OS ADOLESCENTES EM CONFLITO COM A LEI NO CONTEXTO DO ESTADO NEOLIBERAL PALAVRAS-CHAVE
Em debate, os debates: apontamentos sobre os encontros televisivos entre os candidatos à Prefeitura...
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XIII POLITICOM – São Paulo (SP) - 05 a 07 de Novembro de 2014
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Em debate, os debates: apontamentos sobre os encontros televisivos entre os
candidatos à Prefeitura de Belo Horizonte em 20121
Jonathan Goudinho2
Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais
RESUMO
O artigo foi escrito a partir da análise dos debates eleitorais de televisão realizados durante a
campanha à prefeitura de Belo Horizonte em 2012. A escolha do objeto foi feita a partir da
compreensão de que há carência de estudos que se debrucem na análise do debate eleitoral em
relação com a comunicação. Em geral, os estudos empreendidos na temática se ocupam mais em
analisar a abrangência e/ou recepção do acontecimento midiático configurado pelo debate. A
proposta deste trabalho, porém, é estudar o debate enquanto produto – e, por ora, gênero – do
jornalismo, da política e da televisão. Foram considerados os debates eleitorais feitos pelas
emissoras Band Minas, Rede TV! e Globo Minas, com a participação de quatro dos sete
candidatos. Como critérios de análise, foram escolhidos aspectos como formato, limites
temporais e pluralidade temática. Desta maneira, é possível empreender discussão sobre o papel
do debate televisivo no processo eleitoral contemporâneo, no sentido de compreender se este
produto/gênero, de fato, promove debate.
PALAVRAS-CHAVE: debates; televisão; comunicação política; jornalismo político; eleições.
Introdução
Em uma sociedade fortemente midiatizada, as relações entre as pessoas se dão de duas
maneiras: face a face ou mediadas por veículos de comunicação. Um dos setores sociais que se
readequou às novas ordenações sociais e midiáticas foi a política – estudada aqui em seu viés
eleitoral. Buscando novos instrumentos e ferramentas que aprimorem o processo de busca e de
conquista do voto, os políticos e os partidos perceberam na televisão um importante meio de
comunicação para fortalecer e disseminar seu discurso.
Sabe-se que com o advento da sociedade do espetáculo, a televisão ocupou espaço
fundamental nas discussões e debates públicos – além, é claro, no próprio entretenimento.
Thompson (2005) defende que a televisão alterou o modo de interação dos indivíduos, a partir do
momento em que dispensou a partilha de um lugar comum e a comunicação dialógica das
1 Trabalho apresentado ao GT 3 – Jornalismo Político e Eleitoral do XIII Congresso Brasileiro de Comunicação Política e
Marketing Eleitoral – São Paulo (SP) 2 Jornalista pelo Centro Universitário de Belo Horizonte (UniBH) e mestrando do Programa de Pós-Graduação em Estudos de
Linguagens do CEFET-MG, e-mail: [email protected]
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interações face a face. Outra característica importante da televisão é que ela possui, como
diferença em relação às outras mídias, uma riqueza visual capaz de permitir às pessoas o
recebimento de imagens com som e movimento.
A televisão é uma mídia de escala global. E como se sabe, é responsável por atribuir a
muitos eventos políticos um caráter espetacular, criando um campo visual diferente do que os
indivíduos têm em seus encontros físicos com outras pessoas. Por todo o exposto, a política, cada
vez mais midiatizada, encontrou na televisão um instrumento para fortalecer e legitimar seu
discurso. Para tanto, porém, precisa se apropriar das ferramentas que a mídia apresenta com o
intuito de alcançar seus objetivos – neste caso, eleitorais.
Comunicação e política: quando os meios de comunicação não são apenas “meios”
Guareschi (2006) aponta que a mídia assumiu três importantes papéis na sociedade
contemporânea. O primeiro deles é o de construtor da realidade3. Isto quer dizer que algo passa a
existir, ou deixa de existir, hoje, se é, ou não, midiatizado. A mídia tem o poder de instituir o que
é e o que não é real e existente na contemporaneidade. A segunda afirmativa relaciona-se à
primeira: a mídia, além de dizer que o existe, ou não existe, também dá condição valorativa à
realidade. O que é veiculado na mídia é bom e verdadeiro, a não ser que ela própria diga
exatamente o contrário. “Numa sociedade massificada como a nossa, onde nove famílias detêm
90% da mídia [...], quem está nos meios é gente, e gente boa.” (GUARESCHI, 2006, p.31). O
terceiro papel é o de pautador. A mídia é que coloca a agenda de discussão social. O autor
menciona pesquisas que mostram que 82% dos temas e assuntos falados no trânsito, no trabalho,
em casa e nos encontros sociais são pautados pela mídia. É ela que determina, em certa medida, o
que deve ser falado e discutido.
O problema das afirmações de Guareschi (2006) é que ele parece não refletir sobre a
maneira como a mídia desempenha esses papéis, sempre de maneira representativa e
fragmentada. Sobre isso, Miguel (2002) argumenta que
A mídia é, nas sociedades contemporâneas, o principal instrumento de difusão das visões de
mundo e dos projetos políticos; dito de outra forma, é o local em que estão expostas as diversas
representações do mundo social, associadas aos diversos grupos e interesses presentes na
sociedade. O problema é que os discursos que ela veicula não esgotam a pluralidade de
3 Guareschi (2006) reconhece a dificuldade em definir o que é realidade, e por isso cuida de delimitar o conceito. Diz-se por
realidade “o que existe, o que tem valor, o que traz as respostas, o que legitima e traz as respostas, o que legitima e dá densidade
significativa a nosso cotidiano.” (GUARESCHI, 2006, p.30)
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perspectivas e interesses presente (sic) na sociedade. As vozes que se fazem ouvir na mídia são
representantes das vozes da sociedade, mas esta representação possui um viés. O resultado é
que os meios de comunicação reproduzem mal a diversidade social, o que acarreta
conseqüências (sic) significativas para o exercício da democracia. (MIGUEL, 2002, p.163,
grifos do autor)
Observa-se, portanto, que a mídia, em quaisquer dos modelos supracitados, está
relacionada a interesses de alguém – ou “alguéns”. E esse interesse pode estar vinculado aos
campos político, econômico, cultural e informacional. Disso assimila-se que, desde os tempos de
sua formação, a mídia nunca foi apenas meio, no sentido de uma função única de transmissão.
Quando em confronto com outras instituições, como a política, ela se empenha para controlar o
discurso, pautando-o e traçando quais caminhos ele deve seguir. “Ou seja, num ambiente de
acerbo conflito de interesses, é inimaginável que os meios de comunicação sejam os porta-vozes
imparciais do debate político.” (MIGUEL, 2002, p.161). E com as complexidades da
contemporaneidade, essa constatação foi ainda mais asseverada, além de ganhar novas
configurações, como observa Gomes (2007).
Quando a comunicação e cultura de massa foram deixando de ser meios para se transformar em
ambientes fundamentais para a política contemporânea, a coisa chega mesmo a inverter-se, pelo
menos para os mais atilados, que pretendem ver a política como um dos meios de que se servem
os agentes institucionais da comunicação de massa para a obtenção do poder. A idéia (sic) de
quarto poder pode ser convocada para explicar esse fato. De qualquer forma, passa-se a creditar
um valor extremamente grande à comunicação de massa (embora continue a se falar,
equivocadamente, de “meios”) e as coisas se tornaram muito confusas nessa interface, pois nem
sempre é possível decidir sobre quem seria, de fato, o meio e quem seria, então, o seu operador.
(GOMES, 2007, p.60, grifos do autor)
A espetacularização da política na sociedade do espetáculo
No clássico manifesto em que cunhou a expressão sociedade do espetáculo, Debord
(1997) apresenta a sociedade moderna como um conjunto de espetáculos em que as situações
cotidianas formam uma realidade paralela; um simulacro, por conseguinte. Tudo o que era vivido
presencialmente se transformou numa representação. E isso é mais que um conjunto de imagens;
é uma relação social entre pessoas, mediada virtual e iconograficamente.
O espetáculo consiste na manipulação de ícones e imagens, principalmente através dos meios
de comunicação de massa, mas também dos rituais políticos, religiosos e hábitos de consumo,
de tudo aquilo que falta à vida real do homem comum: celebridades, atores, políticos,
personalidades, gurus, mensagens publicitárias – tudo transmite uma sensação de permanente
aventura, felicidade, grandiosidade e ousadia. O espetáculo é a aparência que confere
integridade e sentido a uma sociedade esfacelada e dividida. É a forma mais elaborada de uma
sociedade que desenvolveu ao extremo o „fetichismo da mercadoria‟ (felicidade identifica-se a
consumo). Os meios de comunicação de massa são apenas a „manifestação superficial mais
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esmagadora da sociedade do espetáculo‟, que faz do indivíduo um ser infeliz, anônimo e
solitário em meio à massa de consumidores. (DEBORD, 1997, p.73)
Em função da espetacularização da política, torna-se fundamental remeter à discussão
sobre a relação espetáculo, mídia e política. Gomes (1996) afirma que a política tradicional
fundamentada no discurso, deslocou-se para um campo sem saída em virtude da nova forma de
comunicação usada pelos atores políticos: a política da encenação – ou show. Na sociedade
democrática de massa, para que uma pessoa tenha a possibilidade de se eleger a um cargo
público, ela deve passar por um processo de aprovação e ser legitimada pelos cidadãos. Por conta
disso, mais do que nunca, argumenta Gomes (1996), o político precisa ficar atento ao exercício
do poder e na possibilidade de ser reconhecido. Em função dessa visibilidade – pela qual a
delegação de poderes pode ser mantida ou retirada nas consultas eleitorais formais e regulares –,
a representação na forma de espetáculo é útil para a política. Vale destacar que a política sempre
encontrou maneiras de resolver suas necessidades de percepção, e a propaganda foi uma dessas
soluções. Portanto, política e meios de comunicação se confrontam – e se harmonizam – desde o
início das sociedades de massa.
[...] a natureza da atividade política democrática faz com que a política necessite essencialmente
dos meios de comunicação: a natureza dos meios de comunicação, enquanto meios de exibição
de produtos e promoção de mercados e, por consequência, enquanto meios de entretenimento,
faz com que rejeitem a política como conteúdo preferencial. Como todo mundo sabe, o
comércio é a arte de agradar, a política, de disputar. (GOMES, 1996, p.33)
É possível perceber, por meio dessa breve revisão, a relação mídia-espetáculo nos
meandros políticos. Há, atualmente, crescente homogeneização dos candidatos, dos partidos e dos
discursos, por obra e força dos meios de comunicação de massa. Nessa política do espetáculo, em
que há um intenso embate entre a lógica informacional4 e a lógica espetacular, os candidatos e os
partidos são vistos e tratados como produtos. Não por acaso, os grandes estrategistas nesse
contexto, por consequência, são os profissionais de marketing.
Televisão e política: debate eleitoral como gênero e produto
A televisão consolidou-se como o meio hegemônico por excelência da segunda metade do
século XX, chamando tanta atenção que tem influenciado teorias inteiras sobre o modo de
funcionamento das sociedades modernas. As teorias são construídas com base na inserção desse
4 Entende-se por lógica informacional aquela que deveria predominar nos meios de comunicação de massa. Considerando que a
premissa fundamental e pétrea do jornalismo é a disponibilização da informação ao seu interlocutor, a lógica informacional é
aquela, portanto, que prioriza a informação em quaisquer circunstâncias.
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meio nos sistemas político e econômico e na formatação que ele produz nas concepções sociais
ou nos modos de subjetivação.
Esse meio alterou o modo de interação dos indivíduos, uma vez que dispensa a partilha de
um lugar comum e a comunicação dialógica das interações face a face, conforme avaliação de
Thompson (2005). A televisão cria um campo visual diferente do que os indivíduos têm em seus
encontros físicos com outras pessoas. Dada à importância adquirida no decorrer do tempo, a
mídia – e a televisão, de maneira específica – tornou-se presente na vida dos políticos não apenas
em períodos de intensas campanhas políticas, mas também na própria arte de governar.
Um dos gêneros televisuais é o debate, que, na visão de Charaudeau (2006), é central nos
estudos de televisão. Nesse gênero, reúne-se uma série de convidados em torno de um animador
para tratar de um determinado tema. O debate é completamente organizado e gerenciado pela
instância midiática. O autor considera que a intervenção das imagens faz com que os
participantes debatam entre si sabendo que são ouvidos e assistidos também pelo telespectador.
Depreende-se disso, ainda segundo Charaudeau (2006), que é possível distinguir diferentes tipos
de debates, mostrando, ao mesmo tempo, que o debate é “mais uma máquina de fabricar
espetáculo do que de informar o cidadão.” (CHARAUDEAU, 2006, p. 220-221).
Classificando o debate como uma forma fundada no diálogo, a tese defendida por
Machado (2005) opõe-se ao argumentado por Charaudeau (2006). Para ele, a televisão é um meio
pouco visual. Como herdeira do rádio, continua oral. Por isso, boa parte da sua programação se
funda no diálogo: depoimentos, entrevistas, talk shows, discursos de âncora, debates políticos,
dentre outros. Embora sejam formas baratas de se fazer televisão – e talvez isso explique a
frequência desse gênero nos programas –, esse modelo abre novos espaços para o ressurgimento
do diálogo em condições muito próximas ao modelo socrático5. Bourdieu (1997) também reforça
a tese de que a televisão não é dominada pela imagem, como pareceria óbvio, mas pela palavra.
Ele argumenta que é a palavra que dá sentido, criação e existência. Afinal de contas, diz o autor,
“a foto não é nada sem a legenda que diz o que é preciso ler” (p. 26).
5 O modelo socrático de diálogo consiste na técnica em que o professor conduz o aluno a um processo de reflexão e descobertas
por meio de perguntas aparentemente simples que têm o objetivo, em primeiro lugar, de revelar as contradições na forma de
pensar do aluno. A partir disso, o professor pode auxiliar na redefinição dos valores contraditórios do aluno, conduzindo-o a
pensar sobre si mesmo. Dentre os vários procedimentos usados no diálogo socrático, destacam-se a síncrise e a anácrise. Segundo
Machado (2005), “entendia-se por síncrise a confrontação de dois ou mais pontos de vista sobre um mesmo assunto. [...] Anácrise,
por sua vez, era o nome que se dava aos métodos de provocar a palavra do interlocutor, forçando-o a colocar-se e externar
claramente a sua opinião.” (p.73)
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Uma das facetas que o gênero debate pode assumir é a eleitoral. Assim como os eventos
desportivos, os debates televisivos podem ser considerados combates regulamentados, precedidos
de longas deliberações a respeito das regras do jogo. Sua periodicidade é fixa e sua credibilidade
firma-se no fato de que se consideram iguais as chances de vitória dos oponentes. Ao final do
encontro, a pergunta a ser respondida é sempre: “quem ganhou o debate?”, e o juiz do confronto é
a audiência, que exerce também o papel de torcida.
Para Leite (2003), a história dos debates eleitorais majoritários televisivos está ligada a
dois pontos principais:
a) tecnologia e b) evolução e amadurecimento do contexto político. Em primeiro lugar, e é
óbvio que assim seja, está a invenção da televisão e sua disseminação enquanto meio de
comunicação de massa. Em segundo lugar, o estabelecimento de regimes democráticos e
participativos, em que a eleição do cargo máximo da nação se dá por meio do voto popular.
(LEITE, 2003, p.3)
Manifestação político-midiática contemporânea, os debates televisivos estão sujeitos a
mutações pelas quais passam tanto a política quanto a mídia. Uma das mais perceptíveis é aquilo
que Leite (2003) denomina de “profissionalização dos debates”. A preocupação dos candidatos e
das assessorias em diminuir o risco que correm, e a tentativa da televisão de criar um roteiro com
pouco espaço para improvisação, acaba por “engessar” os teledebates.
Em campanhas eleitorais majoritárias, a política é comumente representada na televisão
de quatro formas, como apontou Gomes (2012): a cobertura jornalística da campanha, a
propaganda eleitoral, os debates e o recente fenômeno das entrevistas ao vivo com os candidatos
em telejornais. De todas essas formas de representação, apenas na propaganda eleitoral (Horário
Gratuito de Propaganda Eleitoral – HGPE) o jornalismo não tem participação direta. Há, é
inegável, uma apropriação de recursos jornalísticos (formato e linguagem) para a sua produção,
mas sem a efetiva participação da instituição jornalismo na produção da propaganda eleitoral; é
um produto controlado pela instituição política. Nas três formas restantes, ainda conforme Gomes
(2013), o jornalismo é quem “convida” a política para entrar em seu mundo – nesse caso, por
meio da televisão. Logo, já se sabe quem deve dominar o discurso e a argumentação. Em tese.
Definições metodológicas
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Optou-se pelos debates da TV Band Minas, da RedeTV! e da TV Globo Minas6. O
primeiro critério foi o temporal. Os três debates foram realizados no início, meio e fim da
campanha, respectivamente. Além, disso, há que se ressaltar características peculiares de cada
um. O debate da Band Minas, transmitido em 2 de agosto de 2012, foi o primeiro da disputa
eleitoral. Essa característica, diga-se, está relacionada à importância da emissora na história
política no Brasil. A Band foi responsável pelo primeiro debate eleitoral no país, ainda em 1982,
mantendo a tradição de dois em dois anos até a atualidade. O debate da RedeTV!, transmitido em
7 de setembro de 2012, foi realizado em parceria com o jornal Folha de S. Paulo, que colaborou
na produção. O último debate escolhido, da Globo Minas, veiculado em 4 de outubro de 2012, foi
o último da disputa eleitoral. Mais que isso, foi a última ação da campanha, já que a propaganda
eleitoral havia se encerrado e as eleições foram realizadas três dias depois.
Para a devida compreensão do contexto político em que se desenvolveu o pleito
majoritário de Belo Horizonte em 2012, faz-se necessário destacar que, às vésperas do prazo final
para a homologação das candidaturas, PSB e PT romperam a aliança para as eleições municipais.
Até então, estava acertada a candidatura à reeleição de Marcio Lacerda (PSB) com o deputado
federal Miguel Corrêa Júnior (PT) como vice. No entanto, por conta de uma dissensão quanto à
coligação proporcional – referente à composição para a Câmara Municipal –, o PT lançou a pré-
candidatura de Roberto Carvalho, então vice-prefeito da capital. O nome de Carvalho não
emplacou, mas a candidatura petista, sim. Patrus Ananias, ex-prefeito de Belo Horizonte e ex-
ministro do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, foi escolhido para pleitear o cargo em
oposição a Lacerda. Outros cinco candidatos concorreram: Maria da Consolação (PSOL), Alfredo
Flister (PHS), Tadeu Martins (PPL), Vanessa Portugal (PSTU) e Pepê (PCO). Participaram dos
debates apenas os candidatos Alfredo Flister, Maria da Consolação, Marcio Lacerda e Patrus
Ananias. Apesar da multiplicidade de candidatos, a eleição se polarizou, como historicamente,
nas candidaturas do PSB e do PT. Houve algum destaque para Maria da Consolação e Alfredo
Flister, mas nenhum deles tinha capilaridade eleitoral para enfrentar os dois principais
candidatos7.
6 Neste artigo não se avaliou a relação entre emissora e produto televisivo apresentado por ela. É importante destacar, no entanto,
que essa questão não passou despercebida ao autor. A opção por não usar esta relação como um dos critérios de análise foi
proposital, para mostrar que, apesar das diferenças editoriais entre as emissoras, o debate eleitoral televisivo segue a mesma
padronização. 7 Em todas as pesquisas eleitorais realizadas pelos institutos de pesquisa no decorrer da campanha, Alfredo Flister e Maria da
Consolação somavam, juntos, cerca de 1% das intenções de voto.
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Os resultados
Quanto ao formato, os debates da TV Band Minas, da RedeTV! e da TV Globo Minas
têm mais semelhanças que diferenças. Em todos os três debates, as regras foram apresentadas
logo após a apresentação dos mediadores – e reiteradas a cada bloco. Essas regras, pré-
estabelecidas e articuladas com as assessorias dos candidatos, são sempre usadas para a garantia
da premissa básica do jornalismo: o acesso à informação. Elas também são empregadas para dar,
segundo as próprias emissoras, fluidez ao debate – por meio do controle. A única emissora,
contudo, que assumiu esse caráter de pré-acordo foi a Globo Minas. Na fala de abertura da
mediadora, a jornalista Isabela Scalabrini, num tom editorial, a tevê deixou claro que as regras do
debate haviam sido aprovadas por todos os candidatos participantes. Como descreveu Gomes
(2013), jornalismo, televisão e política se unem para a promoção do debate: o jornalismo realiza a
mediação, a televisão estabelece a estrutura (regras de formato e limites temporais) e a política,
convidada especial, argumenta.
As regras estabelecidas nos debates analisados garantiram, como se supõe, o maior tempo
dos programas para a apresentação das propostas dos quatro candidatos participantes. Caso a
caso, vamos ver como se deu a partilha das falas por duração em porcentagem.
0
10
20
30
40
50
60
70
80
Mediador Candidatos Jornalistas
Convidados
Sociedade
Civil
Band Minas
RedeTV!
Globo Minas
Gráfico 1 – Partilha das falas por duração (em %)
No debate da Band Minas, que teve 112 minutos de duração, 64 deles foram ocupados
pela fala dos candidatos, em reposta ao mediador, aos jornalistas convidados, aos representantes
da sociedade civil e aos seus adversários. Isso corresponde a 57,14% do tempo total. O mediador
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Paulo Leite, com suas intervenções e interrupções, obteve 36 minutos do tempo, isto é 32,14%. O
tempo de fala ocupado pelos representantes das entidades de classe e pelos jornalistas do Grupo
Bandeirantes representou, respectivamente, 7,14% e 3,57% da duração total do debate.
A partilha das falas foi similar no debate da RedeTV!. Dos 92 minutos de programa, 52
(56%) foram destinados às falas dos candidatos, que além de responderem às perguntas feitas
entre si, também foram questionados por jornalistas da emissora e do jornal Folha de S. Paulo.
Ao mediador Kennedy Alencar, coube 31 minutos do tempo total, o que equivale a 36% do
debate. Os jornalistas convidados ficaram com a menor fatia, oito minutos (8%).
Proporcionalmente, considerando a diferença de 10 minutos de duração entre os debates da Band
e RedeTV! e a ausência de perguntas da sociedade civil, a partilha do tempo foi praticamente a
mesma.
As diferenças aparecem mesmo no debate promovido pela Globo Minas. Com duração de
93 minutos – praticamente igual ao da Band Minas –, o programa não contou com a participação
da sociedade civil nem de jornalistas convidados. Todas as perguntas foram elaboradas entre os
candidatos, por isso eles dominaram 68 minutos do debate, que correspondem a 73,11% do
tempo total. À mediadora Isabela Scalabrini foram destinados 25 minutos ou 26,88% do total, o
que assinala a pontualidade de suas intervenções no debate.
Considerando que um debate eleitoral tem a intenção de ser uma arena para a disputa de
posições políticas em confronto, os três alcançaram sua intenção informativa, atribuindo o maior
tempo à fala dos candidatos. No entanto, não se pode desconsiderar que as intervenções feitas
pelos mediadores, principalmente nos casos da Band Minas e da RedeTV!, embora de acordo
com os princípios normativos pré-estabelecidos, indicam que a política está no centro da arena,
mas é o jornalismo quem controla a gramática do debate. No programa da Globo Minas, não
houve nenhuma interrupção na fala dos candidatos.
O debate da RedeTV! foi o mais contundente neste sentido. O jornalista Kennedy Alencar
não negociou sequer uma vez o respeito ao tempo destinado a cada candidato. Em sua fala inicial,
já havia deixado isso claro, quando pediu aos candidatos que não ultrapassassem o tempo
estabelecido pelas regras. Por uma vez, no segundo bloco, o mediador precisou interromper
Alfredo Flister (PHS) na sua resposta à jornalista Vera Magalhães, da Folha de S. Paulo. Por
quatro vezes ele precisou interromper o candidato Patrus Ananaias (PT), duas vezes no terceiro
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bloco e duas vezes no quarto bloco. No último caso, o petista foi interrompido antes mesmo de
fazer sua pergunta ao candidato Alfredo Flister (PHS). E, depois, na sua réplica ao candidato.
Patrus Ananias [na pergunta]: Candidato Flister, eu vou insistir no tema da saúde, porque a
saúde é vida. Nós precisamos criar em Belo Horizonte um sistema de saúde de qualidade tal
que, inclusive, dispense os planos de saúde e que atenda também à classe média. O candidato
do PSB prometeu que faria sete UPAs [Unidades de Pronto Atendimento]. Não fez nenhuma.
Prometeu que vai fazer 73... [microfone cortado]
Kennedy Alencar: Candidato, seu tempo acabou. Candidato Alfredo Flister, o senhor tem um
minuto e meio.
Patrus Ananias [na réplica]: Belo Horizonte tem 145 centros de saúde. Foram construídos dois
novos centros nos últimos quatro anos, lembrando que a gestão da saúde em Belo Horizonte
esteve vinculada ao PSDB neste mandato. Belo Horizonte tem três UPAs, implantadas na
minha gestão, Célio de Castro, Fernando Pimentel. O candidato promete fazer sete, não fez
nenhuma. Nós sabemos que a questão da saúde é delicada. Nós sabemos que a saúde pressupõe
alimentação, que é um desafio que nós enfrentamos em Belo Horizonte e no Brasil. [Sabemos]
que a saúde tem a ver com moradia, que é outro desafio a ser enfrentado, a questão do
saneamento básico, o combate às drogas. Mas é fundamental que a pessoa tenha a segurança,
em caso de doença, de saber que vai ser atendida, e bem atendida. Nós vamos mobilizar todos
os recursos para atender bem... [microfone cortado].
Kennedy Alencar: Obrigado, candidato Patrus.
No decorrer do debate da Band Minas, Paulo Leite, com sua imponente voz de radialista,
sempre rememorava aos candidatos o tempo de fala que lhes era de direito – deixando implícito
que os interromperia se necessário. E essa interrupção foi feita por algumas vezes. Dois
candidatos foram interrompidos pelo mediador por desrespeitarem as regras do debate. O
primeiro deles foi o candidato Alfredo Flister, no terceiro bloco. Flister perguntou a Marcio
Lacerda (PSB) quais as suas propostas para melhorar a saúde em Belo Horizonte. Lacerda
respondeu em dois minutos, Flister replicou em mais dois e o candidato socialista teve um minuto
de tréplica. O jornalista Paulo Leite já passava à próxima pergunta quando surgiu o impasse.
Paulo Leite: Vamos então ao sorteio do próximo tema...
Alfredo Flister: [com microfone off, pede para falar]
Paulo Leite: Não, o senhor já usou o tempo. São um minuto de pergunta, dois de respostas,
dois de réplica e um de tréplica, de acordo com as regras estabelecidas.
Do pequeno número de advertências, depreende-se o controle das regras. Mas esse
controle é exercido em detrimento do conteúdo. E aqui se mostra a faceta negativa das restrições
temporais. Embora elas garantam a equidade na condução da discussão e no direito de fala dos
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candidatos, ela também prejudica o desenvolvimento de uma argumentação consistente. Vejamos
o exemplo do primeiro bloco do debate da Band Minas. Nele, os candidatos deveriam responder a
questões formuladas por representantes de entidades de classe, escolas e universidades gravadas
previamente em ambientes externos. Cada candidato tinha um minuto para a resposta. No
entanto, é absolutamente inviável responder, em um minuto, questões complexas como as
apresentadas no bloco e abaixo descritas.
Robson Sávio (Fórum Brasileiro de Segurança Pública): Segundo a última pesquisa
nacional de vitimização, Belo Horizonte é a segunda capital brasileira com o maior número de
residências com alarmes. Esse é um dos dados que corrobora para o sentimento de insegurança
vivida pela população belo-horizontina, que tem taxas de crimes violentos maiores do que
cidades como Rio de Janeiro e São Paulo, por exemplo. Durante muito tempo, os prefeitos
disseram que não iriam cuidar da segurança pública porque essa seria uma função dos estados.
Mas nós sabemos que esse tipo de visão é uma visão ultrapassada, porque essas ações de
segurança pública vão muito além de atividades policiais. Os municípios têm uma série de
atividades de prevenção aos crimes, tratamento dos usuários de drogas, políticas voltadas para a
juventude que poderão incidir na redução dos crimes. Portanto, quais são as suas propostas para
que Belo Horizonte possa liderar ações de combate e de prevenção aos crimes na nossa cidade?
Luís Cláudio Chaves (presidente da OAB-MG): Para se tornar uma grande nação, um grande
estado ou um grande município, é necessária uma educação de qualidade. Educação essa que
envolve, além do conhecimento técnico, questões fundamentais como a socioambiental, as
questões relativas às relações humanas, evitando o bullying e as discriminações e, também, a
prática do desporto. Eu pergunto aos candidatos quais planos e projetos eles têm para a
educação municipal de Belo Horizonte.
Esse é um dos grandes impasses na relação jornalismo, televisão e política nos debates
eleitorais. Os limites temporais são fundamentais para garantir a isonomia do programa,
característica da qual o jornalismo não abre mão. Entretanto, considerando que o debate é, em
tese, controlado pelo jornalismo e este, supostamente, tem o acesso à informação como sua
cláusula pétrea, as restrições temporais não favorecem a realização de um debate eleitoral
completo. E, aqui, “completo” quer dizer a possibilidade de explanação total dos argumentos do
candidato.
Como costumeiramente acontece em debates eleitorais, houve uma série de assuntos
abordados nos três programas analisados: apoios políticos, trânsito e transporte público,
segurança, saúde e educação foram algumas das principais temáticas dos enfrentamentos. No
primeiro debate, o da Band Minas, os dois principais candidatos foram bastante cordatos na
abordagem das questões, enquanto Alfredo Flister e Maria da Consolação assumiram o papel de
críticos. Marcio Lacerda e Patrus Ananias, à época com 44% e 27% das intenções de votos,
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respectivamente, na pesquisa do Datafolha8, priorizaram a listagem de ações administrativas de
suas gestões e enumeraram planos de gestão para colocar em prática caso fossem eleitos.
O tom foi se alterando no decurso da campanha e isso foi evidenciado nos debates da
RedeTV! e da Globo Minas, quando houve mais críticas, mais enfrentamento, mais contra-
argumentação. Alfredo Flister e Maria da Consolação mantiveram suas posturas em todos os três
casos. Considerando os três debates, chega-se à seguinte tabela de temas abordados.
Band Minas RedeTV! Globo Minas
Educação 15% 10% 12,5%
Saúde 10% 20% 25%
Economia 5% 5% 18,75%
Política 15% 40% 6,25%
Segurança 10% - 6,25%
Habitação - 10% 6,25%
Infraestrutura 30% 10% 12,5%
Cultura 5% - -
Emprego - 5% 6,25%
Meio Ambiente 10% - 6,25%
Tabela 1 – Temas abordados no debate (em %)
A tabela acima mostra o percentual de temas abordados nos três debates, a partir da
quantidade de vezes em que perguntas sobre a temática foram feitas. Destacou-se o percentual – e
não o número de perguntas – por causa da diferença de quantidade de questões nos programas: os
da Band Minas e RedeTV! tiveram 20 perguntas, enquanto o da Globo Minas, 16 (e um bloco a
menos). Percebe-se que, em média, dez grandes temas foram abordados. E, curiosamente, em
cada um dos debates, um diferente predominou. No debate da Band Minas, questões sobre
infraestrutura e obras viárias foram as mais recorrentes. O percentual de 30% representa as seis
perguntas feitas sobre a temática. Assuntos políticos e sobre educação seguem a lista dos mais
abordados, com 15% (três questões) do total de perguntas cada.
8 A pesquisa foi realizada entre os dias 19 e 20 de julho de 2012. Foram ouvidas 827 pessoas em Belo Horizonte. A margem de
erro máxima é de três pontos percentuais, para mais ou para menos. Primeira da disputa eleitoral, a pesquisa está registrada no
Tribunal Regional Eleitoral (TRE), sob o número MG-00150/2012.
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No debate da RedeTV!, o destaque foi para assuntos políticos. Oito das vinte perguntas
feitas no programa estavam relacionadas a esse universo, o que corresponde a 40% do total de
questões. Foram indagações referentes aos programas de governo dos candidatos, a decisões em
gestões passadas e até questões sobre o “mensalão”9. A supremacia dessa temática se deveu à
participação dos jornalistas Vera Magalhães, da Folha de S. Paulo, e Rodrigo Cabral, da
RedeTV!, convidados para indagar aos candidatos. Eles não os pouparam de perguntas mais
incômodas, como as questões sobre o “mensalão”.
O debate da Globo Minas, por sua vez, foi predominantemente conduzido por questões
voltadas à saúde (quatro perguntas). Considerando o contexto da cidade à época, foi o debate que
mais priorizou o tema de maior preocupação para os eleitores10
. Os outros temas mais abordados
foram economia, com 18,75% (três questões), e educação e infraestrutura, com 12,5% (duas
questões) cada.
Neste aspecto, revela-se outro conflito. A quantidade numerosa de temáticas (foram dez,
com poucas variações) aponta para duas apreciações. A primeira delas diz respeito ao caráter
plural que o debate quer oferecer. Sendo o fórum na tela, tal como conceituou Marques et al.
(2009), um debate midiático de valor deliberativo, quanto mais temas forem abordados, mais a
sociedade terá a possibilidade de conhecer as plataformas dos candidatos. A verdade, no entanto,
é que nenhum deles dá conta de apresentar suas plataformas, então fornecem apenas fragmentos
delas. Nesse sentido, o debate cumpriu sua função, oferecendo eixos temáticos para que os
políticos discorressem. Em contrapartida – e essa é a segunda apreciação –, a quantidade
exacerbada de temas aponta para o tratamento superficial de tais temáticas. Questões sobre a
educação, por exemplo, assunto considerado um dos mais importante em qualquer discussão
política e de governo, só ocupou, nos três debates, a média de 12,5% da quantidade total de
perguntas.
Considerações
9 “Mensalão” é o nome atribuído a um escândalo de corrupção política por meio de compra de votos de parlamentares no
Congresso Nacional para a aprovação de pautas favoráveis ao governo federal. O caso aconteceu entre os anos de 2005 e 2006,
período do primeiro mandato do presidente Lula. 10
Segundo pesquisa encomendada pela própria Rede Globo ao Ibope, divulgada em setembro, 49% dos eleitores considerava a
saúde como o principal problema de Belo Horizonte. A segurança pública foi o segundo tema de maior preocupação, com 20%,
seguido de educação e trânsito, empatados com 7% cada. A pesquisa foi realizada entre os dias 31 de julho e 2 de agosto de 2012.
Foram ouvidas 805 pessoas em Belo Horizonte. A margem de erro máxima é de três pontos percentuais, para mais ou para menos.
Primeira da disputa eleitoral, a pesquisa está registrada no Tribunal Regional Eleitoral (TRE), sob o número MG-00173/2012.
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Fica claro que na organização de um debate estão envolvidas três instituições distintas: o
jornalismo, a televisão e a política. O jornalismo é quem medeia, quem orienta as discussões,
quem busca estabelecer a direção pela qual o debate irá. No entanto, isso só é possível por conta
de outra instituição, a televisão, que fornece as condições técnicas para que o debate se realize. É
por isso que se compreende que a televisão é quem dita a “gramática” do programa, isto é, as
regras que o compõem. A terceira instituição envolvida, a política, tem o centro da arena à sua
disposição para apresentar-se a quem vê. Dessa relação, pode-se dizer, categoricamente, que há
considerável nível de complexidade e tensão.
É pertinente destacar, também, a uniformidade do produto debate eleitoral televisivo. Não
foi considerada na análise a relação entre as emissoras e os debates que elas produziram.
Entretanto, como assinalado anteriormente, essa relação não passou despercebida ao autor. A
escolha em não avaliar essa relação foi proposital. Ficou evidente, ao destrinchar os três debates
eleitorais estudados, que todos eles têm formatos muito parecidos, igualmente engessados. Os
formatos são similares, as trilhas sonoras são similares, os cenários de fundo azul são similares –
embora sejam essas características para outra análise. O tempo destinado a perguntas e resposta é
similar. A quantidade de blocos, também. A postura dos mediadores, idem. Apesar de terem sido
realizados por emissoras diferentes, com princípios editoriais diferentes e até com níveis de
credibilidade e audiência diferentes, os três programas são muito parecidos, tanto em aspectos
estéticos quanto no que diz respeito ao conteúdo.
Os limites temporais estabelecidos nos debates também merecem uma consideração
especial. Talvez esse critério, por menos importante que pareça ser, revele o maior contrassenso
na relação entre jornalismo, televisão e política. A instituição de restrições de tempo aos
candidatos na exposição de suas falas demonstra a importância que o jornalismo dá à equidade e
isonomia. Afinal de contas, um dos maiores paradigmas jornalísticos é a tal objetividade que, se
não existe na sua apreensão pragmática, é veementemente discutida no seu aspecto filosófico. E
dar limite aos candidatos é um exemplo bem prático dessa busca por objetividade. No entanto,
esse pragmatismo para alcançar a equidade resvala em outro princípio elementar do jornalismo: o
acesso à informação. Quando um jornalista pede a um candidato que explicite a sua plataforma
para a educação e lhe dá apenas dois minutos para fazê-lo, certamente a informação não será
plenamente transmitida. O candidato não conseguirá expor tudo o que precisa – até por conta do
cronômetro digital que lhe informa segundo a segundo que seu tempo está acabando. E logo em
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seguida, como se a folha de um caderno fosse passada, outro assunto entra em cena e o anterior é
deixado para trás. Ele pode até ser revisitado depois, é verdade, mas essa é apenas uma
possibilidade.
REFERÊNCIAS
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1997.
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Editora Contexto, 2006.
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Janeiro: Contraponto, 1997.
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Fausto; PINTO, José Milton. O indivíduo e as mídias. Rio de Janeiro: Editora Diadorim, 1996 –
COMPÓS – Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação.
GOMES, Wilson. Entrevistas com candidatos a presidente transmitidas “ao vivo” em telejornais:
o modelo teórico-metodológico da mediação jornalística. Compolítica, v. 2, n. 2, jul-dez 2012.
GOMES, Wilson. Transformações da política na era da comunicação de massa. 2. ed. São
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GUARESCHI, Pedrinho A. Mídia e cidadania. Conexão – Comunicação e Cultura, Caxias do
Sul, v.5, n.9, p.27-40, jan./jun. 2006.
LEITE, Janaína Frechiani Lara. Os presidenciáveis no ringue eletrônico: apontamentos sobre a
história dos debates presidenciais televisivos. In: XXVI CONGRESSO BRASILEIRO DE
CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO, 26. ed., 2003, Belo Horizonte. [Artigo]. Belo Horizonte:
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MACHADO, Arlindo. A televisão levada a sério. 4.ed. São Paulo: Senac, 2005.,
MARQUES, Francisco et al. O fórum na tela: eleições, debates televisivos e e deliberação
mediada. Contemporânea, v. 7, n. 1, jun. 2009.
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56, p. 155-184, 2002. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/ln/n55-56/a07n5556.pdf>.
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THOMPSON, John B. A mídia e a modernidade: uma teoria social da mídia. 7 ed. Tradução de
Wagner de Oliveira Brandão. Petrópolis: Editora Vozes, 2005.