Do meio ambiente ao crescimento econômico: Novas questões para a esquerda francesa nos anos 1970

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XXVIII CONGRESSO INTERNACIONAL DA ALAS 6 a 11 de setembro de 2011, UFPE, Recife-PE GT15 - Meio Ambiente, sociedade e desenvolvimento sustentável Sessão 7-Sociedade e Meio Ambiente: abordagens teóricas Do meio ambiente ao crescimento econômico: Novas questões para a esquerda francesa nos anos 1970 Ana Flávia Pulsini Louzada Bádue Universidade de São Paulo Agência de fomento: CNPQ Orientadora: Ana Claudia Duarte Rocha Marques XVIII Congresso Internacional da Associação Latino Americana de Sociologia. Recife, 2011 1

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XXVIII CONGRESSO INTERNACIONAL DA ALAS

6 a 11 de setembro de 2011, UFPE, Recife-PE

GT15 - Meio Ambiente, sociedade e desenvolvimento sustentável

Sessão 7-Sociedade e Meio Ambiente: abordagens teóricas

Do meio ambiente ao crescimento econômico:

Novas questões para a esquerda francesa nos anos 1970

Ana Flávia Pulsini Louzada Bádue

Universidade de São Paulo

Agência de fomento: CNPQ

Orientadora: Ana Claudia Duarte Rocha Marques

XVIII Congresso Internacional da Associação Latino Americana de Sociologia. Recife, 2011 1

Do meio ambiente ao crescimento econômico:

Novas questões para a esquerda francesa nos anos 1960 e 70

Ana Flávia Pulsini Louzada BádueMestranda em Antropologia Social, Universidade de São Paulo

[email protected]

ResumoNos anos 1970 começaram a emergir na Europa movimentos sociais e certas linhas de produçãoacadêmica que colocavam em xeque teorias e práticas políticas e econômicas da esquerdatradicional. O crescimento econômico, antes visado por todos, começou a figurar nesse cenário comoum problema na medida em que o aumento da produção e do consumo levava a uma destruição daliberdade humana e ainda era incompatível com os recursos naturais existentes no planeta.A partir dos trabalhos de Charbonneau,Ellul, Illich e Gorz, bem como da emergência de movimentosecológicos, é possível remontar à constituição de novas esquerdas na França nos anos 1960 e 1970.A recusa ao marxismo, a ênfase nos modos de vida e a configuração de novas modalidades de luta eresistência política são três eixos centrais para compreender a reformulação da contestação política eda mobilização nesse momento, e que reverberam até os dias atuais.

***

Das catadoras de mangaba do Sergipe até a política energética alemã, o meio ambiente

parece ter entrado definitivamente na agenda política mundial. E é comum que isso seja visto como

um avanço da "consciência ambiental"1. Na medida em que um governo, um grupo específico ou as

pessoas começam a falar sobre ecologia e rever políticas e práticas em nome dela, ou que empresas

investem em "sustentabilidade", isso é considerado uma grande evolução.

Uma visada crítica permite, entretanto, colocar em questão essa visão da história como uma

sucessão de fatos e ideias em direção à razão. Em primeiro lugar, não há uma homogeneidade nem

um consenso sobre o que seja "meio ambiente". Em segundo lugar, considerando-se historicamente,

o processo de politização da natureza, do meio ambiente e da constituição da ecologia política é

permeado por tensões, indicando que o suposto caminho da consciência não é tão evidente como se

afirma.

Soma-se a isso a questão da relação entre material e espiritual (problemas ambientais e

consciência ambiental), que geralmente é concebida unilateralmente, como se a segunda fosse uma

resposta à primeira. Mas, analisando o nascimento da ecologia política, a relação parece ser muito

mais complexa. Por um lado, os problemas materiais estão em profunda relação com jogos políticos e

econômicos. A poluição gerada por automóveis, por exemplo, está ligada a uma série configurações

de poder que estabelecem certos tipos de urbanismo em detrimento de outros. A poluição, por sua

vez, na medida em que é constituída como problema ecológico (e não de saúde) coloca em relação

uma série de elementos que não estavam necessariamente ligados antes.

Este paper busca questionar a visão progressista da história da ecologia a partir da leitura da

obra de quatro intelectuais franceses das décadas de 1950 e 70, que são considerados atualmente

precursores da ecologia política e do decrescimento2: Bernard Charbonneau, Jacques Ellull, Ivan Illich

1 Tanto especialistas quanto leigos compartilham dessa visão. Cf Cans, 2006. Cf. também Viola, 1996, que além de defendero argumento da conscientização em nível global, discute o desenvolvimento da ecologia no Brasil.

2 O movimento de decrescimento é o tema de meu mestrado, o qual vem sendo realizado no departamento de Antropologiada FFLCH-USP. O decrescimento, em termos gerais, defende que o crescimento econômico é incompatível com o meio

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e André Gorz. A retomada dos debates entre esses autores evidencia que a ecologia política, seja na

dimensão da militância política ou das críticas mais teóricas, não é uma resposta evidente e óbvia

dada aos problemas materiais. Ao contrário, veremos com esses autores que tratava-se antes da

constituição de um novo corpo de conhecimentos e práticas que articulava natureza e humanidade de

forma inédita.

Preocupados em fundar uma esquerda desligada do marxismo tradicional e da esquerda

clássica, os quatro autores faziam críticas ao mundo em que viviam e estavam antes preocupados

com a liberdade humana do que com o meio ambiente. Mas as lutas ecológicas lhes pareciam

extremamente adequadas na medida em que, afinadas com suas críticas, buscavam novas formas de

vida e de relações sociais, além de terem um inimigo comum – um sistema social, político e

econômico orientado pelo progresso, pela ciência, pela técnica e pelo crescimento econômico, os

quais não levavam em consideração as necessidades reais da natureza e da humanidade. Veremos

com esses autores como, desde os anos 1950, política e meio ambiente vêm fomentando um novo

espaço de reflexão e militância política. A hipótese deste trabalho é que as questões ecológicas só se

configuraram enquanto tais em profundo diálogo com o corpo de conhecimentos sobre novas formas

sociais e novas formas de ação política proposto por tais autores.

Basta observar as mudanças qualitativas em curso nesse período. Antes dos anos 1960,

grupos em defesa de pássaros não se consideravam "ecologistas"; Bernard Charbonneau não

encontrava editoras para publicar seus textos sobre técnica e destruição do equilíbrio entre homem e

natureza; o documentário Le monde du silence de Jean Yves Cousteau venceu em 1956 o festival de

Cannes e um Oscar sem ter como argumento a defesa do mar. A partir de meados da década de

1960, os grupos em defesa dos animais começaram a crescer e associarem-se entre si;

Charbonneau teve seus livros publicados e o cineasta tornou-se um conhecido "ambientalista". Esse

momento foi decisivo na configuração de um novo campo de saberes na Europa e nos Estados

Unidos (Bramwell, 1989; Cans, 2006; Dalton, 1994). A ecologia política constituiu-se como uma nova

tentativa de compreender o mundo e agir sobre ele – no mesmo momento em que emergiam os

feminismos, as lutas estudantis, as teorias pós-estruturalistas (e pós-modernas), a reorganização da

política institucional e novas formas de trabalho.

A partir de uma leitura de Ellul, Charbonneau, Gorz e Illich, defendo que uma crítica social de

esquerda que não passava necessariamente pelo marxismo deu ensejo à formulação de novas

realidades e novos problemas. Vale ressaltar que a explosão de manifestações "ecológicas"

acompanhou transformações políticas e econômicas na França. Os "trinta gloriosos" depois da

Segunda Guerra promoveram o enriquecimento generalizado da população francesa, a consolidação

de uma sociedade de massas e a industrialização. A ecologia política que se configurava nesse

momento não era apenas uma preocupação com a natureza, mas um corpo de conhecimentos e

práticas que articulavam as questões da natureza com questões de política e de economia, visando

ambiente, já que o objetivo de crescer infinitamente acabará com os recursos naturais, limitados. O decrescimento seconstitui como movimento político, como teoria de ecologia política, como teoria de economia ecológica e como modo devida, na França, na Itália, na Espanha e recentemente no Brasil. Normalmente, essa diversidade de pessoas, coletivos,modos de ação e perspectivas são concebidas por militantes e simpatizantes do decrescimento na França como"nebulosa". cf. Bayon, Flipo, Schneider, 2010.

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compreender que novo mundo era esse em que o enriquecimento generalizado é acompanhado por

sofrimento e crises sociais.

Se levarmos em conta as diversas "esquerdas" de Maio de 1968 na França, pode-se

perceber que a ecologia não era um fenômeno isolado. Nesse momento eram comuns os

diagnósticos de um novo mundo, que colocava questões e problemas inéditos (entre eles,

ambientais). Junto com esse diagnóstico, vinha a insuficiência de "velhas" teorias, sobretudo o

marxismo defendido pelos partidos. A dominação do(a) trabalhador(a)3 era revista à luz da dominação

da natureza, da dominação das mulheres, da dominação de minorias étnico-raciais. E as novas

"realidades" da sociedade do consumo e sociedade do espetáculo são pensadas sob o prisma da

crítica da razão, da falência do estruturalismo, da guinada da psicanálise, do maoísmo e do

trotskismo. A subjetividade tornou-se elemento central de reflexão e de intervenção para a esquerda

(Arvon, 1977), somando-se à crítica às instituições tradicionais, como partidos políticos e sindicatos.

O resultado dessa combinação foi a ênfase inédita nos modos de vida como ação política. A tão

antiga fuga da cidade ao campo, por exemplo, torna-se uma recusa da sociedade do consumo.

Jacques Ellul, Bernard Charbonneau, Ivan Illich e André Gorz buscavam compor um conjunto

de reflexões que desse conta do mundo contemporâneo a partir de um diálogo ambíguo com "o

marxismo" – que, quase sempre é tomado como sinônimo do marxismo oficial do partido – e pela

abordagem de temas clássicos dos debates da esquerda: trabalho, capitalismo, propriedade privada,

produção e consumo. É possível visualizar três eixos nos trabalhos desses autores. Em primeiro

lugar, a revisão do marxismo a partir de um diagnóstico do mundo pós-segunda guerra. O novo

diagnóstico se constrói sobre um novo recorte analítico: a vida cotidiana. É por meio dela que os

autores tecem reflexões sobre sociedade do consumo, trabalho, propaganda e meio ambiente, tema

do segundo eixo. Por fim, diante de um novo quadro, propõe-se novas formas de ação política e de

práxis. Modos de vida e transformação social entram em cena em contraposição à luta de classes e à

revolução socialista.

1. Da contradição de classes à soberania da técnica

Na França tornou-se comum empreender críticas aos países socialistas sem, no entanto,

recair em argumentos da direita. No caso de Charbonneau, Ellul, Illich e Gorz, essas críticas eram

pautadas em uma aproximação dos sistemas socialistas e capitalistas. Charbonneau (1973)

identificava frequentemente a União Soviética aos Estados Unidos a fim de mostrar que os problemas

sociais e ambientais eram análogos já que ambos compartilhavam a ideologia do progresso. Além

disso, tanto em um sistema com em outro, as estruturas técnicas dominantes moldavam as formas de

vida cotidiana suprimindo a liberdade de todos os indivíduos. Ellul dizia que o grande problema nos

anos 1930 e 40 era "à quelle sauce nous allions être mangés: hitlérienne, stalinienne ou américaine"

(Ellul, 1982: 12), ou seja, todos os sistemas apresentavam grandes ameaças totalitárias e deveriam

igualmente ser combatidos.

3 Para a redação deste trabalho adotei linguagem inclusiva de modo a contemplar a representação igualitária de mulheres ehomens. Utilizei o sinal gráfico dos parênteses (ex. autoras(es) ou pesquisadores(as)) e inverti a ordem de apresentaçãode ambos ao longo do texto.

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Illich, que viveu no México e em Porto Rico por muitos anos, direcionava sua críticas

sobretudo aos Estados Unidos e às intervenções deste país na América Latina. Mas não deixava de

compartilhar reflexões sobre o socialismo com Ellul e Charbonneau. Afirmava que os mesmos

processos se verificavam nos países capitalistas e socialistas: contra-produtividade,

subdesenvolvimento e monopólio radical. Seu argumento (Illich, 2006a) era que, uma vez que a

industrialização eliminara a política, pouco importava a orientação do país. A industrialização

imperava, gerando um crescente dano irreparável em todos os setores, em todas as partes do

mundo.

Gorz, nos anos 1960, discordava que se pudesse comparar os regimes capitalistas entre si

bem como comparar capitalistas e socialistas. No entanto, anunciava um processo comum que se

difundia por todo o planeta: o consumo era subordinado à produção, assim como as necessidades, as

exigências criadoras, a cultura e a educação eram subordinadas às exigências do processo de

acumulação. Em suma, em nenhum dos países as necessidades econômicas se submetiam às

exigências de libertação humana, ao contrário, as finalidades humanas se submetem às técnicas. A

acumulação era prerrogativa também no socialismo real, com a especificidade de ser pública e não

privada(Gorz, 1968a; 1968b).

A aproximação dos regimes capitalistas e comunistas implicava uma revisão das teorias

sociais que preconizavam os segundos como alternativa (por vezes inevitável) aos primeiros. Era

preciso compreender o que entrara em jogo para fazer com que ambos se aproximassem e não se

opusessem. Isso levava inevitavelmente a um diálogo, senão uma ruptura, com o marxismo, já que

este, na visão dos autores em questão, não conseguia dar conta de uma nova realidade que

subjugava todo o mundo, independentemente do regime político. Suas teses, ao fim, tinham o

objetivo de ser uma nova luz para reabilitar a esquerda.

Ellul e Charbonneau se conheceram quando jovens quando faziam parte do movimento

personalista. Em 1935 os dois amigos já defendiam as teses que publicariam nos anos 1950 e 1960.

A organização social, política e econômica funcionava sem passar pelas escolhas reais dos

indivíduos, os quais viam-se subjugados a uma ordem que lhes era exterior (Charbonneau e Ellul,

2011). Nesta nova ordem, a renúncia ao ser humano, à consciência e à medida humana levou a um

novo quadro no qual não eram mais pessoas que dominavam pessoas, mas as fábricas, as

instituições, o Estado, o lucro e os armamentos que dominavam a humanidade e minavam as

"liberdades humanas". O personalismo seria uma nova civilização que só se alcançaria mediante um

novo estilo de vida verdadeiramente humano, caracterizado por "juízos que nós temos sem pensar,

pelas nossas reações em face a todos os eventos diários"( ibid: 155). Seria como uma conjugação

entre espontaneidade e consciência.

A questão central para os dois amigos era a perda da liberdade provocada pela hipertrofia

das estruturas técnicas e de gestão, mais do que com uma eventual "crise de civilização", diz

Cérézuelle (2006: 20-1). Pretendiam mostrar que as experiências totalitárias não foram uma

anormalidade, uma exceção mas, ao contrário, a sociedade contemporânea herdara, por meio da

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técnica, o totalitarismo. Essas reflexões pautaram toda a obra subsequente de ambos autores.

De 1947 a 1979, Ellul deu um curso de marxismo no Instituto de Estudos Políticos de

Bordeaux4. Marx lhe parecia oferecer instrumentos poderosos para pensar a sociedade. Mas, dizia

Ellul, era preciso compreender as diferenças do capitalismo no final do século XIX e o capitalismo do

fim do século XX. Enquanto a economia dominara no primeiro momento, agora era a técnica, dizia.

Na sociedade industrial de tipo capitalista, a verdadeira força produtiva do valor era o trabalho. Já na

sociedade técnica, as máquinas funcionam sem intervenção humana. Ellul propunha reformular toda

a teoria do valor, mas o fez de forma muito simplista. Afirmava, sem levar em conta os

desdobramentos dialéticos da contradição entre capital e trabalho, que seriam as máquinas as

criadoras do valor e a alienação seria fruto da conformação dos homens e mulheres a uma sociedade

técnica. Essa revisão da teoria do valor foi compartilhada por Gorz em seus trabalhos posteriores,

quando começou a defender as novas tecnologias. Ele as considerava libertadoras porque o valor

que produziam não advinha da exploração do trabalho, já este era apenas criativo5.

Em suma, na visão de Ellul, Marx não mais ajudava a ler a nova realidade na qual a técnica

substituíra a indústria em termos de exploração. Em 1954, Ellul publicou La technique ou l'enjeu du

siècle, livro no qual defendia essa tese a partir do argumento que a técnica que servia ao homem se

autonomizou, dominando-o. Mas o que seria a técnica? Muito mais do que máquinas; dizia respeito a

uma lógica que se estende por domínios sociais diversos. A burguesia, visando assegurar a produção

técnica para satisfazer seus interesses de classe escolha, acabou por produzir uma situação inédita

quando a dinâmica da produção se espraiou para todos os níveis. No século XIX, completa Ellul,

Marx fez penetrar nas massas a ideia de que a técnica poderia ser libertadora desde que estivesse

nas mãos do proletariado, fazendo com que as massas aderissem às técnicas. Desde a origem o

marxismo teria sido marcado por um elogio do progresso técnico, o qual carregava a possibilidade de

libertação do proletariado.

Historicamente, diz Ellul no livro Illusion Politique publicado em 1965, a Primeira Guerra

Mundial teve papel fundamental na nova configuração social6. Foi a primeira vez que todo o mundo

esteve envolvido em um mesmo conflito. Uma guerra total implicava envolvimento total da sociedade:

da produção de armamentos à produção de alimentos, passando pela organização das tarefas e

trabalhos, tudo regido pela lei da eficácia (Ellul, 1977). Ao mesmo tempo, como justificativa moral à

guerra surgia a propaganda, a qual se institucionalizou como nova forma de comunicação e se

infiltrou nas subjetividades (Ellul, 1967). Ellul parece substituir a explicação de classes apresentada

em La technique ou l'enjeu du siècle de dez anos antes por uma explicação histórica em função da

dinâmica da técnica, na qual a organização do mundo em torno de uma guerra transformou todas as

dimensões da vida.

Mas independente da origem do processo, Ellul parece estar preocupado com seu

desdobramento, já que o processo esconde a própria origem. Uma vez desencadeado o

4 Ele é considerado um dos primeiros a lecionar Marx na França. Cf. Rognon, s.d.5 Os trabalhos recentes de Gorz são alvo de pesadas críticas, já que parecem confundir trabalho imaterial com liberdade

criadora. Cf. Lamaud, 2011.6 Cf. também Charbonneau e Ellul, 2011.

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desenvolvimento técnico, seja em função dos interesses das classes dominantes, seja em função das

exigências materiais de uma guerra mundial, as técnicas vão se multiplicando por diversas

dimensões, fazendo com que um aumento quantitativo se converta em mudança qualitativa. Deixa de

ser um meio para se estender a todos os domínios e todas as atividades dos homens, e inverte a

situação eliminando qualquer atividade não técnica. A mudança não está na técnica em si, mas na

relação entre técnica e sociedade.

A técnica dominou todos os elementos da civilização – economia, arte, literatura,

subjetividade – e seu progresso é irreversível. Cada invenção técnica provoca outras invenções em

outros domínios, ainda mais quando se trata de resolver problemas causados por seu próprio uso

(Ellul, 1968: 118). É o caso das destruições infligidas ao mundo natural, como a redução de recursos

naturais e poluição, que requerem novas técnicas para superarem-se (ibid: 222).

A origem do processo não é a questão central de Ellul, e sim sua autonomização, que garante

sua reprodução e continuidade. Em nome da eficácia, a técnica subjugou a civilização. Se a eficácia é

a principal razão de escolha das técnicas, o homem não é mais um agente das escolhas, pois a

eficiência e a eficácia se impõem. Pessoas que não falam a mesma língua se entendem quando

operam uma mesma máquina. Independentemente de qual tenha sido sua origem, o progresso

técnico se impessoalizou, se desenvolveu automaticamente, sem interferência do homem.

O diálogo com Marx aparece mais uma vez quando Ellul encaixa a economia nesse esquema

explicativo. Na visão do autor, a economia é apenas uma nova técnica criada como resposta a

necessidades criadas por técnicas precedentes e que também cria novas necessidades, como a

técnica do trabalho, que por sua vez produz o cansaço e requer a elaboração de técnicas de

entretenimento. Ellul argumentava que a eficácia da técnica supõe sua autonomia e independência

com relação à economia e à política. Todo o sistema está igualmente submetido à técnica, e não a

técnica submetida a economia.

Esse é o caso também da concentração de capitais – tema caro a Marx. Visto que os

investimentos em meios técnicos são cada vez maiores, indivíduos sozinhos não conseguem

financiá-los. Logo, a "concentração necessária dos capitais dá origem, seja à economia anônima, seja

à economia de Estado" (Ibid: 157). Mas essa concentração não gera aumento de lucros, apenas gera

vantagens técnicas (melhorias mecânicas e novas técnicas de trabalho). O domínio da economia

sobre cada vez mais domínios sociais se dá por intermédio da técnica, como ocorre com esse caso.

Neste esquema, Marx não estaria totalmente errado em adotar uma perspectiva materialista cujos

fundamentos são econômicos. Mas, na opinião de Ellul, seria preciso mais do que isso. O primado da

economia na verdade é um desdobramento do primado da técnica. A rentabilidade passou a ser mero

elemento de cálculo e o capital diminui de importância na medida em que a técnica avoluma-se,

afirma Ellul.

A técnica alcança todo o mundo (mesmo os não civilizados), de modo que todas(os) estão no

mesmo caminho, embora em pontos diferentes – eis a explicação do subdesenvolvimento. A principal

clivagem social não é mais a de classes e não há uma real diferença político-econômica entre

socialismo, capitalismo e totalitarismo. O principal critério para a escolha de um sistema capitalista ou

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socialista não é filosófico, mas a eficácia e o êxito.

Se a escolha de um sistema político é determinada pela técnica, a política como um todo

também o é. O interessante de sua análise sobre esse tema é que ali ele parece tratar de algo como

a ideologia nas sociedades técnicas. Na visão de Ellul, a política mantêm a aparência de liberdade

enquanto as decisões seguem as prerrogativas da técnica e o imperativo da eficácia e não são livres.

A outra face da mesma questão é o modo como as pessoas vivem a política. Os homens e mulheres

de hoje são então engolidas pela atualidade, que se impõe como critério para participar da política.

Visto que a legitimidade do Estado repousa sobre a participação de todos(as), cada um(a) passa a

ser chamado(a) a participar e o requisito para fazê-lo é conhecer tudo, sobretudo os fatos mais

recentes.

A produção desses fatos, por sua vez, é totalmente problemática porque se descola da

realidade. Segundo Ellul, um evento qualquer só se torna fato político na medida ao adquirir sentido

para as pessoas por meio de instituições (mídia, partidos, etc), as quais produzem imagens e

traduções a partir de preconceitos e contextos existentes. Finalmente, o evento original, na visão de

Ellul, já não é mais imediatamente acessível, e sim é reconstruído pela propaganda (1967).

A capacidade de reflexão, de criar uma memória, de relacionar acontecimentos ficam, no

mundo da técnica, submetidos à nova configuração do político – propaganda, atualidade, opinião

pública. E para não submergir em meio ao fluxo incessante de novidades, as pessoas são obrigadas

a esquecer. Ao mesmo tempo, não se consegue mais fazer previsões, já que no dia seguinte haverão

novas atualidades. Consequentemente, "l'obéissance à l'instant, la réaction à l'actualité sont les plus

radicales négations possibles de la liberté" (ibid: 91).

Diante de tudo isso, Ellul enfatiza que o marxismo não consegue mais explicar nada,

esgotou-se – embora tenha sido a única ideologia que exprimiu de fato a situação econômica, jurídica

e política do século XIX. Um sistema de produção que visa produzir sempre mais, orientado

exclusivamente pela eficácia, aniquila as capacidades subjetivas por meio da propaganda e da

atualidade, produzindo uma homogeneização por todas as dimensões em que se instala (na política,

na economia, no consumo, etc). O marxismo, tão frutífero entre as gerações passadas, não mais

serviria para pensar essa nova ordem da técnica que elimina o acaso e quaisquer outras formas de

produção, de política e de vida.

Como Ellul, Charbonneau refletia sobre os custos e consequências do progresso tecnológico

e ambos enfrentaram resistência do marxismo predominante entre a esquerda francesa no

pós-guerra (Cérézuelle, op. cit). As teses dos autores era que a técnica passara a ocupar lugar

fundamental na sociedade, antes ocupado pelo capitalismo. Ellul afirma que ele e Charbonneau

pensavam que se Marx fosse pensar o mundo em que viviam, não caracterizaria a sociedade pelo

capital nem pelo capitalismo, mas pelo desenvolvimento da técnica e o fenômeno do seu crescimento

(Ellul, 1982: 13).

Charbonneau (1973) defendia que a autonomia da economia e da técnica no capitalismo e no

socialismo levavam à destruição da liberdade porque invadiriam todas as esferas da vida com suas

leis e com sua organização. Essa autonomia seria um processo histórico cujo fundamento é antes

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espiritual que material. Se vivemos em uma sociedade em que o materialismo domina, defendia

Charbonneau, isso se dá não porque as relações materiais de produção orientam a organização

social, mas porque temos uma nova crença. Antes era Deus que ocupava o lugar central na

organização do cosmos, mas agora esse papel cabe à ciência, à razão, ao método e à técnica ( ibid).

Marx estaria certo ao dedicar seus pensamentos à economia política, já que esta orienta

todas as dimensões da vida social no capitalismo, dizia Charbonneau. Mas ao considerar o material

como produto de crenças,o autor não deu a devida atenção à dialética entre material e espiritual.

O processo histórico que deu origem ao novo sistema, que seria caracterizado nas palavras

de Cérézuelle como totalização social, estava ancorado na Guerra Fria. O capitalismo sempre foi

orientado para o crescimento, mas a competição entre Estados Unidos e União Soviética fez com que

essa orientação se transformasse em motor do mundo. Ou um país crescia (se nos moldes comunista

ou capitalista, pouco importava) ou estava perdido, ou seja,um país não tinha mais a escolha de estar

em equilíbrio. A novidade não é o crescimento em si, mas ele ter se tornado a única opção viável.

Gorz, quando fala em neocapitalismo ou capitalismo monopolista, está falando exatamente sobre

isso: um novo tipo de capitalismo cujo motor é o crescimento contínuo de produção e consumo.

Pelo próprio funcionamento e lógica interna do desenvolvimento da técnica, todas(os) estão

igualmente submetidos a ela, de modo que o mundo se torna uniforme. Tanto Tokio quanto Buenos

Aires estão diante da mesma realidade material "objetiva" da técnica, e não há duas formas de fazer

um avião aterrissar ou duas maneiras de fazer uma siderúrgica funcionar.

Mas a técnica não é só máquina, defende Charbonneau em profundo diálogo com Ellul. Para

que uma cadeia de produção funcione, é necessário que tudo esteja integrado e que haja uma

organização de tudo o que está envolvido. Quando essa organização é feita de forma hierárquica,

aparece a figura da administração. O Estado, a economia, a propaganda, a urbanização, o turismo e

o lazer como espaços de relação com a natureza, a burocracia, tudo isso são mediações técnicas da

vida social.

Consequentemente não faz mais sentido, diz Charbonneau, pensar a sociedade

exclusivamente em termos de classes já que todos estariam igualmente submetidos a um único

sistema. A burocracia, por exemplo, é uma forma de unir a organização humana com a organização

das máquinas. Ela se despersonaliza cada vez mais, processo que se dá também no interior do

Estado, fazendo com que o poder não se concentre mais nas mãos de pessoas determinadas, mas

que todos(as) o exerçam igualmente para fazê-lo funcionar. Não há, então, uma diferença essencial

entre as classes, não há mais dominadores(as) de um lado e dominados(as) de outro pois agora

todas(os) se associam em um aparelho burocrático, mesmo que alguns(as) tenham excelentes

salários e outras(os) não. Até mesmo os(as) diretores(as) passaram a servir ao sistema, mas não

percebem porque continuam exercendo autoridade, o que acaba por amenizar e esconder sua

posição de servidão (Charbonneau, 1973: 92).

Não são mais as classes ou o sistema político que definem as diferenças entre os países. O

marxismo e o socialismo "reduziram a questão social à oposição da burguesia e do proletariado"

(Charbonneau, 1988: 37), mas burguesia e proletariado "têm com efeito a mesma religião da indústria

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e o mesmo terreno de jogo – a cidade. Para um como para outro, o campo é um corpo estranho que

se suporta pior ou melhor, enquanto se aguarda o momento de eliminá-lo, brutalmente pela revolução

e metodicamente pela técnica" (ibid: 37). Charbonneau queria dizer que outras oposições passam a

ser mais significativas do que as classes, como aquela entre campo e cidade7, ou entre sociedade

industrial e sociedade tradicional; ou ainda entre países desenvolvidos e subdesenvolvidos, sendo os

primeiros aqueles totalmente organizados e os últimos, os que ainda resguardam espaços de

espontaneidade e não-organização técnica.

Assim como Ellul, Charbonneau analisa diversas dimensões, como política e economia, para

compreender de que modo se forma uma nova sociedade na qual toda realidade se submete à lógica

tecnicista e industrial. Mas, diferentemente do companheiro, parece conferir à produção material

industrial uma centralidade a partir da qual a organização se irradia para outras dimensões. Já Ellul

vê como central a prerrogativa da eficácia, que se espalha também para a produção material.

No sistema em que a técnica impera, a economia ocupou lugar fundamental, passando a ser

a nova religião universal. O dinheiro funciona como um signo que submete tudo à economia, que

serve à produção e à técnica, que media as relações privadas. O Estado assume função análoga à do

dinheiro, tornou-se mediador de relações públicas e também tem como finalidade única a produção8.

As relações de exploração do trabalho se dão na mesma chave. Não mais é uma questão de

enriquecer o patrão e sim para enriquecer a indústria. O trabalhador se libertou do Capital para se

submeter à Produção, diz Charbonneau, pois a exploração do trabalhador agora não se dá mais pelo

homem, mas pela economia e todas as pessoas passam a ser igualmente exploradas como recursos

naturais. O dinheiro e o Estado não servem mais a classes específicas, mas à produção – basta ver

que uma parte da mais-valia sempre volta para a aquisição de novas máquinas e meios de produção

(ibid: 105).

O processo que faz com que não haja mais classes é o mesmo que imobiliza os indivíduos e

elimina sua liberdade. As máquinas, a organização, a burocracia, os saberes técnicos e científicos

especializados controlam as forças sociais e podam as relações materiais e sociais espontâneas e

livres. Se o progresso nasceu para libertar o homem de Deus e das antigas formas sociais, ele trouxe

novos sofrimentos, diz Charbonneau. O produtor é reduzido à produção e o consumidor, ao consumo.

A origem da totalização social é a produção. Ela impõe sua organização por todos os níveis

para que possa continuar funcionando. Logo, ao invés de a organização permitir um real controle

social da economia, ela faz o inverso. Serva da economia, a organização comanda a política, as

cidades, as vidas das pessoas para que a produção não pare. (Charbonneau, 1973).

Em nome da organização, os indivíduos sequer podem ter ideias e correr riscos. Para que a

produção continue em perfeito funcionamento, todo o risco (exceto a guerra) deve ser garantido pelo

Estado, que assume formas burocráticas e replica os métodos de trustes privados, criando até

7 No livro Sans feu ni lieu de 1975 Ellul faz uma metáfora religiosa do nascimento da cidade por oposição ao campo, comose a primeira tivesse nascido pela destruição da segunda. Cf. Dufoing, 2011.

8 Segundo Cérézuelle, Charbonneau confere importância fundamental ao Estado na constituição da nova configuraçãosocial pautada pela técnica. Com a Primeira Guerra, os Estados viram-se diante da necessidade de controlar a produçãode forma total, unificada e eficaz. Assim, a organização e a eficácia foram se espraiando para outros setores, resultandoem uma totalitarização social.

XVIII Congresso Internacional da Associação Latino Americana de Sociologia. Recife, 2011 10

mesmo um sistema de seguridade social. A urbanização é outra face deste mesmo processo,

(Charbonneau, 1988: 49), que organiza materialmente a vida dos indivíduos para realizar os

imperativos da produção. Por isso Charbonneau diz que a produção é totalitária: ela impõe sua

organização por todos os níveis para que possa continuar funcionando. Assim, ao invés de a

organização permitir um controle da economia para que esta seja o meio, ela faz o inverso.

Illich, até os anos 1980, escrevia textos panfletários, sem longas reflexões teóricas, mas com

um objetivo claro: mostrar que em todas as dimensões sociais e em todas as instituições verifica-se

um processo análogo de contradições inerentes ao que se chama de progresso e de

desenvolvimento. Com a publicação do famoso relatório do Clube de Roma em 1972, o qual previa

uma diminuição da produção industrial e um aumento da produção de serviços para manter a

economia em funcionamento e ao mesmo tempo salvar a natureza (Meadows et al. 1973), Illich

passou a dedicar seus trabalhos a mostrar que não só a indústria destrói a natureza como também os

serviços destroem a cultura (Illich, 2006a; Robert e Borremans, 2010).

As críticas ao sistema produtivista não tinham uma filiação marxista, embora

esporadicamente Illich citasse Marx e não mencionasse outros predecessores. Isso indica que Illich

visava constituir uma crítica à sociedade que fosse independente da crítica do capitalismo. Os

trabalhos de Illich foram, já na época de publicação, difundidos em meios militantes franceses de

estrema esquerda não-marxistas (Robert; Paquot, 2010).

Assim como Ellul e Charbonneau, Illich argumentava que tanto os ricos como os pobres estão

submetidos ao mesmo sistema, o qual consiste em uma interversão dos meios em fins. Esse sistema

é mais significativo do que a exploração capitalista. Ao invés de pensar em termos de contradições,

Illich fala em contra-produtividade, fenômeno que se verifica em todas as sociedades industrializadas,

capitalistas ou socialistas. Contra-produtividade designa o modo como o desenvolvimento e o

progresso carregam em si sua destruição tanto bio-física quanto social e política. Illich verificava isso

nos transportes, na educação e na saúde – três temas importantes para a análise já que, segundo o

autor, são os elementos do desenvolvimento e da modernidade por excelência.

Com esse raciocínio, Illich se aproxima de Ellul e Charbonneau, ao mostrar que os problemas

de nossa sociedade não são desvios, mas constitutivos desta. Os três argumentam que aquilo que

nasce para nos libertar acaba por nos aprisionar. Segundo Boaventura de Sousa Santos (1975), Illich

buscava provar a lei hegeliana da transformação da quantidade em qualidade. Veja-se o caso do

consumo de energia: ultrapassando-se determinado limite, há um "efeito corruptor do poder

mecânico" (Illich, 1975: 27) que faz com que as pessoas não consigam mais controlar tal consumo e

que os poderes sejam transferidos para a técnica, deixando de ser políticos. Até agora, diz Illich, a

luta entre Estados e classes havia sido o principal agente de miséria. O indivíduo tinham que lutar

com a natureza e com suas(seus) vizinhas(os) (debates propriamente políticos na visão do autor)

para sobreviver, mas a situação mudou e a maior parte das misérias provocadas são resultado das

instituições originalmente desenhadas para proteger o homem em sua luta contra o meio ambiente e

contra as injustiças cometidas pelas elites (Illich, 2006a: 168). É o caso dos transportes, da educação

e da saúde.

XVIII Congresso Internacional da Associação Latino Americana de Sociologia. Recife, 2011 11

Uma vez que autoriza o deslocamento de maiores distâncias, o transporte motorizado

provoca o desaparecimento das relações e comércio local, já que obriga que as pessoas fiquem

presas ao carro para chegar a outros lugares, e também passa a determinar a configuração do

espaço social. "Ao ultrapassar certo limite de velocidade, os veículos motorizados criam distâncias

que só eles conseguem reduzir" (Illich, 1975: 48) e quem não dispõem de veículos motorizados não

consegue se locomover. Além da geografia, o transporte motorizado também altera o tempo social

quando o aumento do raio de circulação é acompanhado por um maior dispêndio de tempo com o

trânsito. Somando todo o esforço de uma pessoa para dirigir (tempo de trabalho para comprar o carro

e pagar as contas mais o tempo dirigindo), tem-se que uma hora avança apenas seis quilômetros. Em

países onde não há carros, uma pessoa também passa uma hora para se deslocar por seis

quilômetros, com a diferença de que gastam apenas 3% da sua vida se movimentando, contra os

25% gastos em países "motorizados", calculava Illich (2006c).

O indivíduo não domina mais seu próprio espaço e seu próprio tempo, nem as relações

sociais e políticas: "o motor mediatiza a sua relação com o meio ambiente e depressa o aliena de tal

modo que depende do motor para definir o seu poder político" ( ibid: 42). A transformação da

quantidade em qualidade, como sugere Souza Santos, diz respeito, então, a uma nova forma social

na qual a tecnologia se sobrepõe às relações da humanidade entre si e com a natureza. O

desenvolvimento da indústria, afirma Illich, se dá em detrimento da plena participação das pessoas,

da autonomia dos indivíduos e dos grupos de base.

Illich refletiu também sobre as ambiguidades da medicina. Da mesma forma que o transporte

motorizado implica imobilidade e escravização da maioria das pessoas ao carro, a medicina prolonga

o tempo da doença, cria novas normas a cada nova doença 'descoberta', os serviços médicos

encarecem e tudo isso contribui para a criação de uma população submissa e dependente, que ao

mesmo tempo não tem acesso por igual aos serviços médicos (Illich, 2006b).

A produção e distribuição de serviços médicos acarretam no processo de iatrogênise, ou seja,

na produção de doenças, sofrimento e morte pela própria medicina, cujo objetivo seria curar. "Las

dolencias, el desamparo y la injusticia que prevalecen son las consecuensias de las estrategias del

progreso", diz Illich (2006a: 168). Pode-se dizer que na leitura de Illich esse processo de

contra-produtividade da medicina só se dá à medida em que esta se torna a forma única e legítima de

saúde. Ou seja, a medicina só provoca mais sofrimento por ocupar todo o espaço da cura e da

relação com o corpo nas sociedades modernas. Consequentemente, aqueles que optam por não

entrar no sistema não conseguem ter êxito, pois uma vez legitimada, a medicina eliminou meios

tradicionais de lidar com a dor e a morte.

O mesmo processo se dá com a educação, que cada vez mais se reduz à escolarização. O

direito a aprender só se realiza pela escola (Illich, 2006d) e, mais do que isso, só por seu intermédio

podem ser formadas as elites dirigentes e profissionais que orientam a sociedade. Em países pobres,

a escolarização é ainda mais intensa na medida em que somente pela escola um indivíduo pode

obter um diploma para inserir-se na sociedade de consumidores disciplinados da tecnocracia (1973c).

Nos países latino-americanos investiu-se em educação com vistas a "tirar a maioria não-rural

XVIII Congresso Internacional da Associação Latino Americana de Sociologia. Recife, 2011 12

da sua marginalidade nos bairros de lata e numa agricultura de subsistência e levá-la para o tipo da

fábrica, de mercado e de vida cívica correspondentes à tecnologia moderna" (1973d: 140). Mas

concretamente a educação não gerou os frutos prometidos. Ao contrário, a escola produziu frustração

porque aparece como garantia de integração social mas não a realiza. A escolarização que nasceu

para incorporar igualmente todas as pessoas ao Estado industrial e que serviu para derrubar o

feudalismo, tornou-se um "ídolo opressor" que só protege aqueles que já foram educados, produzindo

desigualdades.

Essa realidade não é exclusiva de países pobres, diz Illich. Nos EUA a educação também é

aquilo que designa quais pessoas são qualificadas ou não. A diferença maior é que enquanto em

países ricos há escola para todos, em países pobres, não há. Mas nestes, a escola aparece como o

único meio de acender à riqueza, de modo que representa um fardo (Illich, 1973d: 155).

Fica em aberto, no entanto, uma questão. Por que mesmo escolarizadas as pessoas não

ficam ricas? A riqueza é excludente? As respostas estão ligadas à tentativa de Illich de reformular a

crítica social sem passar pela contradição de classes. Em sua visão, interessa menos a "oposición

entre uma clase de hombres explorados y otra clase propietaria de las herramientas" e mais a

"oposición qui se sitúa primero entre el hombre y la estructura técnica de la herramienta y, luego,

como consecuencia, entre el hombre y las profesiones cuyo interés consiste en mantener esta

estructura técnica" (Illich, 2006b: 468).

Illich não deixa explícito se a escolarização, a medicalização e o carro são produto de alguma

classe que pretende manter-se em sua posição de dominação ou se as instituições operam de forma

contraditória produzindo desigualdades entre aqueles que a consomem e aqueles não o fazem. Mas

novamente, ter acesso a certa instituição pressupõe, em algumas passagens dos escritos de Illich,

que se tenha dinheiro e não são todos que o tem.

Ao tentar contornar a questão das classes, Illich oscila entre duas explicações. Ora é o

sistema que cria as desigualdades, ora ele se impõe a uma realidade já cindida. Os diplomas criam

uma diferenciação social, mas essa diferenciação só se dá a partir de uma diferença anterior: os que

tiveram e os que não tiveram acesso ao ensino formal. Com os carros, passa-se uma ambiguidade

semelhante. Illich afirma que o automóvel nasceu como produto de luxo, o que quer dizer que existem

ricos e pobres antes que o trânsito se transforme em espaço exclusivo de veículos motorizados. E

uma vez que isso ocorre, os transportes criam uma desigualdade social entre os que têm e os que

não têm carro.

Illich poderia sugerir que as novas desigualdades são uma transformação das contradições

de classe, mas não é isso que ele faz. Ao afirmar que todos e todas estão igualmente presos a uma

sociedade escolarizada, médica e de carros, ele não dá conta de explicar como, em um mesmo

sistema, alguns conseguem e outros não. Mas apesar de não conseguir explicar satisfatoriamente a

desigualdade a partir de seu quadro conceitual, Illich dá mais atenção ao Terceiro Mundo do que seus

companheiros, os quais também viam no novo sistema uma ruptura com os sistemas anteriores.

Estes estavam mais atentos a um sistema que perpassa igualmente o socialismo e o capitalismo,

enquanto Illich refletia sobre um sistema que submetesse ambos e também os países pobres.

XVIII Congresso Internacional da Associação Latino Americana de Sociologia. Recife, 2011 13

Gorz distanciava-se de seus contemporâneos por submeter suas análises a um vocabulário

marxista, e não por tentar superá-lo. Mas também aproximava-se deles no que se refere ao

diagnóstico de uma nova forma social desenvolvida com o pós-guerra, bem como à constatação da

submissão das necessidades e criatividade humana à técnica. Gorz entrara em contato com os

trabalhos do grupo de Illich no fim da década de 1960 e lera os manuscritos de Nemesis Médica em

1974. Sua impressão na época foi de que Illich revigorava as teorias de Ellul (Gorz, 2008: 54). Antes

de começar a se dedicar à ecologia, nos anos 1970, Gorz se debruçava sobre a configuração do

capitalismo contemporâneo e sua preocupação principal era produzir reflexões para a luta de

trabalhadores, coroando suas reflexões com a temática da auto-gestão.

Como dizia Charbonneau, a competição entre EUA e URSS criou um novo critério de

comparação entre os países: instituiu um novo sistema de produção e consumo voltado para o bem

estar e para o crescimento. Gorz, observando os países capitalistas, chama de capitalismo

monopolista o sistema cujo fundamento é a expansão da produção voltada para o consumo de

massas. Em outras palavras, tratar-se-ia de um sistema que, pela primeira vez, teria feito uma ligação

imediata entre crescimento econômico e consumo de massas. O capitalismo monopolista seria

pautado na venda de produtos e serviços para consumidoras(es) e sua manutenção dependeria das

pessoas comprarem e usarem os serviços oferecidos pelo sistema, donde a manipulação das

necessidades e desejos.

O consumo das massas se transformou no motor do crescimento econômico. Não mais se

trata de industrialização maciça como sinônimo de crescimento econômico, e sim de produção de

bens de consumo e de serviços. E, uma vez que os desejos das massas tornam-se peças tão

importantes não poderiam ser deixados por sua própria conta. Foi assim que a publicidade assumiu

papel central no sistema, já que era a ela que cabia criar desejos e necessidades entre as massas de

consumidores. Tudo se passa como se a economia se desenvolve para satisfazer as necessidades

humanas, mas a realidade, diz Gorz, é que as necessidades são forjadas para produzir lucro (Gorz,

1991).

Uma vez que o capitalismo monopoliza as necessidades dos indivíduos, a consequência é a

homogeneização e a padronização dos comportamentos e aspirações dos indivíduos. Normalmente

isso era visto com bons olhos, como um processo de aburguesamento do proletariado.

Evidentemente, Gorz opunha-se a essa leitura otimista e defendia que a homogeneização produzia

uma dominação generalizada de modo que tanto proletários como colarinhos-brancos padeciam de

alienações similares; até mesmo as necessidades mais íntimas estão foram sujeitas à determinação

do capital.

O capitalismo monopolista caracteriza-se também por uma reconfiguração da organização do

trabalho, ou melhor, da divisão do trabalho. No lugar do(a) empresário(a) individual apareceram

grupos de técnicos(as) especializados(as) em planejamento e organização racional que tentavam

suprimir qualquer imprevisto, improvisação ou intervenção pessoal. As empresas passaram a

obedecer critérios impessoais e objetivos de funcionamento, que demandavam especialização tanto

das camadas dirigentes quanto das massas e a produção deixou de estar sujeita a determinações

XVIII Congresso Internacional da Associação Latino Americana de Sociologia. Recife, 2011 14

pessoais ou de classe. Quanto ao proletariado, este foi quantitativamente reduzido e qualitativamente

transformado em mão-de-obra qualificada. A isso Gorz (1978a) dá o nome de heteronomia: todos(as),

patrões(as) e empregadas(os), se transformaram igualmente em engrenagens de um mecanismo que

não mais lhes diz respeito. Charbonneau diagnosticava também a "despersonalização" de todo o

sistema e dava pistas de que isso alterava a composição das classes, embora não usasse o termo

heteronomia.

Nos anos 1970, quando começou a se engajar com questões ecológicas9, conferindo especial

atenção à heteronomia provocada pela submissão das necessidades e desejos à técnica, Gorz trouxe

novas reflexões sobre a transformação do mundo da produção e do trabalho. Os trabalhadores são

agora substituídos por máquinas. Tais máquinas custam caro e seu valor é repassado para a

mercadoria. Na concorrência, cada capitalista busca rentabilizar suas máquinas o mais rápido

possível, investindo em máquinas mais eficazes, mais caras e que necessitam de menos

trabalhadores para aumentar a produtividade. Assim, a composição orgânica do capital muda (diminui

o capital investido em salários e aumenta o investido em máquinas) promovendo uma queda

tendencial da taxa de lucro10. Se o lucro cai, torna-se mais difícil investir em novas máquinas mais

caras pois há menos dinheiro. A esse processo segundo o qual o peso do capital na produção cresce

de tal modo que o capital não pode mais se reproduzir em ritmo normal, Gorz dá o nome de

sobreacumulação (1978b).

Trata-se de uma contradição: a tendência do capital de investir em máquinas produtivas para

manter seu crescimento leva a uma inviabilidade de crescimento porque o crescimento baixa os

lucros. E para que essa crise não aconteça, Gorz afirma que os capitalistas adotam duas medidas:

diminuir o tempo útil dos produtos para aumentar o número de mercadorias vendidas e sofisticar

produtos para que seus preços aumentem cada vez mais. Ambas as soluções, por sua vez,

encontram novos problemas. A produção cada vez maior de bens implica a utilização de recursos

naturais finitos como água e petróleo; o consumo de bens descartáveis gera uma quantidade cada

vez maior de lixo (ibid). Mas essa nova crise não pode ser resolvida tão facilmente quanto a outra,

porque a contradição agora não é interior à lógica do sistema, e sim vem de fora, dos limites da

natureza.

Pode-se ver, aqui, um desenvolvimento particular da ideia de contra-produtividade

desenvolvida por Illich. Gorz enfatiza que a contra-produtividade é inerente ao sistema – por isso

Souza Santos insistira sobre o caráter dialético e não histórico e/ou temporal do desenvolvimento das

contra-produtividades. A diferença é que Gorz liga essa contradição a um sistema maior: a

contra-produtividade é inerente ao sistema pois o crescimento é uma exigência do capital e supõe um

investimento que acaba por limitar o próprio crescimento do lucro. E quando o capital acha uma

solução para essa crise, essa solução carrega em si outra crise, agora ecológica. A

contra-produtividade é, portanto, uma contradição que se desdobra de outras contradições do

9 Esse engajamento se estendeu por toda a sua vida. Em 1991 publicou o livro Capitalisme, socialisme, écologie, compostopor artigos recentes publicados em outros locais. Contribuiu também com artigos para a revista EcoRev', onde foi publicadoseu último texto, escrito logo antes de seu suicídio.

10 Para compreender melhor o desenvolvimento de Gorz, cf. Marx. 1985.

XVIII Congresso Internacional da Associação Latino Americana de Sociologia. Recife, 2011 15

capitalismo (como a queda tendencial da taxa de lucro).

Segundo o próprio autor, as análises de Illich sobre contra-produtividade e monopólio radical11

são muito próximas do que os marxistas entendem como extensão das relações de produção para

outras esferas (Gorz, 1978c). Falar em contra-produtividade significa fazer uma crítica das relações

de produção capitalistas, fundadas na divisão social do trabalho. Por divisão do trabalho Gorz se

refere à separação social dos trabalhadores e a sua separação com relação aos meios de produção

para que sirvam exclusivamente ao capital. Se o capital controla a organização social do trabalho,

também controla a dimensão técnica, que por sua vez, não é neutra e sim submetida à produção. Por

exemplo: moinhos de vento foram extintos não por sua ineficácia, mas porque o vento é acessível a

todos e isso poderia colocar a produção capitalista em xeque, afirma Gorz. O capitalismo produz

apenas as técnicas compatíveis com sua lógica de dominação, convertendo as técnicas em matriz

das relações de poder, das relações sociais de produção e da divisão hierárquica do trabalho. A

energia nuclear, por exemplo, supõe e impõe uma sociedade hierarquizada, centralizada e policiada.

2. Sociedade de massa e os modos de vida

Os quatro autores argumentam que não faz mais sentido pensar a sociedade em termos de

classes porque há um sistema impessoal, racional e técnico de produção que se espalhou por todas

as dimensões da vida social, criando uma nova forma de alienação que concerne a todas(os),

independentemente da ocupação, do nível sócio-econômico, do país e do regime político. Até mesmo

a vida cotidiana foi submetida aos imperativos do crescimento, da técnica, do capitalismo

monopolista.

Gorz e Charbonneau viam uma transformação inédita na economia, que passou a se destinar

às massas fazendo com que crescimento econômico fosse sinal de bem estar e de consumo. Ao

contrário do que se dizia à época, os quatro autores discordavam de que o aumento do poder de

consumo fosse sinal de melhoria da qualidade de vida, ou sinal de democratização. Diante da

estandardização e homogeneização da produção e do consumo, Ellul recusava o argumento do

aumento da liberdade na massificação do consumo: "onde não há mais escolha, o que há é ditadura"

(1968: 218). Todas as escolhas das pessoas passaram a ser pautadas pela técnica, sobretudo pela

propaganda (que não se reduzia apenas à publicidade, mas se estendia por todas as dimensões

sociais, dizia Ellul).

A partir de seu diagnóstico, o autor constatava que a mulher e o homem tornaram-se

definitivamente seres econômicos, como preconizavam as teorias: inserem-se por inteiro em um

mecanismo cujos valores são reduzidos ao dinheiro. E para que as pessoas consigam lidar com essa

nova realidade, cria-se o mito revolucionário cujo principal fundador, nas palavras de Ellul, foi Marx.

Tratar-se-ia de um mito na medida em que o proletariado apenas quer tomar o lugar da burguesia. E

tanto para o(a) proletário(a) quanto para o(a) burguês(a), um ser humano não passa de uma máquina

de produzir e consumir e o importante não são suas necessidades, mas o escoamento de produtos.

Charbonneau via nesse processo todo o fim da espontaneidade, a perda da liberdade, a

11 O conceito de monopólio radical será explorado adiante.

XVIII Congresso Internacional da Associação Latino Americana de Sociologia. Recife, 2011 16

homogeneização e o fim da multiplicidade cultural e a angústia vivida por cada indivíduo. Diante das

mudanças constantes e das novas necessidades que devem ser supridas, o resultado é o sentimento

de que jamais conseguiremos atingir a felicidade. (Charbonneau, 1973: 187). Illich, preocupado com

as desigualdades sociais, vê nisso que Charbonneau chama de angústia o elemento fundamental

para definir o subdesenvolvimento. Desenvolvidas(os) são aquelas(es) que tem meios para consumir

e/ou acessar o sistema que se lhes impõe, e subdesenvolvidos(as) são aqueles(as) que estão diante

do mesmo sistema mas não têm como usufruir dele. O que Illich e Charbonneau estão mostrando é

que os sofrimentos são sociais, tanto no sentido de que são produtos de novas configurações, como

também geram uma situação social inédita de subdesenvolvimento.

As imposições do sistema à vida social e individual configuram-se como monopólio, defende

Illich. Considerando-se que a partir de certos limites a técnica ou a instituição deixam de ser uma

opção e se convertem em necessidade, estas só podem ser satisfeitas pela produção técnica e

industrial. Com o advento dos transportes motorizados, por exemplo, tudo é reorganizado de modo

que não há mais possibilidade de transitar de outra forma e as pessoas veem-se obrigadas a

utilizarem um produto industrial (Illich, 1975).

O monopólio cria duas alienações: a primeira diz respeito às necessidades, as quais resultam

de um processo técnico e industrial alheio aos transeuntes; a segunda vem do fato de a satisfação

dessas necessidades forjadas só se darem por mercadorias produzidas por terceiros, no caso, as

grandes indústrias automotivas. É importante frisar que o monopólio se exerce em detrimento de

produtos, meios de produção e formas de organização tradicionais. Daí a expressão monopólio

radical para designar a situação na qual a indústria e as instituições controlam a produção e os

desejos humanos por seus próprios produtos.

Gorz considerava os monopólios radicais destruidores das condições da auto-determinação

humana, pois quem determinava tudo, da produção econômica aos desejos mais íntimos, era o

capitalismo, de modo a impossibilitar os(as) trabalhadores(as) de produzir aquilo que necessitam ou

desejam. A(o) operária(o) trabalha servindo à máquina ao invés de servir-se dela. Isso atrofia as

faculdades dos indivíduos e sua capacidade de produzirem a si mesmos. E a divisão social e

territorial do trabalho esfacela o tecido social e as relações mútuas. Por conseguinte, esse

esfacelamento é suprido pela atividade institucional do Estado: proteção, saúde, educação (Gorz,

1978: 47).

Todas essas críticas a um sistema que destruía a liberdade humana centravam-se nos

modos de vida. A emergência da sociedade de massas no lugar da sociedade de classes foi

acompanhada por outra inflexão nas análises de esquerda nos anos 1960 e 70, que dizia respeito à

atenção a outras dimensões da vida social antes não exploradas: a vida cotidiana, o trânsito, a

escola, o lazer, a fábrica, os desejos de consumo, a televisão tornaram-se alvo de análise.

Pode-se dizer que a vida cotidiana tornou-se o cerne das análises sociais na França, de três

maneiras. Em primeiro lugar, passou a ser vista como alvo de intervenção do novo sistema técnico

(Arvon, 1977), sendo a propaganda e a sociedade de massas duas faces do mesmo processo. Em

segundo lugar, é por meio de uma análise das vidas cotidianas que os autores apreendem todo o

XVIII Congresso Internacional da Associação Latino Americana de Sociologia. Recife, 2011 17

sistema. O trânsito, a medicina e o turismo eram ao mesmo tempo espaços nos quais a técnica

intervinha e eliminava as liberdades individuais ao mesmo tempo em que, através deles, poder-se-ia

vislumbrar todo o sistema. Por fim, a vida cotidiana, torna-se o novo locus da ação política e da

transformação social, como veremos a seguir. As obras de todos dos quatro autores não eram

meramente contemplativas e carregavam em seu seio reflexões acerca da transformação do mundo.

3. Práxis e transformação social

A defesa e conservação da natureza não eram o elemento chave da obra de nenhum desses

autores, embora se engajassem em movimentos ecológicos12 e dedicassem trabalhos ao tema. O

meio ambiente era um problema como tantos outros, decorrente de um sistema que subjuga a

humanidade, as relações políticas reais, as relações de sociabilidade, o trabalho e também a

natureza. Mas as lutas ecológicas representavam, para os autores, importantes meios para se

questionar o sistema ao jogarem luz sobre os estragos que promovidos pelo crescimento e pelo

progresso técnico. Além disso, as pessoas que militavam por movimentos ecológicos propunham

novas formas de relações sociais e relações com a natureza e enfatizavam a aspectos concretos da

vida cotidiana como alvo de transformações.

Se há algo a ser feito, na visão dos quatro autores aqui em questão, não se trata de uma

revolução em sentido abstrato, e sim de uma transformação que seja vivida no cotidiano, nas

relações políticas, na produção, no consumo, nas relações sociais e na relação com a natureza.

Quando o trabalho desaparece por conta das máquinas e quando a diferença de classes é

esterilizada pela dominação imposta pela técnica, como sugerem os autores, o motor da

transformação social não está mais na luta no interior da sociedade, ou mais precisamente, deixa de

ser uma luta entre patrões(as) e proletárias(os).

Se considerarmos outras novas correntes de esquerda que explodiram na França em Maio de

1968, veremos que Illich, Gorz, Ellul e Charbonneau não estavam sozinhos. Como afirma Arvon:

Le gauchisme désire unir en une seule gerbe d'espoir la transformation de la société et lechangement de la vie. Cette recherche d'une vie nouvelle naît de la conviction que l'homme n'estpas seulement un être pratique mais qu'il lui faut satisfaire des besoins imaginaires, qu'il est enmême temps un être politique et un être affectif

Arvon, op. cit.: 11

Illich visava outra forma de vida que passasse tanto por novas relações de produção como

por novas subjetividades, novas relações com o meio e novas relações entre as pessoas, a

convivialidade. Essa nova forma social seria caracterizada pela determinação social e política da

produção, de modo que esta não se sobrepusesse às capacidades humanas, inclusive culturais, de

lidar com a natureza e com a humanidade, e que não promovesse desigualdades. I llich chega a

apresentar sugestões práticas: investimento em transporte coletivo; distribuição dos custos da

educação especializada entre as empresas já que elas próprias deveriam formar sua mão de obra,

independentemente da idade; redução do tempo diário de escola e extensão do aprendizado por 20

12 Charbonneau presidiu o Comitê de defesa da Costa Aquitânia entre 1973 e 77, seguido por Ellul, de 1977 a 79. Além disso,escrevia no periódico La Gueule Ouverte. Promoviam discussões do grupo Esprit em locais abertos no interior da França.Gorz se mudou com sua esposa para o interior da França onde buscavam ter uma vida alternativa.

XVIII Congresso Internacional da Associação Latino Americana de Sociologia. Recife, 2011 18

ou 30 anos para que a educação formal (gramática, matemática e técnicas) possa ser feita de

maneira rápida e pontual, enquanto a sabedoria deve ser aprendida por toda a vida; consideração de

outras formas de educação, como aquelas intermediadas por guerras de guerrilha13.

No lugar da medicina, Illich sugere uma reação autônoma e viva às mudanças de ambiente,

ao crescimento, ao envelhecimento, às doenças, ao sofrimento e à morte. Uma vida autônoma é

necessária para lidar bem com a dor, a doença e a morte. É preciso reintegrar o sofrimento à vida

pois é isso que constitui a natureza humana (Illich, 2009). As ciências podem continuar a existir, já

que oferecem conhecimentos interessantes para criar novas ferramentas para que as pessoas

modelem seu meio ambiente imediato sem deixar de carregá-lo de sentido e signos. Mas só podem

fazê-lo sob a condição de serem aplicadas em aliança com saberes tradicionais, que não serão mais

desqualificados.

O ideal seria um mundo da eficácia pós-industrial14, no qual o novo sistema de produção

estivesse ligado a uma dimensão pessoal e comunitária, "onde a modalidade industrial de produção

complementa a produção social sem a monopolizar" (Illich, 1975: 78). Uma ferramenta justa "es

generadora de eficiencia sin degradar la autonomía personal; no suscita ni esclavos ni amos;

expande el radio de acción personal" (Illich, 2006b: 383). No lugar da produtividade industrial, deve

estar a convivialidade.

A mesma questão da liberdade é posta por Ellul, que acreditava que a revolução só existiria

se as pessoas mudassem o seu interior. Somente uma "revolução da civilização" levaria a uma

"revolução personalista", instaurando novos estilos de vida (Troude-Chastenet, 1998). Pequenos

grupos auto-organizados substituiriam pouco a pouco os Estados, fortalecendo a participação política

e limitando as possibilidades de guerra, já que funcionariam como contra-sociedades. Seriam como

uma espécie de revolução imediata, pois poderia se espalhar para além das fronteiras – fazendo-as

mesmo desaparecer. Ellul e Charbonneau chegaram a organizar acampamentos nos Pirineus nos

anos 1930 para provar que um modelo de sociedade personalista (pequenos grupos em contato

direto com a natureza) poderiam existir concretamente (Troude-Chastenet, 2005).

Para Charbonneau, liberdade é autonomia para lidar com o próprio corpo, com as relações

com outras pessoas e com a natureza. A exploração da natureza não deve estar submetida às leis da

ciência, da técnica ou da razão, mas tudo isso deve se submeter à busca de liberdade humana. É

preciso desenvolver o campo, e não destruí-lo. É preciso adequar as máquinas às necessidades

humanas e não o contrário. O progresso da liberdade não significava a "impessoalidade do poder",

como se acreditava em sua época (Charbonneau, 1973: 190). Liberdade era autonomia, mais do que

libertação do trabalho e aumento do tempo de lazer (Charbonneau, 2010; Lamaud, 2011).

Uma nova sociedade apenas florescerá quando as dicotomias existentes forem reconhecidas

enquanto tais e superadas. Trabalho e lazer, natureza e humanidade, campo e cidade. Para de fato

salvar a natureza e resguardar as relações humanas, "é necessário caminhar a contrapelo da

natureza" (Charbonneau, 1988: 203). Se as novas críticas continuarem postulando dicotomias, elas

13 Illich sempre citava Paulo Freire em suas reflexões sobre novas formas de educação desescolarizada.14 Illich usa o termo pós-industrial porque recusa uma volta ao passado. Cf. Illich, 2006b.

XVIII Congresso Internacional da Associação Latino Americana de Sociologia. Recife, 2011 19

apenas serão incorporadas por movimentos de direita (como movimentos nazistas). A liberdade só

será alcançada quando os polos opostos conviverem harmoniosamente. O equilíbrio só será de fato

atingido quando, por fim, os valores forem invertidos, quando os fins comandarem os meios; quando

as necessidades e a liberdade humana comandarem o desenvolvimento da técnica, da economia e

da política. Em suma, a liberdade só se realizará na medida em que as pessoas aceitarem as

contradições entre a liberdade humana e os mecanismos para atingi-la.

Assim como seus companheiros, Gorz não divinizava a natureza. O problema sobre o qual se

debruçava também era a liberdade humana, minada pelo capitalismo e pela heteronomia. Na visão de

Gorz, o movimento operário italiano oferecia potenciais contribuições para recusar o capitalismo:

defesa incondicional da integridade física e cultural dos(as) trabalhadores(as), luta pela igualdade de

salários, pela supressão das tarefas não qualificadas, repetitivas e embrutecedoras, defesa da

auto-gestão do trabalho da reconquista da escola. Tudo isso só viria a se realizar na medida em que

cada setor da classe trabalhadora se reconhecesse como explorada e percebesse que a

fragmentação do trabalho é uma ferramenta de controle do capital. Cada setor, como os técnicos e os

intelectuais, só poderia se emancipar juntamente com outros setores, negando interesses

corporativos. Além disso, os sindicatos deveriam superar a organização verticalizada pela

auto-gestão, com assembleias livres.

A ecologia política dava ensejo a tudo isso, acreditava Gorz. Não era uma questão de

divinizar a natureza; sua contribuição era de outra ordem: jogar luz sobre o fato de que a produção

incessante, o consumo de massas e as instituições criadas para resguardar a acumulação de capital

acabam com a natureza e com a humanidade (Gorz, 1978b).

Gorz não pretendia sugerir novas ações, já que defendia a auto-gestão15, mas ainda assim,

aponta algumas ideias para que a auto-gestão se realize em oposição ao capitalismo. O ideal, diz ele

(1978i), seriam imóveis coletivos, com poucas máquinas e ambientes comuns; uma produção de

produtos que duram muito tempo, apenas poucos modelos que sejam suficientes para todos;

máquinas fáceis de serem consertadas; jornada de trabalho de 20 horas. Não seria uma sociedade

uniforme, porque haveriam ateliês em cada bairro para que as próprias pessoas construíssem para si

mesmas aquilo que é supérfluo. Essa utopia pode se converter em um programa, que corresponde à

forma mais avançada do socialismo.

A autogestão pressupõe necessariamente unidades econômicas e sociais pequenas para que

suas atividades produtivas e a divisão de tarefas possam assegurar a uma mesma unidade territorial,

diversidade de capacidades e talentos, riqueza das trocas humanas, possibilidade de ajustar parte da

produção aos desejos e necessidades locais e um mínimo de autarquia local (1978b: 50). Além disso,

a autogestão requer métodos de produção utilizáveis e controláveis em nível local (quarteirão, bairro),

geradores de autonomia econômica das coletividades locais, não destrutivos e compatíveis com o

poder que produtores e consumidores exercem na produção (ibid: 27).

15 A auto-gestão, no entanto, não é uma panaceia, diz Gorz (1968a). Em uma situação de penúria material, se não houverreflexões constantes, a busca por maiores rendimentos materiais pode apenas reproduzir a separação entre trabalho elazer, de modo que o primeiro continue sendo o "purgatório" (: 144) para se atingir a liberdade no último.Em situações de pobreza, são necessárias intervenções políticas na economia com objetivos a longo prazo, o que requerdecisões centralizadas.

XVIII Congresso Internacional da Associação Latino Americana de Sociologia. Recife, 2011 20

Qualquer que seja a linha ou o desdobramento argumentativo dos autores, fica evidente que

havia uma preocupação de ordem prática, ou mais precisamente, de ordem da realização da

transformação social. As teorias sobre capitalismo monopolista ou sobre sociedade técnica foram

desenhadas tendo em vista as brechas e os modos de ação possíveis para superar o sistema

vigente, e como o sistema mudara, a ação política deveria mudar também. Vimos que não se fala em

revolução, e que o socialismo deixa de ser horizonte para Ellul, Charbonneau e Illich enquanto Gorz

só aceita o termo se passado por uma revisão.

A entrada em cena da subjetividade e dos modos de vida acompanhou o "diagnóstico" do fim

da luta de classes como motor da história. Sindicatos e partidos deixaram de fazer sentido como

instrumentos de luta e foram cada vez mais perdendo espaço para outras formas de organização

política, marcadas pela reivindicação de outras formas de vida (sendo a própria ação política muitas

vezes reduzida à adoção de modos alternativos de vida cotidiana). A ecologia aparecia aos autores

como uma esperança por ser uma luta contra uma forma de sociedade, de economia e de política que

afetava igualmente todos os indivíduos e que provocava transtornos até nos níveis mais íntimos da

vida humana. Pela ecologia os autores vislumbravam novas formas de ação e novas formas de vida.

4. Ecologia política, uma nebulosa da nova esquerda anti-marxista.

As reflexões sobre o que veio a ser chamado de ecologia política eram parte de um quadro

de questões mais amplas, associadas a uma crítica mais geral da sociedade. Troude-Chastenet

(1998) faz uma lista dos temas trabalhados pela ecologia política e então afirma que esses temas já

estavam presentes nos trabalhos de Ellul nos anos 195016: recusa da clivagem entre direita e

esquerda, crítica do Estado e da burocracia, do produtivismo, da organização capitalista do trabalho,

da primazia do econômico, do consumo, do centralismo e defesa da democracia direta, da escala

local, da auto-gestão e autonomia nos planos político e econômico, da frugalidade e de um certo

ascetismo, do meio ambiente e conservação da natureza. Troude-Chastenet diz ainda que as ideias

de Ellul e Charbonneau prefiguravam as teses que seriam desenvolvidas nos anos 1970 por

Castoriadis, Gorz, Illich, Schumacher e Dumont. Contra a corrente, Ellul e Charbonneau se opunham

ao produtivismo e ao consumo.

O que vimos, até aqui, foi que as teses desses autores estavam em profundo diálogo como

marxismo de sua época. Mas ainda hoje podemos a relação entre ecologia e marxismo continua

presente e marca as reflexões sobre o que vem a ser ecologia política. Esta é vista como uma fonte

revigorante do marxismo, a qual consegue dar conta de problemas que o último supostamente não

conseguiu resolver.

Assim como o comunismo foi uma resposta de Marx aos limites da Revolução Francesa, aecologia política, de fato, parece destinada a ser a resposta à tragédia do comunismo hoje. Assimcomo a teoria de Marx foi uma resposta ao problema-chave do século XIX, a elaboração de umateoria e de um programa ecológico parece fadada a ser a resposta da humanidade ao grandeproblema do século XXI.

Lipietz, 2002: 12

16 Dufoing (2011) refuta as interpretações que afirmam que Ellul criticava uma forma de sociedade distanciada da natureza.Sua tese é que Ellul estava antes preocupado com questões religiosas e suas críticas eram direcionadas a uma separaçãoentre sociedade e Deus.

XVIII Congresso Internacional da Associação Latino Americana de Sociologia. Recife, 2011 21

Andrea Zhouri também vê na ecologia política a possibilidade de superação do marxismo.

Crítica em relação aos custos crescentes da reprodução do sistema produtivo, a ecologia políticaia além da análise das contradições do modo de produção capitalista para denunciar umaalienação mais radical que a simples expropriação da mais-valia, qual seja, a alienação entre asociedade industrial e a natureza.

2004: 211

Nos anos 1960 e 70, na França, essa denúncia, no entanto, não constituía um corpo unívoco

de conceitos; eram nebulosas (Jacob, 1999: 8) ou correntes diversas que se cruzavam em vários

pontos comuns que viam na ecologia um projeto revolucionário pós-marxista (Dufoing, 2011; Ekovich,

1996)17. Algumas correntes criticavam a sociedade moderna em nome dos velhos tempos; outras

acusavam a busca do lucro desenfreado por ser indiferente aos equilíbrios ecológicos (Jacob, op. cit).

A ecologia científica incorporou questões de outras ciências, como a demografia, a agricultura, a

economia (cf. Déléage, 1991). Enquanto isso, o antigo sentimento de retorno à terra e as

preocupações sobre o esgotamento da natureza (proteção de espaços "naturais" e de certos animais,

sobretudo pássaros) transformaram-se em preocupações sobre a vida, o consumo, a poluição e

outros domínios que ultrapassam em grande medida conhecimentos exclusivamente sobre a natureza

(Cans, op. cit.: 86 ).

Ao lado das teorias sobre ecologia, verifica-se uma reconfiguração da esquerda em sentido

mais geral. No que tange à produção política-intelectual, havia um descontentamento com o

marxismo, por um lado e, por outro, uma defesa ferrenha de leituras "fiéis" dos trabalhos de Marx

(Oelgart, 1970). A reconfiguração dava-se também nas práticas de militância política e maio de 68 foi

um marco fundamental na constituição de novas formulações de ação. Novos atores políticos

entraram em cena: grupos não ligados à identidade de classes (feministas, estudantes) e cientistas e

especialistas, que saíram de seus laboratórios para defender causas políticas ligadas a aquilo que

estudavam. Os ecologistas aprenderam com as revoltas de maio a desafiar o poder, a clamar por

suas convicções e a lidar com o público não engajado (Cans, op. cit: 110).

Nos anos que se seguiram, a questão da intervenção humana sobre a natureza

intensificou-se. Em 1972, foi realizada uma grande manifestação de bicicletas contra a construção de

uma pista para automóveis na margem esquerda do Sena. Brice Lalonde, que viria a ser ministro do

meio ambiente na França entre 1988 a 1992, participou dessa manifestação e em 1973 seguiu com

mais quatro homens em um pequeno barco de madeira da Nova Zelândia à Polinésia Francesa,

representando a associação Amis de La Terre, em oposição à política de energia nuclear de

Pompidou. Uma série de associações se formou e vários jornais começaram a publicar artigos sobre

ecologia como vocabulário político. Além disso, publicações "ecológicas" começaram a aparecer,

como o jornal La Gueule Ouverte e o Le Sauvage. Militantes em defesa do meio ambiente

mudavam-se para o campo onde cuidavam de ovelhas e vendiam queijo orgânico (ibid: 115).

As novas questões ecológicas eram acompanhadas de um novo tipo de militância pautado na

17 Vale notar que autoras(es) contemporâneas(os) como Michael Löwy (2005) e Isabel Loureiro (2004) estão preocupadosconjugar uma crítica ecológica com reflexões marxistas sem a pretensão de "superar" as últimas. Loureiro (2004; 2011)defende que Marcuse, nos anos 1960, teria tecido profícuas críticas ao capitalismo sem defender um retorno romântico aum passado de conciliação com a natureza.

XVIII Congresso Internacional da Associação Latino Americana de Sociologia. Recife, 2011 22

vida cotidiana e em problemas "concretos". O modo como Roger Cans descreve Brice Lalonde ilustra

essa nova militância.

Ce fils de la grande bourgeoisie, élevé dans le confort et la liberté, se méfie autant du dogmatismemarxiste que de la rhétorique gauchiste. Ce qu'il veut, ce n'est pas renverser le régime nibouleverser la société, mais rendre la vie quotidienne non seulement plus vivable, mais agréable,et notamment en ville où la 'bagnole' est en train de trout dévorer.

Ibid: 135

No interior do governo, o meio ambienta também passou a figurar depois de 1968. A criação

de um Ministério do Meio Ambiente na França, em 1971, passou pela reorganização de outros

ministérios: o da Indústria perdeu as prerrogativas de controle e o da Agricultura perdeu a tutela sobre

a pesca, a caça e a água. Pompidou, na visão de Cans, era favorável à industrialização, mas deu

espaço a um ministério verde porque era afeito à modernidade e considerava o meio ambiente um

tema do futuro (ibid: 125).

Alguns autores defendem que a ecologia política e os movimentos ecológicos,

independentemente da corrente ou da posição no interior da nebulosa, trouxeram ganhos por

questionar a dicotomia fundante da modernidade, qual seja, entre natureza e humanidade. Viveiros

de Castro (2007) afirma que “a crise [ambiental] se instala quando se perde de vista o caráter relativo,

reversível e recursivo da distinção entre ambiente e sociedade”. A crise emerge quando “nós” nos

damos conta de que é necessário abandonar a perspectiva antropocêntrica, segundo a qual o “nós”

exclui “ambiente”. No demos conta que a dominação da natureza pela humanidade era problemática,

segundo Déléage (1991), com a industrialização em massa depois da Segunda Guerra que gerou

problemas ambientais de escala global, como a ameaça nuclear e a poluição.

Mas parece mais interessante não pensar a ecologia política como uma resposta inevitável a

problemas que já estavam postos, pois a existência de problemas ecológicos é contemporânea à

ecologia política. Basta observar aquilo que se passa a chamar de catástrofes ambientais: problemas

naturais causados pela intervenção humana, seja na dimensão política, econômica ou social. É esse

o argumento de Latour (2004): a ecologia política se caracteriza por uma crise da Constituição

Moderna, ou melhor, uma crise da separação entre natureza e política. A ecologia política é paralela à

emergência de vínculos de risco, elementos que não são propriamente objetos, mas relações entre

objetos, efeitos, causas e consequências. Tais vínculos não tem contorno nítido: os produtores

aparecem à luz do dia, ao lado de seus produtos borrando as fronteiras entre política e natureza. A

produção científica, técnica e industrial passaram a ocupar lugar central na definição de um problema

ambiental.

Além disso, os problemas ambientais são concebidos como problemas de ordem universal,

no sentido de que não reconheciam limites geográficos, temporais ou sociais. Uma intervenção na

natureza em um ponto específico do globo geraria desdobramentos por todo o planeta, implicando em

uma necessidade de se criar políticas ambientais, ações e intervenções ecológicas que não estejam

ancoradas exclusivamente em fronteiras políticas tradicionais.

Os problemas ambientais só passam a existir juntamente com a crítica ao progresso e a

crítica da técnica. Pois os problemas ambientais são aqueles causados pela indústria, pela técnica e

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pela ação humana. Ou seja, emergem os problemas ambientais na medida em que a indústria, a

técnica e a ação humana deixam de figurar como solução futura para se converterem em problema

presente.

Considerações Finais

Mesmo que Ellul, Charbonneau, Illich e Gorz tenham sido pouco conhecidos nos anos 1960 e

70 (Cans, op. cit: 151), e que suas preocupações não fossem exclusivamente o meio ambiente

(Dufoing, 2011), podemos identificar uma série de elementos em seus trabalhos que permitem aos

intérpretes atuais classificá-los como precursores do decrescimento.

Esses autores estavam defendendo teses, cada um à sua maneira, de que o mundo mudara

consideravelmente e que eram necessárias novas abordagens e novas formas de intervenção na

realidade para poder transformá-la. A ecologia política e os movimentos ambientais que explodiram

sobretudo depois de 68 na França não se distanciavam desse projeto. Como mostra Jean Jacob, os

anos 1960 e 70 foram marcados pelo fim das esperanças oferecidas pela razão. A ciência não mais

levaria a um futuro melhor e inelutável, o progresso deixou de ser solução para tornar-se problema, a

industrialização tinha elevado o nível de vida material mas trouxera consigo novas formas de

restrições às liberdades humanas. Jacob (op. cit: 34-8) mostra ainda outras correntes teóricas e

outras disciplinas que teciam críticas ao progresso, como a antropologia de Pierre Clastres e as

teorias pós-modernas.

Os movimentos ecológicos, as correntes da ecologia política, juntamente com as teorias

sobre sociedade técnica ou sobre capitalismo monopolista surgiram como tentativas de responder a

um novo mundo. O progresso deixou de ser o horizonte, fazendo com que o futuro deixasse de ser

uma certeza. O presente entrou para o centro das reflexões e ações.

A rebours des principales forces politiques qui se proposent de maîtriser et dominar toujoursdavantage la nature pour construire un monde meilleur, l'écologie politique se satisfait ainsivolontiers du présent. Elle refuse de subordonner des privations actuelles à l'avènement d'unparadis futur.

Ibid: 27

Na virada dos anos 70 para 80, a crise do padrão ouro, o desmantelamento das sociedades

de pleno emprego, o fracasso dos projetos de modernização nos países periféricos, o fim dos Trinta

gloriosos e a queda do Muro, tudo isso estendeu a crítica ao progresso tanto pela direita quanto pela

esquerda nos países centrais, e a única perspectiva que tinham diante de si era a guerra (Arantes,

2007). Paulo Arantes defende que diante da iminência da catástrofe, as políticas sociais e

econômicas se reorientam sob uma nova forma, a qual traz novamente para o primeiro plano o

mecanismo jurídico-político do estado de sítio (Arantes, 2010).

O que os autores aqui analisados construíram em suas teses, argumentos e mesmo em suas

vidas e militâncias foi algo análogo. Ao lado do diagnóstico da crise do progresso e da insuficiência do

progresso e das propostas de revolução socialista, estavam as críticas ao progresso, à ciência, ao

crescimento econômico e ao estado de bem estar social. Com os trabalhos de Ellul, Charbonneau,

Illich e Gorz, apreendemos todo um esforço de retraçar os rumos da esquerda diante do diagnóstico

XVIII Congresso Internacional da Associação Latino Americana de Sociologia. Recife, 2011 24

de falência das promessas do progresso por basicamente três vias: analiticamente, pela recusa da

luta de classes e pela identificação de uma nova forma de dominação; pela ênfase na vida cotidiana

como locus para se compreender as novas dominações, já que estas agora atuavam também nas

subjetividades; e finalmente pela definição de novos sujeitos da transformação social e proposta de

novas modalidades de luta.

A insuficiência da análise de classes nas sociedades ocidentais pós-Segunda Guerra era

produto de uma dominação ainda maior, de uma nova forma de exploração e dominação. A técnica, a

indústria, a economia, a propaganda, o lazer e o turismo, a medicina, e escola submetem todas(os) e

tudo a regras, valores e modos de vida heterônimas, cujos princípios e modos de funcionamento são

determinados pelo crescimento econômico e pela eficácia. Marx não era mais suficiente, diziam, pois

nessa sociedade heterônoma (o termo de Gorz sintetiza as teses dos outros autores) não há mais

uma dominação entre pessoas, mas uma dominação despersonalizada.

Certamente essa análise é bastante interessante. Trata-se de mostrar que uma pura forma,

sem qualquer conteúdo, determina as relações sociais e as relações entre humanidade e natureza

(inclusive, essa forma é que determina essa divisão na medida em que subjuga o que lhe é exterior).

Ao mesmo tempo, esses autores parecem não dar conta de pensar continuidades entre o que lhes

precedeu e o sistema com o qual estariam lidando. Mesmo que apontem o desenvolvimento histórico,

como faz Ellul com o desenvolvimento das técnicas e da organização na Primeira Guerra Mundial,

tudo se passa como se o sistema atual tivesse nascido em decorrência das necessidades da técnica,

ou que fosse algo novo sem qualquer precedente. São também expressivas dessa aparente

descontinuidade as reflexões de Illich sobre o subdesenvolvimento. Certamente o autor teve o mérito

de fazer uma análise considerando os países latino-americanos, enquanto os outros três (ao menos

entre os anos 1950 e 70) não pareciam dar a mesma atenção a realidades de países onde a técnica

não teria atingido o mesmo nível de totalização social. Mas Illich esbarrou em diversas explicações

ambíguas e contraditórias. Excluindo uma concepção de classes, as desigualdades apareciam ora

como produto do monopólio da técnica, da indústria, etc; ora como produtoras de um novo sistema de

dominação. Consequentemente, ora a pobreza parece ser inerente ao sistema, ora parece ser

anterior e exterior.

A questão é que os quatro autores não vêem um desdobramento dialético entre os modos de

produção e dominação anteriores e aqueles que analisam nas décadas de 1950 a 1970. É como se

houvesse toda uma nova configuração social sem qualquer relação com formas precedentes –

embora Gorz mantenha no início de sua obra, a terminologia neocapitalismo – que passa por novas

definições das relações sociais e da ação.

Marx, que foi deixado de lado e ainda hoje o é em nome de sua suposta insuficiência para

compreender o mundo contemporâneo, já anunciava n'O Capital a questão que esses autores

estavam defendendo. O burguês não explora o proletariado porque quer – e se assim fosse, o

capitalismo seria apenas um sistema moral. Segundo Marx, a relação contraditória de exploração

entre burguesia e proletariado é a forma que a contradição entre capital e trabalho assumem no

capitalismo já na sua origem. Ou seja, as relações de sociabilidade no capitalismo do fim do século

XVIII Congresso Internacional da Associação Latino Americana de Sociologia. Recife, 2011 25

XIX são tão heterônimas quanto nas chamadas sociedades técnicas ou no neocapitalismo dos anos

197018. Se há uma diferença entre esses dois momentos, trata-se antes de compreendê-los através

do desenvolvimento dialético do capitalismo do que como uma ruptura.

As teses de Charbonneau, Ellul, Illich e Gorz, ao lado dos movimentos ecológicos e das

correntes da ecologia política19 se constituíram como tentativas de compreender o mundo sem passar

pelo marxismo. As respostas que formularam deram ensejo a novas realidades. Por um lado, ao

recusar uma continuidade entre o sistema de dominação de classes e a dominação da técnica abriam

espaço para a reconfiguração da militância política fora dos meios tradicionais – o que se verifica hoje

no movimento contemporâneo de decrescimento na França, mas também nos movimentos

contemporâneos em São Paulo (Passa Palavra, 2011). Tudo se passa como se não fizesse mais

sentido pensar as lutas no "interior" da sociedade, e sim todas as pessoas tivessem que se unir para

lutar por algo que se tornou maior do que elas.

As questões ambientais constituíram, elas também, uma nova modalidade de compreensão

do social e de ação política. Uma sociedade subjugada pelo domínio da industrialização, da ciência e

do progresso corre riscos de catástrofes ambientais, geradas justamente por tal domínio desenfreado.

A transformação dessa situação passa por uma reconfiguração das ações das pessoas, que agora

devem se juntar. E, assim como vimos nos trabalhos dos quatro autores, a vida cotidiana e as

subjetividades são novos loci de reflexão e atuação no mundo, já que as novas dominações são

experimentadas até mesmo nos níveis mais íntimos da vida de uma pessoa.

Por outro lado, a ecologia política, as teses desses autores e todo o corpo de conhecimentos

e práticas instauradas no fim dos anos 1960, deram margem para uma configuração do social que

nega contradições no interior da sociedade em nome de um "problema maior", que é o meio

ambiente. Em nome dele as pessoas devem mudar seus modos de vida, muitas vezes como uma

determinação de políticas públicas ou por razões econômicas. Mészáros (1987) faz pesadas críticas

às propostas de restruturação da vida cotidiana para resolver problemas ambientais, principalmente

no que tange ao controle demográfico entre asiáticos, africanos e latino americanos: o sistema de

expansão da produção de supérfluos não é sequer questionada enquanto os custos ambientais desse

sistema são repassados para a população em geral. É como se, sob o pretexto da sobrevivência da

espécie humana, a população custeasse a sobrevivência de um sistema sócio-econômico permeado

por deficiências.

Quando vemos, atualmente, que o meio ambiente se transformou em requisito básico para

qualquer ação política e mesmo econômica, podemos pensar, como sugere Arantes, em que medida

as perspectivas de futuro (no caso, crises ambientais) passam pela realização efetiva de novas

configurações sociais. Uma vez eliminada a luta de classes do horizonte da ação política e enfatizada

a vida cotidiana como espaço de militância em muitos circuitos de esquerda, as crítica ao progresso,

à ciência, à propaganda, ao consumo de massas e à dominação da natureza trouxeram novas

maneiras de conceber e intervir na realidade que se verifica em diversos países, de diversas

18 Para uma crítica nessa linha feita a Gorz e à despersonalização do trabalho – que pode ser estendida às teses de Ellul e Charbonneau sobre a organização técnica como nova forma de socialização – cf. Queiroz, 2006.

19 E ainda outras correntes e movimentos que explodiram no fim da década de 1960. Cf. Oelgart, op. cit; Arvon, op. cit.

XVIII Congresso Internacional da Associação Latino Americana de Sociologia. Recife, 2011 26

maneiras, inclusive do "lado" do capitalismo, que agora usa os problemas ambientais como

argumento para continuar a desenvolver sua lógica sem ter que se defrontar com conflitos sociais –

como defende o filósofo brasileiro Renato Janine Ribeiro:

O ideal [do desenvolvimento capitalista não predatório] é audacioso: o exemplo é o da água que aindústria devolve ao rio, tão limpa como entrou. Quer dizer: que o uso humano dos recursosplanetários lhes cause o menor dano possível e, com o avanço da ciência, um dia até os melhore.Estamos a mil léguas do uso de combustíveis fósseis, da predação dos minérios, do aquecimentoglobal. É uma utopia, mas com forte base na ciência – e, o que é raro na história das utopias, nasciências da vida mais que nas ciências humanas.Esse projeto não se choca diretamente com as ideologias. Não divide as pessoas em direita eesquerda, em mundo do trabalho e do capital, em movimentos socialistas e liberais. Por isso, é ummovimento simpático. Mas é exigente. Requer uma mudança radical do nosso trato com anatureza e também com o ser humano. Para isso, o que falta? A tradução da linguagem científica,que é um de seus pontos fortes, em convicção moral.

Ribeiro, 2011. Grifos meus

Novas nebulosas da esquerda sugeriam outra forma de compreender o "social". Transferiram

o conflito "no interior da sociedade" para um conflito entre "humanidade" e "técnica". Jacob (op. cit.)

afirma que as "mudanças sociais" foram transformadas em "mudanças nos modos de vida". Logo, a

própria noção de sociedade não poderia mais se manter intacta. De um todo cindido, passa-se à

pluralidade de pontos de vista e à diversidade. Segundo Oelgart (1970), as novas tendências de

esquerda em voga a partir do fim dos anos 1960 não buscavam mais uma totalidade. Afinal, a

totalidade, defendiam Charbonneau, Ellul, Illich e Gorz, era produto de um sistema que submetia

tudo, sobretudo as necessidades e desejos, à técnica e à economia – totalidade era totalitarismo.

A combinação entre crise do marxismo, fim da luta de classes e atenção às subjetividades e

modos de vida reconfiguraram o social e a ação. Ações "em rede", "multiplicidade", "pontos de vista",

"impossibilidade de se acessar a verdade" ou "a totalidade", as teorias pós-modernas, tudo isso se

configurou ao lado da emergência da ecologia política e de movimentos ecológicos. O movimento

contemporâneo de decrescimento em Lyon permite vislumbrar esse argumento. Não mais luta de

classes por um lado, nem mais sociedade totalizada por outro. O decrescimento se organiza como

nebulosa, defendem militantes e analistas, sem centro, sem limites precisos. E se há uma tentativa de

militar por uma transformação em larga escala, ela se dá pela mobilização individual, quando uma

militante frequenta associações feminista, de saúde, contra a publicidade, consome produtos

orgânicos e busca espaços de convívio pouco individualistas.

Não são aleatórias as referências do decrescimento a Deleuze e Guatarri e a Bruno Latour.

Mas também não é aleatório o esforço de Renato Janine Ribeiro em restabelecer um capitalismo

simpático, sem luta de classes.

XVIII Congresso Internacional da Associação Latino Americana de Sociologia. Recife, 2011 27

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