem sentido e dialoguem com suas realidades, independentemente de qual dança for trabalhada em sala de aula.

Obviamente, é importante relacionar a aprendizagem significativa à história, às diferentes culturas dos povos, à geografia, à matemática e muitas áreas de interesse. O aprendizado significativo é relacional, histórico e reflexivo;

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não se limita, portanto a um único estilo de dança proposto pelos estudantes, mas sim, a um conjunto de relações que são estabelecidas a partir do que trazem para a sala de aula.

A dança é uma linguagem rica de signos e significados. A leitura das imagens, dos corpos em movimento ou mesmo da temática trazida pelos sujeitos que dançam, devem ser discutidas e relacionadas a vida cotidiana, as inquietações, dúvidas e conflitos deles.

E a dança Funk, faz parte da realidade dos alunos?

No ano de 2021 a dança Funk é realidade de muitos estudantes de escolas municipais da cidade de São Paulo.

Origens do Funk

É som de preto, de favelado,

Mas quando toca, ninguém fica parado.

(Amilcka e Chocolate)

Segundo o Mini Dicionário da Língua Portuguesa (2011) a palavra Funk significa “música popular de origem norte americana, dançante, de marcação rítmica vigorosa e repetitiva” (p.429).

Desde 1988 o Funk Carioca vem sendo estudado no Brasil por diferen-tes vertentes filosóficas. O antropólogo Hermano Vianna (1988) e a linguista Márcia Fonseca Amorim (2009), intitulam o Funk carioca como um Movimento Cultural. Para a linguista Adriana Carvalho Lopes (2010, p. 21), “o Funk carioca é uma música, uma linguagem, uma cultura; uma prática social historicamente situada, uma forma de cantar, de se expressar, de construir e sentir o mundo”.

Os sujeitos adeptos do Funk possuem uma identidade própria: o funkeiro apresenta-se como o “sujeito da favela” que gosta de cantar e dançar de uma maneira própria, despojada, utilizando uma linguagem simples, característico das periferias dos grandes centros urbanos. (AMORIM, 2009, p. 20).

Presente nas favelas e bailes Black do Rio de Janeiro desde a década de 1980, o Funk conquistou todo o Brasil. Desde metrópoles como São Paulo,

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Belo Horizonte e Fortaleza até cidades pequenas do interior como Jaboticabal (SP), lá está o Funk sendo praticado e consumido por pessoas de todas as idades.

Se a princípio o Movimento Funk era a expressão de uma juventude negra, menos favorecida economicamente, dos anos 1990 para cá, hoje estamos em 2021, o Funk é presente em todas as classes sociais.

Mas quais as origens do Movimento Funk?

De acordo com Lopes (2010), o Funk brasileiro e contemporâneo é uma mistura do Movimento Hip Hop6 com culturas negras da periferia do Rio de Janeiro.

Antes de tratar o surgimento do Funk Brasileiro e contemporâneo, é preciso fazer uma retrospectiva histórica.

Após a segunda Guerra Mundial, (STOREY, 2015) os intelectuais e ativistas pelos direitos humanos norte-americanos disseminaram ideais liberais, respeito ao pluralismo cultural e fim das diferenças entre classes sociais. Na década de 1960, nos Estados Unidos, a população se uniu contra a guerra do Vietnã, as mulheres lutaram pelos direitos feministas, houve a campanha pelos direitos de lésbicas, gays e transexuais, discussões sobre cultura de massa estavam em alta e a população negra começou a reivindicar seus direitos.

Nesse contexto (fins da década de 1960), surgem figuras como James Brown, George Clinton, Horace Silver, Ray Charles, dentre outros. Esses músicos, inspirados nos ritmos musicais do Soul, Jazz, Rhythm e Blues criam uma nova batida denominada Funk.

Os adeptos do Funk apresentavam um estilo peculiar no modo de falar, no corte do cabelo e nas roupas que usavam. Segundo (VIANNA 1988, p.20) tudo podia se Funky: uma roupa, um bairro da cidade, o jeito de andar e uma forma de música que ficou conhecida como Funk. (AMORIM, 2009, p. 270)

6 O Hip Hop foi um movimento cultural que surgiu na década de 1970 nos Estados Unidos. Ele engloba três segmentos: o break (dança), o rap (música) e o graffiti (desenho) e quatro elementos (MC, DJ, B.boy, Graffiteiro). No rap, existe o MC (mestre de cerimônia), que faz o canto falado e o DJ (disc-jockey) que controla o vinil nos toca-discos e domina a técnica do scratch (arranhar o disco para produzir um efeito sonoro). Os que dançam são denominados B. boys (break boy ou break girl). Os graffiteiros são os responsáveis pela técnica da pintura, especialmente com spray, em muros da cidade. Existe o quinto elemento – Conhecimento e Sabedoria – que consiste na atividade educativa do movimento. (FERREIRA, 2005, p. 5)

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O Funk norte-americano da década de 1960 era diferente ritmicamente e filosoficamente do Funk brasileiro e contemporâneo. Era uma cultura que reivindicava, sobretudo, os direitos dos cidadãos negros. As músicas abordavam a resistência ao sistema racista e enaltecia a cultura afro-americana. Calças boca de sino e cabelos black-power eram o símbolo do Movimento Funk norte-ame-ricano da década de 1960.

Na década de 1970, imigrantes jamaicanos começam a habitar o bairro do Bronx em Nova York e misturam ritmos latinos com as batidas do Funk. Além dessa mistura rítmica nomes como Afrika Mambaataa, Grandmaster Flash e Hool Herc; começam rodar discos de vinil em sentido anti-horário, criando interessantes sonoridades que viriam a se tornar as batidas do Rap.

Uma figura emblemática do movimento Hip Hop é Grandmaster Flash criador do “scratch”, sons ou arra-nhões produzidos a partir do contato das agulhas de vitro-las com discos de vinil girando em sentido anti-horário. Além dos “scratches”, Grandmaster Flash desenvolveu o Rap. (AMORIM, 2009, p. 28).

O Rap é um dos elementos do Movimento Hip Hop. Ele se constitui de poesias falada e muitas vezes improvisadas ao som de batidas rítmicas, os scratches. Em geral trata de temas contestatórios como a conscientização das populações negras, o fim do racismo, a diáspora africana, o resgate da dignidade de pessoas pertencentes a classes sociais economicamente menos favorecidas. É uma música que instiga as pessoas em situações de vulnerabilidade a lutarem pelos seus direitos.

Os negros norte-americanos praticavam o Rap nas ruas e em bailes. A partir dele, tem-se início as danças como o Break dance, Locking, Popping e o Free Style. O Break Dance por exemplo surgiu a partir de movimentos inspirados nos soldados que foram mutilados da guerra do Vietnã. A dança também assumia um caráter político e questionador.

Os pintores também se inspiraram nesse ambiente de lutas e contestação social e criaram os Graffits, desenhos pintados ou gravados nas paredes, uma forma de expressão das artes visuais que também fez e faz parte do Movimento Hip Hop. Trata-se de um movimento artístico, cultural e político que reivindica

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direitos do cidadão, em especial negros norte-americanos e teve sua expressão nas artes visuais, na música, na literatura (poesias rimadas) e na dança.

Existem diferentes batidas de Rap como Break Beat, Acid Rap, Freestyle Music, Instrumental Hip Hop, Jazz Rap, Country Rap, dentre outros.

De acordo com Lopes (2010), na Flórida, na década de 1980, mais especificamente em Miami, surge uma batida de Rap chamada Miami Bass. Esse ritmo, embora possuísse características das batidas do Rap, continha letras que remetiam ao sexo, à erotização, apologia ao consumo e violência. Era uma música que não tinha um caráter contestatório, no sentido de discutir lutas sociais e direitos civis.

E foi justamente esse estilo chamado Miami Bass, que, devido a intensa globalização cultural, adentrou no Rio de Janeiro, misturou-se à cultura brasileira periférica e dessa forma, surgiu o Funk brasileiro contemporâneo.

O funk carioca é resultado de um processo de hibridi-zação semelhante ao que a elite brasileira promovia nos anos 1920, com o movimento antropofágico (LOPES, 2010, p. 26)

O movimento antropofágico de Mário de Andrade, na década de 1920, propunha uma releitura aos moldes brasileiros da cultura vinda do exterior. Sendo assim, o Funk brasileiro nasce nos Estado Unidos, mas reinventa-se em solo nacional.

Para terminar esse tópico sobre a história do Funk brasileiro e contempo-râneo, é preciso dizer que ele invadiu a vida cotidiana de jovens, principalmente moradores das periferias dos grandes centros urbanos. E desde a década de 1980 vem causando repercussão na mídia, discussões em escolas e polêmicas na sociedade em geral.

Colocamos uma pergunta: como esses estudantes, praticantes e adeptos do Movimento Funk gerenciam uma realidade em que lhes faltam bens materiais e culturais e são adeptos de um Movimento que fala de ostentação, consumismo e luxo? Contradição? O Funk está na mídia, nas casas dos estudantes, na vida cotidiana, na maneira de falar e se vestir.

Podemos dizer então, que o Funk integra sem dúvida, a construção da identidade cultural e subjetividade de muitos jovens brasileiros.

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O Funk como parte da cultura popular

Estudar cultura popular pode ser um assunto de fato muito sério: um sério assunto político. (STOREY, 2015, p. 427)

A palavra cultura possui diversos significados. Williams (1963) escreveu que cultura é uma das palavras mais complexas da língua inglesa e propõe duas definições amplas. Em primeiro lugar, a palavra cultura pode ser usada para se referir a um processo geral de desenvolvimento espiritual, intelectual e estético; também pode sugerir determinado estilo de vida, grupo ou período histórico, como a expressão de significados e valores de um grupo social.

Além de tratar o termo cultura, ele também reflete a respeito do termo cultura popular, chegando à conclusão de que existem diferentes interpretações para essa palavra. O autor discorre a respeito de cinco maneiras diferentes de interpretar a expressão cultura popular.

Uma primeira definição de cultura popular é: aquilo que é apreciado por muitas pessoas. Uma segunda maneira de definir cultura popular é “aquilo que é deixado de lado após termos decidido o que é alta cultura” (STOREY, 2015, p. 20). Essa segunda definição traz a ideia de cultura popular como reflexo de uma cultura inferior, de segunda linha, produzida por uma classe social desprovida de educação e bens materiais. A terceira possibilidade é ver a cultura popular como reflexo da cultura de massa, comercial e sujeita às lógicas do Capitalismo. Uma quarta definição é que aquilo que se origina do povo. Essa definição “discorda de qualquer abordagem que sugira ser algo imposto sobre o povo” a partir de classes sociais abastadas (p. 29). Uma quinta definição de cultura popular parte da análise política do marxista Italiano Antônio Gramsci, especialmente ao desenvolver o conceito de hegemonia.

Gramsci estudou o impacto da dominação ideológica de uma classe sobre a outra, o que ele chamou de Hegemonia Cultural. De acordo com ele a coerção ideológica encontra-se em diferentes grupos sociais e instituições como o Estado, igrejas, escolas, sindicatos e a comunicação social. Para esse filósofo, os meios de comunicação sustentam ideologias dominantes, mantendo o status quo de grupos sociais abastados.

Gramsci usa o termo hegemonia cultural para se referir à maneira como grupos dominantes na sociedade, por

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meio de um processo de liderança intelectual e moral, procuram ganhar a aprovação de grupos subordinados na sociedade. (STOREY, 2015, p. 30)

Segundo o pensamento de Storey (2015, p. 345), Gramsci vê a cultura popular como um lugar de “resistência de grupos subordinados e as forças da incorporação que operam em favor dos interesses de grupos dominantes”.

Cultura popular nesse sentido, não é a cultura imposta, a dos teóricos da cultura de massa, nem aquela cultura antagonista que emerge espontaneamente, vinda de baixo, do povo – é um terreno de trocas e negociações entre as duas: um terreno, como já dito, marcado por resistência e incorporação. Os textos e práticas de cultura popular movem-se no âmbito do que Gramsci chama de “equilí-brio de compromisso”- uma balança que, em geral, pende para os interesses dos poderosos. (STOREY, 2015, p. 31)

Para ele, o conceito de cultura popular apresenta um amplo panorama e é difícil categorizá-lo. “Parte da dificuldade e provém da implícita diversidade, sempre ausente/presente ao usarmos o termo cultura popular” (STOREY, 2015, p.130). Para esse autor, “não importa o que cultura popular seja, mas ela definitivamente só surgiu depois da industrialização e urbanização”. (STOREY, 2015, p. 35)

Nessa direção, faz sentido nomear o Funk brasileiro como um Movimento Cultural ou como uma prática social historicamente situada. Podemos dizer que o Funk brasileiro situa-se historicamente na pós-modernidade7, é parte da cultura popular pós-moderna.

Será que os praticantes e consumidores do Movimento Funk estão con-seguindo ler os diversos signos que existem nos discursos sobre e o Funk? Adolescentes que praticam e consomem Funk conseguem perceber os discursos de resistência, apropriação e contradições desse movimento?

7 Nesse texto, o termo pós-modernidade está associado ao pensamento de Jean Fraçois Lyotard (1984) sobre o pós-moderno. Para esse filósofo, a pós-modernidade é uma época em que verdades totalizantes como o Marxismo, Cristianismo, liberalismo, por exemplo, caem por terra. É um período em que evidencia-se o crescente soar de uma pluralidade de vozes marginais, com sua insistência na diferença, na diversidade cultural e na defesa da heterogeidade sobre a homogeneidade. Para saber mais sobre o conceito de pós-modernidade em Lyotard, acessar LYOTARD, Jean François. O pós-moderno. Tradução de Ricardo Correa Barbosa. 3. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1988.

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Quais discursos estão presente no Funk? Será ele um terreno de trocas entre apropriação e resistência como nos traz Gramsci? Ou será que o Funk, que nasce como um movimento de resistência da população negra se tornou parte de uma indústria cultural perversa que estimula a erotização infantil, a violência e o crime, sendo, uma influência negativa na construção das identidades e subjetividades desses jovens? Existe uma consciência crítica embutida nesse movimento que favorece e impulsiona esses estudantes a serem seres humanos melhores e a exercerem sua cidadania? Quais discursos verbais e corporais que estudantes estão produzindo a partir do que vivenciam no Funk?

E ainda, podemos relacionar o Funk ao que o filósofo Lyotard (1984) citado por Storey (2015) nos traz sobre cultura popular: “Cultura Popular é a Cultura do Vale Tudo, uma cultura do “afrouxamento” em que o gosto é irrele-vante e o dinheiro é o único símbolo de valor”? (p. 373)

Como os jovens estudantes estão entendendo e absorvendo esse movi-mento e reproduzindo seus discursos? É preciso discutir o Funk com os jovens, dar espaço para suas vozes, suas percepções sobre esse movimento.

Todas as questões elencadas acima, podem integrar o plano de ensino da disciplina de arte, possibilitando uma discussão aberta e uma experiência prática, principalmente nas aulas de dança, compartilhada com os jovens estu-dantes, no intuito de construir no coletivo, um pensamento emancipatório e crítico (FREIRE, 2017).

O FUNK NA SALA DE AULA: COMO TRABALHAR?

Mas afinal, o que há, enfim de tão perigoso no fato de as pessoas falarem e de seus discursos proliferarem indefi-nidamente? Onde, afinal, está o perigo? (FOUCAULT, 2007b, p. 8)

O ensino e aprendizado de arte não é algo exato. Diferentes caminhos podem traçados para estudar o tema Funk entre estudantes de diferentes idades.

Podemos caminhar junto à riqueza das batidas da música Funk, as letras, os complexos passinhos, a relação do funk com a diáspora negra, os diferentes estilos de Funk, a saber: Funk Putaria, Funk Ostentação, Brega Funk, Funk Cha-voso, Funk Proibidão, Funk consciência, etc.

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Um trilhar seguro para o ensino e aprendizado do Funk é seguir a pro-posta do educador democrático, sugerida por Freire (2017). Ouvir os estudantes, suas reflexões e discursos pode se configurar em uma estratégia interessante.

É intolerável o direito que se dá a si mesmo o educador autoritário de comportar-se como o proprietário da verdade de que se apossa e do tempo para discorrer sobre ela. Para ele, quem escuta sequer tem tempo próprio, pois o tempo de quem escuta é o seu, o tempo de sua fala. Sua fala, por isso mesmo se dá num espaço silenciado e não num espaço com ou em silêncio. Ao contrário, o espaço do educador democrático, que aprende a falar escutando, é “cortado” pelo silêncio intermitente de quem, falando, cala para escutar a quem silencioso, e não silenciado fala. (FREIRE, 2017, p. 114)

Estudar Funk é, sem dúvida, deixar que os jovens se expressem. É abrir diálogo entre os estudantes e um Movimento Cultural que possui história, dis-semina atitudes, valores, comportamentos e discursos.

Quais enunciados a respeito do Funk estão sendo propagados por jovens adolescentes inseridos numa sociedade de consumo pós-moderna? Como os discursos desse movimento se relacionam com os corpos de sujeitos que dançam funk, suas falas, poesias, comportamentos e atitudes?

Embora o Funk esteja presente nas diferentes classes sociais, o Movimento Funk ainda representa a cultura popular negra, desprovida de capital. O Funk nasce como uma das vozes da favela, o reflexo dos guetos, a cultura de um do povo oprimido, mas ao longo dos anos é apropriado por uma classe abastada, que o leva para discotecas, festas e produzem uma indústria funkeira.

O Funk brasileiro e contemporâneo representa uma identidade de uma determinada população que vive a pós-modernidade.

Foucault fez uma profunda reflexão sobre o ser humano, tentando com-preender suas identidades no tempo presente, o que é chamado pela autora Gregolin (2003) de Ontologia Crítica do Presente. Foucault busca na história os discursos que produziram e produzem o homem contemporâneo. Para esse filósofo, compreender os discursos historicamente é uma forma de entendermos quem somos hoje e como podemos transformar pensamentos e atitudes. Em

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outras palavras, ele busca a constituição histórica do ser humano atual por meio dos discursos que os representam.

Foucault (1966) traz a ideia de discursos como um conjunto de enuncia-dos dentro de linguagens (sejam essas verbais, textuais, corporais, imagéticas ou simbólicas) que se articulam dentro de sociedades, grupos e instituições em um determinado momento histórico. Regulamentados por regras sociais e definidos no interior de lutas políticas, discursos não são apenas um sistema de significados, mas significados que se inserem dentro de padrões, regras, atitudes e poderes.

Mas afinal, o que há, enfim de tão perigoso no fato de as pessoas falarem e de seus discursos proliferarem indefi-nidamente? Onde, afinal, está o perigo? (FOUCAULT, 2007b, p. 8)

Uma das principais preocupações de Foucault (2007) está na relação entre conhecimento e poder, e em como essa relação atua em discursos e for-mações discursivas.

O discurso nada mais é do que a reverberação de uma verdade nascendo diante de seus próprios olhos, e quando tudo pode ser dito e o discurso pode ser dito a propó-sito de tudo, isso se dá porque todas as coisas, tendo manifestado e intercambiado seu sentido, podem votar à interioridade silenciosa da consciência de si” (FOU-CAULT,2007, p. 49)

Instituições, grupos e sociedades produzem múltiplos discursos. As mídias por exemplo, são organizações coordenadas por grupos, corporações, são dispo-sitivos produtores de múltiplos discursos em diferentes momentos históricos

O Funk é um movimento da cultura popular brasileira que está na grande mídia e que transmite determinados enunciados e que, possivelmente, influencia a construção das identidades culturais e subjetividades (de adolescentes).

A identidade é realmente algo formado, ao longo do tempo, através de processos inconscientes, e não algo inato, existente na consciência no momento do nascimento, “ela permanece sempre incompleta, está sempre em processo, sempre sendo formada”. (HALL, 2006, p. 38)

Para esse autor, na pós-modernidade ocorre uma crise de identidade. No mundo contemporâneo o conceito de identidade não representa uma ideia

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de estabilidade e construção de um indivíduo único. HALL (2006) traz a o pensamento que “as identidades pós-modernas estão sendo descentradas, isto é, deslocadas ou fragmentadas”. (p. 8)

O que vemos como nós mesmos é a internalização de uma multiplicidade de discursos construídos ao longo da nossa história, em determinado espaço de tempo e sujeita a influências de outros discursos, hierarquias e relações sociais epolíticas (STOREY, 2015).

É importante que educadores dialoguem com elementos estruturantes das identidades dos educandos e dar voz a eles.

Deixamos em aberto algumas perguntas: como criar uma proposta de trabalho em Artes sobre o Funk destinada a estudantes da educação básica que dialogue com a realidade desses jovens e seus anseios? Como trabalhar com as inúmeras linguagens artísticas que compõem o Funk, seja dança, música ou poesia e instigar a consciência crítica para a formação de cidadãos conscientes? Quais discursos estão presentes no Funk os quais os jovens estão se identificando?

Vamos discutir com nossos estudantes essas questões?

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Dança na Escola

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MÉTODO DANÇA EDUCAÇÃO CONTEMPORÂNEA (MDEC): LABAN E A ARTE DO MOVIMENTO NA FORMAÇÃO DOS PROFESSORES

Antônio Sérgio MilaniMariana Mafra Vicentini

Victor Tchiya Soares

INTRODUÇÃO

O Método Dança Educação Contemporânea (MILANI, 2015) traz uma proposta interdisciplinar entre a Dança, a Educação Física e a Arte, fazendo uma releitura das pesquisas de Rudolf Von Laban, nos estudos “dança educativa moderna”, “domínio do movimento”, “coreologia” e “arte do movimento”, as quais afirmam a importância da dança na formação das pessoas, desde a mais tenra idade até a vida adulta, bem como suas possibilidades de aplicação no cotidiano, no trabalho, na terapia, na educação e no palco.

Assim este capítulo pretende trazer um resumo deste método propondo uma “Educação de Corpo inteiro”, pois a Dança, assim como o Corpo expressivo, ainda encontra resistência na escola e na educação de crianças, jovens e adultos.

A Dança, com viés educativo-expressivo, ainda não está na essência da formação dos professores da escola que deveriam “educar as crianças de Corpo inteiro”.

Mas a culpa não é dos professores e o objetivo deste estudo não é pro-curar culpados, mas sim abrir uma reflexão sobre a formação de Corpo inteiro, propondo a dança como meio na educação dos profissionais da educação que perpassa desde a escola, a graduação e a pós-graduação de professores em dife-rentes áreas, pois foi e é negligenciada de geração em geração... a descoberta do Corpo que dança e a arte do movimento humano.

Poderíamos direcionar este capítulo aos professores que trabalham com o Corpo-movimento na Educação Física e Artes, mas vamos além, a arte do movimento da dança educação, é essencial na formação humana como disse Laban, “a dança como instrumento de educação deveria ser ensinada nas escolas”

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Dança na Escola

e acreditamos que os professores de todas as áreas precisam ser sensibilizados para isso.

Nossa proposta aqui é simples e complexa ao mesmo tempo: pretendemos refletir, propor e incentivar os professores sobre a importância da dança-educação na formação integral dos alunos e ao mesmo tempo na formação dos próprios professores, pois nunca é tarde para dançar e descobrir seu Corpo expressivo, por meio da dança-educação.

UMA BREVE VISÃO DA PROBLEMÁTICA DA FORMAÇÃO DOS PROFESSORES DE EDUCAÇÃO FÍSICA COM A DANÇA

Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) (1998) a dança na área da Educação Física está inserida nas atividades rítmicas e expressivas, considerando-a uma manifestação da cultura corporal, que tem como caracte-rística as intenções de comunicação e de expressão por meio dos gestos e ritmos.

Muitos estudos apontam este referencial curricular, no entanto a realidade da universidade é de um currículo que deprecia a disciplina dança com relação às disciplinas dos esportes, privilegiando estes últimos, Sborquia (2002). De outro lado os alunos também apresentam uma visão distorcida e não compreendem a dança no sentido educacional, mas como utilização para apresentações em eventos escolares ou técnicas profissionais afastadas de suas realidades, Brasileiro (1994).

Miranda (1994, p. 3) apoiada em Mariz de Oliveira (1988) e Pellegrini (1988), afirma que “Dança e Educação Física, embora áreas do conhecimento e fenômenos sócio-culturais distintos possuem aspectos de estreita relação: como fenômenos, ambos envolvem o movimento humano”.

Outra constatação importante dessa autora é sua investigação em cursos de graduação em Educação Física em vários estados brasileiros (“SP, RJ. MG, RGS, PR. PI, ES, PI e SE”), em que a Dança no programa destes cursos é desenvolvida como conteúdo específico em outras disciplinas, como “Ginás-tica” e “Rítmica”, por exemplo; no entanto esta autora constatou “ser pouco frequente” nestes programas “referências quanto às formas educacionais da Dança, existindo muito mais a tentativa de desenvolver as técnicas da Dança”. (MIRANDA, 1994, p. 4)

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Para Brasileiro (2003) há um problema com o ensino da Dança em aulas de Educação Física, relacionando alguns pontos que vem ao encontro das questões aqui levantadas. Segundo esta autora há uma certa ausência de conhecimento por parte do professor para a prática pedagógica sistematizada no espaço escolar, gerando assim uma certa marginalização da dança nas aulas de Educação Física escolar.

Essa autora afirma ainda que a dança é tratada como componente folcló-rico, tanto pela Educação Física como pela Arte e é reconhecida com atividade extracurricular ou extra-escolar. Em sua pesquisa com professores de Educação Física Escolar na perspectiva crítica, afirma que os professores de Educação Física apontam não usar o conteúdo dança e apenas um “recorre à dança nas atividades festivas e datas comemorativas”. (BRASILEIRO, 2003, p. 47).

Seus entrevistados argumentam que essa “não utilização do conteúdo dança se deve às questões estruturais, de conhecimento e de aceitação por parte dos alunos; especialmente por parte masculina”. (BRASILEIRO, 2003, p. 48)

Para esta autora é preciso reconhecer a dança não como mera atividade e coreografias, mas como campo de estudo. Aponta ainda, a necessidade de recu-perar as demandas que a Educação Física não conseguiu recuperar, e rediscutir na formação profissional.

As questões de gênero também são evidenciadas neste estudo e apesar da ausência da prática sistemática da dança nas aulas de Educação Física apontadas pela autora a dança é amplamente reconhecida por domínio público e utilizada em eventos nas escolas na maioria orientadas por professores de Educação Física.

Poucos são os estudos em que se procura analisar as possibilidades de materialização de propostas de ensino, e, mesmos os existentes, apresentam-se sob a referência de modelo. Apenas um dos entrevistados não aponta a dança como um conhecimento a ser tratado nas aulas de Educação Física. (BRASILEIRO, 2003, p. 58).

A autora sugere que estas reflexões sobre a dança não devem ser redu-zidas “as habilidades motoras ou a arte da dança clássica no universo da arte” BRASILEIRO (2003 p. 58). Propõe uma discussão ampliada da arte em algo que exceda o dizer verbal para códigos universais da linguagem corporal, em

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Dança na Escola

que os conteúdos da Educação Física Escolar não devem se limitar ao futebol, a queimada, a corridas e exercícios.

Por fim afirma que:

A questão comprova a necessidade de uma discussão mais aprofundada acerca do trato com o conhecimento Dança nos cursos de formação de professores de Educação física. A importância para a reflexão da estética sem a devida consciência de todos. Vivemos, portanto, sob forte influência ideológica estética, sendo a educação física e a dança um campo muito profícuo para essas apropriações estéticas. (BRASILEIRO, 2002, p. 58).

Claro (1988) confirma que a questão de gênero é um empecilho da dança na Educação Física ao expor e esclarecer que, paralelamente às suas experiên-cias pessoais em canto, teatro e dança, cursava a Escola de Educação Física da Universidade de São Paulo (EEFUSP) onde para os alunos daquela instituição “qualquer interesse a respeito dessas áreas ‘tendenciosas’ era tido como jocoso e enquadrado como aspirações tipicamente femininas”.

Há uma resistência para a prática do dançar por grande parte dos homens e a realizam apenas para cumprir o programa, mesmo afirmando sua importância na Educação Física.

Outro fato interessante citado por Claro (1988, p. 34) é que:

Na EEFUSP não existia dança para homem, somente uma pequena experiência com o folclore. Uma única experiência inovadora, porém, solitária, foi iniciada pelo aluno Lourival Parisi com a capoeira. Homem algum havia dançado dentro da escola.

E que a partir desta sua experiência inovadora foi reconhecida mais essa possibilidade de “estratégia motora”, não ainda como dança, arte ou resgate da corporeidade e da sensibilidade.

Outra experiência significativa deste autor foi com relação à “dança criativa”, na qual ouviu falar pela primeira vez na palavra “Conscientização Corporal” e/ou “respeito para consigo mesmo”.

Este aspecto tão explorado atualmente chama atenção diante do estudo realizado ao constatar pouco interesse por parte dos sujeitos na graduação de

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Educação Física em descobrirem-se como seres sensíveis através do Dançar neste estudo de Claro (1988) e que perdura até hoje.

Com base nestes estudos a Educação Física precisa renovar-se com que diz respeito à Dança, pois o significado do Dançar está repleto de subjetividades. Baseado nos autores citados, há intenções e idéias convergentes em sua maioria e algumas divergências principalmente no que tange a objetividade para o Dançar na escola com as disciplinas de Educação Física e da Arte.

De um lado há propostas da Dança-Arte e formação de bailarinos no sentido de estilos e técnicas da Dança, voltadas ao entretenimento e apresentações (mesmo que escolares). Por outro há propostas da Dança-Educação, no sentido de formação humana do cidadão, em explorar a Dança enquanto movimento, alegria, espiritualidade, expressão corporal, criatividade, etc.

Precisamos assumir um posicionamento do dançar como contribuição na formação humana como um todo, estimulando a criatividade, a sensibilidade, a percepção estética, a inteligência e principalmente o respeito ao Corpo. O dançar deve ser repensado para uma “Educação de Corpo Inteiro”, afirmamos apoiados em diferentes autores e nos diferentes contextos socioculturais, é preciso quebrar barreiras e pré-conceitos entre as áreas do conhecimento e do desenvolvimento humano.

Podemos afirmar que a dança é inerente a todo ser humano. Em muitos casos, é preciso apenas estimular os sujeitos a se entregarem ao prazer do dançar. É importante diferenciar uma visão artística relacionada à prática sistemática na atuação profissional, de uma visão educacional voltada para a formação integral dos professores, seja de Educação Física, de Pedagogia, de Artes, estudando a arte do movimento proposta por Laban (1978).

Verderi (1998, p. 31) afirma que:

A nova Educação Física deve promover e observar os corpos em movimentos deve possibilitar a seus alunos participar da construção do conhecimento de si mesmo e de seus colegas; ela deve revelar a opinião de seus alunos, considerar suas percepções, para que se torne uma ação educativa libertadora.

Compreender este fenômeno na formação pessoal e profissional dos professores corrobora com a afirmação de Barreto (2004, p. 76):

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Dança na Escola

O sentido da dança é a própria existência humana. Por isso só é possível compreender este sentido na experiência, seja na experiência estética, a experiência da beleza ou ainda nas experiências educacionais, recreativas ou ritualísticas.

UMA BREVE VISÃO DA PROBLEMÁTICA DA FORMAÇÃO DOS PROFESSORES DE ARTE COM A DANÇA

A dança é uma expressão humana que deriva das emoções e necessidades externadas desde os rituais dançados pelos povos primitivos como manifestações espontâneas até os dias atuais.

Para compreender a importância deste fenômeno na formação do ser humano e na formação dos professores a afirmação de Barreto (2004) pode ajudar, pois:

O sentido da dança é a própria existência humana. Por isso só é possível compreender este sentido na experiên-cia, seja na experiência estética, a experiência da beleza ou ainda nas experiências educacionais, recreativas ou ritualísticas. (BARRETO, 2004, p. 76)

As danças da corte na Europa do século XVI, realizadas em festas que duravam semanas, festejando a supremacia, casamentos ou conquistas de deter-minado reinado, ainda como manifestações espontâneas, evoluíram a partir destas e se tornaram danças para o entretenimento e educação da corte até o Ballet, hoje considerada como arte de palco.

O ensino de Arte no Brasil passou por grandes mudanças ao longo dos anos, sendo considerada como mera atividade recreativa até chegar aos dias de hoje, no qual a Arte agregou importância para o currículo escolar, entretanto, devido ao contexto histórico no Brasil, ainda existe uma grande rejeição a dança, considerando-a apenas como recreação.

Grandes pesquisadores na época da dança moderna na Europa e E.U.A. trouxeram inovações em suas pesquisas na Arte corporal da dança, como Isadora Duncan, Marta Graham, Rudolf Laban e elas não pararam no tempo. Outros pesquisadores sugiram dando continuidade em suas pesquisas no Brasil como Maria Duschenes, Klauss Vianna, Lenira Rangel que escreveu o Dicionário

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Laban, Isabel Marques, Lenora Lobo e Cássia Navas com a pesquisa do Teatro do Movimento.

Pesquisas têm mostrado o quanto a Arte auxilia no processo de ensi-no-aprendizagem do aluno em fase da alfabetização, desenvolvendo sua cria-tividade, pensamento crítico, além de desenvolver o lado sensorial, emocional, cognitivo e social, no qual podemos constatar em Strazzacappa (2001, p. 69) “O indivíduo age no mundo através de seu corpo, mais especificamente através do movimento. É o movimento corporal que possibilita às pessoas se comunicarem, trabalharem, aprenderem, sentirem o mundo e serem sentidos.”, bem como em Marques (2003, p. 23):

A escola pode, sim, fornecer parâmetros para sistemati-zação e apropriação crítica, consciente e transformadora dos conteúdos específicos da dança e, portanto, da socie-dade. A escola teria, assim, o papel não de ‘soltar’ ou de reproduzir, mas sim de instrumentalizar e de construir conhecimento em/ por meio da dança com seus alunos, pois ela é forma de conhecimento, elemento essencial para a educação do ser social.

Algo que muito nos chama a atenção para o desenvolvimento deste trabalho é a definição de Arte para os alunos, pois quando entramos numa sala de aula, a primeira questão que abordamos é: “O que é Arte?” e a resposta mais comum é “arte é desenho”.

Quando iniciamos o processo de movimento corporal, notamos certa resistência por parte de alguns alunos, pois movimentar o corpo era algo novo nas aulas de arte, então um dos exercícios que propomos para tirá-los daquela “automatização” foi levar a realidade para a sala.

Infelizmente a Arte nas escolas acaba se limitando ao ensino de Artes Visuais, sendo pouco trabalhadas as demais áreas (Teatro, Dança e Música), e se justifica pela história da Arte no Brasil. Conforme Soares (2020, p. 73) podemos visualizar no quadro abaixo a quantidade de cursos de formação em Artes no Brasil distribuídos em suas áreas:

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Dança na Escola

Oferta de cursos no Brasil

Fonte: Revista Santa Rita – Ciências Humanas – Vol. 32 julho/2020

Victor Tchiya Soares, professor de Arte, com formação específica em Teatro e especialista em Dança e Consciência Corporal, afirma que o Método Dança Educação Contemporânea MILANI (2015), oferece uma abertura para novas experiências com a dança na formação dos professores e consequente-mente dos alunos.

“Esse método está sendo de grande valia para o meu desenvolvimento profissional, pois pude ampliar as formas de trabalho dentro da escola, apro-veitando melhor os espaços e também consegui ver possibilidade em meus planejamentos de aula”.

Como experiência, acrescenta que a arte do movimento pode inspirar e orientar as crianças, trazendo sentido para as suas vidas, e o papel da dança é importante, ajudando no trabalho corporal, nas movimentações cotidianas, expressivas e comunicativas para conhecer seu próprio Corpo, aprendendo de uma forma diferente a dimensão corporal que podem alcançar de Corpo inteiro.

O tempo e as sociedades evoluíram, mas percebemos que antes de ser arte, a dança deveria ser uma expressão corporal espontânea, que podemos encontrar ainda hoje nas regiões norte e nordeste do Brasil, assim como em vários países do mundo.

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Acreditamos que dançar é uma expressão humana que nasce com o ser humano e quando estimulada, seja pela educação formal ou informal, os alunos se apropriam deste “repertório corporal expressivo de movimentos” em algum momento de sua vida que se estenderá na sua formação humana.

Esta citação dá sustentação ao dançar nato do ser humano, que muitos não se apropriam dela ou não encontram seu sentido, pois não passam pela experiência. Barreto (2004) se posiciona no sentido de a dança estar no uni-verso da arte como expressão estética, porém não nega os “múltiplos papéis que a dança assume, em diferentes situações da vida e da história humana”. (BARRETO, 2004, p. 77)

Acreditamos no Dançar enquanto manifestação primitiva da expressão humana (no sentido de primazia), espontânea, recreativa, prazerosa, integrante sócio-cultural do ser humano, que através dos contextos históricos se trans-formou em arte, técnicas e treinamentos de movimentos pré-estabelecidos, afastando-se desta naturalidade e por sua vez distanciando-se da Educação na sociedade contemporânea.

Mas em uma abordagem cultural-educacional o dançar, enquanto fenô-meno permanece nas “sociedades estruturalmente mais simples”, busca resgatar a sensibilidade, a corporeidade e a formação do ser humano com um todo.

Assim nosso objetivo é aproximar esta concepção dos professores que trabalham com Educação Física, Artes, Dança, Pedagogia, entre outros, pois sugerimos a “Educação de Corpo Inteiro”, sensível e expressivo, comunicativo e estético, seguro e confiante, saudável e educado, crítico e criativo, individual e coletivo, apoiado nas suas próprias experiências, reconstruindo um novo conceito sobre: o que é dançar você?

4. MÉTODO DANÇA EDUCAÇÃO CONTEMPORÂNEA (MDEC) - NOSSO OLHAR AOS ESTUDOS DE RUDOLF VON LABAN

Faremos aqui um resumo de alguns conceitos que acreditamos serem de grande importância e que poderão ter aplicações práticas imediatamente em suas aulas e novas pesquisas com os alunos.

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Dança na Escola

Quem foi Rudolf Von Laban? Laban, como é conhecido, foi arquiteto, formado pela faculdade de Belas Artes de Paris, bailarino, um “cientista-artista” em nossa visão. Filósofo do seu tempo, pesquisou novas teorias sobre o ser humano em movimento. Foi também coreógrafo, professor, artista plástico e um idealista.

Um observador dos problemas de sua época, pesquisador incansável, fundou centros de estudos, participou de movimentos sociais e políticos, deixou seu legado para a Arte e a pedagogia do movimento, influenciando milhares de pessoas pelo mundo inteiro.

Dentre seus seguidores está Maria Duschenes, (Húngara naturalizada Brasileira), que trouxe seus ensinamentos para o Brasil por volta de 1940 e estimulou centenas de pesquisadores por aqui.

Laban se aprofundou no estudo do corpo-movimento, baseando se em estudos socioculturais, nas leis universais da matemática, da física, do espaço, do tempo, do esforço do corpo-movimento e da gravidade, relacionando estas leis ao corpo-movimento e sua expressividade.

Foi um dos responsáveis pela inovação da dança e da ginástica modernas e não se deteve somente aos estilos específicos de ginástica e dança; ampliou seus estudos as ações cotidianas, as experiências emocionais, ao cansaço e eficiência no trabalho, pois trabalhou na indústria por um curto período e assim elaborou suas teorias para todo movimento humano, o “movimento para a vida”.

O corpo-movimento para este pesquisador teve seu foco como forma de expressão, comunicação e arte do movimento e não se limitou a arte de palco e aos artistas, ao contrário, sua visão era que a consciência das práticas corporais pudesse curar as pessoas de uma vida estressante, provocada pela revolução industrial, a evolução do trabalho e o crescimento das cidades.

Dentre os estudos de Laban, aqui propostos, fizemos uma releitura da:

Coreologia: o estudo da dança

A Coreologia trata-se do movimento transformado em linguagem, pois ela possui a sua interpretação e o seu significado. Além disto, ela aborda as formas externas e internas (mental e emocional) do movimento, o qual o corpo considerado completo com todas as suas partes,

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não se fragmenta entre corpo, mente, movimento e emo-ção, mas sim, são uma unidade inseparável. (SOARES, 2019, p. 310)

Para nossa surpresa, segundo Mota (2012, p. 65) apud (Milani 2015, p. 79):

Embora Laban possa ser considerado o criador da Coreo-logia, os fatos mostram que não. Pois, como informa Nicoletta Misler, o termo já era conhecido e utilizado pelos russos, no Laboratório Coreológico de Moscou, desde 1923, ou seja, bem antes de 1926, data em que Laban fez uso público do termo pela primeira vez.

A partir da Coreologia, o Método Dança Educação Contemporânea, traz um novo conceito dando uma nova perspectiva à base dos estudos do Corpo que dança e revela seu fluxo, a Corporeologia, que trata da atuação do Corpo no fluxo da Dança e da Vida, conforme Milani (2015, p. 82) “...a Corporeologia é o estudo do Corpo, da corporeidade, da intencionalidade e do fluxo da motricidade humana, tanto para dançar quanto para viver, pois para compreendermos a Dança precisamos compreender o Corpo que se expressa por meio da Arte do Movimento...”.

Quando analisamos o Corpo, precisamos levar em consideração não apenas o corpo – matéria – físico, como também sua intencionalidade e seu fluxo “o sentir e o perceber o Corpo complexo ao dançar” (MILANI, 2015, p. 83).

Assim a dança educação propõe, não apenas, a execução e repetição dos movimentos e contagens “1,2,3,4,5,6,7,8” como nas danças das academias, para criar uma coreografia; precisamos elaborar aulas com objetivos diferentes, como a expressividade e comunicação dos alunos, o prazer na exploração do Corpo, suas percepções, intenções, necessidades e criatividade, seu tato e contato consigo mesmo, com os outros colegas e com o meio.

Nos estudos labanianos, a “coreo+logia” se refere aos “estudos da dança”, mas no Método Dança Educação Contemporânea, decidimos investigar a Corporeidade dos alunos ao dançar e criamos esta palavra “Corpo + reologia (fluxo)” e assim surgiu este novo conceito: Corporeologia. (MILANI, 2015)

Por essas “simples diferenças”, ampliamos os princípios básicos do movi-mento, por meio de perguntas simples, já citadas por Laban, mas com foco

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Dança na Escola

no Corpo para conseguimos estimular as pessoas em nossas aulas, conforme Milani (2015, p. 80):

1. O quê (estamos estudando) – o Corpo (suas partes, seu todo, o Corpo-Espaço).

2. Onde? (este Corpo atua) – no Espaço (espaço geral, Corpo no espaço ambiente. O Corpo é Espaço e atua no espaço).

3. De que forma? (nos movimentamos) – com Ações – (Laban propôs “oito ações básicas” fomos além e usamos “verbos>movimentos” para que os agentes sejam estimulados a dançar).

4. Como? (podemos estimular os movimentos) – por meio das dinâmicas dos quatro fatores do movi-mento (peso, espaço, tempos e fluência).

5. Com quem: (nos movimentamos) – relacionamen-tos – (as relações entre as pessoas nas práticas do movimento ou mesmo com objetos que chamamos de objetos cênicos).

EUKINÉTICA: “o estudo dos princípios qualitativos do movimento”

Eukinética “Trata-se do estudo das dinâmicas do movimento, que são vinculadas a intencionalidade e a individualidade; da energia empregada na ação e das qualidades expressivas do movimento.” (SOARES, 2019, p. 311).

Educar por meio da dança educação contemporânea é propor aos alunos que compreendam que todo movimento corporal pode ser uma dança e a principal estratégia que sugerimos aos professores é estimular nas aulas o sentido e signifi-cado em explorar o Corpo, seus gestos/movimentos de forma lúdica, expressiva, pedagógica e criativa. Os professores e alunos/as poderão pesquisar diferentes temas, colocar para fora seus desejos, imaginação, sentimentos e angústias, além de outras pesquisas com brincadeiras, esportes e jogos teatrais.

Mais abaixo faremos algumas aulas práticas para ilustrar melhor essa proposta.

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As qualidades expressivas do movimento denominadas por Laban revelam a manifestação da corporeidade e a intencionalidade das pessoas ao se expressa-rem por meio da dança (MILANI, 2015). Essas qualidades foram sintetizadas em quatro fatores e dinâmicas do movimento (fluência, espaço, peso e tempo) que são estudados separadamente, mas na prática um não acontece sem o outro, conforme segue abaixo:

FATORES DO MOVI-MENTO

DINÂMICAS E APLICAÇÃO PRÁTICA

1. Espaço: pode ser direto (unifo-cado) e flexível (multifocado);

Explorar o espaço-corpo, seus diferentes movimentos, em diferentes níveis (baixo, alto e médio), em diferentes direções, retos, em ondas. Movimentos grandes e pequenos (amplos e restritos). Diferentes formas do Corpo.

2. Peso: pode ser firme ou leve; forte ou fraco;

Explorar o peso e a força corporal, seus diferentes apoios e esforços, movimentos mais pesados e leves, fortes e fracos.

3. Tempo: pode ser súbito e sustentado.

Explorar o tempo e ritmo dos movimentos corporais, os diferentes ritmos musicais em tempos lentos, médios e rápidos, com e sem contagens musicais também.

4. Fluência: pode ser controlada e livre;

Sentir e perceber a fluência do Corpo ao se movimentar: dançar, jogar, nadar, viver...Sentir o controle-consciência do Corpo, do esforço apli-cado, dos tempos/ritmos e dos espaços utilizados para dançar e viver.

CORÊUTICA: “o estudo dos princípios espaciais do espaço no Corpo”

Corêutica: “...consiste na organização do “espaço no Corpo” e do Cor-po-movimento no espaço; a partir dos estudos da geometria, Laban elegeu: a cruz tridimensional (Fig. 5), que orienta o Espaço-Corpo em planos, níveis e direções; e os cinco poliedros regulares (Fig. 6), que são as figuras geométricas tetraedro, cubo, octaedro, dodecaedro e icosaedro.

O icosaedro é a mais próxima figura da esfera que ele chamou de Cinesfera ou Kinesfera (Fig. 4), esfera tridimensional imaginária ao redor do Corpo, espaço limite do alcance dos movimentos a partir de um ponto de apoio.” Trecho de: Antônio Milani. “Dança Educação Contemporânea”. Apple Books. (2015, p. 86)“.

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Dança na Escola

Como podemos observar nas imagens abaixo, precisamos correlacionar os conceitos geométricos quantitativos de níveis, planos e direções com os fatores e as dinâmicas do movimento, conceitos expressivos qualitativos.

O que trabalhar nas aulas? Como trabalhar?

Níveis dos movimentos: baixo, médio e alto.

Explorar os movimentos no chão, sentados, agachados, rolando, subindo, se inclinando, em pé, saltando, se erguendo, caindo, parando e dançando em diferentes níveis.Individual, em duplas, trios, grupos.

Planos e eixos: horizontal (látero-lateral – esquerda-di-reita), vertical (acima e abaixo) e sagital (anteroposterior / frente-atrás).

Explorar os movimentos se deslocando e se expandindo nas laterais, para alto e para baixo, frente, para trás, para o centro do Corpo.

Direções: cima, baixo, esquerda, direita, avanço e recuo.

Explorar todas as direções possíveis do espaço, incluindo as diagonais.

Vejamos como podemos trabalhar com o Método Dança Educação Con-temporânea na prática de forma objetiva e subjetiva, expressiva e intencionalmente.

Partindo inicialmente da consciência Corporal da Cinesfera (fig.4) podemos vivenciar e explorar os movimentos corporais representados pelos grá-ficos sugeridos por Laban como: a Cruz tridimensional (fig. 5), que é o trabalho da espacialidade, considerando o Espaço-Corpo em planos/eixos (horizontal, vertical e sagital), os níveis (alto, médio e baixo) e as direções (cima-baixo, esquerda-direita, frente-atrás e diagonais).

Podemos utilizar os poliedros regulares (fig. 6), nos quais Laban dese-nhou as bases possíveis dos movimentos corporais, imaginem e se movimentem dentro destas figuras, mas podem ir além do que está aqui proposto e RECRIAR outras possibilidades.

Como forma de condução do Corpo, Laban classificou 27 direções (fig. 7), subdivididas nas sete direções primárias (fig. 8), oito direções diagonais (fig. 9) e as 12 direções diametrais (fig.10/11). Milani (2015, os. 72-74)

Ao aplicarmos as aulas de dança com estes instrumentos quantitativos, precisamos perceber o quanto nosso Corpo consegue se movimentar no Espaço e se expressar de forma qualitativa, criativa e intencionalmente.

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Outro ponto que destacamos com esta teoria é que ela pode e deve ser usada como instrumento de avaliação do conhecimento e ensinada aos alunos/as para observarem, perceberem e analisarem todas as danças, quando o objetivo for avaliativo.

Quando o objetivo for apreciativo, as questões avaliativas nãos precisam ser evidenciadas, apenas contemplar e sentir o prazer pela arte da dança.

Corporeologia/Cinesfera (fig.4) Cruz tridimensional (fig.5)

Os cinco (5) poliedros regulares (fig. 6) As 27 direções espaciais (fig. 7).

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Dança na Escola

7 direções primárias (fig. 8) 8 direções diagonais (fig. 9)

12 direções diametrais (fig.10) / O Corpo nas 12 direções diametrais

(fig. 11) Rengel (2001, p.44)

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A partir dos estudos de Laban e diferentes autores surge o Método Dança Educação Contemporânea, que propoem aos professores estimularem as pessoas/Corpos a se expressarem e se comunicarem, praticando, investigando, vivenciando a arte do movimento, e se relacionando por meio da dança contemporânea.

Conforme prometido durante este capítulo, segue abaixo algumas aulas como exemplo para vocês aplicarem e esperamos que consigam criar muitas outras aulas.

Gostaríamos de observar que durante a criação do Método, também pes-quisamos as bases governamentais existentes na época como os Parâmetros Cur-riculares Nacionais (PCN) e os Referenciais Curriculares Nacionais da Educação Infantil (RCNEI) e neste capítulo trazemos em primeira mão aulas baseadas na Base Nacional Comum Curricular (BNCC), uma contribuiçao de Soares (2019).

PLANEJAMENTO DE AULA DO MDEC APOIADAS NA BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR (BNCC)

A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) é um documento que define competências gerais na Educação Básica (Educação Infantil, Ensino Fundamental e Médio), o qual foi regulamentado pela Resolução CNE/CP de número 2 de 22 de dezembro de 2017, considerando que a adaptação dos currículos haveria de ser realizada até 2019, com prazo final até início de 2020.

Assim iremos apresentar algumas ideias para aulas com o objetivo de aplicar essa aparente complexa teoria de forma prática e simples que pode ser abordada tanto no ensino fundamental quanto no ensino médio.

As habilidades e as competências da BNCC a serem abordadas para os modelos de aula abaixo são:

Para o ensino fundamental 1

Habilidades:

• (EF15AR09) Estabelecer relações entre as partes do corpo e destas com o todo corporal na construção do movimento dançado.

• (EF15AR10) Experimentar diferentes formas de orientação no espaço (deslocamentos, planos, direções, caminhos etc.) e ritmos

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Dança na Escola

de movimento (lento, moderado e rápido) na construção do movi-mento dançado.

• (EF15AR11) Criar e improvisar movimentos dançados de modo individual, coletivo e colaborativo, considerando os aspectos estru-turais, dinâmicos e expressivos dos elementos constitutivos do movi-mento, com base nos códigos de dança.

• (EF15AR12) Discutir, com respeito e sem preconceito, as experiên-cias pessoais e coletivas em dança vivenciadas na escola, como fonte para a construção de vocabulários e repertórios próprios.

Competências:

• 4. Experienciar a ludicidade, a percepção, a expressividade e a imaginação, ressignificando espaços da escola e de fora dela no âmbito da Arte.

• 8. Desenvolver a autonomia, a crítica, a autoria e o trabalho coletivo e colaborativo nas artes.

Para o ensino fundamental 2:

• (EF69AR11) Experimentar e analisar os fatores de movimento (tempo, peso, fluência e espaço) como elementos que, combinados, geram as ações corporais e o movimento dançado.

• (EF69AR12) Investigar e experimentar procedimentos de impro-visação e criação do movimento como fonte para a construção de vocabulários e repertórios próprios.

Competências:

• 4. Experienciar a ludicidade, a percepção, a expressividade e a imaginação, ressignificando espaços da escola e de fora dela no âmbito da Arte.

• 8. Desenvolver a autonomia, a crítica, a autoria e o trabalho coletivo e colaborativo nas artes.

Para o ensino médio:

• (EM13LGG501) Selecionar e utilizar movimentos corporais de forma consciente e intencional para interagir socialmente em práticas

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Roberta Gaio | Tamiris Lima Patrício (org.)

corporais, de modo a estabelecer relações construtivas, empáticas, éticas e de respeito às diferenças.

• (EM13LGG502) Analisar criticamente preconceitos, estereóti-pos e relações de poder presentes nas práticas corporais, adotando posicionamento contrário a qualquer manifestação de injustiça e desrespeito a direitos humanos e valores democráticos.

• (EM13LGG503) Vivenciar práticas corporais e significá-las em seu projeto de vida, como forma de autoconhecimento, autocuidado com o corpo e com a saúde, socialização e entretenimento.

Competências:

• 5. Compreender os múltiplos aspectos que envolvem a produção de sentidos nas práticas sociais da cultura corporal de movimento, reco-nhecendo-as e vivenciando-as como formas de expressão de valores e identidades, em uma perspectiva democrática e de respeito à diversidade.

Título da aula

Objetivos Desenvolvimento da aula

Conceitos Trabalhados

Abordagem em Dança.

O objetivo desta ativi-dade é introduzir prática artística em dança tra-zendo o desenho como forma de orientação inicial.

Será pedido aos alunos para que levantem de suas carteiras (se for feito dentro de sala) e fechem os olhos para escutar a orientação. Orientações:Considerando o corpo como um lápis imaginário, desenhar no espaço (mesmo que pequeno), utilizando os braços, os dedos, as pernas, cabeça, ombros, cotovelos, joelhos, quadris, pés e preen-cher com variadas formas. Pode ser colocadas músicas para ambientar e auxiliar na criação dos alunos. Avaliação*: o/a professor(a) pode colher relatos dos alunos do que fizeram, as formas que imaginaram como forma de bate papo, além de pedir um registro em desenho do que realizaram nesta aula.

Coreologia,Eukinética e Corêutica.

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Dança na Escola

* Lembrete: A teoria aqui apresentada pode ser usada como instrumento de avaliação do conhecimento e ensinada aos alunos/as para aprenderem observar, perceber e analisar todas as danças, quando o objetivo for avaliativo.

Quando o objetivo for apreciativo, as questões avaliativas nãos precisam ser evidenciadas, apenas deixá-los/as contemplar e sentir o prazer em apreciar a arte da dança.

Título da aula Objetivos Desenvolvimento da aula

Conceitos Trabalhados

A b o r d a g e m interdisciplinar:

Matemática e a Dança

O objetivo desta ati-vidade é começar a realizar o trabalho de movimento corporal, a partir do que os alunos já possuem de conhe-cimento corporal e trabalhar formas de movimentos.

Para que isso aconteça, é infor-mado que o professor/instrutor irá contar de 01 – 16 no qual os alunos/integrantes irão descer e subir de acordo com o número, porém terão de fazer de forma diferente cada subida e descida, trabalhando as variadas formas corporais.

A contagem se dá da seguinte forma:

01 – 16

01 – 08

01 – 04

01 – 02

01 – 01

Com isso, há mudanças na velocidade, níveis, direções e comportamento dos alunos/integrantes.

É interessante ter um tempo de observação dos movimentos corporais produzido pelo aluno e pela turma.

Avaliação: pode ser realizado um bate papo considerando o que observaram no desenvol-vimento da atividade. Como também registrado por meio de relatórios.

Corporeologia,

Coreologia,

E u k i n é t i c a e Corêutica.

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Roberta Gaio | Tamiris Lima Patrício (org.)

Título da aula Objetivos Desenvolvimento da aula C o n c e i t o s Trabalhados

Dança e Ritmo

O objetivo desta ativi-dade é continuar o tra-balho de consciência corporal, a partir do que os alunos explo-raram na atividade anterior.

Nesta segunda etapa, os alunos colocarão em prática o que tra-balharam e pesquisaram no pri-meiro momento e é importante que os mesmos se observem e se possível tragam para a roda de conversa as suas apreciações.

Nesta etapa, as palmas serão o “comando”, cada palma um movimento, podendo variar, deixando livre o uso dos níveis e formas de movimentos.

Avaliação: pode ser realizado um bate papo considerando o que observaram no desenvol-vimento da atividade. Como também registrado por meio de relatórios.

Corporeologia,

Coreologia,

E u k i n é t i c a e Corêutica.

Título da aula

Objetivos Desenvolvimento da aula Conceitos Traba-lhados

Dança Educação e o Movimento Livre

O objetivo desta ati-vidade é colocar em prática o conheci-mento corporal que foi explorado e nas atividades anteriores, o trabalho de Corpo Inteiro.

Neste momento, é aplicada a prá-tica da dança livre, no qual utilizando de variados ritmos (que facilitam se conhecer a turma) o estudo do movimento e também de observação, trabalhando os níveis e também usos do espaço.

Pode ser inserida uma música a esco-lha do professor/instrutor ou mesmo os alunos possam escolher. Pedir que os alunos/ integrantes fechem os olhos e ouçam inicialmente a música, sinta e no tempo de cada um, comecem a se movimentar da forma que se sintam confortáveis, aplicando o que foi trabalhado nas atividades anteriores.

Avaliação: pode ser realizado um bate papo considerando o que observaram no desenvolvimento da atividade. Como também registrado por meio de relatórios.

Corporeologia,

Coreologia,

Eukinética e Corêutica.

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Dança na Escola

Título da aula Objetivos Desenvolvimento da aula

Conceitos Trabalhados

C o m p o s i ç ã o Coreográfica

O objetivo desta atividade é por meio de movimentos criados pel os alunos, conduzir a uma composição coreográfica.

Nesta parte, na qual os alu-nos já possuem uma iden-tidade com o movimento corporal, poderão ser divididos em duplas/trios e orientados a cada aluno integrante do grupo criar um/dois movimento(s) e ao final juntá-los de forma a desenvolver uma pequena célula de uma composição coreográfica.

Corporeologia,

Coreologia,

E u k i n é t i c a e Corêutica.

Título da aula Objetivos Desenvolvimento da aula

Conceitos Trabalhados

C o m p o s i ç ã o Coreográfica 2

O objetivo desta atividade é apresentar para a turma o que foi criado na aula anterior.

Nesta última parte, os alu-nos irão apresentar o que criaram na aula anterior.

Avaliação: a cada apresen-tação os alunos que estão assistindo, poderão falar o que perceberam durante a apresentação da dupla/trio.

Corporeologia,

Coreologia,

E u k i n é t i c a e Corêutica.

Modelo de planilha coreográfica do Método Dança Educação Contemporânea

Planilha 1 – formação inicial / Grupo A – (Os alunos imaginando as árvores)

Iniciarão a sequência deitados/as no solo (sala ou palco) e se levantarão

lentamente formando figuras das árvores (braços abertos, retorcidos, etc.).

Depois moverão os braços para os lados D/E; depois formarão

duplas. Aos pares correrão para frente e para trás, alternadamente

até ouvirem uma explosão da música e cairão no chão, virando raízes.

Planilha 2 / grupo B – (Outros alunos imaginando os Bichos)

Entrarão pelas laterais (sala ou palco) saltando sobre os/as colegas que estão deitados/as no solo, utilizando todo o espaço. Depois paralisam como estátuas. Lentamente formarão figuras de animais (grandes, pequenos, etc,). As raízes (grupo A) irão se transformando em uma grande jaula, e de mãos dadas envolvendo os bichos, saído todos juntos para fora do palco/sala.

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Planilha 3 / grupo C/D - entrarão em 4 grupos (5 pessoas) e formarão 4 poliedros, realizarão deslocamentos no sentido horário. Parando nos 4 cantos do palco. Cada grupo realizara uma figura, da natureza, demonstrando as habilidades de força, resistência, formas de animais, flores, montanhas, etc...

Planilha 4 / todos/as - entrarão em grupos (10 pessoas) desenvolvendo tra-jetórias e evoluções (reta, curva, na diagonal, etc...), realizarão deslocamentos nos sentidos apresentado na planilha 4. Ao sinal do tambor, voltarão as formas de bichos e árvores do início da coreografia, seguindo trajetórias mais livres. Ao parar a música todos ficarão em estátuas nas formas de árvores, bichos e robôs-humanos; finalizando a coreografia.

Fonte: Milani (2015, p. 105)

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O Método Dança Educação Contemporânea veio de uma investigação desde as danças da cultura popular aprendidas na escola, em festas populares, bares e até nas praias, como simples prazer em praticar, se socializar e interagir com outras pessoas.

Após conhecermos profundamente as práticas sistematizadas das dife-rentes técnicas das danças de palco/artísticas como a clássica, a moderna, o sapateado, o jazz, a dança contemporânea, as danças de salão, entre outra, estas experiências proporcionaram ao nosso Corpo uma sensação de prazer em outros sentidos, como exercício físico, expressão artística, expressão pessoal e uma car-reira profissional, como artistas-bailarinos, coreógrafos e professores de dança.

Sermos profissionais da dança nos levou a reflexão do porquê ela estava tão afastada das pessoas pelo preconceito? Porque esta arte não poderia ser trabalhada de forma pedagógica (com crianças), andragógica (com adultos) e didática para a escola e a universidade.

Admiramos a arte da dança, mas quando esta visa apenas o rendimento, o treinamento do corpo, o salto mais alto, mais longo, girar o maior número de vezes possível; ser o/a melhor, ser o/a primeiro/a bailarino/a e buscar até o

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Dança na Escola

“impossível”, esta arte se “assemelha ao treinamento esportivo” e como mostra a história, assim a Dança se afasta da maioria das pessoas.

Até na dor podemos encontrar o prazer, porém a arte da dança profissional se aproxima do esporte e nesta perspectiva afasta as pessoas e seus Corpos de sua expressão original espontânea do Dançar.

Assim nos voltamos a expressão do dançar como fenômeno humano como nos mostra Gonçalves (1998) que chama atenção para o homem primi-tivo em que:

Na expressividade de seus movimentos, o homem primi-tivo, revela sua íntima união com a natureza. Seu corpo, como parte da natureza, também produziu ritmos, que se revelam na harmonia de seus movimentos corporais. Todos os acontecimentos importantes da sociedade são celebrados por meio de intensa participação corporal, em que o corpo é pintado ou tatuado e, pelas danças e pelos rituais, expressava emoções de alegria, tristeza e sentimentos místicos e guerreiros. (GONÇALVES, 1998, p. 73)

Isso nos levou a acreditar que o que afastou o “Dançar” dos Corpos dos pro-fessores e alunos é o que Gonçalves (1998) chama de “sociedades mais estruturadas” e nesse momento histórico, podemos nos apoiar na busca de um conhecimento possível, para educar para o dançar enquanto expressão e comunicação corporal.

Nesta perspectiva acreditamos que o Método Dança Educação Con-temporânea, pode se aproximar da realidade das pessoas. Vemos a Dança na escola como um estado corporal que precisa ser estimulado e sentido dançando.

Essa dança é um estado corporal de percepção, repleto de significados, que não se pode explicar, mas que precisamos estimular nos Corpos não dançantes dos alunos e professores, que precisam ressignificar a Dança e o dançar na escola.

Ao pesquisarmos a educação na escola, acreditamos que a dança é impor-tante na formação de Corpo inteiro, pois pode aproximar mais os alunos, um do outro pelo sentir, e abrir novas ideias aos professores.

Este Método é dedicado aos professores e educadores sociais por perce-bermos ainda um certo preconceito e medo em quebrar barreiras, principalmente nos homens, referente à dança e ao Corpo na escola.

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Roberta Gaio | Tamiris Lima Patrício (org.)

Para se aprofundar mais sobre o Método Dança Educação Contem-porânea acesse www.missaoeducar.com.br e nos siga nas redes sociais Dança Educação (MDEC)

Ministramos cursos presencias em instituições por todo Brasil e temos também um curso online de especialização para os professores que desejam atuar com dança educação e buscam mais conhecimentos.

Abraços dançantes dos autores.

REFERÊNCIAS

BARRETO, Débora. Dança... ensino, sentido e possibilidades na escola. Campinas: Autores Associados, 2004.

BRASILEIRO, Lívia Tenório. O conhecimento no currículo escolar: o conteúdo dança em aulas de Educação Física na perspectiva crítica. Pensar a Prática n. 6 jun./jul. 2003.

CLARO, Edson. Método Dança-Educação Física: Uma reflexão sobre consciência corporal e profissional. São Paulo: Impressão CeTeC, 1988.

FREIRE, João Batista. Educação de Corpo Inteiro. São Paulo: Scipione, 1989.

GONÇALVES, Maria Aparecida Soares. Sentir, Pensar e Agir: Corporeidade e Edu-cação. São Paulo: Papirus, 1998.

GOMES, Antônio S. Milani. Uma análise metodológica do Dançar nos discursos corporais dos discentes em Educação Física. Dissertação de mestrado. Universidade São Judas Tadeu, São Paulo. 2007.

LABAN, Rudolf. Domínio do Movimento. São Paulo: Summus, 1978.

_______ Dança Educativa Moderna. São Paulo: Ícone, 1990.

MARQUES, Isabel. Ensino de dança hoje: textos e contextos. 2 ed. São Paulo: Cortez, 2001.

MARTINS, Joel; BICUDO, Maria Aparecida V. Pesquisa qualitativa em psicologia: fundamentos e recursos básicos. São Paulo: Moraes/EDUC, 1989.

MERLEAU-PONTY, Maurice. Fenomenologia da percepção. Ed. Martins Fontes, São Paulo, 1999.

MILANI, Antônio. Dança Educação Contemporânea. Ed. Lura, São Caetano do Sul, 2015.

________Trecho de: Antônio Milani. “Dança Educação Contemporânea”. Apple Books. Acessado em www.missaoeducar.com.br, 2019.

MILANI, Antônio Sérgio. O Corpo que Dança na Escola. In: Corpo e educação: desafios e possibilidades. Filomena de Carlo Salermo Fabrin; Mônica De Ávila Todaro; Maria Luiza Sardinha de Nobrega; (Orgs.) 1a. ed. Jundiaí: Paco, 2014, vol. 13, p.24-34.

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Dança na Escola

MIRANDA, Maria Luiza de Jesus. A Dança como conteúdo específico nos cursos de Educação Física e Como Área de Estudo no Ensino Superior. Revista Paulista de Educação Física, v. 8 n. 2, p.3-13, jul. /dez. 1994.”

MOTA, Júlio. Rudolf Laban: A coreologia e os estudos coreológicos. Repertorio, Sal-vador, no 18, p.58-70, 2012.1.

SOARES, Victor Tchiya. A Composição Coreográfica livre com base nos estudos de Rudolf Laban. Rumos da Educação, Veranópolis, V.6, p. 307 - 317. 2020.

______. A precarização do ensino de arte no brasil. Revista Santa Rita: Ciências Humanas. n. 32, p. 68 - 74, julho. 2020.

SANTIN, Silvino. Educação física: uma abordagem filosófica da corporeidade. 2ª.ed. rev. Ijuí, Editora Unijuí, 2003.

STRAZZACAPPA, Márcia. A educação e a fábrica de corpos: a Dança na escola. Caderno Cedes, Campinas, v. 21, n. 53, p. 69-83, abr. 2001.

RENGEL, Lenira. Dicionário Laban. Dissertação de Mestrado, Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Artes, Campinas, 2001.

______. O corpo e o conhecimento: Dança Educativa. Texto de Apoio do 3o Encontro de capacitação. Arte, Goiás See/Go, 2002.

______. Dicionário Laban. São Paulo: Annablume, 2003.

VERDERI, Érica. Dança na Escola. Sprint, Rio de Janeiro, 1998.

Sites consultados:

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Desenho kinesfera. Disponível em: < http://thespaceintherelationship.files. wordpress. com/ 2013/ 05/kinespehere-1.jpg>. Acesso em: 28 fev. 2014.

Desenho do icosaedro. Disponível em: <http://thespaceintherelationship.files. wordpress. com/20 13/05/ laban-icosahedron. jpg>. Acesso em: 28 fev. 2014.”

“Dança Educação Contemporânea”. Livro digital em www.missaoeducar.com.br Acesso em: 28 ago. 2019.

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FESTIVAIS ARTÍSTICOS: UMA PROPOSTA PEDAGÓGICA

Tamiris Lima PatrícioMichele Viviene Carbinatto

INTRODUÇÃO

Os formatos em que eventos se constituem podem carregar diferentes funções sociais: educacional, econômica, política, de lazer, dentre outras. His-toricamente, os eventos desempenharam papeis importantes e fundamentais, consolidados por necessidades locais, como feiras para o desenvolvimento do comércio, festas e celebrações da vida cotidiana, jogos para o lazer e comunhão entre pares (GETZ, 2012). No entanto, com a presença constante dos eventos em diversos âmbitos de nossas vidas, a organicidade histórica foi substituída pelos planejamentos. A funcionalidade de cada evento passou, então, a orientar seus gestores que especificam suas premissas existenciais.

Os eventos variam, portanto, em função da localização e de quem ou qual entidade os organiza. Ademais, oferecem uma ou diversas atividades e, comu-mente, evocam sentimentos e emoções diferentes do dia a dia. Entre os tipos de evento temos os “festivais”, que podem variar entre eventos socioculturais e esportivos (GETZ, 2012), consagrando momentos de festa, congraçamento e comemorações. Em sua multiplicidade de formas, os festivais estão presentes em muitas instituições da vida humana, como nas escolas, nas universidades, nos clubes, nas prefeituras, nos museus, nas federações esportivas, etc. O caráter festivo demarca ritos e identidades culturais, finalizações de processos e marcações temporais, permeando nossas vidas nas passagens de ano, nos ritos religiosos, nas conquistas escolares, nas apresentações de projetos artísticos e/ou esportivos.

Neste ínterim, os festivais se tornam locus de aprendizagem. Em sua especificidade, apresentam um rico espaço de comunhão, de relação social e de experiências (CUDNY, 2014; GETZ, 2012). Vivências que são incorporadas, lembradas e significadas. Percepções que perpassam a alegria da festividade e são transformadas em saberes culturais, esportivos e artísticos.

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Dança na Escola

Pensando no âmbito formal de ensino, ressignificamos a forma de propor os festivais. Longe da premissa de via única, professor-aluno, considerar os festivais nesses espaços educacionais, demanda repensar a forma de concebê-los. Suas marcas devem permear a “magia”, as emoções pessoais e a atmosfera relacional corpo-outro. Assim, será por meio das diferentes experiências que o festival contribuirá de forma significativa para a formação humana (EICHBERG, 2007).

Os festivais artísticos — aqui relativos àqueles que têm como carac-terística as apresentações públicas de práticas corporais com estreita relação com a encenação e gestualidade poética do movimento (CARBINATTO e REIS-FURTADO, 2019) — constituem-se com a dialética apresentador/espectador, daquele que assiste com aquele que se mostra. Ser-performance e ser-audiente se entrelaçam pelo saber-estético. Por meio da dança, do teatro, da ginástica, da capoeira, do canto, os festivais artísticos promovem sutilidades e envolvimento narrativo que transcendem o verbo movimentar a uma poesia.

Transcorrer o espaço, o tempo e as relações, é íntimo ao objetivo do evento (GETZ, 2012; EICHBERG, 2007). No caso dos festivais artísticos, para além da experiência estética de quem contempla e de quem se apresenta, é preciso uma especial atenção à organização e à realização do evento de um modo amplo. Mas, como perceber os festivais para além de uma passividade típica dos eventos em que as pessoas — apenas — visitam? Como propô-los de forma que envolvam a comunidade local e seus diversos protagonistas? Como abarcar preceitos pedagógicos em eventos artísticos no âmbito do ensino formal?

Foram esses questionamentos que nos motivaram a propor esse capítulo: traçar caminhos para criar, ofertar e efetivar festivais artísticos no contexto formal de ensino. Entrecruzar com a missão educativa nos pareceu salutar a um livro que propõe reflexões da dança no âmbito escolar. No misto de reflexões teóricas da fenomenologia e de aportes práticos, direcionar você, professor, para o transcender didático. Do exercer gerência “sobre” para o exercer gerência do evento “com” os seus alunos!

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Roberta Gaio | Tamiris Lima Patrício (org.)

DA COMPREENSÃO SENSÍVEL DO CORPO – PERMEANDO AS DELICADEZAS DO EXPOR E DO OFERTAR

Os festivais que reúnem manifestações de práticas corporais artísticas/estéticas relutam às premissas exclusivistas das práticas esportivas, em que os eventos mais conhecidos exibem a competitividade e dialogam — com sucesso — aos anseios midiáticos, nos quais os resultados são enaltecidos. Do mesmo modo, grandes eventos que rememoram os espetáculos grandiosos, como abertura e encerramento de Copas do Mundo de Futebol ou Jogos Olímpicos, aludem à uma visão do indivíduo tão somente como espectador.

Contudo, características que outrora marcavam os festivais — como o ganhar e o perder, a surpresa e a originalidade, o público imponente e os ostentosos recursos cravados no inconsciente social — podem afastá-los de possibilidades pedagógicas. Defendidos como campos de experiências básicas, os festivais suscitam espaços onde ações são conhecidas, vividas e moldadas perante a atividade envolvida. Portanto, como ele é organizado e continuado é de fundamental importância para todos os envolvidos (GETZ, 2012).

Para Merleau-Ponty (2018), é por meio do nosso corpo que nos tornamos “seres-no-mundo”, de modo que o corpo é entendido como um campo disponível para múltiplas experiências. E essas situações sensíveis permitem que conheçamos e transformemos o mundo. Neste entendimento, a vivência particular e subjetiva de cada ser são valorizadas: “quer se trate do corpo de outro ou de meu próprio corpo, não tenho outro meio de conhecer o corpo senão vivendo-o, quer dizer, retomar por minha conta o drama que o transpassa e confundir-me com ele” (MERLEAU-PONTY, 2018, p. 269).

O corpo, portanto, é nossa projeção no mundo e é por meio do movimento que preparamos o espaço a ser explorado e vivido. Neste sentido, o movimento inaugura um processo de criação expressiva diante das coisas, conectando a per-cepção corpórea ao mundo. Passamos a experienciar o outro, o espaço, o tempo, compreendendo, não somente as coisas, mas, também, a si próprio.

A partir dessa compreensão, incorporamos um potencial de reflexão sobre as coisas do mundo, possibilitando, inclusive, transformá-las. Essa reflexão nos torna seres críticos sobre a realidade (SURDI e KUNZ, 2010). Por isso, as

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Dança na Escola

propostas no âmbito educacional devem possibilitar uma autonomia de movi-mento diante das experimentações e essa premissa não deve se perder quando tratamos dos eventos.

Os festivais artísticos proporcionam experiências sensíveis, sociais e de aprendizagem, e as apresentações artístico-estéticas são um de seus pontos-chave. São, afinal, as ocasiões em que indivíduos mostram determinada prática para um determinado público, como, por exemplo, os festivais de dança. Dessa forma, esses eventos oferecem o que chamaremos de “experiência estética”.

Pela perspectiva fenomenológica merleau-pontiana, a experiência estética é compreendida a partir de uma percepção sensível de quem cria um objeto estético e de quem o contempla. Existe uma relação social e individual que abarca o fenômeno, ou seja, há valores e significados culturalmente transmitidos, bem como há uma singularidade de quem o vivencia (REIS, 2011).

Assim, a experiência estética é uma ação perceptiva. Trata-se, porém, de uma percepção que “não é julgar, é aprender um sentido imanente ao sensível antes de qualquer juízo” (MERLEAU-PONTY, 2018, p. 63). A percepção estética não objetiva, portanto, uma visão utilitarista do que se mostra, mas convida o apreciador e o apresentador a senti-la.

Teóricos da corporeidade (MERLEAU-PONTY, 2018; NÓBREGA, 2016; SURDI e KUNZ, 2009), apontam-nos que o corpo revela nosso poten-cial de expressão e de criação, que sente, percebe e vive. É na experiência com si mesmo, que vamos compreendendo de modo sistêmico e espontâneo, os fenômenos (NÓBREGA, 2010). Uma vez que são espaços de experiências não comuns ao cotidiano (CUNDY, 2014), os festivais artísticos podem se apresentar, então, como momentos oportunos de uma aprendizagem sensível corpórea, em que emoções são postas em cena. De modo geral, os festivais proporcionam o encontro corpo-outro.

No contexto educacional, comumente presenciamos festas de fim de ano com apresentações de dança, de música e/ou de ginástica, em que os alunos mostram para os familiares e amigos o que foi aprendido, preparado e ensaiado. No entendimento da experiência estética, esses eventos podem proporcionar aos sujeitos o contato com a alteridade, com o novo, com algo não esperado, possibilitando o engajar do corpo na percepção de novas possibilidades, de

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Roberta Gaio | Tamiris Lima Patrício (org.)

outras formas de sentir e ver o mundo, de resolver problemas de forma rápida e criativa (REIS, 2011).

Proporcionar momentos do “se apresentar” aos estudantes é oferecer a esses corpos, espaços de expressão corporal, de linguagens outras e de relações intersubjetivas (NASCIMENTO, 2020). Experiências e sensações distintas ao habitual. O frio na barriga, as mãos suadas, o tremor das pernas (CARBINATTO et al., 2016). O olhar do público, o som das palmas, a energia que emana dos sorrisos. Sem esquecer do esquecido, o momento que o branco vem a mente — “o que eu faço agora?” — experiência que pode despertar o inusitado, a resposta rápida do improviso que ninguém percebeu como erro.

Do mesmo modo, pensar nas percepções e aprendizados do corpo que se apresenta, é significar o respeito necessário ao corpo que aprecia. No domínio do palco e dos sentidos a ele posto, o ser humano que ali se forma, compreende o esforço para além da qualidade da apresentação. A experiência estética então é contemplada.

Mas, para que toda essa “magia” ocorra, o Festival Artístico precisa ser planejado e organizado para tal. Os objetivos que envolvem os festivais nas instituições educacionais, sejam elas escolas, ONGs ou universidades, precisam estar alinhados com a possibilidade da experiência estética.

Desse modo, a proposição que aqui elucidamos — a organização de um festival artístico — perpassa um plano pedagógico influenciado por teorias educacionais em que os alunos são centrais e protagonistas das ações. Nossa proposta pedagógica se volta aos apontamentos fenomenológicos de uma educação baseada nas relações corpo-mundo e corpo-outro, em que o movimento e as expressões corporais são fundamentais no processo de aprendizagem. Dialogamos também com premissas da teoria freireana de uma “educação libertadora”, incentivando a autonomia e o entendimento sociocultural em que o aluno está inserido (FREIRE, 1996).

Importante apontar que propostas baseadas nas teorias acima postas, mesmo que bem estabelecidas no contexto educacional e condizente aos nos-sos objetivos enquanto educadoras, ainda sentem consequências das vertentes tradicionais que colocam o professor como protagonista do processo. Tais con-sequências atingem não somente os docentes — que apresentam dificuldades na mediação —, mas também os alunos que trazem em seus costumes a passividade de receptores de conteúdo.

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Dança na Escola

Em nossos projetos de extensão em ginástica na Universidade de São Paulo e, especificamente, em um estudo recente (HENRIQUE, 2020), identificamos a dificuldade dos professores com relação a mediação das aulas planejadas neste viés. Percebemos, então, que o limite entre mediar e direcionar é uma linha tênue e, por vezes, a falta de experiências prévias e o real entendimento teórico podem levá-los a desistência do plano pedagógico que coloca o aluno na centralidade do processo.

Neste sentido, tomamos a liberdade para indicar um plano de trabalho daquilo que realizamos com a organização do IX Festival Ginástico GYM-NUSP, da Escola de Educação Física e Esporte da Universidade de São Paulo, o primeiro Festival de Ginastica para Todos online do Brasil8 (CARBINATTO E EHRENBERG, 2020), apresentando nossas vivências como pesquisadoras, gestoras, educadoras e ginastas participantes, com o intuito de recomendar a comunidade acadêmica, sobretudo, os educadores que não possuem experiência na área em questão, um campo fértil de ideias que foram possíveis e positivas a um planejamento didático-pedagógico alinhado às bases teóricas acima apresentadas.

Salientamos que nossa ideia consiste no pressuposto de que os alunos possam participar ativamente na organização de um festival artístico, para além do compromisso do “se apresentar”. Igualmente, advertimos que nosso plano de trabalho não se trata de uma receita pronta ou um manual de uso! Há de se pensar as funções com as condições de cada espaço educacional e seus objetivos, reforçando o proposito deste capítulo que é apresentar nossas experiências, para então, inspirar novos projetos.

DE NOSSAS VIVÊNCIAS FESTIVAS: POSSIBILIDADES DE PRÁTICA

O IX Festival Ginástico GYMNUSP, que aconteceu pela primeira vez no formato virtual, foi idealizado por um processo de autonomia de um grupo de alunas e integrantes do Grupo Ginástico da USP, o GYMNUSP. Este processo vem sendo consolidado desde a criação do grupo (2015) pelas coordenadoras responsáveis, Michele Viviene Carbinatto e Monica Caldas Ehrenberg que,

8 O festival foi planejado e executado de forma remota devido a crise pandêmica causada pelo Covid19 no ano de 2020. Para saber mais acesse o canal do Youtube do GYMNUSP na lista de reprodução sobre o evento: <https://youtube.com/playlist?list=PLl19EN-XvzFoDfjBw5nmvPhO-jop7ZcDh9> Acesso em: 26/03/2021.

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também baseadas na perspectiva da centralidade do aluno, promoveram um ideal autônomo nas integrantes.

Dessa forma, duas alunas sugeriram o formato online do festival que, em decorrência da crise mundial causada pelo Covid-19, não ocorreria no ano de 2020. Com a aprovação das docentes responsáveis, o convite foi feito para todo o grupo e as reuniões e sistematizações das ações subsequentes foram sendo planejadas.

Apresentaremos nesta seção, um esquema dessas ações na organização e consolidação deste festival que é caracterizado pelo viés artístico-estético em que as educandas fizeram parte do todo festivo, desde sua idealização, gestão e logística, até as apresentações.

Em um perspectivar pedagógico, percebemos de antemão a importância de uma coordenação geral que tenha um responsável (exemplo: professor de educação física, docente de uma disciplina) direto da instituição ao qual o evento estará vinculado. Além da mediação de burocracias institucionais, foi preciso uma mediação pautada nos princípios e valores educacionais objetivados. As demais atuações foram do corpo de alunas, que se empoderaram do evento.

Assim, sete equipes de trabalho serão aqui expostas — a. secretaria executiva; b. programa artístico; c. programa visual e divulgação; d. programa técnico-logístico; e. programa de recepção; f. apoteose; g. programa de avaliação.

Figura 1 - Esquema Organizacional

Fonte: elaborado pelas autoras

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SECRETARIA EXECUTIVA

A equipe que constituiu a secretaria executiva do festival trabalhou de maneira direta com a docente responsável pelo evento e se comunicou continua-mente com os membros das outras equipes, uma vez que suas tarefas envolveram a garantia da unidade do evento.

Objetivo e dinâmica do evento caminharam em paralelo. Slogan e ati-tudes durante o fazer também. Dessa maneira, a coordenação intermediou as decisões e tarefas das equipes em prol do sucesso do evento.

Por consequência, foi responsabilidade da comissão: 1. Estabelecer reu-niões com os pequenos grupos de trabalho e delimitar direitos e deveres de cada um deles; 2. precisar as funções específicas de cada setor; 3. propor um cronograma de execução das tarefas; 4. estabelecer e cobrar prazos; 5. gerenciar horários de atuação; 6. sistematizar e mediar necessidades e ideias advindas dos alunos ao responsável da instituição e mediador principal do processo.

Foi importante que a secretaria executiva tivesse um canal de comuni-cação com todos os participantes — como um e-mail oficial para perguntas, ou caixa de perguntas alocada na instituição (se o evento for local e os participantes forem, por exemplo, de uma mesma escola). Em nosso caso, a secretaria veri-ficava diariamente a caixa de mensagem para garantir agilidade nas respostas.

PROGRAMA ARTÍSTICO

Esta equipe foi a responsável por elaborar o regulamento do festival e as inscrições para a participação.

Um regulamento orienta os interessados em como participar do festival em questão, a compreender o objetivo do evento, as possibilidades de apresentação, as condições de tempo e espaço que serão propostas, o tipo de festival (por exemplo, se competitivo ou festivo) e questões relacionadas aos direitos de imagem. Desta forma, acreditamos que um regulamento precisa apresentar os limites que prezam pela eficiência, segurança e dinamicidade do evento, tais quais: número de participantes por cada grupo/apresentação, quantidade de apresentações, tamanho do público.

Entendemos em nosso processo, que este documento necessitava do máximo de informação que poderia esclarecer as dúvidas dos participantes.

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Essas informações foram pensadas e elaboradas junto às outras equipes, sendo fundamental o alinhamento às premissas do evento.

Posteriormente, esta comissão administrou também a inscrição do evento. As inscrições foram realizadas de acordo com as informações estipuladas no regulamento e foram feitas em formato virtual (Google Forms.). Foi importante estipular o prazo de encerramento das inscrições, para que todas as equipes de trabalho pudessem se organizar perante a quantidade de inscritos. E, por fim, as inscrições foram formalmente confirmadas aos participantes.

Este documento pode conter informações relevantes a respeito da logística do evento como um todo. Com o intuito de exemplificar, detalhamos na tabela a seguir alguns pontos a serem pensados e, caso atenda a necessidade do seu evento, seja adicionado à inscrição:

Tabela 1 – Identificação do grupo participante

IDENTIFICAÇÃO DO GRUPO

Nome do Grupo

Responsável pelo Grupo

Contato do Responsável

Localidade (País/Estado/Cidade/Bairro/Escola...)

Quantidade de participantes

Nome, idade e RG de cada integrante

Fonte: elaborada pelas autoras

Tabela 2 - Identificação da apresentação

IDENTIFICAÇÃO DA APRESENTAÇÃO

Nome da coreografia (ou da apresentação artística em questão)

Referência musical

Tempo de apresentação

Release/Descrição

Iluminação necessária

Materiais de apresentação

Fonte: elaborada pelas autoras

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Para além dessas questões, foi importante um espaço que contemplasse a explicação e liberação de burocracias exigidas como: a. termos e condições referentes ao direito de imagem; b. consentimento ao regulamento do festival; c. consentimento do responsável legal (quando menor de 18 anos). Tais referências tornam-se ainda mais necessárias no mundo digitalizado, em que a mídia social e a divulgação de vídeos e imagens estão na palma das mãos de qualquer pessoa.

PROGRAMA VISUAL E DIVULGAÇÃO

Esta equipe foi a responsável pelo Plano de Mídia, ou seja, divulgar o fes-tival conforme o objetivo do evento. Neste sentido, a divulgação do nosso festival foi direcionada a um duplo público-alvo: participantes diretos e espectadores.

As alunas foram responsáveis pela elaboração da arte dos cartazes pro-mocionais, o layout de divulgação do festival, transformando-o em uma marca própria. Foi preciso pensar no nome, nas cores, nas letras, nos desenhos, slogan, tudo para que o objetivo do festival fosse contemplado e, na mesma medida, atingisse o público esperado. Aos poucos fomos criando uma identidade ima-gética do festival.

O programa visual foi responsável pela uniformidade documental: logo, folder, vídeos de divulgação, certificados, regulamento, seguindo a premissa do evento.

Como vivemos em uma era de íntima relação com as Redes Sociais, a utilização dessas plataformas foi uma estratégia interessante de divulgação. Realizamos postagens semanais com informações sobre o festival, vídeos moti-vacionais (criados pelas próprias alunas), lembretes com os prazos estipulados, criação de hashtags (#) para motivação e a facilidade em encontrar as postagens dos participantes, e lives sobre o evento.

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Figura 2 - Exemplo de arte de um festival artístico

Fonte: Acervo Grupo de Estudos GYMNUSP

PROGRAMA TÉCNICO-LOGÍSTICO

Optamos por indicar a equipe da técnica e logística uníssonas, mas ambas autônomas. Como um exemplo aleatório, a técnica precisa saber se haverá posicionamento de algum equipamento no palco/espaço cênico e é importante que a logística, após o posicionamento do material, repasse a técnica a afirmação de continuidade do evento. Isso significa que a comunicação entre elas precisa ocorrer em sintonia e irá refletir em um bom funcionamento no dia do evento.

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Em eventos presenciais, essa equipe precisar estar atenta no que diz respeito aos banheiros, cantinas, limpeza, condições meteorológicas, entre outras demandas que um espaço físico requer.

Se possível, é importante que a equipe técnica e equipe logística atuem com ensaios e testes de som, músicas, microfones previamente. Ademais, serão de responsabilidade do grupo os acertos referentes ao equipamento de audiovisual necessário (por exemplo, garantir que o equipamento esteja de acordo com o tamanho e objetivo do festival), como também o acerto sobre o espaço em que será realizado. Caso a instituição não possua um equipamento ou um espaço adequado, será imprescindível a contratação ou um empréstimo, dependendo das condições financeiras.9

Em nosso caso, no plano virtual, essa equipe estudou as plataformas de transmissão, realizando testes e ensaios prévios com todas as outras equipes. Discutimos cada detalhe, esclarecendo dúvidas e testando todas as possibilidades.

PROGRAMA DE RECEPÇÃO

A Comissão de Recepção foi a responsável pelo encaminhamento dos convites oficiais e formais, bem como o direcionamento da cerimônia por meio das “mestras de cerimônia”.

Comumente, esta equipe é responsável por confirmar presença de possíveis autoridades no evento, recepcioná-los, separar-lhes local específico (normalmente cadeiras frontais e centrais). Lista de inscritos, lista de convidados, lista de autoridades, identificação dos staffs deverá ser garantida. Também é responsável por garantir as bandeiras e mastros (se necessário), hino nacional e/ou outros importantes materiais, como o banner do patrocinador e agradecimento especial ao mesmo (se houver).

A condução cerimonial é, usualmente, atribuída a uma pessoa que faz os agradecimentos oficiais, garante as informações essenciais a serem apresen-tadas antes das apresentações e dialoga com o público. Ademais, atentam-se para garantir a ordem e organização de camarim/bastidores e/ou sala de espera.

9 Neste caso, indicamos uma equipe referente ao financeiro — grupo responsável por administrar as contas e os investimentos necessários para que o evento ocorra, organizando da mesma forma, estratégias de angariamento de recursos (venda de ingresso, rifas, venda de produtos...)

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Em nosso caso, seguindo a premissa da horizontalidade da relação docente-aluno, dividimos as falas entre todas integrantes da organização. Divi-dimos o festival por blocos de coreografia e cada integrante foi responsável por apresentar os grupos e os nomes das coreografias.

APOTEOSE

A apoteose de um evento é um encontro final, no qual todos os participan-tes se juntam ao público em uma grande festa de encerramento. Na perspectiva de prática corporal, é usual a proposição de uma composição coreográfica, com movimentos simplificados, para que todos os participantes (artistas/atletas, organizadores e espectadores) possam se movimentar em sintonia.

No nosso caso, esta comissão foi a responsável por escolher uma música e elaborar uma coreografia que estaria de acordo com os objetivos do evento. Foi preciso pensar em passos fáceis para que todos pudessem aprender e dançar conosco, celebrando e engrandecendo o final do festival.

Creditamos parte fundamental na constituição do festival artístico à apo-teose, pois entendemos que este momento seja um dos momentos auge do dia. A alegria e a satisfação por terem participado do evento envolvem e contagiam as pessoas presentes. É neste instante que os sorrisos transbordam, as palmas ecoam e os abraços entrelaçam a comunidade formada ao longo deste processo — a congregação de um trabalho feito.

AVALIAÇÃO

Obter o feedback dos participantes e do público sobre o festival é de suma importância para a avaliação do evento. Observar os pontos que foram creditados como positivos ou negativos é interessante para a conclusão do projeto pedagógico elaborado em volta da tarefa.

Em nosso festival, a equipe de avaliação foi a responsável pelo ques-tionário de avaliação, na mesma perspectiva que a ficha de inscrição, sendo elaborado virtualmente (Google Forms). Dividimos por seções de interesse (geral, coordenadores de grupo, participantes e público) o que facilitou nossa análise posterior. Para amparar futuras ações, exemplificamos algumas ideias de avaliação nas tabelas a seguir:

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Tabela 3 - Avaliação geral

Qual foi a sua função no festival?( ) Participante ( ) Coordenador de grupo ( ) Espectador

Qual a sua opinião geral do festival?( ) Excelente ( ) Satisfatório ( ) RuimQual a sua opinião sobre a duração do festival?( ) Excelente ( ) Satisfatória ( ) Ruim

Como você ficou sabendo do festival? ( ) Redes sociais ( ) Cartaz de divulgação ( ) Familiares/amigos ( ) Instituição proponente ( ) Outro. Qual? ______________.

Fonte: elaborada pelas autoras

Tabela 4 - Avaliação coordenadores de grupo

O regulamento estava claro e preciso quanto o processo de inscrição? ( ) Sim ( ) Não

O tempo de divulgação foi suficiente para a preparação para o festival? ( ) Sim ( ) Não

A comunicação com a organização do festival foi eficiente? ( ) Sim ( ) Não

A iluminação do festival foi considerada: ( ) Excelente ( ) Satisfatória ( ) Ruim

O som do festival foi considerado:( ) Excelente ( ) Satisfatório ( ) Ruim

O tempo destinado à cada apresentação foi considerado: ( ) Excelente ( ) Satisfatório ( ) Ruim

Comentários e sugestões:

Fonte: elaborada pelas autoras

Tabela 5 - Avaliação participantes

As informações sobre o festival estavam claras? ( ) Sim ( ) Não O espaço de apresentação estava adequado? ( ) Sim ( ) Não

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O espaço de espera (bastidores/camarim) estava adequado? ( ) Sim ( ) Não A iluminação do festival foi considerada: ( ) Excelente ( ) Satisfatória ( ) Ruim O som do festival foi considerado:( ) Excelente ( ) Satisfatório ( ) RuimComentários e sugestões:

Fonte: elaborada pelas autoras

Tabela 6 - Avaliação público

O espaço destinado ao público foi suficiente? ( ) Sim ( ) Não As sinalizações (toalete, lanchonete, entrada, saída) estavam bem localizadas? ( ) Sim ( ) NãoA visualização das apresentações foi considerada: ( ) Excelente ( ) Satisfatória ( ) RuimO som do festival foi considerado: ( ) Excelente ( ) Satisfatório ( ) RuimA qualidade das apresentações foi considerada: ( ) Excelente ( ) Satisfatória ( ) RuimComentários e sugestões:

Fonte: elaborada pelas autoras

É importante ressaltar que cada festival tem suas particularidades. Desta forma, acentuamos — uma vez mais — o fato de que nossas sugestões são inspirações e não modelos prontos e aplicáveis em qualquer cenário. É preciso pensar nos objetivos do evento e suas necessidades. As Tabelas 3, 4, 5 e 6 são exemplos de possíveis formatos de avaliação.

SABERES DESVELADOS AO SENSÍVEL, SABERES DESVELADOS AO CORPÓREO

As possibilidades de convivência com o corpo inspiram questões fenome-nológicas entre professores de Arte e Educação Física, em que as experimentações das técnicas que envolvem o corpo, a tonicidade e a linguagem do gesto, inspiram o olhar filosófico para a experiência sensível. No entanto, Nóbrega (2010) aponta que essa filosofia não se restringe a esses professores, uma vez que aborda uma reflexão ampla sobre a educação, particularmente em escolas e universidades.

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O corpo que vive e, desta forma, experiencia o mundo tem no movi-mento sua dinâmica com o meio ambiente (ANDRIEU, 2019). Os atos se transformam em uma dialética com a percepção corpórea e a corporeidade e nos revelam enquanto seres humanos. No sentido educacional, “assumir o sentido de corporeidade é estar compromissado em ser mais, em caminhar no encontro do outro, do mundo e de si mesmo. Isso é compromisso com cidadania” (MOREIRA, 2019, p. 27).

Oportunizar o envolvimento dos educandos no processo logístico de um festival artístico é ir ao encontro da proposta fenomenológica de que apreendemos o mundo pelo corpo. Antes de um pensamento elaborado, existe a percepção sensível (MERLEAU-PONTY, 2018). Revelando-se como agentes, as dis-centes tomaram o evento para si. Como agentes responsáveis, tornaram cada situação-problema um novo conhecimento a se incorporar e, logo, um novo reconhecimento de si mesmo.

Concebemos o saber incorporado quando, desmembrado pela percepção, configura-se em uma linguagem sensível. A corporeidade, portanto, “é considerada um campo de experiência e reflexão, a partir do qual se desdobram possibilidades epistemológicas, éticas, estéticas, sociais e históricas” (NÓBREGA, 2010, p. 35).

Esse processo na constituição do festival poderá suscitar saberes relativos à tecnologia, produção artística, organização logística, tabelas, fichas cadastrais, entre outras demandas que ao planejar e executar um evento serão requisitadas. Uma articulação interdisciplinar pode promover possibilidades de saberes ainda mais significativos entre docentes e discentes.

Contudo, não perdemos de vista a relação com os outros. Em todas as equipes acima exemplificadas — bem como outras funções que podem vir a surgir — só serão bem-sucedidas quando o grupo caminhar na mesma direção. O processo invocará diálogos, opiniões diversas, protagonismos de uns, dificuldades de outros. A relação corpo-outro será constante do início ao fim.

Como proposto na Figura 1, as equipes mantiveram contato frequente. A articulação das ações precisava estar alinhada e bem definida para o sucesso do festival e exigiu das educandas um ser expressivo, que encontrou nos gestos, nas relações amorosas, nos afetos, nas palavras ditas suas possibilidades de ação e conhecimento (NÓBREGA, 2010).

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Movendo um corpo em direção ao outro, compreende-se as suas múltiplas significações. Merleau-Ponty (2018) nos ajuda a refletir sobre essas questões do universo do sensível, alertando que nesta perspectiva educacional, convidamos os alunos a uma convivência ética com o corpo, uma abertura ao mundo e a reversibilidade dos sentidos, enaltecendo, quem sabe, a profundidade do encon-tro e dos acontecimentos, tornando-os parte de uma história. Nas palavras de Moreira (2019, p. 35)

Corporeidade é voltar os sentidos para sentir a vida em: olhar o belo e respeitar o não tão belo; cheirar o odor agradável e batalhar para não haver podridão; escutar palavras de incentivo, carinho, de odes ao encontro, e ao mesmo tempo buscar silenciar, ou pelo menos não gritar, nos momen-tos de exacerbação da racionalidade e do confronto; tocar tudo com o cuidado e a maneira de como gostaria de ser tocado; saborear temperos bem preparados, discernindo seus componentes sem a preocupação de isolá-los, remetendo essa experiência a outros no sentido de tornar a vida mais saborosa e daí transformar sabor em saber.

O entendimento que perpassa a fenomenologia e que nos embasa teo-ricamente com o exemplo descrito revela a compreensão da existência humana como algo em andamento, onde há sempre o que conhecer. E, para tal, a afeti-vidade mobiliza nossa vida, como a operação principal das significações e das comunicações (NÓBREGA, 2010). No viés pedagógico, percebemos nossos alunos como seres que dialogam na perspectiva do “eu sinto”. Afinal, “percebo primeiro uma outra sensibilidade e somente a partir daí um outro homem e um outro pensamento” (MOREIRA, 2019, p. 26).

QUE VENHA O ESPETÁCULO!

Assíduas de eventos de diversas naturezas, compreendemos que os even-tos, por si só, ensinam. Observar, olhar, interagir com as pessoas no contexto festivo elucida o aprender. O que trazemos aqui é que mesmo no ensino formal é possível ir além. Voltar o processo na centralidade do aluno. Mediar ideias que partem dos protagonistas. Não apenas permitir que eles se apresentem, mas que também planejem. Não somente receber, mas fazer junto!

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Considerações referentes à autonomia do aluno como parte de um ideal educacional (FREIRE, 1996) fazem parte desta proposta pedagógica. Contudo, o papel do docente como mediador e facilitador se faz fundamental e, aqui, muito provável, que se encontre um dos maiores desafios desta função.

Oferecer liberdade de movimento e criação, não significa deixá-los sozinhos e desamparados. Na contramão das metodologias de ensino em que o protagonismo se encontra no professor, propostas como essa podem assustar o educador e os alunos. Desabituados com a autonomia dos educandos, se não bem estudada e planejada, o projeto em questão pode ser um grande desastre.

São necessárias a presença constante, a participação nas reuniões, o acompanhamento das decisões e a intervenção educativa no auxílio da reso-lução dos problemas. O docente cria uma relação horizontal com os alunos, ensinando e aprendendo com eles. Oferecendo suporte teórico, emocional e material. Sentindo as conquistas e os erros, corrigindo e sendo surpreendido a cada passo. Compondo um “ser-junto”.

Há de se impor e, por vezes, decepcionar por não acolher aquela ou esta decisão. Mas no fazer em conjunto a solução é certa e o sentimento de pertencimento de quem fez acontecer recompensará o desgaste das discussões.

O experienciar de cada função fornecerá descobertas significativas na vida de cada integrante — positiva ou negativa. O movimento de cada ação disponibilizará diferentes espaços de relação corpo-mundo. Os saberes farão sentido na prática. O reconhecimento das tarefas ampliará o conhecimento do mundo dos eventos, das práticas corporais, da experiência estética presente nos festivais artísticos.

Claramente, cada instituição tem suas peculiaridades. Equipes outras podem ser formadas e requeridas. E, na mesma ideia, equipes que aqui foram mencionadas, serem dispensadas. Por isso, retomamos o alerta de que nossa proposta não se finda em um manual de uso, mas sim uma inspiração. Um abrir de olhos para a potencialidade embutida nesses eventos.

REFERÊNCIAS

ANDRIEU, Bernard. No Jogador, o campo: a emersão do espaço corporal em Merleau--Ponty. In: NÓBREGA, Terezinha Petrucia; CAMINHA, Iraquitan de Oliveira (orgs.). Merleau-Ponty e a Educação Física. São Paulo: Liber Ars, 2019.

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CARBINATTO, Michele Viviene; EHRENBERG, Mônica Caldas. Festival Ginástico e Isolamento Social: Retratos de um Evento On-line. Curitiba: Editora Bagai, 2020.

CARBINATTO, Michele Viviene; MOREIRA, Wagner Wey et al. Avaliação em Dança: o caso dos festivais universitários da Educação Física. Revista Pro-Posições, Campinas, v. 27, n. 3 (81), set/dez. 2016.

CARBINATTO, Michele Viviene; REIS FURTADO, Lorena Nabanete. Choreographic process in gymnastics… Science of Gymnastics Journal, v. 11, Issue 3, p. 343-353, 2019.

CUDNY, Waldemar. The phenomenon of festivals: Their origins, evolution and classi-fications. Anthropos, v. 109(2), p. 640–656, 2014.

EICHBERG, Henning. Sport as festivity: Education through festival. Physical Culture and Sport. Studies and Research, v. 1, p. 68-78, 2007.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

GETZ, Donald. Event studies: Theory, research and policy for planned events. Rout-ledge, Londres e Nova York, 2012.

HENRIQUE, N. Aula centrada no aluno e aula centrada no professor: experiência na ginástica para todos. 2020. 102 f. Dissertação (Mestrado em Ciências) – Escola de Educação Física e Esporte, Universidade de São Paulo, São Paulo. 2020.

KUNZ, Elenor. Esporte: uma abordagem com a fenomenologia. Movimento, Porto Alegre, ano VI, n. 12, 2000/1.

LACINCE, Nelly; NÓBREGA, Terezinha Petrúcia. Corpo, dança e criação: conceitos em movimento. Movimento, Porto Alegre, v. 16, n. 03, p. 241-258, jul./set., 2010.

MERLEAU-PONTY, Maurice. Fenomenologia da Percepção. Tradução de Carlos Alberto Ribeiro de Moura. 5ª edição. Editora WMF Martins Fontes, São Paulo, 2018.

MOREIRA, Wagner Wey. Merleau-Ponty na sala de aula e na beira do campo: contri-buições para a área da Educação Física/Esportes. In: NÓBREGA, Terezinha Petrucia, CAMINHA, Iraquitan de Oliveira (orgs.) Merleau-Ponty e a Educação Física. São Paulo: Liber Ars, 2019.

NACIMENTO, M. M. Dança e conhecimento: reflexões sobre o corpo vivido. Motri-vivência, Florianópolis, v. 32, n. 62, p. 01-17, abr./jun., 2020.

NÓBREGA, Terezinha Petrucia. Corporeidades: Inspirações Merleau-Pontianas. Natal: Editora da IFRN, 2016.

NÓBREGA, Terezinha Petrucia. Uma Fenomenologia do Corpo. São Paulo: Editora Livraria da Física, 2010.

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Dança na Escola

REIS, Alice Casa Nova. A experiência estética sob um olhar fenomenológico. Arquivos Brasileiros de Psicologia, Rio de Janeiro, v. 63 (1), p. 1-110, 2011.

SURDI, Aguinaldo César; KUNZ, Elenor. A Fenomenologia como Fundamentação para o Movimento Humano Significativo. Movimento, Porto Alegre, v. 15, n. 02, p. 187-210, abr./jun. de 2009.

SURDI, Aguinaldo Cesar; KUNZ, Elenor. Fenomenologia, movimento humano e a educação física. Movimento, Porto Alegre, v. 16, n. 04, p. 2063-290, out./dez. de 2010.

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ORGANIZADORAS

ROBERTA GAIO é doutora em Educação; mestra em Educação – Educação Motora; especialista em Ginástica Rítmica e Motricidade Humana; graduada em Educação Física e autora de vários livros, entre eles Ginástica Rítmica Popular: uma proposta educacional e Para além do Corpo Deficiente: histórias de vida, ambos publicados pela Fontoura. Professora dos Programas de Pós-Gra-duação - Mestrado em Educação Física na Universidade Metodista de Piracicaba/SP de 2000 a 2006 e Mestrado em Educação do Centro Universitário Moura Lacerda de

2009 a 2011. Idealizadora, coordenadora e professora do projeto de Extensão - Ginás-tica Rítmica Popular - da Universidade Metodista de Piracicaba/SP de 1989 a 2006, com representação da cidade Piracicaba nos Jogos Regionais e Abertos. Atualmente, é professora do Centro Universitário Salesiano de São Paulo Liceu (Unisal/Campinas), Coordenadora do projeto de extensão Grupo de Ginástica e Dança do Unisal e Membro do Grupo de Pesquisa – Corpo, Gênero, Corporeidade, Ensino e Multiculturalidade da UFAM/CNPq.

ORCID: 0000-0002-0378-3616

TAMIRIS LIMA PATRÍCIO – Doutoranda em Educação Física, na área de Estudos Socioculturais e Comportamentais da Educação Física e Esporte, Mes-tra em Educação Física, na área de Educação Física e Sociedade, linha de pesquisa em Ginástica Para Todos / Ginástica Geral, Graduada em Educação Física (modali-dade bacharelado e Licenciatura). Foi docente na área de Ginástica na Universidade Nove de Julho- UNINOVE e no Centro Regional Universitário de Espírito Santo do Pinhal- UNIPINHAL. É membro do Grupo de Pes-

quisa em Ginástica - GPG, da FEF-UNICAMP. É membro do Grupo de Estudo em Ginástica da USP- Gymnusp.

ORCID: 0000-0003-3867-4302

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AUTORES/AUTORAS

ANTÔNIO SÉRGIO MILANI - Mestre em Educação Física, especia-lista em Metodologia do Treinamento Personalizado e Ergonomia, especialista em Gestão Cultural (CPF/Sesc), graduado em Educação Física. Autor do livro Dança Educação Contemporânea – uma abordagem interdisciplinar da dança (Lura), coautor dos livros Corpo e Educação (Paco) e Natação Infantil (Supimpa). Bailarino e coreógrafo profissional por 25 anos. Professor do Programa de Pós-Graduação em Dança e Educação Física Escolar nas Universidades FMU e Estácio de Sá (SP). Consultor e coach na Millanium Movimento Creativo. Pesquisador em desenvolvimento humano, dança, motricidade, pilates e lin-guagem corporal não verbal.

ORCID: 0000-0003-1087-6244

CRISTIANE CAMARGO - Doutora em Saúde da Criança e do Adolescente, mestra em Educação Física, Saúde e Qualidade de Vida, especia-lista em Psicomotricidade e Pedagogia do Movimento, graduada em Educação Física e autora de capítulos de livros e artigos científicos na área. Professora do Centro Universitário Salesiano de São Paulo Liceu (Campinas) e da Fundação de Ensino Superior de Bragança Paulista.

ORCID: 0000-0002-8563-7902

GINA DA SILVA GUIMARÃES - Mestre em Educação; Especialista em Educação Física Escolar e em Ensino da Dança. Graduada em Licenciatura Plena em Educação Física. Atuou como professora de Educação Física na Edu-cação Básica, em escola pública e privada; em cursos de Licenciatura, Bacha-relado e Formação Continuada em Educação Física assim como coordenadora em Programas de Saúde Coletiva. Atualmente é doutoranda em Educação; atua como professora tanto no ensino superior, abordando temas como dança, ginástica, projetos didáticos, prática pedagógica, ginástica laboral, assim como na atenção à saúde do trabalhador.

ORCID: 0000-0002-4490-1404

IANA PEREIRA LEÃO - Especialista em Dança Educacional; gra-duanda em Pedagogia e graduada em Direito. Atua como diretora e docente da

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IanaLeãoBallet, inserida na escola MAF. Atuou no projeto Dança nas Escolas, FUNCART, em escolas da rede municipal de Londrina (2019). Atuou como professora de balé na Escola Municipal de Dança de Londrina (FUNCART) de 1998 a 2000 e em 2015. Atuou como bailarina no balé Guaíra Norte, filiado ao Balé do Teatro Guaíra, e Oficina de Dança de Londrina, de 1983 a 1992. Profissionalizou-se em danças clássicas em 1990.

ORCID: 0000-0001-5028-2155

IDA CARNEIRO MARTINS - Doutora em Educação – Formação de Professores, mestra em Educação Física – Pedagogia do Movimento, especia-lista em Educação Motora na Escola e Educação Física na Educação Infantil, coautora do livro Aulas de Ensino Médio, organizadora do livro No Palco da Infância; publicou artigos e capítulos sobre as temáticas de jogos, brincadeiras, e movimento e suas contribuições ao desenvolvimento infantil. Professora do Programa de Pós-Graduação em Educação e do Mestrado Profissional em Formação de Gestores Educacionais da Universidade Cidade de São Paulo.

ORCID: 000-0001-7140-159

JAQUELINE SOUZA DA COSTA – Mestranda em Educação Física - área de desenvolvimento na USP, pós-graduanda em Personal Training: Metodologia de Preparação Física Personalizada., graduada em Educação Física (bacharel), Professora de judô no Esporte Clube Pinheiros.

ORCID: 0000-003-3076-7221

JOSE IVO JUSTINO JUNIOR – Especialista em Ginastica Rítmica; graduado em Educação Física; graduando em Enfermagem; Treinador de Ginastica Rítmica Associação Reverence (2019). Professor de balé clássico na Fundação Cultural de Ibiporã (2013). Premiado como melhor bailarino do festival de dança do Mercosul dois anos consecutivos (2011-2012). Professor de balé clássico no centro de treinamento de Ginastica Rítmica Unopar (2012). Bailarino profissional do balé de Londrina (2009-2015). Aprovado na prova do DRT- Paraná função Bailarino (2008) Paraná. Aluno da Fundação Cultural de Londrina (Funcart 2005-2009) Aluno do Centro Cultural Escola de Dança Teatro Guairá Curitiba/ Paraná.

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ORCID: 0000-0003-4550-0546

JUSSARA DA SILVA ROSA TAVARES - doutoranda em Artes Cêni-cas, Mestra em Educação Física, Graduada em Educação Física, Professora do curso de Dança da Universidade Federal de Sergipe, Pesquisadora do Grupo Ardico/UFS, do grupo de pesquisa GPPAC/USP e do grupo de Dança e Extensão Aldeia Mangue/UFS.

ORCID - 000-0002-6498-1739

KARINA PAULA DA CONCEIÇÃO - Mestranda em Educação. Pós Graduanda em Psicologia do Esporte. Licenciada e Bacharelada em Educação Física. Bolsista CAPES (edital 008/2012) Programa de Licenciaturas Inter-nacionais - PLI - Portugal 2012/2014. Coordenadora do Núcleo Jovem do Projeto “Educação Caminhos Possíveis”. Professora de Dança no Colégio São Miguel Arcanjo e no Grupo de Assessoria Esportiva Bem Me Quer Sports.

ORCID: 0000-0001-8849-4006

MARIANA MAFRA VICENTINI - Especialista em Fisiologia do Exercício, graduada em Pedagogia. Pesquisadora de Ginástica de Academia. Certificado pelo Cref nº 017206-P/SP. Bailarina e professora de Ballet (DRT nº 986). Pesquisadora em mat pilates para gestantes e patologias da coluna na Gravital Pilates; certificada pela Gravity Brazil em Mat Pilates, Gravity Pilates Sistema Basic, Intermediate; e treinadora de gravity pilates para novos instrutores.

ORCID: 0000-0002-7913-3628

MARÍLIA CAMARGO ARAÚJO - Especialização em Dança e Cons-ciência Corporal; Graduada em Educação Física e em Pedagogia; coordenadora pedagógica da rede municipal na cidade de Santa Bárbara d’Oeste – SP; pro-fessora de educação física da rede estadual, também na cidade de Santa Bárbara d’Oeste; integrante do Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Educação Física Escolar (EscolaR) – FEF Unicamp; administradora da página do Instagram Dança na Escola (@danca_naescola).

ORCID: 0000-0002-0004-3620

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MICHELE VIVIENE CARBINATTO - Doutora em Educação Física, Mestre em Educação Física e licenciada e bacharel em Educação Física. Docente na Universidade de São Paulo (USP) na Escola de Educação Física e Esportes, Departa-mento de Esporte. Orientadora de mestrado e doutorado no curso de pós-graduação da EEFE/USP. Realizou estágio de Pós-Doutorado no Teachers College da Uni-versidade de Columbia (Nova Iorque / EUA). Líder do grupo de estudos e pesquisa GYMNUSP e pesquisadora do grupo NUCORPO. É Coordenadora Técnica da modalidade Ginástica Para Todos da Confederação Brasileira de Ginástica.

ORCID: 0000-0001-6598-9938

NATALIA MAESKY BATISTA - Formada em Educação Física (bacha-relado). Atua na Primax Academia da cidade São Paulo/SP.

ORCID: 0000-0003-2096-9516

PALMIRA LIRA - Mestre em Educação, Especialista em Ginástica Rítmica, Graduada em Educação Física e Técnico em Desporto. Atuou como professora de Educação Física em escola pública e privada. Atualmente professora de Ginástica e Dança no ensino superior.

ORCID: 0000-0001-6774-0896

PALOMA T. F. ROCHA - Doutora e Mestre em Educação com expe-riência profissional em formação docente. Especialista em Educação Física Escolar e Graduada em Educação Física, participou como coordenadora de núcleo do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID) na Licenciatura em Educação Física. Atua desde 2008 na Educação Básica, trabalhando com crianças e adolescentes do Ensino Fundamental. Professora de Educação Física da rede Municipal de Ensino da Prefeitura de São Paulo.

ORCID: 0000-0003-1853-7984

REGINA PENACHIONE - Mestrado em Educação, graduação em Licenciatura Plena em Letras Português e Inglês. Atualmente é professora mestra do Centro Universitário Salesiano São Paulo, lecionando como disciplinas de Comunicação e Expressão, Metodologia do Trabalho Científico, História da Educação, Currículo, Avaliação da Aprendizagem e Redação e Expressão Oral.

ORCID: 0000-0001-9867-5150

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ROBERTO GIMENEZ - Doutorado em Educação Física. Mestrado em Educação Física. Graduado em Pedagogia. Licenciado e Bacharelado em Educação Física. Docente e Coordenador dos cursos de Educação Física e do Programa de Mestrado e Doutorado em Educação na Universidade Cidade de São Paulo.

ORCID: 0000-0002-4953-5941

SIDNEY LEANDRO DE OLIVEIRA - Mestre em Dança e graduado em Dança – Licenciatura. Participante do Grupo de estudos Gira/UFBA e do grupo de Dança e Extensão Aldeia mangue/UFS. Atua com foco nos processos de criação em Dança, com temas relacionados as culturas populares, gêneros, sexualidades e interseccionalidade.

ORCID: 0000-0002-0733-0905

VICTOR TCHIYA SOARES - Licenciado em Teatro pela Faculdade Paulista de Artes (FPA). Ator (DRT n. 0046589/SP). Na função de Diretor Teatral. Professor de Arte da rede pública de ensino de Osasco. Especialista em Dança e Consciência Corporal pelo Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU), Especialista em Corpo e Movimento pela Faculdades Unificadas do Estado de São Paulo (Fauesp) e certificado no Método Dança Educação Contemporânea. Atuou junto com a Companhia Teatral 5%, projeto de pesquisa sobre a “Depressão” que culminou na encenação “O Buraco: sou o que sou sem querer”; ator em Companhia’s Teatrais do eixo Minas Gerais - São Paulo.

ORCID: 0000.0003.1871.4418

VIVIAN IWAMOTO: Doutoranda em Educação, Mestre em Educa-ção, Especialista em Dança e Consciência Corporal, Graduada em Educação Física Licenciatura e Bacharelado. Atualmente, Coordenadora do Curso de Educação Física semipresencial e Docente do Curso de Educação Física do Centro Universitário da Grande Dourados (UNIGRAN). Diretora e professora da escola de dança Studio Tiaki. Pesquisadora na área de Educação Física e Educação, com ênfase em Dança, Ginástica, Jogo, Infância, Memória, Imigração e Cultura Japonesa.

ORCID: 0000-0003-0965-2534

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ÍNDICE REMISSIVO

Aações críticas 5, 75apreciação 10, 83, 91, 101, 140, 152, 159, 193arte 6-9, 14-15, 17-18, 20-21, 25, 27, 31-32, 35-40, 43-44, 46, 48-55, 57-59, 82-90, 92-98, 101-102, 111, 127, 129-130, 132-133, 140-141, 144, 162-163, 170, 186-187, 189, 192-193, 196-197, 209-212, 221-222, 228, 236, 254, 256-260, 268, 272, 274, 276-284, 288, 290-291, 293, 296-297, 299, 309-310, 314, 325Bbalé 6, 9-10, 36-43, 167, 189-204, 209-211, 260, 322batalhas 6, 10, 230-231, 242-248, 253-254breaking 234-235, 238, 240-241, 251Ccarnaval 5, 9, 110-116, 118-124, 126-128, 130-131, 133-136, 146complexidade 8, 64, 76, 78, 80, 82, 86-87, 97, 110, 121, 146composição coreográfica 127, 140, 299, 312conhecimento 7, 15, 17, 48-49, 52-53, 59, 73, 75, 77-82, 85, 87-88, 90, 92-97, 108, 114, 120-123, 127, 129, 134, 136, 138-141, 146-151, 157-158, 162, 168, 171-175, 180, 182, 184, 192-193, 196-197, 203, 210, 216, 223, 234, 237, 242, 246, 248, 255-256, 259-260, 263, 270, 275-278, 280, 288, 293, 297-299, 315, 317-318consciência corporal 11, 103, 175-176, 179, 281, 287, 298, 323, 325

corpo 7-9, 11, 17-20, 22, 24-29, 33-34, 37, 40, 42, 48-50, 52, 54-59, 73-74, 83-86, 89-90, 93-94, 97, 100-102, 106, 108, 115, 126-128, 132, 136-137, 139, 141, 150, 162, 165, 168, 178-179, 190, 196-197, 201-203, 218-219, 223-226, 228, 234, 238-239, 241-242, 246, 251, 253, 255-256, 274-275, 278, 280-287, 289-290, 292, 296-299, 302-304, 306, 314-316, 318, 320-321, 325criação 6, 8, 10, 20, 25-26, 39, 52, 62, 73, 83-85, 89, 91-92, 120, 126, 129-130, 133, 136, 144, 151, 155, 165-169, 173, 193, 210, 214, 216-223, 226-228, 233, 240, 242, 245, 247-249, 251, 253-255, 259, 290-291, 302-303, 305, 309, 317-318, 325criatividade 82, 89, 128-130, 132-133, 155, 157, 168-172, 176-178, 180, 182, 186-189, 192, 198, 231, 244-245, 248-249, 254, 278, 280, 284cultura 7-10, 13, 17, 19, 27, 30, 32, 50-55, 74-75, 77, 83, 86, 91-92, 94-98, 111, 114-117, 119-121, 126-127, 129-132, 134, 136-137, 139, 141, 145-146, 158, 162, 165-166, 172, 184, 186, 192, 199, 210, 212, 214, 218, 224-225, 230-243, 246-249, 252-254, 258, 262-270, 272-273, 275, 292, 296, 325cultura de massa 214, 263, 266-267Ddança contemporânea, 296dança educativa 173, 274, 298-299dança popular 34, 140, 145, 163danças urbanas 234, 237, 243, 254, 256, 260desenvolvimento infantil 73, 105, 322

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Eeducação formal 111, 117-119, 127, 134, 189, 193, 258, 282educação não formal 127enredo 61-63, 65, 73, 99, 113, 116, 124, 157-158, 198escola 5-11, 14, 17, 38, 41, 43, 45-46, 48, 50, 52, 55-57, 59-60, 65, 74-85, 88-91, 93-98, 100-102, 105, 108, 110-111, 114, 116-123, 125, 127, 131-132, 134-135, 137-138, 140, 147, 149, 151-152, 158-160, 163-165, 171, 173, 175-176, 186-187, 189-195, 198-199, 201, 209, 211-212, 214-217, 220-222, 224-225, 231, 236-237, 242, 244, 248-249, 252-255, 258, 261, 274, 277-278, 280-281, 291, 296-299, 305, 307, 318, 321-325escola de samba 116-117, 132estágios de aprendizagem 197-198estratégias de ensino 149, 198, 213expressão corporal 5, 9, 25, 56-57, 73, 90, 104, 106, 165, 167, 171, 173, 175, 248, 278, 281, 304Ffestival artístico 304-305, 310, 312, 315folc lore 142, 144-145, 162-163, 199, 277formação de professores 7, 10, 259, 277, 322freestyle 238, 240-241, 265frevo 91, 115-116, 126, 128, 132-133, 146-147, 152-154, 159, 162, 260fruição 89, 92, 120, 221funk 6, 10, 48, 91, 126, 234, 240, 256-257, 262-271, 273

Hhabilidades motoras 9, 15, 99, 104, 109, 166, 191-192, 201-202, 276hip hop 10, 51, 54, 91, 235, 242, 256, 263-265história 5, 8, 14, 17-18, 23-24, 31, 41, 46, 48-50, 52-55, 58, 60, 63, 66-67, 75, 77, 92-93, 95, 113, 123, 130-133, 135, 139-141, 143, 145, 147-148, 152-153, 156, 158, 162-166, 170, 187, 189, 192, 198, 200, 202, 211-212, 218, 231, 233, 246, 248, 255-256, 259, 261, 265, 269, 271, 280, 282, 297, 316, 324Iimprovisação 9, 60, 84, 90, 140, 154, 163, 193, 218-219, 228, 231, 243, 245-247, 254-255, 291investigação 101, 275, 296Jjogo de faz de conta 60-64, 73, 99jogo dramático 198, 200, 213Lliberdade de expressão 39, 167, 176, 179, 182, 185, 231, 240-241, 248linguagem 5, 18, 20, 23, 42-43, 48-50, 53, 55, 58, 60, 63-64, 73, 75-76, 82, 84, 87, 91, 95-96, 104, 140, 142, 172, 202, 216, 218, 221, 228, 232, 237, 242, 248, 250, 253, 255, 257-259, 261-262, 271-272, 276, 283, 314-315, 321ludicidade 9, 124, 174, 291Mmanifestação cultural 19, 83, 110, 116, 120, 128, 132, 236, 253metodologias ativas 5, 9, 138-139, 147-149, 151, 154, 160-164motricidade humana 97, 284, 320

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movimento 6-8, 11, 20, 23, 25, 31, 36, 38, 43-45, 48, 51-52, 55, 57-59, 63-64, 73-74, 77, 83, 89-91, 93, 95-97, 99-101, 107-109, 111, 115-116, 123, 126, 129, 131, 136, 139-142, 163, 165, 167-168, 172-174, 179, 181, 187-188, 191, 196-198, 211, 214, 217, 219, 222-223, 231-232, 235-236, 239-240, 242-243, 245-248, 250-255, 258-259, 262-265, 267-270, 274-275, 278, 280-281, 283-287, 290-292, 298, 301-304, 315, 317-319, 321-322, 325musicalidade 9, 103, 106, 109Ppercepção 15, 109, 189, 291, 297, 315popping 234-235, 238-241, 251, 264práticas pedagógicas 80, 83, 139, 160, 162, 167, 172processo 8, 11, 14, 21, 26, 54, 56-58, 60, 62-66, 73, 77, 82, 84, 86, 88-89, 95, 98, 102-103, 105, 117, 123, 135, 139, 148-149, 151, 157-158, 160-161, 165-166, 168, 170-173, 185-186, 192-193, 195-199, 201, 212, 216-219, 225, 227-228, 243, 245-246, 250, 265-267, 270, 280, 302, 304-305, 307, 312, 315-316Rreflexão 40, 51, 73, 83, 88-89, 91, 94, 120-121, 157, 161, 165, 172, 175, 189, 269, 274, 277, 296, 298, 302, 314-315repertório motor 170-171, 181-182, 184, 241ritmo 8, 14, 28, 30, 40, 46, 52-53, 57, 68, 85, 91, 96-97, 100, 103, 105-107, 115, 121, 123, 129-131, 133, 141, 145, 152, 159, 163, 177-179, 184, 197-198, 200, 202-203, 233-234, 240, 265rudolf laban 90, 166

Ttecnologias da informação e comuni-cação 138, 148