Concerto Abraãmico na visã dispensacional

22
- 5 - RESUMO: Este artigo trata com a questão da natureza do Concerto Abraâmico. É ele condicional ou incondicional como defen- dido pela hermenêutica dispensacionalista? O autor argumenta que esse concerto nunca se pretendeu ser puramente judaico. Ele também incluiu diretivas divinas às quais a comunidade abraâmica deveria responder em fé e obediência. Por sua rebelião e re- jeição de Cristo, Israel anulou as intenções imediatas de Deus. Contudo, os propósitos divinos são soberanos. Por meio de Cristo, a Semente de Abraão por excelência, todas as provisões foram tomadas para um mais amplo cumprimento das eternas provisões do Concerto Abraâmico. ABSTRACT: This article deals with the question of the nature of the Abrahamic Co- venant: Is it conditional or unconditional, as defended by the dispensationalist hermeneu- tics? The author contends that this Covenant was never intended to be purely Jewish. It included also divine directives to which the abrahamic community was expected to respond in faith and obedience. By the unfaithfulness of Israel and her rejection of Christ, literal Israel forfeited God´s immedia- te intentions. However, God’s purposes are sure and sovereign. Through Christ, the Seed of Abraham par excellence, all provisions have been taken for the fuller fulfillment of the everlasting Covenant with Abraham. INTRODUÇÃO Desde a publicação do influente Theology of the Old Testament, de Walther Eichrodt, com sua ênfase na centralidade do tema do concerto no Antigo Testamento 1 , e a tentativa de G. Mendenhall 2 em estabelecer paralelos entre os antigos tratados hititas e a noção bíblica do concerto, uma enorme quantidade de literatura abordando este tema tem sido publicada. É desnecessário dizer que as teorias de Eichrodt e Mendenhall são desa- fiadas e defendidas com igual fervor em anos recentes. O resultado desta ênfase e disputas, entretanto, elevaram a idéia do concerto a ocupar um lugar de importância vital nos estudos atuais do Antigo Testamento. Contudo, independente do relativamente recente interesse de alguns setores da teolo- gia no tema do concerto no Antigo Testamen- to, ou da concentração habitual no Concerto Sinaítico 3 , evangélicos conservadores têm tradicionalmente enfatizado a importância do Concerto Abraâmico para correta com- preensão da mensagem bíblica. John Murray, representante da tradição Calvinista, observa que “é este concerto com Abraão, explici- tamente estabelecido em Gênesis 15, 17, [que] enfatiza a totalidade do subseqüente desenvolvimento da promessa redentiva de Deus, [em] palavra e ação”. 4 Provavelmente a maioria dos segmentos do mundo evangélico atual não teria difi- culdade em aplaudir essa percepção. John F. Walvoord, representante da hermenêutica dispensacionalista, também reconhece que o Concerto Abraamico é uma das revela- ções mais importantes e determinativas das Escrituras. Segundo Walvoord, “o Concerto Abraâmico fornece a chave para todo Antigo Testamento. [...] A análise de suas provisões e o caráter de seu cumprimento estabelecem A NATUREZA DO CONCERTO ABRAÂMICO: UMA ANÁLISE DA INTERPRETAÇÃO DISPENSACIONALISTA AMIN A. RODOR, TH.D. Professor de teologia sistemática e diretor do SALT, Unasp, Campus Engenheiro Coelho

Transcript of Concerto Abraãmico na visã dispensacional

- 5 -

Resumo: Este artigo trata com a questão da natureza do Concerto Abraâmico. É ele condicional ou incondicional como defen-dido pela hermenêutica dispensacionalista? O autor argumenta que esse concerto nunca se pretendeu ser puramente judaico. Ele também incluiu diretivas divinas às quais a comunidade abraâmica deveria responder em fé e obediência. Por sua rebelião e re-jeição de Cristo, Israel anulou as intenções imediatas de Deus. Contudo, os propósitos divinos são soberanos. Por meio de Cristo, a Semente de Abraão por excelência, todas as provisões foram tomadas para um mais amplo cumprimento das eternas provisões do Concerto Abraâmico.

AbstRAct: This article deals with the question of the nature of the Abrahamic Co-venant: Is it conditional or unconditional, as defended by the dispensationalist hermeneu-tics? The author contends that this Covenant was never intended to be purely Jewish. It included also divine directives to which the abrahamic community was expected to respond in faith and obedience. By the unfaithfulness of Israel and her rejection of Christ, literal Israel forfeited God´s immedia-te intentions. However, God’s purposes are sure and sovereign. Through Christ, the Seed of Abraham par excellence, all provisions have been taken for the fuller fulfillment of the everlasting Covenant with Abraham.

IntRodução

Desde a publicação do influente Theology of the Old Testament, de Walther Eichrodt, com sua ênfase na centralidade do tema do

concerto no Antigo Testamento1 , e a tentativa de G. Mendenhall2 em estabelecer paralelos entre os antigos tratados hititas e a noção bíblica do concerto, uma enorme quantidade de literatura abordando este tema tem sido publicada. É desnecessário dizer que as teorias de Eichrodt e Mendenhall são desa-fiadas e defendidas com igual fervor em anos recentes. O resultado desta ênfase e disputas, entretanto, elevaram a idéia do concerto a ocupar um lugar de importância vital nos estudos atuais do Antigo Testamento.

Contudo, independente do relativamente recente interesse de alguns setores da teolo-gia no tema do concerto no Antigo Testamen-to, ou da concentração habitual no Concerto Sinaítico3 , evangélicos conservadores têm tradicionalmente enfatizado a importância do Concerto Abraâmico para correta com-preensão da mensagem bíblica. John Murray, representante da tradição Calvinista, observa que “é este concerto com Abraão, explici-tamente estabelecido em Gênesis 15, 17, [que] enfatiza a totalidade do subseqüente desenvolvimento da promessa redentiva de Deus, [em] palavra e ação”.4

Provavelmente a maioria dos segmentos do mundo evangélico atual não teria difi-culdade em aplaudir essa percepção. John F. Walvoord, representante da hermenêutica dispensacionalista, também reconhece que o Concerto Abraamico é uma das revela-ções mais importantes e determinativas das Escrituras. Segundo Walvoord, “o Concerto Abraâmico fornece a chave para todo Antigo Testamento. [...] A análise de suas provisões e o caráter de seu cumprimento estabelecem

A nAtuRezA do conceRto AbRAâmIco: umA AnálIse dA InteRpRetAção dIspensAcIonAlIstAAmIn A. RodoR, th.d.Professor de teologia sistemática e diretor do SALT, Unasp, Campus Engenheiro Coelho

- 6 -

o formato para todo o corpo da verdade bíblica”.5

Sem dúvida, é precisamente em termos das promessas dadas a Abraão, que Deus na plenitude dos tempos, enviaria Seu Filho, para que todos, sem distinção, recebessem a adoção de filhos. A redentiva graça de Deus, no alcance mais amplo de sua rea-lização, é o desdobramento da promessa dada a Abraão, e, portanto, o desdobramen-to do Concerto Abraâmico. Assim, Paul R. House adequadamente sumariza a questão quando afirma a respeito de Genesis 11:10-25:18: “Dito de forma simples, então, seria dificil exagerar a importância desta seção na literatura bíblica, e, portanto, na teologia bíblica.”6

confIguRAndo o pRoblemA

Dentro da transcendente importância do Concerto Abraâmico emerge o debate quanto a questão de sua natureza: Paul N. Benware coloca o indicador sobre o ele-mento crucial da questão. “Provavelmente o mais importante aspecto relacionado com o Concerto Abraâmico tem que ver com sua natureza. É ele condicional (bilateral) ou um concerto incondicional (unilateral)? Como a questão é respondida determina a estrutura dos estudos proféticos que é adotada.”7 Evidentemente, decisões inter-pretativas quando aplicadas à natureza do concerto com o patriarca determinarão a perspectiva teológica assumida.

A não condicionalidade do Concerto Abraâmico é particularmente defendida pela hermenêutica dispensacionalista, hoje infiltrada em praticamente todos os ramos do protestantismo,8 a qual, como postula-do básico de sua teologia, cria uma aguda dicotomia e descontinuidade entre Israel e a Igreja. Para C. Ryrie, tal distinção (entre Israel e a Igreja) é considerada a “primeira essência”9 do dispensacionalismo e, de fato, podemos considerá-la o fundamento do sistema, sem a qual o dispensacionalismo deixaria de existir.10 Dispensacionalistas crêm que o programa de Deus para Israel está temporariamente in hold, durante a presente era da Igreja, e será retomado por ocasião do arrebatamento da Igreja.

Então, todas as promessas do Concerto Abraâmico se cumprirão literalmente com a descedência fisica do patriarca, vista como os beneficiários exclusivos do concerto.

Segundo o dispensacionalismo, permi-tir que as bênçãos do Concerto Abraâmi-co11 , prometidas à descendência étnica do patriarca, tenham cumprimento espiritual na Igreja, ou vice-versa (que as bênçãos espirituais de promessas feitas à Igreja, se cumpram no Israel físico), seria o pri-meiro passo para fundir aquilo que deve permanecer separado (i.e., Israel e Igreja). Da mesma forma, segundo os intérpretes dispensacionalistas, tornar as bênçãos do Concerto Abraâmico dependentes da fideli-dade ou obediência de Israel, seria também o passo inicial para se argumentar que tais bênçãos se cumpririam espiritualmente com a Igreja. Assim, afirmando a incondi-cionalidade do concerto com Abraão, o dis-pensacionalismo busca garantir distintos o futuro de Israel do futuro da Igreja em duas escatologias absolutamente separadas.

Reivindicando utilizar como princípio hermenêutico o literalismo consistente em seu estudo das Escrituras, o dispensa-cionalismo defende o cumprimento literal das promessas bíblicas, às quais “nenhuma condição foi acrescentada”, e enfatiza que as bênçãos prometidas à semente de Abraão são físicas, em lugar de espirituais e soteriológicas. Essa ênfase insiste ainda que todo Israel étnico desfrutará estas bênçãos físicas e, uma vez que elas ainda não se cumpriram, terão cumprimento em algum tempo no futuro. O dispensaciona-lismo crê que essa compreensão não é nada mais e nada menos do que o resultado de sua estrita aderência a uma hermenêutica literalista, a qual descarta qualquer in-terferência do princípio hermenêutico da analogia da fé. O resultado direto desta leitura do Antigo Testamento em geral, e do Concerto Abraâmico, em particular, é a tendência dispensacionalista de identificar o estado moderno de Israel com o Israel do Antigo Testamento.

A teoria da incondicionalidade do Con-certo Abraâmico, portanto, envolve três questões fundamentais: Primeiro, promete o concerto que Israel permaneceria como

- 7 -

nação, e como depositários das bênçãos divinas para o mundo? Segundo, promete o concerto com Abraão permanente posse da terra prometida à sua descendencia ét-nica, ao atual Israel Sionista? Terceiro, é o cumprimento das promessas do concerto exclusivamente dependente na fidelidade de Yahweh, sem qualquer relação com a obediência e fidelidade humanas? Estas são as questões fundamentais, objetos do propósito deste estudo.12

o pAno de fundo pARA A noção do conceRto

Embora o conceito de berîth, como princípio fundamental da religião de Is-rael, tenha alcançado um lugar seguro na discussão teológica do Antigo Testamento, como Eichrodt13 observa, considerando-se a própria irregularidade da distribuição de ocorrência do termo, reservas são conti-nuamente expressas quanto ao seu signi-fica original. À luz das opiniões correntes acerca da idéia do concerto, com volumosa bibliografia, relacionada em livros, artigos e ensaios, tratando com este tema, o que, como já mencionado, indica a forte ênfase que é colocada em sua importância e sig-nificado, um estudo de qualquer aspecto do tema, deve iniciar com, pelo menos, uma breve consideração do termo berîth, sua definição, uso nas Escrituras e tipos de concertos, antes que possamos adequada-mente interpretar a idéia comunicada por ele, nas referências individuais encontradas na narrativa bíblica relacionada à aliança Abraâmica.14

A etimologiA de berîth

A força etimologica do termo hebraico berîth15 não é inteiramente certa.16 A pala-vra ocorre pelos menos 280 vezes no An-tigo Testamento, traduzida freqüentemente como “concerto/aliança”. Noutros casos, a palavra é traduzida também por “liga” (Js 9:9; 2Sm 3:12 etc); “confederação” (Ob 7; Gn 14:23). O termo é usado em uma variedade de significados, parecendo envolver não apenas o sentido de aliança, mas também, de compromisso, ordenança e lei. As opiniões, como poderia se esperar,

divergem quanto à questão do significado primário do termo. Estudos etimológicos buscando encontrar a raiz por traz de berîth, não alcançaram resultados conclusivos17 . De acordo com M. Weinfeld18 , as deriva-ções sugeridas podem ser classificadas em quatro possibilidades fundamentais19 . Para Mendehall, alternativa que envolve a idéia de “vínculo” e “responsabilidade” do con-certo, é a posição geralmente aceita.

Deve-se observar que, embora diferen-tes intérpretes cheguem a variadas conclu-sões quanto ao significado etimológico da palavra20 , certo consenso parece indicar que, quer os parceiros fossem iguais ou não, era por meio do concerto que eles, juntos, formavam um relacionamento íntimo. Eles estavam tão intimamente unidos que as partes eram freqüentemente mencionadas em termos de parentesco. Pedersen mantém a mesma posição e fala de uma comunhão de alma e vontade dos dois, que resulta em um propósito comum, amizades comuns, inimigos comuns, confiança mútua e leal-dade, com exclusão de discórdias. Em tudo isto, diz ele, a vontade da parte mais forte era a força dominante.21 Esta harmonia resultante é freqüentemente descrita pela palavra shalom, a qual enfatiza a inteireza, harmonia e unidade das partes. Esta ênfase no caráter bilateral e recíproco de berîth é geralmente aceita por diversos estudiosos da questão.

Em conclusão, quanto a etimologia de berîth, embora o significado original do termo seja obscuro e tem sido objeto de considerável discussão, é geralmente aceito que a palavra veio a significar um compromisso mútuo de responsabilidade entre duas partes. Para sumariar as posi-ções sugeridas acima, talvez, a seguinte de-finição poderia ser oferecida: um concerto é um acordo entre duas partes, o qual os une, com interesses e responsabilidades comuns. Contudo, uma vez que existe uma grande variedade de usos do termo, uma única e curta definição não poderia cobrir todos os casos. Somos deixados com a impressão de que os estudos etimológicos isolados do termo berîth e do seu significa-do original, não favorecem, além da dúvida razoável, quer a condicionalidade ou a

- 8 -

incondicionalidade dos concertos bíblicos. Assim, o estudo dos casos específicos de concertos no Antigo Testamento pode ser um campo mais produtivo na compreensão do conceito.

tIpos de conceRto no AntIgo testAmento

Como geralmente observado, encontra-mos dois tipos de concertos mencionados no Antigo Testamento: concertos entre ho-mens e aqueles entre Deus e o homem. De acordo com a maioria dos comentaristas, pode-se assumir que as idéias associadas com a última classe, os concertos divinos são secundários, e transferidos dos concer-tos entre homens.

ConCertos entre os homens

A palavra berîth é usada no Antigo Tes-tamento para descrever contratos de vários tipos entre os homens. Menção é feita de concerto entre Abraão e Abimeleque (Gn 21:27); Isaque e Abimeleque (Gn 26:28); Jacó e Labão (Gn 31:44); Israel e os gibe-onitas (Js 9:6); e a amigável aliança entre Jônatas e Davi (1Sm 18:3); o trato entre Acabe e Ben-Hadade (2Rs 20:34); a liga entre Jeoiada e os governantes para fazer Joás rei (2Rs 11:4); para descrever o pacto entre Davi e os anciãos (1Cr 11:3).

Combinando as declarações feitas em diferentes situações, os seguintes parecem ser os principais elementos nos concer-tos entre homens: (1) uma afirmação dos termos aceitos (Gn 26:29; 31:50, 52); (2) um juramento para cada uma das partes para cumprirem os termos, tendo Deus por testemunha (Gn 26:31; 31:48-43); (3) uma maldição invocada por cada uma das partes, sobre si mesma, no caso de violação do que foi concordado. Em certo sentido isto pode ser considerado uma parte do concerto, acrescentando ênfase a ele (Gn 26:28, 29). A ratificação formal do concerto por algum solene ato externo, embora presente nas narrativas do Antigo Testamento, não é certo que tais atos formais sejam expressamente mencionados (Gn 31:54).

John Murray22 enfatiza que nos con-

certos entre os homens, a idéia do acordo é central. Contudo, isto não implica que tal idéia seja central ou essencial em concertos que Deus estabelece com homens, porque, obviamente, a paridade existindo entre homens não pode ser obtida na relação entre Deus e o homem. Assim, o pacto mútuo é a essência do concerto, quando está em pauta relacionamento meramente humano23 , tal idéia, contudo, fica excluída quando se focaliza um relacionamento divino/humano.

ConCerto entre deus e homens

O concerto, nesse caso, não pode ser um acordo entre partes contratuais que es-tejam em nível de igualdade. Deus, a parte superior, sempre toma a iniciativa. De certa forma, contudo, variando em diferentes situações, tal concerto é um acordo mútuo. Deus, em declarações de mandamento, faz certas promessas e o homem concorda em guardar tais mandamentos e, neste aspecto, as promessas estão condicionadas à obedi-ência humana. Assim, em geral, o concerto de Deus com o homem é uma ordenança di-vina, com sinais ou juramentos da parte de Deus e com promessas de obediência assu-mida pelo lado humano, e com penalidades por desobediência, quando tal ordenança é aceita. Murray argumenta, contudo, que o elemento evidente no concerto entre Deus e o homem não é um contrato:

Em sentido estrito, [o concerto] não é um acordo. Embora as pessoas entrando em concerto, concordem em fazer certas coisas, o pensamento preciso não é o mesmo de pessoas concordando sobre algo entre si, nem um acordo mútuo entre pessoas e o Senhor. Devemos distinguir entre termos do acordo de compromisso. O que encontramos nestas instâncias é solene compromisso de fé, ou fidelidade por parte do povo em consideração. Eles se unem em compromisso para serem fiéis ao Senhor de acordo com Sua vontade revelada. O concerto é uma promessa de solene devo-ção a Deus, um promisso, sem reservas e incondicional com o Seu Serviço.24

H. N. Ridderbos partilha da mesma idéia. De acordo com ele o uso consistente

- 9 -

de diatheke, como a tradução regular na LXX para o concerto com Deus (berîth), em lugar da aparentemente mais disponí-vel sintheke, é uma evidência disto. Ele argumenta que nisto já encontramos uma demonstração de que o concerto com Deus não envolve primariamente um caráter contratual entre duas partes, mas uma con-cessão unilateral que evoca uma resposta. Porque o concerto não procede do homem, mas de Deus, isto se torna uma prevenção contra a tendência de tornar uma obriga-ção religiosa em uma obrigação legal.25 Tal idéia pode ser melhor entendida pelo fato de que o conceito e a terminologia do concerto é usado para descrever o re-lacionamento matrimonial, o que sugere que o concerto não é primariamente um contrato, mas um relacionamento de amor e comunhão entre as partes, embora isto não elimine à idéia da obrigação e da ne-cessidade de lealdade.

nAtuRezA dos conceRtos bíblIcos

Curiosamente, dispensacionalistas e teólogos liberais26 em geral, por razões obviamente completamente diferentes, insistem que, quanto à sua natureza, o Concerto Abraâmico é unilateral, portanto incondicional. Enquanto os primeiros, como veremos mais adiante, chegam a essa conclusão pela rota da hermenêutica, os últimos, pela adoção do método crítico e de sua compreensão naturalista das Es-crituras.27

De acordo com Mendenhall28 , por exemplo, a natureza do concerto de Deus com Israel é paralela com as formulações contratuais do Antigo Oriente Médio. Ele defende que dois tipos de concertos entre os hititas têm sua contrapartida nos concertos entre Deus e Israel. O tratado concertual, que constitui uma obrigação do vassalo para com o seu mestre – o su-zerano – está em paralelo com o Concerto Sinaítico e o tratado de concessão, o qual é um dom incondicional do suzerano para o seu vassalo, está em contrapartida com o Concerto Abraâmico. Como enfatizado por Weinfeld, “o concerto com Abraão [modelado segundo as formulações de tratados no antigo Oriente] ... pertence ao

tipo concessão e não ao tipo do vassalo”.29 Posição oposta, contudo, é assumida por M. G. Kline. Segundo este, “a transação registrada em Genesis 17, pode ser identi-ficada como um concerto do tipo vassalo, uma administração do senhorio do doador do concerto, unindo o seu servo a ele em serviço consagrado, sob a sanção dual, de bênção e maldição”30 .

Evidentemente, a reconstrução do de-senvolvimento do pensamento teológico de Israel por eruditos liberais, baseada nas possíveis similaridades com material extra-bíblico, como sugerido acima, é go-vernada por uma ótica específica quanto à revelação bíblica e o adotado método crítico das Escrituras. Para os propósitos deste estudo é suficiente observar que o conceito do concerto entre Deus e Israel é exclusivo em todas as nações do Oriente Médio31 , e não encontramos no mundo an-tigo nenhum paralelo convincente. Assim, o argumento mais persuasivo quanto a exclusividade dos concertos bíblicos reside num fato incontestável: as nações vizinhas de Israel não tinham concertos com seus deuses e isto por si só desacredita todas as possíveis similaridades encontradas entre tratados humanos.32

Contudo, sem qualquer conexão re-levante com os tipos pagãos de tratados, não podemos deixar de distinguir dois tipos principais de concertos bíblicos entre Deus e o homem. De um lado, o concerto incondicional, representado pelo Concerto com Noé33 , baseado exclusivamente na fidelidade divina e na irrevogabilidade da promessa de Deus. Por outro lado, en-contramos o tipo de concerto condicional, representado pelos concertos Sinaítico e, como veremos, Abraâmico, em que a fide-lidade ou infidelidade humana, obediência ou rebelião, desempenham um decisivo papel religioso e histórico. Em ambos os concertos, condicional e incondicional, a estrutural geral é a mesma, em que as duas partes do acordo não estão em nível de igualdade: um é infinitamente superior ao outro. Como D. N. Freedman observa, esta constante característica do relaciona-mento entre Deus e o homem dá um caráter especial aos concertos da Bíblia, embora os

- 10 -

detalhes possam diferir de caso para caso. No todo, contudo, a iniciativa repousa com o Senhor divino.

No tipo incondicional, Yahweh toma sobre Si certas obrigações, mas, uma vez que todos estes acordos também procedem da iniciativa divina, não podemos falar em imposição humana de termos sobre Deus. Freedman chama este tipo de concerto de “compromisso divino”34 . Por outro lado, os termos e as estipulações são colocados sobre o parceiro humano, e este, Freedman sugere, que pode ser chamado de concerto de “obrigações humanas”35 .

exposIção do conceRto AbRAâmIco

Antes de tratar da interpretação dis-pensacionalista do Concerto Abraâmico, julgamos necessário uma breve exposição deste concerto, para facilitar a compreensão de seus termos e de alguns dos elementos básicos envolvidos.

Alguns eruditos são consideravelmente céticos quanto à reivindicação bíblica de que Deus tenha estabelecido um concerto com os patriarcas. H. Gunkel36, mais re-centemente seguido por J. Hoftijzer37, ar-gumentam que a tradição do concerto com Abraão surgiu em um período posterior da monarquia, puramente como uma tradição literária e teológica, quando Israel buscou reafirmar sua permanência em Canaã em face das sérias ameaças políticas tanto dos Assírios quanto dos babilônicos. Welhau-sen, também considera os patriarcas como epônimos das tribos israelitas. Ele propõe que a noção bíblica de uma religião dos patriarcas é “simplesmente a re-projeção de uma crença israelita posterior”38 .

O livro de Êxodo, contudo, assume que Deus tinha feito um concerto com os patriarcas: “E lembrou-se Deus do Seu concerto com Abraão, com Isaque e com Jacó” (Êx 2:2; 6:4-5). Abraão e sua linha-gem familiar são apresentados em Gênesis 11:26-32. Abraão, o parceiro humano do concerto, aparece no cenário do Antigo Tes-tamento sem qualquer título de grandeza ou glória. Em contraste, o parceiro divino é mencionado como Yahweh, Aquele que existe para sempre e permanece por Si

mesmo (Gn 12:1,7). As palavras de Yahweh em Gênesis 12:1-3 dão início àquilo que F. McCurley chama de o “ciclo Abraâmico”39, e define o estágio para aquilo que segue no relacionamento de Yahweh e os patriarcas na Torah. Cinco vezes estes versos usam a raiz hebraica barak40 , “abençoar”, e cinco vezes o pronome aparece com o tempo ver-bal futuro. Aqui encontramos os elementos essenciais das promessas a Abraão, que teriam desdobramentos posteriores.

Na primeira cláusula do discurso do Senhor, aparece a ordem para Abraão deixar sua “terra” e ir para a “terra” que Ele lhe mostraria (Gn 12:1)41 . Evidente-mente, como veremos posteriormente, as promessas de Deus a Abraão eram contin-gentes à sua obediência à ordem divina, e em resposta à sua obediência o Senhor lhe faz uma série de promessas. Primeiro, Ele fará dele uma “grande nação” – goy gadol (Gn 12:2a)42 . Segundo, “Eu o abençoarei” (12:2b). Isto é, Deus prometeu a Abraão favor pessoal, o qual seria manifesto em fertilidade e prosperidade. E, terceiro, o Senhor prometeu: “Eu engrandecerei o teu nome” (Gn 12:2c). O que os homens, na narrativa da torre de Babel, haviam bus-cado conquistar pelo esforço humano, um “nome” (Gn 11:4), o Senhor dará a Abraão como um dom de Sua graça. A ele é ainda prometido um exaltado status e autoridade, a ponto de que será uma bênção (v.2). O clímax do primeiro discurso de Yahweh aparece no v. 3 (depois da cláusula em que o Senhor promete como tratará os que abençoarem ou amaldiçoarem o patriarca). Novamente aparece o verbo barak, no futu-ro: “Em ti serão benditas todas as famílias da terra.” Quando Abraão vai a Canaã43 , o Senhor faz-lhe então uma promessa final: “À tua semente darei esta terra” (v 7), a qual é reafirmada em 13:17. Em suma, o capítulo 12 denota a promessa de contínua bênção pessoal, uma grande descendência e a posse da terra . Estes elementos bási-cos que constituem o coração do concerto Abraâmico, são repetidos em Gênesis 15:1, 5, 18 e 17:2-8, dentro do contexto da terminologia concertual.

Na narrativa de Gênesis 15:1-21, encon-tramos a seguinte comunicação de Yawheh

- 11 -

com Abraão. Aqui as promessas feitas an-teriormente são reafirmadas e ampliadas. Significantivamente a ênfase deste capítulo concentra-se na “semente” (Gên 15:1-5) e na “terra” (15:7-21), com a verbalização do estabelecimento do concerto: (1) A descen-dência de Abraão será numerosa como as estrelas do céu (v. 5); (2) Yahweh punirá os seus inimigos (v. 14); (3) Sua posteridade herdará a terra prometida (vs. 18-21). Os versos 9 -10 e 17 introduzem aquilo que Gerhard Hasel chama de “sacrifício de ratificação do concerto”44 . A cerimônia começa com um estilo familiar: a ordem de Yahweh e a obediência de Abraão (cf. 12:1, 4, 13:7; 15:5,6).45 Ao passar por entre as carcaças de animais sacrificados46 , en-quanto Abraão dorme, no ato de ratificação do concerto, Yahweh irrevogavelmente jura o cumprimento de Suas promessas concertuais ao patriarca. O Senhor se com-promete a dar a terra prometida à semente de Abraão, mas isto só acontecerá depois que a descendência do patriarca suportar a opressão em outra “terra”, e o Senhor julgar aquela nação.

No capítulo 17, a palavra berîth aparece 13 vezes, entre os versos 3 a 21. As mes-mas promessas são reafirmadas (vs 4-8), mas novos elementos são introduzidos: (1) mudança de nome (v. 5-15); (2) a específica promessa de um filho (v. 16, 19); (3) o rito da circuncisão é estabelecido (v. 10-14). Deve-se notar que estas características do concerto apresentadas nos capítulos 12, 15 e 17, não são separadas de nenhuma forma. Em cada um dos três capítulos os mesmos elementos são repetidos de forma progressiva, e outros desdobramentos são acrescentados, intensificando o significado do concerto, criando sua unidade final. Vic-tor P. Hamilton observa que nos versos de Gênesis 17, encontramos cinco discursos (1-2, 3-8, 9-14; 15-16 e 19-21). Os primei-ros três focalizam o compromisso divino em abençoar. Os outros dois focalizam a expectativa de Deus quanto à fidelidade de Abraão e sua semente (vs. 9-14). Em Gênesis 18, antes da destruição de Sodoma e Gomorra, o Senhor reafirma que Abraão se tornaria uma grande e populosa nação (cf. 12:2). O cumprimento futuro destas promessas é afirmado como uma certeza

divina (18:18), mas o cumprimento da promessa é declarado como dependendo de que os descentes de Abraão “guardem o caminho do Senhor” (18:19).

Em Gênesis 22, encontramos a últi-ma comunicação verbal do Senhor com Abraão de que temos registro. Estas palavras (Gn 22:15-18), seguem o ato de obediência de Abraão ao teste divino, visto em sua disposição de sacrificar seu filho Isaque (Gn 22:1-14). Aqui, O Senhor reafirma Seu compromisso de multiplicar a semente do patriarca – neste contexto é definida a referência aos descendentes (no plural) físicos, corporativo do patriarca (Gn 22:16-17a). Mas o texto registra ain-da duas outras referências à semente de Abraão (Gn 22:17b-18), aparentemente com ambigüidade intencional, sugerindo um Único descendente. A esta questão retornaremos posteriormente.

Sumarizando, portanto, as origens do Concerto Abraâmico estão registradas no livro de Gênesis. Os elementos específicos do concerto são encontrados em Gênesis 12:1-3; 13:14-17; 15:1-7; 18-21. O concer-to é repetido a Abraão em Gênesis 17:4-14, 19, 21. Ele é indiretamente mencionado em Gênesis 22:15-18. Posteriormente confirmado com Isaque em Gênesis 26:1-5 e reafirmado com Jacó em Gênesis 28:13-14.

A InteRpRetAção dIspensAcIonAlIstA do conceRto AbRAâmIco

A propósito de introdução desta seção, observamos que eruditos bíblicos liberais, como sugerido anteriormente, governados por uma visão naturalista das Escrituras, também defendem a natureza unilateral do concerto Abraâmico. A avenida, neste caso, não é a hermenêutica, mas a teoria do para-lelo existente entre os concertos bíblicos e os “concertos de concessão” dos tratados hititas, os quais são vistos como incondi-cionais, e atribuem a obrigação apenas ao mestre do concerto – o suserano – aquele que oferece o tratado.

Weinfeld, por exemplo, vê o concerto Abraâmico como um dom concedido, uma recompensa por lealdade e bons atos já realizados. M. Weinfeld advoga, por-

- 12 -

tanto, que esse concerto como um “dom incondicional”47 . Evidentemente, Weinfeld falha em perceber que no caso dos tratados hititas, o vassalo já possuía a terra; no caso do concerto com Abraão, a narrativa sugere uma promessa de possessão futura da ter-ra. Este é um aspecto crucial no Concerto Abraâmico e dá a ele uma dimensão condi-cional, porque a infidelidade e desobediên-cia da posteridade do patriarca, fatalmente interfeririam no relacionamento concertual, e abortaria sua realização.

A ótiCA dispensACionAlistA do Con-Certo AbrAâmiCo

O dispensacionalismo coloca forte ênfase na incondicionalidade do Concerto Abraâmico. As promessas de Deus são incondicionais, afirmam seus intérpretes, e devem ser cumpridas literalmente. W. W. Bardollar diz que em nenhum lugar as promessas de Deus a Abraão foram revoga-das. Portanto, ele defende que tal concerto é bona fide em sua intenção. Assim, ele conclui: “Nenhum lugar da história pode ser identificado como o cumprimento esta profecia, portanto, devemos considerar tal cumprimento como um evento futuro.”48 Este “evento futuro”, evidentemente, está conectado com a escatologia dispensacio-nalista. Walvoord também insiste que as promessas dadas a Abraão são promessas “incondicionais e graciosas”49 . As citações com a mesma ênfase por autores dispensa-cionalistas são inumeráveis e mencioná-las aqui seria cansativo além de repetitivo.

As evidências dispensacionalistas em apoio à sua conclusão de incondicionali-dade do concêrto Abraâmico são: (1) que ele é chamado um “concerto eterno” em Gênesis 17:1, 13, 1950 ; (2) em nenhuma ocasião quando Deus estabelece ou repete o concerto qualquer condição é acrescenta às promessas; (3) a perpetuidade do concerto Abraâmico foi solenizada pelo ritual divi-namente ordenado, no qual Yahweh passa entre as partes do sacrifício (Gn 17:7-21), e isto significou que Deus acrescentou um juramento às promessas quanto a semente física de Israel; e (4) o concerto foi repetido mesmo depois de Abraão, Isaque e Jacó

terem pecado.

Deve-se notar ainda, como indicado anteriormente, que a incondicionalidade do Concerto Abraâmico é absolutamente vital para o dispensacionalismo e in-dispensável para todo o seu sistema de interpretação. Sua escatologia, dicoto-mia entre Israel e Igreja, distinção entre lei e graça, posição sistematicamente defendida pelo dispensacionalismo, dependem dessa compreensão. Além disso, em íntima relação com a idéia de incondicionalidade do Concerto Abraâ-mico, emerge uma conseqüência em geral menos reconhecida nesta conexão: a doutrina da segurança eterna do crente. O dispensacionalismo argumenta que, assim como as promessas ao Israel físico são incondicionais, da mesma forma o seriam as promessas às famílias da terra abençoadas em Abraão. A New Scofield Bible insiste que “o Novo Concerto (no qual os gentios participam) assegura a eterna bênção, sob o Concerto Abraâmico, a todos os que crêem. [Este] é absoluta-mente incondicional, e uma vez que não há responsabilidade atribuída ao homem, para ele o concerto é final e irreversível”51 . Para Walvoord:

Um paralelo [com a incondicionalidade das promessas feitas ao Israel físico] pode ser encontrado na doutrina da sergurança eterna do crente na dispensação atual. Uma vez aceito Jesus Cristo como Salvador (o qual é paralelo com o ato inicial de Abraão em deixar a terra de sua parentela), ao crente é assegurado uma salvação completa sobre um princípio gracioso completamente in-dependente de alcançar qualquer grau de fidelidade ou obediência nesta vida.52

Em conclusão, dispensacionalistas insistem que o concerto com Abraão é incondicional, que as bênçãos prometidas à semente de Abraão são físicas, sem qual-quer transposição para um plano espiritual ou soteriológico e que tais promessas se cumprirão literalmente com todo o Israel étnico, em algum tempo futuro.53 Em tudo isto, o potencial para distorção da mensa-gem bíblica é extraordinário. Nas próximas páginas nos ocuparemos de uma análise

- 13 -

das idéias dispensacionalistas quanto ao Concerto com Abraão, de sua eventual consistência bíblica e de sua lógica geral.

os benefIcIáRIos do conceRto AbRAâmIco

Mesmo uma leitura cursiva dos textos do Concerto Abraâmico e à luz dos des-dobramentos futuros da revelação (por exemplo, Rm 15:8; Gl 3:3,14, 28-29), pa-rece claro que o concerto com o patriarca nunca foi intencionado ser puramente um concerto judeu. Desde o início o concerto teve uma intencionalidade e amplitude uni-versais. Através do concerto, tanto Abraão quanto posteriormente Israel, foram cha-mados para serem os instrumentos de rea-lização do propósito final do concerto. E, uma vez que o alvo foi realizado em Jesus Cristo, qualquer programa exclusivo para o Israel Sionista, erroneamente identificado com o Israel do Antigo Testamento, é ape-nas uma trágica regressão do concerto.

Antes de tratar do caráter condicional do Concerto Abraâmico, devotaremos alguns parágrafos para tratar com a questão básica dos beneficiários do concerto. O dispensa-cionalismo argumenta que uma interpreta-ção literal de Gênesis 12:1-3, requer que além da bênção destinada à descendência física de Abraão, há outros que também são abençoados através do patriarca, que não pertencem a sua linhagem. Para Walvoord, “as promessas dadas à semente de Abraão são cumpridas por sua descendência física; as promessas a ‘todas as famílias da terra’ serão cumpridas pelos gentios, ou aqueles que não são da descendência física.”54

Assim, o dispensacionalismo não encontra nada em Gênesis 12:3, ou em qualquer outro lugar no Antigo Testamen-to, que possa indicar que as pessoas de “todas as famílias da terra”, que seriam abençoadas em Abraão, desfrutem o status de semente de Abraão. De fato, para Wal-voord, a “bênção [de Gn 12:3] é prometida àqueles fora da semente de Abraão”55 . Tal distinção, devemos observar, é apenas uma tentativa de evadir ao real significado do texto e manter separados os descendentes físicos de Abraão da Igreja. Contudo, Paulo

claramente atribui àqueles abençoados em Abraão o status de “filhos” ou da “semente” de Abraão (Gl 3:7 e 29). Depois de citar Gênesis 15:6, é dito que “Abraão creu e isto lhe foi imputado por justiça” (Gl 3:6). Paulo continua afirmando que “os que são da fé, são filhos de Abraão. Ora, tendo a Escritura previsto que Deus havia de justi-ficar pela fé os gentios, anunciou primeiro o Evangelho a Abraão, dizendo: Todas as nações serão benditas em ti” (Gl 3:7-8).56

Posteriormente, ainda em Gálatas 3, Paulo esclarece como os gentios passam a ser da descendência de Abraão. Uma vez que Cristo foi da descendência física de Abraão, todos aqueles que estão unidos a Ele pela fé são “descendência de Abraão” (v.29, cf. 3:16). A linguagem de Paulo em Gálatas, força Walvoord a admitir que “há uma semente espiritual de Abraão, bem como uma semente natural”57 . Mas estes, Walvood insiste, “não cumprem as pro-messas relacionadas a Israel. [...]. Eles são a semente de Abraão apenas em sentido espiritual, apenas herdeiros das promessas dadas a todas as famílias da terra”58 . Aqui, contudo, encontramos uma clara violação do “literalismo consistente”, tão defendido pelo dispensacionalismo. Se a preocupação em interpretar Gálatas 3:6-12 fosse pura-mente hermenêutica, não haveria a razão para designar as pessoas mencionadas nos versos 7 e 19 como semente “espiritual” em distinção da “semente física” de Abraão. O interesse primário do dispensaciona-lismo, contudo, é a fixação teológica de manter separados a descendência física de Abraão daqueles, que seriam abençoados por meio de Sua semente par excellence, Jesus Cristo.

Não há nada em Gálatas 3 que indique ou sugira que Paulo tenha pensado nes-tes filhos de Abraão apenas em sentido figurativo, ou “espiritual”, como afirma Walvoord. O apóstolo chama aqueles que estão unidos com Cristo de “sementes de Abraão” (tou Abraam sperma). Assim, como Daniel Fuller corretamente observa, “a própria convenção linguística de Gálatas 3, requer a idéia de um relacionamento ontológico ou fisico com Abraão [através de Cristo, que era da descendência fisica

- 14 -

do patriarca]”59 .Mais curioso ainda é a forma como o

dispensacionalismo interpreta a referência de que Abraão seria “pai de uma multidão de nações”, em Gênesis 17:4-8. Um outro artifício interpretativo é criado para manter fechado o círculo ao redor da descedência física de Abraão, o que por, outro lado, cria uma enorme dificuldade além de teológica também lógica. Quem seria esta “multidão de nações” de quem o patriarca seria pai? Para Walvoord, isto “teve o mais literal cumprimento nos descendentes de Ismael, Esaú e nos filhos de Quetura, a segunda esposa de Abraão”60 . Como poderia ser isto? De acordo com Gênesis 17:20, Is-mael fundou uma “grande nação”, e Esaú fundou os edomitas (Gn 36:3-9); mas nada sabemos a respeito dos cinco filhos de Quetura, que podem ter originado qualquer nação. Certamente o dispensacionalismo encontra-se aqui na contra-mão, ao tentar, com os descendentes físicos de Abraão, explicar a afirmação de “uma multidão de nações” que estaria ligada ao patriarca. Além da teologia precária, também a lógica e a consistência requerem que o dispensa-cionalismo, neste caso, inclua os árabes e os edomitas como beneficiários do Concerto Abraâmico, e tanto quanto os judeus, que tenham igual direito à terra de Canaã.61 O que seria considerável inaceitável para os dispensacionalistas.

A insistência dispensacionalista quanto ao cumprimento literal das promessas do concerto desconsideram a verdade básica de que o foco do Antigo Testamento não é Israel, mas o Messias. A rejeição de Cristo pelos judeus constituiu uma violação da responsabilidade do concerto e um obstá-culo decisivo, final e instransponível para a continuidade do concerto. Pela recusa em aceitar e subter-se ao Agente confir-mador do Concerto Abraâmico, os judeus rejeitaram Aquele que veio para validar as promessas do concerto. O Israel moderno, portanto, está fora dá continuidade concer-tual e do contexto do concerto. Seu pro-grama Sionista não tem qualquer relação com o Concerto Abraâmico, e constitui apenas um esforço meramente humano de “estabelecer a sua própria justiça,

[e] não se sujeitaram a justiça de Deus” (Rm 10:3). A realização do concerto e sua continuidade requeriam a aceitação de Cristo, o Alvo do concerto (Gl 3:16). DeCaro está correto ao afirmar que, “do ponto de vista do Concerto Abraâmico, Israel hoje encontra-se ainda em estado de apostasia”62 . E isto, certamente aborta a possibilidade do cumprimento das pro-messas do concerto ao Israel étnico, que em termos bíblicos, como já observado, não pode ser identificado ou confundido com o Israel do Antigo Testamento.

elementos de condIcIonAlIdAde do conceRto AbRAâmIco

Tratando com a natureza condicional do Concerto Abraâmico, J. B. Payne indi-ca que esse concerto foi especificamente condicional, em constraste com o concerto com Noé. “Apenas enquanto Israel agisse em justiça, Ele [o Senhor] traria sobre eles, o que havia prometido.”63 Evidentemente, o relacionamento que emerge da natureza do berîth bíblico, sem dúvida, inclui sansões de compromisso para que o relacionamento concertual seja mantido. Há obrigações e estipulações a serem observadas por aquele que recebe o concerto, mesmo que tais obrigações não sejam expressamente declaradas. Como Ralph. Smith observa, “sem qualquer dúvida, existiram algumas condições que Abraão tinha que satisfazer, para que o concerto de Deus com ele pu-dessem ser efetivo”64 .

Nesta conexão, E. W. Nicholson coloca a questão em termos hipotéticos, mas con-sistente em termos de lógica geral:

Podemos realmente crer que o con-certo entre Deus e Abraão não envolveu nenhuma obrigação sobre o patriarca? Certamente haveria a obrigação que Abraão e seus descendentes continuassem a adorar o Deus em questão e, uma vez que principal característica do concerto foi a promessa da terra, é provável que os dízimos dos produtos da terra e o primogênito dos rebanhos deveriam ser requeridas por este Deus como ofertas.65

Na mesma linha de raciocínio, comen-

- 15 -

tando sobre a condicionalidade do concerto com Abraão, R. Clements observa:

É difícil crer que a posse da terra tenha sido dada aos descendentes de Abraão, sem que isto envolvesse certas responsa-bilidades. Predominantemente, o concerto deve ter mencionado algumas obrigações por parte dos descendentes de Abraão, que permanecessem leais ao Deus de Manre, e oferecessem a Ele sua adoração.

Assim, Clements conclui: “Portanto, o Concerto Abraâmico foi centralizado originalmente na promessa divina de posse da terra, mas ele não foi completamente incondicional”66 .

No texto bíblico, Deus coloca definidas indicações de obrigação sobre Abraão. Primeiro, Ele deu ordens a Abraão, em diversas ocasiões em Gênesis: “Sai” (Gn 12:1)67 ; “levante-te, percorre essa terra” (Gn 13:17); “olha... e conte” (Gn 15:5); “toma-me uma novilha” (Gn 15:9); “anda na minha presença”, “sê perfeito” (Gn 17:1- 2)68 . O verso seguinte (v. 3) descreve a obediência de Abraão à ordem do Todo-Poderoso: “Então, caiu Abraão sobre o seu rosto”, um gesto de submissão. Um preceito moral imperativo é estabelecido antes da promessa do concerto. Pode-se argumentar que a condicionalidade não é colocada naquilo que Abraão teria que fazer em termos positivos de desempenho humano, mas, ao contrário, naquilo que ele não poderia deixar de fazer, isto é, deixar de andar na presença de Yahweh, ou não ser fiel à ordem divina. Assim, deve-se observar, a bênção divina não pode ser vista como sacramental, ex-opere operato, ou idependente da fidelidade e resposta humana a ela. Comentando a expressão “anda na minha presença e sê perfeito”, o SDABC declara:

Abraão deveria caminhar como se estivesse na própria presença de Deus, consciente da inspeção divina e solicito de Sua aprovação – não atrás dEle, como se amendrontado por suas falhas, e desejo de evitar a observação. [...] Assim como a justiça recebida pela fé (justificação) era necessária ao estabelecimento do concerto tal irreprovável caminhar diante de Deus

(santificação), era necessária para que ele fosse mantido. [...] Deus desejava que Abraão entendesse que a realização final da divina promessa requeria que ele estivesse completamente à altura da exaltada norma divina de pureza e santidade.69

Segundo, o Senhor obrigou Abraão e sua descendência a submeter-se à circun-cisão para participarem do concerto (Gn 17:9-14):

E disse mais Deus a Abraão: Guardarás a minha aliança, tu e tua descendência no de-curso das suas gerações [v.9]. Esta é a minha aliança, que guardareis entre mim e vós e a tua descendência: todo macho entre vós será circuncidado [v.10]. O incircunciso, que não for circuncidado na carne do prepúcio, essa vida será eliminada do seu povo, quebrou a minha aliança [v. 14].

A narrativa consiste principalmente das palavras que Deus falou a Abraão. Aqui a proeminente característica são as estipula-ções do concerto. Uma obrigação especial é colocada sobre os servos do concerto, isto é, a circuncisão, chamada de “o sinal do concerto” (v. 11). A realização comunitária deste rito, naquele mesmo dia serviu para consumar o procedimento de ratificação do relacionamento concertual (v. 23-27). Mas a obrigação da circuncisão deveria continuar além deste dia, como um dever permanente da comunidade abraâmica. Aqui é evidente o relacionamento bilate-ral do concerto, entre o Senhor e Abraão e sua casa. As obrigações assumidas pelo Senhor do concerto têm sua contrapartida na obrigação do patriarca e sua linhagem. A circuncisão era um sinal de consagração. M. Kline sugere que a circuncisão é o rito pelo qual o concerto em Gênesis 17 foi “cortado”. “A circuncisão simbolizava o juramento de maldição, pelo qual a co-munidade abraâmica se pronunciava sob a autoridade judicial, ou mais precisamente, sob a espada do Deus Todo poderoso”, como argumenta M. Kline.70

Terceiro, Yahweh disse que cumpriria Suas promessas a Abraão por causa de sua obediência (Gn 22:18; 26:5). Estas consi-derações parecem indicar que o Concerto Abraâmico foi essencialmente condicional

- 16 -

em natureza, um relacionamento bilateral, onde o Senhor cumpriria Suas promessas, se em resposta houve a obediência huma-na. Como Ronald Youngblood observa, “a linguagem da obediência pressupõe a retenção da bênção prometida na falta da obediência”71 . A esta questão devotaremos os próximos parágrafos.

o cARáteR essencIAl dA obedIêncIA

Certamente é correto que, nos termos expressos, no concerto com Abraão, a obediência não é afirmada como uma con-dição; mas que a obediência é pressuposta, é claramente indicado por alguns fatos: Gênesis 18:18 e 19 afirma:

Visto que Abraão certamente virá a ser uma grande e poderosa nação, e nele serão benditas todas as naçoes da terrra? Pois eu o escolhi para que ordene a seus filhos e a sua casa depois dele para que guardem o caminho do Senhor, para que pratiquem a justiça e o juizo, a fim de que o Senhor faça vir sobre Abraão o que acerca dele tem falado.

Esta passagem tem significado especial para nossa discussão, porque, ao contrário de outros textos que falam do estabeleci-mento do Concerto Abraâmico com base na obediência passada (Gn 22:15-18; 26:3-5), ela enfatiza quão essencial é que Abraão treine sua família no caminho do Senhor, para que, depois dele, sua posteridade possa viver da mesma forma que ele viveu. Esta passagem definitivamente ensina que a posteridade de Abraão deve guardar o caminho do Senhor, para que Ele faça vir sobre Abraão o que prometeu. Dificilmente se poderia melhorar a clareza da afirmação de que, para que as promessas do Concerto Abraâmico se cumpram, a posteridade de Abraão deve viver vida tão piedosa e justa quanto a vida do patriarca.

A conexão entre promessa e obediência aqui é inegável. O dever da obediência foi intimamente ligado com a promessa, como uma conseqüência direta. As promessas divinas a Abraão não se cumprirão se ou enquanto sua posteridade permanecer em desobediência e rebelião. É absolutamente explícito que a semente de Abraão deve

guardar obediência ao Senhor para des-frutar as bênçãos do concerto com Abraão. Este conceito está em harmonia com o prin-cípio geral do trato gracioso e providencial de Deus com os homens. Obediência como resposta à graça divina e como princípio de comunhão com Ele torna-se uma condição de bênçãos permanentes. Como W. Kaiser observa,

a condicionalidade não foi ligada à promessa, mas apenas aos participantes que se beneficiariam destas permanentes promessas. Se a condição de fé não é evi-dente, então o patriarca se tornaria mero transmissor das bênçãos, sem pessoalmente herdar qualquer dos seus dons diretamente. Esse tipo de fé deve ser evidente também na obediência que é derivada da fé72 .

Por sua vez, Gênesis 22:15-18, afirma:E então o anjo do Senhor bradou a

Abraão pela segunda vez desce o céu e disse: “Por Mim mesmo jurei diz o Senhor, porque fizeste isto, e não me negaste o teu filho, o teu único filho, que deveras te abençoarei e grandemente multiplicarei a tua descendência, como as estrelas do céu e a areia que está na priais do mar. A tua descendência tomará posse das cidades dos seus inimigos, e em tua descedência serão benditas todas as nações da terra, porque obedeceste à Minha voz.

A promessa é aqui distintamente de-clarada ser uma renovação a Abraão (cf. 15:5), como aquele que, além de ser justi-ficado e tomado em concerto com Yahweh, tinha por meio de aprovação no teste e na obediêcia obtido o conceito de patriarcado espiritual de uma numerosa posteridade. Esta passagem declara que a promessa do concerto fora renovada com Abraão nos termos mais amplos e mais enfáticos, encerrando-se com as palavras “porque obedeceste à Minha voz”.

Posteriormente, quando o concerto foi renovado com Isaque (Gn 26: 3-5), a mesma razão é indicada, “porque Abraão obedeceu à Minha voz, e guardou o Meu mando, os Meus preceitos, os Meus esta-tutos e as Minhas leis”. Ambos os textos enfatizam a obediência passada de Abraão como desempenhando um papel crucial

- 17 -

na continuidade e presevação do concerto. “Foi por causa da obediêcia de Abraão que a promessa foi repetida a seu filho, aquele que tinha aprendido no Monte Moriá, o significado da obediencia requerida do seu pai.”73

conceRto dA gRAçA

Em relação à necessidade de guardar o concerto e à advertência contra a violação dele, não podemos suprimir a inferência de que a necessidade de obediência seja complemeto da riqueza, intimidade, comu-nhão e espiritualidade do concerto. Como J. Murray observa,

a espiritualidade do Concerto Abraâ-mico em contraste com o concerto com Noé consiste no fato de que o Abraâmico é preocupado com o mais alto nível de re-lacionamento religioso e união com Deus. Onde quer que haja relacionamento religioso há uma mutualidade no plano mais alto que a espiritualidade pode alcançar.74

Esse relacionamento religioso e mutu-alidade exigem uma resposta por parte do beneficiário, e resposta de devoção religio-sa no nível de refinamento mais puro que se pode conceber. A observância do concerto, portanto, longe de ser incompatível com a natureza dele, como uma administração da graça, da iniciativa divina, é uma necessi-dade que emerge da sua própria natureza e da espiritualidade que o relacionamento religioso envolve. Outra vez Murray ar-gumenta:

Quanto mais aprimorado o nosso con-ceito da soberania da graça concedida, mais é requerido em termos de fidelidade recí-proca, por parte do recipiente. As demandas de reconhecimento e gratidão aumentam com a largura, profundidade e altura do favor concedido. E essas demandas tomam forma concreta e prática na obrigação de obedecer ao mandamento divino.75

André Parrot, discutindo a promessa dada a Abraão, observa: “Tal promessa não foi dada sem obrigação.”76 Esta obrigação, porém, surge da natureza do relacionamen-to que ele contempla. Assim, a obediência de Abraão é apresentada como a condição

sobre a qual o cumprimento da promessa dada a ele era dependente, e a obediência da semente de Abraão é apresentada como o meio pelo qual a promessa dada a Abraão seria realizada. Há sem dúvida o cumpri-mento de certas condições e estas são su-marizadas na obediência à voz do Senhor, e na obediência ao Seu concerto.

Se o Concerto Abraâmico é baseado na graça de Deus, como então podemos falar de “condições do concerto”? Impor condi-ções à graça não seria o equivalente a des-truir e subverter seu elemento fundamental? A solução deste aparente dilema é ter em mente que, em oposição ao cumprimento automático do dom prometido a Abraão, como defendido pelo dispensacionalismo, devemos perceber que a contínua recep-ção desta graça e da relação estabelecida é contingente ao cumprimento de certas condições. Pois, aparte do cumprimento destas condições, a graça e a relação esta-belecida tornam-se sem significado. Graça concedida implica a recepção dela e de seu Sujeito, por parte do objeto dela.

Se a distintiva posição de Israel, seu papel mediador, seu status, sua experiência de santificação e seu ministério aos outros pudessem ser negados pela desobediência, o que seria deixado? Teria o concerto, à par-te da experiência de fidelidade, obediência e santificação, qualquer significado? A vul-nerabilidade da graça, como a vulnerabili-dade do próprio amor, é precisamente que ambos podem ser rejeitados pela rebelião, indiferença e infidelidade.

A relação estabelecida sobre graça, como vimos, implica bilateralidade. Nesta perspectiva, as condições em vista não são realmente condições impostas. Elas são simplesmente a recíproca resposta de fé, amor e obediência, à parte das quais, a bênção do concerto e o relacionamento concertual seriam inconcebíveis. Murray corretamente observa, “Guardar o concer-to presupõe o relacionamento concertual como estabelecido, em vez de uma con-dição sobre a qual seu estabelecimento é contingente”77 .

condIcIonAlIdAde e IncondIcIonAlI-

- 18 -

dAde Walter Kaiser, como mencionado,

observa que a condicionalidade não foi agregada à promessa, mas apenas aos participantes que seriam beneficiados destas permanentes promessas78 . Isto, sem dúvida, sublinha o importante aspecto dual do Concerto Abraâmico. A posição de que há neste concerto tanto aspectos condicio-nais quanto incondicionais, é mantida por vários teólogos, como E. Heppenstall79 , Mowinckel80 , e G. L Archer. Archer ob-serva que “um importante elemento no concerto de Deus com Israel encontra-se no aspecto dual de condicionalidade e incondicionalidade”81 .

Da perspectiva de Deus, o concerto é incondicional. Seu propósito de abençoar a hamanidade não pode ser frustrado. Isto é estabelecido como plano de Yahweh, desde o início, e nada poderá subverter Seus desígnios finais. Por outro lado, o benefício pessoal da promessa divina será realizado apenas naqueles que viverem o relacionamento con-certual, manifestando verdadeira fé, porque o concerto não dispensa, como vimos, as bênçãos independentemente da fidelidade humana. A implicação desta posição é que Deus cumprirá Seu plano soberano na his-tória, mas ninguém participa dos benefícios

do concerto eterno violando suas demandas de santidade. Nenhum filho do concerto que apresenta a ele um coração não sincero e em rebelião participará de Suas bênçãos.

conclusão

Durante o século passado, em relação ao Concerto Abraâmico, a questão mais discutida foi relacionada com o tema de sua natureza. Enquanto o texto bíblico parece oferecer indicações de incondicionalidade, com as obrigações repousando sobre Ele, por outro lado, o Senhor, na formulação do concerto, colocou definidas indicações de obrigações sobre Abraão. Estas considera-ções apontam para o Concerto Abraâmico essencialmente como de natureza condicio-nal e bilateral, com obrigações colocadas sobre as duas partes.

Evidentemente, as abordagens dos teó-logos liberais e dispensacionalistas, como vimos, assumem diferentes razões para sua defesa de não condicionalidade do Concer-to Abraâmico. A erudição liberal deriva sua conclusão da noção do desenvolvimento do pensamento teológico de Israel, meramente em um plano de horizontalismo histórico. Dispensacionalistas derivam sua posição de sua hermenêutica e pressuposição

fundamental de separação entre Israel e a Igreja. Como indicado, a incondicionalida-de do Concerto Abraâmico é a necessária sustentação da compartimentalização dis-pensacionalista das Escrituras. Contudo, teólogos liberais e dispensacionalistas, afinal, são de certa forma curiosamente semelhantes. Os primeiros dividem as Es-crituras em documentos, os quais diferem ou se contradizem mutuamente. Os últimos

O estudo da literatura relativa ao Concerto Abraâmico fez emergir agumas categorias básicas quanto a questão da condicionalidade, como vistas abaixo:

INCONDICIONAL CONDICIONAL CONDICIONAL E INCONDICIO-NAL

Dispensacionalistas e Teólogos Calvinistas Teólogos Adventistas e alguns teólogos

- 19 -

dividem as Escrituras em dispensações, as quais diferem ou se contradizem entre si. Neste aspecto, ambos são culpados do mes-mo pecado, obscurecendo o testemunho total da Palavra de Deus.

A condicionalidade é defendida por outros, como os teólogos calvinistas (covenant theology) em geral. Contudo, exclusiva condiconalidade não satisfaz a riqueza do Concerto Abraâmico, como um concerto de graça. Assim, somos deixados com o último grupo, os que enfatizam que, no Concerto Abraâmico, encontramos tanto elementos de condicionalidade quanto de incondicionalidade. Esta é a única posição que faz justiça à aliança com Abraão. Em um breve sumário podemos enumerar os seguin-tes pontos proeminentes deste estudo:

(1) Deus é o iniciador do concerto com Abraão, e o concerto é uma soberana dis-pensação de graça.

(2) A obediência de Abraão é repre-sentada em várias ocasiões (cf. Gn 12:1,2, 17: 18:15-18, 22; 26:3-5, etc, ), como a condição sobre a qual o cumprimento das promessas oferecidas a ele eram contingen-tes, e a obediência da semente de Abraão é apresentada como o meio pelo qual as pro-messas dadas a Abraão seriam realizadas. Sem qualquer dúvida, há o cumprimento de certas condições e estas são sumarizadas na necessidade de obediência à voz do Senhor e fidelidade ao Seu concerto.

(3) A violação do concerto não é me-ramente a falha em cumprir exigências legais, ou fracasso em responder à oferta de termos favoráveis de um contrato mútuo. Tal violação é, sobretudo, infidelidade em um relacionamento constituído e da graça dispensada. Pela quebra do concerto, o que realmente é partido não são primariamente as regras de um contrato, mas um relaciona-mento de amor. O que é quebrado realmente

é a comunhão, sem a qual a bênção se torna impossível. A violação do concerto é infide-lidade e rejeição à oferta de amor e graça.

(4) Finalmente, o concerto, do ponto de vista de Israel, pode ser quebrado, como realmente o foi, o que é a evidência irre-futável de sua condicionalidade. Assim, a esperança de um moderno Estado de Israel, em continuidade do Antigo Testamento e em cumprimento de promessas bíblicas, está construída em uma hermenêutica ilusó-ria. Por outro lado, a incondicionalidade do concerto, quanto à certeza de sua realização e do seu irrevogável cumprimento final, é também uma inegável verdade bíblica. Mas discordamos do dispensacionalismo quanto ao tempo do cumprimento das promessas e dos beneficiários do concer-to. O Concerto Abraâmico se cumprirá afinal, contudo não com o Israel étnico – isto, como vimos, seria uma regressão do concerto – mas com todos aqueles que em Cristo, a Semente82 de Abraão, e por meio dEle se tornaram descendência de Abraão. Além do mais, o tempo do cumprimento do Concerto Abraâmico nada tem a ver com o arrebatamento da Igreja, mas com o retorno de Cristo. Assim a falha do Israel literal não frustra os desígnios de Yahweh. Por meio de Cristo, todas as provisões foram tomadas para o mais amplo e pleno cumprimento do concerto com Abraão. Em Cristo, todos os crentes tornam-se participantes das bênçãos do concerto.

Nas palavras de E. G. White,Há esperança para nós apenas quando nos

aproximamos de Deus sob o concerto com Abraão, o qual é o concerto de graça e fé em Cristo. O evan-gelho pregado a Abraão é o mesmo evangelho que é pregado a nós hoje, pelo qual temos esperança. Abraão olhou para Jesus, Aquele que é também o Consumador da fé.83

- 20 -

RefeRêncIAs1 Walther Eichrodt, Theology of the Old Testa-

ment, 2 vols., traduzido por J. A. Baker (Philadelphia: The Westminster Press, 1961). Para Eichrodt, a cen-tralidade do tema do concerto é tal, que ele chega a torná-la o princípio organizador de sua teologia do Antigo Testamento.

2 E. Mendenhall, “Law an Covenant in Israel and the Ancient Near East”, The Biblical Arquaeologist, XVII (1955), 40-65; Para um survey das opiniões recentes, ver Dennis J. McCarthy, Old Testament Covenant (Oxford: Basil Blackwell, 1972).

3 Há um quarto de século, C.L.Roger enfatizava que por causa da grande concentração de interesse no Concerto Sinaítico, “o concerto com Abraão dificilmente é considerado” (Roger, “The Covenant With Abraham and its Historical Setting”, Biblio-theca Sacra, 127, Julho, 1980, 242). Roger argu-mentava que esta discernível tendência por parte de influentes setores da teologia devia-se à idéia de que as narrativas patriarcais são em geral vistas como revisões de tradições tribais, portanto, apenas com uma base histórica parcial. Para um recente estudo quanto a aplicação da crítica textual ao Pentateuco, ver Antônio Renato Gusso, “Linhas Gerais e Novas Têndencias da Crítica do Pentateuco”, Via Teológica, 8 (2003), 73-1.

4 John Murray, The Covenant of Grace (Londres, The Tyndale Press, 1954), 4.

5 John F. Walvoord, The Millenial Kingdom (Ohio: Dunham Publishing Company, 1959), 139. Curiosamente, o dispensacionalismo inicia a deta-lhada exposição do seu sistema com Abraão, como se este fosse o início das Escrituras. Ver a série de artigos publicados por Walvoord entre 1951 e 1952: “The Abraamic Covenant and Premillianialism”, Bibliotheca Sacra, 108 (1951), 414; 109 (1951), 37-46; 136-150; 217-25; 293-303. Para Walvoord e intérpretes dispensacionalistas em geral, as pro-messas a Abraão marcam o início da nação judaica. Tal enfase é utilizada posteriormente como o apoio necessário para a separação entre Israel e a Igreja. Tais promessas, como veremos ao longo deste estu-do, relacionam-se literalmente com a descendência física de Abraão.

6 Paul R. House, Old Testament Theology (Dow-ners Grove, Ill. InterVarsity Press, 1998), 76.

7 Paul N. Benware, Understanding End Times Prophecy (Chicago, Ill.: Moody Press, 1995), 34.

8 Já em 1945, o sistema dispensacionalista se tornara “uma questão de maior ou menor importância em praticamente todas as denominações evangélicas no presente” (Allis, Prophecy and the Church [Phi-ladelphia: The Presbyterian end Reformed Press, 1945], 12, 13). Em 1958, “o dispensacionalismo tem-se infiltrado por quase todos os ramos do protestan-tismo” (A. Rhodes, ed. The Church Faces the Isms:

The Faculty Members of the Louisville Presbyterian Theological Seminary [Nashville: Abingdom, 1958], 109). É estimado que mais de 50 milhões de cristãos hoje, subscrevam o dispensacionalismo.

9 Charles C. Ryrie, Dispensationalism Today (Chicago: Ill. Moody Press, 1973), 50.

10 Louis A. DeCaro corretamente observa que “sem esta diocotomia básica em sua hermenêutica, o dispensacionalismo não poderia permanecer como um sistema distinto de interpretação bíblica. Todo o sistema revolve ao redor da alegada divisão que existe entre Israel e a Igreja” (DeCaro, Israel Today: Fulfillment of Prophecy? [Philadelphia: Presbyterian and Reformed Publishing Company, 1974], 26).

11 O predominante ponto de vista quanto às promessas a Abraão pode ser sumarizado em três principais categorias: (1) a terra; (2) a semente; e (3) a benção (ver Robert Saucy. The Case for Progressive Dispensationalism [Grand Rapids, MI.: Zondervan, 1993], 42-46). David J. A. Clines (The Theme of the Pentateuch [Sheffield: JSO, 1978], 29-43), refere-se a estes como, terra, posteridade e relacionamento com Deus. W. Kaiser Jr. (Towards an Old Testament Theology [Grand Rapids, MI. Zondervan, 1987] 86-94), chama estas de herança, herdeiro e legado. Uma forma alternativa de agrupar tais promessas sugere-as como: (1) nacional; (2) pessoal e (3) universal. Al-guns intérpretes consideram que este agrupamento das promessas emerge mais naturalmente do texto básico (Gn 12:1-3), e da explicação de textos pos-teriores (Gn 13:14-17; 15:21; 18:17-19; 26:2-5, 24; 28:13-15; 35:10-12). Ver Charles Caldwell Ryrie, The Basis of the Premillenial Faith (Neptune, NJ: Loizeaux Brothers, 1953), 49-50. Craig A. Blaising e Darrel L. Bock (Progressive Dispensationalism [Wheaton, Ill.: Victor Books Bridge Point, 1993] 130), vêm a promessa de Deus a Abraão, para aben-çoá-lo e abençoar outros povos na terra através dele, expandida em uma coleçáo de nove promessas. E. Chrisholm, Evidence from Genesis, [Downers Grove, Ill.: InterVarsity Press, 1994], 49-50), relaciona seis promessas: (1) numerosa posteridade; (2) benção pessoal; (3) influência universal; 4) posse da terra; (5) relacionamento pessoal; e (6) juramento eterno. Willem VanGemeren (The Progress of Redemption [Grand Rapids, MI: Baker Book House 1995], 104-108, fala de quarto áreas básicas de promessas: (1) a semente; (2) a a terra; (3) as bênçãos ao patriarca; e 4) bênçãos às nações através do patriarca.

12 Uma das sérias dificuldades relacionadas com este campo de estudo, é que o material associado com o Concerto Abraâmico não é fácil de ser siste-matizado. Ele não apenas se encontra disperso em diferentes capítulos, mas também é freqüentemente repetitivo em sua apresentação. Tais dificuldades têm sugerido diferentes respostas para algumas perguntas fundamentais: (1) Fez o Senhor um ou dois concertos com Abraão? (2) Quais são as promessas do concerto

- 21 -

com o patriarca? (ver nota 11). (3) Quando, na Bíblia, foram ou serão cumpridas estas promessas? (4) E, naturalmente, a clássica questão quanto à sua unila-teralidade ou bilateralidade. Este trabalho limita-se basicamente ao estudo da questão da natureza do Concerto Abraâmico no livro de Gênesis, envolven-do, naturalmente, também temas diretamente ligados a ele. Este estudo limita-se, portanto, a uma análise teológica de seções específicas dentro do livro de Gênesis tratando com o concerto com Abraão, como interpretado pela hermenêutica dispensacionalista. Não está dentro do seu propósito discutir o Concerto Abraâmico no resto do Antigo ou no Novo Testamen-to, exceto nas situações de convergência direta com o interesse deste trabalho.

13 Ver Walther Eichrodt, “Covent and Law”, Interpretation (1966), 20:302.

14 William J. Dumbrell, Covenant and Creation (Nashiville TN: Nelson, 1984), 47.

15 De acordo com J. Wellhausen, o conceito do concerto não aparece até um tardio período pré-exílico. Idéia foi utilizada, segundo ele, pelos profetas em face da apostasia, para demonstar que o concerto dependia das condições morais e religiosas da nação. Assim, o concerto é reprojetado em um período anterior da história para prover a base para a exortação à obediência (Julius Welhausen, Prole-gomena to the History of Israel [Edinburgh: Adam and Black, 1885], 417-419). H. Gunkel e J. Hoftijzer argumentam que a tradição do concerto com Abraão surgiu em um tempo quando Israel sentiu que a posse da terra de Canaã estava ameaçada. Isto em um período tardio da monarquia. O conceito surge puramente como uma tradição teológico-literáriam quando Israel buscou reafirmar sua posse de Canaã, em face de serias ameaças políticas da Assiria e Babilonia. Assim segundo esta compreensão, na visão naturalista da Bíblia, a religião dos patriarcas é simplesmente a re-projecão de uma crença tardia (Ver Ronald Clements, Abraham and David [Naperville, Ill., Alec R. Alleson, Inc, 1967], 23).

16 G. Mendenhalll identifica as formas de concer-to no AT com os antigos tratados dos suzeranos hititas (Ver George. E. Mendenhall, “Anciente Oriental and Biblical Law” e “Covenant Forms in Israelite Tradi-tion”, Biblical Archeology Reader, 25-75; Edward R. Campbell e David Noel Freedman eds [Garden City, NY: Doubleday & Co., Anchor Books, 1970], 3-53). Da mesma forma, M. Weinfeld sugere que os concertos bíblicos são formulados em termos de tipos de tratados tão comuns no Oriente Médio (Ver. M. Weinfeld, “The Covenant of Grant in the O.T.” em Ancient Near East Journal of the American Oriental Society, 90 [1970], 184). Ver também D. J. MacCarthy, Old Testament Covenant (Oxford: Basil Blackwell, 1972), 10-34.

17 Estes estudos foram sumarizados por S. Quell, TDNT, 2:107 em diante, e também por Eichrodt, A Theology, 1:37, n. 3.

18 M. Weinfeld, Theological Dictionary of the OT (Grand Rapids, MI: Eerdmans, 1972), 253-55.

19 (1) “Cortar”, “partilhar uma refeição”, neste caso, da raiz brh, “comer”, refere às refeições fes-tivas, que acompanhavam a cerimônia concertual. L. Koehler, em “Problems in the Study of the Lan-guage of the Old Testament”, Journal of Semitic Studies 1 [Janeiro 1956], 4-5, entende este partilhar de uma refeição, como o ato pelo qual as partes entravam em um acordo ou aliança. Quando usado em referência a um acordo entre Deus e o homem, ele tomava significado teológico, o qual Koeler traduz como “cortar o concerto”. Assim, quando alguém corta o alimento (karat berit), ele entra em comunhão com a outra parte (Ibidem) Contudo, brh não é o verbo regular para “comer” (Weinfeld, 254). Em lugar disto, ele é associado com o processo de convalescença ou recuperação. Além disto, no caso de concerto bíblico entre Deus e o homem, não há nenhuma ocorrência do concerto sendo ratificado por uma refeição cerimonial, assim que esta etimologia proposta é consideravelmente dúbia. Outros ainda, como K. Baltzer, Köeher e McCarthy e também C.L. Roger (243) retêm a idéia de “cortar”, tomada da expressão “cortar um concerto”, mas insistem que a ênfase não está em partilhar uma refeição comum. Neste caso, a ênfase é colocada numa cerimônia sacrificial, como a idéia principal. Nesta linha de pensamento, Gesenius assume que a raiz brt, cortar, segundo o árabe, defende uma conexão do termo com o primitivo rito de cortar as vítimas em pedaços, entre os quais as partes contratuais deveriam passar (cf. Gn 15:17; Jr 34:18,19). Contudo aqueles que se opõem a esta sugestão indicam que “é mais natural supor que tanto a idéia de berîth como o próprio termo existiram independente dos ritos empregados em sua formação em situações particulares” (Dic-tionary of the Bible, 509). (2) “Entre”, “no meio de”, neste caso, berîth é idêntico ao akadiano birit, e corresponde à preposição hebraica ben, a qual, de acordo com M. Noth, ocorre em conexão com berîth (por exemplo “berith... ben... ubhen”, “concerto entre X e Y”) Esta identificação é baseada na pressupo-sição de que birit se desenvolveu em um advérbio, e então em um substantivo. Weinfeld observa que tal teoria não pode ser aceita sem reservas, e indica que a principal dificuldade em ligar berith, “entre” com a preposição ben, resulta em uma tautologia, (M. Noth, GSAT, 142-154; ver Weinfeld, 254) isto é a expressão da mesma idéia em termos diferentes. (3). “Procurar”, “escolher”, sugerido por E. Kutsch (citado por Weinfeld, ibidem, 255), como uma deri-vante de berith II, de acordo com o acadiano, baru, “procurar”. De acordo com Kutsch, o significdo deste verbo desenvolveu-se em “determinar”, “fixar”. Weinfeld parece aceitar esta etimologia relacionada com hzh/hzwt e r’h como “selecionar”, “determinar”, (Cf. Gn 22:8; Êx 18:21), mas, diz ele, a conexão entre “selecionar”, “determinar” e “prometer”, com

- 22 -

aquilo que berîth envolve, não é evidente. (4) Ligar por cadeias, um acordo de responsabilidade mútua, nesta possibilidade, aceita por Wiefeld como “a mais plausível solução” (Weinfeld, 255), berîth estaria associada com o termo acadiano beritù, “unir” “li-gar”. Esta sugestão, ainda de acordo com Weinfeld, é apoiada pelos termos acadiano e hitita para tratado: riksu e ishiul, ambos significando “vinculo”. Esta posição enfatiza o elemento de responsabilidade do concerto, e, como Mendenhall, observa esta é a posição geralmente aceita (The Interpreter’s Dictio-nary of the Bible “Covenant”, G. E. Mendenhall; ver também O. Loretz, “Berit… Band… Bund”, Vetus Testamentum, 16, 239-244.

20 Segundo Weinfeld, o significado original do termo hebraico berîth não é “acordo”, “ou concerto entre duas partes”, como geralmente argumentado. Ele enfatiza que “berîth envolve primariamente e, sobretudo, a noção de ‘imposição de responsabi-lidade’ ou ‘obrigação’” (Weinfeld, 255). Weinfeld indica ainda que berîth é (1) uma ordem, (2) sinô-nimo com lei e mandamento e (3) um compromisso que deve ser confirmado por um juramento, o qual inclui provavelmente uma imprecação condicional. Da mesma forma, E. Kutsch (citado por MacCarthy, 59, 60), sugere três significados básicos de berîth: (1) obrigação assumida por alguém, sem expectativa de um retorno; (2) obrigação colocada sobre outra pessoa, sem ser assumida pela primeira parte, e (3) obrigações assumidas mutuamente. Neste caso, enfatiza-se que berîth nunca significa um relaciona-mento, uma aliança, ou concerto, mas sempre uma obrigação, e sua conclusão teológica é que berîth significa ao mesmo tempo, uma promessa de Deus e uma obrigação sobre o homem (Ibidem, 60). Mas esta possibilidade é objetada por McCarthy. Segun-do ele, apenas os dois primeiros significados são pertinentes para o concerto entre Israel e Deus. J. Begrich vê o significado básico e original de berîth como uma união legal, um acordo incondicional, o qual é estabelecido por um simples ato de vontade imposta pela parte mais poderosa (Joachin Begrich, “Berit: Ei Beitra zur Erfassung Einer Alttestamentli-chn Denkform”, Zeitschrift fur die Alttestamentlich Wissenschaftg (1944): 1-11. Mas a teoria de Begrich, também não passa sem objeção. A. Jepsen discorda que o significado do concerto seja do tipo “conces-são”. Ao contrário, ele afirma, que condições são fre-quentemente presentes. Sua conclusão, é que berîth não se refere a uma unidade legal, mas ao próprio ato que produz o relacionamento e não diretamente o relacionamento (Johannes Pedersen, Israel: Its Life and Culture, Vols I-II [Copenhagem: S.L. Mollerm, 1926], 286; 292-293). Para ele, além disto, original-mente, não havia nenhuma condição imposta sobre a parte inferior (ver C. L. Rogers, “The Covenant with Abraham and its historical Setting”, 244).

21 A. Jepsen, “Berit, Ein Beitrag zur Theologie der Exilzeit, Festschrift”, Wilhelm Rudolph (Tubin-

gen, 1961), 161-180.22 John Murray, The Covenant of Grace, (Lon-

dres: Tyndale Press, 1953), X.23 De acordo com Murray, quando todas as ins-

tâncias de concertos meramente humanos são exa-minadas, definitivamente aparece em preeminência, nestes tipos de concertos, a noção de um juramento de fidelidade e confiança em lugar de um contrato mútuo. É a promessa de fidelidade sem reservas, de total compromisso que parece constituir a essencia do concerto. Diz ele: “Certamente há o vinculo de compromisso de um com o outro, mas tão profun-do e amplo é este relacionamento, que a noção de estipulações contratuais recuam para o background ou desaparecem totalmente.” Ele busca estabelecer este ponto, focalizando que na LXX, mesmo para os concertos humanos, o termo hebraico berîth é traduzido pelo Grego diatheke, e acrescenta: “Se o pacto mútuo pertencesse à essencia do concerto nestes casos, deveriamos esperar o tradutor ulizar suntheke” (Murray, 9). Ver também H. N. Ridder-bos, abaixo.

24 Murray, 11.25 Ver Herman N. Ridderbos, The Epistle of Paul

do the Churches of Galatia (Grand Rapids, MI: Eerdmans, 1953), 13.

26 Ver acima, as notas 15 e 16.27 Em seu estudo do concerto Abraâmico, Frank

R. Vandevelder, The Form and History of the Abrahamic Covenant (Doctoral Dissertation, Drew University, 1967), 12-25, conclui que há pelo menos dois tipos de concertos quanto a sua natureza, no Antigo Testamento, cada um com seu caráter teoló-gico distintivo: o tipo Abraâmico/Davídico e o tipo Sinaítico. Estes dois tipos podem ser entendidos, o primeiro (com Abraão e Davi) envolvendo promes-sas, e o segundo (com Israel) refletindo obrigações. Essa posição é mantida também por E.Weinfeld, “The Covenant of Grant in the OT, and in the An-cient Near Eas”, Journal of the American Oriental Society, 90 (1970), 184; e D. Freedman, “Divine Commitment and Human Obligation”, Interpretation 18 (1964), 420.

28 Mendenhall coloca grande ânfase nas similari-dades entre os tratados dos suzeranos hititas e a noção bíblica do concerto (Mendenhall, “Covenant”). Ver também, J. Bright, Covenant and Promise (Philadel-phia, The Westminster Press, 1972), 34. Contudo, recentes estudos questionam a validade de uma comparação formal entre tais tratados e os concertos bíblicos. Embora eruditos como F. Fesham conside-ram que as diferenças entre os tratados hititas e os concertos bíblicos possam ser atribuidos a diferentes circunstâncias envolvidas, devendo ser consideradas como “diferenças menores” (“Did a Treaty Between the Israelites and the Kenites Exist”, 154; ver tam-bém Klaus Baltzer, The Covenant Formulary, 1-19), muitos outros não são tão positivos quanto a estas conclusões (ver McCarthy, Old Testamento Cove-

- 23 -

nant: A Survey of Current Opinions, 13; ver também Masao Sekine, VT 9 [1959], 47-57; e J.A. Thompson “The Near-Eastern Suzerein Vassal Concepts in the Religion of Israel”, JRH 3 (1964): 1-19), 1-19. Basi-camente o significado do concerto deve ser buscado não em suas similaridades formais como encontrado em culturas que cercaram Israel, mas primariamente no contexto histórico da revelação divina.

29 M. Winfield, “The Covenant of Grant in the Old Testament and Ancient Near East”, Journal of the American Oriental Society, 90 (1972 185. Ver também Mendehall, “Covenant Forms in Israelite Tradition”, 50; K. Baltzer, The Covenant Formula-ry, (Philadelphia: Fortress Press, 1967), 19-62. D. McCarthy, “Treaty and Covenant”, Anacleta Bíblica, 21, (1963), 40-52.

30 Meredith G. Kline, “Oath and Ordeal Signs”, Westminster Theological Journal, 25-27 (1963-65), 17. A analogia dos tratados hititas em relação ao culto de Israel tem sido fortemente negada por outros estudiosos da questão. Para H. J. Krause, tal noção de paralelo não apenas obscurece, mas distorce o verdadeiro conceito de concerto no Antigo Testa-mento (Krause “Worship in Israel”, Oxford [1966], 136-140).

31 Erhard Gerstenberger, “Covenant and Com-mandment”, Journal of Biblical Literature 84 (Março1965), 36.

32 Ver David N. Freedman, Op Cit., 420.33 No registro do concerto com Noé, encontramos

a primeira ocorrência no AT do termo berith (Gn 6:18; 9:9). O concerto com Noé é essencialmente basendo em uma promessa. O compromisso divino é unilateral e incondicional. O cumprimento de tais promessas, portanto, não está condicionado por qualquer requerimento, sendo completa e absoluta-mente sem qualquer obrigação imposta ou exigida do parceiro humano. Alguns elementos podem ser facilmente observáveis neste concerto: (1) Ele é um concerto exclusivamente de Deus, “Agora estabeleço a minha aliança convosco” (Gn 9:9; 11, 12, 13, 17). (2) É universal em propósito, envolvendo a huma-nidade e todas as criaturas viventes; um concerto com “toda a carne” (Gn 9:9, 10). (3) O concerto com Noé é incondicional, não dependendo de qualquer desempenho humano, o qual é consistentemente comprovado inadequado. Freedman observa: “Em vista da radicada tendência humana de fazer o que é errado, Deus faz um compromisso unilateral e incon-dicional, que enquanto o mundo durar não haverá, nunca mais, um cataclismo como aquele que destruiu da humanidade” (Freedman, 426); Nenhum manda-mento é adicionado, o qual poderia ser considerado uma condição da qual o cumprimento da promessa dependesse. Como Murray observa, “não há a mais leve sugestão de que o efeito deste concerto pudesse ser anulado pelo a infidelidade ou que sua benção pudesse ser anulada pela descrença” (Murray, 12-13). (4). O concerto é intensa e completamente unilateral.

Ele está baseado na fidelidade divina, e numa pro-messa irrevogável. Apenas Deus está no controle e nesta conexão há uma rígida exclusão de qualquer cooperação humana. O sinal do arco nas nuvens é acrescentado para selar a promessa de Deus, como uma permanente lembrança de que Ele não será infiel à Sua promessa. O ponto principal estabelecido pelo arco, é que sua continuidade depende unicamente da fidelidade de Deus. Em termos antropomórficos, o sinal depende apenas da lembrança divina. (5) É um concerto eterno. A sua perpetuidade depende exclusivamente de Deus e de Sua fidelidade.

34 David Freedman, 420.35 Ibidem.36 G.Gunkel, “Abraham”, RGG, 1, col. 22,

citado por R. Clements, Abraham and David, 23. Como vimos, o Concerto Abraâmico é geralmente considerado pela teologia liberal, como não histórico, e sim meramente uma revisão de tradições tribais. Rogers observa que “isto naturalmente tem o efeito de remover o concerto com Abraão do seu contexto histórico, deixando a questão aberta para todos os tipos de especulação quanto à sua história e propó-sito” (Ver Rogers, 241).

37 J. Hoftijzer, “Die Verheissungen and die Drei Erzvater”, citado por Clements, Ibidem.

38 J. Welhausen, cf. R. L. Smith, “Covenant and Law in Exodus”, Southwestern Journal of Theology, 1 (Fall, 1971), 34. Acerca de uma data tardia para o Concerto Abraâmico, observamos que o concerto é um antigo conceito e não uma invenção ou desen-volvimento posterior. Contra a noção de uma data posterior para o Concerto Abraâmico, Fensham adverte que o quadro em Gênesis do relacionamento entre o cabeça do clã e Deus é um autêntico reflexo dos pastores nômades, que são os mais remotos ancestrais de Israel (Fensham, 311).

39 Foster R. McCurely, Proclamatioon Com-mentaries, “Genesis, Exodus, Leviticus, Numbers” (Fortress Press, 1979), 34. Devemos notar que a palavra berîth não é utilizada em Gênesis 12, mas a despeito desta ausência, podemos concluir que os três capítulos contendo a descrição do estabele-cimento ou repetição do concerto (Gn 12, 15, 17), estão intimamente relacionados. Assim, embora a verbalização do concerto apareça apenas no capítulo 15 e 17, a noção dele é introduzida de forma clara no capítulo 12.

40 A palavra de bênção de Yahweh expressa Seu desejo de favor, que conduz à fertilidade, prosperida-de, proteção e preservação. “Aquele que é abençoado funciona e produz no nível máximo, cumprimento o seu propósito divinamente designado” (Michel L. Brown “BRK”, New International Dictionary of Old Testament Theology and Exegesis, Billen A. VanGemeren, ed. [Grand Rapids, MI: Zondervan, 1997], 1:759). Na Criação Deus abençoou o homem e a mulher (Gn 1:28-30; 5:2). Ele abençoou o sábado (Gn 2:3). Depois do dilúvio, Deus abençoou Noé e

- 24 -

seus filhos (Gn 9:1-7), em ambos casos, chamados a multiplicar e exercer autoridade. Contudo, em lugar de reter o favor de Deus, o homem rebelou-se contra o Criador que o havia abençoado. E em lugar de experimentar a totalidade da benção divina, a maldição de Deus caiu sobre a humanidade (Gn 3:17; 4:11; 5:29). Ao contrário de Sua bênção a maldição divina significa “amarrar, limitar com obstáculos, tornar incapaz de resistir” (Ver Victor P. Hamilton,) “‘RD”, Theological Words of the Old Testament, 1:75-76).

41 Por Abraão renunciar sua identidade com as nações rebeldes, o Senhor prometeu fazer dele o pro-genitor de uma nação. Mas, esta nação seria distinta de todas as nações prévias, porque o seu ancestral não está imediatamente ligado aos descentes de Noé (dez gerações separavam Noé de Abraão – Gn 11:10-26). Ao chamar esta nação de “grande”, o Senhor se refere a uma grande população, um grande território e a um caráter sábio (cf. Gn 12:7; 13: 14-17; Dt 4:7-8). Ver ainda Gordon J. Wenham, Genesis 1-15, Word Biblical Commentary (Dallas: Word, 1987) 1:275.

42 No registro dos filhos de Noé, as nações (gôyim) foram divididas de acordo com a “terra” (Gn 10:5,20,31,32). Ao deixar sua terra, Abraão estava essencialmente deixando sua nação. “E da tua parentela e da casa de teu pai”. De acordo com Gn 10, ancestrais comuns eram a base da identidade nacional. Assim o Senhor chama Abraão a renunciar sua identificação com as nações em rebelião contra Ele.

43 A ordem de “percorrer” a terra “representa uma apropriação simbólica dela” (Ver, Wenham, Gênesis 1-15, 298). Deve-se observar que a obediência de Abraão, não é explicitamente declarada no texto, mas pode ser considerada uma demonstração de sua fé na promessa de que Deus lhe daria a terra, e a sua inumerável semente (Gn 13:15-16).

44 Gerhard F. Hasel, “The Meaning of the Animal Rite in Genesis 15”, Andrews University, monografia não publicada, 10. Veja também Richard S. Hess, “The Slaughter of the Animals em Genesis 15, and its Ancient Near East Context”, em He Swore an Oath: Bibilcal Themes from Genesis 12-50, ed. por R.S. Hess, P. E. Sattertwaite e G. J. Wenham (Grand Rapids, MI: Baker Book House, 1994), 55-65.

45 Em resposta a pergunta do patriarca quanto à certeza de que herdaria a terra (15:8), o Senhor apenas ordena-lhe que traga alguns animais (v. 9), em resposta Abraão “trouxe” e “partiu”, o que sugere que Abraão conhecia o ritual prestes a acontecer. Para a noção de paralelos extrabíblicos desta cerimônia de ratificação concertual, veja Weinfeld “Tte Covenant of Grant...”, 196-199.

46 Victor P. Hamilton, The Book of Genesis, Chapters 1-17, 438.

47 M. Weinfeld, The Covenant of Grant in the OT, 184-204.

48 W. W. Bandollar, The Validity of Dispensatio-

nalism (Regular Baptist Press, Ill., 1967), 65-66.49 J.F. Walvoord, “The Fullfilment of the Abraha-

mic Covenant”, Bibliotheca Sacra, vol. 102 (1945), 30; ver também “The Abraamic Covenant and Pre-millenialism”, Bibliotheca Sacra, vol 108 (1951); Darby raciocina que “As promessas e concerto com Abraão estão estabelecidas sobre base que não pode ser abalada, não na estabilidade de professa obedi-ência, mas na estabilidade da promessa declarada de Deus – em duas coisas nas quais é impossível que Deus minta, Sua promessa e Seu juramento” (J. N. Darby, “The Covenant”, Collected Writings, 3:75). Da mesma forma, L. S. Chaffer, o teólogo sistemático do dispensacionalismo, observa que “o concerto com Abraão é por necessidade, incondicional e a declaração dele não incorpora uma condição hu-mana, mas repousa inteiramente no freqüentemente repetido e soberano: ‘Eu farei’ de Yahweh” (L.S. Chafem “Dispensationalism”, Bibliotheca Sacra, Vol 93, 1936, 432). The New Sofield Bible, em grande medida, responsável direta pela popularização do dispensacionalismo, faz observação semelhante: “O Concerto Abraâmico revela o soberano propósito de Deus em cumprir, através de Abraão, Seu programa para Israel. O cumprimento final [dele] repousa sobre a promessa divina e o poder de Deus e não na infide-lidade humana” (The New Scofield Bíble, 1318).

50 O termo ‘OLAM (everlasting/eterno), tem o significado básico “os tempos mais distantes”. A palavra é usada em referência tanto ao passado (Gn 6:4), ou, como em 17:15-21, em referência ao futuro. A palavra em si não contém a idéia de “eternidade” mas a um distante passado ou futuro (ver Allan A. MacRae “‘OLAM”, Theological Words in The Old Testament, 2:672-63); Ver DeCaro, Israel Today, 55-57.

51 New Scofield Bible, 1318.52 Walvoord J. F., The Millennial Kingdom (The

Dunham Publishing Co., 1959), 140.53 De acordo com um grande número de comen-

taristas dispensacionalistas (ver Clarence Larkin, Rightly Dividing the Word, 51; M. R. Dehann, The Second Coming of Jesus, 98; W. Blackstone, Jesus is Coming, 46), em Seu primeiro advento Jesus veio cumprir as promesas feitas a Abraão e estabelecer um reino terreno, mas a nação judaica O rejeitou e frustrou Seu propósito. Assim, o cumprimento “foi posposto até o segundo advento de Cristo” (George Ladd, Crucial Questions About the Kingdom of God, 50, 51). A questão que imediatamente emerge, con-tudo, é esta: Se os judeus foram capazes de frustrar o plano de Deus no primeiro advento de Jesus, então que tipo de garantia se pode ter que eles não farão o mesmo por ocasião do segundo advento? Além disto, nesta perspectiva, o primeiro advento de Cristo foi um fracasso, e, talvez, pior ainda, a Cruz não teria sido necessária se os judeus, tivessem resolvido cooperar, aceitando a Sua oferta.

54 Walvoord, “The Abrahamic Covenant and

- 25 -

Prmillenialism”, Bibliotheca Sacra, 108 (1951), 419. Em outro artigo, da mesma série, Walvoord argumenta que “nada deveria ser mais claro que Abrão, Isaque e Jacó entenderam o termo semente como se referindo a linhagem física deles” (“The Abrahamic Covenant...”, Bibliotheca Sacra, 108 (1951), 138.

55 Walvoord, Millenial Kingdom, 161.56 Na promessa de descendência (Gn 17:5), o tex-

to usa o termo gôy em lugar de ‘am. Gôy é útilizada para as nações estrangeiras (como em Gn 10 na lista das nações). Alfred Cody oserva que goy é ordinaria-mente reservado para as nações pagãs, alguém que não era judeu (Cody “When is the Chosen People Called a GÔY?”, Vetus Testamentus 14 (1964), 39-47. A Bíblia nunca utiliza gôy para descrever Israel. Assim, a grande nação seria constituída por mais do que meramente descendentes étnicos de Abraão. Goy é um termo universalista, o que deve forçosamente incluir os gentios.

57 Walvoord, “The Abrahamic Covenant…”, 419.

58 Ibidem, 421.59 Daniel Fuller, Gospel & Law, Contrast or Con-

tinuum (Grand Rapids, MI: Eerdmans, 1980), 125.60 Walvoord, Millenial Kingdom, 147. A mesma

idéia é afirmada pelos editores da New Scofield Bible, no comentário do texto de Gn 17.

61 É claro, Walvoord está consciente que, com a passagem do tempo, Deus expressamente excluiu alguns dos descendentes físicos de Abraão de re-ceberam a promessa. Ismael e os filhos de Quetura (Gn 17:18-19; 25:6), e posteriormente Esaú (Gn 25.23). Mas o que o dispensacionalismo parece não compreender ou admitir é que este “narrowing-down process” não parou aí. Eventualmente, toda a nação judaica foi excluída do relacionamento concertual. Para um proveitoso estudo sobre a questão, ver Hans K. LaRondelle, O Israel de Deus na Profecia (Engenheiro Coelho, SP: Unaspress, 2001).

62 Louis A. Decaro, Israel Today: Fulfillment of Prophecy?, 222.

63 J. Barton Payne, Encyclopedia of Biblical Prophecy (Grand Rapids, MI: Baker Book House, 1973), 112.

64 Ralph Smith, Covenant and Law in Exodus, 34.

65 E.W. Nicholson, Exodus and Sinai in History and Tradition (Richmond: John Knox Press, 1973), 66.

66 Ronald Clements, Abraham and David (Whe-aton, Ill.: Alec R. Allenson Inc. 1967), 33, 34.

67 Em Gênesis 12:1, como C.L Rogers observa, é utilizado o imperativo “saia” – seguido de uma série de imperfeitos cohortativos, com um waw simples. A questão é se esta construção implica uma condi-ção. Embora Rogers sugira outras possibilidades, ele diz: “Não se pode negar que um certo elemento de condição está [aqui] presente” (Rogers, “The

Covenant with Abraham and Its Historical Setting”, Bibliotheca Sacra, 127, [1970], 252). É óbvio que, independente de confirmação gramatical, obedecer a ordem divina de sair de sua terra, da sua parentela e da casa do seu pai, e dirigir-se a terra que o Se-nhor lhe haveria de mostrar, parece ser a condição básica para o cumprimento do concerto. Ao mesmo tempo, tal ordem funciona como negação da idéia incondicionalidade absoluta do concerto. Por outro lado, isto estabelece o ponto central de que o concerto está sempre em relacionamento com a fidelidade e obediência. Aquele não pode subsistir sem esta. Além disto, seria no mínimo estranho que a obediência re-querida como ponto de partida, no início do concerto, não desempenhasse nenhum papel de relevância nos desdobramentos posteriores. Ou que ela tenha sido uma condição para o estabelecimento do concerto, mas não necessária depois, para o cumprimento de sua promessa. Em conclusão, a jornada para Canaã foi apenas a primeira de uma série de respostas de obediência, levando à eventual ratificação da promessa em Harã e fundamental em seus outros desdobramentos.

68 A expressão, “andar na presença de...”, como Hamilton observa, “usualmente expressa o serviço ou devoção de um servo fiel ao seu rei, sendo o último humano (1Rs 1:2; 10:8; Jr 52:12), ou divino” (Hamil-ton, Genesis, Capítulos 1-17). A mesma expressão é usada em Gn 24:40; 48:15.

69 The Seventh-day Adventist Bible Commen-tary (Washington DC: Review and Herald, 1978), 1:321.

70 Kline, Op. Cit, 117. Na tentativa de evadir ao elemento de condicionalidade de Gn 17:0-14, Roger diz que “o concerto já estava em efeito e que a circuncisão é explicitamente chamada um sinal ou jugo do concerto” (Roger, Op. Cit, 253). Contudo, Roger falha em perceber que a questão aqui gira em torno da preservação ou da continuidade do concerto. Uma sanção de maldição aparece acrescentada à es-tipulação relacionada à circuncisão: “O incircunciso, que não foi circuncidado na carne do prepúcio, essa vida será eliminada de seu povo, quebrou a minha aliança” (Gn 17:14). A questão evidente é esta: como então poderia ser o concerto com Abraão incondi-cional, como argumenta o dispensacionalismo, se ele podia ser quebrado? Koehler, em Old Testament, 65, tenta resolver o dilema colocando a comunidade corporativa em contraste com indivíduo. Assim, ele argumenta que o destino pessoal do indivíduo não afeta o concerto. Embora esta distinção entre o indi-víduo e o todo corporativo, a nação, seja parcialmente verdade, isto nao é evidência de que o concerto não pudesse ser quebrado. Neste caso, é dificil ver como tal distinção, entre a nação e o indivíduo resolve o dilema, porque a nação não pode ser nada mais que a soma dos indivíduos que a compõem. Certamente é a quebra pessoal do concerto que potencialmente representa a possibilidade da invalidação nacional

- 26 -

dele. Deve-se observar que a “linhagem genealógica” não é um corpo abstrato, mas uma entidade composta de indivíduos. Certamente, o concerto eterno pode ser quebrado (cf. Is 24:5; Ez 16:59). Embora estas passagens possam ser interpretadas como uma re-jeição individual de Deus, obviamente, toda a nação de Israel poderia, como o fez, rejeitar o concerto e invalidar suas promessas. Assim, Israel, como linhagem física de Abraão não verá o cumprimento das promessas de Deus (Rm 9:7-8).

71 Ronald Youngblood, “The Abrahamic Cove-nant: Conditional or Unconditional?”, The Living and Active Word of God: Studies in Honor of Samuel J.Schultz, ed. Morris Inch e Ronald Youngblood (Winona, Lake, Inc.: Eisebrauns, 1983), 31-46.

72 W. Kaiser, Towards an Old Testament Theo-logy, 94.

73 Oswald Allis, Prophechy and the Church (Philadelphia: The Presbiterian and Reformed, 1945), 33.

74 John Murray, The Covenant of Grace, 17.75 Ibidem, 18. A necessidade de guardar o con-

certo por parte do homem é uma inevitável condição de sua permanência. Concerto e obediência estão em relacionamento vital. Murray faz uma válida observação ao dizer: “É plausível, contudo objetar que a violação do concerto, concebida neste caso, interfere com a perpetuidade dele. Por que afinal, a violação do concerto não implica a perpetuidade condicional dele? O incircunciso “será eliminado do Meu povo; quebrou o Meu concerto” (Gn 17:14). Sem dúvida, a bênção do concerto e o relacionamento que ele antecipa, não pode ser desfrutada ou mantida separada do cumprimento de certas condições por parte do beneficiário. Pois quando pensamos na promessa, a qual é elemento central do concerto, “Eu serei o vosso Deus, e vós sereis o Meu povo,” há uma mutualidade necessária envolvida em seu sentido mais amplo. Comunhão é sempre mútua, e quando ela cessa, a comunhão deixa de existir” (Ibidem, 19).

76 André Parrot, Abraham and His Times (Phila-delphia: Fortress Press, 1971), 118.

77 Murray, Op Cit, 19.78 W. Kaiser,Towards a Old Testament Theology,

94.79 E. Heppenstall, “The Law and the Covenant

at Sinai”, AUSS 11 (1964), 4-26.80 S. Mowinchel, The Psalms in Israel´s Worship,

2 vols. (Oxford: Basil Blackwell, 1962), 1:52.81 G. L. Archer, “Covenant”, Baker’s Dictionay of

the Bible (Grand Rapids, MI: Baker Book House).82 Curiosamente, o termo “semente” (‘zd) tem

um proeminente lugar nas promessas do Senhor a Abraão. O substantivo aparece 244 vezes no AT, com diferentes significados. Semente como “descendên-cia” é o significado em Gn 22:17. Em uso teológico “a palavra designa toda a linha de descendentes como uma unidade, contudo, ela é deliberadamente flexí-

vel o suficiente para denotar tanto uma pessoa que epitomiza todo o grupo (isto é, a pessoa da promessa em última instância é Cristo), ou as muitas pessoas em toda a linha de descendentes naturais ou espiritu-ais” (Walter C. Kaiser Jr. “‘ZD”, TWOT. 1:252-53). Genesis 22 apresenta a última comunicação verbal do Senhor com Abraão registrada. Mais uma vez o Senhor se compromete em abençoar Abraão e multi-plicar a sua “semente”. Então, o Senhor declara que “sua semente possuirá os portões dos seus inimigos” (Gn 22:17) Semente neste contexto pode ter seu sentido plural, apontando para a futura conquista da terra prometida, mas como T. Desmond Alexander observa, “a identidade desta ‘semente’ não é fácil de se determinar. Enquanto a primeira referência à “semente” denota “descendentes”no plural. (Gn 22:17), as referências posteriores são ambíguas (Gn 22:17b, e 18); elas tanto podem se referir a muitos descendentes, ou a um Úníco descendente. Esta última possibilidade, contudo estaria em con-sonância com o alvo geral de Gênesis em enfatizar a linhagem real” (Alexander, From Paradise to the Promised Land: An Introduction to the Main Themes of the Pentateuch [Grand Rapids, MI., 1998], 40). E certamente tal possibilidade está em consonância com o uso que Paulo faz da “Semente” de Abraão no livro de Gálatas.

83 E. G. White, “Words to the Young”, Youth’s Instructor, 22 de setembro 1892, 304.